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ARTICULAÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ENSINO DA ARTE COMO ESTRATÉGIA DE PRESERVAÇÃO DO MANGUEZAL
SILVA, Alessandra M. (1); OLIVEIRA, Therezinha M. N. (2); LAMAS, Nadja de C.(3)
1. UNIVILLE. Bolsista CAPES do Mestrado em Saude e Meio Ambiente
E-mail: [email protected]
2. UNIVILLE. Profª Drª Orientadora da pesquisa. Deptº: Mestrado em Saude e Meio Ambiente
E-mail: [email protected]
3. UNIVILLE. Profª Drª Co-orientadora da pesquisa- Deptº: Mestrado em Patrimônio Cultural e
Sociedade E-mail: [email protected]
RESUMO
O presente trabalho aborda questões relativas ao manguezal localizado no entorno da Baía da Babitonga, importante estuário situado no litoral norte do estado de Santa Catarina, e envolveu a percepção, apreensão e compreensão dos adolescentes da 6ª série de escolas municipais da região, quanto a este ecossistema. A pesquisa, fundamentada no estudo da biorregião, teve por objetivo construir um processo de tomada de consciência, ou seja, o urgente despertar de uma consciência, ainda que incipiente, para preservação do ecossistema manguezal por meio de linguagens da arte, e buscou desenvolver o comprometimento destes adolescentes e seus familiares com o espaço onde vivem. Como metodologia, definiu-se três escolas situadas nos municípios de entorno da Baía da Babitonga, uma em Itapoá, outra em Joinville e uma terceira em São Francisco do Sul, todas elas localizadas próximas ao manguezal, (cerca de 500 metros). A abordagem proposta para cada escola foi a da reflexão sobre o manguezal: seu conceito, sua conservação, e o impacto da destruição provocada por sua ocupação, por descarte de lixo ou por mero desconhecimento, e foi efetivada por meio de imagens, filmes, música, aulas -expositivas e dialogadas-, saída de campo -visita aos manguezais da região-, oficinas de fotografia e escultura, à luz de trabalhos de André Alves e Frans Krajcberg, com montagem final de uma exposição dos trabalhos desenvolvidos pelos alunos em locais estratégicos de cada município, e com a apresentação de um vídeo sobre o processo de construção dessa consciência transformadora. O resultado apresentado nas falas dos alunos, no interesse e nos trabalhos por eles realizados, demonstrou que, por meio da observação, da percepção e da contemplação motivadas, construíu-se o interesse, e o interesse conduziu à ação dos adolescentes envolvidos no processo e pelo processo, valendo registrar a relevância da arte que, calcada num forte embasamento teórico da área ambiental, tornou o trabalho transdisciplinar, e possibilitador do despertar de um olhar sensível e perene para as questões da degradação e para a imperiosa necessidade de ações de conservação e preservação, reafirmando a transversalidade como proposta metodológica efetiva para a Educação Ambiental, ainda que se reconheça que o presente trabalho seja apenas um primeiro passo, ou seja, um indicativo para implementação e monitoramento de pesquisas, atividades e investimentos futuros, com prazos maiores, que garantam efetividade sobre o ecossistema.
Palavras-chave: Educação Ambiental, Ecossistema Manguezal, Arte.
4O COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO Belo Horizonte, de 26 a 28 de setembro de 2016
INTRODUÇÃO
O significado da palavra manguezal geralmente transmite, para quem não é especialista no
assunto, uma idéia equivocada e superficial, ou seja, idéia de lama, de lodo, de água suja, de
imundície, sendo comumente apreendido como um lugar feio, desprovido de beleza, local, em
suma, impróprio e insuscetível de qualquer interesse. Tal idéia implica em total desvalorização
de algo que na verdade representa um ecossistema fundamental, o berço da vida, e o
desconhecimento de sua verdadeira realidade é um dos principais fatores que contribuem
para o processo crescente de sua degradação com severo impacto para a vida ali residente, e
garantidora de outras vidas, e para produtividades, dentre outras, a pesqueira. O manguezal,
apreendido em sua real significação, possui uma beleza intrínseca, íntima, abscôndita,
profunda, uma beleza que não finda. Descobrir a riqueza desse ecossistema é algo
transcendental, mas implica no enfrentamento e na transgressão da ordem do superficial, o
que deve ser feito por todos os meios, mas sobretudo, pela educação. A presente pesquisa
investiga questões sobre a riqueza ignorada dos manguezais que se encontram localizados
no entorno da Baía da Babitonga, litoral norte do Estado de Santa Catarina, trabalhando
especialmente com o aguçamento do olhar, da percepção, da apreensão e sensibilidade dos
adolescentes com relação a este ecossistema para um desaguar numa consciência e reflexão
provocadoras de uma ação participativa humana e cidadã. A importância do presente estudo
reside na possibilidade de sensibilizar o olhar dos adolescentes aproximando-os e
inserindo-os na realidade e riqueza de sua biorregião, motivando-os e incitando-os para o
trato das questões ambientais, com a consciência e responsabilidade de um cidadão, não
apenas local, mas também planetária. Esta pesquisa teve como objetivo, a construção de um
processo de tomada de consciência da existência e da imprescindível necessidade de
preservação do ecossistema manguezal, por meio de linguagens artísticas, fundamentado no
estudo da biorregião, a fim de estimular o maravilhamento, o comprometimento, a
cumplicidade desses adolescentes e de seus familiares com a responsabilidade no trato do
espaço de sua própria morada, morada que não só pertence a eles, mas também às futuras
gerações. Fotografia e escultura tiveram, no trilhar deste caminho, papel fundamental. E a
escola pública local, foi o agente agregador de uma adolescência responsável e construtora.
O ensaio fotográfico de André Alves e as esculturas de Frans Krajcberg articulados com o
estudo da biorregião foram as referências para a construção do pensamento sensível sobre o
manguezal. A resignificação dos resíduos da destruição do manguezal local, elaborada pelos
adolescentes com a construção de fotografias e esculturas teve seu momento previsto para
uma exposição final, em pontos estratégicos de cada um dos três municípios onde se
encontram as escolas participantes do projeto.
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1 REVISÃO DA LITERATURA
1.1 O ECOSSISTEMA MANGUEZAL
Pesquisas apontam que entre os ecossistemas mais ameaçados do mundo estão os
manguezais, cobrindo mais de 15 milhões de hectares entre a África, Ásia, Oceania, América
Latina, América Central, e uma pequena porção na América do Norte. (ver fig. 1).
Figura 1 – Distribuição Mundial dos Manguezais
Fonte: Alves, 2004, p. 121
A História nos conta sobre a importância que o ecossistema manguezal representou para
muitos povos, contribuindo com alimento em tempos de fome, com a madeira nos materiais de
construção utilizados principalmente no pacífico após erupções vulcânicas, em produtos
químicos e fertilizantes. Nessa direção Vanucci (2002, p. 148), nos informa que: “[...] os
manguezais usados judiciosamente e parcialmente transformados em um sistema de múltiplo
uso em base sustentável têm uma longa história para contar sobre sua contribuição para o
desenvolvimento das sociedades humanas”. No entanto, na Contemporaneidade, essa
relevante contribuição do ecossistema manguezal para o desenvolvimento sustentável foi
ignorada pelas presentes gerações por omissão do processo educacional e informativo,
sendo este desconhecimento uma das razões pelas quais inúmeras áreas de manguezais são
utilizadas de forma imprópria, valendo registrar que as áreas costeiras tropicais são as que
mais sofrem com a pressão antrópica, que provoca a destruição de uma riqueza permanente
em função de “benefícios econômicos”. Apesar de sua fundamental importância, os
manguezais vêm sofrendo sérios problemas ambientais devido à ausência de um olhar, de
uma percepção, e de uma apreensão reflexiva, ou seja, de um conhecimento que provoque
um pensamento formador de uma consciência dessa realidade. São despejados diariamente
nos manguezais toneladas de lixo gerado pelas cidades próximas a este ecossistema, sem
nenhum tipo de tratamento de esgoto doméstico e ou industrial. Tem-se ainda a pesca
predatória que comumente não respeita o ciclo adequado para realização desta atividade.
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Caranguejos, camarões e outras espécies de moluscos são retirados de seu habitat, ainda
jovens, e muitas vezes a fêmea é retirada na fase da desova. Isso significa que muitas
comunidades que sobreviviam da pesca ou da coleta de mariscos são obrigadas a buscar
outros meios de sobrevivência. A seguir algumas características do ecossistema manguezal:
A Floresta: Segundo dados do IBAMA (1994, p. 16), o mundo conta com aproximadamente
“[...] 60 espécies de árvores e arbustos que praticamente fazem parte da sociedade de
mangues. As suas matas podem crescer até 35 ou 40 metros, -altura de florestas estudadas
no Brasil de acordo com Herz (1991, p. 94)-, com exceções de até mais de 60 mts. O registro
fotográfico (fig. 2) foi realizado por adolescentes do município de Itapoá, durante o processo
da presente pesquisa. As raízes aéreas que brotam dos galhos dessas árvores caminham em
direção ao solo e são chamadas de raízes escoras, são de diferentes aspectos e formas e
servem para ancorar o tronco ao lodo mole e movediço. “Uma característica ímpar das
árvores de mangue é que elas podem crescer em condições em que nenhuma outra planta
vascular toleraria, por isso sua importância ecológica”. (VANNUCCI, 2002, p. 52)
Figura 2- A Floresta município de Itapoá Figura 3 - As Águas São Francisco do Sul Fonte: Duarte, 2006 Fonte: Gomes, 2006
As Águas: As águas dos manguezais nascem do encontro da água salgada com a água
doce, resultando no que se denomina água salobra. A temperatura da água não cai abaixo de
17 -18ºC no inverno, e chega a 35º C em outras épocas do ano. A tranqüilidade presente no
manguezal está relacionada com a tranqüilidade das águas. Os adolescentes do município de
São Francisco do Sul, participantes do presente estudo registraram na fotografia (ver fig. 3) o
encontro das águas. Nas águas dos manguezais são registradas cerca de 20 espécies de
peixes, 3 ou 4 anfíbios, os répteis são comuns, como as cobras-d´agua (na maioria não
venenosas), diferentes espécies de crocodilo, e tartarugas. De acordo com observações de
Schäeffer-Novelli (1995, p. 24), “a maior parte da fauna do manguezal vem do ambiente
marinho, sendo encontrados entre outras espécies, grande quantidade de moluscos (ostras,
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sururus), crustáceos (caranguejos, siris, camarões) e peixes”. Pelos registros dessa
pesquisadora:
Os peixes podem passar toda sua vida no manguezal, apenas uma fase desta, ou ainda fazer migrações diárias de acordo com a maré ou então realizar migrações mensais, semestrais e anuais para reprodução. É interessante ressaltar que a maioria dos peixes de áreas costeiras explorados comercialmente (sardinhas, tainhas, curimãs, carapebas, camorins ou robalos, anchovas, bagres, linguados e muitos outros) dependem de alguma forma do manguezal para sobrevivência. [...] os manguezais estão entre os principais responsáveis pela manutenção de boa parte das atividades pesqueiras das regiões tropicais. Servem de refúgio natural para reprodução e desenvolvimento (berçário) assim como local para alimentação e proteção de crustáceos, moluscos e peixes de valor comercial. (SCHÄEFFER-NOVELLI (1995, p. 27)
Quanto às aves, geralmente são encontradas somente na franja das áreas dos manguezais e
em locais em que há águas com espaço aberto que permitem o seu vôo e o mergulho para
que nelas possam se alimentar. As garças brancas constroem seus ninhos nas copas dos
mangues. As águas dos manguezais possuem teor altamente nutritivo e é importante
ressaltar que, mesmo em condições desfavoráveis, as águas dos manguezais são ainda
promissoras e suficientemente compensadoras como alimento e abrigo. O Solo: O solo dos
manguezais é de importância vital para o funcionamento do sistema. No entanto, ainda muito
pouco se conhece sobre a microbiologia do solo e das águas deste notável ecossistema. A
superfície do lodo dos manguezais é geralmente quente, rica em matéria orgânica e úmida
nas florestas bem desenvolvidas. Por isso argumenta Vannucci (2002, p. 71-72) tal superfície
constitui um bom meio de cultura. Geralmente é neste solo que ocorre a formação de sais
nutrientes, e os lodos quentes constituem, na verdade, a cozinha do Ecossistema Manguezal.
As características físicas do solo parecem ter a mesma importância das propriedades
químicas, na determinação do crescimento e da saúde dos mangues. Neste solo habita uma
fauna cavadora, presente nos crustáceos e outros caranguejos que vivem no interior da
superfície do mangue. Neste particular vale inserir abaixo registro fotográfico (fig. 4) realizado,
diga-se de passagem, com muita propriedade, pelos adolescentes participantes da presente
pesquisa, na região de Joinville.
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Figura 4 – Solo e fauna cavadora Joinville Fonte: Voas, 2006.
1.2 OS MANGUEZAIS NO ENTORNO DA BAÍA DA BABITONGA
A Baía da Babitonga, complexo estuarino onde se encontra a maior concentração de
manguezais de Santa Catarina, localiza-se no litoral norte catarinense, entre as coordenadas
geográficas de 26º02’-26º28’S e 48º28’-48º50’W, conforme dados fornecidos por Tureck
(2002, p.58), e o Complexo Hídrico da Baía da Babitonga, com seus 1.400 quilômetros
quadrados situa-se próxima às encostas da Serra do Mar. Abrange parte dos municípios de
Araquari, Barra do Sul, Garuva, Itapoá, Joinville (a maior conglomeração urbana com 415.000
habitantes) e São Francisco do Sul, consoante informe e levantamentos efetivados pela ABES
(Associação Brasileira de Engenharia Sanitária).
Figura 5- Localização da Baía da Babitonga-Estado de Santa Catarina (26º02’26º28’S e 48º28’-48’50W).
Fonte: Tureck, 2002, p. 60
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A diversidade ambiental existente nessa área, de acordo com artigo na Revista Brasileira de
Saneamento e Meio Ambiente (2001, p.12), é de relevância vital “[...] Com nascentes no alto
das serras, entre campos de altitude e matas de galeria, os rios descem as encostas da Serra
do Mar e atingem a planície quaternária, protegidos pela densa Floresta Atlântica, até
desaguar na Baía da Babitonga, passando pela região dos manguezais”. Segundo estudos do
IBAMA (1998, p. 21), em levantamento realizado na Baía da Babitonga, as espécies
encontradas nesse local são as seguintes: Rhizophora mangle, também denominado como
mangue-vermelho. “[...] As ostras e os mariscos utilizam as raízes da Rhizophora como
suporte onde se aderem e se desenvolvem, já os caranguejos e os caramujos utilizam as
raízes na busca de alimentos como as algas que ali crescem” (ARAQUARI, 2001, p. 21).
Avicennia schaueriana, conhecida como siriúba As siriúbas encontram-se associadas e em
maior número possuem raízes com pneumatódios. E a Laguncularia racemosa, conhecida
como mangue de cortume ou mangue-branco. Esta espécie encontra-se apenas onde a maré
mais alta alcança. A falta de integração do homem com a natureza provoca resultados de
suma gravidade. Silva (2001, p. 97), em seu Diagnóstico sobre os manguezais da baía da
Babitonga, afirma, por exemplo, que: “o manguezal próximo à área urbanizada se encontra
em processo de descaracterização devido a uma situação de estresse ambiental crônico,
causado principalmente pela poluição hídrica e assoreamento”. Com relação à urbanização
especialmente no tocante ao bairro dos Espinheiros (uma das localidades de pesquisa deste
estudo), Silva (2001, p. 97) afirma que:
A urbanização inadequada e acelerada, aliada à falta de planejamento no bairro dos Espinheiros e, devido à proximidade da área urbana ao manguezal, leva à ação contínua destes tensores, o que acaba por refletir de forma negativa nos manguezais localizados no entorno.
Impõe-se, portanto, urgente investimento na educação como processo de conhecimento, de
percepção e de reflexão, desencadeador de vontade política e de participação da comunidade
na preservação do meio ambiente em geral e, no caso específico do ecossistema manguezal,
com o desenvolvimento paralelo de políticas públicas que efetivem o exercício da cidadania
nesta direção. Torna-se urgente um caminhar juntos, um solidarizar-se, um envolver-se, um
comprometer-se, um acumpliciar-se com a defesa da natureza.
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1.3 A NECESSIDADE DE UMA EDUCAÇÃO TRANSDISCIPLINAR
Existem caminhos possíveis dentro da educação: o caminho que considera a educação sob o
ponto de vista da fragmentação, das disciplinas separadas umas das outras, sem o
estabelecimento de conexões e de relações; e o caminho da educação sob um ponto de vista
da complexidade. Que seria olhar a educação como um processo abrangente dos mais
variados aspectos da vida, do cosmos, do universo, e das miríades de espécies que nele
habitam. Na apresentação do livro Convite à Filosofia, Marilena Chauí chama a atenção para
a importância da consciência, da reflexão, ou seja, do conhecimento filosófico como algo
transcendental, inerente à condição humana e imprescindível à sua plena realização. Nesta
direção, a autora enfatiza a importância da utilização de uma metodologia em que se parta,
inicialmente, não apenas de meras teorias ou de obtenção de respostas prontas e acabadas,
mas sim, de dúvidas, de questionamentos, de indagações sobre problemas suscitados no
nosso dia-a-dia, ou seja, pela experiência e dentro da experiência vivenciada em nosso
cotidiano. Chauí ressalta a imperiosidade de que esta reflexão, esta conscientização e este
conhecimento sejam elaborados, não só nos limites estreitos de uma única disciplina ou de
um único campo ou especificidade, mas que seja efetivado em conexão com outras áreas do
saber, dentro de um círculo hermenêutico que possa enfrentar a complexidade da própria
condição humana. A mesma visão e metodologia são sustentadas, defendidas e propostas
em ontológicas obras, pelo filósofo, antropólogo, historiador e sociólogo Edgar Morin, nas
quais o autor registra, de forma insistente e consistente, que a complexidade do ser humano e
da própria sociedade, sobretudo a dos tempos modernos, exige e impõe uma urgente
reaprendizagem do próprio aprender. Em outras palavras, os autores citados clamam por
um novo olhar, por um novo caminho em direção a uma verdadeira leitura de mundo e
percepção da realidade. São autores que nos impelem, de forma lancinante, a um caminho
transformador, trilhado por uma metodologia inter / multi/ e transdisciplinar para uma
fascinante e nova jornada da elaboração da reflexão, da consciência, do conhecimento, da
ação e transformação da realidade. Em sua obra Inteligência da Complexidade, Morin
argutamente observa o emaranhado de equívocos, inspirados por um pseudocientificismo em
que a Sociedade Contemporânea vem se permitindo mergulhar, de forma ignara,
fragmentária, arrogante e auto-destrutiva.
[...] Estamos num círculo vicioso, num círculo de intersolidariedade em que é justo distinguir aquilo que é científico, técnico, sociológico, político. Mas é preciso distingui-los e não dissociá-los. E há sempre a cegueira, a incapacidade de olhar-se a si próprio. O conhecimento científico é um conhecimento que não se conhece mais a si próprio. Esse problema, o grande filósofo Husserl havia percebido nos anos 30, numa célebre conferência sobre a crise da ciência ocidental. Ele tinha efetivamente diagnosticado que havia uma missão cega, uma carência fundamental, ou
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seja, a ausência da capacidade do sujeito de se conhecer e de refletir sobre si mesmo. (MORIN; MOIGNE, 2000, p.34).
Hoje em dia há um verdadeiro desapossamento cognitivo sobre qualquer área do
conhecimento e é importante lembrar, como nos coloca Linhares, “o caráter imprescindível do
trabalho interdisciplinar na produção do conhecimento não decorre de uma arbitrariedade
racional abstrata. Decorre da própria forma do homem produzir-se enquanto ser social e
enquanto sujeito e objeto do conhecimento social” (LINHARES, 2005, p.64). Sendo assim,
neste estudo trabalha-se, a percepção do meio ambiente por meio da arte, uma vez que se
pretende estabelecer vizinhanças e tecer vetores de sentido. “Consiste em ampliar o espaço
que se situa entre a excessiva abstração acadêmica e a imediatez irreflexiva”.
(INNERARITY,1995, p.17). Na consideração da experiência da arte como elemento essencial
para um pensamento complexo e interdisciplinar, fez-se necessário refletir sobre as palavras
de Innerarity quando afirma que:
[...] a experiência está presente nas nossas apreciações de gosto, não é uma forma paralela da racionalidade, é antes, a urdidura de todas elas, confirmando-as ou reprovando-as, a fruição estética é uma experiência que nos garante consonância ou inadequação com o mundo, pelo que tem uma função reflexiva que não está ao alcance de um grande esforço científico, nem pode estabelecer-se como precipitada moralização. Prescindir da experiência estética seria renunciar a um meio de conhecimento insubstituível, um luxo a que não pode dar-se qualquer um, e menos ainda numa época de escassas certezas” (INNERARITY,1995, p.18).
A arte estabelece com o meio ambiente um nexo de expansão e alargamento numa atenção
que amplia os horizontes e tempera a receptividade na educação. O que este estudo
encarece é o conteúdo nexológico da arte que é um excelente instrumental e precioso
caminho para um olhar sensível e envolvente no estudo do meio ambiente, tema para cujo
exame a diversidade é o ponto fundamental no que diz respeito ao “ver” e ao “perceber” o
meio ambiente como espaço da vida, deve ser encarado dentro de sua complexidade e
diversidade, tendo como destinatário o gênero humano, beneficiário e também responsável
por sua preservação. Neste sentido, Meio ambiente, Arte e Educação, devem ser pensados
no significado de sua essência e na amplitude de sua destinação. E neste contexto
descobrimos aquilo que a negligência intelectual nos fizera esquecer: a identidade do eu, e do
mundo, do sujeito e do objeto, do espírito e da natureza. Meio ambiente e arte, nos propõem:
múltiplas conexões que circulam, um pensamento cognitivo e reflexivo, de compreensão e
ação, numa educação doadora de sentido, tal como colocado por Marilena Chauí, como fonte
de significado para o mundo. Diria Dufrenne que é com a arte que começa a compreensão e a
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percepção. “[...] Longe de ser uma imitação da natureza, a arte é uma iniciação à nossa
percepção da natureza.” (LALO in: RIBON, 1991, p. 86).
1.4 O LUGAR OCUPADO E O ESPAÇO PRATICADO
É possível dizer que estamos experimentando a perda de conexão com o lugar onde vivemos
e com o meio ambiente que nos cerca, o que sentimos como uma verdadeira erosão da
identidade 1 . A reflexão com relação ao “lugar onde vivemos”, encontra acolhida no
pensamento de Certeau que distingue lugar e espaço. “[...] Um lugar é a ordem (seja qual for)
segundo a qual se distribuem elementos nas relações de coexistência. [...] Aí impera a lei do
“próprio”: os elementos considerados se acham uns ao lado dos outros, cada um situado num
lugar “próprio” e distinto que define. Um lugar, argumenta Certeau, indica uma configuração
de posições. (CERTEAU, 1994, p. 201). Já o espaço, define o autor, é motivado pelo
cruzamento, conjunto de movimentos. “[...] espaço é o efeito produzido pelas operações que o
orientam, o circunstanciam, o temporalizam, o fazem funcionar em unidades polivalente de
programas conflituais ou de proximidades contratuais [...] Em suma, o espaço é um lugar
praticado.” (CERTEAU, 1994, 202). Um lugar onde ocorrem interações, interrelações,
conexões. Entretanto, na contemporaneidade o que se percebe é uma fratura nas
inter-relações, nas interações, nas conexões, há uma profunda desintegração no “espaço”
das comunidades no mundo inteiro, ou seja, o lugar é somente “ocupado”. Perdeu-se de vista
a compreensão do que o conceito de espaço no seu bojo nos traz.
Neste sentido, “[...] As instituições educacionais de todos os níveis precisam desempenhar
uma papel crucial no sentido de alimentar o senso de comunidade e de ter um lugar praticado
no mundo. Isso pode ser feito obtendo-se, como parte do currículo, estudos da biorregião”
(O´SULLIVAN, 2004, p. 356). O estudo da biorregião segundo, este autor, traz nos seus
fundamentos a possibilidade de um olhar sobre o estudo da terra, a história das comunidades
e dos povos que habitaram aquela terra. Despertar na comunidade local essa compreensão
permite cultivar a percepção histórica de uma determinada região, desenvolvendo assim nas
pessoas daquela comunidade o comprometimento do espaço onde vivem. Nessa direção,
uma educação voltada para o meio em que se vive, resgata a identidade como estratégia de
1 A questão da identidade é aqui considerada face às reflexões de Cuche, “[...] identidade remete a uma
norma de vinculação, necessariamente consciente, baseada em oposições simbólicas.” (CUCHE, 2002, p. 176). A identidade é construída, reconstruída, e resulta de interações entre outros, a questão da alteridade se encontra presente, não existe identidade sem considerar o outro. A identidade emerge de um processo de identificação.
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envolvimento com o espaço, que é seu mas que é também de todos, possibilitando entre
outros fatores, o desenvolvimento de uma economia local capaz de se auto-sustentar.
Segundo Certeau (2002, p. 202), lugar é uma configuração de posições, os elementos se
acham uns ao lado dos outros, implica uma indicação de estabilidade. Já, quanto ao espaço,
“[...] sempre se tomam em conta vetores de direção, quantidades de velocidade e a variável
tempo. O espaço é um cruzamento de móveis. É de certo modo animado pelo conjunto de
movimentos que aí se desdobram”. “De acordo com Zukin (2000, apud ARANTES, p. 84) a
paisagem é claramente uma ordem imposta ao ambiente construído ou natural. Portanto ela é
sempre socialmente construída: é edificada em torno de instituições sociais dominantes [...]”.
Neste ponto, deve-se afastar entendimentos no sentido da intocabilidade. A ação antrópica do
homem é inafastável, mas pode e deve acontecer de forma positiva. Essa reflexão nos
remete a uma necessária e profunda compreensão do lugar que o ser humano ocupa nesse
espaço. A possibilidade do “cruzamento de móveis” que o autor nos aponta, deve acontecer
de forma respeitosa, dialógica como argumenta Morin, em forma de diálogo e não de conflitos
ou circuntâncias irreversíveis. Mas para que haja diálogo é preciso que exista, em primeiro
lugar um conhecimento do espaço, e uma reflexão acerca desse espaço, quando ocupado. A
questão da invasão em áreas de manguezais é muito séria. Em sobrevôo realizado pelo
IBAMA no ano de 1995, na Baía da Babitonga fica clara a falta de conhecimento do espaço, a
falta de compreensão acerca desse ecossistema, a par de outros fatores, como ganância,
especulação imobilária, e o processo de invasão é insopitável, crescente. Josué de Castro em
romance, preciosa obra de 1.967 “Homens e Caranguejos”, já nos alertava para essas
questões, e de forma lancinante, através de seu personagem Chico: “[...] Há sempre os
atravessadores, os aventureiros especializados em se apossar dessas novas terras, para
batizá-las com um nome próprio e registrá-las imediatamente no competente serviço de
terras. Preparando-se desta forma esses aventureiros para explorar, no futuro, essas terras,
depois de crescidas, como rendosos feudos de mocambos [...]”. (CASTRO, 1967, p. 146).
Acredita-se que a arte é um, dentre outros caminhos, que podem conduzir ao conhecimento, à
compreensão, à reflexão sobre espaço e lugar, tão imprescindíveis a concretização de uma
educação ambiental, numa proposta dialógica que envolva ser humano e natureza, ser
humano e meio ambiente, uma vez que a arte estabelece vínculos com o pensamento
sensível, despertando percepções para recriação do universo. A arte não diz, não ensina: a
arte envolve. E, de acordo com Ribeiro (1998, apud Ruiz, p. 128) para o despertar da
consciência ecológica é preciso afetar, tocar, envolver, enfim, sensibilizar os indivíduos, de
maneira a estimular uma força e um empenho intrínsecos na reconstrução de valores, crenças
e atitudes. A autora afirma ainda que: “a falta de sensibilidade perceptiva, unida à falta de
tempo, ganância e à influência da ciência e da atual forma de vida, afasta o homem da
natureza e da sua própria totalidade”. (RIBEIRO in: RUIZ, 1998, p. 129). É no sentido da
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construção de um pensamento sensível, que a presente pesquisa pretende contribuir, criar
condições que proporcionem um olhar respeitoso e ético, um olhar profundamente humano e
perceptivo do “espaço praticado”.
2 METODOLOGIA
A pesquisa foi realizada no período de outubro de 2006 a maio de 2007, em três escolas
localizadas no entorno da Baía da Babitonga: 1 (uma) escola no município de São Francisco
do Sul - Escola Municipal João Dias, 1 (uma) escola no município de Joinville - Escola
Municipal Dr. José Antônio Navarro Lins – e 1 (uma) escola no município de Itapoá -Escola
Municipal Euclides Emídio da Silva. Essas escolas foram selecionadas especialmente por
encontrarem-se localizadas a 500 metros do manguezal, pois se tinha como pressuposto que
as comunidades pesquisadas deveriam estar inseridas em áreas próximas desse
ecossistema.
2.1 POPULAÇÃO E AMOSTRA
O convite para participar desta pesquisa foi lançado a todos os alunos das 6ª séries das
escolas citadas na metodologia, porém a amostra foi formada pelos alunos, que se
inscreveram de forma voluntária. A escolha da população deu-se em função do próprio
conceito da palavra manguezal que tem, em seu bojo, o sentido de coletividade, ou seja, o de
uma comunidade de árvores. Partiu-se de uma metáfora da idéia de comunidade de árvores
locais para a de uma comunidade de adolescentes locais. Segundo Lepoutre (apud Morin,
2004, p. 451), as comunidades constituídas pelos adolescentes unem-se fortemente por um
sentimento de solidariedade. A idade da população (adolescentes de 12/13 anos) também foi
levada em consideração, uma vez que segundo Limongi (1998, p. 118) “Nesta fase o
adolescente está [...] obcecado pelos problemas sociais, pelas teorias e sistemas que
engedra a fim de solucionar os problemas do mundo”.
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2.2 CAMINHOS PERCORRIDOS - ETAPAS DA PESQUISA
1º Encontro - Apresentação do projeto com a explicação do caminho a ser construído para a
compreensão do ecossistema manguezal. Realizou-se um diagnóstico preliminar, por meio de
relatos dos adolescentes sobre seu conhecimento relativo ao ecossistema manguezal
(depoimentos filmados), a partir das perguntas: - O que é manguezal, e qual sua importância?
2º e 3º Encontro - Visou à sensibilização do olhar para com o mangue, por meio da
linguagem da fotografia de André Alves e das esculturas de Frans Krajcberg, 4º Encontro-
Exibição do filme “A Vida de Krajcberg”, 5º Encontro - Visita ao manguezal com o objetivo de
estimular percepções dos estudantes sobre o ecossistema. Num segundo momento, ainda no
manguezal, com objetivo de resignificar os resíduos da destruição do mangue local, os alunos
fotografaram, filmaram e coletaram os resíduos para posterior construção de objetos. 6º
Encontro - Neste dia as atividades foram vivenciadas em forma de atelier, uma oficina. 7º
Encontro - Escolha das fotografias para a exposição. 8º Encontro- Montagem da exposição
(escolheu-se ponto estratégico dentro do município de cada escola). No final deste último
encontro e encerrando as atividades, os adolescentes foram novamente questionados: O que
é manguezal? E qual sua importância?
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Em cada escola, naturalmente, os resultados apresentaram-se com características diferentes
e peculiares: na Escola Municipal João Dias, município de São Francisco do Sul, os
adolescentes se sensibilizaram, de forma aguda, com o lixo avistado no manguezal, ficando
nítida esta percepção em seus trabalhos finais, tendo o lixo como eixo central: (figuras 6-11)
3.1 COMPARATIVO POR APROXIMAÇÃO (COM BASE NA ANÁLISE RETÓRICA)
Quem: Adolescentes Escola Municipal Navarro Lins- Joinville.
O quê: (1) Imagens apresentadas em sala de aula -entre outras-.
Onde (2) Experiência em campo no manguezal- adolescentes presenciaram-.
Quando (3) Depois da pesquisa o resultado da produção artística dos adolescentes.
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Figuras 6-7- Lixão II – Imagens exibidas para os alunos – Fonte: ALVES, 2004, p.101
Figuras 8-9 – Lixo encontrado no manguezal de São Francisco do Sul
Figuras 10-11 – Esculturas construídas com lixo recolhido do manguezal
3.2 COMPARATIVO POR APROXIMAÇÃO (COM BASE NA ANÁLISE RETÓRICA)
Quem: Adolescentes Escola Municipal Navarro Lins- Joinville. (figuras 12-17)
O quê: (1) Imagens apresentadas em sala de aula -entre outras-.
Onde (2) Experiência em campo no manguezal - adolescentes presenciaram-.
Quando (3) Depois da pesquisa o resultado da produção artística dos adolescentes.
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Na Escola Dr. José Antônio Navarro Lins, município de Joinville, os adolescentes de
área mais urbanizada, (maioria deles), nunca haviam entrado em um manguezal, fato que a
pesquisa registrou, com estranheza, tendo em vista que a escola em referência é situada ao
lado de um manguezal, fato que nos leva a refletir quanto à urgência com que as escolas
devem repensar sua própria identidade espacial e sócio-cultural. A omissão da interação
escola/aluno no tocante ao reconhecimento de sua biorregião foi revelada, de forma
ostensiva, nos trabalhos finais produzidos pelos adolescentes desta escola, trabalhos estes
que tiveram como temática preferida o lodo do manguezal, solo em pisaram pela primeira vez.
Figuras 12-13 – Imagens exibidas para os alunos – Fonte: ALVES, 2004
Figuras 14-15 – Experiência em campo com registro fotográfico realizado pelos adolescentes
Figuras 16-17 - Produção Artística dos adolescentes de Joinville
Buscou-se agrupar as imagens de acordo com a temática desenvolvida na produção artística.
Na primeira fileira horizontal: as imagens mostradas em sala de aula referem-se a espécies
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vegetal e animal e ao solo, típicos do ecossistema manguezal: caranguejo, árvores e lodo. Na
segunda fileira horizontal: as imagens referem-se ao que foi percebido e fotografado
diretamente pelos adolescentes nos manguezais do município de Joinville. Na terceira fileira
horizontal: as imagens referem-se à produção artística dos adolescentes, observando-se
nelas, como temática central dos trabalhos: as espécies, vegetal e animal, bem como solo
-lodo-, componentes do ecossistema. Do exame dessas imagens é possível concluir que
dentre as espécies componentes dos manguezais visitados, o lodo nos manguezais, foi o que
mais impressionou os adolescentes do município de Joinville, impressão materializada por
eles na sua produção artística-bidimensional e tridimensional-, comprovada pelas fotos acima
apresentadas. A questão do lodo foi muito presente nesta escola. De 15 trabalhos, 12
desenvolveram sua produção artística com o material lodo. Outros 3 trabalhos foram
produzidos com galhos de manguezais. Do exame das imagens acima é também possível
notar a sensibilização dos adolescentes com a poética de Alves e de Krajcberg.
3.3 COMPARATIVO POR APROXIMAÇÃO (COM BASE NA ANÁLISE RETÓRICA)
Quem: Adolescentes Escola Municipal Euclides Emídio da Silva- Joinville.
O quê: (1) Imagens apresentadas em sala de aula -entre outras-.
Onde (2) Experiência em campo no manguezal - adolescentes presenciaram-.
Quando (3) Depois da pesquisa o resultado da produção artística dos adolescentes.
Já na Escola Euclides Emídio da Silva no município de Itapoá, ao contrário do que
imaginava por se tratar de uma escola mais distante de um centro urbano, a pesquisa
encontrou adolescentes bem informados com um repertório mais consistente e concreto que
os demais. Restou igualmente nítida a existência de articulação real e efetiva entre
escola/alunos, no que diz respeito não somente à transmissão de informações, mas a uma
formação pessoal pela experiência e cooperação. Ficou evidente nesta escola, à luz do
trabalho ali produzido, a vivência e relevância do trabalho coletivo, do espírito de motivação e
cooperação da escola, cuja influência positiva se materializou diretamente em ações
concretas dos alunos observadas durante a pesquisa. (figuras 18-22).
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Figuras 18-19 Imagens apresentadas em sala para alunos de Itapoá
Figuras 20-21 Experência em Campo no manguezal de Itapoá
Figura 22- Escultura Coletiva Itapoá
Buscou-se agrupar as imagens de acordo com a temática desenvolvida na produção artística.
Na primeira fileira horizontal:, as imagens mostradas em sala de aula referem-se a
conjuntos de árvores queimadas, destruídas provavelmente por ação antrópica. Na segunda
fileira horizontal:, as imagens referem-se ao que foi percebido e fotografado diretamente
pelos adolescentes nos manguezais do município de Itapoá. Na terceira fileira horizontal: a
imagem refere-se à produção artística dos adolescentes, observando-se nela, como temática
central do trabalho, um conjunto de árvores e galhos queimados. Do exame dessas imagens
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é possível concluir que, dentro dos manguezais visitados, o que mais impressionou os
adolescentes do município de Itapoá, foi ao lado da queimada (destruição antrópica), a idéia
de conjunto, aurida no conjunto de árvores e no conjunto de galhos destruídos, e observados
pelos adolescentes, impressão que restou materializada por eles na sua produção
artística-bidimensional e tridimensional-, quando preferiram e optaram, espontânea e
conscientemente, um único trabalho, ou seja, um trabalho coletivo. Neste ponto, a pesquisa
capta, na exposição final dos trabalhos, e com feliz surpresa, um momento de luz,
consubstanciado na metáfora: manguezal comunidade de árvores. A construção de um
pensamento ético, moral e participativo é possível ser também percebida neste último
trabalho dos adolescentes. Ainda que como pequena semente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados desta pesquisa indicam que os caminhos da educação ambiental articulados
com a arte, -diálogo meio ambiente/arte-, conduzem à consciência e à reflexão, elaboram um
olhar perceptivo, crítico e sensível, atento ao impacto provocado pela degradação ambiental e
estimulam uma “ação-já” quanto à preservação dos manguezais como berços da vida,
biorregião dos adolescentes envolvidos pela pesquisa. Importante, entretanto, é dar
seguimento ao trabalho exploratório até o momento realizado, dando-lhe continuidade e
aprofundamento futuro. A pesquisa demonstrou também, não apenas a capacidade de
interesse, mas a de facilidade de assimilação, por parte dos adolescentes, com relação a
temas complexos, tais como o do meio ambiente/arte, quando desenvolvidos em conjunto
com outras áreas do saber, como geografia/história (Baía da Babitonga); sociologia/filosofia
(sociedade de consumo e valores); fotografia/cinema (imagens dos manguezais);
direito/democracia participativa (leis e deveres de cidadania); educação/ética (respeito à
alteridade (diferenças e a busca do bem comum), entre tantos outros. A pesquisa demonstrou
ainda o quanto os adolescentes necessitam, valorizam e retribuem em abertura e
disponibilidade, participação e inteligência, o fato de serem percebidos, respeitados a
valorizados. Neste ponto percebeu-se o quanto é fundamental que o professor/educador seja
capacitado não somente para transmitir, mas, sobretudo para aprender a aprender, e
aprender a ensinar aprendendo a ouvir e compartilhar recíprocas experiências e saberes, tal
como se nos apresenta e nos ensina o próprio meio ambiente em suas cores, sons,
diversidade e reciprocidade. Os resultados apresentados na produção artística bidimensional
(fotografia) e tridimensional (escultura), e nas falas (manifestações/opiniões/propostas) dos
adolescentes demonstraram que, por meio da exploração, observação, percepção e
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contemplação que a arte incita, com base em sólida teoria ambiental e abordagem
multisdisciplinar, demonstrou também que é possível despertar não só um olhar sensível,
mas, paralelamente, um senso crítico para as questões da degradação ambiental e, em
decorrência, estimular nos adolescentes o interesse, a vontade política e a decisão quanto à
concretização de ações participativas de conservação e preservação, reafirmando, dessa
forma, a transversalidade como proposta pedagógica efetiva em Educação no sentido mais
amplo da palavra e que se destine ao respeito, resguardo e proteção inclusive das futuras
gerações. Vale ressaltar, no entanto, que para a eficácia da metodologia
inter-multi-transdisciplinar, torna-se imprescindível que o educador se despoje de uma visão
conservadora e que construa para si mesmo, no seu cotidiano como algo fundamental, um
pensar complexo e um olhar propiciatório ao estabelecimento de relações/ interações,
pensamento e olhar capaz de maravilhar-se com a alteridade, com o sagrado e com a
diversidade e um olhar capaz, enfim, de tecer vetores de sentido e significação. A proposição
de desenvolver um encaminhamento metodológico de educação ambiental articulado com a
arte, -embora sem descartar e também atenta a outras múltiplas áreas do saber-, mostrou-se
um caminho interessante e possível de ser trilhado em busca de um magistério cooperativo,
dialógico e, assim, mais humano e solidário.
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