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Revista VITAS – Visões Transdisciplinares sobre Ambiente e Sociedade – www.uff.br/revistavitas
Nº 2, janeiro de 2012
ANÁLISE DA PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO
AMBIENTAL NO CONTEXTO DE ESCOLA RURAL EM
ITAPORANGA D’ AJUDA-SE.
Rosemeri Melo e Souza1
e Michele Moura Santos2
Resumo O artigo tem como objetivo analisar os fatores que influenciam as práticas
escolares de professores de zona rural através da Educação Ambiental e sua inserção
no processo de ensino-aprendizagem dos alunos. O processo metodológico baseou-se
em unidades de sentidos referentes aos aspectos ambientais da região, e como ocorre a
relação destas com a prática pedagógica das professoras pertencentes ao grupo focal.
Neste estudo foi constatado a desvinculação das práticas escolares das professoras
com a suas práticas ambientais.
Palavras-chaves: Educação Ambiental, práticas escolares, docentes de zona rural,
Introdução
O texto tem como objetivo analisar os fatores que influenciam as
práticas escolares de Educação Ambiental realizadas por professores de
zona rural através da e sua inserção no processo de ensino-
aprendizagem dos alunos. As práticas dos professores da Educação
básica são apresentadas através de contextualizações do cotidiano
escolar.
Discutir sobre as percepções ambientais de professoras de
escola rural na cidade de Itaporanga d` Ajuda – SE é um processo de
investigação e resgate da percepção enquanto sujeito e profissional da
1 Pós-Doutora em Geografia Física (University of Queensland, Austrália). profª Associada do
Departamento e do programa de Pós-Graduação em Geografia/UFS e do Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente ( PRODEMA/UFS). Líder de Pesquisa do
GEOPLAN _ Grupo de Pesquisa em Geoecologia e Planejamento Ambiental e Bolsista de
Produtividade em Pesquisa do CNPq. [email protected] 2 Pedagoga e Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Professora da Faculdade Tobias
Barreto e da Pós-Graduação da Universidade Vale do Acaraú _ UVA/Sergipe.
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Educação Básica. A relação entre os saberes dos professores e as
práticas escolares desenvolvidas por estes no decorrer do cotidiano
escolar é baseada no desfalecimento dos saberes dos professores, na
falta de valorização profissional e principalmente pela falta de
identidade com a condição de professor da séries iniciais do Ensino
Fundamental da Educação Básica.
Nota-se uma desvinculação dos processos educativos que
ocorrem entre a Educação Ambiental e a Educação Básica, sendo
evidenciada por meio do despreparo dos profissionais do ensino
formal, pois trabalhar numa perspectiva socioambiental é promover a
discussão sobre o ambiente, num ponto de vista que busque atender um
entendimento harmonioso das relações sócio ambientais entre homem e
natureza.
Para Fabio Cassino (2003), isso significa inserir alguns princípios
para se tornar uma sociedade sustentável a partir da educação, tais
quais: a perspectiva econômica, cultural, ecológica, espacial e social, já
presentes no Relatório “Cuidando do Planeta Terra”(1991). Seria uma
proposta radical no sentido de articular uma discussão, análise, ou seja,
a (re)leitura dos currículos para rever e selecionar novos parâmetros do
conhecimento daqueles que são transmitidos nas escolas.
A Educação Ambiental traz para a Educação Formal (ensino em
escolas), um novo olhar da realidade, uma (re) leitura social do sujeito.
São práticas de conscientização ambiental que favorecem a conservação
e preservação, em que o desenvolvimento sustentável é instrumento de
efetivação de práticas socioambientais. É o aprofundamento da
percepção socioambiental assinalando as (inter)ligações sociais e
naturais em que o sujeito está envolvido.
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A relação existente entre o meio ambiente e a sociedade
baseia-se na expropriação dos recursos naturais para produção de
produtos manufaturados. Conseqüentemente, educar para o meio
ambiente se torna uma tarefa difícil, pois a Educação Ambiental não
consegue se envolver nos currículos de ensino, de modo a reconhecer e
valorizar o ambiente como um todo interdisciplinar.
Gera o desenvolvimento de uma série de práticas
desarticuladas da perspectiva socioambiental, definida esta por
Guimarães (2005) como a superação da tendência fragmentária, dualista
e dicotômica, fortemente presente em nossa sociedade. A Educação
Ambiental busca preencher de sentido essa expressão com a idéia de
que as questões sociais e ambientais da atualidade se encontram
imbricadas em sua gênese e que as conseqüências manifestam essa
interposição. Sua ausência traz conseqüências para o ensino, tais como:
a fragmentação e o reducionismo das questões relacionadas ao meio
ambiente.
Procedimentos Metodológicos
A pesquisa possui caráter qualitativo, de acordo com Menga
Ludke (1982), e sua metodologia foi baseada na abordagem de
investigação-ação (descrição de um sistema de significados sociais de
um determinado grupo), em que o pesquisador (observador
participante) tem a sua identidade e seus objetivos do estudo revelados
ao grupo pesquisado desde o início, atuando junto aos sujeitos e
espaços ao longo da pesquisa.
A escola a qual pertence à pesquisa está situada no povoado
Nova Descoberta, em Itaporanga d’ Ajuda-SE, distante cerca de 9 km da
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Reserva do Caju (campo Experimental da EMBRAPA). No local há uma
grande extensão de área verde, remanescente de Mata Atlântica
A pesquisa foi realizada na Escola Municipal de Ensino
Fundamental Nicola Mandarino, com um grupo focal de seis
professoras que lecionam nas séries iniciais do ensino fundamental (1º
ao 5º ano), na faixa etária compreendida entre os 36 (trinta e seis) e 40
(quarenta) anos, com experiência no magistério entre os 2 (dois) e 19
(dezenove) anos em escolas públicas e particulares da zona rural,
trabalhando no turno da manhã da escola pesquisada e residentes na
região de Itaporanga d’ Ajuda – Se.
Foram realizados levantamentos bibliográficos de temas como:
formação docente, Educação Ambiental e outros. Assim como foram
adotados instrumentos de coleta, como a observação e entrevista semi-
estruturada, formulário sócio-econômico, e análise documental.
A análise de dados se baseou na transcrição das gravações das
entrevistas e formulários, elaboração de gráficos a partir do uso de
software, dados no Excel, categorização dos dados das entrevistas em
temas concernentes à dissertação, a elaboração das unidades de sentido
no intuito de indicar a freqüência de respostas positivas e negativas no
formulário
As Práticas Escolares de Educação Ambiental e sua inserção no
Processo de Ensino-Aprendizagem dos Alunos
A prática pedagógica das professoras de escolas de zona rural de
Itaporanga d’ Ajuda-Se é tradicional e pautada nos livros didáticos; são
poucas as vezes que são realizadas atividades extraclasses, a prática
escolar está mais voltada à questão de fazer os alunos aprender a ler e a
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escrever, fazer contas, ou seja, as disciplinas de português e matemática.
De acordo com as professoras, são as mais difíceis para os alunos, e,
tendo dificuldades nestas disciplinas, os trabalhos com as outras
(Ciências, Geografia, História, Artes e Sociedade e Cultura) são
inviabilizados.
Não há trabalho interdisciplinar no decorrer de suas práticas
didático-pedagógicas. Geralmente o trabalho da sala de aula se
restringe ao livro didático. As atividades sócioambientais do entorno e
cotidiano escolar são as festas juninas, em que a festa de Santo Antonio
é considerada a maior representação cultural da região de Nova
descoberta e comunidades próximas. Como também o reisado, mas hoje
em dia tem pouca representatividade, pois não tem muitos grupos, e
nem apoio financeiro para a divulgação cultural.
Na análise das Unidades de Sentidos, como consta no Quadro 1,
referente aos aspectos ambientais da região e sua relação com a prática
pedagógica das professoras pertencentes ao grupo focal, foram
detectados a partir das respostas em vermelho das professoras, aspectos
de práticas de vida e pedagógica, tais como: a freqüência da abordagem
das atividades ambientais relacionadas ao meio ambiente local, as quais
são realizadas com práticas pontuais (as atividades são comemoradas
nos períodos específicos do calendário escolar ou não), através de
conversas informais realizadas no decorrer das aulas, com comentários
de alguma situação que seja concernente as atividades em
desenvolvimento:
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Quadro 1 - Unidades de sentidos referentes aos aspectos ambientais da região e sua relação
com a prática pedagógica das professoras pertencentes ao grupo focal.
Elaboração: Michele Moura dos Santos, 2009.
Legenda:
UNIDADES DE SENTIDO
GRUPO FOCAL
P
1
P
2
P
3
P
4
P
5
P
6
Abordagem das
atividades ambientais relacionadas
ao meio ambiente local
Utilização dos
conhecimentos informais na
prática pedagógica
Desenvolvimento de
atividades ambientais
Atividades que
envolvam aspectos ambientais da
região
Problemas ambientais da
região
Conseqüências desses
problemas ambientais para a
comunidade.
Forma como esses
problemas foram abordados pela
escola.
Elementos favoráveis pra
a prática de Educação Ambiental.
Elementos desfavoráveis
a prática de Educação Ambiental.
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Representações negativas contendo uma carga de aparente cansaço, exaustão emocional,
desinteresse pelo fato de ser professora, pelo ato de estar em sala de aula lecionando, ou no ambiente
escolar como um todo.
Representações positivas contendo exemplos de ressignificação da prática educativa das
professoras
A utilização dos conhecimentos informais no enriquecimento da
prática pedagógica ocorre principalmente através de conversas
informais com seus alunos sobre as plantas medicinais, estórias, lendas,
superstições da região, oportunizando as professoras o momento de
trabalhar o resgate de seus saberes ambientais, da prática e
experienciais.
O desenvolvimento de atividades ambientais é realizado em
datas especificas, ou elas não são trabalhadas: as atividades que
envolvem aspectos ambientais da região são discutidas parcialmente, as
mais comentadas são a pesca e agricultura.
Essas atividades são trabalhadas em datas especificas, e não
durante todo o ano letivo, assim como o dia da árvore, do meio
ambiente, as festas juninas, o folclore, dentre outras atividades.
A pesquisa mostrou que em uma escola de zona rural, que
possui elementos voltados para o cuidado com a terra, a sabedoria dos
mais velhos como as rezas, e a experiência de vida desses professores
residentes do interior são conhecimentos desvalorizados e passam
despercebidos no cotidiano escolar.
O livro didático é o principal instrumento de trabalho, a partir
dele são elaborados o planejamento anual, mensal e os planos de aula, a
pesquisa aos materiais tais como: revistas, jornais, manuais didáticos,
jogos ou até o acesso a pesquisa na internet com o uso de
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computadores é inviável , pois não há infra-estrutura adequada na
escola .
As professoras entrevistadas têm noção da existência dos
problemas ambientais (a falta de saneamento básico, o lixo a céu aberto,
extração da areia das margens dos rios e extração irregular da madeira),
mas eventualmente são trabalhados por elas em sala de aula.
As conseqüências desses problemas ambientais não são
abordadas com freqüência nas atividades didáticas de sala de aula, as
atividades ficam restritas aos livros didáticos, as professoras afirmam
não ter suporte didático (livros, cartazes, bibliotecas entre outras)
suficiente; reconhecem que seria interessante trabalhar a partir de
atividades extra-classe, mas a quantidade elevada de alunos
desfavorece as práticas diferentes do cotidiano escolar. É comum
trabalhar tais problemas em conversas informais e colagens de
cartazes.
Durante o período de aplicação do formulário, as docentes
afirmam que têm interesse, mas não há condições favoráveis de
trabalho, falta-lhes material didático adequado, infra-estrutura
adequada, o elevado número de alunos em sala de aula dificultando a
execução das atividades, a falta de apoio da participação dos pais no
processo sócio-educativo.
Existe pouca vinculação dos saberes das professoras, elas estão
muito envolvidas com os problemas de sala de aula e da escola
(turmas com alunos em diferentes níveis de aprendizagem, a falta de
apoio e acompanhamento pedagógico, os impedimentos
administrativos entre outros). Isto implica na atuação das práticas
escolares das professoras, não favorecendo o reconhecimento e
desenvolvimento dos seus saberes, os valores, a sua vontade de formar
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os alunos para a vida. O que, por conseqüência, demonstra uma visão
reducionista da educação, ancorada numa rotina controlada pelas as
práticas educativas tradicionais, como mostra os depoimentos a
seguir:
P6: não trabalho. Eu não acho legais esses livros. O livro de história
não dá pra trabalhar aqui o povoado. Eu acho importante trabalhar as
questões do povoado pra depois trabalhar a realidade de fora.(sic)
P2:tenho muita dificuldade em repassar, pois, muitos não sabem ler
e escrever direito, e os livros de geografia, ciências e historia não ajudam
muito.(sic)
P3: Quando o assunto é o espaço, é o rio, e falo onde está localizado,
os peixes e trabalho as várias disciplinas: matemática, geografia, e
ciências.(sic)
Percebe-se, no cotidiano sócio-educativo, a escola como o local
para as crianças irem lanchar, brincar e encontrar com os colegas,
onde até mesmo a responsabilidade dos pais é repassada para os
professores: há muitos casos de indisciplina praticados pelos alunos,
e, quando os pais são chamados a comparecer na secretaria para
conversar com os professores e tomar conhecimento do seu
rendimento escolar e comportamento, nem todos comparecem para
saber informações de seus filhos.
Dentro desse contexto, notam-se outros problemas tais como: a
desvalorização das professoras, e dos alunos; desestimulo e cansaço
pelo trabalho docente; ou gera-se discurso de culpa, ou seja, sempre
colocam a culpa nos problemas da escola (falta de material, de apoio
didático-administrativo, indisciplina, salas com superlotação de
alunos, ou a sua formação que está defasada entre outros). Foi uma
constante no decorrer da aplicação dos formulários, das entrevistas e
observações semi-estruturadas, as professoras sempre tinham algum
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motivo pra se desculpar pelo trabalho que não tem o rendimento
esperado.
O discurso de culpa era embasado por motivos como: escola
é vista pelos alunos e pais como um lugar para passar mais um tempo
longe de casa, e que lhe garante o direito de continuar atendidos pelos
programas sociais do governo, os quais exigem a freqüência e
permanência dos alunos no ambiente escolar. As professoras sentiam-
se desamparadas pela parte administrativa e pedagógica, não há um
acompanhamento pedagógico efetivo no cotidiano educativo das
docentes.
As docentes contam com ajuda de alguns funcionários para
lidar com os alunos mais rebeldes, mas não há um apoio constante,
pois geralmente esses alunos, quando causam algum problema, ficam
na secretaria para uma conversa com o secretário, e depois os pais ou
responsáveis são chamados para ficar a par do problema.
A partir dos referidos problemas apontados no cotidiano deste
grupo focal de professoras, observam-se aspectos: exaustão emocional,
despersonalização e redução da realização pessoal e profissional são
sintomas da síndrome de Burnout. De acordo com Silva (2006), os
professores sentem-se emocional e fisicamente cansados, estão
freqüentemente irritados, ansiosos, com raiva ou tristes. A síndrome é
a combinação de fatores individuais, organizacionais e sociais, sendo
que esta interação produziria uma percepção de baixa valorização
profissional.
É muito difícil para o educador desistir de sua dedicação ao
ensino e abandoná-la, pois o trabalho educacional lhe propicia (ou
deveria lhe propiciar) outras recompensas, que não são monetárias. A
intensidade do seu trabalho é em busca da realização, mas vem o
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cansaço a desilusão, acabando o professor a questionar-se quanto à
sua competência, de acordo com Silva e Bomtempo (2006).
Na incorporação dos saberes ambientais transmutando-os,
estes são reduzidos a saberes fragmentados no aspecto ambiental e
perdidos no contexto sócio-educativo.
Encontraram-se docentes (9,3% das representações positivas)
que resgatam a reflexividade dos saberes ambientais e a importância
destes nas práticas de vida e profissional, e que apontaram o interesse
em trabalhar elementos de Educação Ambiental tais como; cuidados
com a lavoura, os cuidados que se devem ter com a dengue, os
cuidados com o meio ambiente (a preservação de rios e do manguezal
da região).
Estas docentes encontram nas suas práticas escolares elementos
de significação para ir além dos planos de aula; sentem a importância
da relação entre o saber e prática educativa que exercem em sala de
aula. Na sua prática escolar, há reflexão entre o que ocorreu antes e
depois da ação. Estas docentes ainda se voltam para avaliar a sua ação
em sala de aula, no intuito de se reconhecer e perceber as necessidades
dos seus alunos dentro do processo de ensino-aprendizagem.
Para Charlot (2000), a relação com o saber enquanto relação
social precisa estar alicerçada nas dimensões epistêmica e identitária.
É uma relação com o mundo, com o outro, e com ele mesmo, de um
sujeito confrontando-se com a necessidade de aprender com suas
práticas de vida.
Perspectiva de meio ambiente explorada pelas professoras nas
práticas escolares de Educação Ambiental
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A perspectiva dos professores sobre meio ambiente relaciona-se
com aspectos de limpeza do ambiente, higiene, as transformações
ambientais, a ter cuidados com a saúde, tais como relacionam ter água
encanada, rede de esgoto, pois a comunidade tem atividades
econômicas: a pesca e agricultura, onde os moradores utilizam dos
recursos dessas atividades para comercializar e sustentar a família.
De acordo com Araújo (2004), as questões ambientais apresentam
peculiaridade por serem tão complexas e amplas, e seus elementos
estarem tão interconectados que se torna difícil delimitá-las. A relação
com o meio ambiente configura-se em ver através das mudanças
ambientais as melhorias que o povoado de Nova Descoberta e a cidade
de Itaporanga D’ ajuda/Sergipe conseguiram ao longo dos anos.
As mudanças trouxeram melhores condições de vida e isso na
percepção das professoras denota avanço, progresso. Entretanto,
precisa-se de melhoramentos; dentre outros depoimentos, tem-se a
relação com aspectos de saúde em seu ambiente, pois no povoado de
Nova Descoberta ainda não há infra-estrutura básica (rede de esgotos,
saneamento básico e outros aspectos).
P6: A rede de esgoto. Então isso é uma grande preocupação. Ai tem
muita gente que fica chocado quando falo que prefiro a rede de esgoto, ao
calçamento. É uma questão de saúde. O saneamento básico, não existe aqui
em Nova Descoberta, quando chove as ruas ficam completamente
destruídas , sofrimento pra população. A água é problema muito sério não é
tratada (água de poço). Eles fazem uso da água normal. Água de beber é de
cisterna, e para beber e lavar roupa é do rio às vezes. Água do poço do rio já
foi denunciada, mas não adianta. As pessoas utilizam os animais já teve
época de ir para o rio e chegando lá encontrar até galinha morta. (sic)
P2: Pra mim o meio ambiente é tocar na parte da limpeza. É deixar o
ambiente limpo. É deixar a sala limpa. Não é porque tem o pessoal de apoio
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que vai deixar a sala suja, tem que ter a sala limpa, toco muito na questão
da limpeza.(sic)
Nota-se que há uma interação entre o ambiente e o sujeito,
uma interação baseada na necessidade e utilização dos recursos
naturais como sendo fonte de sobrevivência, os aspectos culturais,
também, faz parte do seu meio ambiente, a relação com a destruição
do rio, a aspectos com higiene e saúde.
P1: Maltratado, né... O pessoal está destruindo a natureza. O Vaza-
Barris é um exemplo, pois trabalhei num areal, eles retiram areia do rio.
Com jatos que sugam areia do rio. Chega a doer só de ver. É uma draga,
como se fosse motor de carro. É um motor de carro movido a gás de cozinha,
ele puxa areia através do motor do carro. Essa draga chega a tirar
“toneladas” de areia. Chega doer no coração, como expectadora dói. Saber
que vai precisar disso mais tarde. “(sic)
P3: Hoje ainda tem pessoas que necessitam dessa busca de alimento
(refere-se à atividade pesqueira), mas a quantidade de peixes diminuiu.(sic)
P5:Houve pequeno avanço, naquela época todo mundo utilizava
água do rio, hoje mudou pra melhor, não tinha água encanada. Você já
pensou ter que utilizar a aquela água suja. Todo mundo utilizava água do
rio. Já pensou no tempo da chuva tomar aquela água do riacho com remédio
utilizado na lavoura.(sic)
Geralmente são discutidos aspectos como o rio Tejupeba, a
comunidade do Paruí, as festas típicas da comunidade, festa de
Santo Antônio, entre outras. Dentre os depoimentos, foi discutida a
questão do acompanhamento, uma tradição dos mais antigos e que
era repassada de pai para filho; algumas professoras sabiam desse
aspecto cultural e chegaram a participar, a trazer para sala de aula,
mas poucas foram as vezes em que comentaram sobre esses
conhecimentos, pois para os alunos se tornava difícil citar esses
conhecimentos para sala de aula.
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Devido à falta de disciplina em sala de aula, os assuntos
eram abordados sem um objetivo concreto, somente na intenção de
transmitir informações. As professoras não reconheciam estes
conhecimentos com fonte e instrumento de formação no
processamento de ensino-aprendizagem. São saberes que se
perderam dentro das dificuldades do cotidiano escolar.
P5: A festa Santo Antônio antigamente tinha o acompanhamento à
pessoa ficava doente e o santo era levado na casa da pessoa pra fazer a reza.
O acompanhamento depende o santo que a pessoa prometer. Tinha a pessoa
que sai na frente segurando aquele santo. Eu mesmo já sair na frente
segurando o santinho na mão e com tamborzinho também. Diz o pessoal
que as pessoas às vezes promete. Se cura e morre. Então não pagou a
promessa. E quando morre vem pedir pra alguém pagar a promessa que
ficou devendo. As pessoas sabia tocar flauta, e os tamborzinhos estão se
acabando, e os mais novos não estão nem aí.(sic)
De acordo com Araujo (2004) As desvalorizações das
práticas ambientais físicas e sociais geram uma dimensão ambiental
fora dos aspectos de interdisciplinares, que poderia favorecer o
desenvolvimento de os valores éticos. A ausência da
integração/interação na prática cotidiana do ensino pode provocar
dificuldades e distorções na compreensão dos problemas
ambientais.
São elementos importantes para compor a perspectiva
ambiental, e mediante os quais estas professoras em seu discurso
tentam ter uma perspectiva interdisciplinar, buscando ir além da
relação de somente procurar o sustento na natureza. No entanto, em
sua prática escolar de E.A são encontrados elementos de uma
prática reducionista e fragmentada.
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Em anuência com Taciana Leme (2006), esta prática se
caracteriza por compreender o meio ambiente como sinônimo de
natureza, apenas aspectos físicos e biológicos. Indivíduos formados
para se adaptarem as normas vigentes e ao mercado de trabalho. Ser
humano separado do meio ambiente. Onde a educação é
instrumento da sociedade para manter, reproduzir e legitimar a
estrutura econômica, política, bem como o autoritarismo a injustiça,
a intolerância, a desigualdade de classe, gênero e raça.
Torna-se uma prática reducionista, por não viabilizar a
exercício da perspectiva ambiental que estas professoras possuem,
os aspectos ambientais da região que circunda a escola, o seu local
de trabalho, assim como o local em que elas convivem, mas
dificilmente trazem ou relacionam com o cotidiano sócio educativo.
Para Araujo e Leff (2004), o ambiente precisa ser
compreendido como uma rede complexa de fenômenos naturais,
sociais, ecológicos e culturais, mediante uma metodologia capaz de
desenvolver um saber que problematize o conhecimento
fragmentado em disciplinas a fim de construir um campo de
conhecimentos teóricos e práticos, orientado para rearticulação das
relações sociedade-natureza.
As professoras sentem-se, por vezes, estimuladas a
trabalhar tais aspectos, mas nem sempre conseguem contextualizar
questões socioambientais em sala de aula devido à falta de material
que fale sobre a comunidade, ou até mesmo, pela quantidade
elevada de alunos, indisciplina, a falta de interesse desses alunos, o
desestímulo e cansaço pelo trabalho docente.
Considerações finais
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A pesquisa sobre as representações do cotidiano escolar
mostrou que, dentre as professoras participantes da pesquisa, os
saberes ambientais construídos na cotidianidade das expressões de
sua vida material e simbólica são esquecidos pelas práticas
educativas de Educação Ambiental e são absorvidos pelos
problemas do cotidiano escolar, com práticas pontuais, tais como: o
dia da árvore, meio ambiente, o inicio das estações do ano. Os
conhecimentos que as professoras e seus alunos trazem não são
resgatados e aproveitados no cotidiano escolar.
Os resultados da pesquisa apresentam uma desvinculação
entre os aspectos ambientais e a prática pedagógica das professoras;
há um desestímulo diante das dificuldades do cotidiano escolar. A
falta de material didático pedagógico, a desvalorização e o
despreparo profissional são uma constante e as impedem de
aproveitar a sua experiência de vida e trazê-las para sua prática
pedagógica enquanto professores das primeiras séries da Educação
Básica.
É possível concluir que as experiências de vida das
professoras e os seus saberes se tornam desvalorizados, ou seja,
mesmo na condição de moradoras de zona rural, onde o contato com
o meio ambiente é freqüente, isso não contribui para inseri-lo dentro
de sua prática pedagógica.
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Revista VITAS – Visões Transdisciplinares sobre Ambiente e Sociedade – www.uff.br/revistavitas
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