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Alergias e Doenças Autoimunes Introdução O que são doenças autoimunes? O sistema imunitário produz um ataque que resulta na inflamação e na destruição de células. Pode afetar vários tecidos e órgãos do organismo ou especificamente um órgão. Turmas 12ºA/D Alergias Entrevista Colite Ulcerosa Entrevista Diabetes Mellitus I Entrevista Doença de Behçet Entrevista Doença Celíaca Entrevista Doença de Crohn Entrevista Esclerose Múltipla Entrevista Lúpus Entrevista Bibliografia 2 3 6 6 7 7 10 10 11 12 13 13 15 15 19 19 21 Doenças e Desiquilíbrios: Alergias e Doenças Autoimunes 1

Alergias e Doenças Autoimunes - AEJSC

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Alergias e Doenças Autoimunes

Introdução

O que são doenças autoimunes?

O sistema imunitário produz um ataque que resulta na inflamação e na destruição de

células. Pode afetar vários tecidos e órgãos do organismo ou especificamente um órgão.

Turmas 12ºA/D

Alergias

Entrevista

Colite Ulcerosa

Entrevista Diabetes Mellitus I

Entrevista Doença de Behçet

Entrevista Doença Celíaca

Entrevista Doença de Crohn Entrevista

Esclerose Múltipla Entrevista

Lúpus Entrevista

Bibliografia

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Alergias

Algumas doenças são provocadas pela intensificação das reações de defesa. Um bom exemplo de uma doença deste tipo são as alergias. Estas provêm de uma resposta exagerada do sistema imunológico face a determinadas substâncias inocentes e que habitualmente são toleradas pela maioria das pessoas, comportando-se como antigénios normais. O sistema imunitário de uma pessoa com esta patologia identifica, erradamente, essas tais substâncias como sendo nocivas e desenvolve uma estratégia para as eliminar.

As alergias são claramente prejudiciais para quem as possui. Estas desencadeiam uma série de alterações inflamatórias da pele e mucosas e originam os típicos sinais e sintomas desta doença. Existem duas vertentes possíveis para o aparecimento de alergias: através da hereditariedade genética ou através de fatores ambientais.

As alergias herdadas geneticamente são transmitidas por, pelo menos, um dos progenitores tendo este/s de possuir esta doença, conferindo assim mais probabilidade do indivíduo a ter. Se apenas um dos progenitores for portador, o indivíduo terá cerca de 50% de chance de a adquirir, porém se ambos os progenitores forem portadores, esta chance aumenta para 75%.

Queremos também referir que não é possível nascer-se alérgico, nasce-se sim com uma predisposição genética que age perante fatores ambientais, tornando a pessoa alérgica a certas substâncias, levando a que esta produza, com uma maior capacidade, uma resposta imunológica de alergia. As substâncias referidas também podem ser denominadas por alergénios.

Existem muitos tipos de alergénios:

• Ambientais inalados ou aeroalergénios (pólens, ácaros do pó, epitélios de animais, fungos…);

• Alimentares (proteínas do leite de vaca, ovo, frutos, camarão, etc…);

• Medicamentos (antibióticos, anti-inflamatórios, anestésicos, etc …);

• De contacto (níquel, crómio, perfumes, parabenos, etc…);

• Ocupacionais, relacionados com exposição no trabalho (látex, farinhas, etc …);

• Veneno de insetos (abelha, vespa, etc …).

Indivíduos com hipersensibilidade imunitária reagem aberrantemente contra algumas destas substâncias.

As reações do sistema imunológico proporcionam ao indivíduo um conjunto de sintomas alérgicos. Os sintomas variam de alergia para alergia sendo estes específicos, no entanto há alguns sintomas que são comuns, como é exemplo a alergia aos ácaros de pó e ao pólen.

No âmbito desta pesquisa, entrevistamos uma portadora de alergias alimentares. Trata-se de uma menina de 12 anos, cujo nome vamos ocultar por motivos de proteção de dados. Devido a isto, utilizaremos o nome fictício “Ana”. Entramos em contacto com a “Ana” e a sua família e colocamos algumas questões acerca deste assunto e da sua experiência pessoal. Segue-se a entrevista feita.

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Entrevista

Entrevistadoras: Como e quando foi diagnosticada a doença? Ana: A doença foi me diagnosticada por volta de 2013, depois de experienciar alguns sintomas (diarreia e vómitos) da doença, após ter comido um bolo de aniversário. Fui ao médico e ele sugeriu-me realizar o teste IgE e concluímos através deste que tinha, então, alergia ao ovo. Nos anos seguintes, ia sempre realizando testes e assim descobrimos que eu tinha além desta, outras alergias alimentares.

Entrevistadoras: Qual/Quais os alimentos a que é alérgica? Ana: O meu sistema imunitário reage ao ovo, ao leite, ao kiwi, à banana, ao tomate e ao marisco.

Entrevistadoras: Qual foi a sua reação ao saber que era alérgica a esses alimentos? Ana: Fiquei um pouco triste pois tinha noção que ia ter algumas limitações alimentares e que não ia poder comer tudo aquilo que desejava. O facto de saber que não ia poder consumir certos alimentos causava em mim uma maior vontade em consumi-los, tal como a expressão: "o fruto proibido é o mais apetecido".

Entrevistadoras: As alergias são de um estado muito elevado ou tolera em pequenas quantidades? Ana: Depende do alimento. Se tratar-se do ovo ou da sua proteína o meu corpo reage imediatamente, mesmos em pequeníssimas quantidades, logo esta é num estado muito

elevado. Por exemplo, a composição da vacina da gripe inclui a proteína do ovo, e por esse mesmo motivo não a posso tomar. Também não posso ingerir alimentos que tenham estado em contacto com ovo, porque até isso é suficiente para eu desenvolver sintomas. No caso dos outros alimentos, as reações são mais ténues e, portanto, só em grandes quantidades é que gero sintomas.

Entrevistadoras: Já sofreu reações alérgicas? Se sim quais? Ana: Já, muitas! Ao ovo e ao kiwi várias vezes. Estes causam-me um grande mau estar, vómitos e diarreia. Outro dos alimentos que também já desenvolvi reações foi ao leite, este provocou-me irritação na pele e muita comichão. Ao nível do sistema digestivo, este alimento, deixou-me com bastantes dores de barriga e diarreia. A banana também é um alergénio que em pequena me originou dores de barriga, mas o mesmo deixou de acontecer depois de o deixar de comer.

Entrevistadoras: Houve alguma alteração na sua rotina habitual? Ana: Sim, foi necessário comprar alimentos que não possuíssem os alergénios ao qual o meu corpo reage. Muitos deles encontram- se na secção vegana, quanto aos restantes, tive de deixar de ingerir retirando assim da minha alimentação, como é o caso do leite de origem animal e seus derivados e as frutas a que sou alérgica.

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Entrevistadoras: Utiliza substitutos alimentares? Se sim, quais? Ana: Utilizo: Para substituir o leite, bebo leite de soja. Para substituir o queijo “normal” os meus pais compram um queijo vegano, disponível nos supermercados. Para substituir o ovo existe um substituto válido para algumas receitas, o que a permite também comer alguns doces e bolachas. Para substituir os iogurtes consumo uns iogurtes sólidos de soja.

Entrevistadoras: A “Ana” sente falta de consumir esses alimentos? Ana: Sim, principalmente no Natal, quando vou a alguma padaria ou até mesmo em aniversários, uma vez que, os doces, em geral, têm na sua composição leite e ovos e, por isso, ao ver outras pessoas a comer o que eu não posso, sinto-me um pouco diferente e “aparte”. O alimento que sinto mais falta é o leite de origem animal porque é aquele que é mais difícil de substituir em produtos embalados e manufaturados, este encontra-se em quase tudo.

Entrevistadoras: Alguma vez se sentiu triste enquanto via outras crianças a comer aquilo que ela não pode? Ana: Sim, sinto-me. Especialmente em épocas festivas, em que existe uma enorme variedade de cozinhados e guloseimas, as quais não posso comer. Família: Mesmo que a “Ana” não se pronuncie é notório que ela se sente em baixo, visto que a conhecemos muito bem. Já até conversamos com ela sobre o assunto e fizemo-la perceber que é perfeitamente normal, cada um tem os seus problemas e limitações. Achamos que isso a ajudou e ela já aprendeu a lidar e a aceitar a sua condição. Não há nada que

lhe impeça de estar sempre com um sorriso na cara!

Entrevistadoras: Foi complicado impedi-la de comer esses alimentos? Família: Não, ela é uma criança bastante madura para a sua idade, logo quando lhe foi explicado ela compreendeu, claro que não vamos negar que ela se sentia um pouco chateada por não poder comer o que os outros meninos comiam, mas ela também compreendeu que era em prol da sua saúde.

Entrevistadoras: Qual foi a reação da família ao saber da notícia? Família: Ficamos um pouco abalados e frustrados por ela ter de deixar de consumir algumas coisas que gostava, porém poderia ser algo bem pior, por isso, olhamos com um certo positivismo para a situação.

Entrevistadoras: Houve alteração alimentar na rotina familiar? Família: Sim, por ela, todos decidimos evitar tudo o que ela não pode ingerir. Os almoços e jantares, bem como as sobremesas, foram modificados porque deixou-se de usar os seus alergénios. Também nós fazemos a sua dieta de modo a apoiá-la, fazendo com que ela não se sinta diferente de nós a nível alimentar. Ana: A minha família sempre me apoiou muito em todas as situações da minha vida e esta não foi exceção.

Entrevistadoras: O médico para a sua situação clínica prescreveu alguma medicação? Ana: Sim, o médico receitou-me o Atarax e o Bilaxten em xarope, para as alergias no geral. Tenho que o tomar ambos de manhã e à noite. Além disto utilizo bastantes cremes cutâneos.

Fim da entrevista

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Durante a entrevista foi referido alguns sintomas sentidos pela “Ana” ao consumir os seus alergénios, ou seja, alguns dos sintomas possíveis das alergias alimentares. Contudo, existe outros sintomas além dos referidos, são eles:

• Síndrome da alergia oral;

• Aparelho respiratório (rinite, tosse, pieira e dificuldade respiratória);

• Aparelho cardiovascular (taquicardia, hipotensão e lipotímia);

• Anafilaxia.

Os tratamentos anti alergénicos possíveis incluem a medicação sintomática, receitada para o alívio das queixas. Nesta medicação encontram-se também os anti-histamínicos para o controlo dos sintomas do indivíduo a nível respiratório, dos olhos, da pele, e os broncodilatadores para o tratamento da asma. Outro dos métodos prescritos pelos médicos é o uso de medicamentos preventivos (anti-inflamatórios). Estes combatem a alergia e evitam o aparecimento dos sintomas. As vacinas antialérgicas é o único tratamento específico e destina- se unicamente ao alergénio implicado, ou seja, adquire uma maior eficácia quando administrada corretamente e sob vigilância apertada do médico especialista em Imunoalergologia.

Em jeito de conclusão, as alergias alimentares pertencem ao vasto grupo das Alergias, tendo elas diferentes manifestações. Para contornar esta doença existem já vários tratamentos possíveis, portanto esta não compromete o dia-a-dia de alguns indivíduos. No caso retratado neste trabalho, as alergias alimentares ainda comprometem, de certa forma, a vida da “Ana”.

Realizado por: Maria Silva, Mariana Ribeiro e Mariana Paiva

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Colite Ulcerosa

Entrevista

Entrevistador: Qual é a sua idade? Entrevistado: Tenho 18 anos.

Entrevistador: Com que idade e como é que descobriu que tinha esse problema de saúde? Entrevistado: Tinha 16 anos. Andava com dores no intestino e tinha sintomas suspeitos como muco e sangue nas fezes. Fiz endo e colonoscopia e confirmei que realmente tinha colite ulcerosa.

Entrevistador: Após descobrir que tinha essa doença a sua qualidade de vida mudou muito? Entrevistado: Não mudou grande coisa. Claro que tenho que ter mais cuidados na alimentação ou, pelo menos, deveria ter. Uma coisa na qual a doença me afetou foi no desporto, pois o meu rendimento diminui bastante e isso fez com que fosse abaixo psicologicamente também. O pior mesmo foi quando tive que recorrer a

cortisona para não correr o risco de ter anemia, aí sim fiquei muito mal. Entrevistador: Quais são os sintomas da colite ulcerosa? Entrevistado: Dores no intestino quando como certas coisas ou quando estou em crise na doença, má disposição às vezes, muitas idas à casa de banho.

Entrevistador: Face à pandemia que estamos a viver, a sua qualidade de vida mudou muito relativamente ao que era? Entrevistado: Não mudou grande coisa, continuei a tomar a medicação normal. A única coisa que pode ter mudado foi a alimentação mais desregrada. Durante o confinamento não tinha tanta atenção e cheguei a ficar um bocado mal do intestino.

Entrevistador: E finalmente qual é a medicação que você toma para contrariar os sintomas? Entrevistado: Os medicamentos que tomo são Pentasa, Salofalk e Azafalk.

Fim da entrevista

Realizado por: Alexandre Vieira, Artur Soares e José Silva

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Diabetes

A Diabetes Mellitus tipo I (DM1) é uma doença crónica e autoimune caracterizada pela produção insuficiente ou pela não produção da hormona insulina, em consequência de uma destruição maciça das células beta pancreática produtoras de insulina. Esta doença é rara e afeta sobretudo jovens e crianças, contudo, pode também manifestar-se tardiamente em adultos e idosos.

A Alice é uma jovem de 17 anos que há dois anos foi diagnosticada com esta doença.

Entrevista

Entrevistador: Queríamos desde já agradecer a sua disponibilidade para colaborar nesta entrevista. O que é para si a DM1? Alice: Para mim, a DM1 é acima de tudo um estilo de vida. Muitas vezes, as pessoas confundem uma pessoa diabética com uma pessoa com diabetes, mas é importante que se perceba que, viver com diabetes não é ser a doença, é coabitar com ela num espaço pessoal. Esta doença alterou a minha linha temporal, uma vez que, nunca tinha lidado com as expressões: “para sempre” e “doença crónica”, até ao momento do diagnóstico. Para além disso, a diabetes é uma doença que me permite ver as coisas de uma perspetiva diferente, mais esperançosa, sobretudo do ponto de vista científico.

Entrevistador: O diagnóstico é geralmente uma fase complicada para os portadores desta doença. Como ocorreu o seu diagnóstico? Foi um processo rápido ou mais demorado? Alice: O meu diagnóstico foi especialmente complicado porque foi diagnosticada numa fase muito inicial da DM1, em que o meu pâncreas ainda produzia uma grande quantidade de insulina logo, os meus níveis glicémicos não eram muito elevados. Estes valores geraram dúvidas em relação ao tipo de diabetes que eu poderia ter, dado que, o diagnóstico de DM1 geralmente acontece quando o doente se encontra perto de uma crise (de cetoacidose diabética), que é caracterizada por níveis extremamente elevados de glicose no sangue. Assim, os médicos começaram por receitar exames, tais como a prova de tolerância à glicose e à hemoglobina glicada.

Na prova de tolerância à glicose, os meus níveis estavam elevados, o que levava a concluir que alguma coisa não estaria bem, no entanto, a minha hemoglobina glicada estava quase normal.

Entrevistador: Foi isso que suscitou muitas dúvidas? Alice: Sim, depois destas análises, eu fiquei durante 2 semanas só a avaliar os meus níveis glicémicos, antes das refeições, sem tomar insulina. Ao fim desse tempo, a médica receitou-me um teste aos anti anticorpos, GADA, IA-2A, IAA E ICA e ZnT8A, para descartar a possibilidade de DM1. Passado 2 semanas o resultado do teste chegou e deu positivo, confirmando assim o diagnóstico. No total, foram cerca de 3 meses para obter o mesmo, o que poderia ter tido diversas consequências, com um impacto muito negativo na minha saúde, mas felizmente correu tudo bem.

Entrevistador: Quais foram os sintomas que levaram os médicos a investigar a hipótese de ter esta doença? Alice: Na verdade, eu não tive sintomas característicos da doença, como sede extrema, urinar com frequência, dores de cabeça, fome frequente, perda de peso, fadiga, fraqueza…. Eu sentia-me diversas vezes mal, tendo alguns episódios de desmaio, o que levou os médicos a fazerem algumas análises para ver o que se passava. Inicialmente, suspeitavam de um quadro clínico de anemia, no entanto, quando os resultados destas análises chegaram, os níveis de glicose sanguíneos estavam ligeiramente elevados. Perante estes resultados

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e os meus sintomas, os médicos suspeitaram que poderia ter diabetes, nem tipo I nem tipo II, diabetes de um tipo mais raro, porque eu não tinha níveis elevados o suficiente para diabetes tipo I, nem histórico familiar ou hábitos alimentares característicos de diabetes tipo II.

Entrevistador: Após o diagnóstico como é que foi para si psicologicamente aceitar esta doença e, de que modo é que isso afetou as pessoas à sua volta? Alice: Eu sempre fui uma pessoa que lidei com as adversidades de uma forma muito racional, ou seja, depois do diagnóstico, a minha atitude foi:” Ok, eu tenho esta doença, o que é que eu posso fazer para manter um bom estilo de vida?”. Acho que, na verdade, lidei bem com a situação no momento do diagnóstico e, só passado alguns meses é que me "caiu a ficha" de que de facto, a doença era para sempre. Isso foi uma coisa que na altura me custou muito a aceitar porque eu lembro-me de pensar que eu, Alice, iria ter de me injetar com insulina ou viver segundo um nível ou um número de açúcar no sangue para o resto da minha vida. Para as pessoas à minha volta foi, em geral, muito difícil. Eu acho que fui das pessoas que lidou melhor com a situação em minha casa. A doença na altura criou um ambiente extremamente stressante porque todos estavam preocupados com o meu bem-estar e com a minha saúde.

Entrevistador: Acha que houve um ambiente de superproteção dos seus pais em relação a si? Alice: Sim, sem dúvida. Na minha opinião, os meus pais sentiram principalmente culpa por esta doença, o que obviamente não era verdade. Lembro-me na altura da minha mãe dizer que achava que eu tinha tomado demasiados antibióticos quando era pequena. Foi muito complicado de lidar, nesse sentido. Contudo, os meus pais ainda hoje não sabem como é que funcionam algumas coisas, porque eu sempre fui muito autónoma a lidar com a minha doença. Por exemplo, durante uma crise, eles sabem o que fazer, mas têm de pensar muito bem. Mas, no dia a dia eles não são capazes de me dizer o que fazer, passo a passo, porque os médicos sempre falaram comigo na primeira pessoa, pois já tinha e tenho autonomia e idade para lidar com esta situação autonomamente. Esta é uma responsabilidade

só minha. Eles assumiram esse ambiente de superproteção, mas nunca tentaram faze-lo por mim.

Entrevistador: Um dos aspetos mais difíceis desta doença é o facto de não haver uma cura para a mesma. Sendo assim, que cuidados tem de ter todos os dias para garantir uma boa qualidade de vida? Alice: O tratamento da DM1 está na base do controlo sobre o que comemos, sobre a quantidade de insulina que injetamos e sobre todos os possíveis fatores que alteram os níveis de açúcar no sangue. Em relação à insulina, há cerca de meio ano, adquiri a bomba de insulina o que me permitiu ter um estilo de vida mais aproximado a um estilo de vida “normal”, dado que, a bomba permite uma aproximação maior à função do pâncreas comparativamente às injeções de insulina. Os cuidados a ter em relação à bomba são à base de trocas de cateter e enchimento de cartuchos de insulina, o que não é especialmente difícil de ser feito. O que é mais difícil de controlar nesta doença é todo o tipo de pequenos fatores que alteram os níveis de açúcar no nosso sangue, desde o nosso humor, atividade física ou à qualidade dos alimentos que ingerimos. Assim, o que se torna mais importante é, por um lado, tentar ter um estilo de vida o mais saudável possível e, por outro lado, conhecermo-nos para saber por exemplo, como é que o nosso corpo responde à atividade física, ao nível da absorção de insulina, ao gasto de energia metabólico e a partir daí, adaptar o tratamento a nós mesmos, porque na diabetes o tratamento é muito personalizado.

Entrevistador: Antes de adotar a bomba de insulina, que outro tratamento utilizava? A que se deveu essa troca? Alice: Antes da bomba o meu tratamento consistia em injeções de insulina, quer insulina de ação rápida, quer insulina de ação basal. Comparativamente à bomba de insulina, as injeções de insulina são menos adaptáveis ao paciente. Assim, com a bomba de insulina consigo níveis de glicose no sangue mais “normais”, ou seja, mais adequados a um bom estilo de vida. Quando adotei a bomba de insulina, houve uma melhoria muito significativa dos meus níveis de açúcar no sangue e dos valores de hemoglobina glicada, já que ambos baixaram bastante.

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Entrevistador: Atualmente, complementando a ação da bomba de insulina, que cuidados tem com a sua alimentação? Alice: Ao contrário do que a maior parte das pessoas pensa, as pessoas com DM1 não têm restrições alimentares, o único cuidado especial a ter é a contagem da quantidade de hidratos de carbono ingeridos, de forma a garantir a injeção da quantidade de insulina correta. No entanto, nem todos os diabéticos contam a quantidade de hidratos de carbono que ingerem, pois isto depende da estratégia adotada pelo nutricionista, contudo, esta é uma das estratégias mais comuns. No geral, eu procuro um estilo de vida saudável e evito consumir alimentos ultraprocessados, dado que, a ingestão deste tipo de alimentos, em grande quantidade e grande frequência, acarreta inúmeras consequências negativas que poderão debilitar ainda mais o meu organismo.

Entrevistador: Acha efetivamente possível ter- se qualidade de vida com DM1, especialmente nos tempos de pandemia em que vivemos?

Alice: Viver com uma doença crónica não é e nunca será algo fácil. Quando essa doença, que caminha lado a lado comigo, se trata de uma doença autoimune, vem com ela muitos cuidados para proteger o meu sistema imunitário, que é frágil. Neste momento, ter DM1 é mais do que inúmeras injeções de insulina, é fazer parte de um grupo de risco. A maior parte dos adolescentes tem como maior medo transmitir este novo vírus aos seus avós ou conhecidos, que façam parte de um grupo de risco. Mas, no caso de uma adolescente que faz parte desse mesmo grupo de risco, associado a todos estes medos está a preocupação pela sua própria saúde. Já é, de facto assustador uma constipação demorar o dobro do tempo a ser tratada, imagine o que é um vírus desconhecido, com inúmeros pontos de interrogação? No entanto, não permito que esta doença me tire o direito de aprender, de viver, de sonhar… Assim, faço a minha vida como os outros, de mão dada a uma doença, de mão dada a um medo.

Fim da Entrevista

Realizado por: Joana Monteiro, Inês Bastos e Leonor Braga

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O presente trabalho é sobre uma doença autoimune adquirida, na qual fomos entrevistar uma pessoa que possui essa mesma doença, a doença Behçet.

O objetivo deste trabalho ter conhecimento dos sintomas a forma como a doença foi diagnosticada e reconhecer os cuidados que a pessoa afetada possui.

Entrevista

Entrevistador: Com que idade foi diagnosticada? Entrevistado: Tinha 26 anos.

Entrevistador: Antes de ser diagnosticada, que sintomas sentiu? Entrevistado: Bastantes aftas na boca e também na região vaginal.

Entrevistador: Foi fácil diagnosticar a doença? Entrevistado: Devido às aftas vaginais que ganhei foi realizada uma biopsia às feridas que tinha e assim fui diagnosticada.

Entrevistador: Como decorreu o processo do diagnóstico? Entrevistado: Apareceram as feridas na região vaginal, fui ao meu médico de família e como não era a primeira vez que aparecia, passou-me uma carta para ir ao hospital realizar uma biópsia naquele momento, antes das feridas desaparecerem.

Entrevistador: Foi fácil aceitar a doença psicologicamente? Entrevistado: Inicialmente fiquei assustada pois fui pesquisar na Internet e só via os casos mais graves da doença, no entanto, falaram comigo e o meu caso é leve e então deixei de pensar tanto, pois o que tiver de vir virá, não vale a pena sofrer por antecipação.

Entrevistador: Como reagiram os parentes a esta doença? Entrevistado: Reagiram bem, visto que, não tenho sintomas muito fortes.

Entrevistador: Sentiu algum efeito secundário com a toma da medicação? Entrevistado: Não, pois para já ainda não preciso de tomar medicação.

Entrevistador: Que cuidados deve ter diariamente? Entrevistado: Tenho de ter mais cuidados com a alimentação.

Entrevistador: Sente dificuldades na sua alimentação? Se sim, quais? Entrevistado: Sim, pois tem alguns alimentos que se comer causam mais rápido as aftas na boca, mas tirando isso nada de especial.

Entrevistador: Em tempos de pandemia, sentiu alguma dificuldade? Entrevistado: Não. Entrevistador: Em tempos de pandemia, consegue ter alguma qualidade de vida? Entrevistado: Sim, a pandemia não diferenciou nada pois os cuidados que tenho são sempre os mesmos. A única coisa devido a pandemia é a nível de stress, pois se andar mais stressada ganho aftas mais rápido.

Entrevistador: Que idade tem e como lida atualmente com a doença em relação a quando foi diagnosticada? Entrevistado: Tenho 37 anos, e eu lido melhor com a doença do que lidava há 11 anos atrás, pois ainda não me tinha mentalizado das adversidades que a doença traria para a minha vida. Entrevistador: Obrigada pela sua colaboração neste trabalho e esperamos que a sua condição de saúde melhore daqui em diante. Entrevistado: Obrigada eu, e espero ter-vos ajudado.

Fim da entrevista

Realizado por: Eunice Fernandes, Eva Santos e Ana Pereira

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Doença Celíaca

A Doença Celíaca é uma doença autoimune, que consiste numa reação exagerada do sistema imunológico ao glúten. Esta proteína é encontrada em cereais como o trigo, o centeio, a cevada e o malte. Esta doença pode causar diarreia, anemia, perda de peso, osteoporose, câncer e até défice de crescimento em crianças.

O corpo de quem tem esta doença não possui uma enzima responsável por desfazer o glúten e como a proteína não é processada corretamente, o sistema imunológico reage ao acúmulo e ataca a mucosa do intestino delgado o que causa lesões e prejudica o funcionamento do órgão.

Para ficarmos a conhecer um pouco mais sobre esta doença, entrevistamos Thaís Passos, uma menina com 20 anos, que foi diagnosticada com a doença celíaca com 7 anos de idade.

Entrevista

Entrevistador: Quais são os sintomas da doença? Thaís: Os sintomas podem variar de pessoa para pessoa, mas os meus são: dor de cabeça, náuseas, mau estar, tonturas e vómitos.

Entrevistador: Quando e como é que foi o diagnóstico? Thaís: O meu diagnóstico foi em 2007. Existem vários testes para este diagnóstico, mas o meu foi por endoscopia. Antes de fazer o exame em si deram-me anestesia geral e depois colocaram-me, pela boca, um tubo fininho com uma câmara na ponta, que mostrou o aspeto do meu intestino delgado. Nessas imagens os médicos conseguiram detetar uma inflamação e outras características que levaram ao meu diagnóstico.

Entrevistador: Há mais alguém da sua família que tenha esta doença? Thaís: Tenho alguns parentes que são intolerantes ao glúten, ou seja, não o conseguem digerir, no entanto, no meu caso quando o glúten entra em contacto com o meu intestino cria-se uma

inflamação, o que provoca em mim os sintomas que já referi.

Entrevistador: Como é que foi a adaptação a uma dieta sem glúten? Thaís: No começo foi um pouco difícil, porque eu era uma criança e convivia com outras que tinham uma dieta normal. Não podia dividir lanches com os meus colegas e tinha que comer sempre em casa antes de ir para uma festa ou um aniversário. No entanto, agora, já é algo que não me incomoda tanto porque já estou habituada a esta rotina.

Entrevistador: É fácil encontrar restaurantes que façam refeições sem glúten? Thaís: Encontrar restaurantes especializados numa dieta sem glúten não é muito comum, mas atualmente, ao contrário de há alguns anos atrás, já encontro com mais facilidade restaurantes que se tentam adaptar, para nos poderem oferecer algumas opções de refeições sem glúten.

Entrevistador: Encontras facilmente nos supermercados alimentos sem glúten ou

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tens que ir a uma loja específica que venda esses produtos? Thaís: Hoje em dia é fácil encontrar produtos sem glúten em qualquer supermercado, inclusive, alguns já têm secções próprias, o que acaba por facilitar a vida de pessoas como eu, que não o podem ingerir, uma vez que todos os alimentos indicados para a nossa dieta estão à mão e não é necessário estar sempre a verificar se cada produto, em que pegamos, é ou não indicado para nós.

Entrevistador: Tomas alguma medicação para a doença? Se sim, tem algum efeito secundário? Qual? Thaís: Não, não tomo nenhuma medicação, até onde sei não existe nenhuma para a

doença, o que nos é indicado é mesmo uma dieta restrita de glúten. O que por vezes acontece, é quando, por alguma razão, ingiro glúten e fico com sintomas, como as náuseas, as dores de cabeça e outros que já referi anteriormente, então, tomo medicação que os alivie.

Entrevistador: Como é que foi viver com esta doença na pandemia? Conseguiste ter uma rotina normal ou tiveste alguma limitação/problema a nível da doença? Thaís: No meu caso a pandemia não me afetou nada a nível da doença. Continuei a alimentar-me da maneira que sempre me alimentei.

Fim da Entrevista

Como esta doença é, maioritariamente, diagnosticada quando começamos a introduzir os cereais na nossa alimentação, esta causa um grande impacto na vida das crianças, uma vez que estas vão sentir-se diferentes das que têm uma alimentação normal.

Trabalho realizado por: Beatriz Sá, Maria Elisabete

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A doença de Crohn é uma doença autoimune que consiste na inflamação crónica que pode atingir qualquer região do tubo digestivo. Embora possa atingir qualquer região do tubo digestivo, desde a boca até ao ânus, regra geral, localiza-se no último segmento do intestino delgado (íleon) e no intestino grosso. A inflamação pode estender-se a todas as camadas da parede digestiva, com formação de úlceras. Além disso, pode não ser contínua, ou seja, podem intercalar-se áreas inflamadas com áreas saudáveis. Vamos entrevistar um colega da nossa turma, Gonçalo Gonçalves, que tem a Doença de Crohn. O Gonçalo tem 17 anos, não é fumador, não bebe e não tem familiares com problemas intestinais.

Entrevista

Entrevistador: O que é a Doença de Crohn para ti? Gonçalo: É uma inflamação nos intestinos.

Entrevistador: Quais são os sintomas da doença? Gonçalo: Dores de barriga, diarreia, perda de sangue nas fezes e febre são os sintomas mais comuns para mim.

Entrevistador: Quando e como foi o diagnóstico? Gonçalo: Fui diagnosticado há 3 anos, ou seja, com 14 anos. A minha mãe comentou com o pediatra que eu ia muitas vezes à casa de banho e ele pelo sim pelo não disse para eu fazer testes para ver se tinha alguma coisa. Fiz ecografias e uma colonoscopia, que foi o teste que me deu a certeza que eu realmente tinha a Doença de Crohn. Depois deste diagnóstico tive de comer durante 2 meses só iogurtes com todos os nutrientes que eu precisava para viver. Não podia comer mais nada. Continuei na minha vida e ia para os treinos na mesma, viver com os iogurtes custou, mas ao menos não tive de mudar a minha rotina.

Entrevistador: Como todos sabemos, não existe uma cura para a Doença de Crohn,

sendo o tratamento desta doença completamente virado para melhorar a qualidade de vida dos doentes ao tratar os sintomas e não a doença. Achas que a medicação em si tem feito o seu propósito? Gonçalo: Sim, acho que sim. Agora até vou ter a medicação aumentada, portanto espero melhorar ainda mais. Eu neste momento tomo 2 comprimidos por dia, antes de me deitar e terei de ir ao hospital uma vez a cada 2 meses para tomar uma injeção.

Entrevistador: Quais são os cuidados que tem na sua alimentação? Gonçalo: Deixei o leite com lactose, mal fui diagnosticado, e agora ultimamente tenho tentado deixar o leite, mesmo sem lactose. Eu como era um miúdo que não comia muita coisa, nem foi muito mau para a minha doença, uma vez que se eu experimentar alimentos novos corro sempre o risco de comer algo que me faça mal. Tive de deixar o peixe e a minha alimentação reside praticamente na massa, arroz, bife grelhado, sopas, bolachas e pão. Ao pequeno-almoço como quase sempre Cerelac.

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Entrevistador: Quando e como é que foi a tua última crise? Gonçalo: A minha última crise foi a primeira também. Começou no início do ano e tinha imensas dores de barriga depois de comer, picos de febre, falta de apetite e diarreia. Comecei a tomar uma “coisa” para prender os intestinos e fui ao hospital para perceber melhor o que era. Fiz uma ecografia e era uma agudização da inflamação dos intestinos. Agora tenho de tomar mais uns comprimidos e antibióticos durante uns tempos até esta situação se regularizar.

Entrevistador: Em que medida é que esta experiência te tornou uma pessoa mais rica e moldou a tua vida? Gonçalo: Continuei a minha vida normal, mas tive de começar a tomar medicação. No dia a dia não mudei nada, mas tenho de ter atenção ao que como e bebo. Também tenho de ter atenção às crises. Tornou-me uma pessoa mais rica porque eu nunca tinha ouvido falar desta doença e atingiu- me de repente e passei a saber que afinal muita gente a tem. Também me fez perceber que algumas doenças não são afinal um “bicho de sete cabeças” e consegue-se ter um estilo de vida bom.

Fim da Entrevista

Trabalho Realizado por: João Espada, Tiago Avelino

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Esta patologia crónica é responsável por causar alterações no sistema nervoso central, sendo mais recorrente a destruição do revestimento que protege as fibras nervosas dos neurónios, a bainha de mielina. Esta eliminação irá refletir-se na propagação do impulso nervoso, ou seja, impedir a que haja uma comunicação adequada e eficaz entre o cérebro e o corpo. Para além disso, a doença pode gerar a perda de diversas funções consoante as zonas afetadas.

A esclerose múltipla é diagnosticada geralmente entre os 20 e os 50 anos, no entanto, pode verificar-se em todas as idades (desde os 2 até aos 75 anos) e surge com mais frequência no género feminino. Apesar de não ser considerada fatal, exerce uma grande influência no quotidiano dos doentes, limitando, de certa forma, determinados das suas vidas.

A nível mundial existem cerca de 2.500.000 pessoas “portadoras “desta patologia e em Portugal, numa escala mais reduzida, há cerca de 5000 pessoas que sofrem da mesma.

Tivemos a oportunidade de contactar uma pessoa da nossa comunidade com Esclerose múltipla. Dessa forma, conseguimos obter mais informações acerca da doença e de tudo o que está associado à mesma.

Entrevista

Entrevistador: Então vamos dar início a entrevista. Primeiro, gostaríamos de pedir para referir alguns aspetos importantes como o seu nome, a sua idade ou alguma doença que esteja associada à esclerose múltipla. Entrevistada: Então o meu nome é Inês Neto e tenho 43 anos. Sou alentejana, nasci em Évora, mas vivo há 12 em São João da Madeira. Antes do diagnóstico podia me considerar uma pessoa completamente saudável sem qualquer tipo de doenças associadas ou patologias.

Entrevistador: Em seguida gostávamos de perguntar em relação ao diagnóstico, quando ocorreu, como foi e qual foi a dificuldade de o obter. Entrevistada: Esse é um dos primeiros problemas com que o doente se debate porque o diagnóstico não é muito fácil. Se calhar com o passar dos anos e hoje em dia, a comunidade médica acaba por estar mais informada sobre a doença, mas como a incidência é muito baixa, os sintomas não

ajudam e por isso podem ser confundidos com outro tipo de patologias e nem sempre o diagnóstico pode ser feito rápida e eficazmente. No meu caso, eu tinha 20/21 anos quando tive o meu primeiro surto refletido nas ressonâncias magnéticas que fiz. Na altura, não foi diagnosticada convenientemente, foi associada a um período de stresse no trabalho. E, como ainda hoje continuo numa fase benéfica da doença, existe um surto de remissão, ou seja, os sintomas que surgiram dos surtos, passado algum tempo eles acabaram por atenuar e, embora não tenha ficado a 100%, quase que recuperei totalmente. Por isso, passaram-se alguns anos e tive outros surtos que também não foram bem diagnosticados, até que em 2006 na véspera de Natal, de manhã, tinha o braço esquerdo dormente. Estava grávida do quarto filho e acabei por recorrer a um Fisioterapeuta, amigo da família.

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Devido ao meu estado, não era possível fazer todos os tratamentos, mas fiz alguns. Inicialmente pensámos que poderia ser qualquer coisa nível da cervical. Fiz então alguns tratamentos, mas eles não foram suficientes, por isso acabei por ir ao ortopedista onde fiz mais alguns tratamentos e exames, mas depois fui aconselhada a consultar um neurologista. Em janeiro de 2007, comecei a ter consultas de neurologia, fiz uma ressonância magnética, e foi a partir desse exame que detetaram lesões no cérebro e também ao nível da espinal medula. Através da coloração, da dimensão e da localização das lesões, os médicos conseguem ter a noção de quanto tempo têm aquelas lesões e algumas das lesões batiam certo com alguns dos sintomas que eu tinha sentido há algum tempo atrás. Fiz mais exames de diagnóstico e tudo levou a crer, sem margem de dúvidas, de que seria esclerose múltipla.

Entrevistador: Quando os surtos começaram a ocorrer e os sintomas a desenvolverem se o que é que pensou que seria? Só stress? Entrevistada: Na altura eu estava longe de imaginar, nem nunca coloquei a hipótese de que fosse algo com esta gravidade. Nos meus surtos apareceram sintomas que não estavam relacionados diretamente com a esclerose múltipla, como por exemplo, a perda de equilíbrio, alteração ao nível da fala e até foram associados a outros tipos de patologias.

Entrevistador: Você falou em medicação e tratamentos. Neste momento está a realizar algum tipo de tratamento? Ou tem medicação diária para controlar? Entrevistada: Eu, durante muitos anos fiz uma medicação que é o Avonex. É uma medicação de primeira linha, ou seja, para os doentes que estão numa fase inicial da doença. É uma injeção intramuscular uma vez por semana. Eu fiz essa medicação durante muitos anos. O que acontece é que há pessoas que toleram melhor, outras menos bem. No meu caso, eu tentava tomar a injeção no final do dia, o mais tarde possível porque tinha, uma reação que se chama no meio clínico, uma ressaca.

Essa ressaca traduzia-se em 24 a 48 horas febres altas e muitas dores musculares. Os dois dias após a injeção eram difíceis de ultrapassar e eram complicados. Como é algo que se repete semana após semana, parece duro para quem está fora, é uma vez por semana, mas um ano após outro traz algum cansaço. Eram coisas que eu não gostava de sentir, com as quais não me senti confortável, há pessoas que toleram melhor a medicação e outras que sentem os efeitos secundários de forma mais intensa. Eu acabei por medir à médica, porque chegava a existir períodos em que eu chegava a não fazer a medicação, então optou-se por outra medicação. Atualmente, tomo Aubagio, uma medicação por via oral, que é relativamente recente, pois não existiam este tipo de medicamentos. Tomo todos os dias um comprimido do qual os únicos efeitos secundários que eu senti e no ínicio, como perda de cabelo, mas após alguns meses voltou a crescer. Além disso, esta medicação faz com que eu tenha que fazer todos os anos análises de controlo, pois pode trazer alterações principalmente a nível do funcionamento do fígado. Então no início, tinha que fazer umas análises, primeiro de quinze em quinze dias e passado seis meses era uma vez por mês e agora vou mais esporadicamente porque as coisas correm bem.

Entrevistador: Mas você antes de começar a tomar os comprimidos por via oral, as injeções eram administradas no hospital ou podia fazer o tratamento em casa? Entrevistada: Eu tinha várias alternativas. Inicialmente, eram administradas no centro de saúde perto da minha residência, mas a farmacêutica que produz o medicamento também disponibiliza um enfermeiro que se desloca a casa dos doentes e ajudam a perceber qual é a melhor forma de se automedicarem. Eu nunca pedi a ajuda desse enfermeiro porque tinha pessoas amigas que eram enfermeiras e tentaram ajudar. Percebi também que não era fácil ser eu própria a injetar-me, pois a medicação tem de ser dada numa determinada zona e não era uma posição fácil, então, optei por não ser eu a administrar. Recorri ao centro de saúde ou a unidades privadas e houve alturas em que recorri a pessoas mais próximas, amigas que eram enfermeiras que me administravam a medicação. Mas, claro, que existem pessoas que conseguem administrar sozinhas, eu não consigo.

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Entrevistador: Também gostava de perguntar se isso alterou de alguma forma o seu quotidiano, com certeza que alterou, mas acho que a impossibilitou alguma coisa. Entrevistada: Eu acho que não, mas depende da postura de cada um. Curiosamente, foi feito o diagnóstico e tinha várias pessoas que tinham a doença e eram quadros diferentes. Infelizmente certas pessoas já faleceram, não pela doença mas algo que apareceu causada pela doença.A,cho que depende muito de como se encara a doença porque, como é que eu vou dizer isto, há pessoas que guardam a doença para si e para a família mais próxima e vivem naquela bolha de que ninguém pode saber, porque, efetivamente, é uma doença que pode percorrer um caminho extremamente complicado. Com o passar dos anos perde- se muita autonomia e eu acho que se a pessoa passar a viver em função do futuro e do que aquilo que pode vir a acontecer as coisas só têm tendência a agravar, até porque os principais pontos que podem levar ao ressurgimento de surtos são o stress, seja ele de que forma for, e o calor. São estes os principais fatores que temos que tentar evitar. Eu sempre tive uma postura muito aberta relativamente à doença. Falei do assunto a toda a gente, acima de tudo porque na altura não se falava tanto como se fala hoje, a maior parte dos quadros que conheciam eram casos complicados, muito complicados. Eu, felizmente, tenho tido a sorte de ir conseguindo ultrapassar os problemas com algumas mazelas que ficam, como é óbvio, mas depende da capacidade e da resiliência de cada um. Foi algo que aceitei com naturalidade, não havia nada a fazer, não há que por em causa, porque é que aconteceu a mim e não a outra pessoa. Aconteceu, paciência, agora tenho que tentar levar o dia a dia com a maior tranquilidade possível. É isto que tenho vindo a fazer ao longo dos anos, continuo a dizer que é uma amiga que eu tenho e com a qual eu caminho todos os dias de mão dada. Uns dias ela acorda bem- dispostas, outros dias não. É como eu e qualquer um de nós, é tentar ir ultrapassando aquilo que vai aparecendo. Agora, não é fácil, tenho que me proteger mais do calor, mas durante toda a vida tentei

fazer mais. Hoje em dia, tento estabelecer limites e não tentar ultrapassa- los, até porque se eu os ultrapassar em termos de doença e tudo o que ela me pode trazer afeta não só a minha vida como de todos aqueles que estão perto de mim, principalmente os filhos, que é por eles que nós vamos tentando rentabilizar as coisas de forma poder continuar a viver como tenho estado até hoje, no maior período possível. Nem tudo se mantém, a minha memória não é tão boa, não tenho tanto concentração, canso-me mais facilmente e, obviamente, os surtos têm trazidos algumas sequelas, muitas vezes tenho dormência nas mãos, nas pernas, na cara. De vez em quando as lesões ficam ativas e por isso, os sintomas dos surtos tornam-se mais visíveis, mas é uma questão de desvalorizar um bocadinho, não calcando os limites e tentando conviver com aquilo que a doença me traz.

Entrevistador: Toda esta informação está a ser muito útil, porque nós não tínhamos a noção de como viver com a doença e ótimo percebermos o seu lado. Entrevistada: Também é preciso perceberem que eu sou um caso benigno da doença, não há muitos exemplos como eu. A minha doença foi diagnosticada há treze ou catorze anos, mas que ela, efetivamente, já existe há mais, há vinte, e que continuo a fazer a minha vida quase de forma normal aos olhos de maior parte das pessoas. Não é muito vulgar, porque na maioria das pessoas há uma degradação que é considerável, mas eu felizmente tenho conseguido não passar por isso, mas não sei até quando, porque o dia de amanhã é sempre uma incógnita.

Entrevistador: O facto de estarmos a viver uma pandemia afetou de algum modo, a sua vida? Entrevistada: No início da pandemia, havia pendente a questão de se havia de mudar de medicamento, uma vez que o que tomava e tomo foi incapaz de inibir um surto que tive na perna esquerda, e a eficácia da medicação foi posta em causa. E então foi recomendada uma medicação de segunda linha, mais forte. Esta medicação é 100% comparticipada, e com a previsão de uma pandemia, sobre a qual não sabiam os custos que iam ter e como é que se as coisas organizaram, decidiram que se iria manter a medicação com que estava.

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Se tivesse mudado de medicação as coisas seriam mais complicadas porque é uma medicação imunossupressora, o que faria com que o meu sistema imunitário ficasse muito mais debilitado do que está hoje em dia, o que me obrigaria a ter muitos mais cuidados do

que os que tenho hoje em dia. Obviamente por ter uma doença crónica a pandemia faz que tenha muitos cuidados. Tirando isso, acredito que foi fazendo, na medida dos possíveis, de forma muito cumpridora a minha vida.

Fim da Entrevista

Nota: Antes de ter sido a iniciada a entrevista confirmamos com a entrevistada se se sentiria confortável ao usarmos o seu nome verdadeiro e pedimos a sua permissão para gravarmos o áudio da entrevista de modo a tornar mais fácil a sua redação.

Trabalho realizado por: Bernardo Santos, Inês Neves e Maria Jardim

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Lúpus

O Lúpus é uma doença autoimune que se caracteriza pelo ataque dos tecidos saudáveis de várias partes do corpo por parte do sistema imunitário, o que provoca a inflamação e alteração da função do sistema afetado.

Esta doença manifesta-se de diversas formas sendo a mais conhecida o aparecimento de manchas vermelhas, especialmente na cara em forma de borboleta, mas podendo também atacar outras partes do corpo como os braços ou o pescoço. Existem outros sintomas bastante comuns como febre, perda de cabelo, perda de apetite, fadiga, emagrecimento, úlceras na boca, articulações dolorosas e inchadas, entre outros.

Quanto à causa da doença esta ainda não é conhecida, pode ter origem em fatores genéticos, ambientais ou hormonais.

Entrevista

Marta, de 51 anos vive há cerca de 20 com esta doença autoimune.

Entrevistador: Bom dia, muito obrigada por estar aqui hoje presente. A primeira pergunta que tenho para si é como foi diagnosticada a doença? Foi ou não difícil? Marta: Bom dia, foi com muito gosto que aceitei colaborar nesta entrevista. Então eu tive uma trombose no joelho esquerdo em que tive uma obstrução de 99% nas duas veias, o joelho ficou muito inchado e os médicos julgavam inicialmente que era algo vascular ou da pílula. Fiz um tratamento de 1 ano e quando o tratamento acabou o médico disse que já estava bem a nível vascular então deixei de tomar a medicação. Passado 6 meses tive outra trombose, só que, no outro joelho e mais leve, como era lateral em ambos os lados o médico considerou que era melhor fazer um exame de medicina interna porque para além disso comecei a ficar com as mãos muito inchadas, foi a partir desse exame que me foi diagnosticado o Lúpus.

Entrevistador: Que idade tinha quando foi feito o diagnóstico? Marta: Tinha 31 anos.

Entrevistador: Houve algo na sua vida que quisesse realizar ou tivesse realizado que o facto de ter esta doença tivesse influenciado?

Marta: Teve influência na minha gravidez, pois normalmente os médicos não aconselham os doentes com Lúpus a engravidar porque como ocorrem muitas alterações hormonais pode provocar maior desenvolvimento da doença e a doença estar ativa, então foi muito mais difícil para mim engravidar, o médico efetuou um tratamento e com muitos cuidados foi me possível engravidar.

Entrevistador: Quais são os cuidados que tem de ter no dia-a-dia? Marta: Um dos cuidados que tenho que ter é não apanhar sol, devo evitar o sol ao máximo, por exemplo, para passear na rua que é algo vulgar de se fazer tenho de usar protetor solar 50+. Outro cuidado é pelo facto de tomar muita medicação tenho de ter atenção a outras medicações que possam interferir com a medicação que tomo. Umas das coisas que influenciam mais o Lúpus ,no meu caso, é o stress e o cansaço, mesmo no trabalho eu tenho de ter um limite, há uns anos atrás eu trabalhava muito intensamente e o Lúpus ficou ativo, tive um esgotamento físico o que provocou hemorragias e fui de urgência para o hospital tomar vitamina K, portanto tenho de controlar o quanto trabalho e não exagerar.

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Entrevistador: Como é que é a sua qualidade de vida com esta doença? Marta: Quando o Lúpus está inativo tenho algumas dores e limitações articulares às quais já me comecei a habituar, mas tenho uma vida normal, não me afeta significativamente em nada. Por outro lado, quando o Lúpus está ativo tenho muitas dores articulares bastante intensas e muito menos mobilidade, por isso tenho mais dificuldade em algumas tarefas.

Entrevistador: Como é que a ciência e a tecnologia acompanharam a evolução da doença? Houve algo que tivesse sido descoberto ou inventado que melhorasse a sua qualidade de vida?

Marta: Não houve nada que tivesse feito diferença, penso que desde que me foi diagnosticada a doença não houve nenhum avanço a níveis tecnológicos ou científicos. Entrevistador: Como é que é viver com esta doença autoimune em tempos de pandemia? Marta: Para ser sincera é praticamente o mesmo, não necessito de mais nenhum cuidado que as outras pessoas, claro que tenho consciência que faço parte do grupo de risco, mas limito-me a seguir as regras que foram impostas e a ter cuidado com a minha saúde e com a dos outros.

Entrevistador: E a última pergunta é como é que foi a aceitação da doença? Como é que foi lidar psicologicamente com o facto de ter Lúpus? Marta: Quando o médico me disse aceitei muito bem, ele explicou- me que era uma doença auto imune, que era para toda a vida e que ia ter que ter várias restrições, mas quando ele me disse que não queria que eu tivesse filhos aí aceitei um bocado mal porque era algo muito importante para mim, tive uns 3 dias a tentar interiorizar e aceitar a situação, depois apercebi-me que a única opção que tinha era aceitar sendo que a doença não tinha cura e estava comigo, no fim felizmente consegui ter a minha filha o que foi um motivo de alegria inexplicável.

Entrevistador: Agradecemos muito o seu testemunho Marta.

Fim da Entrevista

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Bibliografia

https://www.hospitaldaluz.pt/pt

https://www.cuf.pt/saude-a-z/lupus

https://www.cuf.pt/saude-a-z/esclerose-multipla

https://notapositiva.com/esclerose-multipla-abordagem-clinica-fisiologica/

https://www.msdmanuals.com/pt/profissional

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