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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE
DO SUL
FACULDADE DE LETRAS
Aquisição das fricativas /f/, /v/, /R/ e /Y/ do Português
Brasileiro
Carolina Cardoso Oliveira
Dissertação de Mestrado
2002
SUMÁRIO
LISTA DE SÍMBOLOS..........................................................................xii
LISTA DE TABELAS.............................................................................xii
LISTA DE FIGURAS..............................................................................xv
RESUMO.............................................................................................xviii
ABSTRACT............................................................................................xix
1 INTRODUÇÃO......................................................................................1
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.........................................................3
2.1 AQUISIÇÃO FONOLÓGICA......................................................................3
2.2 GEOMETRIA DE TRAÇOS........................................................................5
2.3 FONOLOGIA MÉTRICA...........................................................................11
2.3.1 O ACENTO EM PORTUGUÊS.............................................................................16
3 METODOLOGIA................................................................................18
3.1 BANCOS DE DADOS.................................................................................18
3.2 INFORMANTES........................................................................................19
3.3 CORPUS......................................................................................................21
3.4 INSTRUMENTO DE ANÁLISE...............................................................24
3.4.1 PACOTE VARBRUL.................................................................................................24
3.5 DEFINIÇÃO DAS VARIÁVEIS.................................................................26
3.5.1 VARIÁVEIS DEPENDENTES..............................................................................26
3.5.2 VARIÁVEIS LINGÜÍSTICAS INDEPENDENTES.........................................27
3.5.2.1 Tonicidade.............................................................................................27
3.5.2.2 Posição na palavra..................................................................................28
3.5.2.3 Número de sílabas ................................................................................29
3.5.2.4 Contexto fonológico precedente............................................................29
3.5.2.5 Contexto fonológico seguinte................................................................30
3.5.3 VARIÁVEL EXTRALINGÜÍSTICA INDEPENDENTE................................31
3.5.3.1 Faixa etária.............................................................................................32
3.6 CODIFICAÇÃO DAS VARIÁVEIS............................................................33
3.7 AMALGAMAÇÕES.....................................................................................33
3.8 CRUZAMENTOS.......................................................................................34
4 DESCRIÇÃO DOS DADOS................................................................35
4.1 FONEMA /f/..............................................................................................35
4.1.1 FAIXA ETÁRIA..........................................................................................................35
4.1.1.1 Faixas etárias simples.............................................................................36
4.1.1.2 Faixas etárias amalgamadas...................................................................38
4.1.2 TONICIDADE............................................................................................................40
4.1.3 CONTEXTO PRECEDENTE................................................................................41
4.1.4 CONTEXTO SEGUINTE.......................................................................................42
4.1.5 POSIÇÃO NA PALAVRA........................................................................................42
4.1.6 NÚMERO DE SÍLABAS .........................................................................................43
4.1.7 OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES............................................................43
4.1.8 CRUZAMENTOS.......................................................................................................45
4.1.8.1 Posição na palavra x faixa etária............................................................46
4.1.8.2 Posição na palavra x tonicidade.............................................................47
4.1.8.3 Tonicidade x número de sílabas............................................................48
4.2 FONEMA /v/.............................................................................................49
4.2.1 FAIXA ETÁRIA..........................................................................................................49
4.2.1.1 Faixas etárias simples.............................................................................50
4.2.1.2 Faixas etárias amalgamadas..................................................................52
4.2.2 NÚMERO DE SÍLABAS..........................................................................................54
4.2.3 TONICIDADE...........................................................................................................55
4.2.4 CONTEXTO PRECEDENTE................................................................................56
4.2.5 CONTEXTO SEGUINTE.......................................................................................57
4.2.6 POSIÇÃO NA PALAVRA........................................................................................57
4.2.7 OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES............................................................58
4.2.8 CRUZAMENTOS.......................................................................................................59
4.2.8.1 Posição na palavra x faixa etária............................................................60
4.2.8.2 Posição na palavra x tonicidade.............................................................61
4.2.8.3 Tonicidade x número de sílabas............................................................62
4.3 FONEMA /š/............................................................................................63
4.3.1 FAIXA ETÁRIA..........................................................................................................63
4.3.1.1 Faixas etárias simples.............................................................................64
4.3.2 POSIÇÃO NA PALAVRA........................................................................................66
4.3.3 CONTEXTO PRECEDENTE ...............................................................................67
4.3.4 CONTEXTO SEGUINTE ......................................................................................68
4.3.5 TONICIDADE............................................................................................................68
4.3.6 NÚMERO DE SÍLABAS .........................................................................................69
4.3.7 OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES............................................................70
4.3.8 CRUZAMENTOS.......................................................................................................71
4.3.8.1 Posição na palavra x faixa etária............................................................71
4.3.8.2 Posição na palavra x tonicidade.............................................................73
4.3.8.3 Tonicidade x número de sílabas ...........................................................74
4.4 FONEMA /ž/.............................................................................................75
4.4.1 FAIXA ETÁRIA..........................................................................................................75
4.4.1.1Faixas etárias simples..............................................................................76
4.4.2 CONTEXTO SEGUINTE.......................................................................................78
4.4.3 POSIÇÃO NA PALAVRA........................................................................................79
4.4.4 CONTEXTO PRECEDENTE................................................................................79
4.4.5 TONICIDADE............................................................................................................80
4.4.6 NÚMERO DE SÍLABAS..........................................................................................81
4.4.7 OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES............................................................82
4.4.8 CRUZAMENTOS.......................................................................................................83
4.4.8.1 Posição na palavra x faixa etária............................................................83
4.4.8.2 Posição na palavra x tonicidade.............................................................85
4.4.8.3 Tonicidade x número de sílabas.......................................................86
5 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS....................................................87
5.1 QUANTO À FAIXA ETÁRIA.....................................................................87
5.2 QUANTO À TONICIDADE......................................................................92
5.3 QUANTO AO CONTEXTO PRECEDENTE..........................................93
5.4 QUANTO AO CONTEXTO SEGUINTE................................................94
5.5 QUANTO AO NÚMERO DE SÍLABAS..................................................94
5.6 QUANTO À POSIÇÃO NA PALAVRA.....................................................95
5.7 QUANTO A OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES...........................96
5.7.1 OMISSÕES DE SÍLABA .........................................................................................96
5.7.2 OMISSÕES DE SEGMENTO................................................................................98
5.7.3 SUBSTITUIÇÕES.....................................................................................................100
5.7.3.1 Substituições em /f/ e /v/...................................................................100
5.7.3.2 Substituições em /š/ e /ž/..................................................................102
5.7.3.3 Faixa etária das substituições..............................................................105
5.8 Implicações para a fonoaudiologia............................................................107
6 CONCLUSÃO.....................................................................................109
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................111
ANEXO A – Ficha de levantamento e codificação dos dados para os
fonemas em estudo................................................................................117
ANEXO B – Símbolos usados para codificar variáveis.........................118
LISTA DE SÍMBOLOS
C ⇒ consoante
V ⇒ vogal
R ⇒ raiz
PC ⇒ ponto de consoante
CO ⇒ cavidade oral
LAR ⇒ laríngeo
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - Produção do fonema /f/ quanto à faixa etária......................................36
TABELA 2 – Produção do fonema /f/ quanto à faixa etária amalgamada.................39
TABELA 3 – Produção do fonema /f/ quanto à tonicidade.........................................40
TABELA 4 – Produção do fonema /f/ quanto ao contexto precedente.....................41
TABELA 5 – Produção do fonema /f/ quanto ao contexto seguinte.........................42
TABELA 6 – Produção do fonema /f/ quanto à posição na sílaba............................42
TABELA 7 – Produção do fonema /f/ quanto ao número de sílabas.........................43
TABELA 8 – Omissões e outras realizações na aquisição do fonema /f/................44
TABELA 9 – Omissões e outras realizações amalgamadas na produção de
/f/.................................................................................................................................45
TABELA 10 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa etária........46
TABELA 11 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade.........47
TABELA 12 – Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas.........48
TABELA 13 – Produção do fonema /v/ quanto à faixa etária..........................50
TABELA 14 – Produção do fonema /v/ quanto à faixa etária amalgamada...53
TABELA 15 – Produção do fonema /v/ quanto ao número de sílabas..........54
TABELA 16 – Produção do fonema /v/ quanto à tonicidade..........................55
TABELA 17 – Produção do fonema /v/ quanto ao contexto precedente......56
TABELA 18 – Produção do fonema /v/ quanto ao contexto seguinte...........57
TABELA 19 – Produção do fonema /v/ quanto à posição na palavra............57
TABELA 20 – Omissões e outras realizações na produção do fonema /v/...58
TABELA 21 – Omissões e outras realizações amalgamadas..............................59
TABELA 22 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa etária........60
TABELA 23 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade.........61
TABELA 24 – Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas.........62
TABELA 25 – Produção do fonema /š/ quanto à faixa etária..........................64
TABELA 26 – Produção do fonema /š/ quanto à posição na palavra............66
TABELA 27 – Produção do fonema /š/ quanto ao contexto precedente.......67
TABELA 28 – Produção do fonema /š/ quanto ao contexto seguinte...........68
TABELA 29 – Produção do fonema /š/ quanto à tonicidade...........................68
TABELA 30 – Produção do fonema /š/ quanto ao número de sílabas...........69
TABELA 31 – Omissões e outras realizações na aquisição do fonema /š/....70
TABELA 32 – Omissões e outras realizações amalgamadas..............................71
TABELA 33 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa
etária.............................................................................................................................72
TABELA 34 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade.........73
TABELA 35 – Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas.........74
TABELA 36 – Produção do fonema /ž/ quanto à faixa etária..........................76
TABELA 37 – Produção do fonema /ž/ quanto ao contexto seguinte...........78
TABELA 38 – Produção do fonema /ž/ quanto à posição na palavra............79
TABELA 39 – Produção do fonema /ž/ quanto ao contexto precedente......79
TABELA 40 – Produção do fonema /ž/ quanto à tonicidade..........................80
TABELA 41 – Produção do fonema /ž/ quanto ao número de sílabas...........81
TABELA 42 – Omissões e outras realizações na aquisição do fonema /ž/....82
TABELA 43 – Omissões e outras realizações amalgamadas..............................82
TABELA 44 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa etária........84
TABELA 45 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade.........85
TABELA 46 – Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas.........86
TABELA 47 – Idades de aquisição em Rangel (1998).........................................89
TABELA 48 – Diferença de aquisição entre pares surdo/sonoro.....................90
TABELA 49 – Diferença de idade de aquisição nas posições de onset absoluto
e medial........................................................................................................................90
TABELA 50 – Sílabas favoráveis à produção das fricativas...............................92
TABELA 51 – Contextos precedentes favoráveis à produção das fricativas...93
TABELA 52 – Contextos seguintes favoráveis à produção das fricativas........94
TABELA 53 – Omissões de segmento nas diferentes sílabas............................99
TABELA 54 – Produções por faixas etárias na aquisição de /f/e /v/...........105
TABELA 55 – Produções por faixas etárias na aquisição de /š/ e /ž/..........106
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – Representação da estrutura arbórea segundo Clements e Hume
(1995, p.249)..................................................................................................................7
FIGURA 2 – Representação das consoantes segundo Clements e Hume (1995,
p.292)..............................................................................................................................8
FIGURA 3 – Representação geométrica do /f/.....................................................9
FIGURA 4 – Representação geométrica do /v/....................................................9
FIGURA 5 – Representação geométrica do /š/...................................................10
FIGURA 6 – Representação geométrica do /ž/..................................................10
FIGURA 7 – Representação da relação entre elementos prosódicos................12
FIGURA 8 – Representação da ‘árvore’ (Liberman e Prince, 1977, p.264)......13
FIGURA 9 – Representação da grade métrica (Liberman e Prince, 1977,
p.309)............................................................................................................................14
FIGURA 10 – Representação da grade métrica de Halle e Vergnaud, 1987
(Collischonn, 1999, p.126)........................................................................................14
FIGURA 11 – Representação da consoante final abstrata.................................17
FIGURA 12 – Quadro com o número de informantes selecionados no Banco
de Dados INIFONO.................................................................................................20
FIGURA 13 – Quadro com o número de informantes selecionados no Banco
de Dados INIFONO.................................................................................................20
FIGURA 14 – Quadro com as palavras descartadas com /f/............................22
FIGURA 15 – Quadro com as palavras descartadas com /v/...........................22
FIGURA 16 – Quadro com as palavras descartadas com /š/............................23
FIGURA 17 – Quadro com as palavras descartadas com /ž/...........................23
FIGURA 18 – Quadro com as variáveis dependentes - /f/ e /v/....................26
FIGURA 19 – Quadro com as variáveis dependentes - /š/ e /ž/....................26
FIGURA 20 – Quadro com as diferentes possibilidades de tonicidade em que
/f/ e /v/ podem ocorrer, no PB.............................................................................27
FIGURA 21 – Quadro com as diferentes possibilidades de tonicidade em que
/š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB.............................................................................28
FIGURA 22 – Quadro com as diferentes possibilidades de posição na palavra
em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB...............................................................28
FIGURA 23 – Quadro com as diferentes possibilidades de posição na palavra
em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB...............................................................28
FIGURA 24 – Quadro com as diferentes possibilidades de número de sílabas
em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB...............................................................29
FIGURA 25 – Quadro com as diferentes possibilidades de número de sílabas
em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB...............................................................29
FIGURA 26 – Quadro com as diferentes possibilidades de contexto
precedente em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB..........................................30
FIGURA 27 – Quadro com as diferentes possibilidades de contexto
precedente em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB..........................................30
FIGURA 28 – Quadro com as diferentes possibilidades de contexto seguinte
em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB...............................................................31
FIGURA 29 – Quadro com as diferentes possibilidades de contexto seguinte
em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB...............................................................31
FIGURA 30 – Quadro com as faixas etárias - /f/ e/v/......................................32
FIGURA 31 – Quadro com as faixas etárias - /š/ e /ž/....................................33
FIGURA 32 – Gráfico de produção do fonema /f/...........................................38
FIGURA 33 – Gráfico de produção do fonema /f/ quanto à faixa etária
amalgamada.................................................................................................................39
FIGURA 34 - Gráfico de produção do fonema /v/............................................52
FIGURA 35 - Gráfico de produção do fonema /v/ quanto à faixa etária
amalgamada.................................................................................................................54
FIGURA 36 – Gráfico de produção do fonema /š/...........................................66
FIGURA 37 - Gráfico de produção do fonema /ž/............................................78
FIGURA 38 - Gráfico de aquisição dos 4 fonemas em estudo..........................88
FIGURA 39 – Quadro com sugestões de palavras para terapia.......................108
RESUMO
A presente pesquisa descreve a aquisição das fricativas /f/, /v/, /š/ e
/ž/ do português brasileiro, em posição de onset simples (absoluto e medial),
por crianças com desenvolvimento normal, e idade entre 1:0 e 3:8 anos. Os
dados utilizados nesta pesquisa fazem parte dos Bancos de Dados INIFONO
(crianças com idade entre 1:0 e 1:11 anos) e AQUIFONO (crianças com idade
entre 2:0 e 7:1 anos). Procurou-se observar o que ocorria quando a criança não
produzia um dos segmentos em estudo e quando estes eram substituídos. Para
realizar a análise dos dados fez-se uso da Geometria de Traços e da Fonologia
Métrica. Os dados utilizados foram submetidos à análise estatística pelo
conjunto de programas que fazem parte do Pacote VARBRUL.
ABSTRACT
This study describes the acquisition of the Brazilian Portuguese
fricatives /f/, /v/, /š/ e /ž/ by children with ages between 1:0 – 3:8, with
normal phonological development. The sample comes from the INIFONO
and AQUIFONO data bases. Statistic analysis was carried out using the
VARBRUL program and the results were analysed according to Geometry of
Phonological Features and Metrical Phonology.
1. INTRODUÇÃO
A aquisição da fonologia do português falado no Brasil vem sendo
bastante estudada nas últimas décadas. No processo de aquisição e
desenvolvimento da linguagem infantil alguns traços distintivos, estruturas
silábicas e posições na palavra são adquiridos precocemente, enquanto outros
são adquiridos tardiamente.
O tema central desta dissertação é a aquisição das consoantes fricativas
/f/, /v/, /š/ e /ž/ por crianças brasileiras, na posição de onset (absoluto e
medial), na faixa etária de 1:0 a 3:8 anos.
Apesar do grande número de pesquisas realizadas na área de aquisição e
desenvolvimento da linguagem, não há um estudo específico sobre estas
referidas fricativas no português brasileiro, razão pela qual esses segmentos
foram escolhidos como tema desta pesquisa. Outro fator que motivou esta
escolha foi a diferença de tempo de aquisição existente dentro da classe das
fricativas, e o fato de alguma das fricativas serem consideradas de aquisição
tardia.
Este trabalho também espera complementar a descrição da classe das
fricativas, visto que Savio (2001) estudou a aquisição das fricativas /s/ e /z/
em onset e em coda.
Também relevante para justificar a realização desta pesquisa é o
trabalho realizado no Centro de Estudos sobre Aquisição e Desenvolvimento
da Linguagem (CEAAL) do Programa de Pós-Graduação em Letras da
PUCRS, sob a orientação da Profa. Dr. Regina Ritter Lamprecht, no Projeto
“A fonologia do Português na faixa etária de 1:0 e 2:0 anos”.
Nesta investigação descrever-se-á a aquisição das fricativas /f/, /v/,
/š/ e /ž/do português brasileiro; verificar-se-á a ordem de aquisição dos
fonemas nas diferentes posições da sílaba; o que ocorre quando não são
produzidos; as variáveis lingüísticas e extra-lingüística relevantes na aquisição;
se a aquisição destes fonemas é um processo linear ou gradual; se as teorias
Autossegmental e Métrica explicam de forma adequada a aquisição das
fricativas.
Além de preencher uma lacuna na descrição do PB, este estudo
também traz contribuições para a fonoaudiologia na medida em que traz
informações para o estabelecimento de padrões na aquisição fonológica
normal.
Este trabalho está estruturado da seguinte maneira: no capítulo 2, tem-
se uma revisão bibliográfica sobre a aquisição fonológica e sobre as teorias
utilizadas, ou seja, Autossegmental e Métrica.
O capítulo 3 descreve a metodologia adotada neste trabalho, ou seja,
informações sobre o banco de dados, informantes, corpus, Programa
VARBRUL, e variáveis.
No capítulo 4, tem-se a descrição dos resultados da análise estatística
com as variáveis selecionadas, bem como as não selecionadas pelo Programa
VARBRUL.
O capítulo 5 apresenta a análise e a discussão dos resultados através das
teorias Autossegmental e Métrica.
No capítulo 6, tem-se as conclusões obtidas através desta pesquisa.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 AQUISIÇÃO FONOLÓGICA
A aquisição da fonologia de uma língua implica o aprendizado de vários
aspectos relacionados aos sons que compõem o sistema daquela língua.
Segundo Mota (1996), a criança deve aprender quais são os sons que são
contrastivos em sua língua, quais são as estruturas silábicas permitidas, quais os
sons que são possíveis em cada posição silábica, quais as seqüências de sons
que podem ocorrer em uma mesma sílaba, onde fica o acento em cada palavra.
A grande maioria das crianças aprende todos esses aspectos sem apresentar
dificuldades e somente a partir das evidências do input; não há um ensino
direto dessas habilidades no desenvolvimento normal.
A aquisição fonológica é parte do processo de Aquisição da Linguagem
e permite à criança lidar com o sistema de sons de sua língua, levando ao
incremento de todas as outras habilidades lingüísticas.
Até os quatro anos, crianças com desenvolvimento normal adquirindo
o português brasileiro (PB) são capazes de produzir e usar contrastivamente os
sons de sua língua materna. Conforme Hernandorena (1990), a árdua tarefa de
discriminar fones, fonemas e traços distintivos, aplicar regras fonológicas e
morfofonêmicas, respeitar restrições selecionais e seqüenciais é dominada
bastante cedo pela criança.
Há uma variabilidade individual muito significativa entre as crianças, e
os estudos de aquisição revelam que, mesmo existindo padrões gerais, existem
também, segundo Bates, Dale e Thal (1997) e Lamprecht (1993),
características individuais marcantes, tanto na idade como no ritmo de
aquisição, que precisam ser consideradas como dados a mais nos estudos
fonológicos. Porém, é consenso que esta variação tem limites, é uma
variabilidade regida por restrições universais.
Em vista disto, foram feitos vários trabalhos a fim de ajudar a
esclarecer o processo de aquisição da linguagem. Em sua fase inicial os estudos
eram realizados a partir de dados coletados longitudinalmente. Entre os mais
citados encontra-se o de Leopold (1939-49), que acompanhou o
desenvolvimento de sua filha, e o de Roger Brown (1973), que observou, por
aproximadamente dois anos, o desenvolvimento de Adam, Eve e Sarah.
Sobre o Português Brasileiro também foram desenvolvidos estudos
baseados em dados de coletas longitudinais. Podemos citar o de Lamprecht
(1990), que estudou o perfil de aquisição de 12 crianças na faixa etária de 2:9 a
5:5; o de Santos (1990), sobre 4 crianças com idade entre 2:2 e 2:8 anos; o de
Rosa (1992), sobre o desenvolvimento fonológico normal do Português no
período entre 2:8 e 3:2; o de Ilha (1993), que observou o desenvolvimento
fonológico de crianças com idade entre 1:8 e 2:3 anos; e o de Rangel (1998),
que apresentou os dados de aquisição de 3 crianças na faixa etária de 1:6 a 3:0.
Há também estudos realizados a partir de dados obtidos por coletas
transversais. Dentre eles, destacamos o de Hernandorena (1990), sobre a
aquisição fonológica do português com base em traços distintivos; o de
Miranda (1996), referente à aquisição das róticas do Português Brasileiro; o de
Fronza (1999), referente ao nó laríngeo e ao nó ponto de C no processo de
aquisição normal e com desvios; o de Mezzomo (1999), que estudou os
padrões de aquisição das consoantes em posição de coda medial na faixa etária
de 1:4 a 3:10; e o de Savio (2001), referente à aquisição das fricativas /s/ e /z/
em crianças na faixa etária de 1:0 a 3:0.
Dentre os estudos sobre a aquisição fonológica do Português Brasileiro
que referem as fricativas /f/, /v/, /š/ e /ž/, objetos de estudo desta pesquisa,
destacam-se os seguintes: o de Hernandorena (1990), que mostra que as
fricativas /š/ e /ž/ estão adquiridas plenamente em todas as posições aos
quatro anos; o de Lamprecht (1990), que mostra ser comum (durante o
processo de aquisição) anteriorizar as fricativas /š/ e /ž/ para [s] e [z],
respectivamente; o de Ilha (1993), onde vê-se que, a partir de 1:8, as crianças já
têm os fonemas /f/ e /v/ adquiridos; o de Rangel (1998), que mostra ser
significativo o número de substituições na classe das fricativas; e o de Fronza
(1999), onde vemos que, a partir de um ano e seis meses, as crianças já têm, no
seu inventário fonológico, os fonemas /f/ e /v/.
2.2 GEOMETRIA DE TRAÇOS
A Fonologia Autossegmental surgiu como resposta aos problemas
apresentados pelos modelos lineares, ou seja: a) a relação de bijetividade e b) a
caracterização dos segmentos como conjunto de traços sem nenhuma
estrutura interna.
A Fonologia Autossegmental vê os traços distintivos como as unidades
básicas de representação fonológica. Esta teoria foi proposta inicialmente por
Goldsmith (1976), a partir de um estudo sobre o tom. Mas foi somente na
década de 80 que apareceram os primeiros estudos aplicando esta teoria aos
dados da fala infantil.
Goldsmith notou que, embora os segmentos fossem eliminados,
algumas características do tom eram mantidas, estendendo-se a outras vogais
da palavra. Esse fato veio provar, mais tarde, que um traço pode espraiar-se,
ligando-se, não-linearmente, a mais de um segmento.
A Fonologia Autossegmental passou a defender que o segmento
apresenta uma estrutura interna, ou seja, que existe a hierarquia entre os traços
que compõem determinado segmento da língua. Para Hernandorena (1999),
esta estrutura deve ser capaz de mostrar quais os traços que podem ser
manipulados isoladamente ou em conjunto.
Segundo Hernandorena (1993), os traços distintivos são, portanto,
unidades mínimas capazes de cumprir três funções básicas: a) descrever as
propriedades físicas que entram na composição do som; b) diferenciar itens
lexicais; c) agrupar os sons em classes naturais, isto é, classes de segmentos
relacionados por compartilharem propriedades (traços distintivos).
Na Fonologia Autossegmental, os traços são dispostos em ‘tiers’ (ou
camadas) onde funcionam de modo parcialmente autônomo. Os elementos no
mesmo ‘tier’ são ordenados seqüencialmente, enquanto que os elementos em
‘tiers’ diferentes não são ordenados e se relacionam uns com os outros por
meio de linhas de associação.
Com o propósito de representar formalmente a hierarquia existente
entre os traços fonológicos e o fato de que os traços podem ser manipulados,
Clements (1985) organizou um modelo de representação, a ‘Geometria de
Traços’, que dispõe os traços como mostrado na Figura 1.
A
B C D a E b c d e f g FIGURA 1 - Representação da estrutura arbórea segundo Clements e
Hume (1995, p. 249)
Para Clements e Hume (1995), o nó da raiz (A) domina todos os traços
e dele partem os demais galhos. Este nó é composto de uma matriz de traços:
[aproximante], [soante] e [vocóide], cuja função é dividir os segmentos em
classes maiores (obstruintes, nasais, líquidas e vogais).
Os nós ‘B’, ‘C’, ‘D’ e ‘E’ representam os nós de classe que dominam os
nódulos terminais (a, b, c, d, e, f, g) que são os valores dos traços e funcionam
como unidades ou classes naturais em regras fonológicas.
Conforme Clements e Hume (1995), os nós são ligados por linhas de
associação, que não podem se cruzar no mesmo plano. Ademais, existe entre
os traços uma relação de dependência, sendo que o traço do nó imediatamente
superior domina o do nó inferior e a mudança do nó superior implica
alteração do nó inferior. A maneira como os traços são dispostos e agrupados
em nós não varia de língua para língua.
Para Hernandorena (1996), a Geometria de Traços possibilita o
entendimento da existência e do funcionamento da estrutura do segmento não
só no seu comportamento na fonologia das línguas, mas também no processo
de aquisição da linguagem. Através da Geometria de Traços, é possível
constatar claramente quando um processo é considerado natural na língua,
pois, para a teoria, o que é natural implica somente uma alteração na estrutura
arbórea.
Seguindo essa representação, a organização hierárquica das consoantes,
portanto, é a mostrada na Figura 2.
X [-+ soante] Raiz [-+ aproximante] [- vocóide] Laríngeo [nasal] [aspirado] [glotal] [sonoro] Cavidade oral [contínuo] Ponto de C [labial] [coronal] [dorsal] [anterior] [distribuído]
FIGURA 2 - Representação das consoantes segundo Clements e Hume
(1995, p. 292)
As representações geométricas dos segmentos /f/, /v/, /š/ e /ž/,
objetos de estudo desta pesquisa, de acordo com o modelo de Clements e
Hume (1995), são as que seguem nas figuras 3 a 6.
/f/ R [-soante] [-vocóide] [-aproximante] Laríngeo CO [-sonoro] [+contínuo] PC [labial]
FIGURA 3 - Representação geométrica do /f/ /v/ R [-soante] [-vocóide] [-aproximante] Laríngeo CO [+sonoro] [+contínuo] PC [labial] FIGURA 4 - Representação geométrica do /v/
/š/ R [-soante] [-vocóide] [-aproximante] Laríngeo CO
[-sonoro] [+contínuo] PC [coronal] [-anterior]
FIGURA 5 - Representação geométrica do /š/
/ž/ R [-soante] [-vocóide] [-aproximante] Laríngeo CO [+sonoro] [+contínuo] PC [coronal] [-anterior]
FIGURA 6 - Representação geométrica do /ž/
Na Fonologia Autossegmental existem princípios que impõem limites à
aplicação de regras. São eles: a) o ‘princípio de não-cruzamento de linhas de
associação’, que proíbe o cruzamento de linhas de associação; b) o ‘princípio
do contorno obrigatório’, pelo qual elementos adjacentes idênticos são
proibidos; e c) a ‘restrição de ligação’, que diz que as linhas de associação em
descrições estruturais são interpretadas exaustivamente.
Para Rangel (1998), a Fonologia Autossegmental (assim como outros
modelos teóricos) fornece condições para que se proceda a uma análise
contrastiva entre o sistema fonológico infantil e o sistema fonológico adulto,
permitindo ver, com maior clareza, a construção dos segmentos durante a
aquisição da linguagem.
2.3 FONOLOGIA MÉTRICA
No modelo gerativo de Chomsky e Halle (1968), o acento era tratado
como um traço, era considerado uma propriedade de um som: as vogais eram
[+ac.] ou [-ac.]. O fato de os aspectos supra-segmentais da fala, como acento e
tom, não terem um tratamento adequado na proposta da Fonologia Gerativa
Padrão levou ao surgimento da Fonologia Métrica (Liberman e Prince, 1977).
A Fonologia Métrica tem por objetivo descrever e formalizar os padrões
acentuais e de ritmo da fala.
A partir das novas concepções de Liberman e Prince (1977), o acento
passa a ser entendido como o resultado da estruturação hierárquica dos
constituintes prosódicos, cujas unidades básicas são a sílaba, o pé e a palavra, o
que reflete uma descrição não-linear do acento.
A Fonologia Métrica considera o acento propriedade da sílaba e não de
um segmento. Segundo esse novo modelo teórico, somente uma sílaba pode
ser portadora do acento primário. O “acento passa a ter caráter relacional: não
é mais um traço, mas uma proeminência que nasce da relação entre os
elementos prosódicos: sílaba(σ), pé (∑), palavra fonológica (ω)”
(Hernandorena, 1999, p.76). A sua representação se faz como mostra a Figura
7.
Palavra ω
/ \ pé + pé ∑
/ \ sílaba + sílaba σ
forte fraca
FIGURA 7 – Representação da relação entre elementos prosódicos
É preciso saber como a sílaba se organiza em pés métricos e qual é a
posição do elemento dominante (sílaba forte) para poder estabelecer o
algoritmo acentual de uma língua.
Liberman e Prince (1977), que foram os primeiros estudiosos a criticar
o modelo de Chomsky e Halle (1968), elaboraram uma nova teoria de acento e
ritmo lingüístico. São duas as idéias básicas dessa teoria: primeiro, a
representação da noção de proeminência relativa em termos de uma relação
definida em estrutura de constituintes (binários); segundo, a representação de
certos aspectos da noção de ritmo lingüístico em termos do alinhamento de
material lingüístico em uma grade métrica.
Liberman e Prince (1977) ilustraram dois tipos de formalização lexical
assumidos pela fonologia métrica: a ‘árvore’ e a ‘grade métrica’.
Na árvore métrica, cujos ramos (binários) são rotulados em termos de
forte (S) e fraco (W), o forte sempre será o portador do acento primário.
Portanto, a proposta é que os pés são binários, formados de elementos s/w ou
w/s.
S
W W S / \ / \ / \ S W S W S W │ │ │ │ │ │ re con ci li a tion FIGURA 8 - Representação da ‘árvore’ (Liberman e Prince, 1977,
p. 264)
Além da representação da árvore métrica, que expressa muito bem a
noção de proeminência relativa, Liberman e Prince (1977) utilizam também a
grade métrica, que se presta de maneira satisfatória para expressar o ritmo, já
que esse pressupõe alternâncias, que podem ser mais bem demonstradas pela
grade.
A grade métrica contém níveis, onde as vogais são numeradas. Na 1ª
linha, as vogais recebem um número, da esquerda para a direita; na 2ª linha, só
as vogais mais proeminentes recebem um número; na 3ª linha, apenas a sílaba
mais proeminente é numerada. Quanto mais extensa for a coluna, maior será
sua força.
O objetivo da grade é criar um padrão alternante, evitando choques de
acento.
S
W W S / \ / \ / \
S W S W S W re con ci li a tion 1 2 3 4 5 6 7 8 9
10 FIGURA 9- Representação da grade métrica (Liberman e Prince, 1977,
p. 309)
Segundo Hernandorena (1999), a árvore métrica representa
basicamente as relações de proeminência entre constituintes métricos, sílabas e
outros, mas não indica diretamente qual é o mais proeminente de toda a
seqüência, e a grade métrica representa os elementos mais proeminentes de
uma seqüência, mas não os analisa em constituintes.
Tal duplicidade nos modos de representação do acento era indesejável,
e por esse motivo os estudos que se seguiram a Liberman e Prince (1977)
procuraram reduzir a representação a apenas um dos modos.
Halle e Vergnaud (1987) apresentam uma proposta em que a grade,
agora formada por asteriscos, é enriquecida pela formação de constituintes,
cujos limites são indicados por parênteses.
( * ) linha 2 (* .) (* .) linha 1 (* *) (* *) linha 0
bor bo le ta
FIGURA 10 – Representação da grade métrica de Halle e Vergnaud (1987)(Collischonn, 1999, p.126)
A grade métrica pressupõe um espaço para cada sílaba. Na linha 0
marca-se cada espaço por meio de um asterisco, formando-se os constituintes.
Na linha 1 apenas os elementos mais fortes recebem um asterisco. E na linha
2, apenas o cabeça de toda a seqüência recebe um asterisco.
A construção da grade métrica é feita por um algoritmo, e este possui
alguns parâmetros: a direção (direita para esquerda ou vice-versa), o tamanho
dos constituintes (binários, ternários ou ilimitados) e a posição do cabeça (à
direita ou à esquerda).
A combinação desses parâmetros define os seguintes tipos de
constituintes, conforme exemplificam Halle e Vergnaud (1987):
a) ilimitado, com cabeça à esquerda: * . . . . ( * * * * *) b) ilimitado com cabeça à direita: . . . . * (* * * * * ) c) binário de cabeça à esquerda: * . (* *) d) binário de cabeça à direita: . * (* *)
Segundo Collischonn (1999), a atribuição do acento obedece também a
princípios universais, que impedem que um mesmo algoritmo construa
constituintes binários e ternários ao mesmo tempo, ou que construa
seqüências de constituintes degenerados, e, por outro lado, que também
exigem que a estrutura métrica seja transparente, de modo que se possa dizer,
a partir de uma palavra, o algoritmo que a gerou. Outro princípio importante é
o ‘Princípio da Bijetividade’, que exige que todo constituinte tenha um cabeça
e que todo cabeça faça parte de um constituinte.
2.3.1. O ACENTO EM PORTUGUÊS
Considerando que o português estrutura as sílabas em pés métricos
binários de cabeça à esquerda, para fins deste trabalho adotar-se-á a análise de
Bisol (1992).
Em sua análise, Bisol (1992, p.69) argumenta que o acento é atribuído
pela seguinte regra:
(1) Regra do Acento Primário
Domínio: a palavra i. Atribua um asterisco (*) à sílaba pesada final, isto é, sílaba de
rima ramificada. ii. Nos demais casos, forme um constituinte binário (não-
iterativamente) com proeminência à esquerda, do tipo (* .), junto à borda direita da palavra.
A autora faz uma distinção entre verbos e não-verbos; para fins desta
pesquisa só será utilizada a parte dos não-verbos.
No caso dos nomes e adjetivos, segundo Bisol (1992), a palavra fica
entendida como radical + vogal temática ou marca de gênero, que pode estar
ausente. A flexão, que não interfere, fica fora deste domínio. A regra é cíclica.
A extrametricidade, que tem o poder de tornar invisíveis certos
segmentos periféricos, nos nomes, incide sobre exceções: a) palavras com
acento na 3ª sílaba e b) palavras terminadas em consoante ou ditongo com
acento não-final. Nas palavras do grupo (a), a extrametricidade se aplica à
sílaba final (árvo<re>); no grupo (b), o elemento extramétrico é coda silábica
(lápi<s>).
Para Bisol (1992), os nomes oxítonos terminados em vogal, por
exemplo, ‘café’, são considerados como se tivessem uma consoante final,
abstrata, na forma lexical.
σ σ / \ / | \ C V C V C | | | | | k a f ε FIGURA 11 –Representação da consoante final abstrata
Em palavras não derivadas (‘café’, ‘jacaré’) esta consoante fica em
posição de coda e, quando não ligada a nó de raiz, é apagada. Em palavras
derivadas, por ressilabação, passa para a posição de ataque. Por exemplo,
ka.fεC + eira = ka.fe.tey.ra
3 METODOLOGIA
O capítulo referente à metodologia desta pesquisa sobre a aquisição
das fricativas /f/, /v/, /š/ e /ž/ traz informações referentes aos Bancos de
Dados, às faixas etárias, ao corpus, ao Programa VARBRUL, e à definição
das variáveis lingüísticas e extralingüística.
3.1 BANCO DE DADOS
Os dados utilizados nesta pesquisa fazem parte de dois Bancos de
Dados que pertencem ao CEAAL (Centro de Estudos sobre Aquisição e
Desenvolvimento da Linguagem) da PUCRS e ao Mestrado em Letras da
Universidade Católica de Pelotas (UCPEL): o INIFONO e o AQUIFONO.
O INIFONO é composto de gravações e transcrições da fala de 96
crianças entre 1:0 e 2:0 anos, divididos em faixas etárias de um mês. Já o
AQUIFONO é constituído de amostras da fala de 310 crianças com idades
entre 2:0 e 7:1 anos, distribuídos em faixas etárias de dois meses.
Todos os informantes apresentam desenvolvimento fonológico
normal, são falantes monolíngües do português brasileiro e residentes nas
cidades de Porto Alegre e Pelotas, ambas no Rio Grande do Sul.
Os registros do Banco de Dados INIFONO foram coletados
transversalmente por meio de brinquedos que tentam representar as palavras
contidas no instrumento proposto por Yavas, Hernandorena e Lamprecht
(1991). Este instrumento é composto de cinco figuras temáticas que, através
da nomeação espontânea, visa a obter dados da fala de crianças. Para o Banco
de Dados AQUIFONO, os registros também foram coletados
transversalmente e obtidos através da aplicação do instrumento acima referido.
Cada gravação tem uma duração de, aproximadamente, trinta a sessenta
minutos. Os dados estão armazenados em fitas-cassete e com transcrição
fonética ampla. Todas as transcrições foram revisadas por mais de uma
pessoa.
3.2 INFORMANTES
Quanto ao número de informantes, para o presente estudo, foram
utilizados os dados de todos os informantes do Banco INIFONO que
apresentaram palavras em que houve a ocorrência ou a possibilidade de
ocorrência dos fonemas /f/, /v/, /š/ e/ž/ , tendo em vista a baixa produção
lingüística nas primeiras faixas etárias. Obtiveram-se, assim, 42 informantes do
sexo feminino e 17 do sexo masculino para os fonemas /f/ e/v/, conforme o
quadro que segue:
Faixa etária Feminino Masculino Faixa etária 1:0 0 0 Faixa etária 1:1 2 0 Faixa etária 1:2 1 0 Faixa etária 1:3 1 3 Faixa etária 1:4 2 0 Faixa etária 1:5 2 1 Faixa etária 1:6 4 1 Faixa etária 1:7 4 1 Faixa etária 1:8 6 2 Faixa etária 1:9 5 4 Faixa etária 1:10 6 2 Faixa etária 1:11 8 4 FIGURA 12 - Quadro do número de informantes selecionados no Banco de Dados INIFONO
Para os fonemas /š/ e /ž/, obteve-se 31 informantes do sexo feminino
e 14 do sexo masculino, conforme o quadro abaixo.
Faixa etária Feminino Masculino Faixa etária 1:0 0 0 Faixa etária 1:1 0 0 Faixa etária 1:2 0 0 Faixa etária 1:3 1 1 Faixa etária 1:4 2 1 Faixa etária 1:5 2 1 Faixa etária 1:6 3 1 Faixa etária 1:7 3 2 Faixa etária 1:8 5 1 Faixa etária 1:9 3 2 Faixa etária 1:10 5 2 Faixa etária 1:11 7 3 FIGURA 13 – Quadro do número de informantes selecionados no Banco de Dados INIFONO
Assim, devido à grande disparidade entre informantes do sexo
masculino e feminino, foi descartada a análise da variável sexo em favor da
manutenção de todos os dados.
Já no Banco de Dados AQUIFONO, foram selecionados, para os
quatro fonemas em estudo, quatro informantes por faixa etária, sendo dois
informantes de cada sexo.
Foram selecionados os sujeitos com idade fixada, inicialmente, em um
ano, para verificar a partir de que faixa etária há a possibilidade de ocorrência
ou a ocorrência dos segmentos em questão. A idade máxima foi de dois anos e
nove meses para os fonemas /f/ e /v/, e de três anos e nove meses para os
fonemas /š/ e /ž/. O critério de seleção dessas idades para o levantamento
baseou-se nas pesquisas prévias sobre aquisição do português, tais como:
Hernandorena (1990), no seu estudo sobre o estabelecimento de padrões com
base em traços distintivos, mostra que as fricativas /f/ e /v/ estão plenamente
adquiridas com 2:0 - 2:1; Ilha (1993), que estudou o desenvolvimento
fonológico em crianças normais com idade entre 1:8 e 2:3, encontrou que as
fricativas /f/ e/v/ já constam no inventário fonológico das crianças antes de
1:8; Fronza (1999), estudando o nó laríngeo e o nó ponto de C, mostrou que
/š/e /ž/ já aparecem como fonemas em crianças com 1:6. Já o intervalo entre
as faixas etárias segue a própria divisão dos Bancos de Dados, ou seja, um mês
para o INIFONO e dois meses para o AQUIFONO.
3.3 CORPUS
A amostra utilizada nesta pesquisa é uma parte desses Bancos de
Dados, sendo composta por 67 entrevistas do Banco de Dados INIFONO e
44 do Banco de Dados AQUIFONO.
Inicialmente, foram selecionadas das transcrições fonéticas as palavras
em que há ocorrência ou possibilidade de ocorrência dos fonemas /f/, /v/,
/š/ e /ž/. Após, foi feito o registro gráfico dos dados, em fichas (Anexo A).
Posteriormente, foi feita a codificação destes dados, buscando levantar todas
as possibilidades de análise da produção ou não dos fonemas em questão,
enfatizando a interferência de variáveis lingüísticas e da variável extralingüística
idade. Após a codificação, os dados foram digitados dentro de arquivos
fornecidos pelo pacote VARBRUL e analisados pelo conjunto de programas
que fazem parte do pacote.
Foram descartadas do corpus todas as ocorrências de palavras que
sofreram epêntese, metátese ou assimilação, por tratar-se de fenômenos que
devem ser estudados separadamente. Nos quadros abaixo temos a relação das
palavras descartadas e a idade em que elas foram produzidas.
Palavra Idade Realização sofá 1:6 [tu ‘ta] faz 1:10;2 [fa ‘zi] elefante 1:11 [fã ‘fãnči] fósforo 2:2 [‘f⊃suru] fósforo 2:2 [‘f⊃tu] fósforo 2:5 [‘f⊃tu] fósforo 2:5 [‘f⊃rsu] perfume 2:9 [fe’fumi] fósforo 2:9 [‘f⊃suro]
FIGURA 14 - Quadro com as palavras descartadas com /f/
Palavra Idade Realização vovô 1:5 [pã’pãw] escova 1:5 [‘koko] lavar 1:6 [va’va] cavalo 1:7 [wa’waw] vovó 1:9 [do’d⊃] cavalo 1:11 [va’vaw] cavalo 1:11 [ka’kalu] árvore 2:1 [‘favi] escova 2:5 [si’kova] FIGURA 15 – Quadro com as palavras descartadas com /v/
Palavra Idade Realização
cachorro 1:5 [ko´ki] caixa 1:6 [´tata] chapéu 1:7 [pe´pew] chapéu 1:8 [pa´pew] chocolate 2:1 [koko´lači] chinelo 2:2 [ni´nεlu] cachorro 2:10 [ka´RoRu] chaleira 3:3 [šar´nεla]
FIGURA 16 – Quadro com as palavras descartadas com /š/ Palavra Idade Realização dirigir 1:7 [ĵi´že] laranja 1:11 [a´lãla] laranja 2:4 [ra´žãna] refrigerante 2:8 [fi´fãnči] refrigerante 3:4 [lele´lãnči] FIGURA 17 – Quadro com as palavras descartadas com /ž/
O critério adotado neste estudo para considerar os segmentos fricativos
(/f/, /v/ /š/ e /ž/) como adquiridos é o de 85% de produção correta em
duas faixas etárias seguidas. Este número foi definido a partir de outros
trabalhos já realizados na área de aquisição, tais como Hernandorena (1990) e
Miranda (1996), que consideraram um segmento adquirido com 85% de
realização correta, Azambuja (1998), Fronza (1999) e Savio (2001), que
consideraram 86%, e Hernandorena e Lamprecht (1997), com 90%.
Considera-se que o emprego adequado acima de 85% é indício de uso
efetivo do segmento, sendo as variações que ocorrem consideradas
insuficientes para causar instabilidade no seu emprego.
3.4 INSTRUMENTO DE ANÁLISE
3.4.1 PACOTE VARBRUL
A análise estatística contribui significativamente no tratamento dos
dados de um trabalho desta natureza. Para tanto, foi utilizado o pacote
VARBRUL, responsável pelo tratamento estatístico dos dados. A razão pela
escolha de um programa como este vem de sua já comprovada eficiência para
analisar dados lingüísticos em grande quantidade, fornecendo freqüências e
probabilidades.
Apesar de ser um programa específico para a área da variação, o
VARBRUL já foi utilizado com sucesso em dados da aquisição da linguagem
(Miranda, 1996; Mezzomo, 1999; Savio, 2001, entre outros). Seu uso se
justifica por ele selecionar variáveis lingüísticas e, por isso, servir à aquisição da
linguagem.
Conforme Scherre (1993, p.1), o VARBRUL foi desenvolvido “com o
objetivo de implementar modelos matemáticos que procuram dar
tratamento estatístico adequado a dados lingüísticos variáveis”.
São dez os programas que constituem o Pacote: CHECTOK,
READTOK, MAKECELL, IVARB, TVARB, CROSSTAB, TEXSORT,
TSORT, MVARB e CONTUP. Neste estudo, no entanto, apenas alguns deles
serão utilizados.
Primeiramente, os dados devem ser codificados de acordo com os
símbolos criados pelo pesquisador. Do mesmo modo, a lista das variáveis,
com seus respectivos fatores, recebe codificação própria. Os dados e as
variáveis são digitados separadamente, criando os arquivos com as
especificações .dat e .esp, respectivamente.
O CHECKTOK, primeiro programa a ser utilizado, lê os arquivos de
especificações e dados, e gera um arquivo corrigido (.cor). De acordo com
Espiga (2001), o programa critica a qualidade dos dados, ou seja, verifica se os
mesmos estão de acordo com a codificação informada no arquivo de
especificações. Os dados corrigidos servirão de input para o READTOK. O
READTOK, efetua as transformações nos dados corrigidos pelo
CHECKTOK e gera novos dados com as modificações. O arquivo gerado
contém somente dados passíveis de computação.
O MAKECELL lê os arquivos de condições e de dados corrigidos,
gerando um arquivo de células. Se houver situações de knockout, estas serão
denunciadas pelo programa. O knockout caracteriza a aplicação ou a não-
aplicação categórica da variante considerada, quanto a um certo fator.
O IVARB lê o arquivo de células e gera um arquivo de resultados.
Nesta etapa (Espiga, 2001), o VARBRUL calcula, além dos percentuais de
aplicação da variável dependente, os pesos relativos de todos os fatores de
cada variável independente. O programa também fornece a ordem de
significância das variáveis independentes na aplicação do valor considerado na
análise.
Como o IVARB trabalha com variáveis dependentes binárias, o
VARBRUL também dispõe do programa TVARB, para variáveis dependentes
com três variantes, e do programa MVARB, para variáveis dependentes com
quatro ou mais variantes.
Há outro programa também utilizado neste trabalho, o CROSSTAB.
Este programa permite o cruzamento dos percentuais atribuídos a dois grupos
de fatores especificados e verifica a presença de cruzamentos vazios.
3.5 DEFINIÇÃO DAS VARIÁVEIS
3.5.1 VARIÁVEIS DEPENDENTES
As variáveis dependentes desta pesquisa foram estabelecidas com o
objetivo de observar a realização ou não-realização dos fonemas /f/, /v/, /š/
e /ž/. O valor “1” representou as realizações corretas, enquanto as omissões e
substituições foram categorizadas como “0”. Dessa forma realizou-se uma
análise binária e, posteriormente, é que os casos de omissão e outras
realizações foram categorizadas em um segundo grupo, codificadas com
números de 2 a 7.
Variáveis dependentes Fonema /f/ Fonema /v/ Palavra alvo Realização Palavra alvo Realização 1. Realização do segmento garrafa [ga’afa] vela [’vεla] 2. Omissão do segmento elefante [‘ãnĉi] vermelho [e’metu] 3. Omissão de sílaba formiga [’miga] televisão [tele´zãw] 4. Troca de [sonoro] perfume [‘vumi] sorvete [‘feĉi] 5. Troca de [contínuo] fogão [po’gãw] verde [’beĵi] 6. Troca de ponto feijão [si’zãw] * * 7. Troca por semivogal foi [’woy] violão [wo’lãw] * sem ocorrência Figura 18 – Quadro com as variáveis dependentes -/f/ e /v/
Variáveis dependentes Fonema /š/ Fonema /ž/ Palavra alvo Realização Palavra alvo Realização
1. Realização do segmento bruxa [‘bruša] girafa [ži’afa] 2. Omissão do segmento chinelo [i’nεlu] geladeira [ela’dela] 3. Omissão de sílaba chapéu [‘pε] geladeira [la’dela] 4. Troca por [+ anterior] chapéu [sa’pεw] jacaré [zaka’rε] 5. Troca de [sonoro] cheia [‘žeya] queijo [‘kešu] 6. Troca de [contínuo] chinelo [ki’nεlu] jogar [do’ga] 7. Troca de ponto xícara [‘fikara] jacaré [vaka’lε] FIGURA 19 – Quadro com as variáveis dependentes - /š/ e /ž/
3.5.2 VARIÁVEIS LINGÜÍSTICAS INDEPENDENTES
As variáveis lingüísticas independentes utilizadas para este estudo são as
seguintes: tonicidade, posição na palavra, número de sílabas, contexto
fonológico precedente e contexto fonológico seguinte
3.5.2.1 Tonicidade
Um número grande de trabalhos tem mostrado que a tonicidade é um
fator importante no processo de aquisição de fonologia. A literatura relativa à
aquisição da fonologia tem mostrado que as sílabas átonas são as mais
propícias a sofrer processos fonológicos (para o PB, Miranda, 1996;
Azambuja, 1998; Mezzomo, 1999).
Para Mezzomo (1999), a sílaba pretônica mostrou-se facilitadora na
aquisição da coda com fricativa; já para Miranda (1996), com relação ao r-
fraco, a favorecedora foi a sílaba tônica .
Tonicidade Fonema /f/ Fonema /v/ Postônica /ga’Rafa/ /’šave/ Tônica /ka’fε/ /vo’vo/ Pretônica /fo’gãw/ /avi’ãw/ Pre-pretônica /figu’riña/ /arvore’ziña/ FIGURA 20 – Quadro com as diferentes possibilidade de tonicidade em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB
Tonicidade Fonema /š/ Fonema /ž/ Postônica /’bišo/ /’beyžo/ Tônica /’šikara/ /’žura/ Pretônica /ši’nεlo/ /ži’rafa/ Pre-pretônica /šoko’late/ /žaka’rε/ FIGURA 21 – Quadro com as diferentes possibilidade de tonicidade em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB
3.5.2.2 Posição na palavra
Os fonemas aqui estudados podem ocupar a posição de onset absoluto
e medial da palavra. A importância desta variável já foi destacada por inúmeros
estudos de aquisição (Para o PB, Yavas, 1988; Hernandorena, 1990;
Lamprecht, 1990, 1995; Miranda, 1996).
Em Savio (2001) vemos que o fonema /s/ é adquirido aos 2:0, em
posição de onset medial, e aos 2:6 em posição de onset absoluto. Também para
Rangel (1997) a posição de onset medial é a primeira a ser estabelecida na
aquisição das fricativas. A variável posição na palavra foi formulada para que
se pudesse testar sua influência na produção dos fonemas em estudo.
Posição na palavra Fonema /f/ Fonema /v/ Onset absoluto /’faka/ /ver’meλo/ Onset medial /ka’fε/ /ka’valo/ FIGURA 22 – Quadro com as diferentes possibilidades de posição na palavra em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB
Posição na palavra Fonema /š/ Fonema /ž/ Onset absoluto /ša’ve/ /žela’deyra/ Onset medial /ka’šoRo/ /Re’l⊃žyu/ FIGURA 23 – Quadro com as diferentes possibilidades de posição na palavra em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB
3.5.2.3 Número de sílabas
A seleção desse fator para a análise da aquisição das fricativas baseou-se
no fato de o mesmo já ter-se mostrado relevante em outras análises. Para
Mezzomo (1999), as trissílabas favorecem a aquisição de coda com fricativas.
Número de sílabas Fonema /f/ Fonema /v/ Monossílaba /’foy/ /’vay/ Dissílaba /’faka/ /’vaka/ Trissílaba /ži’rafa/ /es’kova/ Polissílaba /kafε’ziño/ /trave’seyru/ FIGURA 24 – Quadro com as diferentes possibilidades de número de sílabas em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB
Número de sílabas Fonema /š/ Fonema /ž/ Monossílaba /’ša/ /’ža/ Dissílaba /’šave/ /žor’naw/ Trissílaba /’šikara/ /že’lado/ Polissílaba /šoko’late/ /diri’žindo/ FIGURA 25 – Quadro com as diferentes possibilidades de número de sílabas em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB
3.5.2.4 Contexto fonológico precedente
A escolha desta variável se justifica pela importância dada a ela nos
estudos de aquisição fonológica normal (Para o PB, Hernandorena, 1990;
Azambuja, 1998; Miranda, 1996; Mezzomo, 1999; Savio, 2001).
Para citar dois exemplos, nos dados de Mezzomo (1999) vemos que as
vogais /ε/ e /a/ e as consoantes coronais são os ambientes que mais
favorecem a produção da coda fricativa. Para Savio (2001), as vogais /i/ e /u/
são as que mais favorecem a produção do fonema /z/.
Contexto fonológico precedente
Fonema /f/ Fonema /v/
/a/ /šafa’ris/ /ka’valo/ /e/ /ele’fãnte/ /Re’vista/ /ε/ * /’lεva/ /i/ /dife’rente/ /aniver’saryu/ /o/ /so’fa/ /’ovo/ /⊃/ * /es’c⊃va/ /u/ /pãn’tufa/ /’šuva/ /w/ * /ow’vido/ Vazio /’fala/ /vio’lãw/ /s/ /’f⊃sforo/ /esvazi’ou/ /r/ /’garfo/ /ser’veža/ /n/ * * * sem possibilidade de ocorrência no corpus FIGURA 26 – Quadro com as diferentes possibilidades de contexto precedente em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB
Contexto fonológico precedente
Fonema /š/ Fonema /ž/
/a/ /bo’Raša/ /vi’ažen/ /e/ /fe’šou/ /i’greža/ /ε/ * /ko’lεžyu/ /i/ /’bišo/ /Reližy’ãw/ /o/ /bo’šeša/ /’ože/ /⊃/ * /Re’l⊃žyu/ /u/ /’bruša/ /’suža/ Vazio /šoko’late/ /žela’deyra/ /n/ /lãn’šãndo/ /la’rãnža/ * sem possibilidade de ocorrência no corpus FIGURA 27 – Quadro das diferentes possibilidades de contexto precedente em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB
3.5.2.5 Contexto fonológico seguinte
Analisou-se o ambiente lingüístico posterior às fricativas, considerando
a hipótese da possível interferência dele no processo de aquisição. Outros
estudos (Miranda, 1996; Mezzomo, 1999, Savio 2001) já fizeram uso desta
variável.
Savio (2001) encontrou que a vogal seguinte /e/ é mais favorecedora
na produção do fonema /s/.
Contexto fonológico seguinte
Fonema /f/ Fonema /v/
/a/ /’faka/ /’vaka/ /e/ /dife’rente/ /’verde/ /ε/ /ka’fε/ /’vεla/ /i/ /gar’fiño/ /avi’ãw/ /o/ /’fogo/ /vo’vo/ /⊃/ /’f⊃to/ /’v⊃lta/ /u/ /’furo/ /vul’kãw/ Vogal nasalizada /ele’fante/ /esko’viña/ FIGURA 28 – Quadro das diferentes possibilidades de contexto seguinte em que /f/ e /v/ podem ocorrer, no PB
Contexto fonológico seguinte
Fonema /š/ Fonema /ž/
/a/ /’šave/ /’suža/ /e/ /bo’šeša/ /žela’deyra/ /ε/ * /tižε’liña/ /i/ /’šikara/ /ži’rafa/ /o/ /ka’šoRo/ /žor’naw/ /⊃/ /’š⊃ra/ /’ž⊃ya/ /u/ /’šuva/ /’žura/ Vogal nasalizada /’šãw/ /fey’žãw/ * sem possibilidade de ocorrência no corpus FIGURA 29 – Quadro das diferentes possibilidades de contexto seguinte em que /š/ e /ž/ podem ocorrer, no PB
3.5.3 VARIÁVEL EXTRALINGÜÍSTICA INDEPENDENTE
A única variável extralingüística independente analisada neste estudo é a
faixa etária.
3.5.3.1 Faixa etária
Esta variável é de grande importância quando se estuda aquisição da
linguagem. Através dela é possível saber se há linearidade na aquisição
fonológica, ou se ocorrem regressões. Savio (2001) encontrou quedas na
produção do fonema/z/ nas Faixas etárias 1:10 e 1:11. É também possível
estabelecer parâmetros que são essenciais para as pesquisas sobre desvios e
para aplicação clínica.
Faixas etárias Idade * Faixa etária 1:0 1:0;0 – 1:0;29 Faixa etária 1:1 1:1;0 – 1:1;29 Faixa etária 1:2 1:2;0 – 1:2;29 Faixa etária 1:3 1:3;0 – 1:3;29 Faixa etária 1:4 1:4;0 – 1:4;29 Faixa etária 1:5 1:5;0 – 1:5;29 Faixa etária 1:6 1:6;0 – 1:6;29 Faixa etária 1 :7 1:7;0 – 1:7;29 Faixa etária 1:8 1:8;0 – 1:8;29 Faixa etária 1:9 1:9;0 – 1:9;29 Faixa etária 1:10 1:10;0 –1:10;29 Faixa etária 1:11 1:11;0 – 1:11;29 Faixa etária 2:0 2:0;0 – 2:1;29 Faixa etária 2:2 2:2;0 – 2:3;29 Faixa etária 2:4 2:4;0 – 2:5;29 Faixa etária 2:6 2:6;0 – 2:7;29 Faixa etária 2:8 2:8;0 – 2:9;29 * em anos: meses; dias FIGURA 30 – Quadro das faixas etárias - /f/ e /v/
Faixas etárias Idade* Faixa etária 1:0 1:0;0 – 1:0;29 Faixa etária 1:1 1:1;0 – 1:1;29 Faixa etária 1:2 1:2;0 – 1:2;29 Faixa etária 1:3 1:3;0 – 1:3;29 Faixa etária 1:4 1:4;0 – 1:4;29 Faixa etária 1:5 1:5;0 – 1:5;29 Faixa etária 1:6 1:6;0 – 1:6;29 Faixa etária 1 :7 1:7;0 – 1:7;29 Faixa etária 1:8 1:8;0 – 1:8;29 Faixa etária 1:9 1:9;0 – 1:9;29 Faixa etária 1:10 1:10;0 –1:10;29 Faixa etária 1:11 1:11;0 – 1:11;29 Faixa etária 2:0 2:0;0 – 2:1;29 Faixa etária 2:2 2:2;0 – 2:3;29 Faixa etária 2:4 2:4;0 – 2:5;29 Faixa etária 2:6 2:6;0 – 2:7;29 Faixa etária 2:8 2:8;0 – 2:9;29 Faixa etária 2:10 2:10;0 – 2:11 ;29 Faixa etária 3:0 3:0;0 – 3:1;29 Faixa etária 3:2 3:2;0 – 3:3;29 Faixa etária 3:4 3:4;0 – 3:5;29 Faixa etária 3:6 3:6;0 – 3:7;29 Faixa etária 3:8 3:8;0 - 3:9;29 * em anos: meses; dias FIGURA 31 – Quadro das faixas etárias - /š/ e /ž/
3.6 CODIFICAÇÃO DAS VARIÁVEIS
Nesta etapa foram criados símbolos para cada variante das variáveis
definidas, pois para utilizar os programas do pacote VARBRUL, as
informações devem estar codificadas.
Os símbolos utilizados encontram-se no Anexo B.
3.7 AMALGAMAÇÕES
Após realizar a primeira rodada do programa IVARB e estabelecer as
faixas etárias de aquisição, selecionaram-se variantes que poderiam ser
amalgamadas.
Para realizar as amalgamações, dois ou mais fatores são agrupados e
recodificados, necessitando-se, portanto, da criação de um novo arquivo de
condições e de um novo arquivo de células para executar uma rodada dos
dados do VARB2000. Uma reanálise foi feita por meio do teste log-likelihood,
também conhecido como teste do Qui-quadrado. Com esse teste constataram-
se as amalgamações válidas e, também, as que não o eram.
Neste estudo, o critério utilizado para realizar amalgamações é o de
peso relativo próximo.
3.8 CRUZAMENTOS
Algumas variáveis foram cruzadas a fim de investigar a interferência das
mesmas no fenômeno em questão, pois, a partir dessas comparações
controladas, podem ser feitas generalizações válidas.
Para a execução de cada cruzamento, foi necessária a criação de um
arquivo de condições correspondente, no qual foi inserido um novo grupo
contendo o cruzamento em questão.
4 DESCRIÇÃO DOS DADOS
Neste capítulo encontra-se a descrição dos resultados das rodadas
referentes aos fonemas em estudo.
4.1 FONEMA /f/
As variáveis selecionadas pelo Programa VARBRUL como relevantes
no processo de aquisição da fricativa /f/ foram faixa etária e tonicidade.
Optou-se por também expor os demais resultados encontrados em função de
um dos objetivos da pesquisa, que é o de trazer subsídios para a terapia
fonoaudiológica.
4.1.1 FAIXA ETÁRIA
A análise dos dados passou por duas etapas. Na primeira, a fim de se
estabelecer uma linha desenvolvimental de aquisição do fonema /f/, foram
obtidos os resultados de cada faixa etária estabelecida para esta pesquisa. Na
segunda etapa, amalgamaram-se algumas faixas etárias.
4.1.1.1 Faixas etárias simples
Tabela 1– Produção do fonema /f/ quanto à faixa etária
Faixa etária Peso Percentual Freqüência Faixa etária 1:0 * * * Faixa etária 1:1 # 100% 1/1 Faixa etária 1:2 * * * Faixa etária 1:3 # 0% 0/1 Faixa etária 1:4 * * * Faixa etária 1:5 * * * Faixa etária 1:6 .20 71% 5/7 Faixa etária 1:7 .04 50% 2/4 Faixa etária 1:8 .21 71% 10/14 Faixa etária 1:9 .35 88% 23/26 Faixa etária 1:10 .67 97% 32/33 Faixa etária 1:11 .55 95% 58/61 Faixa etária 2:0 .24 85% 17/20 Faixa etária 2:2 .36 90% 28/31 Faixa etária 2:4 .68 96% 23/24 Faixa etária 2:6 # 100% 33/33 Faixa etária 2:8 .75 97% 36/37
Input .95 Significância .018 # knockout * sem possibilidade de ocorrência
Conforme a Tabela 1, as crianças vão adquirindo o fonema /f/
gradativamente. Porém, através do peso relativo, nas faixas etárias 1:7, 1:11 e
2:0 observa-se uma queda.
Nas primeiras faixas etárias é interessante observar que na faixa etária
1:1 e na faixa etária 1:3 só há uma possibilidade de ocorrência deste fonema.
Somente a partir da faixa 1:6 é que as possibilidades de realização vão surgindo
e aumentando gradativamente.
Analisando o peso, tem-se, nas faixas etárias 1:10 (.67) e 1:11 (.55), um
grande aumento na realização correta do segmento. Mas nas duas faixas
seguintes, 2:0 (.24) e 2:2 (.36), a produção do segmento sofre uma queda.
A partir da faixa etária 2:4 (.68) é que o segmento se estabiliza e atinge
pesos relativos elevados. É interessante observar que na faixa etária 2:6 o
percentual de produções corretas atinge 100%.
Os pesos relativos visualizados na Tabela 1 foram retirados da
interação com os fatores selecionados. Os demais pesos, de variáveis não
selecionadas, expostos neste capítulo, foram retirados das interações com
melhor significância, ou seja, os valores mais próximos ao zero.
Analisando a Tabela 1 através da porcentagem, para possível
comparação com os demais trabalhos da área que não usaram peso relativo
(Lamprecht, 1990; Hernandorena, 1990; Miranda, 1996; Mezzomo, 1999;
Sávio, 2001), encontramos uma pequena queda na faixa etária 1:7, onde a
produção correta cai para 50%.
Pode-se dizer que, a partir da faixa etária 1:9, com 88% de produção
correta, o fonema /f/ está adquirido, pois as quedas que ocorrem após esta
idade não conduzem o percentual a menos que 85%, que é o padrão
estabelecido para este trabalho. No entanto, nessa faixa o peso ainda é muito
baixo.
Na Figura 32, através do percentual, observa-se o processo de aquisição
do fonema /f/. Verifica-se que a aquisição se dá de maneira praticamente
crescente, havendo pequenas quedas, conforme já mencionado.
FIGURA 32 – Gráfico da produção do fonema /f/
4.1.1.2 Faixas etárias amalgamadas
As faixas etárias foram amalgamadas seguindo o critério de peso
relativo próximo.
As primeiras faixas, com peso relativo muito baixo, foram agrupadas
formando o Grupo Etário 1. Foi incluída neste grupo a faixa 1:9 que, embora
tendo atingido 88% de produção correta conforme referido acima, teve um
peso baixo (.35).
No Grupo Etário 2 agruparam-se as faixas em que houve um aumento
significativo do peso.
No Grupo Etário 3 amalgamaram-se as faixas seguintes em que os
pesos foram baixos, ou seja, onde ocorreu a queda na produção.
No Grupo Etário 4 tem-se as faixas com pesos relativos altos, onde o
fonema encontra-se plenamente adquirido.
produção de /f/
0102030405060708090100
1.1 1.3 1.6 1.7 1.8 1.9 1.101.11 2.0 2.2 2.4 2.6 2.8
faixas etárias
percentuais
Seqüência1
Tabela 2 – Produção do fonema /f/ quanto à faixa etária amalgamada
Grupo etário Peso Percentual Freqüência Grupo Etário 1 (1:1, 1:3, 1:6, 1:7, 1:8, 1:9)
.16 77% 41/53
Grupo Etário 2 (1:10, 1:11) .51 96% 90/94 Grupo Etário 3 (2:0, 2:2) .24 88% 45/51 Grupo Etário 4 (2:4, 2:6, 2:8) .82 98% 92/94
Input .96 Significância .018
Através da Tabela 2, pode-se constatar que no GE1 o peso é muito
baixo (.16), no GE2 essa variável tem peso relativo acima de .50, mas em
seguida há uma queda e no GE3 o peso cai para .24 No GE4 é que o peso
atinge um valor elevado, .82.
Mas, novamente, olhando-se para a porcentagem vê-se que, a partir do
GE2 o percentual está acima dos 85%. A queda existente no GE3 não é
inferior ao critério de 85%.
FIGURA 33- Gráfico da produção de /f/ quanto à faixa etária
amalgamada
Faixas etárias amalgamadas
0102030405060708090100
GE1 GE2 GE3 GE4
grupos etários
percentuais
Seqüência1
4.1.2 TONICIDADE
Tabela 3 – Produção do fonema /f/ quanto à tonicidade
Tonicidade Peso Percentual Freqüência Exemplos Postônica .60 95% 39/41 /ga’Rafa/ Tônica .56 94% 167/177 /ka’fε/ Pretônica .35 86% 59/69 /fo’gãw/ Pré-pretônica .03 60% 3/5 /figu’riña/
Input .96 Significância .018
No que se refere à variável tonicidade, observa-se que a posição
postônica (.60) é a mais favorecedora para a produção correta do /f/, seguida
de perto pela posição tônica (.56).
A pretônica (.35) e a pré-pretônica (.03) não se mostram como
favorecedoras para a produção do /f/.
Observando a Tabela 3 vê-se que a sílaba tônica teve maior número de
possibilidades de realização da fricativa /f/, 177, enquanto que a pretônica
teve 69 possibilidades, a postônica 41 e a pré-pretônica somente 5
possibilidades de realização. Lembrando sempre que esta freqüência decorre
da língua, mais especificamente do vocabulário infantil (palavras usadas por e
para crianças entre 1:0 e 3:8), não dependendo do desempenho da criança.
4.1.3 CONTEXTO PRECEDENTE
Tabela 4 - Produção do fonema /f/ quanto ao contexto precedente Contexto precedente
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/e/ .74 97% 35/36 /ele’fãnte/ Vazio .52 90% 132/147 /’fala/ /a/ .46 93% 54/58 /šafa’ris/ /o/ .32 93% 14/15 /so’fa/ /r/ .27 89% 25/28 /’garfo/ /i/ # 100% 2/2 /ĵife’rente/ /u/ # 100% 2/2 /pãn’tufa/ /s/ # 100% 4/4 /’f⊃sforo/ Input .96 Significância .47 # knockout
Observando a Tabela 4, vê-se que o contexto precedente mais
favorável à produção do /f/ é a vogal coronal /e/ (.74).
Em segundo lugar, vê-se o contexto precedente vazio (.52), o que
corresponde à posição de início de palavra. É interessante notar que foi o
contexto com maior possibilidades de ocorrência, 147 palavras.
O fonema /f/ apresentou 100% de produção correta quando
precedido pelas vogais /i/ e /u/ e pela fricativa /s/, mas a freqüência foi
baixa, no máximo quatro possibilidades de ocorrência.
4.1.4 CONTEXTO SEGUINTE
Tabela 5 - Produção do fonema /f/ quanto ao contexto seguinte Contexto seguinte
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/i/ .75 96% 22/23 /gar’fiño/ /ε/ .75 98% 40/41 /ka’fε/ /e/ .66 89% 25/28 /dife’rente/ /u/ .48 92% 44/48 /’furo/ /o/ .41 87% 47/54 /’fogo/ Vogal nasalizada .35 94% 15/16 /ele’fãnte/ /a/ .29 89% 56/63 /’faka/ /⊃/ # 100% 19/19 /’f⊃to/ Input .97 Significância .19 # knockout
O contexto seguinte que mostrou-se mais favorecedor à produção do
fonema /f/ foi a vogal labial /⊃/, com 100% de produção correta em 19
possibilidades de ocorrência.
Também apresentaram pesos relativos altos as vogais coronais /i/ (.75),
/ε/ (.75) e /e/ (.66).
4.1.5 POSIÇÃO NA PALAVRA
Tabela 6 - Produção do fonema /f/ quanto à posição na palavra Posição na palavra
Peso Percentual Freqüência Exemplos
Onset medial .57 94% 136/145 /ka’fε/ Onset absoluto .43 90% 132/147 /’faka/
Input .93 Significância .214
Em relação à posição na palavra, o onset medial mostrou-se mais
favorecedor à produção da fricativa /f/ (.57). O onset absoluto apresentou um
peso de .43.
É interessante observar que o número de freqüência de ocorrências do
fonema é quase o mesmo nas duas posições silábicas: 145 possibilidades na
posição de onset medial e 147 possibilidades para onset absoluto.
4.1.6 NÚMERO DE SÍLABAS Tabela 7 - Produção do fonema /f/ quanto ao número de sílabas
Número de sílabas
Peso Percentual Freqüência Exemplos
Polissílaba .60 92% 47/51 /kafε’ziño/ Dissílaba .59 95% 148/156 /’faka/ Trissílaba .30 87% 65/75 /ži’rafa/ Monossílaba .20 80% 8/10 /’foy/
Input .97 Significância .068
Para a produção do /f/, o que mostrou-se mais favorecedor foi a
palavra polissílaba (.60), com 51 possibilidades de ocorrência.
Em segundo lugar vê-se a dissílaba (.59), mas com uma freqüência de
ocorrência bem maior, 156 possibilidades de produção.
Como menos favorecedoras tem-se a trissílaba (.30), com 75 palavras, e
a monossílaba (.20), com apenas 10.
4.1.7 OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES
No corpus desta pesquisa a fricativa /f/ teve 292 possibilidades de
ocorrência, sendo que foi produzida corretamente 268 vezes (92%).
Nos casos em que não houve a produção correta (8%), os dados foram,
inicialmente, codificados como segue abaixo:
Tabela 8 - Omissões e outras realizações na aquisição do fonema /f/
Ocorrências Porcentagem Exemplos
Omitiu segmento 4 1% elefante -[‘ãnči] Omitiu sílaba 5 2% formiga - [‘miga] Substituição de [sonoro]
5 2% perfume - [‘vumi]
Substituição de [contínuo]
7 3% fogão - [po’gãw]
Substituição de [ponto]
2 0% feijão - [si’zãw]
Substituição por semivogal
1 0% foi – [‘woy]
Verifica-se que a não-realização do segmento ocorreu em 9 palavras
(2%) do corpus, sendo que: em 4 palavras (1%) não houve a produção do
segmento, e em 5 palavras (2%) não houve a produção da sílaba portadora do
segmento em questão.
Também ocorreram substituições: 5 substituições (2%) envolvendo o
traço sonoro; 7 substituições (3%) envolvendo o traço contínuo; 2
substituições (0%) de ponto; e uma substituição (0%) por semivogal.
Em razão de as omissões e não-realizações constituírem poucos dados,
amalgamaram-se as variáveis a fim de dar maior sustentação às afirmações. As
amalgamações realizadas encontram-se na tabela abaixo.
Tabela 9 - Omissões e outras realizações amalgamadas na produção de /f/
Fonema /f/
Ocorrência Porcentagem
Omissões 9 3% Substituições 14 5% Substituição envolvendo traços de raiz
1 0%
Tem-se, então, 9 omissões (3%) do segmento /f/; 14 substituições
(5%); e apenas 1 substituição envolvendo traços de raiz (0%).
4.1.8 CRUZAMENTOS
A fim de verificar a influência das variáveis envolvidas na produção do
/f/, fizeram-se cruzamentos entre as variáveis lingüísticas e a variável extra-
lingüística.
Serão apresentados os resultados dos cruzamentos que foram
selecionados pelo Programa VARBRUL e os que a autora desta pesquisa
julgou interessantes.
4.1.8.1 Posição na palavra x faixa etária Tabela 10 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa etária
Posição na palavra Faixa etária Onset absoluto Onset medial
Percentual Peso Freqüência Percentual Peso Freqüência Faixa etária 1:0 * * * * * * Faixa etária 1:1 * * * 100% # 1/1 Faixa etária 1:2 * * * * * * Faixa etária 1:3 0% # 0/1 * * * Faixa etária 1:4 * * * * * * Faixa etária 1:5 * * * * * * Faixa etária 1:6 60% .18 3/5 100% # 2/2 Faixa etária 1:7 50% .06 1/2 50% .06 1/2 Faixa etária 1:8 60% .24 3/5 78% .26 7/9 Faixa etária 1:9 94% .63 17/18 75% .18 6/8 Faixa etária 1:10 95% .64 19/20 100% # 13/13 Faixa etária 1:11 93% .57 28/30 97% .67 30/31 Faixa etária 2:0 78% .24 7/9 91% .38 10/11 Faixa etária 2:2 82% .33 9/11 95% .55 19/20 Faixa etária 2:4 100% # 15/15 89% .39 8/9 Faixa etária 2:6 100% # 18/18 100% # 15/15 Faixa etária 2:8 92% .70 12/13 100% # 24/24
Input .93 Significância .580 * sem ocorrência # knockout
Analisando a Tabela 10, verifica-se que a partir de 1 ano e 9 meses o
/f/ está estabelecido na posição de onset absoluto. Ocorre uma queda, tanto
no percentual quanto no peso, nas faixas 2:0 e 2:2, e o percentual fica abaixo
dos 85%.
Nas duas faixas seguintes, 2:4 e 2:6, o percentual é de 100% de
produção correta, com freqüências de 15 e 18 produções, respectivamente.
Na posição de onset medial, a estabilidade na produção ocorre a partir
da faixa 1:10. As quedas que ocorrem após esta faixa não ficam abaixo dos
85%, que é o critério estabelecido para esta pesquisa, embora em termos de
peso a queda seja significativa.
Destaca-se aqui que, quando se trata de idade de aquisição, o percentual
é importante e tem que ser usado para comparações com demais trabalhos da
área.
4.1.8.2 Posição na palavra x tonicidade
Tabela 11 – Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade
Posição na palavra Tonicidade Onset absoluto Onset medial
Percentual Peso Freqüência Percentual Peso Freqüência Tônica Ex. faca, café
94% .55 78/83 95% .58 89/94
Pretônica Ex. fogão, diferente
86% .33 51/59 80% .24 8/10
Postônica Ex. garrafa
! ! ! 95% .60 39/41
Pré-pretônica Ex. figurinha
60% .10 3/5 * * *
Input .93 Significância .093 * sem ocorrência ! impossível na língua
Através da Tabela 11, verifica-se que, na posição de onset absoluto, a
sílaba tônica é a que apresenta maior influência, .55. A pretônica apresenta .33.
Para a posição de onset medial, a postônica apresenta o mesmo
percentual da tônica, 95%, mas a postônica tem o peso um pouco maior, .60,
enquanto que a tônica apresenta .58.
4.1.8.3 Tonicidade x número de sílabas
Tabela 12 - Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas
Número de sílabas Tonicidade Monossílaba Dissílaba Trissílaba Polissílaba
Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq Tônica Ex. foi, faca, garfinho, telefone
80% .22 8/10 96% .64 100/104 92% .45 23/25 95% .56 36/38
Pretônica Ex. fechar, formiga, telefonar
! ! ! 92% .44 33/36 72% .15 18/25 100% # 8/8
Postônica Ex. garfo, girafa
! ! ! 94% .51 15/16 96% .63 24/25 * * *
Pré-pretônica Ex. formiguinha
! ! ! ! ! ! * * * 60% .10 3/5
Input .94 Significância .100 * sem ocorrência # knockout ! impossível na língua
Analisando a Tabela 12 referente ao cruzamento da variável tonicidade
com o número de sílabas, vê-se que as palavras monossílabas são tônicas por
natureza.
Nas dissílabas, o que mostra-se como favorecedor é a tônica, com .64,
seguido pela postônica, com .51.
A postônica é a mais favorecedora para as palavras trissílabas (.63). Em
segundo lugar tem-se a tônica (.45).
Nas palavras polissílabas, a pretônica apresenta 100% de produção
correta, mas apenas 8 ocorrências.
A tônica apresenta .56, com uma freqüência de 36 produções corretas
em 38 possibilidades.
4.2 FONEMA /v/
As variáveis selecionadas pelo Programa VARBRUL como relevantes
no processo de aquisição da fricativa /v/ foram faixa etária e número de
sílabas. Serão apresentados os resultados dos demais variáveis, conforme
explicitado no item 4.1.
4.2.1 FAIXA ETÁRIA
Em relação ao fonema /v/, a análise dos dados também passou por
duas etapas. Na primeira, com o objetivo de estabelecer uma linha
desenvolvimental de aquisição do fonema /v/, obteve-se os resultados de cada
faixa etária estabelecida para esta pesquisa. Na segunda etapa amalgamaram-se
algumas faixas etárias.
4.2.1.1 Faixas etárias simples
Tabela 13 – Produção do fonema /v/ quanto à faixa etária
Faixa etária Peso Percentual Freqüência Faixa etária 1:0 * * * Faixa etária 1:1 .05 33% 1/3 Faixa etária 1:2 * * * Faixa etária 1:3 .19 67% 4/6 Faixa etária 1:4 .09 50% 2/2 Faixa etária 1:5 # 100% 5/5 Faixa etária 1:6 .19 71% 15/21 Faixa etária 1:7 .17 68% 13/19 Faixa etária 1:8 # 100% 29/29 Faixa etária 1:9 .69 96% 44/46 Faixa etária 1:10 .59 93% 67/72 Faixa etária 1:11 .60 94% 64/68 Faixa etária 2:0 .24 74% 20/27 Faixa etária 2:2 .35 84% 38/45 Faixa etária 2:4 .79 97% 32/33 Faixa etária 2:6 .41 86% 24/28 Faixa etária 2:8 .62 93% 28/30
Input .92 Significância .050 # knockout * sem possibilidade de ocorrência
Analisando a Tabela 13, nota-se que na faixa etária 1:1 há apenas 3
possibilidades de ocorrência do fonema /v/. Essa baixa freqüência segue até a
faixa etária 1:5.
A partir da faixa etária 1:6 aumenta o número de possibilidades de
ocorrência, mas o peso relativo permanece baixo: faixa etária 1:6 (.16), faixa
etária 1:7 (.13).
Na faixa 1:8 obteve-se 100% de produção correta em 29 palavras.
Na faixa etária seguinte (1:9), o peso é elevado (.69), apresentando uma
freqüência de 44 produções corretas em 46 possibilidades de ocorrência.
O peso mantém-se elevado nas faixas 1:10 (.59) e 1:11 (.60).
Na faixa etária 2:0 há uma queda acentuada do peso (.24) e também das
possibilidades de ocorrência (27 palavras).
Aos 2:2 o peso ainda permanece baixo (.35), voltando a subir aos 2:4
(.79).
Aos 2:6 vê-se nova queda (.41), mas aos 2:8 o peso sobe para .62.
Na análise da porcentagem nota-se que até 1:7 os valores são baixos.
Na faixa etária 1:5 obtém-se 100% de produção correta, mas o número de
palavras é de apenas 5.
Da faixa etária 1:8 até a 1:11 o percentual se mantém acima dos 85%.
Na faixa 2:0 há uma queda, e o percentual atinge 74%.
Na faixa 2:2, a porcentagem se mantém abaixo do critério estabelecido,
ficando com 84%.
Pode-se dizer que a partir de 1:8 o fonema /v/ encontra-se adquirido,
seguindo os critérios adotados nesta pesquisa. Há uma queda nas faixas 2:0 e
2:2, justamente evidenciando a dificuldade do /v/, que é sonoro, em relação
ao /f/, surdo.
FIGURA 34 – Gráfico da produção de /v/
Analisando-se a Figura 34, observa-se que o processo de aquisição do
fonema /v/ não é linear.
4.2.1.2 Faixas etárias amalgamadas
As faixas etárias foram amalgamadas seguindo o critério de peso
produção de /v/
0102030405060708090100
1.1 1.4 1.6 1.8 1.10 2.0 2.4 2.8
faixas etárias
percentuais
Seqüência1
relativo próximo.
As primeiras faixas etárias, com pesos baixos, foram amalgamadas
formando o GE1.
No GE2, foram amalgamadas as faixas seguintes em que os pesos
estavam altos. As próximas faixas, onde houve queda no peso, foram
amalgamadas formando o GE3.
No GE4, amalgamaram-se faixas com pesos altos e a faixa 2:6 que,
apesar de o peso estar mais abaixo que as demais, o percentual é acima dos
85%.
Tabela 14 – Produção do fonema /v/ quanto à faixa etária amalgamada
Grupo etário Peso Percentual Freqüência Grupo Etário 1 (1:1, 1:3, 1:4, 1:5, 1:6, 1:7)
.16 69% 40/58
Grupo Etário 2 (1:8, 1:9, 1:10, 1:11)
.63 95% 204/215
Grupo Etário 3 (2:0, 2:2)
.35 81% 58/72
Grupo Etário 4 (2:4, 2:6, 2:8)
.59 92% 84/91
Input .91 Significância .002
Após a amalgamação, vê-se que no Grupo Etário 1 o peso (.16) e a
porcentagem (69%) são baixos.
Há um aumento no GE2, onde o peso passa a ser de .63, e a
porcentagem atinge os 95%.
No GE3, nota-se uma queda, tanto no peso (.35) quanto no percentual
(81%).
O GE4 apresenta peso de .59 e percentual de 92%.
Conforme mencionado no item anterior, vê-se que, a partir de 1:8, o
fonema /v/ encontra-se adquirido, ocorrendo uma queda aos 2:0 e aos 2:2,
voltando a se estabelecer a partir dos 2:4.
FIGURA 35 – Gráfico da produção do fonema /v/quanto à faixa
etária amalgamada
4.2.2 NÚMERO DE SÍLABAS
Tabela 15 - Produção do fonema /v/ quanto ao número de sílabas
Faixas etárias amalgamadas
0102030405060708090100
GE 1 GE2 GE3 GE4
grupos etários
percentuais
Seqüência1
Número de sílabas
Peso Percentual Freqüência Exemplos
Trissílaba .53 88% 138/156 /es’kova/ Dissílaba .53 88% 157/178 /’vaka/ Polissílaba .28 77% 37/48 /trave’seyru/ Monossílaba # 100% 54/54 /’vay/
Input .91 Significância .002 # knockout
As palavras monossílabas mostraram-se favorecedoras para a produção
do fonema /v/ com 100% de produção correta em 54 possibilidades de
ocorrência.
As trissílabas e as dissílabas obtiveram o mesmo peso (.53), ambas com
freqüências altas: 156 possibilidades de ocorrência para palavras com três
sílabas e 178 para palavras com duas sílabas.
As palavras polissílabas são as menos favorecedoras (.28) para o
fonema /v/, com 48 possibilidades de ocorrência.
4.2.3 TONICIDADE
Tabela 16 - Produção do fonema /v/ quanto à tonicidade
Tonicidade Peso Percentual Freqüência Exemplos Tônica .60 92% 193/209 /vo’vo/ Postônica .51 90% 54/60 /’šave/ Pretônica .40 84% 129/153 /avi’ãw/ Pré-pretônica .20 71% 10/14 /arvore’ziña/
Input .92 Significância .032
Conforme a Tabela 16, vê-se que a sílaba tônica é a mais favorável à
produção do fonema /v/ (.60), com uma freqüência alta, 209 palavras.
A postônica apresenta .51 mas uma freqüência menor, apenas 60
palavras. As pretônicas, com uma freqüência alta, 153 possibilidades de
ocorrência, apresentam um peso baixo (.40), enquanto que as sílabas pré-
pretônicas apresentam uma freqüência baixa, 14 palavras, e um peso muito
baixo, .20.
4.2.4 CONTEXTO PRECEDENTE
Tabela 17 - Produção do fonema /v/ quanto ao contexto precedente Contexto precedente
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/o/ .66 93% 54/58 /’ovo/ /r/ .63 94% 16/17 /ser’veža/ /i/ .54 88% 7/8 /aniver’saryu/ Vazio .52 90% 171/190 /vio’lãw/ /a/ .47 88% 103/117 /ka’valo/ /u/ .24 78% 7/9 /’šuva/ /e/ .19 68% 19/28 /Re’vista/ /ε/ # 100% 1/1 /’lεva/ /⊃/ # 100% 2/2 /es’c⊃va/ /w/ # 100% 5/5 /ow’vido/ /s/ # 100% 1/1 /esvazi’ow/ Input .92 Significância .049 # knockout
Conforme a Tabela acima, percebe-se que a vogal /o/ é a mais
favorecedora à produção do /v/ (.66).
Com .63 temos o /r/, mas convém salientar que a freqüência é mais
baixa se comparado à vogal /o/, apenas 17 palavras.
A vogal /i/ apresenta peso de .54 com apenas 8 possibilidades de
ocorrência.
O contexto vazio foi o que apresentou maior número de possibilidades
de ocorrência (190), mas o peso permaneceu mediano (.52).
O fonema /v/ obteve 100% de produção correta quando precedido
pelas vogais /ε/ e /⊃/, o glide /w/ e a fricativa /s/, mas com freqüências
baixas: 1 possibilidade de ocorrência com a vogal /ε/, 2 possibilidades com a
vogal /⊃/, 5 possibilidades com a coda com o glide /w/ e 1 possibilidade
com a coda com fricativa.
4.2.5 CONTEXTO SEGUINTE
Tabela 18 - Produção do fonema /v/ quanto ao contexto seguinte Contexto seguinte
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/ε/ .69 94% 99/108 /’vεla/ /o/ .62 93% 65/70 /vo’vo/ /a/ .58 92% 99/108 /’vaka/ Vogal nasalizada .55 93% 26/28 /esko’viña/ /i/ .42 85% 94/111 /avi’ãw/ /⊃/ .42 84% 27/32 /’v⊃lta/ /e/ .31 81% 46/57 /’verde/ /u/ # 100% 12/12 /’vulkãw/
Input .92 Significância .192 # knockout
Analisando a Tabela acima, percebe-se que o fonema /v/ obteve 100%
de produção correta quando seguido da vogal /u/, porém a freqüência da
mesma é baixa em relação aos demais contextos: 12 possibilidades de
ocorrência.
A vogal /ε/ apresenta um peso favorecedor, .69, e uma freqüência de
108 palavras. Com peso favorecedor também, temos a vogal /o/ (.62) e a
vogal /a/ (.58).
As vogais nasalizadas obtiveram .55 mas uma freqüência baixa em
relação aos demais contextos, apenas 28 palavras.
4.2.6 POSIÇÃO NA PALAVRA
Tabela 19 - Produção do fonema /v/ quanto à posição na palavra
Posição na palavra
Peso Percentual Freqüência Exemplos
Onset medial .53 88% 217/248 /ka’valo/ Onset absoluto .47 90% 169/188 /ver’meλo/
Input .91 Significância .209
O onset medial, com .53, é o mais favorecedor à produção correta da
fricativa /v/.
O onset absoluto obteve peso de .47. É interessante notar que, para o
onset medial, obteve-se 248 palavras; já para o onset absoluto, o número de
possibilidades foi de 188.
4.2.7 OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES
A fricativa /v/ apresentou 436 possibilidades de ocorrência neste corpus,
sendo produzida corretamente 386 vezes.
Nas 50 palavras em que não houve a realização do /v/, encontram-se 5
omissões do segmento (1% do corpus); 10 omissões da sílaba que continha o
fonema em questão (3%); 8 substituições de traço sonoro (2%); 18
substituições envolvendo o traço contínuo (4%); 9 substituições por
semivogais (2%), conforme a Tabela 20, abaixo:
Tabela 20 - Omissões e outras realizações na aquisição do fonema /v/
Ocorrências Porcentagem Exemplos
Omitiu segmento
5 1% Vermelho – [e’metu]
Omitiu sílaba 10 3% Televisão – [tele’zãw] Substituição de [sonoro]
8 2% Sorvete – [‘feči]
Substituição de [contínuo]
18 4% Verde – [‘beĵi]
Substituição de [ponto]
* * *
Substituição por semivogal
9 2% Violão – [wo’lãw]
* sem ocorrência
Amalgamaram-se dados a fim de dar maior consistência aos resultados
obtidos. O resultado pode ser visto na Tabela 21.
Tabela 21 - Omissões e outras realizações amalgamadas na produção de /v/
Fonema /v/
Ocorrências Porcentagem
Omissões 15 4% Substituições 26 6% Substituições envolvendo traços de raiz
9 2%
Ocorreram 15 omissões (4%); 26 substituições (6%) e 9 substituições
envolvendo traços de raiz (2%).
4.2.8 CRUZAMENTOS
Para o fonema /v/ também realizaram-se cruzamentos entre as
variáveis lingüísticas e a variável extra-lingüística.
Serão apresentados os resultados dos cruzamentos selecionados pelo
Programa VARBRUL e aqueles que a autora desta pesquisa julga procedentes.
4.2.8.1 Posição na palavra x faixa etária
Tabela 22 - Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa etária
Posição na palavra Faixa etária Onset absoluto Onset medial
Percentual Peso Freqüência Percentual Peso Freqüência Faixa etária 1:0 * * * * * * Faixa etária 1:1 0% # 0/1 50% .09 1/2 Faixa etária 1:2 * * * * * * Faixa etária 1:3 100% # 2/2 50% .14 2/4 Faixa etária 1:4 50% .14 1/2 50% .06 1/2 Faixa etária 1:5 100% # 2/2 100% # 3/3 Faixa etária 1:6 70% .19 7/10 73% .22 8/11 Faixa etária 1:7 64% .16 7/11 75% .20 6/8 Faixa etária 1:8 100% # 12/12 100% # 17/17 Faixa etária 1:9 100% # 25/25 90% .48 19/21
Faixa etária 1:10 97% .85 35/36 89% .45 32/36 Faixa etária 1:11 92% .51 33/36 97% .76 31/32 Faixa etária 2:0 86% .63 6/7 70% .19 14/20 Faixa etária 2:2 73% .27 11/15 90% .46 27/30 Faixa etária 2:4 100% # 10/10 96% .70 22/23 Faixa etária 2:6 100% # 10/10 78% .25 14/18 Faixa etária 2:8 89% .46 8/9 95% .74 20/21
Input .91 Significância .151 * sem ocorrência
# knockout
Observando a Tabela 22, vê-se que, em posição de onset absoluto, o
/v/ encontra-se estabelecido a partir de 1 ano e 8 meses. Ocorre uma pequena
queda na faixa de 2:0, mas esta queda não é inferior aos 85%.
Aos 2:2 a queda é inferior ao critério estabelecido, atingindo 73%. As
faixas seguintes, 2:4 e 2:6, têm 100% de produção correta, ambas com
freqüências de 10 palavras.
Na posição de onset medial, o /v/ também encontra-se estabelecido na
faixa etária de 1:8. Vê-se uma queda aos 2:0, baixando o percentual de
produção correta para 70%. Aos 2:2, o percentual se eleva para 90%; aos 2:4,
para 96%. Aos 2:6, tem-se outra queda (78%). Aos 2:8 o percentual volta a
subir, atingindo 95% de produções corretas.
4.2.8.2 Posição na palavra x tonicidade
Tabela 23 - Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade
Posição na palavra Tonicidade Onset absoluto Onset medial
Percentual Peso Freqüência Percentual Peso Freqüência Tônica Ex. vaca, cavalo
95% .70 102/107 89% .49 91/102
Pretônica Ex. vassoura, avião
86% .41 59/69 83% .37 70/84
Postônica Ex. chave
! ! ! 90% .51 54/60
Pré-pretônica Ex. vestidinho, arvorezinha
67% .19 8/12 100% # 2/2
Input .90 Significância .027 * sem ocorrência # knockout
! impossível na língua
Este cruzamento foi selecionado pelo Programa VARBRUL como
relevante.
Através da Tabela 23, pode-se afirmar que a sílaba tônica é a mais
favorável na posição de onset absoluto, com .70. A pretônica, na posição de
onset absoluto, apresenta .41.
Na posição de onset medial, a postônica é a mais favorecedora (.51),
seguida pela tônica, (.49). A pré-pretônica apresenta 100% de produção
correta, mas a freqüência é de apenas 2 palavras.
4.2.8.3 Tonicidade x número de sílabas
Tabela 24 – Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas
Número de sílabas Tonicidade Monossílaba Dissílaba Trissílaba Polissílaba
Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq Tônica Ex. vó, vaca, revista, escovinha
100% # 54/54 90% .28 86/96 89% .27 47/53 100% # 6/6
Pretônica Ex. voar, avião, ovelhinha
! ! ! 88% .80 37/42 88% .80 65/74 73% .60 27/37
Postônica Ex. chave, árvore
! ! ! 85% .23 34/40 100%
# 20/20 * * *
Pré-pretônica Ex. ventilar, arvorezinha
! ! ! ! ! ! 67% .69 6/9 80% .82 4/5
Input .90 Significância .010 * sem ocorrência # knockout
! impossível na língua
Este cruzamento foi selecionado pelo Programa VARBRUL como
significativo.
Com relação às palavras monossílabas, pode-se observar, como se sabe,
que são tônicas, com 100% de produções corretas em 54 possibilidades de
ocorrência.
As dissílabas são favorecidas na sílaba pretônica, com .80. A sílaba que
apresentou maior número de ocorrências foi a tônica, com 96 palavras.
A postônica é a mais favorecedora para palavras trissílabas, com 100%
de produção correta em 20 ocorrências. A pretônica apresenta um peso (.80)
muito favorecedor. Também com peso elevado tem-se a pré-pretônica, com
.69.
A sílaba tônica apresenta 100% de produção correta em palavras
polissílabas, mas com apenas 6 ocorrências. A pré-pretônica é a que apresenta
peso mais elevado, .82, novamente com poucas ocorrências, apenas 5.
A pretônica apresenta .60 para palavras polissílabas em 37
possibilidades de produção.
4.3 FONEMA /š/
As variáveis selecionadas pelo Programa VARBRUL como
relevantes no processo de aquisição da fricativa /š/ foram faixa etária e
posição na palavra. Como para os fonemas anteriores, optou-se por expor
os demais resultados encontrados.
4.3.1 FAIXA ETÁRIA
A análise dos dados passou por apenas uma etapa. A fim de se
estabelecer uma linha desenvolvimental de aquisição do fonema /š/, foram
obtidos os resultados de cada faixa etária estabelecida para esta pesquisa.
Não realizaram-se amalgamações devido à discrepância dos valores dos
pesos relativos.
4.3.1.1 Faixas etárias simples
Tabela 25 – Produção do fonema /š/ quanto à faixa etária
Faixa etária Peso Percentual Freqüência Faixa etária 1:0 * * *
Faixa etária 1:1 * * * Faixa etária 1:2 * * * Faixa etária 1:3 .22 50% ½ Faixa etária 1:4 .45 67% 2/3 Faixa etária 1:5 .20 33% 1/3 Faixa etária 1:6 .14 29% 5/17 Faixa etária 1:7 .31 55% 6/11 Faixa etária 1:8 .33 48% 13/27 Faixa etária 1:9 .43 65% 15/23 Faixa etária 1:10 .20 39% 16/41 Faixa etária 1:11 .35 60% 34/57 Faixa etária 2:0 .23 38% 8/21 Faixa etária 2:2 .30 50% 13/26 Faixa etária 2:4 .53 70% 19/27 Faixa etária 2:6 .80 90% 18/20 Faixa etária 2:8 .46 65% 24/37 Faixa etária 2:10 .75 85% 17/20 Faixa etária 3:0 .77 88% 30/34 Faixa etária 3:2 .73 85% 23/27 Faixa etária 3:4 .60 78% 25/32 Faixa etária 3:6 .93 96% 26/27 Faixa etária 3:8 # 100% 17/17 Input .71 Significância .001 * sem ocorrência # knockout
Através da Tabela 25, acima, vê-se que a aquisição do fonema /š/ não é
linear.
Nas primeiras faixas etárias percebe-se que são poucas as possibilidades
de produção: faixa etária 1:3, 2 possibilidades; faixa etária 1:4, 3 possibilidades;
faixa etária 1:5, 3 possibilidades. A partir da faixa etária 1:6 é que este número
aumenta.
Nas faixas 1:6 (.14); 1:7 (.31); 1:8 (.33); 1:9 (.43); 1:10 (.20); 1:11 (.35);
2:0 (.23) e 2:2 (.30), o peso mantém-se muito baixo.
A partir dos 2:4, o peso eleva-se, atingindo .53, e aos 2:6, atinge .80.
Aos 2:8 tem-se uma queda e o peso atinge .46. Eleva-se a partir da faixa
2:10 (.75), atingindo .77 aos 3:0, e .73 aos 3:2.
Aos 3:4 ocorre nova queda (.60). Aos 3:6 constata-se peso favorecedor
(.93), e aos 3:8 ocorre knockout com 100% de produção correta..
Através da porcentagem percebe-se, mais uma vez, que a aquisição do
fonema /š/ não é linear.
O fonema se estabiliza aos 2:6, com 90%. Aos 2:8 há uma queda, e o
percentual cai para 65%.
Nas faixas seguintes, 2:10; 3:0 e 3:2, o percentual se mantém elevado,
com 85%, 88% e 85%, respectivamente.
Na faixa etária 3;4 há uma queda e o percentual atinge 78%.
Aos 3:6, tem-se 96% de produções corretas, e aos 3:8, 100%.
Portanto, pode-se dizer que o /š/ está adquirido a partir dos 2:10.
FIGURA 36 – Gráfico da produção de /š/
4.3.2 POSIÇÃO NA PALAVRA
Tabela 26 – Produção do fonema /š/ quando à posição na palavra
Posição na palavra
Peso Percentual Freqüência Exemplos
Onset medial .60 73% 197/269 /ka’šoRo/ Onset absoluto .37 57% 116/203 /ša’ve/
Input .73 Significância .000
Em relação ao fonema /š/, pode-se perceber, analisando a Tabela 26,
que o onset medial (.60) é o mais favorecedor à produção desta fricativa. O
/š/ em posição de onset medial ocorreu 269 vezes, sendo produzido
corretamente 197 vezes, ou seja, em 73% das vezes. O peso foi de .60.
O /š/ em onset absoluto teve uma freqüência de 203 palavras, sendo
produzido corretamente 116 vezes, apresentando um percentual de 57%, e um
peso de .37.
produção de /š/
0102030405060708090100
1.3 1.5 1.7 1.9 1.11 2.2 2.6 2.1
0 3.2 3.6
faixas etárias
percentuais
Seqüência1
4.3.3 CONTEXTO PRECEDENTE
Tabela 27 – Produção do fonema /š/ quando ao contexto precedente
Contexto Precedente
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/i/ .67 73% 35/48 /’bišo/ /u/ .61 84% 37/44 /’bruša/ /a/ .59 74% 83/112 /bo’Raša/ /e/ .59 67% 41/61 /fe’šou/ Vazio .36 57% 115/201 /šoko’late/ /n/ .34 50% 2/4 /lãn’šãndo/ /o/ # 0% 0/2 /bo’šeša/
Input .73 Significância .000 # knockout
O contexto precedente que mostrou-se mais favorecedor à produção
do /š/ foi a vogal /i/, com peso .67 em 48 possibilidades de ocorrência.
Em segundo lugar tem-se a vogal /u/, com peso de .61 em 44
possibilidades de produção.
A vogal /a/ apresenta .59, em 112 possibilidades de produção.
Em duas possibilidades de ocorrência do fonema /š/ precedido da
vogal /o/ ele não foi produzido corretamente nenhuma vez.
4.3.4 CONTEXTO SEGUINTE
Tabela 28 – Produção do fonema /š/ quando ao contexto seguinte Contexto Seguinte
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/o/ .58 73% 58/79 /ka’šoRo/ /i/ .57 72% 94/130 /’šikara/ /u/ .53 69% 50/72 /’šuva/ /a/ .42 59% 91/155 /’šave/ /e/ .35 52% 13/25 /a’šey/ Vogal nasalizada .34 50% 4/8 /’šãw/ /⊃/ # 100% 3/3 /’š⊃ra/
Input .67 Significância .047 # knockout
A vogal /o/ foi a que mostrou-se mais favorecedora à produção da
fricativa /š/, com peso de .58. A fricativa teve a vogal /o/ como ambiente
seguinte em 79 palavras, sendo produzida corretamente 58 vezes.
A vogal /i/ apresentou peso de .57, em 130 possibilidades de
produção.
Em terceiro lugar, a vogal /u/, com peso de .53 em 72 possibilidades
de produção.
O fonema /š/ apresentou 100% de produções corretas quando
precedido pela vogal /⊃/, mas em apenas 3 possibilidades de produção.
4.3.5 TONICIDADE
Tabela 29 – Produção do fonema /š/ quando à tonicidade Tonicidade Peso Percentual Freqüência Exemplos Postônica .64 76% 103/135 /’bišo/ Tônica .51 67% 143/214 /’šikara/
Pretônica .36 53% 50/95 /ši’nεlo/ Pré-pretônica .28 61% 17/28 /šoko’late/
Input .73 Significância .000
Analisando a Tabela 29 acima, vê-se que a sílaba postônica foi a que
mostrou-se mais favorecedora à produção do fonema /š/, com .64. A
postônica ocorreu 135 vezes e foi produzida corretamente 103 vezes.
A sílaba tônica apresentou um peso de .51 em 214 possibilidades de
produção.
Como menos favorecedoras têm-se a pretônica(.36) e a pré-pretônica
(.28), com 95 e 28 possibilidades de produção, respectivamente.
4.3.6 NÚMERO DE SÍLABAS
Tabela 30 – Produção do fonema /š/ quando ao número de sílabas
Número de sílabas
Peso Porcentagem Freqüência Exemplos
Polissílaba .56 72% 33/46 /šoko’late/ Trissílaba .53 69% 113/169 /’šikara/ Dissílaba .48 64% 161/250 /’šave/ Monossílaba .30 46% 6/13 /’ša/
Input .67 Significância .274
As palavras polissílabas mostraram-se mais favorecedoras à produção
do /š/, com peso de .56.
As trissílabas apresentaram um peso de .53, sendo produzidas
corretamente 113 vezes em 169 possibilidades.
As dissílabas são as que apresentaram o maior número de
possibilidades de ocorrência, 250, e foram produzidas corretamente 161 vezes,
com peso de .48.
Como menos favorecedoras têm-se as monossílabas, com peso de .30
em apenas 13 possibilidades de produção.
4.3.7 OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES
Tabela 31 - Omissões e outras realizações na aquisição do fonema /š/
Ocorrências Porcentagem Exemplos Omitiu segmento
13 4% chinelo – [i’nεlu]
Omitiu sílaba 9 3% chapéu – [‘pε] Substituição de [anterior]
89 22% chapéu – [sa’pεw]
Substituição de [sonoro]
4 1% cheia – [‘žeya]
Substituição de [contínuo]
38 11% chinelo – [ki’nεlu]
Substituição de [ponto]
6 2% chave – [‘fave]
Através dos dados da Tabela 31, conclui-se que a substituição pelo
traço [+anterior] é responsável pelo maior número de casos de não-realização
correta na produção do /š/. Dos 36% de não-realização correta do fonema
/š/, 22% devem-se à substituição do traço [- anterior] pelo [+anterior].
Dentre as substituições também ocorreram: substituição do valor do
traço [sonoro] (1%); substituição envolvendo o traço [contínuo] (11%); e
substituição de ponto (2%).
Foram constatados também casos de omissão do segmento (4%), e de
omissão da sílaba portadora do segmento (3%).
A fim de se trabalhar com maior número de dados, foram realizadas
amalgamações, como mostra a Tabela 32 abaixo.
Tabela 32 - Omissões e outras realizações amalgamadas na produção de /š/
Fonema /š/ Ocorrências Porcentagem
Omissões 22 7% Substituição de [anterior]
89 22%
Substituições 10 3% Substituição de [contínuo]
38 11%
Após a amalgamação, têm-se 22 casos de omissões (7% do corpus); 89
substituições envolvendo o traço [anterior] (22%); 38 substituições
envolvendo o traço [contínuo] (11%); e 10 substituições (3%), que envolvem
os traços [sonoro] e de ponto de articulação.
4.3.8 CRUZAMENTOS
A fim de verificar a influência das variáveis envolvidas na produção do
fonema /š/, fez-se cruzamentos entre as variáveis lingüísticas e variável extra-
lingüística.
Serão apresentados os resultados dos cruzamentos que foram
selecionados pelo Programa VARBRUL e os que a autora desta pesquisa
julgou interessantes.
4.3.8.1 Posição na palavra x faixa etária
Devido ao grande número de variáveis envolvidas neste cruzamento,
não foi possível realizar uma rodada no Programa VARBRUL para obter os
pesos relativos. Conforme já mencionado, quando fala-se em idade de
aquisição nesta pesquisa, utiliza-se o critério de porcentagem que está
apresentado a seguir.
Tabela 33 - Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa etária
Posição na palavra Faixa etária Onset absoluto Onset medial
Percentual Freqüência Percentual Freqüência Faixa etária 1:0 * * * * Faixa etária 1:1 * * * * Faixa etária 1:2 * * * * Faixa etária 1:3 * * 50% 1/2 Faixa etária 1:4 * * 60% 2/3 Faixa etária 1:5 0% 0/1 50% 1/2 Faixa etária 1:6 17% 1/6 36% 4/11 Faixa etária 1:7 0% 0/3 75% 6/8 Faixa etária 1:8 39% 7/18 67% 6/9 Faixa etária 1:9 63% 5/8 67% 10/15 Faixa etária 1:10 13% 2/16 56% 14/25 Faixa etária 1:11 43% 6/14 65% 28/43 Faixa etária 2:0 31% 4/13 50% 4/8 Faixa etária 2:2 25% 3/12 71% 10/14 Faixa etária 2:4 54% 7/13 86% 12/14 Faixa etária 2:6 100% 8/8 83% 10/12 Faixa etária 2:8 67% 12/18 63% 12/19 Faixa etária 2:10 83% 10/12 88% 7/8 Faixa etária 3:0 86% 12/14 90% 18/20 Faixa etária 3:2 77% 10/13 93% 13/14 Faixa etária 3:4 67% 8/4 85% 17/20 Faixa etária 3:6 100% 12/12 93% 14/15 Faixa etária 3:8 100% 8/8 100% 9/9
* sem ocorrência # knockout
Analisando a Tabela 33, verifica-se que a partir de 3 anos e 6 meses o
/š/ está estabelecido na posição de onset absoluto. Antes desta faixa o /š/
atinge 100% de produção correta aos 2 anos e 6 meses, mas aos 2:8 cai para
67% e aos 2:10 fica em 83%.
O percentual fica acima dos 85% na faixa 3:0, mas novamente há uma
queda na faixa 3:2, onde o percentual fica em 77%. Aos 3:4 cai ainda mais, fica
em 67%.
Na posição de onset medial, a estabilidade na produção ocorre a partir
da faixa 2:10, com 88% de produção correta. As quedas que ocorrem após esta
faixa não ficam abaixo dos 85%, que é o critério estabelecido para esta
pesquisa.
4.3.8.2 Posição na palavra x tonicidade
Tabela 34 - Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade
Posição na palavra Tonicidade Onset absoluto Onset medial
Percentual Peso Freqüência Percentual Peso Freqüência Tônica Ex. chave, achou
60% .43 58/96 72% .56 85/118
Pretônica Ex. chapéu, cachorrinho
52% .35 40/77 56% .39 9/16
Postônica Ex. bicho
! ! ! 76% .61 103/135
Pré-pretônica Ex. chocolate
61% .43 17/28 * * *
Input .67 Significância .006 ! impossível na língua * sem ocorrência
Através da Tabela 34, verifica-se que, na posição de onset absoluto, as
sílabas tônica e pré-pretônica são as que apresentam maior influência, ambas
com peso de .43. A pretônica apresenta .35.
Para a posição de onset medial, a postônica é a mais favorecedora com
.61. A tônica apresenta peso de .56 e a pretônica .39.
4.3.8.3 Tonicidade x número de sílabas
Tabela 35 - Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas
Número de sílabas Tonicidade Monossílaba Dissílaba Trissílaba Polissílaba
Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq Tônica Ex. chá, chave, xícara, bolachinha
46% .29 6/13 61% .43 59/96 72% .55 66/92 92% .85 12/13
Pretônica Ex. chapéu, chinelo, cachorrinho
! ! 35% .21 14/40 66% .48 29/44 67% .49 6/9
Postônica Ex. bicho, borracha
! ! 78% .63 87/112 73% .56 16/22 * * *
Pré-pretônica Ex. chafariz, chocolate
! ! ! ! ! 40% .24 2/5 65% .47 15/23
Input .68 Significância .085 * sem ocorrência ! impossível na língua
Analisando a Tabela 35, vê-se que as monossílabas (sempre tônicas)
apresentam peso de .29.
Nas dissílabas, o que mostra-se como mais favorecedor é a postônica,
com .63, seguida pela sílaba tônica, com .43.
A postônica é a mais favorecedora para as palavras trissílabas (.56). Em
segundo lugar tem-se a tônica (.55).
Nas palavras polissílabas, a tônica apresenta-se como a mais
favorecedora, com .85 e uma freqüência de 12 produções corretas em 13
possibilidades.
A pretônica apresenta .49 e a pré-pretônica peso de .47.
4.4 FONEMA /ž/
As variáveis selecionadas pelo Programa VARBRUL como relevantes
no processo de aquisição da fricativa /ž/ foram a faixa etária e o contexto
seguinte. Como nos demais fonemas, optou-se por expor os demais resultados
encontrados em função de um dos objetivos da pesquisa, que é o de trazer
subsídios para a terapia fonoaudiológica.
4.4.1 FAIXA ETÁRIA
A análise dos dados do fonema /ž/, quanto à variável faixa etária, da
mesma forma que para o fonema /š/, foi realizada em uma etapa. Foram
obtidos os resultados de cada faixa etária estabelecida para esta pesquisa, não
realizando-se amalgamações devido aos valores distintos dos pesos relativos.
4.4.1.1 Faixas etárias simples
Tabela 36 – Produção do fonema /ž/ quanto à faixa etária
Faixa etária Peso Percentual Freqüência Faixa etária 1:1 * * * Faixa etária 1:2 * * * Faixa etária 1:3 * * * Faixa etária 1:4 # 100% 1/1 Faixa etária 1:5 * * * Faixa etária 1:6 .12 45% 5/11 Faixa etária 1:7 # 0% 0/2 Faixa etária 1:8 .14 40% 2/5 Faixa etária 1:9 .25 44% 4/9 Faixa etária 1:10 .16 33% 3/9 Faixa etária 1:11 .21 46% 16/35 Faixa etária 2:0 .40 67% 10/15 Faixa etária 2:2 .27 52% 12/23 Faixa etária 2:4 .33 61% 17/28 Faixa etária 2:6 .76 89% 17/19 Faixa etária 2:8 .86 94% 17/18 Faixa etária 2:10 .56 79% 15/19 Faixa etária 3:0 .57 79% 26/33 Faixa etária 3:2 .66 85% 28/33 Faixa etária 3:4 .62 81% 17/21 Faixa etária 3:6 # 100% 26/26 Faixa etária 3:8 .90 95% 21/22
Input .76 Significância .014 * sem possibilidade de ocorrência # knockout
Através da Tabela 36, observa-se que os pesos relativos mostram-se
favoráveis à produção da fricativa /ž/ nas faixas 2:6, 2:8, 3:2, 3:4 e 3:8.
É interessante observar que até a faixa 1:6 praticamente não há
possibilidades de ocorrência deste fonema. Da faixa etária 1:6 até a faixa etária
1:10, a freqüência de palavras é muito baixa. A partir da faixa 1:11 é que este
valor aumenta.
Nas faixas 1:11 (.21), 2:0 (.40), 2:2 (.27) e 2:4 (.33) o peso ainda é
bastante baixo.
Nas faixas 2:6 (.76) e 2:8 (.86) tem-se um aumento do peso, indicando
que o segmento está entrando em fase de estabilização.
Nas faixas 2:10 (.56) e 3:0 (.57) há uma queda e o peso permanece em
um estágio neutro.
Nas faixas 3:2 (.66), 3:4 (.62) e 3:8 (.90) o peso é mais elevado e mostra-
se como favorecedor à produção da fricativa. Podendo considerar-se então,
que o /ž/ está adquirido aos 2:6 anos.
Analisando a Tabela 36 através do percentual, vê-se que o segmento
começa a se estabelecer a partir dos 2:6 (89%), atingindo 94% aos 2:8. Aos
2:10 e aos 3:0 o percentual tem uma queda, atingindo 79% de produções
corretas. Na faixa seguinte, 3:2, atinge 85%, ocorrendo uma pequena queda na
faixa 3:4, onde o percentual fica em 81%.
As duas faixas que seguem, 3:6 e 3:8, apresentam percentuais de 100%
e 95%, respectivamente. Portanto, com 2:6 anos o fonema /ž/ encontra-se
adquirido.
Na Figura 37, observa-se, através do percentual, o processo de
aquisição do fonema /ž/. Verifica-se que a aquisição não é totalmente linear,
conforme já mencionado para as outras fricativas.
FIGURA 37 – Gráfico da produção de /ž/
4.4.2 CONTEXTO SEGUINTE
Tabela 37 – Produção do fonema /ž/ quando ao contexto seguinte
Contexto Seguinte
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/u/ .70 73% 8/11 /’žura/ /i/ .63 78% 60/77 /ži’rafa/ /e/ .51 79% 42/53 /žela’deyra/ /a/ .49 74% 90/122 /’suža/ /o/ .31 59% 24/41 /žor’nal/ Vogal nasalizada .31 45% 10/22 /fey’žãw/ /ε/ # 100% 2/2 /tižε’liña/ /⊃/ # 100% 1/1 /’ž⊃ya/ Input .80 Significância .034 # knockout
Analisando a variável contexto seguinte, percebe-se que a vogal mais
favorecedora à produção de /ž/ é a vogal /u/ (.70).
Também favorecedora é a vogal /i/, com peso de .63. É interessante
ressaltar que a freqüência de possibilidades da vogal /i/ é bem maior do que a
da vogal /u/, 77 contra 11, respectivamente.
produção de /z/
0102030405060708090100
1.4 1.7 1.9 1.11 2.2 2.6 2.1
0 3.2 3.6
faixas etárias
percentuais
Seqüência1
A vogal /ε/e a vogal /⊃/ apresentaram 100% de produção correta,
mas com freqüências muito baixas: 2 produções para o /ε/ e apenas 1
produção para o /⊃/.
4.4.3 POSIÇÃO NA PALAVRA Tabela 38 – Produção do fonema /ž/ quando à posição na palavra
Posição na palavra
Peso Percentual Freqüência Exemplos
Onset absoluto .57 75% 127/170 /žela’deyra/ Onset medial .43 69% 110/159 /Re’l⊃žyu/
Input .80 Significância .083
Em relação à posição na palavra, o onset absoluto mostrou-se mais
favorecedor (.57) à produção do que o onset medial (.43).
O onset absoluto teve 170 possibilidades de ocorrência, enquanto que o
onset medial teve 159.
4.4.4 CONTEXTO PRECEDENTE Tabela 39 – Produção do fonema /ž/ quando ao contexto precedente Contexto Precedente
Peso Percentual Freqüência Exemplos
/n/ .71 87% 33/38 /la’rãnža/ /⊃/ .57 78% 39/50 /Re’l⊃žyu/ Vazio .50 74% 128/174 /žela’deyra/ /e/ .35 59% 19/32 /i’greža/ /u/ .31 55% 6/11 /’suža/ /i/ .30 53% 8/15 /Reliži’ãw /a/ .27 50% 3/6 /vi’ažen/ /ε/ .27 50% 1/2 /ko’lεžyu/ /o/ # 0% 0/1 /’ože/
Input .74 Significância .054 # knockout
Quanto à variável contexto precedente, o contexto que mostrou-se
mais favorecedor à produção do /ž/ foi a consoante nasal /n/, com .71, o que
significa estrutura silábica CVC, ou seja, a coda nasal precedendo o fonema
/ž/.
Também favorecedora é a vogal /⊃/, com peso de .57.
O contexto precedente vazio foi o que obteve maior freqüência, 174
possibilidades, mas o peso manteve-se neutro (.50).
As vogais menos favorecedoras neste ambiente são o /a/ e o /ε/,
ambas com pesos de .27 em freqüências muito baixas. A vogal /a/ apresentou
uma freqüência de 6 palavras, e a vogal /ε/ apresentou apenas duas
possibilidades de ocorrência.
É interessante notar que a vogal /o/, como contexto precedente ao
fonema /ž/, ocorreu apenas uma vez.
4.4.5 TONICIDADE
Tabela 40 – Produção do fonema /ž/ quando à tonicidade
Tonicidade Peso Percentual Freqüência Exemplos Pretônica .56 77% 75/97 /ži’rafa/ Postônica .51 73% 84/115 /’beyžo/ Pre-pretônica .50 72% 52/72 /žaka’rε/ Tônica .35 59% 26/44 /’žura/ Input .73 Significância .187
A sílaba que mostrou-se mais favorecedora à produção do /ž/ foi a
pretônica, com .56 em 97 possibilidades de ocorrência.
Em segundo lugar vê-se a postônica, com .51 de peso e 115
possibilidades de produção.
É interessante notar que a sílaba que mostrou-se como menos
favorecedora à produção desta fricativa foi a sílaba tônica, com peso de .35,
sendo produzida corretamente 26 vezes em 44 possibilidades.
4.4.6 NÚMERO DE SÍLABAS
Tabela 41 – Produção do fonema /ž/ quando ao número de sílabas
Número de sílabas
Peso Percentual Freqüência Exemplos
Trissílaba .56 77% 146/190 /želado/ Polissílaba .51 74% 39/53 /diri’žindo/ Dissílaba .38 62% 50/81 /žor’nal/ Monossílaba .20 40% 2/5 /’ža/
Input .73 Significância .039
A palavra trissílaba mostrou-se mais favorecedora à produção correta
de /ž/(.56). Em segundo lugar tem-se a polissílaba (.51).
A dissílaba apresentou peso de .38, e a monossílaba, a menos
favorecedora, .20.
É interessante notar que a trissílaba obteve 190 possibilidades de
ocorrência, a polissílaba 53, a dissílaba 81 e a monossílaba apenas 5 palavras.
4.4.7 Omissões e outras realizações
Tabela 42 - Omissões e outras realizações na aquisição do fonema /ž/
Ocorrências Porcentagem Exemplos Omitiu segmento
9 4% geladeira – [ela’dela]
Omitiu sílaba 9 4% geladeira – [la’dela] Substituição de [anterior]
52 18% jacaré – [zaka’rε]
Substituição de [sonoro]
3 1% queijo – [‘kešu]
Substituição de [contínuo]
13 5% jogar – [do’ga]
Substituição de [ponto]
6 2% jacaré – [vaka’lε]
Através da Tabela 42 acima, constata-se que as crianças do corpus
tendem a realizar substituições com o /ž/ quando não conseguem produzi-lo
corretamente; foram realizadas 52 substituições envolvendo o traço [anterior]
(18%); 3 substituições do traço [sonoro] (1%); 13 substituições envolvendo o
traço [contínuo] (5%) e 6 substituições de ponto (2%).
Ocorreram 9 omissões do segmento (4%) e 9 omissões da sílaba
portadora do /ž/ (4%).
Novamente foram realizadas amalgamações. Os resultados podem ser vistos na Tabela 43 abaixo.
Tabela 43 - Omissões e outras realizações amalgamadas na produção de /ž/
Fonema /ž/ Ocorrências Porcentagem
Omissões 18 7% Substituição de [anterior]
52 18%
Substituições 9 4% Substituição de [contínuo]
13 5%
As omissões representam 7% do corpus; as substituições do valor do
traço [anterior] correspondem a 18%; as substituições envolvendo o traço
contínuo, 5%; e outras substituições([soante] e ponto), 4%.
4.4.8 CRUZAMENTOS
Como para os demais fonemas, realizaram-se cruzamentos entre as
variáveis lingüísticas e a variável extra-lingüística.
Serão apresentados os resultados dos cruzamentos selecionados pelo
Programa VARBRUL e aqueles que a autora julga procedentes.
4.4.8.1 Posição na palavra x faixa etária
Neste cruzamento não foi possível obter o peso relativo devido ao
grande número de faixas etárias. Mas é importante lembrar que nesta pesquisa,
para falar em idade de aquisição, sempre considerou-se o percentual para
possíveis comparações com demais trabalhos da área. Os resultados
encontram-se na Tabela 44.
Tabela 44 - Cruzamento dos fatores posição na palavra e faixa etária
Posição na palavra Faixa etária Onset absoluto Onset medial
Percentual Freqüência Percentual Freqüência Faixa etária 1:0 * * * * Faixa etária 1:1 * * * * Faixa etária 1:2 * * * * Faixa etária 1:3 * * * * Faixa etária 1:4 100% 1/1 * * Faixa etária 1:5 * * * * Faixa etária 1:6 33% 1/3 50% 4/8 Faixa etária 1:7 0% 0/1 0% 0/1 Faixa etária 1:8 0% 0/2 67% 2/3 Faixa etária 1:9 40% 2/5 50% 2/4 Faixa etária 1:10 33% 1/3 33% 2/6 Faixa etária 1:11 55% 6/11 42% 10/24 Faixa etária 2:0 50% 3/6 78% 7/9 Faixa etária 2:2 38% 6/16 86% 6/7 Faixa etária 2:4 63% 10/16 58% 7/12 Faixa etária 2:6 100% 10/10 78% 7/9 Faixa etária 2:8 91% 10/11 100% 7/7 Faixa etária 2:10 75% 6/8 82% 9/2 Faixa etária 3:0 84% 16/19 71% 10/14 Faixa etária 3:2 100% 19/19 64% 9/14 Faixa etária 3:4 86% 12/14 71% 5/7 Faixa etária 3:6 100% 12/12 100% 14/14 Faixa etária 3:8 92% 12/13 100% 9/9
* sem ocorrência # knockout
Através da Tabela 44 acima, vê-se que, em posição de onset absoluto, o
/ž/ encontra-se adquirido a partir de 2 anos e 6 meses. Ocorre uma queda nas
faixas 2:10 e 3:0, em que o percentual fica abaixo dos 85%. A partir da faixa
3:2, onde obtém-se 100% de produções corretas, o percentual se mantém
acima dos 85%.
Na posição de onset medial, o /ž/ só é adquirido aos 3 anos e 6 meses,
ou seja um ano depois.
4.4.8.2 Posição na palavra x tonicidade
Tabela 45 - Cruzamento dos fatores posição na palavra e tonicidade
Posição na palavra Tonicidade Onset absoluto Onset medial
Percentual Peso Freqüência Percentual Peso Freqüência Tônica Ex. jura, ajuda
65% .67 11/17 56% .49 15/27
Pretônica Ex. girafa, queijo
80% .62 66/83 64% .22 9/14
Postônica Ex. sujo
! ! ! 73% .49 84/115
Pré-pretônica Ex. jacaré, refrigerador
72% .41 50/69 67% .15 2/3
Input .77 Significância .071 ! impossível na língua
Através da Tabela 45, pode-se afirmar que a sílaba tônica é a mais
favorável em posição de onset absoluto, com peso de .67. Com peso de .62 vê-
se a pretônica.
Na posição de onset medial, a postônica e a tônica apresentam o
mesmo peso, .49. Destaca-se que a postônica apresenta 115 possibilidades de
produção, enquanto que a tônica apresenta somente 27 palavras.
4.4.8.3 Tonicidade x número de sílabas
Tabela 46 - Cruzamento dos fatores tonicidade e número de sílabas
Número de sílabas
Tonicidade Monossílaba Dissílaba Trissílaba Polissílaba Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq Perc Peso Freq
Tônica Ex. já, jura, ajuda, laranjinha
40% .14 2/5 54% .46 13/24 80% .54 8/10 60% .41 3/5
Pretônica Ex. jornal, gelado, religião
! ! ! 74% .85 28/38 80% .52 41/51 75% .49 6/8
Postônica Ex. beijo, colégio
! ! ! 47% .24 9/19 78% .48 75/96 * * *
Pré-pretônica Ex. jacaré, joaninha
! ! ! ! ! ! 69% .35 22/32 75% .48 30/40
Input .74 Significância .595 * sem ocorrência ! impossível na língua
Para as palavras monossílabas, que são tônicas, a freqüência foi de
apenas 5 palavras, atingindo um peso de .14.
As dissílabas são favorecidas na pretônica, com peso de .85.
A tônica é a mais favorecedora para as palavras trissílabas, com peso de
.54. A postônica foi a que apresentou maior número de possibilidades de
ocorrência, 96 palavras.
Nas palavras polissílabas, a tônica apresenta-se como a mais
favorecedora, com peso de .85 e freqüência de 12 produções corretas em 13
possibilidades. A pretônica apresentou peso de .49 e a pré-pretônica peso de
.47.
5 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Neste capítulo serão expostos os comentários pertinentes a respeito
dos resultados da análise estatística apresentada no capítulo 4.
5.1 QUANTO À FAIXA ETÁRIA
Este fator foi selecionado como relevante pelo Programa VARBRUL
para a produção dos quatro fonemas em estudo, ou seja, /f/, /v/, /š/ e /ž/.
Em todos os quatro casos houve queda de produção em, no mínimo, uma
faixa etária, mostrando que o domínio desses fonemas não é linear, mas
gradual.
FIGURA 38 – Gráfico de aquisição dos 4 fonemas em estudo
Estes dados corroboram o trabalho de Hernandorena (1990), que
considerou a aquisição como um processo gradativo, mas não linear, devido às
formas regressivas de uso.
Uma das possíveis explicações para as quedas na produção pode ser o
aumento de complexidade, para a criança, de um outro componente da língua,
tal como o componente sintático, o semântico, o morfológico ou pragmático,
que leva a criança a dividir sua atenção entre mais fatores lingüísticos. Segundo
Yavas, Hernandorena e Lamprecht (1991), para a grande maioria das crianças,
o aumento da complexidade de um determinado componente da língua tem
efeito sobre a precisão de outros aspectos.
Rangel (1998), em seu estudo longitudinal de 3 crianças com
desenvolvimento fonológico normal, mostra diferenças individuais
significativas na aquisição, conforme Tabela 47 abaixo.
Produções de /f/, /v/, /s/ e /z/
0102030405060708090100
1.0 1.2 1.4 1.6 1.8 1.10 2.0 2.4 2.8 3.0 3.4 3.8
faixas etárias
percentuais f
vsz
TABELA 47 - Idades de aquisição em Rangel (1998) f v s z š ž
Tatiana 1:9;13 1:7;25 1:9;13 1:10;22 1:9;13 1:11;19 João 2:1;14 2:1;14 2:0;26 2:9;7 2:4;0 -- Rafael 2:2;4 2:1;20 2:1;20 2:2;4 2:6;5 2:6;5 -- não apareceu até 3:0;29.
Como se vê, as diferenças individuais ficam muito claras em um estudo
de caráter longitudinal.
Por vezes, a idade de aquisição é idêntica, como acontece para o /v/ na
fala de João (2:1;14) e de Rafael (2:1; 20), e para o /s/ na fala dos mesmos
meninos (João – 2:0;26; Rafael – 2:1;20). Mas as fricativas [-anterior] mostram
grandes discrepâncias cronológicas: /ž/ já está adquirido aos 1:11;19 por
Tatiana e não é adquirido por João até 3:0;29, já por Rafael é adquirido aos
2:6;5, o que representa uma diferença de 7 meses; o /š/ já está adquirido aos
1:9;13 por Tatiana mas novamente aos 2:6;5 por Rafael, em uma diferença de 9
meses.
Essas diferenças são tanto mais significativas se levarmos em conta a
pouca idade dos sujeitos.
Já nesta pesquisa, de caráter transversal, constatou-se que o fonema /f/
está adquirido pela criança a partir de 1 ano e 9 meses. Já o fonema /v/ está
adquirido com 1 ano e 8 meses.
O fonema /š/ está adquirido aos 2:10, enquanto que o /ž/ está aos 2:6.
É interessante destacar a discrepância existente na idade de aquisição
dos fonemas /š/ e /ž/ em posição de onset absoluto e medial, conforme
Tabela abaixo.
TABELA 48 - Diferenças de idade de aquisição nas posições de onset absoluto e medial.
/š/ /ž/ Diferença
Onset absoluto 3:6 2:6 1 ano Onset medial 2:10 3:6 8 meses Diferença 8 meses 1 ano
Pode-se ver que, para o fonema /š/ há 8 meses de diferença entre a
aquisição do onset medial e o onset absoluto. Já para o fonema /ž/, o onset
absoluto surge 1 ano antes do onset medial. Igualmente de 1 ano é a diferença,
em posição de onset absoluto, da aquisição do /ž/ para o /š/.
Esta discrepância talvez possa ser explicada em função do processo
articulatório. Segundo Albano (2001, p.208), a agilidade e a relativa
independência da ponta da língua como articulador parecem decisivas na
distribuição das coronais entre as duas posições.
Esperar-se-ia que, de acordo com a literatura da área da fonologia e da
aquisição, os fonemas [-sonoro] fossem adquiridos antes dos [+sonoro], mas
não foi o padrão encontrado nesta pesquisa em relação à classe das fricativas,
como mostra a Tabela 49.
TABELA 49 - Diferença de aquisição entre pares surdo/sonoro
Fricativa [-son]
Idade de aquisição
Fricativa [+son]
Idade de aquisição
Diferença entre pares
f 1:9 v 1:8 1 mês š 2:10 ž 2:6 4 meses *s 2:6 *z 2:0 6 meses
* Dados de Savio (2001) – posição de onset
Esse fato também é corroborado pelos dados de Savio (2001). Em seu
trabalho Savio mostrou que o fonema /s/ encontra-se adquirido aos 2:6 na
posição de onset, e o /z/ aos 2:0.
Embora à primeira vista esses dados pareçam ir contra as leis
implicacionais de Jakobson (1968), Clements (em comunicação pessoal)
chamou atenção para o fato de que há línguas no mundo em que ocorre o
segmento sonoro do par sem ocorrer o segmento surdo. Após verificação em
Maddieson (1984) encontrou-se que, de 51 línguas no mundo que possuem a
fricativa sonora /v/, em 11 línguas este fonema ocorre sem o seu par surdo
/f/, ou seja, 21,5% das línguas que contêm o /v/ não contêm o /f/.
Em relação ao /ž/ encontrou-se que esta fricativa sonora ocorre em 51
línguas do mundo, sendo que em duas não ocorre o seu par surdo: em 3,9%
das línguas o /ž/ ocorre sem o /š/.
Portanto, o exame das línguas do mundo corrobora a coerência dos
resultados aqui encontrados.
Uma tendência universal (Locke, 1983) que se confirma nos dados
desta pesquisa é a de que os sons [+anteriores] são adquiridos antes dos sons
[-anteriores], ou seja, a ordem de aquisição das fricativas é labiais>coronais
[+ ant]>coronais [-ant].
É muito interessante destacar que, apesar de os fonemas [+sonoro]
serem adquiridos antes dos [-sonoro] na classe das fricativas (conforme Tabela
49), os [+sonoro] apresentam mais quedas durante o processo de aquisição,
evidenciando assim a dificuldade esperada do [+sonoro] em relação ao [-
sonoro] (Figura 38). Esse fato também foi encontrado nos dados de Savio
(2001).
5.2 QUANTO À TONICIDADE
Este fator foi selecionado como relevante pelo VARBRUL para a
produção da fricativa /f/.
Analisando-se a variável tonicidade, encontrou-se que, para as fricativas
surdas /f/ e /š/, a sílaba que mostrou-se mais favorecedora foi a sílaba
postônica. Em ambos os fonemas a sílaba tônica ficou em segundo lugar, com
peso acima de .50.
Para a fricativa /v/ encontrou-se que a sílaba tônica é a mais
favorecedora, e a postônica em segundo lugar, também com peso acima de
.50.
Já para o fonema /ž/, a sílaba pretônica foi a mais favorável.
Novamente em segundo lugar vê-se a postônica, com peso acima de .50.
Interessante é que a sílaba tônica foi a sílaba menos favorecedora, com peso de
.35.
Savio (2001) encontrou a pretônica como favorecedora para o fonema
/z/ e a postônica para o /s/.
De acordo com a literatura em geral a sílaba tônica é a mais favorável à
produção e à mais perceptível para a criança. Os dados desta pesquisa
mostram que, de uma maneira geral, na classe das fricativas a sílaba postônica
é a mais favorecedora, conforme Tabela 50.
TABELA 50 - Sílabas favoráveis à produção das fricativas
Pretônica Tônica Postônica f + ++ v ++ + *s ++ *z ++ š + ++ ž ++ +
* Dados de Savio (2001) ++= sílaba mais favorável à produção + = segunda sílaba mais favorável à produção
5.3 QUANTO AO CONTEXTO PRECEDENTE
De acordo com Lowe (1996), o ambiente lingüístico pode influenciar a
produção de um som, ou seja, pode facilitar ou inibir a articulação precisa do
mesmo.
O contexto precedente que mostrou-se mais favorecedor à produção
das fricativas /f/ e /v/ foram as vogais médias. Para o /f/, a vogal /e/; para o
/v/, a vogal /o/ e a coda com /r/.
Em ambos os fonemas o contexto precedente vazio obteve peso acima
de .52; igualmente em ambos foi o contexto com o maior número de
possibilidades de ocorrência.
Em relação aos fonemas /š/ e /ž/, houve uma diferença. Apesar de
serem fonemas tão semelhantes os contextos precedentes favorecedores são
bem distintos. Para o fonema /š/, encontrou-se as vogais altas como
favorecedoras. Lembre-se que a palatalização ocorre com vogais altas, em geral
no contexto seguinte, mas também pode ser no antecedente. Já para o /ž/, o
mais favorecedor é coda com nasal.
Novamente vê-se que o contexto precedente vazio foi o que
apresentou maior possibilidades de ocorrência.
Savio (2001) também encontrou vogais altas como facilitadoras para o
fonema /z/. Para o /s/ o que favorece são vogais nasalizadas, /ε/, /a/ e /o/.
TABELA 51 - Contextos precedentes favoráveis à produção das fricativas
Contexto precedente f Vogal média /e/ v Vogal média /o/ e coda com /r/ *s Vogal nasalizada, /ε/, /a/ e /o/ *z Vogais altas
š Vogais altas ž Coda com nasal * Dados de Savio (2001)
5.4 QUANTO AO CONTEXTO SEGUINTE
O contexto seguinte que mostrou-se mais favorecedor à produção das
fricativas /f/ e /v/ foi a vogal média /ε/, que em português só ocorre em
sílaba tônica. Para o fonema /f/ também mostraram-se favorecedoras as
vogais médias /⊃/ e /e/, e a vogal alta /i/; também favorável para o /v/ é a
vogal média /o/ e a alta /u/.
Para os fonemas /š/ e /ž/ vê-se as vogais altas como as mais
favorecedoras à produção correta, para o /š/ a vogal mais favorecedora em
posição de contexto seguinte é a vogal /i/, para a boa produção de /ž/ são as
vogais /i/ e /u/. O fonema /š/ também apresenta como facilitadora a vogal
média /o/. Novamente se vê as vogais com as quais ocorre a palatalização
favorecendo a aquisição das fricativas palatais.
Savio (2001) encontrou a vogal /e/ como a mais favorável à produção
de /z/; enquanto que para a produção de /s/, em contexto seguinte, o que
mostrou-se mais facilitador foram as vogais nasalizadas e a vogal alta /u/.
TABELA 52 - Contextos seguintes favoráveis à produção das fricativas
Contexto seguinte
f Vogais médias/⊃/, /ε/ e /e/, vogal alta /i/ v Vogais médias /ε/ e /o/ e a alta /u/ *s Vogal nasalizada e vogal alta /u/ *z Vogal média /e/ š Vogal alta /i/ e a média /o/ ž Vogais altas * Dados de Savio (2001)
5.5 QUANTO AO NÚMERO DE SÍLABAS
Este fator foi selecionado pelo Programa VARBRUL como relevante
na produção da fricativa /v/.
Diferentemente do referido em alguns trabalhos sobre aquisição, de
que quanto menor o número de sílabas, mais acurada a produção das crianças,
não foi evidenciado aqui esse padrão. Pelo contrário, o que encontrou-se foi
que, para as fricativas surdas /f/ e /š/, as palavras polissílabas foram as mais
favorecedoras; para a sonora /ž/ foram as trissílabas que mostraram-se mais
favoráveis, e para o fonema /v/ foram as palavras monossílabas.
É importante ressaltar o fato de as palavras monossílabas serem as
menos favorecedoras à produção do /f/, /š/ e /ž/.
Fato relevante é o grande número de palavras monossílabas no
vocabulário infantil no PB (talvez também no dos adultos) com o fonema /v/.
Neste corpus foram encontradas 54 ocorrências de palavras monossílabas com
/v/; 13 com /š/; 10 com /f/, e apenas 5 com /ž/.
5.6 QUANTO À POSIÇÃO NA PALAVRA
Em razão do fato de várias pesquisas terem verificado ser a posição um
fator significativo na aquisição de sons da língua, a determinação do sistema
fonológico deve ser feita de acordo com o conjunto de fones empregados
contrastivamente conforme a posição que podem ocupar na estrutura da sílaba
e da palavra (Hernandorena, 1990, p. 51). Os fonemas aqui em estudo podem
ocupar somente a posição de onset, ou seja, onset absoluto ou onset medial.
A variável posição na palavra foi selecionada como relevante pelo
Programa VARBRUL na produção do fonema /š/.
Em Hernandorena (1990) vê-se que a classe das fricativas é a de
aquisição mais tardia em início de sílaba.
Para os fonemas /f/, /v/ e /š/, a posição de onset medial foi a que
mostrou-se mais favorável à produção correta. Estes dados corroboram os
dados de Rangel (1998), onde vê–se que, em relação às fricativas,
considerando a posição na estrutura da sílaba e da palavra, a posição de onset
medial é a primeira a se estabelecer .
Para o fonema /ž/, a posição mais facilitadora à produção é a posição
de onset absoluto. Lembre-se da grande discrepância mencionada no item 5.1,
sobre as idades de aquisição para /š/ e /ž/ em posição de onset absoluto e
medial.
Savio (2001) encontrou que para a fricativa sonora /z/ o onset medial
era mais facilitador que o onset absoluto, enquanto que para a fricativa surda
/s/ o onset absoluto era melhor.
5.7 QUANTO A OMISSÕES E OUTRAS REALIZAÇÕES
5.7.1 OMISSÕES DE SÍLABA
No corpus desta pesquisa ocorreram 33 casos de omissão da sílaba
com fricativa. Foram 5 omissões de sílabas que continham o fonema /f/, 10
omissões com o /v/, 9 com o fonema /š/ e 9 com o fonema /ž/.
Em somente um dos casos ocorreu a omissão da sílaba tônica, e a
postônica nunca foi omitida.
Esses resultados serão discutidos à luz da Fonologia Métrica.
Os exemplos expostos abaixo baseiam-se na análise de Bisol (1992)
para o pé do Português, ou seja, pé troqueu de cabeça à esquerda.
Nos casos envolvendo o fonema /f/, ocorreu apenas uma omissão da
sílaba pré-pretônica, como no caso de [mi’giña] para ‘formiguinha’; as demais
omissões foram todas da sílaba pretônica, como [‘miga] para ‘formiga’, [‘maša]
para ‘fumaça’, conforme vê-se abaixo.
(* .) (* .) /formi’giña/ → [mi’giña] (* .) (* .) /for’miga/ → [‘miga] (* .) (* .) /fu’masa/ → [‘maša]
Nas omissões envolvendo o fonema /v/ ocorreu uma omissão da
sílaba pré-pretônica, [či’ĵiñu] para ‘vestidinho’. As demais omissões foram
todas envolvendo a sílaba pretônica, e todas foram com a palavra ‘televisão’.
(* .) (* .) /vesti’diño/ → [či’ĵiñu] (*) (*) /tele’vizãw/ → [tele’zãw]
Todas as omissões que ocorreram com o fonema /š/ envolveram a
sílaba pretônica, como em:
(* .) (* .) /šupeta/ → [‘peta] (*) (*) /ša’pεw/ → [‘pεw]
O fonema /ž/ foi o único que apresentou caso de omissão de sílaba
tônica, que foi o caso de [‘da] para ‘ajuda’. Os demais casos de omissão
envolvendo o fonema /ž/ ocorreram em sílabas pré-pretônicas, como em:
(* .) (*) /a’žuda/ → [‘da] (* .) (* .) /žela’deyra/ → [la’dera] (* .) (* .) /žoa’niña/ → [i’ña]
Estes dados evidenciam que as sílabas fora do pé do acento sempre são
as atingidas por casos de omissões de sílaba no processo de aquisição das
fricativas. Em 33 casos de omissão de sílaba, houve 31 de omissão da
pretônica e 1 da pré-pretônica, portanto fora do pé do acento. Só houve uma
omissão da tônica – a sílaba forte do pé. Esta parece ser uma evidência forte
de que as crianças antes de 2:4 (idade em que terminam as omissões) já têm
conhecimento a respeito do pé da língua.
Para complementar essa análise, foram tomados os dados em que se
baseia Savio1 (2001), e procedeu-se a um levantamento para verificar as
omissões ocorridas no processo de aquisição dos fonemas /s/ e /z/. Com
relação a omissões de sílaba para o fonema /s/, encontraram-se omissões em
sílabas pré-pretônicas ([ka’gado] para /estra’gado/) e pretônicas ([’patu] para
/sa’pato/).
No caso do fonema /z/, o único caso de omissão de sílaba encontrado
envolveu a postônica ([‘me] para /’meza/). A análise dos dados de Savio
confirma portanto, a estabilidade do pé métrico na aquisição.
1 Agradeço a Carla Baggio Savio pela gentileza em ceder-me os dados
5.7.2 OMISSÕES DE SEGMENTO
Ocorreram 31 casos de omissão de um dos fonemas em estudo, ou
seja, de /f/, /v/, /š/ ou /ž/. Tendo em vista a influência do pé mostrada na
seção 5.7.1, acima, fez-se um levantamento procurando verificar a influência
do acento também no apagamento de fonema, conforme vê-se na Tabela 53.
Tabela 53 - Omissões de segmentos nas diferentes sílabas
Sílaba Fonema
Pré-pretônica Pretônica Tônica Postônica Total
Omissão de /f/ 0 1 3 0 4 Omissão de /v/ 1 2 2 0 5 Omissão de /š/ 1 6 6 0 13 Omissão de /ž/ 4 4 1 0 9 Total 6 13 12 0 31
Segundo a Tabela 53 acima, não ocorreu omissão de nenhum dos
fonemas em estudo quando estes se encontravam em sílaba postônica.
Conforme mencionado no item 5.2 deste capítulo, a sílaba postônica é a mais
favorecedora para a produção de /f/ e /š/, e é a segunda melhor para a
produção de /v/ e /ž/.
As sílabas mais atingidas por omissão do segmento na aquisição das
fricativas são as sílabas pretônicas e as tônicas. Quanto à pretônica, ocorre o
mesmo que na omissão de sílaba, isto é, a posição fora do pé favorece o
apagamento, mas quanto à tônica é o oposto. Como se viu, a criança não
apaga a sílaba tônica, pois estaria mexendo no pé, mas apaga fonemas em
sílaba tônica, pois esta é apenas uma mudança de estrutura de sílaba, não
interfere no padrão acentual da língua.
O levantamento realizado nos dados de Savio (2001) para verificar as
omissões dos segmentos /s/ e/z/ encontrou que estes fonemas foram
omitidos quando encontravam-se, principalmente, em sílaba tônica ([‘uku] para
/‘suko/ e [de’oyto] para /de’zoyto/). Destaca-se que o segmento /S/ foi
omitido principalmente em posição de coda medial ([pa’ta] para /’pasta/).
Não se encontrou nenhuma omissão destes segmentos em sílaba postônica.
Vê-se, portanto, que a sílaba postônica é absolutamente estável: tanto
como sílaba do pé quanto como estrutura de sílaba.
5.7.3 SUBSTITUIÇÕES
No corpus desta pesquisa encontraram-se casos de substituições de
[contínuo], de [sonoro], de [anterior], por semivogal e de traço de ponto.
5.7.3.1 Substituições em /f/ e/v/
Analisando os resultados encontrados para os fonemas /f/ e /v/,
percebe-se que a substituição que mais ocorreu foi a substituição envolvendo
o traço [contínuo], por exemplo, [po’gãw] para /fo’gãw/ e [ka’balu] para
/ka’valo/. Esta substituição correspondeu a 3% do corpus em relação ao
fonema /f/, e a 4% para o fonema /v/. A substituição é ilustrada na visão da
Geometria de Traços.
/f, v/ [p, b] R R CO → CO
[+ cont] [- cont] [labial] [labial]
Outra substituição encontrada é a substituição do traço sonoro. Esta
substituição correspondeu a 2% do corpus, tanto para o fonema /f/
(/per’fume/ – [‘vumi]) quanto para o fonema /v/ (/sorvete/ – [‘feči). A
substituição é ilustrada na visão da Geometria de Traços.
/f/ [v] R R ← LAR → LAR [- sonoro] [+ sonoro]
No corpus desta pesquisa só houve uma ocorrência de substituição do
fonema /f/ por uma semivogal, que foi o caso de /foy/ para [woy].
/f/ [w]
R [- soante] R [+ soante] [-vocóide] → [+ vocóide] [- aproximante] [+ aproximante]
Em relação ao fonema /v/, a substituição por semivogal representou
2% do corpus, por exemplo, [wo’lãw] para /violãw/ . Esta substituição, tanto
para o fonema /f/ como para o /v/, apesar de apresentar baixa freqüência,
não era esperada, pois mexe em traços de raiz.
/v/ [w] R [- soante] R [+ soante] [- vocóide] → [+ vocóide] [- aproximante] [+ aproximante]
As substituições envolvendo traço de ponto não tiveram ocorrência no
corpus desta pesquisa tratando-se do fonema /v/. Na aquisição do fonema
/f/ ocorreram poucos casos, como, por exemplo, /fey’žãw/ para [si’zãw],
não atingindo mais que 1% do corpus.
/f/ [s, z, š, ž]
R R CO → CO PC PC │ │ [labial] [coronal]
5.7.3.2 Substituições em /š/ e/ž/
Em relação aos fonemas /š/ e /ž/ percebe-se que as substituições
ocorreram em maior número do que para /f/ e /v/.
Os fonemas /š/ e /ž/ foram preferencialmente substituídos por /s/ e
/z/, respectivamente (/’šave/ - [‘savi] e /ža’nεla/ - [za’nεla]. Essa substituição,
em que ocorre somente uma mudança no traço [anterior], correspondeu a
22% do corpus em relação ao fonema /š/, e a 18% em relação ao fonema /ž/.
A substituição é ilustrada na visão da Geometria de Traços.
/š,ž/ /s, z/ R R
CO → CO PC PC
[coronal] [coronal] [- ant] [+ ant]
Savio (2001) encontrou a substituição do [anterior], no sentido + → -,
portanto o contrário do apontado nesta pesquisa, como a substituição mais
freqüente na aquisição de /s/ e /z/. Reforçando esses dados, vê-se que esta
instabilidade no traço [anterior], referida como “confusão das fricativas” por
Teixeira (1980), leva à substituição de emprego entre elas próprias. Segundo
Hernandorena (1990), essa instabilidade no valor do traço não ocorre
somente no corpus da faixa etária como um todo, mas há muitos casos de
ocorrência no corpus de uma mesma criança.
A anteriorização, segundo Lamprecht (1990, p. 261), pode ser um
processo que, embora não sendo empregado por todas as crianças, persiste
por bastante tempo naquelas em que é encontrado.
Vaucher (1996), em seu estudo com crianças com desvios fonológicos,
encontrou que, dos 46 sujeitos de sua pesquisa, 34 alteraram o traço [anterior],
indicando um percentual de ocorrência de 42,75% (236/552). A alteração mais
freqüente ocorreu entre vinte e cinco sujeitos; esta aconteceu na direção - → +
com um percentual de ocorrência de 49, 68%.
Outra substituição freqüente envolvendo /š/ e /ž/ é a substituição
envolvendo o traço [contínuo]. Em relação ao fonema /š/ esta substituição
correspondeu a 11% do corpus, e para /ž/ a 5%, como, por exemplo,
/ši’nεlo/ para [ki’nεlu] e /žo’gar/ para [do’ga].
/š,ž/ /plosivas/
R R CO → CO
[+ cont] [- cont]
Referente ao valor [+ contínuo], Hernandorena (1990) mostra que a
alteração para [- contínuo] ocorre basicamente por substituição de
consoantes fricativas, atingindo somente em dois casos a classe das líquidas.
No mesmo estudo de Vaucher (1996) com crianças com desvios
fonológicos evolutivos, dos 46 sujeitos estudados 15 alteraram o traço
[contínuo], indicando um percentual de ocorrências de 12,68% (137/1080).
A alteração mais freqüente ocorreu na direção + → -, quando 8 sujeitos
realizaram um percentual de ocorrências de 27,32%.
As substituições envolvendo traço [sonoro] (/’šeya/ - [‘žeya] e /’keyžo/
- [‘kešu]) e traço de ponto (/’šikara/ - [‘fikara] e /žaka’rε/ - [vaka’lε]) não
atingiram mais que 2% do corpus desta pesquisa na aquisição de /š/ e /ž/.
/š/ [ž]
R R
← LAR → LAR
[- sonoro] [+ sonoro]
/š, ž/ [f, v]
R R
CO → CO
PC PC
│ │ [coronal] [labial]
Em sua tese, Hernandorena (1990) mostra que o traço [coronal] é
alterado tanto em onset absoluto como em onset medial, predominando esta
posição em substituições na classe das fricativas.
Hernandorena (1994), em seu artigo sobre as palatais, propõe que
talvez as crianças possam considerar as fricativas palatais /š/ e /ž/, bem como
o /λ/ e o /ñ/, como consoantes complexas. Um dos argumentos da autora
seriam as substituições que as crianças fazem durante a aquisição destes
fonemas por semivogais. No entanto, no corpus desta pesquisa não
encontraram-se dados para corroborar esta posição.
5.7.3.3 Faixa etária das substituições
Fazendo-se uma análise com relação à faixa etária em que ocorrem as
substituições, omissões e produções corretas na aquisição de /f/, /v/, /š/ e
/ž/, tem-se o seguinte resultado:
TABELA 54 - Produções por faixas etárias na aquisição de /f/ e /v/
Faixa
etária /f/ /v/
Omissão│ Substituição de/por Omissão│ Substituição de/por síl seg [son] pon semi [cont] Prod síl seg [son] pon semi [cont] Prod 1:0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1:1 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 2 0 1 1:2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1:3 0 1 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 4 1:4 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 2 1:5 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 5 1:6 2 0 0 0 0 0 5 1 4 0 0 0 1 15 1:7 0 0 1 0 1 0 2 0 1 1 0 0 4 13 1:8 1 1 2 0 0 0 10 0 0 0 0 0 0 29 1:9 0 2 0 0 0 1 23 0 0 0 0 2 0 44 1:10 0 0 0 1 0 0 32 1 0 3 0 1 0 67 1:11 2 0 0 0 0 1 58 0 0 0 0 0 4 64
2:0 0 0 2 0 0 1 17 1 0 3 0 1 2 20 2:2 0 0 0 1 0 2 28 1 0 1 0 0 5 38 2:4 0 0 0 0 0 1 23 1 0 0 0 0 0 32 2:6 0 0 0 0 0 0 33 3 0 0 0 0 1 24 2:8 0 0 0 0 0 1 36 0 0 0 0 1 0 28 Prod = produções corretas
TABELA 55 - Produções por faixas etárias na aquisição de /š/ e /ž/
Faixa etária
/š/ /ž/
Omissão│ Substituição de/por Omissão│ Substituição de/por Síl seg [son] pon [ant] [cont] Prod síl seg [son] pon [ant] [cont] Prod 1:0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1:1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1:2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1:3 0 0 0 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1:4 0 0 0 0 0 1 2 0 0 0 0 0 0 1 1:5 1 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1:6 2 0 0 1 5 4 5 2 2 0 0 1 1 5 1:7 1 1 0 0 1 2 6 0 0 0 0 2 0 0 1:8 1 2 0 0 7 4 13 0 0 1 1 1 0 2 1:9 1 1 0 1 3 2 15 2 1 1 0 1 0 4 1:10 1 3 0 3 11 7 16 0 0 0 0 6 0 3 1:11 2 1 0 0 13 7 34 0 3 0 2 12 2 16 2:0 0 5 0 0 5 3 8 2 0 0 1 2 0 10 2:2 0 0 1 0 7 5 13 2 0 0 1 3 5 12 2:4 0 0 0 0 7 1 19 1 2 0 0 7 1 17 2:6 0 0 0 0 2 0 18 0 0 1 0 1 0 17 2:8 0 0 2 0 10 1 24 0 0 0 0 1 0 17 2:10 0 0 0 0 3 0 17 0 0 0 0 4 0 15 3:0 0 0 0 0 4 0 30 0 0 0 1 3 3 26 3:2 0 0 1 0 3 0 23 0 0 0 0 4 1 28 3:4 0 0 0 0 6 1 25 0 1 0 0 3 0 17 3:6 0 0 0 0 1 0 26 0 0 0 0 0 0 26 3:8 0 0 0 0 0 0 17 0 0 0 0 1 0 21 Prod = produções corretas
Observando as Tabelas 54 e 55 acima podemos concluir que o traço
[contínuo] se estabiliza antes do traço [anterior], pois as substituições que
envolvem o [contínuo] terminam, em sua grande maioria, em faixas anteriores
às faixas em que terminam as substituições envolvendo o traço [anterior].
Teixeira (1985, p. 188) diz que a anteriorização – bem como a
dessonorização – é um processo que não existe no início da aquisição. Os
resultados desta pesquisa corroboram esta afirmação, pois a anteriorização
acontece a partir de 1:5, e só aumenta nas faixas 1:8 – 1:10; enquanto que a
dessonorização aparece para /f/ e /v/ a partir de 1:7 e para /š/ e /ž/ a partir
de 1:8, e não aumenta nunca.
Como salienta Hernandorena (1993), a ocorrência de substituições
š→s, ž →z, pode significar o entendimento da subcategorização do traço
[anterior] em relação ao traço [coronal], uma vez que apenas a coronalidade
seria, inicialmente, adquirida pela criança, sendo feita a distinção quanto ao
traço [anterior] numa etapa subseqüente. Ainda segundo Hernandorena (1990,
p.235), os traços secundários [anterior] e [alto] são efetivamente os últimos a
ter seu valor distintivo adequadamente empregado.
Os fonemas /f/ e /v/, que são adquiridos antes de /š/ e /ž/, também
sofrem substituições envolvendo o traço [contínuo] a partir dos 1:6, ou seja,
um traço que, naquele momento, ainda não está estabilizado.
5.8 IMPLICAÇÕES PARA A FONOAUDIOLOGIA
Mesmo não tendo como objetivo principal a terapêutica
fonoaudiológica, esta pesquisa procura trazer maiores subsídios para a atuação
clínica.
A partir de um estabelecimento do perfil de aquisição das fricativas /f,
v, š, ž/ em crianças com desenvolvimento fonológico normal, o
fonoaudiólogo é capaz de reconhecer e detectar precocemente casos
desviantes.
O presente trabalho também oferece dados que podem nortear o
terapeuta na seleção das palavras utilizadas na reabilitação dos pacientes que
não fazem uso adequado das fricativas, pois estes vocábulos não devem ser
selecionados ao acaso. Devem ser considerados diversos aspectos: tonicidade,
som precedente, som seguinte, número de sílabas e posição silábica.
Assim, algumas palavras serão apresentadas como modelo,
considerando os resultados encontrados nesta pesquisa.
/f/ /v/ /š/ /ž/ Ideal (possui todas as variantes facilitadoras)
blefe novela, perversa
Gorducho jumento
Boa (possui três variantes facilitadoras)
café, elefante
vela, sorvete
Bruxa, Cachorro
anjinho, girafa
Regular (possui duas variantes facilitadoras)
feijão verde Chinelo jacaré
FIGURA 39 – Quadro com sugestões de palavras para terapia
6 CONCLUSÃO
Esta pesquisa buscou descrever a aquisição normal dos fonemas /f/,
/v/, /š/ e /ž/ em posição de onset (absoluto e medial) por crianças de 1:0 a
3:8 anos, falantes monolíngües do português brasileiro. Os dados coletados
foram submetidos à análise estatística do programa VARBRUL e,
posteriormente, analisados à luz da Geometria de Traços e da Fonologia
Métrica.
Através dos resultados encontrados foi possível chegar a algumas
conclusões que serão expostas a seguir.
- Constataram-se diferentes etapas de aquisição na classe das fricativas:
primeiro tem-se o /v/ e o /f/, depois /z/ e /s/, e por último, o /ž/ e o /š/.
- A idade de aquisição dos fonemas estudados foi: /v/ com 1:8 > /f/
com 1:9 > /ž/ com 2:6 > /š/ com 2:10.
- Destaca-se o fato de o par sonoro ser adquirido antes do surdo.
Embora isto não esteja de acordo com Jakobson, verifica-se que nas línguas
do mundo há casos em que ocorre o fonema sonoro sem ocorrer o seu par
surdo.
- A variável faixa etária foi selecionada como a mais relevante na
aquisição para os quatro fonemas em estudo. As demais variáveis selecionadas
foram: tonicidade (para o /f/), número de sílabas (para o /v/), posição na
palavra (para o /š/) e contexto seguinte (para o /ž).
- A aquisição mostrou não ser linear para nenhum dos fonemas, sempre
ocorreram quedas de produção durante o processo de aquisição, sendo que as
fricativas [+son] sofrem mais quedas durante este processo.
- De um modo geral, para as fricativas, quanto maior for a palavra
melhor para a sua produção.
- As substituições encontradas podem ser adequadamente explicadas
pela Geometria de Traços, enquanto que as omissões, explicadas pela
Fonologia Métrica.
- As substituições mais encontradas na aquisição de /f/ e /v/ foram as
que envolveram a substituição do traço [contínuo]; para /š/ e /ž/ foram as
que envolveram o traço [anterior].
- As sílabas contendo as fricativas em exame e que fazem parte do pé
da língua nunca são omitidas pelas crianças.
- Nos casos de omissão de segmento, a sílaba postônica é a mais
preservadora.
- Com esta pesquisa, aliada ao trabalho de Savio sobre /s/ e/z/,
completa-se o quadro de aquisição das fricativas.
Os objetivos desta pesquisa foram atingidos. Acredita-se que tragam
contribuições para o conhecimento sobre a aquisição fonológica do português
brasileiro, para a descrição do PB, e para subsidiar a terapia fonoaudiológica.
Contudo, algumas questões merecem ser mais bem investigadas, como,
por exemplo, as diferenças entre os sexos na realização dos segmentos em
estudo, e a verificação da facilitação das variáveis apontadas aqui como
facilitadoras na produção das fricativas.
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