A imaginária sacra permambucana do séc. XIX - história e técnica da obra de Manuel da Silva Amorim

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    A IMAGINRIA SACRA PERNAMBUCANA DO SCULO XIX:HISTRIA E TCNICA DA OBRA DE MANUEL DA SILVA AMORIM

    Conceio Linda de FranaEscola de Belas Artes / UFMG

    Kleumanery de Melo BarbozaEscola de Belas Artes / UFMG

    RESUMO

    Apesar de ser reconhecida por muitos estudiosos como a arte de maior originalidade equalidade tcnica e artstica do Brasil colonial, a imaginria pernambucana do sculo XIXapresenta uma carncia de estudos, impossibilitando uma abordagem mais objetiva.

    Buscando suprir esta carncia, este projeto tem por objetivo reunir informaes sobre a obradesenvolvida por Manuel da Silva Amorim, um dos maiores expoentes da imaginria sacrapernambucana, abordando seus aspectos histricos e estticos bem como identificar astcnicas construtivas e materiais utilizados.

    Palavras-chaves:Arte Pernambucana, Tcnicas Construtivas, Imaginria Sacra.

    RESUMEN

    A pesar de ser reconocida por muchos estudiosos como la arte de mayor originalidad ycalidad tcnica y artstica de Brasil colonial, la imaginaria pernambucana del siglo XIX

    presenta una carencia de estudio, lo que impide un enfoque ms objetivo. Este proyectotiene como objetivo recabar informacin sobre el trabajo realizado por Manuel da SilvaAmorim, uno de los mayores exponentes de la imaginaria sacra de Pernambuco, acercndo-se a sus aspectos histricos y estticos bien como la identificacin de las tcnicasconstructivas y materiales utilizados.

    Palabras Clave:Arte Pernambucana, Tcnicas Constructivas, Imaginaria Sacra.

    1. INTRODUO - PANORAMA HISTRICO DO RECIFE NO SCULO XIX.

    A histria do Recife no sculo XIX est marcada pela luta poltica no se

    subordinando ao poder central desafiando as ordens vindas do Rio de Janeiro: A

    Revoluo Pernambucana de 1817, a Confederao do Equador, de 1824 e a

    Revoluo Praieira, de 1848.

    Tornou-se cidade em 1823 e capital de Pernambuco em 1827. Os espaos urbanos

    ganhavam importncia, os costumes sociais exigiam novos comportamentos. Esta

    modernizao da cidade ocorreu por intermdio da administrao pblica dopresidente (prefeito) Francisco do Rego Barros (18371844)

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    O modelo era Paris, cidade emblemtica do mundo ocidental, onde Rego Barros

    estudou. Ele no trouxe apenas as idias, mas trabalhadores e tcnicos franceses.

    A vinda de Louis Vauthier, chefiando uma misso de engenheiros, trouxe

    efetivamente mudanas significativas no setor das obras pblicas, alm da

    circulao de idias socialistas atravs da revista Progresso.

    Construram-se estradas e a Ponte Pnsil de Caxang. As ruas foram numeradas,

    seus nomes definidos, instalada luz pblica a gs, padronizao de prdios dentro

    dos princpios modernizadores europeus.

    Novas maneiras de comer, de vestir, de comportar-se em pblico quebravam

    tradies. Alm disso, no vieram apenas engenheiros, mas profissionais das mais

    diversas reas. Artistas, modistas, mdicos, cozinheiros franceses, aqui se

    estabeleceram em busca de uma melhor sobrevivncia. E dentro deste clima de

    modernizao e euforia foram esculpidos os principais trabalhos do grande escultor

    pernambucano Manuel da Silva Amorim, que abordaremos neste estudo.

    BREVE HISTRICO DE MANUEL DA SILVA AMORIM (MSA)

    Pernambuco apresenta uma imaginria diversificada procedente de oficinasestabelecidas nos atuais Estados de Pernambuco, Alagoas e Paraba que

    integravam no sculo XVIII a Capitania Geral de Pernambuco, entretanto, as

    informaes referentes a este perodo encontram-se dispersas, tornando-se

    necessrio no apenas a sua catalogao, mas, um estudo aprofundado da Escola

    Regional de Pernambuco como classificou a pesquisadora Miriam Ribeiro.

    Dentro deste contexto escolhemos realizar um recorte que compreende aspectos

    tcnicos e estilsticos da obra de Manoel da Silva Amorim, nascido no Recife em

    1793 e onde faleceu em 1873, considerado o mais importante escultor do Nordeste

    do sculo XIX. Pouco se sabe sobre sua vida, porm sua obra, ainda pouco

    estudada pode ser encontrada em muitas igrejas do Recife e Olinda. Ao contrario de

    muitos artistas dos perodos anteriores, tinha o hbito de assinar suas obras, alm

    disso, possvel encontrar vrias imagens com documentao histrica que

    comprovam sua autoria.

    Era irmo da Venervel Ordem Terceira de So Francisco de Recife, para a qual

    confeccionou uma srie de imagens processionais, as imagens de Santa Clara, So

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    Luis, rei da Frana, que atualmente se encontram nos retbulos da nave da Capela

    Dourada e Nossa Senhora da Ajuda, no altar-mor da mesma Capela. Alm destas

    imagens existe ainda a Mater Dolorosa do Mosteiro de So Bento de Olinda, o

    conjunto escultrico do cenculo na Igreja do Divino Esprito Santo do Recife, So

    Manoel da Pacincia da Igreja do Tero e o Senhor dos Passos da Igreja da Madre

    de Deus tambm na mesma cidade, que segundo PIO (1960) um "trabalho de

    cunho notvel, obra de um artista verdadeiramente genial."

    Suas imagens de vestir apresentam elaborada concepo dramtica dos rostos e

    das mos, considerando que a maior parte do corpo seria apresentada coberta por

    mantos ricamente bordados e cabea encimada por perucas de cabelos humanos.

    Apesar desta elaborao estar concentrada nestas partes que ficariam expostas,

    pode-se encontrar algumas esculturas de vestir onde o corpo apresenta detalhes

    anatmicos elaborados.

    No h muitos registros sobre a sua formao, mas, provavelmente deve ter sido

    aprendiz no atelier de Antnio Spangler Aranha (RIBEIRO, 2000). Spangler Aranha

    foi considerado pelo historiador beneditino Loreto Couto como uma espcie de gnio

    artstico por exercer simultaneamente diversas atividades tendo sido poeta,teatrlogo, orador, msico pintor, escultor e dourador, e esta diversidade de talento o

    transformou no mestre mais procurado para a formao de novos artfices.

    Segundo PIO (1960), Manuel era catlico praticante e tornou-se irmo de vrias

    Irmandades do Recife, entre elas a Venervel Ordem Terceira de So Francisco e

    da Confraria do Senhor Bom Jesus da Via Sacra da Igreja da Santa Cruz da qual era

    mesrio. Esta prtica de se associar a diversas irmandades facilitava muito o seu

    trabalho na hora das irmandades encomendarem esculturas para as igrejas. Como

    ele era irmo, normalmente, era convidado a execut-las.

    Alm de escultor, o artista tambm exercia a funo de policromador em algumas

    obras. Segundo Miriam Ribeiro (2000), de sua autoria a excelente policromia da

    imagem de Nossa Senhora da Ajuda entronizada em 1867 no altar-mor da Capela

    Dourada. A informao de que Manoel da Silva Amorim era alm de escultor

    encarnador confirmada por Fernando Pio (1960) conforme pode ser observado nacitao abaixo.

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    Existiam duas na Ordem Terceira. A primeira veio de Lisboa entre os anosde 1755 e 1756 e como tantas outras foi relegada ao abandono. A mesaregedora tomou conhecimento de que a imagem se encontrava em umarmazm debaixo do consistrio, mandou, em sesso de 25 de fevereiro de1842que a transladasse para um dos altares da capela dos novios. Entre

    1866 e 1867 mandou a ordem fazer uma nova imagem por Manoel da SilvaAmorim, uma nova imagem que se encontra at hoje no altar-mor daCapela Dourada. Da primitiva vinda de Lisboa no se tem notcias. Aimagem feita por Manoel da Silva Amorim foi encomendada por AntonioPinto de Barros. Foi entregue em maio de 1866 e custou 160$000 feitura eencarnao. (PIO 1960 P. 111)

    Atuou em muitas igrejas de Recife e Olinda e, provavelmente, em Igarassu, Goiana,

    Ipojuca e Sirinham. Os registros referentes a sua atuao datam do perodo

    compreendido entre os anos de 1826 e 1871. So documentos relativos a

    pagamentos localizados por Fernando Pio. Faleceu em Recife no ano de 1873, aos80 anos.

    2. METODOLOGIA

    Ao iniciar este estudo buscamos formular uma metodologia atravs da qual

    pudssemos analisar algumas das obras documentadas de Manuel da Silva

    Amorim. Desta forma, empregamos uma metodologia baseada, inicialmente, na

    localizao, seleo de obras documentalmente identificadas como sendo de autoria

    do artista pesquisado e na anlise de caractersticas formais e estilsticas

    recorrentes no trabalho de Manuel da Silva Amorim.

    A identificao e localizao das obras foi realizada, inicialmente, a partir de

    levantamento bibliogrfico sendo uma das principais referncias o livro de Fernando

    Pio, Ordem Terceira de So Francisco do Recife, publicado em 1960. De posse

    destas informaes, percorremos vrias igrejas no Recife a fim de confirm-las.

    Com a realizao desta pesquisa de campo, foi possvel perceber que muitas das

    imagens no se localizavam mais onde haviam sido registradas. Atravs de

    entrevistas realizadas com funcionrios responsveis pela manuteno dos acervos

    das igrejas soubemos que algumas imagens haviam sido emprestadas a outras

    Irmandades, mas no conseguimos dados concretos a respeito destas informaes.

    Aps a realizao da pesquisa de campo, atualizamos a lista de localizao das

    imagens como pode ser observado na tabela 1.

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    OBRAS LOCALIZADAS

    ANO OBRA ENCOMENDANTE

    1826 Nossa Senhora da Soledade Igreja da Soledade

    1831 So Joaquim

    Igreja da Santa CruzSo Jos

    So Raimundo

    1836 Santa Clara

    Venervel Ordem Terceira de So Francisco

    So Luiz Rei de Frana

    1842 So Bento Museu de arte Sacra de So Paulo

    1845 Senhor Bom Jesus dos Passos Igreja da Madre de Deus

    1846 Nossa Senhora do Cenculo

    Igreja do Divino Esprito SantoGrupo de Apstolos (12)

    1851 So Jos Igreja Matriz da Boa Vista

    1857 So Manoel da Pacincia Igreja do Tero

    1858 Conjunto Mater Dolorosa - Piet Mosteiro de So Bento (Olinda)

    1867 Nossa Senhora da Ajuda

    Venervel Ordem Terceira de So Francisco2 Anjos do Altar-mor

    Quatro Anjos de Procisso

    So Frei Pedro Gonalves Igreja da Madre de Deus

    1871 Nossa Senhora da Conceio

    Igreja de Santa Rita

    So Jos

    Tabela 1 Obras localizadas de Manuel da Silva Amorim

    Foram realizados registros fotogrficos, esboos e anotaes das obras localizadas

    com a finalidade de analisarmos e compararmos aspectos tcnicos, formais eestilsticos. As obras selecionadas para o estudo foram as que apresentaram

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    documentao ou registro de que foram realizadas pelo artista. A assinatura do

    artista que uma caracterstica marcante no seu trabalho, no foi levada em

    considerao para esta escolha pelo fato da grafia apresentada na base das

    imagens variar muito. Tambm levamos em considerao nesta escolha um grupo

    de obras que deixavam grande parte a anatomia corporal a mostra e

    tambm,imagens de vestir.

    Aps esta etapa inicial, procuramos utilizar um referencial terico que servisse de

    base para a caracterizao de detalhes, os famosos cacoetes que so

    identificados como uma espcie de marca pessoal impressa pelo artista em seus

    trabalhos. Selecionamos ento o mtodo desenvolvido pelo crtico de arte italiano

    Giovanni Morelli (1816-1891).

    Morelli desenvolveu um mtodo baseado em critrios cientficos para ser aplicado

    por pesquisadores e estudiosos de arte. A finalidade de aplicao do mtodo a

    atribuio que ultrapassa o juzo de bonito e feio ou de autntico e falso, mas a

    incluso da obra na coerncia de uma personalidade artstica (...) entendida por

    Morelli como constncia de modos figurativos ou, mais precisamente, como

    recorrncia de certos maneirismos (por exemplo, o modo de desenhar as mos ouas orelhas), em que a fora do hbito prevaleceria sobre a inveno (Argan, 1988,

    p. 143).

    Este se baseia na anlise e classificao das esculturas atravs de caractersticas

    comuns relativas s tipologias de composio anatmicas (caractersticas

    fisionmicas, cabelos, corpos etc.) e cnones de proporo."(...) preciso no se basear, como normalmente se faz, em caractersticasmais vistosas, portanto mais facilmente imitveis, dos quadros...Pelocontrrio, necessrio examinar os pormenores mais negligenciveis, emenos influenciados pelas caractersticas da escola a que o pintorpertencia: os lbulos das orelhas, as unhas, as formas dos dedos das mose dos ps. Dessa maneira, Morelli descobriu, e escrupulosamentecatalogou, a forma de orelha prpria de Botticelli, a de Cosme Tura e assimpor diante:Traos presentes nos originais, mas no nas cpias.

    Para Morelli, "esses detalhes marginais eram reveladores porque constituam os

    momentos em que o controle do artista, ligado a tradio cultural, distendia-se para

    dar lugar a traos puramente individuais que lhe escapam sem que ele se d conta.Segundo ele, durante a realizao de um estudo, o pesquisador pode ser

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    comparado a um detetive que descobre o autor do crime (da obra) baseado em

    indcios imperceptveis para a maioria.

    OBRAS SELECIONADAS

    Senhor Bom Jesus dos Passos

    A imagem do Senhor Bom Jesus dos Passos utilizada nas festividades da Semana

    Santa, quando a mesma sai da Igreja da Madre de Deus percorrendo em procisso

    as principais ruas do centro da cidade do Recife.

    Nome:Senhor Bom Jesus dos PassosAltura: 160cm (ajoelhado)Encomendante: Irmandade do Bom JesusLocalizao: Igreja da Madre de DeusAno: 1845Policromador: Armando dos Santos

    Figura 2 Senhor Jesus do Passos. Fonte: SILVA, 2008.

    A Venervel Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos do Corpo Santo foi

    fundada pelos comandantes brasileiros e portugueses vitoriosos na batalha contra

    os holandeses. Desde 1654, esta Irmandade responsvel pela organizao das

    procisses do Encerro e dos Passos da Paixo de Cristo realizadas durante a

    Semana Santa. Para estas procisses era utilizada uma imagem de vestir do SenhorBom Jesus dos Passos, de origem portuguesa, cercada de lendas em relao a sua

    origem.

    A lenda narrada por Cmara Cascudo conta que a imagem teria sido um presente

    do prprio Cristo que, encarnando um pobre mendigo teria pedido e recebido abrigo

    na Igreja do Corpo Santo, numa noite tempestuosa. Com a demolio da Igreja do

    Corpo Santo para abertura de uma avenida, a imagem foi transferida para a Igreja

    da Madre de Deus onde permanece at os dias atuais.

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    Em 1845, Manuel da Silva Amorim foi contratado pela mesma Irmandade para

    esculpir uma nova imagem tendo como modelo a imagem primitiva de 1654,

    anteriormente citada. Esta imagem esculpida por Amorim passou a substituir a

    imagem primitiva nas procisses da Semana Santa.

    So Tiago Maior

    Esta obra faz parte do conjunto de 13 imagens de roca que representam o

    Cenculo.. O cenculo considerado o local onde os apstolos se reuniram pela

    primeira vez aps a morte de cristo. Este conjunto, pertencente a Igreja do Divino

    Esprito Santo de Recife, foi encomendado a Manuel da Silva Amorim para a

    comemorao do Pentecostes.

    Nome:So Thiago MaiorAltura: 80cmEncomendante: Irmandade do Divino Esprito Santo

    Localizao: Sacristia da Igreja do Divino Esprito SantoAno: 1846

    Figura 3 So Tiago Maior. Foto: Kleumanery Melo, 2006

    So Manuel da Pacincia

    Mrtir do sculo IV foi vtima do rei Juliano que queria que ele adorasse os dolos pagos de

    Roma e como ele no aceitou foi martirizado. Durante seu martrio colocaram dois pregosnos seus ouvidos e, por suportar pacientemente o martrio ele ficou conhecido como So

    Manoel - o santo da pacincia.

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    Nome:So Manoel da PacinciaAltura: 113cmEncomendante: Irmandade do TeroLocalizao: Sacristia da Igreja do Divino Esprito SantoAno: 1857

    Figura 4 So Manuel da Pacincia. Foto: Kleumanery Melo, 2006

    Sua devoo no to comum no Brasil, e poucas imagens so encontradas sob

    essa invocao. O local onde essa devoo mais forte na cidade de Mossor no

    Rio Grande do Norte, onde existe uma parquia dedicada a este santo.

    Durante anos, a imagem ficou entronada no altar-mor da Igreja do Tero, porm,

    aps um roubo, esta quando foi recuperada passou a ser guarda em uma sala

    trancada no primeiro andar da Igreja.

    CARACTERSTICAS TCNICAS DAS OBRAS

    1. Senhor Bom Jesus dos Passos

    Como foi dito anteriormente, esta imagem foi esculpida a partir de uma modelo pr-

    existente, desta forma, o artista teve sua criao limitada a composio do modelo.

    Mas mesmo com esta limitao, o escultor conseguiu deixar sua marca

    desenvolvendo solues diferenciadas na tcnica construtiva. Trata-se de uma

    imagem de vulto, de vestir, esculpida em vrios blocos com articulaes nos braos

    e uma perna encaixada atravs de engaste. Possui olhos de vidro e peas metlicas

    instaladas nas costas e ombros.

    Como se trata de uma escultura de vestir utilizada para a procisso do encontro e do

    encerro e da mesma ter que carregar um cruz sobre o ombro, Manuel elaborou um

    encaixe especial em forma de engrenagem (A), em madeira, para fixar os

    antebraos ao braos, correspondendo a articulao do cotovelo. Esta engrenagem

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    permitia, originalmente, a disposio dos braos em vrios ngulos de abertura,

    sendo travada por uma segunda pea metlica (B).

    Figura 5 Senhor Bom Jesus dos passos detalhe das articulaes dos braos.

    Foto: Kleumanery Melo, 2006

    Com o passar do tempo e o desgaste causado pelo uso, o sistema original

    desenvolvido por Manuel perdeu parte de sua funcionalidade, foi realizada uma

    interveno com a instalao de um gancho metlico e argolas para a sustentao

    do peso do brao.

    No local destinado a fixao da perna esquerda tambm pode ser percebido que o

    escultor elaborou um sistema que no permitisse a movimentao da pea.

    Elaborou um encaixe diferenciado dos comumente encontrados nas esculturas

    brasileiras, como pode ser observado na figura 6. Alm do sistema de encaixe em si

    j servir como uma fixao atravs do engastamento da perna, ainda utilizada uma

    cunha em madeira inserida atravs de um orifcio localizado na lateral da coxa

    esquerda para reforar a fixao da pea encaixada.

    A

    B

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    Figura 6 Senhor Bom Jesus dos passos detalhe do encaixe da perna esquerda.Foto: Kleumanery Melo, 2006

    Ainda podem ser observados outros elementos fixados a escultura a fim de encaixar

    os acessrios que a mesma carrega durante a procisso como uma placa metlica

    instalada nas costas da escultura para o encaixe do resplendor e uma segunda pea

    metlica fixada ao ombro esquerdo para a fixao da cruz durante as procisses.

    Alm destes detalhes relacionados a tcnica construtiva, pode-se destacar a boa

    qualidade da talha, principalmente na face e trax da imagem, e reas que ficariam

    mais expostas durante a apresentao da imagem ao pblico como mos e ps.

    Figura 7 Senhor Bom Jesus dos passos detalhe da talha do p e mo direitos.Foto: Kleumanery Melo, 2006

    1. So Tiago Maior

    Na elaborao do conjunto escultrico do cenculo foi escolhida a imagem do So

    Tiago Maior por apresentar detalhes relativos tcnica construtiva mais evidentes.

    Esta imagem, assim como o conjunto, foi esculpida sem a utilizao de um modelo

    permitindo ao artista maior liberdade na sua criao.

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    Trata-se de uma imagem de roca, de vestir com articulaes nos braos, cabelos

    esculpidos e olhos de vidro. Em relao policromia, pouco pode-se falar pois a

    escultura se encontra com vrias camadas de repintura, sendo a ltima de pssima

    qualidade que acaba por prejudicar a leitura da obra encobrindo a qualidade da talha

    do artista.

    Assim como na imagem descrita anteriormente, nesta escultura Manuel faz uso de

    encaixes e detalhes construtivos peculiares que acabam por determinar uma

    caracterstica marcante em sua obra. Os ps so esculpidos na base e o furo de

    encaixe de duas ripas frontais esta localizado na parte interna da base,

    especificamente na altura dos tornozelos entalhados como se fossem as pernas da

    imagem, e no extremidades como normalmente so encontradas.

    1. So Manuel da Pacincia

    Escultura de vulto em madeira de talha inteira, encarnada, dourada e policromada,

    apresentando olhos de vidro. Apesar dela no ser uma imagem de vestir, esta foi

    escolhida por apresentar grande parte do corpo desnudo deixando a mostra toda

    anatomia trabalhada pelo artista. A partir dela foi possvel identificar algumas

    semelhanas comuns nas esculturas masculinas de vestir ou de corpo desnudo

    esculpidas pelo artista. Estas caractersticas sero apresentadas no tpico a seguir.

    CARACTERSTICAS COMUNS S IMAGENS

    Analisando a fisionomia das imagens selecionadas identificamos caractersticas

    recorrentes, como por exemplo a implantao dos bigodes nas laterais do sulco

    naso-labial e das barbas, que deixam o queixo a mostra, e nascem na altura dos

    lbulos inferiores das orelhas. Freqentemente, os policromadores tentam encobrirestas caractersticas, provavelmente por uma questo de gosto pessoal,

    aumentando o tamanho das barbas, levando sua implantao at o meio das

    orelhas, e bigodes unidos abaixo do nariz.

    Outra caracterstica na elaborao dos traos da face a composio do conjunto

    sobrancelhas e nariz em forma de Y. Estes se apresentam de forma bem marcada

    e se repetem em todas as esculturas localizadas at o momento o que nos leva a

    concluir que se trata de uma marca particular do artista. Outras caractersticas

    comuns em suas obras so a cintura bem marcada e a musculatura das costas onde

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    a linha da coluna forma um eixo de simetria entre a marcao do omoplata que

    forma um C espelhado. Os detalhes aqui relatados podem ser observados na

    Figura 8.

    Figura 8 - Detalhe dos elementos anatmicosFoto: Kleumanery Melo, 2006

    Na elaborao dos cabelos o artista parte de um ponto central no topo da cabea. A

    partir deste ponto os cabelos se desenvolvem em mechas em polvo, sendo

    arrematadas em suas extremidades por mechas maiores. Na escultura de So

    Manuel da Pacincia, nica do grupo selecionado que apresenta cabelos longos,

    este apresenta os cabelos batidos na nuca e sobre suas costas se desenvolvem

    quatro mechas em polvo.

    Figura 9 - Detalhe talha dos cabelos. Notar o ponto central.Foto: Kleumanery Melo, 2006

    Uma caracterstica que distingue Manuel da Silva Amorim dos demais escultores da

    poca o fato deste assinar suas obras. Entretanto, nas esculturas localizadas

    encontramos uma diversidade de formas de assinaturas na base que no permite

    afirmar que foram feitas realmente pelo artista. Assina ora como Amorim, com letra

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    Entre Territrios 20 a 25/09/2010 Cachoeira Bahia Brasil

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    de forma entalhada na parte inferior da base (conjunto do cenculo), ora assina com

    letra cursiva e de forma abreviada conforme assinatura encontrada na parte inferior

    da base do So Manoel da Pacincia. At o presente momento no encontramos

    documentaes onde conste a assinatura do artista permitindo uma comparao

    para identificar traos caractersticos de sua assinatura.

    Figura 10- Assinaturas nas bases das imagens.Foto: Kleumanery Melo, 2006

    CONSIDERAES FINAIS

    Esta pesquisa ainda est sendo desenvolvida e o que foi apresentado neste artigo

    apenas uma pequena parte de um estudo mais aprofundado sobre o trabalho deste

    artista. um trabalho que necessita de muita pesquisa e dedicao uma vez que as

    informaes encontram-se dispersas e acesso as imagens e informaes muito

    restrito e algumas imagens apresentam muitas repinturas e algumas intervenes

    que descaracterizam a tcnica original. Entretanto, salientamos a importncia deste

    estudo para registrar a importncia da imaginria pernambucana no cenrio artstico

    nacional do sculo XIX.

    REFERNCIAS

    SILVA, Leonardo Dantas. Pernambuco Preservado: Histrico dos Bens Tombados noestado de Pernambuco. 2 Ed. Recife: L. Dantas Silva editor, 2008.

    GINSBURG, Carlo. Morelli, Freud e Sherlock Holmes: Pistas e o mtodo cientfico. Traduode Francisco A. S. Grossi. In History workshop journal, n.9, 1980, p.4.

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    Entre Territrios 20 a 25/09/2010 Cachoeira Bahia Brasil

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    PIO, Fernando. Ordem Terceira de So Francisco do Recife. Ed. Universitria, 1960.

    SERCK-DEWAIDE,Myriam. Conservacin de esculturas policromadas. Curso terico Cecor.UFMG: Belo Horizonte, 1989.

    Conceio Linda de Frana

    Mestranda em Artes Visuais pela Universidade Federal de Minas Gerais com rea deconcentrao em Conservao de Obras de arte em Plstico. Especialista em Conservao- Restaurao de Bens Culturais formada pelo CECOR-UFMG. Atualmente conservadora-restauradora do Instituto Cultural Inhotim - Brumadinho MG. Tem experincia e publicaesnas reas de Conservao-Restaurao, Identificao de Materiais Polimricos, ArtesVisuais e Arte-educao.

    Kleumanery de Melo Barbosa

    Especializao em Conservao/Restaurao de Bens Culturais Moveis pela UniversidadeFederal de Minas Gerais, Brasil (2007) Mestranda em Artes Visuais pela UniversidadeFederal de Minas Gerais com rea de concentrao em Gerenciamento de Riscos.Atualmente desempenha atividades de assistncia a Professores do Curso de Conservao-restaurao em Bens Culturais da Universidade Federal de Minas Gerais.