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VALTER T. MOTTA Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações Carboidratos Volume 7

Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

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VALTER T. MOTTA Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Carboidratos

Volume

7

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CARBOIDRATOS

s carboidratos são as fontes mais importantes de energia do organismo. São poliidroxia l-

deídos ou poliidroxicetonas, ou ainda, substâncias que por hidrólise formam aqueles compostos. São classificados como: monossacarí dios, oligossaca-r ídios e pol issacarídios.

Os monossacarídios são açúcares s imples constituídos por uma única unidade poliidroxia l-deídica ou cetônica contendo 3 a 9 átomos de carbono, sendo o principal combustível para a maioria dos seres vivos. Os mais freqüentes no homem são a glicose, frutose e galactose , todos com seis átomos de carbono.

Os oligossacarídios são formados por l igações glicosídicas de dois ou mais (até dez) monossaca-rídios. Apesar da grande variedade de combin a-ções poss íve is , são t rês os mais importantes neste contexto: maltose, composta de duas moléculas de glicose; sacarose, formada por uma molécula de glicose e uma de frutose; e lactose, const i tu ída por uma molécula de glicose e uma de galactose.

Os pol issacarídios são carboidratos de elevada massa molecular formados por mais de dez unid a-des monossacarídicas. O amido (forma de armaze-namento para a glicose nos vegetais) é o principal polissacarídio da dieta. É consti tuído por uma mistura de dois polissacarídios: amilose e amilo -pect ina. A amilose é composta por unidades repe-t i t ivas de glicose, unidas por l igações α-1,4 (ca-deias lineares). A amilopectina é uma estrutura ramificada que além dos laços α-1,4, possui liga-ções α-1,6 nos pontos de ramificação. O gl icogê-n io é a mais importante forma de polissacarídio de armazenamento para a glicose nos animais. Sua estrutura é similar à amilopectina.

Os carboidratos da dieta fornecem a maior parte das necessidades calóricas do organismo. A dieta média é composta de amido, sacarose e la c-tose. O glicogênio, maltose, glicose e frutose, pre -

sentes em certos alimentos, constituem uma fração menor dos carboidratos ingeridos.

Antes da absorção dos carboidratos pelas cé-lulas do intest ino delgado, é essencial que os po-l issacarídios e ol igossacarídios sejam hidrolizados em seus componentes monossacarídicos. Este desdobramento ocorre seqüencialmente em dife-rentes locais do sistema digestório por uma série de enzimas.

O amido e o glicogênio são degradados pela enzima α-amilase (salivar e pancreática) for-mando maltose e isomaltose. Estes dois produtos são hidrolizados em glicose por enzimas ligadas à membrana da borda em escova intestinal: maltase e isomaltase . Portanto, esta hidrólise ocorre na superfície das células da mucosa intestinal. Outras enzimas, que atuam na interface da luz e da cé-lula, são: sacarase , que hidrolisa a sacarose em glicose e frutose; a lactase , que fornece glicose e galactose a part ir da lactose.

Os principais monossacarídios obtidos por hidrólise (glicose, frutose e galactose) são absor-vidos do lúmem para as células e levados ao fí -gado pelo sis tema porta. A gl icose no f ígado é metabolizada ou armazenada como glicogênio. O fígado também libera glicose para a circulação sistêmica, tornando-a disponível a todas as células do organismo. A frutose e galactose são t ransfor-madas em outros compostos de acordo com as necessidades homeostát icas ou convert idas em glicose, a forma usual de açúcar circulante.

A concentração de gl icose no sangue é regu-lada por uma complexa interrelação de muitas vias e modulada por vários hormônios. A glicogênese é a conversão de gl icose a gl icogênio, enquanto a gl icogenól ise é o desdobramento do glicogênio em glicose. A formação de glicose a partir de outras fontes não-carboidratos, como aminoácidos, glice-rol ou lactato, é chamada gl iconeogênese. A con-versão da glicose ou outras hexoses em lactato ou

O

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piruvato é denominada glicól ise . A oxidação total da glicose em dióxido de carbono e água ocorre no ciclo de Krebs (ciclo do ácido cítrico) e a cadeia mitocondrial de transporte de elétrons acoplada a fosforilação oxidativa, geram energia para formar ATP (adenosina trifosfato). A glicose também é oxidada em dióxido de carbono e água pela via pentose fosfato, com a produção de NADPH ne-cessário para as reações anabólicas do organismo.

Bibliografia consultada

CAMPBELL , M . K . Biochemistry. 3 e d . P h i l a d e l p h i a : Saunders , 1999 . p . 420-571 .

LEHNINGER, A. L. , NELSON, D. L. , COX, M. M. Princípios de bioquímica. 2 ed . São Paulo : Sarvier, 1995. p. 297-354 .

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GLICOSE, LACTATO E CETONAS

glicose é a aldohexose mais importante para a manutenção energética do organismo:

Em condições normais, a glicose sangüínea

(glicemia) é mantida em teores apropriados por meio de vários mecanismos regulatórios. Após uma refeição contendo carboidratos, a elevação da glicose circulante provoca:

§ Remoção pelo fígado de 70% da glicose trans -portada via circulação porta. P arte da glicose é oxidada e parte é convertida em glicogênio para ser utilizada como combustível no jejum. O excesso de glicose é parcialmente convertida em ácidos graxos e triglicerídios incorporados às VLDL (lipoproteínas de densidade muito baixa) e transpor tados para os es toques do t e-c ido adiposo.

§ Liberação de insulina pelas células β do pân-creas. Entre os tecidos insulino-dependentes estão o tecido muscular, adiposo, diafragma, aorta, hipófise anterior, glândulas mamárias e lente dos olhos. Outras células, como aquelas do fígado, cérebro, eri trócitos e nervos não ne-cessitam insulina para a captação de glicose ( insulino independentes).

§ Aumento da captação da gl icose pelos tecidos periféricos.

§ Inibição da l iberação do glucagônio.

§ Outros hormônios (adrenalina, hormônio de crescimento, glicocorticóides, hormônios da t i-reóide) e enzimas, além de vários mecanismos de controle, também atuam na regulação da glicemia.

Estas atividades metabólicas levam a redução da glicemia em direção aos teores encontrados em jejum. Quando os níveis de glicose no sangue em jejum estão acima dos valores de referência, d e-nomina-se hipergl icemia , quando abaixo destes valores, hipogl icemia .

A glicose é normalmente filtrada pelos gromé-rulos e quase totalmente reabsorvida pelos túbulos renais . Entre tanto, quando os teores sangüíneos atingem a faixa de 160 a 180 mg/dL, a glicose aparece na urina, o que é denominado gl icosúria .

Em todas as células, a glicose é metabolizada para produzir ATP e fornecer intermediários me-tabólicos necessários em vários processos bio s -s inté t icos .

HIPERGLICEMIA

A causa mais freqüente de hiperglicemia é o dia-betes mell i tus, um estado de intolerância à glicose e hiperglicemia em jejum resultante da ação d efi-ciente da insulina. Apresenta, também, anormali-dades no metabolismo dos carboidratos, proteínas e l ipídios.

Pacientes portadores de episódios hiperglic ê-micos, quando não tratados, desenvolvem cetoaci-dose ou coma hiperosmolar. Com o progresso da doença aumenta o risco de desenvolver complic a-ções crônicas característ icas, tais como: retinopa-t ia , angiopat ia , doença renal , neuropat ia (câim-bras , paresteses dos dedos dos pés , dor nos me m-bros inferiores, neuropatia do nervo craniano), proteinúria, infe cção, hiperl ipemia e doença ate-rosclerót ica. Esta última pode resultar em ataque cardíaco, gangrena ou enfermidade coronariana. Os estados hiperglicêmicos são classif icados:

A

OH

HOOHH

CH2HO

H

H

HOH

OH

Glicose

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Diabetes mellitus tipo 1 (Imuno-mediado). Este tipo compreende 5 -10% de todos os casos de diabetes mellitus. Os sintomas são: poliúria, poli-dipsia, polifagia, perda inexplicada de peso, irri-tabilidade, infecção respiratória e desejo de bebi-das doces. O aparecimento, em geral, é de forma subaguda ou aguda em indivíduos com menos de 20 anos. Estes pacientes tem deficiência de insu-lina e são dependentes da mesma para manter a vida e prevenir cetoacidose. Quando não tratada, surgem náuseas, vômitos, desidratação, estupor, coma e, finalmente, a morte. O diabetes do tipo 1 é caracterizado pela destruição das células β do pâncreas, levando a uma deficiência total de insu-lina pancreática. Apresenta a presença de anticor-pos an t i-insulina, anti-i lhotas e ant i-GAD (descar-boxilase do ácido glutâmico). Além do mecanismo auto-imune este diabetes pode ser idiopático.

Diabetes mellitus tipo 2. Ao redor de 80-90% de todos os casos de diabetes correspondem a este tipo. Ocorre, em geral, em indivíduos obesos com mais de 40 anos, de forma lenta e com história familiar de diabetes. Estes pacientes apresentam sintomas moderados e não são dependentes de insulina para prevenir cetonúria . Nestes casos os níveis de insulina podem ser: normais, diminuídos ou aumentados . É caracterizada pela relativa defi-ciência pancreática, ou de predominante deficiê n-cia pancreática com relativa resistência à ação insulínica. Raramente apresenta cetoacidose dia-bética

Outros tipos específicos de diabetes.

§ Defei tos genéticos das células β: MODY 1, MODY 2, MODY 3 e outros. São formas raras de diabetes t ipo 2. (MODY = Maturity onse t type of d iabetes of youth).

§ Defei tos genét icos da ação da insul ina: diabe-tes l ipo-atrófico, leprechauismo, síndrome de Rabson-Mendenhall, resistência à insulina A e ou t ros .

§ Doenças do pâncreas exócrino: pancreati tes, trauma/pancreatectomia, neoplasia, hemocro-matose, pancreatopatia, fibrocalculosa e outras.

§ Endocrinopat ias: acromegalia, síndrome de Cushing, glucagonoma, feocromocitoma, s o -matostinoma, hipertireoidismo e out ras .

§ Induzido por drogas ou substâncias químicas: vacor – veneno de ra to – pentamidine, ácido nicotínico, glicocorticóides, t iazídicos, hor-mônios t i reoideos, agonistas β-adrenérgicos e out ras .

§ Infecções: rubéola congênita, citomegalovírus e out ras .

§ Formas incomuns de diabetes imuno-mediado: síndrome de “Stiff-man”, anticorpos antire-ceptores de insul ina e outros .

§ Outras s índromes genét icas associadas ao diabetes: s índrome de Down, síndrome de Klinefelter, síndrome de Turner, síndrome de Lawrence-Moon-Beidel, coréia de Huntington, síndrome de Prader-Willi e outras.

Diabetes mellitus gestacional. É a intolerâ n-cia aos carboidratos de intensidade variada (dia-betes e intolerância diminuída à glicose), dia-gnost icada pela primeira vez durante a gravidez podendo ou não persist ir após o parto. Estima -se que esta anormalidade seja encontrada entre 1-20% das grávidas. No entanto, somente ao redor de 3% é diabetes mellitus gestacional verdadeira. Em pacientes diabéticas grávidas, o controle insa-t isfatório da glicose está associado com alta inci-dência de morte intra -uterina e má formação fetal. Tolerância à glicose alterada e hiperglicemia estão relacionadas com o aumento na incidência de ma-crossomia fetal e hipoglicemia neonatal. Na maio-ria destes casos, a resposta ao TOTG (teste oral de tolerância à glicose, v. adiante) volta ao normal depois da gravidez, no entanto, ao redor de 50% destas pacientes desenvolvem diabetes mell i tus nos se te anos segu in tes .

INVESTIGAÇÃO LABORATORIAL

O diagnóstico dos distúrbios no metabolismo da glicose depende da demonstração de alterações na

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concentração de gl icose no sangue. As várias d e-sordens do metabolismo dos carboidratos podem es ta r associadas com (a) aumento da glicose plas-mática (hiperglicemia); (b) redução da glicose plasmática (hipoglicemia) e (c) concentração nor-mal ou diminuída da glicose plasmática acom-panhada de excreção urinária de açúcares reduto-res diferentes da glicose (erros inatos do metabo-lismo da glicose). Os seguintes testes laboratoriais invest igam alguns destes dis túrbios .

GLICOSE PLASMÁTICA EM JEJUM

A determinação da glicemia é realizada com o paciente em jejum de 12-14 h. Result ados normais não devem excluir o diagnóstico de distúrbios metabólicos dos carboidratos. Os cri térios para a avaliação em homens e mulheres não-ges tan tes são :

Normais: até 110 mg/dL Glicemia de jejum inapropriada: de 110 a 126 mg/dL Diabéticos: acima de 126 mg/dL

O valor de 126 mg/dL foi estabelecido pois níveis superiores provocam alterações microvas -culares e elevado r isco de doenças macrovascula-res .

GLICOSE PLASMÁTICA PÓS-PRANDIAL DE

DUAS HORAS

A concentração da gl icemia duas horas após a ingestão de 75 g de gl icose em solução aquosa a 25% (ou refeição contendo 75 g de carboidratos) é de considerável utilidade na avaliação do diabetes. Normalmente, após a ingestão de carboidratos, a gl icose sangüínea tende a retornar ao normal den-t ro de duas horas .

Após duas horas da sobrecarga , os valores de glicemia plasmática ≥200 mg/dL são considerados diagnósticos de diabetes mell i tus. Níveis entre 140 e 200 mg/dL são encontrados na “tolerância à glicose alterada” (v. adiante) . Os indivíduos nor-mais, que se submetem a esta prova, apresentam teores glicêmicos ≤140 mg/dL. Entretanto, medi-cações, agentes químicos, desordens hormonais e

dietas devem ser considerados ao examinar estes resultados. Além disso, os valo res tendem a cre s -cer com a idade (10 mg/dL por década de vida, após a idade de 40 anos) . Deste modo, concentra-ções acima de 200 mg/dL podem ser encontradas em indivíduos idosos que não apresentam diabe-t e s .

TESTE DE O´SULLIVAN

O teste de O´Sullivan é empregado para detectar o diabetes gestacional e deve ser realizado entre 24 ª e a 28 ª semana de gestação. À paciente em jejum é administrada 50 g de glicose em solução aquosa a 25% por via oral. O sangue é colhido após 1 hora. Resultados iguais ou superiores a 140 mg/dL indi-cam a necessidade de um teste completo.

TESTE ORAL DE TOLERÂNCIA À GLICOSE

(TOTG)

Medidas seriadas da gl icose plasmática, nos tem-pos 0, 30, 60, 90 e 120 minutos após administra-ção de 75 g de glicose anidra (em solução aquosa a 25%) por via oral fornece um método apropriado para o diagnóst ico de diabetes. Apesar de mais sensível que a determinação da glicose em jejum, a TOTG é afetada por vários fatores que resulta em pobre reproducibilidade do teste (Tabela 7.1). A menos que os resul tados se apresentem nit id a-mente anormais, a TOTG deve ser realizada em duas ocasiões diferentes antes dos valores serem considerados anormais.

As crianças devem receber 1,75 g/kg de peso até a dose máxima de 75 g de glicose anidra.

A TOTG é indicada nas seguintes s i tuações:

§ Diagnóstico do diabetes melli tus gestacional (neste caso, é empregado o TOTG modificado, v. adiante).

§ Diagnótico de “tolerância à glicose alterada” (ex.: em pacientes com t eores de glicemia plasmática em jejum entre 110 e 126 mg/dL).

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§ Avaliação de pacientes com nefropatia, neuro-patia ou retinopatia não explicada e com gli-cemia em jejum abaixo de 126 mg/dL.

Tabela 7.1. Fatores que afetam a TOTG

A n t e s d o t e s t e D u r a n t e o t e s t e

Inges tão de carboidra tos Pos tu ra

Tempo de je jum Náusea

Cirurgia digestória Ansiedade

Tiazidas Cafeína

Es t rogên ios Tabagismo

Fen i to ína Horár io do dia

P r o p r a n o l o l Atividade

Cor t icoes teró ides Quantidade de glicose

ingerida

Idade

Inat ividade

Peso

Estresse (cirurgia, infecção)

Para garantir a f idelidade nos resultados dos

testes de tolerância à glicose, os seguintes cuid a-dos devem ser tomados:

§ Nos três dias que antecedem a prova, o paci-ente deve ingerir, pelo menos, 150 g de carboi-dra tos .

§ O paciente deve estar exercendo suas ativid a-des f ís icas habituais , mantendo-se em regime alimentar usual, exceto pela adição da quanti-dade de carboidratos indicada no item anterior.

§ Durante o teste, o paciente deve se manter em repouso e sem fumar.

§ O paciente não deve estar usando medicação que interfira no metabolismo dos carboidratos.

§ A prova deve ser realizada pela manhã com o paciente em jejum de 8-10 horas.

CRITÉRIOS PARA O DIAGNÓSTICO DOS ESTADOS HIPERGLICÊMI COS

O diagnóstico do diabetes mell i tus depende da demonstração de hiperglicemia. Para o diabetes do

t ipo 1, a hiperglicemia aparece adruptamente, é severa e está acompanhada de dis túrbios metabó-licos. No diabetes mellitus do tipo 2 o diagnóstico deve ser cuidadoso pois as a l terações da gl icose podem ser moderadas. A seguir, os cri térios de diagnóstico normalmente aceitos:

Diabetes mellitus em homens e mulheres não-grávidas. Qualquer dos achados a seguir é diagnóst ico:

§ Sintomas e sinais de diabetes (polidipsia, p o-liúria, emagrecimento, astenia, distúrbios vis u-ais e outros) e elevação casual (sem observar o jejum) de glicose plasmática (≤200 mg/dL).

§ Glicose plasmática em jejum de oito horas ≥126 mg/dL confirmado por um segundo teste.

§ Glicose plasmática ≥200 mg/dL durante a TOTG aos 120 minutos após a sobrecarga.

Glicemia de jejum inapropriada ( Impaired fasting glucose ou IFG). É definida pela gli-cemia em jejum igual ou maior que 110 mg/dL, mas menor que 126 mg/dL.

Tolerância à glicose diminuída (I mpaired glucose tolerance ou IGT). É definida por glicose plasmática pós-prandial de duas horas (ingestão de 75 g de glicose anidra) maior que 140 mg/dL, mas menor que 200 mg/dL.

Diagnóstico do diabetes gestacional. Os indí-cios de diabetes gestacional incluem uma forte histó-ria familiar de diabetes, idade superior a 30 anos, história de gravidez com recém-nascidos grandes para a idade gestacional ou com mais de 4 kg, uma história inexplicada de morte fetal ou morte neonatal, história de diabetes gestacional, presença de hipertensão ou pré-eclâmpsia, história de reprodução dificultada, macrossomia ou polidrâmnio na gravidez atual. Achados clínicos suspeitos incluem obesidade ou ganho de peso na gravidez atual, glicosúria, infecções recorrentes por monília.

O teste tolerância à glicose e os critérios dia -gnósticos são l igeiramente diferentes em gestan-tes. Nestes casos, administra -se 100 g de glicose e as amostras de sangue são colhidas nos tempos 0,

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60, 120 e 180 minutos. Os valores em mulheres não diabét icas são:

Jejum <105 mg/dL Uma hora <190 mg/dL Duas horas <165 mg/dL Três horas <145 mg/dL

O diagnóstico de diabetes gestacional ocorre quando dois desses l imites forem atingidos ou u l t rapassados .

Em gestantes a partir da 20a semana de gravi-dez, indica-se glicemia em jejum como teste de rastreamento. Valores maiores que 85 mg/dL são considerados positivos sendo necessário proceder ao TOTG. Considera -se, também, confirmatórios de diabetes gestacional valores o bt idos de duas glicemias em jejum ≥ 105 mg/dL.

CRITÉRIOS PARA A TRIAGEM DO DIABETES EM ASSINTOMÁTICOS

O teste diagnóstico deve ser considerado em todos os indivíduos de 45 anos ou mais e , se normal, repetido a cada 3 anos. Também devem ser reali-zados em adultos de qualquer idade ou mais fre -qüentemente nos de 45 anos para cima, nas se-guin tes s i tuações :

§ Com excesso de peso (≥120% do peso ideal).

§ Com parentesco em primeiro grau com diabéti-cos .

§ Membros de grupos étnicos de alto risco (afro -americanos, hispânicos, asiát icos, indígenas americanos e outros).

§ Com história de macrossomia fetal (>4 kg) ou diagnóstico anterior de diabetes gestacional .

§ Com hipertensão (≥140/90).

§ Com colesterol-HDL ≤35 mg/dL e/ou triglice-r ídios ≥250 mg/dL.

§ Com teste prévio positivo de “glicemia de je -jum inapropriada” ou “tolerância à glicose al-terada”.

CONSEQÜÊNCIAS METABÓLICAS DO

DIEBETES MELLITUS O defeito básico no diabetes mellitus é a deficiência insulínica (absoluta ou relativa) que afeta o metabolismo da glicose, lipídios, proteínas, potássio e fosfato. Além disso, influencia indiretamente a homeostase do sódio e água. Nos casos severos de diabetes (tipo 1) não-tratado encontram-se ainda cetoacidose, distúrbios ácido-básicos e hipertrigliceridemia.

Hiperglicemia. Promovida pela elevação da produção hepática e diminuição da captação celular de glicose.

§ Aumento da produção hepática: a falta de insulina e as ações opostas do glucagon e adrenalina causam redução da glicogênese e o incremento da glicogenólise. Além disso, a ação do cortisol (insulina baixa) eleva a gliconeogênese.

§ Redução da captação periférica: a deficiência insulínica inibe a captação celular de glicose e da glicólise. Outros substratos (ácidos graxos, cetonas) são utilizados para a produção de energia.

§ Como conseqüência da hiperglicemia tem-se:

§ Elevação da glicose urinária com diurese osmótica e a conseqüente perda de água, sódio, potássio e fosfato, produz a depleção destas substâncias.

§ Aumento da tonicidade do líquido extracelular que extrai água das células produzindo desidratação celular e, se houver ingestão de água, a diluição dos constituintes extracelulares levando à hiponatremia (hipertônica).

Distúrbios do metabolismo protéico. O diabetes é um estado catabólico associado com perda protéica, principalmente pela elevação da gliconeogênese – para cada 100 g de glicose formada, ao redor de 175 g de proteínas são destruídas.

Distúrbios do metabolismo lipídico. A deficiência insulínica e a ação oposta do glucagon e adrenalina

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estimulam a lipólise e a liberação de ácidos graxos para a circulação. Estes são captados para serem convertidos em energia (β-oxidação), cetonas e triglicerídios que são liberados pelo fígado na forma de VLDL (lipoproteínas de densidade muito baixa). Além do mais, a deficiência insulínica inibe a atividade da lipase lipoprotéica que reduz o desdobramento tanto das VLDL como dos quilomícrons, elevando os níveis de trigliceridemia.

Hiperpotassemia. Uma das ações da insulina é a captação de íons potássio pelas células. Na redução da insulina o potássio deixa as células, provocando hiperpotassemia. Parte deste potássio é perdido na urina como conseqüência da diurese osmótica, causando depleção de potássio na ordem de 200-400 mmol. Quando a insulina é adminis trada, o potássio extracelular retorna às células o que pode resultar em hipopotassemia severa a menos que suplementos de potássio sejam administrados.

Hiperfosfatemia. A insulina ao estimular a glicólise utiliza fosfato inorgânico (produção de ATP etc.), o que eleva a captação celular de fosfato. Na falta de insulina, este íon é liberado das células, promovendo hiperfosfatemia. Parte do mesmo é perdido na urina causando déficit no organismo. Quando a insulina é administrada ele volta para as células, produzindo hipofosfatemia severa.

Distúrbios ácido-base. No diabetes tipo 1 é fre-qüente a acidose metabólica devido a cetoacidose diabética. Os níveis de bicarbonato plasmático podem atingir valores abaixo de 5 mmol/L com pH de 6,8. Pode existir também uma acidose láctica moderada associada.

Distúrbios do sódio e água. A hiponatremia pode ocorrer como conseqüência da hiperglicemia extra-celular. Além disso, devido a hiperlipidemia pode existir pseudohiponatremia. Também ocorre a depleção do sódio total do corpo pela perda renal como conseqüência da diurese osmótica. Em pacientes conscientes, a perda de água é compensada pela ingestão oral. Pacientes graves podem desidratar-se e, dependendo do grau de desidratação, o sódio plasmático aumenta levando a uma hipernatremia.

COMPLICAÇÕES DO DIABETES MELLITUS

Do ponto de vis ta bioquímico as principais complica-ções são:

§ Cetoacidose diabética.

§ Coma hiperosmolar.

§ Acidose láctica.

§ Doença renal.

§ Hiperlipidemia.

CETOACIDOSE DIABÉTICA

A cetoacidose diabét ica pode estar presente em pacientes ainda não diagnosticados como diabéti-cos. Em pacientes diabéticos , a cetoacidose pode ser precipitada pela deficiência profunda de insu-lina (falta da aplicação ou por dose inadequada), níveis elevados de hormônios contra -reguladores (glucagon, cortisol, hormônio de crescimento, adrenalina e noradrenalina), infecções intercor-rentes, trauma, infarto do miocárdio, episódios tromboembólicos, crises hipertensivas, vômitos, exercícios físicos esporádicos ou estresse emocio -nal. As características clínicas são: desidratação, cetoacidose, depleção eletrolít ica e hiperventila -ção .

A cetoacidose pela deficiência de insulina acompanhada por hormônios contra -reguladores resultam em hiperglicemia (a degradação de pro -teínas fornece aminoácidos para a gliconeogênese) e na mobilização de ácidos graxos do tecido adi-poso (aumento da a ção da enzima lipase hormônio sensível) com o subseqüente aumento da formação hepát ica de corpos cetônicos. Estes , por suas ca-racterísticas de ácidos fracos, exaurem as reservas disponíveis de tampão, provocando cetoacidose.

A hiperglicemia causa hiperosmolalidade ex-tracelular que leva tanto à desidratação intracelu -lar como também, à diurese osmótica. A diurese osmótica provoca perda de água, Na +, K+, cálcio e

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outros constituintes inorgânicos e sobrevém redu-ção do volume de sangue circulante. O aumento na produção de corpos cetônicos estabelece uma aci-dose metabólica com hipercalemia associada. Aci-dose láctica e uremia pré -renal podem também estar presentes. As principais características labo-ratoriais da cetoacidose são:

§ Hiperglicemia, geralmente >300 mg/dL.

§ Acidose metabólica com aníons indeterminados elevados, pH sangüíneo <7,30 e bicarbonado <15 mmol/L.

§ Cetonemia e cetonúria (diluição >1:2)

§ Hiperpotassemia.

§ Hiperfosfatemia.

Dois outros dados de interesse bioquímico di-zem respeito a amilase e a creatinina:

§ Elevações da amilasemia são comuns durante a cetoacidose diabética e como estes pacientes muitas vezes apresentam dor abdominal, são real izados diagnósticos errôneos de pancreati te aguda.

§ Os níveis de creatinina estão elevados em vir-tude da des idratação, mas também porque o acetoacetato interfere positivamente na reação de Jaffé.

Pacientes com cetoacidose diabética apresen-tam polidipsia, poliúria, cefaléia, náusea, vômitos e dor abdminal.

CORPOS CETÔNICOS

Os corpos cetônic os consis tem de acetoacetato, β-hidroxibutirato e acetona, sendo formados no fígado a partir do acetil CoA derivado da oxidação dos ácidos graxos l ivres provenientes do tecido adiposo. Quando ocorre redução na uti l ização de carboidratos (ex.: diabetes melli tus) ou falta de carboidratos na dieta (ex.: inanição) acontece um aumento na produção de corpos cetônicos, levando

a um acúmulo dos mesmos no sangue que exce-dem a capacidade dos tecidos periféricos em me -tabolizá -los. Os corpos cetônicos estão presentes no sangue na seguinte proporção: β-hidroxibutirato (78%), acetoacetato (20%) e acetona (2%). No diabetes severo, a relação β-hidroxibutirato/acetato pode atingir, ao redor de 8:1 dependendo da presença de NADH suficiente que favorece a produção de β-hidro xibutirato.

Teores anormalmente elevados de corpos ce-tônicos no sangue ( cetonemia) ultrapassam o um-bral renal provocando o aparecimento de cetonú-ria . O acúmulo destes compostos no sangue leva à cetoacidose (acidose metabólica). O d iabetes e o consumo de á lcool são as causas mais comuns de cetoacidose.

Quando os tecidos não conseguem metabolizar completamente os corpos cetônicos formados pelo excesso de produção, tem-se uma acidose metabó-lica. A acidose é parcialmente compensada pela hiperventilação, com redução da pCO2 . Na aci-dose, também, o H + desloca-se para o interior das células enquanto o K + deixa o espaço intracelular.

Nenhum dos métodos laboratoriais detectam simultaneamente os três corpos cetônicos no san-gue ou urina. Os mais comuns detectam so mente o acetoacetato não reagindo com o β-hidroxibutirato. Este fato pode produzir uma situação paradoxal. Quando um paciente apresenta inicialmente cetoacidose, o teste para cetonas pode estar levemente positivo. Com a terapia, o β-hidroxibutirato é convertido em acetoacetato parecendo que a cetose está mais intensa .

O teste para detectação de cetonas na ur ina é recomendado no diabetes t ipo 1: (a) durante crises agudas ou es t resse ; (b) quando os teores de gl i -cose ultrapassam 240 mg/dL; (c) durante a gravi-dez; (d) ou quando os s intomas de cetoacidose estão presentes. Estes testes na urina são descritos no capítulo “Função renal”.

A quantif icação da acetona, acetoacetato e β-hidroxibutirato é realizada por colorimetria, enzi-mologia, cromatografia gasosa ou eletroforese capilar.

Os consti tuintes avaliados na cetoacidose dia -bética além da glicose e corpos cetônicos, são: (a) o Na + que pode estar normal ou inicialmente baixo; (b) o K+ que pode estar normal mas, em

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geral , está elevado; (c) a uréia apresenta valores aumentados devido a desidratação. A gasometria arterial apresenta o CO2 total reduzido, às vezes abaixo de 5 mmol/L nos casos severos. Outros resultados de gasometria indicam acidose metabó-lica com diminuição compensatória da pCO2 .

SÍNDROME HIPEROSMOLAR NÃO-CETÔNICA

Esta condição ocorre mais frequentemente em pacientes idosos com diabetes do tipo 2. A deficiência insulínica promove efeitos sobre o metabolismo dos carboidratos como na cetoacidose diabética, mas na forma menos severa, permitindo uma menor cetogênese. Além disso, pode existir comprometimento da função renal em pacientes idosos, levando a grandes perdas de água e eletrólitos. A hiperglicemia severa desenvolve desidra-tação profunda e osmolalidade bastante alta, mas sem cetose ou acidose. Esta condição apresenta-se com as seguintes características bioquímicas:

§ Hiperglicemia (>500 mg/dL).

§ Osmolalidade sérica bastante elevada: >320 mosmol/kg.

§ Acidemia mínima ou ausente: pH sangüíneo >7,30 e bicarbonato plasmático >15 mmol/L.

§ Cetonemia: negativa.

Os fatores precipitantes da síndrome hiperos-molar não-cetônica são os mesmos descri tos para a cetoacidose diabética (v. acima).

LACTATO SÉRICO E NO LIQUOR

O ácido láctic o, um intermediário no metabolismo dos carboidratos, é proveniente do músculo es -quelético, cérebro e eritrócitos. A concentração de lactato sangüíneo é dependente da sua produção e degradação no f ígado e r ins. Ao redor de 30% do lactato formado é utilizado no fígado, predomi -nantemente na gliconeogênese (ciclo de Cori) para a produção de gl icose. Aumentos moderados na

formação de lactato resultam no incremento da depuração do lactato hepát ico; no entanto, a cap-tação fica saturada quando as concentrações e xce-dem 2 mmol/L. Por exemplo, durante o exercício intenso, as concentrações de lactato podem au-mentar significativamente - de uma média de 0,9 mmol/L para mais de 20 mmol/L em apenas 10 segundos. Não existe uniformidade quanto aos teores de lactato que caracterizam a acidose lác-tica. Níveis de lactato excedendo 5 mmol/L e pH sangüíneo <7,25 indicam acidose láctica.

A acidose láct ica se apresenta em duas condi-ções c l ín icas diversas :

Tipo A (hipóxica). Este é o t ipo mais comum. Associada com a redução de oxigenação tecidual (h ipóx ia) encontrada em exercícios severos, con-vulsões, pobre perfusão tecidual (hipotensão, in -suficiência cardíaca, parada cardíaca), conteúdo de oxigênio arterial reduzido (asfixia, hipoxemi a, toxicidade pelo monóxido de carbono e anemia severa).

Tipo B (metabólica). Associada com doença (diabetes melli tus, neoplasmas, hapatopatia, aci-dose respiratória, insuficiência renal e sepse). Drogas/ toxinas/ infusões (etanol, metanol, salici-latos, nitroprussiato, fenformin, catecolaminas, frutose e sorbitol) . Acidose láct ica congêni ta: defeitos na gliconeogênese (deficiência de glicose 6-fosfatase ou piruvato carboxilase), no metabo-lismo do piruvato (deficiê ncia da piruvato desi-drogenase), fosforilação oxidativa mitocondrial.

O mecanismo da acidose láctica tipo B não é conhecido, mas acredita-se que o defeito primário seja o impedimento mitocondrial na utilização do oxigênio. Is to reduz os estoques de ATP e NAD+, com acúmulo de NADH e H+. Em presença de perfusão hepática reduzida ou enfermidade hepá-tica, a remoção do lactato é diminuída provocando o agravamento da acidose láctica.

O teor de lactato no LCR normalmente varia de forma paralela aos encontrados no sangue. Em alterações bioquímicas no LCR, entretanto, o lac-tato altera de forma independente dos valores san-güíneos. Níveis aumentados no LCR são encon-trados em acidentes cerebrovascular, hemorragia

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intracraniana, meningite bacteriana, epilepsia e ou t ras desordens do SNC. Na miningite asséptica (viral), os níveis de lactato no LCR não elevam.

Valores de referência: no soro: 5,5 a 22,0 mg/dL. No l iquor: 11 a 19 mg/dL.

Na avaliação laboratorial da acidose láctica também são encontrados os seguintes resultados:

§ Acidose metabólica: bicarbonato plasmático <20 mmol/L (pode chegar a 5 mmol/L).

§ Lactato plasmático: bastante elevado.

§ Hiperosfatemia.

DOENÇA RENAL

Ao redor de 10-25% dos pacientes tratados com doença renal terminal apresentam nefropatia diabética. Isto é provocado basicamente por doença dos pequenos vasos sangüíneos associada ao diabetes que se manifesta inicialmente pela proteinúria e síndrome nefrótica. Subsequentemente, a função renal declina com elevação da uréia e creatinina plasmática, eventualmente levando à insuficiência renal. A avaliação da concentração da microalbuminúria é útil para detectar esta desordem precocemente.

MICROALBUMINÚRIA

Microalbuminúria (pequenas quant idades de a l-bumina e não pequenas moléculas) designa a ex-creção aumentada de albumina urinária não de-tectável pelas tiras reativas empregadas rotineira -mente. É excretada em pequenas quantidades por diabéticos com nefropatia com redução da filtração glomerular. A determinação da microal-buminúria permite a detecção de complicações renais, permitindo o retardamento da evolução pela estabilização dos níveis de glicemia. É con-siderada importante quando se observa uma taxa de excreção de albumina (TEA) de 20 a 200 µg/min ou de 30 a 300 mg/d em dois terços das amostras durante seis meses.

A presença de microalbuminúria em diabéticos tipo 1 sugere maior risco de contrair nefropatia diabética. Nos diabéticos tipo 2, um teor de albumina >0,02 g/d é um fator de r isco para acidentes cardiovasculares e infarto do miocárdio. A determinação da microalbuminúria é recomendada nos seguintes casos :

§ Detectação precoce de nefropatia diabética.

§ Monitoramento do diabetes gestacional .

§ Monitoramento de gravidez de risco.

A urina empregada neste teste deve ser colhida por um período de 12 h ou 24 h com o paciente em repouso, pois ocorre um aumento significativo na TEA em diabéticos, após esforço ou exercícios exaustivos. Em geral, a microalbuminúria é determinada por métodos imunoturbidimétricos, nefelométricos ou de imunodifusão radial.

HIPERLIPIDEMIAS NO DIABETES MELLITUS

As anormalidades lipídicas associadas com o diabetes mellitus incluem:

§ Hipertrigliceridemia. A deficiência insulínica inibe a enzima lipase lipoprotéica reduzindo a metabolização das VLDL. Além disso, ocorre aumento na síntese hepática das VLDL estimulada pela liberação de ácidos graxos (lipólise do tecido adiposo) parte dos quais, são convertidos em triglicerídios e VLDL no fígado.

§ Hipercolesterolemia. O diabetes tipo 2 e a intolerância à glicose são comumente associados à hipercolesterolemia.

HIPOGLICEMIA

A hipoglicemia é uma condição médica aguda caracterizada pela concentração da glicose san-güínea abaixo dos l imites encontrados no jejum (<50 mg/dL em adultos e <40 mg/dL em recém-

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nascidos); no entanto é difícil definir limites es -pecíficos. Pode ocorrer redução em uma hora e meia a duas horas após uma r efeição, sendo relati-vamente comum a obtenção de teores de glicose plasmática ao redor de 50 mg/dL no teste pós-prandial de duas horas. Mesmo em jejum, valores de glicose extremamente baixos, podem ocasio -nalmente ser encontrados sem sintomas ou evi-dências de alguma doença. As principais causas de hipoglicemia são:

Neonatais.

§ Pequeno para a idade gestacional/prematuros.

§ Síndrome do sofrimento respiratório.

§ Diabetes mellitus materna.

§ Toxemia da gravidez.

§ Outras causas (ex.: estresse pelo frio, policite-mia).

Crianças.

§ Hipoglicemia cetônica.

§ Defeitos enzimáticos congênitos (doenças do armazenamento do glicogênio, deficiência de enzimas gliconeogênicas, galactosemia, intole -rância hereditária à frutose).

§ Hipersensitividade à leucina.

§ Hiperinsulinismo endógeno (nesidioblastose).

§ Síndrome de Reye.

§ Idiopática.

Adultos. A hipoglicemia em jejum é rara, mas sinaliza uma séria patologia subjacente.

§ Medicações/toxinas: doses excessivas de insu-lina ou agentes hipoglicemiantes orais. Salici-la tos e bloqueadores β-adrenérgicos.

§ Excesso de etanol: pelo aumento da concentra -ção de NADH citosólico reduzindo a gliconeo-gênese .

§ Doenças hepáticas: cirrose portal severa, ne-crose hepát ica aguda e tumores hepát icos.

§ Doenças endócrinas: insuficiência adrenocorti-cal (doença de Addison), hipotireoidismo, hi-popituitarismo (primário ou secundário), defi-ciência do hormônio de crescimento.

§ Tumores pancreáticos produtores de insulina: insul inomas – geralmente um pequeno e solitá-rio adenoma benigno das i lhotas pancreáticas, que secretam quantidades inapropriadas de in-sulina.

§ Tumores não-pancreáticos (fibromas, sarc o-mas, hepatomas, carcinomas adrenais neoplas-mas gastrointestinais, tumores carcinóides e mesoteliomas).

§ Septicemia. É descrita em choques sépticos devido a infecções por g ram-negat ivos .

§ Insuficiência renal crônica. Pacientes urêmicos são propensos a desenvolver hipoglicemia por vários fatores: redução da inativação renal da insulina, diminuição da gliconeogênese renal, perda de proteínas resul tando no baixo supri-mento de alanina (precursor da gliconeogê-nese) e defeito na reabsorção da glicose.

§ Hipoglicemia reativa – causada pela l iberação exagerada de insulina após uma refeição; idio -pática.

§ Após refeições em pacientes submetidos à ci-rurgias gástr icas.

§ Desnutrição severa.

§ Erros inatos do metabolismo (ex.: glicogenose do tipo I).

Manifestações clínicas da hipoglicemia. Não existem sintomas específicos para a hipogli-

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Carboidratos 57

cemia. Uma redução rápida da glicose plasmática a teores hipoglicêmicos geralmente desencadeia uma resposta s impática com liberação de adrena-l ina, que produz os sintomas clássicos da hipogli-cemia: fraqueza, suor, calafrios, náusea, pulso rápido, fome, tonturas e desconforto epigástrico . Estes sinais não são específicos da hipoglicemia pois também são encontradas em outras condi-ções, tais como: hipertireoidismo, feocromocitoma e ansiedade.

O cérebro é totalmente dependente da glicose sangüínea e níveis muito baixos da glicose pla s -mática (menos de 20 a 30 mg/dL) provocam dis -funções severas do s is tema nervoso central (SNC). Durante jejum prolongado ou hipoglicemia, os corpos cetônicos são ut i l izados como fonte de energia. Nestes casos, vários sintomas e sinais são encontrados, tais como: enxaqueca, confusão, letargia e perda de consciência. Estes sinais e s intomas são conhecidos como neuroglicopenia. A restauração da concentração da gl icose plasmática, geralmente provoca uma pronta recuperação apesar de uma provável lesão irreversível . O teste oral de tolerância à glicose (TOTG) não é um teste apropriado para avaliar pacientes suspeitos de hipoglicemia.

DETERMINAÇÃO DA GLICOSE

Paciente. Deve permanecer em jejum por 12-14 horas. Caso seja diabético, não deve usar insulina ou hipoglicemiantes orais antes da coleta.

Amostra. Soro, plasma, LCR e urina. Quando o sangue for colhido sem conservantes e deixado a temperatura ambiente, as enzimas glicolíticas dos eri trócitos, leucócitos, plaquetas e de alguns con-taminantes bacterianos reduzem os níveis de gli-cose na amostra em aproximadamente 5 a 7% por hora (5 a 10 mg/dL). Esta redução torna-se neg li-genciável quando:

§ O plasma ou soro for separado em menos de 30 minutos após a coleta.

§ Sangue coletado em tubos contendo fluoreto de sódio (2 mg por mL de sangue) – inibidor da enzima enolase da g licólise – ou de iodoace-

ta to de sódio (2 mg por mL de sangue) – inib i-dor da gliceraldeído 3 -P desidrogenase da gli-cólise.

§ Por refrigeração da amostra. Em soro ou pla s ma refrigerado a glicose permanece estável por t rês dias .

As amostras de LCR estão muit as vezes conta-minadas com bactériais ou outros consti tuintes celulares e devem ser analisadas imediatamente após a coleta ou centr ifugadas e refr igeradas.

Em urinas de 24 h a glicose é preservada pela adição de 5 mL de ácido acético glacial ao frasco cole tor antes do início da coleta. O pH final da urina permanece entre 4 e 5, o que inibe a ativi-dade bacter iana. Mesmo com o uso de conser-vante, a urina também deve ser armazenada em refrigerador durante o período de coleta. Amostras de urina mantidas em temperatura ambiente po-dem perder até 40% de seu conteúdo de glicose após 24 horas .

Interferências. Resultados falsamente elevados: paracetamol, ácido acetilsalicílico, ácido ascór-b ico, ácido nalidíxico, ácido nicotínico, adrena-lina, benzodiazepínicos, cafeína, carbonato de lítio, cimetidina, clonidina, cortisona, dopamina, e s teróides anabólicos, estrogênios, etanol, fenito-ína, furosemida, levodopa, tiazidas. Resul tados falsamente reduzidos: alopurinol, anfetaminas, bloqueadores β-adrenérgicos, clofibrato, fenaci-tina, f enazopiridina, fenformina, hipoglicemiantes orais, insulina, isoniazida, maconha, nitrazepan e propranolol (em diabéticos).

Métodos. No passado, os métodos empregados para a determinação da glicose baseavam-se na capacidade redutora da mesma. Os oxidantes utili-zados eram o cobre ou o íon ferricianeto em meio alcalino reduzidos pela glicose a íon cuproso e íon ferrocianeto, respectivamente. Os métodos mais populares , t ransformavam os íons cuprosos a óxido cuproso em presença de calor . O desenvol-v imento de cor era conseguido pela redução do fo s fomolibdato (Folin -Wu) ou arsenomolibdato (Somogyi-Nelson) para formar azul de molibdê-

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nio. Estes métodos foram abandonados por sua complexidade e sofrerem ação de interferentes.

O-Toluidina. A determin ação da glicose pela o -toluidina é a mais específica entre os métodos químicos; entretanto, o seu emprego tornou-se muito restri to depois que esta substância foi cla s-sificada como carcinogênica. A o -toluidina é uma amina aromática que condensa com o grupo aldeí-dico da glicose em solução de ácido acético a quente para formar uma mistura em equilíbrio de uma glicosilamina e a correspondente base de Schiff . Após rearranjos e reações, ocorre o desen-volvimento de cor verde-azulada cuja absorvância é medida em 630 nm. A o -toluidina reage com outras hexoses, como a galactose e a manose. As pentoses, como a xilose, reagem com a o-toluidina para formar cor laranja, com absorvância máxima em 480 nm.

O método da o-toluidina sofre interfe -rências da bilirrubina que, em teores elevados, apresenta valores falsamente aumentados de glicose já que pode ser parcialmente convertida no pigmento bil iverdina de cor verde. A turvação na solução final como em presença de lipemia, causa result a-dos falsamente elevados.

Métodos enzimáticos. Empregam enzimas como reativos e são os mais utilizados atualmente em razão da grande especificidade pela glicose. Eles medem a glicose verdadeira e não os com-p o s t o s redutores. São simples e rápidos de executar, além de necessitar pequenos volu mes de amostra. Os dois sistemas enzimáticos mais empregados são: glicose oxidase, hexoquinase e glicose des idrogenase.

Gl icose oxidase. É altamente específica para a β-glicose. Em presença do oxigênio, a enzima converte a β-glicose a ácido glicônico e peróxido de oxigênio. Em uma segunda reação, a enzima peroxidase decompõe o peróxido de hidrogênio em água e oxigênio. Este último oxida – em pre-sença da peroxidase – um cromogênio aceptor de oxigênio (como o o-dianosidina) para formar um produto colorido lido fotometric amente. Elevadas concentrações de ácido úrico, bilirrubina ou ácido ascórbico inibem a segunda reação por competição do cromogênio pelo H2 O2 produzindo falsos re -sul tados reduzidos. Muitas destas interferências

são el iminadas pelo uso de 4-aminofenazona (método de Trinder).

A concentração de glicose também é determi-nada por polarograf ia . Este método emprega um eletrôdo de O 2 e glicose oxidase produzindo ácido glicônico e peróxido de hidrogênio a partir da glicose. A catalase desdobra o peróxid o de hidro-gênio. A quant idade de O2 consumido é medida pelo eletrôdo de O 2 e está diretamente relacionada aos teores de gl icose nas amostras .

O método de glicose oxidase foi adaptado para uma grande gama de instrumentos automatizados. No sistema de reativ o seco DT Vitros a glicose oxidase está presente em um filme de múltiplas camadas associado a um indicador similar ao e m-pregado pelo método de Trinder. A intensidade da cor f inal é medida através da redução da transpa-rênica do filme por espectrofotometria de refle-xão.

Hexoquinase. O emprego da hexoquinase apre-senta algumas vantagens sobre a glicose oxidase e é adotada em alguns países como o método de referência para a determinação de glicose. Este método consiste de duas reações acopladas: (a) a glicose é fosforilada pelo ATP pela ação da hexo-quinase; (b) a glicose 6-fosfato resul tante é con-vertida pela glicose 6-fosfato desidrogenase, na presença de NADP + , em 6-fosfogliconolactona e NADPH. O NADPH formado é proporcional à quantidade de glicose na amo stra e é medido em 340 nm. Apesar da hexoquinase também fosforilar outras hexoses , esses carboidratos não estão pre-sentes em concentrações suficientemente altas nas amostras para interferir. A hemólise interfere com o sistema hexoquinase pois os eritrócit os contém glicose 6 -P desidrogenase e 6 -fosfogliconato des i-drogenase que empregam NADP+ como substrato.

Glicose desidrogenase. A glicose desidro -ge-nase catal isa a redução de NAD+, produzindo gli-conolactona e NADH que pode ser monitorado em 340 nm. Sofre in terferências da D-xilose e da manose, que raramente são encontradas em teores significativos.

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Carboidratos 59

HEMOGLOBINA GLICADA

Em adultos, os eritrócitos normais contém hemo-globina A (97% do total), HbA2 (2,5%) e HbF (0,5%). Por diferentes métodos eletroforét icos e cromatográficos, foram detectadas sub-frações da hemoglobina A, identificadas como HbA1 a , HbA1b e HbA1 c e, coletivamente, denominadas hemoglo-b inas g l icadas (hemoglobinas g l icos i ladas ou gl ico-hemoglobinas). A fração HbA1 c consti tui , aproximadamente 80% da HbA. As hemoglobinas gl icadas são obt idas pela adição espontânea de glicose ao grupo amino l ivre das proteínas hemo-globínicas por reações não-enzimát icas. Os conte-údos des t a s sub -frações aumentam com a idade dos eri trócitos .

O estudo destas hemoglobinas é realizado, principalmente, pela medida da sub-fração HbA l c em pacientes com diabetes mellitus. Esta avalia-ção indica o controle metabólico do paciente nas 8 a 10 semanas precedentes ao tes te , enquanto a gl icose sangüínea reflete o controle somente das 24 horas anteriores. A HbA1 c é monitorada a cada três ou quatro meses em diabéticos estáveis e, em cada um ou dois meses, em diabéticos com pobre controle glicêmico. Grávidas diabéticas (especi-almente do tipo 1) são avaliadas uma a duas vezes ao mês para um controle mais efetivo. A terapêu-tica insulínica é ajustada nos pacientes diabéticos se a hemoglobina glicada ultrapassar 10%. Na monitoração de diabéticos, variações de 2% entre duas avaliações, é considerada clinicame nte signi-ficante e indicativa de um melhor ou pior controle glicêmico.

Este tes te não é adequado para o acompanha-mento de pacientes diabéticos portadores de h e-moglobinopatias, pois a presença de variantes da hemoglobina provocam redução da meia -vida das hemáciais e, portanto, do tempo de exposição da hemoglobina às variações dos teores de glicose circulante, diminuindo o percentual de hemoglo-bina gl icada. Nestes casos é recomendado o acompanhamento destes pacientes pela dosagem da fructosamina.

DETERMINAÇÃO DA HEMOGLOBINA GLICADA

Paciente. Não necessita jejum para a coleta.

Amostra. Sangue total colhido em tubo contendo EDTA, oxalato de potássio -fluoreto de sódio. O sangue pode ser armazenado em refrigerador por uma semana. Amostras heparinizadas devem ser ensaiadas no máximo em dois dias.

Métodos. A hemoglobina glicada é determinada por três categorias de métodos baseados no modo como os componentes gl icados e não-glicados são separados . São separados de acordo com: (a) dife-renças de carga (cromatografia de troca iônica, cromatografia líquida de alta execução, eletrofo-rese, focalização isoelétrica), (b) reatividade quí -mica (colorimetria e espectrofotometria) e (c) diferenças estruturais (cromatografia por afin i-dade e imunoensaio).

Microcolunas. A HbA l c é determinada, funda-mentalmente, por cromatografia por afinidade. Neste método, a amostra é aplicada a uma coluna t rocadora de íons e os subcomponentes gl icados eluídos com um tampão de baixa força iônica. As hemoglobinas restantes são, então, eluídas com tampão de alta força iônica. As frações são quanti-ficadas em espectrofotometria (em 415 nm). Este método é afetado por variações na temperatura, mas apresenta boa precisão. As variantes da h e-moglobina como HbF, HbS ou HbC desenvolvem interferência mínima.

Eletroforese. A separação eletroforética da hemoglobina A 1 está baseada na capacidade do N -terminal livre da hemoglobina não-glicada em interagir com grupos carregados negativamente.

Valores de referência : estão entre 5 a 8% da HbA total em indivíduos normais e variam entre 8 a 30% em pacientes com diabetes, dependendo do grau de controle de glicemia.

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60 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

FRUCTOSAMINA

É o nome genérico de proteínas cetoaminas. É análoga a hemoglobina glic ada e com meia -vida ao redor de 2 a 3 semanas, o que a torna de grande utilidade no monitoramento a curto prazo como um índice de controle glicêmico do diabético, particularmente em pacientes portadores de hemo-globinopatias, por não sofrer interferências de variantes das hemoglobinas. O ácido ascórbico exerce interferência positiva sobre o teste.

O teste é sensível à var iações nos teores das proteínas séricas, isto é, pacientes exclusivamente nutridos por via parenteral apresentam nít idas variações na concentração da fructosamina, apesar de glicemia normal estável. Há um aumento de 1,3% da fructosamina plasmática para cada 0,3 g/dL de aumento nos teores de proteinemia. Esta-dos hipoproteinêmicos (albumina sérica <3,0 g/dL) podem produzir resultados falsamente bai-xos para os níveis de fructosamina sérica.

Valores de referência: 1,8 a 2,8 mmol/L.

ERROS INATOS DO METABOLISMO

DOENÇAS DO ARMAZENAMENTO DO

GLICOGÊNIO O glicogênio é sintetizado e armazenado principalmente no fígado e músculo. As doenças do armazenamento são erros inatos raros do metabolismo dos carboidratos provocados pela deficiência ou redução na atividade de uma ou mais das muitas enzimas envolvidas.

Uma das características deste grupo de doenças é a anormalidade no armazenamento do glicogênio, geralmente em quantidades aumentadas e, as vezes, com estrutura anormal. Pode ocorrer também hipoglicemia, alterações dos lipídios sangüíneos, hiperuricemia e acidose láctica.

A mais comum das doenças do armazenamento do glicogênio é a Cori tipo IV, devido a deficiência da fosforilase quinase. Glicogênio com estrutura normal acumula, fundamentalmente, no fígado e músculo. A doença de von Gierke (Cori tipo I) é provocada pela deficiência de glicose 6-fosfatase; o glicogênio

acumulado no fígado, rins e intestino também apresenta estrutura normal. Pode também desenvolver hipoglicemia profunda.

GALACTOSEMIA

O fígado é o principal local de conversão da galactose em glicose. Três defeitos genéticos que alteram o metabolismo da galactose são descritos: (a) deficiência das enzimas UDP-glicose:galactose 1-fosfato uridiltransferase, (b) galactoquinase ou (c) UDP-galactose 4-epimerase. Estes defeitos causam o aumento da galactose sérica e urinária.

A galactosemia é uma doença rara (2 para cada 100.000 nascimentos). O defeito mais comum e mais severo é motivado pela deficiência UDP-glicose:galactose 1-fosfato uridiltransferase, que se manifesta no período neonatal ou primeira infância por vômitos acompanhados de hipoglicemia.

A deficiência de galactoquinase não se manifesta clinicamente no período neonatal e pode não ser diagnosticada até o desenvolvimento de catarata.

Crianças com testes positivos para substâncias redutoras na urina devem ser submetidas à análise destes compostos na urina por cromatografia. Caso forem identificadas, a galactose e a galactose 1-fosfato devem ser medidas no soro. A confirmação do diagnóstico é obtida pela medida das atividades de enzimas eritrocitárias.

GLICOSÚRIA: CAUSAS VARIADAS Várias condições promovem glicosúria pela presença de substâncias diferentes da glicose na urina.

Intolerância hereditária à frutose. O fígado é o principal sítio de conversão da frutose em glicose. A deficiência da frutose 1-fosfato aldolase causa o acúmulo intracelular da frutose 1-fosfato. Vômitos e hipoglicemia ocorrem após a ingestão de alimentos contendo frutose, geralmente a sacarose. A idade do aparecimento da anormalidade depende do tipo de alimentação e da severidade do defeito. A maioria dos pacientes desenvolvem uma forte aversão à sacarose. O teste de tolerância à frutose é empregado nesta investigação. Pacientes com esta deficiência mostram pronunciada e prolongada redução dos teores de glicose e fosfato após a administração de frutose. Também apre-sentam frutosúria. A cromatografia urinária confirma a presença de frutose.

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Carboidratos 61

Frutosúria essencial. É uma condição benigna originada pela deficiência de frutoquinase.

Pentosúria essencial. É um erro inato benigno do metabolismo no qual o açúcar L-xilulose é excretado em excesso na urina. Isto se deve a um defeito na NADP-ligada xilitol desidrogenase, uma das enzimas da via de oxidação do ácido glicurônico.

Lactosúria. Não apresenta significância patológica. Encontra-se muitas vezes nos últimos estágios da gravidez e durante a lactação após o parto. Muitas vezes é necessário distinguir a lactosúria da glicosúria.

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62 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

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VALTER T. MOTTA Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Aminoácidos e Proteínas

Volume

8

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AMINOÁCIDOS E PROTEÍNAS

s proteínas são compostos de elevada massa molecular (5000 a vários milhões) produzi-

das pelas células vivas de todas as formas de vida. São polímeros complexos de α-aminoácidos, uni-dos ent re si por um tipo específico de l igação covalente – a l igação peptídica. As proteínas são consti tuídas por 20 aminoácidos diferentes reuni-dos em combinações praticamente infinitas, possi-bili tando a formação de milhões de estruturas diversas. Estas combinações permitem às células a produção de proteínas com diferentes tamanhos, formas, estruturas, propriedades e funções. A seqüência de aminoácidos, que define as características das proteínas, é determinada pelas informações genéticas contidas no núcleo da c é-lula. Por hidrólise, as proteínas fornecem somente aminoácidos (proteínas simples) ou, além dos aminoácidos, outros compostos orgânicos ou inor-gânicos (proteínas conjugadas) . A porção não-protéica é denominada grupo prostét ico. As funções biológicas a t r ibuídas às proteínas são variadas e importantes. Atuam como:

Enzimas. São proteínas altamente especializadas com atividade catalí t ica; praticamente todas as reações químicas celulares onde participam bio -moléculas orgânicas são catalisadas por enzimas. Existem milhares de enzimas, cada uma capaz de catalisar um tipo de reação química diferente.

Proteínas transportadoras. São proteínas que se l igam a íons ou a moléculas específicas, as quais são t ransportadas de um órgão para outro. Transportam hormônios, v itaminas, metais, drogas e oxigênio (hemoglobina); solubilizam os lipídios (apoproteínas) . Muitas proteínas estão presentes nas membranas plasmáticas e nas membranas in -tracelulares de todos os organismos; elas t rans -

portam, por exemplo, a glicose, aminoácidos e outras substâncias a t ravés dessas membranas .

Proteínas de armazenamento. Atuam no a r-mazenamento de certas substâncias, ex.: ferritina, que armazena átomos de ferro.

Proteínas contráteis ou de motilidade. Pro-teínas que modificam sua forma ou contra em-se, ex.: actina e miosina.

Proteínas estruturais. São pro te ínas que ser-vem como filamentos de suporte, cabos ou lâmi-nas para fornecer proteção ou resis tência à estru -turas biológicas, ex.: queratinas, colágeno e elas -t ina.

Proteínas de defesa. Um grande número de proteínas defendem o organismo contra a invasão de outras espécies ou o protege nos ferimentos. As imunoglobulinas ou anticorpos – proteínas especi-alizadas sintetizadas pelos l infócitos – podem reconhecer e precipitar, ou neutralizar, invasore s como bactér ias , vírus ou proteínas estranhas oriundas de outras espécies. O fibrinogênio e a trombina são proteínas que participam da coagula-ção sangüínea que previnem a perda de sangue quando o sis tema vascular é lesado. Algumas destas prote ínas , incluindo o fibrinogênio e a trombina, também são enzimas.

Proteínas reguladoras. Várias proteínas atuam na regulação da atividade celular ou fisiológica, ex.: hormônios e proteína G.

Outras proteínas. Existem numerosas proteínas com funções ditas exóticas ou de difícil classifi-cação.

A

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64 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

São milhares as funções das proteínas. Além das resumidas acima citam-se algumas de grande importância clínica: manutenção da distribuição de água entre o compartimento i n tersticial e o sis -tema vascular do organismo; participação da ho-meostase e coagulação sangüínea; nutr ição de tecidos; formam tampões para a manutenção do pH.

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Aminoácidos e proteínas 65

PROTEÍNAS TOTAIS

número de proteínas dist intas dentro de uma célula humana é estimado entre 3.000 a

5.000. Mais de 300 proteínas diferentes foram identif icadas somente no plasma sangüíneo. Mui-tas delas apresentam papéis bioquímicos específi-cos sendo que suas concentrações podem ser afe-tadas por processos patológicos e , por tanto , são determinadas na invest igação de vár ias doenças. Apesar do grande número de proteínas presentes no plasma sangüíneo, somente algumas são medi-das rotineiramente. As mais medidas são as pre-sentes no sangue, urina, líquido cefalorraquidiano (LCR), líquido amniótico, peritonial ou pleural, saliva e fezes. As funções das proteínas plasmáticas incluem transporte, manutenção da pressão oncótica, tam-ponamento de al terações do pH, imunidade humo-ral, atividade enzimática, coagulação e resposta de fase aguda.

METABOLISMO DAS PROTEÍNAS

PLASMÁTICAS A concentração das proteínas plasmáticas é d e-terminada por três fatores principais: velocidade de síntese, velocidade do catabolismo e o volume de l íquido no qual as proteínas estão dis t r ibuídas.

Síntese. A maioria das proteínas plasmáticas são sintet izadas no f ígado enquanto algumas são pro-duzidas em outros locais, por exemplo, imunoglo-bulinas pelos l infócitos, apoproteínas pelos ente-rócitos e β2 -microglobulina (proteína da superfície celular) amplamente distribuída no corpo. Apro-ximadamente 25 g das proteínas plasmáticas são sintet izadas e secretadas cada dia, pois não há armazenamento intracelular.

Distribuição. Normalmente, a concentração de proteínas totais no plasma está ao redor de 7,0 g/dL e, aproximadamente, 250 g de proteínas são encontradas no compartimento vascular de um homem adulto de 70 kg. A água atravessa mais livremente as paredes capilares que as proteínas e,

portanto, a concentração das proteínas no espaço vascular é afetada pela distribuição líquida.

Catabolismo. As proteínas plasmáticas são d e-gradadas através do corpo. Os aminoácidos libera-dos f icam disponíveis para a s íntese de proteínas celulares.

H IPERPROTEINEMIA

Desidratação. A des idratação causa o aumento (relativo) de todas as frações protéicas na mesma proporção. Pode ser promovida pela inadequada ingestão de l íquidos ou perda excessiva de água (vômito, diarréia intensa, enfermidade de Addison ou acidose diabética).

Enfermidades monoclonais. Mieloma múlt i-plo, macroglobulinemia de Waldenström e doença da cadeia pesada. Estas condições promovem a elevação de imunoglobulinas, causando o aumento nos níveis das proteínas tota is sér icas . (v . adiante).

Enfermidades policlonais crônicas. Cirrose hepática, hepatite ativa crônica, sarcoidose, lupus eritematoso sistêmico e infecção bacteriana crônica.

H IPOPROTEÍNEMIA

Aumento do volume plasmático. Hemodilu i-ção por intoxicação hídrica, também como na cirrose quando a asci te es tá presente .

Perda renal proteínas. Síndrome nefrótica e glomerulonefrite crônica.

Perda de proteínas pela pele. Queimaduras severas .

Gota. Aumento da uricemia.

O

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66 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Distúrbios da síntese protéica. A s ín tese é sensível ao suprimento de aminoácidos e, as sim, a desnutrição, má absorção, dietas pobres em pro-teínas, enfermidade hepática não-virótica severa promovem hipoproteínemia. A insuficiência da função hepatocelular reduz a síntese na enfermi-dade hepática crônica.

Outras causas. Analbuminemia, colite ulcera -t iva, dermatite esfoliativa, doença de Crohn, do-ença de Hodgkin, edema, enteropatia perdedora de proteínas, hemorragia grave, hepatite infecciosa, hipertensão essencial, hipertireoidismo, hipoga-maglobulinemia, insuficiência cardíaca conges -t iva, kwashiorkor, leucemia, má absorção e úlcera péptica.

DETERMINAÇÃO DAS PROTEÍNAS TOTAIS SÉRICAS

Paciente. Não deve ingerir dieta rica em gordu-ras durante 8 horas antes do tes te . Suspender as medicações que interferem nos n íve is das prote í -nas sér icas .

Amostra. Soro sem hemólise e não lipêmico. A amostra pode ser refrigerada por até uma semana.

Interferentes. Resultados falsamente elevados: bromossulfaleína, clofibrato, contrastes radiológi-cos, cort icoesteróides, cort icotropina, dextrano, heparina, insulina, somatropina, t ireotropina e tolbutamida. Resultados falsamente reduzidos: anticoncepcionais orais, dextrano, íon-amônio, líquidos intravenosos excessivos contendo glicose, pirazinamida e salicilatos.

Métodos. Historic amente o método de referência para a determinação das proteínas totais no soro sangüíneo é o método de Kjeldahl. Este método não é empregado rotineiramente no laboratório clínico devido a sua complexidade.

Refractometria. Os métodos que empregam a medida do índice de refração avaliam as proteínas totais no soro, plasma, urina e LCR. Estão basea-dos na determinação refratométrica dos sólidos totais nos l íquidos antes e depois da remoção das

proteínas. Estes métodos são inf luenciados por variações da tempera tura, relação albu-mina/globulinas, azotemia, hiperglicemia, hiper-bilirrubinemia e, particularmente, hiperlipemia.

Biureto. É o mais usado atualmente, pois além de preciso e exato é de fácil execução, sendo, portanto, bastante empregado para a automação. Biureto é o nome dado ao produto de decomposi-ção da uréia pelo calor. Quando o biureto é tra -tado com íons cúpricos em solução alcalina, des -envolve cor violeta. As pro teínas são determina-das por reação idêntica ao do biureto. O complexo color ido é de composição desconhecida, sendo formado entre os íons cúpricos e duas ou mais l igações pept ídicas. A intensidade do produto colorido é proporcional ao número de l igações peptídicas presentes nas proteínas. O reativo seco DT Vitros baseia -se nes ta reação.

Valores de referência para proteínas totais no soro sangüíneo

Adultos ambulatoriais 6 a 7,8 g/dL

PROTEÍNAS TOTAIS NA URINA

Como resultado da pressão hidrostática, as proteí-nas de baixa massa molecular rotineiramente são filt radas através da membrana basal glomerular. Esta membrana atua como uma barreira à filtração graças ao tamanho dos poros e a carga negat iva. As proteínas de pequeno tamanho molecular são conduzidas para dentro do túbulo renal onde são quase totalmente reabsorvidas; no entanto, uma pequena fração é conduzida através dos túbulos e aparece na urina. Entre 20-50% da proteína urin á-ria é albumina. O restante consiste de uromucóide, mucoproteína de Tamm-Horsfall provenientes das células tubulares renais, pequenas quantidades de microglobulinas séricas e tubulares e proteínas de secreções vaginais, prostática e seminal.

A proteinúria anormal é classificada como:

Benigna. A forma benigna é provocada por alt e-rações hemodinâmicas ou clínicas não associadas com morbid ez ou mortal idade e são de causa des -

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Aminoácidos e proteínas 67

conhecida. Este tipo de proteinúria (em geral <1 g/d) é a razão mais freqüente de resultados posit i-vos na pesquisa de proteínas na ur ina. Três cate-gorias gerais de proteinúria benigna são descritas:

§ Proteinúria funciona l , secundária à doenças febris, após exercícios vigorosos, insuficiência cardíaca congest iva e hipertensão essencial .

§ Prote inúria id iopát ica , relativamente comum em crianças assintomáticas e adultos jovens sad ios .

§ Proteinúria ortostát ica ou postural , ocorre quando a pessoa fica em pé por muito tempo e desaparece quando ela se deita por algumas h o-ras. Ocasionada, provavelmente, pela grande pressão sobre a veia renal quando o indivíduo fica em posição vertical.

Sobrecarga. Proteínas de baixa massa molecula r aumentadas no plasma são fi l tradas pelo glomé-rulo em grandes quantidades, ul t rapassando a capacidade de reabsorção do túbulo.

Tubular. É devida a incapacidade dos túbulos renais realizarem a absorção, provocada por uma disfunção ou quando o excesso de p rote ínas no líquido tubular ultrapassa a capacidade reabsortiva dos mesmos. Na proteinúria tubular, pequenas moléculas que em condições normais ultrapas sam a membrana glomerular e são absorvidas, apare -cem na urina final em razão da reabsorção tubular incompleta. A presença de proteinúria é um dos principais sinais de enfermidade renal. A β2 -mi-croglobulina (v. adiante) serve como um marcador da disfunção tubular em condições como: envene-namento por metais pesados, síndrome de Fanconi e hipocalemia crônica. Em doenças tubulares a excreção urinária diária é inferior a 3,5 g de pro -te ína s .

Glomerular. A proteinúria glomerular é uma conseqüência da perda de integridade da mem-brana do glomérulo que, em condições normais, não permite a passagem de proteínas de elevada massa molecu lar para a urina. Nestes casos en-contram-se va lo res maiores que 1,0 g/d. Esta

forma de proteinúria está associada com a sín-drome nefrótica, hipertensão ou glomerulonefrite rapidamente progressiva . Nestas condições, o glomérulo torna-s e progressivamente permeável à proteínas, partic u larmente, à albumina. Quantida-des entre 3 a 6 g/d, podem ser perdidas nestas condições. Este tipo de proteinúria também ocorre como conseqüência secundária de outras enfermi -dades, tais como: amiloidose, lu pus e ritematoso e diabetes mellitus (ao redor de 30 a 40% dos paci-entes com diabetes t ipo 1 desenvolvem nefropatia d iabét ica que se manifesta clinicamente 8 a 10 anos após aquisição da doença) . No curso tardio do diabetes es ta e levação dos teores de prote ínas na urina se torna persistente, dando lugar a uma insuficiência renal.

Proteínas não-plasmáticas. Proteínas de Tamm-Harsfall (urumucóide), um constituinte dos cil indros urinários e provavelmente secretadas pelos túbulos dis ta is .

DETERMINAÇÃO DAS PROTEÍNAS TOTAIS NA URINA

Amostra. São utilizadas amostras de 24 h ou 12 h sem preservativos e mantidas em refrigerador. Não sendo poss ível a de terminação nas primeiras 48 h após a coleta, deve-se misturar bem e separar uma alíquota . Amostras congeladas são es táveis por um ano.

Métodos. A determinação quanti tat iva das pro-teínas na urina é realizada por um dos seguintes métodos :

Turbidimetria. Os métodos turbidimétricos são tecnicamente simples, rápidos e suficiente-mente exatos. Os reagentes comumente usados são: ácido tr ic loroacét ico , ácido sulfossalicílico ou cloreto de benzetônio (BZC) em meio alcalino. Nestes métodos, o reagente precipitante é adicio -nado à urina e a proteína desnaturada precipita em uma suspensão f ina que é quantificada turbidime-tricamente. Nesta categoria, o método mais em-pregado é o do cloreto de benzetônio por ser o mais sensível dos métodos turbidimétricos.

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68 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Corantes. Estas técnicas es tão baseadas no desvio da absorvância máxima do corante quando l igado à proteínas. Os corantes freqüentemente empregados são: azul bri lhante de Comassie (G-250) que liga-se aos res íduos NH 3 das proteínas; e o molibdato vermelho de pirogal lol que reage com grupos amino básicos tanto da albumina como das γ-globulinas para formar um complexo azul.

Biureto. Os métodos que empregam o re a-gente do biureto são pouco uti l izados por serem mais complexos e sofrerem a interferência de certos metabólitos como a bilirrubina. As proteí -nas são concentradas pela precipitação com ácido tricloro acét ico ou ácido fosfotúngst ico-HCl-eta-nólico (reagente de Tsuchya) e redissolvido no reagente do biureto onde o Cu 2 + forma um com-plexo colorido com as l igações peptídicas. O pre-cipitante de Tsuchya melhora a sensibil idade e a l inearidade do método.

Ind icador de pH. É um método semi -quant i-tativo onde a proteína (principalmente a albumina) liga-se ao indicador provocando al terações na cor. Apresenta falso-positivos em urinas pH>8,0.

Valores de referência para as proteínas na urina Adul tos 40 a 100 mg/d Mulheres grávidas Até 150 mg/d Após exercícios (adultos) Até 300 mg/d

PROTEÍNAS MARCADORAS DA

DISFUNÇÃO RENAL Pode-se, também, classificar as proteínas como proteínas marcadoras da dis função renal . Deste modo, três grupos são identif icados, os quais cor-res pondem a t rês t ipos de defei tos renais :

Proteínas com massa molecular de ≥≥ 100.000 Dáltons. Aparecem na urina somente quando houver um avançado comprometimento da membrana, envolvendo a perda da função de per-meabilidade glomerular, a proteinúria é não-se le-t iva. Uma proteína t ípica deste grupo é a IgG.

Proteínas com massa molecular entre 50.000 e 80.000 Dáltons. O aumento da secre-

ção urinária destas proteínas em razão da baixa fi l tragem de íons, representa um possível defeito reversível no glomérulo, sendo uma proteinúria glomérulo selet iva. Proteínas t ípicas deste grupo são a albumina e a transferrina.

Proteínas com massa molecular <50.000 Dáltons. Estas proteínas de baixa massa mole-cular estão normalmente presentes na urina nos casos de um defeito renal intersticial. Assim, a função de reabsorção fica diminuída resultando numa proteinúria tubular. As proteínas marcadoras des te grupo são: α1 -microglobul ina, β2 -microglo-bu l ina e prote ína l igadora de re t inol .

PROTEINÚRIA PRÉ -RENAL, PÓS-RENAL E NÃO-RENAIS

Além das causas renais existem condições pré -renais , pós-renaise não-renais que também acar-retam aumentos da proteinúria. A proteinúria pré-renal é causada por uma permeabilidade excessiva de proteínas de baixa massa molecular. Este filtrado contém altos teores de proteínas na primeira urina. Isto se deve a uma interrupção da reabsorção tubular por sobrecarga no sistema. As proteínas t ípicas de uma proteinú-ria pré -renal são: a mioglobina, imunoglobulinas de cadeias leves kappa e lambda (gamopatias mo-noclonais) e proteínas de Bence Jones. A prote inúr ia pós-renal ocorre pela adição de proteínas à urina na bexiga ou nos ureteres e as -semelha-se a uma doença renal . As proteínas adi-cionadas na urina são l infát icas ou plasmáticas. Entram na urina pela bexiga por exsudação ou transudação do epitél io do ureter . Is to acontece pela a l ta densidade das proteínas envolvidas que não conseguem atravessar a membrana do glomé-rulo. Sua passagem para a urina se deve a uma sobrecarga plasmática pós-renal. A α2 -macroglo-bul ina é um excelente marcador protéico da pro -teinúria pós-renal.

Como prote inúr ia não-renais têm-se: anemia grave, ascite, cardiopatia, distúrbios convulsivos, endocardite bacteriana subaguda, febre, hepatopa-tia, hipertireoidismo, idade avançada, infecção aguda, ingestão ou superexposição a cer tas sub-stâncias (ácido sulfossalicílico, arsênico, chumbo,

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Aminoácidos e proteínas 69

é ter, fenol, mercúrio, mostarda, opiáceos, propile-noglicol, turpentina), obstrução intestinal, reação de hipersensibilidade, toxemia, toxinas bacteria-nas (difteria, escarlatina, estreptocócica aguda, febre tifóide e pneumonia), traumatismo e tumor abdominal.

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70 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

ALBUMINA

albumina compreende ao redor de 60% das proteínas presentes no plasma humano. É

sintet izada no f ígado em velocidade dependente da ingestão protéica, mas sujeita a regulação por retroalimentação pelo teor de albumina circulante. Tem meia vida de 15-19 dias. A albumina exerce importantes fu nç õ e s :

§ Contribui com 75-80% do efeit o osmótico do plasma, um dos fatores que regulam a distri-buição apropriada de água entre os compart i-mentos intra - e extracelulares. Em certas en-fermidades, os teores de albumina anorma l-mente baixas, movem a água do leito vascular para os tecidos (edema ).

§ Transporte e armazenamento de vários com-postos muito dos quais pouco solúveis em água. Por exemplo, a albumina liga (e solubi-liza) vários compostos não-polares como a bi-lirrubina não-conjugada t ransportando-a até o fígado; ácidos graxos de cadeia longa que se ligam fortemente à albumina, sendo assim trans portados do fígado para os tecidos perifé -ricos. A concentração plasmática de diversas s u bstâncias, tais como cálcio, alguns hor-mônios (tiroxina, triiodotironina, cortisol, al-dosterona) e t r iptofano, são reguladas, de certo modo, pela sua ligação à albumina. Várias dro -gas, por exemplo, salicilatos, fenilbutazona, clofibrato, dicumarol, penicilina G e warfarin, também se ligam fortemente à albumina.

HIPERALBUMINEMIA

É encontrada raramente como nos casos de carc i-nomatose metastática, desidratação aguda, dia r-réia, esclerodermia, esteatorréia, estresse, febre reumática, gravidez, intoxicação hídrica, lúpus eritematoso sistêmico, meningite, miastenia, mi e-loma múltiplo, nefro se, neoplasias, osteomielite, pneumonia, poliartri te nodosa, sarcoidose, tra u-

matismo, tuberculose, úlcera péptica, uremia, vômito e hemoconcentração.

HIPOALBUMINEMIA

Esta condição pode ser fisiológica ou patológica.

Redução da síntese

§ Enfermidade hepática severa, como hepatite crônica e cirrose, resulta na incapacidade dos hepatócitos em sintetizar albumina.

§ Desnutrição ou diminuição da ingestão pro -té ica .

§ Síndromes de má absorção , redução da absor-ção de aminoácidos.

Aumento do catabolismo protéico. Como resultado de lesões (cirurgia de grande porte ou trauma), infecção ou malignidade.

Perda de proteínas. Urina: é a forma mais severa desta anormalidade com concentrações de albumina de até < 2 g/L, geralmente com presença de edema . As principais causas são: s índrome nefrótico, glomerulonefrite crônica, diabetes ou lupus eritematoso sistêmico. Fezes: enteropatia perdedora de proteínas aumentada por enfermi -dade neoplástica ou inflamatória. Pele: queimadu-ras .

Distribuição alterada. Seqüestro de grandes quantidades de albumina do compartimento extra-celular, por exemplo, na ascite, quando a elevada pressão na circulação portal dirige a albumina para o líquido peritonial.

Outras anormalidades. A analbuminemia , uma rara doença caracterizada pela ausência congênita de albumina, e bisalbuminemia , detectada na ele-troforese pelo aparecimento de duas bandas ou

A

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Aminoácidos e proteínas 71

uma banda mais larga no lugar da banda normal de albumina. Nenhum sintoma clínico está associado a bisalbuminemia.

O termo “microalbuminemia” é empregado para descrever aumentos na excreção de albumina sem evidências ou enfermidade renal. Esta condi-ção é encontrada em certas populações de diabéti-cos que desenvolvem enfermidade renal. Entre-tanto, a presença de albumina na urina é um achado não-específico. A hipertensão, infecção do trato urinário, exercício e enfermidade cardíaca congestiva também podem aumentar a excreção da albumina na urina.

CONSEQÜÊNCIAS DA HIPOALBUMINEMIA

A hipoalbuminemia afeta a distribuição líquida do corpo e as concentrações plasmáticas de substân-cias transportadas l igadas à albumina.

§ Distr ibuição dos l íquidos corporais . A albu-mina é o mais importante contribuinte da pres -são oncótica do plasma e sua redução resul ta em edema.

§ Função transportadora. Os n íve is de cons ti-tuintes normalmente transportados pela alb u-mina estão diminuidos. Por exemplo, calcemia, drogas e bilirrubina transportada por proteínas. A ligação da bilirrubina à albumina impede que a bilirrubina “livre” atravesse a barreira san-gue/cérebro e, portanto, a sua d epos ição nos tecidos cerebrais (kernictericus na icterícia ne-onatal).

DETERMINAÇÃO DA ALBUMINA SÉRICA

Paciente. Não deve consumir dieta rica em gor-dura por 48 h antes da prova.

Amostra. Soro . Evitar estase prolongada na c o-leta de sangue, pois a hemoconcentração aumenta os níveis de proteínas plasmáticas; além disso, a postura do paciente deve ser observada já que o teor de albumina é, aproximadamente, 0,3 g/dL maior em pacientes ambulatoriais quando rela -cionados aos hospitalizados. Em frascos bem fe -

chados, o soro l ímpido é estável por uma semana em temperatura ambiente ou um mês no refri-gerador.

Interferências. Resultados falsamente elevados: agentes citotóxicos, anticoncepcionais orais e bromossulfaleína. Resultados falsamente reduzi -dos: paracetamol, aspirina, estrogênios, anticon-cepcionais orais, ampicilina, asparaginase e flu o-rouracil.

Métodos. Os primeiros métodos para a separação da albumina das globulin as empregavam o fracio -namento salino. Os mais populares usavam o sul-fato de sódio com a medida da albumina pelo método de Kjeldahl ou pelo desenvolvimento de cor pela reação do biureto.

Verde de bromocresol . Atualmente, os métodos mais amplamente empregados para a anál ise da albumina são os de fixação de corantes. A albu-mina tem a capacidade de fixar seletivamente vários aníons orgânicos, entre os quais, moléculas de corantes complexos como o verde de bromo -cresol (BCG), azul de bromofenol (BPB) ou púr-pura de bromocresol (BCP). Ao ligarem-se à a l-bumina estes corantes sofrem um desvio nas suas absorções máximas. A quantidade de albumina l igada ao corante é proporcional ao teor de albu-mina na amostra. O método do BCG é o recomen-dado por apresentar boa especif icidade e não so-frer interferências da bilirrubina, salicilatos, he-moglobina ou lipemia quando em níveis modera -dos. Este princípio é empregado para a química seca no DT Vitros.

Eletroforese. O emprego da eletroforese das proteínas para a separação da albumina fornece também informações adicionais sobre as globuli-na s .

Outros métodos. A albumina também pode ser avaliada pela determinação das globulinas baseada no conteúdo de tr iptofano das globulinas. Vários métodos tais como: eletroimunoensaio, imuno-químico, nefelométrico, imunodifusão radial, ele-troimunodifusão, turbidimetria, radioimunoensaio e enzimaimunoensaio são também empregados para a determinação da albumina sérica.

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72 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Valores de referência para a albumina sérica Homens adultos 3,5 a 5,0 g/dL Mulheres adultas 3,7 a 5,3 g/dL Recém-nasc idos 2,8 a 5,0 g/dL Acima de 60 anos 3,4 a 4,8 g/dL

Bibliografia consultada

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Aminoácidos e proteínas 73

PROTEÍNAS PLASMÁTICAS ESPECÍFICAS

s proteínas nos l íquidos biológicos são molé-culas anfóteras que podem ser separadas em

frações quando aplicadas sobre um suporte poroso e submetidas a um campo elétrico em processo denominado eletroforese. A migração ocorre de acordo com o grau de ionização, tamanho e forma da molécula protéica, também como, das caracte-ríst icas da solução tampão (pH, composição qua-litativa, força iônica) do meio onde se realiza o processo; da força do campo elétr ico; da porosi-dade, viscosidade e temperatura do suporte.

A separação das proteínas é real izada em soro para evitar interferências da banda do fibrinogê-nio.

Em pH 8,6, empregando os métodos eletrofo-rét icos correntes, as proteínas no soro sangüíneo são divididas nas seguintes frações principais: pré -albumina, albumina, frações α1 , α2 , β1 , β2 e γ. A migração destas macromoléculas é realizada em suportes como o acetato de celulose, gel de aga-rose, gel de poliacrilamida e gel de amido, em res posta a um campo elétrico.

As frações obtidas no soro por eletroforese tem os seguintes valores de referência:

Proteínas Valores de referência (g/dL) Pré -albumina 0,020 a 0,040 Albumina 3,50 a 5,00 Região α1 0,10 a 0,40 Região α2 0,50 a 1,00 Região β1 0,32 a 0,66 Região β2 0,27 a 0,55 Região γ 0,59 a 2,35

Cada fração protéica obtida por eletroforese é constituída de proteínas individuais que podem ser determinadas por vários métodos, como nefelo -metria, imunodifusão radial, imunoeletroforese, etc.

PRÉ-ALBUMINA

Nesta fração, junto a pré-albumina também migra a prote ína l igadora de re t inol (RBP). Ambas são sintetizadas no fígado e tem uma meia -vida menor que 12 h, consequentemente, estas aval iações fornecem indicadores simples e sensíveis de des -nutrição ou disfunção hepática. Os níveis caem rapidamente nas reduções calóricas e protéicas na dieta. A pré -albumina transporta a tiroxina (T4 ) e a triiodotironina (T3 ) . Os níveis séricos da pré -al-bumina diminuem na inflamação, doenças mali-gnas, cirrose hepática e enfermidades renais per-dedoras de proteínas . Na doença de Hodgkin os níveis aumentam. A proteína ligadora de retinol (RBP) transport a a vitamina A (retinol). A RBP sérica eleva em enfermidades renais crônicas, especialmente em pacientes com proteinúria tubular. A redução está associada com enfermidade hepática e má nutrição protéica. Como o zinco é necessário para a síntese de RBP, os estados de deficiência deste metal são caracterizados por baixos níveis de RBP e vita-mina A. A RBP é quantificada por nefelometria.

ALBUMINA

Variações na concentração de albumina sérica em vários estados foram descri tas na seção 3.2.

REGIÃO α 1

ALFA1-ANTITRIPSINA (AAT)

As proteínas como a tripsina, quimiotripsina, elastase e trombina são continuamente l iberadas para o sangue em pequenas quantidades a partir de

A

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74 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

várias fontes, incluindo o pâncreas, leucócitos e bactérias in test inais . A AAT é uma das várias proteínas que inibem a atividade destas proteases, particularmente, a elastase dos neutrófilos, e pode atuar na l imitação da atividade proteolít ica nos sít ios de inflamação. O interesse na AAT é a asso-ciação entre certas doenças do pulmão e f ígado com a sua deficiência devida ao polimorfismo genét ico . Foram identificados vários fenótipos da defic i-ência de AAT. O fenótipo MM (alelo PiM , inibidor da protease) está associado com a at ividade nor-mal da AAT. Indivíduos homozigóticos com o fenótipo ZZ produzem somente pequenas quanti-dades de AAT plasmát ico. Estas pessoas es tão propensas as segu in tes desordens :

§ Enfisema pulmonar. Ao redor de 1% dos paci-entes com enfisema apresentam dificiências de AAT, sendo esta percentagem mais elevada em jovens. Quando associado com deficiência de AAT, o enfisema tende a se manifestar em gru-pos com idade entre 20-40 anos. O fumo parece ser um importante fator que predispõe ao des -envolvimento da doença nestes pacientes, pro-vavelmente pelo estímulo da atividade fagoci-tária com a liberação local de proteases. Part í -culas e bactérias inaladas são continuamente removidas dos pulmões no processo de fago-citose. Quando a AAT é deficiente, a enzima não é inibida e ataca a elastina da parede alv e-olar. A perda de elasticidade do tecido pulmo-nar provoca enfisema com redução da ventila-ção e aumento na vulnerabilidade para infec-ções respiratórias .

§ Desordens hepáticas. A icterícia neonatal g e-ralmente se apresenta como um quadro cole s -tá t ico, sendo comum em indivíduos com o tipo ZZ. Apesar da resolução da icterícia, pode ocorrer o desenvolvimento de cirrose. Ao redor de 20% das crianças com cirrose, a desordem hepática pode ser atribuída a deficiência de AAT. Em adultos a cirrose e o hepatoma estão associados com o fenótipo Pi z .

Valores de referência Recém nascidos 145 a 270 g/dL Adul tos 78 a 200 g/dL Acima de 60 anos 115 a 200 g/dL

Valores aumentados. Doença pulmonar crô -n ica, doenças do f ígado, diabetes mell i tus, doen-ças reumáticas, doenças gástricas, doenças renais, pancreatite, carcinoma, edema angioneurótico, cirrose, hepatoma, gravidez, terapia com estrogê-nios e es teróides .

Valores reduzidos. Deficiência congênita e perdas severas de prote ínas .

ALFA1-GLICOPROTEÍNA ÁCIDA (AAG)

É composta por 45% de carboidratos, com hexose, hexosamina e ácido siálico em iguais proporções. Sua função primária é inativar a progesterona, mas também ligar e afetar a fármaco-cinética de algumas drogas. Apesar do papel exato da AAG ser desconhecido ela está aumentada na artr i te reumatóide, lupus eritematoso sistêmico, neo-plasma maligno, queimaduras e infarto do mi o-cárdio. A redução ocorre na má nutrição, enfermi-dade hepática severa, síndrome nefrótica, anticon-cepcionais orais e gastroenter i tes perdedoras de proteínas. Os valores de referência para a AAG são: 50-150 mg/dL. A determinação de AAG substi tui com vanta-gens o teste de mucoproteínas (seromucóides) , descri to adiante.

ALFA1-FETOPROTEÍNA (AFP)

É uma glicoproteína sintetizada no fígado fetal , sistema digestório e saco vitelino humano. O nível máximo é atingido na 30a semana de gestação e no câncer hepático primário. Em obstetrícia a determinação de AFP é realizada no líquido am-niótico ou soro materno para detectar defei to do tubo neural (anencefalia, espinha bífida) do feto.

A dosagem simultânea da AFP, β-HCG (hor-mônio coriônico gonadotrófico fração beta) e e s -triol livre é utilizada como avaliação do risco fetal em mulheres no segundo tr imestre de gravidez

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Aminoácidos e proteínas 75

(entre 14 e 20 semanas) na detectação de 70% da síndrome de Down (Trissomia do cromossomo 21) e de 95% dos casos de defei tos do tubo neural aberto. A avaliação do risco fetal não é um teste diagnóstico, mas sim uma oportunidade de ras t re-amento, que informa o risco da paciente para as aneuploidias mais freqüentes e para defeitos de fechamento do tubo neural .

A freqüência da síndrome de Down é de 1/800 nascimentos. A doença não é hereditária, mas há 5 a 10% de casos com “história familiar”. O risco de nascimento de uma criança com síndrome de Down cresce com o aumento da idade materna (com 45 anos o risco chega a 1/30).

A elevação da AFP não é específica de ma -lignidade. Está presente em 15 a 75% das hepato-pat ias benignas com atividade regenerativa do hepatócito como a cirrose, hepatite alcoólica, hepatite crônica ativa, em doenças inflamatórias intestinais e colite ulcerativa.

A AFP é marcador tumoral para carcinoma he-patocecular e de células germinativas (não semi -nomas). Embora seja útil no diagnóstico, sua prin -cipal aplicação é na monitorização da eficácia do tratamento cirúrgico ou quimioterápico e no ras -tre amento dessas neoplasias . Os níveis caem a valores normais ao redor de 4 a 6 semanas após tratamento. Aumento nos teores após remissão indicam a recorrência do tumor na maioria dos ca sos .

Valores de referência para a AFP Líquido amniótico (20ª semana) 5 a 25 mg/dL Soro materno (20ª semana) 20 a 100 µg/L Recém-nasc idos 5 mg/dL

ALFA1-LIPOPROTEÍNA

Transportadora de l ipídios (v. adiante).

REGIÃO α 2

HAPTOGLOBINA (HAP)

É uma glicoproteína sintetizada nos hepatócitos e, em pequenas quantidades, nas células do sis tema ret ículo endotel ial dest inada ao transporte da he-mo globina livre no plasma para o sistema retículo endotelial onde é degradada. A hemoglobina não-ligada à haptoglobina é filtrada pelos glomérulos e precipita nos túbulos causando enfermidade renal s evera. Isto normalmente não ocorre com o com-plexo haptoglo bina-hemoglobina que é muito grande para ser filtrado, prevenindo, assim, lesões renais e a perda de ferro. O complexo é degradado no fígado ou sistema ret ículo endotelial , o que explica o teor reduzido de haptoglobina após epi-sódios hemolí t icos. Determin ações isoladas desta fração é de pouca util idade; determinações seria -das , en t retanto, são empregadas para monitorar estados hemolí t icos.

Valores de referência: recém nascidos 5-48 mg/dL; adultos: 34-215 mg/dL.

Valores aumentados. Queimaduras, infecções agudas, terapia com corticóide, a ndrogênios, do-enças do colágeno, neoplasias e s índrome nefrótica – onde grande quant idade de prote ínas de baixa massa molecular são perdidas.

Valores reduzidos. Hemólise intravascular, doenças severas do f ígado, es t rogênio s, anemia megaloblástica, hematomas, gravidez, mononucle-ose infecciosa, reações de transfusão e malária. Nestes dois úl t imos casos, são frequentes as soli-citações de haptoglobina acompanhada de lactato desidrogenase e hemoglobina.

ALFA2-MACROGLOBULINA (AMG)

É inibidora das proteases de modo diferente que o descrito para a AAT. Inibe a atividade da tripsina, quimiotripsina, trombina, elastase, calicreína e plasmina. Está diminuída em pacientes com artrite reumatóide, mieloma múltiplo e submetidos a

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76 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

terapia com estreptoquinase. Pode estar elevada durante a gravidez, terapia com estrogênios, al-gumas doenças hepáticas, diabetes mell i tus e sindrome nefrótica. A avaliação da AMG rara-mente tem valor clínico.

Valores de referência: Homens: 150 a 350 mg/dL; mulheres: 175 a 420 mg/dL.

Valores aumentados. Síndrome nefrótica, gra-videz, hemólise, infância, diabetes mellitus, in -flamações agudas e crônicas, neoplasias, cirrose, deficiência de α1 -antitripsina e terapia com estro -gênio.

Valores reduzidos. Pancreati te aguda grave e úlcera péptica.

CERULOPLASMINA (CER)

É sintetizada no fígado e transporta 90% do cobre no plasma. Os 10% restantes são t ransportados pela albumina. Seis átomos de cobre estão ligados em cada molécula de ceruloplasmina. Está au-mentada em infecções, doenças malignas e trauma. Os aumentos são particularmente notáveis em enfermidades do sistema retículoendotelial como a doença de Hodgkin. O nível está também elevado nas infecções ou obstrução do trato biliar. A ap licação mais importante da avaliação da ce-ruloplasmina é no diagnóst ico da doença de Wilson (defeito autossômico recessivo raro com incidência 1:50.000 a 1:100.000). As anormalida-des neste distúrbio são: diminuição da CER com redução da incorporação do cobre na apoproteína e redução drástica da excreção biliar do cobre. O cobre deposi ta nos r ins , no f ígado onde causa cirrose e no cérebro onde lesa a ganglia basal . Esta enfermid ade também é chamada de degene-ração hepatolen t icular. Os teores de CER são afetados pela idade, exercício, gravidez e admi -nis t ração de est rogênios. Na ausência de enfermi -dade hepática severa, níveis abaixo de 10 mg/dL são suges t ivos de enfermidade de Wilson.

Valores de referência para a ceruloplasmina (mg/dL)

1 a 2 meses 05 a 18 6 a 12 meses 33 a 43 13 a 36 meses 26 a 55 4 a 5 anos 27 a 55 6 a 7 anos 24 a 54 Acima de 7 anos 20 a 54 Adul tos 18 a 45

Valores aumentados. Artri te, doença de Hodgkin, estados neoplásicos e inflamatórios, gravidez, emprego de estrogênios, antiepilépticos e contracept ivos orais .

Valores reduzidos. Má nutrição, má absorção, doença de Wilson, perda de proteínas, s índrome nefrótica, e enfermidade hepática severa, partic u-larmente a cirrose biliar primária.

REGIÃO β 1

TRANSFERRINA (TRF, SIDEROFILINA)

É a principal proteína plasmática transportadora de ferro. Os íons férr icos provenientes da degra-dação do heme no f ígado e aqueles absorvidos a partir da dieta, são transportados pela transferrina para os locais de produção dos eri tróci tos na me-dula óssea. Sua concentração está relacionada com a capacidade total de ligação de ferro (TIBC). A avaliação da TRF é útil no diagnóstico diferencia l da anemia ferropênica e no acompanhamento do seu tratamento. Na deficiência de ferro ou anemia hipocrômica, o teor de TRF está elevado em vir-tude do aumento da síntese, entretanto, a proteína está menos saturada com o ferro pois os níveis de ferro plasmático estão baixos. Por outro lado, se a anemia é causada por impedimento da incorpora-ção do ferro nos eri trócitos, a concentração de TRF está normal ou baixa, mas saturada de ferro. Na sobrecarga de ferro, a TRF está normal en-quanto a saturação (normalmente 30-38%) excede 55% e pode chegar até a 90%.

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Aminoácidos e proteínas 77

Valores de referência: recém nascidos 130-275 mg/dL; adultos: 220-400 mg/d/L e acima de 60 anos 180-380 mg/dL.

Valores aumentados. Anemias por deficiência de ferro, gravidez e durante a terapia com estro -gênio.

Valores reduzidos. Ocorrem, juntamente com baixos teores de albumina, pré-albumina e β-lipoproteína, em inflamações e doenças malignas. A causa da redução na síntese ainda é desconhecida. Outras causas de diminui-ção da TRF são: enfermidade hepática (redução da sín-tese), má nutrição, síndrome nefrótico, neoplasias, he-mólise, enteropatias perdedoras de proteínas, a transfer-rinemia hereditária onde os níveis bastante reduzidos de TRF são acompanhados de sobrecarga de ferro e anemia hipocrômica resistente à terapia pelo ferro.

HEMOPEXINA (HX, HPX)

Atua no transporte do heme livre após catabolismo da hemoglobina em seus componentes. O com-plexo heme -hemopexina atinge o fígado onde a porção heme é convertida em bilirrubin a. Esta fração dificilmente é quantificada no laboratório clínico.

BETA-LIPOPROTEÍNA

Transportadora de l ipídios (v. adiante).

COMPLEMENTO FRAÇÃO C4

A fração C4 participa da via clássica de ativação do complemento e atua na resposta imunológica humoral. Sua deficiência tem caráter autossômico recessivo e resulta em redução da resposta à in -feccões .

Valores de referência: 15 a 45 mg/dL.

REGIÃO β 2

FIBRINOGÊNIO

O fibrinogênio é uma glicoproteína sintetizada pelo f ígado. Atua como substrato para a ação da enzima trombina. É composta por três diferentes pares de cadeias polipeptídicas ligadas por pontes dissulfeto, que sob a ação da trombina formam fibrinopeptídios A e B. A defic iência de fibrin o-gênio pode resultar da fal ta de produção da molé-cula normal (afibrinogenia ou hipofibrogenia) ou da produção de uma proteína estruturalmente anormal (disfibrinogenia).

Valores de referência: 200 a 450 mg/dL.

Valores aumentados. Doenças inflamatórias agudas e crônicas, s índrome nefrót ica, doenças hepáticas/cirrose, gravidez, estrogênio terapia e coagulação intravascular compensada.

Valores reduzidos. Coagulação intravascular aguda ou descompensada, doença hepát ica avan-çada, terapia com L-asparaginase, terapia com agentes fibrinolíticos (estreptoquinase, uroquinase e ativadores de plasminogênio t issular), disfibri-nogenemia congênita – onde os indivíduos afe ta-dos podem ser assintomáticos ou apresentar epi-sódios esporádicos de sangramento.

COMPLEMENTO FRAÇÃO C3

A fração C3 é um dos nove componentes princi-pais do complemento total ; atua na resposta imunológica humoral.

Valores de referência: 80 a 170 mg/dL.

BETA2-MICROGLOBULINA (BMG)

É uma proteína de baixa massa molecular (11.800) facilmente filtrada pelo glomérulo e quase total-mente reabsorvida pelos túbulos renais. Níveis elevados no plasma ocorrem na insuficiência re-

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78 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

nal, inflamação e neoplasma, especialmente aqueles associados com os l infócitos B. O princi-pal valor da determinação da BMG é testar a fu n-ção tubular renal, particularmente nos receptores de transplantes renais onde a rejeição se manifesta pela redução da função tubular.

Valores de referência Soro 0,10 a 0,26 mg/dL Urina 0,03 a 0,37 mg/d LCR 0,30 mg/L

REGIÃO γ

PROTEÍNA C REATIVA (PCR)

É sintet izada no fígado – presente no plasma de pacientes com doenças agudas – e capaz de se ligar ao polissacarídio -C da parede celular do Streptococcus pneumoniae. A PCR é um marcador não-específico que eleva durante a resposta imune para a infecção, lesão tecidual ou necrose celular associada com infarto ou malignidade. Medidas repetidas são úteis no estudo do curso de doenças (como acompanhar terapia durante a inflamação ou processo necrótico). A PCR está envolvida com o sis tema auto-imune e atua na at ivação do com-plemento, fagocitose e l iberação das linfocinas.

Valores de referência: 80-800 µg/dL.

Valores aumentados. Infarto do miocárdio, estresse, trauma, infecções (ex.: recorrentes no lupus eritematoso sistêmico), inflamação (ex.: fase aguda da artrite reumatóide), cirurgia ou pro-liferação neoplástica, espodili te anquilosante e necrose tecidual. O aumento pode chegar até 2000 vezes o valor de referência. Entretanto, como o aumento é inespecífico, ele não pode ser interpre-tado sem uma história clínica completa e também com a comparação com outros exames.

IMUNOGLOBULINAS (ANTICORPOS

HUMORAIS)

As imunoglo bulinas são proteínas especializadas sintetizadas pelos l infócitos em resposta a um antígeno; podem reconhecer e precipitar , ou neu-tralizar invasores como bactérias, vírus ou pro teí-nas estranhas or iundas de outras espécies , ou ou-tras substâncias. Cada p roteína estranha estimula a formação de um conjunto de diferentes anticorpos, os quais podem combinar com o antígeno para formar um complexo antígeno-anticorpo. A pro -dução de anticorpos é parte de um mecanismo geral de defesa denominado resposta imunitária ou imunológica .

Os anticorpos são proteínas com moléculas em forma de Y, consist indo de quatro cadeias poli-pept ídicas: duas cadeias pesadas (H) e duas ca-deias leves (L). As seqüências de aminoácidos das regiões variáveis das quatro cadeias determinam a especificidade antigênica de um anticorpo em part icular , cujos sí t ios de l igação, que são com-plementares a característ icas estruturais específi-cas da molécula de antígeno, tornam possível a formação do complexo antígeno-ant icorpo.

IgG. Corresponde a 70-75% das imunoglobulinas totais. A IgG difunde para o espaço extra -vascular (65% da IgG) devido ao seu pequeno tamanho, sendo também capaz de atravessar a placenta. Sua principal função parece ser a neutralização de t ox inas nos espaços teciduais . Ant icorpos da cla s se IgG são produzidos em resposta à maioria das bactérias e vírus; agregam e envolvem peque-nas proteínas estranhas como as toxinas bacteria -nas. Informações mais precisas sobre as imunida-des são obt idas pela aval iação das quatro subclas -ses da IgG: IgG1 , IgG2 , IgG3 e IgG4 .

IgA. Aproximadamente 10-15% das imunoglobu-linas séricas são IgA. Existe outra forma de IgA, provavelmente mais importante, chamada IgA secretora. É encontrada nas lágrimas , suor, saliva, leite, colostro, secreções gastrointestinais e brô n-quicas. A IgA fornece proteção da área externa contra microorganismos.

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Aminoácidos e proteínas 79

Figura 8.1. Representação de uma molécula de imunoglobulina. A molécula consiste de duas cadeias pesadas e duas cadeias leves l igadas por l igações dissulfeto ( -S-S- ). Tanto a cadeia pesada, como a cadeia leve, apresenta uma região variável e uma região constante.

IgM. É um pentâmero produzido como primeira resposta imune ao est ímulo antigênico. É a pri-meira imunoglobulina produzida pelo feto durante o desenvolvimento. Ela está confinada ao sangue em razão de sua elevada massa molecular que impede a passagem para o espaço extravascular. A IgM não atravessa a barreira placentária, níveis elevados em recém-nascidos durante a primeira semana de vida sugerem infecção pré -natal (rubé-ola, citomegalovírus, toxoplasmose etc.). O au-mento policlonal é encontrado na cirrose, esclero-derma, endocardite bacteriana, tripanosomíase, malária, mononucleose i nfecciosa, actinomicose e leucemia monocítica. Também é empregada na avaliação da imunidade humoral, diagnóstico e monitoramento da terapia da macroglobulinemia de Waldenström (aumento monoclonal da classe IgM). No adulto compreende 5-10% das imuno-globulinas circulantes totais .

IgD. Consti tui menos que 1% das imunoglobuli-nas totais. Sua estrutura é similar a IgG. Muitas vezes estão presentes associadas ao monômero

IgM, na superfície dos l infócitos B. Sua função é desconhecida.

IgE. Encontrada no plasma somente em pequenas quantidades. Incluem as reaginas que se l igam às células. Em presença de antígeno (alérgeno), e como um dos resul tados da reação ant ígeno-ant i-corpo, ocorre a liberação de histamina e outras aminas e polipeptídios da células, produzindo uma reação de hipersensibilidade local.

Valores de referência (por nefelometria) I d a d e IgG IgA I g M IgD IgE

Soro mg/dL mg/dL mg/dL mg/dL UI /mL

N e o n a t o s 700-1480 0 -2 , 2 5 -3 0 (DIR) (RIE)

1 6 -60 anos 650-1500 7 6-390 4 0-345 0 -8 0 -3 8 0

> 6 0 a n o s 600-1560 9 0-410 3 0-360 - -

LCR 0 -5 , 5 0 -0 , 6 0 -1 , 3 - -

Saliva - ~11 - - -

DEFICIÊNCIA DAS IMUNOGLOBULINAS

A defesa imunológica depende de quatro sistemas interat ivos:

§ Anticorpos humorais (imunoglobulinas) da série de linfócitos B.

§ Imunidade celular-mediada dos linfócitos T.

§ O sistema fagocitário.

§ Sistema do complemento.

Os dois últ imos sistemas são não específicos e não tem memória imunológica para o antígeno. O primeiro e o quarto são proteínas pla s máticas. As principais causas de deficiência das imuno-globulinas são:

Causas secundárias. (Comuns):

§ Defeito na síntese (a IgM cai primeiro, a seguir a IgA e, finalmente, a IgG)

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80 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

− Neoplasia linfóide (leucemia linfocítica crônica, doença de Hodgkin e mieloma múltiplo).

− Reação tóxica, insuficiência renal (perde-dora de proteínas) e diabetes mell i tus.

− Drogas: fenitoína, penicilina e imunossu-pressores .

− Neonatal: prematuridade e atraso passageiro da s ín tese .

§ Perda anormal de prote ínas

− Síndrome nefrótica, queimaduras, lesões exudativas e enteropatias perdedoras de pro te ínas .

Causas primárias ou inerentes. (Raros).

§ Insuf ic iência na produção de ant icorpos.

− Generalizada (infecções piogênicas seve-ras).

− Deficiência seletiva das seguintes imuno-g lobul inas .

− IgA: a mais comum (1:700), sem sinto -mas, mas as pessoas afetadas tendem a sofrer doenças alérgicas ou autoimuno-nes .

− IgG e IgA (IgM aumentada): infecções piogênicas recorrentes.

− IgA e IgM: comum na giardíase.

− IgG: infecções piogênicas recorrentes .

− IgM: susceptibilidade à enfermidade auto-imune e a septicemia após esple-noctomia.

§ Insuficiência combinada de anticorpo e imuni-dade cé lu la-mediada.

HIPERGAMAGLOBULINEMIA

POLICLONAL

A hipergamaglobulinemia policlonal é caracteri-zada por aumentos difusos das gamaglobuline-mias. É provocada pelo estímulo imune de muitos clones celulares produzindo várias imunoglobuli-nas . Representa a resposta das células β a o e s tí -mulo antigênico e indica a presença de infecção crônica ou processo auto-imune. As principais causas são:

Infecções crônicas. Brucelose, tuberculose, parasitoses (malária), lepra, bronquie ctasia. Nes -tes casos, as est imativas das imunoglobulinas específicas raramente fornecem mais i n formações que a e letroforese protéica. No entanto, as suas determinações são de grande valor em alguns dia-gnósticos diferenciais .

Doença hepática. Cirrose biliar primária, cir-rose portal e hepati te crônica ativa.

Infecções intrauterinas. A produção de IgM no feto aumenta e , ao nascer , o teor de IgM no s angue do cordão es tá e levado.

Doença inflamatória intestinal. Doença de Crohn e colite ulcerativa.

Desordens auto-imunes. Artrite reumatóide e lúpus eri tematoso sistêmico.

Granulomas. Sarcoidose.

Em alguns casos, as classes imunoglobulínicas fornecem a indicação da etiologia:

§ Predomínio de IgG: hepatite crônica ativa e lúpus eri tematoso sistêmico.

§ Predomínio de IgA: cirrose criptogência, d o-ença de Crohn, tuberculose e sarcoidose.

§ Predomínio de IgM: cirrose biliar primária e doenças parasi tár ias .

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Aminoácidos e proteínas 81

§ Aumentos equivalentes das IgA, IgG e IgM: infecções crônicas prolongadas.

HIPERGAMAGLOBULINEMIA

MONOCLONAL (PARAPROTEINEMIA)

As bandas de imunoglobulinas monoclonais vis í -veis na eletroforese do soro sangüíneo, como p i-cos estrei tos e pontiagudos, são denominadas pa-raproteínas ou componentes monoclonais. Podem ser polímeros, monômeros ou fragmentos de mo-léculas de imunoglobulinas, como cadeias leves (proteínas de Bence Jo nes) ou, raramente, cadeias pesadas ou meias moléculas; tanto os monômeros como os fragmentos podem ser polimerizados. A detecção de uma paraproteína no sangue ou urina necessita outras investigações para determinar se a mesma é benigna ou maligna. Parapro teínemias malignas ocorrem no mieloma múltiplo (e plasma-citoma), macroglobulinemia e outros tumores linfóides. A prevalência de paraproteínemia au-menta com a idade e está ao redor de 3% da p o-pulação geriátrica.

Mieloma múltiplo. Cerca de 60% das parapro-te ínas são devidas ao mieloma múlt iplo (doença maligna de plasmócitos basicamente na medula óssea) que es tá associado com vár ias c lasses de imunoglobulinas, principalmente, a IgG. A maio-ria dos mielomas produzem moléculas de Ig com-pletas – geralmente IgA ou IgG – sendo a quant i-dade produzida muitas vezes proporcional a massa do tumor. Quantidades excessivas de fragmentos de Ig (cadeias leves ou partes de cadeias pesadas) são também produzidas em 85% dos casos, apro-ximadamente. Dímeros de cadeias leves (44kDa) estão, muitas vezes, presentes na urina sendo d e-nominados proteínas de Bence Jones . No mieloma múlt iplo são encontrados:

§ Sinais clínicos: dor óssea, fatiga, anemia leve, infecção, insuficiência renal, hiperviscosidade e uma velocidade de hemossedimentação ele-vada.

§ Diagnóstico: banda de paraproteínas na eletro-forese no soro e urina; lesões l í t icas difusas

no raio X ósseo; biópsia da medula óssea com presença de células plasmáticas anormais.

§ Acompanhamento: hipercalcemia (envolv i-mento ósseo); creat in ina e uré ia e levadas (disfunção tubular e glomerular); β2 -micro -g lobul ina (níveis elevados indicam um mau prognóst ico – depende da renovação das cé-lulas tumorais e da função renal); hemoglo-bina reduzida (depressão da medula); redução das imunoglobulinas “normais” – não-para -proteína – o que predispõe à infecção.

Macroglobulinemia de Waldenström. É uma doença clonal de l infócitos plasmocitóides secre-tores de IgM. Geralmente apresenta um curso mais prolongado que o mieloma múltiplo. Há uma pro-liferação de células que lembram os linfócitos em lugar de células plasmáticas. Elas produzem molé-culas completas de IgM e, muitas vezes, excesso de cadeias leves. A elevação do teor de IgM pro -move o aumento da viscosidade plasmática com tendência à trombose. Epistaxe, hemorragias reti-nianas, confusão mental e insuficiência cardíaca conges tiva são manifestações típicas da síndrome de h iperviscosidade. O diagnóstico e o acompa-nhamento da macroglobulinemia são realizados pelos s egu in tes t e s tes :

§ Eletroferese das proteínas no soro e urina. Devem ser usadas amostras recém-colhidas para evitar erros resultantes da deterioração. Uma urina ao acaso é adequada para a d e-monstração da proteinúria de Bence-Jo nes .

§ Determinação quantitativa das paraproteínas e outras imunoglobul inas no soro. A análise destes resultados permite a diferenciação entre a hipergamaglobulinemia benigna e maligna.

§ Imunoeletroforese ou imunofixação de proteí-nas séricas e urinárias, para determinar o tipo de paraproteína.

§ β2 -Microglobul ina sérica. Para monitorar o progresso da doença; n íveis e levados des tas proteínas indicam um mau prognóstico.

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82 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

§ Uréia e creatinina séricas, para avaliar a fu n-ção renal.

§ Cálcio, fosfatase alcal ina e ácido ú r ico no soro, medidos como índices da extensão do envolvimento ósseo e renovação celular, re s -pectivamente.

Doença da cadeia pesada (doença de Franklin). Compreende um grupo de condições raras nas quais os fragmentos de cadeia pesada correspondentem a porção Fc das imunoglobulinas que são sintet izadas e excretadas na urina. A pro-dução anormal de cadeias pesadas α e γ é a desor-dem mais comum.

Paraproteinemia benigna. Pode ser transitória ou persistente. As paraproteínas ocorrem transit ó-riamente durante infecções agudas em doença auto-imune devido a estimulação de antígeno. Paraproteinemia benigna estável ou persistente pode ocorrer em tumores benignos das células B. São encontradas no diabetes mellitus, infecções crônicas, cirrose e desordens do tecido conjuntivo. São caracter ís t icas desta condição:

§ Concentração de paraproteínas abaixo de 2,0 g/dL (<1,0 g/dL se a paraproteína for IgA).

§ Teores normais de albumina sérica e outras imunoglo bulinas.

§ Período maior que cinco anos sem elevação nas concentrações das paraprote ínas .

§ Mais comum em idades avançadas, isto é, a prevalência é 2% entre 60-80 anos, 10% entre 80-90 anos e 20% para >90 anos.

RESPOSTA DE FASE AGUDA

É uma al teração não específ ica da s íntese e nos níveis plasmáticos de várias proteínas derivadas do fígado após danos teciduais ( trauma, infarto, malignidade) e infecções. É uma resposta à infla-mação que promove o aumento nas concentrações de algumas prote ínas sangüíneas ou tec iduais .

A resposta de fase aguda é mediada pela l ib e-ração de ci toquinas pelos macrófagos at ivados. Em infecções bacterianas isto é induzido pelas endoxinas das bactérias. Vários efeitos sistêmicos acompanham a inflamação como febre, leucoci-tose, al terações endócrinas, modificações no equilíbrio líquido e eletrolítico e proteólise mus-cular.

Proteínas de fase aguda. Este termo é usado para denotar todas as proteínas que al teram a sua concentração em 25% ou mais no período de uma semana após dano tecidual . Entre elas estão: pro -teína C reativa, α1 -antiquimiotripsina, haptoglo -b ina, fatores do complemento e fibrinogênio. Al-gumas destas proteínas são descritas acima. Duas outras medidas são empregadas para avaliar o es tado de fase aguda:

§ Velocidade de sedimentação globular . Modi-ficações na VSG abrangem alterações em vá-rias proteínas (fibrinogênio, α2 -macroglobulinas, imunoglobulinas e albumina) também, como o número e as características das membranas dos eri trócitos.

§ Medidas d as c i toquinas. Com o estabeleci-mento do papel das citoquinas, interleucina 1, interleucina 6 e o fator de necrose tumoral, pelo est ímulo da resposta de fase aguda, foi sugerido as suas avaliações em condições i n -flamatórias. Ainda persistem vários problemas técnicos na determinação rotineira destes componentes .

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84 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

DESORDENS NO METABOLISMO DOS AMINOÁCIDOS

s erros inatos do metabolismo envolvem defeitos enzimáticos que interrompem vias

fisiológicas. Estes impedimentos podem promo-ver:

§ Excesso de precursores tóxicos.

§ Excesso de metabólitos tóxicos.

§ Deficiência de metabólitos essenciais.

Em condições normais, o rim reabsorve mais de 95% dos aminoácidos filtrados, mas alguma modif icação do transportador ou saturação dos mecanismos de reabsorção por elevados níveis plasmáticos podem provocar aminoacidúrias. Muitos distúrbios do metabolismo dos aminoáci-dos são benignos, enquanto outros es tão associa-dos ao retardo mental, retardo do crescimento, convulsões, nefropatia, cirrose hepática e disfun-ção de outros órgãos. As aminoacidúrias são de dois t ipos principais – excesso de fluxo e renal.

Excesso de f luxo. São as que acompanham os teores plasmáticos elevados de aminoácidos quando os túbulos renais são incapazes de reab-sorver as concentrações elevadas dos aminoácidos no fil trado glomerular – ou seja, a capacidade de reabsorção máxima tubular renal é excedida.

Renais. São condições associadas à excreção urinária aumentada de um ou mais aminoácidos, enquanto a concentração dos aminoácidos pla s -mático dos mesmos são normais. Estas condiç ões tem em comum um defeito no mecanismo de transporte tubular renal de um ou mais aminoáci-d o s .

HIPERFENILALANINEMIAS

As hiperfenilalaninemias são um grupo de desor-dens resultantes do impedimento da conversão de fenilalanina à t irosina. Esta via é catalisada pela enzima feni lalanina hidroxi lase, encontrada em quantidades apreciáveis somente no fígado e rim.

A feni lcetonúria (PKU) é um erro inato do metabolismo causado pela ausência (PKU clás -s ica, t ipo I) ou deficiência parcial (tipo II) da enzima fenilalanina hidroxilase, que converte a fenilalanina em tirosina. Na falta desta enzima, a fenilalanina acumula no sangue, sendo metaboli-zada por outra via produzindo catabólitos alterna-tivos, tais como, ácido fenilpirúvico, ácido feni-lláctico, ácido fenilacético e o seu conjugado com a glutamina, a fenacetilglutamina. Estes metabó-li tos são rapidamente excretados na urina, resul-tando em fenilcetonúria. Este distúrbio ocorre com uma freqüência de 1 para 10.000 nascimentos, apresentando sinais clínicos nas primeiras sema -nas de vida; cr ianças não-t ra tadas podem desen-volver retardo mental e redução na expectativa de vida. Crianças afetadas apresentam-se normais ao nascimento e os primeiros sintomas são gera l-mente inespecíficos – desenvolvimento retardado, dificuldades na alimentação e vômitos, as vezes suficientemente severo para sugerir estenose piló-rica. Os pacientes também tendem a demonstrar uma hipopigmentação. Isto ocorre porque a feni-lalanina é um inibidor competitivo da tirosinase, a enzima que inicia a via de produção da melanina. Níveis aumentados de fenilalanina também redu-zem os teores de noradrenalina, mielina e seroto -nina. Esta condição pode contribuir para os sinto-mas neurológicos. A pesquisa desta enfermid ade é, geralmente, realizada na segunda semana de vida do paciente, quando os níveis de fenilalanina estão aumenta-dos, mas ainda não iniciou o processo de retardo mental. O aumento do ácido fenilacético encon-trado no suor e urina causa um odor murídio (s e-melhante ao do rato). Outra forma de hiperfenilalaninemia é conhe-cida como hiper feni la laninemia neonatal t ransi-ente. Esta desordem é causada pelo retardo na maturação hepática do sistema enzimático da fe-nilalanina hidroxilase. Esta condição não é um defeito inerente; os níveis de fenilalanina podem atingir 12 mg/dL inicialmente mas, progressiv a-

O

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Aminoácidos e proteínas 85

mente, vão declinando até alcançar os valores normais.

TIROSINEMIA E DESORDENS RELACIONADAS

A tirosinemia tem várias formas, todas acompa-nhadas por tirosinúria e acidúria fenólica. A tiro -sina é essencial para a s íntese protéica e serve como precursora da tiroxina, melanina e cateco-laminas. A tirosina é proveniente da dieta protéica como também da hidroxilação da fenilalanina.

TIROSINEMIA I (TIROSINOSE)

A tirosinemia I (tirosinose, tirosinemia hepatorre-nal) é uma desordem rara (1 para 100.000 nasci-mentos) caracterizada pela excreção do ácido p -hidroxifenilpirúvico, quando o paciente es t á sob dieta normal e excreção de metabólitos da tirosina e pequenas quant idades de ácido p-hidróxifenilacético, quando a dieta inclui ex-ces so de t irosina. Acredita-se ser causada pela ativ idade reduzida da enzima ácido fumari laceto-acetato hidroxi lase como também da ácido p -h i -droxi feni lpirúvico oxidase (PHPPA oxidase) . A perda da atividade enzimática provoca níveis ele-vados de tirosina no sangue e urina e da metionina no sangue. Aumentos nos n íveis sér icos de α-fetoproteína estão também associados com esta desordem. O dano hepático resulta em insuficiê n-cia aguda e, em alguns casos mais graves, em cirrose. A lesão renal leva à síndrome de Fanconi.

TIROSINEMIA II

É uma deficiência da enzima hepática t i rosina aminotransferase que catalisa o primeiro estágio do catabolismo da t irosina. As carecterist icas clí-nicas são: lesões oculares (erosão da córnea), lesões da pele , das palmas das mãos e solas dos pés. Estas lesões oculares e na pele são provavel-mente secundárias a formação intracelular de cristais de tirosina, que induz à inflamação. Ob -serva-se, ocasionalmente, retardo mental.

Elevados níveis de t i rosina são encontrados no sangue e urina, também como valores aumentados de ácidos fenólicos e tiramina na urina. Diferente da t i ros inemia I, a metionina plasmática não está elevada. No sedimento urin ár io são encontrados cristais em forma de agulha.

TIROSINEMIA NEONATAL TRANSIENTE

Neste distúrbio os teores de t i rosinemia estão elevados em crianças prematuras e nascituras de a termo mas com baixo peso; apresentam imaturi-dade hepática e limitada capacidade de sintetizar as enzimas apropriadas. Com o fígado maduro, a tirosina acumulada volta ao normal em 48 sema -nas .

CISTINÚRIA

Esta desordem não é do metabolismo dos aminoá-cidos, mas de defei to no transporte de cist ina pelas células dos túbulos renais e intestino, sendo transmitida como uma característica autossômica recessiva. Nesta desordem também são excretados outros aminoácidos como a lisina, arginina e o r-nitina, mas o único que cristaliza é a cistina. A incidência deste destúrbio está entre 1 para 10.000 (homozigóticos) e 1 para 20.000 (heterozigóticos) nascimentos. A única manifestação clínica da doença – a fo rmação de cálculo urinário – inicia quando as concentrações urinárias de cistina excedem 30 mg/dL, o que ocorre durante a infância com inci-dência máxima na terceira década de vida. Fre -qüentemente são formados cálculos múltiplos que tendem a recorrência depois de removidos. Os cálculos de cis t ina são branco-amarelados e muitas vezes são moles mas podem também ser densamente granulares. A detectação de cristais de cistina (hexagonais) no sedimento urinário pode ser indicativo de formação de cálculo de cist ina.

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86 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

CISTINOSE

É uma doença de causa desconhecida caracteri-zada por defeito no processo de transporte através das membranas l isossomais com deposição de cristais de cistina. Manifestações sistêmicas sérias resul tam desta deposição. Os cristais se acumulam no fígado, r ins, baço, medula óssea, nódulos l in -fáticos e córnea do olho. A cist inose ocorre em cerca de 1 para 40.000 nascimentos. O tipo nefropático da cistinose surge durante a infância. Estas crianças demonstram deficiê ncia no crescimento, raquitismo, acidose e aumento da excreção renal de potássio, glicose, fosfato e ami-noácidos. Esta aminoacidúria renal é, muitas v e-zes, designada como aminoacidúria generalizada em razão da perda paralela de outros aminoácidos na urin a. Quando exist ir defeito nos túbulos pro-ximais renais com glicosúria, aminoacidúria, fo s -fatúria, proteinúria e, as vezes, acidose, a cisti-nose é conhecida como s índrome de Fanconi . Na forma grave há fotofobia e pode resultar em morte como resultado da insuficiência renal. Outra forma de cistinose – de início tardio, intermediária ou adolescente – não manifesta s in -tomas até a idade de 18 meses a 17 anos. A lesão é menos severa e os pacientes não apresentam sín -drome de Fanconi . O progresso do dano glomeru-lar é mais lento que os casos t ípicos nefropáticos. Existe também uma forma benigna ou adulta de cistinose, onde se encontram cristais de cistina na córnea, leucócitos e medula óssea. Estas pessoas não apresentam disfunção renal ou retinopatia.

SÍNDROME DE HARTNUP

Nesta condição há aumento na excreção urinária de alanina, treonina, glutamina, serina, aspara -g ina, valina, leucina, isoleucina, fenilalanina, t irosina, triptofano, histidina e citrulina, resul-tando em aminoacidúria renal. A incidência é de 1 para 18.000 nascimentos. Muitos pacientes com síndrome de Hartnup apresentam deficiência de nicotinamida, pois o triptofano é convertido em ácido nicotínico e n i-cotinamida em humanos. O triptofano é pobre-mente absorvido nestes pacientes e , devido a má

absorção, a deficiência de nicotinamida torna-se manifesta pelo exantema da pelagra que aparece no primeira década de vida. Existem manifesta-ções neurológicas, dor de cabeça, dificuldades em concentrar-se, fraqueza dos membros e ataxia. A cistinúria e síndrome de Hartnup produzem aminoacidúria por defeitos no transporte tubular renal e , portanto, são as vezes designadas como aminoacidúrias secundárias. Estas aminoacidúrias também podem ser devidas a doenças dos r ins (cist inose) onde há disfunção tubular renal gene-ralizada, doença hepática ou desnutrição. Se, por outro lado, as aminoacidúrias são resultantes de defeitos enzimáticos das vias onde os aminoácidos são metabolizados, elas são designadas como ami-noacidúrias pr imárias.

ALCAPTONÚRIA (ACIDÚRIA

HOMOGENTÍSICA)

É caracterizada pela excreção urinária do ácido homogentísico (ácido diidroxifenilacético) por deficiência da enzima homogent isato dioxidase, que catal isa a t ransformação do ácido homogentí-sico em ácido maleil acetoacético. É uma desor-dem rara com incidência de 1 para 250.000 nasci-mentos . Em crianças encontram-se o escurecimento da urina após exposição ao ar ou à luz do sol ou pela adição de álcali. Ela persiste durante a vida ge-ralmente sem consequências graves e pode não ser diagnosticada até a idade madura. O acúmulo de polímeros de ácido homogentísico nas células causam pigmentação escura nas cart i lagens e no tecido conjuntivo além de alterações artrí t icas.

DOENÇA URINÁRIA EM XAROPE DE

BORDO

É assim chamada devido ao odor característ ico comunicado à ur ina dessas pessoas pelos α-cetoá-cidos. Está associada com anormalidades no me -tabolismo de aminoácidos de cadeias rami ficadas como a leucina, isoleucina e valina nos líquid o s biológicos. É uma desordem hereditária autos s ô -

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Aminoácidos e proteínas 87

mica recessiva que envolve defeito da enzima l ipoato-oxidorredutase dos α-ce toác idos de c a-deia ramif icada que catalisa a descaboxilação oxidativa de cada um dos t rês α-cetoácidos, lib e-rando o grupo carboxila como CO2 produzindo o derivado acil-CoA. A incidência desta desordem é de 1 para 200.000 nascimentos. A doença é tratada por dieta. Quando não d e-tectada ou não tratada rapidamente, a desordem resulta em lesão cerebral severa e morte, que ocorre em geral no primeiro ano de vida. Os sin -tomas incluem vômitos, convulsões, letargia, aci-dose, falta de apetite e hipoglicemia.

HOMOCISTINÚRIA

As homocist inúrias são desordens cara cterizadas pela aumento na concentração da homocisteína nos tecidos do corpo. A incidência é de 1 para 200.000 nascimentos. A homocis t inúria clássica é a deficiência ou ausência da enzima hepática de cis ta t ionina β-s intase , que catalisa a formação de cistationina a partir da homocistina e serina no metabolismo da metionina. O bloqueio causa o acúmulo sangüíneo e urinário de metionina, homocisteína e homocis -tina. Além da metionina, a urina pode conter n í -veis aumentados de outros aminoácidos contendo enxofre. Os sintomas não se manifestam logo após o nascimento, mas se desenvolvem com a idade. Uma das manifestações mais comuns é o ectopia do cristalino. Ocorrem também anormalidades esquelét icas como a osteoporose intensa. O re -tardo mental não é um achado cons is tente . As complic ações que podem levar a morte são cardi-ovascu lares. Estes pacientes tem al terações nas plaquetas e tendência para eventos a t romboem-bólicos.

ALBINISMO

O albinismo é o resultado da ausência ou defic i-ência da enzima t irosinase que converte a tirosina em melanina. Foram identificados dois tipos de albinismo (defeitos genéticos autossômicos reces-sivos) dependendo da quantidade de melanina produzida. O albinismo do tipo I ocorre com a freqüência de 1 para 10.000 nascimentos. Ne -nhuma melanina é produzida nestes pacientes e os olhos, cabelos e pele são afetados. A visão f ica bastante comprometida. No tipo II uma pequena quantidade de mela -n ina é produzida e a visão não é tão afetada quanto no t ipo I . O t ipo I e o t ipo II são defei tos genét icos recessivos diferentes. A freqüência de ocorrência do tipo II é de 1 para 60.000 nasci-mentos .

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88 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

MUCOPROTEÍNAS (SEROMUCOIDES)

s proteínas plas máticas, à exceção das imunoglobulinas e hormônios protéicos, são

sintet izadas no fígado, e chegam à corrente san-gü ínea, c i rculando entre o sangue e os espaços extracelulares. Este movimento ocorre não apenas pela difusão passiva por meio das interfaces e ntre células endoteliais, mas também por causa dos mecanismos ativos de transporte. Em face desse movimento, a maioria dos fluidos extravas culares normalmente contêm pequenas quantid ades de proteínas plasmáticas que se l igam a carboidratos.

Compostos forma dos por prote ínas e carboi-dratos são classificados em dois grupos: glic o-prote ínas e mucoproteínas . Estão presentes nos seguintes compostos: hexoses (galactose ou ma -nose); hexosaminas (glicosamina ou galactosa-mina); metilpentose (fucose) e ácido siálico (Ácido N-acetilneuramínico). A fração protéica é composta de transferrina, ceruloplasmina e hapto-globina. As glicoproteínas são aquelas proteínas unidas a carboidratos com menos de 4% de hexosamina (e até 15% de carboidratos). As mucoproteínas , por sua vez, contêm mais que 4% de hexosamina (e 10 a 75% de carboidra-tos) . Em quantidades variáveis; as mucoproteínas estão presentes em todas as frações globulínicas, sendo de interesse cl ínico a α1 -glicoproteína ácida. As mucoproteínas do soro normal migram, principalmente, junto à α1 -globulina, enquanto as de um soro patológico correm com a fração α2 -globulina.

SIGNIFICAÇÃO CLÍNICA DAS MUCOPROTEÍNAS

Apesar do papel exato das mucoproteínas ser des-conhecido, elas estão associadas com a inflama -ção; níveis e levados são encontrados após episó-dios de inflamação aguda. Valores aumentados (em geral 8 a 12 mg/dL em tirosina) são encontrados na febre reumática,

onde além de orientarem o diagnóstico, permitem a avaliação da atividade inflamatória pois perma-necem al teradas enquanto persis t i r o sur to. Na fase aguda da artri te reumatóide infanto-juvenil , as mucoproteínas apresentam os teores mais elevados, enquanto no adulto aumentam s o-mente em 40% dos casos sem apresentar correla-ção com a duração, grau de atividade e tratamento da doença. As mucoproteínas estão também elevadas no lupus eritematoso disseminado, dermatomiosite, neoplasmas malignos (especialmente aqueles com metástases e grande massa tumoral) , infarto do miocárdio, esclerodermia, reumatismos metabóli-cos ou infecciosos .

Redução das mucoproteínas ocorre na desnutri-ção, enfermidade hepática severa e gastroentero -pat ias perdedoras de prote ínas .

Atualmente, o teste de mucoproteínas está sendo substi tuído com vantagens pela determin a-ção da α1 -g l icoprote ína ác ida (AAG). Esta avali-ação apresenta melhor especificidade, sensibili-dade e adequação ao laboratório por ser menos t rabalhosa.

DETERMINAÇÃO DAS MUCOPROTEÍNAS

Paciente. Não é necessário jejum para a coleta de sangue.

Amostra. Soro ou plasma heparinizado . Separar a amostra logo que possível. Armazenado em re-frigerador, o soro mantém-se inalterado por uma semana.

Métodos. Em anos recentes, a utilidade clínica da avaliação das mucoproteínas foi suplantada pela determinação da α1 -glicoproteína ácida. Co n-sequentemente, existe pouco incentivo em desen-volver e aperfeiçoar este ensaio. Como em nosso meio este teste ainda é utilizado, faz-se a seguir algumas considerações quanto a sua determinação. Vários métodos foram descritos para a deter-minação das pro te ínas presentes nas mucoproteí-

A

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Aminoácidos e proteínas 89

nas, tais como, químicos, eletroforéticos ou por imunodifusão. O mais popular utiliza métodos químicos.

Método químico. É o método mais usado. B a-seia -se na propriedade das mucoproteínas serem so lúveis em ácido perclórico diluído, mas preci-pitar com ácido fosfotúngstico. Este último é la -vado e a quantidade de mucoproteínas é determi -nada colo rimetricamente através do reagente de Folin -Ciocalteau. Estes métodos pecam pela falta de exatidão.

Valores de referência para as mucoproteínas Adul tos 2 a 4,5 mg/dL (em tirosina)

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VALTER T. MOTTA Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Enzimas

Volume

9

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ENZIMAS

s enzimas são proteínas com propriedades catal isadoras sobre as reações que ocorrem

nos sistemas biológicos. Elas tem um elevado grau de especificidade sobre seus substratos acelerando reações específicas sem serem alteradas ou con-sumidas durante o processo. O estudo das enzimas tem imensa importância clínica. Em algumas do-enças as at ividades de certas enzimas são medi-das, principalmente, no plasma sangüíneo, eritró -ci tos ou tecidos. Todas as enzimas presentes no corpo humano s ão sintetizadas intracelularmente. Três casos se destacam:

Enzimas plasma-específicas. Enzimas ativas no plasma utilizadas no mecanismo de coagulação sangüínea e fibrinólise. Ex.: pró -coagulantes: trombina, fator XII, fator X e outros.

Enzimas secretadas. São secretadas gera l-mente na forma inativa e após ativação atuam em locais extracelulares. Os exemplos mais óbvios são as proteases ou h idrolases produzidas no s is-tema digestório. Ex.: lipase, α-amilase, tripsin o-gênio, fosfatase ácida prostát ica e antígeno pros-tát ico específ ico. Muitas são encontradas no san-gue.

Enzimas celulares. Normalmente apresentam baixos teores séricos, mas os níveis aumentam quando são l iberadas a part i r de tecidos lesados por alguma doença. Isto permite inferir a localiza-ção e a natureza das variações patológicas em alguns órgãos, tais como: fígado, pâncreas e mi o-cárdio. A elevação da atividade sérica depende do conteúdo de enzima do tecido envolvido, da ex-tensão e do t ipo de necrose. São exemplos de e n-zimas celulares as transaminases, lactato desidro-genases e tc .

As meias -vidas das enzimas teciduais após liberação no plasma apresentam grande variabili-dade – nos casos de enzimas medidas com propó-si tos diagnóst icos e prognóst icos, podem variar desde algumas horas até semanas. Em condições normais as atividades enzimáticas permanecem constantes, refletindo o equilíbrio entre estes pro-cessos. Modif icações nos níveis de at ividade e n-zimática ocorrem em situações onde este balanço é al terado. As elevações na atividade enzimática são devi-d a s :

Aumento na l iberação de enzimas para o plasma é conseqüência de:

§ Lesão celular extensa, as lesões celulares são geralmente causadas por isquemia ou toxinas celulares, por exemplo: na elevação da ativ i-dade da isoenzima CK-MB após infarto do miocárdio.

§ Proliferação celular e aumento na renovação celular, por exemplo: aumentos na fosfatase alcalina pela elevação da atividade osteoblás-tica durante o crescimento ou restauração ó s -sea após f ra turas .

§ Aumento na s íntese enzimática, por exemplo: marcada elevação na atividade da γ-glutamil t ransferase após a ingestão de álcool .

§ Obstrução de ductos – afeta as enzimas nor-malmente encontradas nas secreções exócri-nas, por exemplo: a amilase e a lipase no suco pancreático. Estas enzimas podem regurgitar para a corrente circulatória se o ducto pancre -át ico-biliar estiver bloqueado.

A

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92 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Redução da remoção de enzimas do plasma devido à insuficiência renal. Afeta as enzimas excretadas na urina, por exemplo: a amilase pode estar elevada na insuficiência renal.

A redução nos níveis de atividade enzimática são menos comuns e ocorrem na:

§ Síntese enzimática reduzida, por exemplo: colinesterase baixa na insuficiência hepática severa pela redução do número de hepatócitos.

§ Deficiência congênita de enzimas, por exe m-p lo: baixa atividade da enzima fosfatase alc a-lina plasmática na hipofosfatasemia congênita.

§ Variantes enzimáticas inerentes com baixa a t iv idade b io lógica , por exemplo, variantes anormais da colinesterase.

A utilidade diagnóstica da medida das enzimas p lasmáticas reside no fato que as al terações em suas atividades fornecem indicadores sensíveis de lesão ou proliferação celular. Estas modificações ajudam a detectar e, em alguns casos, localizar a lesão tecidual, monitorar o tratamento e o pro-gresso da doença . No entanto, muitas vezes falta especificidade, isto é, existem dificuldades em

relacionar a atividade enzimática aumentada com os tecidos lesados. Is to porque as enzimas não estão confinadas a tecidos ou orgãos específicos, pois estão grandemente distr ib uídas e suas a t iv i-dades podem refletir desordens envolvendo vários tec idos .

Na prática, a falta de especificidade é parc i-almente superada pela medida de vários parâme-tros (que incluem várias enzimas). Como as con-centrações relativas das enzimas variam consid e-ravelmente em diferentes tecidos, é possível, pelo menos em parte, identificar a origem de algumas enzimas. Por exemplo, apesar das enzimas transaminases ALT (GTP) e AST (GOT) serem igualmente abundantes no tecido hepático, a AST (GOT) apresenta concentração 20 vezes maior que a ALT (GTP) no músculo cardíaco. A determin a-ção simultânea das duas enzimas fornece uma clara indicação da provável localização da lesão tecidual. A especificidade enzimática pode tam-bém ser aumentada pela análise das formas isoen-zimáticas de algumas enzimas como na lactato desidrogenase.

A seleção de quais enzimas medir com propó-si tos diagnóst icos e prognóst icos depende de vá-rios fatores. As principais enzimas de uso clínico, juntamente com seus tecidos de origem e aplica-ções cl ínicas são l istadas na tabela 9.1.

Tabela 9.1 Distribuição de algumas enzimas de importância diagnóstica

E n z i m a Principal fonte Pr incipais apl icações c l ín icas

Amilase Glândulas sal ivares , pâncreas , ovár ios Enfermidade pancreá t ica

Amino t rans fe rases ( t r ansa-

minases)

Fígado, músculo esquelét ico, coração, r im,

e r i t r ó c i t o s

Doenças do parênquima hepático, infarto do

miocárdio, doença muscular

Antígeno prostático específico P r ó s t a t a Carc inoma de p rós ta t a

Creat ina quinase Músculo esquelét ico, cérebr o, coração, músculo

liso

Infar to do miocárdio , enfermidades

musculares

Fosfatase ácida P r ó s t a t a , e r i t r ó c i t o s Carc inoma da p rós ta t a

Fosfatase a lcal ina Fígado, osso, mucosa intestinal, placenta, rim Doenças ósseas , enfermidades hepát icas

γ -Glutamil t ransferase Fígado, rim Enfermidade hepatobi l ia r , a lcool ismo

Lacta to desidrogenase Coração, f ígado, músculo esquelét ico, er i t ró-

c i tos , p laquetas , nódulos l infá t icos

Infarto do miocárdio, hemólise, doenças do

parênquima hepát ico

Lipase Pâncreas Enfermidade pancreá t ica

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Enzimas 93

AMILASE

amilase é uma enzima da classe das hidrolases que catalisa o desdobramento do amido e glicogênio

ingeridos na dieta. O amido é a forma de armazenamento para a glicose nos vegetais, sendo constituído por uma mistura de amilose (amido não-ramificado) e amilopectina (amido ramificado). A estrutura do glicogênio é similar ao da amilopectina, com maior número de ramificações. A α-amilase catalisa a hidrólise das ligações α-l, 4 da amilose, amilopectina e glicogênio, liberando maltose e isomaltose. Não hidrolisa as ligações α-1,6. A amilase sérica é secretada, fundamental-mente, pelas glândulas salivares (forma S) e cé-lulas acinares do pâncreas (forma P). É secretada no trato intestinal por meio do ducto pancreático. A s glândulas salivares secretam a amilase que inicia a hidrólise do amido presente nos alimentos na boca e esôfago. Esta ação é desat ivada pelo conteúdo ácido do estômago. No intestino, a ação da amilase pancreática é favorecida pelo meio alcalino presente no duodeno. A atividade amilá-sica é também encontrada no sêmem, testículos, ovários, tubos de Fallopio, músculo estriado, pul-mões e tecido adiposo. A amilase tem massa mo-lecular entre 40.000 e 50.000 daltons sendo, fa-cilmente, filtrada pelo glomérulo renal.

HIPERAMILASEMIA

Pancreatite aguda. Constitui um distúrbio i n -flamatório agudo do pâncreas associado a edema, intumescência e quantidades variadas de autodis-gestão, necrose e, em alguns casos, hemorragia. Os níveis de amilasemia aumentam após 2 -12 h do início do episódio de dor abdominal que é cons-tante, intenso e de localização epigástrica com irradiação posterior para o dorso. A atividade amilásica retorna ao normal entre o terceiro e o quarto dia. Os valores máximos são quatro a seis vezes maiores do que os valores de referência e são at ingidos entre 12-72 h. A magnitude da ele-vação não se correlaciona com a severidade do envolvimento pancreático. Por outro lado, 20% de todos os casos de pancrea t i te apresentam amilase

normal (ex.: muitas pancreatites associadas com hiperlipemia). Outros testes laboratoriais, como a medida da amilase urinária, depuração da amilase, avaliação das isoenzimas da amilase e a medida da l ipase sérica, quando empregados em conjunto com a avaliação da amilasemia, aumentam consi-deravelmente a especificidade no diagnóstico da pancreati te aguda. Apesar de menor uti l idade no diagnóstico da pancreatite, a amilase urinária está freqüentemente aumentada, atingindo valores mais elevados e que persistem por períodos maiores. Além da determinação da amilasemia outros sinais freqüentes são utilizados para avaliar a pancre atite aguda:

§ No momento do diagnóst ico: contagem de leucócitos >16.000/mm3 ; glicemia >200 mg/dL; lactato desidrogenase >2 x normal; ALT (GTP) > 6 x normal.

§ Durante as primeiras 48 horas: diminuição do hematócrito >10%; cálcio sérico <8 mg/dL; pO2 arterial <60 mm/Hg.

Outras causas de hiperamilasemia pancre-ática:

§ Complicações da pancreat i te aguda, tais como: pseudocis to complicadas por hemorragia, as cites e efusão pleural.

§ Lesões traumáticas do pâncreas, incluindo trauma cirúrgico e investigações radiográficas.

§ Carcinoma de pâncreas, com obstrução dos ductos pancreát icos .

§ Abscesso pancreático, onde a amilasemia au-menta ocasionalmente.

Hiperamilasemia não-pancreática:

§ Insuficiência renal por declínio da depuração. Os aumentos são proporcionais à extensão do comprometimento renal.

A

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94 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

§ Neoplasias de pulmão e ovário .

§ Síndrome de Meigs (associação de asci te , efu -são pleural e fibro ma de ovário).

§ Lesões das glândulas sal ivares, caxumba ou cirurgia maxilofacial.

§ Macroamilasemia, encontradas em 1-2% da população como resultado da combinação da molécula de amilase com imunoglobulinas (IgA e IgG) ou outras proteínas plasmáticas normais o u anormais para formar um complexo muito grande para ser filtrado pelo glomérulo; neste evento não ocorre amilasúria aumentada e não indica doença.

Hiperamilasemia por desordens de origem complexa. Com mecanismos desconhecidos ou incer tos :

§ Doença do trato b i l iar como a colecistite aguda com aumentos de até quatro vezes os valo res de referência .

§ Eventos intra -abdominais (não pancreáticos) tais como: úlcera péptica perfurada, obstrução intestinal, infarto mesentérico, peritonite, apendicite aguda, gravidez ectópica rompida, aneurismas aórticos e oclusão mesentérica.

§ Trauma cerebral , a causa da elevação é incerta, mas pode estar associada com trauma das glâ ndulas salivares e/ou abdominais; isto é , dependente de outros órgãos a t ingidos .

§ Queimaduras e choques tra umáticos.

§ Hipermilasemia pós-operatória, ocorre em 20% dos pacientes submetidos a intervenções cirúrgicas – incluindo procedimentos extra -ab-dominais.

§ Cetoacidose d iabét ica ,a hiperamilasemia está presente em 80% destes pacientes sendo mais f reqüente quando os teores de glicemia são >500 mg/dL (a fonte de amilase é incerta).

§ Transplante renal , um quinto dos t ransplanta-dos renais apresentam hiperamilasemia.

§ Alcool ismo agudo.

§ Pneumonia e enfermidades não-neoplásicas.

§ Drogas (opiatos, heroína) por constrição d o esfíncter de Oddi e ductos pancreáticos, com a conseqüente elevação da pressão intraductal , provocando regurgitação da amilase para o soro .

AMILASE URINÁRIA

A hiperamilasúria reflete as elevações séricas da amilase. A atividade da amilase urinária é deter-minada em amostras de urina de uma hora (nestes casos o paciente deve esvaziar completamente a bexiga e desprezar esta urina; todas as urinas c o-lhidas na hora seguinte são reservadas) ou de 24 horas. Na pancreat i te aguda a reabsorção tubular da amilase está reduzida, provavelmente secundá-ria a competição com outras proteínas de baixa massa molecular. A hiperamilasúria ocorre tam-bém em quase todas as s i tuações que elevam a amilase sérica.

DEPURAÇÃO DA AMILASE

A relação·entre a depuração renal da amilase e a depuração da creatinina é útil no diagnóstico dife-rencial da pancreati te aguda. Nesta patologia, a depuração renal da amilase é, geralmente, maior do que a depuração da creat inina causando eleva-ção na relação. O mecanismo responsável por este aumento na depuração é, em parte, atribuído a um distúrbio na reabsorção tubular da amilase (e de outras proteínas de baixa massa molecular) na pancreatite aguda. A fórmula empregada para a depuração é:

%100(mg/dL) urina na creat. soro no Amilase

(mg/dL) soro no creat.(U/dL) urina na Amilase=×

××

Page 53: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 95

As determinações de amilase e creatinina séricas são realizadas em amostras obtidas ao mesmo tempo da coleta de urina. A comparação das duas depurações permite corrigir as alterações na velo-cidade de filtração glomerular, condição esta tam-bém encontrada na insuficiência renal severa. Normalmente, os valores da relação variam entre 1 a 4%, enquanto na pancreati te aguda, fre-qüentemente, estão entre 7 e 15%. No entanto, esta relação não é específ ica, pois apresenta ele-vações na ce toacidose diabética, queimaduras extensas, perfuração duodenal, mieloma, circula-ção extracorpórea e grandes doses intravenosas de corticoesteróides. A relação é normalizada após a atividade da amilase no sangue e urina voltarem aos valores de referência. O cálculo desta relação permite diferenciar a macroamilasemia de outras causas de hiperamilasemia. Em função do tama-nho do complexo de macroamilase sua depuração renal é reduzida, fornecendo em valores abaixo de 1%.

DETERMINAÇÃO DA AMILASE

Paciente. Não é exigida preparação especial.

Amostra. Soro sem hemólise e não-lipêmico. A atividade amilásica necessita de cálcio e cloretos como cofatores. Assim, anticoagulantes quelantes como o citrato, oxalato e EDTA são impróprios para estas amo stras . Urina colhida no período de 1 h ou no per íodo de 24 h sem conservantes . A amilase é uma enzima bastante estável. No soro e urina (livre de contaminação bacteriana) a amilase é estável por uma semana em temperatura amb i-ente ou por vár ios meses sob refrigeração.

Interferentes. Resultados falsamente aumenta-dos: ácido aminossalicílico, ácido etacrínico, grandes quantidades de etanol, aspirina, analgés i-cos narcóticos, anticoncepcionais orais, colinérg i-cos, contrastes radiográficos, cort icoesteróides, pancreozimina, furosemida, rifampina e tiazídicos. Resultados falsamente reduzidos: glicose e fluore-t o s .

Métodos. A amilase é determinada por diferentes métodos. Os principais são: sacarogênicos, amilo-

clásticos, cromolít icos e técnicas de monitoração cont ínua.

Amiloclásticos (Iodométricos). A avaliação amiloclástica (iodométrica) está baseada na capa-cidade do iodo formar cor azul intensa com o amido. Após a ação da amilase sobre um substrato de amido em tempo determinado, a cor azul é medida fornecendo a quantidade de polissacarídio remanescente. O método de Van Loon modificado por Caraway além de empregar um substrato rela -tiv amente estável é eficiente e rápido.

Sacarogênicos. Nestes métodos, o substrato de polissacarídio é hidrolizado pela ação da ami lase com formação de monossacarídios e dissacarídios. O dissacarídio (maltose) forma glicose pela ação de uma maltase. A quantidade de glicose produ-zida indica a atividade amilásica. As unidades Somogyi obtidas neste método expressam o nú-mero de mg de glicose l iberada após incubação. A quantidade de glicose já existente na amostra deve ser considerada ao empregar estes métodos. É bastante empregado em automação.

Ensaios cromolí t icos. Utilizam um substrato de amido ligado a um corante, formando um com-ple xo insolúvel. Após a ação da amilase são pro-duzidos pequenos fragmentos de corante-substrato solúveis em água medidos fotometricamente. Este método é facilmente automatizado.

Monitoração contínua. Sistemas enzimáticos-acoplados são empregados para determinar a ati-vidade enzimática por técnica de monitoração contínua na modificação na absorvância do NAD+ medida em 340 nm.

Outros métodos. Raramente empregados para este propósi to são os métodos turbidimétricos, nefelométricos e de polarização fluorescente.

Valores de referência para a amilase Soro de adul tos 60 a 160 U/dL (Somogyi)

Urina 1500 a 1800 U/d (Somogyi) ou 70-275 U/h

Líquido duodenal 50.000 a 80.000 Ud/L (Somogyi)

Page 54: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

96 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Bibliografia consultada

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Page 55: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 97

LIPASE E TRIPSINA

lipase é uma enzima altamente específica que catalisa a hidrólise dos ésteres de glic erol de

ácidos graxos de cadeia longa (triglicerídios) em presença de sais bil iares e um cofator chamado col ipase . As ligações éster, nos átomos de carbono 1 e 3 são preferentemente rompidas, produzindo dois mol de ácidos graxos de cadeia longa e um mol de 2-acilmonoglicerídio por mol de triglicerídio hidrolizado. Tanto a lipase como a colipase são sintetizadas pelas células acinares do pâncreas. A lipase também é encontrada na mu -cosa intest inal , leucócitos, células do tecido adi-poso, l íngua e lei te.

HIPERLIPASEMIA

A medida da atividade da l ipase no soro, plasma, líquido ascítico e pleural, é usada exclusivamente para o diagnóst ico de desordens pancreát icas , geralmente, pancreatite aguda. Os níveis de lipase são normais nos casos de envolvimento de glâ n-dulas sal ivares.

Pancreatite aguda. A atividade da l ipase au-menta entre 4 a 8 horas, após o início do quadro atingindo o pico máximo em 24 horas. Os valores voltam ao normal entre 8 e 14 dias. Os aumentos da lipase geralmente são paralelo s àqueles da amilase, entretanto, tais aumentos podem ocorrer antes ou após as elevações da amilase. Na pancre-at i te aguda pode-se encontrar normoamilasemia em 20% dos pacientes (em casos de hiperlipemia) mas com hiperlipasemia. A atividade lipásica não é necessariamente proporcional à severidade do ataque.

Complicações da pancreatite aguda. A pan-creati te aguda pode produzir l íquido asc í t ico ou l íquido p leural , ou ambos. Acima de 50% dos pacientes com pancreatite aguda severa desenvol-vem pseudocisto, cuja presença é supei tada quando não há melhora clínica em uma semana

após o ataque. Metade dos pacientes com pseudo-cisto mostram elevações na l ipase sérica.

Pancreatite crônica. A lipase sérica também é uti l izada no diagnóstico da pancreati te crônica; apesar da destruição das células acinares nos últ i-mos estágios da enfermidade resulta em diminui-ção na quantidade da enzima na circulação.

Desordens intra -abdominais agudas. A s vezes o diagnóstico da pancreati te é dificultado por outras desordens intra -abdomi nais com acha-dos clínicos similares: úlceras duodenais ou gás-tr icas perfuradas, obstrução intest inal mesenté-rica e colecis t i te aguda .

Enfermidade renal aguda ou crônica. Nestes casos o aumento da at ividade l ipásica não é tão freqüente nem tão pronunciada como a atividade da amilase.

Obstrução do ducto pancreático. A obs t ru -ção do ducto pancreático por cálculo ou carcinoma de pâncreas pode elevar a at ividade da l ipase sé-rica, dependendo da local ização da obstrução e a quant idade de tecido lesado.

DETERMINAÇÃO DA LIPASE

Paciente. Não é exigido cuidados especiais.

Amostra. Soro isento de hemólise. É estável por uma semana no refrigerador ou por vários meses a -20 0 C.

Interferentes. Resultados falsamente aumenta-dos: codeína, heparina, morfina, betanecol, cola n-giopan-creatografia retrógrada endoscópica.

Métodos. Essencial para a compreensão da me-todologia usada na avaliação da l ipase é o fato desta enzima atuar na interface éster-água. Deste modo, os subst ra tos para o ensaio devem ser emulsões. A velocidade de reação aumenta com a

A

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98 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

dispersão da emulsão. O emprego de substratos onde a interface éster-água é inapropriada, per-mite a ação de outras enzimas, tais como: éster carboxílico hidrolase, aril-éster hidrolase e l ipase lipoprotéica. Substratos que empregam triglicerí -dios de ácidos graxos de cadeia curta, também permitem falsas reações lipásicas.

Titulometria. Os primeiros métodos práticos para a medida da lipase empregavam uma emulsão tamponada de azeite de oliva como substrato. O soro a ser testado era incubado por 24 h com o substrato e os ácidos graxos liberados eram titula-dos com hidróxido de sódio a 0,05 M, usando a fenolftaleína como indicador.

Turbidimetria ou nefelometria. São métodos simples e rápidos que monitoram a redução da turvação de uma emulsão de azeite de oliva como resul tado da ação da l ipase sobre o substra to .

Enzimáticos. A lipase hidroliza o substrato contendo triglicerídios produzindo glicerol livre que é quantif icado por diferentes métodos.

Valores de referência para a lipase Adul tos 0,1 a 1,0 Ud Cherry -Crandall ou

28 a 280 U/L (intern acionais)

TRIPSINA

A tripsina é uma enzima proteolítica produzida no pâncreas, na forma precursora de tr ipsinogênio inativo. O tripsinogênio é convertido em tripsina no duodeno pela enteroquinase. A at ivação do

tripsinogênio no duodeno, em lugar de intra -pan-creática, evita a autodisgestão proteolítica do pân-creas. A tr ipsina está presente nas fezes de crian-ças pequenas, com redução dos teores em crianças maiores e em adultos, em virtude da des truição da tr ipsina por bactérias intest inais . A ausência de tr ipsina nas fezes é encontrada em pacientes com insuficiência pancreática, fibrose cística (avan-çada), má absorção em crianças, e pancreatite (crônica).

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Page 57: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 99

FOSFATASE ALCALINA

fosfatase alcalina (FA) pertence a um grupo de enzimas relativamente inespecíficas, que

catalisam a hidrólise de vários fosfomonoésteres em pH alcalino. O pH ótimo da reação in vitro está ao redor de 10, mas depende da natureza e concentração do subs trato empregado. A fosfatase alcalina está amplamente distribu-ída nos tecidos humanos, notadamente na mucosa intestinal, f ígado (canalículos biliares), túbulos renais , baço, ossos (osteoblastos) e placenta . A forma predominante no soro em adultos normais origina-se, principalmente, do fígado e esqueleto. Apesar da exata função metabólica da enzima ser desconhecida, parece estar associada com o trans-porte l ipídico no intest ino e com processos de calcificação óssea. No fígado, a fosfatase alcalina está localizada na membrana celular que une a borda sinusoidal das células parenquimais aos canalículos biliares. Nos ossos a at ividade da fosfatase alcal ina está confinada aos osteoblastos onde ocorre a forma-ção óssea .

HIPERFOSFATASEMIA ALCALINA

Obstrução intrahepática. Como a fosfatase alcalina está localizada nas membranas de reves -t imento dos canalículos biliares, e enzima está elevada nas desordens do trato biliar. Pelo imp e-dimento do fluxo biliar, a FA sérica atinge 2-3 vezes os valores de referência (podendo chegar a 10-15 vezes), dependendo do grau de estase biliar. Estes aumentos são devidos, fundamentalmente, ao: (a) incremento na síntese da enzima, (b) reten-ção de ácidos biliares no fígado, que solubilizam a fosfatase alcalina e a removem da membrana plasmática dos hepatócitos, e (c) regurgitação da enzima para a circulação pelo impedimento da excreção. As elevações ocorrem em:

§ Lesões expansivas, carcinoma hepatocelular primário, metástases, abscessos e granuloma .

§ Hepati te viral e cirrose , apresentam pequenas e levações nos níveis sér icos da FA.

§ Outras desordens, mononucleose in fecciosa, colangite e cirrose portal.

Obstrução extrahepática. A atividade eleva 3 a 10 vezes os valores de referência na obstrução parcial ou total do colédoco. Encontrados nos cálculos bi l iares e câncer de cabeça de pâncreas.

Enfermidades ósseas. Aumentos na at ividade da FA ocorrem em pacientes com doenças ósseas caracterizadas pela hiperatividade osteoblástica.

§ Doença de Paget (osteí te deformante) , como resultado da ação das células osteoblásticas na tentativa de reconstrução óssea que está sendo reabsorvida pela atividade não-controlada dos osteoclastos. A FA atinge de 10 a 25 vezes o limite superor dos valores de referência.

§ Osteomalácia e raquit ismo, apresentam peque-nos aumentos (2 a 4 vezes) de FA, que declinam após terapia com vitamina D.

§ Hiperparatireoidismo primário e secundário, incrementos pequenos de FA refletem a pre-sença e a extensão do envolvimento ósseo.

§ Tumores ósseos osteoblást icos primários ou secundários, com valores bastante elevados.

§ Fraturas ósseas, pequenos aumentos de FA.

§ Outras desordens, pancreatite aguda e crônica, insuficiência renal crônica, septicemia ex-trahepática, infecções bacterianas intra -abdo-minais, síndrome de Fanconi, t irotoxicose e hi-perfosfatemia transiente benigna em cria nças. Algumas drogas como: cloropromazina, estro -gênios e progesterona.

A

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100 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Gravidez. Aumentos da FA de 2-3 vezes são observados no terceiro tr imestre de gravidez; a enzima adicional é de origem placentária. Au-mentos ou reduções inexplicáveis da FA, predi-zem complicações na gravidez, tais como, hiper-tensão ou pré-eclampsia .

ISOENZIMAS DA FOSFATASE ALCALINA

As principais isoenzimas da fosfatase alcalina encontradas no soro são provenientes do f ígado, ossos, intest ino e placenta . Apresentam consid e-rável heterogeneidade inter e intratecidual, sendo seu estudo um indicativo da origem da elevação. Podem também ser encontradas outras isoenzimas patológicas, como a de Regan e Nagao, presentes em processos neoplásticos. Os métodos emprega-dos na separação es tão baseados nas propriedades físicas e químicas das isoenzimas: inibição quí-mica, técnicas imunológicas, eletroforese e inati-vação térmica.

DETERMINAÇÃO DA FOSFATASE ALCALINA

Paciente. Deve permanecer em jejum por 8 h antes d a coleta.

Amostra. Soro ou plasma heparinizado. Evitar hemólise, pois os eritrócitos contém, aproxima-damente, seis vezes mais fosfatase alcalina que o soro. O ensaio deve ser real izado logo que possí -vel após a coleta; em algumas horas a fosfatase aumenta de 3 a 10% a 25 0 C. Os valores podem estar 25% mais elevados após a ingestão de refe i-ção rica em gorduras.

Interferências. Resultados falsamente elevados: são encontrados em pacientes submetidos a trata-mento com paracetamol, aspirina, agentes anti-fúngicos, barbitúricos, difenilhidantoína, morfina, ant i-concepcionais orais e t iazidas.

Métodos. Como o substrato natural da fosfatase alcalina é desconhecido, foram propostas várias

substâncias que o subst i tuem na aval iação da at i-vidade desta enzima. Deste modo, várias metodo-logias foram propostas com o emprego de dife-ren tes subs t ra tos .

ββ-Glicerofosfato . Os primeiros ensaios publi-cados quantificavam a l iberação do fosfato inor-gânico do subst ra to β-glicerolfosfato, após a ação da enzima presente na amostra. Estes métodos foram abandonados pela pouca sensibil idade e prolongado per íodo de incubação.

P-Nitrofenilfosfato. A atividade da enzima é medida pela quantidade de fenol l iberado do p -nitrofenilfosfato após incubação com o soro, pos-teriormente avaliado por diferentes métodos.

4-Nitrofenilfosfato. É o substra to mais usado atualmente na avaliação da fosfatase alcalina. É medido o produto l iberado após a hidrólise, o 4-nitrofenóxido que é proporcional à atividade da fosfatase alcalina. A modificação proposta por Bowers e McComb é a mais empregada atual-mente.

αα-Naftol monofosfato. Mede a velocidade de formação de α-naftol a 340 nm após incubação.

Valores de referência para a fosfatase alcalina (4-nitrofenilfosfato – Bowers)

Adul tos 20 a 105 U/L Crianças de 0 a 3 meses 70 a 220 U/L Crianças de 3 meses a 10 anos 60 a 150 U/L Jovens de 10 a 15 anos 60 a 260 U/L

Bibliografia consultada

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Page 59: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 101

FOSFATASE ÁCIDA TOTAL E FRAÇÃO PROSTÁTICA

termo fosfatase ácida (FAC) designa um grupo heterogênio não-específico de fosfata-

ses que exibem pH ótimo entre 4,5 e 7, e catali-sam a hidrólise de monoéster ortofosfórico produ-zindo um álcool e um grupo fosfato. A fosfatase ácida é amplamente distr ibuída nos tecidos. A maior atividade é encontrada na glândula prostá-t ica (1000 vezes maior que em outros tecidos), células osteoblást icas do osso, f ígado, b aço, rins, eri trócitos e plaquetas. Em homens adultos, a próstata contribui com quase a metade da enzima presente no soro . Em indivíduos do sexo masculino, a fração prostática representa em torno de 50% da fosfa -tase ácida total , sendo o restante provenie nte do f ígado e de desintegração das plaquetas e er i t ró -citos. Para o sexo feminino é proveniente do fí -gado, eri trócitos e plaquetas. Os níveis de fosfa -tase ácida no soro apresentam importância clínica no diagnóstico e monitorização do câncer prostá-tico, em especial pelo emprego da fração prostá-t ica da fosfatase (FACP).

H IPERFOSFATESEMIA ÁCI DA

Carcinoma prostático. A principal finalidade da determinação da fosfatase ácida prostát ica é o diagnóstico e a monitorização do câncer prostá-t ico, particularmente, da forma metastisada. O carcinoma prostático atinge principalmente ho-mens acima de 50 anos e é classificado em quatro e s tágios A, B, C e D (ver tabela 4.2) com relação também as elevações do antígeno prostático esp e-cíf ico (Ver marcadores tumorais). As elevações da FAC prostát ica são encontradas ao redor de 60% dos homens com câncer metastát ico da próstata (estágio D). No entanto, enquando o câncer per-manece localizado na glândula são encont rados valores normais ou levemente aumentados da a t i-vidade da enzima.

Hipertrofia prostática benigna (HPB). É uma ocorrência relativamente comum em homens acima de 40 anos. O aumento da atividade é

p o s s ível pela regurgitação da enzima no soro por compressão ou obstrução do s is tema ductal pros-tático como resultado da hipertrofia glandular. O d iagnóstico é real izado através de quest ionários de sintomas, toque retal, dosagem de PSA, fluxo -metria e estudo de fluxo de pressão. A etiopatoge-nia da HPB ainda não está adequadamente escla -recida.

Após cirurgia ou terapia anti -androgênica. Os níveis vagarosamente retornam ao normal ou com o subseqüente aumento caso o tratamento não tenha ob t ido sucesso .

Palpação retal. A fosfatase ácida prostát ica no soro, raramente eleva após a palpação. Entretanto, elevações transitórias podem ocorrer após biópsia da próstata, cistoscopia, infarto prostát ico (cau-s ado pelo ato de cateterização) e a bastante rara, ruptura de cis to prostát ico.

Outros aumentos da fosfatase ácida total. Pequenas a moderadas elevações são encontradas, freqüentemente, nas enfermidades ósseas associa-das aos osteoclastos: enfermidade de Paget (avan-çada), hiperparatireoidismo com envolvimento esquelético, invasão maligna do câncer de seio, anemia hemolític a, anemia megaloblástica, mono-nucleose, prostatite, policitemia vera, leucemia mielocítica (e outras enfermidades hematológi-cas), mieloma múltiplo, enfermidade de Niemann-Pick e enfermidade de Gaucher (deficiência da enzima glicerocerebrosidase).

DETERMINAÇÃO DA FOSFATASE ÁCIDA

Paciente. Não é exigido preparo especial.

Amostra. Soro ou plasma heparinizado isento de hemólise e não lipêmicos . Separar o soro ou pla s ma dos er i t róci tos logo que possível . A en-zima é estabilizada na amostra por acidificação (pH ao redor de 5,4). Isto é conseguido pela adi-ção de 50 µL de ácido acético 5 mol/L (alternati-

O

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102 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

vamente, juntar 10 mg de citrato dissódico monoi-drato por mL de soro). Nestas condições a at ivi-dade enzimática é mantida por várias horas em temperatura ambiente ou por uma semana no re -frigerador.

Interferentes. Resultados falsamente aumenta-dos: clofibrato. Resultados falsamente reduzidos: etanol e estrogênio -terapia para o carcinoma de próstata .

Métodos. Vários métodos foram desenvolvidos para avaliar a atividade da fosfatase ácida. Devido a importância da detectação do carcinoma prostá-tico antes de metastizar, esforços tem sido reali-zados no aumento da sensibil idade e especifici-dade das medidas da enzima.

Primeiros métodos. Historicamente, muitos dos ensaios desenvolvidos para medir a at ividade da fosfatase alcalina foram adaptados para a fosfa -tase ácida ut i l izando os mesmos substratos mas utilizando um tampão ácido. O emprego do fenilfosfato em pH 4,9 é uma modificação do método de King-Armstrong para a fosfatase alcalina. Outras adaptações foram reali-zadas com o β-glicerolfosfato ou 4-nitrofenilfos-fato .

Timolftaleína monofosfato. É um substrato auto-indicador com alto grau de especificidade para a FACP. A timolftaleína l iberada após a ação da fosfatase, desenvolve cor em meio alcalino. Fosfatases ácidas provenientes de outros tecidos, reagem em grau bem menor com este substrato. Este método é freqüentemente usado.

Inibição pelo L -tar tarato . A inibição química dife rencia a fração prostática pelo uso de L-tarta-rato. A fosfatase ácida total é determinada por métodos correntes (são uti l izados o 4 -nitrofosfato ou α-naftil fosfato como substrato) e, em seguida, a fração prostática é inibida pelo L-tartarato com nova de terminação da fosfatase ácida. A fração prostática é calculada pela diferença entre as duas determinações. Esta medida não é totalmente es -pecífica para a FACP já que outras isoenzimas

mostram diferentes graus de inibição pelo L-tarta-rato .

αα-Naftol fosfato . Os métodos que empregam o α-naftol fosfato como substrato liberam o naftol – pela ação da fosfastase ácida – que reage com o Fast Red TR para formar um produto colorido. Pouco usado atualmente.

Enzima imunoensaio. Os métodos imunológi-cos es tão ganhando força, principalmente na a u-tomação, por sua especificidade para a FACP. Um anticorpo monoclonal l igado a um suporte sólido une-se a FAC prostát ica. Um segundo anticorpo conjugado a uma enzima (ALP ou peroxidase) liga-se a fosfatase ácida prostát ica; a a tividade da enzima ligada é proporcional aos teores de FACP.

Outros métodos. Radioimunoensaio, cinética fluoremétrica.

Valores de referência para a fosfastase ácida prostática (Roy)

Adul tos 0,5 a 1,9 U/L

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Page 61: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 103

Tabela 9.2. Classificação clínica do câncer prostático

Grau clínico

Descrição, histologia e resultados do exame digital retal e outros exames

Freqüência da elevação da fosfatase

ácida prostática

Freqüência de elevação do

PSA

A 1 Microscópico, não palpável clinicamente com focos menores do

que 5% do tecido examinado 1 1 % 6 7 %

A 2 Microscópico, não palpável clinicamente; com muitas áreas de

mais de5%

B1 Pa lpáve l , tumor macroscóp ico ≤1,5 cm de diâmetro em um

único lobo 2 2 % 7 3 %

B2 Palpável, tumor macroscópico >1,5 cm de diâmetro ou vários

nódulos em ambos os lobos

C1 Tumor com e xtensão extracapsular mas ainda cl inicamente

local izado, palpável , es tendendo - se até a vesícula seminal mas

a inda não f ixado à parede pélvica

3 9 % 8 0 %

C2 Tumor com extensão extracapsular mas ainda cl inicamente

local izado, palpável es tendendo - se na vesícula seminal mas

f ixado na parede pélvica

D 1 Tumor metastático demonstrável limitado três nódulos pélvicos

ou menos 5 8 % 8 8 %

D 2 Tumor metastático demonstrável com nódulos mais extensos ou

metás tase ext rapélv ica (ex . : aos ossos)

Page 62: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 104

AMINOTRANSFERASES (TRANSAMINASES)

s enzimas aspartato aminotransferase, AST (transaminase glutâmica-oxalacética, GOT) e

alanina aminotransferase, ALT (transaminase glutâmica-pinúvica, GPT) catalisam a transferê n-cia reversível dos gru pos amino de um aminoácido para o α-cetoglutarato, formando cetoácido e ácido glutâmico. Estas reações requerem piridoxal fo s fato como coenzima:

Aspar t a to + α- ce tog lu ta ra to D oxalacetato + ácido glutâmico

Alanina + α- ce tog lu ta ra to D p i ruvato + ácido glutâmico

As reações catalisadas pelas aminotransferases (transaminases) exercem papéis centrais tanto na síntese como na degradação de aminoácidos. Além disso, como estas reações envolvem a interconver-são dos aminoácidos a piruvato ou ácidos dicarb o-xílicos, atuam como uma ponte entre o metabo-lismo dos aminoácidos e carboidratos. As aminotransferases estão amplamente distri-buídas nos tecidos humanos. As at ividades mais elevadas de AST (GOT) encontram-se no mi o-cárdio, f ígado, músculo esquelético, com peque-nas quantidades nos rins, pâncreas, baço, cérebro, pulmões e eritrócitos.

AUMENTOS DAS AMINOTRANSFERASES

Desordens hepatocelulares. A AST (GOT) e a ALT (TGP) são enzimas intracelulares presentes em grandes quant idades no ci toplasma dos hepa-tócitos. Lesões ou destruição das células hepáticas liberam estas enzimas para a circulação. A ALT (GPT) é encontrada principalmente no citoplasma do hepatócito, enquanto 80% da AST(GOT) está presente na mitocôndria. Esta diferença tem auxi-l iado no diagnóst ico e prognóst ico de doenças hepáticas. Em dano hepatocelular leve a forma predominante no soro é ci toplasmática, enquanto em lesões graves há l iberação da enzima mi-tocondrial, elevando a relação AST/ALT.

§ Hepat i te aguda. Os níveis de aminotransfera-ses sér icas elevam-se uma a duas semanas a n-

tes do início dos sintomas. Os aumentos podem atingir até 100 vezes os limites superiores dos valores de referência, apesar de níveis entre 20 e 50 vezes, serem os mais encontrados. As atividades máximas ocorrem entre o 7 e 120 dia; declinando entre a terceira e quinta se-mana, logo após o desaparecimento dos s into-mas. Na fase aguda da hepatite viral ou tóxica, a ALT (GPT), geralmente, apresenta atividade maior que a AST (GOT). A r elação AST/ALT é menor que 1. Geralmente, se encontram hiper-bilirrubinemia e bilirrubinúria com pequena elevação dos teores sér icos da fosfatase alca-lina.

§ Cirrose hepát ica. São detectados níveis a té cinco vezes os l imites superiores dos valores de referê ncia , dependendo das condições do progresso da destruição celular; nestes casos, a atividade da AST (GOT) é maior que a ALT (GTP). A dis função hepatocelular provoca a síntese prejudicada da albumina, além do pro -longamento do tempo de protrombina, hiperbi-lirrubinemia, teores de amônia elevadas e ure -mia baixa. A umentos das aminotransferases semelhantes aos encontrados na cirrose, são freqüentes na co lestase extrahepática, carci-noma de f ígado, após ingestão de álcool , du-rante o “delirium tremens” e após administra -ção de cer tas drogas, tais como, opiatos, sali-cilatos ou ampicilina. A relação AST/ALT freqüentemente é ma ior que 1.

§ Mononucleose infecciosa. Pode ocorrer eleva-ções de até 20 vezes os valores de referência, com o envolvimento hepático.

§ Colestase extra -hepát ica aguda. Entre as vá-rias causas estão: retenção de cálculos biliares, carcinoma de cabeça de pâncreas e tumor dos ductos bi l iares.

Infarto do miocárdio. Ao redor de 6 a 8 horas após o infarto do miocárdio, a atividade sérica da AST (GOT) começa a elevar, atingindo o pico

A

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Enzimas 105

máximo (20 a 200 U/mL) entre 18 e 24 horas e, progressivamente, retornando aos valores de refe-rência ao redor do 5 0 dia. A AST (GOT) não altera na angina pectoris, pericardite e enfermidade vas-cular miocárdica.

Distrofia muscular progressiva e dermato-miosite. Elevações de 4-8 vezes da AST (GOT) e, ocasionalmente, da ALT (GPT), são encontra-dos. Em geral, estão normais em outras enfermi-dades musculares, especialmente as de origem neurogênica.

Embolia pulmonar. Aumento de 2-3 vezes o normal.

Pancreatite aguda. Provoca aumentos mode-rados de duas a cinco vezes o normal.

Insuficiência cardíaca congestiva. Os níveis de AST podem estar aumentados em graus de leve a moderado, provavelmente, refletindo a necrose hepát ica secundária ao suprimento sangüíneo in a-dequado do f ígado.

Outras desordens. A AST (GOT) apresenta pequenos aumentos na gangrena, esmagamento muscular, enfermidade hemolíticas, distrofia muscular progressiva, dermatomiosite, colangite (inflamação dos ductos biliares) e infecção por paras i tas .

DETERMINAÇÃO DAS TRANSAMINASES

Paciente: Não necessi ta cuidados especiais .

Amostra. Soro isento de hemólise, pois a ativ i-dade das aminotransferases é maior nos eri tróci-tos. A atividade da enzima permanece inalterada por 24 horas em temperatura ambiente e mais de uma semana sob refrigeração.

Interferentes. Valores falsamente aumentados: paracetamol, ampicilina, agentes anestésicos, c lo ranfenicol, codeína, cumarínicos, dife nilhi-

danto ína, etanol, isoniazida, morfina, anticoncep-cionais orais, sulfonamidas e t iazidas.

Métodos. Alguns métodos uti l izados para a d e-terminação da atividade das aminotransferases baseiam-se na formação de cor entre o piruvato ou oxaloacetato e a dinitrofenilhidrazina para formar as hidrazonas correspondentes. A alcalinização da mistura desenvolve cor proporcional à conversão dos cetoácidos à hidroxiácidos. A dinitrofenilh i-drazina também reage com o α-cetoglutarato pro-vocando interferências. Estes métodos são obso-le tos .

Monitorização contínua. O piruvato ou oxalo-acetato formados pela ação das aminotransferases são acoplados a uma segunda reação onde o piru -vato (pela ação da ALT) ou oxaloacetato (pela ação da AST) são reduzidos pela NADH em rea-ção catalisada pela lactato d esidrogenase (para a ALT) ou malato desidrogenase (para a AST). A transformação da NADH por oxidação à NAD + é monitorada em 340 nm. É adicionado piridoxal 5’-fosfato para suplementar o teor de coenzima no soro e assim desenvolver ativid ade máxima. Este princípio é utilizado na tecnologia de química seca (DT Vitros).

Valores de referência a 37 o C (U/L) AST (GOT): 5 a 34 ALT (GTP): 6 a 37

Bibliografia consultada

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Page 64: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

106 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

GAMA-GLUTAMILTRANSFERASE

γ-glutamiltransferase (γ-GT) catalisa a trans -ferência de um grupo γ-glutamil de um peptí -

dio para outro peptídio ou para um aminoácido produzindo aminoácidos γ-glutamil e cis tenil-glicina. Está envolvida no transporte de aminoáci-dos e peptídios através das membranas celulares, na s íntese protéica e na regulação dos níveis de glutatião tecidual. A γ-GT é encontrada no fígado, rim, in test ino, próstata , pâncreas, cérebro e cora-ção .

AUMENTOS NA ATIVIDADE DA γ-GT

Apesar da atividade enzimática ser maior no rim, a enzima presente no soro é de origem, principal-mente, do sistema hepatobiliar. No f ígado, a γ-GT está localizada nos canalículos das células hepáti-cas e, particularmente, nas células epiteliais que revestem os ductos biliares. Deste modo, o princi-pal valor clínico na avaliação da γ-GT é no estudo das desordens hepatobil iares . O grau de elevação é úti l no diagnóstico diferencial entre as desor-dens hepáticas e do trato bil iar .

Obstrução intra -hepática e extra -hepática. São observados os maiores aumentos (5-30 vezes os l imites superiores dos valores de referência) nas coles tases do t ra to biliar – processo patoló -g ico primário da cirrose biliar, colestase intra -hepática e obstrução biliar extra -hepática. A γ-GT é mais sensível e duradoura que a fosfatase alca-lina, as t ransaminases e a nucleotidase, na detectação de ic ter íc ia obstrut iva , colangi te e colecis t i te . Além disso, a γ-GT é útil na diferenci-ação da fonte de elevação da fosfatase alcalina – a γ-GT apresenta valores normais nas desordens ósseas e durante a gravidez. A γ-GT é particula r-mente importante na avaliação do envolvimento hepatobiliar em adolescentes, pois a atividade da fosfatase alcal ina está elevada durante o cresci-mento ósseo .

Nas doenças hepatocelulares incluem também a elevação das transaminases, bilirrubinas, tempo de protrombina prolongado e hipoalbuminemia.

Enfermidades hepáticas induzidas pelo álcool. A liberação da γ-GT no soro reflete os efeitos tóxicos do álcool e drogas (ex.: fenitoína) sobre as estruturas microssomiais das células h e-pát icas. A γ-GT é um indicador do alcoolismo, particularmente, da forma ocult a. Em geral, as elevações enzimáticas nos alcoólatras variam e n-tre 2-3 vezes os valores de referência. Por outro lado, a ingestão de álcool em ocasiões sociais não aumenta, significativamente, a γ-GT. Estes en-s aios são úteis no acompanhamento dos efeitos da abstenção do á lcool . Nestes casos , os n íveis vol-tam aos valores de referência em duas ou três semanas, mas podem elevar novamente se o uso do álcool é retomado. Em vista da susceptibili-dade da indução enzimática, a interpretação da γ-GT em qualquer caso, deve ser realizada à luz dos efei tos de drogas e álcool . O diagnóst ico do uso de álcool pode ser complementado pelos se-gu in tes t e s tes :

§ Volume celular médio (VCM) dos eritrócitos. O valor diagnóstico da γ-GT é aumentado quando a macrocitose é encontra da pela medida do VCM.

§ Tranferrina deficiente em carboidratos (CDT). Em pacientes com doença induzida pelo álcool, a transferrina plasmática tem um reduzido conteúdo de carboidratos (ácido siálico). O teor de CDT plasmático está aumentado em, aproximadamente, 90% dos pacientes que inge-rem mais de 60 g de álcool por dia.

§ Etanol sangüíneo .

Hepatite infeciosa. Aumentos de 2 a 5 vezes os valores de referência; nestes casos a determinação das aminotranferases (transaminases) é de maior utilidade.

A

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Enzimas 107

Neoplasmas. Primários ou secundários apre-sentam atividade da γ-GT mais intensa e mais precoce que outras enzimas hepáticas.

Esteatose hepática (fígado gorduroso). É a mais comum das hepatopatias alcoólicas, mas também é descrita em outros quadros, como: h e-pati tes medicamentosas, gestação, nutr ição pa-renteral , cort icoterapia, diabetes e nas desnutri-ções protéicas. Pequenos aumentos (2 a 5 vezes o valor superior de referência) ocorrem pela indução das enzimas microssomiais pelo álcool. Nas outras condições os aumentos são menores .

Drogas. A γ-GT está presente em grandes quan-t idades no re t ículo endoplasmático l iso e, por-tanto, suscept ível a indução de aumento da sua at ividade por drogas, tais como a fenitoína, warfa -rina e fenobarb ita l . Nes tes casos , as e levações a t ingem níveis 4 vezes maiores que os limites superiores dos valores de referência.

Fibrose cística (mucoviscidose). Elevam a γ-GT por complicações hepáticas decorre n te s .

Câncer prostático. São encontrados níveis mo-deradamente elevados. Outros t ipos de câncer com metástase hepática também provocam aumentos da enzima.

Outras condições. Lupus eri tematoso sistêmico e hipertireoidismo.

Atividade normal da enzima é encontrada em enfermidades ósseas (enfermidade de Paget, neo-plasma ósseo), em crianças acima de u m ano e em mulheres grávidas saudáveis – condições em que a fosfatase alcalina está aumentada. Apesar da γ-GT ser encontrada no pâncreas e rins, a enzima não eleva em desordens nestes órgãos a menos que exista envolvimento hepático.

DETERMINAÇÃO DA γ-GT

Paciente. Deve permanecer em jejum por 8 h o-ras, à exceção da ingestão de água. Além disso, não deve ingerir álcool durante 24 horas antes da prova.

Amostra. Soro sangüíneo. Estável por uma s e-mana em temperatura ambiente. Quando conge-lada é estável por 3 meses.

Métodos. Os primerios métodos de análise da γ-GT empregavam o glutatião como substrato. O desaparecimento do substrato ou a formação de produto era detectada por cromatografia, mano-metria ou absorvância em UV.

γγ-Glutamil-p -nitroanil ina. O substrato mais usado para a anál ise da γ-GT é a γ-glutamil-p -nitroanilida. O resíduo γ-glutamil do substrato doador é transferido para a glicilglicina, liberando a p-nitroanilina, um produto cromogênico com absorvância em 405-420 nm. Esta reação tanto pode ser usada como método de monitorização contínua como de ponto final. Em química seca (DT Vitros) a alteração de reflexo é empregada para calcular a atividade da enzima.

Interferências. Resultados falsamente elevados: fenitoína, fenobarbital, glutemidina e metaqua-lona.

Valores de referência (U/L) Homens: 5 a 25 Mulheres 8 a 40

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Page 66: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

108 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

LACTATO DESIDROGENASE

lactato desidrogenase (LD) é uma enzima da c lasse das oxidorredutases que catal isa a

oxidação reversível do lactato a piruvato, em pre-sença da coenzima NAD+ que atua como doador ou aceptor de hidrogênio.

Lactato + NAD+ + D Piruvato + NADH+ + H+

A LD está presente no ci toplasma de todas as células do organismo. Sendo rica no miocárdio, fígado, músculo esquelético, rim e eritrócitos. Os níveis teciduais de LD são, aproximadamente, 500 vezes maiores do que os encontrados no soro e lesões naqueles tecidos provocam elevações pla s-máticas significantes desta enzima.

ISOENZIMAS DA LACTATO DESIDROGENASE

Devido a presença da lactato desidrogenase em vários tecidos, aumentos dos teores sér icos da mesma é um achado inespecífico. É possível obter informações de maior significado clínico pela separação da LD em suas cinco frações isoenzi-máticas. As isoenzimas de LD são designadas de acordo com sua mobilidade eletroforética. Cada isoenzima é um tetrâmero formado por quatro subunidades chamadas H para a cadeia polipeptí -dica cardíaca e M para a cadeia polipeptídica muscular esquelética. As cinco isoenzimas encon-t rados no soro são :

T ipo Percentagem Loca l i zação

LD-1 (HHHH) 1 4 -2 6 Miocárd io e e r i t róc i tos

LD-2 (HHHM) 2 9 -3 9 Miocárd io e e r i t róc i tos

LD-3 (HHMM) 2 0 -2 6 Pulmão, l infócitos, baço,

pâncreas

LD-4 (HMMM) 8 -1 6 Fígado, músc. esquelético

LD-5 (MMMM) 6 -1 6 Fígado, músc. esquelético

A hemólise produzida durante a coleta e/ou manipulação de sangue, eleva as frações LD -1 e LD-2.

AUMENTOS NA ATIVIDADE DA LD

Infarto agudo do miocárdio. A LD no soro aumenta 8 a 12 horas após o infarto do miocárdio, atingindo o pico máximo entre 24-48 horas; es tes valores permanecem aumentados por 7 a 12 dias (v. adiante).

Insuficiência cardíaca congestiva, mioca r-dite, choque ou insuficiência circulatória. A LD eleva mais do que 5 vezes os valores de referência.

Anemia megaloblástica. A deficiência de fo -lato ou vitamina B 1 2 provoca destruição das célu -las precursoras dos er i t róci tos na medula óssea e aumenta, em até 50 vezes, a atividade da enzima sérica por conta das isoenzimas LD -1 e LD-2 que voltam ao normal após o tratamento.

Válvula cardíaca artif icial. É uma causa de hemólise que eleva as frações LD -1 e LD-2.

Enfermidade hepática. Os aumentos não são tão efet ivos como os das transaminases (amin o-transferases):

§ Hepati te infecciosa tóxica com icterícia, pro -voca aumento de até 10 vezes os valores de re -ferência.

§ Hepati te viral , c irrose e icterícia obstrut iva, apresentam níveis levemente aumentados: uma ou duas vezes os valores superiores de referê n-cia.

Mononucleose infeciosa. Os teores séricos da LD são geralmente altos, talvez porque a LD seja liberada dos agregados das células mononucleares imaturas do organismo.

Enfermidade renal. Especialmente necrose tubular e pielonefri te . Entretanto estes aumentos

A

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Enzimas 109

não estão correlacionados com a proteinúria e outros parâmetros da enfermidade renal.

Doenças malignas. Mostram incrementos da LD no soro, especialmente aquelas com metásta-ses hepát icas. Elevações importantes são encon-tradas n a enfermidade de Hodgkin , câncer abdo-minal e pulmonar.

Distrofia muscular progressiva. Aumentos moderados especialmente nos estágios iniciais e médios da doença: eleva a fração LD -5.

Trauma muscular e exercícios muito inte n-sos. Eleva principalmente a LD -5, dependendo da extensão do trauma.

Embolia pulmonar. A isoenzima LD -3 está elevada provavelmente pela grande destruição de plaquetas após a formação do êmbolo.

Pneumocistose. Em pacientes portadores do vírus da imunodeficiência adquirida. Esta suspeita deve ser confirmada através dos caracteres cl íni-cos e dos níveis de hipoxemia dos gases arteriais .

CORRELAÇÃO CLÍNICA DAS ISOENZIMAS DA LD

As isoenzimas apresentam alterações em várias enfermidades que refletem a natureza dos tecidos envolvidos.

Aumentos da LD -3 ocorrem com freqüência em pacientes com vários t ipos de carcinomas. As isoenzimas LD -4 e LD-5 são encontradas, fundamentalmente, no fígado e músculo esquelé -t ico, com o predomínio da fração LD -5. Assim s endo, os níveis LD -5 são úteis na detectação de desordens hepát icas – particularmente, distúrbios intra -hepát icos – e desordens do músculo esquelé -t ico, como a distrofia muscular. Na suspeita de enfermidade hepática, com LD total muito au-mentada e quadro isoenzimático não-específico, existe grande possibilidade da presença de câncer. A LD pode formar complexos com imunoglo-bulinas e revelar bandas at ípicas na eletroforese. O complexo com a IgA e IgG, geralmente migra entre a LD -3 e LD-4. Este complexo macromole-

cular não está associado a nenhuma anormalidade clínica específica. No infarto do miocárdio tem-se os n íve is da fração LD -1 e LD-2 aumentados, as isoenzimas das quais o miocárdio é particularmente rico (ver adiante).

Além do lactato, a LD pode a tuar sobre outros substra tos , ta is como o α-hidroxibutirato. A subu-nidade H tem afinidade maior pelo α-hidroxibuti-ra to do que as subunidades M. Is to permite o uso deste substrato na medida da at iv idade da LD -l e LD-2, que consistem quase inteiramente d e subu-nidades H. Este ensaio é conhecido como a me -dida da at ividade da α-hidroxibutirato desidroge-nase (α-HBD). A α-HBD não é uma enzima distinta, é, isto sim, representante da atividade da LD -1 e LD-2. A atividade da α-HDB está aumentada naquelas condições em que as frações LD -1 e LD-2 estão elevadas. No infarto do mio cárdio, a atividade da α-HBD é muito similar aquela da LD -l. Foi proposto o cálculo da relação LD/ α-HBD que, em adultos varia entre 1,2 a 1,6. Nas enfermi-dades hepát icas parenquimais , a relação se situa entre 1,6 a 2,5. No infarto do miocárdio , com aumento da LD -1 e LD-2 a relação diminui para 0,8 a 1,2.

LACTATO DESIDROGENASE NA URINA

Elevações da atividade da LD na urina de três a seis vezes os valo res de referência estão associa -das com glomerulonefrite crônica, lupus eritema -toso sistêmico, nefroesclerose diabética e câncer de bexiga e rim. A determinação da LD na urina é afetada pela presença de inibidores como a uréia e pequenos pept íd ios e de possíveis inativações da enzima sob condições de pH adversos na urina.

LACTATO DESIDROGENASE NO LCR

Em condições normais a atividade da LD no lí -qu ido cefalorraquidiano (LCR) é bem menor do que a encontrada no soro sangüíneo. A dis t r ibui-ção is oenzimática é LD 1 >LD3 >LD2 >LD4 >LD5 . No en tanto, estes valores podem aumentar e/ou modi-

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110 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

ficar em presença de hemorragia ou lesão na bar-re ira cerebral sangüínea provocada por enfermida-des que ad icionam LD de origem sistêmica ao LCR. Além disso, as isoenzimas da LD são libera -das das células que se infiltram no LCR. Por exemplo, na meningi te bacteriana, a granulocitose resultante produz elevações da LD -4 e LD-5, en-quanto a meningi te v iral causa linfocitose que provoca elevações da LD -1 e LD-3.

Alguns autores observaram aumentos na fração LD-5 no LCR em presença de tumores metastati-zados, enquanto em tumores cerebrais primários mostram aumento em todas as frações. Em neo-natais, elevações da LD s ão observadas em hemo r-ragias intracraneanas e estão de forma significa-t iva associadas com distúrbios neurológicos com convulsões e hidroencefalia.

DETERMINAÇÃO DA LACTATO DESIDROGENASE

Paciente. Não é exigido preparo especial.

Amostra. Soro ou plasma heparinizado ou LCR. O soro e plasma devem estar completamente isentos de hemólise, pois os eri trócitos contém 100-150 vezes mais LD. Estável por 24 h em tem-peratura ambiente. Não refrigerar.

Interferentes. Resultados falsamente elevados: ácido ascórbico, anfotericina B, barbitúricos, car-bonato de lítio, clofibrato, carbutamina, cefalo -t ina, clonidina, cloridrato de clorpromazina, clori-drato de procainamida, codeína, dextran, floxuri-dina, hormônio tireóideo, lorazepam, meperidina, mitramicina, morfina, nia cina, nifedipina, propra-nolol e metildopa. Resultados falsamente reduzi -dos: esteróides anabólicos, androgênios oxalatos e tiazidas.

Métodos. A atividade da lactato desidrogenase pode ser avaliada em termos da velocidade de transformação do piruvato a lactato. Após incuba-

ção, a quantidade de piruvato consumida é deter-minada pela adição de dini trofeni lhidrazina para formar um composto colorido (hidrazona) medido fotometricamente. Esta metodologia está sendo abandonada em detr imento aos ensaios “cinét i-cos”. Em outro método colorimétrico, a NADH formada reage com sais tetrazólicos para produzir um composto colorido.

Piruvato à lactato. Muitos métodos medem a interconversão de lactato/piruvato uti l izando a coenzima NAD+ e NADH medida em 340 nm. As reações procedem do lactato → piruvato, ou de modo inverso, piruvato → lactato. A velocidade da reação reversa é três vezes mais rápida, permi-tindo o emprego de reagentes mais baratos, amo s-tras pequenas e menor tempo de incubação. En-tretanto, a reação reversa é mais susceptível a exaustão do substrato e a perda de l inearidade. O filme usado em química seca (DT Vitros) contêm os reagentes para o emprego da conversão do piruvato e NADH, em lactato e NAD+.

Valores de referência para a lactato desidrogenase (U/L)

Soro 95 a 225 Urina 42 a 98 Líquido cefalorraquid iano 7 a 30

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Page 69: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 111

CREATINA QUINASE

enzima creatina quinase (CK) catalisa a fo s -forilação reversível da creatina pela adeno-

s ina trifosfato (ATP) com a formação de creatina fosfato. A CK está associada com a geração de ATP nos s is temas contráteis ou de t ransporte . A função fisiológica predominante desta enzima ocorre nas células musculares, onde está envol-v ida no armazenamento de creatina fosfato (com-posto rico em energia). Cada ciclo de contração muscular promove o consumo de ATP com forma-ção de ADP. A creatina quinase está amplamente distribuída nos tecidos, com atividades mais elevadas no músculo es quelético, cérebro e tecido cardíaco. Quantidades menores são encontradas no r im, diafragma, tireóide, placenta, bexiga, útero, pul-mão, próstata, baço, reto, cólon, es tômago e pâncreas. O fígado e eri t róci tos são essencial-mente desprovidos desta enzima.

ISOENZIMAS DA CREATINA QUINASE

A creatina quinase consiste de um dímero com-posto de duas subunidades (B ou cérebro e M ou muscular) que são separadas em três formas mole-culares dis t intas :

§ CK-BB ou CK-1 , encontrada predominante-mente no cérebro. Raramente está presente no sangue.

§ CK-MB ou CK-2 , forma híbrida, predominante no miocárdio.

§ CK-MM ou CK-3 , predominante no músculo esquelét ico .

Estas t rês isoenzimas são encontradas no citosol ou associadas à estruturas miofibrilares. O mú s culo esquelético contém quase inteiramente CK-MM, com pequenas quantidades de CK-MB. A maior atividade da CK no músculo cardíaco é também atribuída a CK-MM com, aproximada-

mente, 20% de CK-MB. O soro normal contém ao redor de 94-100% de CK-MM. A CK-MB está confinada quase exclusivamente no tecido cardí-aco. Níveis elevados de CK-MB são de grande s ignificado diagnóstico no infarto agudo do mi o-cárdio. Existe uma quarta forma que difere das frações anteriores, chamada CK-Mt, localizada no espaço entre as membranas internas e externas das mitocôndrias e corresponde a 15% da atividade da CK total cardíaca. A macro -CK está associada à imunoglobulinas representando 0,8-1,6% da atividade da CK e não está relacionada a nenhuma enfermidade especí-fica. Nas lesões teciduais extensas com ruptura das mitocôndrias, a CK-Mt pode ser detec tada no soro. Sua presença também não está relacionada a nenhuma enfermidade especifíca, mas parece indi-car doenças severas, como tumores malignos e anormalidades cardíacas.

CORRELAÇÃO CLÍNICA DA CK

A atividade sérica da CK está sujeita a variações fisiológicas que interagem e afetam a atividade da enzima, tais como: sexo, idade, massa muscular, atividade física e raça.

Enfermidades do músculo esquelético. Como uma das principais localizações da creatina quinase é o músculo esquelético, os níveis séricos es tão freqüentemente e levados nas lesões des tes tec idos .

§ Distrofia muscular progressiva, particula r-mente a de Duchene (distúrbio recessivo ligado ao cromossomo X) apresenta atividade de CK 50 a 100 vezes os limites superiores dos valo -res de referência. Apesar da CK total ser de grande utilidade n estas desordens , não é uma avaliação inteiramente específica já que eleva-ções também são encontradas em outras anor-malidades do músculo cardíaco e esquelético. Em distrofias como a de Becker e a de Dreifuss

A

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112 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

os níveis de CK sérica são normais ou leve-mente aumentados.

§ Miosi te v iral e polimiosi te apresentam valores bastante elevados de CK; no entanto, doenças musculares neurogênicas, como: miastenia gravis , esclerose múlt ipla, pol iomiel i te e pa-rkinsonismo a atividade enzimática é normal.

§ Hipertermia maligna, uma enfermidade fami -liar rara mas severa caracterizada por febres altas, convulsões e choque e desencadeada pela administração de anestesia geral. Muitos destes pacientes apresentam evidências de miopatia. Atividades bastante elevadas da CK são en-cont radas no es tágio agudo pós-anestesia. P e-quenos aumentos muitas vezes persistem e p o-dem também ser detectados em parentes dos pacientes afe tados .

§ Polimiopat ia necrosante , onde existe destru i-ção do músculo devido ao infarto ou necrose muscular , lesões por esmagamento, alcoolismo, hipertermia maligna, exercícios intensos, mioglobinúria recorrente, certas enfermidades metabólicas hereditárias do músculo, viroses, injeções intramusculares (os aumentos da CK podem persistir por mais de 48 h) e intervenções cirúrgicas.

§ Drogas, elevações em doses farmacológicas: ácido aminocapróico, anfotericina B, carbenoxolone, clofibrato, ciclopropano, danazol, éter dietílico, dietilstilbrestol, halotano, labetalol, lid ocaína, D-penicilina, pindolol, stanozol, quin idina e succinilcolina. Nos casos de abuso ou “overdose” como a amitriptylina, anfetaminas, barbitúricos, etanol, glutetimida, heroína, imipramina e fenciclidina podem aumentar a atividade da enzima dramaticamente.

§ Estados psicót icos agudos, os incrementos são, provavelmente, provocados por anormalidades do músculo esquelét ico.

Enfermidades cardíacas. São comuns os au-mentos da at ividade da CK em situações que en-

volvem o coração, apesar de nem todos os au-mentos indicarem o envolvimento miocárdico.

§ Infarto do miocárd io , ver d iscussão das enzi-mas no infarto do miocárdio (v. adiante).

§ Condições e procedimentos cardíacos, tais como: angina pectoris, choque cardiogênico, cirurgia cardíaca incluindo transplante, taqui-cardia, cateterização cardíaca, arteriografia c o-ronária, insuficiência cardíaca congestiva e a n-gioplastia coronária percutânea transluminal elevam em níveis moderados a CK total ou a CK-2 (CK-MB), ou ambas; estas elevações p o-dem mascarar subsequentes infartos do mi o-cárdio.

§ Miocardite , promove aumentos marcantes da CK-2 (CK-MB).

Enfermidades do sistema nervoso central. Apesar da al ta concentração de CK no tecido c e-rebral, o soro raramente contém CK-1 (CK-BB). Devido ao seu tamanho molecular (80.000), a passagem através da membrana sangue-cérebro é impedida.

§ Lesões no crânio com dano cerebral , nes t e s casos, quantidades signif icantes de CK-1 (CK-BB) podem ser detectadas no soro; a extensão destes aumentos estão correlacionadas com a severidade do dano e também com o prognós-t ico .

§ Enfermidade cardiovascular, n eurocirurgia e isquemia cerebral aumentam a fração CK-3 (CK-MM). A isoenzima CK-1 não eleva.

§ Hemorragia subaracnóidea, paradoxalmente a isoenzima CK-2 (CK-MB) pode ser detectada freqüentemente nestes pacientes. Este achado sugere comprometimento do miocárd io após acidente cerebral.

§ Síndrome de Reye, (desordem da infância ca-racterizada pelo inchamento agudo do cérebro com infiltração gordurosa e disfunção hepática sem icterícia), a CK total está aumentada em

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Enzimas 113

até 70 vezes, principalmente a isoenzima CK-1; a extensão total da elevação da CK parece ser um indicador da severidade da encefalopa-tia.

Enfermidades da tireóide. A atividade da CK sérica demonstra uma relação inversa com a ativ i-dade da t ireóide.

§ Hipotireoidismo, a atividade da CK eleva em 5 vezes os limites superiores de referência, mas os aumentos chegar a 50 vezes e são devidos ao envolvimento do tecido muscular (incremento na permeabilidade da membrana) provavelmente, na redução da depuração de CK como efeito do hipometabolismo; a principal isoenzima presente é a CK-3 (CK-MM), apesar de 13% da atividade da CK ser devida à fração CK-2 (CK-MB), sugerindo um possível envolvimento do miocárdio (de qualquer modo, o hipotireoidismo predispõe à enfermidade ca r-díaca isquêmica).

§ Hipertireoidismo, os aumentos da atividade da CK tendem estar nos limites inferiores de valo-res de referência.

DETERMINAÇÃO DA CREATINA QUINASE

Paciente. Se a dosagem tiver por objetivo a ava-liação de distúrbios da musculatura esquelética, o paciente deve evitar exercícios vigorosos durante 24 h. Não ingerir álcool no dia anterior ao teste. Suspender as drogas que afetam os resultados das dosagens durante 24 h .

Amostra. Soro, plasma (heparinizado) isentos de hemólise, LCR e l íquido amniót ico . Ic terícia e lipemia podem interferir em leituras de absorvân-cias. Em refrigerador e no escuro, as amostras são estáveis por uma semana. A –20 o C conservam-se por mais de um mês.

Interferências. Falsos resul tados aumentados: procedimentos invasivos e outros: cateterismo cardíaco (com lesão do miocárdio), choque elé -t rico, eletrocauterização, eletromiografia, injeções

intramusculares e massagem muscular recente. Drogas: acetato de dexametasona, ácido aminoca-próico, carbonato de lí t io, clofibrato, cloreto de s uccinilcolina, cloridrato de meperidina, codeína, digoxina, etanol, fenobarbital, furosemida, glute-timida, guanetidina, halotano, heroína, imipramina e sulfato de morfina.

Métodos para a CK total. A determinação da atividade da creatina quinase emprega produ tos formados na reação direta (creatina fosfato + ADP) ou inversa (creatina + ATP). Tanto o ATP como o ADP são medidos por reações específicas.

Método de Oliver-Rosalki . Os métodos mais empregados utilizam a reação reversa, onde em condições ót imas se desenvolve seis vezes mais rapidamente que a reação direta. Olivier descreveu uma seqüência de reações onde a transformação de creatina fosfato em creatina e ATP, catalisada pela creatina quinase é acoplada ao sistema hexo -quinase/glicose 6 -fosfato desidrogenase/NADH. A variação na absorvância em 340 nm é medida na avaliação de CK. Rosalki incluiu um tiol ao rea-gente para aumentar a atividade da CK mantendo os grupos sulfidrílicos na forma reduzida. A modi-ficação proposta por Szasz é sensível e apresenta boa precisão e está livre da interferência exercida pela adenilato quinase. Em química seca (DT Vi tros) o ativador N- aceti lcisteína restaura a atividade de CK que inicia a seqüência de reações que culminam com a união da H2 O2 e o corante leuco.

Valores de referência para a creatina quinase (U/L)

Homens 15 a 160 Mulheres 15 a 130

DETERMINAÇÃO DAS ISOENZIMAS DA CK

A separação eletroforética das isoenzimas da CK, foi um dos métodos mais empregados até recen-temente. Os monômeros M e B possuem diferentes cargas, o que permite a separação das diferentes frações. Baseados na carga, também foram desen-volvidos métodos que utilizam a cromatografia t rocadora de íons. Esta técnica está em desuso.

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114 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Principalemnte para a CK-MB, foram desen-volvidos vários métodos imunológicos, dentre os quais , o de imunoinibição que util iza anticorpos CK-M ant i-humano para inibir a CK-MM (ativi-dade muscular). A atividade CK restante, que é proporcional à atividade da CK -MB, catalisa a formação da creatina e ATP a partir da creatina fosfato e ADP. Estas reações são empregadas em química seca (DT Vitros). Ensaios de massa também são usados na de-terminação da atividade da CK-MB. Anticorpos contra a CK-MB são covalentemente l igados a uma superfície sólida. A CK-MB da amostra reage com o anticorpo formando um complexo antígeno-anticorpo. Um segundo anticorpo conjugado com outra enzima (ex.: fosfatase alcalina) é, então, adicionado. Assim, forma -se um complexo anti-corpo-CK-MB-anticorpo. Após a remoção de anti-corpos não-l igados, um substrato é adicionado para reagir com a enzima conjugada ao anticorpo para formar um produto detectável, proporcional a atividade da CK-MB presente na amostra.

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Page 73: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Enzimas 115

OUTRAS ENZIMAS

ALDOLASE

A aldolase (ALD) pertence a classe das l iases encontradas em todas as células do organismo, mas presente em concentrações mais elevadas no músculo esquelético, fígado e cérebro. Em virtude da elevação da aldolase durante a doença ativa do músculo esquelético, sua avaliação ajuda no acompanhamento e evolução de cer tas doenças, como a distrofia muscular progressiva. É necessário pelo menos 30 minutos de re -pouso antes da coleta da amostra para evitar a interferência da atividade muscular. As amostras devem ser livres de hemólise (os eritrócitos apre -sen tam 100 vezes mais atividade que o soro).

Valores de referência: recém-nascidos: <32 U/L; crianças: <16 U/L; adultos: 1,0 a 7,5 U/L (30 0 C).

Valores elevados. Doença do músculo esquelé-tico, principalmente, na distrofia muscular de D u-chenne, dermatomiosit e, polimiosite (no entanto são encontrados valores normais na polimielite, miastenia grave, esclerose múltipla e enfermid a-des musculares de origem neurogênica), infarto do miocárdio, hepatite viral aguda, triquinose, gan-grena, tumores prostáticos, alguma s metás tases hepáticas, leucemia granulocítica, anemia mega-loblástica, “delirium tremens” e drogas (acetato de cortisona, e corticotrofina).

Valores reduzidos. clinicamente insignifican-t e s .

ISOCITRATO DESIDROGENASE

A isocitrato desidrogenase (ICD) é uma enzima que catalisa a descarboxilação oxidativa do isoci-trato a oxalossucinato e α-cetoglutarato no ciclo

de Krebs. É um indicador sensível de doença h e-pática parenquimatosa.

Valores de referência: 2 a 13 U/L (37 0 C).

Valores elevados. Cirrose, hepatite (crônica), infarto pulmonar grave, kwashiorkor, lesões he-páticas infectadas por bactérias, metástases hepá-ticas, mononucleose infecciosa, síndrome de Reye e inflamação aguda do trato biliar.

Valores reduzidos. Necrose hepatocelular (ma-ciça).

5’-NUCLEOTIDASE

Enzima da membrana plasmática que catalisa a hidrólise da maioria dos ribonucleosídios 5’-mo -nofosfato e desoxinucleosídios 5’-monofosfato em nucleosídios correspondentes e or tofosfatos . Trata-se de uma isoenzima da fosfatase alcalina encontrada no parênquima hepático e nas células do ductos bil iares. Sua atividade sérica aumenta de 2 a 6 vezes em doenças hepáticas que interfe-rem com a secreção biliar (cálculo, cirrose biliar etc.) . A sua avaliação ajuda a estabelecer o dia-gnóstico diferencial entre câncer ósseo e hepático, visto que a 5’-nucleotidase raramente está elevada no câncer ósseo. Quando acoplados com elevação da fosfatase alcalina, os níveis de 5’-nucleotidase indicam metástase hepática.

Valores de referência: 2 a 17 U/L;

Valores elevados. Alcoolismo, cirrose, ciru r-gia, colestase fármaco-induzida, disfunção hepá-t ica, metástase hepática e obstrução extra -hepá-tica;

Valores reduzidos. Hepatite.

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116 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

COLINESTERASE

Duas enzimas tem a capacidade de hidrolizar ace-tilcolina para formar colina e o ácido correspon-dente. Uma é a acet i lcol inesterase ou col ineste-rase I encontrada nos eritrócitos, pulmões e baço, terminações nervosas e na matéria cinza do cére-bro, mas não no plas ma. É responsável pela rápida hidrólise da acetilcolina liberada nas terminações nervosas para mediar a transmissão do impulso nervoso a t ravés da s inapse . A outra colinesterase é a acilcolina acilhidro -lase usualmente denominada pseudocolinesterase ou colinesterase II encontrada no fígado, matéria branca do cérebro e soro; sua função biológica não é conhecida. A pseudocolinesterase é uma colinesterase específ ica que hidrol isa tanto ésteres não-colina como a acetilcolina. É encontrada em várias fo r-mas e atua em inativar a acetilcolina. É sintetizada no f ígado e encontrada no plasma. A atividade de enzima é inibida reversivelmente por inseticidas contendo carbamato e irreversivelmente por inse-t ic idas organofosforados. Alguns pacientes exibem apnéia prolo ngada após administração de succinilcolina, um rela-xante muscular. Esta droga é normalmente hidro-lizada pela colinesterase plasmática. Entretanto, ocasionalmente, a droga é ativa por períodos mais

longos, causando apnéia que perdura por várias horas . I s to é ocasionado em razão do desequilíbrio eletrolí t ico e desidratação. Mais de 50% dos paci-entes sensíveis à succinilcolina tem anormalidades geneticamente determinadas na enzima que levam a atividades reduzidas no plasma.

Valores de referência: 3.500 a 8.500 U/L.

Valores aumentados. Alcoolismo, câncer de mama, síndrome nefrótica, obesidade, hiperlip o-proteinemia do tipo IV e psicose.

Valores reduzidos. Anemias, dermatomiosite, desnutrição, doença renal crônica, embolia pul-monar, gravidez tardia, infarto do miocárdio, in -fecções agudas, intoxicação por inseticidas org a-nofosforados, anticoncepcionais orais, estrogênios e doenças hepát icas parenquimatosas .

Bibliografia consultada

BODANSKY, O. , SCHWARTZ, M. K . 5 ’-Nucleotidase. Adv. Cl in . Chem. , 15:4 4 -1 3 6 , 1 9 72 .

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Enzimas 117

INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO (IAM)

infarto do miocárdio consiste em necrose irreversível do miocárdio, que resulta em

geral de trombose numa lesão pré -existente da parede vas cular ou rotura de uma placa aterosclerótica em uma artéria coronária importante. A princípio ocorre isquemia, e se esta for grave e prolongada, segue-se o infarto do miocárdio, cuja extensão depende da artéria coronária obstruída, do grau de circulação colateral e das exigências de oxigênio do tecido suprido pela artéria. Segundo a Organização Mundial de Saúde, a tr íade clássica para a confirmação diagnóstica é formada por:

§ Dor no peito: pré -cordial.

§ Alterações eletrocardiográficas: em especial com elevações do segmento ST e onda Q.

§ Elevações das enzimas cardioespecíficas.

A avaliação enzimática é uma rotina nos paci-entes suspei tos de terem desenvolvido infar to agudo do miocárdio. O infarto deve ser diferenci-ado da angina pectóris, embolia pulmonar e insu-ficiência cardíaca congestiva. Além disso, nem todos os pacientes manifestam os mesmos sinto -mas. De fato, os infartos silenciosos ocorrem em aproximadamente 20% dos casos. Some -se a is to , que as alterações eletrocardiográficas podem estar ausentes ou serem inespecíficas. A s enzimas mais uti l izadas na investigação do infarto agudo do miocárdio são: a creat ina quinase (CK) e a lactato desidrogenase (LD), também como suas isoenzi-mas. A t ransaminase oxalacét ica (TGO) apresenta menor uso. Para aumentar esta especificidade são avaliadas também as isoenzimas da CK e LD.

Nesta seção, considera -se as a l terações enzi-máticas e algumas provas não-enzimáticas utiliza-das para o diagnóstico do infarto do miocárdio e as vantagens e desvantagens de cada t ipo de me-dida. Após a insta lação dos s intomas do infar to agudo do miocárdio se observa, na maioria dos

pacientes , um período durante o qual é possível detectar a elevação das enzimas liberadas pelo tecido miocárdico lesado. Esta relação temporal é part icular para cada enzima e varia de um paciente para outro, ainda que exista um modelo típico (Figura 4.1). De modo geral, estas enzimas devem estar elevadas na ocorrência do infarto agudo do miocárdio (especificidade) e dentro dos valores normais na ausência de infarto (sensibilidade). Geralmente, a diferenciação do infarto pulmo-nar é realizada prontamente, sendo a mesma ca-racterizada pelos níveis elevados da LD e, usual-mente, pelos valores normais de TGO(AST) e CK. Em alguns pacientes com embolia pulmonar, ocor-rem valores discretamente aumentados da TGO(AST) pulmonar ao redor do terceiro ou quar to d ia após o acesso de dor no pei to .

CK-MB

O miocárdio contém expressivas quantidades de CK-MB. Em outros tecidos, a CK-MB é encon-trada em pequenos teores. No miocárdio esta fra -ção pode ser l iberada para o soro em quantidades significantes. A elevação da atividade plasmática da CK-MB (igual ou maiores que 6% da CK total) é o indicador mais específico de l esão miocárdica (98-100% dos casos), particula rmente, de infarto agudo do miocárdio. A CK-MB começa a elevar-se em 4-8 horas a partir da dor precordial, atin -gindo o máximo em 12-24 horas, retornando ao normal, nos casos não complicados, em 48-72 horas. Pacientes que atingem o pico máximo rapi-damente (8-12 h), tem melhor pro gnóst ico do que aqueles que demoram para alcançar o pico (24 h). Atividade aumentada de CK-MB é também encontrada em outras desordens cardíacas. Po r-tanto, aumentos desta fração não são inteiramente específ icos para o infar to agudo do miocárdio mas, provavelmente, refletem algum grau de lesão isquêmica cardíaca. A especificidade para o in -farto pode ser aumentada se os resultados forem interpretados em associação com as isoenzimas da lactato desidrogenase e se medida, seqüencia l-

O

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118 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

mente, por períodos superiores a 48 horas para detectar os aumentos e as reduções t íp icas das enzimas encontradas nestes dis túrbios. A angina pectoris, choque cardiogênico, taquicardia, mi o-cardite e insuficiência cardíaco-congest iva, ge-ralmente, não elevam a CK total nem a CK-MB. Outras situações como: injeções intramusculares, traumatismos, cirurgias não-cardíacas e cateteris-mos cardíacos a CK-MB permanece normal. Ocor-rem elevações nos níveis séricos da CK-MB em estados patológicos descri tos na tabela 9.2.

T abela 9.2. Elevação da atividade sérica da CK-MB em diversos estados patológicos Infar to agudo do miocárdio

Angina severa (em alguns casos)

Fibri lação auricular crônica

Insuf ic iência coronár ia

Síndrome de aplas tamento

Pe r i ca rd i t e

Desfibri lação

Colo cação de marcapasso

Angiograf ia coronár ia

Cirurgia cardíaca de pei to aberto

Massagem cardíaca externa ou ressuscitação cardiopul-

m o n a r

In tox icação por monóxido de ca rbono

Hiper termia mal igna

Dis t rof ia muscular como a de Duchenne

Po l imios i t e

Cirurgia ou in fa r to p ros t á t i co

De rma tomios i t e

Síndrome de Reye

Processos mal ignos

A fração CK-BB pode se transformar na CK-MB, o que explica o aparecimento desta isoenzima em pacientes com câncer de pulmão, desordens cerebrais agudas e outros dis túrbios .

LACTATO DESIDROGENASE

A atividade da LD total aumenta 8 a 12 h a partir da dor precordial, atinge o máximo em 24 a 48 h e permanece elevada por 7 ou mais dias. As eleva-ções são t rês a quatro vezes o v alor de referência superior, mas pode atingir até 10 vezes. A fração

LD-1 apresenta uma trajetória semelhante à LD total, no entanto, devido a sua especificidade teci-dual, a isoenzima tem maior utilidade diagnóstica. Nos infartos com alterações eletrocard iográficas evolutivas, com desenvolvimento de ondas Q (transmural) a LD -1 excede 45% da atividade da LD total , enquanto o infarto não-Q (subendo-cárd ico) geralmente apresenta valores menores do que 45%. Uma causa comum de falsos-posi t ivos com LD-1 elevada é a presença de hemólise, tanto por dificuldades na coleta, transporte ou separação da amostra, como também em presença de válvula cardíaca prostét ica.

O valor da relação LD -1/LD-2 depende do fato que a LD -2 não aumenta após o infarto do mi o-cárdio enquanto a LD-1 o faz. Além disso, a ativ i-dade da LD -1 é geralmente menor do que a LD -2, sendo que os aumentos da at ividade eleva con-sideravelmente após o infarto, com isso a LD -1 excede a LD -2. Ao redor de 80% de todos os in -fartos do miocárdio mostram este tipo de relação. Uma relação maior que 0,7 tem uma sensibilidade diagnóstica de 99%. Deve ser enfatizado que o infarto do miocárdio e a hemólise produzem exa-tamente o mesmo efeito sobre a LD -1 e também sobre os valores da relação LD -1/LD-2. Algumas causas d e aumentos destas frações são mostradas na tabela 9.3.

Tabela 9.3. Causas de aumento da relação LD-1/LD-2 Infar to agudo do miocárdio

Infar to renal agudo

Hemólise causada por

Válvulas cardíacas prostét icas

Anemias hemol í t icas

Anemias megaloblást icas

Manipulação da amostra de sangue

Processos mal ignos

AMINOTRANSFERASES

(TRANSAMINASES)

A TGO (AST) aumenta 6 -8 h após a dor, at ingindo o pico 18-24 h, retornando aos níveis normais em 4 ou 5 dias. A TGO não é específica do tecido cardíaco e também aumenta em enfermidades do

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Enzimas 119

f ígado, pulmão e músculo esquelético. Os valores do pico máximo são 5 a 10 vezes maiores que o limite superior de referência. No entanto, a sensibil idade combinada com a especificidade tem mostrado que a TGO (AST) é uma enzima cardíaca diagnosticamente redun-dan te. Deste modo, esta enzima está sendo grada-tiv amente abandonada no diagnóstico laboratorial do infarto do miocárdio.

TESTES NÃO-ENZIMÁTICOS PARA O IAM

Mioglobina. É uma heme -proteína de l igação do oxigênio presente no músculo esquelético e cardí-aco. Consti tui cerca de 2% da proteína total do músculo e está localizada no citoplasma. Les õ e s celulares durante o infarto agudo do mi ocárdio liberam mioglobina na circulação sangüínea.

0

2

4

6

8

10

12

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16

18

20

0 1 2 3 4 5

Dias após a dor

Ativ

idad

e en

zim

átic

a

CK-MB

LDH-1

TGO total

Figura 4.1. Modelo típico de alterações na ativ idade enzimática após infarto do miocárdio não-complicado.

Os níveis de mioglobina em pacientes com IAM elevam em torno de 2 horas após a dor pre-cordial e seus picos são at ingidos dentro de 6 -9 h

retornando ao normal em 24-36 h após o infarto. O pequeno tamanho da molécula permite que a mioglobina se desloque rapidamente na circulação sangüínea sem uti l izar o sistema linfático. Os teores de mioglobina sofrem elevação nos se-gu in tes casos :

§ Infarto agudo do miocárdio.

§ Cirurgia com coração aberto.

§ Exercício intenso.

§ Lesão do músculo esquelét ico.

§ Pacientes portadores genéticos ou com atrofia muscular progres siva.

§ Deficiência renal grave.

§ Aplicação de injeção intramuscular (variável).

A mioglobina é dosada em 2-12 h após o IAM e apresenta alta sensibil idade e especificidade clínica. Entretanto, resultados falso-posi t ivos podem ocorrer como resultado de lesões no mús-culo esquelético ou por insuficiência renal.

Troponinas. São prote ínas cont idas nas células musculares do aparelho miofibrilar das células que constituem o sarcômero, que é o núcleo básico do aparato contrátil da fibra mu s cular esquelética e cardíaca. São compostas de múlt iplas sub-unidades: t roponina I (subunidade inibidora da actina), t roponina C (subunidade ligada ao cálcio e reguladora da contração) e troponina T (subunidade ligada a miosina – t ropomiosina). A subunidade troponina I existe em três isoformas: duas no músculo esquelét ico e uma no músculo cardíaco. As isoformas mais promissoras para o diagnóstico do IAM são: a troponina T (cTnT) e a troponina I (cTnI). Dados clínicos mostraram que as t roponinas são marcadores precoces do IAM, sendo liberadas praticamente ao mesmo tempo que a CK-MB, permanecendo elevadas por mais de uma semana após o infarto.

Page 78: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

120 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

A troponina I cardíaca aparece no plasma 4 -6 h após o a taque do IAM, at ingindo picos de con-centração em 12-18 h após o infarto. Na fase pre coce que sobrevem o ataque cardí-aco, a cinética da liberação da troponina I é pró -xima a da CK-MB. Todavia, as taxas de troponina I no soro permanecem elevadas durante um perí -odo mais longo (4 a 7 dias). Com isso o acompanhamento do IAM é bem melhor atra vés da troponina I. A troponina T permanece anormal por 6 a 10 dias após o IAM, apresentando as outras características semelhantes à troponina I.

TESTES ENZIMÁTICOS E O

ELETROCARDIOGRAMA Em todos os indivíduos suspeitos de IAM são recomendadas as medidas das atividades das enzimas cardioespecíficas e de testes não-enzimáticos (quando disponíveis) nas primeiras 48 h após o infarto. Em muitos pacientes o eletrocardiograma (ECG) fornece evidências inequívocas do infarto. Entretanto, muitas vezes é possível encontrar dificuldades em interpretá-los, especificamente na presença de arritmias, além do que, o ECG não se apresenta sempre anormal em paci-entes enfartados recentemente. Por outro lado, a avaliação enzimática pode estabelecer uma indicação da extensão do infarto e, assim, estabelecer prognósticos.

As enzimas plasmáticas e o ECG são comple-mentares na investigação de pacientes suspeitos de IAM. A cuidadosa análise das enzimas e do ECG (juntamente com a história do paciente) reduzem sensivelmente os erros cometidos neste diagnóstico. O valor dos testes enzimáticos versus o ECG no IAM são comparados a seguir:

Sensibilidade (%) Especificidade (%) Eletrocardiograma 70 100 Enzimas séricas 95 90

Bibliografia consultada

ANDREOLI, T. E., CARPENTER, C. C. J., BENNETT, J. C., PLUM, F . Cecil: medicina interna básica. 4 ed. Rio de Jane i ro : Guanabara -K o o g a n , 1 9 9 7 . 9 6 5 p .

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VALTER T. MOTTA Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Lipídios, Lipoproteínas e

Apoproteínas

Volume

10

Page 80: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

121

LIPÍDIOS, LIPOPROTEÍNAS E

APOPROTEÍNAS

s l ip ídios são substâncias orgânicas insolú -veis em água, porém solúveis em solventes

apolares . Estão presentes em todos os tecidos e apresentam grande importância em vár ios as pe-ctos da vida. Atuam como hormônios ou precur-sores hormonais, combustível metabólico, comp o-nentes estruturais e funcionais das biomembranas, isolante que permite a condução nervosa e previne a perda de calor. Os lipídios principais no plasma humano são o colesterol , ésteres de colesterol , triglicerídios, fosfolipídios e os ácidos graxos não esterificados (NEFA). Na tabela 10.1 são classifi-cados os l ipídios clin icamente importantes.

Tabela 10.1. Classificação de lipídios importantes clinicamente Derivados esteróis Ésteres do glicerol

Colesterol e seus ésteres Triglicerídios Hormônios esteróides Fosfoglicerídios Ácidos biliares Derivados da esfingosina Vitamina D Esfingomielina

Ácidos graxos Glicoesfingolipídios Cadeia curta (2 a 4 C) Terpenos Cadeia média (6 a 10 C) Vitamina A Cadeia longa (12 a 26 C) Vitamina E Prostaglandinas Vitamina K

A s lipoproteínas são par t ículas que t ranspor-tam lipídios apolares (insolúveis em água) em seu núcleo. Estes complexos são const i tuídos por quantid ades variáveis de colesterol e seus ésteres, triglicerídios, fosfolipídios e apoproteínas, sendo solúveis no plasma devido à natureza hidrófila da parte protéica. Com base na densidade, as l ip o-proteínas plasmáticas são separadas em: quilomi-

crons, lipopro teínas de densidade muito baixa (VLDL), lipoproteínas de baixa densidade (LDL) e lipoproteínas de alta densidade (HDL). Nas ú l-timas décadas acumularam-se evidências relacio -nando os lipídios e lipoproteínas plasmáticas com a aterosclerose.

No estudo das d esordens lipoprotéicas são e m-pregados os seguintes tes tes de ro t ina :

§ Colesterol total.

§ Triglicerídios.

§ Colesterol-HDL.

§ Colesterol-LDL (por cálculo).

§ Relação: colesterol total/colesterol-HDL.

§ Relação: colesterol-LDL/colesterol HDL.

§ Aparência do soro após r efrigeração de 18 H a 4 o C.

§ Lipoproteína (a) [Lp(a)].

§ Apoproteína B (Apo B).

Bibliografia consultada

GLEW, R. H. , NINOYAMA, Y. Clinical studies in medical biochemistry. 2 ed. Oxford : Oxford Univers i ty Press, 1 9 9 7 .

LAKER, M. F . Clinical biochemistry for medica l s tudents. London : Saunders , 1997 . p . 22 -42 .

O

Page 81: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

122 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

COLESTEROL TOTAL

colesterol é o esterol mais abundante nos tecidos humanos. Compõe as lipoproteínas de

baixa densidade (LDL) e membranas celulares sendo, também, substância pre cursora na s ín tese dos hormônios esteróides e ácidos bil iares. O c o-lesterol é derivado do ciclopentano peridro fenan-treno com ligação dupla entre C -5 e C-6, hidroxila no carbono 3 (colesterol livre) e cadeia alifática de 8 carbonos no C-17.

HO

CH3

CH3

Colesterol livre

A ingestão de colesterol é, aproximadamente, 400 a 700 mg/d, enquanto a absorção situa-se ao redor de 300 mg/d. Somente 25% do colesterol plasmático é proveniente da dieta, o restante é sintetizado (1 g/d), funda-mentalmente, pelo fí -gado, a partir do acetil CoA. Parte do colesterol hepático é transformada em ácidos biliares excre-tados pela bi le . Por outro lado, os sais de ácidos biliares formam complexos com o colesterol pro -movendo maior excreção deste composto. O co-lesterol plasmático ocorre tanto na forma livre (30% do total) como esterificado (70% do total). Na forma esterificada, diferentes ácidos graxos (provenientes da lecit ina) estão unidos ao C-3. O colesterol plasmático é afetado tanto por fatores intraindividuais como interindividuais. As medidas da colesterolemia são influenciadas por:

§ Dieta. A quantidade e a composição da gordura da dieta afeta os níveis de colesterol plasmá -t ico. Em particular, aquelas gorduras contendo principalmente ácidos graxos poliinsaturados (ex.: óleos vegetais e peixes) tendem a r eduzir o colesterol circulante, enquanto aquelas gorduras formadas em sua maior parte por gor-duras saturadas (ex.: gorduras animais e ma n-

teiga) tendem a aumentar a colesterolemia. Dietas ricas em fibras reduzem levemente a concentra ção do colesterol. O consumo de uma a três unidades de álcool por dia causa signifi-cante e levação nos teores do colesterol-HDL. Refeições recentes, como também a ingestão de colesterol na dieta, tem pequeno efeito sobre os níveis de colesterol plasmático a curto prazo.

§ Exercícios físicos. Quando executados de fo rma regular tendem a aumentar o colesterol-HDL com pequenas reduções também do co-lesterol total plasmático.

§ Idade. O colesterol plasmático eleva com a idade o que, provavelmente, esteja relacionado com a dieta.

§ Sexo. Em mulheres antes da menopausa o co-lesterol plasmático está diminuído e o coleste-rol-HDL está elevado. Estas diferenças desapa-recem após este per íodo.

§ Raça. Existem diferenças marcantes entre dife-rentes raças. Por exemplo, os europeus do norte apresentam colesterol plasmático ele -vado, provavelmente devido mais a dieta e fa -to res ambientais que por diferenças genéticas.

H IPERCOLESTEROLEMIA

Os níveis de colesterol plasmático iniciam o seu aumento com o nascimento, mostrando uma leve depressão na adolescência, sofrendo uma nova elevação na idade adul ta . Apesar de alguns estu -dos avaliarem os teores lipídicos em crianças, não existem, até o momento, resultados prospectivos que permitam determi nar valores “seguros” ou desejáveis para es te grupo. Em aproximadamente 95% dos pacientes com hipercolesterolemia primária, a anormalidade é devida a combinação de fatores dietéticos e vários defei tos genét icos .

O

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Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 123

Aterosclerose. A lesão aterosclerótica no ho-mem é caracterizada pelo acúmulo de lipídios dentro e ao redor das células do espaço intimal e está associada com a proliferação celular e fibrose que provocam o estreitamento do lúmem do vaso. A deposição de l ipídios é um evento precoce e o colesterol, presente na parede arterial , é derivado principalmente das l ipoproteínas de baixa densi-dade (LDL). As placas ateroscleróticas são, obvi-amente, estruturas complexas. O colesterol-LDL é somente uma das causas. Dentre os vários fatores que contr ibuem para as lesões aterosclerót icas estão a lesão endotelial e a adesão plaquetária. Amostras colhidas até 24 h após o infarto do mi o-cárdio não apresentam alterações marcantes no colesterol plasmático. Medidas realizadas alguns dias ou até semanas após o infarto mo stram valo -res diminuídos de colesterol.

Hipercolesterolemia familiar (HF). É o mais claro exemplo da associação entre os níveis das LDL plasmáticas aumentadas e a aterosclerose. De todas as hipercolesterolemias somente 1 em 25 são classificadas como HF. Esta desordem resul ta de defei to genético na produção ou natureza dos r e-ceptores apoB1 0 0 de alta afinidade (ou na própria es t rutura da apoB1 0 0 que não é reconhecida pelo receptor normal). Os heterozigóticos tem ao redor de 50% da atividade receptora normal, enquanto os homozigóticos não apresentam atividade re-ceptora. Muitos heterozigóticos são portadores de xantomas tendinosos e mais de 50% tem sintomas de doença arterial coronária na quarta ou quinta década de vida. Nos homozigóticos, enfermidades cardíacas podem estar presentes já na segunda década de vida.

Gravidez. A gravidez pode estar acompanhada de moderado aumento do colesterol plasmático, pro -vavelmente como resultado de alterações endócrinas. Esta alteração é fisiológica e volta ao normal após o par to .

Pós-menopausa. Nesta fase as mulheres mo s -tram hipercolesterolemia com aumento do risco de enfermidade aterosclerótica.

Síndrome nefrótico. Apresenta valores eleva-dos de colesterol, fosfolipídios e tr iglicerídios; são causados pela e levação somente das VLDL ou VLDL e LDL juntas.

Diabetes mellitus. Quando não-tra tada es tá associada com a hipercolesterolemia e hipertrigli-ceridemia.

Outras causas. Hipotireoidismo. Cirrose biliar primária.

H IPOCOLESTEROLEMIA

Abetaliproteínemia. Ausência completa de apoB.

Hipertireoidismo.

Doença de Tangier. Aumento do catabolismo da apoA-I.

Má-absorção e má-nutrição.

Macroglobulinemia de Waldenström.

Leucemia mielocítica crônica.

Metaplasia mielóide.

Mielofibrose.

Mieloma.

Policitemia vera.

DETERMINAÇÃO DO COLESTEROL TOTAL

Paciente. Permanecer em jejum à exceção da água, durante12-14 h e abster-se de álcool durante 24 h antes da prova. A últ ima refeição antes do teste não deve conter alime ntos r icos em coleste-rol e o conteúdo de gordura total não deve ul t ra-passar os 30%. Se poss ível , suspender as drogas que afetam os resul tados durante 24 h antes da prova.

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124 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Amostra. Soro ou plasma heparinizado i sen tos de hemólise. A amostra permanece estável durante sete dias em temperatura ambiente.

Interferências. Resultados falsamente elevados: adrenalina, androgênios, anticoncpcionais orais, ácido ascórbico, brometos, borato de adrenalina, clorpropamina, corticoesteróides, fenitoína, iode-tos , levodopa, sulfonamidas e viomicina. Resulta-dos falsamente reduzidos: ácido aminossalicílico, clofibrato, heparina, niacina, tetraciclinas, tiazidas e vitamina A.

Métodos. Bastante usados foram os métodos que empregavam a reação de Liebermann e Burchard que cons i s te na avaliação do colesterol pelo des -envolvimento de cor com ácido sulfúrico e ani-d rido acético. Este método sofreu inúmeras modi-ficações sendo que muitas delas introduziram várias fases até o desenvolvimento de cor f inal . De um modo geral, estes métodos sofrem interfe -rências da bilirrubina, turvação, lipemia, hemólise e o u tros cromogênios não-específicos. Parte des-tas interferências foram eliminadas por métodos que empregavam várias fases até o desenvolvi-mento de cor final (Abell et al).

Enzimáticos. Atualmente, a maioria dos laboratórios empregam os métodos enzimáticos para a determinação do colesterol. Vários proces -sos foram propostos, mas os mais populares são os que utilizam a enzima colesterol esterase para hidrolizar os ésteres de colesterol presentes no soro formando colesterol livre e ácidos graxos. O colesterol l ivre (presente no soro + produzido por hidrólise) é oxidado em presença de colesterol oxidase formando coles -4-en-3-one e água oxig e-nada. A água oxigenada oxida certas substâncias para formar compostos coloridos medidos foto -metricamente. A mais comum é a que produz um corante quinoneimina (reação de Trinder). A água oxigenada também pode ser medida diretamente

(amperometria) ou por reações produtoras de NADPH e monitorada em 340 nm. Estes métodos podem sofrer a interferência da bilirrubina e da vit amina C.

Valores de referência para o colesterol total em adultos (mg/dL)

Desejável: <200 Limítrofes: 200 a 240 Elevados: >240

Bibliografia consultada

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Page 84: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 125

TRIGLICERÍDIOS

s ácidos graxos ocorrem, principalmente, como ésteres de glicerol (acilgliceróis). A

classe dos aci lgl iceróis depende do número de ácidos graxos presentes na molécula: monoglic e-rídios (um ácido graxo esterificado), diglicerídios (dois ácidos graxos esterificados) e triglicerídios ( t rês ácidos graxos esterificados).

Os triglicerídios (triacilglicerois) são sintetiza-d o s no f ígado e intest ino e são as formas mais importantes de armazenamento e transporte de ácidos graxos; consti tuem as principais frações dos quilomícrons, das VLDL e pequena parte (<10%) das LDL presentes no plasma sangüíneo. Os mono e diglicerídios são encontrados em quantidades relat ivamente pequenas como inter-mediários metabólicos na biossíntese e degradação dos lipídios contendo glicerol. A quase totalidade das gorduras ingeridas na dieta são tr igl icerídios formados por ácidos graxos saturados e insatura-dos. Alguns ácidos graxos piliinsaturados (ácidos l inolénico, l inolêico e araquidônico) não são sin -tet izados no organismo e devem ser supridos na dieta. Os triglicerídios da dieta são hidrolizados pela ação das l ipases pancreát icas e sais bi l iares para formar 2-monoglicerídios e ácidos graxos livres. Por d i fusão, os 2-monoglicerídios e os ácidos graxos entram no retículo endoplasmático das células da mucosa e são reesterificados a triglic e-r ídos . Após reesterificação, os triglicerídios são asso-ciados a outros l ipídios e proteínas específ icas (apoproteínas) para formar macromoléculas de-

nominadas quilomícrons. Estas partículas deixam a célula da mucosa, provavelmente por pinocitose reversa, e aparecem nos vasos linfáticos da região abdominal e, posteriormente, na circulação sistê-mica. A liberação intestinal de quilomícrons per-siste por várias horas após a ingestão de gorduras. Os quilomícrons são transportados pelo sangue a todos os tecidos do corpo, incluindo o tecido adiposo que é o principal local de captação. En-contram-se somente pequenas quant idades de quilomícrons no sangue após jejum de 12-14 ho-ras . Os triglicerídios plasmáticos são derivados de duas fontes, intest ino e f ígado. Os hepáticos d e-pendem fundamentalmente do estado nutricional do indivíduo. Deste modo, em jejum, os ácidos graxos provenientes do tecido adiposo são capta-dos pelo fígado e a seguir excretados como VLDL (v. adiante). Após refeição, parte dos carboidratos da dieta são convertidos em triglicerídios e são secretados como lipoproteínas. É importante e n-fatizar que, com exceção durante a absorção das gorduras da dieta, o fígado é o principal provedor de triglicerídos ao plasma.

H IPERTRIGLICERIDEMIA

Os níveis de triglicerídios plas máticos variam com o sexo e a idade, mas, mais especificamente, com a dieta. Além disso, fatores intraindividuais mu i-tas vezes dificultam a interpretação de um único resul tado deste const i tuinte .

Hipertrigl iceridemia familiar. Este grupo de condições es tá associado com defei tos tanto na produção como no catabolismo das VLDL. Estes pacientes apresentam risco aumentado de doença cardíaca isquêmica. Alguns pacientes tem quilo -micronemia em adição as VLDL elevadas. Nestes casos são f reqüentes a presença de xantomas erupt ivos e ataques de pancreat i te aguda. Com algumas exceções, nenhuma interação foi observada entre as subfrações do coles terol e os níveis de triglicerídeos.

O

H 2C O C R1

O

HC O C R 2

O

O

R3COH 2C

Triglicerídio

Page 85: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

126 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Figura 10.1. Metabolismo dos triglicerídios endógenos e exógenos.

Hipertrigliceridemia secundária:

§ Alcoolismo

§ Excesso de ingestão calórica

§ Obesidade

§ Diabetes mellitus

§ Hipotireoidismo

§ Síndrome nefrótico

§ Uremia

§ Gravidez

§ Pancreatite (geralmente alcoólica)

§ Doenças do armazenamento do glicogênio

§ Disproteínemias, lupus eritematoso sistêmico

§ Doenças de armazenamento (Gaucher, Ne u-mann-Pick, deficiência de lecitina-colesterol acil transferase)

DETERMINAÇÃO DOS TRIGLICERÍDIOS

Paciente. Permanecer em jejum por 12-14 h; abs te r-se de álcool durante t rês dias antes da p rova. Quando possível e sob orientação médica s u s pender as drogas que podem afetar os níveis lip íd icos no sangue.

Amostra . Soro ou plasma heparinizado sem he-mólise.

Interferências. Resultados falsamente elevados: anticoncepcionais orais estrogênios-progest ina, estrogênios, cort icoesteróides, β-bloqueadores, diuréticos tiazídicos, colestiramina. Resultados falsamente reduzidos: ácido ascórbico, asparagi-nase, clofibrato, fenformin e metaformin.

Métodos. A avaliação do glicerol liberado a par-tir dos triglicerídios tem sido a base da maioria das determinações deste composto. Dois t ipos de reações são empregadas para este pro pósi to: quí-micas e enzimáticas.

Métodos químicos. Nas determinações basea-das nas reações químicas, inicialmente os triglic e-rídios são extraídos com a remoção de substâncias interferentes, tais como, os fosfolípidios e a gli-cose. A seguir o glicerol é liberado dos triglicerí -dios e quantif icado por diversas reações diferen-tes . Es tes métodos es tão sendo abandonados .

Enzimáticos. Os métodos enzimáticos para a quantificação dos triglicerídios inicialmente ne-

Endógeno Endógeno

Fígado

LDL

LDL

IntestinoDelgado

HDLnascente

Colesterolda dieta

HDL

AGL + glicerol AGL + glicerol

Page 86: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 127

cessitam a hidrólise dos ácidos graxos do glicerol realizada pela enzima lipase geralmente acomp a-nhada por uma protease. O papel da protease ainda não é conhecido nesta reação, mas permite uma melhor hidrólise dos triglicerídios. A α-quimio -tr ipsina é a protease mais usada para este propó-s i to . Todos os métodos descri tos a seguir apre -sentam boa especificidade, sensibil idade e preci-s ão .

Existem vários ensaios para a determinação do glicerol liberado pela hidrólise dos triglicerí -dios. Em um deles, o glicerol livre liberado dos triglicerídios pela lipase reage com o ATP em presença de glicerol quinase para produzir glicerol 3-fosfato e ADP. O ADP formado nesta reação é re -fosforilado pelo fosfo enolpiruvato, em reação catalisada pela piruvato quinase para formar ATP e piruvato. O piruvato é enzimaticamente reduzido em presença de NADH pela lactato desidrogenase, produzindo lactato e NAD+ . O decréscimo da a b-sorvância como resultado do consumo de NADH é monitorado em 340 nm e é proporcional a con-centração dos triglicerídios na amostra.

Outro método enzimático comumente usado emprega a enzima L-α-glicerol fosfato oxidase (GPO), que reage com o glicerol fosfato pela re a-ção da lipase e glicerol quinase descrita acima. Em presença de GPO e O2 , o glicerol fosfato é oxidado para produzir diidroxiacetona fosfato e peróxido de hidrogênio. O peróxido reage com um cromogênio com desenvolvimento de cor.

O glicerol 3-fosfato produzido na reação catalisada pela glicerol quinase forma um composto colorido – o formazan – proporcional ao teor de triglicerídios. O glicero l 3-fosfato é

inicialmente oxidado pelo NAD+ em reação catalisada pela glicerol 3-fosfato desidrogenase (GPD) para formar NADH. O NADH formado reage com o 2-p-iodofenil-3-nitrofenil-5-feniltetrazolium pela ação da diaforase para produzir o corante formazan .

Um fator importante que afeta a exatidão da medida dos triglicerídios é a presença de glicerol l ivre endógeno no soro. Na maioria das amostras, o glicerol endógeno contribui com 10 a 20 mg/dL sobre os valores obt idos .

Valores de referência para os triglicerídios (mg/dL) Desejável: <200 Limítrofes: 200 a 499 Elevado 400 a 10.000 Alto risco >10.000

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128 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

COLESTEROL HDL E LDL

s l ipoproteínas de alta densidade (HDL) exercem importante papel na concentração do

colesterol nos tecidos. As HDL também atuam no retorno do colesterol dos tecidos periféricos para o fígado, onde é removido na forma de ácidos biliares em processo denominado “transporte r e-verso do colesterol”. As HDL tem ação protetora contra a doença arterial coronária. Foi demons-t rado que a prevalência da enfermidade coronari-ana é mu ito maior em indivíduos com níveis redu-zidos de HDL, em relação aos indivíduos com teores elevados. Vários estudos cl ínicos e epidi-miológicos confirmaram a relação inversa e inde-pendente entre a enfermidade coronariana e a HDL. Devido a impossibilidade da determinação direta das HDL pelo emprego da ultracentrifuga-ção (método de referência) realiza -se a medida do colesterol-HDL no plasma e soro. A maioria dos métodos para esta aval iação está baseada na precipi tação das l ipoproteínas contendo ApoB (LDL e VLDL) por meio de soluções polianiôni-cas tais como o dextran sulfato/cloreto de magné-sio, fosfotungstato ou polietileno glicol. O teor de colesterol no sobrenadante é determinado pelos métodos correntes. Os níveis de colesterol HDL são dependen tes do sexo e idade.

Valores “cut off” para o risco coronariano baseado nos níveis do colesterol HDL

(mg/dL) Risco coronariano positivo < 35

Risco coronariano negativo > 60

Valores elevados. Alcoolismo, cirrose biliar (primária), hepatite crônica, hiper-α-lipoprotei-nemia familiar. As drogas incluem ácido nicotí-nico, ciclofenil, cimetidina, estrogênios, etanol, fenitoína, hidrocarbonetos clorados, l ovastatina e terbutalina.

Valores reduzidos. Arteriosclerose, colestase, coronariopatia, diabetes mellitus, doença de Tan-gier, doença renal, hepatopatia, hipercolesterole-

mia, hiperlipoproteinemia tipo IV, hipertrigliceri-demia, hipolipoproteinemia, após infarto do mi o-cárdio, fumo, obesidade, sedentarismo, esteróides, androgênios, progestágenos, anabolizantes, t iazí-dicos, bloqueadores β-adrenérgicos, neomicina, ant i-hipertensivo, infecções bacterianas e infe c-ções virais .

É possível a avaliação do risco coronariano por meio do sub-fracionamento da HDL através da eletroforese de gel de poliacrilamida, que podem ser identif icadas as sub-frações 2a, 2b e 3a (H5, H4, H3) correspondentes a fração HDL2 , que apresentam corelação negativa com o risco coronariano e , as sub-frações 3b 3c (H2, H1),correspondentes ao HDL3 , mais densas e menores, que possuem correlação de alto risco coronariano.

COLESTEROL LDL

As lipoproteínas de baixa densidade (LDL) são formadas, principalmente, ou talvez em sua totali-dade, na circulação a partir das VLDL e, prova-velmente, da degradação dos quilomícrons. É a partícula lipídica mais aterogênica no sangue, pois o colesterol LDL constitui ao redor de dois terços do colesterol total plasmático. Os níveis elevados de LDL estão diretamente associados no prognós-tico de risco de aterosclerose coronariana. O colesterol LDL é determinado pelo emprego de ant i-soro policlonal enzimático em partículas de látex, removendo assim as HDL e VLDL da amostra. Os valores de colesterol-LDL são também ob tidos em mg/dL por cálculo pela fórmula de Friedewald:

Colesterol LDL = Colesterol total - (colesterol HDL + triglicerídios/5)

Obtém-se bons resul tados com a apl icação desta fórmula, quando os tr iglicerídios são meno-res que 400 mg/dL e em ausência de quilomícrons.

A

Page 88: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 129

Valores de referência para o colesterol LDL (mg/dL)

Desejável: <130 Limítrofe: 130 a 160 Elevado: >160 mg/dL

Valores aumentados. Anorexia nervosa, dia-betes mélito, disglobulinemias, doença de Cushing, gravidez, hepatopatia, hiperlipoprotei-nemia do tipo II, insuficiência renal e porfiria. As drogas incluem androgênios, anticoncepcionais orais, catecolaminas, corticosteróides glicogênicos e diurét icos.

Valores reduzidos. Abetalipoproteinemia, art e-riosclerose, doença articular inflamatória, doença pulmonar, estresse, hiperlipoproteinemia tipo I, hipertireoidismo, hipoalbuminemia, mieloma múltiplo e síndrome de Reye. As drogas incluem ácido nicotínico, clofibrato, colestiramina, estro -gênios, neomicina, probucol e tiroxina.

RELAÇÃO: COLESTEROL TOTAL/COLESTEROL HDL

Como um modo de visualizar a influência comb i-nada de fatores de r isco de doença coronaria na, emprega-se a divisão do colesterol total pelo c o-lesterol-HDL que resultam em valores emprega-dos diretamente como índice de risco coronari-ano:

Risco =Colesterol total (mg/ dL)Colesterol HDL (mg/ dL)

A analogia foi estabelecida ao risco para h o-mens e mulheres de acordo com a tabela:

Risco Homens Mulheres

Metade da média 3,43 3,27 Média 4,97 4,44 2 x média 9,55 7,05 3 x média 23,39 11,04

Para a aplicação da fórmula, o paciente não pode estar padecendo de doenças que al teram os níveis de l ipoproteínas plasmáticas (enfermidade hepát ica, após enfarto do miocárdio etc.)

Também é possível o fracionamento da LDL pela eletroforese em gel de poliacrilamida cujas s u b -frações que apresentam correlações positivas com o risco coronariano, especialmente quando predominam as sub-frações L2 e L1 que são de tamanho pequeno e mais densas. Em indivíduos normais predomina a sub-fração LDL3 maior e homogênea.

RELAÇÃO: COLESTEROL LDL/COLESTEROL HDL

Esta relação associa o colesterol total , colesterol HDL e triglicerídios (ver cálculo do colesterol LDL).

Risco = Colesterol LDL (mg/ dL)Colesterol HDL (mg / dL)

O risco coronariano obtido pela fórmula, para homens e mulheres, é mostrado a seguir:

Risco Homens Mulheres Metade da média 1,00 1,47 Média 3,55 3,22 2 x Média 6,25 5,03 3 x Média 7,99 6,14

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Page 90: Bioq.clinica Aminoacidos e Proteinas

Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 131

LIPOPROTEÍNAS PLASMÁTICAS

s l ipoproteínas são part ículas esfér icas que transportam lipídios apolares (insolúveis em

água) em seu núcleo. Estes complexos são cons -t i tuídos por quantidades variáveis de colesterol e seus ésteres, triglicerídios, fosfolipídios e proteí-nas (apoproteínas) sendo solúveis no plasma de-v ido à natureza hidrófila da parte protéica. A c lassif icação das l ipoproteínas está funda-mentada nas propriedades f ís ico-químicas de cada grupo, que diferem entre si na composição lipídica e protéica. As l ipoproteínas plasmáticas em humanos normais são:

Quilomícrons. É a principal forma de transporte dos tr iglicerídios da dieta (exógeno) até os teci-d o s .

Lipoproteínas de densidade muito baixa (VLDL, very low density lipoproteins). Transpor-tam triglicerídios de origem endógena desde o fígado e, em menor quantidade, do intestino del-gado para os tec idos .

Lipoproteínas de densidade baixa (LDL, low density lipoproteins). Ricas em colesterol que são t ransportadas a té as células .

Lipoproteínas de alta densidade (HDL, high density lipoproteins). Provavelmente atuam na ca-ptação do colesterol ao nível celular, e condu-zindo-o até o f ígado onde é catabolizado e eli-minado.

Tabela 10.1. Classificação, propriedades e composição das lipoproteínas humanas.

Parâmetro Qui lomícron VLDL LDL HDL

Densidade (g/mL) <0 ,93 0 , 9 3 - 1 , 0 0 6 1 , 0 0 6 - 1,063 1 , 0 6 3 - 1 , 2 1

D i â m e t ro ( n m ) >70 2 5 - 7 0 1 9 , 6 - 2 2 , 7 4 - 1 0

Mobi l idade e le t roforé t ica Origem P r é -β β α Composição (% do peso)

Coles tero l l ivre 2 5 - 8 1 3 6

Colesterol es ter i f icado 5 1 1 - 1 4 3 9 1 3

Fosfol ip ídios 7 2 0 - 2 3 1 7 2 8

Tr igl icer íd ios 8 4 4 4 - 6 0 1 1 3

P ro t e ínas 2 4 - 1 1 2 0 5 0

Apolipoproteínas (% do total)

A- I 7 , 4 T r a ç o s - 6 7

A- I I 4 , 2 T r a ç o s - 2 2

B-1 0 0 T r a ç o s 3 6 , 9 9 8 T r a ç o s

B-4 8 2 2 , 5 T r a ç o s - -

C- I , C- I I , C- I I I 6 6 4 9 , 9 T r a ç o s 5 - 1 1

E- I I , E - I I I , E - IV - 1 3 T r a ç o s 1 - 2

D - - - T r a ç o s

Local de s íntese In t e s t i n o Intestino, fígado In t ravascular Intestino, fígado

A

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132 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

APOLIPOPROTEÍNAS

Os componentes protéicos das lipoproteínas, as apopro-teínas, são uma família complexa de polipeptídios que promovem e controlam o transporte dos lipídios no plasma e sua captação pelos tecidos. São divididas em vários grupos, cujos membros mais importantes são:

ApoA. Sintetizada no fígado e intestino. Está inicial-mente presente nos quilomícrons na linfa, mas é rapidamente transferida para as HDL.

ApoB. Está presente no plasma em duas formas: apoB100 e apoB48. A apoB100 é o componente protéico das LDL e está também presente nos quilomícrons e VLDL. A apoB48 é somente encontrada nos quilomícrons. A apoB100 é reconhecida por receptores específicos nos tecidos periféricos.

ApoC. Esta família de três proteínas (apoC-I, apoC-II e apoC-III) é sintetizada no fígado e incorporada pelas HDL.

ApoE. É sintetizada no fígado, incorporada ao HDL e transferida, na circulação, para os quilomícrons e VLDL. É, provavelmente, a principal apoproteína envolvida na captação hepática dos quilomícrons remanescentes; liga-se aos receptores apoB nos tecidos.

Apo(a). Está presente em quantidades equimoleculares a apoB100 nas lipoproteínas A, Lp(a). Tem elevado conteúdo de carboidratos e uma seqüência de aminoáci-dos similar ao plasminogênio.

A estrutura das part ículas l ipoprotéicas é g e-ralmente formada por um núcleo hidrofóbico de ésteres de colesterol e triglicerídios. A camada externa hidrófila é consti tuída por compostos p o-lares tais como, proteínas solúveis , porção hidró-fila dos fosfolipídios e colesterol l ivre com seu grupo hidroxila (posição 3) direcionado para a periferia do complexo. As concentrações dos l ipídios plasmáticos são índices estát icos do metabol ismo lipoprotéico uti l izados no estudo do risco cardiovascular. O conhecimento dos fatores que determinam os n í -veis l ipídicos no sangue é fundamental para a compreensão da patofisiologia das hiperlipopro-

teínemias. Estes fatores incluem processos anabó-licos como a absorção e síntese, junto a processos catabólicos como a mobilização, degradação e excreção.

ENZIMAS ENVOLVIDAS NO

TRANSPORTE LIPÍDICO

Quatro enzimas de relevância em desordens clínicas são descritas:

Lecitina colesterol aciltransferase (LCAT). Transfere um grupo acila (resíduo de ácido graxo) da lecitina para o colesterol, formando o éster de colesterol. No plasma, esta reação ocorre provavelmente nas HDL e pode ser estimulada pela apoA-I.

Lipase lipoprotéica. Está ligada a superfície endotelial dos capilares sangüíneos em vários tecidos extra-hepáticos e atua na hidrólise dos triglicerídios presentes nos quilomícrons e nas VLDL, formando gli-cerol e ácidos graxos. Sua atividade aumenta após as refeições, parcialmente como resultado da ativação pela apoC-II.

Lipase hepática. Sua atividade é semelhante a da lipase lipoprotéica.

Lipase hormônio-sensível. Presente nas células do tecido adiposo; controla a liberação de ácidos graxos do tecido adiposo para o plasma. É ativada pelas cateco-laminas, hormônio de crescimento e glicocorticóides e é inibida pela glicose e pela insulina.

METABOLISMO DAS LIPOPROTEÍNAS

PLASMÁTICAS

A descrição abaixo do metabolismo das lipoproteínas e apolipoproteínas é uma visão simplicada que emprega um mínimo de detalhes para atender as finalidades deste trabalho.

Metabolismo dos quilomícrons. Após uma refeição contendo gorduras, os quilomícrons são formados na mucosa intestinal. Os ácidos graxos e o colesterol são reesterificados no retículo endoplasmático para formar triglicerídios e ésteres de colesterol apolares. Estes compostos são “emp acotados” com a apoB48, várias

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Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 133

apoA e lipídios polares (fosfolipídios e colesterol livre) e atingem a circulação sistêmica via ducto torácico. As apoA são transferidas para as HDL e, simultaneamente, adquirem apoC e apoE das HDL. Os quilomícrons assim modificados, interagem com a enzima lipase lipoprotéica resultando na rápida hidrólise de grande parte dos triglicerídios que compõem as partículas. Com a redução do tamanho das part ículas, os componentes mais hidrofílicos (apoC, colesterol não-esterificado e fosfolipídios) são transferidos para as HDL. Os quilomícrons remanescentes pobres em triglicerídios, são captados pelo fígado, onde são catabolizados.

Metabolismo das VLDL. Os triglicerídios são continuamente sintetizados no fígado e excretados na forma de VLDL (“endógena”). Em menor extensão a mucosa intestinal também secreta VLDL (“exógena”). A síntese hepática aumenta quando ocorre elevação na síntese dos triglicerídios. Quando inicialmente produzida, as VLDL consistem principalmente de triglicerídios e algum colesterol não-esterificado, com apoB100 e menor quantidade de apoE. A apoC-II é então adquirida, principalmente, das HDL, e os triglicerídios são removidos do “núcleo” das VLDL de maneira análoga, aquela dos quilomícrons. As partículas residuais são conhecidas como “VLDL remanescentes” (ou IDL), que são rapidamente convertidas em LDL ou removidas da circulação pelo fígado.

Metabolismo das LDL. Possivelmente todas as LDL são provenientes das VLDL. As partículas de LDL são ricas em ésteres de colesterol, provavelmente derivadas das HDL; a apoB100 é a única apolipoproteína presente. As LDL são removidas da circulação por dois processos: um regulado e o outro não-regulado. O mecanismo regulado envolve a ligação das LDL a receptores apoB100 específicos presentes na superfície dos hepatócitos e de células dos tecidos periféricos. A partícula inteira de LDL é incorporada pela célula por invaginação da membrana celular. Dentro da célula, a partícula funde-se com os lisosomas; a apoB é desdobrada e os ésteres de colesterol são hidrolisados, tornando disponível o colesterol livre para as células. A quantidade de colesterol intracelular regula:

§ A velocidade da síntese do colesterol através do efeito dos teores do colesterol sobre a enzima HMG-CoA redutase.

§ O número de receptores de LDL-apoB na superfície celular.

A via não-regulada envolve mecanismos receptor-independente de captação do colesterol pelas células que estão presentes particularmente nos macrófagos. Estes mecanismos são ativados quando os níveis de colesterol plasmático estão alterados.

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134 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Tabela 10.2. Desordens hiperlipêmicas

Designação genética e classe l ipopro -

téica e levada S i n ô n i m o Desordem pr imária

Hiper l ipemia exógena

(Qui lomícron)

T i p o I Def ic iência da l ipase l ipoproté ica famil iar

Def ic iência da apo C- I I

Hiper l ipemia endógena

(VLDL)

T i p o I V Hiper t r ig l icer idemia famil iar (moderada)

Hiper l ip idemia t ipo- l ipopro te ína múl t ip la fami l i a r

Doença de Tangier

Hiper l ipemia

(VLDL + qui lomícron)

T i p o V Hiper t r ig l icer idemia famil iar (severa)

Def ic iência da l ipase l ipoproté ica famil iar

Def ic iência da apo C- I I

Hipercoles te ro lemia

(LDL)

Tip o I I a Hipercolesterolemia familiar (defei to dos receptores de LDL)

Hiper l ip idemia t ipo- l ipopro te ína múl t ip la fami l i a r

Hipercolesterolemia poligênica (incluindo hipercolesterolemia

exógena)

Hiperl ipidemia combinada

(LDL + VLDL)

T i p o I I b Hiper l ip idemia t ipo- l ipopro te ína múl t ip la fami l i a r

Hiper l ip idemia remanescente T i p o I I I Disbe ta l ipoprote inemia fami l ia r

Hiperlipoproteínemia lamelar (lipopro-

teínas vesicular e discoidal)

- Defic iência da leci t ina-coles terol ac i l - t ransferase

HIPERLIPOPROTEÍNEMIAS

As hiperlipoproteínemias formam um grupo de distúrbios caracterizados pelas anormalidades quanti tat ivas e/ou qual i tat ivas das l ipoproteínas plasmáticas. São causadas por:

§ Fatores genét icos .

§ Fatores ambientais.

§ Combinação dos dois fatores acima.

§ Adquiridas (secundárias) .

A s hiperlipidemias primárias constituem um grupo de enfermidades, nas quais os teores de l i-poproteínas plasmáticas são manifestações primá-

rias da enfermidade. São doenças hereditárias, cuja alteração lipídica const i tui seu fenótipo. As hiperlipidemias primárias foram classific a-das por Fredrickson com posterior modificação por Beaumont e cols. em seis grupos diferentes (tipo I, IIa, IIb, III, IV, V). Na tabela 5.2 é mo s -trada a classificação das hiperlipidemias de acordo com a classe ou classes l ipoprotéicas (quilomícron, VLDL e LDL), com as quais estão a s soc iadas . Os “t ipos” de hiperl ipoproteínemias não são ent idades patológicas , mas grupos de desordens que afetam as concentrações dos l ipídios e l ip o-prote ínas p lasmáticas de modo semelhante, resul-tando quadros lipoprotéicos similares. Portanto, a classificação de um paciente em um dos “tipos” hiperlipoproteinêmicos não é diagnóstico clínico per se, envolvendo etiologia, patofisiologia e tra-tamento; em lugar disso é a definição de um qua-dro l ipoprotéico, que talvez resulte de desordens diferentes.

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Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 135

A s hiperlipidemias secundárias são produzidas em pessoas normolipêmicas que adquirem certas enfermidades sistêmicas. Na maioria dos casos, as característ icas l ipoprotéicas anormais não são suficientemente distintas para diferenciar as lip o-proteínemias secundárias das primárias. A seguir são descritas as hiperlipidemias secundárias mais f reqüentes .

Tipo I. Diabetes mellitus insulinopênico, disglo -bulinemia, lupus eritematoso e pancreat i te .

Tipo I I . Síndrome nefrótica, hipotireoidismo, e n-fermidade hepática obstrutiva, porfiria, mieloma múltiplo, cirrose portal, hepatite viral (fase aguda), mixedema, estresse, anorexia nervosa e hipercalcemia idiopática.

Tipo I I I . Hipotireoidismo, disgamaglobulinemia, mixedema, cirrose biliar primária e acidose dia-bética.

Tipo IV. Diabetes mellitus, síndrome nefrótica, gravidez, anticoncepcionais orais, doença de ar-mazenamento de glicogênio, alcoolismo, doença de Gaucher, doença de Niema nn-Pick, pancreatite, hipotireoidismo e disglobulinemia.

Tipo V. Diabetes melli tus insulinopênica, sín -drome nefrótico, alcoolismo, mieloma, hipercal-cemia idiopática, pancreatite, macroglobulinemia, diabetes mellitus (não-insulino dependente) .

FATORES DE RISCO CORONARIANO

Existem certos parâmetros que parecem guardar alguma relação, possivelmente de causa e efeito, com a doença arterial coronária e são conhecidos como fatores de r isco. Fatores de r isco são atri-butos as sociados a um aumento substancial da suscetibil idade individual para a doença coroná-ria, e em especial, para o seu aparecimento pre -coce. Resultados de vários estudos prospectivos p o-pulacionais documentaram uma longa lista de fatores de risco à aterosclerose. A contribuição de alguns destes fatores são acei tos unanimemente,

enquanto outros permanecem com significação incerta (Tabela 10.3).

Tabela 10.3. Fatores de risco na aterosclerose

Tabagismo

Hiper tensão a r te r ia l

Hipercoles te ro lemia (co les te ro l LDL)

HDL colesterol reduzido (<35 mg/dL)

Diabetes mell i tus

Hiper t r igl icer idemia (>200 mg/dL)

Obesidade (30% acima do peso ideal)

Sedentar ismo

Gota e h iperur icemia

Estresse e t ipo de personal idade

História familiar de doença arterial coronária precoce

Os estudos epidemiológicos sugerem que ao redor de 75% dos casos de enfermidade arterial coronariana (angina pectoris, enfarto do mi o-cárdio, morte súbita) são atribuíveis a três fatores de risco capitais: tabagismo, hipertensão e hiper-colesterolemia, sendo cada fator de igual impor-tância. Estes mesmos fatores de risco são eficazes na aterosclerose cerebral , apesar de seus pesos relat ivos serem diferentes; neste caso a hiperten-são apresenta maior periculosidade. De grande significado na enfermidade v ascular periférica são os fatores: diabetes, tabagismo e hipertriglic e-ridemia. Como a aterosclerose é uma enfermidade mu l-tifatorial, quanto maior o número de fatores de risco presentes, maior a suscetibil idade. Apesar deste capítulo ficar restri to às contr ibuições dos l ipídios e l ipoproteínas na aterogênese, deve ser lembrado que vários fatores são cooperat ivos e operam em conjunto no desenvolvimento da en-fermidade.

FATORES DE RISCO MÚLTIPLOS

A presença de vár ios fa tores de r isco - combin a-ção de elevados níveis de colesterol , pressão san-güínea aumentada e tabagismo - implica em um elevado risco e onde o tratamento de hiperlipid e-mia é mais indicado.

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136 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Outros fatores de risco l istados na tabela 10.3 podem influenciar o desenvolvimento da atero s -clerose diretamente ou associado, no mínimo par-cialmente, com anormalidades no metabolismo dos l ipídios e das l ipoproteínas .

§ Obesidade e inatividade física são importantes e, provavelmente, inter-relacionadas. Ambas es tão associa das com os teores das HDL redu-zidos, enquanto os indivíduos obesos possuem amiúdes evidências de hiperlipidemia, pressão sangüínea elevada e, ocasionalmente, diabetes melli tus. Foi demonstrado um constante au-mento na mortalidade por enfermidades card i-ovasculares em relação ao aumento de peso.

§ Diabetes mellitus, muitas vezes está associada com a aterosclerose em presença de outros f a-tores capitais. A ocorrência desta complicação está, provavelmente, relacionada com a dura-ção do diabetes e , supostamente, como uma manifestação de controle inadequado. Indiv í -duos diabéticos podem mostrar marcada hiper-trigliceridemia e colesterol-HDL diminuído.

§ Gota e hiperuricemia estão freqüentemente associados com hipertrigliceridemia e obesi-dade.

CLASSIFICAÇÃO DAS HIPERLIPIDEMIAS PELOS TESTES LABORATORIAIS

Na tabela 10.4 são mostradas, de forma prática, as desordens no transporte l ipídico em relação aos testes do colesterol total, triglicerídios e aparência do soro/plasma após refrigeração de 18 horas.

H IPERLIPIDEMIA EXÓGENA (TIPO I)

Esta desordem rara é encontrada em pacientes com menos de 10 anos de idade. É caracterizada pela presença maciça de quilomícrons (>1.000 mg/dL) no plasma sangüíneo colhido em jejum. Difere da hiperlipidemia do tipo V pela formação de camada

leitosa sobre um infranadante límpido após o teste de refrigeração. A desordem é provocada pela dificiência familiar de lipase lipoprotéica ou da Apo C-II . Xantomas são encontrados quando os triglicerídios excedem 2.000 mg/dL. Também estão presentes dor abdominal aguda, l ipemia retinalis, esplenomegalia e/ou hepatomegalia.

H IPERLIPEMIA ENDÓGENA (TIPO IV)

É caracterizada pela elevação das VLDL com t riglicerídios entre 160-1.000 mg/dL no plasma s angüíneo coletado em jejum. Pode ser familiar, mas é comumente encontrada por causas secundá-rias. A amostra armazenada em refrigerador fica unifo rmemente turva sem a camada de quilomi -crons. A base patofis iológica desta desordem pa-rece ser um quadro heterogênio provocado tanto pela superprodução de VLDL, como da hipertri-gliceridemia induzida por carboidratos, alcoo-l ismo ou terapia por estrogênios/progestina ou, ainda, devido ao impedimento da função do sis -tema de renovação da l ipase l ipoprotéico-mediada, como na insufic iência renal crônica e diabetes mellitus.

H IPERLIPEMIA MISTA (TIPO V)

É caracterizada pela presença de quilomícrons e excesso de VLDL na amostra de plasma em jejum, com valores de triglicerídios acima de 1.000 mg/dL e teores de colesterol que podem ser nor-mais ou elevados. Esta síndrome apresenta um quadro metabólico múltiplo, muitas vezes secun-dário à obesidade, diabetes ou alcoolismo, ocasio-nalmente induzidos por estrogênios e raramente familiar. O início dos sintomas ocorre a part ir da terceira ou quarta década de vida. As causas secundárias de aumento das VLDL e quilomícrons são descritas na seção Triglicerídios (ver acima).

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Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 137

Tabela 10.4. Classificação simplificada das hiperlipedemias segundo os tes tes laboratoriais

Designação genérica e classe

l ipopro té i ca aumen tada Tipo Teores lipídicos (mg/dL) Aparência do soro após 18 h de refr igeração

Sobrenadan te In f ranadan te

Hiper l ipedemia exógena

(Qui lomícron)

I T > 1 . 0 0 0

C = var iável

Lei toso Límpido

Hiper l ipemia endógena

(VLDL)

IV T = 1 6 0 a 1 . 0 0 0

C = normal

- T u r v o

Hiper l ipemia mis ta

(VLDL + qui lomícron)

V T > 1 . 0 0 0 Lei toso T u r v o

Hipercoles te ro lemia

(LDL)

I Ia T = no rma l

C > 240

- Límpido

Hiperl ipidemia combinada

(LDL + VLDL)

I I b T > 1 6 0

C > 240

- T ur v o

T = Tr ig l icer íd ios C = Coles terol

O t ipo I I I não pode ser de tec tado por es te esquema

H IPERCOLESTEROLEMIA (TIPO IIA)

É provocada pela e levação das LDL (ricas em colesterol) . Esta desordem pode ser genética ou secundária a alterações como o hipotireoidismo, síndrome nefrótica ou, ainda, de etiologia incerta, provavelmente refletindo uma interação entre a dieta e fatores poligênicos indefinidos. A base patofisiológica parece ser a combinação de produ-ção excessiva e catabolismo defeituoso do coleste-rol. Na hipercolesterolemia familiar (HF), o de-feito celular foi identificado como uma deficiê n-cia nos receptores B e E da superfície celular para a LDL, que normalmente controla o metabolismo do colesterol intracelular, assim como, a degrada-ção da LDL. Na tabela 10.5 são mostrados os r iscos para a a terosclerose e os pontos “cut-off” (em mg/dL), baseados parcialmente em dados de levantamentos cl ínicos mostrando os benef íc ios da redução dos níveis de colesterol e enfatizando a importância do colesterol LDL como parâmetro para a decisão do tratamento.

Tabela 10.5. Painel para decisões de tratamento de adultos usando pontos “cut-off” para o colesterol LDL

Fator de r isco Tratamento

die té t ico

Tratamento

c o m d ro -

g a s

Objetivo do

t ra tamento

Ausen te >160 >190 <160

P r e s e n t e >130 >160 <130

Presença de

doença ar tér io -

co ronar iana

>100 >130 <100

Várias causas secundárias podem estar associ-

adas com a elevação d as LDL (Tabela 10.6).

H IPERLIPIDEMIA COMBINADA (TIPO IIB)

Geralmente implica no aumento das LDL e VLDL. Em termos práticos sua presença é sugerida por uma elevação nos teores de colesterol e tr iglicerí-dios. Somente estes cri térios são insuficientes para distinguir as hiperperlipidemias do tipo IIb das do tipo III . Entretanto, o t ipo III é uma desor-dem bastante rara e para propósi tos diagnóst icos ela pode s er ignorada neste contexto, a menos que

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138 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

estejam presentes xantomas tuberosos e xantomas nas superfícies palmares.

O defeito metabólico primário desta desordem parece ser uma superprodução de apoB e que r e-sulta em elevação das lipoproteínas contendo esta apoproteína. Pacientes com superprodução simu l-tânea de apoB e triglicerídios, apresentam as VLDL e os triglicerídios aumentados no plasma. Quando não houver e levação na s ín tese das VLDL-triglicerídios, pode ocorrer uma produção direta de LDL com a conseqüente hipercolestero -lemia. A grande prevalência do tipo de IIb é no-tada com o aumento da idade e obesidade.

Tabela 10.6. Causas secundárias de elevação da LDL Dieta r ica em colesterol e gorduras saturadas

Hipot i reo id ismo

Síndrome nefró t ica

Disgamaglobul inemia , mie loma múl t ip lo

Obst rução hepát ica , enfermidade hepát ica

Por f i r i a

Gravidez

Anorex ia nervosa

Diabetes

Insuf ic iência renal crônica

Drogas: estrogênios, androgênios (esteróides anabólicos),

β -bloqueadores , carbamazepina, progest inas

H IPERLIPIDEMIA REMANESCENTE (TIPO

III)

Esta forma está associada com enfermidade car-diovascular periférica. Por esta razão a interven-ção é particularmente indicada. Um alerta para a possível existência de hiperlipopro teinemia do tipo III (disbetalipoproteinemia) é a presença de xantomas na superfície palmar ou depósitos tube-rosos nos cotovelos e joelhos, par t icularmente se “desapareceram” com terapia no passado. O dia -gnóstico definitivo necessita da análise de isofor-mas da apoE. O tipo III ocorre em 1:10.000 pes -s o a s . A base patofisiológica desta enfermidade é o acúmulo de VLDL remanescente (cujo núcleo é

rico tanto em triglicerídios como em ésteres de colesterol). É causada por uma apoE anormal (homozigótica), que não é normalmente reconhe-cida pelos receptores l ipoprotéicos. Este é um d is túrbio genético, mas é ocasionalmente encon-trado em associação com hipotireoidismo ou o b e s idade.

AVALIAÇÃO DAS APOLIPOPROTEÍNAS

A determinação das apolipoproteínas aumenta a especificidade para a identificação dos fatores de risco coronariano. O perfil de apoproteínas é indi-cado para pacientes que apresentam um risco de a terosclerose, tais como:

§ Pacientes com hipercolesterolemia: a apoB é utilizada para confirmar o diagnóstico. Muitas vezes a apoB aumentada é encontrada sem ele-vações do colesterol total ou do colesterol LDL.

§ Pacientes com níveis de colesterol HDL redu-zidos: a avalia ção de apoA1 é útil para indicar novos dados d iagnós t icos .

§ Crianças com antecedentes familiares de hipercolesterolemia, cardiopatia isquêmica precoce ou diabetes .

§ Mulheres que tomam anticoncepcional.

§ Como medida preventiva em todos os indiv í -duos adul tos a cada c inco anos .

Apolipoproteína A1. É a principal constituinte das lipoproteínas antiaterogênicas (HDL), enzima que esterifica o colesterol celular, no qual é cap-tado rapidamente pelas HDL e assegurando seu retorno ao fígado para seu catabolismo. A dimi-nuição de ApoA1 é um indicador do aumento de risco cardiovascular; também é responsável pela eliminação insuficiente de colesterol tissular por via hepática. Deve ser considerado que existem outras causas que podem originar reduções das concentrações de apoproteínas como a insuficiê n-cia renal crônica e síndrome nefrótica, doenças

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Lipídios, l ipoproteínas e apoproteínas 139

hepatocelulares e colestáticas, t ireóides, trata-mento com corticóides, dietas ricas em carboi-dratos e tabagismo. Alguns medicamentos como os derivados de lovastat ina e f ibratos, ácido nicot ínico, hidrocarbonetos clorados e fenitoína elevam a ApoA1.

Apolipoproteína B. Maior constituinte protéico das l ipoproteínas aterogênicas (LDL e, secundari-amente, de VLDL). A ApoB atua como determi-nante da união das LDL a seus receptores es pecíf-cos. As LDL circulantes em excesso são captadas pelos macrófagos produzindo as células espumo-sas, ponto de partida da placa de ateroma. Uma concentração elevada de ApoB favorece a forma-ção de aterosclerose. O aumento de ApoB é o melhor índice para o es tudo de r isco cardiovascu-lar, principalmente, em presença de valores nor-mais de colesterol. Aumentos da ApoB são encontrados nas hiper-lipoproteínemias dos tipos IIa, IIb e V, doença coronariana do jovem, diabetes, hipotireoidismo, insuficiência renal e síndrome nefrótica, doença hepática celular ou colestática, Cushing, disglo -bulinemia, gravidez, porfiria, anorexia nervosa, hipercalcemia infantil , esfingolipidoses, estresse emocional, dietas ricas em carboidratos, conta-ceptivos orais , abuso do álc ool, progestinas, este-róides anabólicos, glicocorticóides, catecolami-nas , β-bloqueadores e diurét icos. Valores reduzidos são comumente devido aos fármacos: estrogênios, colestiramina, fibratos, lovastatina, ácido nicotínico, tiroxina, neomicina e probucol. São encontrados também em patolo -gias como: abeta-lipoproteínemia, deficiência de α-lipoproteína (Tangier), hipo-β-l ipoproteína heterozigótica e homozigótica, deficiência de LCAT e do cofator da lipase lipoprotéica (Apo C -II), tireotoxicose, desnutrição, má absorção intes -tinal, estresse (queimaduras, doenças), grave alte-ração hepatocelular, doenças crônicas, mieloma, s índrome de Reye e dieta rica em lipídios poli-insa turados . Antes de instaurar uma terapia para redução de l ipídios é importante estabelecer o valor basal da relação de concentrações de ApoB/ApoA1. Os valores desta relação são: homens, 0,40 a 1,10 e para mulheres, 0,35 a 0,95.

LIPOPROTEÍNA (A) – LP(A)

É uma partícula lipoprotéica com estrutura similar a LDL. Ambas têm como maior constituinte pro -téico a apoB-100. Por apresentar homologia es -trutural com o plasminogênio, bem como com a LDL, inúmeras pesquisas mostraram a influência pró -aterogênicas e pró -trombóticas da Lp(a); estu-dos indicam que a Lp(a) inibe competitivamente a ação do plasminogênio e possibili ta assim o dis -paro dos efei tos aterogênicos. Deste modo, os valo res séricos elevados de Lp(a) constituem fator de risco independente para doença aterosclerótica e intensificam o risco de outros fatore s como c o-lesterol-LDL aumentado, hipertensão arterial, ta-bagismo etc. Os níveis de Lp(a) são determin ados geneticamente, não sofrendo influências a mbien-tais nem dos teores das demais l ipoproteínas. A função fisiológica da Lp(a) é desconhecida, sendo const i tuída pela Apo(a) e ApoB-100, que são elementos complementares de dois sistemas funcionais diferentes, e que, provavelmente, a Lp(a) seria uma ponte entre os dois sistemas. Es -truturalmente a Apo(a) faz parte do sistema de coagulação e fibrinolítico re gulando as proteases. A Apo(a) e Lp(a) competem com o plasmin o-gênio. Esta propriedade da Apo(a) pode explicar a associação de altas concentrações de Lp(a) com o infarto do miocárdio. Este risco aumenta conco-mitantemente com concentrações elevadas de LDL. Por outro lado, também são encontrados valores elevados em diabetes descompensado e hipotireoidismo intenso. Elevados níveis de Lp(a) estão associados com o aumento de r isco de:

§ Infarto do miocárdio.

§ Doenças arterio -coronarianas prematuras (<55 anos de idade).

§ Doenças cerebrovasculares .

§ Infarto agudo do miocárdio com histórico fa-miliar de hipercolesterolemia.

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140 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Não existem ainda testes de rotina confiáveis para esta determinação. Os existentes apresentam resul tados variáveis .

Valores de referência para a lipoproteína (a) (mg/dL) Homens 2,2 a 50 Mulheres 2,1 a 57 A Lp(a) parece não responder à terapia com inibidores da enzima 3-hidroxi 3-metil coenzima A redutase. No entanto, a Lp(a) responde favoravelmente ao tratamento com niacina e estrogênio.

HIPOPROTEÍNEMIAS PRIMÁRIAS

Nesta categoria três doenças familiares raras são men-cionadas:

Doença de Tangier. É ocasionada pelo aumento na velocidade de catabolismo da apoA-I. Somente traços de HDL são detectados no plasma, enquanto o colesterol-LDL está reduzido. Os ésteres de colesterol acumulam no sistema linforeticular, provavelmente, pela fagocitose excessiva dos quilomícrons anormais e das VLDL remanescentes formados por deficiência de apoA-I.

Abetalipoproteínemia. Está associada com a ausência completa de apoB. As lipoproteínas que contém normalmente apoB em quantidades apropriadas (ex.: quilomícrons, VLDL e LDL) estão ausentes do plasma. Os teores do colesterol e triglicerídios plasmáticos apresentam-se muito baixos.

Hipobetalipoproteínemia. É devida a redução da síntese de apoB. As VLDL e LDL, apesar de baixas não estão ausentes.

HIPOLIPIDEMIAS SECUNDÁRIAS

Reduções importantes no colesterol plasmático ocorre quando a síntese hepática está diminuída como na desnutrição (ex.: kwashiorkor em crianças), má absorção severa ou em algumas formas de doenças hepáticas crônicas.

FOSFOLIPÍDIOS OXIDADOS

Os fosfolipídios oxidados presentes nas paredes dos vasos são altamente aterogênicos. Duas enzimas, paroxonase e acetilhidrolase plaqueta-ativadora, são capazes de degradar os fosfolipídios oxidados. Uma vez degradados, os fosfolipídios perdem a capacidade de agregar placas ateroscleróticas. Além disso, a HDL é antiinflamatória no estado basal, mas pode se converter em pró-inflamatória durante a resposta à fase aguda. As mesmas duas enzimas atenuam esta conversão. Deste modo, a paroxonase e acetilhidrolase plaqueta-ativadora e talvez outras enzimas, influenciam significativamente o metabolismo lipídico através de seus efeitos sobre a oxidação dos lipídios. As variações nos níveis destas enzimas podem explicar porque alguns pacientes com teores elevados de HDL e concentrações baixas de colesterol total e LDL, desenvolvem doença coronariana.

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142 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

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VALTER T. MOTTA Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

Metabolismo Mineral e Ósseo

Volume

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METABOLISMO MINERAL E ÓSSEO

vanços significativos tem sido realizados nestes úl t imos anos no es tudo do metabo-

lis mo ósseo e mineral, aumentando consideravel-mente a compreensão da patofisiologia das desor-dens ósseas . Junto a isto, ocorreu um grande i n -cremento na tecnologia laboratorial permitindo a melhora nas determinações do cálcio total e ioni-zado, fosfato, magnésio, fosfatase alcalina total, hormônio paratireóideo intacto (PTH), metabólitos da vitamina D, proteína liberadora de hormônio paratireóideo (PTHrP), marcadores do metabo-lismo ósseo (osteocalcina, fosfatase alcalina ós-seo -específica, pró -peptídios do colágeno, hidro -xiprolina urinária, hidroxilisina-glicada urinária, piridinolina, deoxipiridinolina, sialo -proteína óssea e fosfatase ácida tar tarato-resistente). O tec ido ósseo é compos to :

Sais minerais inorgânicos cristalinos. (75% do peso seco). São compostos por fosfato de cálcio e carbonato de cálcio (força de compre s -são). Os minerais estão presentes como uma mi s -tura de cristais de hidroxiapatita [Ca 1 0 (PO4 )6 (OH)3 ], fosfato de cálcio amorfo e outros materiais. Pequenas quantidades de magné-sio, sódio, potássio, hidróxido, fluoreto, estrôncio, zinco, rádio, cloreto e sulfato. A deposição destes sa is complexos fortalece grandemente a estrutura óssea .

Matriz orgânica. (25% por cento do peso seco). É formada por 94% de fibras de colágeno, com elevado conteúdo dos aminoácidos prolina e h i-droxiprolina; 5% da substância básica (substân-cias não-colagenosas) que incluem líquido extra-celular, albumina, mucoproteína, sulfato de con-droitina, ácido hialurônico, osteocalcina (proteína G1a), lipídios e pequenos peptídios além de 1% de citrato.

Mesmo na vida adul ta , o osso está em estado dinâmico (acredita-se que ao redor de 3-5% da massa óssea esteja passando por uma remodelação at iva a qualquer tempo). Os processos de forma-ção e reabsorção óssea são controlados por várias influências hormonais e metabólicas. O osso é formado pela ação de osteóci tos e osteoclastos , cuja atividade é refletida no nível de fosfatase alcal ina do soro. A reabsorção óssea ocorre, pre-dominantemente, como resultado da ação de oste-oclastos e ordinariamente envolve a dissolução de ambos, minerais e matriz orgânica.

São necessárias pelo me nos três células especi-al izadas no osso para a síntese, a modelagem e remodelagem desse tecido:

§ Osteoblastos: células mesenquimais com in -tensa capacidade secretora , são responsáveis pela produção de cadeias protéicas ricas em aminoácidos como prolina, hid roxiprolina etc., precursores de colágeno para a formação de os teóide – o precursor não-calcificado do osso – nos locais superficiais de crescimento ou remodelagem. Além disso, s ecretam fatores de crescimento locais sob influência do GH e fosfatase alcalina óssea, relacionadas com o processo de mineralização do osso talvez através da neutralização de um inibidor da deposição mineral (pirofo s fato). Geralmente, são encontrados no interior das lacunas ósseas, e também na região subperiostal entre osso cortic al e o periósteo. A membrana plasmática dos os teoblas tos são r icos em fosfatase alcalina, cuja atividade é um índice de formação óssea. Os osteoblastos tem receptores para o hormônio paratireoideo (PTH), 1, 25-diidroxivitamina D (1, 25(OH)2 D) e estrogênio , mas não para a calcitonina. O es tímulo do PTH, 1, 25(OH)2 D, hormônio de crescimento e

A

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estrogênio induz os osteobla s tos a produzir o fator de crescimento “insulin like” I (EG-1), que tem papel importante na regulação e modelagem óssea local.

§ Osteoclastos: células gigantes e multinucle a-das relacionadas com a absorção – l ise óssea com finalidade de reparação de uma fratura ou mobilização de íons cálcio – realizadas continuamente, porém sob o controle do hormônio paratireiodeo (PTH), que estimula a secreção de enzimas proteolí t icas e ácidos orgânicos (lactato e cítrico), que dig erem e solubilizam a matriz óssea calcificada. Os os teoclas tos possuem uma ação oposta aos os teoblas tos , reabsorvendo a matriz óssea. Estão presentes entre 1 a 4% das superf ícies ó s sea s .

§ Osteócitos: segundo alguns autores, estado de “repouso” das células ósseas, os osteócitos e n-contram-se instalados nas cr iptas ósseas onde

seriam estimuladas por fatores humorais locais ou sistêmicos a diferenciar-se rumo à atividade blástica (crescimento e reparação) ou à ativ i-dade clássica/lítica (reabsorção, mobilização, iônica). Os osteócitos sintetizam pequenas quantidades de matriz para manter a integri-dade óssea .

Bibliografia consultada

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Metabolismo mineral e ósseo 145

CÁLCIO

cálcio está presente em três compartimentos principais: esqueleto, tecidos moles e líquido

extracelular. Aproximadamente, 99% de cálcio do organismo está localizado no esqueleto, primaria-mente, na forma de hidroxiapatita, que é uma rede de cristal composto de cálcio, fósforo e hidróxido. O cálcio restante desempenha numerosas e signi-f icat ivas funções não relacionadas à estrutura ó s sea. As funções f is iológicas do cálcio nos dife-rentes compartimentos são:

§ Cálcio intracelular . Condução neuromuscular, manutenção do tono normal e na condução e relaxamento do músculo esquelético e cardí-aco; síntese glandular e na regulação das glâ n-dula s exócrinas e endócrinas; na preservação da integridade da membrana celular e na per-meabilidade, particularmente, em termos do intercâmbio de sódio e potássio; metabolismo do glicogênio; processo da visão; e os eventos celulares envolvendo a l igação do cálcio com a proteína calmodulina.

§ Cálcio extracelular . Mineralização óssea, me-canismo da coagulação sangüínea e manuten-ção do potencial de membrana plasmática.

§ Cálcio do esquele to . É o principal local de armazenamento e mobilização de cálcio para o “pool” extracelular e intracelular. O osso é continuamente remodelado através de um pro-cesso combinado de reabsorção e formação ó s-sea.

Parte do cálcio ingerido (200 a 1500 mg/d), é absorvida por um processo ativo, principalmente no duodeno e é favorecido em pH ácido (em pH alcalino o íon forma compostos insolúveis). A vi tamina D é essencial neste processo. O cálcio existente no plasma humano normal apresenta-se sob t rês formas dis t in tas :

§ Cálc io não ionizado , es ta fração não-difusível (40-45% do total) consiste, em grande parte,

em Ca 2 + l igado às proteínas plasmáticas, esp e-cialmente à albumina.

§ Cálcio ionizado l ivre (45-50% do total), é a forma fisiologicamente ativa. É mantido em níveis constantes por um complexo sistema de controle envolvendo o PTH.

§ Cálcio complexado (5-10% do total) com uma variedade de ânions como o citrato, fosfato, lactato , bicarbonato e outros íons .

As distr ibuições relat ivas das três formas são modificadas como resultado de variação no pH sangüíneo ou do teor das prote ínas plasmát icas . Aumentos de 0,1 unidade de pH diminuem o cál-cio ionizado em 0,16 mg/dL. Reduções do pH aumentam o cálcio ionizado na mesma proporção anterior. A manutenção da homeostase do cálcio en-vo lve a part icipação de três órgãos maiores - o in test ino de lgado , os r ins e o esqueleto . A glân-dula mamária durante a lactação é também im-portante, assim como a placenta e o feto durante a ges tação .

CONTROLE DO METABOLISMO DO

CÁLCIO

O nível de cálcio no líquido extracelular e a inte-gridade do conteúdo de minerais ósseos são ma n-tidos homeostaticamente durante anos de ingestão variável de cálcio, através de um equilíbrio eficaz entre a formação e destruição óssea e a absorção e excreção do cálcio.

Vários compostos estão envolvidos na regula-ção do cálcio plasmático e, em muitos casos, afe-tam também os níveis de fosfatemia. Os dois prin -cipais controladores da homeostase do cálcio são o hormônio parat ireoideo e a vitamina D. Outras substâncias também contribuem em menor grau: calc i tonina, hormônios t ireoideos, esteróides

O

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Figura 11.1 Principais respostas hormonais na redução do teor de cálcio plasmático.

adrenais , prostaglandinas, fator at ivador dos osteoclastos e proteína PTH-re lac ionada.

Hormônio paratireóideo (PTH). É secretado pela células principais da glândula paratireóide em resposta a hipocalcemia ou hipomagnesemia. Os teores de PTH exibem uma variação diurna, estando elevado nas primeiras horas da manhã (ao redor das 9 h) . As ações do PTH são:

Ca plasmático diminuido2 +

Paratiróides estimuladopela caída do no plasma

Ca2 +

PTH plasmático

Liberação de PTH

Osso

Rim

Intestino Delgado

Teor 1:25 DHCCplasmático

Efeito de retroalimentaçãonegativa pelo aumentodo do plasma.Ca

2 +

1 - hidroxilase renal(via queda no PTH)

Teor de cálcioplasmático aumentado

Retroalimentaçãonegativa

Retroalimentaçãonegativa

Hidroxilaçãorenal da 25-HCCproduzindo 1:25-DHCC(pelo aumento do PTH)

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Metabolismo mineral e ósseo 147

§ Vitamina D. Além de efeitos indire tos sobre a absorção gas trointestinal de cálcio e fosfato, o PTH ativa a conversão da 25-hidroxivitamina D a 1,25-diidroxicolecalciferol (calcitriol), a forma ativa da vitamina D que estimula a absorção gastrointest inal do cálcio e fosfato.

§ Rins: o PTH (a ) aumenta a reabsorção tubular distal de cálcio e a excreção do fósforo através do mecanismo adenilato ciclase-AMP cíclico, (b) reduz a reabsorção do fosfato, sódio, cálcio e íons bicarbonato nos túbulos proximais e (c) estimula a produção de 1,25-diidroxicolecalciferol pelos rins com o seguinte resul tado: aumento da reabsorção do cálcio e inibição da reabsorção do fo s fato, produzindo fosfatúria.

§ Ossos: o PTH atua tanto direta como indireta-mente alterando a atividade e o número de o s -teoblas tos , os teoclastos e osteócitos, regulando o cálcio para o líquido extracelular. O PTH aumenta a reabsorção óssea pelos osteoclastos, necessi tando dos osteoblastos para mediar o seu efeito. O aumento na atividade osteoblás -t ica é detectada pela elevação na at ividade da fosfatase alcalina sérica. O incremento na ati-vidade osteoclást ica é evidenciado pela eleva-ção da hidroxiprolina urinária e excreção de desoxipiridinolina. O resultado final da acão do PTH é uma reabsorção verdadeira e não simplesmente a desmineraliza ção óssea .

O efeito total do PTH é o aumento do cálcio ionizado plasmático e a redução da fosfatemia (pelo aumento da excreção renal de fosfato). Ex-cesso prolongado de PTH está associado com h i-percalcemia, hipofosfatemia e aumento da ativ i-dade da fosfatase alcalina (estimulação dos osteo-blastos). A deficiência de PTH (hipoparatireoi-dismo) promove a hipocalcemia e hiperfosfatemia.

Calcitonina (CT). É um polipeptídio de 84 res í -duos de aminoácidos produzido e secretado pelas células parafoliculares da tireóide (ou células C) e, em menor grau, pelas paratireóides, timo e me-dula supra -renal . A secreção deste hormônio pa-rece ser contínua e é estimulada pela concentração

de cálcio ionizado no sangue. A secreção aumenta em resposta à elevações do cálcio ioni zado e di-minui com reduções nos teores sangüíneos deste íon. Por tanto , es tas respostas são de di reção oposta ao controle exercido pelo cálcio sobre a secreção de hormônio paratireóideo. Ações da calcitonina:

§ Exerce controle sobre o nível sérico de cálcio ao inibir a reabsorção óssea osteoclástica, r e-duzindo assim, a perda de cálcio e fósforo do o s s o .

§ Alguns efei tos sobre a função renal , como a inibição da reabsorção de cálcio e fósforo p e-los túbulos renais .

Vitamina D. É a designação genérica para um gru po de esteróis estruturalmente análogos e a b-solutamente importantes no metabolismo do cálcio e fósforo. É sintetizada na pele por irradiação ultravioleta ou absorvida no intestino. O 1,25-di idroxicolecalci ferol (calci tr iol) (DHCC) – fo rma biologicamente ativa da vitamina D – (a) e s timula a absorção do cálcio e fósforo no intes -tino delgado, (b) aumenta a mobilização de cálcio do osso (nessa ação o PTH atua sinergisticamente) e (c) eleva a reabsorção renal do cálcio e fósforo. O efeito total da vitamina D é o aumento plasmá -tico do fósforo, cálcio total e ionizado. A defici-ência da 1,25-OHCC leva a defeitos na minerali-zação óssea.

Três são os principais estímulos para a síntese de calcitriol: (a) redução da concentração de cál-cio plasmático, (b) aumento na secreção do PTH e (c) elevação dos níveis de fósforo intracelular.

Outros hormônios. Os hormônios da tireóide (triiodotironina e tiroxina) elevam a mobilização de cálcio do osso. Os esteróides adrenais podem alterar a excreção de cálcio pelos rins, part icula r-mente, nos casos de insuficiência supra -renal. Finalmente, os hormônios sexuais (especialmente es trogênios) estão relacionados aos teores de cál-cio; a diminuição de estrogênios em mulheres em fase pós-menopausa está associada a um aumento de reabsorção do osso com decl ínio da massa ós-

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sea e o subseqüente aumento do r isco de osteopo-rose e fraturas.

H IPERCALCEMIA

Define-se a hipercalcemia como a existência de cálcio sérico total acima de 10,5 mg/dL em adultos. A elevação do Ca 2 + plasmático é um problema potencialmente sério que pode levar à enfermid ade renal, arritmias cardíacas e mau estado geral. Cerca de 90% das hipercalcemias se devem ao hiperparatireoidismo primário ou neoplasias malignas.

Hiperparatireoidismo primário. É caracteri-zado pela produção autônoma do PTH na ausência de um estímulo fisiológico apropriado, ou seja, hipersecreção coexistente com cálcio sérico ioni-zado normal ou elevado. É encontrado no ade-noma paratireoideo, na hiperplasia difusa ou, ra -ramente, no carcinoma. Também é relatada na neoplasia endócrina múltipla tipo I com tumores pituitário e pancreático e na neoplasia endócrina múltipla tipo IIa com carcinoma tireoideo medu-lar, hiperparatireoidismo e feocromocitoma. Tanto o cálcio como a albumina devem ser medidos e, algumas vezes repetidos, pois a hipercalcemia pode ser intermitente. Uma acidose moderada pode estar presente pela perda urinária de bicar-bonato influenciada pelo PTH. Alguns pacientes desenvolvem problemas ósseos em conseqüência ao elevado teor de PTH no plasma, especialmente nos casos crônicos. No hiperparatireoidismo são encontradas as s eguintes caracter ís t icas bioquí-micas:

§ Hipercalcemia. Está quase sempre presente apesar de intermitente no início da doença. O PTH causa a l iberação do cálcio do osso e a u-menta a reabsorção renal do cálcio.

§ Hipofosfatemia. O PTH induz ao aumento da excreção renal de fosfato. Atualmente, pelo diagnóstico precoce da doença, a hipofosfate-mia é encontrada somente em 50% dos casos.

§ Atividade aumentada da fo sfatase alcal ina. Reflete o incremento na renovação óssea.

§ Níveis elevados de PTH. Geralmente acima dos valores de referência. Valores normais não excluem o diagnóstico. Teores extremamente al tos são encontrados no carcinoma de glâ n-dulas parat ireóides.

Hipercalcemia tumoral. É a causa mais freqüente em pacientes hospital izados. Vários fa tores são responsáveis pela hipercalcemia da malignidade. Estas variações dependem do tipo de tumor e da exi s tência ou não de metástases ósseas. Um fator i mportante nesse t ipo de hipercalcemia é a l iberação da proteína PTH-relacionada (PTH-rP), um peptídio com grande homologia com o PTH e que também atua no receptor de PTH. As doenças malignas são assim descri tas:

§ Com envolvimento ósseo: tumor direto de ero -são do osso, tumo res localizados com a produ-ção de agentes de absorção óssea (ex. : prosta-glandina E2 ).

§ Sem envolvimento ósseo (hipercalcemia humo-ral da doença mal igna): é o mecanismo mais freqüente. É produzida por: (1) síntese tumoral da proteína relacionada ao hormônio paratireóideo (PTH-rP), principalmente por carcinomas epidermóides (pulmão, esôfago, cabeça e mama), carcinoma urotelial, colangiocarcinoma e carcinoma de ovário; (2) síntese de 1,25-diidroxivitamina D por alguns linfomas e/ou fator(es) de cre s cimento (fator de crescimento tumoral, fator de crescimento epidérmico, fator de crescimento plaqueta-derivado); (3) doenças malignas hematológicas: citoquinase (interleucina-1, fator de necrose tumoral, linfotoxina), (linfoma); (4) hiperparatireoidismo coexistente primário.

§ Mieloma múlt iplo . A hipercalcemia aparece como resultado da l iberação local das citoqui-nas que promovem a reabsorção óssea.

As caracter ís t icas bioquímicas encontradas nestes casos são: (a) hipercalcemia de apareci-mento repentino, (b) o fósforo sérico com teor variável, (c) a hiperfosfatemia é encontrada em

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Metabolismo mineral e ósseo 149

indivíduos com o tipo mestastático de hipercalce-mia, nos linfomas com excesso de vitamina D e, se existir, insuficiência renal, (d) a hipofosfatemia é comum na hipercalcemia humoral da maligni-dade, (e) os níveis de fosfatase alcalina sérica estão gera lmente aumentados e (f) a velocidade de excreção do cálcio urinário está incrementada.

Hipervitaminose D. É comum no uso de prepa-rações contendo vitamina D para o tratamento da os teoporose . A ação da vitamina D promove a hipercalcemia pela absorção intestinal; isto su-prime a secreção de PTH que, por sua vez, inibe a excreção urinária de fosfato resultando em hiper-fosfatemia. A fosfatase alcalina permanece nor-mal. O excesso de vitamina D pode t ambém ocor-rer em linfomas e em várias doenças granulomato-sas como sarcoidose, tuberculose e histoplasmose; todas elas incluem células monocíticas contendo a enzima 1α-hidroxilase.

Desordens endócrinas. Hipertireoidismo (em até 25% dos pacientes), hip o tireoidismo, acromegalia, insuficiência supra -renal aguda (Addison) e feocromocitoma.

Imobilizações prolongadas. Hipercalciúria e balanço negativo de cálcio ocorrem em todos os indivíduos imobilizados por longo tempo. Se hou-ver renovação óssea aumentada, como em crianças e adultos com doença óssea de Paget, também está presente a hipercalciúria.

Enfermidades granulomatosas. Sarcoidose, tuberculose, coccidioidose. Ao redor de 10-20% dos pacientes com sarcoidose tem hipercalcemia, ao menos, intermitentemente.

Síndrome leite -álcalis. Encontrado em pacie n-tes que ingerem grandes quantidades de lei te e álcali (ex.: NaHCO3 ) como anti-ácido para aliviar úlceras. O álcali reduz a excreção de cálcio urin á-rio. É uma desordem rara.

Insuficiência renal. Insuficiência renal crônica, insuficiência renal aguda (fase diurética), e trans-plante renal.

Administração ou ingestão.. Nutrição parenteral. Regimes hiperalimentares.

Hipocalciúria-hipercalcemia familiar. É uma desordem rara transmitida por um gen dominante autossômico. Pacientes com este distúrbio podem ser assintomáticos por toda a vida. É caracterizada por hipercalcemia moderada, hipermagnesemia, PTH pouco elevado ou normal e hipocalciúria relativa.

Diuréticos tiazídicos. O emprego prolongado de diuréticos clorotiazídicos aumenta a secreção de PTH; o aumento da absorção intest inal do cál-cio interfere com a excreção renal de cálcio pro-duzindo uma hipercalcemia moderada.

Terapia com lít io. O uso de l í t io por longos períodos está associado ao hipotireoidismo (inib i-ção da ação do TSH), diabetes insipidus e hiper-calcemia. Esta última, não está esclarecida mas foi demonstrado estímulo na secreção de PTH e redu-ção da excreção renal de cálcio.

Aumento das proteínas plasmáticas. Hemo-concentração e hiperglobulinemia devido ao mie-loma múltiplo. Deve-se também descartar a “pseudoalbuminemia” promovida por hiperalbu-minemia, de forma que torna-se necessár io subtrair 0,8 mg/dL do nível de cálcio total para cada 1,0 g/dL de aumento na concentração sérica da albumina ou aplicar a seguinte fórmula:

Cálcio corrigido = cálcio sérico – albumina + 4

Manifestações clínicas da hipercalcemia. A maioria dos pacientes (>60%) são assintomáticos. Os sinais e sintomas da hipercalcemia não são específ icos. Os sintomas mais comuns estão rela-cio nados com o sistema neuromuscular. Fadiga, mal-estar e fraqueza muscular podem estar pre-sentes em hipercalcemias (<12 mg/dL). Depre s -são, apatia e incapacidade de concentração podem ser proeminentes em valores mais elevados (>12 mg/dL). A hipercalcemia pode induzir a uma dia-betes insipidus nefrogênica moderada; portanto, sede, polidipsia e poliúria podem estar presentes. Cólica renal devido a cálculos renais, é uma séria

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150 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

manifestação da hipercalcemia e hipercalciúria crônica.

Avaliação laboratorial da hipercalcemia. Na avaliação da hipercalcemia vários pontos devem ser cons iderados :

§ Idade e sexo. O hiperparatiroisimo primário é comum em mulheres com idade acima de 60 anos. A hipercalcemia benigna familiar pode estar presente em crianças.

§ Presença ou ausência de mal ignidade.

§ Dor óssea. Suspeitos de malignidade; hiperp a-ratireoidismo primário.

§ Medicamentos. Particularmente, vitamina D, l í t io e t iazídicos.

§ Cálculos renais . Comum no hiperparatireoidismo mas não na malignidade.

§ História familiar. Hipercalcemia benigna fa-miliar.

H IPOCALCEMIA

A hipocalcemia deve ser examinada sob a luz das variáveis que afetam fisiologicamente o cálcio ionizado ativo, principalmente, em relação ao teor de proteínas plasmáticas e pH sangüíneo. A hip o-calcemia verdadeira (redução de cálcio total e ionizado) incluem:

Hipoalbuminemia. A redução é ocasionada pela diminuição do cálcio ligado às proteínas; ocorre em enfermidade hepática crônica, síndrome ne-frótico, insuficiência cardíaca congestiva e des -nutrição. O Ca2 + plasmático não-ligado – a fração fisiologicamente importante – é mantido em níveis normais pelo PTH. Deste modo, variações no teor de cálcio plasmático devem ser acompanhadas de avaliação da concentração da albumina para evitar falsos resultados. O cálcio plasmático (em mmol/L) pode ser “corrigido”, aproximadamente, levando em conta a concentração de albumina (em g/dL) usando a fórmula:

Ca “corrigido” = Ca medido + 0,02 x (40 – conc. albumina)

Efeito da concentração do H+ no plasma. Na acidose, a protonização da albumina reduz sua capacidade de l igar o cálcio, elevando o teor de cálcio ionizado (Ca 2 +), sem alteração do cálcio total. Assim, a h iperventilação com alcalose respi-ratória pode reduzir o Ca 2 + plasmático com o des -envolvimento de tetania. Nos estados crônicos da acidose ou alc alose, o PTH atua no sent ido de reajustar o Ca 2 + plasmático em direção ao normal.

Insuficiência renal crônica. Moderada hip o-calcemia ocorre na maioria dos casos de insufic i-ência renal crônica. É de origem multifatorial:

§ Redução da captação intestinal devido: (a) diminuição da síntese de 1,25(OH)2 D pela inadequada massa renal; (b) precipitação do cálcio como fosfatos insolúveis no lúmem i n -testinal.

§ Resistência óssea à ação do PTH (toxinas urêmicas).

§ Redução da reabsorção renal do cálcio.

§ Precipitação in v ivo do fosfato de cálcio.

Síndromes de deficiência de vitamina D. São provocadas por:

§ Deficiência nutr ic ional . Redução da ingestão (deficiência dietética) e síndromes de má ab-sorção .

§ Exposição inadequada à luz solar ul travileta.

§ Diminuição da 25-hidroxi lação. Doença h e-pática; anticonvulsivantes (fenitoína).

§ Redução da 1 α-hidroxi lação. Doença renal com destruição do parênquima renal com perda da atividade da 1-α-hidroxilase.

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Metabolismo mineral e ósseo 151

§ Aumento da depuração de 1 ,25-DHCC. Sín-drome nefrótico, álcool, aminoglutimidina e fenitoína.

Pancreatite aguda. Um ou dois dias após a crise de pancretite aguda muitas vezes ocorre h i-pocalcemia moderada. A exata causa não foi es -clarecida mas parece envolver:

§ Depósito de cálcio como sabão no pâncreas lesado (a lipase libera ácidos graxos).

§ Liberação de glucagon que estimula a excre-ção de calcitonina.

§ Hipoalbuminemia.

§ Hipomagnesemia.

Deficiência de magnésio. Secreção reduzida de PTH e ação diminuída de PTH nos ossos e rins.

Hipoparatireoidismo. É uma condição rara que combina a redução do cálcio plasmático e aumento do fosfato em ausência de enfermidade renal. A atividade da fosfatase alcalina, em geral, é nor-mal. A confirmação deste distúrbio é realizada pela medida do PTH; os valores encontrados são baixos e, as vezes, indetectáveis.

Pseudo-hipoparatireoidismo É uma doença hereditária rara. É caracterizada por sintomas de hipoparatireoidismo, mas com níveis séricos elevados de PTH em lugar de reduzidos. O diagnóst ico do pseudo-hipoparatireoidismo pode necessi tar da aval iação do AMP-cíclico urinário.

Tetania. É um quadro que sugere hipocalcemia. Pode ocorrer nas situações acima descritas e, oca-sionalmente, na hipomagnesemia, em ausência de hipocalcemia e pela rápida elevação do fosfato plasmático.

Fase curativa de enfermidade óssea. Nos tratamentos de hiperparatireoidismo, hipertireoi-dismo e doenças malignas hematológicas.

Manifestações clínicas da hipocalcemia. Geralmente, a hipocalcemia é assintomática. Os s intomas estão relacionados ao teor sangüíneo de cálcio, da duração da hipocalcemia e da veloci-dade com a qual ela se desenvolve. A redução de cálcio livre provoca sintomas característicos: ir-ritabibilidade neuromuscular como a tetania la-tente. A ocorrência de diminuições significativas do cálcio plasmático determina o desenvolvimento de t e tania (espasmo carpopodálico), com flexão dos tornozelos e punhos, cr ispação muscular , cãimbras e, inclusive, convulsões. Concentrações de cálcio muito baixas podem estar associadas com a hipotensão e anormalid ades eletrocardio -gráficas, como o intervalo QT prolongado. Hip o-calcemia crônica (prolongada por vários anos) pode ser complicada por calcificação ganglia b a-sal, formação de catarata e anormalidades nos dentes , pele , cabelo e unhas.

Avaliação laboratorial da hipocalcemia. A abordagem na investigação do paciente com hip o-glicemia é:

§ Excluir as causas óbvias e comuns como a hipoalbuminemia, insuficiência renal e pan-creati te aguda.

§ Avaliação do teor de PTH: valores elevados são consistentes com hiperparat ireoidismo s e-cundário (ex.: deficiência de vitamina D) e pseudo-hiperparatireoidismo. Valores baixos ou “normais” indicam hipoparatireoidismo.

§ Em presença de hiperparatireoidismo secundá-rio (cálcio baixo, PTH elevado) o conteúdo de vitamina D (25-HCC e 1,25-DHCC) do paci-ente deve ser avaliado.

§ Em todos os casos de hipoparatireoidismo onde a causa não está esclarecida, particularmente aqueles irresponsíveis à terapia pelo cálcio, pode exigir a determinação do magnésio pla s mático.

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152 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

CÁLCIO URINÁRIO

A calciúria é determinada pelo método descrito para o soro e plasma, utilizando urina de 24 horas. Os sais de cálcio precipitam em urinas alcalinas; deste modo, o pH deve ser ajustado a pH 3 -4 com ácido clorídrico 6 mmol/L e papel indicador. A concentração do cálcio total na urina reflete: a absorção intest inal , a reabsorção óssea, a f i l-tração e a reabsorção tubular renal. Empregado no acompanhamento das terapias de reposição e na avaliação do metabolismo do cálcio nas doenças ósseas, nefro litíase, hipercalciúria idiopática e doenças da paratireóide.

Valores aumentados de cálcio urinário. Acromegalia, 5% da população normal, carcinoma metastático ósseo, doença de Paget, hipercalciúria primária, imobilizações, intoxicações, intoxicação por vitamina D, mielomas, sarcoidose, uso de es t rógenos e cor t icóides .

Valores reduzidos de cálcio urinário. Defi-ciência de vitamina D, hipocalciúria familiar, hipoparatireoidismo osteodistrofia renal, pseudo-hipoparatireoidismo, pré -eclâmpsia, uso de tiazí -dic o s .

DETERMINAÇÃO DO CÁLCIO

Paciente. Jejum de 8 h. Antes da prova, deve consumir dieta com quantidades normais de cál-cio, 600-800 mg/d durante 3 dias.

Amostra. Soro ou plasma heparinizado i sen tos de hemólise e separados prontamente após a co-leta, para evitar a captação do cálcio pelos eritró -ci tos . O sangue deve ser colhido sem estase ve-nosa para evitar as variações do cálcio, l igado às proteínas. Armazenado é estável em temperatura ambiente por 8 horas, quando refrigerado p or 24 horas e quando congelado por um ano. O cálcio na urina é mantido sem precipitação durante a coleta ou quando armazenado, pela adição de 10 mL de ácido clorídrico 6 mol/L ao frasco de coleta.

Interferências. Resultados falsamente aumenta-dos: hemólise, desidratação ou hiperproteinemia.

Resultados falsamente reduzidos: hipovolemia dilucional, administração de cloreto de sódio por via endovenosa 2 dias antes da coleta .

Métodos. O método histórico para a determin a-ção do cálcio, necessitava a precipitação do mesmo pelo oxalato com posterior titulação com perma ngato ou EDTA. Estes métodos não são mais utilizados pela reduzida sensibilidade. Também histó ricos são os métodos que uti l izam a t i tu lação direta do cálcio pelo EDTA, usando como indicador o Cal-Red , purpurato de amônio (murexidina) e negro de eriocromo T. Estes métodos apresentam dificuldade na visualização do ponto final da re ação .

o-Cresolftaleína. O método mais usado atual-mente baseia -se na formação de cor vermelha (medida espectrofotometricamente) entre o cálcio e a o-cresolftaleína complexona. A interferência do magnésio é eliminada pela adição de 8-hidro -xiquinolina a reação. A diálise da amostra com tampão ácido também é usada para liberar o cálcio l igado às proteínas. Esta reação é empregada em alguns equipamentos automatizados. Este método indireto é o princípio da química seca ( DT Vitros) que utiliza também o corante Arsenazo III, um indicador que altera a cor após complexar o cálcio.

Espectroscopia de absorção atômica. É o mé-todo de referência para a determinação do cálcio. Após dissociação dos átomos de cálcio das proteí-nas e dos complexos inorgânicos, é medida a quantidade de luz absorvida pelos átomos de cál-cio livres em determinado comprimento de onda (422,7 nm). O Ca 2 + + 2e - → Ca0 + Próton → Ca* (em estado excitado).

Diluição isotópica. O cálcio e uma quantidade conhecida de isótopo de cálcio são comparadas por espectrofotometria de massa. É o método d e-finitivo empregado somente em algumas institui-ções .

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Metabolismo mineral e ósseo 153

Valores de referência para o cálcio Adul tos (soro) 8,8 a 10,2 mg/dL Recém-nasc idos 7,0 a 12 mg/dL Recém-nascidos prematuros 6,0 a 10 mg/dL Crianças 8,8 a 11 mg/dL Urina adultos (dieta normal) 150 a 300 mg/d

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154 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

FOSFATO

organismo de um adulto contém 500 a 600 g de fósforo (medido como fosfato inorgânico)

amplamente distribuído. É o sexto elemento mais abundante do organismo. Os papéis biológicos do fósforo incluem:

§ Confere resistência estrutural ao osso quando combinado com o cálcio na forma de hidroxiapatita.

§ Participa como agente essencial (em ligações fosfato de “alta energia”) no metabolismo energético e no metabolismo dos carboidratos e gorduras .

§ Atua como tampão no plasma e urina. No líquido extracelular e em pH fisiológico, a maior parte do fósforo se apresenta nas formas

inorgânicas monovalentes ( H PO2 4− , diidroge-

nofosfato) e divalentes ( HPO42− , hidrogenofo s-

fato) . As quantidades relat ivas dos do is íons fosfato são dependentes do pH. Em pH 7,4, o coeficiente de diidrogeno fosfato/hidrogeno-fosfato é de 4:1. Devido ao efeito do pH sobre as concentrações re la t ivas das duas es pécies de fosfato, o fósforo sérico deve ser expresso em mg/dL.

§ Manutenção da integridade celular.

§ Regulação da atividade de algumas enzimas.

§ Regulação do transporte do oxigênio através do 2,3-difosfoglicerato eritrocitário.

A média de consumo dietét ico para os adultos é 800 a 1.500 mg/d dos quais cerca de 70% é absorvido (absorção ativa) prin cipalmente pelo jejuno e o restante é excretado pelas fezes no intest ino delgado. O fósforo está presente virtualmente em todos os alimentos.

No organismo o fósforo está assim distribuído:

§ Fosfato no esqueleto (80-90% do to ta l ) . O fosfato inorgânico e o cálcio são os principais comp onentes da hidroxiapati ta presentes no o s s o .

§ Fosfato intracelular (10-20% do to ta l ) . Fosfatos de al ta energia entre os quais o ATP. Esta fonte de energia mantém muitas funções como: con tractilidade muscular, função neurológica e transporte eletrolítico. O fosfato intracelular está primariamente ligado ou na forma de ésteres de fosfato orgânico.

§ Fosfato extracelular (<0,1% do total) . Mantém a concentração intracelular crít ica e fornece o substrato para a mineral ização dos ossos .

Ocasionalmente, cristais de fosfato de cálcio precipitam em outras áreas do corpo. Níveis de fosfatos anormalmente elevados, muitas vezes, provocam a formação de cálculos nos rins ou b e-xiga.

HOMEOSTASE DO FÓSFORO

A homeostase do fósforo é mantida por meio de diferentes mecanismos. Os três principais órgãos envolvidos na são: o in tes t ino de lgado, os rins e o esqueleto . Os níveis de fosfatemia elevam facilmente após uma copiosa refeição. Os antiácidos reduzem a absorção e o cálcio, o alumínio e o magnésio ligam o fósforo em complexos insolúveis. O alumínio é o ligante mais eficiente.

Os fatores que regulam os níveis de fo s fatemia são, em muitos casos, os mesmos que atuam sobre os teores de cálcio no sangue. Os n íveis séricos de fósforo, são inversamente proporcionais aos do cálcio sérico.

Hormônio paratireóideo (PTH). O PTH é secretado em resposta a hipocalcemia ou hipomagnesemia (Ver Cálcio). Isto libera o cálcio

O

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Metabolismo mineral e ósseo 155

e o fósforo para a circulação, mas como a reabsorção tubular do fósforo é inibida, o nível de fosfato não se eleva, podendo mesmo diminuir, provocando o aumento do cálcio sangüíneo. No r-malmente, 85 a 95% do fósforo filtrado pelo glo -mérulo é reabsorvido; a secreção de PTH bloqueia este mecanismo.

Vitamina D . Essa vitamina exerce efeito sobre os níveis de fosfato pelo aumento da reabsorção ó s -sea e, também, na elevação da absorção no lúmem intestinal. Além disso, a vitamina D em sua forma ativa, 1,25-diidroxicolecalciferol, eleva a reabsor-ção tubular de fosfato .

Hormônio de crescimento (GH). O GH regula o crescimento ósseo, promove a absorção intestinal e a reabsorção renal de cálcio e fósforo. Quando secretado excessivamente reduz teores de fosfatemia, pela utilização de fosfato na formação óssea .

Na p rática clínica, o único indicador disponível para as desordens da homeostase do fósforo é o seu nível plasmático que, não necessariamente, reflete o conteúdo de fósforo do corpo ou extraes-queleto.

H IPERFOSFATEMIA

Considera -se a h iperfosfatemia presente quando os níveis séricos são maiores que 5 mg/dL em adultos ou 7 mg/dL em crianças e adolescentes. A hiperfosfatemia causa hipocalcemia pela precipitação do cálcio, redução na produção de vitamina D e o impedimento da reabsorção óssea PTH-mediada. As principais causas de hiperfosfatemia são:

Redução da excreção renal de fosfato. A excreção renal de fosfato é igual a absorção gastrointestinal . A redução na excreção ocorre:

§ Na insuficiência renal crônica é comum a presença de hiperfosfatemia quando a velocidade de filtração glomerular (GFR) é menor que 25 mL/minuto.

§ Aumento da reabsorção tubular: hipoparatireoidismo (deficiência de PTH).

§ Acromegalia (elevados teores séricos de hor-mônio de crescimento). Aumenta a reabsorção renal dos fo s fa tos .

§ Usuários de hemodiálise.

Aumento da ingestão ou administração de fosfato. Adminis tração oral ou intravenosa de sais de fosfato (laxantes orais/retal, enemas). Intoxicação de vitamina D ou outras causas que aumentam a vitamina D como a sarcoidose. Hiper-alimentação (incluindo administração lipídica). Queimaduras por fósforo branco. Síndrome leite-álcal is . Transfusão de sangue velho.

Endocrinopatias. Hipoparatireoidismo. Pseudo-hipoparatireóidismo. Anormalidades nos teores do hormônio paratireóideo. Acromegalia e outras causas do excesso de hormônio de crescimento. Tirotoxicose. Deficiência de glicocorticóides.

Aumento do catabolismo ou dano celular. Rhabdomiólise. Trauma, queimaduras, danos por esmagamento, choque. Exercícios intensos. Imobilização p rolongada. Doenças cardíacas relacionadas. Hipertermia maligna. Hipotermia. Hemólise massiva. Infeções severas. Isquemia intestinal.

Neoplasma. Leucemia mielóide crônica. Linfoma. Tumores ósseos. Lise tumoral após quimioterapia.

Acidose. Acidose respiratória aguda. Acidose láctica. Cetoacidose diabética. Cetoacidose alcoólica.

Pseudohiperfosfatemia. É encontrado devido a paraproteinemia promovida por: macroglobu-linemia de Waldenstrom, mieloma múltiplo ou ga-mopatia monoclonal de significação desconhecida.

Manifestações clínicas da hiperfosfatemia. O problema mais comum associado com elevações

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156 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

rápidas nos teores de fosfato sér ico é a hipocal-cemia. As manifestações são:

§ Sistema nervoso central (SNC). Estado mental alterado. Delírio. Coma. Entorpecimento. Convulsões e insulto apoplético. Cãibras musculares e tetania. Hiperexcitabilidade neu-romuscular (sinais de Chvostek e Trousseau). Parestesias particularmente perioral e extremi -dades distais) .

§ Sistema cardiovascular. Hipotensão e insufi-ciência cardíaca. P rolongamento do intervalo QT.

§ Ocular. Catarata.

Avaliação laboratorial da hiperfosfatemia. A maioria das causas de hiperfosfatemia são indi-cadas pelo quadro cl ínico e a part i r dos níveis de eletróli tos no soro. Se a etiologia for obscura o seguinte esquema deve ser seguido:

§ Excluir a hiperfosfatemia em crianças e as causadas por hemólise.

§ Excluir a insuficiência renal pela determin a-ção da creatinina sérica.

§ Em casos de calcemia aumentada ou normal, considerar o excesso de vitamina D, maligni-dade óssea, d iabetes mellitus não-tratada e acidemia (acidose láctica). Em presença de cálcio reduzido, o hipoparatireoidismo pode ser a causa.

§ A avaliação da excreção urinária de fosfato pode ajudar em alguns casos. Hipofosfatúria é usual no hipoparatireoidismo. Para a hiperfo s-fatúria considerar o aumento na ingestão, des-truição celular in v ivo e malignidade.

Medicação para a redução do fósforo. São utilizadas vários fármacos com esse fim:

§ Fixadores orais de fosfato. Carbonato de cálcio: combina com o fosfato da die ta e forma fosfato de cálcio insolúvel excretado

pelas fezes. Hidróxido ou carbonato de alumínio. Gluconato de cálcio: modera a atividade nervosa e muscular e normaliza a função cardíaca. Cloreto de cálcio: utilizado para o tratamento da hiocalcemia result ante de hiperfosfatemia.

§ Diurét ico/ in ibidor da anidrase carbônica. Acetazolamina: aumenta a excreção renal do fósforo.

H IPOFOSFATEMIA

A hipofosfatemia é definida como leve (2-2,5 mg/dL), moderada (1-2 mg/dL) ou severa (<1 mg/dL). As causas mais comuns são: ret irada repentina do álcool e em pacientes sob tratamento de cetoacidose diabética.

Alterações intracelulares. Maior fosfatação da glicose (aporte oral ou intravenosa, hiperalime n-tação), hiperinsulinismo e alcalose respiratória, movem o fosfato para dentro das células pela at ivação da fosfofrutoquinase, que est imula a glicólise intracelular. A glicólise promove o consumo de fosfato pela produção de derivados fosforilados. Qualquer causa de hiperventilação (ex.: septicemia, ansiedade, dor, insolação, retirada de álcool, cetoacidose diabética, encefalopatia hepática, envenenamento por salicilato) pode precipitar a hipofosfatemia. A administração de carboidratos reduz o teor de fosfato sérico pelo estímulo na l iberação da insul ina , que transfere glicose e fosfato para dentro das células. As catecolaminas e os agonis tas β-receptores também estimulam a captação de fosfato pelas células. A leucemia e linfomas podem consumir fosfato, promovendo hipofosfatemia.

Aumento da excreção urinária. A insufi-ciência renal crônica é a doença renal que mais afeta o metabolismo do cálcio e do fósforo. Esta doença provoca hiperparatireoidismo compen-satório, o qual por sua vez, causa a doença óssea difusa, incluindo osteoporose, osteomalacia, o s t eoesclerose (áreas de densidade óssea aumentada), osteíte fibrosa cística e calcificação

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Metabolismo mineral e ósseo 157

metastática. Outras causas de excreção urinária aumentada de fosfato:

§ Expansão agudo do volume, diurese osmótica, inibição da anidrase carbônica (ex.: acetazolamida) e alguns neoplasmas.

§ Raquitismo resistente à vitamina D, também chamado de hipofosfatemia familiar, é herdado usualmente por um caráter dominante ligado ao sexo.

§ Síndrome de Fanconi (disfunção do túbulo proximal), doença renal herdada que se caracteriza pela excreção urinária aumentada de fosfato, glicose e aminoácidos.

Redução da absorção intestinal do fosfato. Perda aumentada: sucção nasogástrica prolongada, diarréia crônica e uso intenso de antiácidos l igadores de fosfato. Redução na absorção: dieta severa com restrição de fosfato, síndromes de má absorção e deficiência de vitamina D.

Manifestações clínicas da hipofosfatemia. A hipofosfatemia média/moderada é geralmente assintomática. As manifestações cl ínicas geralmente ocorrem no estado severo. Os sinais e sintomas mais comuns são: fraqueza muscular, necrose muscular, dor óssea, acidose metabólica, disfunção das plaquetas, disfunção dos eritrócitos, hemólise, sintomas neurológicos variados, disfu n-ção leucocitária e sinais de insuficiência cardíaca devida a cardiomiopatia. A hipofosfatemia também causa rabdomiolisis via depleção do ATP e a conseqüente incapacidade das células musculares manter a integridade da membrana. Pacientes que sofrem uma severa restrição de álcool são especialmente vulneráveis a rabdomiolisis secundária a hipofosfatemia, provocada pela rápida captação de fosfato pelas células musculares. A rabdomiolisis raramente ocorre em pacientes tratados de cetoacidose diabética ou al imentado após inanição. A insuficiência respiratória pode ocorre r em alguns pacientes com hipofosfatemia severa, part icularmente quando a causa for a inanição.

As funções hematológicas também podem ser afetadas. A anemia hemolítica associada com hipofosfatemia severa é atribuída a incapacidade dos eritrócitos manter a integridade das membranas celulares devido a depleção do ATP, provocando a sua dest ruição no baço. A deficiência de fosfato também compromete a l iberação do oxigênio para os tecidos, pela redução do 2,3 bisfosfoglicerato (2,3-BPG) eritrocitário. A deficiência de fosfato comumente prejudica as funções neurológicas, que se manifestam por confusão e coma. Neuropatia periférica e paralisia motora ascendente, similar ao síndrome de Guillain -Barré, também pode ocorrer.

Avaliação laboratorial da hipofosfatemia. Invest igar as causas mais comuns de hipofo s -fatemia severa, como alcalose respiratória, alcoo-lismo crônico, cetoacidose alcoólica, ansiedade, botulismo, cetoacidose diabética, síndrome de Guillain -Barré, hiperventilação e hiperparatireoi-dismo baseado na observ ação cl ínica e testes bioquímicos de rotina. Se a etiologia não for óbvia, proceder a determinação da velocidade de excreção urinária de fosfato. Outros eletrólitos:

§ A hipomagnesemia muitas vezes está associa -da com o deslocamento de fosfato para o interior das células.

§ A hipercalcemia é comum no hiperparatireio -dismo primário.

§ Alterações no potássio sérico estão associadas com certas causas de hipofosfatemia, tais como Cetoacidose diabética e alcoolismo.

FOSFATO URINÁRIO

O fosfato urinário varia com idade, massa muscu-lar, função renal, nível de hormônio paratireoideo, hora do dia e dieta. Nessa avaliação emprega-se urina de 24 horas colhida sem conservantes.

Valores aumentados de fósforo urinário. Insuficiência renal, hipoparatireoidismo, pseudo-

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hipoparatireoidismo, hipervitaminose D, osteopo-rose, acromegalia, mieloma múltiplo, leucemia mielóide crônica, metástase óssea, hipocalcemia, diabetes mellitus descompensada, exercícios, d e-sidratação e hipovolemia.

Valores reduzidos de fósforo urinário. De-feitos tubulares de reabsorção (síndrome de Fan-coni), hiperparatireoidismo primário e secundário, hipotireoidismo, esteatorréia, osteomalácia, hi-povitaminose D, raquitismo, hemodiálise, doença hepática, alimentação parenteral prolongada, anti-ácidos, diuréticos, alcoolismo e tratamento da cetocetose diabética.

DETERMINAÇÃO DO FÓSFORO

Paciente. Permanecer em jejum 8-12 h antes da coleta. Após ingestão de alimentos ou administra-ção de glicose ocorre r edução da fosfatemia. Esta diminuição se deve ao aumento do pH sangüíneo após a refeição que eleva a formação de comple-xos cálcio -fosfato. Também contribui para a hi-pomagnesemia, a captação induzida pela insulina do fosfato sérico pelo músculo e f ígado, que per-mite a formação de intermediários glicose-fosfato.

Amostra. Soro, plasma heparinizado e urina de 24 h. O soro e plasma devem ser isentos de hemó -lise (o fósforo está várias vezes mais concentrado nos eritrócitos que no plasma e, também, porque a hemoglobina interfere na reação). Separar o soro ou plasma tão rápido quanto possível . Urina de 24 h colhida sem conservantes .

Interferências. Resultados falsamente elevados: enema ou infusão de fosfato, fenitoína, heparina cálcica, heparina sódica e injeção de hipófise posterior. Resultados falsamente reduzidos: an-drogênios, antiácidos (quelantes de fosfato), b i-tartarato de adrenalina, borato de adrenalina, clo -ridrato de adrenalina, diuréticos, esteróides ana-bólicos, glucagon, insulina e salicilatos.

Métodos. O fósforo na forma de fósforo inorgânico nos l íquidos biológicos, é tradicionalmente ensaiado pela formação de um complexo do íon fosfato com o molibdato de amônio em pH ácido. O complexo fósforo -mo -

libdato não-reduzido é medido diretamente em 340 nm (método de escolha) ou convertido em azul de molibdênio mediante o emprego de vários agentes redutores, tais como, hidroquinona, ácido 1 -amino-2-naf tol-4 -sulfônico (ANS), p -semidina (N-fenil-feni lenhidrazina) , sul fato amônio-fer-roso, c loreto de estanho e metol (meti l -p -aminofenol sul fato) . Este últ imo redutor é usado em química seca (DT Vitros). Alguns compostos, como o citrato, oxaloace-tato, tartarato, sorbitol, manitol e silica, podem interferir com o molibdato pela formação de um complexo com o molib da to .

Enzimáticos. Um dos métodos emprega a pu-rina nucleosídio fosfori lase e a xant ina oxidase para produzir H2 O2 a partir do fósforo e inosina. Outro método emprega a fosforilação do glicogê-nio pela fosforilase A, acoplada com a fosfogli-comutase e a g licose 6 -fosfato desidrogenase com a medida das alterações do NADH em 340 nm. Este método elimina a interferência da bilirrubina e utiliza pH neutro que miniminiza a hidrólise de ésteres fo s fato.

Valores de referência para o fósforo Adul tos 2,2 a 4,5 mg/dL Recém-nasc idos 3,5 a 8,6 mg/dL Crianças 4,0 a 7,0 mg/dL Urina (adultos) 400 a 1300 mg/d

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159 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

MAGNÉSIO

magnésio é o quarto cat íon mais abundante no corpo e o segundo cat íon mais concen-

t rado no compartimento intracelular. O conteúdo total no corpo é 2.000 mEq ou 24 g. Sua concen-t ração no líquido intracelular é aproximadamente 10 vezes maior que no líquido extracelu lar. Cerca de 67% do magnésio no organismo está associado ao cálcio e ao fósforo, no esqueleto. O res tante é encontrado no músculo esquelét ico e cardíaco, rim, fígado e líquido intersticial. Somente 1% do magnésio total se encontra no plasma. Ao redor d e 30% do magnésio presente no plasma está ligado à albumina, proteínas, ci trato e fosfato. Os outros 70% aparecem na forma livre ou iônica e uma pequena porção como um complexo de ânions.

Ao redor de 40% do consumo dietét ico diário do adulto (300-350 mg) são absorvidos no í leo e excretados na urina e fezes. O pro cesso de absorção parece ser pobremente contro lado e a homeostase é mantida pela excreção re nal, que é regulada pela reabsorção tubular.

O magnésio apresenta as seguintes funções fisiológicas em cada compartimento:

Função intracelular:

§ Importante papel como cofator em mais de 300 sistemas enzimáticos.

§ Ativador alostérico de muitas enzimas (ex: adenilato ciclase).

§ Fundamental na glicólise, fosforilação oxida-t iva, replicação celular, metabolismo dos nu -cleot ídios , biossíntese protéica, contração mu s cular e coagulação sangüínea.

§ Essencial na manutenção da estrutura macro -molecular do RNA, DNA e na síntese protéica.

§ As proteínas regulatórias Gs e Gi necessitam magnésio para expressar sua atividade.

Função extracelular:

§ Fonte de manutenção do magnésio intracelular.

§ Estabilização dos axônios neurológicos; a re-dução da concentração do magnésio diminui o limiar do estímulo do axônio aumentando a velocidade da condução nervosa.

§ Influencia a liberação d o neurotransmissor na junção neuromuscular por competitividade ini-bindo a entrada de cálcio no terminal pré -s i-náptico nervoso. Portanto, a redução do teor de magnésio no soro aumenta a excitabilidade. O magnésio e o cálcio são antagonistas f is iológi-cos no sistema nervoso central .

Função no esqueleto

§ Aproximadamente 67% do magnésio está presente nos ossos; um terço do mesmo está disponível para troca com o líquido extrace-lular. Esta fração atua como reservatório para manutenção do magnésio no plasma.

BALANÇO DO MAGNÉSIO

O mecanismo de regulação do magnésio no pla s ma é pouco conhecido. A fração ionizada é afetada pelo pH e pela concentração das proteínas, citrato, e fosfato no plasma. O hormônio parati-reóideo e a aldosterona também atuam no controle de magnésio circulante. Foram descritas relações recíprocas entre a magnesemia e a calcemia e, em alguns casos, entre a magnesemia e fosfatemia. Somente 30-40 por cento do magnésio ingerido é absorvido. A absorção pode ser afetada pela quantidade de cálcio, fosfato, proteína , lactose ou álcool presentes na dieta. O magnésio é excretado na urina e fezes (este ú1timo representa o catíon não absorvido). A excreção urinária é igual a a b-

O

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160 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

sorção, exceto nas condições de depleção ou e x-ces so de magnésio. A avaliação do estado do magnésio é difícil . As medidas rotineiras laboratoriais medem a con-centração do magnésio sérico, que tem pouca cor-relação com o magnésio intracelular, particula r-mente, em desordens crônicas. O diagnóstico da deficiência de magnésio baseia -se geralmente na história e exame físico cuidadoso. A medida da excreção urinária de magnésio é úti l na dist inção entre as perdas renais de magné-sio de outras causas de hipomagnesemia.

H IPOMAGNESEMIA

As diminuições do magnésio raramente ocorrem como um fenômeno isolado. Geralmente são acompanhadas por desordens no metabolismo do potássio, cálcio e fósforo. As concentrações de magnésio sér ico estão reduzidas nos seguintes c a s o s :

Desordens gastrointestinais. Sucção nas o-gástrica prolongada com a administração de flu i-dos parenterais l ivres de magnésio, s índromes de má absorção, diarréia aguda e crônica, fístulas intestinais e biliares, pancreatite hemorrágica aguda; hipomagnesemia primária neonatal, má nutrição proteína-calórica e ressecção intestinal extensa.

Perda renal . Terapia parenteral líquida crônica, diurese osmótica (diabetes mellitus, manitol, uréia), hipercalcemia, álcool e fármacos (diuréticos, aminoglicosídios, cisplatin, ciclosprorina, gentamicina, anfoterecina B, glicosídios cardíacos e pentamidina).

Acidose metabólica. Desnutrição, cetoacidose e alcolismo.

Enfermidade renal. Pielonefrite crônica, nefrite intersticial, glomerulonefrite, fase diurética da necrose tubular aguda, nefropatia pós-obs t rutiva, acidose tubular renal e t ransplante pós-renal.

Hipomagnesemia primária.

Depleção de fosfato.

Alcoolismo crônico. É uma causa severa de hipomagnesemia provocada pelo aumento da ex-creção renal – álcool induzida, ingestão inade-quada, vômito e diarréia.

Cirrose hepática.

Pancreatite aguda.

Sintomas da hipomagnesemia. Os sinais e sintomas da depleção do magnésio usualmente não aparecem até que os níveis extracelulares tenham caído a 0,5 mmol/L ou menos. As manifestações são s imilares aos provocados pela redução do cálcio, tais como irritabilidade neuromuscular severa, tetania, convulsões e arri tmias cardíacas. Incluem ainda: debilidade, depressão, agitação, hipocalcemia e hipocalemia. Estas alterações re-fletem a deficiência do magnésio ionizado. Em geral, a deficiência é secundária a outra enfermi-dade ou a um agente terapêutico.

Avaliação laboratorial da hipomagnesemia. Na maioria das vezes o quadro clínico esclarece a causa da hipomagnesemia. Nos casos não esclare-cidos, os testes a seguir podem ser ú te i s :

§ Magnésio urinário. Depende da ingestão, no entanto, nos estados de depleção podem levar à hip omagnesemia.

§ Cálcio plasmát ico. Hipercalcemia: sobrecarga de cálcio e hipercalcemia crônica, incluindo as devidas ao hiperparatireoidismo, podem au-mentar a excreção renal do magnésio e promo-ver hipomagnesemia. Hipocalcemia: associada ao hipoparatireodismo ou com a hipomagnesemia.

§ Eletróli tos séricos. Valores diminuídos de potássio sérico podem indicar as causas de d e-pleção de magnésio como o hiperaldostero -nismo primário, terapia diurética, diarréia e abuso de laxantes. Hiponatremia associada com hipomagnesemia pode sugerir SSIHAD (v. sódio).

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Metabolismo mineral e ósseo 161

H IPERMAGNESEMIA

A hipermagnesemia é uma anormalidade rara pois o rim é bastante efetivo na excreção do excesso do eletrólito. A hipermagnesemia sintomática ocorre mais freqüentemente em pacientes com insuficiência renal . Nas outras condições, as manifestações clínicas estão, em geral , ausentes. As causas de h ipermagnesemia são:

Ingestão excessiva de magnésio. São devidas a intervenções iatrogênicas e administração, especialmente secundários a erros de cálculo da quantidade apropriada de infusões de magnésio, e/ou em pacientes com insuficiência renal. Ocorre também via oral (antiácidos), retal (laxantes), parenteral no tratamento de doença hiper tensiva específ ica da gestação – pré -eclâmpsia (nestes casos pode ocorrer intoxicação tanto da mãe como do recém-nascido) ou na correção de deficiência de magnésio.

Insuficiência renal. Aguda ou crônica em pacientes com ingestão de ant iácidos ou catárt icos. O magnésio sérico eleva quando a depuração de creatinina for inferior a 30 mL/minuto.

Ingestão de lítio.

Cetoacetose diabética. O magnésio deixa as células aumentando o nível plasmático.

Doença de Addison. Insuficiência adrenal.

Hipercalcemia-hipocalciúrica familiar. (v. cálcio).

Síntomas da hipermagnesemia. Os sintomas neuromusculares são as manifestações mais co-muns nas intoxicações pelo magnésio. Um dos primeiros sinais é o desaparecimento dos reflexos dos tendões ( teores sér icos entre 5 -9 mg/dL). D e-pressão da respiração e apnéia em virtude da paralis ação da musculatura voluntária quando o magnésio atinge 10-12 mg/dL. Valores mais elevados podem ser cardiotóxicos e provocar parada cardíaca. O ut r o s s intomas encontrados são: sonolência, hip o tensão, náusea, vômito, e rubor

cutâneo. A hipermagnesemia induz à redução do cálcio sérico. Acredita-se que isto é devido à interferência na secreção e ação do PTH.

Avaliação laboratorial da hipermagnese -mia. As causas comuns de hipermagnesemia f o -ram descritas acima. Entretanto, chama -se atenção para outras condições :

§ Terapia com magnésio (ex.: pré -eclâmpsia).

§ Aumento da ingestão de magnésio na insufic i-ência renal (ex.: pacientes com insuficiência renal crônica que usam laxativos ou prepara-ções antiácidas contendo magnésio) .

§ Hipercalemia e hipercalcemia muitas vezes estão presentes concomitantemente.

DETERMINAÇÃO DO MAGNÉSIO

Paciente. Não é exigido cuidados especiais.

Amostra. Soro e plasma heparinizado isentos de hemólise (os eritrócitos contêm três vezes mais magnésio que o soro) e l ipemia separado tão rápida quanto possível após a coleta. Refrigerado, o soro permanece estável por 2-3 dias. O sangue deve ser colhido com o mínimo de es tase .

A urina de 24 horas empregada nessa determi-nação deve ser conservada pelo uso de ácido c lo -rídrico concentrado até a amostra atingir pH 1.

Interferências. Resultados falsamente elevados: antiácidos e catárt icos. Resultados falsamente reduzidos: hip erbilirrubinemia, terapia com ácido glicurônico que interfere na reação colorimétrica, terapia prolongada com líquidos intravenosos, hip eralimentação, exsangüíneo transfusão ou aspi-ração nasogástrica prolongada. Drogas: anfoteri-cina, cisplatina, corticosteróides, diuréticos, gli-conato de cálcio e insulina.

Métodos. O método de escolha para a determin a-ção do magnésio é a espectrofotometria de abso r-ção atômica que sofre interferências mínimas além de ser simples, sensível e específico. Como a maioria dos laboratórios não dispõe deste equip a-

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162 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

mento, existem como alternativa, métodos flo u-rescentes, colorimétricos e enzimáticos.

8-Hidroxi-5 -quinolinsulfônico. Forma por quelação com o magnésio um composto fluore s -cente.

Amarelo de t i tan. É empregado em meio alca-lino com a formação de um complexo colorido. A impureza do reagente compromete a exatidão, a precisão e a sensibi l idade do teste.

Azul de meti l t imol. O magnésio reage com o azul de metiltimol formando complexos coloridos medidos em 510 e 600 nm. Apresenta boa corela-ção com a espectrofotometria de absorção atô-mica.

Calmagite . O uso de Calmagite (ácido 1-[1-hidroxi -4-metil-2-fenilazo]-2-naftol-4-sulfônico), um corante metalcrômico, para a determinação do magnésio sem desproteinização, é o método colo -rimétrico que apresenta a melhor correlação com os resul tados obt idos por espectrofotometr ia de absorção atômica. O magnésio reage com o cal-magite azul para formar um complexo magnésio -calmagite. A modificação de cor, do azul para violeta avermelhado, é monitorada em 532 nm. A interferência do íon cálcio é prevenida pelo uso de EGTA [etilenebis (oxietilenenitrilo)] tetracetato enquanto o cianeto de potássio é usado para inibir a reação dos metais pesados com o calmagite.

Clorofosfonazo III. O agente quelante cloro-fosfonazo III (CPZ) seletivamente complexa o

magnésio presente na amostra. É adicionado EGTA para quelar o cálcio. Na segunda fase do ensaio, o EDTA é adicionado para remover o ma g-nésio do complexo com alterações na absorvância.

Valores de referência para o magnésio (mmol/L) Crianças e adultos 0,7 a 1,1 Recém-nasc idos 0,6 a 1,0

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163 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

ENFERMIDADE METABÓLICA ÓSSEA

Os defeitos generalizados na mineralização óssea, frequentemente associados ao metabolismo anormal do cálcio ou fosfato, são agrupados como “enfermidades metabólicas ósseas”. Em muitos exemplos de enfermidades metabó-l icas ósseas, os pacientes mostram características de duas ou mais destas condições, o que dif iculta a plena identif icação do processo patológico, mes mo com a ajuda de exames radiológicos ou biópsia óssea.

OSTEOPOROSE

A osteoporose caracteriza -se pela redução conco-mitante do mineral e da matriz óssea com deterio -ração da microarquitetura do tecido ósseo, que, no entanto, é histológica e quimicamente normal. Isto aumenta a fragil idade dos ossos e o r isco de fra -tu ra. É a doença metabólica mais comum do osso. Não é uma entidade etiológica única mas está associada com vários fatores epidemiológicos , cl ínicos e bioquímicos que resultam no de-créscimo da massa óssea.

O pico de densidade óssea é normalmente at in-gido ao redor dos 30 anos. A quant idade óssea obt ida durante o crescimento é uma determinante importante para o aparecimento de osteoporose clínica na idade avançada. Exercícios e alimenta-ção adequada também são primordiais na obtenção e manutenção da massa esquelética. Após a idade de 35 a 40 anos, a reabsorção óssea excede leve-mente a formação óssea com a perda óssea na o r-dem de 1% ao ano. Em mulheres, ao redor da me-nopausa, a perda óssea está em 2% ao ano. Este aumento na reabsorção está diretamente relacionado à deficiência de esteróides sexuais e pers is te por uma década. A idade (1,4 a 1,8 vezes mais por década de vida), o sexo (mulh e-res>homens) e a deficiência de hormônios esteróides são fatores de r isco importantes. A osteoporose pode ser decorrente de uma ou mais patologias sistêmicas que provocam a diminuição da massa óssea de forma acentuada. A melhor

forma de se evitar a instalação e as complicações resultantes da osteoporose é a prevenção que pode ser conseguida através da identificação e eliminação de fatores de risco e do diagnóstico precoce da perda óssea . Causas da os teoporose :

Primária. Pode ser dividida em t i p o I, onde a perda óssea ocorre, principalmente, no osso trabe-cular e está intimamente relacionada com a perda da função ovariana pós-menopausa; e t ipo II (s e-nil) que envolve a perda óssea cort ical e trabecu-lar em decorrência do envelhecimento normal.

Secundária. Ao redor de 20% das fraturas por osteoporose são secundárias a a lguma condição médica, envolvendo as que seguem:

§ Doenças endócrinas. Hipogonadismo femi -n ino (hiperprolactinemia, amenorréia hipo-ta lâmica, anorexia nervosa, insuficiência ova-riana prematura e primária); hipogonadismo masculino (insuficiência gonadal primária – síndrome de Klinefelter – insuficiência gona-dal secundária, puberdade tardia; hipertireoi-dismo; h iperparatireoidismo; hipercortiso-lismo; defic iência do hormônio de cresimento e diabetes .

§ Doenças gastrointest inais . Gastrectomia sub-total , síndromes de má absorção, icterícia obstrutiva crônica, alactasia, cirrose biliar primária e outras cirroses.

§ Distúrbios da medula óssea. Mieloma múlt i-plo, linfoma, leucemia, anemias hemolíticas, mastocitose sistêmica e carcinoma dissemi -nado .

§ Doenças do tecido conjunt ivo. Osteogênese imperfeita, síndrome de Ehlers -Danlos, artrite reumatóide, síndrome de Marfan e homocisti-núria.

§ Drogas. Álcool, heparina, glicocorticóides, t iroxina, anticonvulsivantes, alumínio (antiá-

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164 Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações

cidos), agonistas do hormônio de l iberação de gonadotrofinas, ciclosporina e quimioterapia.

Manifestações clínicas. A os teoporose é as -sintomática a menos que resulte em fraturas. Pro-blemas secundários incluem abdomem protube-rante, constipação crônica e perda da auto estima.

Recentemente foi apresentado um novo teste para avaliação laboratorial da reabsorão óssea: a medida do NTx urinário. O NTx (N-telopeptídio do colágeno ósseo t ipo I) é l iberado na corrente sangüínea durante a fase de reabsorção óssea e excretado na urina. A quantificação da excreção urinária do NTx é um indicador sensível e especí -fico de alterações súbitas nos níveis de reabsorção óssea. A medid a é indicada na: osteoporose, me -nopausa e pós -menopausa, doença óssea de Paget e t ra tamento com supressores de estrogênios .

OSTEOMALÁCIA E RAQUITISMO

Osteomalácia (ou raquitismo quando ocorre antes de cessar o crescimento - ou seja, fechamento das epífeses dos ossos) caracter iza -se pela mineraliza-ção incompleta do tecido ósseo resul tante de vá-rios distúrbios no metabolismo do cálcio e fós-foro. A formação osteóide continua, mas os ossos to rnam-se moles. É quase sempre devida a defici-ência de vitamina D (particularmente importante na infância) ou pela depleção de fosfato. As principais causas da osteomalacia são:

Deficiência de vitamina D. Menor formação de vitamina D ou seus metabólitos por:

§ Exposição inadequada à luz ultravioleta.

§ Ingestão inadequada de vitamina D.

§ Má absorção de vitamina D e de cálcio, em razão da gastrectomia, doença intestinal, hepática ou biliar.

§ Distúrbios no metabolismo da vitamina D (d o-ença renal, raquitismo dependente de vitamina D tipo I e t ipo II).

§ Resistência à vitamina D.

§ Enfermidade hepática (redução na formação de 25(OH)D).

§ Medicação anticonvulsiva, difenildantoína, fenobarbital ou compostos de alumínio (a u-mento do catabolismo da vitamina D).

Hipofosfatemia crônica. Acompanhada de hipocalcemia e níveis elevados de fosfatase alc a-lina. Reduz o potencial de mineralização dos sais ósseos. É promovida pelo abuso de álcool , over-dose de hidróxido de alumínio, perda renal tubular seletiva, síndrome de Fanconi e osteomalácia o n-cogênica.

Manifestações clínicas. Incluem fraqueza muscular proximal, andar bamboleante, dor difusa nos ossos e propensão à f ra turas .

Resultados laboratoriais. A osteomalacia é geralmente caracterizada por elevados valores da fosfatase alcalina sérica. Hipocalcemia é encon-trada na deficiência de vitamina D. Devido à h i-pocalcemia, ocorre o desenvolvimento de hiperp a-ratireoidismo secundário, causando hipofosfate-mia. A concentração de cálcio e PTH estão nor-mais nos defei tos do t ransporte de fosfato nos túbulos renais .

DOENÇA ÓSSEA DE PAGET

A doença óssea de Paget (osteí te deformante) é um distúrbio crônico de causa desconhecida ca-racterizada por rápido comprometimento do remo-delamento ósseo. Pode envolver somente um osso ou ser mais ou menos generalizada. Inicialmente, verifica-se a ocorrência de reabsorção óssea ex-cessiva e aumento da at ividade osteoclástica. S e-gue-se uma fase de formação aumentada de osso, ocasionando um padrão desorganizado de áreas recém-formadas e irregularmente distribuídas de osso lamelar. Este osso é mais fraco que o normal, estando sujeito a fraturas e outras deformidades. É uma enfermidade que atinge 4% da população

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Metabolismo mineral e ósseo 165

acima de 40 anos. Crânio, fêmur, pelve e vért e-bras são os ossos mais comumente afetados.

Manifestações clínicas. As manifestações clínicas incluem dor músculo -esquelética, defo r-midade esquelética, artrite degenerativa, fraturas patológicas, déficits neurológicos pela compressão da raiz do nervo ou do nervo craniano (incluindo surdez) e, raramente, insuficiência cardíaca com débito alto, sarcoma osteogênico, fibrosarcoma, condrossarcoma e tumor de células gigantes. A maioria dos pacientes é assintomática, sendo a doença descoberta em decorrência do alto nível de fosfatase alcalina sérica ou por meio de radiografias t iradas por outro motivo.

Avaliação laboratorial. Os achados são: eleva-ção da atividade da fosfatase alcalina sérica (que reflete a proliferação osteoclástica ativa, mas p a-tológica), da osteocalcina sérica, da excreção uri-nária de hidroxipro lina (pelo “turnover” aumen-tado do colágeno) e, em menor grau, do cálcio e fósforo. Estes parâmetros são úteis na monitora -ção da terapia desta enfermidade. Os teores do cálcio e fósforo inorgânico séricos são usualmente normais porém,, ocasionalmente, aumentados . Os níveis de PTH apresentam-se normais.

OSTEODISTROFIA RENAL

A osteodistrofia renal compreende várias anorma-lidades esqueléticas que podem estar associadas à insuficiência renal devido a vários mecanismos patofisioló gicos. Osteíte fibrosa, osteomalácia, osso aplástico e amilóide esquelética podem ser encont rados . As concentrações séricas de PTH estão muitas vezes elevadas na insuficiência renal crônica, resultando em enfermidade óssea hiperparatiróide ou oste í te f ibrosa. Como os rins regulam o meta-bolismo do fosfato, ocorre hiperfosfatemia na insuficiência renal por incapacidade dos rins ex-cretarem fosfato. Devido ao equilíbrio entre o cálcio e o fosfato no plasma, o fosfato elevado provoca hipocalcemia. Isto estimu la a secreção de

PTH com hiperplasia das glândulas paratireóides. Além disso, os teores sangüíneos de 1,25(OH)2 D (metabólito ativo da vitamina D) devido a incapa-cidade dos rins em sintetizá -lo (falta da enzima 1 -α-hidroxilase), estão baixos na insuficiência renal e resultam na má absorção do cálcio intestinal e estimulam a secreção de PTH. Finalmente, a re-sistência esquelética à ação do PTH é descrita na insuficiência renal; isto contribui para hipocalc e-mia e hiperparatireoidismo secundário. A osteomalá cia pode ser uma complicação da insuficiência renal crônica. A intoxicação por alumínio presente na água usada na diálise e em ant iácidos são fontes comuns. Como o alumínio não é excretado na insuficiência renal, pode depositar no osso impedindo a mineralização e, portanto, causar osteomalácia. Elevadas concentrações de alumínio podem inibir a função celular óssea resul tando em osso aplást ico. Para controlar e tratar estas anormalidades, os pacientes com insuficiência renal crônica neces -si tam se submeter periodicamente aos seguintes testes no soro sangüíneo: creatinina, uréia, Na +, K+, CO2 total, albumina, cálcio, fósforo e fosfa -tase alcalina.

Manifestações clínicas. A dor óssea é a mais comum queixa dos pacientes com osteodistrofia renal. Pacientes em fase de crescimento, podem desenvolver deformidades. Calcificações extrace-lulares são também comumente encontradas em áreas periarticular e como calcificação de órgãos internos (pulmões, músculo cardíaco e outros tecidos).

Características bioquímicas. Quando a ve lo -cidade de filtração glomerular está abaixo de 30 mL/min., os níveis de uréia e creatinina estão geralmente elevados. Outros achados incluem hiperfosfatemia, hipocalcemia, teores elevados de PTH e concentrações baixas de 1,25(OH)2 D. A fos fa tase alcalina está aumentada em pacientes com hiperparatireoidismo ou osteomalácia por deficiência de vitamina D. Encontra -se , também, magnésio elevado, principalmente em pacientes que empregam antiácidos contendo magnésio.

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Metabolismo mineral e ósseo 166

Tabela 11.1. Inves t igações b ioqu ímicas de en fermidades metabó l i cas ósseas

Diagnós t ico Cálcio Fosfato PTH Fosfatase

a lca l ina Ca 2 +

Hiperpara t i reo id ismo

Pr imár io ↑ ou N ↓ ou N ↑ ou N N ou ↑ ↑ ou N

Secundário ↓ ou N ↑ ou N ↑ ↑ ou N N

Terc iár io ↑ ou N ↑ ou N ↑ ↑ ou N ↑ Raquit ismo e ost eomalacia

Inges tão def ic ien te ↓ ou N ↓ ou N ↑ ou N ↑ N ou ↓

Insuf ic iência renal ↓ ou N ↑ ou N ↑ ↑ N

Síndrome de Fanconi ↓ ou N ↓ ou N N ↓ N

Os teoporose N N N N N

Doença de Paget N ou ↑ N N ↑ N

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