Bacias sedimentares brasileiras

Embed Size (px)

Citation preview

Bacias sedimentares brasileirasOrigem, evoluo e classificaoO Brasil, por praticamente toda sua extenso territorial, apresenta um grande nmero de bacias sedimentares, cujo conhecimento muito varivel. Nos prximos meses ser apresentada uma sntese das principais bacias brasileiras, nos seus aspectos geolgicos e paleontolgicos, atravs da contribuio de pesquisadores de diversas instituies. Este nmero introduz esta nova srie, apresentando, sem inteno de esgotar o assunto, uma anlise dos processos e mecanismos que levam gnese das bacias, alm dos aspectos conceituais sobre sua classificao.

Origem, evoluo e classificao das bacias sedimentaresWagner Souza-Lima* & Gilvan Pio Hamsi Junior#*

Fundao Paleontolgica Phoenix, Aracaju, Sergipe, Brasil (e-mail: [email protected]) PETROBRAS-UNSEAL-ATEX-LG, Aracaju, Sergipe, Brasil (e-mail: [email protected])

#

A organizao e classificao so caractersticas do ser humano. Do ponto de vista cientfico, so aes fundamentais para facilitar o entendimento e permitir uma simplificao terica dos complexos processos naturais. O estudo da origem e evoluo das bacias sedimentares um exemplo de tal complexidade, para o qual as primeiras tentativas de organizao remontam a mais de um sculo 1. Organizar as centenas de bacias sedimentares existentes no mundo fundamental para que seja possvel entender os processos termomecnicos e estilos estruturais envolvidos em suas gneses e a influncia destes na distribuio dos recursos naturais. Uma bacia sedimentar o resultado do processo de subsidncia de uma placa tectnica, que permite o acmulo e a preservao dos sedimentos: cessando a subsidncia, cessa a sua histria deposicional. A subsidncia pode ser de carter local, quando causada pela distenso e ruptura da litosfera, ou regional, quando causada por mecanismos de manuteno do equilbrio isosttico2. Uma placa litosfrica praticamente bia sobre o substrato mais dctil do manto, a astenosfera. Quando, por algum motivo, uma carga acrescida superfcie da placa, ela sofre subsidncia por flexura para readquirir o equilbrio atravs da isostasia. Por outro lado, a isostasia pode causar soerguimento regional quando uma carga retirada ou pode causar soerguimento nas bordas das reas afundadas flexuralmente, como um efeito secundrio (ombreiras flexurais). A subsidncia pode ser classificada como mecnica, quando resultante da deformao ou ruptura crustal, ou trmica, quando resultado da alterao do estado trmico da litosfera (Figura 1).

Figura 1 - Representao esquemtica dos processos de subsidncia mecnica e trmica. No caso de subsidncia mecnica local (A), apenas o bloco submetido carga subside, ao passo que na regional (B) uma grande rea sofre flexura. Nos eventos termais apenas (C), a quantidade de subsidncia que ocorre por resfriamento igual quantidade de soerguimento relacionada ao aquecimento da crosta. Para que uma bacia seja criada por processos termais necessrio ento que outros processos (D) atuem em conjunto (p. ex., eroso, afinamento da crosta, etc.)2. A subsidncia mecnica pode ser local ou regional (neste caso por flexura). A subsidncia mecnica local tpica dos estgios iniciais de bacias marginais (fase rift), resultante da ruptura crustal. A subsidncia mecnica regional flexural ocorre principalmente em bacias de antepas (foreland), mas corresponde tambm ao componente da prpria carga sedimentar que amplifica os demais processos de subsidncia. A subsidncia trmica resulta tambm do processo de compensao isosttica. A distenso de uma placa litosfrica leva ao seu afinamento, que se d pela ascenso do topo da astenosfera. O topo da astenosfera definido pelo limite trmico abaixo do qual ocorre a fuso parcial das rochas do manto. A ascenso da astenosfera tambm pode ser causada pela atuao de uma pluma mantlica (hotspot). Estas plumas so anomalias trmicas oriundas provavelmente do contato entre o manto e o ncleo que, ao atingirem a placa, enfraquecem a litosfera circundante e causam vulcanismo na superfcie. Aps a ruptura de uma placa litosfrica, ela tende a se resfriar e retornar situao original. Isso se d pelo rebaixamento do topo da astenosfera s custas do esfriamento e adensamento das rochas do manto. Tal adensamento corresponde a uma carga que induz subsidncia flexural da placa, por isostasia. Este processo geralmente tem carter regional, sendo tpico da fase de deriva continental. Os processos de subsidncia originam uma srie de feies estruturais importantes na histria evolutiva de uma bacia sedimentar, destacando-se as zonas de charneira e as ombreiras. A zona de charneira uma regio que registra a variao abrupta no registro sedimentar, correspondente s reas de intenso afinamento crustal, normalmente marcadas por falhas de elevado rejeito (Figura 2). As ombreiras so resultantes dos soerguimentos que ocorrem nas bordas de bacias por compensao isosttica regional, tendo como conseqncia a eroso das pores soerguidas e a gerao de discordncias, muitas delas regionais. Figura 2 - Seo esquemtica da margem continental brasileira na altura da bacia de Sergipe-Alagoas exibindo a regio da zona de charneira e sua relao com as zonas de afinamento crustal3.

A ruptura da litosfera em geral acompanha as zonas de fraqueza e anisotropias do embasamento. No caso das bacias da margem leste e equatorial brasileira, p. ex., a evoluo deste processo culminou com a formao do Oceano Atlntico. Alm das anisotropias do embasamento, auxiliaram nessa ruptura continental a atuao de hotspots, como os de Tristo da Cunha e Ascenso, que causaram o enfraquecimento dos ncleos cratnicos mais resistentes. possvel, com base em tcnicas estratigrficas quantitativas, compreender-se a histria do preenchimento sedimentar de uma bacia4. A utilizao dos fsseis na obteno de dados bioestratigrficos e paleobatimtricos auxilia na construo de diagramas de histria de soterramento que so teis interpretao exploratria das bacias (Figura 3). A construo desses diagramas envolve a aplicao da tcnica de back stripping sucesso estratigrfica de um poo, onde cada unidade estratigrfica sucessivamente subtrada, calculando-se o equilbrio isosttico da coluna restante. Esta anlise permite obter uma representao grfica dos movimentos verticais de um horizonte estratigrfico desde o momento de sua deposio at um ponto temporal escolhido, predizendo, p. ex., o alcance de condies para a gerao de hidrocarbonetos. Figura 3 - Diagrama generalizado da histria de soterramento da bacia de Sergipe-Alagoas destacando o comportamento da seo marinha cretcea. Desde o emprego do conceito dos geossinclinais5, 6, 7 1, 5

, a classificao das bacias sedimentares tem evoludo de forma

bastante dinmica. As diversas classificaes sugeridas, em sua maioria, basearam-se no posicionamento da bacia em relao s placas tectnicas . Uma das propostas mais aceitas foi aquela que procurou associar os elementos7

tectnicos e termo-mecnicos ocorrncia de hidrocarbonetos (Figura 4), de ampla utilizao na indstria de petrleo. Essa classificao, dita "de Klemme", distingue oito tipos bsicos de bacias, sendo trs deles associados a reas intracontinentais, ou seja, bacias formadas no interior de uma placa litosfrica, e cinco tipos marginais ou extracontinentais, correspondendo s bacias originadas nas bordas das placas, sujeitas a esforos tracionais, compressivos ou transcorrentes (de rasgamento). Durante a evoluo de uma bacia, um tipo pode evoluir para outro. Nesta classificao, nota-se que a origem e evoluo das bacias sedimentares pode ser entendida fundamentalmente com base no contexto geotectnico atuante nas placas litosfricas onde elas se inserem. Distinguem-se, assim, as bacias distensionais, compressionais e as intracratnicas.

Figura 4 - Classificao das bacias sedimentares segundo sua posio em relao s placas tectnicas7.As bacias distensionais podem ser divididas em marginais (tipos V e VIII7), rifts interiores (III) e transtensionais (V). Os rifts interiores so as bacias originadas por ruptura crustal, acompanhado ou no por ascenso convectiva do manto. Caso evoluam para uma fase de deriva continental, constituiro as bacias marginais (Figura 5). Nessas ltimas, durante a fase de deriva, predominam os processos de subsidncia trmica, ao contrrio da subsidncia mecnica, que caracteriza o rift. As bacias transtensionais esto associadas movimentao de falhas cisalhantes que geram bacias em pull-apart (Figura 6), normalmente com elevadas taxas de subsidncia. Nas bacias compressionais, formadas em margens convergentes, distinguem-se as de foreland, ou de antepas, em reas continentais (tipos II, IV) e os sistemas arco-fossa, em reas ocenicas (tipo VI ). Nestas bacias predomina a subsidncia mecnica regional, de carter flexural, causada pela carga

de cintures dobrados adjacentes8. As bacias transpressionais so tambm um outro tipo de bacia compressional (VII), originadas na rea de juno de falhas cisalhantes do tipo transcorrente. Figura 5 - Evoluo esquemtica de bacias rift para margens passivas9, 2. Os eventos mostrados ilustram, p. ex., os mecanismos que originaram as bacias da margem leste brasileira.

As bacias formadas no interior dos continentes (ou intracratnicas, tipo I), como as bacias do Paran, do Parnaba, Amazonas e Solimes, apresentam evoluo bastante complexa, com alternncia de fases de subsidncia e de soerguimento. Apesar de geralmente evoludas a partir de rifts abortados, os mecanismos que explicariam as diversas fases de subsidncia e de soerguimento ainda so controversos10, 11.

Figura 6 - Bacia pull-apart ideal12. A origem destas bacias est associada a falhas transcorrentes (strike slip), porm normalmente no evoluem a ponto de ocorrer a gerao de crosta ocenica. As bacias de margens transcorrentes (tipo V) esto associadas a grandes falhas de rejeito horizontal, podendo ser distensionais ou compressionais. As bacias transtrativas, ou pull-apart (Figura 6), so formadas nas reentrncias das falhas sujeitas distenso, enquanto que as bacias transpressionais so originadas nas reas sujeitas compresso. A primeira possui mecanismo de subsidncia anlogo a um rift, enquanto que a segunda anloga a uma bacia de antepas, onde a subsidncia flexural provocada pela carga tectnica. Normalmente, as bacias transpressivas e transtrativas apresentam elevadas taxas de subsidncia que, associada s baixas taxas de sedimentao, geram condies deposicionais profundas. Uma outra classificao, muito simplificada, a temporal, separando as bacias em proterozicas, paleozicas, mesozicas e cenozicas (Tabela 1). Um outro sistema de classificao, relativamente mais complexo, foi proposto de modo a agrupar as bacias atravs de cdigos que pudessem representar, de forma mais fidedigna, toda sua evoluo tectono-sedimentar13, 14. Embora tenha sido louvvel, esta codificao acabou sendo pouco usada, pois se tornou por demais complexa, afastando-se da simplificao terica necessria ao fcil entendimento da evoluo das bacias sedimentares. Afinal, quem se lembraria que a bacia de Sergipe-Alagoas tem como classificao IS12M3/IS13/IF12L3Lc(LL?)/IS12M/(MS12M/MS12M/MS2M3)Lb? 15