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7/30/2019 Cadernos FGV Projetos n 21: Infraestrutura: Investindo no Desenvolvimento do Brasil
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7/30/2019 Cadernos FGV Projetos n 21: Infraestrutura: Investindo no Desenvolvimento do Brasil
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
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SUMRIO
editorial
04FGV PROJETOS
entrevistas
06BENJAMIN ZYMLER
14SERGIO F. QUINTELLA
depoimentos
20ATUAO DO BNDES NO SETOR DEINFRAESTRUTURA
Joo Carlos Ferraz
26REPENSANDO AS CIDADES:
MOBILIDADE, SUSTENTABILIDADE E
CONVIVNCIA
Jaime Lerner
artigos
30CENRIOS E OPORTUNIDADES PARA O
SETOR DE SERVIOS: PLANEJAMENTO,
ENGENHARIA E ANLISE ECONMICA
Cesar Cunha Campos
34AS PARCERIAS PBLICO-PRIVADAS NO
BRASIL E SEUS DESAFIOS
Carlos Ari Sundfeld
40LOGSTICA E INFRAESTRUTURA
NO BRASIL
Manoel Reis
46O CONTROLE DO TCU SOBRE A
CONCESSO DE SERVIOS PBLICOS
Jos Mcio
52PROVER INFRAESTRUTURA: A
MARATONA DOS MUNICPIOS
BRASILEIROS
Luiz Gustavo Barbosa
56CONSTRUO CIVIL: UMA ANLISE DE
DESEMPENHOAna Maria Castelo
60INFRAESTRUTURA NAVAL: U M AVANO
NECESSRIO
Mauricio Costa
64A EVOLUO E OS DESAFIOS DAS
TELECOMUNICAES NO BRASIL
Marcio Couto
72TRANSPORTE URBANO: A EXPERINCIA
DO METR RIO
Luiz Carlos Duque e Mauricio Gouva
82BANCOS DE DESENVOLVIMENTO,
FINANCIAMENTO DA INFRAESTRUTURA
E DO D ESENVOLVIMENTO ECONMICO
Rogrio Sobreira
90SANEAMENTO BSICO
Rosane Coelho
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
Cesar Cunha Campos
DIRETORFGV PROJETOS
novas oportunidades e possibilidades para o
progresso social. Esta edio do Cadernos
FGV Projetos foi publicada especialmente por
ocasio do III Brazil Infrastructure Investment
Forum nos Estados Unidos, seminrio organizado
pela Brazilian-American Chamber of Commerce.
Dedicada ao tema Infraestrutura, esta publicao
traz artigos e depoimentos de personalidadesligadas de alguma maneira a esse setor, alm de
experincias bem-sucedidas que vm contribuindo
para a modernizao do pas. De saneamento
construo civil, passando por transporte,
telecomunicaes, logstica, investimentos, modelos
de gesto e contratao, at os desafios de cidades
e municpios e as principais necessidades do setor,
diversos temas foram abordados.
Os assuntos e questes levantados nesta publicao
ampliaro o debate acerca dos melhores caminhos
e solues para consolidar bons modelos e atrair
investimentos para o setor de infraestrutura no
Brasil. Esperamos, com isso, contribuir para que os
efeitos dessa onda positiva pela qual passa o pas
sejam discutidos e refletidos para um resultado
mais efetivo, duradouro e sustentvel.
Boa leitura!
O excelente momento da economia brasileira e a
motivao do governo em ampliar os investimentos
em infraestrutura no pas se traduzem em
excelente oportunidade para incrementar o debate
sobre o futuro e as perspectivas brasileiras para
esse setor. A turbulncia econmica europeia e
a difcil retomada da recuperao da economia
americana direcionam o foco para oportunidadesde investimentos em pases antes pouco atrativos,
favorecendo o interesse no Brasil.
Nesse contexto importantes medidas esto
sendo adotadas pelo governo brasileiro para
incrementar o setor e facilitar a implementao
de novos projetos. Entre elas esto as Parcerias
Pblico-Privadas (PPPs) e um conjunto de leis e
regulaes que do segurana entrada de novos
investidores, especialmente os mecanismos que
fundamentam a participao do setor privado. O
mesmo se d em relao ao Regime Diferenciado
de Contrataes Pblicas (RDC), inicialmente
aplicvel s contrataes relacionadas Copa das
Confederaes, Copa 2014 e os Jogos Olmpicos e
Paraolmpicos de 2016.
Assim, assistimos a um momento histrico no
pas, que indicar mudanas substanciais que
afetaro positivamente os brasileiros, trazendo
FGV PROJETOSeditorial
EDITORIAL
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
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BENJAMIN ZYMLERentrevista com
Graduado em engenharia eltrica pelo Instituto Militar de
Engenharia (IME) e em direito pela Universidade de Braslia
(UnB), mestre em direito pela mesma universidade.
Possui 15 anos de experincia em estudos de planejamento
e anlise de sistemas eltricos, com nfase em sistemas
de transmisso, tendo gerenciado projetos e contratos e
coordenado diversas equipes de engenheiros e tcnicos.
Foi analista de finanas e controle externo do Tribunal
de Contas da Unio (TCU), onde possui experincia
em auditoria e anlise de prestao de contas no setor
pblico, principalmente nas reas de empresas pblicas e
sociedades de economia mista. Atualmente, ocupa o cargo
de Ministro do TCU.
O Brasil , atualmente, uma das principais economias do
mundo. Esse crescimento atrai investimentos no pas. Em
entrevista FGV Projetos, o presidente do Tribunal de
Contas da Unio (TCU), Benjamin Zymler, afirma que o
Tribunal est preparado para a tarefa de fiscalizar os novos
investimentos. O ministro comenta as medidas tomadas
nos ltimos anos, destacando a aproximao dos rgos do
governo com o Tribunal e os investimentos na capacitao
de auditores. Encerra salientando a importncia das aes
do TCU para garantir confiabilidade aos grandes projetos
de infraestrutura.
RESUMO
Benjamin Zymler
PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS
DA UNIO (TCU)
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FGV PROJETOS: O BRASIL ,
ATUALMENTE, UMA DAS PRINCIPAIS
ECONOMIAS DO MUNDO, SENDO O
IMPACTO ECONMICO PERCEBIDO NA
PAUTA DIRIA. COMO O TRIBUNAL DE
CONTAS DA UNIO (TCU) ACOMPANHA
ESSE PROCESSO DE CRESCIMENTO?
BENJAMIN ZYMLER: O TCU tem dedicado grande
ateno anlise do processo de crescimento
econmico vivenciado pelo Brasil. Assim, por
exemplo, quando analisadas as contas apresentadasanualmente pelo Presidente da Repblica, a Corte
de Contas tem conferido nfase ao estudo de temas
como infraestrutura e crescimento sustentvel.
Nesse mesmo sentido, o TCU tem acompanhado os
aspectos macroeconmicos da situao brasileira,
em especial no que concerne ao crescimento do PIB.
A ao do Tribunal tambm alcana temas
relacionados ao crescimento econmico do pas,
como as concesses de servios pblicos e as
grandes obras necessrias superao dos gargalos
atualmente existentes na rea de infraestrutura.
Por fim, so acompanhados os impactos ambientais
desse crescimento.
O TCU EST PREPARADO PARA FISCALIZAR
TANTOS INVESTIMENTOS NO PAS?
>> Ao longo dos ltimos anos, o TCU tem se
preparado para fiscalizar os investimentos federaisna rea de infraestrutura. Atualmente, o Tribunal
possui quatro secretarias que fiscalizam as
principais obras realizadas com recursos da Unio.
Alm disso, h duas secretarias encarregadas de
fiscalizar as concesses de servios pblicos e as
parcerias pblico-privadas, que sero largamente
utilizadas para viabilizar os investimentos
atuais. O TCU dispe ainda de uma secretaria
especializada na fiscalizao do Banco Nacional de
Desenvolvimento (BNDES) - que financia parcela
significativa desses investimentos - e da Petrobras
- que responde por uma parte muito relevante
desses dispndios. Alm disso, a Corte de Contas
tem desenvolvido metodologias especficas para a
fiscalizao dos diferentes tipos de investimento
em infraestrutura que so necessrios para garantir
a sustentabilidade do crescimento do pas.
QUAIS OS PRINCIPAIS DESAFIOS DO
TRIBUNAL PARA CRESCER EM SINTONIA
COM O DESENVOLVIMENTO E OS
INVESTIMENTOS QUE VM SENDO FEITOS
NO PAS?
>> O TCU conta com aproximadamente 1.700
auditores para exercer suas funes. Esse
nmero no dever experimentar um crescimento
significativo nos prximos anos. Assim sendo,
o principal desafio conseguir fiscalizar os
investimentos crescentes com um quantitativo
de pessoal praticamente fixo. Nesse contexto,
visualiza-se como necessria a ampliao da
eficincia do Tribunal, o que vem sendo buscado
de vrias formas.
Em primeiro lugar, promoveu-se um programa
de treinamento dos auditores em larga escala,
que buscou atualizar os servidores do TCU no
que concerne ao estado da arte na fiscalizaode recursos pblicos. Houve tambm um
direcionamento da maior parte da fora de trabalho
para a rea de fiscalizao. Em 2012, foi fixada a
meta de utilizao de 55% dos recursos humanos
disponveis na rea de auditoria. Por fim, esto sendo
aprimorados os mtodos de auditoria utilizados no
mbito do TCU. Nesse sentido, cumpre destacar que
est se buscando a aderncia desses mtodos com
os padres internacionalmente aceitos.
HOUVE ALGUMA MUDANA IMPORTANTE
NA RELAO DO TCU COM OS OUTROS
RGOS DO GOVERNO NO CONTROLE E
NO DESENVOLVIMENTO EM PROJETOS DE
INFRAESTRUTURA?
>> Nos ltimos anos, houve uma aproximao
dos rgos do governo e do TCU. Assim, quando oPoder Executivo estava elaborando projetos muito
relevantes na rea de infraestrutura, estabeleceu-
se um canal de comunicao que permitiu ao
Tribunal comear sua anlise com razovel
antecedncia. Pode ser citado, a ttulo de exemplo,
o recente caso das concesses dos aeroportos de
Braslia, Viracopos e Guarulhos, cujas minutas
de editais foram analisadas por equipes do TCU
ainda durante sua elaborao. Essa forma de
atuao permitiu a agilizao dos procedimentos
de controle pelo TCU.
FOI REALIZADO ALGUM TIPO DE
INVESTIMENTO EM INOVAO E
TECNOLOGIA NO TCU, PARA MELHOR
MONITORAR E ATENDER A MAIOR
DEMANDA DE FISCALIZAO DE OBRAS
PBLICAS?
>> O TCU tem realizado investimentos significativosem tecnologia, em especial no que concerne
fiscalizao das grandes obras. Tais investimentos
tm permitido a realizao de trabalhos com
alto grau de confiabilidade e abrangncia. Por
exemplo, tm sido utilizadas imagens de satlite e
equipamentos sofisticados para confirmar dados
de escavao e terraplanagem. Pode-se citar, ainda,
o incremento progressivo do nmero de ensaios
em laboratrios que so realizados visando aferir
a qualidade das obras em questo. Em sntese, o
Tribunal est se equipando para realizar mais e
melhores auditorias em obras pblicas.
QUE INVESTIMENTOS FORAM FEITOS
EM CAPACITAO E ORIENTAO AOS
RGOS PBLICOS?
>> No que diz respeito capacitao, umaimportante iniciativa se concretizou quando
do ingresso dos novos auditores de obras em
2010. Alm do programa de formao comum
carreira de auditor do TCU, que a segunda fase
do concurso pblico, realizou-se um programa
complementar e bastante especfico para obras,
que culminou com a imediata realizao de uma
auditoria, formada por uma equipe de servidores
experientes.
Alm disso, no final do ano passado, foi prevista
a realizao, em curto e mdio prazos, de 41
cursos na rea de obras, dos gerais aos altamente
especializados. Destes, 12 j se realizaram at o
momento e 16 esto programados at o final do ano.
Os demais devero compor o plano de capacitao
para 2013, juntamente com outras demandas
levantadas. Para 2012, so cerca de 500 vagas para
as unidades especializadas (secretarias de Obras),
200 para auditores do Tribunal em geral e 100 para
auditores de outros rgos. A carga horria anualde capacitao das unidades especializadas deve
superar facilmente 100 horas - bastante alta, mesmo
considerando organizaes e setores de ponta.
H tambm reunies tcnicas internas e encontros
tcnicos, como o ocorrido em abril com a comisso
de fiscalizao financeira e fontrole da Cmara
ENTREVISTAS
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
11dos Deputados, para melhor conhecimento da
dinmica das fiscalizaes de obras. Assim
como essas iniciativas, vrias aes resultam em
capacitao, melhoria de processos e avanos
em outros aspectos do trabalho, embora no se
caracterizem primordialmente como ao de
capacitao formal.
H ALGUMAS CRTICAS QUE ACUSAM O
TCU DE, EM SUA FISCALIZAO DE OBRAS,
FREAR INVESTIMENTOS. COMENTE, POR
FAVOR.
>> Inicialmente, necessrio ressaltar que a
prerrogativa de decidir a paralisao de obras,
assim como a responsabilidade por essa deciso, do Congresso Nacional e, como tal, vem sendo
exercida. A participao do TCU na prestao de
informaes ao Congresso sobre obras com indcios
de irregularidades decorre do disposto nas Leis de
Diretrizes Oramentrias (LDOs) de cada exerccio.
Nos termos estabelecidos na LDO 2013, art. 93
ao art. 101, cabe ao TCU identificar os indcios de
irregularidades graves nas obras fiscalizadas e
comunic-los ao Congresso Nacional, para que este
delibere pela paralisao ou no de cada obra.
Ressalta-se que, atualmente, dentre as dezenas de
milhares de obras em execuo com recursos do
oramento da Unio, existem apenas cinco obras com
execuo fsica, oramentria e financeira suspensa em
virtude da referida sistemtica de fiscalizao de obras.
EM RELAO AOS INVESTIMENTOS QUE
VM SENDO FEITOS PARA A COPA 2014,COMO O TRIBUNAL EST SE PREPARANDO
PARA ACOMPANH-LOS E FISCALIZ-LOS
DE FORMA EFICAZ E SEM ATRASOS?
>> A realizao da Copa 2014 apresenta
materialidade, relevncia e riscos significativos,
o que ensejou a deciso de acompanhar as aes
governamentais relacionadas a esse evento.
O ministro Valmir Campelo foi designado pelo Plenrio
do TCU para relatar todos os processos constitudos
no Tribunal relativos Copa 2014. Em funo da
diversidade de agentes envolvidos - Unio, estados,
Distrito Federal e municpios - foi celebrado o
protocolo de intenes que constituiu a Rede de
Informaes para Fiscalizao e Controle dos Gastos
Pblicos na Organizao da Copa do Mundo de
2014 (Rede da Copa). Nesse processo de fiscalizao
atuam, alm do TCU, o Senado Federal, a Cmara dos
Deputados, a Controladoria-Geral da Unio (CGU) e os
Tribunais de Contas estaduais e municipais.
Os gastos previstos com a Copa 2014 na rea de
infraestrutura esto estimados em aproximadamente
R$ 28 bilhes, concentrados na construo ou
reforma das arenas (R$ 7 bilhes), em obras de
mobilidade urbana (R$ 12 bilhes) e na ampliao
ou reforma de aeroportos (R$ 7,4 bilhes). Do
trabalho desenvolvido pelo TCU, resultou umaeconomia de aproximadamente R$ 600 milhes,
cabendo destacar a reduo nos oramentos do
Maracan (R$ 98 milhes) e da Arena Amazonas
(R$ 87 milhes).
OS RGOS GOVERNAMENTAIS
E GESTORES PBLICOS ESTO
PREPARADOS PARA LIDAR COM GRANDES
OBRAS PBLICAS? QUAL A POSSVEL
CONTRIBUIO DO TCU NESSE SENTIDO,
ESPECIALMENTE EM TREINAMENTO,
FORMAO E CAPACITAO DE SEU
QUADRO TCNICO?
>> Lidar com grandes obras pblicas um desafio
que exige tecnologias e metodologias avanadas e,
principalmente, pessoal altamente qualificado. O
TCU tem se preparado para isso nos ltimos anos,
bem como para apoiar o desenvolvimento das demais
instituies de controle nessa empreitada.
Desde 2010, o Tribunal preocupa-se com a disseminao
das competncias de controle e, mais especificamente,
das obras pblicas, em vista dos investimentos
impulsionados pela realizao da Copa 2014. Nesse
ano, promoveu-se um curso de 35 horas para 62
participantes, dentre servidores efetivos das instituies
que compem a Rede de Controle em cada Estado
da federao que receber os jogos da Copa 2014,
especialmente servidores de tribunais de contas dos
estados e da CGU. Foi um marco na atuao conjunta e
uma amostra da possibilidade de apoio do TCU.
A ao do Tribunaltambm alcana
temas relacionados ao
crescimento econmico
do pas, como as
concesses de servios
pblicos e as grandesobras necessrias
superao dos gargalos
atualmente existentes na
rea de infraestrutura.Benjamin Zymler
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
ENTREVISTAS
Em 2011, iniciou-se o desenvolvimento de
cursos a distncia de alto nvel sobre auditoria
de obras, num total de 110 horas. So cursos de
oramento de obras, auditoria de oramento e de
auditoria e anlise da contratao, que fecham o
ciclo da fiscalizao de obras. Os cursos j esto
disponveis aos rgos de controle e permitem
maior alcance da capacitao.
Em 2012, paralelamente ao desenvolvimento dos
cursos a distncia, houve vrias aes destinadas
Rede de Controle. No incio do ano, realizou-
se o curso Auditoria de Obras Pblicas, comparticipao coordenada pelo Grupo de Educao
Corporativa, formado pelos setores de capacitao
dos tribunais de contas dos estados, e apoiada
pelo Instituto Serzedello Corra (ISC/TCU). O curso
capacitou 47 servidores.
Houve tambm uma edio adaptada do curso, sob
o nome Planejamento, Oramentao, Licitao
e Execuo de Obras Pblicas, para funcionrios
e servidores de companhias de saneamento que
trabalham diretamente com a elaborao de editais,
especificaes e planilhas de preos das licitaes
que envolvam recursos federais repassados pelo
Ministrio das Cidades. um exemplo de curso
voltado para as instituies executoras, numa
atuao preventiva do Tribunal. Outros cursos
similares foram realizados ou esto programados,
sempre com 35 horas e com contedo similar ou
adaptados demanda especfica.
Para 2013, o ISC continuar o atendimentocoordenado das demandas dos rgos de controle,
no tema obras e outros. O atendimento prev
duas semanas de dedicao exclusiva do Instituto
aos rgos de controle e a realizao de cursos a
distncia de mesmo nvel que os ofertados para
o pblico interno. Alm dos cursos especficos
na temtica controle de obras, j se iniciou, no
primeiro semestre deste ano, a capacitao em
auditoria em geral - fundamentos, planejamento,
execuo e comunicao de resultados. O programa
de capacitao, que totaliza 80 horas, o mesmo
utilizado para a atualizao dos auditores do TCU.
O programa deve capacitar cerca de 100 servidores
de tribunais de contas at o final deste ano e
continuar disponvel em 2013.
Dessa forma, de meados de 2010 at o fim de 2012,
cerca de 300 servidores de outros rgos tero sido
capacitados em obras ou em procedimentos de
auditoria afins, em alto nvel e nos padres do TCU.
Com os novos cursos e mediante coordenao no
atendimento das demandas, nossa atual capacidadecomporta maior quantitativo por ano, o que
acreditamos ser suficiente para a disseminao das
competncias e possibilidade de sua multiplicao
nos diversos rgos.
QUE FATORES RELACIONADOS AO
CONTROLE DO TCU PODEM CONTRIBUIR
POSITIVAMENTE PARA OS INVESTIMENTOS
INTERNACIONAIS NO BRASIL?
>> A atuao do TCU tem colaborado para conferir
maior confiabilidade aos grandes projetos de
infraestrutura que esto sendo implementados no
pas. Em especial no que concerne s concesses
de servios pblicos, a atuao da Corte de Contas
tem contribudo para aprimorar os estudos feitos
pelo Governo Federal e, consequentemente, para
ampliar a confiana dos investidores na exatido
dos nmeros apresentados pela administrao
pblica. Da mesma forma, a atuao do TCUna fiscalizao da observncia dos marcos
regulatrios importante para garantir a
segurana jurdica e a estabilidade desses marcos.
Considerando que essas duas ltimas qualidades
so imprescindveis para viabilizar investimentos
de longo prazo, como so os realizados no setor
de infraestrutura, fica evidente a relevncia da
atuao do Tribunal.
Lidar com grandes obraspblicas um desafio
que exige tecnologias e
metodologias avanadas
e, principalmente, pessoal
altamente qualificado. O
TCU tem-se preparado
para isso nos ltimos
anos, bem como para
apoiar o desenvolvimento
das demais instituies
de controle nessa
empreitada.Benjamin Zymler
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
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SERGIO F. QUINTELLAentrevista com
Vice-presidente da Fundao Getulio Vargas (FGV)
desde 2005, formou-se em engenharia pela Pontifcia
Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), em
economia pela Faculdade de Economia e Finanas do
Rio de Janeiro (Feferj) e em engenharia econmica pela
Escola Nacional de Engenharia. No exterior, fez mestrado
em administrao de empresas na Scuola di Formazione
Ipsoa, MBA na mesma rea na Harvard Business School e
curso de extenso em finanas pblicas na Pennsylvania
State University (PSU). Atualmente, membro do Conselho
de Administrao da Petrobras e do Conselho Tcnico da
Confederao Nacional do Comrcio. Foi presidente da
Empresa Internacional de Engenharia e da Companhia do
Jar. Tambm foi membro do Conselho Monetrio Nacional,
presidente da Associao Brasileira de Normas Tcnicas e
do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.
Nesta entrevista, o vice-presidente da Fundao Getulio
Vargas (FGV), Sergio F. Quintella, reflete sobre a
importncia do planejamento para a boa execuo de obras
de infraestrutura. Aps grandes investimentos no setor,
at o incio da dcada de 1980, o Brasil observou uma
certa estagnao nos investimentos em infraestrutura. Na
recente retomada, nota-se os efeitos desse perodo, como
escassez de engenheiros qualificados e com experincia.
Defende ainda que a falta de bons projetos bsicos
compromete a execuo de qualquer obra. Por fim, destaca
que o Brasil deve diminuir o Custo Brasil a fim de aumentar
sua competitividade e atrair mais investimentos.
RESUMO
Sergio F. Quintella
VICE-PRESIDENTE DA FGV EMEMBRO DO CONSELHO DE
ADMINISTRAO DA PETROBRAS
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
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ENTREVISTAS
FGV PROJETOS: QUAL FOI A
SUA EXPERINCIA NO SETOR DE
INFRAESTRUTURA?
SERGIO F. QUINTELLA: Sou engenheiro de
profisso e de corao. Formei-me pela Pontifcia
Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-
Rio) em plena fase desenvolvimentista, com um
Plano de Metas voltado para a construo de usinas
hidroeltricas, estradas de rodagem e ferrovias,
construo de aeroportos e portos e, finalmente,como sntese do programa, a construo de
Braslia no Planalto Central. Toda a minha atuao
na engenharia est ligada a projetos e obras
nesse setor, desde a construo do sistema de
abastecimento de gua do Guand (obra de enorme
proporo em sua poca), no Rio de Janeiro, ao vo
central da Ponte Rio-Niteri. Presidi a companhia
responsvel pelo projeto da Usina de Itaip, de
grande parte do sistema de transmisso de energia
eltrica, das ferrovias para transporte de minrio
e do sistema Carajs (minas, ferrovia e porto),
no Norte do Brasil. Alis, e aqui permito-me uma
digresso, quando se fala em ferrovias, rodovias,
portos e aeroportos, a palavra correta logstica,
fundamental para o escoamento da produo e,
muitas vezes, responsvel pela competitividade
internacional de commodities como soja e minrio,
por exemplo. A rea de infraestrutura, portanto,
sempre ocupou lugar de destaque em minha
trajetria profissional.
De 1957 at incio dos anos 80, quando houve a
crise cambial e o Brasil correu o risco de no cumprir
suas obrigaes internacionais, tivemos grandes
investimentos no setor de infraestrutura. A partir de
ento, e durante mais de 25 anos, a necessidade de
ajustes fiscais conteve os investimentos pblicos
neste setor, o que somente agora parece estar sendo
retomado. Durante esse perodo de estagnao, houve
uma reduo significativa na formao de engenheiros.
No havendo obras de infraestrutura, muitos jovens
migraram para outras reas e, atualmente, h uma
carncia muito grande de engenheiros treinados, com
vivncia e experincia em obras de infraestrutura
de grande dimenso. uma razo pela qual, por
exemplo, algumas empresas brasileiras esto sendo
obrigadas a contratar engenheiros estrangeiros para
trabalhar no Brasil.
QUAIS AS ETAPAS QUE DEVEM SER
OBSERVADAS PARA O SUCESSO DE UMA
OBRA DE INFRAESTRUTURA?
>> Qualquer obra de engenharia exige um
conjunto de etapas a serem percorridas para que o
empreendimento possa ser conduzido dentro dos
padres de segurana, qualidade e custos. As obras
de infraestrutura no fogem a essa regra, antes
devendo ser integradas a um planejamento feito
com antecedncia, muito antes da sua execuo,
nos canteiros de obra e que se desenvolve nas
pranchetas e computadores dos engenheiros
projetistas. O projeto, antes de tornar-se um
trabalho de detalhamento de fundaes, estruturas e
especificao de equipamentos, passa pelo chamado
projeto bsico, pea fundamental, por exemplo,
para a escolha do traado, avaliao das condies
de solo, regime de chuva etc. Somente a partir
deste projeto bsico, possvel avaliar os custos doempreendimento com alto grau de preciso. Segue-
se o projeto detalhado e o incio das obras.
Sem um projeto bsico de qualidade, no possvel
desenvolver um bom oramento, ou mesmo uma
concorrncia para que os preos se encaixem
dentro do que foi planejado. Essa uma das razes
pelas quais algumas obras no Brasil so oradas
por determinado valor e terminam custando duas
ou trs vezes mais.
QUAIS OS REFLEXOS DA INFRAESTRUTURA
NO CHAMADO CUSTO BRASIL?
>> Nesse momento de retomada de investimentos
no setor de infraestrutura, uma questo que deve
ser debatida refere-se ao chamado Custo Brasil.Por que determinados produtos brasileiros, seja
no campo siderrgico, qumico, petroqumico etc.
tm um custo de fbrica competitivo com os do
mercado internacional, mas, quando colocados
no mercado, so mais caros do que os seus
concorrentes estrangeiros?
O Custo Brasil um resultado de vrios fatores,
sendo que muitos deles esto fora do controle
dos empresrios que tm aqui suas atividades
produtivas. Eles incluem a elevada carga tributria,
o custo da energia eltrica, a complexidade do
sistema de impostos e taxas, a legislao trabalhista
e por fim uma deficiente infraestrutura.
O economista Claudio Frischtak, em trabalho
recente examinando as perspectivas do Brasil e da
China, grau de compatibilidade e os investimentos
em infraestrutura, assim se manifestou:
No Brasil, ainda investe-se pouco eminfraestrutura. Nas ltimas duas dcadas,
os investimentos estiveram em mdia em
torno de 2,3% do PIB, reduo considervel
quando comparado ao perodo que se inicia
na dcada de 1970. Com exceo do setor
de telecomunicaes, a queda nos demais
segmentos foi acentuada e possivelmente os
investimentos - no seu conjunto - incapazes de
cobrir a depreciao do capital fixo, estimada
em 3%. A implicao clara: deteriorao na
qualidade e custos dos servios, contribuindo
para a baixa produtividade da economia e
arrestando - pelo lado da oferta - o crescimento.
Uma comparao dos investimentos do Brasil
em infraestrutura com os de outras economias
emergentes, mostra no apenas considervel
dissonncia, mas uma lenta recuperao. Narealidade em 2011 houve uma nova inflexo
- a taxa de investimento caiu para 2,05%, e
possivelmente ser inferior a 2% do PIB em 2012.
No h, no Brasil, infraestrutura para escoar
a produo brasileira adequadamente. Isso
acontece com o agronegcio da Regio Oeste, por
exemplo, que no possui uma rota de transporte
alternativo pelo Pacfico e deve cruzar todo o pas
para chegar aos portos que o levaro ao mercado
internacional. A experincia de transporte de
combustvel por alcooldutos extremamente
recente. O minrio produzido pela Vale, em
Carajs, uma exceo nesse cenrio. Isso
porque a Vale, antes de ser apenas uma grande
empresa de minerao, sobretudo uma excelente
operadora de logstica, capaz de utilizar ferrovias
e portos de alta eficincia e, assim, competir com
vantagens em mercados longnquos, como os
japoneses e chineses. A meu ver, as perspectivas
da rea so enormes e variadas, as oportunidadesesto abertas para todos os setores e devero
atrair o capital nacional e internacional. O setor
de infraestrutura, certamente, o que mais
levar reduo do Custo Brasil, aumentando a
competitividade do pas e tornando-o mais atrativo
ao mercado internacional.
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
A meu ver, asperspectivas da rea
so enormes e variadas,
as oportunidades esto
abertas para todos os
setores e devero atrair
o capital nacional e
internacional.Sergio F. Quintella
PERODO 1971/1980 1981/1989 1990/2000 2001/2010
TOTAL (% PIB) 5,42 3,62 2,29 2,32
ELETRICIDADE 2,13 1,47 0,76 0,67
TELECOMUNICAES 0,80 0,43 0,73 0,65
TRANSPORTES 2,03 1,48 0,63 0,71
GUA E SANEAMENTO 0,46 0,24 0,15 0,29
TABELA 1
INVESTIMENTO EM INFRAESTRUTURA NO BRASIL (% DO PIB)
GRFICO 1INVESTIMENTO EM INFRAESTRUTURA (% DO PIB) DE PASES EM DESENVOLVIMENTO
FONTE: CASTELAR PINHEIRO (2009) E FRISCHTAK (2011)
FONTE: FILIPINAS, TAILNDIA E VIETN, BANCO MUNDIAL (2009), CHINA, ASIAN DEVELOPMENT BANK(2010), NDIA, NATIONAL TRANSPORT DEVELOPMENT COMMITTEE (2010), CHILE E COLMBIA MORGAN
STANLEY (2008-2011), PARA O BRASIL, CUJOS DADOS SE REFEREM MEDIA 2008-2011, EMPRESASABERTAS (PBLICAS E PRIVADAS); SIAFI, CNI E CLCULOS E ESTIMATIVAS PRPRIAS
ENTREVISTAS
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
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ATUAO DO BNDES NOSETOR DE INFRAESTRUTURA
depoimento
JOO CARLOS FERRAZ
Em seu depoimento, o vice-presidente do Banco Nacional
de Desenvolvimento (BNDES), Joo Carlos Ferraz,
apresenta alguns dos desafios que o Brasil enfrentar nos
prximos anos e o papel do BNDES nesse cenrio. Todo
crescimento gera tenso e desequilbrio, e o sucesso de
um pas em manter essa trajetria de longo prazo depende
da capacidade da sociedade em reconhecer a existncia
dessas tenses, a fim de negoci-las e mitig-las. O autor
comenta o Programa de Acelerao do Crescimento
(PAC), que renovou os investimentos em infraestrutura
no Brasil e os desafios nesse sentido. Encerra salientando
a importncia de garantir solidez aos novos modelos para
atrair investimentos.
RESUMO
Graduado em economia e jornalismo pela Pontifcia
Universidade Catlica de Minas Gerais (PUC-Minas),
com doutorado em economia da inovao e polticas
pblicas pela Universidade de Sussex, Inglaterra. Joo
Carlos Ferraz foi diretor da Diviso de Desenvolvimento
Produtivo e Empresarial da Comisso Econmica para
Amrica Latina e Caribe (Cepal) da ONU e professor
visitante na Universidade de Tsukuba, no Japo.
Atualmente professor da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ) e vice-presidente do Banco Nacional de
Desenvolvimento (BNDES).
Joo Carlos Ferraz
VICE-PRESIDENTE DO BNDES
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CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL
23Todo crescimento , por definio, desequilibrado.
Significa dizer que qualquer entrada em
determinada etapa de crescimento est sujeita
a tenses, pois o desenvolvimento sempre
multidimensional.
A primeira tenso refere-se ao aumento de consumo e
capacidade de oferta. O consumo pode se r realizado
de forma imediata, mas o aumento da produo para
esse consumo depende da capacidade de oferta.
Portanto, se o consumo cresce, h uma presso
que aumenta a capacidade de oferta, e, quando se
trata de um bem durvel mdio, esse aumento de
capacidade pode demorar dois ou trs anos para se
concretizar. Considerando o tempo de maturao
de infraestruturas que devem atender a um possvel
aumento de consumo, que um processo mais lentodo que o aumento da capacidade de produo, tem-se
ento uma segunda fonte de tenso: a capacidade de a
infraestrutura suportar um aumento de demanda por
seus servios. Finalmente, a terceira fonte de tenso
provm das competncias e tem por caracterstica o
longo tempo de maturao de formao das pessoas,
para que tenham as habilidades e qualificaes
necessrias para servir infraestrutura.
Essas so as tenses e os desequilbrios que o Brasil
enfrentar pelo menos nos prximos 10 anos. O
sucesso do pas em manter essa trajetria de longo
prazo depender, em grande parte, da capacidade da
sociedade em reconhecer a existncia dessas tenses,
a fim de negoci-las e mitig-las. A nica forma de
ameniz-las ser mais eficiente na formao das
pessoas, no desenvolvimento da infraestrutura e na
produo, alm de melhorar a qualidade no consumo.
O panorama diante do qual nos deparamos para
os prximos anos exige que concentremos nosso
foco tanto na quantidade quanto na qualidade dosinvestimentos. Com eficincia, qualidade e progresso
tcnico, todas essas tenses sero mitigadas.
A ltima onda de investimentos em infraestruturas
realizada no Brasil, de forma sistemtica e
permanente, ocorreu h mais de 30 anos. Desde a
chamada crise da dvida, em 1982, a preocupao
do pas esteve em realizar projetos necessrios
sua sobrevivncia.
Uma das reaes imediatas crise foi incentivar
a reserva em moeda estrangeira. Foi quando
o pas conseguiu passar de pequeno a grande
exportador, principalmente de commodities,
graas aos investimentos que haviam sido feitos
anteriormente. Logo, foram desenvolvidas
infraestruturas para canalizar exportaes, a fim
de sustentar uma crise de dvida que j existia.
At hoje, e durante muito tempo, se elogia o fato
de uma determinada empresa que exporta um
tipo de commodity manter, com muita eficincia,
o menor custo por quilmetro/tonelada
transportada no mundo.
A partir da dcada de 1990, conseguimos estabilizar
a economia e, mais tarde, entramos em um processo
de reformas estruturais, principalmente dos ativos
patrimoniais que existiam nesse pas. Considerando
o tempo de maturao, foram feitas as privatizaese criadas as agncias reguladoras.
No perodo mais recente, aconteceram muitas
mudanas, sendo o investimento o smbolo mais
marcante dessas transformaes. Entre 2004 e 2005,
o investimento passou a crescer a taxas maiores do
que a taxa de crescimento do PIB. Comea, ento, a
surgir a demanda por infraestrutura. Em 2007, foi
lanado o Programa de Acelerao do Crescimento
(PAC), que representava o primeiro esforo
concentrado em retomar a onda de investimentos
em infraestrutura depois de cerca de 25 anos.
No tnhamos, porm, um modelo a seguir. O
modelo que seguamos anteriormente, apoiado nas
estatais, era ultrapassado, no funcionava, e foi
colocado em prtica quando ainda estvamos sob
um governo autoritrio.
Nesse novo esforo de investimentos, tnhamos
o desafio de mudar o modelo, que passou a
seguir a modicidade tarifria, no qual ganhava aconcesso aquele que oferecia o melhor preo para
o consumidor.
O desafio inicial para colocar essas aes em prtica
era muito grande. No havia, nos ministrios,
equipes com a competncia para desenvolver um
projeto legal, um projeto ambiental, um projeto de
engenharia, ou um projeto financeiro. O pas no
possua projetos e nem capacidade para elabor-los.
Essa realidade abarcava todos os nveis. Se no
havia mo de obra capacitada no ministrio,
DEPOIMENTOS
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tambm no havia nas empresas e nem na execuodas obras. O pas no estava acostumado a fazer
investimentos em infraestrutura.
O PAC teve incio em 2007 e desde ento temos
trabalhado de maneira contnua para alavancar
essa agenda. Uma anlise institucional evidenciaria
que os investimentos do PAC funcionaram melhor
onde j existiam mais competncias, tanto no setor
privado quanto no setor pblico. Esse foi o caso da
rea de energia eltrica. Esse setor contava com um
ministrio relativamente organizado, trabalhava
no modelo de modicidade tarifria e utilizava-se
de concesses financiadas em longo prazo pelo
BNDES. A energia eltrica , por isso, o setor que
mais avana, em que as metas e compromissos com
o PAC esto atendidos.
evidente a importncia de se investir mais em
infraestrutura, e continuamos realizando esforos
nesse sentido. Um dos desafios melhorar nossa
capacidade de elaborao de bons projetos.
Um exemplo digno de nota o chins. Em 2008,
quando veio a crise bancria, os chineses, que
vinham numa trajetria de moderao do ritmo de
sua expanso, tiveram que arremeter sua economia
e lanaram um projeto de US$ 600 bilhes para a
infraestrutura. O Brasil, por outro lado, continuou
sua trajetria pela linha do consumo. No ano
seguinte notcia do programa realizado pela
China, visitei o pas e verifiquei a implementao
de projetos que deveriam levar at dez anos para
ser executados. Diferentemente do Brasil, a China
reduzido de funcionrios, a baixa inadimplncia,entre outras caractersticas.
Apoiamos grandes projetos da infraestrutura e
do setor industrial, mas tambm temos produtos
especialmente voltados s micro, pequenas e
mdias empresas, como o Carto BNDES e o
Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), que tm
ampliado o acesso ao crdito para as companhias
de menor porte. Alm disso, o banco participa de
fundos no reembolsveis para desenvolvimento
cultural, social, tecnolgico e ambiental. D,
ainda, suporte s empresas na condio de banco
de investimento, permitindo, assim, participao
direta em companhias por renda varivel, correndo
risco direto ou atravs de fundos.
Na tarefa de ajudar na expanso dos investimentos,
o BNDES tem sido fortemente beneficiado por uma
deciso do Estado brasileiro, assegurando que no
faltaro recursos para o banco. A lgica que rege
essa deciso a de que os investimentos devemcrescer frente do PIB. Nunca tivemos que tomar
decises no que se refere alocao de recursos, mas
se eles se tornarem escassos e isso for necessrio, a
prioridade j est muito bem definida. Trs reas
tm prioridade superior s demais: socioambiental,
inovao e infraestrutura.
No que se refere aos financiamentos infraestrutura,
eles esto basicamente divididos em duas reas do
banco, que so a econmica e a social. O desembolso
na rea de infraestrutura econmica, que inclui
os projetos de energia e logstica, vem crescendo
estava em crescimento desde 1978. Tinha, portanto,30 anos de crescimento, acumulando projetos nas
mais variadas categorias e capacitando pessoas
para execut-los, quando surgisse a oportunidade.
Quando o momento chegou, o pas possua um
estoque de competncias e de projetos prontos.
No Brasil, uma iniciativa importante no sentido de
melhorar a qualidade dos projetos foi a criao, pelo
BNDES e por bancos comerciais, da Estruturadora
Brasileira de Projetos (EBP). A empresa elabora
projetos com potencial de serem realizados pelo
setor pblico. Desta forma, pode oferecer solues
quando surgirem oportunidades de concesso.
Hoje, conhece-se com clareza a importncia de ter
bons projetos para seguir estimulando o crescimento
da economia, mas essa percepo no nova para o
BNDES. Em sua histria, o Banco sempre foi chamado
a dar apoio institucional s polticas pblicas de
infraestrutura, fazendo estudos ou participando, por
meio de seus tcnicos, dos esforos de modelagem eimplementao de projetos.
O BNDES tem sido, obviamente, um dos grandes
instrumentos para ampliar os investimentos em
nosso pas. Ele uma instituio que possui duas
caractersticas muito importantes que a tornam
capaz de entregar os compromissos aos quais ela
induzida ou chamada a realizar: a escala e o escopo.
Com ativos da ordem de US$ 300 bilhes, o Banco
desembolsa em torno de US$ 80 bilhes por ano, e
se destaca no apenas pelo seu porte, mas tambm
por sua eficincia, que se comprova pelo nmero
sistematicamente acima do desembolso dasdemais reas. A rea de infraestrutura econmica
previsvel, tem projetos de longa maturao e
vem crescendo cerca de 20% ao ano. A rea que
chamamos de infraestrutura social a mais recente.
Inicialmente trabalhava com saneamento e com o
financiamento a projetos de mobilidade urbana,
como metr e trem, e mais recentemente passou
a financiar investimentos dos governos estaduais.
Nossa atuao junto aos estados vem aumentando
nos ltimos anos, e essa nova rea deve ganhar
espao crescente em nossa instituio.
Em suma, temos uma gama enorme de desafios
frente na trajetria que estamos traando, no
sentido de ampliar a quantidade e a qualidade dos
projetos e dos investimentos em infraestrutura em
nosso pas.
Temos todas as condies de faz-lo, j que
estamos em um momento muito interessante,
porque poucas vezes na histria de nosso pashouve consenso em relao importncia dos
investimentos para impulsionar o crescimento.
H, entre a direita e a esquerda, ou entre o
mais ortodoxo e o mais heterodoxo economista,
o consenso de que o investimento deveria
ser o carro-chefe do crescimento brasileiro.
Essa uma bela e auspiciosa notcia, porque,
politicamente, torna possvel a construo
de uma maior solidariedade para superar os
gargalos existentes em diversos setores. Nossas
fronteiras de oportunidades e a taxa de retorno
dessas fronteiras so muito boas atualmente.
DEPOIMENTOS
Com ativos da ordem de US$ 300 bilhes, oBanco desembolsa em torno de US$ 80 bilhes
por ano, e se destaca no apenas pelo seu porte,
mas tambm por sua eficincia (...)Joo Carlos Ferraz
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REPENSANDO ASCIDADES: MOBILIDADE,SUSTENTABILIDADE E
CONVIVNCIA
depoimento
JAIME LERNER
ARQUITETO, URBANISTA E
EX-PREFEITO DE CURITIBA
fundamental compreender o funcionamento das cidades
para fazer investimentos adequados em infraestrutura
e em desenvolvimento econmico. Em seu depoimento
Jaime Lerner, descreve as medidas necessrias para um
bom desenvolvimento urbano. Explica que, alm das
necessidades bsicas de educao, sade e segurana,
existem trs importantes pontos para o bom funcionamento
de uma cidade: mobilidade, sustentabilidade e
convivncia. O autor d sugestes de como investir nessas
trs reas, dando foco relao trabalho-moradia e
importncia de incentivar a integrao socioeconmica e
cultural em bairros e regies. Lerner afirma que a cidade
deve ser encarada como um organismo vivo e que possvel
empreender grandes mudanas a favor da populao em
um curto prazo.
RESUMO
Graduado em arquitetura e urbanismo pela Universidade
Federal do Paran (UFPR), Jaime Lerner foi prefeito de
Curitiba por trs mandatos, tendo participado do Plano
Diretor da cidade. Foi governador do Paran por oito
anos consecutivos, consultor das Naes Unidas para
assuntos urbanos e, atualmente, presidente de seu
prprio escritrio de arquitetura, desenvolvendo projetos
no Brasil e no exterior.
Jaime Lerner
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DEPOIMENTOS
No h investimento em infraestrutura nem
desenvolvimento econmico sem considerar as
necessidades das cidades. As cidades so estruturas
de vida, trabalho e lazer, e essas instncias no
podem ser pensadas separadamente. Existem
trs pontos, alm, claro, de educao, sadee segurana, que so essenciais para o bom
funcionamento de qualquer cidade no mundo:
mobilidade, sustentabilidade e convivncia, esta
ltima entendida como tolerncia e coexistncia.
No possvel separar atividade econmica dos
assentamentos humanos.
Em relao mobilidade, existem algumas solues
viveis: a primeira, est em tornar eficiente o
sistema de transporte que j existe. Outra soluo
o transporte pblico, o transporte individual no
vivel. Defendo at que podemos metronizar
o nibus, quer dizer, dar ao nibus o mesmo
desempenho que possui o metr. Mas preciso,
sobretudo, pensar em alternativas, seja metr,
investimento na superfcie - como o BRT - a bicicleta,
como alternativa sustentvel, at novos elementos,
como o transporte pblico individual. Em Paris,
h o Autolib, um carro eltrico, que pode ser
compartilhado e alugado, como as bicicletas.
O problema da sustentabilidade pode ser resolvido,
assim como o da mobilidade. Cerca de 75% das
emisses de carbono se originam na cidade. Sendo
assim, devemos pensar em mecanismos para a
diminuio dessa emisso de gases na atmosfera.
No plano climtico e no da sustentabilidade,
algumas aes simples podem contribuir, como usar
menos o automvel, separar o lixo, morar mais perto
do trabalho ou trazer o trabalho para mais perto da
moradia. Um dos componentes importantes para
a tolerncia, para a convivncia, a integrao
socioeconmica e cultural. No possvel conviver
em cidades que separam as pessoas por renda,
idade, funes ou qualquer outro aspecto cultural. Asegregao e o isolamento so trgicos para a cidade.
Seria ingenuidade dizer que as pessoas vo morar
no mesmo prdio, mas a convivncia na mesma
regio, no mesmo bairro, fundamental. Gosto de
fazer uma metfora da cidade associando-a a uma
tartaruga. Ao mesmo tempo em que a tartaruga um
exemplo de vida, trabalho e movimento, seu casco
tem o desenho de uma prefeitura urbana. Se o casco
da tartaruga for partido ao meio, vida de um lado e
trabalho de outro, a tartaruga morrer, e isso que
est acontecendo em muitas cidades. A cidade ideal
aquela onde h integrao de funes e de renda,
estruturando assim o seu crescimento. preciso
integrar, vida, movimento, transporte e lazer em
uma estrutura orgnica e de crescimento. Quanto
mais integrada, mais humana a cidade.
Todo esse movimento de integrao, s se faz
possvel pela sustentabilidade, que pode ser
representada por uma equao entre o que se
poupa e o que se desperdia. Para resumir, eudiria o seguinte: quando voc quer criatividade
corte um zero do oramento, quando voc quer
sustentabilidade corte dois zeros do oramento, e,
por fim, se voc quer solidariedade, assuma a sua
identidade e respeite a diversidade dos outros.
O modelo de construo de habitaes populares,
que situa as pessoas cada vez mais longe do seu
local de trabalho, desastroso. No existe habitao
popular decente se no for integrada cidade, e,
infelizmente, no o que vem ocorrendo no Brasil.
A melhor soluo nesse sentido preencher vazios
urbanos e construir sistemas que possibilitem a
acessibilidade das pessoas. Habitao popular nopode ter como nico destino a periferia. Habitao
popular no periferia, integrao cidade.
O mesmo se pode dizer em relao s favelas.
Cada vez mais, elas devem pertencer cidade.
Mais alternativas econmicas e de emprego
precisam ser dadas para que essas comunidades
se configurem como todo e qualquer outro bairro.
Sempre defendi a ideia da zona franca da favela, na
qual quem desenvolver uma atividade econmica
que gere empregos, no paga impostos. A gerao
de empregos e renda contribuiria para afastar as
pessoas das drogas.
Essas regies tambm apresentam graves
problemas de habitao. Grande parte delas
ocupam encostas e, todas as vezes em que se mexe
no terreno ocupado, algo inadequado acontece.
Mas h possibilidade de levar infraestrutura sem
comprometer as moradias: como abastecimento
de gua, energia e recolhimento do esgoto pelocorrimo das escadarias. Nem todos os problemas
podem ser resolvidos, no entanto muitas melhorias
podem ser realizadas: primeiro, a gerao de
empregos, depois a resoluo do problema do lixo.
Na verdade, esse problema de fcil soluo. Nas
encostas de Curitiba, por exemplo, foi adotado
o sistema de Compra do Lixo 1, um incentivo para
que o prprio morador descarte seu lixo, em local
apropriado, para ser recolhido. s vezes, o lixo no
recolhido porque no h acesso para a chegada
do caminho.
Visto que possvel ter solues criativas nas
comunidades, preciso repensar tambm ashabitaes para as classes mdia e alta. Digo que h
um processo de dasluzao da construo. Esto
confundindo valor e preo. Tanto os preos quanto
o dimensionamento dos imveis esto absurdos,
exagerados. As moradias esto superdimensionadas,
com vrios pavimentos, e o aumento do nmero de
metros quadrados aumenta o custo da obra. Outro
problema dessa tendncia em superdimensionar
as construes o afastamento de lugares que
tm infraestrutura, a construo de reas sociais
que nunca so usadas. Em relao construo, o
comportamento do novo riquismo, custar muito
caro para todo mundo. Em algum momento, a
situao imobiliria ficar insustentvel do ponto de
vista econmico.
A cidade precisa ser pensada como um organismo
vivo, qual todos tenham acesso. necessrio
e possvel assegurar as condies de integrao
de vida, trabalho, lazer, moradia e emprego. Os
governantes precisam direcionar energia, no sentidode mudar as tendncias que no so desejveis. As
cidades tm muita fora poltica, mas s vezes os
gestores delegam isso burocracia. E a burocracia,
por sua natureza, postergadora. As decises devem
ser tomadas para benefcio imediato da populao.
Costumo dizer que em trs ou quatro anos possvel
fazer uma grande mudana em uma cidade e
continuo afirmando isso.
1O Programa Compra do Lixo constitui-se numa forma alternativa de Coleta Domiciliar, destinada a atender as camadas menos favorecidas da populao. Paracada saco de lixo contendo de 8 a 10 Kg de resduos depositados na caamba, o participante recebe um vale, que troca por produtos alimentcios. A Associaode Moradores, pelo trabalho de parceria com a Prefeitura, recebe 10% do valor pago por cada saco de lixo depositado na caamba. Este dinheiro depositadoem conta corrente bancria em nome da Associao, que utiliza este recurso em obras ou servios definidos pela prpria comunidade.
(...) quando voc quer criatividade corte um zero dooramento, quando voc quer sustentabilidade corte dois zeros
do oramento, e, por fim, se voc quer solidariedade, assuma a
sua identidade e respeite a diversidade dos outros.Jaime Lerner
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CENRIOS EOPORTUNIDADES PARAO SETOR DE SERVIOS:
PLANEJAMENTO,ENGENHARIA E ANLISE
ECONMICA
artigo
CESAR CUNHA CAMPOS
DIRETOR DA FGV PROJETOS
O Brasil se encontra em um momento economicamente
positivo. Inflao e taxa de desemprego seguem reduzidos,
enquanto crescimento se mantm estvel. Esse cenrio
impulsiona a demanda por diversos servios, como
energia, transporte, saneamento e habitao, e alerta para
a necessidade de investimentos em infraestrutura. Neste
artigo, Cesar Cunha Campos, diretor da FGV Projetos,
traa um panorama do setor, destacando as importantes
iniciativas que vem sendo realizadas, como o Programa de
Acelerao de Crescimento e o Programa de Investimento
em Logstica. preciso planejamento estruturado,
integrado e coerente para superar os gargalos existentes e,
nesse contexto, as oportunidades para o desenvolvimento
de projetos so excelentes.
RESUMO
Graduado em engenharia civil pela Pontifcia
Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), mestre
em administrao empresarial pela London Business
School e doutor em planejamento de transportes pela
Technische Universitt Wien, ustria. Desde 1975,
integra e lidera vrios projetos em gesto, planejamento,
engenharia, economia e finanas. Desenvolveu projetos
para as principais empresas brasileiras, pblicas e
privadas, especialmente anlises de viabilidade para a
captao de recursos nos principais bancos e agncias de
desenvolvimento (tais como BNDES, IRDB, BID e OECF) e
tambm projetos no mbito internacional. Desde 2003,
diretor da FGV Projetos, unidade de assessoria tcnica da
Fundao Getulio Vargas (FGV).
Cesar Cunha Campos
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Um dos temas centrais da agenda brasileira atual
a questo da infraestrutura, por se caracterizar
como base de sustentao do crescimento
socioeconmico nacional.
A previso do crescimento econmico brasileiro
para 2013 da ordem de 4%, devendo manter-se
nesse nvel ao longo da prxima dcada. Os juros
esto em patamares historicamente baixos (7,5%
ao ano), a inflao se mantm em torno da meta
(4,5%, em 2012) e a taxa mdia de desemprego estem 5,4% (julho/2012). A dvida lquida do setor
pblico prossegue sua trajetria descendente, tendo
atingido 36,5% do PIB, em 2011. Os investimentos
estrangeiros diretos foram de US$ 67 bilhes (2011),
com projeo para US$ 55 bilhes em 2012, e as
reservas internacionais do pas chegam a US$ 377
bilhes (agosto/2012). Apesar do contexto de crise
internacional, as exportaes seguem trajetria
ascendente, tendo passado de US$ 137,8 bilhes
(2006) para US$ 256 bilhes (2011), devendo atingir
cerca de US$ 264 bilhes, em 2012.
Para que esses nmeros se consolidem e se
expandam, fundamental um conjunto expressivo
de investimentos em setores de infraestrutura,
como energia, telecomunicaes, transportes
rodovirio, ferrovirio e areo, portos e aeroportos,
hidrovias e saneamento bsico. Esses segmentos,
certamente se constituem em pilares fundamentais
para as atividades econmicas de uma nao.
Ao longo da primeira dcada de 2000, a elevao do
nvel de renda da populao aumentou a demanda
por energia eltrica, transporte, saneamento
e habitao, levando a uma expectativa social
crescente por maiores investimentos nesses
setores. Alm dessas necessidades, o Brasil conta
com importantes iniciativas em andamento.
O Programa de Acelerao do Crescimento
(PAC), iniciado em 2007, prev investimentos
de US$ 0,7 trilho, at 2021, na implantao
de projetos de infraestrutura nas reas de
transporte, energia, saneamento, habitao e
recursos hdricos. J o Programa de Investimento
em Logstica, anunciado em agosto de 2012,
prev investimentos de US$ 63 bilhes, dos
quais US$ 21 bilhes em 7.500 km de rodovias
e US$ 42 bilhes em 10.000 km de ferrovias. Ao
somar essas necessidades, relevante mencionaros investimentos anunciados na indstria de
petrleo e gs natural (2012-2016), na ordem
de US$ 236,5 bilhes, enquanto na indstria de
minerao so estimados US$ 75 bilhes. O cenrio
favorvel e promissor desses investimentos conta,
ainda, com a motivao adicional da realizao
de grandes eventos esportivos que ocorrero no
pas, em futuro prximo: a Copa 2014 e os Jogos
Olmpicos de 2016.
Mesmo com esse elevado volume de investimentos
programados, o Brasil ainda precisa ampliar seus
recursos em infraestrutura. Assumindo um padro
mdio de investimentos de economias consolidadas
de 2% a 4% do PIB, sero necessrios investimentos
adicionais da ordem de US$ 1,1 trilho ou US$ 60
bilhes ao ano, no perodo 2013-2030.
Os bons resultados da economia e as decises
polticas so fatores fundamentais, mas outros
fatores tambm necessitam de ateno. Os
investimentos em infraestrutura, por serem
fundamentais para o crescimento econmico e
requererem recursos financeiros vultosos, devem
contar com alguns mecanismos relevantes.
Em primeiro lugar, devem ser bem planejados
para que, de fato, promovam um aumento de
produtividade e uma reduo nos custos de
produo. Em segundo lugar, a expanso da
infraestrutura deve ser suficientemente rpida
para sustentar o crescimento econmico. Em
terceiro lugar, devem contar com um setor pblico
de planejamento e controle gil, eficiente e atento.
Por fim, devem existir mecanismos financeiros
pblicos e privados adequados, alm de uma base
legal consistente.
A legislao brasileira se baseia no Estado de
Direito, com leis e regulamentos consolidadosao longo das ltimas dcadas, que permitem
claros processos de licitao (Lei n8.666),
Concesses Pblicas, Parcerias Pblico-Privadas,
dentre outras possibilidades. Com relao aos
rgos de planejamento e controle, o Brasil
conta com uma slida estrutura de Estado,
com instituies estatais de planejamento,
com rgos reguladores, com consolidados
Tribunais de Contas de atuao federal, estadual
e municipal, bem como Ministrios Pblicos
eficientes e atuantes. No que diz respeito aos
agentes financeiros, o BNDES considerado o
maior banco de desenvolvimento em aplicao de
recursos do mundo, que disponibiliza fortemente
seus recursos no setor de infraestrutura. Por fim,
conta-se no Brasil com um setor financeiro slido
e moderno, tanto privado quanto pblico: Banco
do Brasil e Caixa.
Nesse contexto, pode-se prever que haver uma
forte e crescente demanda pelo setor de servios
de planejamento no setor de engenharia e anlise
econmico-financeira, voltada para o atendimento
das questes tcnicas e de controle, para as
necessidades de atendimento s caractersticas
dos financiamentos pblicos e privados, para a
elaborao e execuo dos projetos de engenharia
e suas consequentes implantaes.
Com os nmeros de investimentos expostos acima,
e considerando que, para suportar todos esses
recursos, ser necessrio um ciclo de planejamento
composto de planos diretores, estudos de
viabilidade tcnica, econmica e financeira,
projetos conceituais, projetos bsicos e projetos
executivos de engenharia, pode-se prever que o
setor de servios poder contar com cerca de 5 a
10% do total a ser investido em infraestrutura no
Brasil nos prximos anos.
Essa expectativa somente se materializar com
um forte setor de consultorias especializadas, com
tcnicas eficientes e profissionais experientes. As
escolas brasileiras de engenharia e de economia
devero formar um contingente expressivo de
bons profissionais, e o mercado brasileiro de
servios especializados se tornaro mais atraentes
em mbito mundial.
Diante de todo esse cenrio positivo e de grandes
perspectivas, o Brasil vive uma ansiedade associada
ao seu potencial de desenvolvimento e s suas
imensas limitaes de infraestrutura. O quadro no
momento se delineia virtuoso, com a proposio
e viabilizao de grandes investimentos a partir
de um planejamento estruturado, integrado e
coerente. Ser necessrio razovel perodo para
superao dos grandes gargalos hoje existentes,
mas as oportunidades na rea de planejamento
e desenvolvimento de projetos so excepcionais,
especialmente em gesto e acompanhamento
de obras, apoio fiscalizao e projetos em
andamento, e avaliao da conformidade entre
projeto e execuo.
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AS PARCERIAS PBLICO-PRIVADAS NO BRASIL E
SEUS DESAFIOS
artigo
CARLOS ARI SUNDFELD
PROFESSOR DA DIREI TO GV/FGV
O artigo do professor Carlos Sundfeld trata das Parcerias
Pblicos-Privadas (PPPs). O autor apresenta as diferentes
formas parcerias entre governo e iniciativa privada ao longo
do tempo, e a longa tradio brasileira no setor. O conceito
de PPP como compreendido atualmente cunhado apenas
a partir da Lei n 11.079/2004, que diferencia concesses
administrativas e patrocinadas, mas o Brasil se utiliza
de contratos de concesso desde o sculo XIX. Segundo
Sundfeld, as parcerias pblico-privadas so vantajosas
para o governo tanto quanto para a iniciativa privada e
ainda existem muitas oportunidades a explorar.
RESUMO
Graduado em direito pela Pontifcia Universidade Catlica
de So Paulo (PUC-SP), onde tambm completou mestrado
e doutorado em direito administrativo e atua como
professor. professor fundador da Escola de Direito de
So Paulo da Fundao Getulio Vargas (Direito GV/FGV)
e scio-fundador de Sundfeld Advogados. Presidente da
Sociedade Brasileira de Direito Pblico, participou da
criao da lei nacional de Parcerias Pblico-Privadas, da
lei mineira de Parceria Pblico-Privada e outros projetos e
textos legais nessa matria.
Carlos Ari Sundfeld
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A expresso Parceria Pblico-Privada possui
um uso bem restrito na legislao. No entanto,
preciso estabelecer uma distino entre parceria
pblico-privada, em sentido lato, que abrange
diversos tipos de relacionamento contratual entre
poder pblico e particular, e Parceira Pblico-
Privada, em sentido stricto, o que a lei brasileira
chama de PPP especificamente.
A histria das parcerias pblico-privadas no
recente, como se costuma mencionar, nem
na experincia internacional nem no Brasil. Na
experincia internacional, com a qual a experinciabrasileira mantm intenso dilogo, os contratos
que, originalmente, geravam essas parcerias, eram
chamados de contratos de concesso. Desde a
metade do sculo XIX, existem no Brasil contratos de
concesso que cabem na ideia de parceria pblico-
privada tomada em sentido lato. So eles: contratos
de concesso de servio pblico, de obra pblica e
concesses setoriais regulamentadas por lei. Trata-
se de vnculos de longo prazo em que o particular
assume uma responsabilidade do Estado para
realizar investimentos, criar uma infraestrutura e
depois explor-la. Tal explorao se faz sob uma
regulao, com base e origem em um contrato, que
estabelece um vnculo e determina as regras que
vo disciplinar a explorao da infraestrutura.
Porm, a histria das parcerias, em sentido lato,
tem altos e baixos na legislao e na experincia
brasileira. A legislao do sculo XIX comeou a
tratar desse assunto para um setor especfico: o
ferrovirio. No sculo XX, esse movimento foi se
estendendo a outros setores, conforme necessidade
de desenvolv-los. Na dcada de 1930, foi
editado o cdigo de guas 1 para regulamentar as
concesses eltricas, que estavam em ascenso
devido ao processo de industrializao do pas.
No incio da dcada de 1960, foi editado o cdigo
brasileiro de telecomunicaes, quando a Unio
se tornou a grande prestadora de servios de
telecomunicaes. Ao longo do tempo, em todos os
setores foram surgindo leis para regular esse tipo
de contrato, normalmente com nome de contrato
de concesso e, eventualmente, com o nome de
contrato de permisso.
Consequentemente, foi sendo formada uma
rica e importante jurisprudncia a respeito dos
direitos e deveres das partes nesses contratos.
Essa jurisprudncia espelhou-se em uma doutrina
jurdica que sempre tratou do tema concesso
de servio pblico ou obra pblica, procurando
destacar os poderes que o Estado deve ter nessarelao. Ao lado disso, sempre se afirmou haver
algo intocvel na relao contratual: o respeito
equao econmico-financeira do contrato.
Essa tradio foi sendo formada historicamente
e continuou a existir mesmo durante o perodo
de decadncia das concesses, quando o Estado,
sobretudo a partir da dcada de 1950, passou a
usar as grandes empresas estatais em seu projeto
desenvolvimentista. Exemplos desse modelo so
a Eletrobras, da dcada de 1960, e a Telebras,
da dcada seguinte. Nesse perodo, os contratos
de concesso com os particulares foram sendo
cada vez menos utilizados. Porm, fundamental
ressaltar que isso no foi feito com confiscos.
A tradio brasileira sempre respeitou os contratos
de concesso, criando-se, assim, uma cultura de PPP
avant la lettre. No perodo acima descrito, o poder
pblico comprou empresas privadas, que eram
concessionrias, ou assumiu empresas privadas
quebradas, sempre tentando respeitar as relaes
contratuais existentes. Em alguns casos, deixou
de usar os contratos de concesso, atribuindo os
servios diretamente s empresas estatais, mas sem
jamais abandonar a ideia de concesso.
No que diz respeito s parcerias pblico-privadas,
nunca na histria do direito brasileiro deixamos de
seguir a orientao segundo a qual elas so relaes
contratuais, a que o Estado tambm deve respeito.
Assim, a realizao de valores pblicos sempre se
pautou pelo contedo previsto nas clusulas dos
contratos originais, ou nas eventuais modificaes
realizadas pelo poder pblico, mas com observncia
dos direitos expressos na equao econmico-
financeira e nas normas jurdicas aplicveis.
Na dcada de 1990, ocorre uma renovao da
legislao, que dar origem expresso PPP.
Diferentemente do que ocorreu em outros pases da
Amrica Latina, essa renovao foi extremamente
bem-sucedida no Brasil, graas slida base jurdicae institucional construda ao longo de dcadas.
LEGISLAO
Em 1995, foi editada a Lei N 8987, uma lei
nacional para as concesses. At ento s havia,
no Brasil, leis setoriais. O objetivo da nova lei era
retomar o uso das concesses, consolidando ideias
j seguidas na cultura e na experincia jurdica
brasileira, para permitir privatizaes e outros
projetos em parceria com a iniciativa privada. A
lei consolida ideias j presentes na tradio do
pas, ajustando apenas alguns pontos, referentes
aos poderes da administrao e determinao de
preos em contrato.
Embora as concesses tivessem se consolidado a
partir de uma relao contratual com o particular,
administrao pblica eram reconhecidos poderes,
chamados exorbitantes, de modificar o contrato.
Pelo modelo jurdico existente, o governo poderia
extinguir um contrato de concesso, retomando
os servios e deixando o particular credor da
administrao pblica. Era preciso, portanto,
estabelecer limites claros e rgidos para esse tipo de
ao, a fim de aumentar a segurana do particular.
A nova lei de concesses manteve o poder de
a administrao pblica encampar2 o servio
outorgado a empresa privada concessionria,
estabelecendo, no entanto, dois condicionantes:
a concordncia do poder legislativo em cada
caso, o que dificulta o processo de encampao,
e a exigncia de pagamento de indenizao
prvia extino do contrato. Essas iniciativas
aumentaram a segurana do acordo, uma vez que
tornou desvantajoso para o poder pblico extinguir
antecipadamente esses contratos.
No perodo das estatais, no qual algumas dessas
empresas eram tambm concessionrias, e o
poder pblico assumia os papis de regulador econcedente, essas relaes contratuais sofreram
deterioraes. Esse foi o caso da fixao de
tarifas, por exemplo. No caso de empresas estatais
concessionrias, as tarifas acabavam sofrendo
flutuaes conforme a poltica, sendo reelaboradas
ano a ano, sem seguir regras contratuais. A nova
lei retomou o valor do contrato, estabelecendo
a obrigatoriedade de licitaes para todas as
concesses, prevendo tarifas fixadas por contrato.
A Lei n 8987/95 regula o que entendemos por
concesso comum, aquela mantida integralmente
com tarifas cobradas dos usurios finais. Essa
lei permitiu que o processo de privatizaes, que
havia se iniciado no governo Fernando Collor,
passasse a ter uma slida base legislativa, baseada
em experincias jurdicas consistentes. Desde sua
criao, mantm-se um instrumento referencial
para o julgamento de aes judiciais relacionadas
ao tema.
Em 2004, foi elaborada uma lei para completar
a Lei n 8987/95. A Lei n 11.079/2004, por cuja
concepo fui responsvel, inaugura o conceito
de PPP (em sentido estrito) a partir da criao e
regulamentao de dois novos tipos de contratos
de concesso. Esses contratos so as concesses
patrocinadas e administrativas, para celebrao
de contratos de longo prazo entre poder pblico e
1O nome se deve matriz eltrica adotada no Brasil, que priorizava a energia hidreltrica. 2 importante menci onar que, embora a encampao fosse possvel em v rios setores por lei ou pelo texto dos contratos, no houve no Brasil uma prti cageneralizada de retomada arbi trria pelo Estado de serv ios dados em concesso.
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iniciativa privada. Na lei brasileira, o conceito de PPP
refere-se, portanto, a esses dois tipos de contrato.
A concesso patrocinada a concesso de um
servio pblico ou da explorao de uma obra
pblica em que, alm da tarifa paga pelo usurio,
h um adicional pago pelo poder pblico. Esse
arranjo se aplica aos casos em que as tarifas
cobradas dos usurios no so satisfatrias para
compensar os investimentos realizados pelo
parceiro privado. J a concesso administrativa, tem
sua tarifa inteiramente paga pelo poder pblico e
aplicada a servios de responsabilidade do Estado,
como sade, educao ou segurana pblica,
reas estratgicas que envolvem investimentosmacios em infraestrutura pblica, cuja gesto
extremamente complexa e requer profundos
conhecimentos tcnicos. A lgica que rege esses
contratos a mesma que rege os contratos de
concesso comum, com a diferena de que a tarifa
paga pelo Estado e no pelo usurio final.
Historicamente, a grande diferena entre as
concesses administrativas e outros contratos
utilizados pelo poder pblico para criar
infraestrutura de primeira necessidade, a forma
de contratao da iniciativa privada. Se antes o
Estado abria licitaes separadas para contratar
as aes de projetar escolas, fazer obras e comprar
materiais, alm de realizar concursos para contratar
profissionais em um processo operacional
altamente complexo, com gerenciamento
simultneo de vrios contratos, a concesso
administrativa permite juntar esse conjunto e norme
de operaes em um nico contrato. Assim, o poder
pblico transfere ao particular parte do risco daconcepo do empreendimento, da flutuao de
preos e da obsolescncia do servio.
Alm da criao de leis nacionais para regulao
dos modelos de concesses, o Brasil assistiu,
desde o princpio da dcada de 1990, renovao
e ao surgimento de uma ampla variedade de leis
setoriais. Essas leis dedicaram-se a regular com
mais detalhe a aplicao dos modelos em setores
especficos, tratando suas particularidades.
A legislao brasileira , portanto, bastante
sofisticada e no apenas cuida de questes
especificamente contratuais, mas tambm regula,
disciplina, organiza e estrutura, institucionalmente,
os vrios setores. Para isso, cria agncias
reguladoras, com independncia, e atribui a elas a
tarefa de estabelecer regras regulamentares, alm
de cuidar da execuo desses contratos.
CONSIDERAES FINAIS
As Parcerias Pblico-Privadas apresentam
vantagens tanto para poder pblico quanto para
iniciativa privada. Para o governo, representama possibilidade de uma rpida expanso da
infraestrutura independente de arrecadao
tributria prvia. Alm disso, h uma enorme
economia de custos, no longo prazo, gerada pela
eficincia das contrataes.
Do ponto de vista do setor privado, so
oportunidades de negcio. Os modelos de
concesso esto forando um rearranjo do setor
privado, que se estrutura em novos tipos de
organizao empresarial. Se, no passado, eram
grandes empreiteiras que assumiam a implantao
da infraestrutura pblica, por meios de contratos
de obras, atualmente essas mesmas empresas
se transformaram em concessionrias, com
capacidade para desenvolver relacionamentos de
nova natureza com todos os atores envolvidos.
Embora a experincia brasileira no setor seja
complexa e sofisticada, h muitas oportunidades
ainda a explorar. Os estados e municpios tmaplicado os novos mecanismos de concesso nas
reas que so de sua responsabilidade, como
educao bsica, sade e segurana. O grande
desafio est na montagem de projetos que deem
conta de todas as etapas necessrias para a
realizao de transferncia de capital, e sua
posterior gesto. Nesse processo, destaca-se a
qualidade tcnica como item fundamental para que
o desenvolvimento do projeto seja bem-sucedido.
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LOGSTICA EINFRAESTRUTURA NO
BRASIL
artigo
MANOEL REIS
PROFESSOR DA EAESP/FGV E
COORDENADOR DO GVCELOG
Nas ltimas dcadas, temos testemunhado um aumento
de concorrncia que tornou os mercados mais dinmicos
e globalizados. Em seu artigo, Manoel Reis fala da
posio brasileira nesse novo cenrio competitivo, nossas
deficincias em diversos modais de transporte e as
consequncias desses gargalos. Comenta as duas edies do
Plano de Acelerao do Crescimento (PAC e PAC 2) e o Plano
Nacional de Logstica e Transporte (PNLT), desenvolvido
pelo Ministrio dos Transportes. Por fim, o autor aponta
perspectivas e d sugestes para que possamos suprir
nossas deficincias de infraestruturas logsticas.
RESUMO
Graduado e mestre em engenharia naval pela Universidade
de So Paulo (USP), doutor pelo Massachusetts
Institute of Technology (MIT). Professor na Escola de
Administrao de Empresas de So Paulo da Fundao
Getulio Vargas (EAESP-FGV), scio-diretor da MARE
Logstica. representante da EAESP no Captulo Brasil
do Supply Chain Council.
Manoel Reis
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VISO GERAL
At a dcada de 1960, o ciclo de vida dos produtos
era mais longo e as incertezas do mercado menos
intensas, com baixa concorrncia. Assim, fazia
sentido perseguir a excelncia nos negcios atravs
da gesto eficiente de atividades isoladas, como
compras, transportes, armazenagem, produo,
manuseio de materiais e distribuio.
A partir da dcada de 1970, inciou-se no mundo
um processo de crescimento da concorrncia,
em virtude do aumento da oferta de bens e
servios, que, aos poucos, superou a demanda,tornando os mercados cada vez mais dinmicos
e globalizados, trazendo consequncias diversas,
entre as quais se destaca o encurtamento do
ciclo de vida dos produtos. Nesse contexto
de concorrncia acirrada, os clientes esto se
tornando cada vez mais informados e exigentes,
fato que, nas ltimas dcadas, induziu o foco na
gesto integrada das atividades que compem
a cadeia de abastecimento, tanto internamente
nas empresas, quanto no relacionamento entre
os membros da cadeia estendida. Com a grande
semelhana que vem se estabelecendo entre os
bens produzidos por diferentes fornecedores (uma
certa comoditizao), aflorou a necessidade de
estabelecer a diferenciao competitiva entre
os mesmos. Os dois fatores mais importantes
para essa diferenciao so a reduo de custos
e a agregao de valor, especialmente o valor
intangvel, aquele que no est intrinsecamente
associado ao bem, mas que oferecido juntamente
com ele, incluindo disponibilidade, servio,atendimento, entre outros.
A logstica a parte da gesto da cadeia de
abastecimento responsvel por executar o fluxo
de materiais e informaes correspondentes
ao longo da cadeia, e tem por principal misso
disponibilizar, de forma eficiente e eficaz,
materiais e produtos onde se faam necessrios,
especialmente os produtos acabados nos pontos
O Brasil o quinto pas do mundo em extenso
territorial, atrs da Rssia, Canad, China e Estados
Unidos, e tem uma forte vocao para a produo
e exportao de commodities agrcolas e minerais.
Dentro desse contexto, fica clara a necessidade de
modais de mais baixo custo, como o hidrovirio e o
ferrovirio, para a movimentao de longa distncia
dessas cargas e para a prtica da intermodalidade.
No entanto, a distribuio modal tem uma forte
concentrao no modal rodovirio, com 61% da
produo de transporte; participao de 21% domodal ferrovirio; cerca de 1% do modal fluvial;
13% do modal martimo na cabotagem; e os 4%
restantes ficam com os modais dutovirio e areo.
Comparada s matrizes de transporte de outros
grandes pases, que tm participao maior dos
modais ferrovirio e fluvial, essa distribuio modal
mostra-se inadequada, por ser causadora de custos
excessivos e aumento substancial nos tempos de
trnsito, nus que rouba competitividade do pas.
de demanda. Assim, a logstica um instrumento
essencial na agregao de valor intangvel aos bens
e na racionalizao das operaes e consequente
reduo de seus custos.
Isso posto, pode-se afirmar que uma logstica
competente um instrumento essencial para a
diferenciao e competitividade entre empresas
concorrentes e, mais ainda, para a competitividade
de um pas.
A ATUAL CONDIO BRASILEIRA EM
INFRAESTRUTURA LOGSTICA
No Brasil, as mudanas j mencionadas ocorreram
principalmente a partir do incio da dcada de
1990, com a abertura comercial que incrementou
sobremaneira a concorrncia para as empresas
do pas, at ento acostumadas ao protecionismo
do Estado.
Claramente, a competitividade brasileira
hoje profundamente dificultada pela situao
calamitosa de sua infraestrutura logstica, fato
de conhecimento geral e que vem sendo alvo de
iniciativas governamentais que, at o momento,
pouco alteraram o quadro, de forma que o problema
se aprofunda e se agrava. H uma grande inpcia
no planejamento e, em especial, na implantao de
projetos de infraestrutura, que se arrastam no tempo,
aumentando os custos e impedindo consistentemente
o cumprimento dos cronogramas estabelecidos.
Conforme o Grfico 1, em 1975, os investimentosbrasileiros em infraestrutura logstica foram de
cerca de 1,8% do PIB. No entanto, esse percentual
foi se reduzindo ao longo dos anos e se estabilizou
em torno de 0,2%, entre 1990 e 2004, num
momento em que, em virtude do brutal crescimento
da concorrncia internacional, o pas mais
necessitava de infraestrutura logstica adequada. A
partir de 2004, os investimentos voltaram a crescer,
atingindo, em 2011, cerca de 0,65% do PIB.
Os baixos investimentos na infraestrutura geraram
gargalos em todos os modais de transporte,
conforme segue:
RODOVIAS
Nveis insuficientes de conservao e
recuperao
Dficit de capacidade da malha em regies
desenvolvidas
Inadequao de cobertura nas regies em
desenvolvimento
FERROVIAS
Extenso e cobertura insuficiente da malha no
territrio nacional
Quantidade excessiva de passagens em nvel
Falta de contornos em reas urbanas
Invases de faixa de domnio
GRFICO 1
INVESTIMENTOS DO MINISTRIO DOS TRANSPORTES EM INFRAESTRUTURALOGSTICA ENTRE 1975 E 2010 (% DO PIB)
FONTE: PNLT - PLANO NACIONAL DE LOGSTICA E TRANSPORTE, 2011
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45PORTOS
Limitaes ao acesso martimo
Restries ao acesso terrestre (rodo e ferrovirio)
Deficincias de retrorea e beros
Modelo gerencial da administrao porturia
desatualizada
HIDROVIAS
Restries navegao pela inexistncia de
eclusas
Restries de calado
Deficincias de sinalizao e balizamento
PRINCIPAIS CONSEQUNCIAS DESSES
GARGALOS
Altos custos logsticos
Inadequao da matriz de transportes vis--visa vocao brasileira para a produo e exportao
de commodities
Falta crtica de ferrovias e de sua integrao,
com duas alternativas de bitola
Impossibilidade da prtica da intermodalidade
na maioria do territrio nacional
Dificuldade de acesso terrestre e martimo aos
portos
Navegabilidade dos rios inviabilizada pela falta
de eclusas
Falta de dutos para o transporte de etanol
Baixa utilizao da cabotagem, de grande
potencial pela extenso da costa de cerca de
8.000 km
O pas enfrenta hoje um enorme desafio a ser
vencido para atingir um patamar de competitividade
compatvel com o atual mercado mundial, sem
contar as necessidades geradas pelos dois grandes
eventos que o Brasil ir sediar: Copa 2014 e
Olimpadas 2016.
PERSPECTIVAS
O Plano Nacional de Logstica e Transporte (PNLT),
considerado um plano de Estado, vem sendo
desenvolvido pelo Ministrio dos Transportes
desde a dcada passada e prope um conjunto
de projetos de infraestrutura de transportes que
objetivam dar um encaminhamento na soluo dos
problemas de infraestrutura logstica brasileiros.
O PNLT prev uma significativa alterao na
matriz de transportes at 2025, tornando-a
mais equilibrada e duplicando a produo de
transporte de cargas por ferrovia, com as seguintesconsequncias:
38% de aumento da eficincia energtica
41% de reduo de consumo de combustvel
32% de reduo de emisso de CO2
39% de reduo de emisso de NOx
Algumas partes do PNLT foram incorporadas s
duas edies do PAC, mas, como j comentado, os
resultados foram bastante insuficientes.
Em agosto de 2012, o governo federal lanou um
programa de investimentos de R$ 133 bilhes,
No ano de 2007, o Governo Federal lanou o
Programa de Acelerao do Crescimento (PAC), cujo
objetivo era promover a retomada do planejamento
e execuo de grandes obras de infraestrutura
social, urbana, logstica e energtica no pas, de
forma a contribuir para o seu desenvolvimento
acelerado e sustentvel. Em 2010, foi lanada
a segunda fase do Programa de Acelerao do
Crescimento (PAC 2), que incorpora mais aes nas
reas social e urbana, alm de mais recursos para
continuar construindo a infraestrutura logstica e
energtica para sustentar o crescimento do pas.
Na realidade, os resultados das duas edies do PAC
foram insu