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A numeração das páginas não corresponde à …€¦ · Generalidades Desenvolvimento da ... participação à vontade humana, e desenha o zoneamento das obrigações ... obrigações

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  • AEDITORAFORENSEseresponsabilizapelosvciosdoprodutonoqueconcernesuaedio(impressoeapresentaoafimdepossibilitaraoconsumidorbemmanuselo e llo). Nem a editora nem o autor assumem qualquerresponsabilidadeporeventuaisdanosouperdasapessoaoubens,decorrentesdousodapresenteobra.Todos os direitos reservados. Nos termos da Lei que resguarda os direitosautorais, proibida a reproduo total ou parcial de qualquer forma ou porqualquer meio, eletrnico ou mecnico, inclusive atravs de processosxerogrficos,fotocpiaegravao,sempermissoporescritodoautoredoeditor.

    ImpressonoBrasilPrintedinBrazil

    DireitosexclusivosparaoBrasilnalnguaportuguesaCopyright2017byCaioMriodaSilvaPereira

    EDITORAFORENSELTDA.UmaeditoraintegrantedoGEN|GrupoEditorialNacionalTravessadoOuvidor,11Trreoe6andar20040040RiodeJaneiroRJTel.:(0XX21)35430770Fax:(0XX21)[email protected]|www.grupogen.com.br

    Otitularcujaobraseja fraudulentamentereproduzida,divulgadaoudequalquerformautilizadapoderrequereraapreensodosexemplaresreproduzidosouasuspensodadivulgao,semprejuzodaindenizaocabvel(art.102daLein.9.610,de19.02.1998).Quemvender,expuservenda,ocultar,adquirir,distribuir,tiveremdepsitoouutilizarobraoufonogramareproduzidoscomfraude,comafinalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lucro direto ou indireto,parasi ouparaoutrem, sersolidariamente responsvel comocontrafator, nostermosdosartigosprecedentes,respondendocomocontrafatoresoimportadoreodistribuidoremcasodereproduonoexterior(art.104daLein.9.610/98).

    Capa:DaniloOliveira

    1edio196321edio2017

    ProduoDigital:Equiretech

    Datadefechamentodestaedio:21.12.2016

    CIPBrasil.Catalogaonafonte.SindicatoNacionaldosEditoresdeLivros,RJ.

  • P49iPereira,CaioMriodaSilva

    Instituies de direito civil Vol. III / Atual. Caitlin Mulholland. 21. ed. Rio de Janeiro:Forense,2017.

    IncluibibliografiaISBN9788530974565

    Contedo.V.1.Introduoaodireitocivil:teoriageraldodireitocivil.V.2.Teoriageraldasobrigaes.V.3.Contratos.V.4.Direitosreais.V.5.Direitodefamlia.V.6.Direitosdassucesses.

    1.Direitocivil.2.DireitoCivil.Brasil1.Ttulo.CDU347

    347(81)342.1

  • CaptuloXXXVII

    184.185.

    185A.186.187.187A.188.

    189.189A.

    CaptuloXXXVIII

    190.191.192.193.194.195.196.

    NDICESISTEMTICO

    NotadaEditoraNotaaoVolumePrefcioIntroduo

    NooGeraldeContrato

    Conceitodecontrato:romanoemodernoFunosocialdocontrato.Princpiodesuaobrigatoriedade.PrincpiodoconsensualismoPrincpiodaboafobjetivaAutonomiadavontadeeintervenodoEstadoRequisitosdevalidadedoscontratos:subjetivos,objetivoseformaisIneficciastrictosensuFormaodocontrato:tempoelugar.ContratosporcorrespondnciapormeiotelefnicoepormeiodaInternetInterpretaodoscontratosInterpretaofavorvelaoconsumidor

    ClassificaodosContratos

    Contratostpicos,atpicosemistosContratosconsensuais,formaisereaisContratosonerososegratuitosContratosbilateraiseunilateraisContratoscomutativosealeatriosContratosdeexecuoimediata,diferidaesucessivaContratosindividuaisecoletivos

  • 197.197A.

    CaptuloXXXIX

    198.199.200.

    CaptuloXL

    201.202.203.

    CaptuloXLI

    204.205.206.206A.

    CaptuloXLII

    207.208.208A.

    CaptuloXLIII

    209.210.211.

    CaptuloXLIV

    212.213.

    ContratosdeadesoContratoscoligados

    ContratoPreliminar

    Conceitodecontratopreliminar.GeneralidadesDesenvolvimentodadoutrinabrasileiraEfeitosdocontratopreliminar

    Arras

    NooehistriadasarrasFunoprincipal:confirmatriaFunosecundria:penitencial

    RelatividadedosContratos

    Contratosemfavordeterceiro.GeneralidadesEfeitosdocontratoemfavordeterceiroPrestaodefatodeterceiroContratocompessoaadeclarar

    VciosRedibitrios

    ConceitodevcioredibitrioEfeitosdosvciosredibitriosResponsabilidadecivildofabricante

    Evico

    NoogeraldeevicoEfetivaodagarantiaEvicoparcial

    ExtinodosContratos

    CessaodarelaocontratualResiliovoluntria

  • 214.215.216.

    CaptuloXLV

    217.218.219.220.221.222.223.224.

    CaptuloXLVI

    225.226.227.228.229.229A.230.230A.230B.230C.230D.230E.230F.

    CaptuloXLVII

    231.232.233.

    Clusularesolutiva:tcitaeexpressaExceptiononadimpleticontractusResoluoporonerosidadeexcessiva.Teoriadaimpreviso

    CompraeVendaeTroca

    ConceitoeanlisedacompraevendaCoisa.SuasqualidadesPreo.SeuscaracteresConsentimento.RestriesEfeitosdacompraevendaRiscoPromessadecompraevendaTroca

    ModalidadesEspeciaisdeCompraeVenda

    RetrovendaVendaacontentoevendasujeitaprovaPreempoouprefernciaPactodemelhorcompradorPactocomissrioVendasobredocumentosReservadedomnioContratoestimatrioLeasingLeasebackLeasingimobilirioAlienaofiduciriaemgarantiaAlienaofiduciriaimobiliria

    Doao

    Conceitodedoao.SeusrequisitosClassificaodasdoaesEfeitosdadoao

  • 234.235.

    CaptuloXLVIII

    236.237.238.239.240.241.

    241A.241B.241C.241D.241E.241F.

    CaptuloXLIX

    242.243.244.244A.244B.244C.

    CaptuloL

    245.246.

    246A.246B.

    CaptuloLI

    IneficciadadoaoRevogaodadoao

    LocaodeCoisas

    GeneralidadesacercadalocaodecoisasElementos:coisa,preo,consentimento,prazo,formaObrigaesgeraisdolocadorObrigaesdolocatrioPrdiosrsticosPrdiosurbanos.Legislaodeinquilinato.RenovaodoarrendamentocomercialEstabilizaodosalugueresFixaodolocatrionoimvelRelaesentreolocadoreolocatrioDevoluodoimvelpelolocatrioDespejoGarantiasnalocaourbana

    EmpreitadaTransporte

    GeneralidadesdocontratodeempreitadaEfeitosdocontratodeempreitadaContratodetransporteTransporterodoviriodecargasSubcontrataodoserviodetransportedecargaTransporterodoviriodecargasexcludentesdaresponsabilidade

    Emprstimo

    Comodato.Noo.ObrigaesMtuo.Conceito.Obrigaes.Onerosidadeegratuidade.Usura.Aberturadecrdito.ContacorrenteContratosdefinanciamentoLimitaesconstitucionaisdosjurosreais

    Depsito

  • 247.248.

    CaptuloLII

    249.250.251.251A.251B.

    CaptuloLIII

    252.253.254.255.256.257.

    CaptuloLIV

    257A.257B.

    CaptuloLV

    258.259.260.261.

    CaptuloLVI

    262.263.

    Conceitodedepsito.Espcies.Obrigaes.ExtinoDepsitonecessrio.Depsitohoteleiro.Sequestro

    PrestaodeServiosCorretagemComissoAgncia,DistribuioeFranchising

    PrestaodeserviosecontratodetrabalhoDisciplinajurdicadaprestaodeserviosCorretagemComissoAgncia,distribuioefranchising

    MandatoGestodeNegcios

    GeneralidadesacercadomandatoObrigaesdomandatrio.SubstabelecimentoObrigaesdomandanteExtinodomandato.MandatoirrevogvelMandatojudicialGestodenegcios

    Fidcia

    Conceitoehistria.NegciofiducirioContratodefidcia:disciplinajurdica

    SociedadeParceria

    MudanadaregulamentaodasociedadenoCdigoCivilOmissisOmissisOmissis

    EdioRepresentaoDramtica

    Noodeedio.ObrigaodoeditoredoautorRepresentaodramtica

  • CaptuloLVII

    264.265.266.

    CaptuloLVIII

    267.268.

    CaptuloLIX

    269.270.

    CaptuloLX

    271.272.273.

    CaptuloLXA

    273A.273B.

    CaptuloLXI

    274.274A.275.276.

    CaptuloLXII

    277.278.

    Seguro

    Conceito,elementosegeneralidadesDireitoseobrigaesdoseguradoedoseguradorEspciesdeseguros

    ConstituiodeRenda

    GeneralidadesacercadaconstituioderendaEfeitosdaconstituioderenda.Extino

    JogoeAposta

    Conceitodejogoeaposta.Generalidades.MtuoparajogoEspciesdejogos

    Fiana

    Conceito,caracteres,requisitosdafianaEfeitosdafianaExtinodafiana

    TransaoCompromisso

    TransaoCompromisso

    ContratosBancrios

    Atividadesbancrias.DepsitobancrioContratosbancriosContacorrente.Aberturadecrdito.CrditodocumentrioDesconto.Financiamento.Redesconto.Repasse

    DeclaraoUnilateraldeVontade

    Promessaunilateral.PromessaderecompensaTtulosdecrdito.Ttulosaoportador

  • 279.

    CaptuloLXIII

    280.281.282.283.

    ANEXO

    283A.283B.283C.283D.283E.283F.283G.283H.

    Ttuloscambiais,letradecmbio,promissria,duplicata,cheques

    ResponsabilidadeCivil

    NooderesponsabilidadecivilResponsabilidadecivilporfatodeoutremResponsabilidadesemculpaLiquidaodasobrigaes

    ANovaTipologiaContratualnoDireitoCivilBrasileiro

    EvoluohistricadocontratoNovasperspectivasdocontratoIncorporaoimobiliriaJointventureOutroscontratosKnowhoweEngineeringHedgingFactoring

    ndiceAlfabticoremissivo

  • D

    INTRODUO

    epoisdeformuladaanoodedireitoededuzidaateoriageraldasnormas,passamos a cogitar dos elementos fundamentais da relao jurdica o

    sujeito,oobjeto,asforasjurgenas.Desenvolvemosoconceitodonegciojurdico,nosseusvriosaspectos.Eencerramosovol.I,destasInstituies,comoestudodaprescrioedadecadncia.Formulamos,novol.II,adogmticadaObrigao,suaorigem, sua classificao, suas modalidades, sua extino. Tratamos de suainexecuo,absolutaerelativa.Encerramolocomadoutrinadesuamutao,noseuaspecto mais frequente e tradicional da cesso dos crditos, como no menoscorriqueiroemenosdesenvolvidodaassunodedbito.

    Nopresentevolume,empreendemosoestudodasFontesdasObrigaes.J dissemos (n 130, vol. II) da infindvel controvrsia que tem dividido os

    civilistas,desdeosromanos.Gaius,noComentrioIII,n88,dasInstitutiones,ensinaqueaobrigaooranascedocontrato,oradodelito(velexcontractunasciturvelexdelicto).OmesmoGaius,emoutrapassagemaquesereportaoDigesto,liv.XLIX,tt.VII,fr.1,pr.,maisminuciosoemaisextenso,admitindooutrascausasmenosprecisas: Obligationes aut ex contractu nascuntur, aut ex malefitio, aut proprioquodamiureexvariiscausarumfiguris.

    EmboraateoriaconsagradanasInstitutasdeJustiniano,comonasgaianas,tenhasobrevivido na doutrinao moderna, os escritores de nosso tempo travamse derazesparaafirmarapluralidadedasfontes(contrato,quasecontrato,delito,quasedelito,vontadeunilateral, enriquecimento indevidoe lei), oupara sustentarlhesaunidade(lei).

    Dentrodestadiscussosemfim,edessedebatesemquartel,nonosarreceamosdetrazeranossapalavra,comafixaodeconceitosesclarecedores:obrigaesh,commaisprecisodenominadasdeveresfundadasexclusivamentenalei(sereleitor,pagartributos,alimentarosfilhos),asquaisnoseconfiguramcomoobligationesemsentidotcnico,enosoporistomesmoobjetodenossaspresentescogitaes.A obrigao propriamente dita gerase de um paralelogramo de foras, cujoscomponentessoofatohumanoealei.certoqueelesestopresentesnagnesede

  • qualquer relao jurdica, porque a vontade do Estado que amolda oscomportamentos individuais, permitindo que o fato do homem d origem a umaprestaoeconomicamenteaprecivel.

    Fato humano e lei achamse, ento, presentes em qualquer obligatio: nas decunhoconvencional,comonasdenaturezaextracontratual.Masnoparticipamemdosagemidntica.

    Ao revs, ora o ordenamento jurdico atua, deixando mais larga margem departicipaovontadehumana,edesenhaozoneamentodasobrigaesnascidasdocontrato ou da declarao unilateral de vontade ora procede na criao deobrigaesemcujaformaoavultaavontadedalei.

    Neste vol. III, deduziremos as Fontes de Obrigaes, inaugurandoo com ateoria geral dos contratos, de onde passaremos s vrias espcies destes.Examinaremos as figuras tradicionais, acrescentandolhes as que ainda noencontraramguaridaemnossodireitocodificado(contratopreliminar,vendacomreserva de domnio, contratos bancrios, corretagem). No estudo da declaraounilateral de vontade, dedicamos especial ateno aos ttulos de crdito(nominativos,aoportador,ordem).Econcluiremosestetomocomasobrigaesoriundas do fato humano no volitivo, com fundamento na culpa ou fazendoabstraodesta(responsabilidadesemculpa).

    Masnoperderemosdevistaoquesetemcogitadopresentemente,dareformadosCdigosbrasileiros.E,comonoscoubeahonradeelaborarumAnteprojetodeCdigodeObrigaes(ParteGeraleContratos),aquiconsignamosalgodoquenoprojetamentopretendamosintroduzir.

    Nestevol.III,dequeoravemapblicomaisumaedio,noperdemosdevistaoProjeto de Cdigo de Obrigaes, enviado ao Congresso Nacional em 1965 elamentavelmente retirado em 1967. Na sua elaborao, que teve como ponto departida o nosso Anteprojeto, apresentado ao Ministrio da Justia em 1962 (v.ProjetodeCdigodeObrigaes,ExposiodeMotivos,pg.VII,EdioImprensaNacional,Rio,1965),comonasua reviso (pelacomissocompostadeOrosimboNonato,PresidenteCaioMriodaSilvaPereira,relatorgeral,emembrosTefiloAzeredoSantos,SylvioMarcondes,OrlandoGomeseNehemiasGueiros)estavampresentes as mais modernas concepes, bem como as mais arrojadas soluesapontadaspelacinciacivilistacontempornea.

    Acrescidodenovoscaptulosepargrafos,aludimossinovaessugeridaspeloProjeto,naconvicodequeareformadoCdigoCivilhdevir,comaatualizaode nosso direito positivo, que se apresentar divorciado da evoluo jurdica,superado pelas contribuies cientficas, fragmentado por uma incontrolvel

  • legislaoextravagante.Cumprerecolocarassoluestcnicasemtermosexatoseemobedinciaaoespritodesistema.

    QuantostenhamsensibilidadeparaahoraqueviveestePaseparaosanseiosderenovao que eclodem de todos os quadrantes, percebem que adequado omomento de se empreender a imprescindvel reformulao de nossa ordemjurdica,pornspreconizadanodiscursopronunciadonoInstitutodosAdvogadosBrasileirosem1962,quandonosfoioutorgadaMedalhaTeixeiradeFreitasedesdeentoobjetodevivase interminveisdiscusses (cf.nosso livroReformulaodaOrdemJurdicaeOutrosTemas,Ed.Forense,1980).

    Nosepodeperdertalensejo,sobpenadecondenaoirrecorrvel,pronunciadapelasgeraesfuturas.

    Aquideixamos,maisumavez,onossoapeloeanossaprofissodef.Algumhdemanteracesoofogosagradodasideiasreformistas.Esegeraodosjuristasdehojefaltaracoragemnecessria,osquevieremdepoisdens,estudantesdeagora,hodereceberestabandeiraefazerdelaumobjetivopermanente.

    RiodeJaneiro,junhode1980

  • A

    NOTADAEDITORA

    partirda17edio,comaexpressaconcordnciadoatualizador,ProfessorRegis Fichtner, e da famlia do Prof. CaioMrio da Silva Pereira, este

    volume da Coleo Instituies de Direito Civil passa a ser atualizado pelaProfessoraCaitlinMulholland.

    As atualizaes realizadas pelo Professor Regis Fichtner, desde 2003,permanecem. Foram incorporadas as alteraes que a atualizadora consideroupertinentesparaestaedio.

    Agradecemos a colaborao e a dedicao que o Professor Regis FichtnerconcedeucontinuidadedaColeodurantetodosessesanos.

    RiodeJaneiro,fevereirode2013

  • M

    NOTAAOVOLUME

    uitasmodificaestmsidointroduzidasnavidacontratualbrasileira,emtorno das Fontes das Obrigaes (Contratos, Declarao Unilateral de

    Vontade, Responsabilidade Civil). Eu mesmo tenho trazido a minha modestacolaborao, em trabalhos esparsos, conferncias e estudos. Escrevi um livroversando a Responsabilidade Civil, acolhido generosamente pela comunidadejurdica.

    Aodarapblicoestanovaedio,aproveiteioensejoparaincorporarlhenovasachegascomrefernciareformaconstitucional,legislaoespecialsobreContratos,Cdigo de Proteo e Defesa do Consumidor. Achei de bom alvitre e oportunoaditarlhe um Anexo em que trato sinteticamente de novos tipos de contratos,compreendidossinopticamentesobaepgrafeNovaTipologiaContratualnoDireitoCivil Brasileiro, que para aqui transponho de publicaes anteriores. Para maiorfacilidade de localizao, e para que se no altere a numerao sequencial dosvolumessubsequentes,distribuamatrianosnmeros283Aa283H.

    CaioMriodaSilvaPereiraRiodeJaneiro,1994

  • 201.

    A

    CAPTULOXLARRAS

    Sumrio201. Noo e histria das arras. 202. Funo principal: confirmatria. 203.Funosecundria:penitencial.

    Bibliografia

    Van Wetter, Pandectes, vol. III, 310 Giorgio Giorgi, Teoria delleObbligazioni, vol. IV, n 467 Ricci,Corso di Diritto Civile, vol. VI, 196Saleilles, Thorie Gnrale de lObligation, n 249 Coelho da Rocha,Instituies de Direito Civil portugus, vol. II, 740 Mazeaud et Mazeaud,LeonsdeDroitCivil,vol.III,n806Trabucchi,IstituzionidiDirittoCivile,n265 Ruggiero e Maroi, Istituzioni di Diritto Privato, vol. II, 130 Colin etCapitant, Cours de Droit Civil, vol. II, n 520 Enneccerus, Kipp y Wolff,Tratado,Derecho deObligaciones, vol. I, 36 Slvio Rodrigues,Das ArrasPlaniol, Ripert et Boulanger, Trait lmentaire, vol. II, nos 2.434 De Page,Trait lmentaire de Droit Civil, vol. IV, nos 270 e segs. Giulio Venzi,ManualediDirittoCivileItaliano,n436CaioMriodaSilvaPereira,Arras,inRevistaForense,vol.68,pg.476.

    NOOEHISTRIADASARRAS

    palavra arra, que nos veio diretamente do latim arrha, pode ser pesquisada

    17

  • Aretrospectivamente no grego arrabn, no hebraico arravon, no persarabab,noegpcioaerb,comsentidodepenhor,degarantia.amesmaideiaquesubsistiuatravsdostempos.

    Sua riqueza de acepes demonstra, bem como a utilizao do conceito emvrios setores, tcnicos e profanos, evidencia a sua utilizao frequente. Emvernculomesmo,significoudeumladoopenhor,aquantiadadaemgarantiadeum ajuste, como tambm a quantia ou os bens prometidos pelo noivo parasustentodaesposaseela lhesobrevivesse,sentidoemqueaempregaAlexandreHerculano,numevidenteparalelismocomodote.1

    A noo jurdica temse, contudo, mantido pura, dentro dos Cdigos queinscrevemtodosomilenarinstituto.

    A existncia das arras assinalada, com efeito, em quase todas as antigaslegislaes,2massuaorigemmaisfacilmenteserastreianodireitodefamliadoque no de obrigaes, pois que muito antes de se caracterizarem os contratos,quandono passavamainda da permuta pura e simples de objetos, j elas eramconhecidaseusadasnoscontratosesponsalcios.3

    Extinguindoseo regimedacomunidade familiar,e tornandose insuficienteatrocainspecieparaconteracomplexidadedosnegciosjurdicos, transplantoudo direito de famlia para as relaes obrigacionais o instituto da arra, paragarantia do pacto avenado, ou o reforamento do contrato ajustado, sem quefosse ele abolido naquela antiga utilizao. Lado a lado viveram, durantemuitotempo,asduasfiguras,daarraqueatestavaasolidezdasobrigaesajustadas,edaarraqueafianavaarealizaodoscasamentostratados.4

    Suaprimeirafinalidade,nodireitoobrigacional,foiasseguraraperfeiodocontrato.Mais tarde outro efeito foilhe atribudo. Nos primeiros tempos, no.Foi o valor assecuratrio que se lhe reconheceu no direito prromano,5 esse oseusentidonoDireitoRomanoprjustinianeu:parademonstraroacordodeduasvontadesnarealizaodonegcio,umadaspartestransferiaoutradeterminadasomadedinheiro,davalheumacoisamvel,oulheentregavaumanelarrhainsignumconsensusinterpositidata.6

    Ulteriormente, no direito das Institutas, modificao introduzida porJustinianod lugaracontrovrsiaquea inflexibilidadedos textosantigosnuncaautorizara. Dividemse os glosadores e comentaristas no caracterizlas, e duasescolas se constituem. Uma primeira sustenta modificao radical do direito.Domat,Molitor,Demangeat,Brunemanneoutros,semdistinguirseestounoperfeito o contrato, atribuem s arras a faculdade de retratao do ajustado, eentendem que foram convertidas de confirmatrias em penitenciais.7 Uma

    18

  • 202.

    segunda,tendofrenteCinoeBartolo,Cujcio,Voet,Pothier,firmadosestesnaglosa,8 preconizam que houve modificao apenas parcial do velho texto,admitindoadistino:podemasarrasserdadasantesdaperfeiodocontrato,oupodemserentreguesdepoisdeconcludo.Somentenoprimeirocaso lhespareceterhavidoacomentadamodificaosomenteparaasvendasprojetadasque,noseuentender, importamelasemfaculdadedearrependimento.Quando,aorevs,sotransferidasdepoisdecompletadaaconveno,conservamocarterantigodearrhaconfirmatoria,eprovamaexistnciadela.9

    Estas duas funes assumidas pelas arras, segundo os doutores, vieraminfluenciar a evoluo moderna do instituto, que surge nos cdigos comoreproduo dos entendimentos que os romanistas imprimiam s fontes.Definindoasconfirmatriasdoscontratos,ou ligadasfaculdadederetracto,aslegislaes dos diversos povos nada tm feito alm de reproduzir o queencontraram, relatado e explicado pelos romanistas, segundo a velha tradioquiritria, como confirmatrias dos ajustes ou autorizadoras do arrependimento,segundoacodificaodosculoVI.

    AsarraseramreguladasnoCdigode1916napartegeraldoscontratos,nosarts. 1.094 a 1.097. Davase nfase, assim, ao seu carter de instrumentopreparatrioparaacelebraodocontrato.OCdigode2002transferiuasregrasdasarrasdodireitodoscontratosparaodireitodasobrigaes(arts.417a420),mais exatamente para o Ttulo do Inadimplemento das Obrigaes, o que lheatribuimaior carter deprefixaode indenizaodosdanos sofridospelaparteinocentenahiptesedeocontratonovirasercelebrado.

    FUNOPRINCIPAL:CONFIRMATRIA

    Para umas legislaes como a alem, a sua, a brasileira, aarra ou sinal,emseguimentotradiodoDireitoRomanoantigo,importaemumaconvenoacessria real, tendo o efeito de provar que o contrato principal est concludo,havendoasvontadesconsequentesrealizadoonegciojurdico,econsiderandoseaspartesreciprocamentevinculadas.Motivosdeordemaltamentemoralapontamestesistemacomoprefervel,porquenodeixaaseriedadedosnegciosmercde um direito de arrependimento comprado e pago antecipadamente. Dadas asarras, o negcio est concludo.No mais possvel o arrependimento.Aparteque, depois de sua transferncia, se arrepende e recusa, no usa de um direito,masinfringeocontrato.

    EmquepeseaopiniodeLarombire,10arra era,entreos romanos,oanel

    19

  • queumdoscontratantestransferiaaooutro,parasimbolizaraconvenoperfeita.Tambmnovelhodireitofrancsnoeramenosquearraumvintmmarcado,ouuma pequena moeda de cobre do mais nfimo valor (liard), entregue pelocompradoraovendedor,aquePothierdenominadenierdadieu,eMerlinchamadenierDieu, e eranitidamenteconfirmatria,porque, seocompradorpudesse(ouovendedor)arrependersedacompraevendaporumvintm,nenhumaseriaporcertoaseriedadedosnegcios.

    Efeitos:Dadoosinal,estfirmadoonegcio.Seoobjetodadoemarrasfordinheiro ou outro bem mvel (Cdigo Civil, art. 417) ou, como maisprecisamenteenunciaSaleilles, seguardar relaode fungibilidadecomoobjetodo contrato,11 consideramse princpio de pagamento, que apenas devercompletarse devolvemse, ao contrrio, se no existir aquela relao, nomomento em que o contrato se executa. Se, porm, o negcio se impossibilitarsemculpa,restituemse,porquenosobreviveacausadesuareteno.Nocaso,entretanto, de a impossibilidade originarse de culpa, ou se houver recusa decumprimento, perdlas em benefcio do outro contratante, se arrependido ouculpadoforoqueastiverdado,casoestenoqueiraobteraexecuodocontrato(CdigoCivil,art.418).Searrependidoforoqueastiverrecebido,determinaoart.418queaquelequeasdeutemafaculdadedehaverocontratopordesfeitoeexigir a sua devoluo mais o equivalente (devoluo em dobro), acrescido decorreomonetria segundo ndices oficiais regularmente estabelecidos, juros ehonorriosdeadvogado.

    A inseronoCdigoCivilde regradeterminandoa correomonetriadodbitoinfelizedesnecessria.Tratasederegraelaboradadentrodamentalidadeinflacionria que vingou no Pas desde 1964. A correomonetria elementoalimentador da inflao, que em nveis altos constitui um dosmaiores flagelossociais, jque fazsubsistir simultaneamenteduasmoedas:amoedacorrente,dequem no dispe de conta bancria e no pode se proteger em aplicaesfinanceiraso indexador,quemantmparaaquelequetemcapitalsuficienteparadepositaroseudinheirooseuvalordecompra.Tambminfeliza inseroderegra determinando o pagamento de honorrios de advogado com o simplesinadimplemento da obrigao, independentemente de prova de efetiva prestaodo servioe semqualquerparmetrodevalor.A interpretaodestedispositivonesteparticulardevesermuitoparcimoniosa,sobpenadesedificultaraindamaispara o devedormoroso o cumprimento da sua obrigao e eventualmente poderensejarumenriquecimentosemcausaparaocredorouparaoseuadvogado.

    SobagidedoCdigoCivilde1916,discutiaseseasarrasimportavamem

    20

  • 203.

    prefixao das perdas e danos. A tendncia quele tempo j era destacar a arraconfirmatriadafinalidadelimitativadasperdasedanos,admitindoosmodernositalianos, com fundamento no Cdigo Civil, que a parte prejudicada peloinadimplemento poderia pedir a resoluo ou o cumprimento do contrato, e emambos os casos seria devido o ressarcimento inteiro das perdas e danos.12 Acontrovrsiaemnossadoutrinaera,porm,acesa.Enquanto,deumlado,ClvisBevilqua, Carvalho deMendona, Slvio Rodrigues negavam a suscetibilidadede se acumulares as arras e as perdas e danos,13 de outro lado no faltava quedoutrinasseacumulao.14OCdigode2002resolveuapolmicaquesto:oart.419expressamenteadmitequeaparte inocentesolicite indenizaosuplementar,seprovarmaiorprejuzo,valendoasarrascomotaxamnima.

    OCdigo reservou ainda ao credor no art. 419 a possibilidade de exigir ocumprimento especfico da obrigao, sem prejuzo da cumulao com aindenizao por perdas e danos, cujo montante mnimo equivale ao valor dasarras.Neste caso, est o credor dispensado de realizar a prova do dano caso secontenteemrecebera indenizaomnimafixadana lei.Somentenahiptesedepretender obter indenizao superior quele valor que ter que comprovar osdanossofridos.

    FUNOSECUNDRIA:PENITENCIAL

    Para outras legislaes, tendo frente a francesa, a entrega da arra tem osignificado de ser s partes livre o arrependimento ficando a perda do sinalregulando a indenizao. Esta faculdade de retratao, que no pode durarindefinidamente,vaiataexecuocabaldaobrigao.15Emgeral,afaculdadederetracto recproca, porque da natureza, se bem que no da essncia das arras.Pode acontecer, porque a bilateralidade no tem carter de ordem pblica, quealguma vez aparece reservada a um s dos contratantes, e em tal caso mereceacolhidaarespeito.16

    Assemelhase a arrapenitencial clusulapenal (v.n149, supra,vol. II),de que difere por ser uma conveno acessria real, isto , perfazse com atradio efetiva da coisa dela se distingue ainda pelo fato da transfernciaantecipada,aopassoqueaclusulapenaldenaturezaconsensual.Extremamseaindapelosefeitosaclusulapenaltornasedevidasehouverinfraodoajuste,e,senohouverouenquantonohouver,seuvalorpotencialoulatenteasarrassotransferidasdesdelogo,eseuvalorefetivoeatualparaahiptesedefuturoarrependimento. E acrescentase que as arras se estipulam para os contratos

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    bilaterais, ao passo que a clusula penal pode ser estabelecida para qualquerobrigao.17

    No direito francs, onde a sua funo penitencial (Cdigo Civil francs,art.1.590), levantouseaquestoseaspartes,aosearrependerem,ofendemumdireitoadquirido.negativa inclinouseasoluomais razovel: retratamseaspartesdeumcontratoquenotransferedireitosenquantopendeafacultdedbit.Enquanto esta figurar, a aquisio dos direitos fica em suspenso (Colin etCapitant), at que a conduta inequvoca das partes demonstre que dela no seutilizam,senoforpactuadaatermo,findooqualcaducadeplenodireito.

    Se qualquer das partes, usando um direito seu, recua do negcio, ficam asarrasconstituindoo ndiceda indenizao,pagandooutraovalordelas: se foiquem as deu, perdeas em proveito da que as recebeu se esta a culpada,devolveseemdobro.18

    Resolvendose o contrato por mtuo consenso, ou impossibilitandose aprestao sem culpa de qualquer das partes, darse a devoluo das arrassimples,enoemdobro,porqueteriamperdidoasuafinalidade.19

    O nosso Cdigo Civil, art. 420, admite que tenham as arras esta funopenitencial, a que se devem atribuir estes efeitos que a tal carter se atribuem.Mas bemdever que a regra, para ns, a confirmatria, o que osmodernosdoutrinadoresafirmamserasuafunonatural,20resultantedaaplicaopuradaregra, independentemente de eleio das partes. Para que se lhe atribua o efeitopenitencial arrha quae ad ius poenitendi pertinet necessria a estipulaoexpressa.21

    No obstante isto, processase nos costumes e na vida dos negcios umatransformaodeconceitos,segundoaqualanaturezapenitencialvaiassumindoforosdepredominnciaemtoaltograuqueaospoucososentidoconfirmatriodosinalvaipassandoasegundoplano.

    O art. 420 do Cdigo dispe expressamente que na hiptese de as arrasserempenitenciais,ovalordaindenizaoestlimitadoaodasarras,nocabendodireito a indenizao suplementar, mesmo que a parte prejudicada com oarrependimento venha a sofrer prejuzo maior. Nesse caso, embora oarrependimentoencerredireitoestabelecidonocontratopelaspartes,aestipulaotextual de arras penitenciais dispensa a meno expressa ao arrependimento, jqueestedireitosefarpresumirdaopopelaespciedearras.

    AlexandreHerculano,LendaseNarrativas,vol.I,pg.195.

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    Cf.LudovicBeauchet,HistoireduDroitPrivdelaRpubliqueAthniense,vol.IV,pg.421.DigestoItaliano,vol.VI,verb.Caparra.VanWetter,Pandectes,vol.3,310.Beahchet,ob.cit.,pg.423.Larombire,ThorieetPratiquedesObligations,vol. II,n20VanWetter, loc.cit.Traduo:arraemsinaldeconsensosobreacoisadada.Giorgi,Obbligazioni,vol.IV,n467Molitor,LesObligationsenDroitRomain,vol.I,172.Mayns,DroitRomain,vol.II,259.Giorgi,ob.cit.Larombire,ob.cit.Saleilles,loc.cit.Nomesmosentido:EduardoEspnola,DaGarantiaeExtinodasObrigaes,pg.355,nota88JooLusAlves,CdigoCivilInterpretado,anotaesaoart.1.096.RuggieroeMaroi.Istituizioni,pg.76.C.ClvisBevilqua,Comentrioaoart.1.095M.I.CarvalhodeMendona,DoutrinaePrticadasObrigaes.vol.II,n661SilvioRodrigues,DasArras,pg.98.Cf.AlvinoLima,parecerinRevistadosTribunais,vol.165,pg.461.BaudryLacantinerieetSaignat,TraitdeDroitCivil,Delaventeetdelchange,n81.Larombire,ob.cit.,n25.Trabucchi,Istituzioni,pg.595.AubryetRau,Cours,vol.V,349MazeaudetMazeaud,Leons,vol.III,n806.Giorgi,ob.cit.,n469Saleilles,ob.cit.,n249.Trabucchi,ob.cit.,pg.596.Clvis Bevilqua, Comentrio ao art. 1.096 do Cdigo Civil de 1916 Ruggiero eMaroi,Istituzioni,pg.76.

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    CAPTULOXLIRELATIVIDADEDOSCONTRATOS

    Sumrio204.Contratosemfavordeterceiro.Generalidades.205.Efeitosdocontratoemfavordeterceiro.206.Prestaodefatodeterceiro.206A.Contratocompessoaadeclarar.

    Bibliografia

    SerpaLopes,Curso,vol.III,n105Demogue,Obligations,vol.VII,nos759esegs.Giorgi,Obbligazioni,vol.III,nos412esegs.Barassi,LaTeoriaGeneraledelleObbligazioni,vol.II,pgs.450esegs.OrlandoGomes,Contratos,n129De Page, Trait lmentaire de Droit Civil, vol. II, parte I, nos 552 e segs.Gaudemet, Thorie Gnrale des Obligations, pgs. 235 e segs. FrancescoMessineo,DottrinaGeneraledelContratto,pgs.404esegs.ColinetCapitant,CoursdeDroitFranais,vol. II,nos121esegs.MazeaudetMazeaud,LeonsdeDroitCivil,vol.II,nos766esegs.Trabucchi,IstituzionidiDirittoCivile,n286RenatoScognamiglio,ContrattiinGenerale,n58Pacchioni,IContrattiaFavore di Terzi, passim Lcio Fonte de Resende, Promessa de Fato deTerceiroEnneccerus,KippyWolff,Tratado,DerechodeObligaciones,34e35.

    CONTRATOSEMFAVORDETERCEIRO.GENERALIDADES

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  • Dseocontratoemfavordeterceiroquandoumapessoa(oestipulante)convenciona com outra (o promitente) uma obrigao, em que aprestaosercumpridaemfavordeoutrapessoa(obeneficirio).

    Muito se tem debatido em doutrina a propsito da caracterizao jurdicadeste ato negocial, que por seu aspecto exterior, por sua estrutura e por seusefeitos,sediversificadosnegciosjurdicosordinrios,pelofatodeostentaralgodiferente,comocomparecimentodasdeclaraesdevontadededuaspessoasnacelebrao de um ajuste, o qual beneficiar um estranho relao jurdica. Aestraneidadecresce,atentandoseemqueesteterceiro,emboranoparticipantedaformaodoato,adquireasqualidadesdesujeitodarelaoobrigacional.

    Eisporqueosautoresnoseharmonizamnasuaconceituao,havendonadamenosdecincoexplicaes tericasoucincoposiesdoutrinriasdiferentesnasuacaracterizao:1

    AUnspretendemqueaestipulaoemfavordeterceironopassadeumaofertaesperadeaceitao,resultandoocontratoformadoquandoobeneficiriomanifestaavontadedereceberaprestaoaqueopromitenteestobrigado.Nosatisfaz a teoria, se se observa que o promitente no mero policitante, masverdadeiramenteobrigadoouvinculado.

    B Outros enxergam na estipulao em favor de terceiro uma gesto denegcios, empreendidapeloestipulante,comorepresentanteoficiosodo terceiro,entabulando negcio que permanece na expectativa de aprovao deste, naqualidadededominus.2Tambmestaexplicaonopodesatisfazer,pelofatodeagirememseuprprionomeoestipulanteeopromitente,enonominealieno,3oquedesfigurainteiramenteahiptesedenegotiorumgestio.4

    CUmaterceiracorrentevaibuscarnaexpressovinculativadadeclaraounilateral de vontade a sua estruturao. Mas no logra convencer, j que aestipulao em favor de terceiro requer o concurso de duas vontades para ternascimento,e,portanto,umatotipicamenteconvencional.

    DEmquartolugarapareceumajustificativajmaisprximaderealidade,defendidacomoexceoregraresinteraliosactaaliisnecnocetnecprodest.5

    Admitem que o terceiro, no participante de um negcio jurdico, receba arepercussodeseusefeitos.Faltalhe,noentanto,acomplementao,consistentenadeterminaoprecisadesuanaturezajurdica.

    E Finalmente vem a sua configurao como contrato. No um contratocomo todos os outros, porm sui generis, visto como nasce, firmase,desenvolvese e vive como os demais contratos, porm se executa de maneirapeculiar, com a solutio em favor de um estranho relao criada. Como nota

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  • Clvis Bevilqua, que defensor de seu carter contratual, existe umadespersonalizaodovnculo,aocontrriodageneralidadedoscontratos,criandooqueeledenominarelaocontratualdupla.6Buscandomaterializaogrficapara este ato, figuramolo como um tringulo, cujo vrtice a ocupado peloestipulante, e os ngulos b e c da base respectivamente pelo promitente e pelobeneficirio:

    A estipulao em favor de terceiro , com efeito, um contrato, e por istoganha terreno a preferncia pela sua nomeao como contrato em favor deterceiro.Originase da declarao acorde do estipulante e do promitente, com afinalidadedeinstituirumiurisvinculum,7mascomapeculiaridadedeestabelecerobrigaodeodevedorprestarembenefciodeuma terceirapessoa,aqual,noobstanteserestranhaaocontrato,setornacredoradopromitente.Nomomentodaformao,ocursodasmanifestaesdevontadeestabeleceseentreoestipulantee o promitente (lado ab do tringulo). O consentimento do beneficirio no necessrioconstituiodocontrato,eporconseguintecriaodevantagensemseuproveito.8 E nem se argumente contra esta consequncia, porque tambm oherdeiro adquire a herana no momento da abertura da sucesso,independentementedesuaaceitaoeatdesuacincia.9Nosepode,entretanto,negaraoterceiroafaculdadederecusaraestipulaoemseufavor,expressaoutacitamente.10Nomomentode sua execuo, flui pelabaseoupela linhabcdotringulo, isto , entre promitente e beneficirio. E, para fechlo, lado ac, hfaculdades reconhecidas ao estipulante quanto revogao da estipulao,substituio do beneficirio, e mesmo revogao do benefcio em caso dedescumprimento de encargo eventualmente imposto ao terceiro, como tudoveremosaotratardosseusefeitosnon205,infra.

    A conceituao contratualista da estipulao, que a sua verdadeiracaracterizaojurdica,nopodesofrerentrensamenordvida,umavezquedoutrina legal, perfilhada e consagrada no Cdigo Civil. Por outro lado, novigora em nosso direito a concepo da estipulao como negcio jurdicoacessrio. Mesmo onde assim se entendia, como se dava no direito francs, aelaborao jurisprudencial e o trabalho hermenutico rejeitaram este carter,tratandoacomoprincipal.11Adoutrinamodernaestassenteemqueofatosdaestipulao, independentementeda intervenoouanunciado terceiro, qued

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  • 205.

    origemaosdireitosaestedestinados.12

    Se no h harmonia entre os doutores na sua caracterizao jurdica,aprovao da doutrina no lhe falta caracterizao econmica, apontando TitoFulgnciovriashiptesesdesuautilizaonocomrciojurdico:

    1 Constituio de renda em que o promitente recebe do estipulante umcapital, e obrigase a pagar ao beneficirio uma renda por tempo certo ou pelavidatoda.

    2 Seguro, em vrias de suas modalidades (de vida, contra acidentespessoais, contra acidentes do trabalho, dotal), em que o segurado (estipulante)contrata com o segurador (promitente) pagar ao beneficirio (terceiro) o valorajustado,emcasodesinistro.

    3 Doaes modais, quando o donatrio se obriga para com o doador aexecutaroencargoabenefciodepessoadeterminadaouindeterminada.

    4 Contratos com o Poder Pblico, concesso de servio pblico etc. emqueo contratante (promitente) convenciona comaAdministrao (estipulante) aprestaodeserviosaosusurios(terceirosindeterminados).

    Paraaformaodaestipulaoemfavordeterceiroexigemseosrequisitosnecessrios validadedos contratos emgeral subjetivos, objetivos e formais,convindo to somente fazer algumas aluses a peculiaridades deste contrato.Comeando pelo ltimo observamos que se trata de contrato consensual, sendolivre a sua forma13 muito frequente neste campo o contratotipo, como o deadeso. A liceidade e a possibilidade do objeto merecem encarecidas, pois queno muda os termos da equao jurdica o fato de ser o credor um elementoestranho criao do vnculo. No tocante ao requisito subjetivo, claro que oestipulanteeopromitentehodeteraptidoparacontratar.Noserequer,porm,a capacidade de terceiro, j que ele no intervm na celebrao do contrato.14

    Outroaspectoaconsiderarresidenaindagaoformuladapeladoutrina(ColinetCapitant,MazeaudetMazeaud,DePage) se vlida a estipulao em favor depessoa indeterminadae futura.Pelonossodireitonopadecedvida.Somenteaindeterminao absoluta do credor invalida o contrato. Se o terceiro momentaneamenteindeterminado,massuscetveldeidentificao(determinvel),o ato vlido. O mesmo dirse da futuridade, desde que ligada a fatorespositivosdecaracterizao,comoarefernciaaosherdeirosdoestipulanteoudepessoaconhecida,alusoproledecertocasaletc.15

    EFEITOSDOCONTRATOEMFAVORDETERCEIRO

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  • O Direito Romano, que levava ao extremo a personalizao do vnculoobrigacional,repelia,aprincpio,totalmenteahiptesedeumarelaocontratualestabelecerse entre duas pessoas para ser cumprida emmos de uma terceira.Contudo,aideianofoidetodorepugnantequelesistema,noqualseconstruiuafiguradadonatiosubmodo,16queimplicavaaexecuodoencargoabenefciodeoutrem,eaindadarestituiododoteaumterceiroquenoodotador.Estescasos tinham, contudo, carter puramente excepcional. A regra era contida naparmia alteri sipulari nemo potest,17 enumerada nas Institutas de Justiniano,comonoDigesto.18Mais tarde, dentromesmodoDireitoRomano, chegouse aadmitir a justaposio de clusula subrogatria na stipulatio, pela qual sechegava indiretamente consecuo de resultado benfico a terceiro (Sponaesnemihi aut Titio?). J no Baixo Imprio chegouse a conceder a actio a terceiro,naquelas hipteses de doao modal e restituio de dote, depois estendida restituiodacoisadadaemdepsitooucomodato.19

    Mas o preconceito sobreviveu no nimo dos juristas a tal ponto que quasechegou a nossos dias, como ainda se observa em Pothier.20 Coube ao direitomoderno, especialmente em razo do desenvolvimento econmico, quemultiplicousituaes,emqueadespersonalizaodovnculoobrigacionalganhamaior extenso, abrir campo a esta figura peculiar de negcio jurdico. Outrashipteses jeram tradicionalmenteconsagradas,de repercussodoatoemquemdele no participa (pagamento ao credor putativo oponibilidade de contratoconstitutivo de direitos reais condio resolutiva em direitos transferidos aterceirosetc.).Masemtodosessescasos,quemrecebeapercussodofenmenono propriamente um terceiro, que, em sentido tcnico preciso, aquele quepermanece substancialmente estranho ao contrato.21 Desenvolvendose a adoodocontratoafavordeterceiro,entrouemalgunsCdigos,svezesacontragosto,como foi o caso do francs ou do italiano de 1865 outras vezes maisdesembaraadamente,comoodobrasileiroouitalianode1942.

    Umaboasistematizaodosseusefeitosdeverdistribulosemtrsgrupos,em funo das trs ordens de relaes jurdicas criadas: entre estipulante epromitente,entrepromitenteebeneficirio,eentreestipulanteebeneficirio.

    ARelaesentreoestipulanteeopromitente.Naformaodocontrato,oestipulanteeopromitenteagemcomoquaisquercontratantes.Eseopromitentefica obrigado a prestar a um terceiro, nem por isto se desobriga em relao aoestipulante.Ao contrrio, enquanto no realiza a solutio, permanecevinculadoaeste,queconservaodireitodeexigirocumprimentodocontrato (CdigoCivil,art.436).Istonosignificaqueelesejaobrigadoaagirnestesentido,22senoque

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  • tem esta faculdade. Pode ainda reservarse o direito de substituir o terceirodesignado no contrato, independentemente de consentimento do promitente, quedevercumpriradeterminao recebida.Basta,para isto, adeclaraounilateraldevontadedoestipulante,poratointervivosoucausamortis(CdigoCivil,art.438).Nestecontratoaprestaodevidaaumterceiro,eparaopromitentetratase de negcio normalmente no celebrado intuitu personae creditoris.23 Asubstituio fazse livremente, e a prtica dos negcios mostra com quefrequnciaocorre:nos segurosdevida,mediante simplesendossodaapliceouportestamentonosseguroscontraacidentesnotrabalhoasubstituioaregra,por serem beneficirios os empregados da empresa, cuja relao nominal periodicamenteenviadaaosegurador,comsubstituio,dosqueseretiram,pelosnovos admitidos.Outra faculdade reconhecida ao estipulante a sua revogao,caso em que o promitente se exonera em relao ao terceiro, passando emconsequnciaaserdevidaaprestaoaoestipulante,salvoseocontrrioresultarda vontade das partes, ou da natureza do contrato, ou do pouco comum carterpersonalssimo do terceiro.24 A faculdade de revogar a estipulao, como a desubstituir o beneficirio, cessa, como se ver logo abaixo. Cessa, ainda, sehouverrennciaaela,umavezquenoconstituimatriadeordempblica.25

    B Relaes entre promitente e terceiro. No aparecem na fase decelebraodocontrato.Nadeexecuo,oterceiroassumeasvezesdocredor,e,por isto, tem a faculdade de exigir a solutio. Dvida no se suscita, em nossodireito,emqueoterceirotitulardeaodiretaparaesteefeito.Muitoemboranosejapartenasuaformao,podeintervirnelecomasuaanuncia,e,ento,sujeito s condies normais do contrato (Cdigo Civil, art. 436), enquanto oestipulante o mantiver sem inovaes. Os encargos e deveres que lhe resultemtm de ser atendidos, ainda que no haja ele anudo na fase de formao, pelarazo simplesdeque seapresentacomocredorcondicional,que temopoderdeexigirea faculdadede recebersubconditione,de realizardeterminado fatoparacomoutrem(modus).

    C Relaes entre estipulante e terceiro. Formado o contrato entreestipulanteepromitenteparabeneficiaroterceiro,ficaoprimeirocomopoderdesubstitulo, como visto acima. Cabelhe, tambm, a faculdade de exonerar opromitente, salvo se o terceiro ficar como poder de exigir a prestao (CdigoCivil, art. 437), valendo a aceitao do terceiro para consolidar o direito,tornandoo irrevogvel edefinitivo.26Quando a estipulao for acompanhada deencargo imposto no terceiro, tem o estipulante a faculdade de exigir que ocumpra. E, em certos casos, como na donatio sub modo, conserva o poder

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  • 206.

    personalssimo, intransfervel, de revogla por inexecuo do encargo (CdigoCivil, art. 555). O fundamento da revogabilidade, como da exigibilidade decumprimento,omesmo:aaceitaodobenefciopeloterceiro,desnecessriaformaodo contrato, pormnecessria incorporaodo bemouvantagemaoseupatrimnio,dsecondicionadaouvinculadaimposiodoencargo.

    PRESTAODEFATODETERCEIRO

    Outro aspecto dos efeitos dos contratos em relao a terceiros est naquelecasodapessoaquesecomprometecomoutraaobterumaprestaodefatodeumterceiro. o chamado contrato por outrem, ou, promessa de fato de terceiro,comodenominaoCdigoCivilnosarts.439e440.

    Tambm aqui h uma relao jurdica entre duas pessoas capazes e aptas acriardireitoseobrigaes,asquaisajustamumnegciojurdicotendoporobjetoaprestaodeumfatoasercumpridoporoutrapessoa,noparticipantedele.Adoutrina27igualmentecontrovertenasuacaracterizaojurdica:

    a)Gesto de negcios: com a qual guarda sem dvida remota semelhana,masdequevivamentedifere,pelofatodeopromitentenoseprnadefesadosinteressesdoterceiro,oficiosamenteaocontrrio,oobjetivoaquevisatornaroterceirodevedordeumaprestao,nointeressedoestipulante.

    b)Mandato: desassiste razo aos que aproximam ao mandato esta figuracontratual,porfaltara representao,queemnossodireito lheessencial (v.n271,infra).

    c)Fiana: a aproximao com esta tambm resultante de um desvio deperspectiva.Agarantiafidejussriacontratoacessrio,aopassoqueocontratoporterceiroprincipal.

    Tal qual ocorre na estipulao em favor de terceiro, aqui tambm h duasfasesaconsiderar:

    I Uma primeira, da formao, em que comparecem dois contratantes, econcluemumnegciojurdiconoqualsomenteelessopartesesointeressados.

    II Uma segunda fase, da execuo, emque surge uma terceira pessoa, e,dandoa suaanuncia,obrigaseaumaprestao,paracomocredor, segundooque fora estipulado com o devedor na primeira fase. Este ato negocialcompreende, assim, dois devedores. O credor sempre o mesmo, com direitooponvel a seu contratante at a anuncia do terceiro, e contra este a partir deento. Os dois devedores so, portanto, sucessivos, e no simultneos.Primeiramente, o credor o daquele que se obrigou a obter a prestao do

    30

  • terceiro umavezd este a sua anuncia, o credorpassa a ter direitodeobter asolutio contra ele.A sucessividadeda relaodebitria est emqueo terceiro anadaobrigadoenquantonoderoseuacordo,assumindo,destarte,aobrigaodeprestar.

    Acaractersticaessencialdestaespcienegocialestassentadaprecisamenteemquenonascenenhumaobrigaoparao terceiroenquantoelenoderoseuconsentimento.Podeseprometeraprestaodefatodoterceiro,masobviamenteno se pode compelilo a executar a prestao prometida.28 Durante a primeirafase,existeumaobrigaoparaquemcontratoucomocredor,assegurandoaestequeoterceirofariaaprestao.Adenominaodonegcionodireitofrancsdbem a ideia de sua posio: convention de portefort, originria da frmulaadotada na celebraodo ajuste, quandoo devedor primrio se portefort pourun tiers (CdigoCivil francs, art. 1.120),ounoexemplodadoutrina: jemeportefort que Pierre vous paiera cent, equivalente a prometo que Pedro lhepagarasomaindicada.29

    Aanlisedaconvenoeasuadecomposionasduasfasesesclarecembemasuaestrutura,quantoaosseusefeitos.

    Noprimeiromomento (formao), odevedorprimrio ajusta a constituiodeumaobrigaoconvencionalcomocredor,dequemsetornadevedor.Oobjetodasuaobrigaoconseguirqueo terceiroseobrigueprestao, isto,queoterceiro consinta em tornarse devedor de certa prestao.30 Ele no deve aprestao final, porque esta ficar a cargo do terceiro, mas devedor de umaprestaoprpria, aqual consiste emobter o consentimentodo terceiro.No sedesobrigaria, porm, mostrando que envidou esforos no sentido de obter aanuncia, porque a sua obrigao, na terminologia que registramos no n 32,supra(volumeII),dacategoriadasderesultado,enodemeiosdevedordeumaobrigao de fazer, consistente em conseguir o compromisso do terceiro.31

    Seo terceiro consente, obrigase, e com isto executase a obrigaododevedorprimrio.

    Mas,senoofizer,odevedorprimrio(devedordaconvenodeportefort) inadimplente. E, como se no trata de prestao fungvel, porque adstrita obteno de compromisso de um terceiro, sua inexecuo sujeitao a perdas edanos (Cdigo Civil, art. 439). A fixao do objeto da obrigao, como bemacentuaSerpaLopes,essencialparaquesedsubstnciaobrigao,eparaquesecaracterizemosseusefeitos.Oobjetodaobrigaododevedorprimrionolimitadoaumesforonosentidodeobteroconsentimentodoterceiro.maisdo que isto. Consiste em atingir um resultado: obter aquele compromisso.

    31

  • Assegurando que o terceiro se obrigaria a determinada prestao, haverinadimplemento se o terceiro negar o seu consentimento. E, ento, as perdas edanossodevidas.Umavezqueoterceiroanuaeseobrigue,odevedorprimrioexonerase, nos termos do art. 440, e no responde perante o credor caso hajainadimplemento do terceiro. Ele no um fiador do terceiro no corresponsvel pelo cumprimento especfico da obrigao que o terceiro vem aassumir.Ocontedodaobrigao,comoobservaMessineo,nodiretamenteofato do terceiro.32 o compromisso do terceiro. A sua obrigao extinguesequando o terceiro assume o compromisso de prestar. E, se no o faz, o credortemaocontraestequeseobrigouaodbitoespecfico,enocontraaquelequese comprometeu a conseguir o compromisso.Os objetos das obrigaes no seconfundem.Pornoatentarnisto,muitosescritoressedesviamdobomcurso,enem Clvis Bevilqua escapou,33 sustentando tese desafinada da natureza doinstituto, provavelmente mal inspirado na defeituosa redao do dispositivo doCdigode1916porelecomentado,repetidonoCdigoCivilde2002.precisodeixarbemcertoqueopromitenteno fiadordo terceiro,emboranada impeaquesecomprometanaduplaqualidadedeportefortedefiador.Querdizer:queseobriguepelofatodoterceiroeaomesmotempoassumaoencargodesubstitulocomoseugarante,nocasodefaltareleexecuodoquevenhaaseroobjetoespecficodoprpriofato.34

    O promitente no se exonera, com fundamento nos motivos da recusa doterceiro. Este pode ter razes poderosas para isto, e mesmo assim o devedorprimrio est sujeito a ressarcir perdas e danos. Seu compromisso era obter oconsentimento do terceiro, e no apenas conseguir os motivos da recusa doterceiro.

    Eximese,entretanto,decomporoidquodinterest,35quandoaprestaodoterceiro no pode ser feita por impossibilidade ou por iliceidade. No primeirocaso,aobrigaonotemobjeto(obrigaseodevedoraqueoterceirolhealugueum cavalo, e este morre) no segundo, no pode o credor fazer de um objetoilcito fonte de obrigao jurdica (obrigase a obter que a autoridade policialconcedalicenaparaqueocredorinstaleumacasadetavolagem).

    Noseexoneraopromitenteemrazodaincapacidadedoterceiro,poisnadaimpedequeseobriguepelaprestaodefatodeummenoroudeuminterdito,eat de pessoa futura, como o caso, alis frequente, de quem assume ocompromissodeobteroacordodeumasociedadeemviasdeconstituio.36Emtodas essas hipteses o devedor primrio responde pelas perdas e danos se oacordonoobtido,comonocasoderecusloomenoraoatingiramaioridade,

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  • 206A.

    oudaautoridadejudicirianegarautorizaoparaoato,oudesenoconstituirasociedade,oudeseusrgosdeliberativosdecidirememcontrrio.

    O pargrafo nico do art. 439 contm uma exceo regra do dever deindenizarporpartedopromitente emcasode recusado terceirode anuir comaobrigao:quandoo terceiroforcnjugedopromitenteeavalidadedoatoaserpor ele praticado depender de outorga uxria, desde que eventual indenizaoimpostaaopromitentepossa,emrazodoregimedebens,afetaropatrimniodocnjugequenoanuiuemseobrigar.Seassimnofosse,aresponsabilizaodopromitenteacabariapor implicar, igualmente, a responsabilidadedo terceiro, emrazodoregimedebensdecorrentedocasamento.

    CONTRATOCOMPESSOAADECLARAR

    O contrato com pessoa a declarar modalidade contratual sem origem noDireitoRomano,dadoocarterpersonalssimodasobrigaes,incompatvelcomacircunstnciadeduaspessoascelebraremumcontrato,cujosefeitosdesbordemdelas. Tradicionalmente, os direitos nascidos de um contrato percutem nos quedele participam, seus herdeiros e subrogatrios, seus cessionrios, ou de quemlhesassumaasobrigaes.FoioCdigoCivilitalianode1942quelheimprimiutipicidade, nos artigos 1.401 e segs. O Cdigo Civil brasileiro de 2002 ointroduziu em nossa tipologia contratual nos seus arts. 467 a 471, posto quedesabrigadodeumatradioefetivaemnossavidanegocial,masquepoder,nofuturo,proporcionarconsequnciasteis.

    Nosetrata,comoaepgrafedaSeoIXparecesugerir,decontratoemqueuma das partes seja desconhecida, ou em que somente existe manifestao devontade unilateral. Isto seria a negao do contrato, que inexiste sem duplaemissovolitiva.OCdigo referese aumnegcio jurdicobilateral, noqual jexisteoconsentimentodaspartes.Ocontratojestformado.Nelefica,todavia,consignado que um dos contratantes reservase a faculdade de indicar a pessoaque adquirir, em momento futuro, os direitos e assumir as obrigaesrespectivas(electioamici).Aspartescontratantesestodefinidase identificadas.Oquerestavirapessoadesignadaocuparolugardesujeitodarelaojurdicaassimcriada(CdigoCivil,art.467).

    Aindicaodapessoadeveserfeitanoprazoestipulado,ou,emsuafalta,nodecincodias,paraoefeitodedeclararseaceitaaestipulao(art.468).Emfacedepronunciamentopositivo,oterceiroindicadotomaolugardapartecontratante.

    Desdobrase, desta sorte, o contrato em duas fases. Numa primeira, o

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    estipulante comparece em carter provisrio, permanecendo a avena entre umcontratante certo, e outro, meramente indicado, porm dependente de aceitao.Numasegunda,onomeadopassaaserodominusnegotii.

    Opargrafonicodoart.468instituiaatraodaformaparaaaceitaodoterceiro,querevestiradocontrato,sobpenadenotereficcia.Aformaparaaaceitao serobrigatoriamenteadocontrato, aindaqueno sejaa impostapelalei.

    Defineoart.469oefeitoretrooperantedaaceitao.Umavezmanifestada,consideraseque,aoadquirirosdireitoseassumirasobrigaes,estevepresentecomopartecontratantedesdeadatadocontrato, independentementede jexistirentendimentosentreelaeocontratantequeadesignou,oudeinexistirem.

    Deste efeito retroativo resulta a controvrsia a propsito da caracterizaojurdicadestafiguracontratual.Oraseentendecomoumaestipulaoemfavordeterceiro,oracomoumcontratocondicional,oraintegradonagestodenegcios,traduzindoseaaceitaodo terceironomeadocomoaprovaoou ratificaodocontratocelebradoemseunome.

    Segundo a dogmtica italiana, que oCdigo adotoupormodelo, o contratoporpessoaaindicarumnegciojurdicovlido,dotadodeobrigatoriedade.Seonomeado aceita na forma e nas condies estabelecidas nos arts. 468 e 469,adquireosdireitoseassumeasobrigaes.Substitui,portanto,quemodesignounatitularidadedasrelaesjurdicas.Senoaceita,nemporissoperdeocontratosua eficcia. Continua vlido, subsistindo entre os contraentes originrios (art.470,I).

    Omesmoocorrersenoprazoestipulado,oulegal,noforfeitaaindicaoebemassimseapessoanomeadaera insolvente, independentementedeooutrocontratanteconhecerounoainsolvncianomomentodaindicao(arts.470,II,e471).

    Cf.ColinetCapitant,DroitCivil,vol.II,n132SerpaLopes,Curso,vol.III,n67DePage,Traitlmentaire,vol. II,parte I,n664Demogue,Obligations,vol.VII,nos

    815esegs.Proprietrio.Emnomealheio.Gestodenegcios.Onegcioquefeitoentreuns,nemprejudicanembeneficiaaoutros.ClvisBevilqua,Comentrioaoart.1.098doCdigoCivilde1916.

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    Vnculojurdico.DePage,ob.cit.,n663.ColinetCapitant,ob.cit.,n130.Demogue,ob.cit.,n829.MazeaudetMazeaud,Leons,n782.DePage,ob.cit.,n677.MazeaudetMazeaud,ob.cit.,n776.DePage,ob.cit.,n671.Nestesentido,verexemplificativamenteoart.546doCdigoCivil.Doaosobmodo.Nigumpodeseobrigarporoutro.Cf.Institutiones,liv.III,tt.XX,19Digesto,liv.44,tt.VII,fr.11.ColinetCapitant,ob.cit.,n125.Cf.Pothier,Oeuvres,vol.II,n87.Trabucchi,Istituzioni,n286.Demogue,Obligationes,vol.VII,n782.Emdecorrnciadapessoadocredor.Barassi,Obligazioni,vol.II,n146.Demogue,Obligations,vol.VII,n794.DePage,Traitlmentaire,vol.II,parteI,n680.Cf.SerpaLopes,Curso,vol.III,n75.Trabucchi,Istituzioni,n286.ColinetCapitant,DroitCivil,vol.II,n139.SerpaLopes,loc.cit.Demogue,Obligations,n733DePage,Trait,vol.II,parteI,n895.Messineo,DottrinaGeneraledelContratto,pg.414.ClvisBevilqua,Comentrioaoart.929doCdigoCivilde1916.DePage,ob.cit.,n734.Oqueinteressa.Demogue,Obligations,vol.VII,n896.

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    CAPTULOXLIIVCIOSREDIBITRIOS

    Sumrio207. Conceito de vcio redibitrio.208. Efeitos dos vcios redibitrios. 208A.Responsabilidadecivildofabricante.

    Bibliografia

    ClvisBevilqua,ComentriosaoCdigoCivil,vol. IV,aosarts.1.1011.106M. I. Carvalho de Miranda, Doutrina e Prtica das Obrigaes, edioatualizadaporJosdeAguiarDias,vol.II,nos692esegs.SerpaLopes,Curso,vol.III,nos96esegs.ColinetCapitant,DroitCivil,vol.II,nos576esegs.DePage, Trait lmentaire, vol. IV, parte I, nos 176 e segs. Fubini, NatureJuridique de la Responsabilit du Vendeur pour les Vices Cachs, in RevueTrimestrielle de Droit Civil, 1903, pgs. 179 e segs. Cunha Gonalves, DaCompraeVendanoDireitoComercialBrasileiro,nos 128 e segs.Mazeaud etMazeaud,LeonsdeDroitCivil, vol. III, nos977e segs.Trabucchi, IstituzionidiDirittoCivile,n322RuggieroeMaroi,IstituzionidiDirittoPrivato,141Planiol,RipertetBoulanger,TraitlmentairedeDroitCivil,vol.II,nos2.477esegs.

    CONCEITODEVCIOREDIBITRIO

    cio redibitrio o defeito oculto de que portadora a coisa objeto de contrato

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  • Vcomutativo, que a torna imprpria ao uso a que se destina, ou lheprejudicasensivelmenteovalor.assimque,mutatismutandis, todososescritoresodefinem,equeoCdigoCivilentendenoart.441.

    O Cdigo de Proteo e Defesa do Consumidor estende a garantia pordefeitosnosprodutosdeconsumodurveisouno,desconformidadeemrelaos indicaes constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem oumensagempublicitria, respeitadas contudo as variaes decorrentes de sua natureza,podendooconsumidorexigirasubstituiodaspartesviciadas(Lein8.078,de13.09.1990,art.18).

    Noseaproximaontologicamenteoconceitodevcioredibitriodaideiaderesponsabilidade civil. No se deixa perturbar a sua noo com a indagao daconduta do contratante, ou apurao da sua culpa, que influir contudo nagraduao dos respectivos efeitos, sem aparecer como elemento de suacaracterizao.Oerrotemsidoapontadocomoseufundamento,comoargumentode que o agente no faria o contrato se conhecesse a verdadeira situao(Carvalho de Mendona) na teoria dos riscos vai justificlo Brinz naresponsabilidadedovendedorpelaimpossibilidadeparcialdaprestao,assentaoRegelsberger vai Windscheid liglo pressuposio Cunha Gonalves achaumavariantedestanainexecuodoalienante:VonIheringprendeoequidadeFubini toma em considerao a finalidade especfica da prestao.1 Para ns, oseu fundamento o princpio de garantia, sem a intromisso de fatoresexgenos, de ordem psicolgica ou moral. O adquirente, sujeito a umacontraprestao,temdireitoutilidadenaturaldacoisa,e,seelalhefalta,precisadeestargarantidocontraoalienante,paraahiptesede lhe serentreguecoisaaque faltem qualidades essenciais de prestabilidade, independentemente de umapesquisa de motivao. Por isto, Tito Fulgncio, em sntese apertada e feliz,enunciao, dizendo que o alienante , de pleno direito, garante dos vciosredibitrios.2Ao transferir ao adquirente coisa de qualquer espcie, sejamvel,seja imvel, por contrato comutativo, tem o dever de assegurarlhe a sua possetil, senoequivalente rigorosa, aomenos relativadopreo recebido.E, se elanoseprestasuafinalidadenatural,ousenoguardaparalelismocomovalordeaquisio,prejudicadapordefeitooculto, temoadquirenteodireitodeexigirdotransmitenteaefetivaodoprincpiodegarantia.

    Segundo o que se deduz da norma legal, e dos princpios doutrinriosassentes, alinhamse alguns requisitos de verificao dos vcios redibitrios, asaber:

    AOs defeitos devem serocultos, pois que os ostensivos, pelo fato de o

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  • serem, se presumem levados em considerao pelo adquirente, que no enjeitoumasrecebeuacoisa.Averificaodesterequisitosvezesdifcilnaprtica,jque um defeito pode ser oculto para uma pessoa e perceptvel facilmente paraoutra. A apurao farse, entretanto, in abstracto, considerandose oculto odefeitoqueumapessoa,quedisponhadosconhecimentostcnicosdoadquirente,ouqueumapessoadedilignciamdia,senoforumtcnico,possadescobriraumexameelementar.3Nosereputaocultoodefeitosomenteporqueoadquirenteo no enxergou, visto como a negligncia nomerece proteo.Ressaltese queemrelaesdeconsumoestacaractersticanoexigida,podendooprodutoouservioserenjeitadoaindaqueovciosejaaparenteoudefcilconstatao(art.26,Lein8.078/1990).

    B Devero ser desconhecidosdo adquirente se deles tiver conhecimento,mesmoquenosejamaparentes,nosepodequeixardesuapresena.

    CSomenteselevamemcontaosjexistentesaotempodaalienaoequeperdurem at o momento da reclamao. Os supervenientes afetam coisa jincorporada ao patrimnio do adquirente e se houverem cessado, deixam ademanda sem objeto.4 Exceo a esta orientao se faz quanto aos defeitosrelativosaprodutoseserviosobjetosderelaodeconsumoregidospelaLein8.078/1990,aqualpermiteatuteladovciosupervenienteformaodocontrato,desde que no tenha sido causado por ato prprio do consumidor, pelo usoinadequadoouinapropriadodoprodutoouservio.

    D No qualquer defeito que fundamenta o pedido de efetivao doprincpio, porm aqueles que positivamente prejudicam a utilidade da coisa,tornandoa inaptassuas finalidades,ou reduzindoasuaexpressoeconmica.5

    Nasrelaesdeconsumo,noentanto,permiteseaexecuodagarantia tambmquandohdisparidadecomasindicaesconstantesdorecipiente,daembalagem,rotulagemoumensagempublicitria, respeitadasasvariaesdecorrentesdesuanatureza,podendooconsumidorexigirasubstituiodaspartesviciadas(art.18,Lein8.078/1990).

    O seu campo de ao o contrato comutativo. Alguns Cdigos omantmcomo integrantesdasobrigaesdovendedor (francs, italianode1865, italianode1942,montenegrino,espanhol,alemo,suodasObrigaesetc.)oargentinoinsereo na disciplina dos contratos comutativos o Projeto Felcio dos SantoscuidavadelesnapartegeraldoscontratosoCdigoCivilbrasileiroconsolidaasua dogmtica na parte geral dos contratos, mas em particular restringe a suaincidncia aos contratos comutativos. A estes, entretanto, e para o efeito deabrigar a teoria dos vcios redibitrios, a lei equipara as doaes onerosas

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    (Cdigo Civil, art. 441, parg. nico), porque, se no perdem o carter deliberalidade, impem ao donatrio uma prestao em favor de outrem,determinadaouindeterminadamente(v.n233,infra).

    Desde que se configurem as condies de sua ocorrncia, o alienanteresponde pelos vcios redibitrios. No se exime, ainda que os ignore (CdigoCivil, art. 443 Cdigo de Defesa do Consumidor, art. 23), pois que ofundamento da responsabilidade, como vimos, no a sua conduta,mas pura esimplesmenteaaplicaodoprincpiodegarantia.Enoseexonera,igualmente,seacoisa, jempoderdoadquirente,vierapereceremrazodovcioocultoepreexistente (Cdigo Civil, art. 444), pois se certo que res perit domino,6 arelao de causa e efeito, contudo, entre o perecimento e o defeito implica aresponsabilidadedoalienante.Nestecaso,oadquirentetemdireitoaoreembolsodo preo, posto no restitua a coisa perempta.7 Ressalvase, porm, operecimento devido a caso fortuito, e no em consequncia do defeito anterior,para absolver o alienante da garantia, pois que o dano lhe viria de qualquermaneira.8Igualsoluomereceoperecimentodevidoculpadoadquirenteenoaovciooculto.9E,denossaparte,acrescentaramoscasusanullopraestantur:10

    ningumpodeserresponsabilizadopelofortuito.Tambmnocaberesponsabilidadeseacoisaforalienadaemhastapblica,

    nosporqueasuaexposioprviapossibilitariaminuciosoexame,comoaindapelofatodeserforada,emprocessojudicial,emqueserealizaporautoridadedajustia.Alis,deesclarecerqueporvendaemhastapblicadeveentenderseaque se faa compulsoriamente (penhora em ao executiva, venda pordeterminaojudicialeminventrio,vendadebensderfosetc.),poisque,seointeressadolivrementeescolheuoleiloparaaalienao,subsistiragarantia.11

    Descabe, finalmente, se tiver havido, por parte do adquirente, rennciaexpressa ou tcita garantia. Ressalvamos que, em hiptese de relao deconsumo, considerada abusiva a clusula contratual que estabelea a rennciapelo consumidor garantia pelos defeitos do produto ou servio, por fora dodisposto nos arts. 25 e 51, I, da Lei n 8.078/1990. Em contratos de adesocelebradosnombitode relaesparitrias,consideramsenulas,nos termosdoart. 424, as clusulas que estipulem a renncia antecipada do aderente a direitoresultantedanaturezadonegcio,dentreasquaisse inserearennciagarantiaporvciosredibitrios.

    EFEITOSDOSVCIOSREDIBITRIOS

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  • Recebida a coisa portadora de vcio ou defeito oculto, pode o adquirenteenjeitla redibindo o contrato. No obrigado, evidentemente, a manter onegcio e conservar a coisa que no se preste sua finalidade, ou estejadepreciada.Evoltamaspartesaostatuquoante.12JoDireitoRomano,atravsda palavra de Ulpiano, havia disciplinado o instituto e determinado este efeito:Reddhibereestfacereutrursushabetvenditorquodhabuerit:quiareddendoidffiebat, idcirco reddhibitio est appellata. quasi redditio.13 Devolver oadquirenteobem,ouopordisposiodoalienante.Eeste terde restituiropreo,maisasdespesasdocontrato.Aqui,nesteponto,quetemimportnciaaapurao da conduta do alienante, que ver sua responsabilidade agravada seconheciaodefeito,casoemque,almdarestituiodopreo,emaisdespesasdocontrato, temderessarciraoadquirenteasperdasedanosconsequentes(CdigoCivil,art.443).

    Pode acontecer que, portadora embora do vcio oculto, a coisa ainda tenhautilidadeparaoadquirente,enosejadeseuinteresse,nemdesuaconvenincia,enjeitla, devolvendoa ao alienante por via da ao redibitria (actioreddhibitoria no Direito Romano,Wandelung no direito alemo). Em tal caso,facultalhe a lei outra ao, a estimatria ou de abatimento de preo (actioaestimatoriaouquantiminorisnoDireitoRomano,Minderungnoalemo),pelaqual o adquirente, conservando a coisa defeituosa, reclama seja o seu preoreduzidodaquiloemqueodefeitoocultoadepreciou,paraquenoopagueporinteiro,ou,sejotiverfeito,paraqueobtenharestituioparcialdodespendido(art.442,CdigoCivil eart.18,1, III,CdigodeDefesadoConsumidor).Esta faculdade no pode ser levada ao extremo de criar para o adquirente umafonte de enriquecimento, mas deve ser de damno vitando,14 limitada aproporcionaraoadquirenteumasoluoequitativa,queoresguardedepagarpelacoisadefeituosaopreodeumaperfeita.

    A leicria,desta sorte,umaobrigaoalternativa abenefciodoadquirente.Oalienantedevearedibiodocontratoouadiferenadepreo.Aindacabeumaterceiraopoacargodoadquirente,quandoconsumidor,queseriaasubstituiodoprodutoporoutrodamesmaespcie,emperfeitascondiesdeuso(art.18,1,I,Lein8.078/1990).Comoaescolhacabeaocredor,faresteaopo,como efeito de concentrar a prestao (v. n 144, supra, vol. II). Da afirmarse,comboaextrao,queaescolhairrevogvel.Umavezfeita,noadmiterecuoelectaunavianondaturrecursusadalteram.1516Opiniocontrriaseencontrana doutrina alem, em razo do 465 doBGB permitir o pedido alternativo, edispor que a redibio ou o abatimento do preo se consideram adquiridos no

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  • momento emqueovendedorder a sua aquiescncia.Odireito francs, almdeoutros casos em que negada a opo ao adquirente, facultalhe to somente aaodeabatimentodepreoquandoojuizestimaovcioocultopequenodemaisparafundamentararedibio.17

    Odireitodoadquirenteestsujeitoaprazodecadencial,quevariadeacordocomanaturezadobem:paraosbensimveis,oprazodeumano,enquantoparaos mveis, o prazo de trinta dias, ambos contados da tradio (art. 445 doCdigo Civil). O codificador de 2002 previu, ainda, a reduo desses prazos metadenahiptesedeoadquirenteterdesdelogoapossedobem,efixoucomotermoinicialnojaefetivaentrega,masaalienao.

    Oprazode30diassuficientequandoacoisamvelmaissimples,sendoexguo para os aparelhos complexos (instrumentos de difcil instalao, avies,motoresetc.).Sentindoo,aprticadosnegcioscorrigeaimperfeiolegalcoma instituio deprazos de garantia, durante os quais o alienante responde pelaperfeiodacoisatransferida,eobrigaseatasubstitula,sesetornarinaptasuadestinao.Equivaleaclusulaaumasuspensoconvencionaldadecadncia(v.n123,supra,volumeI)e,aplicadaespcie,importaemque,atoadventodotermoajustado,estinibindooalienantedeinvocaradecadnciadodireitodoadquirente, que pode postular a efetivao da responsabilidade pelo vcioredibitrioalmdoprazolegaldedecadnciadaao.

    esta uma dasmodificaes da garantia contra os vcios redibitrios. Elapode ser reforada e reduzida, o que a doutrina j havia admitido, e ajurisprudncia aprovado mesmo antes do Cdigo Civil de 2002, que espancouqualquerdiscussosobreaquestoaodeterminarexpressamente,noart.446,queos prazos para a invocao de vcio redibitrio no correm na constncia declusuladegarantia.Deacordocomodispositivo,oadquirentedevedenunciarodefeitoaoalienantenos30(trinta)diasseguintesaoseudescobrimento,sobpenadedecadncia.Seinterpretadoemsualiteralidade,oart.446trariaumainvoluoem temadevcios redibitrios, poispoderia conduzir ao entendimentodequeodefeitodeveserdenunciadonos30diasseguintesaoseudescobrimento,sobpenadedecadncia,adespeitode,eventualmente,aindarestarprazoparaoexercciodaredibio. Mesmo antes do Cdigo Civil de 2002, essa orientao no sesustentava,doutrinae jurisprudncia j admitiamo inciodacontagemdoprazoparaoexercciodaredibioapartirdofimdoprazodegarantia,noimportandoomomentoemqueovcioseapresentou.

    Oprazodegarantiaconstitui,pois,umreforamento,echegamesmoasermaisdoquearesponsabilidadepelovciooculto,porqueabrangeaseguranade

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    bom funcionamento. Reversamente, lcito reduzir a garantia, o que constituicautela adotada por quem negocia em objetos usados, por exemplo: o alienanteeximese de responder pelos defeitos ocultos, ou apenas restringe aresponsabilidade.Masclaroqueumaclusuladestasortenoprevalecerseoalienante j temconhecimentododefeito,porqueno jurdicoqueumapessoapossaextraircondiofavorveldamfcomqueseconduza.18

    Ocodificadorde2002previuno1doart.445regraconsideradaambguapor alguns.De acordo com o dispositivo, quando o vcio, por sua natureza, spuder ser conhecido mais tarde, o prazo contarse do momento em que deletivercincia,atoprazomximode180(centoeoitenta)dias,emsetratandodebens mveis e de um ano, para os imveis. Duas so as possibilidadesinterpretativas:i)contarosprazosalifixadosapartirdomomentoemqueovcioforrevelado,independentementedotempotranscorridodesdeaalienaodobemou ii) considerar tais prazos o limite temporal mximo para o surgimento dovcio.

    Aprimeira soluovai aoencontrodadisciplina expressamenteprevistanoCdigo de Defesa e Proteo ao Consumidor, no 3 do seu art. 26, quedeterminaoinciodacontagemdoprazonomomentoemqueficarevidenciadoodefeito. No entanto, admitirse que por interpretao se chegue ao mesmoresultado no mbito de relaes paritrias, importa atribuir ao alienanteresponsabilidade por tempo indeterminado, uma vez que, por maior que seja otempo transcorrido desde a alienao, o adquirente sempre poder acionar oalienante,desdequeofaanoprazodecadencialde180diasou1ano,conformeanaturezamvelouimveldobem,contadodoconhecimentodovcio.

    A crtica quela orientao conduz, inevitavelmente, adoo do segundoentendimento, de acordo com o qual os prazos previstos no 1 do art. 445encerram o limite mximo dentro do qual o vcio deve surgir para que sejapossvel imputar responsabilidade ao alienante. Nesse sentido, quando o vcio,porsuanatureza,spuderserconhecidomaistarde,oprazodecadencialserde210dias (180diasparao surgimentodovciomais30diasparao exercciodaredibio),nocasodemveis,ededoisanos(1anoparaosurgimentodovcioemais 1 ano para o exerccio da redibio), no caso de imveis, contados datradio.

    RESPONSABILIDADECIVILDOFABRICANTE

    A tendncia moderna de proteo ao consumidor levou a considerar que a

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    teoria dos vcios redibitrios revelase insuficiente. Construiuse, ento, adoutrinadaresponsabilidadecivildo fabricante,cujaessncia reconheceraodiretacontraoprodutor,paracoberturadedanocausadonautilizaodeprodutosacabados,querevelemdefeitosatribuveisfabricao.19

    OCdigodeDefesaeProteoaoConsumidorestabelecepreceituaomaisrigorosa, impondo a substituio do produto por outro da mesma espcie, emperfeitascondiesdeuso,earestituioimediatadaquantiapaga,devidamentecorrigida,almdasperdasedanos,ouaindaabatimentodopreo.

    Num reforo das garantias do adquirente o mesmo Cdigo de Proteo eDefesadoConsumidor (Lein8.078,de13.12.1990)asseguraaoconsumidorainverso do nus da prova no processo civil, quando, a critrio do juiz, forverossmil a alegao, ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regrasordinriasdeexperincia(art.6,nVIII).

    Cf.M.I.CarvalhodeMendona,DoutrinaePrticadasObrigaes,vol. II,n696SerpaLopes,Curso,vol.III,n98.TitoFulgncio,Programas,vol.II,QuadroXXX,pg.78.MazeaudetMazeaud,Leons,vol.III,n982.BaudryLacantinerie et Saignat,Della Vendita e della Permuta, n 418 De Page,Traitlmentaire,vol.IV,parteI,n177.Cf.a respeitodascondiesdeocorrnciadosvciosredibitrios:M.I.CarvalhodeMendona,ob.cit.,n695SerpaLopes,ob.cit.,n99ColinetCapitant,DroitCivil,vol.II,n578DePage,ob.cit., loc.cit.CunhaGonalves,DaCompraeVenda,n129BaudryLacantinerieetSaignat,DellaVenditaedellaPermuta,nos 416e segs.Planiol,RipertetBoulanger,Traitlmentaire,vol.II,n2.478.Acoisaseperdeparaoseudono.MazeaudetMazeaud,ob.cit.,pg.380.ClvisBevilqua,Comentrioaoart.1.104doCdigode1916ColinetCapitant,ob.cit.,n580bis.MazeaudetMazeaud,n987RuggieroeMaroi,Istituzioni,vol.II,141.Ningumresponsvelpelocasofortuito.DePage,ob.cit.,n175Planiol,RipertetBoulanger,Traitlmentaire,vol.II,n2.479.Estadoanterior.Digesto,liv.XXI,tt.I,fr.21,1.Evitarodano.Eleitaumasoluonopodeseadmitirrecursoalternativo.

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    Cf.TeixeiradeFreitas,Esboo,art.3.589CarvalhodeMendona,Obrigaes,vol.II,n 700 Clvis Bevilqua, Comentrio ao art. 1.105 Trabucchi, Istituzioni, n 322AubryetRau,Cours,vol.V,355bis.MazeaudetMazeaud,ob.cit.,n987.Cf. a respeito da modificao convencional do princpio de garantia Mazeaud etMazeaud,ob.cit.,n992DePage,ob.cit.,n189Planiol,RipertetBoulanger,ob.cit.,n2.488.R.A.Mankiewiez,LaResponsabilitduFabricant,inRevueInternationaledeDroitCompar,1956,241GuidoAlpaeMrioBessone,LaResponsabilitadelProduttore,pgs.137esegs.PhilippeMalinaud,LaResponsabilitduFabricant,inBoletimdaFaculdade de Direito de Coimbra, vol. LV, pgs. 9 e segs. Caio Mario da SilvaPereira, ResponsabilidadeCivil do Fabricante,RevistaForense, vol. 285, pg. 7CaioMariodaSilvaPereira,ResponsabilidadeCivil,pgs.153esegs.

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  • 209.

    CAPTULOXLIIIEVICO

    Sumrio209.Noogeraldeevico.210.Efetivaodagarantia.211.Evicoparcial.

    Bibliografia

    Alberto Trabucchi, Istituzioni di Diritto Civile, n 321 Ruggiero e Maroi,IstituzionidiDirittoPrivato, vol. II, 141ClvisBevilqua,Comentrios aoCdigoCivilBrasileiro,vol.IV,aosarts.1.107esegs.SerpaLopes,CursodeDireito,vol.III,nos103esegs.ArangioRuiz,Evizione,inDizionarioPraticodiDirittoPrivato, deScialojaPlaniol,RipertetBoulanger,Trait lmentairedeDroitCivil,vol.II,nos2.529esegs.Gaudemet,Obligations,pg.357ColinetCapitant,CourslmentairedeDroitCivilFranais,vol. II,nos529esegs.Mazeaud et Mazeaud, Leons de Droit Civil, vol. III, nos 952 e segs. CunhaGonalves,DaCompraeVenda,nos136esegs.SebastiodeSousa,DaCompraeVenda, n 127DomenicoRubino,LaCompravendita, n 169M. I.Carvalhode Mendona,Doutrina e Prtica das Obrigaes, ed. atualizada por Jos deAguiar Dias, vol. II, nos 705 e segs. Enneccerus, Kipp y Wolff, Tratado,Derecho de Obligaciones, vol. II, 106 Paulo Barbosa de Campos Filho,DaEvicodoArrematante.

    NOOGERALDEEVICO

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  • Quandoalgumadquireodomnio,aposseouousodeumbem,porcontratooneroso,estvisandoaumautilidadequecorrespondecontraprestaoefetuada.Nosnos 207 e 208 cogitamos dos defeitosmateriais da coisa

    recebida, deduzindo a teoria dosvcios redibitrios.Nopresente captulovamostratardodefeitodedireito,queaatinja.Ateoriadosvciosredibitriosaproximasedaevico,porqueumaeoutravoassentararesponsabilidadedoalienantenamesma razo jurdica, que o princpio de garantia, oferecido pela lei aoadquirentecontraoalienante.

    Chamase evico a perda da coisa, por fora da sentena judicial, que aatribui a outrem, por direito anterior ao contrato aquisitivo:1 Evincere estvincendoiniudicioaliquidauferre.2

    Analisandoestadefinio,encontramos,aumasvez,osseusrequisitoseodesenvolvimentodoinstituto:

    A Perda da coisa. Recebendoa o adquirente em estado de servir, e semquesofraaaodequalquerdefeitoocultoqueaatinja,vemaperdlaprivandosedodomnio,daposseoudouso.Aperdapodesertotalouparcial,conformeoadquirentesejadeladespojadonasuaintegridadeouapenasparcialmente.

    BSentena.Noqualquerperdaqueconstituievico,masaquelaqueseoperaemvirtudedesentenajudicial.Operecimentodoobjeto,asuadestruio,a sua subtraopelasviasde fatode terceiro sohipteses emqueoadquirentesofreaperdadacoisaoudesuautilizao.Masnoocorreevico,porqueestapressupe um pronunciamento da Justia.No obstante a exatido do princpio,conformecomaestruturalegaledogmticadoinstituto,casoshassemelhveisevico, produtores dosmesmos efeitos jurdicos desta. 1 Abandono da coisaantes de sentena, quando o direito do terceiroreivindicante de tal formaincontroverso que o prosseguimento do litgio implicaria injustificadarecalcitrncia e emdispndio intil de energia processual como financeira.Mas,para que o abandono possa equivaler evico, no pode ser arbitrrio doadquirente, porm nele h de convir o alienante.3 2 Remisso hipotecria, naforma do que dispe o art. 1.481 do Cdigo Civil, em virtude do qual oadquirente de um bem hipotecado, ante a alternativa de sofrer a excusso dahipoteca ou pagar o dbito garantido, opta por esta segunda hiptese e,despendendo soma em soluo da dvida do alienante, redime a coisa adquiridano ocorre a sua perda, por ter sido evitada com o dispndio realizado peloadquirente, o qual, por isto mesmo, tem a faculdade de proceder contra oalienante, como se fosse evicto. 3 Vias de fato de terceiro, confirmadasjudicialmente,nocasodeoadquirenteacorreremdefesadacoisaarrebatada,ena

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  • ao que intentar, para reivindicla ou sustentar a sua integridade jurdica, servencido sobo fundamento do direito anterior do terceiro demandado a analogiacom a evico est em que o pronunciamento judicial confirmatrio da situaofticacriadapeloterceirogeraamesmaconsequnciaqueproduziriaumasentenacondenando o adquirente a efetuar sua entrega a outrem. 4 Conservao dacoisaporttulodiversodocontratoaquisitivo,casoemquenoocorreaperdadobem recebido, porque o adquirente vem a consolidar seu direito em virtude deuma causa jurdica diversa, como, por exemplo, no caso de ser herdeiro doterceiro evidente, e tornarse dono por sucesso causamortis no h perda dobemjurdico,masfatalmenteoperderiasenoocorressea interfernciadeoutracausajurdicaparaasuareteno.4

    CAnterioridadedodireitodoterceiro.Aperdadacoisa,mesmoquesedpor sentena judicial, no caracteriza por si s a evico. Esta pressupe que opronunciamentodaJustiasefundaemcausapreexistenteaocontratopeloqualseoperou a aquisio do direito do evicto. Se este houver deixado constituir emfavor de algumumdireito quemotive a perda da coisa, sibi imputet5 e no vreclamar do alienante, pois que este lhe transferira umbem escorreito. Somentepodeo transmitente ser chamadoa responderpelaperda,quandoestadevidamotivao anterior ao contrato. Em caso de usucapio iniciado antes ecompletado depois da transmisso ao adquirente, a doutrina inclinase pela suaabsolvio,porque,estandonasmosdoadquirenteinterromperaprescrio,nopodeatribuiraoalienanteasconsequnciasdeterdeixadodefazloe toleradoacontinuaodeumaposseprejudicialaoseudireito.Asentenaatributivadacoisaao usucapiente no se baseia em causa anterior, porque o incio do prazo daprescrio aquisitiva era inidnea a converter a posse emdomnio requer o seuescoamentocompleto,eesteveioocorrerapsocontratoaquisitivo.6Ressalvase,contudo,aresponsabilidadedoalienanteseoprazoprescricionalsecompleta toprximodoatodeaquisioquenohajatempoparaqueoadquirenteconheaasituao e o interrompa.7 Exceo razovel ao princpio da anterioridade adesapropriao da coisa, posteriormente ao contrato, sempre que o decretodeclaratriodautilidadepblicajexistanomomentodatransmissoenotenhasido acusado pelo alienante,8 porque, embora a perda da coisa ocorraposteriormenteaocontratoaquisitivo,suacausaoantecede,enoestnasmosdoadquirenteevitla.

    Ocampodeaodateoriadaevicosooscontratosonerosos.Quasetodosos Cdigos, mesmo os mais modernos, disciplinam a evico no contrato decompra e venda. Mas no tm razo, porque este gnero de garantia no ficaadstrito a esta figura contratual.Andou bemo direito brasileiro, colocandoa na

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  • parte geral dos contratos, e foi fiel tradio romana que no limitava os seusefeitos emptiovenditio.9 Em princpio, o alienante no responde por ela noscontratosgratuitos,anoserqueexpressamenteodeclare.Abrese,porm,umaexceo legal para as doaes modais, porque, sem perderem o carter deliberalidade,assemelhamseaoscontratosonerosos,emrazodoencargoimpostoaodonatrio.

    O Cdigo de 2002 inovou em relao ao direito anterior, ao dispor quesubsiste a garantia da evico ainda que a aquisio se tenha realizado emhastapblica. Diante de tal regra, a pergunta cabvel, no respondida pelo Cdigo,consiste emse saberquemrespondepelaeviconaalienaoemhastapblica,tendo em vista que nessa hiptese a venda no se d espontaneamente peloproprietriodacoisa,massimpeloEstado,afimdequeterceirosejafavorecido.Imaginese a hiptese de um bem ser alienado em hasta pblica aps ter sidopenhoradoparaagarantiadeumaexecuocontraoproprietrio.Emocorrendoaevico,oadquirentedobemdeveexigir a indenizaopela suaperdadoantigoproprietrio, ou do credor que obteve o proveito com a venda que veio a serprejudicadaemrazodeumdireitoanterior?Naprimeirahiptese,aschancesdeo adquirente vir a obter a sua indenizao so diminutas, tendo em vista oprovvel estado de insolvncia do proprietrio que teve bem de sua propriedadelevado a hasta pblica. Na segunda hiptese, se estar transferindo aresponsabilidadepelaevicoaquemnuncafoiproprietriodacoisaevencida.

    Nosomentenatransmissodedireitosreaisqueocorrearesponsabilidadepela evico, seno tambmnade crditos.10Mas aquiosprincpiosvariamumtanto,poisque,conformejvimosnon181,supra(vol.I),ocedenterespondeto somente pela existncia do direito transferido (veritas nominis) e no pelasolvnciadodevedor(bonitasnominis).

    Ocorrendo a perda da coisa nas circunstncias mencionadas, o alienante responsvel.Esteoprincpioessencial.Aleiobrigaoaresguardaroadquirentecontraos riscosdaperda.Enopesadvidanaperquiriodo seu fundamento.Dentro de um esquemadedutivo, temos que no hmister, tal qual defendemospara a fundamentao da responsabilidade pelos vcios redibitrios (n 207,supra), incutir fatorao exgena. Bastanos proclamar o princpio de garantia,poisqueoadquirentetemdireitoareceberaprestaoquelhedeveoalienante,eseestenoeratitulardeumdireitoestremededvidas,serchamadoaasseguraroadquirentecontraaspretensesdeterceiros,earesponderpelasconsequnciasda vitria destes no pleito que se ferir. Noutros termos, o alienante deve aoalienatriogarantiaedefesacontraqualquerterceiroque,fundadoemumvciododireito daquele, prive ou pretenda privar o adquirente, total ou parcialmente, do

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  • 210.

    usopacficoda coisa.11A garantia contra a evico , assim, uma consequncianatural,emboranoessencialdaobrigaodeentregaracoisaalienada.12

    Por tudo isto, nos contratos onerosos no h necessidade de que seconvencione, para que prevalea a garantia. O alienante responde de direito(Ruggiero) ainda que no o declare, muito embora em frmula tabelioahabitualmente se reafirme. A garantia, convm repetir, opera ex lege e no excontractu.Mas, sendo como matria de ordem privada e no pblica, tm aspartesafaculdadedemodificla,quernosentidodoseureforo,quernodesuareduo,eatdesuaaboliocompleta(art.448)comoserexaminadanon210,infra.Excetuamseestaregra,asdisposiesconstantesdoCdigodeDefesadoConsumidor, que consideram abusivas as clusulas que exonerem ou atenuem aresponsabilidadedosfornecedoresouaindaimpliquemarennciadedireitos(art.51,I,daLein8.078/1990).Domesmomodo,consideramsenulas,nostermosdoart.424,asclusulasqueestipulemarennciaantecipadadoaderenteparitrioadireitoresultantedanaturezadonegcio,dentreasquaisseinserearennciagarantiaporevico.

    E,comosenofundanaculpadoalienante,vingaa responsabilidadedeste,aindaqueestejadeboaf.13

    EFETIVAODAGARANTIA

    Sendo uma garantia legal, e no convencional, em princpio, cabe aolegisladorestabelecera suaextenso.Ocorrendoaperda judicialdacoisa, temoadquirente a faculdade de voltarse contra o alienante (CdigoCivil, art. 450) eexigir que este lhe restitua o preo pago, e mais as despesas com o contrato,honorriosdeadvogadoecustasjudiciaisnaaoquelheimpsaevicoeaindalhe indenizeos frutosque tiver sidoobrigadoa restituir, edemaisprejuzosqueda evico diretamente lhe resultarem. Neste passo, cabe esclarecer que oalienanterespondepelaplusvaliaadquiridapelacoisa,isto,adiferenaamaiorentreopreodeaquisioeoseuvalorao tempoemqueseevenceu (pargrafonico do art. 450), atendendo a que a lei manda indenizar o adquirente dosprejuzos,e,aocuidardasperdasedanos,oCdigoCivil(art.402)consideraasabrangentes no apenas do dano emergente, porm daquilo que o credorrazoavelmentedeixoude lucrar.E, seaevicovemprivlodacoisanoestadoatual, o alienante tem o dever de recompor o seu patrimnio, transferindolhesomapecuniriaequivalenteestimativadavalorizao. JeraestaaopiniodePothier,14 que sobrevive hoje, sem cunho de unanimidade, contudo. Se, ao

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  • contrrio de valorizao, estiver depreciada, a aplicao pura e simples dodisposto no art. 450 desautoriza levla em considerao, pois que constrange oalienante a efetuar a restituio integral do preo, e no obsta uma possvelalegao de que a menorvalia corre conta de negligncia do adquirente.15

    Finalmente,oalienantedeveaindaosjuroslegais,vistadodispostonoart.404doCdigoCivil.

    A obrigao do transmitente sobrevive ntegra, ainda que a coisa estejadeteriorada, salvo havendo dolo do adquirente mas, se este houver auferidovantagensdadeteriorao (comono casode ter vendidomateriais resultantesdademoliodeumprdio),deduzirseodaquantiaareceber,anoserquetenhasido condenadoa indenizaro terceiro evincente (CdigoCivil, arts. 451e452),poissealeinoquerqueoadquirentesofraprejuzocomaevico,noaerige,entretanto,emfontedeenriquecimento.

    O tratamento dispensado ao evicto, em face das benfeitorias existentes, consequncia lgica dos princpios gerais que presidem a essa, segundoassentamosnon75,supra(vol.I).Assimque,seoadquirenteastiverfeitonacoisa, e a sentena as no tiver abonado, incluemse na indenizao que oalienante lhe deve se houverem sido abonadas ao adquirente, mas no tiveremsidoporesterealizadas,esimpeloalienante,deduzireste,dopreoquehouverde restituir ao adquirente, o seu valor e se tiverem sido realizadas peloadquirente, e a este abonadas, delas se no cogitar nas relaes entre alienanteresponsveleadquirenteevicto.

    Reforada a evico por clusula expressa (e. g., restituio em dobro oufiana), tem o adquirente o direito de haver o que o reforo lhe assegurar, emquantiaouemcoisa,bemcomodemandaroterceirofiador.

    Aorevs,seporclusulaexpressaficarexcludaagarantia(clusuladenonpraestandaevictione), o adquirente temo direito de recobrar o preo que pagoupela coisa evicta (Cdigo Civil, art. 449), desacompanhado dos acessriosmencionados acima, pois do contrrio consagrarseia locupletamento, retendo ocontraenteaprestaoauferida,muitoemboraaoutrapartenohajaconservadoacontraprestao.Aclusuladenonpraestandaevictionepodereceber,entretanto,uma amplitude maior, e assumir o carter de exonerao total do alienante,inscrevendose entre os casos de cessao de responsabilidade, logo abaixoreferidas, quando assume a forma de renncia do adquirente16 ou quando seestipulacomadeclaraodequeoadquirenterecebaacoisaaseu inteirorisco,comamenoexpressadenoseroalienanteobrigadorestituiodopreo.17

    O adquirente no pode demandar pela evico, afora as hipteses

    50

  • supramencionadas,quando falta algumdos seuspressupostosessenciais:a)seaperda no ocorre em virtude de sentena, mas resulta de caso fortuito, foramaior, roubo ou furto, mesmo que o perecimento se d na pendncia da lide(ClvisBevilqua),porqueoalienantedeveagarantiapelaintegridadejurdicadoobjeto,masnotemobrigaoderesguardlodofatodascoisasoudoshomens.No h responsabilidade, igualmente, se, em vez de sentena judicial, a perdaprovier de um provimento administrativo, como a requisio da coisa ou acondenao do edifcio pela sade pblica18 b) no h responsabilidade para oalienante se o adquirente sabia que a coisa era alheia, porque seria ele, no caso,um cmplice do apropriamento, e no pode fundar, na sua conduta ilcita, umapretenso jurdica c) igualmente inexiste se sabia o adquirente que a coisa eralitigiosa, porque ento estava ciente de que a prestao do outro contratantedependia de acertamento judicial que lhe podia ser desfavorvel d) se foiinformadodo riscodaevicoeoassumiuexpressamente, liberandooalienantedas respectivas consequncias, porque um tal contrato seria aleatrio, no lhecabendoreclamarpelofatodenadaviraexistirdacoisaadquirida(emptiospei).

    Cabe ressaltar que, em qualquer caso de excluso da garantia contra aevico,oalienantepodeinvocaraclusulaparaacobertarsedosefeitosdaaodoterceiroevincente.Jamais,sobtalfundamento,encontrariadefesaparaatoseuqueperturbeautilizaodacoisaoupriveoadquirentedodireitotransferido.19

    Para efetivao do direito resultante da evico, previa o Cdigo Civil umrequisito impostergvel: convocar o alienante integrao da lide laudatioauctoris.20Seaaointentadapeloadquirentecontraoterceiro,nainicialpedira citao do alienante para que integre o processo, e responda pelasconsequncias. Se, ao revs, for ru na aomovida pelo terceiro reivindicante,convocar (denunciaoda lideno linguajarprocessual)o alienante imediato,ouqualquerdos anterioresparaquevenha assumir a suadefesa (CdigoCivil, art.456). Essa possibilidade de denunciao da lide de qualquer um dos alienantes,independentementedaposioquetenhanasucessodetitularidadessobreobem,foi uma inovao importante doCdigo de 2002, porque possibilitava ao evictocobrar a sua indenizao diretamente do responsvel pela aquisio viciadaoriginria, sem que tivesse que exercer o seu direito contra o alienanteimediatamente anterior e sucessivamente.OCdigo de ProcessoCivil de 2015,contudo,revogouoartigo456.

    OCdigodeProcessoCivilde2015exigeemseuart.125,I(correspondenteao art. 70, I, doCdigodeProcessoCivil de1973), adenunciaoda lideparaque possa haver o exerccio do direito de obter indenizao por evico. Se nodenunciar a lide ao contestar a ao, o evicto perde o direito de obter

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  • 211.

    posteriormenteaindenizaodoalienante.Orevogadopargrafonicodoart.456do Cdigo Civil continha uma regra de direito processual: se o alienante nocomparecesse e fosse manifesta a procedncia da evico, o adquirente poderiadeixardeoferecer contestaoouusarde recurso, semqueperdessea faculdadedeprocedercontraele.

    Comamortedoalienante(oudequalquerdosalienantes)aresponsabilidadepassaaosherdeiros.

    Enquanto pender a ao de evico, est suspensa a prescrio da doadquirentecontraoalienante(CdigoCivil,art.199,nIII).

    EVICOPARCIAL

    De incio dissemos, coma lei e a doutrina, que a evic