A Vez Do Marketing Verde

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  • 8/14/2019 A Vez Do Marketing Verde

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    A vez do marketing verde

    Cleyton Carlos Torres11

    Em 1886, a palavra ecologia, do grego oikos (habitat) e logos(cincia), foi empregada

    pela primeira vez pelo zologo alemo Ernst Haeckel, para a definio das interaes de

    qualquer espcie existente entre os animais e o ambiente. Porm, foi mais precisamente no

    perodo entre guerras (mundiais) que o homem comeou a adotar uma postura com maior

    exigncia quanto aos produtos que consumia e, por extenso, o requerimento de novas posies

    por parte das empresas, j que suas aes, principalmente a partir desse contexto, eram

    relacionadas com atitudes prejudiciais sade do planeta, por serem caracterizadas como os

    principais poluidores.

    Dessa natureza, o homem comea a debater e discutir seu presente e futuro, e analisa,

    atravs de diversos pontos de vista, os impactos que sua verticalizao causou ao meio

    ambiente desde ento. Dalmoro, Venturini & Pereira apontam que:

    O acelerado crescimento demogrfico, tecnolgico e industrial, doltimo sculo, gerou reflexes, por parte da sociedade em geral, acercado impacto deste crescimento na qualidade de vida das pessoas e napreservao ambiental. Questes como responsabilidade social,desenvolvimento sustentvel e consumo consciente passaram a fazerparte do dia-a-dia das empresas, da sociedade e do governo.(DALMORO, VENTURINI & PEREIRA, 2008:40)2

    Com isso, atualmente as organizaes empresariais se defrontam com uma demanda de

    novas necessidades corporativas, relacionadas no s aos seus produtos e servios, mas

    tambm s suas interaes com a sociedade e o meio ambiente ao seu redor. A chamada

    Responsabilidade Social Empresarial (RSE), onde entra o eco-marketing, comea a tomar forma

    e contedo.

    Por definio, marketing a ao empresarial direcionada para a identificao das

    necessidades, carncias e valores de um mercado especfico, assim como na criao dessas

    necessidades e aplicabilidade de novos valores, de acordo com o desenvolvimento e a exignciada humanidade.

    J o eco-marketing um segmento do marketing que trabalha diretamente com os

    pblicos dos chamados nichos verdes, que so consumidores que j exercem uma conscincia

    ecologicamente correta ou que no esto diretamente relacionados com a causa ambiental, mas

    que se interessam pelo tema, sendo, desse modo, possveis de cooptao. So considerados

    1 Jornalista e blogueiro. Ps-graduado em Assessoria de Imprensa, Gesto da Comunicao e Marketing. Contato:[email protected] em http://200.169.97.104/seer/index.php/RBGN/article/viewFile/232/445. ltimo acesso em 28/11/2009.

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    nichos de mercado por serem um nmero baixo de consumidores e produtos. Porm crescente

    em vista que essa parcela est ligada aos formadores de opinio e pertencentes s classes mais

    altas, alm de que as prticas sustentveis se constituem em um terreno extremamente frtilpara as empresas.

    O termo eco-marketing nasceu na dcada de 70, quando a American Marketing

    Association (AMA), visando as futuras transformaes em que caminhavam os mercados e

    observando uma nova economia que surgia, produziu um workshop com o intuito de debater o

    papel do marketing frente ao meio ambiente. Do evento, o eco-marketing ficou definido como

    sendo, segundo a AMA, o estudo dos aspectos positivos e negativos das atividades de

    marketing em relao poluio, ao esgotamento de energia e ao esgotamento de recursos no

    renovveis. No Brasil, a Natura citada no relatrio Talk the walk, de 2005, como uma das

    cinco pioneiras na utilizao do marketing verde em grande escala.Nessa nova economia (a economia do politicamente correto e do socialmente

    responsvel) um dos grandes desafios das empresas diz respeito colocao da sua imagem

    no mundo globalizado em plena era da informao. So cada vez menores as diferenas entre

    os produtos das grandes e pequenas empresas, nacionais e internacionais, pois a globalizao,

    apagando limites geogrficos e mesclando centenas de culturas diferentes, os tornou to

    prximos em estrutura fsica e de qualidade, que j no se leva mais em conta apenas o preo, o

    design ou os demais fatores comuns. nessa hora que se veem os benefcios da era da

    informao, e nesse contexto que o marketing e todos os seus adjetivos modernos,

    principalmente o eco-marketing, se mostram como um dos principais braos dessa novaestrutura organizacional.

    Cada vez mais maior o nmero de pessoas que se questionam se ao consumirem

    determinado produto de uma marca especfica, estaro ajudando na construo de uma

    sociedade mais justa. Cada vez mais, preo e qualidade so posies secundrias, sendo

    substitudos pela tica, princpios e valores. A era da informao est criando uma enorme

    gerao de consumidores socialmente responsveis, que deixam de adquirir um produto ou, de

    fato, o adquirem, se a empresa estiver relacionada com alguma ao ou projeto social, como

    aponta Domingues, Queirs & Abreu:

    A crescente preocupao com a preservao do meio ambiente, aliadaao papel desempenhado pelas organizaes ecolgicas e meios decomunicao, comea a gerar novos hbitos de consumo nassociedades. O consumidor exerce poder atravs das suas decises decompra contribuindo dessa forma para o processo de mudana. Opoder de compra, embora atue de uma forma mais sutil e silenciosa doque manifestaes ou boicotes, tem maior impacto sobre as decisesestratgicas das empresas. (DOMIINGUES, QUEIRS & ABREU,2003:07)

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    A comunicao a responsvel por efetuar a integrao desta tendncia socialmente

    responsvel que as empresas esto adotando e que deixa sinais claros quando o social ou no

    estrategicamente utilizado, com as novas posies tomadas por parte da sociedade em geral.Kitchen &Schultz afirmam que:

    Clientes, funcionrios e sociedade em geral esto buscando umentendimento e conhecimento do carter das empresas. Se elas nose comunicarem, esses pblicos tiraro suas concluses a partir daprimeira informao que encontrarem disponvel. (KITCHEN &SCHULTZ, 2001:306)

    Com isso, as empresas privadas e as instituies sem fins lucrativos - e, por extenso,

    os produtos e/ou servios que representam ganham novas e importantes dimenses,

    constitudas pelos valores de uma nova cultura organizacional, baseada no ser politicamentecorreto, cristalizando, desse modo, uma imagem institucional positiva junto aos pblicos externo

    e interno com os quais a organizao interage.

    Entretanto, esse processo que tambm demanda clareza e coerncia no plano dos

    valores institucionais, no era evidentemente praticado, j que antigamente as empresas

    limitavam sua comunicao devido a contextos polticos, conforme Torquarto coloca:

    Num pas econmica e politicamente fechado, as corporaes einstituies viviam de costas para a sociedade: no respeitavam oconsumidor, consideravam a preservao do meio ambiente uma

    fantasia que poderia colocar em risco a lucratividade e negavam opinio pblica o direito de ser informada sobre suas atividades. Nocaso particular da administrao pblica e das estatais, at ainformao mais prosaica era tratada como questo de segurananacional e, portanto, sonegada ao pblico. (TORQUATO, 2004:21)

    Como podemos ver, h uma grande diferenciao das aes praticadas naquela poca,

    pois, nos dias atuais, com uma nova posio ocular que a sociedade apresenta, as corporaes

    procuram, ao extremo, alinhar suas imagens a um papel de empresa-cidad, mesmo gerando

    conflitos de princpios (empresa realmente responsvel socialmente ou uma mera estratgia de

    marketing?).

    Entretanto, no s questes polticas afetam o desenvolvimento estratgico de aes de

    eco-marketing, pois o social tambm um papel decisivo para a atuao das empresas, como

    coloca Portela:

    No Brasil, ainda devido baixa renda per capita de grande parte dapopulao, uma parcela significativa dos consumidores ainda poucosensvel aos apelos ecolgicos dos produtos. Esse quadro, contudo,est em processo de modificao rpida devido a educao ambientalpor parte de diferentes organizaes e mesmo rgos da mdia. Nessesentido, no se pode deixar de atentar para um nicho de mercado compossibilidades reais de crescimento, possuindo consumidores com

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    renda e instruo suficientes para valorizar o marketing verde e osprodutos ambientalmente corretos.Empresas que possuem viso de longo prazo tomam uma dupla

    medida: alm de atenderem as regulamentaes governamentaissobre a questo ambiental, incluem o meio ambiente na sua filosofiaempresarial e o adotam como questo estratgica para sobrevivnciados seus negcios. Desse modo, considera-se que o marketing verdesurge como uma ferramenta para auxiliar as organizaes no processode entrega de valor aos seus clientes com garantia de preservaoambiental. (PORTELA:2008)3

    Nisso, fica evidente que o terceiro setor , de fato, um modismo empresarial desde o

    final do sculo XX. Nunca se falou tanto em sustentabilidade social, produtos produzidos de

    maneira politicamente correta e, principalmente, nunca os passos da iniciativa privada e das

    organizaes sem fins lucrativos andaram to prximos e ao mesmo tempo nunca foram to

    importantes.

    O novo desafio dos comunicadores aliar, em um mesmo processo estratgico

    empresarial, a imagem da empresa, a responsabilidade social empresarial e, devido s eras

    tecnolgica e de informao em que vivemos, explorar ao mximo os canais das novas mdias

    digitais, criando uma interface entre empresa e sociedade que caracterize o sculo tecnolgico

    no qual estamos inseridos, usando a mdia digital no para uma empresa parecer socialmente

    responsvel, mas para ajud-la a efetivamente ser, principalmente na construo de valores,

    como aponta Carniello & Zulietti:

    A criao de uma plataforma nica fundamentada na linguagem digitalpara todas as mdias resultou tambm em um uso maior decomplementaridade entre as mdias por parte dos comunicadores,permitindo que todos os meios operem em conjunto para construo devalores. (CARNIELLO & ZULIETTI, 2006: 06)

    Esse passa a ser o enfoque do marketing: entender o branding noapenas como a agregao de valores a um produto, e sim fazer comque seja impossvel dissociar valores dos produtos dos valores dasociedade. (CARNIELLO & ZULIETTI, 2006: 07)4

    Nesse contexto, o marketing verde trabalha para a melhora da imagem da empresa e na

    explorao de um nicho de mercado crescente, lucrativo e exigente. Vender produtos e proteger

    o meio ambiente, criar expectativas de necessidades nos consumidores e, ao mesmo tempo,

    possuir um papel fundamental no equilbrio ecolgico so caractersticas fundamentais do eco-

    marketing. H as chamadas linhas verdes (produtos ecologicamente corretos) porque h os

    chamados consumidores verdes (a parcela de mercado que agrega valor marca quando esta

    est vinculada preservao ambiental e est disposta a pagar mais por isso) em crescente

    demanda, e vice-versa, h consumidores verdes porque a quantidade de produtos

    3 Disponvel em http://www.comunidade vencer.com.br/blog.aspx?bid=4918. ltimo acesso em 15/10/2009.4Disponvel em http://www.vertent.net/abrapcorp/www/trabalhos/gt3/gt3_carniello.pdf. ltimo acesso em 15/10/2009.

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    ecologicamente corretos no para de crescer e tomar mercados, grandes redes de distribuio e,

    principalmente, a mdia.

    Isso fica evidente quando, segundo Ottman, o marketing do meio ambiente tem porestrutura dois pontos fundamentais:

    Desenvolvimento de produtos que equilibrem necessidades dosconsumidores, tenham preo vivel e convenincia comcompatibilidade ambiental, ou seja, exeram um impacto mnimo sobreo ambiente e projeo de uma imagem de alta qualidade, incluindosensibilidade ambiental, quanto aos atributos de um produto e quantoao registro de trajetria do fabricante, no que se refere a respeitoambiental. (OTTMAN, 1993:43)

    Entretanto, essa imagem deve ser o mais facilmente possvel para o consumidor aderi-

    la. Ter um produto ecologicamente correto, mas no investir para que o comprador note em

    poucos momentos, destinar toda uma estratgia ao fracasso, pois na era do imediatismo e da

    competio por diferenas entre produtos finais, ningum quer ter que adivinhar ou supor que

    uma marca respeita o meio ambiente. Quer, sim, notar a empresa, processar a informao e,

    conforme seu conhecimento informacional adquirido, decidir se adere ou no.

    Alm do mais, o eco-marketing deve falar por si s, mas tambm tem o papel de

    educador perante a sociedade. O marketing verde deve criar necessidades no consumidor,

    atravs de produtos que causem o menor impacto possvel no meio ambiente, mas tambm

    deve educar a sociedade para que a mesma entenda os reais significados de se consumir um

    produto conforme os padres atualmente impostos pela mdia, por ONGs e, principalmente,

    colocadas por uma parcela de mercado que j vem acompanhando essa transformao.

    Essa educao parte do pressuposto que, alm do conscientizao ecolgica, o eco-

    marketing deve estimular o consumo consciente onde no existe e continuar agregando valor a

    marca onde j de conhecimento de todos. O papel dessa vertente do marketing possui mo

    dupla, bidirecional. Quando educado e consciente, o consumidor possui maiores chances de

    adquirir o produto ao qual sua marca est relacionado, seguindo os valores propostos pelo

    marketing verde. Antnio Callado, Aldo Cunha & Lima apud Chamarro colocam como questes

    estimuladoras bsicas o seguinte:

    Informar e educar: as campanhas realizadas trazem a possibilidade daconscincia da reciclagem e do fim do desperdcio, com o objetivo deinformar sobre a utilizao de uma coleta seletiva de resduos slidosurbanos.

    Estimular aes benficas para o meio ambiente: as diferentescampanhas para que o cidado economize gua e energia pretendemincentivar um comportamento ecolgico mas adequado.

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    Trocar comportamentos nocivos para o meio ambiente: as campanhascontra fogo, todos os veres, tratam de evitar que o cidado realizequeimadas que possam ocasionar incndios.

    Troca de valores pela sociedade: dentro deste objetivo se podeenquadrar as campanhas de recomendao de respeitar o ciclo de vidados peixes e campanhas para a proteo das florestas. (CALLADO,CUNHA & LIMA, 2006)5

    Segundo o estudo Talk the walk, o marketing verde economicamente vivel,

    principalmente para as empresas que no possuem muitos recursos para a publicidade, e

    extremamente importante para todas elas, independentemente do tamanho, j que as aes

    sociais e ambientais so cada vez mais discutidas na sociedade. Uma das empresas citadas no

    estudo, a brasileira Natura, demonstra como o eco-marketing pode alavancar de forma real asvendas. Os ganhos no perodo de 2002 a 2004 refletem um crescimento de 32%, ante elevao

    de 20% do mercado de cosmticos, fazendo que a empresa atingisse uma fatia de 19% do

    mercado, e uma cifra final, em 2004, de mais de 604 milhes de dlares. O valor da marca,

    entretanto, 113% do volume de vendas anual, demonstrando a importncia positiva agregada

    ao nome.

    Alm disso, segundo o mesmo relatrio, cerca de 70% dos consumidores gostariam de

    adquirir produtos ecologicamente corretos, mas no o fazem por falta de informao.

    O eco-marketing traz reduo de custos, agrega valor marca, transforma toda uma

    cadeia de produo e, principalmente, vende mais do que um produto que gera impactosnegativos mnimos no meio ambiente, vende, tambm, informao, valores.

    Referncias

    DOMINGUES, Mnica F.; QUEIRS, Bruno T.; ABREU, Nuno Beiro. Ecomarketing.Dissertao (Economia do Meio Ambiente) Faculdade de Economia do Porto, Porto, 2003.

    KITCHEN, Philip J.; SCHULTZ, Don E. Raising the corporate umbrella: corporatecommunications in the twenty-first century. Houndmills: Palgrave MacMillan, 2001

    OTTMAN, J. Marketing verde: desafios e oportunidades para a nova era do marketing. SoPaulo: Makron Books, 1993.

    TORQUATO, Gaudncio. Comunicao Empresarial / Comunicao Institucional. So Paulo:Summus Editorial, 1986.

    ___________. Tratado de comunicao organizacional e poltica. So Paulo: Thomson, 2004.

    5 Disponvel emhttp://www.biblioteca.sebrae.com.br/bds/BDS.nsf/1d7b269b07fee04a03256eae005ec615/760953e80df881ba83256f88005178e4/$FILE/NT000A310E.pdf. ltimo acesso em 12/09/2009.