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Sean O’Neill tinha significado tudo para Eleanor de Warenne, mas desde que ele tinha deixado o solar de sua família e tinha desaparecido, ninguém havia voltado a ter notícias dele. Inclusive Eleanor tinha abandonado toda esperança de voltar a vê-lo e se comprometeu com outro. Então, a somente uns dias de suas bodas, Sean apareceu de novo… mas o moço que tinha sido seu protetor durante a infância se converteu em um estranho embrutecido pelo tempo que tinha passado na prisão. E era um fugitivo.Cansado e angustiado, Sean sofreu uma grande impressão ao descobrir que a pequena Elle se converteu na bela e desejável Eleanor. Embora se negasse a pô-la em perigo, sua decisão de afastar-se dela se viu posta a prova pela determinação de uma mulher que não ia permitir que a abandonasse de novo.
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1
GG rruuppoo ddee RR oommaanncceess HHiissttrriiccooss
GGRRHH
Crditos Traduo/Pesquisa: GRH
Revisora Final: Miss Bella
Formatao: Miss Bella
2
AA NNooiivvaa RR oouubbaaddaa Brenda Joyce
Dinastia Warenne 6
Dinastia Warenne 6
3
Argumento:
Sean tinha significado tudo para Eleanor de
Warenne, mas desde que ele tinha deixado o solar
de sua famlia e tinha desaparecido, ningum havia
voltado a ter notcias dele. Inclusive Eleanor tinha
abandonado toda esperana de voltar a v-lo e se
comprometeu com outro. Ento, a somente uns dias
de suas bodas, Sean
que tinha sido seu protetor durante a infncia se
converteu em um estranho embrutecido pelo tempo
que tinha passado na priso. E era um fugitivo.
Cansado e angustiado, Sean sofreu uma grande
impresso ao descobrir que a pequena Elle se
converteu na bela e desejvel Eleanor. Embora se
negasse a p-la em perigo, sua deciso de afastar-se
dela se viu posta a prova pela determinao de uma
mulher que no ia permitir que a abandonasse de
novo.
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CCoommeennttrriioo ddaa RReevviissoorraa iinniicciiaall::KKeellllyy
Com toda a sinceridade que sei que posso ter com vocs leitores
digo que esse livro foi um dos melhores que j corrigi, a historia de
amor entre Elle e Sean linda, construda pouco a pouco e
colocada a prova vrias vezes. Em que pese que algumas vezes d
vontade de matar o mocinho pelo o que faz a mocinha sofrer, e
em outras d a vontade de peg-lo no colo de consol-lo devido a
tanto sofrimento que ele passou. Mas vocs s iro se deliciar com
essa leitura se lerem.
Bjs
CCoommeennttrriioo ddaa RReevviissoorraa FFiinnaall::MMiissssBBeellllaa
At agora no encontro palavras para descrever o que eu senti ao
revisar esse livro...Eu particulamente odieiiiiiiii a mocinha e o
mocinho.Ela uma chata de galocha que passa o livro todo se
arrastando por ele...E ele passa o livro todo falando que no quer
nada com ela...Fiquei com pena mesmo foi do noivo traido...
Mas deixo na mo de cada uma de vocs decidir qual sentimento
vai se sobressair ao lerem essa continuao da Dinastia
Warenne...
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PPrrllooggoo
Askeaton, Irlanda, junho de 1814
A chamada do desconhecido. Estava ali, a seu redor, em seu
interior; a chamada da aventura era uma inquietao insistente.
Nunca a tinha sentido com mais fora, e era impossvel seguir
ignorando-a durante mais tempo.
Sean se deteve no ptio do solar que tinha sido de sua
famlia durante quatro sculos. O tinha reconstrudo os muros que
tinha a frente com suas prprias mos. Tinha ajudado aos artesos
do povo a substituir as janelas, e os antigos chos de pedra do
interior.
Com um exrcito de faxineiras, tinha resgatado as espadas
queimadas do salo principal, todas elas heranas da famlia.
Entretanto, as tapearias que adornavam a estadia se queimaram
por completo.
Tambm tinha arado os campos carbonizados e enegrecidos
junto aos arrendatrios das terras dos , dia aps dia e
semana aps semana, at que a terra foi frtil de novo. Tinha
fiscalizado a seleo, compra e transporte do gado caprino e
bovino que tinha substitudo aos rebanhos destrudos pelas tropas
britnicas naquele negro vero de 1798.
Naquele momento, erguido sobre seus arreios, com os alforjes
cheios, observava como as ovelhas pastavam com suas crias nas
colinas que havia detrs da casa, sob os primeiros raios de sol.
Ele tinha reconstrudo aquele imvel com o suor de sua frente,
e s vezes, com lgrimas tambm. Tinha reconstrudo Askeaton
para seu irmo maior, durante os anos que Devlin tinha passado
no mar, como capito da marinha real, lutando na guerra contra
os franceses.
Devlin tinha voltado para casa uns dias antes com sua mulher
americana e sua filha. Licenciou-se da marinha e Sean sabia que ia
ficar em Askeaton. E assim era como deviam ser as coisas.
Sentiu inquietao. No estava seguro do que era o que queria,
mas sabia que sua tarefa ali tinha terminado. Havia algo ali fora,
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esperando-o, algo grande que o chamava como as sereias
chamavam os marinheiros. S tinha vinte e quatro anos e sorria ao
sol, exultante e preparado para qualquer aventura que o destino
queria lhe propor.
Sean! Espera!
Sentiu uma breve incredulidade ao ouvir a voz da Eleanor de
Warenne. Entretanto, deveria ter sabido que ela estaria acordada
a aquelas horas, e que o surpreenderia enquanto ele se dispunha a
partir.
Desde o dia em que a me de Sean se casou com o pai da
Eleanor, esta se tinha convertido na sombra de Sean. Aquilo tinha
ocorrido quando ela era uma pequena de dois anos e ele era um
sombrio menino de oito.
Quando eram meninos, Eleanor o tinha seguido como um
cachorrinho, algumas vezes divertindo-o e outras vezes
incomodando-o. E quando ele tinha comeado a restaurao das
terras de sua famlia, ela tinha estado a seu lado, de joelhos,
tirando pedras rotas do cho com ele. Quando Eleanor tinha
completo dezesseis anos, tinham-na enviado a Inglaterra; aps, j
no parecia a pequena Elle. Sean se voltou para ela com
desconforto.
E ela o alcanou apressadamente. Sempre tinha tido um passo
de pernadas largas, nunca o passo gracioso de uma dama. Aquilo
no tinha trocado, mas sim todo o resto. Sean ficou muito tenso,
porque ela estava descala e s levava uma camisola de algodo
branco.
E naquele instante, no soube quem era a mulher que o estava
chamando. A camisola lhe acariciava o corpo como uma luva de
seda, indicando curvas que ele no podia reconhecer.
Aonde vai? Por que no me despertou? Irei montar com
voc! Podemos jogar uma carreira at a igreja e voltar disse
Eleanor.
De repente, entretanto, ficou calada, imvel, olhando com os
olhos muito abertos aos alforjes do cavalo de Sean. O sorriso lhe
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tinha apagado dos lbios. Ele notou sua surpresa, seguida pela
compreenso.
Sempre pensaria em Elle como uma menina pouco elegante,
alta e desajeitada tivesse a idade que tivesse, com a cara muito
magra e angulosa, e com o cabelo recolhido em umas tranas que
lhe chegavam cintura. O que lhe tinha ocorrido naqueles dois
anos? Sean no estava seguro de quando se desenvolveram em
seu corpo aquelas curvas to pouco recatadas e femininas, ou de
quando lhe tinha arredondado as faces, convertendo-se em um
oval perfeito.
Ele afastou a vista do pescoo de sua camisola, que lhe tinha
parecido indecente. Depois afastou a vista de seus quadris, que
no podiam pertencer a Elle. Ardiam-lhe as bochechas.
No pode ir por a em camisola. Algum vai v-la!
exclamou.
A noite anterior, Sean tinha estado sentado frente a ela na
mesa, e tambm havia se sentido incmodo; cada vez que olhava
para Elle, ela sorria e tentava manter o olhar. Depois, Sean tinha
feito todo o possvel por evitar o contato visual.
Viu-me mil vezes de camisola disse ela lentamente
Aonde vai?
Ele a olhou. Seus olhos no tinham mudado, e Sean se sentia
agradecido por aquilo. Tinham a cor do mbar e a forma de uma
amndoa, e neles, ele sempre tinha podido decifrar o estado de
nimo de Elle, seus pensamentos, suas emoes. Naquele
momento, ela estava preocupada. A reao de Sean foi imediata:
sorriu para reconfort-la. De algum modo, seu dever tinha sido
sempre aliviar os medos de Elle.
Tenho que ir explicou-lhe Mas voltarei.
O que quer dizer? perguntou-lhe ela com incredulidade.
Elle, h algo a fora, e preciso encontr-lo.
O que? perguntou ela, com um olhar de horror No! A
fora no h nada! Eu estou aqui!
Sean ficou calado, sem apartar a vista de Elle. Ele sabia, como
todo mundo de suas duas famlias, que ela sempre tinha tido um
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amor tolo e selvagem por ele. Ningum sabia exatamente quando,
mas de menina, Elle tinha decidido que o queria e que um dia se
casaria com ele.
A Sean o divertiam aquelas afirmaes. Sempre tinha sido
consciente de que ela superaria aquelas tolices com a idade. No
tinham sangue comum, mas ele a considerava uma irm. Eleanor
era a filha de um conde, e um dia se casaria com um homem de
ttulo ou muito rico, ou ambas as coisas.
Elle lhe disse ele com tranqilidade Askeaton pertence a
Devlin. Agora j est em casa. E eu tenho a sensao de que h
algo mais para mim a fora. Preciso ir. Quero ir.
Ela tinha empalidecido.
No! No pode ir !No h nada a fora, do que est falando?
Sua vida est aqui! Ns estamos aqui, sua famlia, e eu. E Askeaton
seu tambm, tanto como de Devlin!
Ele decidiu no rebater aquilo, porque Devlin tinha comprado
Askeaton do conde oito anos antes. Titubeou, tentando encontrar
as palavras adequadas para que ela o compreendesse.
Tenho que ir. Alm disso, voc j no me necessita. Cresceste
disse, e seu sorriso se apagou Logo lhe enviaro de volta a
Inglaterra, e j no pensar mais em mim. Ter muitos
pretendentes acrescentou, e sem saber porqu, aquela idia lhe
pareceu estranha e desagradvel Volta para a cama.
Uma expresso de pura determinao se refletiu no semblante
de Elle, e ele se sentiu tenso. Quando ela tinha um objetivo, no
havia forma de lhe impedir que o conseguisse.
Vou com voc anunciou.
obvio que no!
No pense partir sem mim! Vou pedir que me selem um
cavalo! gritou ela, dando a volta para entrar correndo casa.
Sean tomou pelo brao e fez que se girasse. Assim que sentiu
seu corpo suave contra o seu, falhou-lhe o crebro.
Imediatamente, separou-a de si.
Sei que sempre te saste com a tua em tudo, me incluindo a
mim. Mas esta vez no.
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Esteve se comportando como um idiota desde ontem! Ficou
me evitando! E no se atreva a neg-lo. Nem sequer me olhava
exclamou Elle E agora diz que me deixa?
Parto. No estou te deixando. Simplesmente, vou.
No o entendo disse ela com os olhos cheios de lgrimas
Leve-me com voc!
Vai voltar para a Inglaterra.
Odeio-o!
Claro que o odiava. Elle era uma flor silvestre, no uma rosa de
estufa. Criou-se com cinco irmos e tinha nascido para percorrer
as colinas da Irlanda a cavalo, no para danar nos eventos sociais
londrinos. Naquele momento, ali, frente a ele, com as bochechas
midas de lgrimas, parecia novamente uma menina de oito anos,
afligida pelo desgosto e muito vulnervel.
E imediatamente, ele tomou entre seus braos, como tinha
feita centenas de vezes antes.
No passa nada disse-lhe brandamente.
Entretanto, no momento em que sentiu seus seios contra o seu
peito, soltou-a. Notou que lhe ardiam as bochechas.
Vai voltar? perguntou-lhe ela, aferrando-se a seus braos.
Claro que sim disse ele com secura, tentando se afastar.
Quando?
No estou seguro. Em um ou dois anos.
Um ou dois anos? repetiu ela, chorando Como pode
fazer algo assim? Como pode me deixar durante tanto tempo? Eu
j sinto falta de voc! meu melhor amigo! Eu sou sua melhor
amiga! No vai sentir falta de mim?
Ele se rendeu e tomou a mo.
Claro que vou sentir falta de voc lhe disse brandamente.
Era a verdade.
Prometa-me que vai voltar por mim lhe rogou ela.
Prometo-lhe respondeu Sean isso.
Enquanto se olhavam fixamente, unidos pelas mos, ela
chorava. Com delicadeza, ele se soltou. Era hora de partir. Voltou-
se para o cavalo e elevou a perna para o estribo.
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Espera!
Ele se deu a volta pela metade, e antes de que pudesse reagir,
ela passou-lhe os braos pelo pescoo e o beijou.
Sean se deu conta do que estava ocorrendo. Elle, a pequena
Elle, alta e magricela, o suficientemente temerria para saltar da
velha torre de pedra que havia detrs da casa e de rir enquanto o
fazia, estava-o beijando nos lbios. Mas aquilo era impossvel,
porque quem estava entre seus braos era uma mulher, a
proprietria de um corpo suave e quente, com uns lbios abertos
e ardentes.
Horrorizado, Sean se retirou de um salto.
O que isso?
Um beijo, tolo!
Ele se limpou a boca com o dorso da mo, sem sair de seu
assombro.
No gostou? perguntou-lhe Elle com incredulidade.
No, no gostei gritou Sean.
Havia-se posto furioso, com ela e consigo mesmo. Subiu ao
cavalo rapidamente e a olhou. Ela estava soluando em silncio,
cobrindo a boca com a mo.
Ele no podia suportar que chorasse.
No chore. Por favor.
Ela assentiu e lutou contra o pranto at que cessou.
Prometa-me outra vez que voltar.
Ele tomou ar.
Prometo-lhe que voltarei.
Ela o olhou com os olhos cheios de lgrimas.
Ento, Sean sorriu, embora tambm tinha vontade de chorar.
Depois agitou as rdeas de seu cavalo e comeou a galopar. No
queria sair to rapidamente, mas no podia presenciar mais o
sofrimento de Eleanor. Quando se sentiu seguro de que podia
faz-lo, olhou para trs.
Ela no se moveu. Seguia junto s portas de ferro do imvel,
olhando como ele se afastava. Eleanor elevou a mo, e inclusive
da distncia, ele percebeu seu medo e sua tristeza.
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Ele tambm elevou a mo para saud-la. Possivelmente aquilo
fora o melhor, pensou, tremendo por dentro. Voltou-se para o
caminho e seguiu avanando para o este.
Quando chegou primeira colina, deteve-se uma ltima vez.
Pulsava-lhe o corao com fora, rapidamente, inquietantemente.
Olhou de novo a sua casa. O edifcio se via to pequeno como uma
casa de brinquedos. Havia uma pequena figura branca junto s
portas de ferro. Elle seguia sem mover-se.
E se perguntou se o que estava procurando no o tinha j em
seu poder.
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CCaappttuulloo 11
7 de outubro, 1818, Adare, Irlanda
Em trs dias ia casar-se. Como tinha ocorrido aquilo?
Em trs dias ia casar-se com um cavalheiro ao que todo mundo
considerava perfeito para ela. Em trs curtos dias, ia converter-se
na esposa de Peter Sinclair. Eleanor de Warenne estava assustada.
Ia to inclinada sobre o lombo de seu cavalo que s via sua
pelagem e sua crina. Esporeou-o para que galopasse mais
rapidamente, mais perigosamente. Eleanor queria correr mais que
seu nervosismo e seu medo.
E brevemente, conseguiu-o. A sensao de velocidade se fez
absorvente; no podia haver outro sentimento nem outros
pensamentos. O cho a era um borro sob os cascos do cavalo.
Finalmente, o presente se desvaneceu. A euforia se apropriou
dela.
O amanhecer iluminava o plido cu. Finalmente, Eleanor se
esgotou, e tambm o semental que montava. Ergueu-se e o animal
diminuiu o passo. Imediatamente, ela recordou de seu iminente
matrimnio.
Eleanor fez que o cavalo diminusse a velocidade at o trote.
Tinha chegado ao ponto mais alto da colina, e olhou para baixo,
para sua casa. Adare era a cabea das terras de seu pai, que
abrangiam trs condados, cem povos, milhares de granjas e uma
mina de carvo muito produtiva, alm de vrias pedreiras.
Mais abaixo, a colina se convertia em um espesso bosque, e
mais frente, em uma pradaria exuberante que, atravessada por
um rio, terminava nos jardins que rodeavam a enorme manso de
pedra que era seu lar. Aquela manso, que tinha sido reformada
cem anos antes, era um retngulo de trs pisos, com uma dzia de
colunas que sujeitavam o telhado e o frontn triangular. Havia
duas asas mais detrs da fachada, uma reservada para a famlia, e
a outra para seus convidados.
Sua casa estava, naquele momento, abarrotada de pessoas da
famlia e convidados. Assistiriam trezentas pessoas ao enlace, e os
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cinqenta membros da famlia do Peter estavam alojados nesta
asa. O resto ficavam nas estalagens dos povos e no Grande Hotel
de Limmerick.
Eleanor olhou para o imvel, sem flego, suarenta; a trana lhe
tinha desfeito, e vestia um par de calas que tinha roubado
sculos atrs de algum de seus irmos. Depois de sua
apresentao na sociedade, dois anos antes, tinham-lhe pedido
que montasse com um traje de amazona adequado para uma
dama.
Entretanto, criou-se com trs irmos e com dois meio-irmos, e
pensava que aquilo era absurdo. Aps, tinha comeado a montar
ao amanhecer para poder montar escarranchada e fazer saltos,
coisas impossveis de levar a cabo com saia. A sociedade
consideraria seu comportamento reprovvel, e tambm seu
prometido, se descobrisse que ela gostava de montar e vestir-se
como um homem.
obvio, no tinha inteno de permitir que ningum a
descobrisse. Queria casar-se com Peter Sinclair, verdade?
Eleanor no pde suport-lo, ento. Tinha pensado que sua
pena e sua preocupao tinham acontecido fazia muito tempo,
mas naquele momento tinha o corao destroado. Sabia que
devia casar-se com Peter, mas com suas bodas to perto, tinha
que admitir uma verdade terrvel e aterradora. J no estava
segura. E mais importante ainda, tinha que saber se Sean estava
vivo ou morto.
Eleanor guiou ao cavalo colina abaixo. Tinha o pulso acelerado
por causa de uns sentimentos que no queria experimentar. Ele a
tinha deixado quatro anos antes. E no ano anterior, ela tinha
conseguido aceitar a realidade de seu desaparecimento. Depois de
esperar sua volta durante trs interminveis anos, depois de
negar-se a acreditar a concluso a que tinha chegado sua famlia,
despertou-se uma manh com uma horrvel certeza. Sean tinha
partido para sempre. No ia voltar. Todos tinham razo: ele no
havia tornado a dar sinais de vida. Quase com toda segurana,
devia estar morto.
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Durante vrios dias tinha permanecido encerrada em seu
quarto, chorando a morte de seu melhor amigo, do menino com o
que tinha passado a maior parte de sua vida, do homem ao que
amava. E quarta manh, tinha sado de seu quarto e tinha ido ver
seu pai.
Estou pronta para me casar, pai. Eu gostaria que encontrasse
um candidato apropriado.
O conde, que estava sozinho na sala do caf da manh, olhou-a
boquiaberto.
Algum com um bom ttulo e rico, algum a quem goste da
caa tanto como a mim, e pessoalmente atrativo tinha
prosseguido Eleanor. J no ficavam emoes. Acrescentou com
expresso sombria: De fato, dever ser um cavaleiro
excepcional, ou no conseguiremos nos levar bem.
disse o conde, ficando em p , tomou a deciso
correta.
Ela tinha evitado a questo.
Sim, sei.
Depois, partiu antes de que seu pai pudesse lhe perguntar qual
era o motivo de to sbita mudana de opinio. Eleanor no
queria falar de seus sentimentos com ningum.
Um ms depois tinha tido lugar a apresentao. Peter Sinclair
era o herdeiro de um condado e de umas terras situadas no
Chatton, e sua famlia era rica. Tinha sua mesma idade, e era
bonito e encantador. Era um cavaleiro perito, e criava cavalos puro
sangue.
Eleanor tinha sentido desconfiana por sua origem inglesa, j
que durante suas duas temporadas sociais em Londres tinha
sofrido a perseguio de alguns mulherengos, mas, ao conhec-lo,
tinha sentido simpatia por ele quase imediatamente. Ele tinha se
comportado de um modo sincero desde o comeo. Aquela mesma
noite, ela tinha decidido que o matrimnio com ele seria possvel.
A celebrao das bodas se fixou para pouco depois, dada a idade
da Eleanor.
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De repente, ela se sentiu como se estivesse sobre um cavalo
selvagem, um ao que no podia controlar. Tinha montado durante
toda sua vida, e sabia que o nico recurso que tinha era saltar.
Entretanto, ela nunca tinha fugido de nada, nunca em seus
vinte e dois anos de vida. Em vez disso, tinha exercitado sua
vontade e sua habilidade sobre o cavalo e tinha conseguido
control-lo.
Havia tentando convencer-se de que todas as noivas estavam
nervosas antes das bodas; depois de tudo, sua vida estava a ponto
de mudar para sempre. No s se casaria com Peter Sinclair, mas
tambm iria viver em Chatton, na Inglaterra, dirigiria sua casa e,
logo, levaria seu filho no ventre. Deus, poderia faz-lo?
Oxal soubesse, ao menos, o que tinha ocorrido a Sean.
Entretanto, provavelmente nunca saberia. Seu pai e Devlin
tinham passado anos buscando-o, inclusive atravs da polcia, os
Bow Street Runners. Entretanto, ningum o tinha encontrado.
Sean tinha desvanecido.
Uma vez mais, amaldioou-se por hav-lo deixado partir.
Eleanor tinha tentado det-lo; deveria hav-lo tentado com mais
mpeto.
Bruscamente, Eleanor deteve suas arreios e fechou os olhos
com fora. Peter seria um marido perfeito, e ela estava muito
afeioada com ele. Sean no estava. Alm disso, Sean nunca a
tinha olhado do mesmo modo em que a olhava Peter. Seu
prometido era bom, divertido, encantador, loiro e bonito. Estava
louco pelos cavalos, como ela. Era uma estupenda partida, tal e
como haveriam dito as debutantes dos bailes aos que ela se viu
obrigada a assistir.
Eleanor esporeou ao cavalo para que seguisse avanando. No
sabia por que se estava mentindo daquela maneira. Peter era um
bom homem, mas, como ia casar se com ele quando existia a mais
mnima possibilidade de que Sean estivesse vivo? Por outra parte,
j no podia romper os contratos de matrimnio!
De repente, sentiu um profundo pnico. Em Londres, ela tinha
sido todo um fracasso. Odiava os bailes, onde a desprezavam por
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ser irlandesa e alta, e porque preferia os cavalos s festas. Os
ingleses tinham sido terrivelmente condescendentes. E estava
segura de que tambm seria um fracasso em Chatton. Embora
Peter nunca tivesse questionado sua origem, quando a conhecesse
tambm seria condescendente com ela.
Porque ela no era uma dama o suficientemente educada para
ser uma esposa inglesa. As damas no montavam a cavalo
escarranchado, com calas e a ss ao amanhecer. E embora
algumas eram o suficientemente valentes para ir caa da raposa,
as damas no disparavam carabinas nem praticavam a esgrima.
Peter no a conhecia absolutamente.
As damas no mentiam.
Era como se Sean estivesse a seu lado, lhe cravando um olhar
cheia de acusaes. Oxal ele no a tivesse deixado. Como era
possvel que aquilo seguisse lhe fazendo dano, a ponto de casar-
se, e quando tinha investido um ano inteiro de sua vida em sua
relao com Peter?
Fechou os olhos outra vez e viu de novo a um homem alto,
moreno, de olhos assombrosamente chapeados.
As damas no mentem, Elle.
Eleanor no pde suportar aquela pontada de tristeza. No
necessitava aqueles pensamentos naquele preciso instante. No
queria os ter.
V! exclamou, quase chorando Deixe-me em paz, por
favor!
Entretanto, o dano permanecia. Ela tinha se atrevido a deix-lo
entrar de novo em sua mente, e a to somente uns dias de suas
bodas, parecia que no ia partir.
Eleanor conhecia Sean desde que eram meninos. A me de
Sean ficou viva durante um terrvel massacre provocado pelos
ingleses, e seu pai, que tambm era vivo por aquela poca,
casou-se com a Mary e tinha acolhido a Sean e a seu irmo.
Embora nunca os tinha adotado legalmente, tinha criado aos
meninos junto a seus trs filhos e a Eleanor, tratando-os
como se tambm fossem deles.
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Inclusive quando era um
beb que mau andava, pensava que Sean era um prncipe, embora
em realidade sua famlia era da pequena nobreza irlandesa, e
catlicos empobrecidos.
Ela tinha engatinhado atrs dele, chamando-o, tentando segui-
lo a todas as partes. Ao princpio, ele tinha sido amvel e a tinha
levado sobre os ombros, ou a tinha puxado da mo para devolver-
lhe a sua bab. Entretanto, sua amabilidade se converteu em
irritao quando Eleanor tinha crescido e, de menina, tinha
comeado a esconder-se na classe em que ele tomava suas lies,
e lhe tinha aconselhado como fazer melhor as coisas. Sean
chamava o professor e dizia a Eleanor que partisse e se ocupasse
de seus assuntos. Por desgraa, inclusive aos seis anos, Eleanor se
dava melhor em matemtica que a ele.
Se a Sean lhe ocorria escapar das lies durante um dia, ela o
seguia at o lago, decidida tambm a pescar. Sean tentava
assust-la com os vermes, mas Eleanor o ajudava a p-los nos
anzis. Ela tambm era melhor nisso.
Est bem, m erva, pode ficar resmungava ele finalmente.
Uma antiga dor estava se apropriando dela, mas entretanto se
deu conta de que tambm estava sorrindo. Tinha desmontado e
caminhava com as rdeas do cavalo na mo. J estava perto dos
estbulos, e enquanto avanavam, o animal pastava com
satisfao.
A Eleanor lhe encheram os olhos de lgrimas. Sean no estava
ali. Ela desejava com todo seu corao que voltasse, ela sentia
falta dele, mas do que servia? A lgica dizia que se tivesse querido
voltar, j o teria feito. E o sentido comum lhe dizia, alm disso,
algo muito mais doloroso: Sean nunca tinha demonstrado que
sentisse por ela outra coisa que afeto fraternal.
Ao chegar junto a uma das entradas do imvel, Eleanor se deu
conta de que lhe aproximava um homem. Imediatamente
reconheceu seu irmo maior, Tyrell. Ele estava to ocupado com
todos os assuntos das terras, o condado e a famlia que j no
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passavam muito tempo juntos, mas no havia nenhum homem
mais slido ou melhor que ele.
Um dia, Tyrell se converteria no patriarca da famlia, e teria que
lhe expor todos os problemas e as crises, tanto pessoais como de
outra classe, para que resolvesse. Ela o admirava muito. Era seu
irmo favorito.
Tyrell se deteve ante ela, e Eleanor se alegrou muito de hav-lo
encontrado. Era um homem alto, musculoso e moreno. Sorriu e
disse a sua irm:
Me alegro de ver que est bem. Vi-te da janela, e quando
desceu do cavalo, temi que tivesse ocorrido algo de mau.
Eleanor esboou um sorriso forado. Sentia-se triste e frgil.
Estou bem. Decidi deixar pastar um pouco ao Apollo, isso
tudo.
Tyrell a olhou fixamente.
Sei que sempre gostou de madrugar, mas acreditava que
tnhamos feito o trato de que no montaria deste modo enquanto
tivssemos tantos convidados.
Eleanor tentou seguir sorrindo, mas evitou seu olhar.
Tinha que montar esta manh.
O que te ocorre? perguntou-lhe Tyrell sem rodeios, e
carinhosamente, tirou-a da mo maioria das noivas gostariam
de poder dormir mais para estar mais belas, carinho lhe disse.
Dormir mais no me vai cortar a estatura respondeu ela
com sarcasmo As belezas de verdade no so to altas como os
homens, e mais altas que seus maridos.
Ele sorriu brevemente.
Decidiste que quer um marido mais alto? um pouco tarde
para trocar de opinio.
Demnios, o primeiro pensamento de Eleanor foi que a Sean
apenas lhe chegava pelo queixo, inclusive com as botas postas.
Consternada, Eleanor mordeu o lbio.
Tenho muito carinho por Peter murmurou No me
importa que nossos olhos estejam mesma altura quando eu
estou descala.
19
Me alegro, porque ele est muito apaixonado por voc lhe
disse Tyrell seriamente.
Acredita de verdade? Vou contribuir uma grande fortuna ao
matrimnio.
muito evidente que est apaixonado, Eleanor. Por que est
inquieta?
Estou confusa respondeu ela com um suspiro.
Ela assinalou-lhe um banco de pedra com uma expresso
amvel. Entregou-lhe as rdeas do cavalo e ambos se sentaram.
Seriamente aprecio Peter disse muito inteligente e
considerado, e desfrutei durante o tempo que passamos juntos.
Sabe que detesto os bailes, mas estes ltimos meses, com ele a
meu lado, no me importou danar.
Ele foi bom com voc, Eleanor lhe disse Tyrell Toda a
famlia est de acordo nisso. Vai convert-la em uma dama
elegante e convencional.
Eu tentei seriamente ser uma dama disse ela.
As damas no mentem, Elle.
De novo, Eleanor sentiu pnico. Levantou-se com brutalidade.
Tyrell! Sean est me obcecando. No posso faz-lo! De
verdade, no posso! Deveramos cancelar as bodas. No me
importa me converter em uma solteirona.
Ele abriu os olhos de par em par.
Eleanor, o que o que motivou isto agora? perguntou-lhe
com cautela.
No sei! Se ao menos soubssemos onde est Sean
Tyrell permaneceu em silncio.
Ela encheu aquele silncio.
Sei que voc pensa que est morto. Sei o que disse a polcia.
Eu ainda sinto falta dele sussurrou Eleanor.
E para seu assombro, deu-se conta de que seguia sentindo
tanto como se lhe atravessassem o corao com uma faca.
Tyrell lhe passou o brao pelos ombros.
20
Quiseste-o durante toda a vida, e leva quatro anos longe
daqui. Estou seguro de que uma parte de voc ter saudades para
sempre dele. Peter uma grande partida para voc, Eleanor, em
todos os sentidos, e eu estou muito contente porque sei que alm
disso est verdadeiramente apaixonado por voc.
Ela apenas o ouviu.
Mas como vou fazer tudo isto se me sentir assim? Estou to
inquieta! quase como se Sean estivesse aqui e me impedisse de
seguir adiante. Vou ser a esposa de Peter Sinclair. Vou ter seus
filhos. Vou viver em Chatton.
E se Sean estivesse aqui as coisas seriam distintas?
Sim! respondeu ela, e se ruborizou Compreendo o que
quer dizer. Ele nunca me quis como me quer Peter. Sei, Ty, ento
por que tenho que estar pensando nele em todas as horas?
Todas as noivas ficam muito nervosas antes de suas bodas,
ou ao menos, isso me falaram lhe disse Tyrell com um sorriso
reconfortante Possivelmente esteja procurando desculpas para
postergar o evento, ou possivelmente para fugir.
Ela o observou atentamente.
Possivelmente tenha razo. O que deveria fazer?
Eleanor. J esperaste durante quatro anos por Sean. O que
deveria fazer? Esperar outros quatro?
Aquilo era o que seu corao desejava. Finalmente, Eleanor
disse:
Ele no est morto, Ty. Sei. Sinto muito. Est muito vivo.
Tem-me feito muito dano, mas um dia voltar e nos contar o que
ocorreu e por que.
Espero que tenha razo disse Tyrell com seriedade Uma
pessoa muito sbia disse uma vez que ns no escolhemos o
amor. O amor nos escolhe. O amor verdadeiro nunca morre,
Eleanor.
E o que fao? perguntou-lhe em tom suplicante sua irm.
Sinceramente, no me surpreende que se sinta atormentada
por suas lembranas justamente antes de suas bodas. Tendo em
21
conta o passado, seria estranho que no pensasse nele. Mas isso
no significa que tenha que cancelar suas bodas com o Sinclair.
O que quer dizer?
Eleanor, desejo que tenha uma vida prpria. Seu lar, sua
famlia, um futuro com a alegria dos filhos. Sean nunca
correspondeu a seus sentimentos, e no sabemos onde est ou se
voltar algum dia. Sinclair te est oferecendo um futuro de
verdade. Acredito que seria um engano que o abandonasse no
altar. No encontrar uma oportunidade assim de novo. Sinclair
estupendo para voc.
Eleanor se deu conta de que no lhe importava o que lhe estava
dizendo. Encurvou-se sobre o banco, consumida de desesperana
e dvida.
Tyrell seguiu falando com delicadeza.
Sinclair um homem honrvel, e se apaixonou por voc.
Seriamente est pensando em romper o compromisso por causa
da remota possibilidade de que Sean volte e se d conta de que te
quer?
Ela se sentia to afligida que no podia pensar com claridade.
Tyrell tinha razo. Estava sendo absurda. E tinha dado sua palavra
a Peter Sinclair.
Claro que, se voc no quisesse nada com Sinclair, eu no
quereria que se casasse com ele prosseguiu seu irmo Mas,
por isso vi, acredito que lhe tem muito carinho. Tenho me sentido
muito feliz ao te ver rir de novo, Eleanor. E nunca pensei que te
veria sorrir durante um baile.
Eleanor respirou profundamente e tomou uma deciso.
Tem razo. Sou muito afortunada. Peter tem ttulo, rico,
bonito e bom, e alm de me querer. Devo ser a parva maior do
mundo por pensar em romper este compromisso por causa de um
homem que no me quer, que nem sequer est aqui. Um homem
que todo mundo d por morto.
Nunca foste parva replicou Tyrell , mas me alegra que siga
adiante com as bodas. No sou capaz de explicar-lhe o prazer que
experimentar ao ter uma famlia prpria.
22
Voc escandalizou a toda a sociedade ao escolher Lizzie em
vez de se casar segundo seu dever, Ty. Casou-se por amor, por
amor verdadeiro; assim que eu no estou to segura de que v
desfrutar de tudo o que voc tem.
Nunca saber se no o tenta disse ele Eu nunca a
animaria a este matrimnio se no tivesse grandes esperana para
ele. Quero que se sinta amada e que seja feliz, Eleanor. Todos o
queremos.
Ela o abraou.
meu irmo favorito! Havia-lhe dito isso?
Ele riu.
Acredito que sim lhe disse ele com um sorriso de afeto E,
Eleanor? No se volte muito masculina, por favor.
Ela sorriu.
Como um truque, no tem que temer que meu carter se
transforme muito. No prova disso meu traje? disse, e
assinalou as calas que levava postos.
Tyrell no baixou o olhar.
Sobre este tema, tenho uma objeo. Eleanor, por favor, me
prometa que voltar a pr o traje de montar. Ao menos, at
depois das bodas e da lua de mel. E te aconselho que depois pea
ao Peter humildemente que te permita montar escarranchado.
No me cabe dvida de que poder convenc-lo de algo que
deseje de verdade.
Ela suspirou.
Tentarei ser humilde, Ty. E tem razo. No preciso montar
um escndalo. Entrarei em casa sem que ningum me veja. Esto
levantados os cavalheiros?
Um grupo deles tem inteno de ir de pesca, assim agora
esto na sala do caf da manh. Sugiro-te que atravesse o salo de
baile. As senhoras esto dormindo, salvo minha esposa disse
ele, com um sorriso.
Obrigado, Ty. Obrigado por seus conselhos. Acalmaste-me
muito. Agora me sinto muito melhor.
Tyrell lhe beijou a bochecha.
23
D a casualidade de que acredito que est fazendo o correto.
Acredito que, com o tempo, seu amor pelo Peter aumentar.
Quando tiver seus filhos no o lamentar. Voc merece a vida que
ele te pode oferecer. Sinclair pode te dar muitas coisas.
Sim. Tem razo. De fato, sempre tem razo disse Eleanor, e
sorriu a seu irmo. Nunca estava de mais adular ao herdeiro do
condado.
Ele riu.
Minha esposa no estaria de acordo. No tem por que ser
lisonjeadora, querida.
Mas se for o mais sbio de todos meus irmos! Importaria-se
de levar ao Apollo ao estbulo, por favor? perguntou-lhe.
obvio.
Eleanor o abraou e caminhou para a casa para entrar em salo
de baile pela terrao.
Tyrell ficou ali, olhando-a. Seu sorriso se desvaneceu. Ele tinha
sido muito afortunado na vida por ter podido casar-se por amor. E
sabia que Eleanor estava to apaixonada por Sean como sempre.
Nunca tinha sido mais evidente. Durante todos aqueles meses
passados, ela tinha estado atuando.
Tyrell no podia deixar de pensar em todo aquilo. Sua mulher o
tinha convertido em um romntico. Desejava com todas suas
foras que as circunstncias fossem distintas, e que sua irm
pudesse casar-se com quem de verdade era seu amor. Entretanto,
aquilo no era possvel, e Sinclair lhe estava oferecendo um
futuro.
Embora Sean voltasse naquele mesmo momento, no podia
oferecer nada a Eleanor.
Tyrell ficou muito tenso. Tinha-lhe oculto a verdade a sua irm,
e desejava que fosse o correto.
Porque a noite anterior, depois do jantar, o comandante do
regimento estacionado ao sul de Limerick, o capito Brawley, tinha
pedido uma audincia com o conde. Tyrell tambm tinha assistido,
posto que era seu direito. E o jovem capito lhes havia dito que
haviam descoberto o paradeiro de Sean .
24
Tyrell e seu pai tinham sabido que Sean tinha estado
encarcerado durante os dois ltimos anos em uma priso militar
em Dubln; aquilo lhes tinha produzido uma forte impresso.
Segundo o capito, Sean tinha sido acusado de traio. No havia
explicao para aquele confinamento to largo nem do motivo
pelo que as autoridades no tinham informado famlia. Ento,
Brawley lhes tinha contado a notcia mais impressionante de
todas: Sean tinha escapado trs dias antes.
Sean se tinha convertido em um fugitivo procurado
pelas autoridades, que tinham posto preo a sua cabea.
E Tyrell esperava que aparecesse em Adare em qualquer
momento.
25
CCaappttuulloo 22
Todo mundo pensava que o inferno era um fogo abrasador.
Todo mundo se equivocava.
O inferno era a escurido. O silncio, o isolamento. Ele sabia.
Acabava de passar dois anos ali. Trs dias antes, tinha escapado.
A luz fazia mau nos seus olhos, e os sons normais o assustavam;
os ingleses o perseguiam, e no tinha inteno de deixar-se
pendurar. Por todas aquelas razes, tinha estado ocultando-se no
bosque durante o dia e avanando caminho ao sul de noite.
Haviam-lhe dito que em Cork havia homens que o ajudariam a
fugir do pas. Homens radicais, homens que tambm eram
traidores, como ele, e que no tinham nada que perder salvo a
vida.
Estava a ponto de amanhecer. Ele estava coberto de suor,
depois de ter viajado da priso de Dubln aos subrbios de Cork
em to somente trs dias, a p.
Quando se tinha dado conta de que possivelmente nunca sasse
do buraco negro de sua cela, tinha comeado a exercitar seu corpo
para manter-se forte, ao tempo que planejava uma fuga. Exercitar
o corpo tinha sido fcil. Tinha encontrado um oco na parede, e o
tinha usado para pendurar-se dele e subir a pulso.
No piso tinha feito flexes, e tinha mantido em forma as pernas
fazendo exerccios de esgrima. Entretanto, seu corpo no estava
acostumado a andar nem a correr. Os msculos que no tinha
usado durante dois anos lhe gritavam de dor. E os ps era o que
mais lhe doa de tudo.
Exercitar a mente tinha sido muito mais difcil. Concentrou-se
em problemas matemticos, em geografia, em filosofia e nos
poemas. Rapidamente se tinha dado conta de que devia manter a
mente ocupada, porque do contrrio no podia evitar pensar. E o
pensamento o fazia recordar, e recordar s lhe provocava
desespero e medo.
26
Na mo levava uma tocha. A tocha era seu tesouro mais
prezado. Depois de ter estado imerso na escurido durante dois
anos, uma fonte de luz era algo muito importante para ele.
Sean olhou para cu. Tinha comeado a esclarecer-se; j
no necessitava a luz para seguir. O outro nico sobrevivente de
Kilvore lhe havia dito que chegasse a uma determinada granja o
mais rapido que pudesse, e ele sabia que devia continuar, superar
seu medo. Com cuidado, apagou a tocha.
Blarney Road, a estrada em que estava, conduzia ao centro do
povoado. Um pouco mais adiante estava a granja Connelly.
Tinham-lhe assegurado que ali encontraria ajuda.
Enquanto caminhava pelo bosque, sem atrever-se a usar a
estrada, a no ser avanando em paralelo a ela, pulsava-lhe o
corao com fora. Durante as trs largas noites que tinha passado
viajando, tinha evitado todas as estradas e inclusive os caminhos,
mantendo-se nas colinas e o bosque.
Tinha ouvido tropas uma vez, a cento e cinqenta quilmetros
ao norte do lugar no que se encontrava naquele momento. A
horas de Dubln, tinha ouvido um rodeio de cavalos e se apareceu
em caminho das altas rochas do topo de uma colina. Abaixo, viu os
uniformes azuis de um regimento de cavalaria. A ltima vez que
tinha visto a cavalaria, tinham morrido duas dzias de homens, e
tambm mulheres inocentes e meninos. Aterrorizado, Sean havia
tornado a se esconder no bosque.
O cu comeou a ficar de cor rosa plido. Aquele dia tampouco
ia chover. Comeou a ficar tenso, mas estava muito perto de seu
objetivo para deter-se. Sofreria luz do dia, por muito que lhe
custasse. Os sons do bosque que despertava j estavam
comeando a sobressalt-lo; os pssaros que comeavam a cantar
nos ramos das rvores lhe fizeram chorar, como cada manh
desde que tinha conseguido escapar. Era um som precioso, to
inestimvel como a tocha que levava na mo.
A estrada se curvou, e apareceu uma casa de campo com o
telhado de palha. Detrs da casa havia um campo de milho e um
abrigo.
27
Sean se deteve detrs de uma rvore, com a respirao
entrecortada, e no do exerccio, mas sim do medo. Resultava-lhe
muito difcil ver alm da casa, do semeado e do abrigo, devido a
que na priso os olhos lhe tinham debilitado muito. Finalmente,
percebeu um movimento entre a casa e o campo de milho; era um
homem, ou ao menos isso lhe pareceu. Desejou com todas suas
foras que fosse Connelly.
Sean olhou para ambos os lados da estrada, mas no divisou a
ningum. No confiava em sua vista, assim emprestou ateno
para perceber algum som. Quo nico ouviu foi o canto dos
pssaros, e depois de um momento, pensou que tambm poderia
detectar o rangido das folhas, o sussurro da brisa.
Pensou que estava sozinho.
E comeou a suar de novo.
Naquele momento, o corao lhe pulsava desbocadamente.
Saiu do bosque estrada, quase esperando que uma coluna de
soldados se lanasse sobre ele sem piedade. Entretanto, no
apareceu nenhum soldado, e ele tentou respirar com mais calma.
No o conseguiu. Estava muito assustado.
Piscou contra o cu brilhante e seguiu cruzando a estrada.
O homem o viu e se deteve.
Sean amaldioou sua viso e seguiu para diante. Tentou falar
com grande esforo. Justo antes de que o confinassem no
isolamento mais absoluto, tinha havido um assassinato na priso,
seguido de um terrvel caos. O tinham golpeado grosseiramente, e
no distrbio, tinham-lhe talhado o pescoo. Depois, ningum tinha
enviado a um mdico para que o atendesse, e durante uns dias
Sean se debateu entre a vida e a morte.
Pouco a pouco, entretanto, curou-se, embora no por
completo. J no podia falar com facilidade; de fato, formar as
palavras lhe custava um esforo desonesto, e lhe resultava
exaustivo. obvio, no tinha tido que falar com ningum durante
dois anos, e uma vez que se deu conta de que logo que podia faz-
lo, no o tinha tentado.
28
Naquele momento, tentou pronunciar a palavra que tinha em
mente.
Connelly? disse lentamente, e ouviu sua prpria voz, rouca
e desagradvel.
O homem se aproximou dele.
Voc lhe disse seu interlocutor, e o puxou pelo
brao.
Sean ficou impressionado ao sentir seu roce, e alarmado ao dar-
se conta de que o esperavam. Fez um gesto de dor e se afastou do
outro homem.
Como sabe?
Temos nosso prprio correio secreto respondeu Connelly.
Era um homem grande, forte, com um largo nariz vermelho e os
olhos azuis, muito brilhantesMe mandaram uma mensagem.
Ser melhor que entre.
Sean seguiu o homem casa, e quando a porta esteve fechada,
sentiu um grande alvio.
Minha senhora j est com as galinhas lhe disse Connelly
Agora John Collins lhe explicou. Enquanto falava, olhava a
Sean com preocupao crescente Parece um esqueleto, moo.
Darei-te de comer e uma lmina para que se barbeie. Malditos
sejam esses desgraados ingleses!
Sean se limitou a assentir, e se apalpou a espessa barba. No
tinha podido barbear-se durante dois anos.
Connelly titubeou, mas depois lhe disse:
Sinto o que ocorreu em Kilvore. Sinto-o muito. Sinto por sua
esposa e seu filho.
Sean se ergueu. Na mente se formou uma imagem imprecisa de
uma cara doce com os olhos bondosos, cheios de esperana. Peg
se tinha desvanecido em uma lembrana pouco definida e
dolorosa, sem cor, embora ele sabia que ela tinha o cabelo ruivo.
A Sean lhe encolheu a alma.
No princpio tinha sofrido, durante muitos meses. Naquele
momento, entretanto, j s ficava o sentimento de culpa. Estavam
mortos por sua culpa.
29
No fica outro remdio que partir do pas. Sabe?
Sean assentiu, aliviado por que tivessem interrompido seus
pensamentos. Tinha aprendido como evitar toda lembrana de seu
breve matrimnio, salvo nas horas da madrugada.
Sim.
Bom. V diretamente pelo Blarney Road at o Blarney Street.
Pode cruzar o rio pela primeira ponte. Segue o rio, te levar at o
cais, Anderson Quay. O sapateiro O'Dell te dar alojamento.
Sean assentiu de novo. Tinha perguntas, sobre tudo, quando
poderia encontrar uma passagem e quanto teria que pagar, mas
de momento, sentia-se exausto e faminto. S tinha comido uma
fatia de po em trs dias. E falar lhe resultava uma difcil tarefa.
Tentou formar as palavras e inquiriu:
Quando? Quand
Sente-se, moo disse Connelly com expresso grave No
sei. Todas as manhs, ao meio dia, v ao Oliver Street. Procura um
cavalheiro que leve uma flor branca na lapela. Ele poder te dizer
o que precisa saber. Eu s sou um granjeiro, Sean.
Meio-dia repetiu Sejam
No sei se o cavalheiro estar ali hoje ou amanh, ou ao dia
seguinte. Mas um homem bom. toda uma ajuda para os
patriotas. Chama-se McBane. No o perca.
McBane, pensou Sean, e assentiu.
Connelly se voltou e foi para a despensa. Depois voltou com um
prato de batatas cozidas e uma grande fatia de po com queijo. A
Sean lhe fez a boca gua.
A mesa estava coberta com uma toalha branca; a cristaleira era
do Waterford, a porcelana importada e os talheres de prata. A
estadia estava iluminada por enormes candelabros, e os serventes
uniformizados serviam bandejas de veado, cordeiro e salmo. As
mulheres levavam seda e jias, e os homens o traje de ornamento.
O perfume fl
Sean se sobressaltou. No tinha direito a recordar aquilo.
negava-se a identificar aquelas lembranas nem ao homem a
quem pertenciam.
30
Em vez disso, comeou a comer rapidamente o po e o queijo.
O nico passado que queria recordar era o mais recente, sua vida
na granja dos Boyle. De outro modo, nunca poderia pagar pelo
que lhes tinha feito.
O rudo era ensurdecedor.
Sean se deteve o passar a entrada do bar, afligido pela
cacofonia de sons. Teve o impulso quase irresistvel de tampar aos
ouvidos com as mos. As conversaes escandalosas, as
gargalhadas, o arrastar das cadeiras, o tinido das latas eram uma
inundao de sons que ameaava imobilizando. Sean ficou rgido
de tenso. E as luzes brilhantes eram cegadoras.
Tinha sado da granja uma hora depois de chegar ali, e tinha
seguido as instrues de Connelly. O sapateiro, a quem tinha
encontrado com facilidade, tinha-o agasalhado em uma pequena
habitao que tinha sobre sua oficina.
O que sim lhe tinha resultado difcil tinha sido percorrer a
cidade, que despertava a aquelas horas, com todo seu tumultuar.
Sean tinha ficado afligido com a presena de tanta gente, to a p
como a cavalo, ou em carretas e carruagens, e com tanta
conversao e movimento. E tambm havia muita sujeira, muita
fuligem, fumaa e lixo. Sentia-se estranho, um intruso, como um
granjeiro do norte que nunca tivesse estado em uma cidade.
No tinha conseguido acostumar os sentidos a semelhante
descarga de estmulos durante as poucas horas que tinha passado
ali. E naquele momento, ao entrar no pub, teve que tampar os
olhos com as mos. Sentiu uma quebra de onda de pnico, e seu
primeiro instinto foi fugir.
Entretanto, conservou a capacidade de raciocinar. Sua mente
pde discernir que aquele estabelecimento pblico abarrotado era
prefervel ao escuro buraco que tinha sido sua cela. E se disse que,
ao final, acostumaria-se ao rudo, luz e multido.
Respirou profundamente e comeou a avanar por entre a
gente, com cuidado de evitar o contato fsico com outros. Tinha
divisado uma mesa solitria ao fundo, na penumbra; quando
chegou a ela, sentiu-se mais seguro, aliviado. Sentou-se contra a
31
parede, de modo que tinha as costas protegida e podia abranger
toda a estadia com o olhar.
Observou aos trinta ou quarenta homens que estavam
presentes ali, todos bebendo, rindo, falando ou jogando cartas ou
jogo de dados. Uma vez mais, sentiu-se como um intruso. Aqueles
homens eram irlandeses, como ele. Uma vez, ele tinha estado
disposto a dar a vida defendendo-os contra a tirania e a injustia, e
quase o tinha feito. Naquele momento no sentia nenhum vnculo
com eles. No sentia nada absolutamente, salvo confuso e
surpresa.
Foi ento quando viu aproximar-se de um homem que levava
uma jaqueta de l azul, uma flor silvestre na lapela e uma pequena
carteira na mo. Como temia uma armadilha, Sean deixou sua
adaga, que tinha roubado ao guarda da priso ao escapar, sobre
sua coxa, sob a mesa.
O cavalheiro o viu e se deteve ante a mesa.
Collins?
Sean assentiu ao ouvir seu sobrenome falso. Depois lhe
assinalou a cadeira.
O homem se sentou.
Deram-me sua descrio disse Por desgraa, tem
exatamente o aspecto que teria um delinqente fugitivo.
Sean fez caso omisso daquele comentrio. O homem era alto e
era ruivo. Levava um traje de boa l e uns sapatos reluzentes.
Claramente, era de classe alta. Provavelmente, era o homem que
Connelly lhe tinha indicado, algum chamado Rory McBane.
Sean demorou um momento em falar. Resultava-lhe um pouco
mais fcil que ao princpio.
Est sozinho?
No me seguiram respondeu McBane, observando-o com
cautela Tive muito cuidado. E voc?
Sean assentiu. Seu interlocutor seguiu olhando-o fixamente,
como se estivesse tentando discernir a quem estava ajudando
naquela ocasio. Possivelmente McBane soubesse que o
32
buscavam por assassinato. Possivelmente soubesse que era um
assassino e tivesse medo.
Tudo o que precisar est nessa carteira lhe disse McBane
depois de um silncio tenso H um pouco de dinheiro e uma
muda de roupa. Tambm uma passagem para Hampton, Virginia,
em um navio de mercadorias americano, o Ou. S. Firo. Sair depois
de amanh com a primeira mar.
Logo seria livre. Em questo de dias, estaria cruzando o oceano,
afastando-se dos ingleses e da Irlanda, a terra onde tinha crescido
e tinha passado a maior parte de sua vida. Sabia que devia dar
graas ao McBane, mas em vez disso, o corao lhe acelerou,
como se estivesse tentando lhe dizer algo. Sabia que deveria
sentir-se exultante ou aliviado, mas no notava nenhuma daquelas
coisas.
O cristal tilintou. As suaves conversaes se aconteceram a seu
redor. E uns olhos de cor mbar, brilhantes e risonhos,
sustentaram-lhe o olhar.
Sean sentiu uma forte tenso. No entendia por que, de
repente, a mente lhe estava jogando aquela m passada. Estava
muito enjoado. Possivelmente estivesse voltando-se louco, por
fim. No podia deixar-se levar ali onde suas lembranas queriam
translad-lo. No podia retornar para aquela vida! O pnico se
apropriou dele.
Necessita de uma boa lmina de barbear lhe disse McBane,
e a interrupo foi bem-vinda Vi um pster da polcia com seu
retrato. Parece-se muito. Tem que tirar essa barba.
Sean ficou olhando. Ele tinha usado a lmina do Connelly, mas
no era de boa qualidade. E McBane tinha razo. Necessitava um
bom barbeador, uma escova do cabelo e sabo.
E sua cabea seguia vagando.
Uns olhos chapeados, brilhantes, agradveis, devolviam-lhe o
olhar do espelho. Ali se refletia um homem bonito, moreno, que
se estava barbeando pela manh. Naquele reflexo, havia umas
cortinas de veludo abertas. Fora, o cu estava azul, esplndido, e
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as colinas eram maravilhosamente verdes. Espionavam-se as
runas de uma torre da janela. E se via o mar.
Sean! Vai seguir perdendo o tempo, ou vamos montar a cavalo?
Est bem? perguntou-lhe McBane.
Sean no entendeu a pergunta. O que lhe estava acontecendo?
No podia pensar naquele passado. Ele tinha se casado com Peg
Boyle, decidido a conseguir am-la algum dia, e a ser um bom pai
para seu filho e para o filho que levava no ventre. Peg era a nica
mulher da que tinha que lembrar-se. Naquele momento,
deliberadamente, recordou-a entre seus braos, golpeada,
maltratada, sangrando at morrer.
Olhe, Collins, tenho entendido que aconteceu um inferno.
Estamos no mesmo bando. Sou irlands, como voc. Alm disso,
tambm ouvi dizer que voc nobre de nascimento, e isso algo
mais que temos em comum. No tem bom aspecto. Posso lhe
ajudar de algum jeito? perguntou-lhe McBane, que embora
tinha uma expresso de perplexidade, tambm estava
preocupado.
Sean no era capaz de encontrar alvio no presente naquele
momento.
P perguntou-lhe. Queria saber
por que um cavalheiro arriscaria sua vida por ele.
J te falei. Ambos somos irlandeses, e eu sou um patriota.
Voc lutou pela liberdade de uma maneira, e eu luto de outra,
normalmente, com minha pluma, mas algumas vezes, tambm,
ajudo a homens como voc.
Sean tentou sorrir.
Obrigado disse com a voz rouca.
H algo mais que necessite?
Sean negou com a cabea. Quo nico precisava era navegar
para uma terra diferente, para uma vida distinta. Uma vez que o
conseguisse, possivelmente deixasse de recordar aqueles
momentos de uma vida que tinha deixado atrs, e que o
torturavam.
McBane se inclinou para ele.
34
Ento, deite-se e descanse at que parta o Firo. Eu vou para
Cork esta noite, mas pode me localizar em Adare. Est a s meio-
dia de caminho daqui, e nossos amigos comuns podem me levar
uma mensagem.
Sean sabia que seu corpo tinha permanecido imvel, mas o
corao lhe tinha dado um salto no peito, com uma fora dolorosa
e exaustiva. Teve a sensao de que McBane acabava de
apunhal-lo. Seria aquilo uma armadilha, depois de tudo? Ou era
sua memria a que de novo o estava torturando com crueldade?
Acabava McBane de referir-se a Adare?
McBane ficou em p.
Que Deus o acompanhe disse a Sean.
Ele, aturdido, no respondeu.
McBane fez um som de lstima, e depois deu a volta e abriu
passo entre a multido. Sean permaneceu sentado, paralisado.
Deveria deixar que McBane partisse; do contrrio, ia perder o que
ficava de fora de vontade. Mas, e se McBane era parte de uma
armadilha?
Sean no ia voltar para a priso e no ia deixar que o
pendurassem.
Sean seguiu McBane com o olhar. Esperou que chegasse at a
sada, e depois tomou a carteira e saiu atrs dele. Seguiu-o
sigilosamente e o agarrou por detrs para aprision-lo contra um
muro. McBane ficou paralisado.
para Adare grunhiu Sean, furioso Isto uma
Collins! ofegou McBane Est louco? Que demnios est
fazendo?
O que se prope? Que insistiu Sean.
O que me proponho? Estou tentando ajud-lo a sair do pas,
idiota. No devem nos ver juntos! Minhas opinies contra os
ingleses so bem conhecidas. Maldito seja! Te procuram por toda
parte na cidade!
Sean o empurrou com mais fora contra o muro.
No pode ir para Adare! um truque! gritou-lhe.
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Um truque? Est louco! Ouvi dizer que o tiveram em
isolamento durante dois anos. Perdeu a cabea! Vou para Adare
porque sou amigo da famlia da noiva.
E Sean perdeu o controle.
Adare era seu lar.
Os prados verdes e os jardins de Adare eram to espetaculares
que os grupos de veraneantes ingleses pediam permisso para
visit-los. Freqentemente, tambm pediam permisso para
visitar a manso, e normalmente lhes concedia se o conde ou a
condessa estavam na residncia.
Sean estava tremendo. No, Sean tinha crescido ali. Ele
se tinha convertido em John Collins.
Est muito plido lhe disse McBane Solte-me, por favor.
Mas Sean no o ouviu.
Aquela manh tinham tido aula de cincia e humanidades com
o tutor, o senhor Godfrey. Depois tinham passado a tarde
praticando a esgrima com um professor italiano, ensaiando passos
com o professor de baile e aprendendo tcnicas avanadas de
equitao. Havia cinco moos, jovens, bonitos, fortes, preparados,
privilegiados e mais que um pouco arrogantes. E tambm estava
Elle.
Sim. Umas bodas muito importante, de fato.
Sean fechou os olhos. No queria recordar um tempo em que
tinha tido uma gratificante sensao de pertencer a uma grande
famlia, de segurana, de paz; mas j era muito tarde.
Tinha um irmo, uma cunhada e uma sobrinha; tinha uma me
e um padrasto; e tinha meio-irmos, e tambm tinha Elle. Sean
no podia respirar; estava tentando com todas suas foras manter
fechada a comporta que continha suas lembranas; se deixava
escapar algum, seguiriam-lhe milhares, e nunca conseguiria evitar
aos ingleses, nunca poderia fugir do pas, no sobreviveria.
Afastou-se de McBane. O suor lhe escorregava pelas costas.
McBane estava muito molesto. Ergueu-se e arrumou a roupa.
Depois, sua irritao se transformou em preocupao ao ver Sean.
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Encontra-se bem?
McBane tinha mencionado a uma noiva. Sean o olhou.
Quem se casa?
McBane o olhou com grande surpresa. Depois respondeu com
cautela:
Eleanor de Warenne. Conhece a famlia?
Sean ficou to aniquilado que no podia mover-se; a impresso
que se levou derrubou todas as barreiras que ele tinha ereto para
evitar viajar de volta ao passado. E Elle estava na porta de seu
quarto, em Askeaton, com o cabelo recolhido em uma larga
trana, vestida para montar, com uma das camisas de Sean e um
par de calas de Cliff. Aquilo era impossvel.
Por que demora tanto? perguntou-lhe Temos o dia livre!
Acabou-se de arranhar queimaduras da madeira. Falou que
podamos passear em Doam's Rock. O cozinheiro preparou a
comida em um pacote, e os ces esto l fora, impacientes.
Sean tentou recordar a idade que tinha Elle ento. Era muito
antes de sua primeira temporada. Possivelmente tivesse treze ou
quatorze anos, porque era alta e magra. No pde evitar record-
lo de tudo.
Ele estava sorrindo.
As damas no entram sem chamar nas habitaes dos
cavalheiros, Elle.
Tinha o torso nu. Voltou-se do espelho e tomou uma camisa
branca.
Mas voc no um cavalheiro, verdade?
Ele se abotoou a camisa tranqilamente.
No, voc no uma dama.
Graas a Deus!
Ele tentou no rir.
No use o nome de Deus em vo! exclamou.
Por que no? Voc o faz muito pior. Ouo-te jurar quando
est zangado. Os meninos podem dizer palavres, e as garotas
devem mover os quadris quando andam, e levar horrveis
espartilhos!
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Ele olhou seu corpo magro.
Voc nunca ter que levar espartilho.
E uma sorte! afirmou Elle.
Finalmente, sua cara se escureceu. Passou por diante dele e se
sentou na cama desfeita.
Sei que sou muito pouco adequada pa
suspirou ela Estou a regime para engordar. Comi duas
sobremesas todos os dias. No aconteceu nada. Estou
sentenciada.
Ento, Sean no pde evitar rir.
Ela ficou furiosa e lhe lanou um travesseiro.
Elle, h coisas piores que estar magra. Provavelmente, algum
dia deixar de est-lo. - disse.
Entretanto, no podia imagin-la de outro modo que no fosse
muito ossuda e muito alta.
Ela se levantou da cama.
Fala isso para me consolar. Tambm me disse que deixaria de
crescer faz dois anos.
Estou tentando que se sinta melhor. Vamos. Se ganhar at
Doam's Rock, pode ficar aqui um dia mais.
Seus olhos brilharam.
De verdade?
De verdade confirmou ele com um sorriso O ltimo que
cheguar parte a casa hoje disse, e se dirigiu para a porta.
Com um grito, ela o adiantou e saiu voando para as escadas.
Ele estava rindo, e quando esteve montado a cavalo, ela levava
vrias colinas de vantagem.
Sean se separou de McBane, tremendo. No podia pensar
naquilo. Precisava tomar aquele navio e zarpar para a Amrica.
Quantos anos tinha Elle?, perguntou-se sem poder evit-lo. A
ltima vez que a tinha visto tinha dezoito. Sean tentou
desesperadamente fechar o passo daqueles pensamentos em sua
mente, mas era muito tarde. Uma imagem inesquecvel se formou
em sua cabea: Elle, com sua camisola de renda branca, junto s
portas de Askeaton, uma figura pequena e triste que ele via do
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topo da colina. Elle no se movia. E ele no precisava estar junto a
ela para saber que estava chorando.
Me prometa que voltar por mim.
Sean se sentia muito doente naquele momento. Logo que podia
respirar.
-se? sussurrou. Acaso ela se
apaixonou?
Por que me pergunta isso? inquiriu McBane A conhece?
Sean olhou para McBane, e por fim, viu-o. Tinha que sab-lo.
Com quem se casa?
McBane ficou assombrado.
O noivo o filho de um conde, Peter Sinclair.
Ao dar-se conta de que Elle ia casar se com um ingls, Sean
exclamou:
Com um maldito britnico!
McBane disse com cautela:
Tem ttulo e fortuna, e se diz que um homem bonito. Ouvi
comentar que muito bom matrimnio. De fato, minha esposa
me falou que Sinclair est muito apaixonado e que ela tambm
muito feliz. Olhe, Collins, dou-me conta de que est consternado.
Mas o estar mais ainda se uma patrulha nos surpreender aqui.
Tem que voltar para seu esconderijo at que tenha que tomar o
navio para a Amrica.
Tinha razo. Sean lutou por recuperar o sentido comum. Em um
dia partiria a Amrica. Era questo de vida ou morte. O que fizesse
Eleanor, com quem se casasse, no era assunto dele. No passado,
ele a teria protegido com sua vida, mas ento era um homem
diferente, com outra vida. Sean tinha morrido pouco
depois daquela terrvel noite em Kilvore. Converteu-se em um
assassino procurado pelas autoridades inglesas.
Embora queria faz-lo, no podia voltar, porque Sean
no existia.
J s era John Collins.
Olhou para McBane.
Tem razo.
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Que Deus o acompanhe, Collins. Que Deus o acompanhe.
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CCaappttuulloo 33
Antes de que ns cavalheiros nos retiremos a tomar o licor,
eu gostaria de fazer um brinde disse o conde de Adare.
Todo mundo ficou em silncio. Sentados mesa do jantar havia
cinqenta convidados e toda a famlia de Warenne, exceto Cliff,
que ainda tinha que chegar, alm de Devlin e Virginia . A
mesa estava vestida com as melhores toalhas de linho e servida
com os cristais e a porcelana mais delicada. Havia centros de flores
da estufa da condessa. O conde presidia o jantar, e a condessa
estava sentada frente a ele.
Eleanor viu que seu pai sorria. Tinha um olhar de calidez e
bondade nos olhos profundamente azuis. Estava olhando a toda
sua famlia e a seus convidados, e finalmente se fixou nela. Ela no
podia olh-lo nos olhos; sabia que seu pai estava muito contente
por que se casasse com o Peter, e no queria que supusera que
tinha passado todo o dia feita um molho de nervos. Sua
conversao com o Ty no tinha tido um efeito muito duradouro.
Peter estava sentado a seu lado. Ele tinha sido muito atento
durante toda a noite, e estava muito bonito com seu traje de
etiqueta. No princpio, para Eleanor tinha sido difcil rir e fingir que
no passava nada de mau.
Entretanto, e embora no gostasse muito, tinha tomado duas
taas de vinho tinto, e com o lcool se acalmou.
Imediatamente, tinha desfrutado ao escutar tudo o que dizia
Peter, e tinha estado rindo durante quase todo o tempo. Eleanor
nunca se deu conta de quo gracioso era seu prometido. E se
perguntou por que nunca se deu conta de que tambm era muito
bonito.
Se no tivesse sido escandaloso, possivelmente tivesse tomado
uma terceira taa de vinho, pena a que o jantar j tinha
terminado. Ento, teria podido flutuar durante o resto da noite.
Peter lhe murmurou ao ouvido, para que ningum mais
pudesse ouvi-lo:
Encontra-se bem?
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Ela sorriu.
Foi uma noite maravilhosa.
Ele arqueou as sobrancelhas com surpresa.
Todas as noites so maravilhosas se as compartilhar contigo
respondeu.
Eleanor notou que se derretia com uma agradvel sensao.
por que tinha tido dvidas sobre aquele matrimnio?
um romntico, Peter lhe disse, rindo, e lhe deu com o
cotovelo no brao.
Sempre fui um romntico no que a voc concerne.
Ela o olhou abanando as pestanas. Como podia ser to
afortunada? Por que tinha estado desgostada? No o recordava
com claridade.
A condessa estava sentada frente ao conde, ao outro extremo
da mesa. Lorde Henredon, o pai de Peter, estava a sua direita.
Mary disse brandamente:
Querido? Todos estamos esperando.
O conde pigarreou. Afastou a vista de sua filha e se fixou nas
caras espectadores de seus convidados.
No sei como lhes explicar quo feliz estou porque minha
querida e bela filha tenha decidido, por fim, casar-se. E estou
ainda mais feliz de que v se casar com o jovem Sinclair.
Evidentemente, a mudana de opinio requeria ao homem
adequado. No recordo hav-la visto nunca mais ditosa. Pelos
noivos. Que seu futuro esteja cheio de amor, paz, alegria e risada
disse o conde, e elevou sua taa. Depois, continuou: Tambm
queria lhes agradecer a lorde e lady Henredon por sua ajuda na
organizao destas monumentais bodas, e quero dar as graas a
todos nossos convidados por estar aqui. Sobre tudo, ao senhor e a
senhora McBane, a lorde e lady Houghton, a lorde e lady Barton,
nesta reunio familiar, que espero que seja primeira de muitas
ocasies felizes. E finalmente, quero lhe dar as graas ao jovem
Sinclair. Peter, obrigado por fazer feliz a minha filha.
Depois de seu brinde de agradecimento, o conde se sentou,
olhando carinhosamente para Eleanor.
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Tambm eu gostaria de fazer um brinde interveio Tyrell,
sorrindo enquanto ficava em p Pelo homem que se atreve a
casar-se com minha irm. A faa feliz, ou ter que se ver com seus
cinco irmos disse para Peter.
Sinclair sorriu.
Viverei para fazer feliz a Eleanor disse galantemente.
Depois acrescentou com desconcerto Eleanor tem
quatro irmos, no?
Eleanor notou que lhe apagava o sorriso dos lbios. Tinha trs
irmos e dois meio-irmos. Todo mundo sabia. No sabia tambm
Peter? Mas Sean se foi, estava desaparecido.
Falei algo inapropriado? perguntou Sinclair com grande
confuso Cliff no chegou ainda, mas com ele, seriam quatro
irmos.
Eleanor cravou os olhos na toalha. De repente, mesmo com os
efeitos do vinho, sentia-se triste. Onde estava Sean? Por que no
estava ali? No queria voltar para casa?
O vinho lhe tinha nublado a inteligncia. Sean no estava ali,
assim, como ia casar-se? No podia haver bodas sem Sean, porque
ele era o homem com quem se supunha que ia casar-se. De
repente, Eleanor teve uma pontada de pnico.
Sinto muito, Eleanor murmurou Tyrell.
Ela o olhou. Os efeitos do vinho se dissiparam como se tivesse
se inundado em uma banheira de gua fria. Ia casar-se com o
Peter, no com Sean. Queria Peter, ou quase, e tinha que tomar
uma terceira taa de vinho antes de que a noite se danificasse.
Devlin interveio. Tinha sido capito da marinha
britnica, e ainda conservava a pele bronzeada e o cabelo loiro
pelo sol.
Estou seguro de que ter ouvido os rumores, Peter. Tenho
um irmo pequeno, mas desapareceu faz quatro anos. Ningum
viu a Sean, nem soube nada dele, aps.
Sinclair ficou consternado.
No, no o tinha ouvido. Deus Santo, sinto-o muitssimo,
capito disse para Devlin. A Eleanor no ficava vinho na taa.
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Olhou fixamente o cristal, desejando no ter conhecido nunca a
Sean, porque lhe estava destroando o que se supunha que devia
ser o dia mais feliz de sua vida. E ela era feliz, verdade? Gostava de
como Peter a olhava, e como sorria. Tinha sido muito feliz um
momento antes! ia sentir falta de Sean para sempre, mas tambm
ia casar-se com um homem maravilhoso, perfeito, embora fora
ingls.
Peter? disse-lhe, sonrrindo Eu gostaria muito de tomar
outra taa de vinho pediu. Entretanto, ele no teve
oportunidade de lhe responder.
Pelo Sinclair disse Rex de Warenne. Tinha perdido a perna
direita na guerra; naquele momento, ficou em p com ajuda de
sua muleta O marido perfeito para nossa irm. Eleanor, no h
nenhuma noiva mais afortunada que voc.
Eleanor olhou para Rex, perguntando-se se estava burlando
dela. Tinha mudado tanto desde que havia re
Sou a mulher mais afortunada da Irlanda disse com
veemncia.
Todo mundo a olhou.
Eleanor se perguntou, horrorizada, se tinha falado as palavras.
Rex arqueou as sobrancelhas com ceticismo.
Seriamente?
Eleanor o olhou novamente, e pensou que ele sabia
exatamente como se sentia. Claro que ele tinha muita afeio ao
vinho, e ao brandy, sobre tudo desde que tinha perdido a perna.
Possivelmente lhe desse outra taa de vinho, discretamente, no
caso de ter cometido a terrvel gafe de embriagar-se em
companhia to educada.
As damas no se embebedam, Elle.
Eleanor se sobressaltou no assento. Deu-se a volta para
procurar a Sean, mas no havia ningum atrs dela.
Eleanor? O que ocorre? perguntou-lhe Peter rapidamente,
preocupado.
Est aqui? disse ela, agarrando-se ao respaldo de sua
cadeira.
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O conde ficou em p com deciso.
Acredito que deveramos ir tomar os licores. Eleanor?
Eleanor se deu conta de que tinha estado a ponto de sentar-se
de costas na cadeira. Sean no estava ali. Ela se sentiu to
decepcionada que lhe custou manter a compostura sob tantas
olhadas.
Peter permaneceu sentado junto a ela. Enquanto os homens
saam, Rex se aproximou deles coxeando. Era um homem muito
moreno e musculoso, a viva imagem de Tyrell, salvo que tinha os
olhos marrons e no azuis.
Sinto muito, Eleanor. No deveria descarregar meu mau
humor em voc nesta ocasio to feliz.
Ela tinha deixado de entender a seu irmo anos antes, quando
Rex havia tornado da guerra, cheio de amargura e ferido, e
naquela ocasio, tampouco tinha nem idia do que queria dizer.
Sorriu e disse, agitando a mo com exagero:
OH, Rex. meu irmo favorito, e no pode fazer nada de
mau. Sabe, no?
Rex olhou para Peter.
Perdoa um momento, Peter lhe disse.
Depois tomou pelo brao a seu irmo e a afastou da mesa.
Est bbada! exclamou em um cochicho.
Sim, verdade? respondeu ela com um grande sorriso
Agora comeo a entender por que voc gosta tanto beber. Poderia
me conseguir outra taa de vinho tinto, por favor?
Claro que no respondeu ele, que estava entre divertido e
horrorizado , Est pensando em sabotar suas prprias bodas?
Eleanor decidiu analisar a palavra sabotagem.
Mmm. Sabotagem significa runa, no? Mas, em um sentido
poltico? uma sabotagem um ato poltico? Por que estamos
falando de sabotagem?
Deveria ir para seu quarto disse Rex com firmeza, mas lhe
tremiam os lbios como se estivesse tentando no sorrir.
No at que no me tenham beijado afirmou ela, e se
afastou de seu irmo. Dirigiu-se para Peter com um sorriso.
45
As damas se retiraram a um salo contigo. Seu prometido a
estava esperando a ss junto mesa.
Vai tudo bem? perguntou-lhe.
Eleanor ficou surpreendida pela pergunta.
Claro que sim respondeu, e o tirou do brao Estou com
voc acrescentou.
Ele se ruborizou.
Eleanor, voc nunca bebe. Possivelmente devesse avisar a
alguma de suas cunhadas e te dar boa noite por hoje.
Essa uma idia pssima! exclamou ela, e se aproximou
mais de Peter No estivemos a ss nem um momento durante
todo o dia lhe disse brandamente No quer que vamos ver as
estrelas?
Ele se ruborizou ainda mais.
Ia sugerir justamente isso. Voc se adiantou.
Me d muito bem adiantar aos meninos, e aos homens
respondeu ela com franqueza. Monto e disparo melhor que
ningum.
Ele a olhou com os olhos totalmente abertos.
OH murmurou ela. As damas no montam e no
disparam, pensou. As damas no mentem As damas no
mentem disse em voz alta.
Desculpa?
Possivelmente conversar no foi a melhor ideia de todas.
Eleanor sorriu e empurrou ele, brandamente, para as portas da
terrao. Peter relaxou e lhe permitiu que o guiasse para fora.
Sean subiu os degraus do terrao. Estava deserto e sem
iluminar, e inclusive antes de cruz-la, viu o interior da casa, onde
havia uma reunio. Aproximou-se de uma das grandes janelas e
olhou o salo.
Presidindo a mesa estava o homem que o tinha acolhido em
sua casa depois do assassinato de seu verdadeiro pai, que o tinha
criado, que lhe tinha ensinado a nobreza e a honra, que o tinha
querido como a um filho prprio. Sean se aferrou parede da
casa. Os joelhos lhe fraquejavam.
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E depois viu seu irmo.
Devlin estava em p. Era um homem alto e forte. Sua mulher
estava sentada a seu lado. Sean tinha reconstrudo Askeaton para
Devlin, e voltaria a faz-lo sem pens-lo, se fosse necessrio.
Tambm daria a vida por seu irmo maior.
Tragou saliva. A bela esposa de Devlin, Virginia, parecia muito
feliz, e ele se alegrou com todo seu corao pelos dois. Ela tinha
salvado a alma de seu irmo anos antes, e por aquilo, Sean sempre
a quereria.
Seus meio-irmos tambm estavam ficando em p. Havia um
ambiente festivo, quente e luminoso na estadia.
E a Sean lhe resultou impossvel no recordar todos os
momentos que tinha passado naquele salo com seu pai, com seus
irmos, com sua me e com Elle. Como a mar do mar irlands, as
sensaes e os momentos o empaparam, lhe exigindo ateno,
inspeo, rememorao: uma manh de Natal, uma tarde escura e
fria, noites agradveis frente ao fogo, veladas de famlia,
camaradagem fraternal e brandy. Sean teve que sacudir com fora
a cabea para livrar do passado.
Por que estava fazendo aquilo? Recordar a vida que tinha
deixado atrs no ia ajud-lo a evitar aos ingleses e fugir do pas.
Em uns minutos, roubaria um cavalo dos estbulos e ficaria em
caminho para Cork. Chegaria ali antes do amanhecer. Depois,
zarparia para a Amrica.
Mas ainda no podia partir.
Recordou-se que estava fazendo aquilo porque Elle ia casar se.
Sean apertou a cara contra o cristal, observando como Tyrell
apertava o ombro de Devlin. Os dois homens estavam rindo de
algo enquanto saam do salo com outros, e a Sean lhe resultou
impossvel negar o desejo que sentia de entrar naquela casa e
formar de novo parte de sua famlia. Desejava-o tanto que teve
que fazer um esforo muito grande por no deixar-se levar. As
autoridades inglesas tinham posto preo a sua cabea por traio,
e ele no tinha inteno de afundar ao conde e a seus irmos
consigo.
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As mulheres estavam levantando tambm, preparando-se para
sair do salo. Sean reconheceu a Virginia; Tyrell rodeou com o
brao a uma dama. O resto do grupo no lhe resultava familiar,
salvo sua me. A condessa seguia to elegante como sempre, mas
ele se deu conta de que tinha envelhecido. E no se enganou: seu
desaparecimento devia lhe haver causado muita dor.
Ento, Sean se fixou na dama que caminhava junto ao Rex. E
ficou paralisado.
Tinha mudado, mas ele a reconheceria em qualquer parte. E
sentiu tanto alvio que esteve a ponto de deprimir-se contra a
janela. Elle.
J no ficava nada daquela menina magra e intrpida.
Entretanto, se se atrevia a recordar a ltima noite que tinha
passado em casa, teve que reconhecer que quatro anos antes
tinha deixado na porta do imvel a uma mulher que estava
florescendo e que j no tinha nada de menina. Sean tinha
esquecido o quo alta que era. Os ngulos e os planos de seu
corpo se converteram em curvas voluptuosas. A menina
desajeitada era uma mulher muito bela, tanto que poderia deixar
sem sentido a um homem.
Ao observ-la enquanto enrolava a seu irmo, Sean teve a
sensao de que o mundo inteiro se voltava do reverso.
Teve pnico. O que estava fazendo?
Ao ser consciente de que estava observando a Elle com fome e
necessidade, cambaleou-se.
Aquilo era impossvel, pensou com incredulidade, com espanto.
No podia desejar a uma mulher a que tinha considerado sua irm
durante toda sua vida. Seu corpo estava respondendo como o
faria ante qualquer mulher bela, devido aos dois anos de celibato
que tinha passado na priso.
Elle estava caminhando junto ao Rex e sorrindo a um cavalheiro
loiro, ao que tomou pelo brao. Sean se deu conta de que aquele
devia ser Sinclair. Era um homem bonito e privilegiado, com os
gestos de um nobre. Sean o desprezou a primeira vista.
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Deu-se conta de que estava tremendo de desespero. Estava
furioso com ela, com Sinclair, consigo mesmo. obvio que Elle
tinha crescido. Ele tinha todo o direito de sentir-se surpreso ao ver
a beleza em que se converteu, mas no tinha direito a sentir
nenhuma outra coisa. E aonde ia ela com o Sinclair, de todos os
modos?
Deu-se conta de que o salo tinha ficado vazio, e ouviu abrir a
porta da terrao. Imediatamente, ouviu tambm a risada de Elle.
Embora aquele som lhe resultava familiar, tambm tinha algo
estranho e novo. Sua risada tinha trocado. Converteu-se em uma
risada sedutora.
O apertou as costas contra a parede. O casal apareceu ante sua
vista, caminhando para a balaustrada. Estavam to absortos um
no outro que no se precaveram de sua presena. Ela tambm se
movia de um modo distinto. Seus passos eram largos, mas o
movimento de seus quadris tinha sensualidade, algo que ele odiou
imediatamente. Movia-se como uma mulher que sabia que a
apreciavam e a admiravam, que a observavam.
Te falei quo bonita est esta noite? perguntou-lhe Sinclair,
tomando ambas as mos.
Sean se afogou em silncio.
Parece-me que no respondeu Eleanor, sorrindo Mas se o
tiver feito, sempre pode me dizer isso outra vez.
Estava paquerando! Quando tinha aprendido Elle a paquerar?
to preciosa sussurrou Sinclair.
Sean detestou sua voz enrouquecida. No deveriam estar a ss
na terrao, de noite. E onde estavam os outros? Ela tinha quatro
irmos para fazer o papel de acompanhantes. Por que no havia
nenhum que o estivesse fazendo?
E voc, senhor, muito galante e encantador respondeu
brandamente Elle Sou muito afortunada por me casar com um
homem assim.
Com respeito a voc, um homem nunca ser o
suficientemente galante nem encantador respondeu Sinclair.
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Acaso no sabia que sua prometida era um demnio? No sabia
que galopava, que dava murros e que soltava improprios? No
sabia que caava e pescava? Ou acaso Elle se converteu em uma
debutante e uma coquete?
Me alegro de que seja to encantador sussurrou Elle Te
encontro verdadeiramente encantador, embora tenha os olhos
azuis.
Sean no entendeu a que se referia, e pareceu que Sinclair
tampouco.
Houve ento um silncio tenso.
Sean teve vontades de dar um murro parede, porque soube
que Sinclair ia beij-la.
Posso te beijar, Eleanor? perguntou-lhe.
Pensava que nunca foste perguntar-me isso. - disse ela com
uma suave gargalhada.
Com incredulidade, Sean viu como Sinclair a tomava entre seus
braos e inclinava a cabea para ela. A lua escolheu aquele preciso
momento para aparecer por entre as nuvens e iluminou aos
amantes. Sinclair tinha fundido sua boca com a dela, e lhe estava
devolvendo os beijos obstinada a seus ombros.
Sean se apoiou contra o muro, furioso e paralisado, ofegando, e
afastou o olhar. No podia assimilar que aquela mulher sensual
que estava nos braos daquele homem fosse Elle. No podia
aceitar que fosse Elle que estava emitindo aqueles sons suaves de
prazer. Ela se tinha convertido em uma mulher muito desejvel,
mas Sean sabia que no tinha direito a sentir por ela a luxria que
estava sentindo.
Eleanor, quero-te.
A declarao entrecortada de Sinclair chamou de novo a
ateno de Sean para o casal. Sinclair lhe tinha tomado a face
entre as mos, e estava tremendo visivelmente enquanto lhe
sorria como se estivesse apaixonada por ele.
Estou tentando ser um cavalheiro com todas minhas foras
sussurrou Sinclair, mas me est pondo isso muito difcil.
50
Estamos sozinhos murmurou Elle Ningum saber se est
sendo um cavalheiro ou no esta noite.
Sean ia intervir, mas se conteve bem a tempo. Acaso estava
sugerindo Eleanor que Sinclair se tomasse mais liberdades? Ela
tinha sido uma menina selvagem e obstinada, e Sean sabia que era
uma mulher muito apaixonada. Teria se deitado j com seu
prometido? Elle nunca se negava nada que quisesse, e ele a
conhecia o suficientemente bem para saber que sua virgindade
no lhe importaria nada.
E se estavam beijando de novo.
Ento, Sean deu um murro na parede. Demnios, onde estavam
seus irmos? Ia ter que presenciar aquilo durante toda a noite?
Porque no acreditava que pudesse suport-lo.
Elle se sobressaltou em braos de Sinclair.
O que foi isso? perguntou, olhando a seu redor.
Sean esqueceu seu dilema e tentou voltar-se invisvel contra a
parede.
A que se refere? perguntou-lhe Sinclair com a voz rouc