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UNIVERSIDADE DE SO PAULO
FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRO PRETO
DEPARTAMENTO DE NEUROCINCIAS E CINCIAS DO COMPORTAMENTO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM SADE MENTAL
NTALI CASTRO ANTUNES CAPRINI OLIVEIRA
A TCNICA DA DISTRAO NO ALVIO DA DOR EM CRIANAS
HOSPITALIZADAS: UM ENSAIO CLNICO RANDOMIZADO
RIBEIRO PRETO - SP
2014
NTALI CASTRO ANTUNES CAPRINI OLIVEIRA
A TCNICA DA DISTRAO NO ALVIO DA DOR EM CRIANAS
HOSPITALIZADAS: UM ENSAIO CLNICO RANDOMIZADO
RIBEIRO PRETO - SP
2014
Dissertao de Mestrado apresentada ao
Programa de Ps-graduao em Sade Mental
da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto da
Universidade de So Paulo para obteno do
ttulo Mestre em Cincias.
rea de Concentrao: Sade Mental
Orientadora: Profa. Dra. Maria Beatriz Martins
Linhares
Autorizo a reproduo e divulgao total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrnico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
Oliveira, Ntali Castro Antunes Caprini
A tcnica da distrao no alvio da dor em crianas
hospitalizadas: um ensaio clnico randomizado. Ribeiro Preto, 2014.
86p. : il. ; 30 cm
Dissertao de Mestrado, apresentada Faculdade de Medicina
de Ribeiro Preto/USP. rea de concentrao: Sade Mental.
Orientadora: Linhares, Maria Beatriz, Martins.
1. Dor peditrica. 2. Dor aguda. 3. Distrao.
4. Interveno no-farmacolgica, hospitalizao.
Nome: Oliveira, Ntali Castro Antunes Caprini
Ttulo: A tcnica da distrao no alvio da dor em crianas hospitalizadas: um ensaio clnico
randomizado.
Aprovado em: ____/____/________
Banca Examinadora
Prof. Dr. ___________________________________________________________________
Instituio:____________________________________Assinatura: ____________________
Prof. Dr. ___________________________________________________________________
Instituio:____________________________________Assinatura: ____________________
Prof. Dr. ___________________________________________________________________
Instituio:____________________________________Assinatura: ____________________
Dissertao de Mestrado apresentada ao
Programa de Ps-graduao em Sade Mental
da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto da
Universidade de So Paulo para obteno do
ttulo Mestre em Cincias. rea de
concentrao: Sade Mental
A mente que se abre para uma nova idia, jamais
voltar ao seu tamanho original
Albert Einstein
Agradecimento Especial:
Profa. Dra. Maria Beatriz Linhares pelos ensinamentos,
orientaes e suporte durante a trajetria deste trabalho. Pela
oportunidade nica de aprendizado e por ter acreditado e
confiado no meu potencial desde a minha chegada em Ribeiro
Preto. Obrigada por compartilhar comigo o seu vasto
conhecimento, sua rica experincia e sabedoria. Com voc alm
de teorias, aprendi a ter entusiasmo e aumentar ainda mais a
magnitude do amor que sinto minha profisso. Tenho
admirao pela sua competncia como professora e orientadora,
que sempre nos ensina a buscar a excelncia, transmitindo seu
apoio e segurana. Sempre ser um privilgio trabalhar ao seu
lado, serei eternamente grata pela oportunidade!
Agradecimentos
Agradeo inicialmente Deus pelas oportunidades de aprendizado e conhecimento
que tem me proporcionado, pela sua presena constante em minha vida, me sustentando
durante todos os desafios enfrentados durante o percurso deste trabalho.
Ao Departamento de Neurocincias e Cincias do Comportamento da FMRP-USP,
pelo apoio dispensado durante a realizao do Mestrado.
Secretaria de Ps-graduao e Secretaria de Ps-graduao em Sade Mental da
FMRP-USP, pela ateno e auxlio no decorrer do Mestrado.
Aos professores: Profa. Dra. Snia Enumo, Profa. Dra. Flvia Osrio e Prof. Dr. Jair
Lcio pelas contribuies enriquecedoras e experincia desafiante no Exame de Geral de
Qualificao. Agradeo especialmente o valioso auxlio do Prof. Dr. Jair Lcio na anlise dos
dados.
Ao Prof. Dr. Allen Finley pela oportunidade internacional que me proporcionou, pelos
valiosos ensinamentos e incentivos ao meu crescimento acadmico.
Ao Programa Pain in Child Health - PICH, pela oportunidade de participar de um
projeto brilhante e inspirador que transformou a minha viso sobre o fazer pesquisa cientfica.
Agradeo especialmente o apoio dos mentores por compartilharem experincias e
conhecimentos durante os treinamentos anuais e visitas tcnicas aos laboratrios de pesquisa.
Aos colegas trainees pela acolhida e oportunidades de trocas de vivncias internacionais.
Mayday Foundation Canadian Institutes for Health Research, pelo subsdio
financeiro minha participao nos treinamentos anuais do PICH, nos congressos
internacionais na rea de dor peditrica e nas visitas tcnicas aos laboratrios de pesquisa.
equipe de enfermagem da Pediatria do HCFMRP-USP, pelo apoio na coleta de
dados, especialmente Letcia pela disponibilidade em ajudar diariamente durante todo
processo.
Aos pacientes e familiares pela disponibilidade e interesse em participar do estudo,
possibilitando que esta pesquisa se concretizasse.
s amigas de laboratrio pelo apoio e companheirismo nessa jornada: Rafaela
Cassiano, Fabola Dantas, Maria Eduarda Pedro, Elisa Altafim, Doane Servidone, Ana
Cludia Castro, Martina Brom, Renata Freitas e Luciana Consentino.
s amigas Beatriz Valeri e Fernanda Doca, irms do PICH, pela doce acolhida nos
meus primeiros desafios acadmicos internacionais e pelo compartilhamento de experincias
e conhecimentos no universo da dor peditrica.
querida amiga Cludia Gaspardo, pelas inmeras vezes que me auxiliou, sempre
demonstrando carinho e humildade ao dividir sua rica experincia acadmica!
s minhas companheiras de trabalho do HCFMRP-USP, obrigada por compartilharem
sonhos, realizaes e desafios dirios.
s aprimorandas do Programa de Desenvolvimento na rea da Sade do HCFMRP-
USP, pela disponibilidade em aprender e auxiliar na minha formao como supervisora.
Ao meu pai Valmir que me ensinou a ter empenho, persistncia e dedicao nos
projetos de vida. A voc pai querido, muito obrigada por valorizar o meu estudo, incentivar o
meu crescimento e oferecer as grandes oportunidades de vida!
minha me Solange que me ensinou a sonhar e batalhar pelo que realmente
amamos! Obrigada pelo primeiro exemplo de professora que tive na vida, por me mostrar o
valor de ensinar e pelos bons valores que ensinastes a mim e meus irmos.
minha irm Vivian sempre presente na minha formao humana e acadmica, minha
incentivadora incansvel. A voc irm querida, muito obrigada por compartilhar as maiores
alegrias da minha vida e enfrentar os grandes desafios e dificuldades. Minha companheira de
vida, a certeza que Deus existe quando nos uniu! Obrigada tambm ao meu cunhado Victor
por compartilhar bons momentos conosco durante esses anos de mestrado.
Ao meu querido irmo Adam, com voc aprendi a ter coragem para superar os nossos
limites e buscar os nossos potenciais diante das dificuldades. Obrigada por compartilhar a
melhor infncia que poderia ter! Agradeo tambm a minha cunhada Camila e meu sobrinho
Samuel pelos momentos de descontrao e risadas que tive ao lado de vocs nas horas livre.
famlia que Deus me deu: meu querido marido Joo Victor. Obrigada pela fora,
compreenso e amor que me sustentaram dia aps dia. Minha eterna gratido pelo seu apoio
incondicional e por me lembrar do que realmente importante na vida!
famlia que Deus colocou em minha vida: Waldir, Valria e Vanessa, obrigada pela
ajuda constante e expresso de amor para conosco. Waldir, agradeo especialmente pelas
ajudas tcnicas e permanente disponibilidade durante esse processo!
s queridas Regina e Jlia, agradeo pelo acolhimento, incentivo e amor a mim
dispensados! Obrigada Jlia especialmente na ajuda na escolha dos filmes que utilizei com as
crianas neste trabalho.
Aos meus queridos avs pelo carinho, oraes e admirao ao meu trabalho. Ao meu
querido av Alberto que me ensinou a importncia da serenidade, do bom-humor e da f em
todos os projetos de vida. Sinto muito a sua falta!
amiga-irm Thais pelo companheirismo fiel, presena certa nos momentos felizes e
tristes! Pelas primeiras vivncias no ballet em que aprendemos juntas a ter determinao.
todos os meus familiares e amigos que me acompanharam durante esse processo
com suas amizades e oraes. Minha alegria poder compartilhar a vida com vocs!
RESUMO
O presente estudo teve por objetivo avaliar a eficcia de uma interveno no-farmacolgica
de distrao no alvio de dor aguda em crianas hospitalizadas submetidas a procedimentos
dolorosos por demanda clnica, controlando variveis de estresse e catastrofizao de dor. O
delineamento do estudo foi um ensaio clnico randomizado cruzado (cross-over). A amostra
do estudo foi composta por 40 crianas na fase escolar (6 a 11 anos), que estavam internadas
na Enfermaria de Pediatria do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina de Ribeiro
Preto-USP e que foram submetidas a procedimento de puno venosa ou arterial prescrito por
demanda clnica. Os participantes foram randomizados em dois grupos, sendo que todas as
crianas receberam a interveno e foram controles de si mesmas, mas em dois perodos
distintos. O estudo foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa do hospital. Inicialmente,
avaliaes do estresse e catastrofizao de dor foram processadas, utilizando-se,
respectivamente, a Escala de Estresse Infantil (ESI) e a Escala de Catastrofizao de Dor para
Crianas (PCS-C), a fim de controlar essas variveis. Para avaliao da intensidade de dor
foram utilizados os seguintes instrumentos: Escala Visual Analgica (VAS) e Escala de Faces
Revisada (FPS-R). Na coleta de dados, o Grupo 1 recebeu a interveno de distrao
audiovisual antes e durante um procedimento de puno realizado pela enfermeira e, em outro
dia um segundo procedimento de puno foi realizado sem interveno. No Grupo 2, por sua
vez, o procedimento ocorreu de forma inversa, sendo primeiramente sem interveno e
posteriormente com interveno. A interveno constituiu-se na distrao audiovisual com o
direcionamento da ateno da criana antes e durante o procedimento doloroso para filmes de
curta metragem com temticas infantis. Aps a concluso dos procedimentos de puno eram
aplicadas as duas escalas de dor para avaliar a percepo da intensidade de dor pelas crianas.
A anlise de varincia ANOVA 2 X 2 com comparao entre- e intra-grupos foi processada
com a finalidade de atender ao objetivo do estudo. O nvel de significncia adotado em todas
as anlises realizadas no presente estudo foi de 5%. Os resultados mostraram que os dois
grupos foram semelhantes nas medidas basais de estresse e catastrofizao de dor; no houve
diferenas estatisticamente significativas nessas variveis. Verificou-se que houve diferena
estatisticamente significativa entre os grupos nos perodos com e sem interveno da
distrao; os escores em ambas as escalas FPS-R e VAS mostraram-se menores no perodo
com distrao em comparao ao perodo sem interveno. Alm disso, a sequncia de
exposio da distrao nos grupos e o perodo em que foi realizada a distrao tambm
interferiram significativamente no efeito da interveno de distrao. A anlise do efeito
carry-over mostrou que aproximadamente 30% dos efeitos estimados no alvio de dor foram
atribudos exclusivamente interveno de distrao. Em concluso, a interveno de
distrao audiovisual foi eficaz na reduo da percepo da intensidade de dor durante o
procedimento doloroso agudo em crianas hospitalizadas. A tcnica de distrao pode ser
recomendada como uma estratgia no-farmacolgica simples e eficaz para alvio da dor
aguda, podendo ser implementada na prtica clnica em ambientes de cuidados peditricos.
Palavras-chaves: dor peditrica, dor aguda, distrao, interveno no-farmacolgica,
hospitalizao.
ABSTRACT
The present study was aimed to evaluate the efficacy of a non-pharmacological intervention
of distraction for acute pain relief in hospitalized children undergoing painful procedures by
clinical demand, controlling variables of stress and pain catastrophizing. The study design
was a crossover randomized controlled trial. The sample was composed of 40 children at
school age (6-11 years), who was admitted in the pediatric ward of the Hospital of Clinics of
Ribeiro Preto Medical School-USP and who underwent venipuncture or arterial puncture
prescribed by clinical demand. Participants were randomized into two groups and all children
that received the intervention were themselves controls, in two different periods. The study
was approved by the Committee of Ethics on Research of the Hospital. Initially, the stress and
pain catastrophizing assessments were performed using The Child Stress Scale (CSS) and
Pain Catastrophizing Scale for Children (PCS-C), respectively, aiming to control these
variables. The instuments used for pain assessment were the following: The Visual Analog
Scale (VAS) and The Faces Pain Scale Revised (FPS-R). In the data collection, the Group 1
received the audiovisual distraction intervention before and during the puncture performed by
the nurse and in another day a second puncture was performed without intervention.
Contrarily, in Group 2 the procedure was first without intervention and subsequently with
intervention in another day. The intervention consisted in audiovisual distraction by focusing
the child's attention before and during the painful procedure to short films about infant
thematics. The two pain scales were applied after the puncture procedures to assess the
childrens perception of pain intensity. An ANOVA 2 X 2 analyses of variance was
performed including between- and within-groups comparisons. The level of significance
adopted in all analyzes of the present study was 5%. The results showed that the two groups
were similar in the baseline of stress and pain catastrophizing outcomes; there were no
significant differences between the groups in these variables. There was a statistically
significant difference between groups in the periods with and without distraction intervention;
the scores in both scales FPS-R and VAS were lower during distraction compared with the no
intervention period. Furthermore, the sequence of exposure of the distraction in the groups
and the period that distraction was performed also significantly interfered in the effect of
distraction intervention. The analysis of the carry-over effect showed that around 30% of the
estimated effects on pain reliefing were attributed to the distraction intervention. In
conclusion, the intervention of audiovisual distraction was efficacy in reducing the perception
of pain intensity during routine acute painful procedure in hospitalized children. The findings
of the present study endorse that distraction is a simple and efficacious non-pharmacological
management for acute pain relief, which could be implemented in clinical practice of pediatric
care settings.
Keywords: pediatric pain, acute pain, distraction, non-pharmacological intervention,
hospitalization.
LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1 Fluxograma de composio da amostra. .................................................................
36
Figura 2 Esquema temporal da interveno de distrao audiovisual. ..................................
43
Quadro 1 Esquema do procedimento de coleta de dados. ..................................................... 42
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Caracterizao sociodemogrfica da amostra. .......................................................
45
Tabela 2 Caractersticas da evoluo clnica das crianas. ..................................................
46
Tabela 3 Caractersticas dos procedimentos dolorosos. .......................................................
48
Tabela 4 Indicadores de estresse e de catastrofizao da dor. ..............................................
49
Tabela 5 Escores de dor nas escalas FPS-R e VAS. .............................................................
50
Tabela 6 Eficcia da distrao na reduo da intensidade de dor, avaliada pela
Escala de Faces Revisada (FPS-R), considerando-se o efeito da interveno e do
perodo. ...................................................................................................................................
51
Tabela 7 Eficcia da distrao na reduo da intensidade de dor, avaliada pela
Escala Visual Analgica (VAS), considerando-se o efeito da interveno e do
perodo. ....................................................................................................................................
52
LISTA DE ABREVIATURAS
ANOVA Anlise de Varincia Fatorial
CFP Conselho Federal de Psicologia
ESI Escala de Stress Infantil
FPS-R Faces Pain Scale-Revised (Escala de Faces Revisada)
G1 Grupo 1
G2 Grupo 2
HC Hospital das Clnicas
HCFMRP Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto
IASP International Association for Study of Pain
IL Illinois
LAPREDES Laboratrio de Pesquisa em Preveno de Problemas de Desenvolvimento
e Comportamento da Criana
PCS-C Pain Catastrophizing Scale for Children
PedIMMPACT Pediatric Initiative on Methods, Measurement, and Pain Assessment in
Clinical Trials
PICH Pain in Child Health
USP Universidade de So Paulo
SP So Paulo
SPSS Statistical Package for Social Sciences
StataCorp LP Stata Statistical Software
TX Texas
USA United States of America
VAS Visual Analog Scale (Escala Visual Analgica)
SUMRIO
APRESENTAO ................................................................................................................. 15
1 INTRODUO ................................................................................................................... 16
1.1 Dor Peditrica ..................................................................................................................... 16
1.2 Dor e Estresse ..................................................................................................................... 19
1.3 Catastrofizao da Dor ....................................................................................................... 21
1.4 Avaliao da Dor Peditrica ............................................................................................... 22
1.5 Interveno em Dor Peditrica ........................................................................................... 24
1.6 Intervenes de Distrao para Manejo de Dor Aguda ...................................................... 26
1.6.1 Distrao multimodal com aplicativo tecnolgico .......................................................... 27
1.6.2 Distrao audiovisual ...................................................................................................... 28
1.6.3 Realidade Virtual ............................................................................................................. 29
1.6.4 Distrao com objetos externos ....................................................................................... 29
1.6.5 Distrao mediada por profissionais e pais ..................................................................... 30
1.6.6 Mltiplas estratgias com distrao ................................................................................. 31
2 OBJETIVO .......................................................................................................................... 33
3 MTODO ............................................................................................................................. 34
3.1 Delineamento do estudo ..................................................................................................... 34
3.2 Participantes ....................................................................................................................... 34
3.3 Aspectos ticos .................................................................................................................. 37
3.4 Local da pesquisa................................................................................................................ 37
3.5 Intrumentos e Medidas ....................................................................................................... 38
3.5.1 Instrumentos para avaliao de dor ................................................................................. 38
3.5.2 Instrumento para avaliao de estresse infantil ............................................................... 39
3.5.3 Instrumento para avaliao das caractersticas sociodemogrficas e clnicas ................. 40
3.6 Equipamentos e Materiais .................................................................................................. 40
3.7 Procedimentos .................................................................................................................... 41
3.7.1 Coleta de dados ................................................................................................................ 41
3.7.2 Anlise de dados .............................................................................................................. 43
4 RESULTADOS .................................................................................................................... 45
4.1 Caracterizao da amostra .................................................................................................. 45
4.2 Caracterizao do procedimento doloroso ......................................................................... 47
4.3 Indicadores de estresse e de catastrofizao da dor nas crianas ....................................... 49
4.4 Indicadores de intensidade de dor ...................................................................................... 50
4.5 Eficcia da tcnica de distrao no alvio da dor................................................................ 51
5 DISCUSSO ........................................................................................................................ 53
6 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .............................................................................. 67
ANEXOS ................................................................................................................................. 76
ANEXO 1 PARECER COMIT DE TICA EM PESQUISA ............................................. 76
ANEXO 2 TERMO DE ASSENTIMENTO PARA CRIANA .......................................... 79
ANEXO 3 TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ......................... 80
ANEXO 4 ESCALA VISUAL ANALGICA (VAS).......................................................... 82
ANEXO 5 ESCALA DE FACES REVISADA (FPS-R) ...................................................... 83
ANEXO 6 ESCALA DE CATASTROFIZAO DE DOR PARA CRIANAS (PCS-
C) .............................................................................................................................................. 84
ANEXO 7 ROTEIRO DE CARACTERIZAO DA CRIANA ...................................... 86
Apresentao | 15
APRESENTAO
O presente estudo de Mestrado est vinculado ao Laboratrio de Pesquisa em
Preveno de Problemas de Desenvolvimento e Comportamento da Criana (LAPREDES),
sob a coordenao da Profa. Dra. Maria Beatriz Martins Linhares. O estudo se insere em um
conjunto de projetos de pesquisa em neonatos e crianas hospitalizadas, sob a coordenao da
orientadora, que se relacionam temtica dor e desenvolvimento da criana e so realizados
no Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto USP. O trabalho de
Mestrado em questo visou o estudo da dor peditrica em crianas hospitalizadas na
Enfermaria de Pediatria do HCFMRP-USP, envolvendo uma interveno psicolgica para
alvio de dor durante procedimentos dolorosos agudos de rotina.
A mestranda tem experincia na rea de Psicologia Peditrica, iniciando seus estudos
na temtica de dor peditrica em 2011 com a participao no Programa HC Criana Sem Dor,
em que desenvolveu em conjunto com sua orientadora a segunda etapa deste programa que
tinha por objetivo caracterizar as opinies dos profissionais de sade sobre avaliao e manejo
da dor peditrica no HCFMRP-USP. O referido programa tem colaborao internacional do
Prof. Dr. Allen Finley (Dalhousie University) e segue o modelo da iniciativa ChildKind,
desenvolvido em hospitais do Canad e Estados Unidos.
Cabe ressaltar, que o estudo da dor avanou nas pesquisas realizadas no referido
laboratrio, que conta desde 2007 com o vnculo do PICH Pain in Child Health, programa de
treinamento estratgico em dor peditrica financiado pelo Canadian Institute of Health, sendo a
mestranda membro trainee internacional desde 2013 at o presente momento. Atualmente a
mestranda atua no HCFMRP-USP como psicloga assistente na rea de Psicologia Peditrica. A
prtica assistencial em dor peditrica, associada reviso da literatura na rea possibilitou o
desenvolvimento da presente pesquisa que tm relevncia e desdobramentos para a prtica clnica.
Introduo | 16
1 INTRODUO
1.1 Dor Peditrica
A International Association for Study of Pain (IASP) define a dor como uma sensao
ou experincia emocional desagradvel causada por um dano tecidual real ou potencial e
descrita em termos de tal dano (IASP, 2008). A dor envolve um processo neurofisiolgico,
uma vez que ela ativa o sistema nervoso perifrico e central e apresenta estreita relao com o
sistema de ativao do organismo. Ela pode ser do tipo aguda, crnica ou recorrente (IASP,
2008). A dor aguda corresponde a uma reao ao estmulo doloroso e interrompe aps a
remoo do mesmo (por exemplo, em decorrncia de procedimentos mdicos), enquanto a dor
crnica compreende um processo patolgico crnico nas estruturas somticas ou um dano ao
sistema nervoso central (Basbaum, Bushnell, & Devor, 2005; Howard, 2005; Jones, 2005).
A dor crnica pode evoluir de modo persistente, em decorrncia de uma enfermidade,
ou de modo recorrente, que se caracteriza por episdios com durao, intensidade e
frequncia variados, intercalados por perodos assintomticos. Quando o episdio de dor
ocorre pelo menos trs vezes durante um perodo mnimo de trs meses, com intensidade
suficiente para interferir nas atividades de vida diria da criana, a dor pode ser considerada
recorrente (Puccini & Bresolin, 2003). A dor crnica persistente e a dor recorrente em
crianas e adolescentes envolvem fatores psicossociais e devem ser reconhecidas como uma
preocupao de grande relevncia nesta populao (King et al., 2011). Deve-se destacar que o
impacto da dor aguda no termina quando o estmulo removido, visto que as dores agudas
procedurais podem se relacionar ao desenvolvimento e manuteno de dores crnicas mais
tarde na trajetria de vida da criana (Noel, Chambers, McGrath, Klein, & Stewart, 2012).
Atualmente a dor configura-se em um problema de sade mundial, sendo o seu alvio
ou tratamento um direito humano reconhecido pela Organizao Mundial de Sade e pela
Introduo | 17
International Association for the Study of Pain (IASP, 2008). Pode ser entendida como uma
experincia estressante, sendo as crianas uma populao vulnervel e subtratada em relao
ao alvio da dor. Apesar do crescimento exponencial de evidncias cientficas sobre a dor
peditrica nas ltimas dcadas, existem muitas barreiras para a adequada transferncia de
conhecimento para a prtica clnica. Consequentemente, as crianas continuam a
experimentar dores desnecessariamente durante a hospitalizao (Birnie et al., 2014; Linhares
et al., 2012; Taylor, Boyer, & Cattaneo, 2008; Stevens et al., 2011).
A dor em crianas apresenta caractersticas especficas que devem ser consideradas na
sua compreenso, avaliao e tratamento. As especificidades da dor peditrica incluem fatores
relacionados ao indivduo e sua histria de dor (por exemplo, nvel de desenvolvimento,
gnero, condio clnica, experincias prvias de dor), fatores referentes aos familiares
(atitudes empticas dos pais, percepo e atribuio de significado s vivncias de dor,
modelos e histria de dor na famlia), fatores relacionados ao profissional de sade
(sensibilidade, empatia, nvel de conhecimento, percepo e atribuio de significado s
experincias de dor, disposio para a agir na avaliao e manejo da dor) e fatores do contexto
(aspectos culturais como crenas e valores) (Chambers, 2003; Craig & Ridell, 2003;
Marchand, 2012).
Quando so focalizados aspectos do indivduo relacionados dor, devem-se destacar
as variveis psicolgicas afetivas, cognitivas e comportamentais que modulam a percepo e
qualidade da dor experimentada (Correia & Linhares, 2008). Observa-se que do ponto de vista
dos processos afetivos, a ansiedade, o estresse e o medo so prevalentes e envolvem sistemas
de ativao (sinal de alarme) que podem amplificar a dor e provocar a sensao de perda de
controle durante as experincias dolorosas. No caso da dor aguda, verifica-se associao com
ansiedade, estresse e medo, e no caso da dor crnica, com desamparo e depresso (Duffon,
Dunn, & Compas, 2009; Jones, 2005; Symreng & Fishman, 2004). No que se refere aos
Introduo | 18
processos cognitivos, deve-se atentar para o nvel de desenvolvimento da criana, para a
percepo que a mesma possui das caractersticas aversivas da dor e para a influncia dos
processos de ateno e memria sobre a percepo da dor (Kennedy, Luhmann, & Zempsky,
2008; Noel et al., 2012). Com relao ao comportamento associado s experincias de dor,
necessrio levar em considerao a aprendizagem por condicionamento das respostas de dor,
assim como aprendizagem social da dor (Barros, 2010; Craig, 2009; Linhares & Doca, 2010).
Para a compreenso da dor da criana necessrio tambm entender os
relacionamentos estabelecidos entre a criana e seu cuidador. Em relao aos cuidadores das
crianas, estes desempenham um relevante papel quando se refere dor em neonatos e
crianas. O Modelo de Scio-Comunicao da Dor (Craig, 2009) prope que, para entender a
dor da criana, deve-se identificar o significado pessoal atribudo pelos cuidadores s suas
experincias de dor e expresso de dor na criana. Os cuidadores, pais e profissionais,
atribuem significados dor que podem ser utilizados para decodificar os sinais e sintomas da
dor da criana. Este modelo sugere a existncia de largas esferas de influncia (famlia,
comunidade e cultura) que se relacionam tanto com criana quanto com os cuidadores.
O Modelo de Scio-Comunicao da dor inclui fatores relacionados diretamente
criana, a experincia de dor e a expresso da dor. A experincia de dor est fundamentada na
composio biolgica da criana (limiar do sistema nervoso), as experincias passadas com a
dor e os diferentes contextos sociais (criana sozinha no hospital, ou em casa com os pais). As
crianas expressam a dor de diversas formas, podendo ser verbais ou no verbais (atividade
facial, movimentos corporais especficos). Alm disso, o modelo preconiza a avaliao da
disposio das aes efetivas dos cuidadores para manejo da dor em crianas (Riddell &
Chambers, 2007).
Introduo | 19
1.2 Dor e Estresse
Entre as experincias estressoras que potencialmente atingem a criana, a famlia e
suas relaes, esto as vivncias de dor, danos orgnicos, hospitalizao e tratamentos
invasivos. O estresse pode ser compreendido como uma reao do organismo que envolve
componentes fsicos e/ou psicolgicos, causados pelas alteraes psicofisiolgicas que
ocorrem quando a pessoa se confronta com uma situao que a irrite, amedronte, excite ou
confunda (Compas, 2001; Lipp & Lucarelli, 1999). Apresenta-se em quatro estgios
gradativos, denominados por estado de alerta, fase de resistncia, quase-exausto e exausto,
esta ltima fase considerada patolgica, com importante desequilbrio interior, depresso e
prejuzos na produtividade (Lipp, Arantes, Buriti, & Witzig, 2002).
O processo bioqumico envolvido nas situaes de estresse independe da causa da
tenso, sendo que o elemento primordial necessrio para o seu desencadeamento claramente
a necessidade de adaptao a algum fato ou mudana. Quando exigido criana uma
adaptao, o processo do estresse pode ser iniciado, dependendo da magnitude do esforo
envolvido no restabelecimento da homeostase interna (Lipp et al., 2002).
Quando a criana exposta a um evento estressante como uma experincia dolorosa,
ela entra em estado de alerta, levando a uma ativao do sistema nervoso simptico e da
glndula pituitria, por meio do hipotlamo (Lipp & Lucarelli, 1999). Ao mesmo tempo,
ocorre a ativao das glndulas supra-renais que liberam adrenalina, preparando a criana
para a reao de luta e fuga (Lipp & Lucarelli, 1999). A vivncia de um estresse intenso pode
gerar graves consequncias para a criana, ocorrendo desajustes psicolgicos que podem
perdurar pela vida adulta (Shonkoff, 2010).
O processo de avaliao do estresse na infncia contribui para especificar as
intervenes (no nvel clnico, institucional, escolar e familiar) a serem feitas com as crianas,
no sentido de propiciar a reduo do estresse, evitando o desenvolvimento de doenas e de
Introduo | 20
dificuldades advindas do estresse excessivo. Tambm poder auxiliar a criana a ter um maior
conhecimento de si e das possveis implicaes do estresse nas suas relaes com o meio
ambiente e no seu desenvolvimento posterior. medida em que a criana capaz de perceber
seus estressores e de desenvolver habilidades adequadas e eficientes de enfrentamento das
situaes estressantes e ou dificuldades, poder manejar seu estresse satisfatoriamente,
prevenindo-o nas outras fases da sua vida (Lipp & Lucarelli, 1999).
Embora aprender a enfrentar adversidades seja uma parte importante do
desenvolvimento saudvel da criana, o estresse excessivo ou prolongado pode ser txico para
o desenvolvimento humano. Quando uma criana sente-se ameaada seu organismo ativa uma
variedade de respostas fisiolgicas, inclusive aumento do batimento cardaco, da presso
arterial e de hormnios do estresse, como o cortisol (Shonkoff, 2010). De acordo com
Shonkoff (2010) existem trs tipos de estresse, a saber: positivo, tolervel ou txico. No
momento em que a criana est sob proteo de relacionamentos com adultos que lhe
propiciam segurana, ela aprende a adaptar-se aos desafios cotidianos e seu sistema de
resposta ao estresse retorna ao nvel original; sendo este estresse do tipo positivo. O estresse
tolervel, por sua vez, ocorre quando dificuldades mais srias na vida da criana, como
exemplo a morte de familiares, so moderadas pelos seus cuidadores, que ajudam a criana a
se adaptar, amenizando assim os efeitos potencialmente danosos de nveis anormais de
hormnios de estresse (Shonkoff, 2010). Quando experincias adversas fortes, frequentes ou
prolongadas so vivenciadas com apoio ineficiente de adultos, o estresse torna-se txico e
destrutivo para o desenvolvimento dos circuitos neurais. A experincia precoce de estresse
txico pode impor um custo cumulativo capacidade de aprendizagem, assim como sade
fsica e mental. Quanto mais adversas as experincias na infncia, maior a probabilidade de
dificuldades de desenvolvimento e problemas de sade fsica e mental (Shonkoff, Boyce, &
McEwen, 2009).
Introduo | 21
Diante das experincias potencialmente estressoras como os procedimentos dolorosos
agudos presentes na rotina da hospitalizao de crianas, devem ser implementadas
estratgias de enfrentamento que minimizem os efeitos do estresse no desenvolvimento
emocional e cognitivo. Estratgias de enfrentamento podem ser entendidas por esforos
cognitivos e comportamentais utilizados pelas crianas para manejar demandas internas e
externas de situaes avaliadas como estressoras (Folkman & Moskowitz, 2004). As
intervenes de distrao so reconhecidas como recursos positivos na regulao do estresse e
utilizadas de forma comportamental ou cognitiva por crianas e adolescentes em situaes de
dor (Skinner & Zimmer-Gembeck, 2007).
1.3 Catastrofizao da Dor
Estudos na rea de dor peditrica relatam o envolvimento de aspectos cognitivos como
elementos que influenciam no enfrentamento da dor. As variveis psicolgicas como os
pensamentos, as crenas, as emoes e os comportamentos influenciam na forma como a
criana percebe a experincia dolorosa e no impacto funcional em sua vida. Os fatores
cognitivos podem auxiliar a criana na busca de recursos ou estratgias de adaptao frente a
uma vivncia dolorosa, contribuindo na forma que os pacientes expressam e verbalizam suas
dores (Marchand, 2012; Williams, McCracken, & Vlaeyen, 2012).
De acordo com estes estudos, uma boa ferramenta para prever como uma criana lida
com a experincia de dor atentar-se para existncia do pensamento catastrfico ou de
ruminao. Diversas caractersticas individuais foram identificadas como fatores de
vulnerabilidade para criana ao ajustamento dor. A catastrofizao da dor um fator
cognitivo que modula a resposta do paciente dor e pode ser definida pela percepo de uma
falta de autocontrole, somado a uma preocupao excessiva com o futuro. Este fator tem sido
reconhecido como um dos elementos mais importantes que relacionam ao surgimento de um
Introduo | 22
quadro de dor crnica e humor negativo (Marchand, 2012; Vervoot, Huguet, Verhoeven, &
Gourbet, 2011).
Ao ser considerado como uma varivel mediadora do enfrentamento da dor, o
pensamento catastrfico est associado a altos ndices de sofrimento psicolgico, dficits
funcionais e amplificao da percepo dolorosa (Verhoeven, Goubert, Jaaniste, Van
Ryckeghem, & Crombez, 2012). Catastrofizao da dor surgiu como uma varivel crtica na
forma como se pode entender o ajuste para dor em crianas. Em crianas, no entanto, ainda h
poucos mtodos de avaliao de catastrofizao sobre a dor. A escala especfica Pain
Catastrophizing Scale for Children (PCS-C) avalia dimenses relacionadas com a ampliao
da dor, ruminao, e desamparo em que as crianas esto submetidas (Crombez et al., 2003).
Evidncias de estudos sobre o tema sugerem que a catastrofizao da dor em crianas
pode estar associada s respostas parentais dor de seus filhos. H uma relao entre a
presena de pensamento catastrfico nas crianas e de desamparo ou falta de solicitude por
parte dos pais, ou seja, observa-se um impacto negativo no enfrentamento da dor pela criana
quando os pais no ajudam na promoo de comportamentos adaptativos dos filhos (Vervoot
et al., 2011).
1.4 Avaliao da Dor Peditrica
Considerando que a dor tem impacto na criana, a avaliao da dor peditrica
fundamental para subsidiar escolhas de estratgias e intervenes efetivas que visem
minimiz-la. As dimenses de dor avaliadas podem ser do tipo: intensidade, localizao,
durao e qualidade afetiva (Chambers & McGrath, 1998). As medidas de avaliao de dor,
por sua vez, envolvem tanto medidas de autorrelato e de observaes comportamentais
(Stinson, Kavanagh, Yamada, Gill, & Stevens, 2006), quanto medidas fisiolgicas como a
frequncia cardaca, a saturao de oxignio e o cortisol salivar (Anand, Stevens, & McGrath,
Introduo | 23
2007; Basbaum et al., 2005; Jones, 2005), sendo estas medidas complementares s primeiras
que so especficas para avaliao de dor (Linhares & Doca, 2010). A avaliao da
experincia da dor pode incluir avaliaes multidimensionais, envolvendo medidas de
avaliaes comportamentais e fisiolgicas e diferentes aspectos da experincia dor, tais
como intensidade, local, padro, contexto e significado (Franck, Greenberg, & Stevens,
2000).
A seleo de um mtodo apropriado de avaliao clnica de dor deve ser baseada no
tipo de dor e na condio mdica na qual a criana se encontra, alm de necessariamente
verificar a idade da criana e seu nvel de desenvolvimento cognitivo e emocional (Chambers
& McGrath, 1998). Entre as medidas de avaliao de dor, as escalas de autorrelato,
questionrios e dirios obtidos por automonitoramento so considerados indicadores
confiveis tanto da ocorrncia quanto da intensidade da dor (Chambers & McGrath, 1998;
Cohen et al., 2008; Stinson et al., 2006) assim como as medidas observacionais em crianas e
adolescentes (Cohen et al., 2008; Von Bayer & Spagrud, 2007). A partir de quatro anos de
idade, a criana passa a ter o domnio das habilidades de linguagem e comunicao social das
experincias subjetivas, permitindo a utilizao de medidas de autorrelato com maior
confiabilidade.
Recomendaes sobre medidas para avaliao da dor peditrica foram elaboradas por
especialistas em um consenso internacional, considerando especificidades como a idade da
criana e do tipo de dor (aguda, crnica e recorrente). Este consenso foi proposto pelo grupo
vinculado Iniciativa sobre Mtodos, Medidas e Avaliao de Dor Peditrica em Ensaios
Clnicos (Pediatric Initiative on Methods, Measurement, and Pain Assessment in Clinical
Trials - PedIMMPACT) (Dworkin et al., 2005; McGrath et al., 2008) que estabeleceu critrios
sobre a qualidade dos instrumentos de avaliao, classificando-os como: bem estabelecidos
(well-stablished), quase bem estabelecidos (approaching well-established) e promissores
Introduo | 24
(promising). Estes critrios basearam-se na validade, fidedignidade, detalhamento da medida
que permitia replicao ou crtica posterior e publicao por diferentes grupos de
pesquisadores em revistas com reviso por pares. As escalas de avaliao de intensidade de
dor para crianas frequentemente utilizadas e bem-estabelecidas (well-established) por
apresentar boas qualidades psicomtricas so: Escala de Faces Revisada (Faces Pain Scale-
Revised - FPS-R), Escala Visual Analgica (Visual Analog Scale - VAS) e Oucher Scale
(Charry, Piola, Linhares, & Silva, 2014; Correia & Linhares, 2008; Dworkin et al., 2005;
Linhares & Doca, 2010; McGrath et al., 2008; Von Bayer, 2006).
1.5 Interveno em Dor Peditrica
Evidncias cientficas tm demonstrado que a dor originada dos procedimentos agudos
(como exemplo: puno venosa e imunizaes) uma importante fonte de dor peditrica e
pode ter implicaes em longo prazo no comportamento e percepo de dor da criana
(Howard, 2003; Kennedy et al., 2008; Noel et al., 2012). Tais procedimentos dolorosos
agudos so frequentes na rotina clnica de crianas que necessitam de cuidados mdicos e
podem criar significativa dor e sofrimento na trajetria de tratamento dessas crianas,
ansiedade para os cuidadores e ser um desafio para os profissionais de sade. Alm disso,
memrias negativas sobre um procedimento podem resultar em exageradas respostas dor,
aumentando a ansiedade durante os procedimentos subsequentes (Noel et al., 2012). A
eliminao ou alvio da dor, sempre que possvel, uma importante responsabilidade dos
profissionais de sade, visto que a dor no manejada pode acarretar em impactos em longo
prazo na vida dos pacientes (Kennedy et al., 2008).
Quando h a identificao de experincia dolorosa em crianas hospitalizadas faz-se
necessrio a tomada de deciso clnica para alvio e manejo adequado dessa dor. Entre as
formas de manejo e alvio da dor peditrica encontram-se as intervenes farmacolgicas, que
Introduo | 25
visam minimizar sintomas de dor por meio dos efeitos da ao de medicamentos especficos
como analgsicos e sedativos, e as intervenes no-farmacolgicas, que consistem na adoo
de tcnicas que auxiliam na diminuio da percepo de dor, promovem conforto e melhor
enfrentamento da criana em situao de dor (Linhares & Doca, 2010; Riddell et al., 2011).
Estudos de reviso de literatura recomendam diversas intervenes de manejo no-
farmacolgico da dor em crianas tais como distrao, hipnose, relaxamento, preparao
psicolgica para procedimentos, entre outros (Birnie et al., 2014; Chen, Joseph, & Zelter,
2000; Stinson, Yamada, Lamba, & Stevens, 2008; Uman, Chambers, McGrath, & Kisely,
2008; Uman et al., 2013). A escolha da tcnica eficaz deve considerar o tipo de dor (aguda,
recorrente e/ou crnica), o contexto de dor (procedimentos invasivos dolorosos, cirurgia ou
quadro clnico), assim como as caractersticas da dor (localizao, intensidade, durao e
qualidade afetiva). As intervenes no-farmacolgicas mais frequentemente utilizadas com
crianas referem-se s tcnicas cognitivo-comportamentais (Chen et al., 2000; Stinson et al.,
2008; Uman et al., 2008; Uman et al., 2013).
De acordo com Uman et al. (2013), as tcnicas psicolgicas cognitivo-
comportamentais para o manejo da dor ajudam as crianas a desenvolverem habilidades de
enfrentamento para controle de sua prpria dor, devendo ser adequadas ao seu nvel de
desenvolvimento. As intervenes cognitivas envolvem a identificao e alterao de estilos
de pensamento negativos relacionadas com a ansiedade sobre o procedimento doloroso, e
substitu-las por crenas e atitudes mais positivas, levando a um comportamento mais
adaptativo. As intervenes comportamentais, por sua vez, so baseadas em princpios da
aprendizagem, visando comportamentos especficos. As intervenes cognitivo-
comportamentais so definidas como aquelas incluindo pelo menos uma interveno
cognitivo associado com pelo menos uma interveno comportamental (Williams et al., 2012;
Uman et al., 2008, Uman et al., 2013).
Introduo | 26
As intervenes psicolgicas descritas nos estudos de reviso de literatura (Barros,
2010; Birnie et al., 2014; Chen et al., 2000; Linhares & Doca, 2010; Uman et al., 2008; Uman
et al., 2013) como efetivas para o manejo da dor so: distrao - tcnicas que direcionam a
ateno para estmulos no relacionados ao procedimento doloroso (por exemplo: vdeos,
jogos, dilogos); hipnose - dissociao da experincia dolorosa por meio do engajamento em
situaes imaginrias prazerosas ou seguras; relaxamento - envolve o controle respiratrio
associado ao relaxamento progressivo dos vrios grupos de msculos do corpo; preparao
psicolgica so oferecidas informaes antecipatrias sobre as etapas do procedimento e
sensaes que o mesmo emerge; modelao - demonstrao e simulao do procedimento por
outra criana ou um adulto, demonstrando comportamentos de enfrentamento positivo da
situao e dessensibilizao - exposio gradual situao de dor geradora de ansiedade.
1.6 Intervenes de Distrao para Manejo de Dor Aguda
Estratgias baseadas no processo de distrao demonstram um impacto positivo no
suporte no-farmacolgico para alvio da dor durante os procedimentos dolorosos agudos
(Birnie et al., 2014; Kleiber & Harper, 1999; Uman et al., 2008, Uman et al., 2013). A tcnica
da distrao envolve o estabelecimento de um conjunto de rotinas e os distratores podem ser
de diferentes tipos. Por meio da imaginao, do engajamento e da motivao na proposta a
criana pode construir a distrao. Este recurso cognitivo visa desviar a ateno da criana
para longe dos aspectos aversivos dos procedimentos dolorosos, direcionando para estmulos
mais agradveis a fim de reduzir o impacto que essas experincias tm sobre o medo infantil e
resposta afetiva experincia de dor (Chen et al., 2000; Miller, Rodger, Kipping, & Kimble,
2011).
Estudos de reviso que examinaram os efeitos da interveno da distrao no alvio da
dor associados a procedimentos invasivos mostraram que este recurso foi eficaz na reduo da
Introduo | 27
dor peditrica (Birnie et al., 2014; Chen et al., 2000; Kleiber & Harper, 1999; Uman et al.,
2008; Uman et al., 2013). Diversos tipos de tcnicas de distrao tm sido descritos na
literatura, como exemplo: distrao multimodal com aplicativo tecnolgico (Kipping, Rodger,
Miller, & Kimble, 2012; Miller, Rodger, Bucolo, Greer, & Kimble, 2010; Miller et al., 2011),
distrao audiovisual (Downey & Zun, 2012; Wang, Sun, & Chen, 2008), realidade virtual
(Kipping et al., 2012), videogame (Miller et al., 2010), distrao com jogo de cartas (Inal &
Kelleci, 2012), distrao com um caleidoscpio (Tfekci, Celebiolu, & Kkolu, 2009),
distrao com uma bola elstica (Sadeghi, Mohammadi, Shamshiri, Bagherzadeh, &
Hossinkhani, 2013), ensinar a criana a utilizar a imaginao (Kline, Turnbull, Labruna,
Haufler, DeVivio, & Ciminera, 2010), e distrao para manejo comportamental por pais
(Slifer et al., 2009). Alguns estudos utilizaram ainda combinaes de estratgias
farmacolgicas e no-farmacolgicas, incluindo distrao para alvio da dor (Berberich &
Landman, 2009; Boivin, Poupon-Lemarquis, Iraqi, Fay, Schmitt, & Rossignol, 2008). A
seguir encontram-se algumas evidncias de estudos que analisaram a eficcia de diferentes
tipos de distrao.
1.6.1 Distrao multimodal com aplicativo tecnolgico
A eficcia da distrao multimodal com aplicativo tecnolgico foi examinada em dois
estudos pelo mesmo grupo de pesquisadores (Miller et al, 2010; Miller et al 2011). Ambos os
estudos demonstraram efeitos positivos com a utilizao do aplicativo quando comparada com
outras intervenes. O estudo mais recente (Miller et al., 2011) examinou um protocolo
combinado (aplicativo tecnolgico que envolvia preparao psicolgica e distrao) para
reduzir a dor e estresse em crianas com queimaduras que foram submetidas a procedimentos
de trocas de curativos, em comparao com um tratamento de distrao padro do local em
que o estudo foi realizado (Miller et al. 2011). A reduo nos nveis de dor no grupo com o
Introduo | 28
protocolo combinado foi clinicamente significativa, com as crianas relatando apenas nveis
moderados de dor, em comparao com o grupo de distrao padro, que relataram nveis de
dor severa. As crianas do grupo com o protocolo combinado apresentou uma reduo
moderada de 30% dos escores de dor durante o procedimento doloroso em comparao com o
grupo de distrao padro, tanto na avaliao pelas crianas quanto pelos cuidadores.
Diante dos resultados desses estudos, faz-se importante compreender os fundamentos
das estratgias de preparao psicolgica. Estas visam oferecer informaes antecipatrias e
seguras sobre o procedimento e tratamento ao qual a criana ser submetida a fim de reduzir
os medos, o estresse e a dor. As informaes preparatrias sobre o procedimento devem ser
fornecidas de forma clara, simples e honestas para que a criana possa compreend-las e saber
o que esperar. Inclui tambm a modelao, baseada na observao de vdeos nos quais outras
crianas esto sendo submetidas ao mesmo procedimento ao qual a criana necessita enfrentar
(McGrath, Finley, Ritchie, & Dowden, 2003; Miller et al., 2011; Uman et al., 2008).
1.6.2 Distrao audiovisual
Um estudo randomizado controlado examinou a eficcia de distrao audiovisual em
comparao com uma interveno psicolgica de rotina e uma condio controle durante a
puno venosa em crianas em idade escolar (Wang et al., 2008). A tcnica de distrao
audiovisual foi efetiva na reduo da dor medida por meio de auto-relato, bem como uma
melhor cooperao das crianas e aumento das taxas de sucesso do procedimento de puno
venosa. Os escores de dor dos grupos de distrao audiovisual e de interveno psicolgica
foram significativamente menores do que no grupo controle.
Outro estudo no randomizado analisou a distrao audiovisual (cartoons) na
percepo de dor em contexto de procedimentos dolorosos agudos (Downey & Zun, 2012).
Os resultados mostraram que assistir aos cartoons afetou a percepo da dor das crianas,
Introduo | 29
avaliada cinco minutos antes do procedimento. Isso indica que o uso de desenhos animados
como uma distrao pode efetivamente reduzir a dor antes do procedimento. No foram
encontradas diferenas entre os grupos que assistiram aos cartoons e que no assistiram
durante e aps os procedimentos.
1.6.3 Realidade Virtual
A realidade virtual compreende um tipo de distrao em que h a simulao da
realidade por meio da tecnologia. A realidade virtual foi estudada por Kipping et al. (2012)
que observou uma reduo efetiva na intensidade da dor aguda durante trocas de curativos de
crianas com queimaduras, comparando com uma distrao padro do local. Observaes da
equipe de enfermagem revelaram diferenas estatisticamente significativas entre o grupo de
realidade virtual e grupo de distrao padro durante a remoo do curativo. Comportamentos
relacionados com menor dor foram observados no grupo que utilizou a realidade virtual e a
necessidade de medicao para dor tambm foi menor para o grupo que utilizou a realidade
virtual.
1.6.4 Distrao com objetos externos
A eficcia das estratgias de distrao que utilizam objetos durante procedimentos
dolorosos tambm foi investigada em pesquisas da rea. Um estudo avaliou os efeitos de um
jogo de cartas (Flippits) como distrao para reduzir a dor e ansiedade durante a coleta de
sangue em crianas em idade escolar (Inal & Kelleci, 2012). As crianas do grupo de
distrao com o jogo de cartas relataram nveis de dor significativamente mais baixos do que
o grupo controle. Os pais e os profissionais relataram nveis significativamente mais baixos de
ansiedade no grupo de distrao do que no grupo controle. Da mesma forma, outro estudo
relatou resultados positivos de uma estratgia de distrao usando caleidoscpios para reduzir
Introduo | 30
a dor durante a puno venosa em crianas em idade escolar (Tufekci et al., 2009). A eficcia
de uma tcnica de distrao em que uma bola elstica foi pressionada durante a insero de
cateter em crianas em idade pr-escolar tambm foi relatada (Sadeghi et al., 2013), indicando
que o grupo de crianas que utilizou a distrao (pressionar uma bola elstica) mostrou nveis
significativamente mais baixos de dor quando comparadas com o grupo controle.
1.6.5 Distrao mediada por profissionais e pais
Alguns estudos avaliaram a eficcia das intervenes mediadas por profissionais e
pais. Um estudo realizado por Kline et al. (2010) comparou a eficcia do ensino do uso da
imaginao para o manejo da dor em contraste com a realizao de uma investigao
detalhada das memrias de dor em pacientes internados em unidade de terapia intensiva
peditrica, realizadas com o apoio de profissionais. Uma mudana significativa foi detectada
na classificao de dor entre o incio e o trmino do tratamento em crianas de ambos os
sexos que receberam o ensino do uso da imaginao, mas no em crianas que participaram
da investigao detalhada das memrias de dor.
Os efeitos de duas diferentes intervenes para treinamento dos pais durante
procedimentos dolorosos administrados pelos mesmos (por exemplo: injeo intramuscular,
aplicao de insulina) tambm foram analisados no estudo de Slifer et al. (2009). Os grupos
de interveno examinados foram os seguintes: pais utilizando estratgias de distrao e pais
realizando manejo comportamental, sendo que a medida avaliada foi o estresse emergente das
situaes de dor. Entre as crianas que apresentaram sinais de desconforto durante a primeira
observao (39% das crianas), a mdia para pontuao de estresse foi significativamente
menor no grupo com estratgias de distrao em comparao com o grupo de manejo
comportamental.
Introduo | 31
1.6.6 Mltiplas estratgias com distrao
A estratgia multifatorial para manejo da dor durante procedimentos de imunizao foi
avaliada em comparao com os cuidados habituais (prprios do local da pesquisa) em
crianas pr-escolares e escolares (Boivin et al., 2008). A estratgia multifatorial inclua um
conjunto de intervenes farmacolgicas e no-farmacolgicas, envolvendo a distrao por
meio de soltar bolhas de sabo durante o procedimento doloroso. As crianas do grupo de
interveno apresentaram significativamente menores escores de dor, em comparao com o
grupo controle. em crianas menores do que 10 anos de idade.
A eficcia de mltiplas estratgias para alvio da dor, incluindo a distrao, durante
procedimentos de imunizao em crianas pr-escolares foi avaliada em comparao com um
grupo controle com tratamento de rotina do local da pesquisa (Berberich & Landman, 2009).
O grupo de interveno apresentou significativamente menores escores na avaliao de dor do
que o grupo controle, relatado tanto pelas crianas quanto pelos pais e profissionais.
Embora a tcnica de distrao seja frequentemente utilizada como uma estratgia no-
farmacolgica de enfrentamento em programas de alvio e tratamento da dor em crianas, as
evidncias empricas com qualidade metodolgica sobre a eficcia da distrao ainda so
insuficientes (Birnie et al., 2014; Hermann, 2012; Stinson et al, 2008; Uman et al, 2008;
Uman et al., 2013). Uma possvel explicao pode ser que a distrao no funciona para todos
em qualquer situao como pode ser observado nos resultados de alguns estudos aqui
expostos. Como exemplo, em estudo recente foi examinado o papel da catastrofizao da dor
como um fator que influencia a eficcia da distrao em crianas em idade escolar. Os
resultados indicaram que as crianas com nveis mais elevados de relato sobre catastrofizao
da dor se beneficiaram menos das estratgias de distrao em experincias dolorosas do que
as crianas com nveis mais baixos de catastrofizao da dor (Verhoeven et al., 2012).
Introduo | 32
Estudos de reviso da literatura descreveram algumas lacunas metodolgicas sobre
intervenes no-farmacolgicas para o alvio da dor, como as seguintes: poucos estudos
randomizados controlados, amostras pequenas e falta de descries precisas do procedimento
para o alvio da dor (Hermann, 2012; Stinson et al, 2008; Uman et al, 2008; Uman et al.,
2013). Outro estudo de reviso de literatura recente destacou tambm a necessidade de
melhorias na qualidade metodolgica dos estudos da rea que promovam diretrizes para a
prtica clnica, ressaltando a importncia de atentar para o impacto dos tipos de distrao e
para as caractersticas da amostra (Birnie et al., 2014).
Portanto, verifica-se a necessidade da realizao de novos estudos randomizados
controlados que possam contribuir com evidncias sobre a eficcia da tcnica de distrao
como interveno no-farmacolgica. Cabe ressaltar que, nos estudos de reviso
apresentados, no foram encontradas pesquisas empregando a metodologia cross-over para
analisar as intervenes com os participantes como seus prprios controles, avanando nos
conhecimentos sobre a tcnica de distrao. Em meio a esta lacuna, o presente ensaio clnico
randomizado cruzado (cross-over) teve por hiptese que a interveno de distrao
audiovisual reduziria a percepo da intensidade da dor aguda em procedimentos de puno
em crianas hospitalizadas.
Objetivo | 33
2 OBJETIVO
O presente estudo teve por objetivo avaliar a eficcia de uma interveno no-
farmacolgica de distrao audiovisual no alvio de dor aguda em crianas hospitalizadas
submetidas a procedimento doloroso por demanda clnica, controlando-se variveis de
estresse e catastrofizao de dor.
Mtodo | 34
3 MTODO
3.1 Delineamento do estudo
Ensaio clnico randomizado cruzado (cross-over). O estudo clnico randomizado
uma metodologia bem estabelecida para a obteno de evidncias para o cuidado sade
(Souza, 2009). Baseiam-se na comparao entre duas ou mais intervenes, as quais so
controladas pelos pesquisadores e aplicadas de forma aleatria em um mesmo grupo de
participantes. Uma das variaes do ensaio clnico randomizado denomina-se cruzado (cross-
over), em que possvel testar duas ou mais condies usando-se o mesmo participante. Esse
tipo de metodologia tem a vantagem de ter o mesmo indivduo como controle dele mesmo, ou
seja, emprega-se uma anlise pareada (Senn, 2002; Souza, 2009).
3.2 Participantes
A amostra do estudo foi composta por 40 crianas na fase escolar, na faixa etria entre
seis e 11 anos, que estavam internadas na Enfermaria de Pediatria do Hospital das Clnicas da
Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto e que foram submetidas a procedimento prescrito de
puno venosa ou arterial por demanda clnica. Este procedimento era realizado por
enfermeiras treinadas e prescritos por mdicos pediatras responsveis pelo atendimento das
crianas. Foi realizado o clculo amostral que indicou que 15 participantes em cada grupo
seria satisfatrio para determinar o efeito da interveno, considerando o poder de efeito 0,80,
nvel de significncia de 5% [p0,05] e dois pontos de reduo em 10 pontos da Escala de
Faces Revisada de dor.
Os participantes foram randomizados em dois grupos, sendo que todas as crianas
receberam a interveno e foram controle de si mesmas, mas em dois momentos distintos. O
processo de randomizao foi realizado por meio do recurso disponvel no site
Mtodo | 35
www.randomizer.org, que designou aleatoriamente os participantes em dois grupos. O Grupo
1 (G1, n = 22) foi composto pelas crianas que durante o procedimento doloroso receberam a
interveno de distrao (A) e no procedimento doloroso seguinte, realizado em outro dia, foi
seguida a rotina atual do local, em que no h tcnicas no-farmacolgicas para o
procedimento especfico (B). O Grupo 2 (G2, n = 18) incluiu os participantes que,
primeiramente, foram submetidas ao procedimento doloroso seguindo a rotina atual do local
(B) e no procedimento doloroso seguinte, realizado em outro dia, receberam a interveno de
distrao para alvio de dor (A). Os procedimentos dolorosos ocorreram em um intervalo de
tempo de no mnimo um dia e no mximo sete dias.
Os critrios de incluso dos participantes foram os seguintes: crianas com idades
entre seis e 12 anos, que possuam domnio da linguagem para comunicar-se, em contexto de
internao hospitalar com diagnsticos clnicos diversos, com necessidade de puno prescrita
por demanda clnica, com tempo mnimo de um dia de internao e tempo de intervalo de no
mximo sete dias entre os procedimentos de puno. Os critrios de excluso dos
participantes, por sua vez, foram os seguintes: crianas com prejuzos neurolgicos ou
problemas na comunicao e crianas sob sedao. O perodo da coleta de dados teve uma
durao de oito meses, sendo iniciada em 27 de maro de 2013 e finalizada em 04 de
novembro de 2013.
O fluxograma de composio da amostra encontra-se na Figura 1.
Mtodo | 36
Figura 1. Fluxograma de composio da amostra.
Durante o perodo de coleta de dados foram internadas 177 crianas com idade entre
seis e 12 anos na Enfermaria de Pediatria, sendo que destas 135 crianas no atingiram os
critrios de incluso no estudo ou possuam algum dos critrios de excluso. O motivo
predominante para a no incluso das crianas no estudo foi a dificuldade de planejamento
prvio de dois procedimentos de puno em intervalo de no mximo sete dias. Outros motivos
Crianas entre 6 e 12 anos
internadas no perodo da coleta
n = 177
n= 125
Recusa na participao
n = 1
No atenderam aos
critrios de incluso
n = 135
Crianas elegveis
n = 42
27
Crianas iniciaram o estudo
n = 41
Criana no completou a coleta
n = 1
Amostra final
n = 40
G1
n = 22
G2
n = 18
Mtodo | 37
para excluso observados referiam-se ao fato de crianas com prejuzos neurolgicos ou com
problemas para comunicar-se e crianas sedadas. Foram elegveis para o estudo 42 crianas,
sendo que em uma delas a famlia recusou a participao no estudo por crena religiosa e
outra no completou o estudo, pois recebeu alta antecipada. A amostra final do estudo foi de
40 crianas.
3.3 Aspectos ticos
O presente estudo foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa do Hospital das
Clnicas da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto-USP, sob parecer n 222.515 (ANEXO
1). Para realizao da pesquisa foi feito um convite criana para participao voluntria no
estudo, sendo explicado a ela cada etapa a ser desenvolvida. As crianas alfabetizadas
assinaram Termo de Assentimento para Criana (ANEXO 2) concordando em participar do
estudo como tambm foi firmada a autorizao do responsvel legal pela criana por meio do
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (ANEXO 3), o qual descreve os objetivos da
pesquisa e os procedimentos de coleta de dados. Os dados de identificao dos pacientes
foram resguardados, no implicando em riscos aos participantes. O estudo atende s normas
da Resoluo n 466 do Conselho Nacional de Sade referente s diretrizes regulamentadoras
de pesquisas envolvendo seres humanos.
3.4 Local da pesquisa
Os pacientes foram submetidos aos procedimentos da pesquisa nas unidades de
internao da Enfermaria Peditrica do Hospital das Clnicas de Ribeiro Preto da Faculdade
de Medicina de Ribeiro Preto USP. Este um hospital pblico universitrio de nvel
tercirio conveniado com a rede SUS, sendo referncia no atendimento e tratamento de alta
complexidade de crianas de Ribeiro Preto, regio e outros estados do Brasil.
Mtodo | 38
A organizao e anlise dos dados coletados foram realizadas no Laboratrio de
Pesquisa em Preveno de Problemas de Desenvolvimento e Comportamento da Criana
(LAPREDES) do Departamento de Neurocincias e Cincia do Comportamento, Faculdade
de Medicina de Ribeiro Preto da Universidade de So Paulo, em Ribeiro Preto (SP).
3.5 Intrumentos e Medidas
3.5.1 Instrumentos para avaliao de dor
Escala Visual Analgica/ Visual Analog Scale VAS (Scott, Ansell, & Huskisson, 1977):
Esta escala avalia a intensidade da dor aguda-procedural e ps-operatria e consiste em uma faixa
limitada de 100 mm de comprimento, a qual representa o contnuo da experincia dolorosa e tem
em suas extremidades palavras: sem dor e pior dor possvel (ANEXO 4). As crianas so
instrudas a assinalar a intensidade da sensao dolorosa em um ponto dessa reta, sendo que os
escores podem variar de zero a 10, quanto maior o escore significa mais dor. Esta escala
amplamente utilizada para crianas a partir de seis anos de idade e possui boa sensibilidade e
validade, sendo uma escala classificada como bem estabelecida (well-established) pelo grupo
vinculado Iniciativa sobre Mtodos, Medidas e Avaliao de Dor Peditrica em Ensaios
Clnicos (Pediatric Initiative on Methods, Measurement, and Pain Assessment in Clinical Trials -
PedIMMPACT) (Dworkin et al., 2005; McGrath et al., 2008; Von Bayer et al., 2006).
Escala de Faces Revisada/ Faces Pain Scale Revised FPS-R (Hicks, Von Bayer,
Spafford, Van Korlaar, & Goodenough, 2001): Esta escala consiste, originalmente, em sete
faces, apresentadas em forma ordinal crescente de intensidade da dor, de fcil administrao e
requer para sua aplicao apenas as faces fotocopiadas. A escala revisada consiste de seis
faces, sem expresses de choros ou sorrisos, fazendo a correlao mtrica de 0-10, em escala
crescente de dor, sendo chamada de Escala de Faces Revisada (FPS-R). No presente estudo
Mtodo | 39
foi utilizada sua verso no idioma Portugus-Brasil (Poveda, Silva, Passareli, Santos, &
Linhares, 2003). O examinador solicita ao examinado que aponte para a face que corresponda
intensidade da dor, a face escolhida pontuada com 0, 2, 4, 6, 8 ou 10, contando da
esquerda para a direita, sendo que zero significa sem dor e 10 com muita dor. A escala foi
avaliada como bem estabelecida (well-established) pelo grupo vinculado Iniciativa sobre
Mtodos, Medidas e Avaliao de Dor Peditrica em Ensaios Clnicos (Pediatric Initiative on
Methods, Measurement, and Pain Assessment in Clinical Trials - PedIMMPACT) (Dworkin
et al., 2005; McGrath et al., 2008; Von Bayer et al., 2006) por apresentar boas qualidades
psicomtricas e pode ser utilizadas com crianas de quatro a 12 anos de idade (ANEXO 5).
Escala de Catastrofizao de Dor para Crianas/ Pain Catastrophizing Scale for
Children PCS-C: Esta escala avalia os pensamentos e sentimentos da criana sobre a
experincia dolorosa. Contm 13 itens e a resposta baseia-se na frequncia que as crianas
experimentam cada um dos pensamentos e sentimentos quando esto com dor, utilizando uma
escala de cinco pontos (0 = nunca e 5 = sempre). A escala resulta em um escore total que pode
variar de zero a 52, e ainda compreende trs subescalas relacionadas com as dimenses de
ampliao, ruminao e desamparo. Os itens 6, 7 e 13 relacionam-se a dimenso de
ampliao, j os itens 8, 9, 10 e 11 referem-se a dimenso de ruminao e os itens 1, 2, 3, 4, 5
e 12 so relativos a subescala de desamparo. A verso para crianas foi desenvolvida e
validada por Crombez et al. (2003), demonstrando validade de constructo, validade interna e
preditiva em crianas escolares. Para a utilizao nesse estudo foi obtida a autorizao dos
autores para a traduo na lngua Portuguesa (Brasil) (ANEXO 6).
3.5.2 Instrumento para avaliao de estresse infantil
Escala para avaliao de sintomas de estresse: Escala de Stress Infantil - ESI (Lipp &
Lucarelli, 1998). A escala objetiva avaliar estresse em crianas de seis a 14 anos de ambos os
Mtodo | 40
sexos, nas quatro dimenses do estresse infantil: fsica, psicolgica, psicolgica com
componentes depressivos e psicofisiolgica. Esta escala composta por 35 itens relacionados
a reaes de estresse e a resposta a cada item feita por meio da escala likert de cinco pontos
e registrada em quartos de crculos, conforme a frequncia com que os indivduos
experimentam os sintomas apontados pelos itens. Desta forma, circulo em branco significaria
nunca sente e o circulo completamente preenchido indicaria sente com freqncia. O
escore varia de 0 a 140 pontos. A ESI oferece tabelas de correo das respostas. Este
instrumento foi validado para amostra brasileira e possibilita identificar o tipo de reao mais
frequente da criana, facilitando o controle do estresse (Lipp, & Lucarelli, 1998). Esta escala
de uso exclusivo do psiclogo e para sua aquisio necessrio o CFP (certificado de
registro profissional na rea da Psicologia).
3.5.3 Instrumento para avaliao das caractersticas sociodemogrficas e clnicas
Roteiro de Caracterizao da Criana: Este roteiro foi construdo para a presente
pesquisa e preenchido por meio da anlise dos registros do pronturio mdico de cada criana,
constando informaes sobre idade, sexo, escolaridade, especialidade peditrica em que a
criana estava inserida, diagnstico ou hiptese diagnstica, tempo de tratamento, tempo de
internao e motivos da internao atual (ANEXO 7).
3.6 Equipamentos e Materiais
Para realizao da pesquisa foi utilizado o recurso audiovisual (aparelho de DVD
player porttil do modelo Philips PD7030 com tela LCD de 7/18 cm) e o DVD Coleo de
Curtas da Pixar Volume 1 (PIXAR Short Films Collection Volume 1) que contm histrias
infantis de curta metragem com temas de personagens produzidos pela Walt Disney Pictures.
A durao mdia de cada filme era de 10 minutos. As crianas escolhiam previamente uma
Mtodo | 41
entre 13 histrias que estavam disponveis no DVD para assistir antes e durante o
procedimento doloroso.
3.7 Procedimentos
3.7.1 Coleta de dados
Os responsveis legais pelas crianas que concordaram com a participao na pesquisa
assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, assim como as crianas assinaram
termo de assentimento firmando sua concordncia em participar do estudo. Os procedimentos
de avaliao de dor e interveno de distrao foram realizados com crianas que tinham
punes venosas ou arteriais prescritas pelos mdicos. Na coleta de dados aplicava-se
primeiramente o roteiro de caracterizao sociodemogrfica e clnica com as mes das
crianas, e em seguida eram aplicadas com as crianas as escalas de estresse (Escala de
Estresse Infantil ESI) e de catastrofizao de dor (Pain Catastrophizing Scale for Children
PCS-C).
A interveno de distrao audiovisual constituiu no direcionamento da ateno da
criana antes e durante o procedimento doloroso de puno para um filme infantil de curta
metragem com contedos de humor e de interesse da faixa etria envolvida no estudo. A
durao do filme tinha em mdia 10 minutos, a fim de cobrir a durao do procedimento de
puno. A criana assistia ao filme at o final, no sentido de evitar frustaes decorrente de
interrupo do mesmo, alm de auxiliar na recuperao aps o procedimento doloroso.
As informaes antecipadas sobre o procedimento doloroso foram fornecidas de forma
clara para que a criana compreendesse o que iria acontecer, sem no entanto se caracterizarem
como uma tcnica de preparao psicolgica. Deve-se destacar, que at o momento de
realizao do estudo, no havia a adoo de tcnicas de interveno no-farmacolgica ou
Mtodo | 42
farmacolgica (creme tpico para alvio de dor) para este procedimento especfico no
contexto da Enfermaria onde foi realizada a pesquisa.
No Quadro 1 encontra-se um resumo esquemtico do procedimento de coleta de
dados, aps as avaliaes iniciais do estresse e da catastrofizao da dor.
Quadro 1. Esquema do procedimento de coleta de dados.
Grupos de
Participantes
Primeiro
Perodo (1
puno)
Procedimento de
Avaliao
Segundo
Perodo (2
puno)
Procedimento de
Avaliao
G1 (A-B) Puno com
tcnica de
distrao (A)
Avaliao de dor
VAS
FPS-R
Puno sem
tcnica de
distrao (B)
Avaliao de dor
VAS
FPS-R
G2 (B-A) Puno sem
tcnica de
distrao (B)
Avaliao de dor
VAS
FPS-R
Puno com
tcnica de
distrao (A)
Avaliao de dor
VAS
FPS-R
VAS = Visual Analog Scale; FPS-R = Faces Pain Scale Revised.
O G1 foi submetido interveno de distrao (A), realizada pela pesquisadora
responsvel (psicloga especialista em Psicologia Peditrica, experiente e treinada) antes e
durante um procedimento de puno. Em outro dia um segundo procedimento de puno era
realizado sem interveno (B). No G2, por sua vez, o procedimento ocorreu de forma inversa,
sendo que os participantes eram submetidos ao procedimento de puno sem aplicao da
tcnica de distrao (B) e ao passar pelo procedimento doloroso em outro dia foi aplicada a
interveno de distrao descrita (A). Aps a concluso dos procedimentos de puno, a
pesquisadora aplicava os instrumentos de medida de intensidade de dor (Escala Visual
Analgica VAS, Escala de Faces Revisada FPS-R).
O processo envolvido na interveno de distrao audiovisual aplicada nas crianas
est esquematizado na Figura 2.
Mtodo | 43
Preparao para Inicio do Procedimento de Trmino do Aplicao das
procedimento Filme puno Filme Escala de Dor
______|_____5min_____|_____5min_____|_____5min_____|_____5min_____|_____
Figura 2. Esquema temporal da interveno de distrao audiovisual.
Alm dos procedimentos descritos anteriormente, foi realizada uma observao de
cada procedimento doloroso em que as crianas eram submetidas, registrando-se o tipo de
puno (venosa ou arterial) e os nmeros de tentativas da mesma realizada pela equipe de
enfermagem. Foram coletados tambm dados do pronturio mdico referentes s seguintes
informaes: especialidade peditrica responsvel pelo atendimento da criana, diagnstico
ou hiptese diagnstica, tempo de tratamento, motivos da internao atual, tempo de
internao at o dia da primeira puno, tempo de intervalo entre as punes e tempo total de
internao.
3.7.2 Anlise de dados
A preparao dos dados para anlise incluiu as seguintes etapas: organizao dos
materiais impressos e protocolos em pastas com a devida identificao, correo dos testes de
acordo com as normas dos respectivos instrumentos de avaliao, codificao dos
participantes e das variveis, montagem de planilhas e organizao de Banco de Dados no
programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS, 19.0, Chicago, IL, USA).
Os dados foram submetidos anlise de estatstica descritiva, em termos de: a) mdia,
desvio-padro, valores mnimos e mximos para as variveis numricas contnuas; b)
frequncia e porcentagem para as variveis categricas. Foram realizadas anlises de
comparao entre grupos utilizando-se o Teste t de Student para as variveis contnuas e o
Teste do Qui-Quadrado para as variveis categricas, a fim de verificar se existia diferenas
significativas entre os grupos quanto s caractersticas principais.
Mtodo | 44
Foi processada a anlise de varincia ANOVA 2 X 2 para modelos de estudos
crossover com a finalidade de atender o objetivo do estudo. Alm disso, foi aplicado o teste
Omnibus como medida de separabilidade entre os efeitos da interveno e os efeitos carry-
over, utilizando-se o programa Stata Statistical Software (StataCorp LP, 13.0, College
Station, TX, USA). O nvel de significncia adotado em todas as anlises realizadas no
presente estudo foi de 5%.
Resultados | 45
4 RESULTADOS
Os resultados do presente estudo sero apresentados em quatro sees. Primeiramente,
sero expostos os dados relacionados s caractersticas da amostra, incluindo a caractersticas
sociodemogrficas e as caractersticas de evoluo clnica das crianas. Na segunda seo
sero focalizados os dados sobre os procedimentos dolorosos aos quais as crianas foram
submetidas, seguida pela terceira seo em que sero apresentados os resultados relativos aos
escores de estresse e catastrofizao da dor mensurados como indicadores de linha de base
das crianas. Finalmente, na quarta seo, sero expostos os resultados de comparao entre e
intra-grupos relacionados aos dados das avaliaes de dor que mensuram a eficcia da
interveno para alvio de dor (distrao audiovisual) utilizada no presente estudo.
4.1 Caracterizao da amostra
A Tabela 1 apresenta a caractersticas sociodemogrficas das crianas do G1 e do G2.
Tabela 1. Caracterizao sociodemogrfica da amostra.
Caractersticas das crianas G1
(n = 22)
G2
(n = 18)
Valor de p
Sexo f (%)
Masculino
Feminino
7 (32)
15 (68)
9 (50)
9 (50)
0,24 (1)
Idade Mdia (DP)
8,32 ( 2,05) 8,72 ( 1,80) 0,52 (2)
Escolaridade Mdia (DP) 2,82 ( 1,81) 3,61 ( 2,00) 0,20 (2)
G1 = Grupo 1 (AB); G2 = Grupo 2 (BA), (1) Teste do Qui-quadrado; (2) Teste t de Student; f =
frequncia; % = porcentagem; DP = desvio padro.
Na Tabela 1 verifica-se que no foram encontradas diferenas estatisticamente
significativas entre os grupos G1 e G2 quanto s caractersticas sociodemogrficas das
Resultados | 46
crianas. Houve uma distribuio semelhante de meninos e meninas nos dois grupos. Em
ambos os grupos, as crianas estavam com uma idade mdia em torno de oito anos e
escolaridade mdia entre dois e trs anos de estudo.
A Tabela 2 revela as caractersticas de evoluo clnica das crianas, relacionadas a
especialidade peditrica responsvel pela internao, motivo da internao atual, durao da
enfermidade, tempo de internao at a primeira avaliao, tempo de internao total e tempo
de intervalo entre os perodos das avaliaes realizadas no estudo.
Tabela 2. Caractersticas da evoluo clnica das crianas.
Caractersticas clnicas das crianas G1
(n = 22)
G2
(n = 18)
Valor de p
Especialidades peditricas f (%)
Onco-hematologia
Gastroenterologia
Cardiologia
Endocrinologia
Pneumologia
Reumatologia
Nefrologia
Imunologia
12 (54)
1 (5)
1 (5)
1 (5)
3 (13)
1 (5)
3 (13)
0
5 (29)
0
0
5 (29)
3 (17)
2 (11)
1 (7)
1 (7)
NA
Motivo da internao atual f (%)
Tratamento clnico
Tratamento cirrgico
Investigao diagnstica
17 (77)
3 (14)
2 (9)
9 (50)
0
9 (50)
0,08 (1)
Durao da enfermidade (meses)
Mdia (DP)
40,27 ( 43,21)
39,72 ( 40,80)
0,97 (2)
Tempo de internao at 1
avaliao (dias)
Mdia (DP)
4,36 ( 4,07)
4,61 ( 4,48)
0,86 (2)
Tempo total de internao (dias)
Mdia (DP)
11,77 ( 9,71)
10,56 ( 7,70)
0,67 (2)
Tempo de intervalo entre as
avaliaes (dias)
Mdia (DP)
2,32 ( 1,64)
2,50 ( 1,72)
0,74 (2)
G1 = Grupo 1 (AB); G2 = Grupo 2 (BA); (1) Teste do Qui-quadrado; (2) Teste t de Student; f =
frequncia; % = porcentagem; DP = desvio padro; NA = no se aplica.
Resultados | 47
Verifica-se na Tabela 2 que no houve diferena estatisticamente significativa entre os
grupos G1 e G2 quanto s caractersticas de evoluo clnica registradas nos pronturios
mdicos das crianas. Quanto especialidade peditrica responsvel pela internao, observa-
se que a amostra foi composta por pacientes de diversas especialidades, sendo predominante a
Onco-hematologia peditrica e Endocrinologia peditrica. Nota-se que os motivos da
internao atual foram semelhantes entre os grupos, embora tenha havido uma tendncia
estatisticamente significativa a ocorrer mais investigao diagnstica no G2 em relao ao
G1.
A durao da enfermidade teve uma mdia em torno de 40 meses de tratamento em
ambos os grupos, o que sugere ser uma amostra de crianas com enfermidades crnicas. O
tempo de internao at a primeira avaliao da criana foi em mdia quatro dias e o tempo
total de internao manteve-se entre 10 e 11 dias em ambos os grupos; no houve diferenas
estatisticamente significativas entre os grupos. Em relao ao intervalo entre as avaliaes dos
procedimentos de puno, a mdia em torno de dois dias foi semelhante em ambos os grupos;
tambm no houve diferenas estatisticamente significativas entre os grupos.
4.2 Caracterizao do procedimento doloroso
A Tabela 3 apresenta as caractersticas dos procedimentos dolorosos de puno aos
quais as crianas foram submetidas, em relao a: tipo de puno, nmero de tentativas da
puno e uso de medicaes para dor nos dias das avaliaes.
Resultados | 48
Tabela 3. Caractersticas dos procedimentos dolorosos.
Caractersticas do procedimento
doloroso
G1
(n = 22)
G2
(n = 18)
Valor de p
Tipo de procedimento doloroso (1
avaliao) f (%)
Puno venosa
Puno arterial
19 (86)
3 (14)
15 (83)
3 (17)
0,79 (1)
Tipo de procedimento doloroso (2
avaliao) f (%)
Puno venosa
Puno arterial
20 (91)
2 (9)
16 (89)
2 (11)
0,83 (1)
Nmero de tentativas de puno (1
avaliao)
Mdia (DP)
1,27 ( 0,70)
1,56 ( 0,92)
0,28 (2)
Nmero de tentativas de puno (2
avaliao)
Mdia (DP)
1,18 ( 0,66)
1,00 ( 0,00)
0,25 (2)
Medicao utilizada para dor no dia
(1 avaliao) f (%)
Ausente
Presente
14 (64)
8 (36)
12 (67)
6 (33)
0,84 (1)
Medicao utilizada para dor no dia
(2 avaliao) f (%)
Ausente
Presente
13 (59)
9 (41)
14 (78)
4 (22)
0,21 (1)
G1 = Grupo 1 (AB); G2 = Grupo 2 (BA); (1) Teste do Qui-quadrado; (2) Teste t de Student;
f = frequncia; % = porcentagem; DP = desvio padro.
De acordo com a Tabela 3, ambos os grupos foram comparveis em relao s
caractersticas dos procedimentos dolorosos; no houve diferena estatisticamente
significativa entre eles. O tipo de procedimento predominante nos dois grupos foi puno
venosa, seguida de puno arterial, tanto na primeira quanto na segunda avaliao da criana.
Quanto ao nmero de tentativas para o sucesso do procedimento, observa-se uma mdia
semelhante (uma tentativa) em ambos os grupos nas duas avaliaes realizadas. Em relao
ao uso de medicaes para dor, nota-se que a maioria das crianas no utilizava tais
Resultados | 49
medicaes nos dias das avaliaes; no houve diferena estatisticamente significativa entre
os grupos.
4.3 Indicadores de estresse e de catastrofizao da dor nas crianas
Na Tabela 4 encontram-se os dados referentes