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ELES USAMUMA ESTRATGIA
DE MEDOPROTEO DO DIREITOAO PROTESTO NO BRASIL
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Publicado originalmente em 2014 porAmnesty International LtdPeter Benenson House1 Easton StreetLondon WC1X 0DWUnited Kingdom
Amnesty International 2014
ndice: AMR 19/005/2014 Brazilian PortugueseIdioma original: InglsImpresso por Anistia InternacionalSecretariado Internacional, Reino Unido
Todos os direitos reservados. Esta publicao possuidireitos autorais, mas pode ser reproduzida livremente ,por quaisquer meios, para fns educacionais, de a tivismo
e de campanhas, no podendo ser comercializada.
Pede-se que tais usos sejam informados aos detentores dos
direitos para que sua divulgao possa ser acompanhada.Para a reproduo deste contedo em quaisquer outrascircunstncias, ou para sua reutilizao em outraspublicaes, bem como para traduo e adaptao,uma autorizao prvia e por escrito deve ser obtida doseditores, podendo haver a necessidade de algum pagamento.Para solicitar permisso ou para outras informaes ,contate-nos em: [email protected]
Foto da capa: Policiais militares durante manifestao emSo Paulo, 11 de junho de 2013. Desde junho de 2013,em vrias ocasies, a polcia militar usou fora excessi vapara responder aos protestos.Credito: Mdia Ninja
amnesty.org
A Anistia Internacional um movimento mundial com mais de 3 milhes de apoiadores,membros e ativistas, em mais de 150 pases e territrios, que fazem campanhas paraacabar com os mais graves abusos dos direitos humanos.
Nossa viso de que todas as pessoas desfrutem de todos direitos consagrados naDeclarao Universal dos Direitos Humanos e em outras normas internacionais dedireitos humanos. Somos independentes de quaisquer governos, ideologias polticas,interesses econmicos ou religies, sendo fnanciados, sobretudo, por nossosmembros e por doaes privadas.
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Eu tinha orgulho de participar dos protestos,mas quando fui preso, para mim acabou. Eles
usam uma estratgia de medo. No quero maispassar por isso. Tive crise de ansiedade e noconsegui arrumar emprego depois disso: oempregador pede antecedente criminal. Eu faziagrafite, mas agora parou. Tudo mudou.Humberto Caporalli, 24 anos, grafiteiro, enquadrado na Lei de Segurana Nacional aps participar de uma manifestao em So
Paulo, no dia 7 de outubro de 2013, por melhoras na educao.
INTRODUONas ltimas semanas, milhares de manifestantes saram s ruas no Brasil, enquanto o pas seprepara para receber a Copa do Mundo de futebol. Os protestos de agora ecoam as grandesmanifestaes do ano passado, quando os brasileiros expressaram sua insatisfao com o
aumento da tarifa do transporte, com os gastos para a Copa do Mundo e com a carncia deinvestimentos em servios pblicos. Os protestos de 2013, que comearam em So Paulo noms de junho, adquiriram uma dimenso sem precedentes, quando centenas de milhares depessoas participaram de extensas manifestaes em dezenas de cidades de todo o pas.
A reao da polcia onda de protestos de 2013 foi violenta e abusiva em muitas ocasies. Apolcia militar usou gs lacrimogneo de forma indiscriminada contra os manifestantes,inclusive dentro de um hospital, atirou com balas de borracha em indivduos que noapresentavam qualquer ameaa e espancou as pessoas com cassetetes. Centenas ficaram
feridas, entre elas um fotgrafo que perdeu um olho depois de ser atingido por uma bala deborracha. Outras centenas foram encurraladas e detidas, algumas com base em leis decombate ao crime organizado, sem a menor indicao de que estivessem envolvidas comatividades criminosas.
As deficincias que marcam a prtica policial, sobretudo a formao inadequada e a falta deprestao de contas, levantam srias preocupaes de que o direito de protestar sejagravemente comprometido durante a realizao do Mundial. O fato de o pas planejar contar,em algumas cidades, com as foras armadas, cujos antecedentes no cumprimento de funes
policiais so reprovveis, agrava essas preocupaes.
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Polcia militar encurrala manifestantes pacficos na escadaria da Cmara de Vereadores, na Cinelndia, Rio de Janeiro, 15 deoutubro de 2013. Depois disso, dezenas de pessoas que exerciam pacificamente seu direito de protestar foram detidas. LuizBaltar
Recentemente, deputados federais e estaduais comearam a propor leis mais severas que
conferem polcia e s autoridades judiciais maiores poderes para reprimir os protestos. Em
fevereiro de 2014, a morte acidental de um cinegrafista, causada por fogos de artifcio
disparados por um manifestante, ajudou a alimentar esse mpeto, enquanto as autoridades se
aproveitavam da controvrsia criada em torno da morte para pressionar por uma resposta
mais linha dura. Embora a grande maioria das pessoas que saiu s ruas no ltimo ano tenha
manifestado suas opinies de modo pacfico, ocorreram tambm alguns episdios de
violncia por parte de certos grupos e indivduos que destruram bens, provocaram incndios,
impediram o trnsito e entraram em choque com a polcia.
Atualmente, tramitam no Congresso Nacional diversas propostas legislativas que podero ser
usadas para restringir o direito de protestar. Entre estas, um novo projeto de lei antiterrorista
que contm uma definio de terrorismo to ampla que, entre outras coisas, incluiria em seu
escopo o dano propriedade ou a servios essenciais, causando temores de que possa ser
usado de modo indevido contra manifestantes. Uma srie de outras propostas visam
diretamente a realizao de protestos, inclusive proibindo o uso de mscaras durante
manifestaes e requerendo que os organizadores notifiquem as autoridades com
antecedncia sobre a realizao desses eventos. Por que essa legislao seria necessria,
contudo, no est claro. O Brasil j conta com diversos instrumentos jurdicos para responderao vandalismo e aos comportamentos violentos. O acrscimo de novas leis com tamanha
abrangncia no serve aos direitos individuais nem aos interesses da sociedade brasileira
com um todo.
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A Anistia Internacional entrevistou manifestantes, advogados, jornalistas e defensores dos
direitos humanos sobre os protestos que tm acontecido no ltimo ano no Brasil. Tambm
verificamos gravaes em vdeo, examinamos registros da polcia e analisamos documentos
governamentais. Nosso trabalho de acompanhamento da reao policial s manifestaes
pblicas faz parte de uma iniciativa mais ampla e de longo prazo que visa a monitorar as
prticas policiais no Brasil.
Durante a Copa, a ateno do mundo estar voltada para o Brasil. Os brasileiros que se
sentem insatisfeitos com o desempenho de seu governo em termos de mudanas sociais e
diminuio das desigualdades podem considerar que esta seja uma boa oportunidade de sair
s ruas. Para a Anistia Internacional, a Copa do Mundo ser um momento crucial para testar
se a polcia e outras autoridades pblicas do Brasil realmente entendem e levam a srio sua
obrigao de respeitar o direito liberdade de expresso e de reunio pacfica. Como Estado-
parte do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos, ratificado em 1992, o Brasil
deve garantir que indivduos e grupos sejam capazes de participar livremente de
manifestaes pblicas.
Manifestantes fogem depois que a polcia militar fez uso indiscriminado de gs lacrimogneo durante um protesto em So Paulo,13 de junho de 2013. Mdia Ninja
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USO EXCESSIVO DA FORANo ltimo ano, centenas de manifestantes foram agredidos enquanto participavam de
manifestaes pblicas no Rio de Janeiro e em So Paulo, quase sempre pela polcia militar.Informaes abundantes fornecidas por participantes e testemunhas das manifestaes
indicam que a polcia usou fora excessiva para responder aos protestos, inclusive armas
"menos letais", principalmente gs lacrimogneo, spray de pimenta, bombas de efeito moral e
balas de plstico ou borracha1.
Em pelo menos um protesto, no Rio de Janeiro em 17 de junho de 2013, h indcios
confiveis de que a polcia usou armas de fogo para dispersar os manifestantes.
Devido a uma formao precria2e falta de regulamentao3, os policiais brasileiros svezes utilizam armas "menos letais" de modo imprprio. Por exemplo, em pelo menos trs
ocasies, em junho e julho de 2013 no Rio de Janeiro, a polcia usou gs lacrimogneo
contra manifestantes em locais fechados, como hospitais, estaes de metr e restaurantes.Zoel Salim, diretor da Casa de Sade Pinheiro Machado, no Rio de Janeiro, relatou Anistia
Internacional um desses incidentes, ocorrido no dia 11 de julho de 2013. Ele contou que os
policiais militares "atiraram bombas de gs no corredor da emergncia do hospital", fazendo
que o gs "se espalhasse por todo o hospital".
Policial militar lana spray de pimenta contra manifestantes em So Paulo, 13 de junho de 2013. Mdia Ninja
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As normas internacionais de direitos humanos de cumprimento obrigatrio pelo Brasil
requerem que o governo respeite o direito liberdade de expresso e de reunio, e que
responda de modo proporcional a qualquer comportamento ilegal durante manifestaes. As
normas internacionais que governam o uso da fora e de armas de fogo determinam
explicitamente, entre outras coisas, que os policiais e outros agentes responsveis pela
aplicao da lei somente podero usar a fora quando estritamente necessrio e na medida
exigida para o desempenho de suas funes4. Antes de recorrer ao uso da fora, esses
funcionrios devero empregar, tanto quanto possvel, meios no violentos. Caso o uso da
fora seja inevitvel, eles devero us-la de modo contido. Ademais, no devero usar armas
de fogo contra pessoas a menos que seja em legtima defesa ou na defesa de outras pessoas
contra ameaa iminente de morte ou leso grave.
Em vista de um histrico reprovvel das foras militares no desempenho de funes policiais,
as preocupaes da Anistia Internacional sobre o uso excessivo da fora so exacerbadas
pelas informaes de que o efetivo militar ser usado nas cidades brasileiras que sediaro os
jogos da Copa. Deve-se enfatizar que foras militares no cumprimento de funes de
aplicao da lei devem acatar as mesmas normas jurdicas internacionais que a fora policial
regular, devendo sujeitar-se aos mesmos mecanismos de prestao de contas.
Acima:Jornalista ferido por bala de borracha disparada
pela polcia militar durante protesto no Rio de Janeiro, 11
de julho de 2013. Luiz Baltar/Imagens do Povo
Acima direita: Manifestante ferido durante protesto em
So Paulo, 20 de junho de 2013. Mdia Ninja
Direita: Mulher ferida por bala de borracha disparada
pela polcia militar durante protesto em So Paulo, 20 de
junho de 2013. Mdia Ninja
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"Eles usam uma estratgia de medo": Proteo do direito ao protesto no Brasil
Anistia Internacional, junho de 2014 ndice: AMR 19/005/2014
O fotgrafo Srgio Andrade da Silva perdeu um olho aps ser atingido por uma bala de borracha, disparada pela polcia militardurante uma manifestao em So Paulo, 13 de junho de 2013. Srgio Andrade da Silva
SRGIO ANDRADE DA SILVA, FOTGRAFO, SO PAULOSrgio da Silva, 32 anos, fotgrafo profissional. No dia 13 de junho de 2013, el e participou de umamanifestao em So Paulo contra o aumento das passagens de nibus. De acordo com testemunhas ocularese com gravaes em vdeo verificadas pela Anistia Internacional, a polcia usou fora excessiva pararesponder ao protesto.
Naquela noite, policiais militares bloquearam uma avenida por onde os manifestantes planejavam passar.Srgio da Silva cobria os protestos nesse local. Posteriormente, ele contou Anistia Internacional que nopresenciou qualquer sinal de violncia por parte dos manifestantes. Descrevendo a ao da polcia como umataque, Srgio relatou que os policiais simplesmente comearam a jogar gs lacrimogneo e bombas de
efeito moral, e a atirar com balas de borracha em todas as direes. Para ele, pareceu ser um esforopremeditado e organizado para impedir a marcha de prosseguir. Srgio tambm disse Anistia Internacional
que os policiais atiravam contra transeuntes e reprteres, no apenas contra os manifestantes.
Assim que os policiais comearam a atirar , ele foi atingido no olho esquerdo por uma bala de borracha.Segundo contou Anistia, a dor que sentiu foi indescritvel. Eu senti um impacto, uma dor terrvel no olho
esquerdo, que ficou inchado na hora, o sangue escorrendo.
Uma pessoa que assistia a cena levou-o a um hospital pblico. Apesar de uma cirurgia na mesma noite, eleperdeu o olho, que teve de ser substitudo por uma prtese.
Srgio da Silva, casado e pai de dois filhos, passou trs meses sem poder trabalhar. A perda da visocomprometeu sua capacidade de fotografar, uma vez que, agora, ele tem grande dificuldade para avaliarprofundidade de campo, foco e luminosidade. Tambm ficou difcil se locomover pela cidade, principalmenteatravessar ruas e usar o transporte pblico.
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Srgio da Silva jamais recebeu qualquer explicao ou pedido de desculpa oficial, nem oferta de compensaopor parte das autoridades. Ele e sua famlia tiveram que arcar com todas as despesas mdicas. Srgioorganizou pessoalmente uma petio e coletou 45 mil assinaturas para pedir o fim do uso de balas deborracha. Tambm ingressou com uma ao civil por danos contra o Estado de So Paulo.
As autoridades falam sobre as investigaes do que eles chamam de excessos da polcia durante os
protestos, mas no tornaram pblicos os resultados dessas investigaes, afirmou. O silncio do Estado emresposta ao que aconteceu uma segunda forma de violncia.
GIULIANA VALLONE, REPRTER, SO PAULOGiuliana Vallone, 27 anos, reprter de um importante jornal de So Paulo. Ela estava entre os muitosjornalistas que cobriam os protestos no centro da capital no dia 13 de junho de 2013, quando foi atingida noolho por uma bala de borracha. Ela afirma que o policial responsvel pelo disparo a viu, mirou a arma e atiroucontra ela a uma distncia de 20m.
Eu no estava protestando, contou Giuliana Anistia Internacional. No tinha manifestante confrontando
a polcia na rua. Ele simplesmente apontou a arma para mim e disparou. No momento em que foi ferida,
Giuliana havia parado para ajudar um transeunte que estava perdido. Ela no estava filmando nem tirandofotografias. Eu vi ele mirando em mim, mas eu jamais achei que ele fosse atirar... Voc no imagina que um
cara fardado, com uma arma, vai atirar na sua cara.
Os mdicos disseram que foi um milagre Giuliana no ter perdido a viso naquele olho, e que os culos queela usava provavelmente a protegeram.
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No dia 25 de janeiro de 2014, policiais militares invadiram a recepo de um hotel em So Paulo, onde manifestantes haviam
buscado abrigo. Eles lanaram bombas de gs lacrimogneo e agrediram os manifestantes com cassetetes, deixando muitos deles
feridos. Yan Boechat
VINICIUS DUARTE, ESTUDANTE, SO PAULOVinicius Duarte, 27 anos, msico e estudante universitrio, foi brutalmente espancado por policiais militaresdurante uma manifestao em So Paulo no dia 25 de janeiro de 2014. Ele ficou gravemente ferido, teve amandbula e o nariz quebrados e perdeu quatro dentes depois que dois policiais militares o golpearam
diversas vezes com os cassetetes.
Vincius contou Anistia Internacional que, aps alguns manifestantes agirem de modo violento, a polciatentou dispersar a manifestao usando gs lacrimogneo e agredindo as pessoas. Junto com um grupo demanifestantes, Vincius entrou na recepo de um hotel nas proximidades para tentar se proteger do gslacrimogneo. Conforme relatou Anistia Internacional: Os policiais jogaram bombas a esmo e, de repente, a
rua ficou empesteada e ningum conseguia respirar. No desespero, pra conseguir respirar um pouco, algumaspessoas pediram pra entrar no hotel e os funcionrios nos receberam numa boa. L, ns comeamos asocorrer uns aos outros. Tinha gente passando mal por causa do gs e quem no estava ocupado socorrendoalgum estava sendo socorrido.
Vincius afirma que os policiais cercaram o hotel e ento adentraram. Contou que eles no tentaram negociar
com os manifestantes, mas invadiram o hotel de modo violento, batendo com os cassetetes nas pessoas eatirando com balas de borracha, inclusive em quem estava deitado no cho.
Vincius disse que tentou conversar com os policiais, pedindo que tivessem calma. Foi nessa hora que doispoliciais o atacaram. Eu gesticulei com a mo pedindo calma. Quando eu fiz isso, dois policiais vieram pracima de mim e comearam a me bater com vrios golpes de cassetete. Teve uma hora que tomei um golpe na
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cabea que me fez cair no cho, e eles continuaram a me bater. Mesmo eu cado no cho sem poder medefender, eles continuaram batendo e batiam mais, e nisso eu perdi muito sangue, perdi dentes.
Vincius sofreu vrias leses, mas no recebeu atendimento mdico por mais de duas horas. Havia mdicosvoluntrios participando da manifestao para prestar atendimento imediato, mas Vincius diz que ospoliciais no permitiram que ele fosse atendido. Depois de muito tempo, finalmente ele foi levado a umhospital.
A polcia abriu um inqurito contra Vincius por resistncia e leses corporais. Ele moveu uma ao contra ospoliciais que afirma o terem agredido. A Anistia Internacional no tem conhecimento do resultado dasinvestigaes.
Manifestantes dispersam depois de a polcia militar usar gs lacrimogneo de forma indiscriminada durante um protesto em SoPaulo, 6 de junho de 2013. Mdia Ninja
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PRISES ARBITRRIAS, NEGAO DE
ACESSO A ASSISTNCIA LEGAL E MAUUSO DE LEIS AMPLASDesde meados de 2013, centenas de pessoas foram presas e interrogadas no
contexto dos protestos. Na grande maioria dos casos, os manifestantes foram soltos sem que
fossem acusados formalmente, algumas vezes depois de investigaes da polcia civil
conclurem que as acusaes contra eles eram infundadas. At o momento, sabe-se de
apenas um indivduo que foi condenado por delito relativo a comportamento criminoso
durante os protestos, sendo que a acusao contra ele questionvel.
Em contraveno s leis brasileiras e s normas internacionais, a polcia militar prendeu
manifestantes mesmo sem evidncia de que estivessem envolvidos em atividades criminosas,
levando-os a delegacias de polcia e detendo-os temporariamente para interrogatrio e
verificao de antecedentes criminais.5O simples ato de carregar bandeiras, cartazes, tinta
ou vinagre (usado para atenuar os efeitos do gs lacrimogneo) era suficiente para que as
pessoas fossem detidas para interrogatrio. Embora muitas tenham sido soltas em pouco
tempo, seus dados e informaes pessoais permaneceram com a polcia, fazendo que os
manifestantes e seus advogados temam que possam vir a ser investigados futuramente.
Policiais detm manifestante em So Paulo, 18 de junho de 2013. Desde junho de 2013, em vrias ocasies, a polcia militardeteve manifestantes pacficos em So Paulo. Mdia Ninja
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Outro motivo de preocupao o uso imprprio de leis penais severas contra os
manifestantes. Indivduos que participaram de protestos foram presos com base na Lei sobre
Organizaes Criminosas (Lei N 12.850, de 2 de agosto de 2013), uma lei que tem como
alvo o crime organizado. Pessoas que nunca antes haviam se encontrado, mas que foram
detidas na mesma manifestao, de modo imprprio, passaram a ser investigadas
formalmente com base nessa lei, por supostamente integrarem uma organizao criminosa.
De modo semelhante, a Anistia Internacional tem conhecimento de pelo menos dois
manifestantes que foram investigados com base na Lei de Segurana Nacional (Lei N 7.170,
de 14 de dezembro de 1983), uma lei que tambm visa ao crime organizado, formulada na
poca em que o pas ainda estava sob regime militar.6
Tambm causa preocupao o fato de vrios manifestantes terem sido investigados pelo
crime de desacato a autoridade por afirmaes ou comentrios que fizeram polcia. Em
caso de condenao por esse delito, a pessoa est sujeita a uma pena de seis meses a at
dois anos de priso. Segundo informaes, at mesmo advogados foram presos com base
nessa lei embora no tenham sido objeto de investigao formal depois de serem
interrogados pela polcia sobre os motivos da deteno dos manifestantes. De modo geral,
leis de desacato a autoridadeso incompatveis com o direito liberdade de expresso.7
Advogados de So Paulo e do Rio de Janeiro relataram aos pesquisadores da Anistia
Internacional que, ao comparecerem s delegacias de polcia, tiveram seu acesso aos
manifestantes negado em diversas ocasies. Eles contaram ainda que alguns manifestantes
detidos foram proibidos de entrar em contato com advogados e familiares por vrias horas
depois de presos. Os advogados tambm relataram Anistia Internacional que sofreram
interferncia em seu trabalho nas delegacias de polcia, ao tentarem atuar em favor de
manifestantes presos nas manifestaes.Daniel Biral, integrante de um grupo de advogadosvoluntrios de So Paulo que oferece assistncia jurdica gratuita a pessoas detidas durante
as manifestaes, afirma ter sido ameaado por um policial militar durante um protesto. Em
outra ocasio, aps visitar um manifestante hospitalizado em So Paulo, em 27 de janeiro de
2014, ele foi advertido por um indivduo armado e no identificado para que parasse derepresentar manifestantes. Segundo afirmou, o homem disse: Abandone o caso; a polcia
est certa. No mexa nesse caso. Os loucos esto a solta e com a autorizao do Estado, e
voc sabe que os loucos atiram.
HUMBERTO CAPORALLI,
ARTISTA PLSTICO E GRAFITEIRO, SOPAULOHumberto Caporalli, 24 anos, participou de uma manifestao por melhoras na educao, organizada emapoio aos professores grevistas do Rio de Janeiro , no dia 7 de outubro de 2013, em So Paulo. Quando a
manifestao terminou, ele foi preso e enquadrado na Lei de Segurana Nacional (Lei 7.170/1983).
Durante o protesto, quando manifestantes e policiais entraram em choque no centro de So Paulo e umaviatura da polcia foi depredada, ele tirava fotografias. Quando a manifestao terminou, Humberto e umaamiga se dirigiram a um bar nas proximidades. Ao sarem do bar, uma pessoa que Humberto acredita ser umpolicial paisana abordou-os e comeou a fazer perguntas. Em seguida, policiais civis armados se
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aproximaram em um carro e perguntaram o que eles estavam fazendo. Quando disseram ter estado namanifestao, os dois foram presos e levados a uma delegacia de polcia perto dali.
Na chegada, Humberto foi fotografado pelos jornalistas, que depois produziram matrias sobre a priso.Dentro da delegacia, os policiais o pressionaram para que fornecesse a senha de sua conta no Facebook.Humberto passou dois dias detido at que um juiz lhe concedesse liberdade provisria. Sua cabea foiraspada e, devido superlotao na priso, ele tinha que alternar com outros detentos os turnos para sentar,deitar e dormir.
Humberto foi indiciado com base no artigo 15 da Lei de Segurana Nacional por praticar sabotagem contrainstalaes militares, meios de comunicaes, meios e vias de transporte, estaleiros, portos, aeroportos,fbricas, usinas, barragem, depsitos e outras instalaes congneres, crime que prev pena de at 10 anosde priso para quem o pratica. Tambm foi acusado por dano qualificado ao patrimnio pblico, incitao aocrime, associao criminosa, porte ilegal de arma de fogo de uso restrito e crime de pichao. A soma totaldas penas mximas para todos os crimes de 23 anos e meio de priso.
O boletim de ocorrncia com as acusaes contra Humberto inclua somente evidncias circunstanciais parajustificar seu indiciamento. O documento afirmava que os seguintes itens foram encontrados em sua mochila:quatro latas de spray de tinta, uma bomba de gs lacrimogneo usada, uma cmara e um documento tipo
manifesto em poesia com conotao de protesto. Com base nas informaes obtidas pela polcia a partir da
conta pessoal de Humberto no Facebook, o boletim afirmava ainda que ele havia curtidouma pgina dogrupo (anarquista) black bloc. Por fim, o documento afirmava que ele se vestia como reza a missa desta
organizao, de preto.
Segundo relatou Anistia Internacional, Humberto Caporal li artista plstico e havia recolhido a cpsulausada de bomba de gs lacrimogneo, que fora lanada pela polcia, para us-la em uma instalaoartstica.
Seu caso faz parte de um inqurito mais amplo da polcia civil de So Paulo sobre o black bloc(investigao
N 01/2013, de 9 de outubro de 2013). Segundo informaes, cerca de 300 pessoas j foram investigadas combase no inqurito. Destas, 40 foram convocadas a prestar depoimento no sbado, 22 de fevereiro de 2014,mesmo dia e horrio em que ocorria uma segunda grande manifestao contra a Copa do Mundo.Normalmente, a polcia civil no toma depoimentos aos sbados.
Temeroso dessa experincia e da ampla cobertura que sua priso recebeu da mdia, Humberto Caporalli deixouSo Paulo assim que foi posto em liberdade. Ele contou Anistia Internacional que no participa mais deprotestos. Eu tinha orgulho de participar dos protestos, mas quando fui preso, para mim acabou. Eles usam
uma estratgia de medo. No quero mais passar por isso. Tive crise de ansiedade e no consegui arrumaremprego depois disso: o empregador pede antecedente criminal. Eu fazia grafite, mas agora parou. Tudomudou.
Humberto no tem informaes de como o processo contra ele est se encaminhando.
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Em 20 de junho de 2013, Rafael Braga Vieira foi detido aps uma manifestao no Rio de Janeiro e sentenciado a cinco anos de
priso. Ele foi acusado de porte ilegal de explosivos, mas afirma que levava produtos de limpeza. Renata Neder
RAFAEL BRAGA VIEIRA, RIO DE JANEIROAt 23 de maio de 2014, s se sabia de uma nica pessoa que tivesse sido julgada e condenada por um crimerelacionado aos protestos. Essa pessoa Rafael Braga Vieira, 25 anos, negro e sem teto.
A deteno de Rafael aconteceu aps uma das maiores manifestaes da histria do Rio de Janeiro, em 20 de
junho de 2013. Centenas de milhares de pessoas saram s ruas para participar do protesto, mas Rafaelafirma que no foi esse o seu caso. A manifestao, que terminou em choques com a polcia, aconteceu nocentro comercial da cidade; porm, depois que foi dispersada, milhares de pessoas caminharam longasdistncias at chegar em casa. Algumas se dirigiram para o bairro da Lapa, onde Rafael passava as noitesem uma casa abandonada.
Ele contou Anistia Internacional que estava saindo da casa para encontrar sua tia quando um grupo deaproximadamente 10 policiais o abordou. Rafael afirma que carregava duas garrafas de produtos de limpezaque ele havia encontrado e que planejava levar para sua tia. Segundo relatou:
Eles me chamaram Vem c, moleque, A, neguinho... , moleque... J chegaram meagredindo. Elesperguntaram: Oque voc tem a? Ah, cara, voc t com coquetel molotov? Voc t ferrado, neguinho.
Respondi que no era isso, eu nem sabia o que era coquetel molotov. Me agrediram l dentro da delegacia, noestacionamento.
Rafael Braga Vieira foi processado pelo delito de possuir artefato explosivo ou incendirio sem autorizao.
Em dezembro de 2013, foi condenado e sentenciado a cinco anos de priso. O laudo pericial do caso concluiuque os produtos qumicos que ele portava no poderiam ser usados como explosivos, mas o tribunaldesconsiderou essa constatao em seu veredicto.
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"Eles usam uma estratgia de medo": Proteo do direito ao protesto no Brasil
Anistia Internacional, junho de 2014 ndice: AMR 19/005/2014
FALTA DE RESPONSABILIZAO PELA
VIOLNCIA POLICIALA Anistia Internacional preocupa-se com a aparente falta de vontade em fazer que ospoliciais prestem contas do comportamento abusivo que tiveram durante as manifestaes.
Embora algumas autoridades locais, como as de So Paulo, tenham anunciado que fariam
investigaes internas sobre as denncias de violncia policial durante os protestos, os
resultados dessas investigaes no foram divulgados at agora. Concretamente, no se tem
conhecimento de que algum policial tenha sido submetido a procedimentos penais ou
disciplinares.
Um dos obstculos para a responsabilizao dos agentes do Estado a dificuldade em
identificar individualmente os policiais. As vtimas do excesso de fora da polcia durante as
manifestaes relataram Anistia Internacional que no conseguiam identificar os policiaisresponsveis pelos abusos. Isso acontece principalmente com a tropa de choque, cujos
equipamentos protetores geralmente encobrem as tarjas de identificao. Em outros casos,
os policiais parecem no usar qualquer forma de identificao.
Polcia militar durante um protesto em So Paulo, 20 de junho de 2013. Mdia Ninja
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PROPOSTAS DE LEGISLAO PENALDiversas propostas esto sendo discutidas no Congresso Nacional para emendar ou criar leis
penais que podero comprometer o direito liberdade de expresso e de reunio. Dentreestas, uma nova lei de combate ao terrorismo e uma srie de outras leis que visam
diretamente as manifestaes, tanto proibindo o uso de mscaras quanto criando a exigncia
de notificao prvia.
Muitas dessas propostas foram redigidas s pressas, no calor de manifestaes marcadas
pela violncia, com a inteno de que fossem aprovadas e vigorassem ainda antes da Copa do
Mundo. Em uma atitude positiva, o governo afirmou recentemente que no apoia a
tramitao emergencial desses projetos de lei no Congresso, o que parece tornar improvvel
que sejam votados antes do incio do Mundial em junho de 2014. Ainda assim, esses
projetos continuam tramitando no Congresso e podero ser aprovados a qualquer momento.
PROJETOS DE LEI ANTITERRORISMODois projetos em tramitao no Senado, conhecidos como PLS 499/2013 e PLS 44/2014,
tipificariam o crime de terrorismo no direito brasileiro8. Equivocadamente, a definio de
terrorismo que consta nos projetos de lei vaga e significativamente mais ampla do que a
definio recomendada pelo relator especial da ONU sobre direitos humanos e a luta contra o
terrorismo9. Tal definio abrange no apenas os crimes de violncia, mas tambm os crimes
contra a propriedade, suscitando temores de que possa ser usada para processar
manifestantes por atos de vandalismo ou outros danos a bens.
Um aspecto positivo seria que uma das propostas (PLS 44/2014) contm uma clusula de
exceo afirmando que a lei no se aplicaria, entre outras coisas, a manifestantes com
motivaes sociais relativas defesa de direitos humanos ou constitucionais. Essa clusula,
contudo, no suficiente para justificar a aprovao de uma lei que permanece demasiadoampla.
No momento em que este documento foi escrito, nenhuma das propostas havia sido votada.
PROJETOS DE LEI SOBRE MANIFESTAES PBLICAS
A Cmara dos Deputados tambm est discutindo uma srie de propostas que tratam
diretamente de manifestaes, muitas delas apresentadas recentemente. As propostas
encontram-se atualmente com o relator, deputado Efraim Filho, que publicar um relatrio
avaliando os mritos dos diferentes projetos de lei.
Alguns deles, formulados com a inteno de lidar com os chamados grupos "black bloc",estabeleceriam a proibio do uso de mscaras durante manifestaes. Na medida em que
tais propostas probam o uso de mscaras inclusive com propsitos expressivos, e no
simplesmente as mscaras usadas com a inteno de impedir a identificao dos
manifestantes, elas podero comprometer o direito liberdade de expresso.10
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Outras propostas requereriam que os manifestantes notificassem as autoridades com
antecedncia sobre a realizao de qualquer manifestao. Embora a Anistia Internacional
considere aceitvel que os Estados requeiram ser comunicados previamente sobre
aglomeraes e manifestaes, a fim de que tomem medidas para proteger a segurana e a
ordem pblicas, ou para proteger o direito de outros, a realizao de manifestaes no
deveria estar submetida permisso das autoridades governamentais. Exigncias de
notificao prvia deveriam incluir clusulas de exceo para as aglomeraes espontneas.
Os procedimentos, o formato e os meios requeridos para apresentar a notificao no devem
ser demasiado difceis de cumprir.
Caso os organizadores no comuniquem s autoridades, a reunio no deveria ser dissolvida
automaticamente e os organizadores no deveriam ser submetidos a procedimentos penais ou
administrativos que resultem em multas ou priso.11A pena de at trs anos de recluso pelo
no cumprimento da exigncia de notificao com 48 horas de antecedncia, prevista em um
dos projetos de lei, seria incompatvel com os direitos liberdade de expresso e de reunio.
Polcia militar faz uso indiscriminado de gs lacrimogneo para dispersar manifestantes no Rio de Janeiro, 7 de setembro de 2013. Luiz Baltar
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CONCLUSES E RECOMENDAESComo membro do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Brasil recentemente votou a
favor de uma importante resoluo que o Conselho adotou para proteger os direitos humanosdurante manifestaes pacficas.12A resoluo no apenas exorta os Estados a possibilitarem
que indivduos e grupos exeram seu direito liberdade de reunio, de expresso e de
associao durante manifestaes pacficas, como tambm expressa preocupao com a
instaurao de processos penais contra indivduos e grupos que participem dos protestos.
O Brasil tomou uma atitude acertada ao votar a favor da resoluo, mas agora o pas precisa
dar um passo adiante. Para que o apoio manifestado pelo Brasil aos direitos liberdade de
expresso e de manifestao pacfica seja realmente verdadeiro, esses direitos precisam ser
protegidos dentro de sua prpria casa. Sendo assim, a Anistia Internacional exorta as
autoridades brasileiras a garantirem que as leis e prticas do pas no mbito domstico
estejam plenamente de acordo com suas obrigaes legais no mbito internacional. Com esse
propsito, a Anistia Internacional faz as seguintes recomendaes:
USO DE FORA EXCESSIVA PELAS FORAS DE SEGURANA
A polcia e outras foras de segurana devem procurar evitar a violncia em
manifestaes pblicas, comunicando-se com seus organizadores antes dos eventos edurante sua realizao.
A polcia e outras foras de segurana devem aplicar meios no violentos antes de
recorrer ao uso da fora.
Se uma manifestao pblica mostrar-se violenta e o uso da fora tornar-senecessrio, por exemplo, para proteger seus participantes ou os transeuntes, a polcia e
outras foras de segurana devero limitar o uso dessa fora ao mnimo necessrio.
A polcia e outras foras de segurana devem permitir que jornalistas, inclusive
indivduos que fotografam e gravam em vdeo, trabalhem livremente e sem interferncias.
Armas menos letais, como balas de plstico e de borracha, devem ser usadasapenas quando estritamente necessrio, quando seu uso for proporcional ameaa que seapresenta e quando outros meios no violentos forem insuficientes. Essas armas devem serusadas somente por agentes que receberam treinamento integral sobre seu uso apropriado.
As autoridades brasileiras em nvel federal e estadual devem assegurar que as
polcias civil e militar, bem como outras foras de segurana, recebam treinamento adequadoe efetivo para o policiamento de manifestaes pblicas, inclusive as de grandes dimenses.
As foras de segurana devem, principalmente, receber treinamento sobre o uso apropriadode armas menos letaise sobre as normas internacionais relativas ao uso da fora.
As autoridades brasileiras em nvel federal e estadual devem criar regulamentos parao uso de armas menos letaisque sejam compatveis com as normas internacionais relativasaos direitos humanos e aplicao da lei.
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PRISES, DETENES E PROCESSOS ENVOLVENDO MANIFESTANTES PACFICOS
As autoridades brasileiras devem assegurar que as pessoas no sejam detidas ou
processadas criminalmente apenas por exercerem seu direito de participar de manifestaes
pblicas.
Infraes menos graves da lei, como colar cartazes em local proibido, jogar lixo no
cho e causar danos leves propriedade, cometidas por um indivduo ou por um grupo depessoas, podem resultar em investigao e posterior responsabilizao individual. Noentanto, pela importncia do direito liberdade de manifestao, esses atos no deveriammotivar a deciso de dispersar uma aglomerao, nem de impedir as pessoas que protestam
pacificamente de exercer seus direitos, tampouco de deter ilegalmente quem estprotestando de modo pacfico.
As autoridades brasileiras devem assegurar que as pessoas detidas durante osprotestos tenham pleno acesso a aconselhamento e assistncia legal, que os advogados
tenham acesso s pessoas detidas e que possam desempenhar suas funes profissionaissem intimidaes, obstrues, hostilidades ou interferncias imprprias.
PRESTAO DE CONTAS
As autoridades brasileiras em nvel nacional e estadual devem estabelecer e pr emprtica mecanismos de prestao de contas claros, eficazes e pblicos para investigar
denncias de violaes cometidas por todas as foras de segurana responsveis pelopoliciamento, antes e durante a Copa do Mundo. Devem ainda garantir que os responsveis
por violaes de direitos humanos sejam submetidos aos procedimentos disciplinares epenais apropriados.
Qualquer incidente em que o uso da fora pelos agentes da lei resulte em ferimentoou morte, inclusive durante manifestaes pblicas, deve ser investigado exaustivamente,com a possibilidade de as autoridades competentes tomarem as medidas administrativas ou
penais apropriadas.
Denncias contra a polcia devem ser investigadas de modo efetivo e imparcial. Seagentes da lei cometerem violaes de direitos humanos, eles devem submeter-se a
procedimentos disciplinares e penais.
A polcia e outras foras de segurana, inclusive militares, responsveis pelo
policiamento antes e durante a Copa do Mundo devem possibilitar a identificao individualde seus membros nas operaes de manuteno da ordem pblica, por meio de crachs
visveis contendo seu nome ou nmero. Equipamentos de proteo no devem ser usados deforma que oculte a identificao individual dos policiais.
PROPOSTAS DE LEGISLAO CRIMINAL E OUTRAS APLICVEIS A SITUAES DE PROTESTO
O Congresso brasileiro deve rejeitar os projetos de lei antiterrorismo PLS 499/2013e PLS 44/2014.
O Congresso Brasileiro deve tomar especial cuidado ao apreciar projetos de lei
relativos a manifestaes pblicas, no devendo aprovar qualquer legislao que possainfringir ou ameaar o direito liberdade de expresso ou o direito de manifestao pacfica.
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Policiais militares confrontam manifestantes durante um protesto na Avenida Presidente Vargas, Rio de Janeiro, junho de 2013.Luiz Baltar
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NOTAS FINAIS
1A Anistia Internacional utiliza o termo "menos letal" para se referir s armas que no so defogo, uma vez que as evidncias mostram que muitas dessas armas so potencialmenteletais. Dispositivos usados para o controle de distrbios, como canhes de gua, munio deimpacto (projteis ou balas de plstico ou de borracha), irritantes qumicos como spray de
pimenta e gs lacrimogneo, podem causar leses graves e at a morte.
2Um estudo de 2014 da Fundao Getlio Vargas (FGV) constatou que mais de 60% dospoliciais consideravam no ter recebido treinamento adequado nem estar bem preparadospara atuar em grandes manifestaes. "A polcia e os 'black blocs': a percepo dos policiaissobre junho de 2013". Relatrio preliminar. Rio de Janeiro: Fundao Getlio Vargas, 2014.
3Atualmente, no existe no Brasil uma norma regulamentadora para o uso de armas "menosletais", apesar da ampla utilizao dessas armas no pas.
4
Dentre as normas pertinentes esto o Cdigo de Conduta da ONU para os FuncionriosResponsveis pela Aplicao da Lei e os Princpios Bsicos da ONU sobre a Utilizao daFora e de Armas de Fogo pelos Funcionrios Responsveis pela Aplicao da Lei.
5O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos probe as prises e detenesarbitrrias e requer que a polcia tenha uma suspeita razovel de que a pessoa presa sejaculpada de um crime. Para ter suspeita razovel da culpa de uma pessoa, a polcia devedispor de fatos ou informaes que convenam um observador independente de que a pessoa
em questo possa ter cometido o delito. Veja a Publicao das Naes Unidas, de 2003,Human Rights in the Administration of Justice: A Manual on Human Rights for Judges,Prosecutors and Lawyers, p.174.
6A lei tem por finalidade cobrir os crimes polticos e sociais contra a segurana nacional.Muitos juristas j a criticaram por consider-la inconstitucional de acordo com a Constituiodemocrtica de 1988.
7Veja, da Comisso Interamericana de Direitos Humanos (1995): Relatrio sobre aCompatibilidade entre as Leis de Desacato e a Conveno Americana sobre Direitos
Humanos, OAS/Ser L/VIII.88, Doc.9 rev, pp.210-223.
8A sigla PLS designa um "Projeto de Lei do Senado" e se refere a projetos de lei que forampropostos no Senado. De modo similar, a sigla PL designa um "Projeto de Lei" e se refere a
projetos de lei que foram propostos na Cmara dos Deputados. Para serem aprovados, osprojetos de lei devem ser votados tanto na Cmara quanto no Senado. Dependendo da casalegislativa onde foram propostos, seguiro diferentes tramitaes at sua aprovao final.
9Relatrio do relator especial sobre a Promoo e a Proteo dos Direitos Humanos eLiberdades Fundamentais na Luta contra o Terrorismo, UN Doc. A/HRC/16/51, 22 dedezembro de 2010, par. 28.
10
Veja, por exemplo, o documento de 2010 da Organizao para a Cooperao e a Seguranana Europa, Guidelines on Freedom of Peaceful Assembly, Second Edition, par. 98.
11Veja o relatrio do relator especial da ONU sobre os direitos liberdade de reunio pacficae de associao, UN Doc. A/HRC/20/27, 21 de maio de 2012, par. 29.
12Conselho de Direitos Humanos da ONU, resoluo 25/38 relativa promoo e proteodos direitos humanos no contexto de protestos pacficos, UN Doc. A/HRC/25/L.20, 28 demaro de 2014.
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NOS CONFLITOS DE MAIOR VISIBILIDADEOU NOS CANTOS MAIS ESQUECIDOS DOPLANETA, A ANISTIA INTERNACIONALREALIZA CAMPANHAS PARA EXIGIR
JUSTIA, LIBERDADE E DIGNIDADE PARATODOS, BUSCANDO MOBILIZAR O APOIODAS PESSOAS PARA CONSTRUIRMOS UMMUNDO MELHOR.
O QUE VOC PODE FAZER?
Ativistas de todo o mundo tm mostrado que possvel resistir
s foras perigosas que prejudicam os direitos humanos.Faa parte desse movimento. Vamos combater os semeadoresdo medo e do dio.
Junte-se Anistia Internacional e participe de um movimentoglobal que se mobiliza para acabar com as violaes dos direitoshumanos. Ajude-nos a fazer a diferena.
Faa uma doao para apoiar o trabalho da Anistia Internacional.
Juntos podemos fazer que nossas vozes sejam ouvidas.
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Para localizar os escritrios da Anistia Internacional no mundo, acesse:www.amnesty.org/en/worldwide-sitesSe no houver um escritrio da Anistia Internacional em seu pas, envie este formulrio para:
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http://anistia.org.br/
ndice: AMR 19/005/2014Junho de 2014
ELES USAM UMAESTRATGIA DE MEDOPROTEO DO DIREITOAO PROTESTO NO BRASIL
Nas ltimas semanas, milhares de pessoas saram s ruaspara protestar, enquanto o Brasil se prepara para recebera Copa do Mundo de 2014. Esses protestos ecoaram as grandesmanifestaes que aconteceram no ano passado, de formaindita no pas, quando centenas de milhares de pessoas,em dezenas de cidades, exerceram seu direito de protestar.
A Anistia Internacional preocupa-se que, em alguns casos,os manifestantes tenham sido confrontados com a violnciae os abusos da polcia. Enquanto isso, deputados federais e
estaduais comearam a propor leis mais severas que conferem polcia e s autoridades judiciais maiores poderes parareprimir os protestos. Atualmente, tramitam no CongressoNacional diversos projetos de lei que podem infringir asobrigaes jurdicas internacionais do Brasil. O pas devegarantir que indivduos e grupos sejam capazes de participarlivremente de manifestaes pblicas. Quanto polcia e outrasforas de segurana, se defrontadas com atos de violncia,devem limitar o uso da fora ao mnimo necessrio.
Durante a Copa, a ateno do mundo estar voltada parao Brasil. Os brasileiros que se sentem insatisfeitos como desempenho de seu governo em termos de mudanas sociaise diminuio das desigualdades podem considerar que aCopa do Mundo seja uma boa oportunidade para sair s ruas.Este ser um momento crucial para testar se a polcia e outrasautoridades pblicas do Brasil realmente entendem suaobrigao de respeitar o direito liberdade de expressoe de reunio pacfca.