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LIBNIA CRISTINA NUCCI PASSOS
BULLYING: UMA VISO JURDICA DA PRTICA NO AMBIENTE ESCOLAR
Assis 2011
LIBNIA CRISTINA NUCCI PASSOS
BULLYING: UMA VISO JURDICA DA PRTICA NO AMBIENTE ESCOLAR
Monografia apresentada ao Departamento do
curso de Direito do IMESA (Instituto Municipal de
Ensino Superior de Assis), como requisito para a
concluso do curso de graduao em Direito, sob
a orientao especfica do Prof. Ms. Leonardo de
Gnova, e Orientao Geral do Prof. Dr. Rubens
Galdino da Silva.
Orientador: Professor Mestre Leonardo de Gnova.
rea de Concentrao: Direito Civil.
Assis 2011
FICHA CATALOGRFICA
PASSOS, Libnia Cristina Nucci Bullying: uma viso jurdica da prtica no ambiente escolar / Libnia Cristina Nucci Passos. Fundao Educacional do Municpio de Assis FEMA Assis, 2011. 90p. Orientador: Leonardo de Gnova Trabalho de Concluso de Curso Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis IMESA.
1. Bullying 2. Violncia Escolar
CDD: 340 Biblioteca da FEMA
BULLYING: UMA VISO JURDICA NA PRTICA NO AMBIENTE ESCOLAR
LIBNIA CRISTINA NUCCI PASSOS
Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao
Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis
como requisito do Curso de Graduao analisado
pela seguinte comisso examinadora.
Orientador: Professor Mestre Leonardo de Gnova.
Analisador (1): Professora Mestre Fabiana Ferraz De Marchi Manfio.
Assis 2011
DEDICATRIA
Dedico este trabalho aos meus pais,
Gilberto e Mrcia, pelo incentivo aos
estudos, pelo apoio, pela segurana que
me passam e pelo amor que demonstram
por mim em cada palavra e atitude.
AGRADECIMENTOS
Diante da finalizao de mais uma etapa, agradeo quele que nunca desistiu de
mim: a DEUS, pelo amor, graa, fidelidade, por renovar as minhas foras a cada
manh e por olhar de forma cuidadosa sobre a minha vida. Em Ti deposito minha
esperana, confio meus dias e tenho a garantia da Vitria.
Agradeo ainda reconhecidamente:
Ao Prof. Leonardo de Gnova, pelos auxlios, ensinamentos pesquisa desse
trabalho e por acreditar em mim;
Prof. Camila Nogueira de Moraes, pela pacincia, empenho, dedicao e pela
contribuio nesta tarefa;
Aos meus pais, Gilberto e Mrcia, pelo incentivo e apoio constante em mais uma
etapa;
minha av Helena Marta, pelo companheirismo e por me motivar com seu
exemplo de vida;
minha irm Talita e ao George, pelos conselhos e por me encorajar a no desistir;
Ao Heliton, pela compreenso, cuidado, pacincia, por alegrar meus dias e me
proporcionar momentos de tranqilidade;
minha tia Marta, pelo carinho e pelas palavras amigas;
Luciana, pela ajuda, pelas dicas e pela fora que me deu neste perodo;
Ao Prof. Leandro, pelas sugestes, pela considerao, pela amizade e a todos da
Escola Galharini, pela contribuio pesquisa deste trabalho.
Ensina a criana no caminho em que deve andar, e, ainda quando for velho, no se desviar dele.
Provrbios 22:6
RESUMO O bullying um ato violento praticado, principalmente, entre adolescentes em
ambiente escolar, e, embora exista h anos, tornou-se objeto de discusses em
tempos mais recentes. Isto se deu devido ao crescimento dessa prtica e
verificao da gravidade das consequncias.
Assim, necessrio que se crie uma discusso acerca dos aspectos jurdicos e
sociais no que tange responsabilidade civil dos agressores e a criao de uma lei
especfica, ante a dificuldade de enquadramento jurdico, como forma de contribuir
para a proteo das vtimas, punio daqueles que praticam e preveno do
problema.
Palavras chave: Bullying Violncia Escolar Responsabilidade.
ABSTRACT
Bullying is an act of violence that is practiced, mainly, among adolescents in the
school environment, even though it exists for years, it became an object of
discussion in recent times. This happened because of the growth of this practice and
the verification of the severity of the consequences.
Thus, it is necessary to create a discussion about the legal and social aspects
regarding the civil responsability of the offenders and the creation of a specific law,
given the difficulty of the juridical framing as a way to contribute to the protection of
victims, punishment of those who practice and preventing the problem.
Keywords: Bullying School Violence Responsibility.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ART Artigo
CC Cdigo Civil
CDC Cdigo de Defesa do Consumidor
ECA Estatuto da Criana e do Adolescente
SUMRIO
1. INTRODUO ................................................................................................. 13
2. BULLYING: NOES GERAIS ................................................................... 15 2.1. HISTRICO DO BULLYING .......................................................................... 15 2.2. CONCEITO ...................................................................................................... 19 2.3. CRITRIOS DE IDENTIFICAO DO BULLYING ..................................... 20 2.4. FORMAS DE BULLYING ............................................................................... 22 2.5. PARTICIPANTES DO BULLYING ................................................................. 23 2.5.1. Vtimas ............................................................................................................ 23 2.5.1.1. Vtima Tpica ................................................................................................ 23 2.5.1.2. Vtima Provocadora ...................................................................................... 23 2.5.1.3. Vtima Agressora .......................................................................................... 24 2.5.2. Agressores ..................................................................................................... 24 2.5.3. Espectadores ................................................................................................. 25 2.5.3.1. Espectadores Passivos ................................................................................ 25 2.5.3.2. Espectadores Ativos ..................................................................................... 26 2.5.3.3. Espectadores Neutros .................................................................................. 26
2.6. MEIOS DE IDENTIFICAR OS ENVOLVIDOS COM O BULLYING ........... 26 2.6.1. A Vtima .......................................................................................................... 27 2.6.2. Os Agressores ............................................................................................... 28 2.6.3. Os Espectadores ou Testemunhas .............................................................. 29
2.7. CONSEQUNCIAS DO BULLYING .............................................................. 30
3. O PAPEL SOCIAL DA FAMLIA E DA ESCOLA NA EDUCAO DAS CRIANAS E ADOLESCENTES ........................................................... 31 3.1. O DIREITO E AS MUDANAS SOCIAIS ..................................................... 31 3.2. O PAPEL DA FAMLIA .................................................................................. 33 3.3. O PAPEL DA ESCOLA ................................................................................... 36
4. O BULLYING E A LEGISLAO ATUAL ................................................ 39 4.1. OS DIREITOS DA CRIANA E DO ADOLESCENTE: PROTEO VTIMA ..................................................................................................................... 39 4.1.1. Constituio Federal ................................................................................. 39 4.1.2. Estatuto da Criana e do Adolescente Lei n 8.069/1990 .................. 40 4.1.3. Outras Legislaes .................................................................................... 41 4.2. RESPONSABILIDADE CIVIL: BULLYING E O DEVER DE INDENIZAR A VTIMA ..................................................................................................................... 42 4.2.1. Responsabilidade Atribuda Instituio de Ensino ................................ 42 4.2.2. Responsabilidade do Agressor (Menor) e dos Pais ................................... 48
4.3. NECESSIDADE DE UMA LEGISLAO ESPECFICA ............................. 54
5. ESTUDO SOBRE O BULLYING ................................................................. 58
5.1. DADOS E CONSTATAES ........................................................................ 58 5.2. ANLISE SOBRE OS DADOS DA PESQUISA ........................................... 60
6. UMA REFLEXO CRTICA SOBRE O DEVER DE INDENIZAR ....... 68 6.1. O PODER FAMILIAR COMO EXERCCIO DA CIDADANIA ...................... 68 6.2. LIMITES AOS FILHOS: DEVER DOS PAIS ................................................ 69 6.3. BULLYING: UM PROBLEMA QUE TAMBM DOS PAIS ....................... 69
7. CONCLUSO ................................................................................................... 74
REFERNCIAS ................................................................................................... 77
ANEXO I ................................................................................................................ 81
ANEXO II ............................................................................................................... 88
13
1. INTRODUO
A violncia escolar ocorrida de forma repetida contra uma mesma vtima ao longo do
tempo e dentro de um desequilbrio de poder, de forma agressiva, cruel, proposital,
conhecida como bullying, um dos temas que dificilmente pode passar
despercebido pelo ordenamento jurdico, j que trata de um fenmeno social de
grande relevncia.
O presente trabalho visa a estudar o fenmeno bullying, traando os conceitos e as
caractersticas do problema, juntamente com seus efeitos dentro da sociedade
moderna, buscando o posicionamento da jurisprudncia para o assunto e a
dificuldade de enquadramento jurdico, ante a inexistncia de lei especfica.
Embora o bullying possa ser encontrado em vrios segmentos da sociedade, ser
tratado, nesta oportunidade, no mbito escolar, praticado entre alunos do ensino
fundamental e mdio.
As relaes comportamentais dos alunos na escola so uma questo social muito
preocupante. Porm, a ateno para o problema s ocorre quando so divulgadas
algumas tragdias que ocorrem nas escolas, gerando insegurana para a
comunidade, sem que as verdadeiras causas sejam enfocadas. Trata-se de prtica
recorrente, mas que se tornou objeto de discusses recentemente.
Em que concerne questo jurdica, este tema pouco discutido, causando dvida
aos operadores do direito a respeito da medida judicial cabvel quando da ocorrncia
de tal prtica.
Deste modo, foi despertado interesse em traar, neste trabalho, em linhas gerais,
uma discusso acerca dos posicionamentos jurisprudenciais, no que tange
responsabilidade civil dos agressores e essa necessidade de uma lei especfica,
diante do aumento de casos dessa natureza nas diferentes esferas da sociedade
atual.
14
A sustentao da pesquisa ser realizada atravs de legislao, jurisprudncia,
pesquisas bibliogrficas, pesquisa emprica, internet e doutrina.
Alm disso, tal pesquisa ser realizada tambm nas escolas para que se veja de
perto a realidade do problema e como ele atinge, de forma efetiva, as relaes
escolares entre os alunos, possibilitando uma aproximao do tema diante da
realidade que ele se apresenta.
Ser, ainda, feito anlise sobre o tratamento do assunto na legislao vigente, bem
como acerca da viabilizao de defesa s vtimas e punies aos responsveis, de
modo a contribuir para a diminuio do problema, por meio de medidas judiciais
necessrias e eficazes.
Por ltimo, segue a estruturao do trabalho.
No primeiro captulo, procurou-se conceituar o que vem a ser o bullying, passando
por sua evoluo histria, conceito, critrios de identificao, forma, participantes,
meios de identificar os envolvidos e consequncias do fenmeno.
No segundo captulo, procurou-se demonstrar o papel da escola e da famlia diante
das mudanas ocorridas na sociedade.
J no terceiro captulo, especificou-se sobre a proteo vitima encontrada em
legislaes esparsas, a responsabilidade atribuda pela jurisprudncia instituio
de ensino e aos pais, bem como a necessidade de uma legislao especfica.
O prximo captulo foi dedicado pesquisa emprica, de grande relevncia ao
assunto em questo.
No ltimo captulo, foi realizada uma reflexo crtica ao dever de indenizar atribudo
pela jurisprudncia.
15
2. BULLYING: NOES GERAIS
2.1. HISTRICO DO BULLYING
O Bullying um fenmeno de agresso que pode ocorrer no meio de adolescentes.
Na verdade, sempre existiu, mas no era observado pela sociedade.
De acordo com FANTE (2005, p. 44), foi em meados da dcada de 1970, na Sucia,
que a prtica despertou o interesse na sociedade quando foram percebidos
problemas entre estudantes agressores que vitimavam seus colegas; em seguida,
este interesse alastrou-se para outros pases.
Na Noruega, tambm nos anos de 1970, o professor Dan Olweus comeou a
pesquisar e investigar sobre as agresses ocorridas nas escolas, bem como o
comportamento dos agressores e das vtimas (FANTE, 2005, p.45).
Segundo FANTE (2005, p.45), atravs desse estudo, foi possvel individualizar o
bullying, diferenciando-o das demais agresses:
Dan Olweus, pesquisador da Universidade de Bergen, desenvolveu os primeiros critrios para detectar o problema de forma especfica, permitindo diferenci-lo de outras possveis interpretaes, como incidentes e gozaes ou relaes de brincadeiras entre iguais, prprias do processo de amadurecimento do indivduo.
Essa investigao, no entanto, s teve relevncia para as instituies de ensino
quando, em 1982, ocorreu o suicdio de trs crianas entre 10 e 14 anos,
possivelmente motivado por uma situao de maus-tratos sofridos por elas em meio
a seus colegas de escola, o que caracterizou um caso grave de bullying.
Tal pesquisa, realizada pelo professor Olweus, ocorrida na Universidade de Bergen,
na Noruega, feita com 84.000 estudantes, 300 a 400 professores e 1.000 pais, dizia
respeito natureza e ocorrncia do Bullying, sendo utilizados questionrios para
16
verificar as caractersticas, a extenso e os impactos do Bullying (CALHAU, 2010, p.
13).
Neste questionrio foi verificada a frequncia, tipos de agresses, locais de maior
risco, tipos de agressores e percepes individuais quanto ao nmero de
agressores, destinando-se a apurar as situaes de vitimizao e agresso,
segundo o ponto de vista da prpria criana.
Esse estudo informou os primeiros resultados sobre o bullying, verificando que um
em cada sete estudantes estavam envolvidos em casos de bullying. Tal constatao
mobilizou o governo noruegus a criar a Campanha Nacional Anti-Bullying, em 1983,
que veio a reduzir cerca de 50% dos casos ocorridos nas escolas da poca. Este
importante resultado repercutiu em pases como Reino Unido, Canad, Portugal,
que passaram a desenvolver seus prprios projetos e aes a respeito do tema
(FANTE, 2005, p.45).
Em 1993, foi publicado o livro Bullying at School, escrito por Olweus que
apresentava e discutia o problema baseado nos resultados da pesquisa e, alm
disso, oferecia projetos de interveno e uma relao dos sinais e sintomas que
poderiam ajudar a identificar os agressores e as vtimas do bullying.
O programa de interveno proposto na obra tinha como objetivo principal
desenvolver regras contra o Bullying nas escolas, envolvendo pais e professores,
conscientizandoos sobre o problema para eliminar mitos sobre o assunto,
promovendo, assim, apoio e proteo s vtimas.
Na obra de Fante (2005, p.46) encontramos que o fenmeno vem se alastrando para
outros pases:
Segundo Olweus, os dados de outros pases indicam que as condutas Bullying existem com relevncia similar ou superior as da Noruega, como o caso da Sucia, Finlndia, Inglaterra, Estados Unidos, Canad, Pases Baixos, Japo, Irlanda, Espanha e Austrlia.
17
Hoje, com o tema mais difundido, pesquisas do mundo inteiro afirmam que em torno
de 5% a 35% das crianas, em idade escolar, estejam envolvidas em atitudes
agressivas nesse ambiente.
A Conferncia Europia sobre iniciativas para combater o bullying nas escolas,
ocorrida em 1998, foi um marco importante que contou com a participao de pases
como Reino Unido, Irlanda, Itlia, Frana, Espanha, Portugal, Grcia, Noruega,
Sucia, Finlndia, Dinamarca, ustria, Blgica, Luxemburgo e Pases Baixos, e na
Amrica do Norte: Canad e USA (FANTE 2005, p.46).
Nos Estados Unidos, o fenmeno do bullying cresceu muito entre os alunos das
escolas e j est sendo discutido como um fenmeno global, pois, caso continue se
alastrando dessa maneira, os jovens podero tornar-se adultos abusadores e
delinquentes, na opinio de pesquisadores.
No Brasil, embora verificado um atraso de 15 anos em relao aos pases da
Europa, verifica-se um crescimento muito grande sobre o estudo do tema, em
virtude das reiteradas ocorrncias desta prtica que se tem observado.
Para FANTE (2005, p. 46-47), uma das primeiras pesquisas sobre o assunto no
Brasil foi feito pela professora Marta Canfield e seus colaboradores, no ano de 1997,
em escolas de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, e pelos professores Israel
Figueira e Carlos Neto, em 2000 e 2001, em escolas municipais do Rio de Janeiro.
De acordo com SILVA (2010, p.113), alguns estudos da Associao Brasileira
Multiprofissional de Proteo Infncia e Adolescncia (ABRAPIA), mostram que
apesar do Bullying ocorrer nas escolas de todo mundo, as escolas brasileiras
apresentam ndices superiores aos dos pases europeus. Essa Associao
constatou em suas pesquisas, apoiadas por empresas como Petrobrs e IBOPE,
que, entre os anos de 2002 e 2003, 28,3% dos alunos das escolas do Rio de
18
Janeiro, de 5 a 8 srie, admitiram ser alvo do bullying, tendo 60% admitido que
sofreram bullying na sala de aula1.
Segundo a revista Nova Escola2, uma pesquisa realizada em 2008 em seis estados
brasileiros apontou que 70% de 12 mil alunos consultados afirmaram ter sido vtimas
de violncia escolar.
De igual modo, foi verificado pela ABRAPIA que, entre os anos de 2000 e 2004,
40,5% dos alunos brasileiros admitiram estar envolvidos com o bullying e, em 2010,
constatou-se que a maior parte das humilhaes tpicas do bullying ocorre entre os
alunos da 5 e 6 srie, com maior incidncia dessa prtica em Braslia, Belo
Horizonte e Curitiba (SILVA, 2010, p. 113).
Aramis Lopes Neto (2005, s166), mdico do Municpio do Rio de Janeiro e scio
fundador da ABRAPIA, em artigo cientfico publicado em 2005, acrescentou que:
O bullying mais prevalente entre alunos com idades entre 11 e 13 anos, sendo menos frequente na educao infantil e ensino mdio. Entre os agressores, observa-se um predomnio do sexo masculino, enquanto que, no papel de vtima, no h diferenas entre gneros. O fato de os meninos envolverem-se em atos de bullying mais comumente no indica necessariamente que sejam mais agressivos, mas sim que tm maior possibilidade de adotar esse tipo de comportamento. J a dificuldade em identificar-se o bullying entre as meninas pode estar relacionada ao uso de formas mais sutis. Considerando-se que a maioria dos atos de bullying ocorre fora da viso dos adultos, que grande parte das vtimas no reage ou fala sobre a agresso sofrida, pode-se entender por que professores e pais tm pouca percepo do bullying, subestimam a sua prevalncia e atuam de forma insuficiente para a reduo e interrupo dessas situaes.
Deste modo, fica evidente que o bullying sempre existiu, porm s agora tem se
dado a importncia necessria a esse fenmeno por meio de pesquisas que
demonstram o comportamento do agressor em praticar tais condutas e as
consequncias graves que a vtima tende ao sofrer.
1 Dados retirados do Site: http://www.observatoriodainfancia.com.br/article.php3?id_article=232
2 Retirado do Site: http://revistaescola.abril.com.br/crianca-e-adolescente/comportamento/tudo-
bullying-433208.shtml.
http://www.observatoriodainfancia.com.br/article.php3?id_article=232http://revistaescola.abril.com.br/crianca-e-adolescente/comportamento/tudo-bullying-433208.shtmlhttp://revistaescola.abril.com.br/crianca-e-adolescente/comportamento/tudo-bullying-433208.shtml19
2.2. CONCEITO
A palavra Bullying de origem inglesa, no existindo uma traduo exata para o
termo, porm, serve para caracterizar comportamentos violentos, podendo ser
agresses, assdios, aes de desrespeito, realizados de forma repetitiva e
intencional, sem justificativas ou motivos especficos para tal conduta.
Sobre esse fenmeno, Ana Beatriz Barbosa Silva (2010, p.21) explica que:
[...] de forma quase natural, os mais fortes utilizam os mais frgeis como meros objetos de diverso, prazer e poder, com o intuito de maltratar, intimidar, humilhar e amedrontar suas vtimas. E isso, invariavelmente, sempre produz, alimenta e at perpetua muita dor e sofrimento nos vitimados.
O Bullying um assdio moral que visa desprezar, denegrir, violentar, agredir,
destruir o psicolgico de uma pessoa, sem motivo e com atos repetitivos.
CALHAU (2010, p.6) afirma que: [...] o bullying um cerco, tal qual o realizado em
uma guerra, onde o inimigo vai sendo atacado continuamente at se render ou
morrer.
FANTE (2005, p.27), por sua vez, define o termo como:
[...] uma palavra de origem inglesa, adotada em muitos pases para definir o desejo consciente e deliberado de maltratar uma pessoa e coloc-la sob tenso; termo que conceitua os comportamentos agressivos e antissociais, utilizado pela literatura psicolgica anglo-saxnica nos estudos sobre a violncia escolar.
[...] por definio universal, bullying um conjunto de atitudes agressivas, intencionais e repetitivas que ocorrem sem motivao evidente, adotado por um ou mais alunos contra outro (s), causando dor, angstia e sofrimento. Insultos, intimidaes, apelidos cruis, gozaes que magoam profundamente, acusaes injustas, atuao de grupos que hostilizam, ridicularizam e infernizam a vida de outros alunos levando-os excluso, alm de danos fsicos, morais e materiais, so algumas das manifestaes do comportamento bullying. (FANTE, 2005, p. 28 e 29).
20
A palavra bully traduzida enquanto nome como: indivduo valento, tirano,
mando, brigo e como verbo em: brutalizar, tiranizar, amedrontar. O bullying um
tipo de violncia, agresso fsica ou psicolgica, de forma repetitiva e intencional, na
qual um agressor (bully) pratica contra uma vtima, que no consegue se defender,
por circunstncia ou desigualdade de poder.
Essa desigualdade de poder pode ser diferena de tamanho, idade,
desenvolvimento fsico e emocional, pode ser que esteja em minoria, apresente
pouca habilidade de defesa, o que leva a vtima a no conseguir se defender com
facilidade e, alm disso, os agressores impem sobre as vtimas sua autoridade
para mant-las sob seu domnio e comandam tambm a maioria dos outros alunos
que presenciam o ato, proibindo qualquer atitude solidria em relao ao agredido.
Segundo CALHAU (2010, p.06), a Associao Brasileira Multiprofissional de
Proteo Infncia e Adolescncia (ABRAPIA) definiu algumas aes presentes
do bullying como:
[...] colocar apelidos, ofender, zoar, gozar, escarnar, sacanear, humilhar, fazer sofrer, discriminar, excluir, isolar, ignorar, intimidar, perseguir, assediar, aterrorizar, amedrontar, tiranizar, dominar, agredir, bater, chutar, empurrar, ferir, roubar e quebrar pertences.
Em suma, os fortes atormentam e intimidam os mais frgeis, com o propsito de se
divertirem por mero prazer, sabendo que a vtima no capaz de se defender e no
consegue fazer com que os colegas ajam em sua defesa.
2.3. CRITRIOS DE IDENTIFICAO DO BULLYING
O bullying possui um conceito especfico e definido, no sendo permitida qualquer
confuso com outros tipos de violncia, j que apresenta caractersticas prprias.
Para diferenciar o bullying de simples brincadeiras, de incio, deve ser analisado o
bom senso, verificando-se a situao. Alm disso, no se pode dizer que todas as
21
situaes de conflito configuram-se como bullying, pois assim seria um excesso,
devendo toda sociedade procurar avaliar caso a caso com cautela.
O bullying no se trata de brincadeiras simples, saudveis, prprias da idade em que
o assediado no se sente incomodado ou no se importa para apelidos, mas trata-
se de casos de violncia fsica ou moral, de forma dissimulada, praticadas por
agressores contra as vtimas, de forma reiterada.
Para distinguir ou individualizar o bullying de outras formas de violncia deve-se
analisar os seguintes critrios: aes repetitivas e intencionais contra a mesma
vtima em um perodo prolongado de tempo, alm do desequilbrio de poder,
dificuldade de defesa da vtima, ausncia de motivos que justifiquem as agresses,
aes estas que geram traumas psquicos na vtima, sentimentos negativos,
sequelas emocionais.
Alguns pesquisadores entendem que os ataques devem ser de no mnimo trs
vezes contra a mesma vtima e no mesmo ano para configurar bullying, mas deve
ser analisado o caso concreto para estabelecer e mensurar a prtica deste ato
agressivo.
Para CHALITA (2008, p.14), esse fenmeno caracteriza-se da seguinte forma:
O bullying a negao da amizade, do cuidado, do respeito. O agente agressor impiedosamente expe o agredido s piores humilhaes. Dos apelidos perversos s atitudes covardes de quem tem mais fora fsica ou mais poder. O agredido dificilmente encontra a coragem para se defender e permite que se fechem as cortinas. E quantos h que, com as cortinas fechadas, do cabo prpria histria. No so poucos os relatos recentes de alunos que desistem de viver e que, antes disso, decidem se vingar da instituio que permitiu que as cortinas lhe fossem fechadas.
O bullying pode ocorrer tanto entre alunos e alunos, de forma horizontal, quanto
entre professores e alunos, de forma vertical. Os atos desse fenmeno so
perversos e podem ocorrer sem serem percebidos, devendo quem est ao redor
fazer um esforo para identific-lo.
22
2.4. FORMAS DE BULLYING
De acordo com BRITO (2009, p.29-30), h vrias formas de praticar o bullying,
dentre elas: a forma direta e a indireta.
O bullying direto mais comum entre agressores do sexo masculino e ocorre
quando as vtimas so atacadas diretamente com atitudes que visam a humilhar,
fazer sofrer, discriminar, excluir, isolar, ignorar, intimidar, perseguir, assediar,
aterrorizar, amedrontar, tiranizar, dominar, agredir, ameaar, roubar ou apelar para o
lado sexual.
J o bullying indireto ocorre quando as vtimas esto ausentes e uma forma mais
comum entre as meninas e crianas, que deixam a vtima em isolamento social, com
atitudes de indiferena, difamao e negao aos desejos. Essa forma de isolar
pode ser por comentrios maldosos sobre a vtima, imposio de formas de vestir,
critica religio, etnia, incapacidade da vtima e intimidao de pessoas que
desejam se socializar com ela.
De acordo com SILVA (2010, p.22-24), normalmente a vtima do bullying agredida
por vrios agressores, causando sua excluso social e evaso escolar, podendo ser
praticadas de forma verbal (insultar, ofender, xingar, fazer gozaes, colocar
apelidos pejorativos, fazer piadas ofensivas) fsica ou material (bater, chutar,
espancar, empurrar, ferir, beliscar, roubar, furtar ou destruir os pertences da vtima,
atirar objetos contra a vtima), psicolgica e moral (irritar, humilhar e ridicularizar,
excluir, isolar, ignorar, desprezar ou fazer pouco caso, discriminar, aterrorizar e
ameaar, chantagear e intimar, tiranizar, dominar, perseguir, difamar, passar bilhetes
e desenhos entre os colegas de carter ofensivo, fazer intrigas e fofocas), sexual
(abusar, violentar, assediar, insinuar) e, ainda, virtual, que o chamado
Cyberbullying ou Bullying Virtual, no qual os jovens usam ferramentas tecnolgicas
como celulares, filmadoras, mquinas fotogrficas, internet para praticar agresses
do tipo calnia contra a vtima.
23
2.5. PARTICIPANTES DO BULLYING
De acordo com SILVA (2010, p. 37), os envolvidos com o bullying podem ser
divididos em vtimas, agressores e espectadores.
2.5.1. Vtimas
As vtimas so pessoas eleitas, escolhidas aleatoriamente pelos agressores para
serem alvos dos seus ataques, mesmo sem darem motivo algum agresso.
De acordo com FANTE (2005, p.71-72), podem dividir-se em: vtima tpica, vtima
provocadora e vtima agressora.
2.5.1.1. Vtima Tpica
As vtimas tpicas so aquelas pessoas que no conseguem se socializar, pois so
tmidas e bem reservadas. Alm disso, no conseguem reagir aos comportamentos
provocadores e agressivos que fazem contra elas. So frgeis fisicamente ou
apresentam algo que as faz destacar positiva ou negativamente no meio. So
pessoas selecionadas sem motivos, taxadas como diferentes, escolhidas para
serem alvos por fugirem do padro estabelecido pelo grupo.
2.5.1.2. Vtima Provocadora
As vtimas provocadoras so aquelas que implicam em seus colegas reaes
agressivas contra si mesmas, mas no conseguem responder s respostas de forma
satisfatria. Elas brigam ou discutem quando so insultadas e atacadas.
Geralmente so crianas hiperativas, impulsivas ou imaturas que criam ambientes
tensos na escola, chamando a ateno dos agressores, que aproveitam essas
situaes para desviarem toda ateno para a vtima que provoca.
24
2.5.1.3. Vtima Agressora
A vtima agressora aquela que sofreu o bullying e, com isso, passa a intimidar ou
ser agressora de outras crianas, ou seja, procura outra vtima mais fraca e
vulnervel que ela para reproduzir comportamento agressivo, repetindo nos outros
os maus tratos sofridos.
Um exemplo tpico so os trotes ocorridos em universidades, na qual os alunos do
primeiro ano (calouros) so agredidos por outros alunos, sendo que, no prximo
ano, essas mesmas vtimas passam ser os agressores de outros alunos. Outro
exemplo so as pessoas que vo at a escola com armas ou bombas para matarem
o maior nmero possvel de crianas em busca da justia.
Esse tipo de vtima faz com que o bullying se torne um problema de difcil controle,
levando-o a ser um crculo vicioso.
2.5.2. Agressores
Segundo FANTE (2005, p. 73), o agressor aquele que realiza o ato agressivo em
uma vtima ou nos mais fracos.
Pode ser tanto menino, quanto menina e, geralmente, uma pessoa que no
consegue compreender o outro, possuindo traos de desrespeito e maldade e, na
maioria das vezes, tem um poder de liderana obtido por sua fora fsica e assdio
psicolgico.
Alm de ser mais forte em relao a seus companheiros de sala e tambm vtima,
pode ainda ter uma idade um pouco mais avanada, ser superior em brigas, nos
esportes e ser uma pessoa impulsiva, que se frustra e irrita facilmente.
25
Geralmente no consegue se adaptar s condutas, nem pode ser contrariado,
mostrando pouca simpatia com as vtimas. Pode ter condutas antissociais e no
aceitam ser contrariados ou frustrados.
Pode ser um membro de uma famlia desestruturada, com pouco relacionamento
afetivo e ausncia dos pais. O que falta afeto, tanto por conta do lar deficitrio,
quanto do prprio jeito do jovem que manifesta desrespeito, ausncia de culpa e
remorso pelos atos cometidos contra os outros, como por exemplo, maltratar
animais, empregada, amigos, irmos e funcionrios da escola.
O desempenho escolar desses jovens pode ser regular ou deficitrio na maioria das
vezes, mas no significa deficincia intelectual ou de aprendizagem, j que muitos,
no incio, tm rendimentos normais ou acima da mdia.
Esse agressor pode agir sozinho ou em grupo. Quando est junto com os outros que
o seguem, seu poder aumenta e isso faz com que ele procure mais e novas vtimas.
2.5.3. Espectadores
Os espectadores so aquelas pessoas que testemunham as agresses, mas no
tomam nenhuma atitude.
Permanecem inertes e no se manifestam favorveis nem ao agressor, nem
vtima, podendo ser classificados em trs grupos, de acordo com SILVA (2010, p.45-
46): espectadores passivos, espectadores ativos e espectadores neutros.
2.5.3.1. Espectadores passivos
Os espectadores passivos, chamados tambm de testemunhas silenciosas, so
aqueles que no concordam com as atitudes dos bullies, mas no tomam nenhuma
atitude em defesa da vtima, permanecendo em silncio.
26
So aqueles que tm medo de se tornarem vtimas e recebem ameaas para no se
intrometerem no caso; alm disso, so frgeis e esto propensos a sofrerem
consequncias psquicas.
2.5.3.2. Espectadores Ativos
Os espectadores ativos so aqueles que apesar de no participarem diretamente
dos ataques, utilizam de palavras de incentivo aos agressores e do risada,
divertindo-se com o que veem.
Tambm se encaixam nesse tipo de espectador aqueles que articulam ou tramam as
agresses e depois apenas observam e se divertem, camuflados como boas
pessoas.
2.5.3.3. Espectadores Neutros
Dentre os espectadores neutros esto aqueles alunos que no se sensibilizam com
as atitudes dos agressores, pois esto inseridos em um contexto social de lares
desestruturados, ou moram em lugares em que a violncia faz parte do cotidiano.
Esses espectadores, muitas vezes, omitem-se diante da situao de bullying,
configurando tambm uma atitude imoral e criminosa, pois contribuem com a
impunidade e com o crescimento da violncia.
2.6. MEIOS DE IDENTIFICAR OS ENVOLVIDOS COM O BULLYING
Para que seja possvel a elaborao de estratgias, medidas preventivas e at
mesmo medidas punitivas em combate ao bullying, necessrio que pais,
professores, membros da sociedade e at mesmo alunos saibam identificar os
comportamentos das crianas e adolescentes envolvidos, analisando os papis que
cada um pode desempenhar nas situaes de bullying escolar.
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O bullying afeta a criana em seu relacionamento familiar, escolar e pode gerar
srios problemas emocionais, uma vez que ela no consegue fazer parte do grupo.
Muitas vezes, h dificuldade em perceber o bullying na escola, pois a vtima sente-
se envergonhada de admitir que est sendo agredida, e os espectadores sentem-se
intimidados em delatar os colegas.
2.6.1. A Vtima
Segundo SILVA (2010, p. 48), para identificar a vtima, deve ser observado no
ambiente escolar alguns comportamentos tais como: isolamento do grupo,
aproximao de adultos, insegurana, ansiedade, quietude, faltas reiteradas aula,
tristeza, aflio, desinteresse nas atividades escolares, dentre outros.
Em casa, os pais podem detectar sinais de vitimizao: quando a criana se queixa
de dor de cabea, enjo, dor de estmago, tonturas, vmitos, pouco apetite, insnia,
geralmente com maior intensidade no perodo que antecede o horrio das vtimas
entrarem na escola; mudana de humor de forma inesperada, apresentando
exploses de irritaes ou raiva; falta de amigos para compartilhar o tempo livre e
que, s vezes, no frequentam sua casa; quase no recebe telefonemas, e-mails,
torpedos, convites de festas, excurses, viagens com os alunos da escola; passam a
gastar mais na cantina da escola ou comprar outros objetos para presentear os
outros para agrad-los, a fim de evitar perseguies; comeam a apresentar
desculpas; sintomas de doenas fsicas que de fato podem existir como contuses,
feridas, cortes, arranhes ou estragos nas roupas, com o intuito de apresentar
subterfgios para faltar s aulas e, tambm em razo do estresse vivenciado,
ocasiona baixa imunidade fisiolgica, debilitando o organismo como um todo e
causando vrias enfermidades; voltam da escola com roupas rasgadas ou sujas e
com o material escolar danificado; apresentam-se irritados, ansiosos, tristes ou
deprimidos, sonolentos durante o dia e com ar de infelicidade permanente, alm de
no terem muito apetite; tornam descuidados com as tarefas escolares.
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2.6.2. Os agressores
Os agressores (bullies), no ambiente escolar, tm como seus comportamentos
habituais: fazem brincadeiras de mau gosto, alm de rir de forma a provocar, so
hostis e desdenhosos; colocam apelidos pejorativos e ridicularizantes com explcito
propsito maldoso; insultam, difamam, ameaam, menosprezam, ridicularizam,
constrangem alguns alunos; fazem ameaas diretas ou indiretas, do ordens,
dominam e subjulgam; perturbam e intimidam, incomodam, empurram, picham,
batem, envolvem-se em discusses e desentendimentos entre alunos ou entre
alunos e professores; rasgam roupas; pegam dos outros materiais escolares,
dinheiro, lanches e outros pertences sem o consentimento do dono ou at mesmo
sob coao.
Em casa, esses agressores devem ser observados pelos pais quando apresentarem
habitualmente atitude hostil, desafiadora e agressiva com os pais, irmos e
empregados, chegando at a aterroriz-los para mostrar autoridade sobre eles ou
atemorizam sem levar em conta a diferena de idade e de fora fsica; no
respeitam a hierarquia da casa; so habilidosos para manipular as pessoas e sair de
confuses ou situaes difceis que se envolveram; mentem sem qualquer
constrangimento e de modo a convencer, quando so questionados sobre suas
atitudes hostis; exterioriza ou tenta exteriorizar sua autoridade sobre algum; porta
objetos ou dinheiro sem justificar sua origem, ou seja, objetos que no possuam ou
dinheiro extra; adotam maneiras arrogantes de se vestir e, s vezes, de se portar,
conferindo-lhes superioridade perante familiares e colegas; voltam da escola
geralmente com roupas amarrotadas, demonstrando envolvimento em brigas ou
confrontos fsicos e com ar de superioridade; tambm podem se portar como se
nada de errado estivesse acontecendo, alm de contestarem todas as observaes
negativas que os pais recebem por parte da escola, dos irmos ou dos empregados
domsticos.
Outra forma muito importante de identificar o agressor distinguir aqueles que
podem sair desse papel e tornarem-se pessoas contra a violncia escolar, daqueles
29
que, desde muito cedo, possuem uma natureza sem afetividade. Se conseguirmos
fazer essa distino, mais fcil estabelecer estratgias de recuperao desses
agressores, pois, muitas vezes, o comportamento agressivo e violento em funo
de circunstncias desfavorveis que os cercam, como lares desestruturados.
Esses jovens, na maioria das vezes, ficam com sentimento de culpa por suas aes
erradas, podendo se tornar pessoas contra a violncia na escola, quando passam
por um processo de recuperao.
J outros tipos de agressores podem descender de uma natureza sem afetividade,
pois, desde muito cedo podem apresentar traos perversos, uma vida cheia de
condutas, tais como: mentiras constantes; crueldade com animais, irmos e colegas;
comportamento desafiador diante de autoridades como pais e professores; falta de
responsabilidade; acessos de fria quando contrariados; falta de sensibilidade, culpa
ou remorso; falta de constrangimento; fugas de casa ou da escola; violao de
regras.
Os jovens que apresentam essas caractersticas ditas anteriormente, de forma
consistente, apresentam transtorno de conduta ou delinqncia, que tendem a piorar
na vida adulta.
O importante nesses casos a aplicao de regras e limites a esses jovens, os
quais devem ser fiscalizados quanto ao cumprimento, para evitar a violao dos
mesmos.
2.6.3. Os espectadores ou testemunhas
Os espectadores, por sua vez, no costumam apresentar sinais explcitos como as
vtimas e os agressores.
Geralmente, tanto na escola, quanto em casa, ficam calados e no falam o que
sabem.
30
Os mais ansiosos ou sensveis contam casos de bullying, mas no admitem que
vivenciam. Quando indagados, podem tentar disfarar citando cenas de filmes,
novelas, seriados, histrias da internet, como a origem principal de seus
comentrios.
2.7. CONSEQUNCIAS DO BULLYING As consequncias do bullying so terrveis e graves para todos os envolvidos, porm
as vtimas so as que mais sofrem efeitos negativos, j que o trauma muito
grande, podendo se estender ao ambiente familiar, de trabalho, ocasionando
prejuzos para a sua sade fsica e mental.
De acordo com a cartilha lanada em 2010 pelo Conselho Nacional de
Justia, Bullying - Projeto Justia nas Escolas, nota-se que todas as vtimas dessa
agresso social sofrem em maior ou menor proporo com os ataques de bullying.
So muitas as consequncias que elas podem enfrentar, interferindo na vida escolar
e na vida adulta, e isso depende da estrutura, vivncia e intensidade das agresses
sofridas, sendo muito provvel que necessitem de apoio psicolgico e/ou psiquitrico
para superar seus traumas.3
A superao do trauma depende do comportamento hbil de cada vtima para lidar
com as situaes.
De acordo com estudos, possvel notar que grande parte das vtimas de bullying
posteriormente desenvolvem um quadro depressivo, em virtude da perda da auto
estima. Muitas dessas vtimas, quando no tratadas, chegam a casos extremos de
suicdio.
3 CNJ. Bullying - Projeto Justia nas Escolas. Cartilha 2010, p. 9.
31
3. O PAPEL SOCIAL DA FAMLIA E DA ESCOLA NA EDUCAO DAS CRIANAS E ADOLESCENTES
3.1. O DIREITO E AS MUDANAS SOCIAIS
notrio que atualmente nos deparamos com uma sociedade complexa, cuja
cultura e valores sofrem constantes mutaes.
Tais mudanas ocorridas no mbito scio-econmico, poltico, juntamente com o
processo de globalizao, trouxeram grandes reflexos sobre a estrutura da famlia
brasileira.
Diante de tais circunstncias, o Cdigo Civil Brasileiro de 2002 introduziu alteraes
relevantes para o Direito de Famlia, que deixou de ser patriarcal, patrimonialista e
individualista, para ser regida pelos princpios da sociabilidade, eticidade e
operabilidade.
Modificaes como a considerao de unies estveis como entidades familiares,
facilitao de dissoluo conjugal envolvem, sim, um grande avano social, no
entanto, acabaram por banalizar o conceito de famlia.
Os avanos sociais e polticos da globalizao e do processo legislativo perante o
novo conceito de famlia trouxeram uma mudana na estrutura familiar e em seus
valores, fazendo surgir uma tolerncia que, na verdade, no devia existir, como por
exemplo, a ausncia dos pais na vida dos filhos, tanto social, familiar e escolar.
O estresse, a falta de tempo dos pais na vida moderna, geraram a falta de
dedicao na efetiva educao dos filhos, fazendo com que deleguem escola a
obrigao que, na verdade, incumbida a eles, de educar e estruturar suas
crianas.
32
Alm disso, crianas esto cercadas de meios tecnolgicos que no so influncias
seguras para a educao e formao de um cidado ntegro, tico e que sabe
conviver socialmente nos diversos ambientes que se pode deparar.
O mundo capitalista possibilita a inverso de valores, sendo que o afeto, o dilogo, o
carinho, o amor esto sendo trocados por trabalho, falta de tempo, celular,
computadores e dinheiro.
A tarefa dos pais de educar est sendo transferida para a escola, que deve contribuir
para formar cidados, principalmente no processo de aprendizagem, mas esta no
pode se incumbir de um nus que no lhe cabe ou arcar com responsabilidades que
no so totalmente suas.
Esse o posicionamento de GONDIM:
A noo de famlia tem sido mudada a partir da crise da famlia clssica com o
aumento do divrcio e do trabalho assalariado das mulheres e com o crescimento da
coabitao (GONDIM apud SINGLY 2000, p.31).
Ante essas transformaes sociais, a famlia no precisa deixar de trabalhar e o
direito precisa evoluir, conforme as necessidades sociais, mas os pais/ responsveis
precisam organizar o seu tempo de forma que possibilite a participao efetiva na
vida de seus filhos, dialogando com os mesmos, pois a educao dos filhos, muitas
vezes, tambm um reflexo do que eles veem e vivem dentro de casa.
Portanto, diante dessas mudanas que se v atualmente, necessrio se faz analisar
o papel efetivo da famlia, na figura dos pais e tambm o papel da escola para que,
assim, possa ser atribuda eventual responsabilidade nos casos de bullying queles
que realmente tm o dever de arcar com tal incumbncia.
33
3.2. O PAPEL DA FAMLIA Como se sabe, a famlia tem o papel primordial na educao e formao das
crianas e adolescentes. Ela a base da cultura e da sociedade futura, pois uma
boa educao familiar servir de apoio ao comportamento da criana quando esta
estiver na fase adulta.
A famlia o primeiro contato do ser humano com o meio social e ela que propicia
laos afetivos, cuidados e bem estar.
Por meio dela o indivduo aprende a conviver de forma coletiva, aprende
comportamentos, sendo o incio da formao do carter e da personalidade da
criana.
Ela uma instituio social bsica, de acordo com GONDIM (2011 apud SILVA
1987, p.457):
Famlia uma instituio social bsica, que aparece sob as formas mais diversas em todas as sociedades humanas. D-se o nome de famlia a um grupo caracterizado pela residncia em comum e pelo convvio de pais e filhos, isolados dos demais parentes. Dentre suas diversas funes as mais importantes parecem ser a reproduo da espcie, a criao e a socializao dos filhos, a transmisso essencial do patrimnio cultural.
4
O que deve ser destacado deste conceito a funo da famlia na criao e
socializao dos filhos.
O bullying, como dito, um ato agressivo que possibilita a todos verem a falta de
socializao do indivduo, a dificuldade em aceitar as diferenas e ao outro.
4 Silva, Benedicto de org. Dicionrio de cincias sociais. Fundao Getlio Vargas, 1987, p.457.
Retirado do site: www.adventista.edu.br Acesso em 12 de junho de 2011.
http://www.adventista.edu.br/34
Releva-se, portanto, neste ponto a importncia da funo da famlia na criao,
formao e socializao dos filhos.
Uma boa base familiar proporciona a qualquer pessoa condies de respeitar o
outro, a se sensibilizar com atitudes agressivas, a utilizar os direitos que possui at o
limite de no atingir o direito alheio.
Logicamente a escola contribui para a formao do cidado, podendo influenciar
suas opinies, ponto de vista, crescimento de aprendizagem, mas o carter se forma
em casa, no seio familiar, no devendo atribuir tal maneira de ser e de conviver
escola.
Para comprovar tal entendimento, est o artigo 19 do Estatuto da Criana e do
Adolescente5, que dispe:
Art. 19. Toda criana ou adolescente tem direito de ser criado e educado no seio da sua famlia.
Se o dispositivo estabelece o direito criana de viver e ser educado com a famlia,
de se destacar que os pais ou responsveis so os principais educadores de seus
filhos, e, portanto, existe uma relao natural entre pais e educao.
Os pais so responsveis por encaminhar os filhos e apresentar-lhes as virtudes de
que devem ser providos.
A famlia o local que dever ser cercado de afeto, de laos, de amor que propicia
um ambiente saudvel para que a educao dos filhos se desenvolva. Ela
essencial para a formao da pessoa, devendo haver ponderao dos pais para que
transmitam laos afetivos, mas que tal educao seja realizada de forma moderada,
com limites, respeito.
5 Lei n 8.069 de 13 de julho de 1990.
35
Alis, o limite algo que se relaciona muito com o bullying, pois o mundo se
preocupa mais com o ter e no com o ser e os filhos, muitas vezes, querem ter
tudo e os pais, ao invs de impor certos limites, deixam- os livres.
Quando uma pessoa sabe o seu limite, ela entende que nem sempre pode fazer
tudo o que deseja e que precisa respeitar seus semelhantes.
Ao cometer uma conduta agressiva como o bullying, o indivduo no consegue
diferenciar os limites das brincadeiras, agresses verbais, maus tratos e induzem os
outros a acharem que tais atitudes so normais.
Tal dificuldade decorre da impossibilidade dos pais de delimitar o que os filhos
podem ou no fazer, e a renncia dos pais na educao dos filhos causa
consequncias como crianas egocntricas, sem noo de limites, que no so
capazes de enfrentar os obstculos e desafios da vida.
Muitos pais tm esquecido seu papel de educar de forma efetiva e, diante da falta de
tempo em razo do trabalho, deixam os filhos fazerem tudo o que querem e fingem
que nada ocorreu para tentar compensar sua ausncia na vida familiar, tolerando
qualquer conduta, at as intolerveis. O novo papel assumido pelos pais na
atualidade, infelizmente, ser um ponto de referncia material e financeiro para os
filhos, deixando o afeto e os valores de lado.
O que mais se v nos ambientes so crianas mal educadas, querendo passar por
cima dos pais, filhos que fazem birra, choram, at batem nos pais e estes no fazem
nada. Para compensar o choro, do bens materiais aos filhos, como se isso fosse
soluo para o problema e muitos no educam, no corrigem e nem lutam para
melhorar o ser que est no mundo, pois quem ama deveria fazer tudo isso.
O que a sociedade proporciona aos cidados pode ser bom ou ruim, mas no ela
que transmite determinados valores que s a famlia consegue dar.
36
A educao, os laos afetivos, os costumes transmitidos pela famlia, influenciam a
conduta, o comportamento da pessoa em qualquer local que ela esteja, com ou sem
a presena familiar.
Na escola ocorre da mesma forma, pois nela o aluno reflete os costumes e hbitos
que aprendeu e vivenciou em casa e, por isso, que o acompanhamento dos pais e
o convvio familiar, de forma efetiva, so indispensveis para que o aluno consiga
conviver no ambiente escolar sem causar problemas, pois o que se aprende em
casa e se absorve, ainda que o cidado seja influenciado, ele no esquece,
conseguindo, assim, conviver com o meio social sem maiores problemas.
3.3. O PAPEL DA ESCOLA
A escola tem um papel muito importante que o de formar cidados, transmitir
conhecimento que eles necessitam para viver e trabalhar nesse mundo de evoluo
e tecnologia, alm de orient-los para a vida.
ela que vai capacitar e dar condies ao aluno para ele ser inserido no meio
social, educando-o para que aprenda sobre cultura, poltica, preparando-o para o
trabalho, os negcios e para a vida.
A escola deveria auxiliar aos pais no desenvolvimento saudvel da criana mental e
emocionalmente, mas no deve se incumbir da responsabilidade total em educar e
formar o carter, pois isso deve ser sempre um trabalho em conjunto.
O aluno no vai at a escola para aprender como ser educado, como se comportar
em vrios ambientes, como respeitar os outros, pois tais valores vem de casa, e,
ainda que haja uma contribuio do ambiente escolar, tal atribuio dos pais,
sendo que o principal objetivo dos alunos irem aula o de aprender contedos,
que so de grande importncia para formar cidados e pessoas aptas aos desafios
da vida.
37
De acordo com os Parmetros Nacionais Curriculares, do Ministrio da Educao
(2001, p. 45), os contedos so importantes, porque revela um compromisso da
instituio escolar em garantir o acesso aos saberes elaborados socialmente que
possibilitem o desenvolvimento, a socializao, o exerccio da cidadania
democrtica, as diversas crenas e possibilitar o conhecimento efetivo das matrias,
a fim de contribuir com sua formao e sua insero no mercado de trabalho. A
escola deve ser um espao de formao e informao, em que a aprendizagem de
contedos o principal objetivo, devendo ser favorecida a insero do aluno no dia-
a-dia das questes sociais que mais marcam e no universo de cultura nacional e
universal. A formao escolar deve propiciar o desenvolvimento de capacidades, de
modo a favorecer a compreenso e a interveno dos fenmenos culturais e sociais.
Na escola, os alunos tero acesso realidade social, poltica e cultural para que
sejam cidados democrticos, para que saibam exercer seus direitos e deveres e
tenham opinies crticas, identifiquem suas habilidades e, como consequncias de
tais contedos estabelecidos, sejam educados de modo a respeitarem os limites dos
outros, a perceber as diferenas sociais, culturais, religiosas, pois logicamente que,
se o ensino for efetivo e se tudo isso for absorvido pelo aluno, certamente ele se
tornar um cidado de respeito aos demais.
Alm disso, tambm papel da escola socializar o aluno que, entrando em contato
com o outro, aprender a conviver com aquilo que lhe diferente.
A escola deve formar alunos para dominar os contedos e tem sim um dever muito
mais amplo do que este, consistente na transmisso de uma viso sobre o mundo,
sobre as cincias e tambm contribui para uma preparao do aluno para o convvio
com outros humanos, ensinando-o os limites sociais, o direito, as regras de
convivncia, o princpio da hierarquia.
Diante desse dever amplo que se preza atualmente, tambm deve ser analisado que
a escola deve prezar pela educao ou formao dos alunos, porm tais
responsabilidades sobre o aluno no podem ser atribudas totalmente a ela, pois
38
educar uma pessoa que j vem educada de casa torna-se uma tarefa muito difcil, j
que carrega consigo certos conhecimentos, comportamentos, condutas que j
adquiriu junto famlia e ao meio em que vive.
A escola responsvel, portanto, por parte da educao, responsvel por dar
continuidade quilo que os pais comearam em casa nos primeiros anos de vida da
criana, devendo favorecer a formao de cidados conscientes, atuantes,
pensantes e quando esses aprendem a criticar, a enxergar claramente a realidade,
conseguem pensar em um nvel mais abrangente, elevado, capaz de identificar as
diferenas que esto ao seu redor.
39
4. O BULLYING E A LEGISLAO ATUAL
4.1. OS DIREITOS DA CRIANA E DO ADOLESCENTE: PROTEO VTIMA
Atualmente, no encontramos em nosso ordenamento jurdico legislao especfica
para o bullying, devendo a vtima recorrer a vrios dispositivos que esto esparsos
para tentar adequ-los ao caso concreto. Deste modo, devem ser citadas algumas
legislaes que garantem, ainda que de forma dificultosa, a proteo vtima diante
de tal prtica sofrida.
4.1.1. Constituio Federal
Como visto, o bullying no apenas qualquer agresso e nem uma simples
brincadeira ou um comportamento normal de uma criana.
Tal conduta um problema srio que pode afetar a habilidade da vtima, o progresso
acadmico e social dela, podendo ser classificado como agresso fsica, moral e,
alm disso, fere um direito fundamental previsto na Constituio Federal, que o
princpio da dignidade da pessoa humana.
O artigo 5 da Constituio Federal dispe o seguinte:
Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes: (...) II - ningum ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa seno em virtude de lei; III - ningum ser submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; (...) X - so inviolveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenizao pelo dano material ou moral decorrente de sua violao; (...)
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XV - livre a locomoo no territrio nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens; (...) XX - ningum poder ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; (...) XLI - a lei punir qualquer discriminao atentatria dos direitos e liberdades fundamentais; XLII - a prtica do racismo constitui crime inafianvel e imprescritvel, sujeito pena de recluso, nos termos da lei;
Os direitos do cidado so constitucionalmente garantidos por meio de clusulas
ptreas que, quando violadas, no deixam outra alternativa vtima a no ser a
reclamao de seus direitos.
O dispositivo supracitado uma das nicas garantias das vtimas de bullying que
veem seu sossego ser invadido por violncia e agresso.
4.1.2. Estatuto da Criana e do Adolescente - Lei n 8.069/1990.
Tambm possvel citar alguns artigos esparsos do Estatuto da Criana e do
Adolescente como uma tmida legislao que poderia ser invocada como defesa em
aes de bullying.
Como dito, a legislao no especfica a este tipo de caso, no entanto, possvel
tentar traz-la tona, uma vez que prev uma proteo aos direitos da vtima.
Vejamos:
Art. 5. Nenhuma criana ou adolescente ser objeto de qualquer forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso, punido na forma da lei qualquer atentado, por ao ou omisso, aos seus direitos fundamentais.
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade fsica, psquica e moral da criana e do adolescente, abrangendo a preservao da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idias e crenas, dos espaos e objetos pessoais.
41
Art. 18. dever de todos velar pela dignidade da criana e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatrio ou constrangedor.
Art. 53. A criana e o adolescente tm direito educao, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exerccio da cidadania(...)
A dificuldade que se tem com essas leis o fato de que possvel identificar a
proibio de determinada conduta, no entanto, no h previso alguma sobre o que
h de acontecer nos casos em que a conduta proibida violada.
O agressor pode at saber que a conduta proibida, mas no h sano prevista
para o caso de desrespeito.
4.1.3. Outras legislaes
Pode-se identificar ainda outras legislaes que procuram, de alguma forma,
proteger o interesse e bom desenvolvimento da criana contra atos agressivos.
Necessitam, porm, de melhor especificao em casos de violao ao direito
protegido.
Como uma dessas legislaes, podemos citar a Declarao Universal dos Direitos
da Criana, a qual estabelece o seguinte:
Princpio 10: A criana gozar proteo contra atos que possam suscitar discriminao racial, religiosa ou de qualquer outra natureza. Criar-se- num ambiente de compreenso, de tolerncia, de amizade entre os povos, de paz e de fraternidade universal e em plena conscincia que seu esforo e aptido devem ser postos a servio de seus semelhantes."
A lei, no entanto, sequer menciona que tipo de proteo gozar a criana,
mostrando, assim, uma lacuna ainda maior quando evocada para amparar direitos
violados.
42
4.2. RESPONSABILIDADE CIVIL: BULLYING E O DEVER DE INDENIZAR A VTIMA
O bullying ainda pode gerar danos de natureza moral e material (patrimonial), e,
alm de causar consequncias imediatas, pode gerar danos futuros que podem
refletir na vida adulta de uma criana.
A proibio dessa prtica resguarda os direitos personalssimos, constitucionalmente
assegurados, e, quando so violados, possibilita vtima o direito de valer-se do
Poder Judicirio, pleiteando a indenizao devida.
4.2.1. A responsabilidade atribuda Instituio de Ensino
Embora a legislao ainda no tenha se firmado quanto s decises neste sentido,
Tribunais tm procurado se posicionar, atribuindo a responsabilidade nesses casos
instituio de ensino, quando os atos de bullying so praticados dentro do
estabelecimento.
Nesse sentido o entendimento jurisprudencial:
ABALOS PSICOLGICOS DECORRENTES DE VIOLNCIA ESCOLAR - BULLYING - OFENSA AO PRINCPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA. SENTENA REFORMADA. CONDENAO DO COLGIO. VALOR MDICO ATENDENDO-SE S PECULIARIDADES DO CASO. Na espcie, restou demonstrado nos autos que o recorrente sofreu agresses fsicas e verbais de alguns colegas de turma que iam muito alm de pequenos atritos entre crianas daquela idade, no interior do estabelecimento do ru, durante todo o ano letivo de 2005. certo que tais agresses, por si s, configuram dano moral cuja responsabilidade de indenizao seria do Colgio em razo de sua responsabilidade objetiva. Com efeito, o Colgio ru tomou algumas medidas na tentativa de contornar a situao, contudo, tais providncias foram incuas para solucionar o problema, tendo em vista que as agresses se perpetuaram pelo ano letivo. Talvez porque o estabelecimento de ensino apelado no atentou para o papel da escola como instrumento de incluso social, sobretudo no caso de crianas tidas como diferentes. Nesse ponto, vale registrar que o ingresso no mundo adulto requer a apropriao de conhecimentos socialmente produzidos. A interiorizao de tais conhecimentos e experincias vividas se processa, primeiro, no interior da famlia e do grupo em que este indivduo se insere, e, depois, em instituies como a escola. No dizer de Helder Baruffi, Neste processo de socializao ou de insero do indivduo na sociedade, a educao tem
43
papel estratgico, principalmente na construo da cidadania. (TJDFT - 20060310083312APC, Relator WALDIR LENCIO LOPES JNIOR, 2 Turma Cvel, julgado em 09/07/2008, DJ 25/08/2008 p. 70)
Nesse julgado do TJDF, foi configurado dano moral, tendo em vista a
responsabilidade objetiva do Colgio, por no se atentar para o papel da escola
como meio de incluso social, na construo da cidadania.
Assim, foi surpreendentemente evocado na referida deciso, o artigo 14 do Cdigo
de defesa do Consumidor, baseada no fato de haver defeito na prestao do
servio, na qual deve o fornecedor (escola) responder independente de culpa pela
reparao dos danos causados aos consumidores, incumbindo escola o dever de
tomar medidas efetivas para impedir o bullying.
De igual modo, o entendimento do TJRJ:
PROCESSUAL CIVIL. AO INDENIZATRIA. VIOLENCIA ESCOLAR. BULLYNG. ESTABELECIMENTO DE ENSINO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA PRESTAO DO SERVIO. DANO MORAL CONFIGURADO. DESPROVIMENTO DOS RECURSOS. I Palavra inglesa que significa usar o poder ou fora para intimidar, excluir, implicar, humilhar, Bullying um termo utilizado para descrever atos de violncia fsica ou psicolgica, intencionais e repetidos; II Os fatos relatados e provados fogem da normalidade e no podem ser tratados como simples desentendimentos entre alunos. III Trata-se de relao de consumo e a responsabilidade da r, como prestadora de servios educacionais objetiva, bastando a simples comprovao do nexo causal e do dano; IV Recursos agravo retido e apelao aos quais se nega provimento. (TJRJ 0003372-37.2005.8.19.0208 apelao, Des. Ademir Pimentel Julgamento: 02/02/2011 Dcima Terceira Cmara Cvel).
Em relao responsabilidade do estabelecimento privado de ensino, o entendimento de JUNIOR (2009, p.13) no seguinte sentido:
Sabe-se que a responsabilidade do estabelecimento privado de ensino, aps a vigncia do Cdigo de Defesa do Consumidor, no se apresenta mais como responsabilidade indireta do educando, mas sim, como responsabilidade objetiva direta, com esteio no artigo 14, do CDC. O dever do fornecedor (colgio) de prestar servios seguros a seus consumidores (alunos) funda-se no fato do servio o no no fato do preposto ou de outrem, como outrora era entendido. Desse modo, para se aferir a responsabilidade pelos danos sofridos pelo autor, faz-se premente apenas a verificao da existncia de conduta, seja ela comissiva ou omissiva, do
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nexo causal e do dano alegado, sem se perquirir sobre qualquer elemento subjetivo.
Quanto ao nexo causal entre a conduta do responsvel pelo defeito do servio e o
dano sofrido pelo aluno, embora a jurisprudncia no tenha pacificado sobre a
necessidade ou no de provas para comprovao do abalo psquico, para que a
vtima seja indenizada por danos morais e materiais, a maioria da doutrina entende
que a responsabilidade no caso de bullying objetiva6, ou seja, d-se
independentemente de culpa.
Deste modo, o representante do aluno no precisar demonstrar nenhuma prova
mais elaborada sobre o ocorrido, pois o nus da prova cabe ao estabelecimento de
ensino e ao consumidor cabe apenas apresentar em juzo documentos e provas
essenciais para a propositura da ao, como o laudo mdico sobre a afetao
psquica da vtima, por exemplo.
Vale ainda mencionar que, no caso do estabelecimento de ensino, importante que
se comprove a culpa para eventual ao de regresso do Estado em face de seu
agente, se este for o responsvel pelo dano.
A respeito da necessidade de prova, esto os diferentes entendimentos
jurisprudenciais:
ABALOS PSICOLGICOS DECORRENTES DE VIOLNCIA ESCOLAR - BULLYING - OFENSA AO PRINCPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA. SENTENA REFORMADA. CONDENAO DO COLGIO. VALOR MDICO ATENDENDO-SE S PECULIARIDADES DO CASO. Na espcie, restou demonstrado nos autos que o recorrente sofreu agresses fsicas e verbais de alguns colegas de turma que iam muito alm de pequenos atritos entre crianas daquela idade, no interior do estabelecimento do ru, durante todo o ano letivo de 2005. certo que tais agresses, por si s, configuram dano moral cuja responsabilidade de indenizao seria do Colgio em razo de sua responsabilidade objetiva. Com efeito, o Colgio ru tomou algumas medidas na tentativa de contornar a situao,
6 Art. 927, Pargrafo nico, CC. Haver obrigao de reparar o dano, independentemente de culpa,
nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
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contudo, tais providncias foram incuas para solucionar o problema, tendo em vista que as agresses se perpetuaram pelo ano letivo. Talvez porque o estabelecimento de ensino apelado no atentou para o papel da escola como instrumento de incluso social, sobretudo no caso de crianas tidas como diferentes. Nesse ponto, vale registrar que o ingresso no mundo adulto requer a apropriao de conhecimentos socialmente produzidos. A interiorizao de tais conhecimentos e experincias vividas se processa, primeiro, no interior da famlia e do grupo em que este indivduo se insere, e, depois, em instituies como a escola. No dizer de Helder Baruffi, Neste processo de socializao ou de insero do indivduo na sociedade, a educao tem papel estratgico, principalmente na construo da cidadania. (grifo nosso) (TJDFT - 20060310083312APC, Relator WALDIR LENCIO LOPES JNIOR, 2 Turma Cvel, julgado em 09/07/2008, DJ 25/08/2008 p. 70)
Agravo de instrumento contra ato do juiz que indeferiu a produo de prova pericial em vtima de assdio moral e bullying, sob o fundamento de que a mesma seria desnecessria ao deslinde do feito. Rejeio da preliminar arguida pelo agravado, vez que o descumprimento da norma do artigo 526
do Cdigo de Processo Civil, no lhes ocasionou prejuzo. Necessidade de realizao da prova pericial psicolgica e estudo social por perito de confiana do juzo tendo em vista a natureza da lide. Deciso monocrtica, com fulcro no artigo 557, 1, do Cdigo de Processo Civil, dando provimento ao recurso. (grifo nosso) (TJRJ. 15 C. AC 200800234646. Rel. Celso Ferreira Filho. J 02.12.2008. DJ 09.12.2008).
Embora a jurisprudncia seja divergente, seria prudente que toda ao de
indenizao por bullying fosse instruda com documentos mdicos, laudos
psicolgicos, cartas, bilhetes, testemunhas que presenciaram as agresses,
fotografias, etc, comprovando a ofensa dignidade e a afetao psquica da vtima,
pois o valor da indenizao ser fixado pelo juiz de acordo com tais provas.
A excludente de responsabilidade da escola pode ser observada apenas nos casos
do artigo 14, 3 do Cdigo de Defesa do Consumidor:
Art. 14, 3. "O fornecedor de servios s no ser responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o servio, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro."
Uma hiptese verificada que exclui a responsabilidade do fornecedor a
comprovao da inexistncia de defeito na prestao de servio. Nos casos de
bullying, caso o estabelecimento queira se beneficiar dessa excludente, ele dever
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comprovar que poca do incidente ele ofereceu ao consumidor a segurana que
era esperada, que a segunda hiptese.
Para ilustrar esse fato, segue abaixo o julgamento da 2 Cmara Cvel do Tribunal
de Justia do Estado do Rio de Janeiro:
RELAO DE CONSUMO. Estabelecimento de ensino. Prestao de servio de tutela de menor. Alegao de abalos psicolgicos decorrentes de violncia escolar. Prtica de bullying. Ausncia de comprovao do cometimento de agresses no interior do estabelecimento escolar. Adoo das providncias adequadas por parte do fornecedor. Observncia do dever de guarda. Falha na prestao do servio no configurada. Fatos constitutivos do direito da autora indemonstrados. Manuteno da sentena. Recurso desprovido. (TJRJ 00152397120078190203 apelao, Des. Carlos E. Passos - Julgamento: 28/07/2010 - Segunda Cmara Cvel)
A outra possibilidade de excludente de responsabilidade do estabelecimento de
ensino seria a comprovao da culpa exclusiva da vtima, fato esse que ficou
demonstrado numa ao de dano moral julgada pela 6 Cmara Cvel do Tribunal de
Justia de So Paulo:
Dano moral. Pedido fundado na alegao de que os rus teriam injuriado a autora e a agredido fisicamente. Ausncia de prova concreta a esse respeito. Documento subscrito pela diretora do estabelecimento de ensino que sugere haver sido a autora quem iniciou o entrevero. No caracterizao da responsabilidade do instituto de ensino, porquanto agiu de forma diligente quando do desentendimento entre seus alunos. No
configurao de dano moral. Apelo desprovido. (TJSP. 6 Cmara de Direito Privado. AC 0088276-66.2007.8.26.0000. Rel. Sebastio Carlos Garcia. J 10.06.2010. DJ 25.06.2010).
Sobre a condenao da Escola, h outro entendimento encontrado e, neste caso, de
escola pblica:
RESPONSABILIDADE DO ESTADO. O Municpio responsvel por danos sofridos por aluno, decorrentes de mau comportamento de outro aluno, durante o perodo de aulas de escola municipal. O descaso com que atendido o autor quando procurou receber tratamento para sua filha se constitui em dano moral que deve ser indenizado. (TJSP Ap. 0150021-47.2007.8.26.0000 Rel. Des. Barreto Fonseca Julg. em 11-8-2008 7 Cmara de Direito Pblico)
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No caso em tela, de acordo com o relator, o Municpio responsvel pelos danos
sofridos, mesmo sem necessidade de invocao da responsabilidade objetiva do
Estado ( 6 do artigo 37 da Constituio Federal)7, devendo ele responder pelo
dano, tendo em vista o descaso dos servidores pblicos de dar atendimento
adequado criana. Alm disso, ressaltou-se o artigo 932, inciso IV, do Cdigo Civil:
Art. 932. So tambm responsveis pela reparao civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; [...] IV - os donos de hotis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educao, pelos seus hspedes, moradores e educandos; [...].
Vale ainda mencionar o artigo 933, do Cdigo Civil: Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que no haja culpa de sua parte, respondero pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
Nesse sentido, tambm se pronuncia JUNIOR (2009, p.14):
Durante o perodo em que o aluno se encontra sob os cuidados da escola e dos educadores ocorre um hiato no efetivo exerccio da guarda por parte dos pais, at porque, durante esse tempo, o prprio acesso dos pais ao interior da escola no permitido com naturalidade e de bom grado. Dessa forma, os atos praticados pelos alunos dos quais venha a resultar danos a outrem ou, at mesmo, a outros alunos, resulta na responsabilidade indenizatria da prpria escola.
Alm disso, a jurisprudncia vai alm, responsabilizando tambm professores por
agresses sofridas por aluno que estava sob seus cuidados, demonstrando tambm
o no cabimento da ao de regresso entre instituio de ensino e pais do agressor,
como se analisa no julgado da 10 Cmara Cvel no Tribunal do Estado do Rio
Grande do Sul:
7 Art. 37. A administrao pblica direta e indireta de qualquer dos Poderes da Unio, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municpios obedecer aos princpios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficincia e, tambm, ao seguinte: 6 - As pessoas jurdicas de direito pblico e as de direito privado prestadoras de servios pblicos respondero pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsvel nos casos de dolo ou culpa.
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Apelao civil. Responsabilidade civil. Responsabilidade do estabelecimento do ensino. Agresso entre menores. Falta de cuidado da educadora e da escola. Agravo retido. Denunciao da lide. Tratando de responsabilidade fundada no artigo 932, inciso IV, do cdigo civil, no procede a denunciao da lide, haja vista a inexistncia de direito de regresso do estabelecimento de ensino contra os pais do causador do dano. Ilegitimidade passiva da professora. Sendo a educadora responsvel pela vigilncia aos menores que se envolveram na agresso, tem legitimidade para responder por danos decorrentes do evento. Tendo a educadora e a escola faltada com o cuidado necessrio na guarda dos alunos da turma maternal, cujos antecedentes indicavam a presena de um aluno com histrico de brigas, devem responder pelos danos causados pela agresso (e no agressividade) verificada. Dano moral puro. [...] Apelaes providas, em parte. Agravo retido desprovido. Deciso unnime. (TJRS. 10 Cmara Cvel. AC 70024551392. Rel. Jorge Alberto Schreiner Pestana. Julgamento: 28.05.2009. Dirio da Justia: 23.07.2009).
Como demonstrado, a jurisprudncia atribui a responsabilidade de reparar o dano
instituio de ensino, justificando tal entendimento na relao de consumo e na
responsabilidade objetiva da escola de zelar, guardar pelos alunos, enquanto esses
esto sob sua responsabilidade.
4.2.2. Da responsabilidade do agressor (menor) e dos pais A responsabilidade civil ocorre quando uma pessoa atua ilicitamente, de forma
contrria ao ordenamento jurdico e causa dano a outrem, ficando subordinado ao
dever de repar-lo, salvo se conseguir meios de provas de modo a ficar isento de tal
encargo. Deste modo, prescreve o artigo 927, do Cdigo Civil:
Art. 927."Aquele que, por ato ilcito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repar-lo" De acordo com tal artigo, no h dvidas a respeito do dever de indenizar que
deveria recair sobre o agressor, nos casos de bullying, j que preciso que o ato
(agresso, assdio) tenha ao humana e que seja praticada pelo prprio agente.
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Ocorre que, geralmente, o agente agressor um menor, devendo incidir ento a
responsabilidade de reparao civil sobre seus responsveis legais, conforme
dispe o artigo 932, do Cdigo Civil:
Art. 932. So tambm responsveis pela reparao civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condies;
Assim, todos os elencados no artigo respondem pelas atitudes do menor, ainda que
no tenham culpa de sua parte8. Neste caso, o terceiro que representa os filhos tem
a chamada culpa in vigilando, ou seja, aquela que decorre da falta de vigilncia,
fiscalizao da conduta daqueles a quem so responsveis. Alm disso, vale ainda
ressaltar que no cabe ao de regresso dos pais ou responsveis contra o menor 9.
A respeito do assunto, CALHAU (apud TARTUCE, 2009, p.353-354) aduz que:
...no caso dos pais, no podero alegar que os filhos praticavam atos de bullying, gerando dano, contra terceiros e nada sabiam, pois h o dever de supervisionar os filhos. Os pais devem orientar os filhos para que no sejam vtimas e, tambm, para no se tornarem nunca agressores. Havendo dano causado pelos filhos menores, por atos de bullying, o caso dos pais indenizarem a vtima.
A respeito da responsabilidade dos pais, tutores e curadores, o artigo 92810, do
Cdigo Civil bem claro ao dispor que a responsabilidade do incapaz vem em
segundo plano, de forma subsidiria, pois este s responder pelos prejuzos que
8 Artigo 933, do Cdigo Civil: As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda
que no haja culpa de sua parte, respondero pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
9 Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele
por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.
10 Art.928. O incapaz responde pelos prejuzos que causar, se as pessoas por ele responsveis no tiverem obrigao de faz-lo ou no dispuserem de meios suficientes. Pargrafo nico: A indenizao prevista neste artigo, que dever ser equitativa, no ter lugar se privar do necessrio o incapaz ou as pessoas que dele dependem.
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causar se os responsveis do art. 932, I e II, CC no tiverem obrigao de faz-lo ou
no dispuserem de meios suficientes para isso.
Segundo ULHOA (2010, p. 387-389), em primeiro lugar deve ser exigida a
indenizao em face dos responsveis pelos menores que promovem o dano.
Porm, na hiptese de no existirem as duas condies em questo, seria o caso do
patrimnio do prprio incapaz responder pela indenizao.
Sobre tal assunto, STOCO (2009, p. 243) tambm se pronuncia:
Se o agente que praticou a ao ou omisso causadora do dano for menor de 16 anos de idade, ser considerado absolutamente incapaz ou inimputvel (CC, art. 3, I), sendo certo, contudo, que, nos termos do art. 928 do CC, responder pelos prejuzos que causar, se as pessoas por ele responsveis no tiverem obrigao de faz-lo ou no dispuserem de meios suficientes. [...] O novo Cdigo Civil, rompendo com o sistema anterior, estabeleceu a responsabilidade subsidiria ou secundria do incapaz, pois responsveis imediatos pela reparao sero os pais, tutores e curadores.
Sendo assim, h o entendimento de acordo com esse artigo de que os pais so os
responsveis pelos atos ilcitos dos filhos, pois o poder familiar estabelece que estes
devem orientar e disciplinar as atitudes do incapaz, para que se evite esse tipo de
comportamento.11
Sobre o pargrafo do artigo 928, do CC, que trata da quantia indenizatria, explica o
enunciado n 39 do Caderno Especial Jurdico:
ENUNCIADO: a impossibilidade de privao do necessrio pessoa, prevista neste artigo, traduz um dever de indenizao equitativa informado pelo principio constitucional da proteo dignidade da pessoa humana. Em conseqncia, h de ser interpretado extensivamente, servindo de parmetro normativo para o sistema de responsabilidade civil. Como conseqncia, tambm os pais, tutores e curadores sero beneficiados pelo limite humanitrio do dever de indenizar, de modo que a passagem ao patrimnio do incapaz se dar no quando esgotados todos os recursos do
11
Art. 1.630. Os filhos esto sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.
Art. 1.634. Compete aos pais, quanto pessoa dos filhos menores: I - dirigir-lhes a criao e educao; II - t-los em sua companhia e guarda; (...) VII - exigir que lhes prestem obedincia, respeito e os servios prprios de sua idade e condio.
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responsvel, mas quando reduzimos este ao montante necessrio manuteno de sua dignidade. (NEGRO, 2003, p.167)
O que deve ser analisado que, embora o dispositivo citado acima esteja
aparentemente de fcil interpretao, para muitos, entra em contradio com o
artigo 94212, do mesmo cdigo, que trata da responsabilidade patrimonial, de modo
que os bens do menor que praticou o bullying, respondem pela reparao do dano
acarretado ao ofendido.
Em princpio, a responsabilidade individual, mas h casos de responsabilidade
indireta, em que a pessoa responde por ato de terceiro (art. 932, incisos I a V),
aplicando, assim, o princpio da solidariedade, pelo qual tanto o agente que pratica a
conduta ilcita como o seu responsvel ficam obrigados pela reparao integral do
dano.
O mesmo princpio da solidariedade aplica-se diante do concurso de agentes na
prtica do ilcito, ou seja, quando duas ou mais pessoas violam direito alheio e
causam-lhe dano. (GONALVES, 1984, p.165).
No caso desse artigo, ao contrrio do artigo 928, do CC, que trata da
responsabilidade subsidiria trabalha-se com a responsabilidade solidria, de forma
que o menor, responsvel pela ofensa ou violao do direito de outrem (bully),
responde juntamente com os pais. Alm disso, quando as agresses so cometidas
por mais de um menor, devem todos os envolvidos responderem pela reparao,
englobando, inclusive, as pessoas designadas no art. 932 (pais, tutores e
curadores).
12
Art. 942. Os bens do responsvel pela ofensa ou violao do direito de outrem ficam sujeitos reparao do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos respondero solidariamente pela reparao. Pargrafo nico. So solidariamente responsveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932.
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Diante do que foi exposto acima, a dvida que se mostra , se ao causar dano a
outrem, primeiramente a responsabilidade dos pais, como no artigo 928, de forma
subsidiria, ou do menor juntamente com os pais, de forma solidria, como
estabelece o artigo 942, do CC.
Para esclarecer tal impasse, Theotonio Negro expe em seu livro os enunciados da
Jornada de Direito Civil, ocorrida em setembro de 2002:
Enunciado n 40 do CEJ (Caderno Especial Jurdico): O incapaz responde pelos prejuzos que causar de maneira subsidiria ou excepcionalmente, como devedor principal, na hiptese do ressarcimento devido pelos adolescentes que praticarem atos infracionais, nos termos do art. 116, do Estatuto da Criana e do Adolescente, no mbito das medidas scio-educativas ali previstas. (NEGRO, 2003, p.167).
Enunciado n 41 do CEJ (Caderno Especial Jurdico): A nica hiptese que poder haver responsabilidade solidria do menor de 18 anos com seus pais ter sido emancipado nos termos do art. 5, pargrafo nico, inc. I, do novo Cdigo Civil (NEGRO, 2003, p. 167).
Assim, em regra, os pais so responsveis pelos danos causados pelo menor,
sendo a exceo quando o juiz determinar que o adolescente restitua a coisa,
promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuzo da
vtima, nos termos do artigo 116, do ECA. Alm disso, o menor responde,
excepcionalmente, de forma solidria com os pais, quando for emancipado.13
Embora haja a previso legal sobre a responsabilidade dos pais pelos filhos como
explicado anteriormente, as decises dos Tribunais esto sendo tomadas no sentido
de que s deve haver este dever dos pais quando o dano ou o bullying ocorrer fora
13
Para alguns tribunais, a emancipao faz com que o menor passe a ser responsabilizado devido a
cessao da incapacidade. Outros entendem que neste caso, a responsabilidade exclusiva dos
pais, porm, h um terceiro posicionamento (o mais utilizado) que defende a responsabilidade dos
pais de forma solidria, pois assim, no despreza os efeitos da emancipao e nem o dever dos pais
para com aqueles menores (ainda que emancipados) que estejam sob seus cuidados (Retirado da
Revista Jurdica Instituio Toledo de Ensino, Prof Gelson Amaro de Souza e Resumos de Direito
e Atualizaes Renata Esser).
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do estabelecimento de ensino ou por meio da internet, celular (casos estes
chamados de cyberbullying), de acordo com os julgados seguintes:
Apelao. Responsabilidade civil. Internet. Uso de imagem para fim depreciativo. Criao de flog. Pgina pessoal para fotos na rede mundial de
computadores. Responsabilidade dos genitores. Ptrio poder. Bullying. Ato ilcito. Dano moral in re ipsa. Ofensas aos chamados direitos de personalidade. Manuteno da indenizao. [...] PC do ofensor. [...] A prtica de bullying ato ilcito, haja vista compreender a inteno de desestabilizar psicologicamente o ofendido, o qual resulta em abalo acima do razovel, respondendo o ofensor pela prtica ilegal. Aos pais incumbe o dever de guarda, orientao e zelo pelos filhos menores de idade, respondendo civilmente pelos ilcitos praticados, uma vez ser inerente ao ptrio poder, conforme inteligncia do art. 932, do Cdigo Civi