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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE VETERINÁRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA – CLÍNICA E REPRODUÇÃO ANIMAL GUILHERME MARQUES SOARES AVALIAÇÃO DE FATORES DE INFLUÊNCIA NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES NITERÓI 2010

Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

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Page 1: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE VETERINÁRIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA – CLÍNICA E REPRODUÇÃO ANIMAL

GUILHERME MARQUES SOARES

AVALIAÇÃO DE FATORES DE INFLUÊNCIA NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES

NITERÓI 2010

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II

GUILHERME MARQUES SOARES

AVALIAÇÃO DE FATORES DE INFLUÊNCIA NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor. Área de Concentração: Clínica e Reprodução Animal.

Orientadores: Profª. Dra. RITA LEAL PAIXÃO Prof. Dr. JOÃO TELHADO PEREIRA

NITERÓI 2010

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III

S676 Soares, Guilherme Marques

Avaliação de fatores de influência na

manifestação da agressividade em cães/ Guilherme

Marques Soares; orientadora Rita Leal Paixão. —

2010.

96 f.

Tese (Doutorado em Clínica e Reprodução Animal)-

Universidade Federal Fluminense, 2010.

Orientadora: Rita Leal Paixão

1.Comportamento animal. 2. Cão. 3.Comportamento

agressivo. 4. Bem-estar do animal. I. Título.

CDD 156

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III

GUILHERME MARQUES SOARES

AVALIAÇÃO DE FATORES DE INFLUÊNCIA NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor. Área de Concentração: Clínica e Reprodução Animal.

Apresentada em 04 de novembro de 2010.

BANCA EXAMINADORA

PROFª. DRA. NORMA VOLLMER LABARTHE – UFF / FIOCRUZ

PROF. DR. JOSÉ MÁRIO D’ALMEIDA - UFF

PROF. DR. PROF RICARDO TADEU SANTORI – UERJ

PROF. DR. MAURO LANTZMAN – PUC-SP

PROFª. DRA. RITA LEAL PAIXÃO – UFF

NITERÓI 2010

Page 5: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

IV

Patrícia, Lia e Ana, dedico a vocês não só esta tese, mas toda a minha vida. Amo vocês.

Page 6: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

V

AGRADECIMENTOS

Aos meus orientadores, pessoas íntegras, éticas e de uma inteligência impar, por me ensinarem a cada dia o que é ser pesquisador.

À minha família, alicerce da minha vida, por todo apoio e incentivo que sempre me deram, desde o jardim da infância até hoje.

À minha esposa, pelo companheirismo, amor e paciência que tem comigo.

Às minhas filhas que, sem a menor noção disso, me incentivam a melhorar e me aprimorar como ser humano, como pai e como profissional.

Ao professor James Serpell e à Escola de Medicina Veterinária da Universidade da Pensilvânia, por nos ter permitido o uso do C-BARQ em nossa pesquisa.

A todos os criadores que permitiram a realização dos testes em seus canis.

Aos alunos da Faculdade de Medicina Veterinária da UFF que contribuíram aplicando os questionários.

A todos aqueles que muito generosamente responderam os questionários e testes psicológicos.

A Profª. Dra. Vilma Aparecida da Silva que tornou possível a realização dos testes psicológicos dos proprietários dos cães.

E principalmente a Deus que, com seu imenso amor, colocou toda essa gente bacana no meu caminho.

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VI

"Um misantropo sentimental engendrou este aforismo que muitas vezes se repete maquinalmente: quanto mais conheço os homens, mais gosto do meu cão. Eu afirmo a inversa: quem conhece verdadeiramente os animais, inclusive os animais superiores, os que nos são mais próximos, e possui uma certa compreensão da evolução filogenética, é por isso mesmo capaz de compreender plenamente o caráter único dos homens." (Konrad Lorenz)

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VII

“Vós sois o sal da terra. Se o sal perde o sabor, com que lhe será restituído o sabor? Para nada mais serve senão para ser lançado fora e calcado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre uma montanha nem se acende uma luz para colocá-la debaixo do alqueire, mas sim para colocá-la sobre o candeeiro, a fim de que brilhe a todos os que estão em casa. Assim, brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos céus”. (Mt 5, 13-16)

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VIII

RESUMO

A agressividade canina é um tema importante, pois, além de ser um problema de saúde pública, interfere na qualidade de vida de cães, proprietários e profissionais que lidam com esses cães. No capítulo I desta tese, objetivou-se estimar o impacto do problema nas unidades de atendimento clínico do Brasil. Para tal, foi feito um inquérito com médicos veterinários, através de um questionário enviado a todas as escolas de veterinária que possuíam unidades de atendimento no país. As agressões foram a segunda queixa comportamental mais frequente e a primeira indicação para abandono ou eutanásia. Mas, o que leva um cão a manifestar a agressividade? Para responder essa pergunta, outros quatro estudos foram realizados. No capitulo II, foi feita uma revisão sistemática de literatura para ver o que há publicado sobre a associação entre raça e agressividade. Com os trabalhos publicados de 1997 a março de 2009 não foi possível confirmar tal associação. No capítulo III, filhotes de seis a oito semanas, de cinco raças (Bull Terrier, Cocker Spaniel Inglês, Retriever do Labrador, Pit Bull e Rottweiler), foram submetidos ao Teste de Campbell, a fim de avaliar seus padrões de dominância e compará-los entre as raças. Concluiu-se que os cães das raças Rottweiler e Bull Terrier tiveram escores mais compatíveis com independência. No capítulo IV, os perfis dos compradores dos filhotes testados no capítulo III foram traçados com o auxílio de dois testes psicológicos, o Questionário de Agressividade e o Inventário Multifásico de Personalidade Minessota. Concluiu-se que as pessoas que compraram cães das raças Labrador e Cocker Spaniel Inglês apresentaram maiores pontuações na escala para Hostilidade do Questionário de Agressividade, comparados àqueles que compraram Rottweiler e Bull Terrier. No quinto capítulo foram correlacionados perfis de agressividade de proprietários e itens de manejo com padrões de agressividade dos cães. As comparações foram feitas usando o mesmo Questionário de Agressividade do capítulo IV para os proprietários e um questionário validado para identificação dos problemas de agressividade e medo dos cães. Concluiu-se que a agressividade física do proprietário tem uma correlação inversa com a agressividade canina direcionada a cães familiares e também que o fato de o proprietário permitir que o cão o guie se correlacionou com maior agressividade contra o proprietário. Os resultados encontrados nos cinco capítulos desta tese reforçam a ideia de que a manifestação da agressividade canina tem múltiplas causas que vão desde a raça até a personalidade do proprietário e de como este conduz a criação, a socialização e a educação de seu cão. Palavras-Chave: agressividade, comportamento canino, cães, bem-estar animal.

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IX

ABSTRACT

The Dog’s Aggression is an important issue because, besides being a public health problem, interfering with quality of life of dogs, owners, and professionals dealing with these dogs. In Chapter I of this thesis aimed to estimate the impact of the problem in veterinary care units in Brazil. To this end, a survey was done with veterinarians, through a questionnaire sent to all schools of veterinary medicine that had the clinics in the country. The aggressions were the second most common behavioral complaint, and the first indication for abandonment or euthanasia. But, what takes a dog to be aggressive? To answer that question, four other studies were conducted. In Chapter II, there was a systematic literature review to see what is published on the association between breed and aggression. With articles published from 1997 to March 2009 was not possible to confirm this association. In Chapter III, pups from six to eight weeks, five breeds (Bull Terrier, English Cocker Spaniel, Labrador Retriever, Pit Bull and Rottweiler), underwent the Campbell test, to assess their patterns of dominance and compare them between breeds. It was concluded that the Rottweilers and Bull Terriers scored more compatible with independence. In chapter IV, the profiles of buyers of pups tested in chapter III were traced with the help of two psychological tests, the Aggression Questionnaire and the Minnesota Multiphasic Personality Inventory. It was concluded that people who bought Labradors and English Cocker Spaniels had higher scores on a hostility scale, compared to those who bought Rottweiler and Bull Terrier. In the fifth chapter, the aggression profiles of owners and management items were correlated with patterns of aggression in dogs. Comparisons were made using the same Aggression Questionnaire for the owners and a validated questionnaire to identify the problems of aggression and fear of dogs. It was concluded that the owner’s physical aggressiveness has an inverse correlation with canine aggression directed to family dogs and also the fact that the owner let the dog guide was correlated with increased aggressiveness against the owner. The results in the five chapters of this thesis reinforce the idea that the expression of canine aggression has numerous causes ranging from the breed until the owner's personality and how this leads to creation, socialization and education of your dog. Key words: aggressiveness, canine behavior, dog, animal welfare.

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0

SUMÁRIO Resumo, p. VIII

Abstract, p. IX

1- Introdução, p. 1

2- Fundamentação Teórica, p. 3

2.1- Fatores que influenciam na manifestação da agressividade em cães, p. 5

2.1.1- Sexo, p. 5

2.1.2- Ambiente social e manejo, p. 6

2.1.3- Agressões por dominância, p. 9

2.1.4- Doenças, p. 11

2.2- Medidas preventivas, p. 12

3- Justificativas e objetivos, p. 15

3.1- Justificativas, p. 15

3.2- Objetivo geral, p. 15

3.3- Objetivos específicos, p. 15

3.4- Metas, p. 16

4- Desenvolvimento, p. 17

4.1- Capítulo I – Epidemiologia de problemas comportamentais em cães no Brasil: inquérito

com médicos veterinários, p. 17

4.1.1- Introdução, p. 17

4.1.2- Material e métodos, p. 18

4.1.3- Resultados, p. 19

4.1.4- Discussão, p. 22

4.1.5- Conclusão, p. 24

4.2- Capítulo II – Associação entre raça e agressividade em cães: revisão sistemática, p. 25

4.2.1 – Introdução, p. 25

4.2.1.1- Associação entre genética e comportamento, p. 25

4.2.2- Material e métodos, p. 28

4.2.3- Resultados, p. 29

4.2.3.1- Quanto ao desenho metodológico dos artigos, p. 29

4.2.3.2- Quanto às raças mais agressivas, p. 30

4.2.4- Discussão, p. 31

4.2.5- Conclusão, p. 32

4.3 - Capítulo III – Comparação do comportamento dominante de filhotes de cães de cinco

raças, p. 36

4.3.1 – Introdução, p. 36

4.3.2 – Material e métodos, p. 36

4.3.3 – Resultados, p. 39

4.3.4 – Discussão, p. 41

4.3.5 – Conclusão, p. 43

Page 12: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

1

4.4 - Capítulo IV – Perfil dos compradores de filhotes de quatro raças, p. 44

4.4.1 – Introdução, p. 44

4.4.2 – Material e métodos, p. 45

4.4.3 – Resultados, p. 47

4.4.4 – Discussão, p. 50

4.4.5 – Conclusão, p. 53

4.5 - Capítulo V – Avaliação da influência da agressividade do proprietário na manifestação

da agressividade do cão, p. 54

4.5.1 – Introdução, p. 54

4.5.2 – Material e métodos, p. 54

4.5.2.1- Questionário para avaliação e pesquisa comportamental de cães, p. 56

4.5.3 – Resultados, p. 56

4.5.3.1 – Correlação entre características do proprietário e agressividade do cão, p. 57

4.5.3.2 – Correlação entre agressividade do proprietário e agressividade do cão, p. 58

4.5.3.3 – Correlação entre características dos cães e de manejo e agressividade do cão, p. 59

4.5.4 – Discussão, p. 61

4.5.5 – Conclusão, p. 65

5- Considerações Finais, p. 66

6- Bibliografia, p. 69

Glossário, p. 82

Apêndice, p. 84

Domesticação e formação das raças, p. 84

Classificação zoológica, p. 85

Histórico das raças caninas estudadas nos capítulos III e IV, p. 85

Retirever do Labrador, p. 85

Rottweiler, p. 86

Cocker Spaniel Inglês, p. 86

Bull Terrier, p. 87

Pit Bull, p. 87

Anexo 1, p. 89

Anexo 2, p. 91

Page 13: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

1- INTRODUÇÃO

A convivência do cão com o ser humano é dinâmica ao longo dos, pelo

menos, quinze mil anos de história comum entre essas duas espécies. No início da

domesticação, o cão agia como um lixeiro, passando a colaborador, parceiro e hoje

tem uma relação com o ser humano que beira a dependência mútua, principalmente

nos grandes centros urbanos. Relação na qual o cão depende integralmente do

abrigo e do alimento fornecidos pelo homem e o homem pode se beneficiar do

equilíbrio emocional proporcionado pelo cão.

O equilíbrio dessa relação é seriamente ameaçado cada vez que o cão, que é

um predador/carniceiro por natureza, apresenta comportamentos agressivos contra

esse humano, muitas vezes sem preparo emocional para encarar essa agressão

sem considerá-la uma forma de traição. A agressão de cães contra seres humanos é

a principal queixa que leva proprietários a procurarem serviços de etologia clínica no

mundo inteiro. Os cães são os animais que mais causam acidentes por ataques

contra seres humanos, principalmente nos ambientes urbanos. As principais vítimas

desses cães são pessoas de convívio próximo a eles (proprietários, familiares e

vizinhos). Considerando esses fatos, a mordedura de cães passa a ser um problema

de saúde pública, já que milhares de pessoas são mordidas por cães em todo o

mundo por ano, o que gera um ônus pecuniário aos sistemas públicos de saúde,

além do impacto na qualidade de vida dos indivíduos atacados devido a suas

consequências físicas e psicológicas.

Há uma infinidade de causas possíveis e teorias defendidas sobre as causas

dessa agressividade, porém há poucos estudos na área. Sabe-se que cães menos

socializados têm maior dificuldade de convívio, que algumas raças são mais

predispostas a ataques em certos contextos que outras e também que os machos

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2

têm maior tendência à agressividade interespecífica, porém onde está a chave dessa

problemática ainda é uma incógnita.

Ante a necessidade de elucidar pontos obscuros nas motivações para a

agressividade dos cães, na presente tese, testamos a seguinte hipótese: “A

manifestação da agressividade canina tem origem multifatorial que envolve raça,

manejo e a personalidade do proprietário”, porém sem a pretensão de esgotar o

assunto.

Antes de investigar os fatores relacionados com a manifestação da

agressividade canina, no capítulo I buscamos verificar se o problema é relevante no

cotidiano do clínico de pequenos animais no Brasil, através de um inquérito

epidemiológico com médicos veterinários.

No capítulo II, buscamos investigar, a partir da literatura, a associação entre

raça e agressividade. No capítulo III, baseado na associação que existe entre

agressividade canina contra seres humanos e dominância, investigamos a

dominância em filhotes de cinco raças, Pit Bull, Bull Terrier, Rottweiler, Retriever do

Labrador e Cocker Spaniel Inglês.

No capítulo IV buscamos relacionar aspectos psicológicos do proprietário que

influenciam na aquisição dos filhotes, a fim de responder à pergunta: existe algum

padrão psicológico que leve a pessoa a escolher essa ou aquela raça? Já no

capítulo V, o objetivo é relacionar a agressividade do proprietário, assim como

aspectos de manejo, com a agressividade canina.

Page 15: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

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2- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A agressividade canina é um tema frequentemente abordado quando o

assunto é a interação entre o homem e o cão. Governos legislam sobre raças

agressivas (RIO DE JANEIRO, 1999; SÃO PAULO, 2003; ROSADO et al., 2007;

MATO GROSSO DO SUL, 2008), condomínios impõem regras de convivência para

evitar acidentes envolvendo ataques e várias pessoas temem os cães devido a

traumas sofridos ou transmitidos em decorrência de respostas agressivas de cães.

A agressividade é definida como a conduta do agressivo, como instinto de

combate do animal (LORENZ, 2001). A agressão se refere ao comportamento

ameaçador ou perigoso e abrange uma ampla variedade de comportamentos, desde

posturas corporais sutis e expressões faciais até os ataques propriamente ditos

(LANDSBERG et al., 2004). A palavra agressão traz como significado à mente

humana: maldade, sordidez ou vingança, mas não é o que acontece com os cães.

As agressões fazem parte do repertório comportamental dessa espécie (FOGLE,

1992). A agressividade no reino animal, longe de ser um princípio diabólico,

destruidor, como a psicanálise nos quer levar a crer, é indubitavelmente uma parte

essencial da organização dos instintos em vista da proteção da vida (LORENZ,

2001). No caso do cão, os comportamentos agressivos são subdivididos em três

etapas: ameaça, ataque e apaziguamento (BEAVER, 2001). A ameaça é

caracterizada por posturas intimidadoras, rosnados, latidos, exibição de dentes,

piloereção cervical ou manutenção de contato visual, podendo se compor de um ou

vários desses sinais. O ataque é a agressão propriamente dita, caracterizado pela

mordida ou sua tentativa. A fase de apaziguamento é caracterizada por um

comportamento relativamente não agressivo, mas que reforça a postura agressiva

do cão pós-ataque. O cão pode lamber a região mordida, montar no agredido ou

apenas por sua pata sobre ele (OVERALL, 1997).

Page 16: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

4

A agressividade pode ser manifestada em vários contextos e é essa

contextualização que vai direcionar uma possível abordagem terapêutica para cada

caso. As vítimas nesses contextos podem ser de qualquer espécie, principalmente

humanos e caninos. Os contextos podem ser divididos didaticamente em ativos ou

passivos. Nos casos da agressividade ativa, os cães atacam sem qualquer ameaça

direta à sua integridade física. Portanto se pode caracterizar como ativos os

episódios de agressão ocorridos nos seguintes contextos:

• Predação - o cão ataca com todo um gestual de caça. É comum ocorrer

contra pessoas correndo (frequentemente crianças), rodas e pneus (carros, motos,

bicicletas, patins ou skates). Também com animais de outras espécies (FOGLE,

1992; OVERAL, 1997; BEAVER, 2001).

• Proteção Territorial – os ataques são direcionados a indivíduos que não

fazem parte do grupo social do cão e invadem seu espaço territorial. Este território

pode se estender além dos limites territoriais estabelecidos pelos seres humanos,

como muros ou cercas. Neste contexto também, o cão pode reagir agressivamente

durante passeios com algum membro humano de seu grupo social, quando

indivíduos (humanos ou caninos) se aproximam, invadindo um perímetro territorial

que o cão reconhece como seu. (FOGLE, 1992; OVERAL, 1997; LANDSBERG,

2004).

• Proteção Maternal – os ataques são efetuados por fêmeas comumente em

período de amamentação. Pode ocorrer também com algumas cadelas em

pseudociese. Esta categoria de agressividade assume características semelhantes

às de proteção territorial, porém dentro do contexto da fêmea protegendo sua prole

(FOGLE, 1992; OVERAL, 1997; BEAVER, 2001).

• Disputa Hierárquica – Também é chamada de Agressão por Dominância.

Uma das principais características deste tipo de agressão é o fato de, na maioria das

vezes, ser direcionada a algum membro da família (CAMERON, 1997; PALÁCIO et

al., 2005). É o tipo de agressão mais difícil de ser contextualizada, pois normalmente

envolve situações que não encontram justificativas, considerando-se valores

humanos.

A agressividade caracterizada como passiva envolve situações onde o cão

simplesmente reage a estímulos que ameacem sua integridade física. São essas

situações:

Page 17: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

5

• Por Medo - um cão acuado se defende daquilo que o ameaça de forma

agressiva (MILLS e ZULCH, 2010). Este tipo de agressão foi o mais observado em

um estudo belga com cães militares, mesmo com a rejeição de cães medrosos no

momento da seleção para o trabalho designado, o que pode estar relacionado com a

técnica de adestramento usada com tal grupo de cães (HAVERBEKE et al., 2009). É

um tipo de agressão normalmente perigoso, pois o cão não reprime o ataque, visto

que se sente ameaçado. É como se dissesse: “é ele ou eu”.

• Por Dor - o cão ataca aquele que está ou que já lhe tenha causado dor

(FOGLE, 1992; OVERAL, 1997; BEAVER, 2001). Portanto, é um contexto comum

nas clínicas veterinárias ou a cães que estejam sofrendo ou que já tenham sofrido

processos dolorosos como dores crônicas ou reações inflamatórias agudas.

Todas as situações listadas envolvem contextos normais de agressividade,

porém ainda ocorrem agressões que não são possíveis de serem contextualizadas,

chamadas idiopáticas. Existem também aquelas com causas clínicas

(endocrionopatias ou neuropatias), e ainda há casos com ambivalências que

mesclam classificações. Um exemplo desses casos que mesclam classificações são

casos de agressão normalmente caracterizada como hierárquica por causa do

contexto geral da agressão, porém traz, em inúmeros casos, linguagem corporal

incompatível com o conflito hierárquico, não há a postura do líder se impondo ao seu

subordinado. Tal linguagem corporal, com misto de ofensiva e defensiva (ativa e

passiva), caracteriza uma situação que mescla a dominância e o medo motivando a

agressão (LUESCHER & REISNER, 2008).

É relevante ressaltar que a agressão canina direcionada a seres humanos

muitas vezes é desejada pelo proprietário, como no caso dos cães de guarda.

Porém, ainda assim é necessário que se preveja e trabalhe tal agressividade a fim

de evitar acidentes que ocorrem pela falta de discernimento dos cães para o certo e

o errado.

2.1- FATORES QUE INFLUENCIAM NA MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE EM CÃES

2.1.1- Sexo

Nos casos de agressões a seres humanos, há uma predominância de cães

machos não castrados (WRIGHT, 1991; FATJÓ et al., 2005; PALÁCIO et al., 2005;

PALESTRINI et al., 2005; ROSADO et al., 2009; VOITH, 2009). Machos também se

Page 18: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

6

mostram mais frequentemente envolvidos em ataques no contexto de agressão

territorial (PÉREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009). Entretanto, as agressões

podem ocorrer numa variedade de circunstâncias, que dependem mais da motivação

para a agressão do que do sexo do agressor (MERTENS, 2006).

As cadelas apresentam com mais frequência comportamentos agressivos

contra outros cães, quando essa frequência é comparada à frequencia que os

machos demonstram comportamentos agressivos entre si . Essas agressões de

fêmeas tendem a ser mais frequentes ainda no período de estro (MERTENS, 2006).

Em estudo realizado no Canadá, as cadelas apresentaram probabilidade maior de

respostas agressivas do que os machos e quanto menor o peso da fêmea, maior a

probabilidade de ter sido envolvida em um ataque a ser humano (GUY et al., 2001b).

Quanto a gonadectomia, os machos castrados mostram menor tendência a

comportamentos agressivos comparados aos machos não castrados (OVERALL e

LOVE, 2001). Porém, há um experimento que foi realizado com cadelas da mesma

raça, em uma faixa estreita de idade, criadas sob as mesmas condições e divididas

em dois grupos. Nesse estudo, as cadelas do grupo experimental foram ovario-

histerectomizadas e apresentaram reações agressivas com maior frequência num

período de quatro a cinco meses após a cirurgia, quando comparadas a fêmeas e

que não foram castradas (KIM et al., 2006).

2.1.2- Ambiente Social e Manejo

O ambiente social, desde a ninhada, pode influenciar o comportamento

agressivo do adulto. Em estudo retrospectivo realizado no Chile com cães da raça

Rottweiler e mestiços de Rottweiler, observou-se que animais oriundos de ninhadas

pequenas apresentaram menor agressividade que os de ninhadas grandes. Tal fato

pode estar relacionado à disponibilidade de alimento e/ou atenção da mãe

(BUSTOS, 2003).

No Reino Unido, a agressividade de cães da raça Cocker Spaniel Inglês foi

avaliada através de uma escala de cinco pontos (1- sem agressão e 5 – muito

agressivo). A partir desses resultados os autores selecionaram o primeiro quartil

como o grupo de “menor agressividade” e o quarto quartil como o grupo de “maior

agressividade”. O grupo de “menor agressividade” relacionou-se com frequência

significativamente maior ao grupo de donos acima de 65 anos e a maior frequência

de escovação e passeios. O grupo de “maior agressividade” apresentou correlação

Page 19: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

7

com o grupo proprietários com idade compreendida entre 25 e 34 anos. O mesmo

grupo teve correlação com histórico de doença do cão nas suas primeiras 16

semanas de vida e com frequências de passeios menores que o outro grupo. Este

grupo mostrou maior frequência em puxar a guia, assim como uma maior resistência

para obedecer comandos. Os proprietários de cães deste grupo, de “maior

agressividade”, demonstraram menor vínculo afetivo com seus cães (PODBERSCEK

e SERPELL, 1997).

Em um estudo canadense, a presença de adolescentes convivendo com o

cão e o fato deste dormir na cama dos proprietários nos primeiros dois meses em

que estavam na casa, foram estatisticamente relacionados com o grupo de cães

envolvidos em agressões direcionados a indivíduos da família humana que os

acolheu desde filhotes (GUY et al., 2001b).

Cães militares levados para a casa de seus responsáveis e que praticam

esportes com eles, ou seja, que tiveram um grau de interatividade constante,

demonstraram menos agressividade, mais sociabilidade e mais obediência, quando

comparados àqueles que só tiveram contato com seus responsáveis no canil militar

(LEFEBVRE et al., 2007).

Em um estudo feito na Austrália com questionários respondidos por

proprietários, se demonstrou que o risco de agressão relacionada à comida foi maior

em: cães mestiços; cães que foram adquiridos com mais idade; residências onde

tinham mais cadelas; residências com maior número de cães; e cães que recebiam

petiscos à mesa, durante as refeições das pessoas. O risco para esse tipo de

agressão diminuiu em cães que caminham com seus donos diariamente e que

recebiam petiscos durante o treinamento (MCGREEVY e MASTERS, 2007).

Alguns fatores mostraram aumentar a probabilidade da ocorrência de

agressões territoriais, são eles: a finalidade da aquisição do cão (para guarda

patrimonial); nível de escolaridade do proprietário (com nível universitário); e punição

dos cães com castigos físicos (PÉREZ-GUISADO et al., 2008).

Um estudo sugere que cães adquiridos para companhia, com acesso a

visitantes em casa e com menores restrições de movimentos (que ficam mais soltos)

tiveram maior risco de ataques a pessoas. Esse estudo foi feito com cães de duas

cidades em países diferentes e teve resultados diferentes em relação à

agressividade para os mesmos hábitos teoricamente predisponentes. Por exemplo, o

fato de o cão dormir na cama de algum membro da família teve correlação com a

Page 20: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

8

agressividade entre os cães de uma cidade, mas sem a mesma correlação entre os

animais da outra. O que sugere que diferenças culturais podem interferir na

predisposição a ataques de cães a seres humanos em contextos diferentes

(MESSAM et al., 2008).

Pesquisadores identificaram que fatores como o fato de a pessoa ser

responsável por um cão pela primeira vez e como esta pessoa educa esse cão têm

maior influência no desenvolvimento de agressões por dominância do que fatores

intrínsecos ao cão como: sexo, raça, idade, tamanho ou cor da pelagem (PEREZ-

GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009).

Um estudo que avaliou cães agressores e cães agredidos revelou que os

cães agressivos eram predominantemente adquiridos em canis, enquanto os cães

oriundos de abrigos ou de amigos ou parentes expressavam maioria numérica no

grupo dos agredidos (ROLL e UNSHELM, 1997). O mesmo estudo revelou que os

cães agressores já exibiam uma tendência a agredirem outros cães. Essa tendência

foi relatada por tentativas de agressão em episódios anteriores da agressão

propriamente dita. A maioria dos cães envolvidos nas brigas avaliadas no estudo

caminhava na rua sem estarem devidamente contidos com guia. Os dois grupos

apresentaram uma história comum de falha na socialização primária com outros

cães. Observou-se predominância de machos dentre os cães envolvidos nas brigas.

Cães de propriedade de mulheres encontraram-se mais no grupo dos agredidos, do

que no grupo dos agressores. Cães que passeavam com toda a família foram os

mais encontrados no grupo das vítimas.

O ambiente social tem um papel muito importante no contexto de agressões

motivadas por conflitos hierárquicos (OVERALL, 1997), sendo este o contexto de

agressão que mais leva proprietários aos serviços de etologia clínica por todo o

mundo (GUY et al., 2001c; DENEMBERG et al., 2005; FATJÓ et al., 2005; FATJÓ et

al., 2007).

A agressividade faz parte do repertório comportamental do cão, assim como

de outras tantas espécies de animais sociais ou não. Dentro das matilhas, apesar de

ser um comportamento normal, existe uma variedade de rituais de apaziguamento.

Esses rituais de apaziguamento são fundamentais no processo evolutivo das

espécies, pois visam manter a coesão de grupos de animais gregários (LORENZ,

2001). Grupos de animais que ficam brigando entre si tornam-se mais fracos e mais

vulneráveis a predadores, por exemplo. Portanto, as agressões ocorridas dentro do

Page 21: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

9

mesmo grupo social não são desejáveis no contexto humano nem no canino.

Segundo os argumentos de Lorenz (2001) pode-se supor que tais agressões dentro

dos grupos sociais ocorram devido a uma ruptura na harmonia de seu

comportamento natural por ambiguidades nas atividades do grupo social em questão

ou a um não entendimento dos rituais naturais desses cães. Em relação às

agressões caninas direcionadas aos seres humanos do mesmo grupo social do

agressor, essas seriam provocadas pela ruptura na harmonia social do grupo ou

pelo não entendimento dos rituais de apaziguamento. Nesse caso a explicação é

corroborada pelos argumentos de Turner (1997), que diz que as causas não

orgânicas de problemas comportamentais podem ser classificadas em: desrespeito

(por falta de conhecimento) às características biológicas normais dos animais; falsas

expectativas criadas pelos proprietários em relação a seus animais; e interação

incorreta com o animal.

2.1.3- Agressões por Dominância

A dominância é um traço individual de conduta, comum a indivíduos de várias

espécies, é inato e tem forte importância evolutiva para espécies sociais

(CAMERON, 1997). Essa característica faz com que o cão assuma postos mais altos

em sua hierarquia social, com o conceito oposto à submissão (FOGLE, 1992;

BEAVER, 2001). Tal característica é manifestada nos cães de diversas maneiras,

sempre com o objetivo de obter o controle dos recursos, que no ambiente doméstico

são: alimento, abrigo, brinquedos e o local de dormir. Nesse contexto, a atenção e o

carinho das pessoas também pode ser incluído na relação de recursos controlado

pelo cão. O cão dominante pode exercer essa dominância de forma pacífica ou

agressiva em relação a pessoas ou cães. Na abordagem agressiva, o cão se

comporta inicialmente com intimidações posturais ou sonoras e posteriormente com

ataques direcionados àquele que ameace sua superioridade hierárquica ou a ordem

natural da matilha (OVERALL, 1997).

Na maioria das vezes, estrutura social canina normalmente se apresenta

organizada de forma linear na qual A domina B que domina C e assim

sucessivamente (OVERALL, 1997; BEAVER, 2001; LANDSBERG et al., 2004). Essa

hierarquia já começa a ser estabelecida desde a ninhada, quando os filhotes

definem quem terá acesso prioritário aos recursos (comida, água, sombra,

brinquedos ou abrigo) através de brincadeiras. A relação de dominância e

Page 22: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

10

submissão é exibida e reforçada durante as brincadeiras, nas quais os dominantes

mostram-se mais ativos e os submissos mais responsivos às iniciativas dos

dominantes (BAUER e SMUTS, 2007). Essas brincadeiras agonísticas começam em

torno de cinco semanas e aumentam até o estabelecimento da hierarquia,

decrescendo a partir de oito a dez semanas (PAL, 2008). Comportamentos

dominantes frequentemente observados em filhotes são: estabelecer o controle do

alimento; rolar o outro indivíduo sobre seu dorso expondo o ventre, abocanhar o

pescoço do outro, abocanhar a boca do outro e montar no outro simulando

comportamento de cópula (BEAVER, 2001). A aceitação ou não dessas iniciativas

acaba por organizar socialmente esses filhotes.

Essa estruturação social dos cães é parte do que Askew (2003) chama de

Pack Theory, ou Teoria da Matilha, que não é essencialmente uma teoria (WRIGHT,

2004), mas uma idéia aceita e difundida no meio da etologia clínica (FOGLE, 1992;

CAMERON, 1997; OVERALL, 1999; BEAVER, 2001; ASKEW, 2003; LANDSBERG

et al., 2004). Tal teoria se baseia em dois princípios. O primeiro diz que os padrões

comportamentais de cães e lobos são essencialmente os mesmos (SCOTT e

FULLER, 1965). O segundo diz que quando socializados com pessoas, cães e lobos

transferem para os seres humanos os relacionamentos sociais que normalmente se

desenvolvem com indivíduos da mesma espécie o quanto lhes são permitidos pelo

seu grupo social humano. Cães não adquirem comportamento humano com essa

associação, mas continuam a mostrar o padrão comportamental comum a todos os

canídeos (SCOTT e FULLER, 1965). Ou seja, é a ideia de que o cão quando

inserido no contexto social humano, o que inclui residências com outros animais, se

comporta como se comportaria dentro de um grupo de cães em liberdade, desta

forma, assumindo a posição hierárquica que lhe for permitida ou indicada dentro do

grupo (FOGLE, 1992; OVERALL, 1999; BEAVER, 2001; ASKEW, 2003). Há autores

que a questionam (VAN KERKHOVE, 2004; BRADSHAW et al., 2009), alegando que

sua base em uma estimativa do comportamento canino a partir do comportamento

de lobos se torne falha no momento em que já há estudos demonstrando diferenças

cognitivas significativas entre esses canídeos tanto no comportamento intra como

interespecífico (HARE et al, 2002). Enfim, a Teoria da Matilha é uma ideia sujeita a

modificações e adaptações a partir de novos estudos que avaliem a relação do cão

com o ser humano e como não é o foco direto da presente tese não haverá um

maior aprofundamento nem uma maior discussão a respeito.

Page 23: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

11

Uma das principais características da agressão por dominância é o fato de,

na maioria das vezes, ser direcionada a algum membro da família (CAMERON,

1997; PALÁCIO et al., 2005).

Há situações que motivam os ataques caninos e são típicas de reações

agressivas por dominância: incomodar o cão enquanto dorme; puxar a guia para

corrigir o cão; puxar a cabeça do cão para pôr-lhe a guia; escovar o cão; encarar o

cão; portar uma focinheira; conduzir o cão em exercícios restritivos; usar punição

física (OVERALL, 1999). Além dessas situações, podem ocorrer reações agressivas

quando pessoas tentam deixar o cômodo em que se encontram assim como

comportamentos não agressivos fazendo parte do contexto como: monta indevida,

marcação territorial, roubo de comida ou pular nas pessoas (LANDSBERG, 1990). O

último item sugere a necessidade do cão dominante em estar sempre “por cima”. A

agressão relacionada à comida pode fazer parte do contexto da agressão por

dominância. Neste caso, o cão demonstra reações agressivas com a proximidade de

algum indivíduo (humano o canino) de sua comida, podendo se estender a outros

recursos como abrigo (camas, sofás, casinhas, etc) ou pertences que o cão

considere como dele (brinquedos, panos ou objetos “furtados” do proprietário), o que

é chamado de agressão possessiva (LUESCHER e REISNER, 2008).

2.1.4- Doenças

Para o diagnóstico de distúrbios de comportamento relacionados à

agressividade, é importante descartar causas clínicas como: neoplasias, infecções,

distúrbios hormonais ou doenças neurológicas (OVERALL, 1999).

Em um estudo comparando uma população de cães que apresentaram

quaisquer problemas de comportamento e sua função tireoideana revelou-se que

61% desses cães apresentavam atividade tireoidiana deficiente, mas ainda

subclínica, havendo uma correlação significativa entre disfunção tireoideana e

agressão direcionada a pessoas (ARONSON e DODDS, 2005).

Caldwell e Little (1980) relataram que, de oito animais com histórico de

agressividade, três apresentaram lesões em exames histopatológicos, como

necrose, gliose e microvaculação em áreas do sistema límbico.

Cães com histórico de tratamento para doença de pele apresentaram maior

probabilidade de ter mordido familiares humanos, o que pode estar relacionada com

a medicação usada para o tratamento (corticóides e/ou anti-histamínicos) ou com o

Page 24: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

12

potencial aumento da irritabilidade secundário ao prurido ou à privação do sono

(GUY et al., 2001b).

2.2- MEDIDAS PREVENTIVAS

Alguns autores concordam (OVERALL, 1997; BEAVER, 2001; LANDSBERG

et al., 2004) que a correta orientação dos proprietários quanto a aspectos inerentes

ao comportamento canino (estabelecimento de hierarquia, princípios de

comunicação e aprendizado) e a socialização primária (SEKSEL, 1997) seriam as

melhores maneiras de prevenir comportamentos agressivos de cães a seres

humanos.

Alguns governos tentam controlar os ataques com leis proibitivas de certas

raças (RIO DE JANEIRO, 1999; SÃO PAULO, 2003; ROSADO et al., 2007; MATO

GROSSO DO SUL, 2008). Na Espanha, no período de 2000 a 2004, tais leis não se

mostram eficientes no controle epidemiológico de ataques de cães a seres humanos

(ROSADO et al., 2007).

Socialização é o processo de aprendizado do comportamento social

apropriado com indivíduos da mesma espécie ou de espécies diferentes (SEKSEL,

1997). Lorenz (2001) diz que ritos provenientes de movimentos agressivos

reorientados não são incorporados no patrimônio hereditário dos animais, mas são

transmitidos pela tradição e cada indivíduo tem que aprendê-los. Diz também: “nos

animais, uma experiência individualmente adquirida se transmite igualmente por

ensino e aprendizagem, dos indivíduos mais velhos aos mais novos”. No processo

de domesticação, o cão é inserido no convívio humano, por isso, é extremamente

necessário que seja socializado no contexto humano, para que essa interação

interespecífica ocorra de uma forma coerente e socialmente aceita pela sociedade

humana. Um cão socializado no contexto humano passa a ter uma relação mais

harmônica com sua família humana, o que traz benefícios sociais à família e ao cão

(SEKSEL, 1997). Considerando que a maioria dos ataques acontece em contextos

familiares e comumente são direcionados a pessoas conhecidas da família, como

vizinhos, parentes e amigos (OVERALL e LOVE, 2001), a socialização torna-se uma

necessidade mais significativa. Porque, no aprendizado dentro do processo de

socialização, o cão passa a reconhecer pessoas ou atividades como parte da sua

vida e não como ameaça, fazendo que um cão não ataque uma criança conhecida

Page 25: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

13

quando esta invade o seu território por não identificá-la nem como ameaça nem

como presa.

A fase da vida que vai de oito a dezesseis semanas é considerada um ponto

crítico no desenvolvimento social dos cães e é chamada de fase de socialização

primária (SCOTT e FULLER, 1965). Nesta fase o cão aprende com muito mais

facilidade e de uma forma mais intensa e duradoura o que é seguro ou não para ele.

Cães que até as 16 semanas não tiveram contato com pessoas passaram a

comportarem-se como selvagens1 , temendo qualquer pessoa que se aproxime,

tornando-os incapazes de aprender comandos simples de adestramento (SCOTT e

FULLER, 1965). Por outro lado, cães criados em famílias humanas tiveram maior

rendimento em testes cognitivos (SCOTT e FULLER, 1965) e menos reações

agressivas quando comparados com os que ficaram instalados permanentemente

em canis (LEFEBVRE et al., 2007).

No processo de socialização durante a fase de socialização primária,

apresenta-se ao cão, de forma positiva, todos os fatores que farão parte da vida do

cão com este cão ainda filhote (8-16 semanas). Esses fatores devem ser controlados

para garantir que a experiência seja positiva, por exemplo: pessoas de diferentes

idades, diferentes etnias, brinquedos ou objetos (SEKSEL, 1997). Um exemplo de

como pode ser feita esta prevenção está em uma pesquisa feita recentemente no

Brasil, na qual a pesquisadora desenvolveu uma técnica de socialização primária

com filhotes de cães. Nessa pesquisa, os cães e seus proprietários participavam de

aulas de socialização e eram orientados sobre cuidados básicos (escovação de

dentes e controle de ectoparasitas, por exemplo) assim como sobre como interagir

de maneira correta com seus cães. Esses cães, que eram filhotes, eram avaliados

durante as interações para a identificação precoce de possíveis problemas de

comportamento. Tal estudo teve como resultado um alto índice de satisfação dos

proprietários e uma melhora na qualidade da interação destes com cães e vice-versa

(SERRA, 2005).

Outra medida para prevenir problemas de comportamento, inclusive os

relacionados à agressividade, é selecionar o cão para atender às demandas da

família de maneira adequada considerando a realidade dessa família (LANTZMAN,

2004). Com o objetivo de selecionar cães para atenderem às demandas de

1 Nota do autor – O cão nas condições descritas comporta-se como um animal que ainda não foi domesticado,

que ainda vive sem o contato humano.

Page 26: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

14

diferentes famílias ou atividades, Netto e Planta (1997) desenvolveram um teste para

essa seleção e descreveram que cães que reagiram agressivamente durante os

testes, tiveram maior probabilidade de agredirem depois de inseridos em suas

atividades ou famílias.

Page 27: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

15

3- JUSTIFICATIVAS E OBJETIVOS

3.1- JUSTIFICATIVAS

A relação cada vez mais próxima do cão com o ser humano, a importância

dos ataques de cães como aspecto de saúde pública, a agressão canina como

principal causa de abandono ou eutanásia de cães pelo mundo e os problemas

relacionados à agressividade canina como principais queixas clínicas

comportamentais em todo o mundo justificam a presente tese.

3.2- OBJETIVO GERAL

Investigar fatores que exercem influência na manifestação da agressividade

em cães, visando sua prevenção.

3.3- OBJETIVOS ESPECÍFICOS

a) Avaliar a importância do problema para o médico veterinário brasileiro que

trabalha com atendimento clínico a cães no Brasil;

b) Investigar na literatura a relação entre agressividade e raça canina;

c) Comparar o grau de dominância em filhotes das diferentes raças

pesquisadas;

d) Identificar se há influência de algum padrão de personalidade do

proprietário na seleção da raça, no período da aquisição do cão;

e) Correlacionar a agressividade do proprietário com a manifestação da

agressividade por parte dos cães;

f) Identificar itens de ambiente social e manejo que possam estar

relacionados aos comportamentos agressivos por parte dos cães;

g) Verificar se há associação entre a agressividade e outros padrões

comportamentais como medo ou ansiedade.

Page 28: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

16

3.4- METAS

a) Contribuir para melhorar a relação do cão com o ser humano, a partir do

entendimento das motivações para a agressividade dos cães;

b) Contribuir para reduzir o número de acidentes causados por ataques de

cães, agindo de forma preventiva a partir do entendimento das motivações para a

agressividade dos cães.

Page 29: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

17

4- DESENVOLVIMENTO

Para que houvesse uma sequência no raciocínio do leitor em relação às

metodologias empregadas a fim de confirmar ou não à hipótese inicial que é: “A

manifestação da agressividade canina tem origem multifatorial que envolve raça,

manejo e a personalidade do proprietário”, a presente tese foi dividida em cinco

capítulos.

4.1- CAPÍTULO I – EPIDEMIOLOGIA DE PROBLEMAS COMPORTAMENTAIS EM CÃES NO BRASIL:

INQUÉRITO COM MÉDICOS VETERINÁRIOS

“O conceito de normal é um dos mais difíceis de definir em toda a biologia, mas ao mesmo

tempo é tão indispensável como o conceito oposto de patológico.” (LORENZ, 2001)

4.1.1- Introdução

A ocorrência de problemas de comportamento em cães tem implicações

importantes no bem-estar desses animais e em sua relação com seus proprietários.

Acidentes por ataques de cães são considerados um problema de saúde pública

(OVERALL e LOVE, 2001; O´SULIVAN et al., 2008a). Nos Estados Unidos da

América (EUA), o custo anual do sistema público de saúde com tratamento de

vítimas de ataques de cães excede 100.000.000 de dólares (OVERALL e LOVE,

2001).

A agressividade canina é o problema que mais leva proprietários a procurar

os serviços especializados em etologia clínica na Espanha (FATJÓ et al., 2005;

FATJÓ et al., 2007). Convém destacar que após acidentes com ataques de cães,

sinais da síndrome de Estresse Pós-traumático foram observados em 12 de 22

crianças belgas em um estudo desenvolvido naquele país, sendo que cinco dessas

Page 30: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

18

crianças desenvolveram o quadro completo da síndrome (PETERS et al., 2004;

KEUSTER et al., 2006). Tal problema, por vezes, requer que a vítima e seus

parentes próximos sejam encaminhados a serviços de acompanhamento psicológico

(VOITH, 2009). Em estudo recente realizado em Niterói, no Estado do Rio de

Janeiro, 27,6% dos proprietários de cães que residiam em apartamento

entrevistados descreveram a agressividade como um comportamento incômodo ou

problemático exibido por seus cães (SOARES, 2007). No mesmo município, 87,4%

dos proprietários de cães que residiam apartamento relataram que seus cães

rosnavam ou tentavam morder em pelo menos uma situação cotidiana. A situação

que desencadeava tais respostas com maior frequência foi quando o cão era

contrariado, em 30,1% dos casos (SOARES et al., 2007).

Cerca de vinte milhões de animais de estimação a cada ano são

abandonados em abrigos nos EUA e pelo menos a metade desses são mortos por

causa de problemas de comportamento (SEKSEL, 1997).

No Brasil, até o presente momento, não há publicada uma casuística nacional

dos problemas de comportamento dos cães domésticos nem de como os casos

existentes são conduzidos. O presente estudo objetivou relatar os problemas de

comportamento mais frequentemente atendidos por médicos veterinários brasileiros,

assim como suas condutas clínicas e algumas consequências de tais problemas

para o bem-estar e vínculo homem-animal, sob a visão desses clínicos.

4.1.2- Material e Métodos

Para obtenção dos dados sobre problemas de comportamento foi utilizado o

questionário de Fajtó et al. (2006) modificado (ANEXO 1), composto de perguntas

sobre cães e gatos (os resultados referentes aos felinos foram publicados no

International Journal of Applied Research in Veterinary Medicine, v. 7, p. 130-137,

2009.). Após a elaboração dos questionários, os mesmos foram enviados por

correio, através de sistema de carta-resposta, para as 108 faculdades de medicina

veterinária distribuídas em todo o território nacional, que possuíam unidades de

atendimento clínico a cães e gatos (consultórios, clínicas ou hospitais), dentre 137

instituições cadastradas no Conselho Federal de Medicina Veterinária até a data do

envio dos questionários (maio de 2008). Um novo envio foi realizado seis meses

depois àquelas faculdades que não haviam respondido. Também foram enviados

por correio eletrônico para promover uma maior agilidade no envio das respostas.

Page 31: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

19

Todas as correspondências (inclusive o correio eletrônico) tiveram como

destinatários os coordenadores de curso de Medicina Veterinária e os responsáveis

pelas unidades de atendimento. As perguntas abrangeram os problemas de

comportamento mais frequentes na rotina clínica de animais de companhia, a atitude

dos veterinários e dos proprietários perante estes problemas e as formas de

tratamento escolhidas.

Os questionários foram respondidos por médicos veterinários, professores ou

não, que prestassem atendimento nas unidades clínicas para pequenos animais.

Podendo um ou mais profissionais responder em cada unidade. Foram consideradas

as respostas daqueles que afirmaram ser consultados sobre problemas de

comportamento. Todos os respondentes assinaram um Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido aprovado, assim como o projeto em sua íntegra, pelo Comitê de

Ética em Pesquisa (CNM/HUAP # 096/07) da Universidade Federal Fluminense.

Os dados obtidos foram armazenados em um banco de dados do aplicativo

Microsoft Office Access 2003 e analisados utilizando-se o programa estatístico

Bioestat 5.0®. Além da estatística descritiva das respostas das questões 1, 2 e 3, foi

utilizado o teste de Kruskal-Wallis para observar se havia diferenças significativas

entre as posições de classificação das respostas das questões 4, 5, 6, 7 e 8 do

questionário. O teste de comparações Student-Newman-Keuls foi usado de forma

complementar para a comparação entre os pares de respostas, para avaliar se

tiveram ou não diferenças significativas (ARANGO, 2005).

4.1.3- Resultados

Das 108 faculdades de veterinária com atendimento a pequenos animais do

país, obteve-se reposta de 46 (42,6%), totalizando 101 questionários respondidos.

As regiões do Brasil foram representadas da seguinte forma: região Sul - 13

questionários (12,9%), correspondendo a sete faculdades das 25 com atendimento a

pequenos animais da região; região Sudeste - 65 questionários (64,4%), totalizando

27 universidades dentre as 58 com atendimento médico veterinário da região; região

Centro-oeste - quatro questionários (4,0%), correspondendo a quatro instituições

dentre 12; região Nordeste - 16 questionários (15,8%), totalizando seis dentre 10

instituições; e região Norte - três questionários (3,0%), uma universidade dentre as

três faculdades existentes com unidade de atendimento. Dos 101 questionários

respondidos, 91,1% dos médicos veterinários disseram ser consultados sobre

Page 32: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

20

problemas de comportamento. Quanto à espécie mais consultada, 83 (90,2%)

médicos veterinários afirmaram ser mais consultados sobre distúrbios de

comportamento em cães do que em gatos (5,4%) e quatro respondentes (4,3%) não

identificaram a espécie com maior frequência para esse tipo de queixa.

Em relação às condutas dos médicos veterinários, 57,6% disseram que

tentam resolver alguns casos e outros são encaminhados para um veterinário

especializado em comportamento animal; 21,7% disseram tentar resolver alguns

casos e outros são encaminhados para um adestrador; e 17,4% tentam resolver

sozinhos qualquer caso. Apenas 3,3% afirmaram encaminhar todos os casos para

veterinários especializados e 1,1% afirmou que Etologia não é um campo da

Medicina Veterinária. Nenhum clínico disse encaminhar todos os casos para

adestradores.

Quanto à morte induzida consequente a problemas de comportamento, 82

(89,1%) afirmaram que, em cada 10 procedimentos realizados, nenhum ocorre por

queixas comportamentais e oito (8,7%) afirmaram que, em cada 10, um é devido a

queixas comportamentais. Houve duas respostas (2,2%) de que duas eutanásias

são decorrentes de problemas comportamentais em cada 10. Na questão que

solicitava que o médico veterinário indicasse qual o comportamento que mais

motivaria o proprietário a abandonar ou solicitar a eutanásia do seu cão, 54 (58,7%)

respostas caracterizaram a agressão como muito frequente (notas 10, 9 ou 8), e 38

(41,3%) indicaram os comportamentos destrutivos como muito frequentes. A

agressão, portanto, foi incriminada como a causa mais frequente de abandono ou

eutanásia devido a problemas comportamentais tendo diferenças significativas em

relação aos demais problemas listados (P<0,02). A destrutividade teve diferença

significativa em relação a defecações inapropriadas (P=0,01), falta de controle nos

passeios (P<0,01), hiperatividade (P=0,02) medo de pessoas (P<0,01) e de barulhos

(P<0,01).

Os médicos veterinários responderam que comportamentos destrutivos eram

as queixas mais frequentes, seguidas pelas agressões. Os comportamentos com

queixas menos frequentes foram: defecações em locais inapropriados; medo de

pessoas e falta de controle durante os passeios (Gráfico 1). Os resultados do teste

de Kruskal-Wallis no grupo de respostas a essa pergunta apresentaram diferenças

significativas (P<0,01). Na comparação entre os pares, agressões e

comportamentos destrutivos não apresentaram diferença significativa entre si

Page 33: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

21

(P=0,8). Ambos mostraram-se significativamente mais frequentes do que:

defecações e micções inapropriadas, falta de controle nos passeios, medo de

pessoas e de barulhos (P<0,05). Além dessas, os comportamentos destrutivos foram

significativamente mais frequentes do que vocalização excessiva (P=0,03).

Comportamentos compulsivos foram significativamente mais frequentes do que

medo de pessoas e falta de controle nos passeios (P<0,01). Esta teve diferenças

significativas também em relação a: hiperatividade, medo de barulhos e vocalizações

excessivas (P<0,05). Hiperatividade foi significativamente diferente de medo de

pessoas (P=0,01) e nenhum dos demais pares apresentou diferenças significativas.

Os alvos mais frequentes das agressões caninas foram outros cães (30,4%),

seguidos de pessoas da família (23,9%) assim como pessoas desconhecidas

(23,9%). O resultado do teste de Kruskal-Wallis no grupo de respostas a essa

pergunta não indicou diferença significativa (P=0,2).

O tratamento mais recomendado para as agressões caninas foi a terapia

comportamental, significativamente mais frequente do que a castração e o uso de

medicamentos (P<0,01). O mesmo ocorreu em relação ao tratamento para as

eliminações inapropriadas com urina, a terapia comportamental foi a principal

recomendação, significativamente mais frequente do que castração (P<0,01) e uso

de medicamentos (P=0,01).

Page 34: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

22

4.1.4- Discussão

Baseado na taxa de retorno dos questionários de 42,6% e na distribuição

equilibrada das respostas por todo território nacional, a amostra foi considerada

representativa em relação à experiência e à conduta dos clínicos veterinários quanto

aos problemas de comportamento de cães no Brasil.

A decisão de realizar esta pesquisa com médicos veterinários de hospitais e

unidades de atendimento veterinário de faculdades de Medicina Veterinária, ao invés

de clínicas privadas, e o duplo envio das cartas-respostas, podem ter contribuído

para uma maior taxa de retorno, quando comparada a trabalhos envolvendo

questionários como o de Fatjó e colaboradores (2006) que obtiveram taxa de

resposta de 15%. Pode-se presumir que os veterinários envolvidos no ambiente de

ensino tenham maior predisposição a contribuir com uma pesquisa científica. Além

disso, o envio adicional do questionário por correio eletrônico, contornou a possível

deficiência na distribuição dos questionários não só pelos correios como também

pelos setores de comunicação de algumas instituições, o que pode ter levado ao

extravio de algumas correspondências. Outra razão para a escolha das faculdades

como alvo da pesquisa era obter uma distribuição nacional mais homogênea,

evitando concentrar o perfil dos resultados em uma só região.

Em concordância com a literatura internacional, a maioria dos participantes

afirmou ser consultada por problemas de comportamento (OVERALL, 1997; FRID,

2004; FATJÓ et al., 2006), ficando evidente que questões relacionadas ao

comportamento animal fazem parte da rotina de médicos veterinários em todo o

país.

A maioria dos médicos veterinários participantes se declarou predisposta a

indicar casos a especialistas e adestradores. Apenas cerca de um quinto afirmou

tentar resolver todos os casos sozinhos. Em estudos que levantaram essa questão

em outros países, uma maior parcela dos profissionais se mostra relutante a indicar

casos para outros veterinários, ou por falta de comunicação apropriada com os

colegas, ou simplesmente por temer perder a clientela, fatores que podem estar

presentes no Brasil (FATJÓ et al., 2006). Todavia, não se pode descartar a

possibilidade que de muitos médicos veterinários não reconheçam ou não valorizem

os problemas relacionados ao comportamento animal, negligenciando-os. Também o

pequeno número de profissionais que trabalham com comportamento animal,

especificamente na área clínica, pode dificultar a indicação do paciente (FATJÓ et

Page 35: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

23

al., 2006). Outra hipótese para um número tão alto de possíveis indicações a

especialistas seria a resposta que os respondentes supunham ser a mais adequada,

visto que o número de profissionais com esse perfil ainda é muito reduzido no país.

Então a resposta pode refletir o ideal e não o que acontece no dia a dia.

A partir das respostas de 89,1% dos médicos veterinários brasileiros que

citaram não realizar eutanásia de animais por causa de problemas comportamentais,

pode-se levantar a hipótese de que no Brasil haja uma cultura de não matar o cão

devido a tais problemas. Principalmente comparando esses resultados ao do estudo

de Fatjó e colaboradores (2006) que encontraram apenas cerca de 25,0% de

profissionais dizendo não submeter animais domésticos à eutanásia por problemas

de comportamento. Diante dessa realidade, é possível interpretar o resultado da

pergunta sobre os motivos de eutanásia ou abandono como motivos para abandono

apenas. Tal resultado mostra-se coerente com o que tem sido publicado

(GORODETSKY, 1997; RUGBJERG et al., 2003; FATJÓ et al., 2005; FATJÓ et al.,

2007; O´SULLIVAN et al., 2008a), mostrando a agressão como principal motivador

de abandono. Esse fato aumenta a responsabilidade dos médicos veterinários em

orientar os proprietários de cães em relação à socialização e à educação de seus

animais visando o seu bem-estar, como também dos proprietários e da sociedade

(SEKSEL, 1997; SERRA, 2005). Entretanto a discrepância desse resultado do

presente estudo com os índices de morte induzida devido a problemas

comportamentais que são citados na literatura internacional (OVERALL, 1997;

SEKSEL, 1997; FATJÓ, et al.,2006) pode sugerir também que os respondentes

tenham optado pela resposta que lhes pareceu mais indicada, ou pela resposta que

eles supunham que o entrevistador considerasse correta, ou ainda pode ser uma

característica da amostra, visto que em instituições de ensino pode-se realmente

não haver eutanásia por queixas comportamentais.

Os problemas mais frequentemente relatados foram idênticos aos de Fatjó e

colaboradores (2006), já quanto aos menos frequentes só houve coincidência na

falta de controle durante os passeios. As agressões aparecem em segundo lugar

como queixa mais frequente, porém foi o mais incriminado como causa de

abandono, o que concorda com o fato de que as agressões são os comportamentos

que mais levam os proprietários a buscar atendimentos especializados em etologia

clínica em todo o mundo (RUGBJERG et al., 2003; DENENBERG at al., 2005;

BAMBERGER e HOUPT, 2006; FATJÓ et al., 2007).

Page 36: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

24

Alguns estudos apresentam os próprios familiares como principais alvos das

agressões caninas (FATJÓ et al., 2005; BAMBERGER e HOUPT, 2006). O presente

estudo mostra outros cães como principais alvos dessas agressões, o que está de

acordo com um estudo de Rugbjerg e colaboradores (2003), na Dinamarca, e com

Fatjó e colaboradores (2006), na Espanha.

O tratamento mais recomendado para os dois problemas propostos no

questionário foi terapia comportamental, o que está de acordo com o estudo

espanhol (FATJÓ et al., 2006). Considerando que a Etologia Clínica ainda é uma

área pouco difundida no Brasil e que o questionário apresenta a questão de maneira

genérica, citando mudanças ambientais e enriquecimento ambiental sem categorizar

que tipo de terapia seria proposta, a realização de novos estudos faz-se necessária.

Estudos relevantes visando identificar qual tipo de terapia comportamental tem sido

recomendado para os problemas propostos, até porque a maioria dos respondentes

afirmou tentar resolver alguns casos sozinhos.

O clínico geral que atende animais de companhia é normalmente o primeiro

profissional consultado sobre problemas comportamentais. Fato que aumenta a

importância de se intensificar a formação em etologia clínica nas faculdades de

Medicina Veterinária brasileiras, a fim de: (1) reduzir o número de animais mortos ou

abandonados em decorrência de tais problemas, (2) melhorar o bem-estar dos

animais de companhia e (3) favorecer o vínculo do ser humano com seu animal de

estimação.

4.1.5- Conclusão

Conclui-se com este capítulo que a agressão canina é um importante aspecto

na rotina das clínicas veterinárias do Brasil, já que é um dos problemas mais

relatados pelos proprietários. Também é relevante para o bem-estar dos cães de

companhia, visto que é a principal causa de abandono desses animais, segundo a

opinião dos respondentes.

Page 37: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

25

4.2- CAPÍTULO II – ASSOCIAÇÃO ENTRE RAÇA E AGRESSIVIDADE EM CÃES: REVISÃO

SISTEMÁTICA

“Um dos caracteres mais distintos das nossas raças domésticas é que notamos entre elas

adaptações que não contribuem em nada para o bem-estar do animal ou planta, mas simplesmente

para o proveito e capricho do homem.” (DARWIN, 1859)

4.2.1 –Introdução

A agressividade canina é o problema de comportamento que mais leva cães

aos serviços de etologia clínica em vários paises do mundo (OVERALL e LOVE,

2001; BAMBERGER e HOUPT, 2006; FATJÓ et al., 2007) e é também um problema

de saúde pública, visto que o número de pessoas atacadas por cães gira em torno

de 2% da população dos EUA (OVERALL e LOVE, 2001). Por conta disso, há uma

preocupação em se prevenir o problema dos ataques de cães a seres humanos. Por

exemplo, no Estado do Rio de Janeiro, em abril de 1999, redigiu-se uma lei (nº.

3205), que ganhou nova redação em setembro de 2005 (nº. 4597) para controlar

populações de cães de certas raças tidas como agressivas e caracterizadas como

cães ferozes. Essa lei impõe a castração de cães da raça Pit Bull, proíbe sua criação

e obriga que cães das raças Pit Bull, Rottweiler, Fila e Doberman transitem apenas

em logradouros públicos de pouco movimento usando guia, enforcador e focinheira.

No ano de 2003, o governo do Estado de São Paulo também promulgou uma lei que

obriga o uso de guia e coleira em cães das raças Pit Bull, Rottweiler e Mastim

Napolitano para condução desses cães em locais públicos. Tais dispositivos legais

foram propostos, supostamente, para atender a uma necessidade expressa pela

população desses estados. Porém, há um preconceito que envolve certas raças e

seus proprietários, como acontece no caso do Pit Bull (TWINING et al., 2000), mas

uma pergunta é relevante: existem realmente raças agressivas por si próprias?

A presente revisão de literatura objetiva pesquisar a relação entre raças

caninas e seu envolvimento em ataques a seres humanos nos artigos publicados

sobre agressões de cães a seres humanos.

4.2.1.1- Associação entre Genética e Comportamento

Todos os criadores de cães trabalham com a seleção dos animais a partir de

características morfológicas como: porte, pelagem, inserção de orelhas e cauda e

Page 38: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

26

aprumos. Alguns excluem de seus plantéis animais com temperamento inapropriado

àquela raça. Então se faz a pergunta: é possível que uma característica

comportamental, como a agressividade, seja transmitida para a geração seguinte?

Em 1965, os pesquisadores John Scott e John Fuller, publicaram um livro que

descreve os resultados de suas experiências com hereditariedade de características

comportamentais em cães (SCOTT e FULLER, 1965). Os experimentos foram

realizados com cães de cinco raças: Cocker Spaniel Americano, Basenji Africano,

Fox Terrier pelo de arame, Pastor de Shetland e Beagle. Dentre os experimentos

realizados, esses pesquisadores relatam diferenças raciais significativas no

comportamento agressivo de filhotes de 13 a 15 semanas, sendo os filhotes da raça

Fox Terrier os mais agressivos e os de Cocker Spaniel Americano os menos

(SCOTT e FULLER, 1965). Porém, esse estudo considerou comportamentos

agressivos durante interações lúdicas com os filhotes, o que pode não estar

diretamente associado ao comportamento agressivo desses cães quando adultos.

Da mesma forma que características morfológicas podem ser herdadas de

gerações passadas, é possível que características neurofisiológicas ou

comportamentais também o sejam. Portanto, a predisposição genética para diversos

problemas comportamentais pode justificar uma possível associação entre a

agressividade e a raça do cão. Tal relação pode ser justificada com diferenças nos

níveis de neurotransmissores ou a eficiência de seus receptores no Sistema Nervoso

Central (SNC), favorecendo, ou não, o surgimento de problemas como agressividade

ou ansiedade (TAKEUCHI e HOUPT, 2003). Outros artigos associam alterações

estruturais nos cérebros de cães agressivos e não agressivos. Há um aumento do

numero de receptores para andrógenos na amígdala baso-lateral em machos

agressivos comparados a não agressivos (JACOBS et al., 2006). Há um aumento no

número de receptores serotoninérgicos por todo encéfalo (BADINO et al., 2004;

JACOBS et al., 2007) e uma diminuição no número de receptores adrenérgicos

córtex frontal, hipocampo e tálamo (BADINO et al., 2004) dos cães agressivos

comparados aos não agressivos.

Há alterações metabólicas associadas à agressividade. Cães agressivos da

raça Pastor Alemão tiveram menores concentrações de bilirrubina e colesterol total

comparados a cães não agressivos da mesma raça, idade, porte e sexo. A

composição sérica dos ácidos graxos também diferiu, o grupo agressivo apresentou

menores concentrações de Acido Docosahexaenóico (DHA) e uma razão maior de

Page 39: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

27

Ácidos graxos omega6/omega3 (RE et al., 2008). Porém, tal estudo merece uma

avaliação no eixo causa-efeito, pois tais alterações podem ter relação com o

estresse. O que fica evidente na pesquisa de Verrier e colaboradores (1987), na qual

os cães induzidos a ataques de fúria tiveram alterações cardíacas, provavelmente

mediadas por catecolaminas.

Há um setor identificado no genoma canino que interfere na captação da

dopamina no cérebro, o que pode estar relacionado com a agressividade de certas

raças (ITO et al., 2004).

Mesmo com todas as possibilidades supracitadas, em um estudo realizado

com cães das raças Pastor Alemão e Rottweiler (SAETRE et al., 2006), os autores

identificaram uma correlação genética em alguns traços de personalidade, mas não

nos traços relacionados à agressividade. Em outro estudo (STRANDBERG et al.,

2005), os autores misturaram ninhadas de Pastor Alemão e realizaram testes de

comportamento com os filhotes e suas mães, obtendo como resultado uma maior

semelhança comportamental nos filhotes em relação às cadelas que os tinham

amamentado e não em relação às mães biológicas, concluindo com isso que o efeito

do ambiente da ninhada tem maior influência no comportamento que a genética

materna. Há ainda outro estudo retrospectivo com proprietários de cães (PÉREZ-

GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009), no qual foi relatada uma associação

significativa entre fatores ambientais, sociais e de manejo no desenvolvimento de

agressões por dominância, o que não foi observado em relação a fatores intrínsecos

aos cães (raça, porte e cor de pelagem).

Aspectos relatados nos parágrafos anteriores poderiam alicerçar os

argumentos favoráveis à associação entre raça e agressividade, porém ainda não é

possível responder à pergunta se há uma associação direta entre agressividade e

raça. Até porque, dentro de uma mesma raça há linhagens diferentes que dependem

das características “da moda”, fato que pode ser regionalizado. A formação dessas

linhagens depende também da seleção dos machos padreadores ou raçadores, que

acontece sempre que um macho se destaca nas exposições e passa a ser muito

procurado para transmitir a suas características morfológicas (GRANDJEAN, 2001,

p.10), o que pode causar um viés dentro dessa raça em relação a características

morfológicas ou comportamentais originadas desse indivíduo.

Page 40: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

28

4.2.2- Material e Métodos

O presente estudo teve como bases para a coleta de dados o CAB

(Commonwealth Agricultural Bureaux) abstracts, o MEDLINE® via BVS (Biblioteca

Virtual em Saúde) e o SCIELO (Scientific Eletronic Library on Line). Foram usadas

para a consulta as seguintes palavras chave: “dog” & “aggression”; “dog bites”; e

“canine aggression” em todos os bancos de dados e selecionados trabalhos

publicados de 01 de janeiro de 1997 até 16 de março de 2009. Ao todo, 303

referências foram rastreadas com as palavras-chave (56 do MEDLINE®, 2 do

SCIELO e 245 do CAB - abstract), já excluindo as referências em duplicata. Em um

primeiro momento, os artigos foram triados a partir do título, do resumo e do veículo

de publicação. Os critérios de exclusão foram: (1) artigos escritos em idioma

diferente de inglês, português ou espanhol; (2) trabalhos sobre Raiva (vírus rábico);

(3) cuidados com as lesões causadas pelas mordeduras dos cães; (4) pesquisas

comparativas com outras espécies; (5) trabalhos que relacionavam cães como

coterapeutas (Terapias assistidas por animais, por exemplo); (6) trabalhos que

descreviam ou pesquisavam os tratamentos para distúrbios relacionados à

agressividade; (7) resumos de Congressos, Simpósios, encontros e afins; (8)

capítulos de livros; (9) trabalhos que relatam distúrbios físicos ou doenças

relacionadas à agressividade; (10) trabalhos que relatavam outros comportamentos

que poderiam apenas envolver agressividade no seu contexto (por exemplo, medo);

(11) casos clínicos; (12) trabalhos exclusivamente direcionados a agressões entre

cães.

A segunda fase da seleção iniciou-se com um total de 119 títulos de artigos.

Nessa etapa, a triagem foi feita a partir da leitura do artigo e teve como critérios de

inclusão: (1) inquéritos epidemiológicos de ataques de cães a seres humanos; e (2)

artigos que descrevessem fatores predisponentes ou relacionados à agressividade.

Foram usados como critérios de exclusão desta segunda fase da seleção: (1)

trabalhos que envolviam uma só raça canina; (2) artigos que falavam genericamente

sobre um contexto de agressão (por exemplo, agressão predatória); (3) trabalhos

publicados em periódicos não disponíveis na rede mundial de computadores e não

encontrados no CCN (Catálogo Coletivo Nacional) por não ter acesso possível em

bibliotecas do Brasil.

Page 41: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

29

4.2.3- Resultados

Um total de 28 artigos compôs a base de informações da presente revisão e

estão relacionados na tabela 1 que sumariza os aspectos gerais desses trabalhos.

4.2.3.1- Quanto ao desenho metodológico dos artigos

Dos 28, seis são artigos de revisão e descrevem os aspectos relacionados à

agressividade canina. Somente dois artigos de revisão relacionam raças à

ocorrência de agressões contra seres humanos. Overall e Love (2001) fizeram uma

grande busca na literatura a respeito do tema e descreveram que as raças

semelhantes ao American Pit Bull (Pit Bull Type) estiveram envolvidas nos casos

onde as agressões geraram mais lesões e lesões mais graves em suas vítimas,

porém não há relatos de maior casuística de ataques efetuados por tal padrão racial.

O outro artigo de revisão que cita raças agressivas é o de Houpt (2007), no qual a

autora buscou na literatura os casos envolvendo ataques de cães e citou as diversas

raças relacionadas nos trabalhos que compõe sua revisão, porém não há uma

conclusão que permita fazer a associação entre raça e agressividade.

Há dezessete pesquisas retrospectivas, todas elas relatando a epidemiologia

dos ataques com fontes de informação diferentes. Há onze trabalhos que usaram a

informação dos serviços públicos de saúde e citaram raças agressivas (KEUSTER et

al., 2006; ROSADO et al., 2007; SHULER et al., 2008; O'SULLIVAN et al., 2008a) e

outros seis com o mesmo tipo de fonte de dados não citaram (TAN et al., 2004;

FORTES et al., 2007; GEORGES e ADESIYUN, 2008; O'SULLIVAN et al., 2008b;

VUCINIC et al., 2008). Outros três trabalhos (BAMBERGER e HOUPT, 2006; FATJÓ

et al., 2007; YALCN e BATMAZ, 2007) usaram informação de serviços

especializados em etologia clínica, porém Yalcn e Batmaz (2007) não citaram raças

agressivas. Também há alguns com dados coletados em clínicas veterinárias (GUY

et al., 2001a; GUY et al., 2001b; TAKEUCHI e MORI, 2006; O'SULLIVAN et al.,

2008a) e três pesquisas buscaram diretamente dados na população de proprietários

de cães (BRADSHAW e GOODWIN, 1998; DUFFY et al., 2008; MCGREEVY e

MASTERS, 2008).

Três estudos usaram um desenho prospectivo (NETTO e PLANTA, 1997;

SVARTBERG e FORKMAN, 2002; SVARTBERG, 2006) e tinham em comum o fato

de avaliar testes para seleção de cães ou determinar traços de personalidade.

Page 42: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

30

4.2.3.2- Quanto às raças mais agressivas

Dos 28 artigos, 15 citaram raças mais envolvidas em casos de agressões ou

com maior potencial para agressividade, sendo os mestiços citados em seis artigos

(GUY et al., 2001a; GUY et al., 2001b; BAMBERGER e HOUPT, 2006; ROSADO et

al., 2007; MCGREEVY e MASTERS, 2008; SHULER et al., 2008). Nas mesmas

condições, a raça Pastor Alemão apareceu citada em três artigos (BAMBERGER e

HOUPT, 2006; KEUSTER et al., 2006; ROSADO et al., 2007), assim como raças

afins ao Pit Bull (ALLEN, 2001; OVERALL e LOVE, 2001; SVARTBERG, 2006),

sendo que uma dessas referências é uma nota editorial, baseada na experiência do

autor (ALLEN, 2001). A raça Retriever de Labrador também apareceu citada em três

artigos (GUY et al., 2001a; GUY et al., 2001b; BAMBERGER e HOUPT, 2006), a

raça Springer Spaniel apareceu citada em dois artigos (GUY et al., 2001a;

BAMBERGER e HOUPT, 2006). Shuler e colaboradores (2008) não se ativeram à

raça especificamente, mas ao grupo racial de acordo com a FCI (Federation

Cynologique Internationale), a conclusão foi que os Terriers e os cães de trabalho

tiveram os maiores índices de mordidas, expressos nesse estudo em número de

ataques registrados no Serviço Público de Controle de Animais em relação a cada

1000 cães licenciados na cidade de Multnomah (Oregon – EUA).

Duffy e colaboradores (2008) fizeram uma avaliação em cães de 30 raças

através de um questionário respondido pelos proprietários dos cães destinado ao

diagnóstico de problemas comportamentais (C-BARQ - Canine Behavioral

Assessment & Research Questionnaire) e encontraram com maiores escores para

agressividade os Dachshunds, Chihuahuas e Jack Russell Terriers. Já no inquérito

realizado por Takeuchi e Mori (2006) com médicos veterinários japoneses, cães da

raça Miniatura Pincher ficaram classificados nas primeiras posições nos critérios de

avaliação de agressividade.

A raça Colie foi citada por O'Sullivan e colaboradores (2008a) e Cocker

Spaniel Inglês e Pastor Catalão foram citados por Fatjó e colaboradores (2007)

como sendo as raças mais frequentemente envolvidas em casos de agressões a

seres humanos em seus estudos na Irlanda e Espanha respectivamente.

Page 43: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

31

4.2.4- Discussão

Os artigos pesquisados não apresentaram uma unanimidade em relação a

uma raça mais agressiva. Os mestiços foram os mais citados, porque são

normalmente os mais frequentes em todas as populações caninas, o que aumenta a

probabilidade de ataques por cães sem padrão racial definido. Esses artigos não

explicitaram o tipo de mestiços, se são misturas de duas ou mais raças conhecidas,

ou se são cães sem raça definida. Ressaltando que quando se fala em mestiços é

importante saber que raças compõem a mistura, principalmente quando se procura a

associação entre raça e agressividade.

O artigo de Takeuchi e Mori (2006) foi baseado na experiência e na opinião

dos veterinários japoneses a respeito das 56 raças questionadas. Por não ser

baseada em opiniões, é possível que a classificação das raças tenha sido fruto de

preconceito sobre certas características que passam de profissional para

profissional, tornando-se cultural.

Overall e Love (2001), em seu artigo de revisão, citaram uma série de outras

raças envolvidas em episódios de agressão, além daquelas do tipo Pit Bull. Porém,

os próprios autores comentam que alguns padrões raciais recebem maior ênfase na

mídia, o que pode resultar em exageros da real participação de certas raças nas

estatísticas referentes a ataques de cães. É possível que tal fato gere o seguinte

paradigma: “Todo cão que morde é Pit Bull”. Outro aspecto a ser discutido sobre o

Pit Bull é que nenhum dos trabalhos (ALLEN, 2001; OVERALL e LOVE, 2001;

SVARTBERG, 2006) que citaram este padrão racial como o mais agressivo é

baseado em casuística.

O artigo de Rosado e colaboradores (2007) é o que mais embasa a crítica ao

preconceito contra certas raças. Os autores provaram com dados epidemiológicos a

ineficiência da lei de controle de cães ferozes na Espanha quando compararam

dados de cinco anos anteriores à promulgação da lei com cinco anos sob a vigência

da mesma. Os autores constataram que não houve evidências de diminuição na

casuística de ataques de cães. O que reforça a necessidade de encarar este o

problema promovendo instrução para os proprietários e uma lei de posse

responsável que não discrimine raças.

A genética pode exercer alguma influência na agressividade, porém pode não

haver uma relação direta com a raça e sim com as linhagens dentro das mesmas.

Tal hipótese traz a necessidade de pesquisas específicas dentro das diversas raças,

Page 44: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

32

semelhantes à de Saetre e colaboradores (2006), que buscaram associações entre

genética e comportamento em cães das raças Rottweiler e Pastor Alemão, não

encontrando associação entre genética e agressividade.

A dificuldade em encontrar coincidências sobre as raças mais agressivas com

a metodologia utilizada no presente estudo pode ter algumas explicações.

Primeiramente, os estudos foram feitos em países diferentes e isso requer uma

avaliação das linhagens de cada raça em cada país, fato que tem relação com os

padreadores mais usados em cada região (GRANDJEAN, 2001, p.10). Outra

explicação, ainda considerando a distribuição geográfica dos artigos envolvidos

neste estudo, é a hipótese levantada no artigo de Messam e colaboradores (2008)

de que características culturais humanas diferentes possam interferir na

predisposição para ataques dos cães em contextos semelhantes. Além dessas

características geográficas, a diversidade da origem dos dados usados nos artigos

envolvidos e a falta dos dados da população canina em cada região onde foram as

pesquisas realizadas podem ter contribuído para os resultados do presente estudo.

É possível suspeitar que as raças mais envolvidas em ataques sejam

provavelmente as raças mais populares nos locais onde foram realizadas as

pesquisas. Embora a raça possa não apresentar uma relação direta com a

agressividade, não se pode descartar que o potencial em causar danos às vítimas

dos ataques de certas raças. Visto que, raças maiores, mais ágeis e mais fortes

podem provocar lesões mais graves nos indivíduos atacados.

4.2.5- Conclusão

A partir da revisão dos artigos publicados de 1997 a março de 2009 não é

possível afirmar que a haja uma associação clara entre agressividade e a raça dos

cães.

Page 45: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

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36

4.3 - CAPÍTULO III – COMPARAÇÃO DO COMPORTAMENTO DOMINANTE DE FILHOTES DE

CÃES DE CINCO RAÇAS

“A agressão por dominância é um traço normal, natural, evolutivo, selecionado em várias espécies,

inclusive em caninos.” (Cameron, 1997)

4.3.1 – Introdução

A necessidade de selecionar cães para diversas atividades ou famílias com

aspectos distintos fez com que William Campbell desenvolvesse e publicasse um

teste para seleção de filhotes (CAMPBELL, 1972). Esse teste, que se tornou

conhecido como Teste de Campbell, tem por objetivo avaliar o grau de dominância

do filhote a fim de enquadrar o filhote testado no melhor perfil de família que o está

adquirindo ou facilitar a escolha da atividade mais adequada para esse filhote. Em

teoria, a dominância faz com que os cães assumam postos mais altos em sua

hierarquia social, sendo o conceito oposto à submissão (BEAVER, 2001). Essa

característica se manifesta nos cães com o objetivo de obter o controle dos recursos,

que no ambiente doméstico são: alimento, abrigo, brinquedos, atenção e carinho das

pessoas. O exercício do controle dos recursos pelo cão dominante pode ocorrer em

abordagens pacíficas ou agressivas. A agressão por dominância é o principal

problema de comportamento em cães diagnosticado em serviços de etologia clínica

por todo o mundo (LANDSBERG, 1990).

A questão racial dos cães é polêmica e gera diversos preconceitos sociais

(TWINING et al., 2000) e leis proibindo o trânsito ou a reprodução de algumas raças

(RIO DE JANEIRO, 1999; RIO DE JANEIRO, 2005; ROSADO et al., 2007). Mas a

pergunta que este estudo se propõe a responder é se há realmente diferenças de

tendência à dominância apresentada pelos filhotes das cinco diferentes raças, a fim

de munir os profissionais que trabalham com cães (médicos veterinários,

adestradores e criadores) de informações para prevenir problemas relacionados à

agressividade por dominância.

4.3.2 – Material e Métodos

Foram selecionadas cinco raças, duas do grupo discriminado pela lei nº. 4597

do Estado do Rio de Janeiro (RIO DE JANEIRO, 2005), Rottweiler e Pit Bull. A raça

Bull Terrier foi inserida no estudo por sua semelhança fenotípica com o Pit Bull, por

Page 49: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

37

ser citada pela literatura internacional como envolvida em ataques contra seres

humanos (OVERALL & LOVE, 2001) e por ser discriminado pela lei nº 3.489 do

estado do Mato Grosso do Sul (MATO GROSSO DO SUL, 2008). Além dessas três,

foram inseridas na amostragem duas raças tidas como cães de companhia,

populares no Brasil, mas que aparecem em estudos internacionais como

frequentemente envolvidas em ataques contra seres humanos, o Retriever do

Labrador (GUY et al., 2001a) e o Cocker Spaniel Inglês (FATJÓ et al., 2007).

Foram contatados canis dessas cinco raças. Todos ou foram indicados por

duas entidades Cinófilas do Estado do Rio de Janeiro, Kennel Clube Fluminense e

Brasil Kennel Clube, ambas associadas à Confederação Brasileira de Cinofilia ou

pelos próprios criadores que indicavam novos canis para a realização da pesquisa.

Ao todo, 21 canis (3 Bull Terrier; 3 Cocker Spaniel Inglês; 2 Pit Bull; 6 Retriever do

Labrador; 7 Rottweiler) participaram do estudo.

Para a identificação da dominância dos filhotes foi selecionado o teste

Comportamental para seleção de Filhotes de Campbell (1972). Os testes foram

realizados nos canis de origem e todos os filhotes foram testados pela mesma

pessoa. O examinador foi um médico veterinário com experiência na área de

etologia clínica, que não tivera contato anterior com os filhotes e que evitou exibir

qualquer emoção durante os testes.

Nenhum filhote foi caudectomizado anteriormente aos testes e nenhum filhote

de Cocker Spaniel Inglês era de cor sólida.

O teste de Campbell é dividido em cinco etapas, cada uma delas corresponde

a uma manipulação feita com o filhote, na qual sua resposta é avaliada e

classificada como: muito dominante (dd), dominante (d), submisso (s), muito

submisso (ss) e independente/medroso (i). As etapas do teste são:

(A) Atração social: em uma área de no mínimo 3 m2, o examinador posiciona o

filhote de frente para uma parede, se afasta cerca de um metro, se agacha e chama

o filhote batendo palmas sem fazer muito barulho, observa se o filhote atende ou

não esse chamado e como ele o faz. As respostas possíveis incluem: (dd) o filhote

vem prontamente, de cauda erguida, buscando contato com o examinador; (d) o

filhote vem prontamente, de cauda erguida e não faz contato com o examinador; (s)

o filhote vem prontamente, de cauda abaixada; (ss) o filhote vem hesitante, de cauda

abaixada; (i) o filhote ou não vem ou foge.

Page 50: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

38

(B) A seguir: na mesma área da etapa anterior, o examinador posiciona o filhote

encostado na parede, mas virado para si, tendo certeza que tem a atenção do filhote

e começa a andar para o centro da área, observando se o filhote o segue e como o

faz. As possíveis respostas incluem: (dd) o filhote segue prontamente o examinador

de pé, cauda erguida, tentando brincar; (d) o filhote segue prontamente o

examinador de pé, cauda erguida; (s) o filhote segue prontamente o examinador

com a cauda abaixada; (ss) o filhote segue hesitante; (i) o filhote não segue

examinador ou foge dele.

(C) Contenção: o examinador posiciona o filhote em decúbito dorsal, o contém

nesta posição por aproximadamente 30 segundos e observa sua reação. Respostas

possíveis incluem: (dd) o filhote se debate vigorosamente mordendo ou rosnando,

com a cauda balançando; (d) o filhote se debate vigorosamente, com a cauda

balançando, sem morder ou rosnar; (s) o filhote se debate e depois se acalma; (ss) o

filhote não se debate e pode lamber a mão do examinador.

(D) Dominância social: o examinador posiciona o filhote em decúbito ventral, em

posição de esfinge, com uma mão o contém na nuca, com a outra afaga seu dorso

por aproximadamente 30 segundos e observa a reação do filhote. Respostas

possíveis: (dd) o filhote se agita, rosna ou tenta morder; (d) o filhote se agita, mas

não exibe comportamento agressivo; (s) o filhote se agita por um curto período de

tempo; (ss) o filhote assume o decúbito dorsal; (i) o filhote foge e não volta.

(E) Dominância Elevada: o examinador contém o filhote com as mãos em torno

do tórax do animal e o levanta do solo aproximadamente 20 cm e observa a reação

do filhote. Respostas possíveis: (dd) o filhote se debate vigorosamente rosnando ou

tentando morder; (d) o filhote se debate, mas não exibe comportamento agressivo;

(s) o filhote se debate depois se acalma e/ou lambe as mãos do examinador; (ss) o

filhote não se debate e pode lamber as mãos do examinador.

Os escores nas diferentes etapas do teste indicam: (dd) dominância

excessiva (5 pontos); (d) dominância (4 pontos); (s) submissão equilibrada (3

pontos); (ss) submissão excessiva (2 pontos); (i) independência ou medo (1 ponto).

A partir da análise dos resultados foram identificados os cães com maiores graus de

dominância, estabelecendo-se uma classificação entre os filhotes de forma

decrescente.

Ao todo, 265 filhotes foram submetidos ao Teste de Campbell (1972), 138

cães da raça Retriever do Labrador (77 machos e 61 fêmeas), 71 cães da raça

Page 51: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

39

Rottweiler (35 fêmeas e 36 machos), 31 da raça Bull Terrier (15 fêmeas e 16

machos), 13 Cocker Spaniel Inglês (nove fêmeas e quatro machos) e 12 da raça

American Pit Bull (sete fêmeas e cinco machos). Todos os cães tinham idade

compreendida entre seis e oito semanas, foram oriundos de canis especializados em

suas raças no estado do Rio de Janeiro e nasceram no período de março de 2008 a

junho de 2009.

As pontuações foram tabuladas e comparadas estatisticamente pelo teste de

Kruskal-Wallis e a comparação entre os pares pelo teste de Mann-Whitney através

do programa BioEstat® 5.0, com nível de significância de 5% (α=0,05). O mesmo

programa foi usado para realizar a estatística descritiva.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética para uso de animais em

pesquisa da Universidade Federal Fluminense (protocolo # 0020/2008)

4.3.3 – Resultados

A comparação entre os resultados totais entre os sexos através do teste de

Kruskal-Wallis não teve diferença significativa (P=0,78). Assim como não houve

diferença significativa entre o tamanho das ninhadas (P=0,12)

Na avaliação global (Tabela 2), os filhotes de Labrador obtiveram pontuação

significativamente superior aos de Rottweiler (P=0,02) e Bull Terrier (P=0,02).

Tabela 2 – Comparação das medianas dos resultados dos Testes de Campbell aplicados a filhotes de cinco raças. Niterói – RJ, UFF, 2010. Retriever do

Labrador Rottweiler Bull Terrier Cocker

Spaniel Inglês Pit Bull

Nº. Filhotes 138 71 31 13 12 Número de Ninhadas 20 11 5 3 2 Etapas do teste Medianas

Atração Social 4a 3a 3b 2 4,5b A Seguir 4e 1cdef 3d 4f 3c Contenção 2g 2 2 3g 2 Dominância Social 2h 3i 1hijk 2j 3k Dominância Elevada 2 2 2 2 2 Avaliação Global 13lm 12l 12m 13 14,5 Resultados das comparações a partir do teste de Mann-Whitney- a,b,c,d,f,l,m – P<0,05; e,k – P<0,001; g,j- P<0,01; h,i –P<0,0001

Os resultados do teste de Kruskal-Wallis na pontuação para a etapa de

“Atração Social” (Tabela 2) apresentaram diferença significativa entre os resultados

(P=0,03). Na comparação entre os pares, os filhotes de Labrador apresentaram

pontuação significativamente maior do que os de Rottweiler (P=0,04). Os filhotes de

Page 52: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

40

Pit Bull apresentaram pontuação significativamente maior que os de Bull Terrier

(P=0,04). Nenhum dos demais pares apresentou diferença significativa.

Na segunda etapa do teste (“A Seguir”), os resultados apresentaram diferença

significativa entre as respostas (P<0,01). Na comparação entre os pares (Tabela 2),

os filhotes de Rottweiler apresentaram pontuação significativamente menor do que

os todos os outros filhotes (P<0,05). Poucos filhotes de Rottweiler demonstraram

posturas características de medo durante os testes. Esses filhotes simplesmente não

seguiam o examinador na segunda etapa do teste. Os filhotes, em sua maioria, o

acompanhavam com o olhar permanecendo atentos, porém sem se deslocarem ou

então começavam a cheirar o chão e se deslocavam em outra direção,

demonstrando independência.

Na etapa de “Contenção” (Tabela 2) houve diferença significativa entre as

respostas (P=0,04). Na comparação entre os pares, os filhotes de Cocker Spaniel

Inglês tiveram pontuação significativamente maior que os de Labrador (P<0,01). Os

filhotes de Cocker Spaniel Inglês se debateram sem exibir reações agressivas com

muito mais frequência que os filhotes de Labrador, que em sua maioria aceitaram a

contenção em decúbito dorsal sem reações, o que justifica a maior pontuação dos

primeiros. Nenhum dos demais pares teve diferença significativa.

Na quarta etapa do teste (“Dominância Social”), os resultados do teste de

Kruskal-Wallis (Tabela 2) apresentaram diferença significativa entre os resultados

(P<0,01). Na comparação entre os pares, os filhotes de Bull Terrier tiveram

pontuação significativamente menor do que os de Labrador (P<0,0001), de

Rottweiler (P<0,0001), de Cocker (P<0,01) e de Pit Bull (P<0,001). Nessa etapa,

ocorreu com os filhotes de Bull Terrier o mesmo fenômeno da segunda etapa entre

os filhotes de Rottweiler e os demais. Os filhotes de Bull Terrier se comportaram de

forma muito semelhante na quarta etapa do teste (“Dominância Social”) e saíam da

posição de esfinge se deslocando para longe do examinador sem exibição de sinais

de medo.

Na quinta etapa (“Dominância elevada”) poucos filhotes reagiram à

manipulação, permanecendo praticamente inertes quando suspensos. Houve

diferença significativa (Tabela 2) entre as respostas (P=0,02) a partir do teste de

Kruskal-Wallis, mas nenhum dos pares apresentou tal diferença de forma

significativa.

Page 53: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

41

Nas etapas de “Contenção”, “Dominância Social” e “Dominância Elevada”,

cinco cães exibiram comportamentos agressivos em alguma dessas fases, e tal

reação foi independente de raça, ou seja, representantes de todas as raças reagiram

agressivamente em algum desses testes.

4.3.4 – Discussão

A proporção do número de filhotes testados no presente estudo obedeceu à

proporção de filhotes nascidos no período dos testes, e registrados pelo Kennel

Clube Fluiminense (Labrador, 66; Rottweiler, 52; Cocker Spaniel Inglês, 16; Bull

Terrier, 15, Pit Bull, 7).

O teste de Campbell é uma avaliação subjetiva e foi idealizado para a seleção

de filhotes pelo futuro proprietário. O instrumento é sujeito a variáveis que foram

minimizadas no presente estudo pelo fato de que todos os testes foram realizados

pela mesma pessoa e em ambiente não hostil aos filhotes, todos com idades entre

seis e oitos semanas. Mesmo com as limitações, o teste não perde sua validade na

comparação entre filhotes, por isso o teste tem sido aplicado em pesquisas

científicas para avaliar dominância em filhotes (PÉREZ-GUISADO et al, 2006).

Os resultados da avaliação global do teste mostram os filhotes de Pit Bull com

maiores pontuações em relação às demais raças, porém a diferença não foi

significativa após os testes estatísticos. Tal fato pode ser decorrente do tamanho da

amostra de filhotes de Pit Bull (n=12), porém mostra um resultado sugestivo de

maior dominância nesses filhotes, o que parece concordar com a imagem de cão

feroz que a população tem da raça, considerando a falsa associação popularmente

feita entre agressividade e dominância (ASKEW, 2003). Esse resultado também

pode explicar em parte os resultados obtidos em um estudo italiano (CAPRA et al.,

2009) onde os Pit Bulls, submetidos a outros testes de comportamento diferentes do

de Campbell, obtiveram pontuações significativamente maiores para agressividade

contra outros cães, comparados aos controles, porém sem diferença na

manifestação de agressividade contra pessoas desconhecidas.

Na comparação entre os filhotes de Labrador com os de Rottweiler, na

interpretação do Teste de Campbell, a maior pontuação dos primeiros aponta uma

maior tendência à dominância. Contudo, ao analisar os resultados de cada etapa,

observa-se que tal diferença numérica pode ser consequente de maior

independência dos filhotes de Rottweiler, sugerida pela maior frequência de cães

Page 54: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

42

com um ponto na etapa “A Seguir”. O mesmo ocorreu com a maioria dos filhotes de

Bull Terrier. Eles se comportaram de forma muito semelhante na quarta etapa do

teste (“Dominância Social”) e simplesmente saíam da posição de esfinge se

deslocando para longe do examinador sem exibição de sinais de medo. Um ponto

significa ao mesmo tempo independência ou medo do filhote, características

diametralmente opostas. Essa independência segundo o autor do teste

(CAMPBELL, 1972) deixa dúvidas quanto à dominância, mas na opinião dos autores

da presente pesquisa, tal independência pode ser um indicativo de dominância e a

certeza da necessidade de um trabalho diferenciado para a socialização desses

filhotes. Esta contradição nos resultados poderia ser resolvida com uma

reformulação do teste de Campbell, na relação de comportamentos esperados,

separando respostas características de medo e independência, nas etapas de “A

Seguir” e “Dominância Social”, assim como na etapa “Atração Social”.

O teste de Campbell tem como principal fator de restrição o fato de listar

somente quatro ou cinco possibilidades de reação do filhote a cada manipulação

proposta. Tal fato obriga a quem realiza o teste ter conhecimentos em etologia

canina para enquadrar certos comportamentos apresentados ao mais próximo

listado no teste. Por exemplo, na avaliação de “Dominância Social”, houve filhotes

que não se agitaram, não assumiram decúbito dorsal nem tentaram fugir,

simplesmente permaneceram na mesma posição aceitando passivamente a

manipulação.

O presente estudo não encontrou diferenças nos padrões de dominância

entre os sexos, diferente do que foi encontrado por Pérez-Guizado e colaboradores

(2006) que também usaram o Teste de Campbell para comparar padrões

comportamentais de filhotes de Cocker Spaniel Inglês. Os pesquisadores espanhóis

encontraram maiores indícios de dominância em machos do que em fêmeas da raça

avaliada.

O temperamento das mães e as diferenças de manejo (por exemplo,

alimentação dos filhotes, alimentação das mães e a personalidade dos tratadores)

de um criador para outro não foram considerados no presente estudo.

Slabbert e Odendaal (1999) conseguiram prever em filhotes com oito

semanas eficiência para treinamento de busca e com nove meses eficiência para

prever agressividade. Apesar disso, os testes com filhotes de oito semanas parecem

não ser eficientes em prever o comportamento dos animais quando adultos, de uma

Page 55: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

43

forma mais ampla, como no estudo realizado por Wilsson e Sundgren (1998). Isso

ocorre, provavelmente, porque o resultado imediato do teste não prevê a reação do

filhote à forma com que será criado até a vida adulta nem a sua relação com o

proprietário, ideia já sugerida por Campbell (1972) ao divulgar o teste

comportamental para seleção de filhotes. Corroborando esta ideia, foi relatado em

um estudo realizado na Espanha (PÉREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009)

no qual se identificou alguns fatores associados aos casos de agressão por

dominância como: o fato do cão ter alimento a vontade; cães que caminham ou

interagem pouco com seus proprietários; cães sem um processo de educação

básica; e proprietários que tem um cão pela primeira vez. Todos esses detalhes

devem ser considerados na seleção dos filhotes, associado ao teste, para assim

prevenir problemas de agressividade por dominância nos cães, principalmente raças

envolvidas no presente estudo por serem populares no Brasil.

4.3.5 – Conclusão

Há diferença significativa em relação ao padrão de dominância nos filhotes

das raças envolvidas no presente estudo. Fato este que pode influenciar na

manifestação da agressividade dessas raças na vida adulta desses cães. Porém

houve um destaque maior para a independência das raças Rottweiler e Bull Terrier

do que para o padrão dominante das demais. Essa diferença pode evidenciar a

necessidade de trabalhos específicos de socialização das diferentes raças a fim de

evitar manifestações agressivas desses cães quando adultos.

Page 56: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

44

4.4 - CAPÍTULO IV – PERFIL DOS COMPRADORES DE FILHOTES DE QUATRO RAÇAS

“Um aspecto central do comportamento dos animais domésticos é, obviamente, a interação entre o

animal e o humano.” (Ladewig, 2005)

4.4.1 – Introdução

Analisar razões para comportamentos de cães domésticos sem olhar para os

seres humanos que convivem com esses cães é uma tarefa inútil, visto que a

relação inadequada entre seres humanos e cães pode até não ser a única causa

dos diversos distúrbios comportamentais descritos, mas certamente, agrava,

predispõe e complica tais distúrbios (O´FARRELL, 1997; BÉNÉZECH, 2003;

LADEWIG, 2005). A ansiedade do proprietário pode levar o cão a desenvolver

distúrbios de ansiedade (O´FARRELL, 1997), assim como o humor do condutor pode

alterar o nível de estresse do cão, o que já foi comprovado avaliando níveis séricos

de cortisol de cães vencedores e perdedores em provas de agility (JONES e

JOSEPHS, 2006).

Há uma tendência, estudada na psicologia, de que as pessoas escolhem

seus animais baseando-se na busca por semelhanças entre si e seu animal de

estimação, projetando no animal seus próprios sentimentos e atribuindo a eles

sentimentos como amor, afeição, obediência e lealdade (ALGER e ALGER, 1997).

Para avaliar personalidade de seres humanos, diversos testes psicológicos

foram desenvolvidos ao longo dos anos, a fim de tornar objetivos aspectos

subjetivos da psicologia. Como exemplo, se pode citar o MMPI - Inventário

Multifásico de Personalidade Minesota (DAHLSTROM et al, 1972) e o questionário

de agressividade (GALLARDO-PUJOL et al., 2006).

Ante a realidade de que a personalidade ou o humor do proprietário possa

afetar o comportamento do cão, no presente estudo buscou-se correlacionar itens da

personalidade do proprietário com seleção da raça a fim de encontrar pistas para

responder a perguntas como: “Quem procura um cão para guarda tem personalidade

diferente de quem procura um cão para companhia?”

Page 57: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

45

4.4.2 – Material e Métodos

Pessoas que compraram os filhotes avaliados no capítulo III foram contatadas

e convidadas a participar da pesquisa. Os contatos foram feitos via correio

eletrônico, mesma via por onde foram enviados os questionários.

Cada voluntário foi submetido a dois testes psicológicos. O primeiro foi o

MMPI (DAHLSTROM et al, 1972), validado para uso no Brasil pelo CEPA (Centro

Editor de Psicologia Aplicada). Teste que é baseado em 366 afirmativas, as quais o

respondente classifica como certas ou erradas de acordo com uma autoavaliação de

sua personalidade. As respostas foram tabuladas e encaminhadas à Médica

Psiquiatra responsável pela avaliação dos testes. O MMPI, em sua versão resumida

(utilizada no presente estudo), possui três escalas de validação: Escala de Dúvida,

Escala de Mentira e Escala de Erro. A Escala de Dúvida é relacionada às afirmativas

não respondidas. A Escala de Mentira visa informar até que ponto a pessoa desejou

insinuar melhor aparência do que sua realidade psicológica, ou seja, a pessoa que

desejou apresentar-se mais socialmente favorável. A Escala de Erro visa verificar se

o examinado compreendeu os itens, se cooperou apropriadamente ou não, ou se

ocorreram erros no preenchimento do cartão de respostas. Esta última condição foi

minimizada pelo fato de o conjunto de afirmativas ter sido enviado por correio

eletrônico e a pessoa responder no próprio arquivo. Foram excluídos os dados de

qualquer respondente que tenha sido acusado por qualquer uma dessas escalas.

A versão resumida do MMPI gera nove escalas clínicas: Hipocondria (Hs),

Depressão (D), Histeria (Hy), Desvio Psicopático (Pd), Masculinidade-Feminilidade

(MF), Paranóia (Pa), Psicastenia (Pt), Esquizofrenia (Sc) e Hipomania (Ma). No

presente estudo, optou-se por não utilizar a escala MF dado que sua precisão refere-

se mais ao gênero masculino. A Escala D mede a profundidade do sintoma clínico

ou do complexo de sintomas conhecido como Depressão, que pode ser a principal

incapacidade do indivíduo ou vir acompanhada de outros problemas de

personalidade (como causa ou consequência). A escala Hy mede em que grau o

indivíduo se assemelha aos pacientes que tenham desenvolvido sintomas de

psiconeurose do tipo histeria de conversão. A escala Pd mede a semelhança do

indivíduo com um grupo de pessoas, cuja principal dificuldade se encontra na

ausência de respostas emocionais profundas, na inabilidade de participar

psicologicamente das experiências a que está sendo submetido e no desrespeito de

costumes sociais. A escala Pa derivou do contraste entre pessoas normais e um

Page 58: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

46

grupo de pacientes clínicos que se caracterizavam pela desconfiança,

hipersensibilidade e delírios de perseguição. A escala Pt mede a semelhança do

respondente com pacientes psiquiátricos perturbados por fobias ou comportamentos

compulsivos (Transtorno Obsessivo Compulsivo). A escala Ma mede o fator de

personalidade característico das pessoas que apresentam superatividade no

pensamento e na ação, ou seja, excitamento emocional e fuga de ideias. A escala

Hs indica tendência à preocupação extrema com doenças e a escala Sc mede a

tendência a esquizofrenia, distúrbio psiquiátrico caracterizado pelo fato da pessoa

ter alucinações e encará-las como se fossem reais (HATHAWAY e MCKINLEY,

1972) Considerou-se a pontuação de 60 como ponto de corte (SILVA et al., 2001)

em qualquer das escalas para considera-las como “positivas”, apesar de ser

necessária uma abordagem clínica individualizada para fechar o diagnóstico do

respondente.

O outro teste foi o Questionário de Agressividade (QA) adaptado para o

português de Gallardo-Pujol e colaboradores (2006). Este teste é baseado em 12

afirmativas para as quais o respondente classifica como: (1) “nunca”, (2)

“raramente”, (3) “às vezes”, (4) “quase sempre” e (5) “sempre”. A essas respostas se

atribuem notas de um a cinco na ordem apresentada. O teste gera quatro escalas:

Agressividade Verbal, Agressividade Física, Hostilidade e Raiva. As duas primeiras

compõem as partes instrumental e motora do comportamento, respectivamente. A

escala de Hostilidade representa o componente cognitivo do comportamento e a

escala de Raiva representa o componente emocional e afetivo do comportamento.

A adaptação da versão em espanhol do QA foi feita no presente estudo

usando o método de tradução reversa (back translation), o qual é um procedimento

para investigar a equivalência conceitual entre a versão original e a versão traduzida

para o português. Para isso, um tradutor bilingue brasileiro traduziu a versão em

espanhol para o português, em seguida um tradutor bilingue mexicano traduziu a

versão em português para o espanhol. Finalmente, a versão original e a com

tradução reversa foram comparadas em busca de significados não equivalentes e

nenhuma discrepância foi observada.

Além dos dois questionários, a seguinte pergunta foi proposta: “Com que

finalidade escolhi este cão? Por quê?” A fim de entender as motivações dos

proprietários por cada raça. O respondente também foi caracterizado em relação a:

sexo, idade, número de filhos e grau de escolaridade.

Page 59: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

47

Para possibilitar inferências estatísticas mais confiáveis, as pessoas foram

agrupadas em: Grupo A - proprietários de cães de companhia (Cocker e Labrador); e

Grupo B - proprietários de cães de guarda ou briga (Rottweiler e Bull Terrier).

Os dados foram tabulados dividindo os proprietários em quatro subgrupos, de

acordo com a raça adquirida e foram avaliados estatisticamente com testes não

paramétricos de Kruskal-Wallis e a comparação entre os pares pelo teste de

Student-Newman-Keuls. Após o agrupamento, os grupos foram comparados através

do teste de Mann-Whitney e também foi feito o teste de correlação de Spearman

para comparar a influência das variáveis entre si. Todos os testes foram realizados

através do programa BioEstat® 5.0, com nível de significância de 5% (α=0,05).

Para o cálculo do coeficiente de Spearman foram feitas duas abordagens,

uma incluindo os respondentes do MMPI e outra os excluindo. Os cálculos foram

feitos a partir da divisão dos resultados em variáveis binárias com o seguinte critério:

Sexo (Mulheres=1 e Homens=2); Idade (valores iguais ou inferiores à mediana=1;

valores superiores à mediana=2); Raça escolhida (Guarda ou Briga=1 e de

Companhia=2); Avaliação do MMPI (positivo para qualquer escala=1 e negativo em

todas as escalas=2) e as avaliações do questionário de agressividade para todas as

escalas foram as mesmas (valores iguais ou inferiores à mediana=1; valores

superiores à mediana =2).

Houve a necessidade de o respondente ser maior de idade e assinar um

termo de consentimento livre e esclarecido aprovado junto com o projeto pelo

Comitê de Ética Institucional da Universidade Federal Fluminense (protocolo #

017/08).

4.4.3 – Resultados

Dos 265 filhotes testados no capítulo III, fez-se contato com 127 proprietários,

e desses, 52 responderam ao Questionário de Agressividade (20 homens) e 37 ao

MMPI (15 homens).

Na tabela 3 encontra-se a distribuição dos contatados e respondentes de

acordo com a raça do cão escolhido. Com o detalhe de que uma respondente tinha

dois cães da mesma raça, por isso foi contada apenas como uma unidade para

todas as análises a seguir. Uma única pessoa (proprietária de Labrador) respondeu

ao MMPI e não respondeu ao QA, todos os demais responderam ao QA.

Page 60: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

48

Tabela 3: Número pessoas que responderam aos questionários aplicados a proprietários de filhotes de cães de cinco raças, Niterói – RJ, UFF, 2010.

Raça Filhotes – Nº Contatados – Nº (%) QA* - Nº (%) MMPI# - Nº (%)

BT 31 21 (67,7) 12 (57,1) 9 (42,8)

CSI 13 9 (69,2) 4 (44,4) 4 (44,4)

RL 138 63 (45,6) 25 (39,7) 16 (25,4)

PB 12 5 (41,7) 0 0

Rot 71 29 (40,8) 10 (34,5) 7 (24,1)

Obs.: * Questionário de agressividade (GALLARDO-PUJOL et al., 2006) # Inventário Multifásico de Personalidade Minesota (DAHLSTROM et al, 1972) BT= Bull Terrier ; CSI = Cocker Spaniel Inglês; RL = Retriever de Labrador; PB = Pit Bull; Rot = Rottweiler

Na tabela 4 encontra-se a distribuição dos respondentes ao QA de acordo

com a raça do cão escolhido, número de filhos, média de idade e grau de instrução.

Agrupando por raça e comparando através do teste t de Student a idade dos

proprietários, os de Bull Terrier foram mais jovens do que os de Labrador (P=0,03).

Nenhuma outra combinação de pares de grupos apresentou diferença significativa.

Tabela 4: Frequência absoluta dos compradores de filhotes no período de março de 2008 a junho de 2009, segundo a raça do cão, grau de instrução, número de filhos e média etária dos respondentes do Questionário de Agressividade traduzido de Gallardo-Pujol et al. (2006). Niterói – RJ, UFF, 2010.

Grau de Instrução Número de Filhos Média etária (anos)

Raça Médio Superior Pós-graduação Nenhum 1-2 3-4 (media± desvio padrão)

BT 3* 8 - 7 4 1 29,1± 7,7

CSI 1 2 1 1 3 - 32,5± 7,6

RL 4 11 10 9 13 3 36,3 ± 7,2

Rot

3 3 4 3 7 - 36,2±9,3

Obs.: * Um respondente não informou seu grau de escolaridade BT= Bull Terrier; CSI = Cocker Spaniel Inglês; RL = Retriever de Labrador; Rot = Rottweiler

Em relação à pergunta proposta aos novos proprietários, foram extraídos os

núcleos significativos das respostas e os dados foram agrupados de maneira a

comparar as motivações por categoria de respostas. Os resultados dessa

comparação encontram-se na tabela 5. Ressaltando que em algumas respostas foi

possível extrair dois núcleos significativos. Dois proprietários de Labrador tiveram

como finalidade “Guarda” e “Companhia”, assim como três proprietários de

Page 61: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

49

Rottweiler. Um outro proprietário de Rottweiler alegou razões estéticas associadas à

guarda.

Tabela 5: Frequência relativa, por raça, dos núcleos significativos das respostas de compradores de filhotes de cães à pergunta: “Com que finalidade escolhi este cão?”, Niterói – RJ, UFF, 2010.

Núcleo Significativo (%) Raça (nº) Guarda Criação Companhia Estética Indefinido BT (12) 8,3 25,0 50,0 16,7 - CSI (4) - 25,0 75,0 - - RL (22) 9,1 - 86,4 9,1 4,5 Rot (10) 70,0 30,0 30,0 10,0 - OBS. Em algumas respostas houve mais de um núcleo significativo, por isso algumas linhas não fecham 100% BT= Bull Terrier; CSI = Cocker Spaniel Inglês; RL = Retriever de Labrador; Rot = Rottweiler

Três proprietários de Labrador deixaram alguma das questões do QA em

branco, por isso foram excluídos da amostra. A frequência de categorias de

respostas ao QA encontra-se na tabela 6. Na aplicação do teste de Mann-Whitney,

grupo de proprietários de cães de companhia teve valores significativamente

maiores que o outro grupo na subscala Hostilidade (P<0,01), que foi a única

subescala de apresentou diferenças significativas.

Tomando como base o MMPI, não houve diferença significativa entre os

grupos através do teste de Mann-Whitney (P>0,05). Os resultados foram tabulados e

estão expressos na tabela 7.

Comparando as variáveis através do teste de correlação de Spearman,

observou-se uma correlação positiva entre a subescala de Hostilidade com a

subescala de Agressão Verbal (P=0,01) e com a subescala de Raiva (P<0,01).

Confirmou-se a correlação positiva entre as pessoas do grupo racial de companhia e

Page 62: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

50

a subescala de Hostilidade (P<0,01). Nenhuma outra combinação apresentou

correlação positiva.

Tabela 7: Frequência absoluta por grupos raciais dos resultados da aplicação do Inventário

Multifásico de Personalidade Minesota em proprietários de filhotes de cães, Niterói – RJ, UFF,

2010.

D Hy Pa Pd Pt Ma Hs Sc

Grupo (nº) ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60 ≤59 ≥60

A* (16) 10 3 14 2 14 2 15 1 15 1 16 0 13 3 15 1

B# (20) 15 5 17 3 18 2 17 3 19 1 19 1 16 4 19 1

* Proprietários de cães das raças Rottweiler e Bull Terrier # Proprietários de cães das raças Retriever do Labrador e Cocker Spaniel Inglês

D = Depressão Hy = Histeria Pa= Paranóia Pd = Desvio Psicopático

Pt = Psicastenia Ma = Hipomania Hs = Hipocondria Sc= Esquizofrenia

Analisando os resultados do MMPI quanto ao traço dominante entre as

escalas clínicas, observa-se que as pessoas do grupo dos cães de guarda ou briga

tiveram com mais frequência perfis dominantes para Histeria (37,5%), seguidos por

Depressão (31,3%). Já no grupo dos cães de companhia, houve a predominância de

duas escalas em valores iguais, Depressão e Hipocondria (20,0%).

4.4.4 – Discussão

A dificuldade de recrutar voluntários se deu pela dificuldade e obter

informações dos novos proprietários dos filhotes com os criadores e pela recusa de

muitos convidados. O fato de que alguns criadores não repassaram os dados dos

compradores ficou claro na diferença de 137 (51,7% dos novos proprietários)

indivíduos com os quais o contato não foi possível. Outra dificuldade foi conseguir

que os contatados concordassem em responder aos questionários, apenas 41,4%

responderam ao questionário de agressividade. O número de respostas ao MMPI foi

ainda menor, provavelmente, pelo tamanho do questionário (366 afirmativas), mas

este foi mantido no estudo em virtude da qualidade e da segurança da informação

gerada por ele.

É provável que a dificuldade em se conseguir respostas dos proprietários de

Pit Bull, assim como o acesso aos criadores, se deva à Lei nº. 4597 do Estado do

Rio de Janeiro (RIO DE JANEIRO, 2005), a qual proíbe a reprodução dos cães

dessa raça no Estado. Essas pessoas podem ter se sentido amedrontadas em

Page 63: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

51

divulgar seus dados para uma pesquisa realizada por uma instituição federal de

ensino, apesar do compromisso firmado pelo termo de consentimento de não

divulgação desses dados. Um novo estudo focando pessoas que compram filhotes

de Pit Bull é necessário para avaliar se há diferenças nos perfis psicológicos dessas

pessoas que as levem a temer participar da pesquisa, por exemplo.

Proporcionalmente os proprietários de Bull Terrier foram os que mais

colaboraram, contrastando com os de Pit Bull que não responderam um questionário

sequer. Apesar da superioridade numérica, apenas 23,4% dos proprietários de

Labrador convidados responderam ao MMPI. Essa diferença na colaboração pode

ser um indício de diferença entre os proprietários das raças pesquisadas. Os

proprietários de cães de menor estatura (Cocker e Bull Terrier) mostraram-se mais

colaboradores que os de maior estatura (Labrador e Rottweiler).

A amostra do presente estudo foi constituída por pessoas que compraram

filhotes em canis registrados em entidades cinófilas, ou seja, filhotes relativamente

caros para o poder aquisitivo da maioria da população brasileira e isso se evidencia

no grau de instrução dos respondentes. Não houve qualquer respondente com nível

escolar fundamental e 76,7% dos respondentes tinham nível superior. A

escolaridade dos respondentes também pode ter relação com a forma de contato

(correio eletrônico) que pode ter excluído pessoas de menor instrução ou sem

acesso a um computador pessoal. A diferença proporcional de escolaridade dos

proprietários de Bull Terrier para os demais, acompanha a média etária, portanto, é

provável que a juventude dos proprietários de Bull Terrier, traduza sua escolaridade

proporcionalmente inferior a dos outros grupos, principalmente em relação aos

proprietários de Labrador. É possível também que a menor faixa etária dos

proprietários de Bull Terrier respondentes traduza sua maior participação

proporcional no estudo, o que também se reflete no proporcional menor número de

filhos em relação aos outros grupos, principalmente dos proprietários de Labrador e

Rottweiler. O pequeno número de filhotes de Cocker Spaniel Inglês submetido ao

teste no Capítulo III dificulta qualquer abordagem de comparação com as outras

raças.

O índice de rejeição ao convite para participar da pesquisa pode estar

relacionado com o tema, com a abordagem psicológica ou ainda com a forma de

contato via correio eletrônico.

Page 64: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

52

Em relação à finalidade da escolha do filhote, pode-se perceber que vários

proprietários (14,6%) escolheram o cão por razões cinotécnicas, para serem

reprodutores em seus canis. Tal fato se deve á característica da amostra de que

todos os filhotes foram oriundos de canis registrados em entidades cinófilas.

Também ficou evidente a diferença de motivação para a escolha dos Rottweiler e

dos Labradores. Os primeiros tiveram 70% das respostas como “Guarda” contra o

segundo que teve mais de 86% das respostas como “Companhia”.

A escala de Hostilidade dos proprietários de cães de companhia teve valores

maiores do que os proprietários de cães de guarda ou briga. As raças com maior

percentual de escolhas para companhia obtiveram maior pontuação na escala de

hostilidade comparada às demais. Aparentemente, o que se esperaria era o inverso,

porém faz-se necessário uma análise psicológica mais profunda para compreender o

porquê dessa diferença, pois este resultado abre mais perguntas do que responde.

Tal resultado pode encontrar explicações na psicologia. Uma hipótese seria o fato de

pessoas mais hostis ou que apresentem dificuldades em se relacionar com outras

pessoas buscarem cães de companhia para suprir essa carência. Outra hipótese

seria sustentada pelo conceito psicanalítico de Projeção (LAPLANCHE, 1998) que é

a operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro (pessoa ou coisa)

qualidades, sentimentos ou desejos que desconhece ou recusa em si próprio. Essa

segunda hipótese, então, diz que aqueles com menores valores na escala de

hostilidade assim aparecem por projetar sua hostilidade em um cão que intimide, e

não reconhece esse traço de sua personalidade, portanto não identifica como suas

as opções que o teste apresenta. Ainda há uma terceira hipótese, em que as

pessoas que procurem cães com aspecto intimidador o fazem para lidar com a sua

baixa hostilidade, ou seja, por se sentirem desprotegidas devido a sua

personalidade, buscam segurança no aspecto intimidador do cão. Em uma pesquisa

norteamericana, as autoras (WOODWARDS e BAUER, 2007) relataram maior

hostilidade em pessoas que preferiram gatos a cães, comparados com o grupo com

a escolha inversa. Os autores do estudo norteamericano justificam a escolha dos

gatos por pessoas com maior hostilidade em virtude de personalidade

aparentemente mais hostil e desapegada dos felinos, como uma forma de

reciprocidade. Porém, juntando os dois resultados, pode-se formular uma hipótese

de que quanto maior a hostilidade do indivíduo, maior a sua tendência em escolher

um animal de aspecto geral menos intimidador.

Page 65: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

53

A diferença na escala de hostilidade entre os grupos é um indício forte de

diferenças na busca por um ou outro estereotipo racial canino. Tal busca é, muitas

vezes, baseada em conceitos pré-estabelecidos para uma raça ou outra (WRIGHT et

al, 2007). Este resultado é uma evidência de que a personalidade do proprietário

pode interferir na escolha da raça.

A comparação entre variáveis através do teste de correlação de Spearman

mostrou que idade e sexo do proprietário ou o fato de ter ou não indícios de

distúrbios psiquiátricos não influenciaram no aumento dos valores da subescala de

hostilidade. O que reforça a escolha pelo grupo racial como o diferencial entre os

respondentes.

O fato de não haver diferenças significativas entre os proprietários com

relação aos resultados do MMPI pode ter sido decorrente do tamanho da amostra,

fazendo-se necessário repetir o estudo com uma amostra maior para que se chegue

a uma conclusão definitiva, até mesmo para confirmar a manutenção da diferença

entre os traços dominantes das pessoas dos dois grupos. Porém, apesar de o teste

ser completo e confiável, este mede escalas clínicas de problemas psiquiátricos que

podem realmente não apresentar um padrão para a escolha de uma determinada

raça ou outra, devido à grande variedade de fatores envolvidos com tais problemas

psiquiátricos.

4.4.5 – Conclusões

Pessoas que escolhem a raça Retriever do Labrador, o fazem em busca de

companhia e pessoas que escolhem a raça Rottweiler procuram mais um animal

para Guarda. Aqueles que escolheram cães das raças Retriever do Labrador ou

Cocker Spaniel Inglês apresentaram escalas maiores para hostilidade comparados

aos que escolheram cães das raças Rottweiler ou Bull Terrier.

Page 66: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

54

4.5 - CAPÍTULO V – AVALIAÇÃO DA INFLUÊNCIA DA AGRESSIVIDADE DO PROPRIETÁRIO NA

MANIFESTAÇÃO DA AGRESSIVIDADE DO CÃO

“A palavra agressão traz como significado à mente humana: maldade, sordidez ou vingança,

mas não é o que acontece na mente dos cães.” (FOGLE, 1992)

4.5.1 – Introdução

Neste capítulo, buscou-se testar a correlação entre a agressividade do

proprietário e itens de manejo com a manifestação da agressividade do cão,

seguindo a mesma lógica do capítulo anterior, onde se relacionou a personalidade

do proprietário à escolha da raça. Também se buscou a associação entre perfil do

proprietário e o manejo com o medo do cão, visto que há uma associação entre

medo e agressividade (DUFFY et al., 2008; MILLS e ZULCH, 2010).

4.5.2 – Material e Métodos

Para esta fase da pesquisa, foi utilizado um questionário (ANEXO 2)

constituído de cinco partes: (1) termo de consentimento livre e esclarecido (aprovado

junto com o projeto pelo Comitê de Ética Institucional da Universidade Federal

Fluminense - protocolo # 017/08); (2) identificação do respondente; (3) QA -

questionário de agressividade (o mesmo do capítulo IV); (4) identificação do animal e

do manejo; (5) as seções de agressividade e medo do Questionário para Avaliação e

Pesquisa Comportamental de Cães (Canine Behavioral Assessment & Research

Questionnaire – CBARQ), desenvolvido e validado por Hsu e Serpell (2003).

Este questionário foi aplicado inicialmente a oito respondentes para avaliar o

tempo gasto com o preenchimento e se a terminologia estava clara. A amplitude do

tempo de resposta variou de 15 a 25 minutos e nenhum respondente teve

dificuldades com a terminologia empregada.

Alunos do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal Fluminense

foram recrutados para ajudar na distribuição dos questionários entre seus amigos,

parentes e clientes das clínicas se fizessem estágio em clínicas particulares. O

recrutamento aconteceu durante aulas das disciplinas de Genética e Melhoramento,

Fisiologia Veterinária II, Clínica Médica de Pequenos Animais I e II. Os alunos foram

treinados para orientar no preenchimento do questionário. Foram distribuídos 300

questionários aos alunos, cinco para cada, para que fossem aplicados. Aos

Page 67: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

55

respondentes foi solicitado que respondessem sobre apenas um cão, caso

convivessem com mais de um, independente do número de cães que convivesse

com o cão escolhido. Para ser incluído na amostra, o questionário deveria: (1) ser

referente a cães com idade inferior a sete anos, para evitar contaminar a amostra

com possíveis problemas de agressividade comuns a idosos decorrentes de

alterações características do envelhecimento (maior frequência de artrites e

periodontites, por exemplo); (2) ser referente a cães com mais de dois anos de

idade, em virtude dos problemas de mordedura comuns aos filhotes e da possível

imaturidade social desses cães; (3) ser preenchido por pessoa maior de 18 anos que

tenha assinado o termo de consentimento; e (4) ter o QA totalmente preenchido.

Para atender aos dois primeiros critérios de inclusão, os questionários preenchidos

sem a data de nascimento dos cães foram excluídos.

Os dados foram tabulados e avaliados estatisticamente com o teste de

correlação de Spearman para comparar a influência das variáveis entre si. Todos os

testes foram realizados através do programa BioEstat® 5.0, com nível de

significância de 5% (α=0,05).

Para o cálculo do coeficiente de Spearman, as variáveis foram caracterizadas

da seguinte forma: Sexo (Mulheres=1 e Homens=2); Idade do proprietário (valores

iguais ou inferiores à mediana=1; valores superiores à mediana =2); Grau de

Instrução (Fundamental=1, Médio=2, Superior=3); Teve ou não filhos (se não teve

filhos=1 e se teve algum filho=2); Finalidade da Escolha do cão (Companhia=1, Não

Escolheu=2, Guarda=3); e o que o cão representa na vida do respondente (filho=1,

amigo=2, alguém para cuidar=3; outros =4). As variáveis relacionadas às

características dos cães a ao manejo foram caracterizadas da seguinte forma: Sexo

do cão (Machos não castrados=1, machos castrados=2, Fêmeas castradas=3,

fêmeas não castradas=4); o hábito de pelo menos 30 minutos diários de passeio

(sim=1, não=2); anda na frente ou puxando o proprietário (sim=1, não =2); mastiga

objetos (sim=1, não=2); passou por adestramento (sim=1, não=2); o número de

comandos que obedece (quantidade absoluta de comandos); o proprietário retira

comida se o cão não comer (sim=1, não=2); o cão come antes da família (sim=1,

não=2); por último onde o cão dorme (não tem acesso ao interior da casa=0, tem

acesso e dorme fora do quarto do proprietário=1, dorme no quarto do proprietário

fora da cama do proprietário=2, dorme na cama do proprietário=3).

Page 68: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

56

4.5.2.1- Questionário para Avaliação e Pesquisa Comportamental de Cães

O C-BARQ foi desenvolvido por Hsu e Serpell (2003) como uma forma de

quantificar os problemas de comportamento. A partir dele, são gerados coeficientes

numéricos para aspectos do comportamento daquele cão. O instrumento foi validado

a partir da comparação de seus resultados com os diagnósticos obtidos através das

anamneses e entrevistas por etologistas clínicos da Escola de Medicina Veterinária

da Universidade da Pensilvânia (HSU e SERPELL, 2003).

As seções de agressividade e medo do questionário se baseiam em

respostas marcadas em uma escala gradual crescente de 0 a 4 (0= nunca e 4 =

sempre) e geram os seguintes coeficientes:

• Agressão a estranhos – tendência em responder agressivamente a

estranhos que invadam ou se aproximem do espaço individual do cão ou do

proprietário.

• Agressão direcionada ao proprietário - tendência em responder

agressivamente ao proprietário ou a outros membros da família quando desafiado,

manipulado, encarado ou quando as pessoas se aproximam enquanto o cão está de

posse de objetos ou comida.

• Agressão ou medo de outro cão desconhecido - tendência em responder

agressivamente ou com medo quando abordado diretamente por um cão

desconhecido.

• Agressão direcionada a cão familiar – tendência em responder

agressivamente quando abordado diretamente por um cão que conviva no mesmo

domicílio.

• Medo de pessoas estranhas - tendência em responder com medo a

aproximação direta de pessoas desconhecidas.

• Medo de estímulos novos - tendência em responder com medo a sons altos

ou súbitos, assim como a objetos ou situações não familiares.

4.5.3 – Resultados

Ao todo, 193 questionários (64,3%) foram devolvidos, sendo que desses 14

questionários foram devolvidos em branco. Os demais 107 questionários não foram

Page 69: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

57

devolvidos pelos alunos. Dos 179 questionários preenchidos, 61 foram excluídos da

amostra por não atenderem aos critérios de inclusão, restando 118 questionários

válidos que resultaram na presente amostra.

4.5.3.1 – Correlação entre características do proprietário e agressividade do cão

Em relação aos 118 questionários, a média etária dos respondentes foi de

30,5 anos (desvio padrão=12,0; amplitude= 18-63) e a maioria foi respondida por

mulheres (69,5%). Quanto ao grau de instrução desses respondentes, três (2,5%)

não informaram, quatro (3,4%) tinham ensino fundamental, 44 (37,3%) tinham

ensino médio, 53 (44,9%) tinham ensino superior e 14 (11,9%) tinham pós-

graduação. Em relação ao número de filhos, 87 (73,7%) não tinham filhos, oito

(6,8%) tinham um filho, 15 (12,7%) tinham dois filhos, seis (5,0%) tinham três filhos e

dois (1,7%) tinham quatro filhos. Quanto à finalidade da escolha do cão, 72 (61,0%)

afirmaram escolher o cão somente para companhia, sete (5,9%) para guarda e

companhia, nove (7,6%) para guarda, 27 (22,9%) afirmaram que não escolheram o

cão e três (2,5%) disseram escolher para criação. Quanto ao quê o cão representa

na vida da pessoa, seis (5,1%) afirmaram que seu cão é “alguém para cuidar”, 61

(51,7%) que o cão representa um “amigo”, 50 (43,7%) que o cão representa um

“filho” e um respondente assinalou que seu cão é um animal que desempenha um

papel de trabalho em sua casa.

Os resultados da comparação das características individuais do proprietário

com a agressividade ou medo do cão através do coeficiente de correlação de

Spearman estão expressos na tabela 8. Três correlações foram significativas. Uma

entre ter ou não filhos e agressão a cães estranhos, na qual cães de pessoas sem

filhos apresentaram maiores coeficientes de agressão a cães estranhos (P=0,04). A

outra correlação foi entre a finalidade da escolha e o medo do cão a pessoas

desconhecidas (P=0,04), na qual os cães de proprietários que os escolheram para

companhia apresentaram coeficientes maiores para medo de pessoas

desconhecidas. A terceira correlação significativa foi entre o número de convivas e o

coeficiente de agressão direcionada ao proprietário (P<0,01), na qual quanto mais

gente convivia com o cão, maiores os coeficientes de agressão ao proprietário.

Ao comparar todas as variáveis entre si, as mulheres afirmaram com maior

frequência do que os homens que seus cães representam uma figura de maior

afeição, como filho ou amigo (rs=0,231, P=0,01). Também as pessoas com maior

Page 70: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

58

grau de instrução afirmaram com maior frequência que a finalidade da escolha do

cão foi companhia (rs=-0,278, P<0,01). Outra correlação foi observada entre idade

do proprietário e grau de instrução (rs=0,194, P=0,03). Nenhuma das demais

comparações de dados apresentou correlação significativa.

Tabela 8: Coeficiente de Spearman (rs) das correlações entre características dos proprietários e agressividade ou medo dos cães. Niterói – RJ, UFF, 2010. Agressão a

pessoas desconhecidas

Agressão ao proprietário

Agressão a cão estranho

Agressão a cão familiar

Medo de Estranhos

Medo de Estímulos novos

Sexo -0,129 0,0531 0,0931 0,199 -0,110 -0,0415

Idade -0,136 -0,040 -0,173 -0,182 0,0141 -0,0707

Grau de Instrução 0,136 -0,0122 0,132 0,0867 0,191 0,0267

Filhos -0,0440 0,0529 -0,216a -0,167 -0,167 -0,0822

Finalidade da Escolha 0,174 0,122 0,134 -0,148 -0,200a 0,102

O cão representa 0,0243 0,0442 0,00516 -0,00656 0,0209 -0,0423

Nº de convivas humanos

-0,0349 0,313b 0,148 -0,0398 -0,0927 0,0378

a- P<0,05; b – P<0,01

Comparando os dados relativos aos coeficientes do C-BARQ, houve

correlação entre os dois coeficientes de medo (rs=0,352, P<0,001), caracterizando

que quanto maior o coeficiente para medo de pessoas estranhas, maior também foi

o coeficiente para medo de estímulos novos. Assim como todos os coeficientes de

agressão canina apresentaram correlação positiva significativa (P<0,05). O

coeficiente de agressão contra pessoas desconhecidas apresentou correlação

positiva com medo de pessoas desconhecidas (rs=0,281, P<0,01) e medo de

estímulos novos (rs=0,324, P<0,01). Também o coeficiente de agressão a cães

desconhecidos teve correlação positiva com medo de estímulos novos (rs=0,314,

P<0,01).

4.5.3.2 – Correlação entre Agressividade do proprietário e agressividade do cão

Os resultados da comparação da agressividade do proprietário com a

agressividade ou medo do cão estão expressos na tabela 9. Duas correlações foram

significativas. Quanto maior o coeficiente de agressão física do proprietário menor o

Page 71: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

59

coeficiente canino de agressão contra cão familiar (P=0,01). Outra correlação que se

observou foi entre o coeficiente de hostilidade do proprietário com o medo de

pessoas desconhecidas por parte do cão, quanto maior um maior o outro (P=0,03).

Tabela 9: Coeficiente de Spearman (rs) das correlações entre agressividade dos proprietários e

agressividade ou medo dos cães. Niterói – RJ, UFF, 2010

Agressão a

pessoas

desconhecidas

Agressão ao

proprietário

Agressão a

cão

estranho

Agressão a

cão familiar

Medo de

Estranhos

Medo de

Estímulos

novos

Agressão

Física -0,0605 -0,191 -0,131 -0,298a 0,0594 -0,0332

Agressão

Verbal 0,0900 -0,144 0,0454 -0,210 0,110 0,0570

Hostilidade 0,0719 0,0341 -0,0833 -0,0700 0,215b 0,164

Raiva 0,0668 -0,0412 -0,0538 0,0633 0,161 0,0633

a- P=0,01;b – P=0,03

Comparando-se os dados referentes aos coeficientes gerados pelo QA houve

correlações entre todos os pares (P<0,01), com exceção entre o coeficiente de

agressão física e o coeficiente de hostilidade (P=0,08).

4.5.3.3 – Correlação entre características dos cães e de manejo e agressividade do

cão

Dos 118 cães, 59 (50,0%) eram machos e 16 desses machos (13,5%) eram

castrados. Entre as 59 fêmeas, 16 (13,5%) eram castradas. A média de idade dos

cães foi de 4,4 anos (desvio padrão= 1,5; amplitude= 2,0 – 6,9). Cães de diversas

raças participaram da amostra e estão distribuídos da seguinte maneira: 34 – sem

raça definida; 16 poodle; 8 Cocker Spaniel Inglês; 8 – Retriever do Labrador; 7-

Pastor Alemão; 7 – Yorkshire Terrier; 6 – Pit Bull; 6- Pincher; 4 – Rottweiler; 3 –

Boxer; 3- Teckel; 3- Terrier Brasileiro; 2 – Maltês; 2-Shi Tzu; 2- Golden Retriever; 1 –

Beagle; 1- Buldogue americano; 1- Chiuaua; 1-Dálmata; 1- Fila Brasileiro; 1- Jack

Russel Terrier e 1- Lhasa Apso. Ressaltando que as raças foram declaradas pelos

respondentes.

Os resultados da comparação de características dos cães e de itens de

manejo com a agressividade ou medo do cão estão expressos na tabela 10. Uma

Page 72: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

60

das correlações significativas observadas foi entre “guiar” o proprietário e agressão

ao mesmo (P=0,04), caracterizando que os cães que andam na frente ou puxando a

guia de seus proprietários apresentaram maiores coeficientes para agressão ao

proprietário. Outra correlação observada foi que cães que têm o seu alimento

retirado pelo proprietário, quando não comem tudo, apresentaram maiores

coeficientes para agressão contra cão da mesma família (P=0,03). Cães que

dormem mais próximos de seus proprietários apresentaram correlação positiva em

relação a medo de pessoas estranhas (P<0,01).

Tabela 10: Coeficiente de Spearman (rs) das correlações entre características dos cães e

agressividade ou medo dos cães. Niterói – RJ, UFF, 2010

Agressão a

pessoas

desconhecidas

Agressão

ao

proprietário

Agressão a

cão

estranho

Agressão a

cão

familiar

Medo de

Estranhos

Medo de

Estímulos

novos

Sexo do cão 0,106 -0,0259 -0,0247 -0,0993 0,0809 -0,0614

Idade do cão 0,108 -0,122 0,213 -0,116 -0,0843 -0,0266

Passeia? -0,178 -0,00620 -0,207 -0,0914 -0,0265 0,0738

Guia o

proprietário? -0,0983 -0,224a -0,0248 0,0462 0,0278 -0,0783

Mastiga

objetos? 0,157 0,0604 -0,0221 0,160 -0,110 -0,119

Passou por

adestramento? -0,0468 0,0790 0,0443 0,0669 -0,00118 0,0286

Quantos

comandos? -0,0303 -0,141 -0,00572 0,0642 -0,0619 -0,0418

O proprietário

retira a

comida?

0,0893 0,0449 -0,0373 -0,253a 0,0367 0,0983

Pula nas

visitas? 0,108 -0,194 0,0858 0,0850 0,157 0,0160

Pula nas

pessoas da

casa?

-0,0325 0,0394 0,104 0,0331 -0,162 -0,150

Onde dorme 0,0367 -0,0177 -0,145 -0,0996 0,277b 0,0499

a- P<0,05; b – P<0,01

Page 73: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

61

Comparando os dados referentes a características do cão e manejo entre si,

observou-se correlação entre o hábito de passear ou não e a idade do cão (rs= -

0,337, P<0,01), caracterizando que cães mais novos passeiam com maior

frequência do que os mais velhos. Outra correlação observada foi que cães que

passaram por processo de adestramento atendem mais comandos (rs= -0,270;

P<0,01). Cães que passeiam diariamente pulam menos nas visitas (rs= -0,227;

P=0,02) e cães que dormem mais próximos de seus proprietários têm hábito de

mastigar objetos não alimentares com maior frequência (rs= -0,182; P=0,04).

Nenhuma das demais combinações entre dados apresentou correlação significativa.

4.5.4 – Discussão

Vários resultados deste estudo são inéditos e não podem ser comparados

com outras pesquisas. Por exemplo, o fato de cães de pessoas sem filhos

apresentarem maiores coeficientes de agressão a cães estranhos. Analisando os

dados mais minuciosamente observa-se que na amostra há um número considerável

de pessoas abaixo dos 35 anos (68,6%), sendo que nenhuma dessas pessoas tinha

filhos.

Não houve correlação entre ter ou não filhos e o quê o cão representa na vida

da pessoa, os cães de pessoas sem filhos poderiam representar um filho com maior

frequência nesse grupo, fato que não foi observado. Como já descrito, no presente

estudo a idade do proprietário não teve correlação significativa com agressão ou

medo do cão, o que diverge de um estudo norteamericano (PODBERCEK e

SERPELL, 1997) no qual tal associação é relatada, o grupo de cães mais agressivos

é associado com maior frequência a proprietários com idade entre 25 e 34 anos.

Dois resultados que se mostram coerentes com os resultados do capítulo IV

são relacionados à escolha do cão e ao coeficiente de hostilidade do proprietário. No

capítulo IV observou-se que as pessoas que escolheram raças de cães para

companhia tiveram maiores coeficientes de hostilidade no QA. Neste capítulo,

embora essas duas variáveis não tivessem correlação direta, observou-se que

ambas se correlacionaram com o coeficiente de medo de pessoas desconhecidas

por parte do cão. Quanto maior a hostilidade do proprietário, maior o medo do cão

de pessoas desconhecidas. Assim como cães escolhidos para companhia também

apresentaram maiores coeficientes de medo de pessoas estranhas. Levanta-se

outra hipótese de que a percepção do proprietário mais hostil em relação ao medo

Page 74: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

62

de estranhos seja diferente, e isso apareça no teste de personalidade. Outra

possível hipótese é que proprietários de cães de companhia permitam com mais

facilidade que seu cão tema estranhos, o que na concepção do proprietário poderia

ser inaceitável para um cão de guarda. Neste estudo, portanto, não houve uma

associação direta entre a finalidade da escolha do cão (companhia ou guarda) com

sua agressividade, diferente do que sugerem Pérez-Guisado e seus colaboradores

(2008), que relataram que cães escolhidos para guarda patrimonial apresentam

maior chance de estar envolvido em ataques contra seres humanos.

Outro item que apresentou correlação com medo de pessoas estranhas foi o

fato de o cão dormir mais próximo de seu proprietário, quanto mais próximos, maior

o coeficiente de medo. Outro resultado que leva a levantar hipótese: o medo de

pessoas desconhecidas pode ser justificado pelo fato desses cães que dormem com

seus proprietários serem mais mimados. Também por serem mais mimados, podem

ter o processo de educação deficiente no sentido de mastigar objetos não

alimentares, outro resultado deste capítulo. Esse mimo pode ser enquadrado no que

vários artigos citam como spoiling. O verbo spoil significa estragar no inglês e pode

ser traduzido como mimar para o português. Ser mimado ou tratado como um ser

humano é incriminado por alguns autores (VOITH et al., 1992; O’FARREL, 1997;

PEREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009) como causa de agressão em

contextos de dominância. Porém, a proximidade do proprietário no momento de

dormir não apresentou correlação significativa com agressão contra o proprietário no

presente estudo.

Quanto maior o coeficiente de agressão física do proprietário, menor o

coeficiente canino de agressão contra cão familiar. Uma hipótese para explicar tal

fato pode ser que o cão seja capaz de enxergar na tendência à agressão física do

proprietário uma forma de imposição hierárquica, o que coibiria a tentativa de disputa

hierárquica com outros cães da mesma família, razão mais frequente para agressão

entre cães (RUGBJERG et al, 2003). Outro resultado que reforça a o conhecimento

de demonstrações de dominância e submissão foi que cães que andam na frente ou

puxando a guia de seus proprietários apresentaram maiores coeficientes para

agressão ao proprietário. A correlação entre guiar o proprietário e a agressão a ele

direcionada pode ter relação com a imposição de limites claros ao cão. Cuidando

para não cair em uma ideia antropomórfica ou em um senso comum, talvez seja

necessário analisar a estrutura social canina de uma forma mais complexa do que

Page 75: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

63

forma linear sugerida na “Teoria da matilha”. Com isso, pode-se levantar outra

hipótese: um cão sem limites claros pode reagir de forma agressiva contra seus

proprietários, assim como uma criança sem limites pode reagir agressivamente

contra seus educadores (ZAGURY, 2000), independente do formato de organização

hierárquica que se estabeleça na família. Esse mesmo resultado é coerente com a

recomendação que se faz em casos de agressão por dominância (OVERALL, 1997;

ASKEW, 2003; LANDSBERG et al., 2004), na qual o cão deve deixar de guiar o

proprietário, ser ensinado a andar atrás ou do lado deste e este não deve ser

deixado ultrapassar pelo cão quando for passar por portas ou portões.

Ainda no contexto do passeio, o fato de guiar o proprietário (andar na frente

ou puxando a guia) teve correlação significativa com agressão ao proprietário, ou

seja, o fato de passear ou não passear não teve correlação com agressão, mas a

qualidade desse passeio sim. Tal fato está de acordo com um artigo americano

(PODBERSCEK e SERPELL, 1997), no qual os autores observaram que cães da

raça Cocker Spaniel Inglês que puxavam a guia passeavam menos e eram mais

agressivos. Uma menor frequência de passeios é descrita como associada à maior

agressividade relacionada à comida (MCGREEVY e MASTERS, 2007).

A correlação direta entre o número de convivas humanos e o coeficiente de

agressão ao proprietário pode estar, por hipótese, relacionada com a dificuldade de

o cão identificar uma hierarquia em residências onde há muitos convivas humanos, o

que pode ser o motivador da agressão ao proprietário. Outra hipótese para explicar

esse resultado é que em ambientes sociais com muita gente, o cão encontre

reações diferentes das pessoas para os mesmos comportamentos e esse fato gerar

ansiedade e medo (O’FARREL, 1997), aumentando a probabilidade dos ataques por

medo.

O sexo dos cães não apresentou correlação com qualquer padrão de

agressividade, contrariando diversos autores (WRIGHT, 1991; FATJÓ et al., 2005;

PALÁCIO et al., 2005; PALESTRINI et al., 2005; ROSADO et al., 2009; VOITH,

2009). Tal resultado mostra que tanto machos quanto fêmeas tiveram a mesma

probabilidade de manifestar qualquer um dos padrões de agressividade avaliados no

presente estudo. O que pode excluir o preconceito em relação ao sexo e aumentar o

cuidado que as pessoas que trabalham com cães devem tomar para evitar acidentes

com mordidas. É possível que este resultado se deva à característica da amostra,

com diferentes raças e formas de manejo. Porém, esse resultado é coerente com o

Page 76: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

64

resultado do capítulo III, no qual não houve diferença entre fêmeas e machos na

tendência à dominância através do Teste de Campbell.

O controle do alimento é outro ponto ressaltado na modificação

comportamental sugerida em casos de agressão por dominância (OVERALL, 1997;

ASKEW, 2003; LANDSBERG et al., 2004), porém no presente estudo não houve

relação entre retirar o alimento se o cão não come tudo com agressão ao

proprietário. Houve relação com agressão contra cão da mesma família, fato que

pode estar relacionado à competição por outros recursos, já que o alimento é

controlado.

Alguns resultados destacam a importância de processos de educação e

socialização bem feitas. O desagradável ato de pular nas visitas foi observado com

menor frequência nos cães que tinham hábito de passear pelo menos 30 minutos

diários. Esse hábito de passear se mostrou mais frequente em cães mais jovens.

Pode-se supor que cães idosos passeiem menos, em virtude de problemas

articulares. Entretanto, cães com mais de sete anos foram excluídos da amostra.

Propõe-se a hipótese de que tal diminuição se justifique pela perda da novidade. Os

cães mais novos ainda contam com o “efeito novidade”, mas depois de alguns anos

de convívio, podem ser deixados de lado e, com isso, terem menos atenção do

proprietário. Outra hipótese mais otimista é que o volume de informações a respeito

de comportamento canino que vem sendo divulgado na mídia esteja influenciando

os novos proprietários dos novos cães a melhorarem a qualidade da interação com

esses animais.

Um resultado óbvio desse capítulo é de que cães que passaram por processo

de adestramento atendam mais comandos, o que mostra coerência nos resultados

dos cálculos estatísticos. Porém, ter passado por processo de adestramento não

apresentou correlação significativa com qualquer das escalas de agressividade. Este

resultado está de acordo com Voith e colaboradores (1992), mas diferente do que foi

encontrado por outros autores (JAGOE e SERPELL, 1996; O’SULLIVAN et al., 2008;

PEREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO, 2009).

Os autores de um artigo espanhol (PEREZ-GUISADO e MUÑOZ-SERRANO,

2009) relatam itens associados à agressão por dominância, como: cães do sexo

masculino; cães com idade entre cinco e sete anos; cães quem têm mulheres como

proprietárias; cães que têm proprietários inexperientes, ou seja, pessoas que nunca

tiveram experiências anteriores como proprietárias de cães; cães sem adestramento;

Page 77: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

65

cães de proprietários com curso superior; cães destinados à companhia; cães com

comida à vontade e cães que passeiam pouco. O único desses itens que teve

correlação significativa foi o cão ser escolhido para companhia, mas essa correlação

existiu com o medo de pessoas desconhecidas e não com agressão ao proprietário,

que seria um forte indício de agressão por dominância. Outros estudos

(PODBERSCEK e SERPELL, 1997; MESSAM et al., 2008) também associam a

condição de cão de companhia à maior agressividade.

A correlação encontrada no presente estudo entre agressão e medo é

coerente com os resultados de outras pesquisas (DUFFY et al., 2008; MILLS e

ZULCH, 2010). Esta vem sendo discutida no meio científico e fica bem evidente no

artigo de LUESCHER e REISNER (2008), no qual os autores questionam o

diagnóstico de agressão por dominância em situações nas quais cães atacam em

contextos de controle de recursos, mas com postura de medo.

4.5.5 – Conclusão

A partir dos resultados do presente estudo, sugere-se que sejam feitas novas

pesquisas para explicar as razões para cada correlação encontrada. Mas, é possível

concluir que a manifestação da agressividade canina é multifatorial, dependendo de

fatores que vão do manejo à personalidade do proprietário.

Page 78: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

66

5- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao avaliar a agressão canina na visão do clínico brasileiro, a presente tese

atinge seu primeiro objetivo específico, mostrando a importância do problema em

virtude de alta frequência de queixas que os médicos veterinários recebem sobre

agressividade canina. Assim como pelo fato de os clínicos considerarem as

agressões como causa mais frequente de abandono ou eutanásia de cães por parte

dos proprietários.

Ao buscar na literatura a associação entre a raça e a agressividade canina

não se pode chegar a qualquer relação direta entre elas. O que sugere que a raça

do cão não seja o principal fator responsável pela manifestação de sua

agressividade, principalmente considerando-se frequência de ataques. Porém, não

se pode deixar de considerar que a raça exerça influência no potencial lesivo dos

ataques. Um cão de uma raça com um padrão de peso maior, como um Rottweiler

terá maior poder de lesionar sua vitima comparado a um cão de uma raça menor,

como um Cocker Spaniel Inglês.

Ao realizar o Teste de Campbell filhotes das raças Retriever do Labrador,

Rottweiler, Bull Terrier e Cocker Spaniel Inglês, concluiu-se que há uma diferença

entre seus padrões de dominância. Diferença esta mais marcada pela

independência dos filhotes de Rottweiler e Bull Terrier em fases do teste, do que

pela observação das avaliações globais de todos. Fato que é muito relevante às

conclusões gerais da tese, visto que se esses cães têm padrões diferentes de

interação com o ser humano, também merecem esforços diferentes na sua

socialização, a fim de evitar problemas futuros de comportamento relacionados com

agressividade (SEKSEL, 1997; SEKSEL et al., 1999; SERRA, 2005). Além disso,

essas duas raças em destaque, são cães muito fortes, com grande poder de lesão

de suas vitimas. Portanto, o capítulo III evidencia que a raça pode indiretamente

Page 79: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

67

influenciar na manifestação da agressividade do cão, já que deve considerar a

maneira que esses cães sejam socializados.

Quando os perfis dos proprietários que recém adquiriram filhotes das cinco

raças supracitadas foram comparados, concluiu-se que os proprietários de Bull

Terrier são mais jovens e com menor escolaridade. Que os proprietários de Retriever

do Labrador procuram cães de companhia e os de Rottweiler para guarda, também

que os proprietários de Retriever do Labrador ou Cocker Spaniel Inglês tiveram

maiores pontuações na escala de hostilidade do Questionário de Agressividade. Tais

resultados evidenciam que há diferenças sociais e psicológicas entre os proprietários

que selecionam determinadas raças. Tais aspectos do proprietário devem ser

incluídos na análise da associação entre raça e agressividade, o que torna a

avaliação dos fatores responsáveis pela manifestação de agressividade mais

complexa. Na presente tese, o resultado entre a hostilidade do proprietário e a raça

escolhida deixa dúvidas no eixo causa-efeito. A diferença da personalidade do

proprietário faz com que busquem cães supostamente mais intimidadores ou esses

cães foram selecionados artificialmente com aspecto intimidador por causa da

personalidade de seus criadores?

No capítulo V, traços da agressividade do proprietário aparecem

correlacionados com perfis de medo e agressividade do cão. Observou-se que medo

e agressividade se correlacionaram significativamente. Também que vários outros

fatores apresentaram correlações com a díade medo/agressividade. Fatores

relacionados à finalidade da escolha do cão, ao fato de o proprietário ter ou não

filhos e a itens de manejo.

A presente tese cumpriu seu objetivo geral, de investigar fatores relacionados

com a manifestação da agressividade canina confirmando a hipótese inicial “A

manifestação da agressividade canina tem origem multifatorial que envolve raça,

manejo e a personalidade do proprietário”. Os resultados desta investigação abrem

mais perguntas do que as respondem. Mas, mostram que a agressão canina não

deve ser olhada de forma simplista. Não é apenas uma questão de manejo, de

adestramento ou de hierarquia. Ou ainda de descriminar essa ou aquela raça. A

agressividade canina se deve a um complexo de fatores, que envolve desde manejo

à personalidade do ser humano responsável pelo cão. Esse complexo de fatores

somado à grande frequência de queixas sobre comportamento animal nas clínicas

brasileiras ressaltam a importância da formação dos médicos veterinários em

Page 80: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

68

relação: ao comportamento animal, à importância de educar as pessoas

responsáveis pelos cães e ao correto processo de socialização entre as espécies

humana e canina.

Page 81: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

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GLOSSÁRIO

Animais Gregários Animais que, em condições naturais, vivem em

grupos, ou seja, se agregam.

Agressão Agressão é melhor definida em um dado contexto como uma ameaça adequada ou inadequada ou desafio que é finalmente resolvido por combate ou defesa. (OVERALL, 1997)

Agressividade

A agressividade é a conduta de quem pratica a agressão.

Brincadeiras Agonísticas Brincar é, dentre outras definições, um ato de entretenimento no qual é possível simular a vivência de uma determinada situação. O termo agonístico se refere a lutas. Portanto, brincadeiras agonísticas são aquelas que envolvem lutas. Na etologia, se refere às brincadeiras com manifestações de agressividade, sejam intimidações ou ataques propriamente ditos.

Comportamentos Compulsivos

São definidos como movimentos repetidos intensamente e fora de contexto, atribuídos a uma “busca” na redução de um estado da ansiedade (FOGLE, 1992).

Etologia Clinica

Especialidade da Medicina Veterinária que se dedica ao estudo e tratamento de problemas de comportamento. Também é denominada como Medicina do comportamento ou Zoopsiquiatria.

Hiperatividade O termo pode ter duplo uso, a hiperatividade verdadeira ou primária e a hiperatividade adquirida ou secundária. Cães verdadeiramente hiperativos podem exibir maior agitação, pequena duração na atenção, ausência de treinabilidade, exibições agressivas e falha para se acalmar em ambientes neutros e apresentam efeito paradoxal quando submetidos a tratamento com anfetaminas. As anfetaminas em cães não hiperativos causam agitação, nos hiperativos há o efeito contrário (LANDSBERG, et. al, 2004). A hiperatividade adquirida ou secundária é um comportamento aprendido a partir da interação do cão com o meio. Está relacionada com cães muito agitados, rebeldes ou difíceis de controlar.

Page 95: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

83

Problema de Comportamento

Considera-se problema de comportamento, qualquer comportamento do animal normal ou anormal que se traduza em problema na relação com seu grupo social humano ou animal. Todos os distrúrbios de comportamento, mesmo que não gerem problemas diretos na relação social do animal, ou comportamentos do animal que não sejam considerados normais para a espécie também são incluídos nesta definição. A micção em local inapropriado é um exemplo de problema de comportamento. Urinar para marcar território, é um comportamento natural da espécie canina, porém quando o cão marca com frequência um objeto pessoal do proprietário ou um móvel de sua residência gera problemas da qualidade da relação com esse proprietário e tal ato pode ser considerado um problema de comportamento. Outros exemplos podem seguir a mesma linha de raciocínio como: defecações em locais inapropriados, vocalizações excessivas e agressões. Como distúrbios de comportamento pode-se citar como exemplo os comportamentos compulsivos e a depressão.

Socialização

A socialização é o processo pelo qual o indivíduo se integra em um grupo social e aprende as regras sociais deste grupo.

Socialização Primária

Fase do desenvolvimento do cão, que se inicia na 8ª semana e se estende até a 16ª semana de vida do animal (SEKSEL, 1997). Está compreendida didaticamente entre o período de transição e o período juvenil. Nesta fase de sua vida, o filhote aprende a discriminar entre estímulos ambientais benignos (olfativos, sonoros, visuais e táteis) e ameaçadores. Por meio destes processos de aprendizagem, de interação social, comportamento lúdico e reconhecimento ambiental, o cão adquire habilidades comunicativas e de organização social, as quais irão determinar sua capacidade de adaptação, de ajuste ao ambiente, de interação com o grupo ao qual pertence ou irá pertencer, influenciando os futuros relacionamentos sociais da vida adulta (LANTZMAN, 2004).

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84

APÊNDICE:

DOMESTICAÇÃO E FORMAÇÃO DAS RAÇAS

Ao longo da história, os cães vêm sendo submetidos tanto aos efeitos da

seleção natural, os quais possibilitaram a sua adaptação ao meio ambiente em que

vivem, como aos efeitos da seleção artificial, provocada pelos seres humanos de

diversos modos objetivando uma ampla variedade de aplicações para esses cães

(DENIS, 2007). No início da domesticação, os seres humanos conservaram aqueles

animais menos agressivos e menos arredios, provavelmente selecionando aqueles

com características morfológicas que diferiam dos exemplares selvagens, fato que

pode ter possibilitado a grande variedade morfológica encontrada nos cães

domésticos hoje em dia (DENIS, 2007). Contrariando a teoria de Darwin (1859), de

que os diferentes tipos morfológicos de cães teriam origem em diferentes espécies

de canídeos, através de análise genética de RNA mitocondrial, concluiu-se que a

origem do cão doméstico tem o lobo como ancestral mais provável (VILÁ et al,

1997). Exemplares dessa espécie foram, ao longo do tempo, sendo selecionado

para diversas aptidões, sendo hoje um animal com um potencial maior de cognição

social do que os lobos selvagens, destacando-se até de grandes primatas em certas

tarefas que dependem da leitura de sinais corporais humanos (HARE et al, 2002).

As primeiras associações entre homens e canídeos foram encontradas na

China e remontam há 150.000 anos (GRANDJEAN, 2001, p.3). Há cerca de 10.000

anos, ao deixar de ser nômade e caçador para ser produtor e criador do seu

alimento, o homem precisou domesticar o canídeo ancestral do cão para auxiliá-lo

na caça e posteriormente no cuidado do gado (GRANDJEAN, 2001, p.4). A fixação

dos padrões raciais só apareceu a partir do século XVI para os cães de caça e

prosseguiu ao longo dos séculos posteriores. A cinofilia progrediu até que no século

XIX (Londres – 1861 e Paris – 1863) se registraram as primeiras exposições caninas

(GRANDJEAN, 2001, p.7).

As raças, como são conhecidas hoje, são fruto de seleção natural, seleção

artificial e do cruzamento entre animais de padrões diferentes. O reconhecimento

das raças depende da organização das pessoas que criam os cães em associações

ou clubes, nos quais esses indivíduos estabelecem (ou reconhecem) padrões

morfológicos e comportamentais para as raças. Essas associações ou clubes de

cinofilia têm hoje uma entidade internacional de reconhecimento e classificação das

Page 97: Avaliação de fatores de influencia na manifestação da

85

raças chamada de FCI (Federação Cinológica Internacional). Portanto, do Husky

Siberiano ao Cão Pelado Mexicano, do Pequinês ao Dogue Alemão, todas as cerca

de 400 raças homologadas pela FCI, a despeito de sua diversidade morfológica,

pertencem à espécie Canis familiaris (GRANDJEAN, 2001, p.6).

CLASSIFICAÇÃO ZOOLÓGICA

Filo=> Chordata Classe => Mamália Ordem =>Carnívora Família => Canidae Gênero =>Canis Espécie => Canis familiaris

HISTÓRICO DAS RAÇAS CANINAS ESTUDADAS NOS CAPÍTULOS III E IV

RETIREVER DO LABRADOR

Havia, no século XVIII, na ilha de Terra Nova, no Canadá, um cão muito

apreciado como apanhador na caça ao pato selvagem, chamado St. John Water

Dog, em geral negro e com as dimensões de um Pointer. Exemplares desse cão

foram levados para a Inglaterra, em 1830, pelo terceiro duque de Malmesbury,

mesma pessoa responsável pelo nome Retriever do Labrador como foi registrado no

Kennel Club Inglês em 1903 (SCANZINI, 1983, p.278; GRANDJEAN, 2001, p.289).

Atualmente a raça é classificada pela FCI como cão de caça e é muito valorizada

para companhia e para trabalhos como guia de cegos e localizadores de drogas ou

pessoas soterradas.

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86

ROTTWEILER

Existem duas origens possíveis para essa raça na Alemanha, uma é que

descenderia do Boiadeiro Bávaro e outra dos Molossos romanos. Já na idade média,

na cidade de Rottweil, em Würtemberg, este cão forte e robusto guardava rebanhos

e defendia os vendedores de gado contra os bandidos. Na época, a corporação dos

açougueiros adotou-o, o que justifica um dos nomes pelo qual é conhecido, “cão de

açougueiro”. O primeiro clube de criadores da raça surgiu em 1907. Durante a

primeira guerra mundial foi usado pelo exército alemão. (SCANZINI, 1983, p.189;

GRANDJEAN, 2001, p.101). Atualmente é classificado pela FCI como cão de tração,

de guarda e boiadeiro.

COCKER SPANIEL INGLÊS

Na Grã Bretanha, no século XIV, já existia um Spaniel, que era utilizado para

caça de pássaros com rede (“l’espainholz”). Esses cães localizavam e expulsavam

as aves de seus esconderijos para que os caçadores as pegassem. No século XVII,

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87

esses cães se especializaram para caçar galinhola (“cocking”). Desse especialista

surgiu a raça Cocker Spaniel Inglês, que foi reconhecida em 1883 (GRANDJEAN,

2001, p.297). Atualmente é classificado pela FCI como levantador de caça e é muito

usado como cão de companhia.

BULL TERRIER

A raça é proveniente do cruzamento de Buldogues e de Terriers com a

finalidade de criar um “gladiador das raças caninas”, um cão forte como um

Buldogue com a agilidade de um Terrier, sendo primeiramente usado em combates

contra touros e depois contra outros cães. Em 1835, esses duelos foram proibidos

na Inglaterra. Por volta de 1860, Sir James Hinks, selecionou uma variedade

totalmente branca, que deu origem à raça atual. Foram admitidos outros padrões de

pelagem, em virtude da debilidade dos animais decorrente da seleção dos brancos

(SCANZINI, 1983, p. 225; GRANDJEAN, 2001, p.140). Atualmente é classificado

pela FCI como cão de caça e não é mais usado em brigas.

PIT BULL

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No final do século XIX e início do XX, em Staffordshire (terra da cerâmica

inglesa), conservara-se uma variedade de buldogue da época em que se realizavam

combates, isto é, um tipo sólido, ágil, lutador e obstinado. Veio a ser reconhecido em

1935, com o nome de Staffordshire Bull Terrier. Esses cães, nos Estados Unidos da

América foram selecionados para criar uma raça maior e mais poderosa para os

combates entre cães, os quais aconteciam em fossas (pit=fossa), por isso passou a

ser conhecido com Pit Bull (SCANZINI, 1983, p.225; GRANDJEAN, 2001, p.139). O

Pit Bull é uma raça distinta dos Bull terrier de Staffordshire e não é reconhecida pela

FCI, mas, no Brasil, é reconhecida e classificada pela CBKC como cão de guarda e

companhia. Atualmente a raça participa de campeonatos de obediência, faro, agility,

proteção e tração.

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ANEXO 1:

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ANEXO 2:

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