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1 A Configuração do Campo de Consumo do Vinho do Vale do São Francisco: Uma Luta por Preservação ou Subversão da Ordem Vigente no Consumo Vínico Autoria: Brunno Fernandes da Silva Gaião, André Luiz Maranhão de Souza Leão Resumo Hoje o Vale do São Francisco é a segunda maior região vitivinícola do Brasil, entretanto existem vários obstáculos para a consolidação do Vale como uma referência nacional na produção de vinhos. Valendo-nos da teoria da prática de Bourdieu e por meio de uma etnografia da comunicação, buscamos responder ao seguinte questionamento: como a disputa por poder entre consumidores configura o campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco? Em meio à disputa por poder os agentes buscam associar-se a um modo de consumo de vinhos dominante, afastando-se do vinho do Vale, associado a um consumo marginal, pouco valorizado. 1. INTRODUÇÃO O cenário contemporâneo do consumo vínico é marcado pela presença de rituais enraizados, bem como pela existência de um vocabulário característico do meio e que é compartilhado pelos consumidores. Assim, a atividade de consumir vinhos parece exigir dos consumidores certo nível de conhecimento que os permita participar de maneira adequada deste mundo particular. Além disto, a procedência do vinho surge como um fator de extrema importância para o consumidor, que valoriza as bebidas oriundas de determinadas regiões em detrimento de outras. Este mesmo fator da procedência do vinho age diretamente sobre a realidade da produção vitivinícola mundial. A produção de vinhos é, então, dividida entre os países tradicionais na atividade, predominantemente europeus, e os países do chamado Novo Mundo. Estes elementos, juntos, apontam para o que poderíamos identificar como uma matriz ideológica do consumo e produção de vinho, que influencia e orienta o mundo dos vinhos. Assumindo a existência desta matriz ideológica, devido as suas características particulares o Vale do São Francisco, região emergente na produção vitivinícola brasileira, parece enfrentar dificuldades para consolidar seus produtos no mercado. As peculiaridades geográficas impõem uma condição inerente aos vinhos do Vale, que se mostram vinhos simples, pouco rebuscados e de uma região nada convencional na produção de vinhos finos. Desta forma, é possível perceber que muitas das dificuldades enfrentadas pelos produtos do Vale estão relacionadas com o próprio desenvolvimento de uma cultura de consumo de vinhos no Brasil, o que transcende os aspectos puramente econômicos, indicando questões que transitam no âmbito de aspectos culturais do consumo de vinhos. Neste ponto o pensamento de Pierre Bourdieu surge como uma opção profícua na busca por um melhor entendimento do consumo de vinhos, e neste caso específico, do vinho do Vale do São Francisco. Valendo-nos de sua teoria da prática e partindo especialmente de suas contribuições acerca da formação social do gosto e das relações de poder existentes entre agentes, buscamos compreender como a disputa por poder entre consumidores configura o campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco. 2. O VINHO E O VINHO DO VALE DO SÃO FRANCISCO Assim como aconteceu ao longo do tempo, nesta primeira década do terceiro milênio a produção e consumo do vinho passaram por transformações, mas a bebida continua em evidência. Apesar da tendência à diminuição do consumo de vinhos, estes se popularizaram, deixando de ser um objeto de consumo exclusivo da elite. O vinho se faz presente nas mais diversas ocasiões e espaços. A ubiqüidade desta bebida se destaca em um cenário contemporâneo de fragmentação (LUNARDO, GUERINET, 2007; ROMANI; GRISTI, 2008). Mesmo nos casos de consumo individual, este é permeado por significados

Autoria: Brunno Fernandes da Silva Gaião, André Luiz Maranhão de … · 2012-08-17 · Em meio à disputa por poder os agentes buscam associar-se a um modo de consumo de vinhos

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A Configuração do Campo de Consumo do Vinho do Vale do São Francisco:

Uma Luta por Preservação ou Subversão da Ordem Vigente no Consumo Vínico

Autoria: Brunno Fernandes da Silva Gaião, André Luiz Maranhão de Souza Leão

Resumo

Hoje o Vale do São Francisco é a segunda maior região vitivinícola do Brasil, entretanto existem vários obstáculos para a consolidação do Vale como uma referência nacional na produção de vinhos. Valendo-nos da teoria da prática de Bourdieu e por meio de uma etnografia da comunicação, buscamos responder ao seguinte questionamento: como a disputa por poder entre consumidores configura o campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco? Em meio à disputa por poder os agentes buscam associar-se a um modo de consumo de vinhos dominante, afastando-se do vinho do Vale, associado a um consumo marginal, pouco valorizado. 1. INTRODUÇÃO

O cenário contemporâneo do consumo vínico é marcado pela presença de rituais enraizados, bem como pela existência de um vocabulário característico do meio e que é compartilhado pelos consumidores. Assim, a atividade de consumir vinhos parece exigir dos consumidores certo nível de conhecimento que os permita participar de maneira adequada deste mundo particular. Além disto, a procedência do vinho surge como um fator de extrema importância para o consumidor, que valoriza as bebidas oriundas de determinadas regiões em detrimento de outras. Este mesmo fator da procedência do vinho age diretamente sobre a realidade da produção vitivinícola mundial. A produção de vinhos é, então, dividida entre os países tradicionais na atividade, predominantemente europeus, e os países do chamado Novo Mundo. Estes elementos, juntos, apontam para o que poderíamos identificar como uma matriz ideológica do consumo e produção de vinho, que influencia e orienta o mundo dos vinhos.

Assumindo a existência desta matriz ideológica, devido as suas características particulares o Vale do São Francisco, região emergente na produção vitivinícola brasileira, parece enfrentar dificuldades para consolidar seus produtos no mercado. As peculiaridades geográficas impõem uma condição inerente aos vinhos do Vale, que se mostram vinhos simples, pouco rebuscados e de uma região nada convencional na produção de vinhos finos.

Desta forma, é possível perceber que muitas das dificuldades enfrentadas pelos produtos do Vale estão relacionadas com o próprio desenvolvimento de uma cultura de consumo de vinhos no Brasil, o que transcende os aspectos puramente econômicos, indicando questões que transitam no âmbito de aspectos culturais do consumo de vinhos.

Neste ponto o pensamento de Pierre Bourdieu surge como uma opção profícua na busca por um melhor entendimento do consumo de vinhos, e neste caso específico, do vinho do Vale do São Francisco. Valendo-nos de sua teoria da prática e partindo especialmente de suas contribuições acerca da formação social do gosto e das relações de poder existentes entre agentes, buscamos compreender como a disputa por poder entre consumidores configura o campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco.

2. O VINHO E O VINHO DO VALE DO SÃO FRANCISCO

Assim como aconteceu ao longo do tempo, nesta primeira década do terceiro milênio a produção e consumo do vinho passaram por transformações, mas a bebida continua em evidência. Apesar da tendência à diminuição do consumo de vinhos, estes se popularizaram, deixando de ser um objeto de consumo exclusivo da elite. O vinho se faz presente nas mais diversas ocasiões e espaços. A ubiqüidade desta bebida se destaca em um cenário contemporâneo de fragmentação (LUNARDO, GUERINET, 2007; ROMANI; GRISTI, 2008). Mesmo nos casos de consumo individual, este é permeado por significados

 

compartilhados, por aspectos culturais e simbólicos, o que caracteriza o vinho como um produto social, coletivo (ROMANI, GRISTI, 2008; DEMOSSIER, 2001). Além disto, a bebida atua como instrumento de estetização e estilização de um consumo distintivo e identitário (DEMOSSIER, 2001; LUNARDO GUERINET, 2007; AGUIAR, 2008). Destaca-se também a perpetuação de um consumo ritualizado, que inclui práticas de apreciação e serviço e um vocabulário próprio, indicando uma relação estreita entre o consumo e o conhecimento acerca da bebida (REAL, 1993; DEMOSSIER, 2001). Desta forma, o vinho surge como demarcador de status e instrumento de distinção (DEMOSSIER, 2005).

Mas o elemento que mais chama a atenção e que se perpetua ao longo dos anos no consumo de vinhos é a valorização da origem da bebida. A região onde o vinho é produzido é fator decisivo na determinação da qualidade da bebida. Segundo Glass (2008), três dos cinco aspectos mais relevantes para os consumidores, no que compete à decisão de compra, estão relacionados com a origem do vinho. Este cenário de valorização do país de origem, da região produtora, ou especificamente da vinícola produtora contribui para o fortalecimento de uma ideologia de consumo que qualifica as regiões tradicionais como referências no que diz respeito à qualidade dos vinhos (GLASS, 2008; GUIDRY et al., 2009). Desta forma o consumidor se utiliza de estereótipos estabelecidos em suas escolhas, perpetuando uma lógica que privilegia países europeus, como França, Itália e Portugal (GUIDRY et al., 2009).

Apesar da forte tradição europeia, nas últimas décadas EUA, Chile, Argentina, Austrália e África do Sul veem se destacando como produtores fora do tradicional território europeu, e são os principais responsáveis pelo fortalecimento da crença de que não somente as regiões tradicionais podem oferecer bons produtos (CHARTERS et al., 2008). Nos anos 1980 o Novo Mundo vitivinícola representava 5% do mercado mundial, hoje o número é de 30%.

Neste contexto o Brasil se localiza como a terceira potência latino-americana no que diz respeito à produção de vinhos, atrás de Chile e Argentina, sendo responsável por cerca de 1,2% da produção mundial. A produção nacional ainda se concentra de maneira mais marcante na região sul do país, especificamente na Serra Gaúcha, mas outras regiões também se destacam, como o Vale do São Francisco, que representa 15% da produção nacional (FENSTERSEIFER, 2007; PINTO, 2008).

O Submédio São Francisco está situado entre as latitudes 8º e 9º do hemisfério sul, localização considerada uma das últimas fronteiras do cultivo de uvas viníferas, contrariando a crença de que a produção de vinhos finos só é possível em regiões temperadas do planeta. As vinícolas da região do Vale do São Francisco se diferenciam das demais produtoras de vinhos espalhadas por todo o mundo, posto que a região do sub-médio do vale, graças ao clima seco e aos projetos de irrigação, apresenta um maior nível de produtividade (2,5 safras por ano). Contudo, estas características únicas do Vale, que possibilitam sua excepcional capacidade produtiva, impõem aos produtores da região o desafio de alcançar melhores níveis de qualidade para seus vinhos, a fim de igualá-los aos de seus principais concorrentes (LIMA, 2005; VITAL, 2005; ROBINSON, 2007).

Apesar do fortalecimento crescente da região, ainda existem diversos obstáculos a serem superados para a consolidação do Vale do São Francisco como referência nacional na produção de vinhos finos. Os principais desafios são o fato do mercado do sul e sudeste do país, maiores consumidores de vinhos no Brasil, não possuírem maior proximidade com os vinhos produzidos e engarrafados no Nordeste, e a concorrência dos vinhos importados do Chile e Argentina, beneficiados pelos acordos comerciais do MERCOSUL (VITAL, 2005). Além disto, a falta da Indicação Geográfica de Procedência dos vinhos da região enfraquece os produtos do Vale em relação aos seus concorrentes nacionais e internacionais (LIMA, 2006; RAMALHO; SOUSA, 2009).

 

3. O PENSAMENTO DE PIERRE BOURDIEU E OS ESTUDOS DE CONSUMO Tendo em vista o questionamento apresentado acima e o caráter marcadamente cultural

presente no consumo do vinho, é pertinente ressaltar o campo disciplinar em que se insere nossa pesquisa, a Consumer Culture Theory (CCT). A despeito da alcunha de “teoria”, a CCT representa um grupo amplo de agenda de pesquisas que compartilham semelhanças em relação aos objetos de investigação, escolhas teóricas e metodológicas, bem como à postura do pesquisador e ao direcionamento e campo empírico das pesquisas dentro de uma gama de opções possíveis. Neste sentido, esta pesquisa se localiza na interseção entre dois dos grandes campos temáticos desta escola de pensamento, quais sejam: padrões sociohistóricos de consumo e ideologias de massa e as estratégias de interpretação dos consumidores (ARNOULD; THOMPSON, 2005; 2007).

Levando em consideração a natureza do questionamento norteador de nosso trabalho, a obra do pensador francês Pierre Bourdieu surge como uma opção teórica apropriada para dar continuidade ao desenvolvimento da problemática emergente em nossa discussão. O pensamento de Bourdieu tem sido utilizado de forma marcante na realização de pesquisas direcionadas para o entendimento do consumo contemporâneo.

Para Bourdieu, a dinâmica social é traduzida pela relação dialética entre a objetivação das posições referentes ao espaço social – espaço este, ao qual Bourdieu dá o nome de “campo” – e a subjetivação das disposições individuais (habitus), reflexo destas mesmas posições e que se fazem notar por meio de comportamentos e posturas do indivíduo (OLIVEIRA, 2001; STONES, 2006; BOURDIEU 2007b). Sendo assim, é possível afirmar que “o habitus é a internalização ou incorporação da estrutura social, enquanto o campo é a exteriorização ou objetivação do habitus” (THIRY-CHERQUES, 2008, p.172).

Cada campo é delimitado pelas disputas de poder específicas e pelos interesses dos grupos de agentes nele inseridos – as diferentes classes do campo. Cada um destes agentes ocupa diferentes posições no campo, de acordo com a quantidade e variedade de capital que possuí. Estes capitais podem ser de quatro tipos: cultural (habilidades e qualificações intelectuais), social (acessos sociais de relacionamentos e contatos), econômico (riqueza material) e simbólico (rituais de reconhecimento, prestígio e honra). Em cada campo alguns capitais serão mais valorizados do que outros na determinação das posições de cada agente (STONES, 2006; ARAÚJO et al., 2009; BOURDIEU, 2009b).

Cada classe de agentes, ou fração de classe, possui um habitus próprio, que, ao ser incorporado pelos indivíduos ao longo do tempo, atua diretamente nas escolhas de consumo destes. Nossas escolhas em relação à música, alimentação, vestuário e etc. são produto de uma organização social e de nossa posição na mesma (SIQUEIRA, 2010). A naturalidade aparente dos nossos gostos nos leva a encarar com estranheza, e até mesmo aversão, aquilo que não nos agrada e aquele com cujos gostos não comungamos. Muito de nossa definição do que gostamos vem da identificação do que não gostamos (BOURDIEU, 2007b).

Por seu caráter distintivo o gosto funciona como uma expressão da unidade de uma classe. Por ser produto das condições de existência de uma classe particular, o gosto agrega indivíduos pertencentes a uma mesma classe, ao mesmo tempo em que os aparta dos outros. Nossas escolhas e preferências são utilizadas como critérios para nos classificarmos a nós mesmos e pelos quais somos classificados pelos demais. Em suma, Bourdieu apresenta o gosto como uma expressão objetivada do habitus específico de cada classe, com uma função social de reprodução e legitimação das diferenças sociais (BOURDIEU, 2007b).

Através do uso de estratégias específicas, explícitas ou não, os agentes tentam conquistar posições dentro da estrutura na qual estão inseridos (OLIVEIRA, 2001; BOURDIEU, 2007a). Desta maneira, os agentes que ocupam posições de dominação procuram lançar mão da violência simbólica para privilegiar interesses de conservação, ou reprodução da ordem vigente, das ilusões (illusio) que dão sustentação à dinâmica que impera na estrutura. Por

 

outro lado, os agentes dominados buscam a alteração da configuração do campo, ou seja, a subversão desta ordem (THIRY-CHERQUES, 2008; BOURDIEU, 2010).

No entanto, o poder não se consolida sendo força bruta pura, posto que o mesmo é frágil enquanto explícito. Logo, os agentes dominantes procuram meios de legitimar o poder que possuem como uma forma de justificá-lo, impedindo assim que sua arbitrariedade seja percebida e sua existência seja contestada (BOURDIEU, 2009a; MISOCZKY, 2003). Com esta legitimação o poder se torna invisível e é exercido com o consentimento e cumplicidade dos próprios dominados, reforçando a dominação exercida pelas classes detentoras dos capitais em jogo. Neste ponto os símbolos surgem como ferramentas de reprodução da ordem social, possibilitando a construção do consenso e conformação em relação à ordem vigente. Os sistemas simbólicos, e o correlato poder simbólico proveniente destes, permitem às classes dominantes construir a realidade da maneira que lhes é mais favorável (BOURDIEU, 2010).

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Em decorrência das características da pesquisa aqui proposta, bem como da adoção da postura bourdieusiana em relação à pesquisa, dentre as opções possíveis decidimos realizar um estudo de inspiração etnográfica. Em meio às diversas variantes da etnografia, adotamos a etnografia da comunicação. Fundada na década de 1960 por Dell Hymes e influenciada pela linguística e pela antropologia, esta abordagem assume que a linguagem é configurada culturalmente nos contextos sociais da vida cotidiana (CARBAUGH, 2007). A proposta da etnografia da comunicação é a de identificar o uso de padrões de linguagem utilizados pelos indivíduos para criar e expressar seu entendimento da realidade em contextos específicos. Cabe, então, ao pesquisador buscar compreender aspectos culturais de uma determinada comunidade por meio das interações verbais e não verbais entre seus membros (MATEI, 2009). Estes grupos são chamados de “comunidades de fala”, que se configuram pelos critérios linguísticos presentes e, principalmente, pelo critério social que a diferencia de outros grupos (RESENDE, 2006). Ao tratar dos significados compartilhados em interações interpessoais, a etnografia da comunicação se enquadra como uma análise de discurso funcional (STILLER, 1998), assumindo uma perspectiva pragmática da linguagem, em que as palavras ganham significado de acordo com o uso que fazemos delas nos diferentes contextos sociais (WITTGENSTEIN, 2005).

Nossa coleta de dados se deu por meio da imersão em ambientes e situações de consumo de vinhos finos, que permitiu a observação e registro (ROCHA, et al., 2005) das interações entre os consumidores. Durante mais de seis meses foram registradas 80 interações entre consumidores em situações em que algum vinho produzido no Vale do São Francisco se fez presente e foi objeto de consumo e comentários. Estas 80 interações ocorreram em dois restaurantes da cidade do Recife, oito situações de consumo particulares (jantares e almoços entre amigos) e dezenove situações de compra de vinhos em quatro supermercados do Recife.

Sempre que possível assumimos a postura de observador participante, o que aconteceu em interações em que havia a familiaridade com os consumidores ou uma oportunidade de interação com aqueles desconhecidos. Nestes casos, buscamos introduzir o vinho do Vale do São Francisco nas interações. Nos casos em que esta oportunidade não ocorreu, como em situações em que dois ou mais consumidores interagiam, fosse em um supermercado ou em ambientes privados, utilizamos observações não participantes (ADLER; ADLER, 1994). Durante estas observações foram levados em consideração o comportamento dos consumidores diante de seus pares e os diálogos entre eles. O registro das interações foi feito por meio de gravadores digitais e notas de campo, o que nos permitiu descrever o contexto de cada interação e registrar aspectos não verbais (STAKE, 2006; BOURDIEU, 2001).

A construção de nossa análise se deu por meio do quadro teórico que Bourdieu elaborou ao longo de suas pesquisas, formado pelos conceitos de habitus, campo, e seus componentes.

 

Foi com estes elementos em mente que realizamos a coleta dos dados, usando-os como norteadores em nossa busca pelos achados empíricos que oferecessem respostas a nossos questionamentos (THIRY-CHERQUES, 2008).

Apresentamos abaixo a Figura 1 com as categorias de análise que nortearam nossa entrada no campo empírico durante todo o processo de coleta de dados. A partir destas categorias buscamos sensibilizar nosso olhar nas observações realizadas. Cada uma delas é apresentada junto com sua respectiva definição. Como é possível perceber, todas as categorias foram retiradas da teoria bourdieusiana, de acordo com a revisão teórica já apresentada.

Categorias Definições

Pos

içõe

s

Doxa Opinião consensual estabelecida entre os agentes e representativa do ponto de vista dominante.

Nomos Leis informais que regem o funcionamento do campo e regulam a luta pela dominação.

Classe Identidade/alteridade entre os agentes inseridos no campo, que podem pertencer ou não a uma mesma classe.

Dis

pos

içõe

s Ethos Valores não conscientes que orientam a moral cotidiana, materializados em estado prático.

Eidos Maneira específica de pensar a realidade, baseada em crenças pré-reflexivas.

Hexis Princípios incorporados fisicamente, expressos pelo corpo em posturas e expressões específicas.

Cap

itai

s Capital Simbólico Rituais de reconhecimento, prestígio e honra. Capital Cultural Habilidades e qualificações intelectuais. Capital Econômico Riqueza material. Capital Social Acessos sociais de relacionamentos e contatos.

Dom

inaç

ão Poder Simbólico

Poder invisível, implícito, exercido por um agente com a cumplicidade dos agentes dominados.

Violência Simbólica Violência sutil, dissimulada, entre os agentes inseridos em um campo e pertencentes a classes distintas.

Reprodução Social Processos que contribuem para a perpetuação das configurações do campo.

Illusio Ilusões que se perpetuam e permitem o funcionamento e manutenção da estrutura do campo.

Figura 1. Categorias de Análise Fonte: Elaboração do autor

 Sendo a etnografia da comunicação um tipo de análise de discurso funcional, no

transcorrer de nossa pesquisa utilizamos níveis de análise distintos, que nos permitiram identificar as categorias teóricas em cada interação analisada. Voltamos nosso olhar para aspectos não-verbais paralinguísticos, referente à dimensão fonética da linguagem (ALBANO et al., 1997; ANDRADE; APPA, 2005), e extralingüísticos, referentes à dimensão corporal (WEIL, 1973; BIZERRIL NETO, 2005); aspectos interacionais de visão êmica, concernentes ao compartilhamento de significação (GUMPERZ, 2002; GOFFMAN, 2001; VAN DIJK, 2004), e de definição do “eu”, concernentes à determinação do papel interacional do agente (GOFFMAN, 1981, 1982).

5. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

Nesta seção abordaremos os resultados advindos da nossa coleta de dados, iniciando pela apresentação daquilo que chamamos de categorias empíricas dentro do campo estudado. Em seguida trataremos das relações existentes entre estas categorias e como tais relações configuram a estrutura do campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco.

 

5.1. As categorias empíricas identificadas no campo Apesar de termos entrado em campo para realizar a coleta dos dados com base nas 14

categorias teóricas apresentadas nos procedimentos metodológicos, ao darmos início à análise dos dados – que ocorreu em paralelo à parte da coleta – identificamos a possibilidade de uma nova organização analítica, respaldada pelas informações advindas do campo empírico. Percebemos que todas as categorias teóricas propostas a priori se faziam presente no decorrer da coleta, no entanto cada uma delas se manifestava de formas diversas, de acordo com o pensamento bourdiesiano. Desta forma optamos por criar categorias empíricas, preservando a sua correspondência com as categorias teóricas, mas propondo uma nova organização para os dados. Logo, cada categoria teórica deu origem a categorias empíricas específicas, resultando em 14 destas. Na Figura 2 apresentamos cada uma das categorias empíricas e suas respectivas definições.

Categorias empíricas

Definições

Preservação da ordem

Aspectos que contribuem para a perpetuação do modo dominante do consumo de vinho. Pode ser expressa por meio de opinião consensual (doxa), regras de consumo (nomos), identificação de classe (classe), valores (ethos), crenças (eidos), expressões corporais (hexis), reprodução social (reprodução social) e ilusões sociais (illusio).

Subversão da ordem

Aspectos que expressam o atrelamento do consumidor a um modo alternativo de consumo de vinho, apontando para uma ruptura da configuração vigente no campo de consumo dos vinhos. Pode ser expressa nos níveis de opinião consensual (doxa), valores (ethos), crenças (eidos) e reprodução (reprodução social).

Expressão de subjetividade

Aspectos relacionados à manifestação de juízo do consumidor sobre vinhos, evidenciando as idiossincrasias e subjetividade de um agente. Podem ser expressos por nos níveis de valores (ethos) e crenças (eidos).

Reforço de autoridade

Demonstração de poder de um agente, que projeta posição de superioridade em uma interação com outro(s) agente(s).

Exposição de falta de autoridade

Exposição da ausência de poder de um agente, revelando posição de inferioridade em uma interação com outro(s) agente(s).

Ampliação de domínio

Violência praticada por um agente pertencente a uma classe dominante, que inferioriza uma classe tendo como objetivo reforçar o seu domínio no campo.

Resistência ao domínio

Violência praticada por um agente pertencente a uma classe dominada, que preserva sua classe tendo como objetivo se opor ao domínio exercido por outras classes.

Aproximação dos códigos vínicos

Valorização do agente por meio da demonstração de sua proximidade com o mundo dos vinhos, permitindo que este projete posição de superioridade.

Distanciamento dos códigos vínicos

Desvalorização do agente por meio da demonstração de sua pouca proximidade com o mundo dos vinhos, revelando posição de inferioridade em uma interação com outro(s) agente(s).

Conhecimento vínico

Valorização do agente por meio da demonstração de seu conhecimento sobre o mundo dos vinhos, permitindo que este projete posição de superioridade.

Desconhecimento vínico

Desvalorização do agente por meio da demonstração de seu pouco conhecimento sobre o mundo dos vinhos, revelando posição de inferioridade em uma interação com outro(s) agente(s).

Abasteza pecuniária

Valorização do agente por meio da demonstração de seu poder pecuniário no contexto de consumo de vinhos, permitindo que este projete posição de superioridade.

Escassez pecuniária

Desvalorização do agente por meio da demonstração de seu pouco poder pecuniário no contexto de consumo de vinhos, revelando posição de inferioridade em uma interação com outro(s) agente(s).

Relacionamentos profícuos

Valorização do agente por meio de sua pertença a uma rede de contatos formada por agentes bem conceituados no mundo dos vinhos, permitindo que este projete posição de superioridade.

Figura 2. Categorias empíricas Fonte: Pesquisa de Campo (2012)

 

Uma vez que nossa análise foi pautada em uma variante da análise de discurso funcional, pudemos perceber que, ao estabelecer correspondência com as categorias teóricas, cada categoria empírica assumiu também uma função social específica nas interações entre agentes, funções estas incorporadas às definições das categorias empíricas na figura acima (em negrito). Cada uma das categorias empíricas e suas respectivas funções, por sua vez, se manifestaram por meio de diversas facetas, de acordo com as diferentes situações nas quais se desenvolveram as interações entre os agentesi. Em caráter ilustrativo, apresentaremos um trecho de interação em que podemos identificar algumas destas categorias empíricasii.

Na seção de bebidas de um supermercado, um senhor observava as garrafas expostas. Após comparar duas garrafas de vinho chileno, ele pegou um Terranova, produzido no Vale do São Francisco. Neste momento me aproximei e peguei na prateleira uma garrafa de Rio Sol, também do Vale. Então ele virou-se e, espontaneamente, elogiou o Rio Sol, enquanto bateu o gargalo da garrafa de Terranova que tinha em suas mãos na garrafa de Rio Sol em minhas mãos: “Esse vinho é muito bom!”. Então perguntei se ele conhecia o Rio Sol, ao que ele me respondeu, com segurança: “Conheço [pronúncia longa]. É lá da região do Vale do São Francisco. Mas é muito bom! [fala alto, enfatizando o ‘muito bom’ com um tom firme]”, e emendou, expondo a garrafa em sua mão: “Esse aqui também é bom [o Terranova], mas esse aí ainda é melhor. Esse é R$ 19,00, né?”, perguntou-me, referindo-se ao Rio Sol. Esclareci que o Terranova custava R$16,00 e o Rio Sol R$21,00, e o senhor afirmou: “Esse é R$ 16,00. Terranova. [breve pausa] É bom também. Mas esse é melhor [Rio Sol]”. Perguntei, buscando confirmação: “É?”, e ele respondeu, novamente com segurança: “Certeza absoluta”, e complementou: “Já bebi bastante”. Antes de ele ir embora perguntei: “O senhor vai levar esse aí pra experimentar, é?”, ao que ele respondeu com naturalidade: “Vou levar esse pra experimentar... E é mais barato [complementou, como que se justificando]”. Então despedimo-nos (S.02 – I.U; P.1)iii.

Na interação acima, inicialmente podemos identificar a categoria empírica “Preservação da ordem”, expressa pelas facetas o vinho como instrumento de aproximação física e preço como critério de compra secundário. Por meio de seu movimento dêitico, ao me abordar, o consumidor demonstra que utiliza o vinho como um instrumento de intermediação interacional a fim de estabelecer um vínculo, mesmo que passageiro, com outros consumidores (Hexis). Além disto, percebemos no tom e entoação da fala do consumidor a importância dada por ele à questão do preço para a definição da escolha do vinho, mesmo que este se mantenha em segundo plano (Ethos). Assim, perpetuam-se práticas já estabelecidas no campo de consumo do vinho do Vale.

A faceta preço como critério de compra secundário aponta, também, para a categoria empírica “Escessez pecuniária” (Capital Econômico), indicando o possível estabelecimento de uma faixa de preço como limite para a aquisição de vinhos por parte do consumidor. Neste sentido, em determinado momento ele procura justificar a sua escolha e dissimular a importância do preço do vinho a fim de evitar uma possível aproximação de uma posição de inferioridade na interação, o que é perceptível tom e entoação empregados por ele.

Destacamos ainda o “Reforço de autoridade” expresso pela faceta por ser mais experiente, e estabelecido pelo consumidor por meio da construção de uma imagem, ou face, de consumidor de vinhos experiente e qualificado, valorizando a posse dos Capitais Simbólico (Aproximação dos códigos vínicos) e Cultural (Conhecimento vínico). Assim, o consumidor busca assumir posição de superioridade na interação (Poder Simbólico).

Identificamos ainda a categoria empírica Expressão de subjetividade, expressa pelas facetas opina sobre um vinho e valoriza a experimentação de novos vinhos. A primeira delas diz respeito à apresentação da opinião pessoal (Eidos) do consumidor acerca dos vinhos em pauta, expressa por meio do tom, entoação e altura da voz, bem como da duração da elocução do agente. A segunda faceta aponta para o fato de o consumidor estar disposto a

 

conhecer novos vinhos, a fim de ampliar seu conhecimento acerca da bebida (Ethos). Aqui são expressas as idiossincrasias, a subjetividade do agente.

Ao adotarmos a escolha pela elaboração das categorias empíricas os dados passaram a se apresentar de uma maneira tal que nos permitiu a identificação de uma dinâmica inerente à estrutura do campo de consumo de vinhos do Vale do São Francisco, na qual se configura uma disputa entre a reprodução e reconfiguração do campo. Duas categorias empíricas se mostraram mais representativas desta dinâmica: “Preservação da ordem” e “Subversão da ordem”. As mesmas vão ao encontro da elaboração teórica de Bourdieu em relação à dinâmica do campo social. Enquanto as classes dominantes de um campo atuam no sentido da manutenção do status quo, as classes de dominados lutam pela subversão da ordem vigente (BOURDIEU, 2009b; BOURDIEU, 2010). Não por acaso estas foram as duas subcategorias mais presentes na análise dos dados.

A categoria “Expressão de subjetividade”, por sua vez, remete àquilo que Bourdieu chama de “disposições”, ou seja, ao habitus dos agentes. E é justamente por meio do habitus, no papel de disposição interiorizada e geradora da prática, que a teoria bourdieusiana explica como os agentes podem alterar inconscientemente a estrutura em que estão inseridos (WACQUANT, 2007; BOURDIEU, 2007a; BOURDIEU, 2009a). É esta possibilidade de “expressão de subjetividade” do agente que faz da teoria elaborada por Pierre Bourdieu uma tentativa de romper com o paradigma estruturalista, propondo uma forma de Estruturalismo permeada pela agência (THIRY-CHERQUES, 2008; WACQUANT, 2006).

Os diferentes capitais surgiram sempre de duas formas, numa valência positiva para todos eles, que permitem que os agentes assumam uma posição de superioridade, ou num valência negativa, à exceção do Capital Social, fazendo com que os agentes sejam expostos em posições de inferioridade. As categorias empíricas relacionadas ao Poder Simbólico e à Violência Simbólica também seguiram a mesma lógica dual, por meio da posse dos capitais os agentes procuram ter seu poder simbólico elevado dentro do campo (Reforço de autoridade). Em contra partida os agentes com poucos capitais acabam por ter sua falta de poder explicitada, enfraquecendo-se perante os demais agentes no contexto de disputa (Exposição da falta de autoridade). Quanto à violência simbólica, suas duas formas de manifestação estão diretamente relacionadas às classes dominantes (Ampliação de domínio), que procuram se fortalecer ainda mais, atacando as classes inferiores, e à classe dos dominados (Resistência ao domínio), que buscam expor os dominantes para enfraquecê-los.

5.2. A estrutura de relações entre as categorias empíricas

Uma vez expostas as categorias empíricas, suas funções e facetas, apresentaremos agora a estrutura de relações elaborada a partir dos dados coletados ao longo da pesquisa. Estas relações foram determinadas por meio da presença de diferentes categorias em uma mesma interação, categorias que foram articuladas a partir da teoria da prática de Bourdieu. A Figura 3 traz todas as relações eliciadas no campo de consumo de vinhos do Vale do São Francisco. As 14 categorias são diferenciadas por meio de suas tonalidades e formas.

A fim de ilustrar como se deu a relação entre as categorias empíricas, apresentaremos um trecho de interação, explorando as relações presentes nele.

Em um jantar entre amigos, conversava com uma amiga na cozinha, quando sugeri: “Quer um vinhozinho?”, ao que ela respondeu: “Eu acho que eu vou tomar o espumante logo”. Neste instante o convidado simpático, aproximou-se interessado e falou animadamente para a moça: “Eu topo!”. Então ela disse, com a garrafa em suas mãos: “Espumante, eu gosto dele mais geladinho. Vou dar um tapa nele no freezer”. Enquanto colocava a garrafa de espumante Rio Sol no congelador ela complementou, contundente: “Eu quero nem saber. Não é pra botar em freezer não, mas...”. E o convidado simpático comentou num tom blasé: “Tem essa história de que o resfriamento tem de ser gradual e lento não, né?” (J.01 – I.1; P.3).

 

Nesta interação podemos perceber, por meio do tom, entoação e conhecimento de mundo dos interagentes, a relação que se estabelece entre “Conhecimento vínico” e “Aproximação dos códigos vínicos”, uma vez que tanto o rapaz quanto a moça demonstram serem consumidores experientes ao citarem a indicação de resfriamento adequado do vinho. Estas duas categorias empíricas se relacionam com “Preservação da ordem”, pelo fato de os consumidores fazerem referência a uma prática estabelecida como correta no campo de consumo de vinhos como um todo. No entanto, em contrapartida, a categoria “Subversão da ordem” se faz presente e estabelece relação com as mesmas categorias quando os consumidores indicam uma inclinação à insubordinação, indo de encontro à regra.

Figura 3. Estrutura de relações Fonte: Elaboração do autor.

Debruçando-nos sobre a estrutura apresentada na figura acima, a disposição dos

elementos tem por objetivo explicitar a dinâmica social expressa na teoria bourdieusiana, na qual os agentes lutam pela preservação ou pela subversão da ordem vigente no campo em que estão inseridos. Uma vez que a preservação e a subversão estão mais diretamente ligadas, respectivamente, às classes dos dominantes e dominados, julgamos pertinente dispor estes elementos nos extremos superior e inferior da estrutura. Já a categoria empírica “Expressão de

 

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subjetividade” foi localizada exatamente no centro da figura de forma a expressar a inserção da agência dentro da estrutura. Os elementos mais à direita e à esquerda são os elementos de dominação “Poder Simbólico” e “Violência Simbólica” que dão sustentação à preservação ou subversão do campo. Da mesma forma os elementos mais relacionados com as classes dominantes (Reforço de autoridade e Ampliação de domínio) se localizam na parte superior da estrutura, enquanto os elementos relacionados às classes de dominados (Exposição da falta de autoridade e Resistência ao domínio) localizam-se na parte inferior. Por fim, no centro da estrutura estão dispostos os elementos relativos aos diferentes capitais presentes no campo de consumo de vinhos do Vale. Como podemos notar estes elementos foram dispostos de uma maneira tal que os de valência positiva estão posicionados na metade superior da estrutura, enquanto que os de valência negativa estão na parte inferior.

Iniciaremos a explorar a “Preservação da ordem” do campo de consumo dos vinhos pela sua relação com “Reforço de autoridade”. Esta relação explicita a posse do Poder Simbólico pelas classes dominantes do campo, que agem em prol da preservação da configuração do campo. Por outro lado, percebemos que “Preservação da ordem” também se relaciona com “exposição da falta de autoridade”, assumindo um significado equivalentemente oposto. Esta relação aponta para a fragilização das classes dominadas frente às práticas consolidadas no campo. Para conservar esta configuração (Preservação da ordem)

os agentes dominantes lançam mão da Violência Simbólica, atacando as classes inferiores, objetivando seu descrédito dentro do campo de consumo de vinhos (Ampliação de domínio), o que ainda pode acontecer por meio de situações em que os agentes dominados atacam, inconscientemente, sua própria classe, apontando também para a relação entre “Ampliação de domínio” e o Poder Simbólico. Ao atacarem outro agente (Ampliação de domínio) os consumidores procuram, em última instância, reiterar seu poder (Reforço de autoridade) e exibir a limitação de poder, ou fragilidade do outro (Exposição da falta de autoridade).

Como já discutimos anteriormente, estas lutas entre classes se dão por meio da disputa pelos capitais disponíveis dentro do campo. Neste sentido, “Preservação da ordem” se relaciona com cada uma das categorias que dizem respeito aos capitas, indicando a tendência das classes dominantes de preservarem os parâmetros de valorização dos capitais existentes. São estes capitais que permitem que os agentes dominantes se mantenham nesta posição.

Com relação à “Abasteza pecuniária”, percebemos, então, a utilização do Capital Econômico para perpetuação da configuração existente no campo, ao permitir a associação do agente a uma classe superior de consumidores. Em se tratando de “Relacionamentos profícuos”, a pertença a uma rede de contatos formada por agentes bem posicionados no campo se mostra importante para os consumidores que ocupam posições de domínio. Neste mesmo sentido, identificamos a relação de “Relacionamentos profícuos” com “Reforço de autoridade”, demonstrando que o fato de o agente conhecer especialistas ou outro tipo de consumidor bem conceituado confere a ele Poder Simbólico frente aos demais consumidores.

Entretanto, não são a riqueza ou a rede de contatos os principais meios pelos quais os agentes conseguem se sobressair em meio às disputas. Os principais capitais em jogo no campo de consumo de vinhos do Vale do São Francisco são o Capital Simbólico e o Capital Cultural, são o prestígio e o conhecimento. Estes dois capitas se relacionam com a “Preservação da ordem” e com o “Reforço de autoridade”. O “Conhecimento vínico”, juntamente com o reconhecimento da qualificação do agente enquanto consumidor de vinhos (Aproximação dos códigos vínicos) são os principais meios de se conquistar uma posição privilegiada no campo e alcançar o Poder Simbólico (Reforço de autoridade). A reprodução de práticas estabelecidas e tidas como corretas em meio aos consumidores de vinho (Preservação da ordem) permite que os agentes consigam ostentar o seu conhecimento vínico e sejam reconhecidos como consumidores qualificados.

 

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Muitas vezes é por meio da Violência Simbólica (Ampliação de domínio) que os agentes se mostram superiores, explicitando sua posse dos capitais supracitados (Conhecimento vínico e Aproximação dos códigos vínicos) e expondo a falta de capitais dos dominados (Desconhecimento vínico e Distanciamento dos códigos vínicos).

É a falta de capitais que compromete os agentes dominados, impossibilitando sua ascensão às posições superiores. Assim, temos as relações de “Exposição da falta de autoridade” com “Distanciamento dos códigos vínicos” e “Desconhecimento vínico”. Consumidores menos experientes e com pouco conhecimento sobre vinhos se mantêm atrelados às classes dominadas, expondo a falta de poder destas classes.

“Preservação da ordem” também se relaciona com a valência negativa do Capital Econômico (Escassez pecuniária), indicando que o poder aquisitivo limitado pode comprometer alguns agentes, associando-os a padrões de consumo menos qualificados.

Deixando os capitais de lado, “Preservação da ordem” também estabelece relação com “Expressão de subjetividade”, demonstrando que as ações dos agentes, por mais idiossincráticas e subjetivas que sejam, ainda sofrem a influência da estrutura em que eles estão inseridos. Esta relação vai ao encontro da ideia defendida por Bourdieu, de que o agente não age de maneira livre e totalmente consciente, mas sim, é constrangido pela estrutura.

Por fim, “Preservação da ordem” ainda estabelece relação direta com a categoria “Subversão da ordem”, sua antítese teórica. A ligação entre estas duas categorias expressa o embate entre os dois grandes movimentos conflitantes dentro do campo, a perpetuação ou mudança da estrutura. É nesta relação em que percebemos a dinâmica social da teoria bourdieusiana, segundo a qual não é possível para um agente manter-se neutro. Assim, as ações dos consumidores no campo de consumo dos vinhos do Vale acabam por contribuir para a reprodução do status quo ou para promover a mudança no espaço social do campo.

Após apresentarmos as relações da categoria “Preservação da ordem”, nos voltaremos agora para as relações que “Subversão da ordem” estabelece com os demais elementos da estrutura do campo de consumo dos vinhos do Vale. Primeiro temos a ligação direta com a Violência Simbólica, referente às situações em que agentes dominados se opõem à preservação das configurações do campo e atacam as classes superiores (Resistência ao domínio), objetivando diminuir o domínio destas e conquistar maior espaço no campo.

“Subversão da ordem” se relaciona ainda com a valência positiva de dois tipos de capitais, precisamente os capitais de maior valor no campo de consumo dos vinhos do Vale do São Francisco, o Capital Simbólico (Aproximação dos códigos vínicos) e o Capital Cultural (Conhecimento vínico). É através da apropriação destes dois capitais, centrais no campo, que os agentes dominados buscam sobrepujar a soberania das classes dominantes.

Chegando à última das três categorias centrais da estrutura do campo de consumo dos vinhos do Vale apresentaremos as demais relações que “Expressão de subjetividade” estabelece com as outras categorias empíricas. Primeiramente temos a relação mantida com “Reforço de autoridade”, revelando que as ações dos agentes, por mais inconscientes e impensadas que sejam, em última instância, sempre apontam para a valorização do agente dentro do espaço social do campo. Por mais desinteressado ou alheio às disputas do campo, o agente sempre evitará ser associado a classes inferiores, mesmo que com ações inconscientes.

Corroborando com a relação anterior, “Expressão de subjetividade” se relaciona também com “Ampliação de domínio”, indicando que, mesmo de maneira não planejada ou calculada, os agentes praticam a violência simbólica na intenção de ampliarem seu domínio numa interação específica e em consequência dentro do campo como um todo.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, a “Expressão de subjetividade” sempre estabelece relações com os capitais mais valorizados no campo, o Capital Simbólico (Aproximação dos códigos vínicos) e o Capital Cultural (Conhecimento vínico). Apenas a relação desenvolvida entre “Expressão de subjetividade” e “Distanciamento dos códigos

 

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vínicos” vai de encontro a esta lógica, demonstrando que em alguns casos as idiossincrasias dos agentes podem comprometê-los, ameaçando suas posições no campo.

Finalmente, depois de abordarmos as três principais categorias da estrutura, bem como todas as relações que elas apresentam, resta-nos ainda ressaltar duas últimas relações. A ligação entre “Aproximação dos códigos vínicos” e “Conhecimento vínico” e entre “Distanciamento dos códigos vínicos” e “Desconhecimento vínico”. Estas relações entre Capital Simbólico e Capital Cultural corroboram aquilo que afirmamos por diversas vezes anteriormente: estes são os dois principais capitais em jogo, por conseguinte, são os principais instrumentos de conquista de poder presentes no campo de consumo do vinho do Vale.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a análise dos dados expostos anteriormente, a configuração da estrutura presente no campo de consumo dos vinhos do Vale do São Francisco aponta a existência de dois elementos centrais em sua dinâmica social, a preservação e subversão da ordem. O embate entre estes dois movimentos gera a dinâmica que atua como norteadora das ações dos agentes enquanto consumidores de vinhos. Desta forma corroboramos com a teoria bourdieusiana ao identificar o campo estudado como sendo um campo de poder, notadamente marcado pela luta intermitente entre as classes de agentes. Dentro deste espaço social os agentes dominantes utilizam os capitais disponíveis para garantir a sua manutenção no poder, reproduzindo práticas e discursos estabelecidos. Este consumo se mostra ritualizado e simbólico.

Devido a isto, os capitais econômico e social se mostram como secundários frente aos capitais simbólico e cultural, que surgem como as principais fontes de poder dentro do campo. Para conseguir se destacar no campo, exige-se dos consumidores, sobretudo, o domínio de códigos específicos, o conhecimento de diversas marcas e dos meandros do consumo de vinhos, bem como a demonstração de prestígio e status em meio aos demais consumidores.

O domínio destes capitais concede aos agentes posições privilegiadas dentro do campo, mas é principalmente por meio da Violência Simbólica que os agentes dominantes conseguem se impor dentro do campo, impedindo a ascensão dos consumidores pertencentes às classes inferiores. Neste ponto é curioso notar que em alguns casos os próprios dominados colaboram com esta inferiorização de suas classes, ao aceitarem os padrões e práticas de consumo estabelecidas, reforçando suas próprias limitações como consumidores de vinhos.

Esta mesma tendência também surge em relação à expressão de subjetividade dos agentes. Apesar dos agentes manifestarem idiossincrasias e opiniões pessoais, eles tendem a alinhar-se, inconscientemente, ao modo dominante de consumo de vinhos. Os agentes percebem quais as práticas tidas como corretas dentro do campo e alinham suas ações.

Contudo, existem aqueles agentes que se esforçam para inserirem alguma mudança na configuração estabelecida, visando a conquista de posições mais privilegiadas no campo de consumo de vinhos do Vale do São Francisco. Promovendo a alteração da estrutura do campo em dimensões mínimas, desestabilizando-a pouco a pouco, a subversão da ordem é a tentativa das classes dominadas de assumir o poder, destituindo as classes dominantes do controle do espaço social em questão. São estas pequenas mudanças que possibilitam a ascensão de uma nova estrutura. É neste ponto em que, novamente, retomamos o pensamento de Bourdieu, mostrando que se o homem não é capaz de agir de maneira totalmente consciente, tão pouco está fadado à eterna reprodução de uma estrutura social imutável (BOURDIEU, 2007a).

Chama a atenção é o fato de que a subversão almejada e articulada pelas classes inferiores do campo se mantém em um nível por demais superficial. Percebemos que os consumidores dos vinhos do Vale, no afã de conquistarem posições de dominação, se alinham ao modo dominante de consumo de vinhos, e assim perpetuam a valorização dos mesmos capitais já presentes no campo. O conhecimento (Capital Cultural) e o prestígio e status (Capital Simbólico) continuam a representar os principais instrumentos de dominação e

 

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caminho mais curto rumo às posições superiores do campo. A subversão superficializada – que, apesar de presente no campo, se mantém direcionada apenas às disputas entre classes, objetivando trocas de posições de agentes dentro da estrutura – faz com que as classes inferiores findem por contribuir para a manutenção da ordem vigente estabelecida, uma vez que é por meio da posse destes mesmos capitais que os agentes dominantes praticam a violência simbólica e exercem o controle sobre o campo de consumo do vinho do Vale.

Ao não promover alterações mais profundas na estrutura do campo e valorizar os mesmos capitais já controlados pelas classes dominantes, os agentes dominados sabotam os próprios planos de ascensão e dão o primeiro passo para se manterem em posição de inferioridade na estrutura. Em consequência disto, o campo se conserva, de forma a beneficiar ainda mais os dominantes e aumentar o abismo existente entre estes e os agentes dominados.

A partir desta visão panorâmica do campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco, podemos nos voltar agora especificamente para a pergunta de pesquisa que motivou nosso trabalho: como a disputa por poder entre consumidores configura o campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco?

Primeiramente, tratando o campo de consumo do vinho do Vale como um campo de disputa por poder, percebemos que os agentes pertencentes às classes dominantes conseguem impor seu controle sobre os demais. Destarte, de modo geral, a tendência à conservação e perpetuação da estrutura do campo sobrepuja a subversão do campo. Uma vez que este campo é relativamente novo e, por conseguinte ainda está se consolidando, os consumidores tendem reproduzir as práticas estabelecidas no mundo dos vinhos como um todo na tentativa de conseguirem se sobressair e conquistar posições de superioridade e poder simbólico.

Desta forma, notamos a presença marcante do Doxa que permeia o mundo dos vinhos influenciando os agentes no campo de consumo do vinho do Vale. A descriminação entre as regiões tradicionais e consagradas na produção vitivinícola e as novas regiões vinícolas é percebida em diversas passagens. Tal diferenciação se faz presente principalmente em relação aos vinhos chilenos e argentinos, que, mesmo fazendo parte do Novo Mundo vintivinícola, são tidos como superiores aos vinhos do Vale. As regras de consumo e costumes já estabelecidos também são preservadas e ganham força dentre os consumidores, que buscam construir uma imagem de consumidores qualificados.

Assim, a matriz ideológica subjacente ao campo ao mundo dos vinhos é reproduzida e se enraíza de forma ainda mais profunda no campo de consumo do vinho do Vale do São Francisco, servindo de parâmetro para a distribuição de poder entre os agentes. Neste contexto, é necessário destacar que surgem manifestações que vão de encontro à matriz ideológica dominante. Contudo, esta tentativa de subversão da ordem ainda parece incipiente.

Considerando que o gosto dos agentes é construído sobre os mesmos alicerces que sustentam as lutas por poder dentro de um campo e é o produto das condições de existência de uma classe particular, o gosto pelo vinho do Vale acaba sendo associado às classes inferiores. Isto ocorre graças à já discutida perpetuação da matriz ideológica dominante no mundo dos vinhos, que leva ao descredito dos vinhos produzidos em regiões pouco tradicionais.

Desta forma, em meio à disputa por poder os agentes buscam associar-se a um modo de consumo de vinhos dominante, já consolidado e reconhecido no mundo dos vinhos e se afastam do vinho do Vale do São Francisco, associado a um consumo marginal e pouco valorizado. Na esteira deste movimento o campo de consumo dos vinhos do Vale se espelha no mundo dos vinhos como um todo, reproduzindo as mesmas práticas e padrões de consumo.

Com o término desta pesquisa, nos cabe agora apresentarmos as limitações de nosso estudo. Em primeiro lugar destacamos a limitação imposta pela operacionalização da pesquisa em relação ao tempo disponível para a execução da etnografia da comunicação. Nosso trabalho de coleta de dados durou seis meses, tempo que pode ser considerado exíguo para a realização de uma etnográfica. Entretanto, ressaltamos a maleabilidade da variante da

 

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etnografia adotada em nossa pesquisa, por esta ser uma derivação de análise de discurso funcional. Além disto, é preciso apontar que, o imbricamento no campo empírico se iniciou cerca de um ano antes do começo da coleta dos dados. Desta forma, foi possível uma aproximação prévia com o objeto de estudo antes de iniciada a etnografia da comunicação.

Quanto às recomendações de futuras pesquisas, fica evidente a necessidade da realização de estudos que se aprofundem na compreensão do campo de consumo dos vinhos do Vale do São Francisco, explorando questões como o posicionamento dos vinhos da região em relação aos demais vinhos brasileiros (especialmente os da Serra Gaúcha), o posicionamento de cada uma das marcas de vinho da região dentro do campo e o discurso construído por cada uma delas. Extrapolando o campo de consumo do vinho do Vale, sugerimos ainda a realização de estudos que se debrucem sobre o cenário de consumo vínico brasileiro, investigando o processo de consolidação da cultura de consumo de vinhos em nosso país, bem como a relação de disputa que se estabelece entre os vinhos nacionais e os vinhos argentinos e chilenos, que possuem grande representatividade no mercado brasileiro.

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