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AGIRÁS Revista AGIR de Ambiente e Sustentabilidades Ibirapitanga (BA), v. 1, n. 1, ago./nov. 2009 6 Dossiê Pratigi Adequação Espacial e Conceitual para o Zoneamento da APA do Pratigi Rui Barbosa da Rocha [email protected] Danusa Campos Roque Galeão Rezende Fraga Rogério Nunes Wolf Reiber Fábio Lopes

Adequação Espacial e Conceitual para o Zoneamento da APA do Pratigi

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Dossiê Pratigi

Adequação Espacial e Conceitual para o Zoneamento da APA do Pratigi

Rui Barbosa da Rocha

[email protected]

Danusa Campos

Roque Galeão Rezende Fraga

Rogério Nunes

Wolf Reiber

Fábio Lopes

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Apresentação

A Área de Proteção Ambiental - APA do Pratigi possui cerca de 85.686 ha e localiza-se no Baixo Sul do Estado da Bahia. Inserida no Corredor Central da Mata Atlântica, foi criada em abril de 1998 com objetivo de proteger as grandes extensões de praias, restingas, manguezais e remanescentes de Floresta Ombrófila Densa, bem como promover o desenvolvimento rural e urbano dos municípios que a abrigam.

A sua poligonal foi estendida em 2001. Apesar de existir um Plano de Manejo (CRA, 2000), este somente abrangia a porção original da unidade. Após a ampliação, que incluiu toda a Bacia Hidrográfica do Rio Juliana, a APA recebeu novo Plano de Manejo, realizado com apoio do Programa Corredores Ecológicos, do MMA.

O Plano de Manejo foi aprovado pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente - CEPRAM em 2006, embora já mereça revisão e adequações espaciais, considerando a necessidade de ampliação de sua poligonal e ajustes específicos em seu zoneamento, com base em diagnóstico socioambiental em curso pelo Grupo de Trabalho - GT, sob a orientação da Secretaria de Meio Ambiente da Bahia, através da Superintendência de Biodiversidade e Florestas e da Administração da APA.

O Plano de Manejo é um instrumento de planejamento e gerenciamento das unidades de conservação, elaborado com base nos diagnósticos dos fatores bióticos, físicos e humanos existentes na unidade de conservação e seu entorno. O Plano de Manejo foi realizado pela Ecossistema Consultoria Ambiental, com os estudos iniciados pela equipe da Ecossistema em setembro de 2003, englobando 20 técnicos especialistas em diversas áreas do conhecimento.

A metodologia utilizada seguiu o "Roteiro Metodológico de Planejamento de Parque Nacional, Reserva Biológica e Estação Ecológica" (IBAMA, 2002) e o Roteiro Metodológico para Gestão de Áreas de Proteção Ambiental - APAS (IBAMA, 2001). Segundo a empresa responsável, efetuou-se a caracterização do meio físico da Área Ampliada da APA do Pratigi, incluindo os solos, visando compreender as limitações e os conflitos existentes de forma a subsidiar o manejo e gestão da APA. Também foram realizados levantamentos sobre plâncton, bentos e ictiofauna no ambiente aquático e flora, avifauna, herpetofauna e mastofauna do ambiente terrestre.

Os estudos caracterizaram os diversos ambientes existentes na APA, identificando-se a ocorrência de diversas espécies raras e endêmicas,

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confirmando a informação de que a região é de grande importância para a conservação da biodiversidade. Ainda segundo a empresa responsável, foram realizados estudos socioeconômicos, enfatizando as atividades de ecoturismo e a identificação de diversos conflitos e seus impactos ambientais. Em relação ao patrimônio histórico-arqueológico foram identificadas 24 ocorrências arqueológicas, caracterizando uma grande diversidade cultural.

Por outro lado, o Grupo de Trabalho estabelecido pela Secretaria de Meio Ambiente - SEMA compreende que o tratamento dado a esta APA seguiu parâmetros de conservação mais afeitos a Unidades de Conservação de Proteção Integral, sem considerar em profundidade a dinâmica agrária e socioeconômica da mesma, o que dificulta a implementação do zoneamento proposto.

Conclusão do estado atual na APA:

1 Existe uma realidade agrária/fundiária em crise, com miséria social atrelada a desmatamentos de formiguinha na região da Serra da Papuã, voltados para a produção de mandioca e banana, incluindo a oferta de lenha para secagem de cacau;

2 O Plano de Manejo da APA atual restringe projetos estruturantes para uma nova economia na APA, a exemplo do que propõe o Plano de Desenvolvimento Integrado para a APA do Pratigi – criação de lagos, geração de energia em micro e pequenas centrais hidroelétricas, piscicultura, melhorias e formatação da estrada parque entre Ituberá e a BR 101;

3 Intervenções estruturantes se mostram capazes de alterar o quadro social, econômico e ambiental da APA, especialmente na sua região mais crítica – o Ecopolo 1 – mesmo que com algum impacto ambiental – supressão de florestas, alteração do leito dos rios, povoamento de peixe exótico (tilápia);

4 Estes projetos de desenvolvimento estão concebidos na região e prontos para serem implementados pela AGIR, com apoio governamental, da Fundação Odebrecht e orientação técnica da OCT.

5 Intervenções poderão conduzir a região para uma economia pautada em energia, piscicultura, agroflorestas, silvicultura, restauração de matas nativas e a conservação de florestas remanescentes, constituindo ambiente agrário e ambiental para o agroecoturismo.

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Figura 1

Portanto, a decisão de se constituir um Grupo de Trabalho, coordenado pelo Professor Rui Barbosa da Rocha, do Departamento de Ciências Agrárias e Ambientais da Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC, deu-se em maio de 2008, em reunião com Dr. Marcos Ferreira, Superintendente de Biodiversidade e Florestas da Secretaria de Meio Ambiente da Bahia, Dr. Plinio Sampaio, diretor de Unidades de Conservação, Dr. Rogério Cunha, administrador da APA, e o Sr. Wolf Reiber, consultor representante da Fundação Odebrecht.

Metodologia

A percepção de todos foi de que seria necessário considerar os estudos preliminares de pesquisadores da UESC e do Instituto Floresta Viva que apontavam profunda crise socioambiental na APA do Pratigi, em detrimento do Plano de Manejo da APA do Pratigi, que orienta conservação e preservação generalizada na APA, sem apontar caminhos para o desenvolvimento sustentável na região, capazes de superar as limitações e ciclos de desmatamento com a agricultura familiar, especialmente no Ecopolo 1 (zona alta da Bacia do Juliana).

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Com esta constatação, decidimos realizar estudos e oficinas com o Conselho Gestor da APA e representantes das prefeituras dos municípios associados ao Pratigi, concluindo-se com uma proposta de Adequação do Plano de Manejo a esta realidade socioambiental, justificando assim projetos de desenvolvimento com uso intensivo de mão de obra rural em atividades localizadas, evitando novos desmatamentos no Ecopolo I, zona mais ameaçada na APA, atualmente. Este fenômeno, porém, não se restringe a apenas um Ecopolo, mas alcança também os Ecopolos 2 e 3, em zonas específicas que merecem ajustes e adequações.

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Figura 2 - Poligonais concebidas para ampliação da APA, considerando os divisores de águas que compõem as principais bacias hidrográficas do território

No dia 2 de abril de 2009, em primeiro encontro de avaliação e definição de calendário para o grupo de trabalho, na Serra da Papuã, com a participação de Roque Fraga, Fábio Lopes, Rogério Cunha e Rui Rocha, estabeleceu-se um roteiro metodológico específico para elaboração de proposta de adequação do Plano de Manejo, a ser submetida ao Cepram. Os passos são:

1. Levantamento de informações e base de dados existente:

• Planos Diretores dos cinco municípios associados à APA; • Ações de Regularização Fundiária em execução pela CDA/SEAGRI; • Estudos atuais de utilização das terras, realizados pela OCT e AGIR; • Outros estudos e informações disponíveis.

2. Elaboração de desenho para proposta de ampliação da APA, com justificativas, com base em recomendações do próprio plano de manejo, no âmbito dos atuais cinco municípios;

3. Adequações e atualização do zoneamento da APA;

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4. Incorporação/sugestão de um Sistema de Áreas Protegidas, incluindo sugestões para inserção de Monumento Natural na Pancada Grande, Refúgio de Vida Silvestre, Estação Ecológica e/ou categorias afins;

5. Avaliação final com os atores da APA, com foco nos cinco municípios do consórcio, com base na governança em curso no território.

Este trabalho envolverá um comitê de acompanhamento, com base no Consórcio Intermunicipal da APA do Pratigi, que inclui todos os secretários de meio ambiente dos cinco municípios. Ao mesmo tempo, estarão sendo envolvidos os técnicos da SEMA, IMA, UESC, ONGs locais e membros do CEPRAM.

Informações preliminares

De acordo com a Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, o desafio da APA do Pratigi é a proteção das restingas e manguezais, característicos do ecossistema da Mata Atlântica, até as áreas de estuário do município de Igrapiúna e a foz do Rio Pinaré, além dos remanescentes de Floresta Ombrófila Densa e da Bacia Hidrográfica do Rio Juliana, exuberante complexo hídrico, que contribui para a estabilidade do sistema hidrográfico microrregional, incluindo a Cachoeira da Pancada Grande, importante atrativo turístico da região (RBMA, 2006).

Figura 3 – Área antropizada, perda de conectividade florestal no Ecopolo Serra da Papuã

Fonte: Roque Fraga, 2008

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Merecem destaque, neste cenário, as Fazendas Reunidas Vale do Juliana (FRVJ) e a Michelin. A FRVJ cultiva principalmente cacau e pupunha, que ocupam uma área de 4.525 ha, dos quais 2.753 ha são cobertos por mata primária ou em estado avançado de regeneração; além de 479 ha por cacau em sistema agroflorestal cabruca. Por sua vez, a Michelin, uma das líderes mundiais na produção de pneus, tem na APA uma plantação de 9.000 ha que abriga 1.500 ha de Mata Atlântica primária. As plantações Michelin lançaram, também em 2003, o projeto Ouro Verde, que visa conciliar rentabilidade econômica, desenvolvimento social e proteção ambiental, por meio de sistemas agroflorestais alicerçados em pesquisa científica (Tabela 1).

Tabela 1 – Lista das pesquisas científicas na Reserva Ecológica Michelin

Pesquisas Projetos

Levantamento da Avifauna, onde foram catalogadas 250 espécies de aves (Pedro Lima)

Biogeografia de mamíferos de médio e grande porte numa Paisagem Antrópica na Mata Atlântica da Bahia – Brasil (Kevin Flesher – doutorado na Rutgers University – New Jersey)

Descrição de cinco novas espécies de dípteras (moscas) em periódicos científicos (Freddy Bravo)

Pesquisas realizadas

Densidade da população de macacos-prego-do-peito-amarelo, espécie ameaçada de extinção (Gustavo Canale – IESB)

Estudos Florísticos e Ecológicos Das Briófitas da Reserva Ecológica Michelin (Cid José Passos Bastos – UFBA) Dinâmica espacial na Diversidade de Polinizadores: heterogeneidade de habitats e conectividade funcional em minicorredores no Corredor Central da Mata Atlântica (Mauro Ramalho – UFBA) Ecologia e comportamento do macaco-prego-do-peito-amarelo (Cebus xanthosternos) – IESB Caracterização da comunidade de borboletas em uma reserva florestal no sul da Bahia: “Padrões Espaciais e Temporais” – UFBA

Pesquisas em andamento

Crescimento inicial de espécies arbóreas nativas da Mata Atlântica sob efeito de fungos micorrízicos arbusculares – UESC

Fonte: Subcomitê da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica do Baixo Sul da Bahia, 2006.

Sem a contribuição destas empresas, milhares de hectares de Mata Atlântica já teriam sido destruídos e consequentemente a Bacia do Serinhaém estaria irremediavelmente degradada, implicando em prejuízos ambientais incalculáveis em toda a região.

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Além das grandes empresas privadas que cooperam com a conservação ambiental na APA do Pratigi, é importante mencionar o apoio de pequenos e médios produtores como as fazendas Contendas I, Contendas II e Califórnia; o apoio das comunidades quilombolas que vivem da extração de piaçava na região estuarina convivendo harmonicamente com a maior mancha de Mata Atlântica do estado da Bahia; e, fato inédito, dos Assentamentos Rurais presentes na APA, como Lucas Dantas, Margarida Alves e Josiney Hipólito, estes com o desafio da estabilização dos remanescentes florestais e incremento da produção agroflorestal do cacau.

A área está inserida em Zona de Clima Tropical com elevadas temperaturas e pluviosidade, influenciados pela localização litorânea e maiores altitude mais a oeste. Está dividida em duas faixas climáticas que se distribuem paralelamente, Tropical chuvoso de floresta (Af) e Tropical de monção (Am) segundo a classificação de Köppen. O clima Af cobre toda região litorânea adentrando cerca de mais de 45 km para o interior. Este clima caracteriza-se por ser quente e úmido, sem estação seca definida, com temperaturas elevadas sem grandes oscilações. A precipitação é superior a 60 mm para o mês mais seco e o total anual acima de 1.330 mm com as máximas ocorrendo nos meses de fevereiro, março, abril, junho e julho. O relevo nessa faixa climática vai do plano ao forte ondulado.

Nestas paisagens predominam os solos arenosos com baixa fertilidade natural, entre eles os Neossolos, Espodossolos e Latossolos Vermelho-Amarelos. São propícios a cultivos de mandioca, coco-da-baía, caju, mangaba dentre outros. Os Tabuleiros Pré-litorâneos também aparecem na faixa Am, compreendem a maior parte da área central do Território com altitude média de 150 m.

Os relevos são uniformemente dissecados com presença de espesso manto de intemperismo sobre o embasamento cristalino associado às superfícies de aplainamento neogênicas, são chamados de mares de morro e formam topos tabulares, capeados por sedimentos. O padrão de drenagem é composto de numerosos sulcos difusos dendríticos, que aprofundam as ravinas centrais e geram alvéolos de cabeceira (RADAMBRASIL, 1981). Dentre os solos encontrados nessas paisagens estão os Latossolos Vermelho-Amarelo, Latossolo Amarelo, Argissolos Vermelho-Amarelo Eutróficos e Distróficos e uma extensão significativa de Chernossolo Avermelhado que são pouco férteis, pois se desenvolve de material pobre em minerais ferro-magnesianos.

Ainda nessa faixa estão presentes as Serras e Maciços Pré-litorâneos localizam-se na região sudoeste da bacia do Juliana e na porção central do território, abrangendo relevos montanhosos intercalados por áreas mais planas. A altitude desta área varia de pouco mais 200 m e as formas do relevo constituem-se de interflúvios, geralmente, convexizados, configurando colinas e morros que podem assumir feições de serras. As encostas apresentam-se convexas, côncavas e retilíneas, associadas aos afloramentos de rocha (RADAMBRASIL, 1981). Este relevo é originado por rochas gnáissicas e graníticas formando solos argilosos, profundos com boa fertilidade natural, propícios a lavoura cacaueira.

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Há ainda o Planalto Pré-Litorâneo formado por serras e maciços montanhosos tabulares separados por vales chatos ou agudos, formando uma drenagem dendrítica com altitude de 20-50 metros, entretanto a maior parte deste tipo de relevo é encontrado na faixa Tropical de Monção (Am).

O Tropical de Monção (Am) cobre menos de 30% do sudoeste da área do Território. Apresentam temperaturas médias superior a 18°C no mês menos quente, e chuvas constantes durante o ano com apenas um pequeno período seco ou menos úmido. Neste clima há uma variação da precipitação entre 1.100 a 1.500 mm anuais, contudo nos meses mais secos (agosto e setembro), a precipitação é inferior a 100 mm, os quais são compensados pelos totais pluviais elevados. Apresenta temperatura média elevada (acima de 23°C), com pequenas oscilações no decorrer do ano. O mês mais frio possui uma média superior a 18° C (CARVALHO FILHO et al., 1970).

Quanto às características climatológicas, a área do Território possui temperatura média de 25,0°C com máxima em 31,1°C e mínima de 21,5°C. O índice pluviométrico do litoral no ano mais seco chega a 1.901 mm e no ano mais chuvoso 3.222 mm mensais. A precipitação média anual é superior a 2.400 mm com período chuvoso correspondente aos meses de maio a junho e outubro a dezembro, não há mês seco pronunciado, entretanto o mês de setembro apresenta o índice pluviométrico mais baixo do ano (SEI, 1999; BAHIA, 1996). Estas chuvas são ocasionadas pela atuação da Frente Polar Atlântica e por Massas de Umidade vindas da Região Amazônica. A umidade relativa do ar está em torno de 84% e a direção predominante dos ventos é para o sudeste. As chuvas e a umidade relativa do ar decrescem no sentido leste/oeste.