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A liturgia na segunda fase da Reforma Aula preparada por: Vinicius Couto APRESENTAÇÃO A segunda fase da Reforma compreende as ocorrências na França, Suíça, Holanda, Escócia e Inglaterra. O tema será subdividido nesta aula através dos reformadores dessa fase, a saber: Calvino, Zwinglio, Knox, e Cranmer. OBJETIVOS Conhecer o pensamento litúrgico dos principais teólogos que compõem a segunda fase da Reforma protestante. ULRICH ZWINGLIO Zwinglio (1484-1531) nasceu em Wildhaus, povoado da Suíça. Estudou nas Universidades de Viena e da Basiléia, recebendo aulas de mestres humanistas, representantes do movimento renascentista, pensamento este que moldou e influenciou Zwinglio. Foi sacerdote em Glarus (1506) e em Einsiedeln (1516). Influenciado pelo Novo Testamento grego publicado por Erasmo de Roterdã, tornou-se um estudioso das Escrituras e um pregador bíblico. Chegou a copiar à mão todas as epístolas de Paulo e as lia constantemente e após uma década de estudos, inclinou-se gradualmente para as ideias protestantes. Em 1522 surgiram as primeiras divergências com a doutrina católica, quando ele publicou um livro depondo as ideias que não concordava do catolicismo e, por conseguinte, seu afastamento do papado. Em uma declaração escrita de seus pontos de vista, Zwinglio expôs seu favoritismo para com o sacerdócio universal dos crentes, a salvação pela fé e não pelas obras e a autoridade da Escritura ao invés da papal. Não obstante, ele atacou o primado dos papas, a missa e o celibato clerical. Zuínglio defendia o consumo de carne na quaresma e o casamento dos sacerdotes, alegando não serem essas coisas proibidas nas Escrituras e propôs o princípio de que tudo devia ser julgado pela Bíblia. Com essas ideias iniciais, Zwinglio implantou o culto em Zurique. Basicamente, a liturgia adotada consistia na substituição da missa por um serviço de comunhão, a

Aula 06 - A Liturgia Na Segunda Fase Da Reforma

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  • A liturgia na segunda fase da Reforma

    Aula preparada por: Vinicius Couto

    APRESENTAO

    A segunda fase da Reforma compreende as ocorrncias na Frana, Sua, Holanda,

    Esccia e Inglaterra. O tema ser subdividido nesta aula atravs dos reformadores dessa

    fase, a saber: Calvino, Zwinglio, Knox, e Cranmer.

    OBJETIVOS

    Conhecer o pensamento litrgico dos principais telogos que compem a segunda

    fase da Reforma protestante.

    ULRICH ZWINGLIO

    Zwinglio (1484-1531) nasceu em Wildhaus, povoado da Sua. Estudou nas

    Universidades de Viena e da Basilia, recebendo aulas de mestres humanistas,

    representantes do movimento renascentista, pensamento este que moldou e influenciou

    Zwinglio. Foi sacerdote em Glarus (1506) e em Einsiedeln (1516).

    Influenciado pelo Novo Testamento grego publicado por Erasmo de Roterd,

    tornou-se um estudioso das Escrituras e um pregador bblico. Chegou a copiar mo

    todas as epstolas de Paulo e as lia constantemente e aps uma dcada de estudos,

    inclinou-se gradualmente para as ideias protestantes.

    Em 1522 surgiram as primeiras divergncias com a doutrina catlica, quando ele

    publicou um livro depondo as ideias que no concordava do catolicismo e, por

    conseguinte, seu afastamento do papado. Em uma declarao escrita de seus pontos de

    vista, Zwinglio exps seu favoritismo para com o sacerdcio universal dos crentes, a

    salvao pela f e no pelas obras e a autoridade da Escritura ao invs da papal.

    No obstante, ele atacou o primado dos papas, a missa e o celibato clerical. Zunglio

    defendia o consumo de carne na quaresma e o casamento dos sacerdotes, alegando no

    serem essas coisas proibidas nas Escrituras e props o princpio de que tudo devia ser

    julgado pela Bblia.

    Com essas ideias iniciais, Zwinglio implantou o culto em Zurique. Basicamente, a

    liturgia adotada consistia na substituio da missa por um servio de comunho, a

  • exposio da Escritura durante a pregao e a remoo de smbolos catlicos, inclusive da

    cruz. O elemento central do culto na viso zwingliana era a pregao da Palavra e

    manteve muitos poucos elementos ao lado da prdica. Baniu a msica do culto, pois

    achava que esta tem um poder sedutivo. Juntamente com a msica, ele retirou

    qualquer manifestao artstica, tais como as artes visuais e iconografias e mandou pintar

    todas as paredes de branco.1

    Zwinglio foi mais radical do que Lutero e defendia o princpio sola Scriptura mais do

    que ningum. Nichols comenta que, sendo homem da nova era, procurou remover tudo

    o que cheirasse velha ordem religiosa e que no tivesse apoio bblico.2

    Em relao celebrao da Ceia, Zwinglio divergiu de Lutero recomendando que ela

    fosse observada trimestralmente, isto , quatro vezes ao ano e instituiu que quando

    estivesse sendo observada a Ceia, que o po e o vinho fossem levados para a

    congregao.3

    Zwinglio uniu foras com os luteranos para que batalhassem juntos pela f

    protestante e formaram uma espcie de liga defensiva. Entretanto, os dois reformadores

    concordavam em quase tudo. Havia quinze artigos protestantes que definiam os assuntos

    bsicos da f crist. Zwinglio concordava com quatorze, exceto o artigo que abordava

    sobre a Santa Ceia. Lutero defendia a ideia da consubstancialidade e Zwinglio um

    memorial.

    Essa diferena doutrinria fez a primeira diviso no protestantismo: luteranos e

    reformados.4 Ao contrrio do que se pensa, a teologia reformada no nasce de um

    pensamento calvinista. Ela tem seu bero na controvrsia da Santa Ceia embatida pelos

    telogos protestantes Lutero e Calvino.

    JOO CALVINO

    Calvino (1509-1564) nasceu em Noyon, cidade da Frana. Seu pai era um advogado

    rico que tinha ligao com o alto clero francs. Estudou Direito por influncia paterna,

    mas retornou aos estudos teolgicos aps a morte de seu pai.

    No se tem certeza de quando, onde e como Calvino se tornou protestante, mas a

    mudana foi fruto das influncias dos novos estudos e ensinos de Lutero. Ele mesmo

    conta ter passado, em 1533, pelo o que ele mesmo denominou de sbita converso,

    dizendo que outrora estava teimosamente preso s supersties do papado e que no

    era possvel desvencilhar-se desse profundo lamaal, mas que Deus havia subjugado seu

    1 RICE, Howard; HUFFSTUTLER, James. Reformes Worship. Louisville: Geneva Press, 1997, p. 3.

    2 NICHOLS, Robert H. Histria da Igreja Crist. So Paulo: Cultura Crist, 2000, p. 173.

    3 SENN, Frank.Christian Liturgy: Catholic and Evangelical. Minneapolis: Fortress Press, 1997, 62.

    4 Ibid, p. 174.

  • corao da obstinao de sua idade para a docilidade e conhecimento da verdadeira

    piedade, mediante Sua providncia secreta.5

    Quando Lutero afixou as 95 teses na porta da igreja no castelo de Wittenberg, Joo

    Calvino tinha oito anos de idade. Vendo dificuldade para que houvesse reforma em Paris,

    Calvino mudou-se para Basel, na Sua. L, ele escreveu e publicou suas institutas no ano

    de 1536.

    Impossibilitado de voltar para Estrasburgo em funo da guerra entre Frana e

    Alemanha, foi para Genebra, atuando com Guilherme Farel. Os dois acabaram sendo

    expulsos de Estrasburgo e Calvino foi para Genebra, onde pastoreou uma igreja de

    refugiados franceses.

    A cidade de Genebra era toda protestante e isso exigiria muito de Calvino. Foi

    preciso reorganizar a comunidade, elaborar leis que expressassem a moral bblica e que

    fosse adotado um sistema educacional de primeira ordem. Com relao organizao da

    igreja, ele criou o sistema de Consistrio, o qual era composto por presbteros que

    vigiavam a conduta do povo e dos ministros e implementou a administrao da

    beneficncia da cidade atravs dos diconos.

    Calvino tambm criou um forte sistema educacional, que culminava na Academia.

    Para ele, educao e religio eram inseparveis. Ele trouxe vrios Mestres de qualidade

    para as escolas e Genebra e muitos estrangeiros vinham estudar por l, dentre os quais,

    vale destacar John Knox.

    Em relao ao culto, as influncias de Calvino vinham do reformador de Basel, John

    Oecolampadius. De acordo com ele, a Bblia no d um ensino objetivo de como deve ser

    a liturgia crist. Entretanto, o culto precisa estar composto de elementos essenciais, tais

    como a justificao pela f, a graa providente e acima de tudo, o amor cristo. No

    obstante, o culto cristo precisa ser simples, sem rituais pomposos ou cerimnias

    suntuosas, pois o viver de Cristo era simples e sem pretenso.6

    Calvino se diferenciou tanto de Lutero quanto de Zwinglio na expresso cltica.

    Enquanto para o ltimo, a msica havia sido abolida, para Calvino ela tinha o poder de

    inflamar o corao humano com zelo espiritual. Pensando assim, o reformador francs

    recrutou vrios msicos para a igreja genebrina e encomendou diversas melodias. Isso

    tambm se deve ideia calvinista (entenda-se de Calvino) de que havia a orao falada e

    a cantada.

    As msicas que seriam cantadas nas igrejas deveriam ser simples, algo que no

    requeresse treinamento e tampouco habilidade vocal, visto que deveria se cantada por

    5 CALVINO, Joo. Comentrio de Salmos. Volume I. Fiel, 2009, p. 32.

    6 OLD, Hugues O. Guides to the Reformed Tradition. Louisville: Westminster John Knox Press, 1997, p. 4.

  • toda a congregao.7 A diferena mais expressiva entre Calvino e Lutero, pelo menos no

    que se diz respeito msica, encontra-se na nfase doutrinria. Na hindia luterana o

    alvo recai sobre a graa consoladora, prevalecendo a alegria e a paz daquele que cr e

    justificado. Apesar de Calvino no fugir dessa ideia, ele deixa sobressair a obedincia.

    Para se ter dimenso da importncia de Calvino para a msica na liturgia, vale o

    comentrio de que ele escreveu em 1539 um saltrio francs intitulado Aulcuns Psalmes

    et Cantiques mys em Chant. Esse saltrio possua dezessete salmos metrificados, dentre

    os quais havia cinco de sua autoria e doze de Clment Marot. Este trabalho serviu como

    base para seu saltrio posterior em Genebra.

    Seguindo o caminho de Lutero, Calvino era contra a ideia da Missa praticada pela

    Igreja Catlica. De acordo com ele, De todos os dolos, ele no conhecia nenhum to

    grotesco como aquele no qual o sacerdote evocava Cristo em suas mos pela enunciao

    mgica e oferecia-o novamente no altar do sacrifcio, enquanto o povo olhava com

    admirao estpida.8

    Calvino tambm elaborou uma obra intitulada Ratio et Forma Publice Orandideum,

    at que Administrandi Sacramenta, et Caet. Essa obra era um manual litrgico. Segundo

    esta obra, o culto era dividido em canto inicial, orao de confisso, cnticos, coleta,

    sermo, cntico final e bno final. Na ordem para a celebrao da ceia, a congregao

    cantava o Credo Apostlico no incio, o Salmo 138 durante a comunho e o cntico de

    Simeo aps a orao final de gratido.9

    Corroborando com a apresentao anterior, lvarez explica que o culto de Calvino

    era dividido em duas partes: a liturgia da Palavra e a liturgia do alto aposento. No

    primeiro havia a seguinte ordem: leitura dos salmos, confisso de pecados, orao de

    iluminao e sermo. Na segunda parte havia a coleta com orao, intercesses, Pai-

    Nosso parafraseado, recitao do Credo Apostlico, instituio da Santa Ceia com orao

    de exortao e consagrao, orao posterior comunho e beno sacerdotal.10

    James White explica esse rito cltico:

    O rito comea com uma vigorosa orao de confisso observando

    que somos incapazes de qualquer bem, e em nossa depravao

    transgredimos infinita e incessantemente os santos

    mandamentos. Segue-se a absolvio, depois de um elemento

    introduzido por Bucer, o canto do Declogo. Faz-se uma orao

    7 RICE, Howard; HUFFSTUTLER, James. Op. Cit., p. 3.

    8 BARD, Thompson. Liturgies of the Western Church. Philadelphia: Fortress Press, 1980, p. 185.

    9 Ibid, pp. 203-204.

    10 LVAREZ, Juan J. Varela. El Culto Cristiano: origen, evolucin, actualidad. Barcelona: CLIE, 2002, p. 106.

  • espontnea, canta-se um salmo metrificado para ento se

    pronunciar uma orao de coleta rogando por iluminao,

    elemento este supostamente comum no culto cristo antigo (...)

    Seguem-se a leitura e o sermo. Uma longa intercesso pastoral

    de intercesso, uma petio e uma parfrase do Pai-Nosso

    precedem a bno de encerramento.11

    Calvino desejava que a Ceia fosse celebrada semanalmente, porm, os moradores

    de Genebra estavam acostumados a realiza-la mais esporadicamente. Calvino at sugeriu

    que fosse mensalmente, mas recebeu a instruo de realiza-la quatro vezes ao ano. A

    liturgia supracitada foi adotada como que contando com a celebrao da Ceia.

    Entretanto, quando no fosse o dia determinado para tal celebrao, as diretivas

    eucarsticas da liturgia deveriam ser omitidas.

    JOHN KNOX

    Knox (1514-1572) provavelmente tenha nascido no povoado de Haddington, s

    margens do rio Tyne, a cerca de 30 km de Edimburgo. Recebeu bons estudos e formou-se

    academicamente na Universidade de Saint Andrews. descrito pelo historiador Cairns

    como sendo um homem corajoso, mas ao mesmo tempo rspido, que no temia a

    ningum, seno a Deus.12

    Foi ordenado para o sacerdcio catlico em 1536 e se tornou discpulo de George

    Wishart, o qual introduziu na Esccia os ideais zwinglianos. Wishart chegou a ser

    martirizado. Morreu queimado em uma estaca no ano de 1536. Transferiu-se para

    Londres e serviu como um dos capeles reais. Nessa poca, ele se encontrou com Thomas

    Cranmer e colaborou para a reviso dos 39 artigos.

    Logo que Maria Tudor subiu ao trono da Inglaterra, ele fugiu para a Sua e se

    tornou aluno de Calvino. Aps passar alguns anos em Genebra, retornou ao seu pas em

    1559 e era desejo seu implantar a igreja Presbiteriana Escocesa. A aceitao do

    protestantismo ocorreu no contexto da luta pela independncia do domnio francs e no

    ano de 1567, a missa foi declarada ilegal e a igreja escocesa foi organizada em

    presbitrios, snodos e uma assembleia geral, tal qual acontecia em Genebra.13

    11

    WHITE, James F. Introduo ao Culto Cristo. So Leopoldo: Sinodal, 1997, p. 110. 12

    CAIRNS, Earle E. O cristianismo atravs dos sculos: uma histria da igreja crist. So Paulo: Vida Nova, 1988, p. 260. 13

    GONZLEZ, Justo. Uma histria Ilustrada do Cristianismo: a era dos reformadores at a era inconclusa. Volume II. So Paulo: Vida Nova, 2011, pp. 79-83.

  • A liturgia de Knox era estritamente baseada naquilo que recebeu dos pensamentos

    reformados. Ele enxergava a Escritura como princpio regulador da adorao, fazendo

    jus ao sola Scriptura.

    Em sua obra A Vindication of the Doctrine That Sacrifice of the Mass is Idolatry (Uma

    Vindicao da Doutrina de que o Sacrifcio da Missa Idolatria), ele declarou: Toda

    adorao, honra, ou servio inventada pela mente do homem na religio de Deus, sem

    Seu expresso mandamento, idolatria. A missa foi inventada pela mente do homem, sem

    qualquer mandamento de Deus; portanto, ela idolatria (...) [e] blasfema morte e

    paixo de Cristo.

    A Confisso Escocesa de F, que foi elaborada por Knox e outros cinco ministros no

    ano de 1560, declara em seu artigo 20 que

    na Igreja, em que - como casa de Deus que - convm que tudo seja

    feito com decncia e ordem. No que pensemos que a mesma

    administrao ou ordem de cerimnias possa ser estabelecida para

    todas as pocas, tempos e lugares; pois, como cerimnias que os

    homens inventaram, so apenas temporais, e, assim, podem e devem

    ser mudadas quando se percebe que o seu uso fomenta antes a

    superstio que a edificao da Igreja.

    Sua liturgia, portanto, era baseada na experincia que teve com Calvino e outros

    telogos da Reforma na Sua e na Inglaterra. Ele centralizava a pregao da Palavra,

    reconhecia apenas dois sacramentos e cria que eles s poderiam ser administrados pelos

    ministros ordenados e as oraes do culto eram livres.

    As Escrituras deveriam ser lidas de forma ordenada, do incio ao fim. Uma leitura

    interpolada devia ser evitada. Ele dizia: Pulando e divagando de um lugar ao outro da

    Escritura, seja na leitura, ou na pregao, julgamos no ser proveitoso para edificar a

    igreja, como o seguimento contnuo de um texto.

    THOMAS CRANMER

    A Reforma na Inglaterra ocorreu de maneira diferenciada das demais reformas na

    Europa. O rei Henrique VIII queria divorciar-se de sua esposa, Catarina de Arago, pois

    ela s lhe dera uma filha, mas a Igreja catlica era contra o divrcio. O rei, ento, rompeu

    com ela (Igreja Catlica) e nomeou o telogo Thomas Cranmer, da Universidade de

    Cambridge, Primaz em toda a Inglaterra, o qual se tornou arcebispo de Canturia.

  • Cranmer (1489-1556) aprovou o divrcio e o novo casamento do rei. Em 1534 o rei

    declarou-se chefe da Igreja catlica Inglesa. Nos anos seguintes, Henrique ainda teria

    outras quatro esposas: Jane Seymour, Ana de Cleves, Catarina Howard e Catarina Parr.

    Durante todo o reinado de Henrique, a igreja na Inglaterra era permaneceu catlica na

    sua doutrina e em sua liturgia, com a diferena de que estava independente de Roma.

    Apesar da ligao doutrinria com a Igreja de Roma, o Rei Henrique proferiu uma

    ordem de que cada Igreja tivesse uma Bblia completa, de grande formato, na lngua

    inglesa e fosse colocada onde o povo pudesse ler com facilidade. A Bblia usada pelo povo

    era principalmente de traduo feita por Tyndale, diretamente dos originais.14

    Henrique morreu na f catlica e foi sucedido no trono por Eduardo VI (1547-1553).

    Os tutores do jovem rei implantaram a Reforma na Inglaterra e puseram fim s

    perseguies contra os protestantes. Nesse perodo foram aprovados dois importantes

    documentos escritos pelo arcebispo Cranmer, o Livro de Orao Comum (1549; revisto

    em 1552) e os Quarenta e Dois Artigos (1553), que era uma sntese das teologias luterana

    e calvinista.

    Cranmer implantou uma liturgia vernacular e estabeleceu a ordem cltica da

    seguinte maneira, conforme consta no Livro de Orao Comum: comeava com um salmo

    de introito, Pai-Nosso, orao de coleta por pureza, kyrie15, gloria in excelsis, saudao,

    coleta do dia e coleta pelo rei. Seguem-se imediatamente a epstola e o evangelho, vindo

    a seguir o credo Niceno e o sermo. O culto passa ento para a exortao e a eucaristia.

    Dois elementos foram transplantados para dentro da prpria eucaristia: intercesses

    aparecem logo aps o Sanctus, e a confisso vem antes da comunho.16

    lvarez, por sua vez, detalha o culto anglicano da seguinte forma: Pai-Nosso com

    orao introdutria, leitura do declogo, recitao do Kyrie, orao pelo rei, leitura

    epistolar e dos evangelhos, recitao do Credo e pregao. Em seguida, o culto continua

    com as ofertas, orao pea Igreja universal, confisso de pecados e anncio da graa,

    recitao do Sursum Corda,17 consagrao dos elementos, comunho, orao, cntico e

    bno final.18

    Eduardo era doentio e morreu ainda jovem, sendo sucedido por sua irm Maria

    Tudor (1553-1558), conhecida como a sanguinria, filha de Catarina de Arago. Maria

    perseguiu os lderes protestantes e muitos foram levados fogueira. Os mrtires mais

    famosos foram Hugh Latimer, Nicholas Ridley e Thomas Cranmer.

    14

    NICHOLS, Robert H. Op. Cit., p. 190. 15

    Trata-se de uma orao antifonal em que a congregao responde s peties ministradas pelo sacerdote com a seguinte frmula: Senhor, tende piedade, Cristo tende piedade, Senhor, tende piedade. 16

    WHITE, James F. Op. Cit., p. 110. 17

    Orao litrgica, cujo sentido elevemos nossos coraes. 18

    LVAREZ, Juan J. Varela. Op. Cit., p. 107.

  • Com a morte de Maria, subiu ao trono sua meia-irm Elizabete I (1558-1603) e a

    Inglaterra tornou-se definitivamente protestante. Em 1563, foi promulgado o Ato de

    Uniformidade, que aprovou os Trinta e Nove Artigos de f. Dessa vez, os artigos no mais

    tentavam fazer uma ponte entre o calvinismo e o luteranismo, mas se inclinavam com

    mais vigor para a primeira opo. Nesse perodo surgiram os puritanos.

    Os puritanos queriam que o culto da Igreja inglesa se libertasse de muitas coisas

    que os desagradavam, tais como as vestimentas e os aparatos cerimoniais que eram

    considerados como pertencentes velha ordem medieval. Eles ainda eram contrrios

    forma de governo episcopal, adotada pela igreja da Inglaterra e mostravam preferncia

    pela forma de governo presbiteriana.

    Alguns queriam que cada congregao fosse independente, sem vnculo com o

    Estado. Por causa disso, alguns foram chamados de independentes e, depois, de

    congregacionalistas. Alm disso, eles tambm pretendiam que fosse empreendida uma

    estrita disciplina na Igreja da Inglaterra para liberta-la de clrigos e leigos que eles

    consideravam indignos.19

    No sculo 17, no contexto da guerra civil entre o rei Carlos I e um parlamento

    puritano, foi convocada a Assembleia de Westminster (1643-1649). Neste evento foi

    produzida uma srie de documentos calvinistas para a Igreja da Inglaterra, dentre os

    quais esto a Confisso de F de Westminster e os Catecismos Maior e Breve, que se

    tornaram os principais smbolos confessionais das Igrejas reformadas e presbiterianas.

    CONSIDERAES FINAIS

    A herana cltica moderna mais predominantemente influenciada pela viso dos

    reformadores do que de qualquer outra poca estudada at ento. Os elementos

    litrgicos presentes em Calvino e Zwinglio so inequivocamente os mais presentes na

    contemporaneidade e a importncia do pensamento de tais homens pde ser vista neste

    ensaio.

    bvio que ainda faltaram outros expoentes da Reforma Protestante, todavia, o

    alvo central de demonstrar seus efeitos na liturgia francesa, sua, escocesa e inglesa foi

    cumprido com essa aula. A Reforma estava longe de acabar. Nos anos seguintes

    movimentos reacionrios ocorreriam pela Alemanha e pela Inglaterra e seriam uma

    espcie de reforma dentro da Reforma. As principais contribuies desses novos grupos

    aconteceram no campo da liturgia.

    19

    NICHOLS, Robert H. Op. Cit., p. 192.

  • BIBLIOGRAFIA

    LVAREZ, Juan J. Varela. El Culto Cristiano: origen, evolucin, actualidad. Barcelona: CLIE, 2002.

    BARD, Thompson. Liturgies of the Western Church. Philadelphia: Fortress Press, 1980.

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    CALVINO, Joo. Comentrio de Salmos. Volume I. Fiel, 2009.

    GONZLEZ, Justo. Uma histria Ilustrada do Cristianismo: a era dos reformadores at a era inconclusa. Volume II. So Paulo: Vida Nova, 2011.

    NICHOLS, Robert H. Histria da Igreja Crist. So Paulo: Cultura Crist, 2000.

    OLD, Hugues O. Guides to the Reformed Tradition. Louisville: Westminster John Knox Press, 1997.

    RICE, Howard; HUFFSTUTLER, James. Reformes Worship. Louisville: Geneva Press, 1997.

    SENN, Frank.Christian Liturgy: Catholic and Evangelical. Minneapolis: Fortress Press, 1997.

    WHITE, James F. Introduo ao Culto Cristo. So Leopoldo: Sinodal, 1997.