Cadernos FGV Projetos n° 21: Infraestrutura: Investindo no Desenvolvimento do Brasil

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    3

    SUMRIO

    editorial

    04FGV PROJETOS

    entrevistas

    06BENJAMIN ZYMLER

    14SERGIO F. QUINTELLA

    depoimentos

    20ATUAO DO BNDES NO SETOR DEINFRAESTRUTURA

    Joo Carlos Ferraz

    26REPENSANDO AS CIDADES:

    MOBILIDADE, SUSTENTABILIDADE E

    CONVIVNCIA

    Jaime Lerner

    artigos

    30CENRIOS E OPORTUNIDADES PARA O

    SETOR DE SERVIOS: PLANEJAMENTO,

    ENGENHARIA E ANLISE ECONMICA

    Cesar Cunha Campos

    34AS PARCERIAS PBLICO-PRIVADAS NO

    BRASIL E SEUS DESAFIOS

    Carlos Ari Sundfeld

    40LOGSTICA E INFRAESTRUTURA

    NO BRASIL

    Manoel Reis

    46O CONTROLE DO TCU SOBRE A

    CONCESSO DE SERVIOS PBLICOS

    Jos Mcio

    52PROVER INFRAESTRUTURA: A

    MARATONA DOS MUNICPIOS

    BRASILEIROS

    Luiz Gustavo Barbosa

    56CONSTRUO CIVIL: UMA ANLISE DE

    DESEMPENHOAna Maria Castelo

    60INFRAESTRUTURA NAVAL: U M AVANO

    NECESSRIO

    Mauricio Costa

    64A EVOLUO E OS DESAFIOS DAS

    TELECOMUNICAES NO BRASIL

    Marcio Couto

    72TRANSPORTE URBANO: A EXPERINCIA

    DO METR RIO

    Luiz Carlos Duque e Mauricio Gouva

    82BANCOS DE DESENVOLVIMENTO,

    FINANCIAMENTO DA INFRAESTRUTURA

    E DO D ESENVOLVIMENTO ECONMICO

    Rogrio Sobreira

    90SANEAMENTO BSICO

    Rosane Coelho

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    Cesar Cunha Campos

    DIRETORFGV PROJETOS

    novas oportunidades e possibilidades para o

    progresso social. Esta edio do Cadernos

    FGV Projetos foi publicada especialmente por

    ocasio do III Brazil Infrastructure Investment

    Forum nos Estados Unidos, seminrio organizado

    pela Brazilian-American Chamber of Commerce.

    Dedicada ao tema Infraestrutura, esta publicao

    traz artigos e depoimentos de personalidadesligadas de alguma maneira a esse setor, alm de

    experincias bem-sucedidas que vm contribuindo

    para a modernizao do pas. De saneamento

    construo civil, passando por transporte,

    telecomunicaes, logstica, investimentos, modelos

    de gesto e contratao, at os desafios de cidades

    e municpios e as principais necessidades do setor,

    diversos temas foram abordados.

    Os assuntos e questes levantados nesta publicao

    ampliaro o debate acerca dos melhores caminhos

    e solues para consolidar bons modelos e atrair

    investimentos para o setor de infraestrutura no

    Brasil. Esperamos, com isso, contribuir para que os

    efeitos dessa onda positiva pela qual passa o pas

    sejam discutidos e refletidos para um resultado

    mais efetivo, duradouro e sustentvel.

    Boa leitura!

    O excelente momento da economia brasileira e a

    motivao do governo em ampliar os investimentos

    em infraestrutura no pas se traduzem em

    excelente oportunidade para incrementar o debate

    sobre o futuro e as perspectivas brasileiras para

    esse setor. A turbulncia econmica europeia e

    a difcil retomada da recuperao da economia

    americana direcionam o foco para oportunidadesde investimentos em pases antes pouco atrativos,

    favorecendo o interesse no Brasil.

    Nesse contexto importantes medidas esto

    sendo adotadas pelo governo brasileiro para

    incrementar o setor e facilitar a implementao

    de novos projetos. Entre elas esto as Parcerias

    Pblico-Privadas (PPPs) e um conjunto de leis e

    regulaes que do segurana entrada de novos

    investidores, especialmente os mecanismos que

    fundamentam a participao do setor privado. O

    mesmo se d em relao ao Regime Diferenciado

    de Contrataes Pblicas (RDC), inicialmente

    aplicvel s contrataes relacionadas Copa das

    Confederaes, Copa 2014 e os Jogos Olmpicos e

    Paraolmpicos de 2016.

    Assim, assistimos a um momento histrico no

    pas, que indicar mudanas substanciais que

    afetaro positivamente os brasileiros, trazendo

    FGV PROJETOSeditorial

    EDITORIAL

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

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    BENJAMIN ZYMLERentrevista com

    Graduado em engenharia eltrica pelo Instituto Militar de

    Engenharia (IME) e em direito pela Universidade de Braslia

    (UnB), mestre em direito pela mesma universidade.

    Possui 15 anos de experincia em estudos de planejamento

    e anlise de sistemas eltricos, com nfase em sistemas

    de transmisso, tendo gerenciado projetos e contratos e

    coordenado diversas equipes de engenheiros e tcnicos.

    Foi analista de finanas e controle externo do Tribunal

    de Contas da Unio (TCU), onde possui experincia

    em auditoria e anlise de prestao de contas no setor

    pblico, principalmente nas reas de empresas pblicas e

    sociedades de economia mista. Atualmente, ocupa o cargo

    de Ministro do TCU.

    O Brasil , atualmente, uma das principais economias do

    mundo. Esse crescimento atrai investimentos no pas. Em

    entrevista FGV Projetos, o presidente do Tribunal de

    Contas da Unio (TCU), Benjamin Zymler, afirma que o

    Tribunal est preparado para a tarefa de fiscalizar os novos

    investimentos. O ministro comenta as medidas tomadas

    nos ltimos anos, destacando a aproximao dos rgos do

    governo com o Tribunal e os investimentos na capacitao

    de auditores. Encerra salientando a importncia das aes

    do TCU para garantir confiabilidade aos grandes projetos

    de infraestrutura.

    RESUMO

    Benjamin Zymler

    PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS

    DA UNIO (TCU)

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    FGV PROJETOS: O BRASIL ,

    ATUALMENTE, UMA DAS PRINCIPAIS

    ECONOMIAS DO MUNDO, SENDO O

    IMPACTO ECONMICO PERCEBIDO NA

    PAUTA DIRIA. COMO O TRIBUNAL DE

    CONTAS DA UNIO (TCU) ACOMPANHA

    ESSE PROCESSO DE CRESCIMENTO?

    BENJAMIN ZYMLER: O TCU tem dedicado grande

    ateno anlise do processo de crescimento

    econmico vivenciado pelo Brasil. Assim, por

    exemplo, quando analisadas as contas apresentadasanualmente pelo Presidente da Repblica, a Corte

    de Contas tem conferido nfase ao estudo de temas

    como infraestrutura e crescimento sustentvel.

    Nesse mesmo sentido, o TCU tem acompanhado os

    aspectos macroeconmicos da situao brasileira,

    em especial no que concerne ao crescimento do PIB.

    A ao do Tribunal tambm alcana temas

    relacionados ao crescimento econmico do pas,

    como as concesses de servios pblicos e as

    grandes obras necessrias superao dos gargalos

    atualmente existentes na rea de infraestrutura.

    Por fim, so acompanhados os impactos ambientais

    desse crescimento.

    O TCU EST PREPARADO PARA FISCALIZAR

    TANTOS INVESTIMENTOS NO PAS?

    >> Ao longo dos ltimos anos, o TCU tem se

    preparado para fiscalizar os investimentos federaisna rea de infraestrutura. Atualmente, o Tribunal

    possui quatro secretarias que fiscalizam as

    principais obras realizadas com recursos da Unio.

    Alm disso, h duas secretarias encarregadas de

    fiscalizar as concesses de servios pblicos e as

    parcerias pblico-privadas, que sero largamente

    utilizadas para viabilizar os investimentos

    atuais. O TCU dispe ainda de uma secretaria

    especializada na fiscalizao do Banco Nacional de

    Desenvolvimento (BNDES) - que financia parcela

    significativa desses investimentos - e da Petrobras

    - que responde por uma parte muito relevante

    desses dispndios. Alm disso, a Corte de Contas

    tem desenvolvido metodologias especficas para a

    fiscalizao dos diferentes tipos de investimento

    em infraestrutura que so necessrios para garantir

    a sustentabilidade do crescimento do pas.

    QUAIS OS PRINCIPAIS DESAFIOS DO

    TRIBUNAL PARA CRESCER EM SINTONIA

    COM O DESENVOLVIMENTO E OS

    INVESTIMENTOS QUE VM SENDO FEITOS

    NO PAS?

    >> O TCU conta com aproximadamente 1.700

    auditores para exercer suas funes. Esse

    nmero no dever experimentar um crescimento

    significativo nos prximos anos. Assim sendo,

    o principal desafio conseguir fiscalizar os

    investimentos crescentes com um quantitativo

    de pessoal praticamente fixo. Nesse contexto,

    visualiza-se como necessria a ampliao da

    eficincia do Tribunal, o que vem sendo buscado

    de vrias formas.

    Em primeiro lugar, promoveu-se um programa

    de treinamento dos auditores em larga escala,

    que buscou atualizar os servidores do TCU no

    que concerne ao estado da arte na fiscalizaode recursos pblicos. Houve tambm um

    direcionamento da maior parte da fora de trabalho

    para a rea de fiscalizao. Em 2012, foi fixada a

    meta de utilizao de 55% dos recursos humanos

    disponveis na rea de auditoria. Por fim, esto sendo

    aprimorados os mtodos de auditoria utilizados no

    mbito do TCU. Nesse sentido, cumpre destacar que

    est se buscando a aderncia desses mtodos com

    os padres internacionalmente aceitos.

    HOUVE ALGUMA MUDANA IMPORTANTE

    NA RELAO DO TCU COM OS OUTROS

    RGOS DO GOVERNO NO CONTROLE E

    NO DESENVOLVIMENTO EM PROJETOS DE

    INFRAESTRUTURA?

    >> Nos ltimos anos, houve uma aproximao

    dos rgos do governo e do TCU. Assim, quando oPoder Executivo estava elaborando projetos muito

    relevantes na rea de infraestrutura, estabeleceu-

    se um canal de comunicao que permitiu ao

    Tribunal comear sua anlise com razovel

    antecedncia. Pode ser citado, a ttulo de exemplo,

    o recente caso das concesses dos aeroportos de

    Braslia, Viracopos e Guarulhos, cujas minutas

    de editais foram analisadas por equipes do TCU

    ainda durante sua elaborao. Essa forma de

    atuao permitiu a agilizao dos procedimentos

    de controle pelo TCU.

    FOI REALIZADO ALGUM TIPO DE

    INVESTIMENTO EM INOVAO E

    TECNOLOGIA NO TCU, PARA MELHOR

    MONITORAR E ATENDER A MAIOR

    DEMANDA DE FISCALIZAO DE OBRAS

    PBLICAS?

    >> O TCU tem realizado investimentos significativosem tecnologia, em especial no que concerne

    fiscalizao das grandes obras. Tais investimentos

    tm permitido a realizao de trabalhos com

    alto grau de confiabilidade e abrangncia. Por

    exemplo, tm sido utilizadas imagens de satlite e

    equipamentos sofisticados para confirmar dados

    de escavao e terraplanagem. Pode-se citar, ainda,

    o incremento progressivo do nmero de ensaios

    em laboratrios que so realizados visando aferir

    a qualidade das obras em questo. Em sntese, o

    Tribunal est se equipando para realizar mais e

    melhores auditorias em obras pblicas.

    QUE INVESTIMENTOS FORAM FEITOS

    EM CAPACITAO E ORIENTAO AOS

    RGOS PBLICOS?

    >> No que diz respeito capacitao, umaimportante iniciativa se concretizou quando

    do ingresso dos novos auditores de obras em

    2010. Alm do programa de formao comum

    carreira de auditor do TCU, que a segunda fase

    do concurso pblico, realizou-se um programa

    complementar e bastante especfico para obras,

    que culminou com a imediata realizao de uma

    auditoria, formada por uma equipe de servidores

    experientes.

    Alm disso, no final do ano passado, foi prevista

    a realizao, em curto e mdio prazos, de 41

    cursos na rea de obras, dos gerais aos altamente

    especializados. Destes, 12 j se realizaram at o

    momento e 16 esto programados at o final do ano.

    Os demais devero compor o plano de capacitao

    para 2013, juntamente com outras demandas

    levantadas. Para 2012, so cerca de 500 vagas para

    as unidades especializadas (secretarias de Obras),

    200 para auditores do Tribunal em geral e 100 para

    auditores de outros rgos. A carga horria anualde capacitao das unidades especializadas deve

    superar facilmente 100 horas - bastante alta, mesmo

    considerando organizaes e setores de ponta.

    H tambm reunies tcnicas internas e encontros

    tcnicos, como o ocorrido em abril com a comisso

    de fiscalizao financeira e fontrole da Cmara

    ENTREVISTAS

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    11dos Deputados, para melhor conhecimento da

    dinmica das fiscalizaes de obras. Assim

    como essas iniciativas, vrias aes resultam em

    capacitao, melhoria de processos e avanos

    em outros aspectos do trabalho, embora no se

    caracterizem primordialmente como ao de

    capacitao formal.

    H ALGUMAS CRTICAS QUE ACUSAM O

    TCU DE, EM SUA FISCALIZAO DE OBRAS,

    FREAR INVESTIMENTOS. COMENTE, POR

    FAVOR.

    >> Inicialmente, necessrio ressaltar que a

    prerrogativa de decidir a paralisao de obras,

    assim como a responsabilidade por essa deciso, do Congresso Nacional e, como tal, vem sendo

    exercida. A participao do TCU na prestao de

    informaes ao Congresso sobre obras com indcios

    de irregularidades decorre do disposto nas Leis de

    Diretrizes Oramentrias (LDOs) de cada exerccio.

    Nos termos estabelecidos na LDO 2013, art. 93

    ao art. 101, cabe ao TCU identificar os indcios de

    irregularidades graves nas obras fiscalizadas e

    comunic-los ao Congresso Nacional, para que este

    delibere pela paralisao ou no de cada obra.

    Ressalta-se que, atualmente, dentre as dezenas de

    milhares de obras em execuo com recursos do

    oramento da Unio, existem apenas cinco obras com

    execuo fsica, oramentria e financeira suspensa em

    virtude da referida sistemtica de fiscalizao de obras.

    EM RELAO AOS INVESTIMENTOS QUE

    VM SENDO FEITOS PARA A COPA 2014,COMO O TRIBUNAL EST SE PREPARANDO

    PARA ACOMPANH-LOS E FISCALIZ-LOS

    DE FORMA EFICAZ E SEM ATRASOS?

    >> A realizao da Copa 2014 apresenta

    materialidade, relevncia e riscos significativos,

    o que ensejou a deciso de acompanhar as aes

    governamentais relacionadas a esse evento.

    O ministro Valmir Campelo foi designado pelo Plenrio

    do TCU para relatar todos os processos constitudos

    no Tribunal relativos Copa 2014. Em funo da

    diversidade de agentes envolvidos - Unio, estados,

    Distrito Federal e municpios - foi celebrado o

    protocolo de intenes que constituiu a Rede de

    Informaes para Fiscalizao e Controle dos Gastos

    Pblicos na Organizao da Copa do Mundo de

    2014 (Rede da Copa). Nesse processo de fiscalizao

    atuam, alm do TCU, o Senado Federal, a Cmara dos

    Deputados, a Controladoria-Geral da Unio (CGU) e os

    Tribunais de Contas estaduais e municipais.

    Os gastos previstos com a Copa 2014 na rea de

    infraestrutura esto estimados em aproximadamente

    R$ 28 bilhes, concentrados na construo ou

    reforma das arenas (R$ 7 bilhes), em obras de

    mobilidade urbana (R$ 12 bilhes) e na ampliao

    ou reforma de aeroportos (R$ 7,4 bilhes). Do

    trabalho desenvolvido pelo TCU, resultou umaeconomia de aproximadamente R$ 600 milhes,

    cabendo destacar a reduo nos oramentos do

    Maracan (R$ 98 milhes) e da Arena Amazonas

    (R$ 87 milhes).

    OS RGOS GOVERNAMENTAIS

    E GESTORES PBLICOS ESTO

    PREPARADOS PARA LIDAR COM GRANDES

    OBRAS PBLICAS? QUAL A POSSVEL

    CONTRIBUIO DO TCU NESSE SENTIDO,

    ESPECIALMENTE EM TREINAMENTO,

    FORMAO E CAPACITAO DE SEU

    QUADRO TCNICO?

    >> Lidar com grandes obras pblicas um desafio

    que exige tecnologias e metodologias avanadas e,

    principalmente, pessoal altamente qualificado. O

    TCU tem se preparado para isso nos ltimos anos,

    bem como para apoiar o desenvolvimento das demais

    instituies de controle nessa empreitada.

    Desde 2010, o Tribunal preocupa-se com a disseminao

    das competncias de controle e, mais especificamente,

    das obras pblicas, em vista dos investimentos

    impulsionados pela realizao da Copa 2014. Nesse

    ano, promoveu-se um curso de 35 horas para 62

    participantes, dentre servidores efetivos das instituies

    que compem a Rede de Controle em cada Estado

    da federao que receber os jogos da Copa 2014,

    especialmente servidores de tribunais de contas dos

    estados e da CGU. Foi um marco na atuao conjunta e

    uma amostra da possibilidade de apoio do TCU.

    A ao do Tribunaltambm alcana

    temas relacionados ao

    crescimento econmico

    do pas, como as

    concesses de servios

    pblicos e as grandesobras necessrias

    superao dos gargalos

    atualmente existentes na

    rea de infraestrutura.Benjamin Zymler

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    ENTREVISTAS

    Em 2011, iniciou-se o desenvolvimento de

    cursos a distncia de alto nvel sobre auditoria

    de obras, num total de 110 horas. So cursos de

    oramento de obras, auditoria de oramento e de

    auditoria e anlise da contratao, que fecham o

    ciclo da fiscalizao de obras. Os cursos j esto

    disponveis aos rgos de controle e permitem

    maior alcance da capacitao.

    Em 2012, paralelamente ao desenvolvimento dos

    cursos a distncia, houve vrias aes destinadas

    Rede de Controle. No incio do ano, realizou-

    se o curso Auditoria de Obras Pblicas, comparticipao coordenada pelo Grupo de Educao

    Corporativa, formado pelos setores de capacitao

    dos tribunais de contas dos estados, e apoiada

    pelo Instituto Serzedello Corra (ISC/TCU). O curso

    capacitou 47 servidores.

    Houve tambm uma edio adaptada do curso, sob

    o nome Planejamento, Oramentao, Licitao

    e Execuo de Obras Pblicas, para funcionrios

    e servidores de companhias de saneamento que

    trabalham diretamente com a elaborao de editais,

    especificaes e planilhas de preos das licitaes

    que envolvam recursos federais repassados pelo

    Ministrio das Cidades. um exemplo de curso

    voltado para as instituies executoras, numa

    atuao preventiva do Tribunal. Outros cursos

    similares foram realizados ou esto programados,

    sempre com 35 horas e com contedo similar ou

    adaptados demanda especfica.

    Para 2013, o ISC continuar o atendimentocoordenado das demandas dos rgos de controle,

    no tema obras e outros. O atendimento prev

    duas semanas de dedicao exclusiva do Instituto

    aos rgos de controle e a realizao de cursos a

    distncia de mesmo nvel que os ofertados para

    o pblico interno. Alm dos cursos especficos

    na temtica controle de obras, j se iniciou, no

    primeiro semestre deste ano, a capacitao em

    auditoria em geral - fundamentos, planejamento,

    execuo e comunicao de resultados. O programa

    de capacitao, que totaliza 80 horas, o mesmo

    utilizado para a atualizao dos auditores do TCU.

    O programa deve capacitar cerca de 100 servidores

    de tribunais de contas at o final deste ano e

    continuar disponvel em 2013.

    Dessa forma, de meados de 2010 at o fim de 2012,

    cerca de 300 servidores de outros rgos tero sido

    capacitados em obras ou em procedimentos de

    auditoria afins, em alto nvel e nos padres do TCU.

    Com os novos cursos e mediante coordenao no

    atendimento das demandas, nossa atual capacidadecomporta maior quantitativo por ano, o que

    acreditamos ser suficiente para a disseminao das

    competncias e possibilidade de sua multiplicao

    nos diversos rgos.

    QUE FATORES RELACIONADOS AO

    CONTROLE DO TCU PODEM CONTRIBUIR

    POSITIVAMENTE PARA OS INVESTIMENTOS

    INTERNACIONAIS NO BRASIL?

    >> A atuao do TCU tem colaborado para conferir

    maior confiabilidade aos grandes projetos de

    infraestrutura que esto sendo implementados no

    pas. Em especial no que concerne s concesses

    de servios pblicos, a atuao da Corte de Contas

    tem contribudo para aprimorar os estudos feitos

    pelo Governo Federal e, consequentemente, para

    ampliar a confiana dos investidores na exatido

    dos nmeros apresentados pela administrao

    pblica. Da mesma forma, a atuao do TCUna fiscalizao da observncia dos marcos

    regulatrios importante para garantir a

    segurana jurdica e a estabilidade desses marcos.

    Considerando que essas duas ltimas qualidades

    so imprescindveis para viabilizar investimentos

    de longo prazo, como so os realizados no setor

    de infraestrutura, fica evidente a relevncia da

    atuao do Tribunal.

    Lidar com grandes obraspblicas um desafio

    que exige tecnologias e

    metodologias avanadas

    e, principalmente, pessoal

    altamente qualificado. O

    TCU tem-se preparado

    para isso nos ltimos

    anos, bem como para

    apoiar o desenvolvimento

    das demais instituies

    de controle nessa

    empreitada.Benjamin Zymler

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    SERGIO F. QUINTELLAentrevista com

    Vice-presidente da Fundao Getulio Vargas (FGV)

    desde 2005, formou-se em engenharia pela Pontifcia

    Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), em

    economia pela Faculdade de Economia e Finanas do

    Rio de Janeiro (Feferj) e em engenharia econmica pela

    Escola Nacional de Engenharia. No exterior, fez mestrado

    em administrao de empresas na Scuola di Formazione

    Ipsoa, MBA na mesma rea na Harvard Business School e

    curso de extenso em finanas pblicas na Pennsylvania

    State University (PSU). Atualmente, membro do Conselho

    de Administrao da Petrobras e do Conselho Tcnico da

    Confederao Nacional do Comrcio. Foi presidente da

    Empresa Internacional de Engenharia e da Companhia do

    Jar. Tambm foi membro do Conselho Monetrio Nacional,

    presidente da Associao Brasileira de Normas Tcnicas e

    do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.

    Nesta entrevista, o vice-presidente da Fundao Getulio

    Vargas (FGV), Sergio F. Quintella, reflete sobre a

    importncia do planejamento para a boa execuo de obras

    de infraestrutura. Aps grandes investimentos no setor,

    at o incio da dcada de 1980, o Brasil observou uma

    certa estagnao nos investimentos em infraestrutura. Na

    recente retomada, nota-se os efeitos desse perodo, como

    escassez de engenheiros qualificados e com experincia.

    Defende ainda que a falta de bons projetos bsicos

    compromete a execuo de qualquer obra. Por fim, destaca

    que o Brasil deve diminuir o Custo Brasil a fim de aumentar

    sua competitividade e atrair mais investimentos.

    RESUMO

    Sergio F. Quintella

    VICE-PRESIDENTE DA FGV EMEMBRO DO CONSELHO DE

    ADMINISTRAO DA PETROBRAS

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    ENTREVISTAS

    FGV PROJETOS: QUAL FOI A

    SUA EXPERINCIA NO SETOR DE

    INFRAESTRUTURA?

    SERGIO F. QUINTELLA: Sou engenheiro de

    profisso e de corao. Formei-me pela Pontifcia

    Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-

    Rio) em plena fase desenvolvimentista, com um

    Plano de Metas voltado para a construo de usinas

    hidroeltricas, estradas de rodagem e ferrovias,

    construo de aeroportos e portos e, finalmente,como sntese do programa, a construo de

    Braslia no Planalto Central. Toda a minha atuao

    na engenharia est ligada a projetos e obras

    nesse setor, desde a construo do sistema de

    abastecimento de gua do Guand (obra de enorme

    proporo em sua poca), no Rio de Janeiro, ao vo

    central da Ponte Rio-Niteri. Presidi a companhia

    responsvel pelo projeto da Usina de Itaip, de

    grande parte do sistema de transmisso de energia

    eltrica, das ferrovias para transporte de minrio

    e do sistema Carajs (minas, ferrovia e porto),

    no Norte do Brasil. Alis, e aqui permito-me uma

    digresso, quando se fala em ferrovias, rodovias,

    portos e aeroportos, a palavra correta logstica,

    fundamental para o escoamento da produo e,

    muitas vezes, responsvel pela competitividade

    internacional de commodities como soja e minrio,

    por exemplo. A rea de infraestrutura, portanto,

    sempre ocupou lugar de destaque em minha

    trajetria profissional.

    De 1957 at incio dos anos 80, quando houve a

    crise cambial e o Brasil correu o risco de no cumprir

    suas obrigaes internacionais, tivemos grandes

    investimentos no setor de infraestrutura. A partir de

    ento, e durante mais de 25 anos, a necessidade de

    ajustes fiscais conteve os investimentos pblicos

    neste setor, o que somente agora parece estar sendo

    retomado. Durante esse perodo de estagnao, houve

    uma reduo significativa na formao de engenheiros.

    No havendo obras de infraestrutura, muitos jovens

    migraram para outras reas e, atualmente, h uma

    carncia muito grande de engenheiros treinados, com

    vivncia e experincia em obras de infraestrutura

    de grande dimenso. uma razo pela qual, por

    exemplo, algumas empresas brasileiras esto sendo

    obrigadas a contratar engenheiros estrangeiros para

    trabalhar no Brasil.

    QUAIS AS ETAPAS QUE DEVEM SER

    OBSERVADAS PARA O SUCESSO DE UMA

    OBRA DE INFRAESTRUTURA?

    >> Qualquer obra de engenharia exige um

    conjunto de etapas a serem percorridas para que o

    empreendimento possa ser conduzido dentro dos

    padres de segurana, qualidade e custos. As obras

    de infraestrutura no fogem a essa regra, antes

    devendo ser integradas a um planejamento feito

    com antecedncia, muito antes da sua execuo,

    nos canteiros de obra e que se desenvolve nas

    pranchetas e computadores dos engenheiros

    projetistas. O projeto, antes de tornar-se um

    trabalho de detalhamento de fundaes, estruturas e

    especificao de equipamentos, passa pelo chamado

    projeto bsico, pea fundamental, por exemplo,

    para a escolha do traado, avaliao das condies

    de solo, regime de chuva etc. Somente a partir

    deste projeto bsico, possvel avaliar os custos doempreendimento com alto grau de preciso. Segue-

    se o projeto detalhado e o incio das obras.

    Sem um projeto bsico de qualidade, no possvel

    desenvolver um bom oramento, ou mesmo uma

    concorrncia para que os preos se encaixem

    dentro do que foi planejado. Essa uma das razes

    pelas quais algumas obras no Brasil so oradas

    por determinado valor e terminam custando duas

    ou trs vezes mais.

    QUAIS OS REFLEXOS DA INFRAESTRUTURA

    NO CHAMADO CUSTO BRASIL?

    >> Nesse momento de retomada de investimentos

    no setor de infraestrutura, uma questo que deve

    ser debatida refere-se ao chamado Custo Brasil.Por que determinados produtos brasileiros, seja

    no campo siderrgico, qumico, petroqumico etc.

    tm um custo de fbrica competitivo com os do

    mercado internacional, mas, quando colocados

    no mercado, so mais caros do que os seus

    concorrentes estrangeiros?

    O Custo Brasil um resultado de vrios fatores,

    sendo que muitos deles esto fora do controle

    dos empresrios que tm aqui suas atividades

    produtivas. Eles incluem a elevada carga tributria,

    o custo da energia eltrica, a complexidade do

    sistema de impostos e taxas, a legislao trabalhista

    e por fim uma deficiente infraestrutura.

    O economista Claudio Frischtak, em trabalho

    recente examinando as perspectivas do Brasil e da

    China, grau de compatibilidade e os investimentos

    em infraestrutura, assim se manifestou:

    No Brasil, ainda investe-se pouco eminfraestrutura. Nas ltimas duas dcadas,

    os investimentos estiveram em mdia em

    torno de 2,3% do PIB, reduo considervel

    quando comparado ao perodo que se inicia

    na dcada de 1970. Com exceo do setor

    de telecomunicaes, a queda nos demais

    segmentos foi acentuada e possivelmente os

    investimentos - no seu conjunto - incapazes de

    cobrir a depreciao do capital fixo, estimada

    em 3%. A implicao clara: deteriorao na

    qualidade e custos dos servios, contribuindo

    para a baixa produtividade da economia e

    arrestando - pelo lado da oferta - o crescimento.

    Uma comparao dos investimentos do Brasil

    em infraestrutura com os de outras economias

    emergentes, mostra no apenas considervel

    dissonncia, mas uma lenta recuperao. Narealidade em 2011 houve uma nova inflexo

    - a taxa de investimento caiu para 2,05%, e

    possivelmente ser inferior a 2% do PIB em 2012.

    No h, no Brasil, infraestrutura para escoar

    a produo brasileira adequadamente. Isso

    acontece com o agronegcio da Regio Oeste, por

    exemplo, que no possui uma rota de transporte

    alternativo pelo Pacfico e deve cruzar todo o pas

    para chegar aos portos que o levaro ao mercado

    internacional. A experincia de transporte de

    combustvel por alcooldutos extremamente

    recente. O minrio produzido pela Vale, em

    Carajs, uma exceo nesse cenrio. Isso

    porque a Vale, antes de ser apenas uma grande

    empresa de minerao, sobretudo uma excelente

    operadora de logstica, capaz de utilizar ferrovias

    e portos de alta eficincia e, assim, competir com

    vantagens em mercados longnquos, como os

    japoneses e chineses. A meu ver, as perspectivas

    da rea so enormes e variadas, as oportunidadesesto abertas para todos os setores e devero

    atrair o capital nacional e internacional. O setor

    de infraestrutura, certamente, o que mais

    levar reduo do Custo Brasil, aumentando a

    competitividade do pas e tornando-o mais atrativo

    ao mercado internacional.

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    A meu ver, asperspectivas da rea

    so enormes e variadas,

    as oportunidades esto

    abertas para todos os

    setores e devero atrair

    o capital nacional e

    internacional.Sergio F. Quintella

    PERODO 1971/1980 1981/1989 1990/2000 2001/2010

    TOTAL (% PIB) 5,42 3,62 2,29 2,32

    ELETRICIDADE 2,13 1,47 0,76 0,67

    TELECOMUNICAES 0,80 0,43 0,73 0,65

    TRANSPORTES 2,03 1,48 0,63 0,71

    GUA E SANEAMENTO 0,46 0,24 0,15 0,29

    TABELA 1

    INVESTIMENTO EM INFRAESTRUTURA NO BRASIL (% DO PIB)

    GRFICO 1INVESTIMENTO EM INFRAESTRUTURA (% DO PIB) DE PASES EM DESENVOLVIMENTO

    FONTE: CASTELAR PINHEIRO (2009) E FRISCHTAK (2011)

    FONTE: FILIPINAS, TAILNDIA E VIETN, BANCO MUNDIAL (2009), CHINA, ASIAN DEVELOPMENT BANK(2010), NDIA, NATIONAL TRANSPORT DEVELOPMENT COMMITTEE (2010), CHILE E COLMBIA MORGAN

    STANLEY (2008-2011), PARA O BRASIL, CUJOS DADOS SE REFEREM MEDIA 2008-2011, EMPRESASABERTAS (PBLICAS E PRIVADAS); SIAFI, CNI E CLCULOS E ESTIMATIVAS PRPRIAS

    ENTREVISTAS

  • 7/30/2019 Cadernos FGV Projetos n 21: Infraestrutura: Investindo no Desenvolvimento do Brasil

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    21

    ATUAO DO BNDES NOSETOR DE INFRAESTRUTURA

    depoimento

    JOO CARLOS FERRAZ

    Em seu depoimento, o vice-presidente do Banco Nacional

    de Desenvolvimento (BNDES), Joo Carlos Ferraz,

    apresenta alguns dos desafios que o Brasil enfrentar nos

    prximos anos e o papel do BNDES nesse cenrio. Todo

    crescimento gera tenso e desequilbrio, e o sucesso de

    um pas em manter essa trajetria de longo prazo depende

    da capacidade da sociedade em reconhecer a existncia

    dessas tenses, a fim de negoci-las e mitig-las. O autor

    comenta o Programa de Acelerao do Crescimento

    (PAC), que renovou os investimentos em infraestrutura

    no Brasil e os desafios nesse sentido. Encerra salientando

    a importncia de garantir solidez aos novos modelos para

    atrair investimentos.

    RESUMO

    Graduado em economia e jornalismo pela Pontifcia

    Universidade Catlica de Minas Gerais (PUC-Minas),

    com doutorado em economia da inovao e polticas

    pblicas pela Universidade de Sussex, Inglaterra. Joo

    Carlos Ferraz foi diretor da Diviso de Desenvolvimento

    Produtivo e Empresarial da Comisso Econmica para

    Amrica Latina e Caribe (Cepal) da ONU e professor

    visitante na Universidade de Tsukuba, no Japo.

    Atualmente professor da Universidade Federal do Rio

    de Janeiro (UFRJ) e vice-presidente do Banco Nacional de

    Desenvolvimento (BNDES).

    Joo Carlos Ferraz

    VICE-PRESIDENTE DO BNDES

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    23Todo crescimento , por definio, desequilibrado.

    Significa dizer que qualquer entrada em

    determinada etapa de crescimento est sujeita

    a tenses, pois o desenvolvimento sempre

    multidimensional.

    A primeira tenso refere-se ao aumento de consumo e

    capacidade de oferta. O consumo pode se r realizado

    de forma imediata, mas o aumento da produo para

    esse consumo depende da capacidade de oferta.

    Portanto, se o consumo cresce, h uma presso

    que aumenta a capacidade de oferta, e, quando se

    trata de um bem durvel mdio, esse aumento de

    capacidade pode demorar dois ou trs anos para se

    concretizar. Considerando o tempo de maturao

    de infraestruturas que devem atender a um possvel

    aumento de consumo, que um processo mais lentodo que o aumento da capacidade de produo, tem-se

    ento uma segunda fonte de tenso: a capacidade de a

    infraestrutura suportar um aumento de demanda por

    seus servios. Finalmente, a terceira fonte de tenso

    provm das competncias e tem por caracterstica o

    longo tempo de maturao de formao das pessoas,

    para que tenham as habilidades e qualificaes

    necessrias para servir infraestrutura.

    Essas so as tenses e os desequilbrios que o Brasil

    enfrentar pelo menos nos prximos 10 anos. O

    sucesso do pas em manter essa trajetria de longo

    prazo depender, em grande parte, da capacidade da

    sociedade em reconhecer a existncia dessas tenses,

    a fim de negoci-las e mitig-las. A nica forma de

    ameniz-las ser mais eficiente na formao das

    pessoas, no desenvolvimento da infraestrutura e na

    produo, alm de melhorar a qualidade no consumo.

    O panorama diante do qual nos deparamos para

    os prximos anos exige que concentremos nosso

    foco tanto na quantidade quanto na qualidade dosinvestimentos. Com eficincia, qualidade e progresso

    tcnico, todas essas tenses sero mitigadas.

    A ltima onda de investimentos em infraestruturas

    realizada no Brasil, de forma sistemtica e

    permanente, ocorreu h mais de 30 anos. Desde a

    chamada crise da dvida, em 1982, a preocupao

    do pas esteve em realizar projetos necessrios

    sua sobrevivncia.

    Uma das reaes imediatas crise foi incentivar

    a reserva em moeda estrangeira. Foi quando

    o pas conseguiu passar de pequeno a grande

    exportador, principalmente de commodities,

    graas aos investimentos que haviam sido feitos

    anteriormente. Logo, foram desenvolvidas

    infraestruturas para canalizar exportaes, a fim

    de sustentar uma crise de dvida que j existia.

    At hoje, e durante muito tempo, se elogia o fato

    de uma determinada empresa que exporta um

    tipo de commodity manter, com muita eficincia,

    o menor custo por quilmetro/tonelada

    transportada no mundo.

    A partir da dcada de 1990, conseguimos estabilizar

    a economia e, mais tarde, entramos em um processo

    de reformas estruturais, principalmente dos ativos

    patrimoniais que existiam nesse pas. Considerando

    o tempo de maturao, foram feitas as privatizaese criadas as agncias reguladoras.

    No perodo mais recente, aconteceram muitas

    mudanas, sendo o investimento o smbolo mais

    marcante dessas transformaes. Entre 2004 e 2005,

    o investimento passou a crescer a taxas maiores do

    que a taxa de crescimento do PIB. Comea, ento, a

    surgir a demanda por infraestrutura. Em 2007, foi

    lanado o Programa de Acelerao do Crescimento

    (PAC), que representava o primeiro esforo

    concentrado em retomar a onda de investimentos

    em infraestrutura depois de cerca de 25 anos.

    No tnhamos, porm, um modelo a seguir. O

    modelo que seguamos anteriormente, apoiado nas

    estatais, era ultrapassado, no funcionava, e foi

    colocado em prtica quando ainda estvamos sob

    um governo autoritrio.

    Nesse novo esforo de investimentos, tnhamos

    o desafio de mudar o modelo, que passou a

    seguir a modicidade tarifria, no qual ganhava aconcesso aquele que oferecia o melhor preo para

    o consumidor.

    O desafio inicial para colocar essas aes em prtica

    era muito grande. No havia, nos ministrios,

    equipes com a competncia para desenvolver um

    projeto legal, um projeto ambiental, um projeto de

    engenharia, ou um projeto financeiro. O pas no

    possua projetos e nem capacidade para elabor-los.

    Essa realidade abarcava todos os nveis. Se no

    havia mo de obra capacitada no ministrio,

    DEPOIMENTOS

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    25

    tambm no havia nas empresas e nem na execuodas obras. O pas no estava acostumado a fazer

    investimentos em infraestrutura.

    O PAC teve incio em 2007 e desde ento temos

    trabalhado de maneira contnua para alavancar

    essa agenda. Uma anlise institucional evidenciaria

    que os investimentos do PAC funcionaram melhor

    onde j existiam mais competncias, tanto no setor

    privado quanto no setor pblico. Esse foi o caso da

    rea de energia eltrica. Esse setor contava com um

    ministrio relativamente organizado, trabalhava

    no modelo de modicidade tarifria e utilizava-se

    de concesses financiadas em longo prazo pelo

    BNDES. A energia eltrica , por isso, o setor que

    mais avana, em que as metas e compromissos com

    o PAC esto atendidos.

    evidente a importncia de se investir mais em

    infraestrutura, e continuamos realizando esforos

    nesse sentido. Um dos desafios melhorar nossa

    capacidade de elaborao de bons projetos.

    Um exemplo digno de nota o chins. Em 2008,

    quando veio a crise bancria, os chineses, que

    vinham numa trajetria de moderao do ritmo de

    sua expanso, tiveram que arremeter sua economia

    e lanaram um projeto de US$ 600 bilhes para a

    infraestrutura. O Brasil, por outro lado, continuou

    sua trajetria pela linha do consumo. No ano

    seguinte notcia do programa realizado pela

    China, visitei o pas e verifiquei a implementao

    de projetos que deveriam levar at dez anos para

    ser executados. Diferentemente do Brasil, a China

    reduzido de funcionrios, a baixa inadimplncia,entre outras caractersticas.

    Apoiamos grandes projetos da infraestrutura e

    do setor industrial, mas tambm temos produtos

    especialmente voltados s micro, pequenas e

    mdias empresas, como o Carto BNDES e o

    Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), que tm

    ampliado o acesso ao crdito para as companhias

    de menor porte. Alm disso, o banco participa de

    fundos no reembolsveis para desenvolvimento

    cultural, social, tecnolgico e ambiental. D,

    ainda, suporte s empresas na condio de banco

    de investimento, permitindo, assim, participao

    direta em companhias por renda varivel, correndo

    risco direto ou atravs de fundos.

    Na tarefa de ajudar na expanso dos investimentos,

    o BNDES tem sido fortemente beneficiado por uma

    deciso do Estado brasileiro, assegurando que no

    faltaro recursos para o banco. A lgica que rege

    essa deciso a de que os investimentos devemcrescer frente do PIB. Nunca tivemos que tomar

    decises no que se refere alocao de recursos, mas

    se eles se tornarem escassos e isso for necessrio, a

    prioridade j est muito bem definida. Trs reas

    tm prioridade superior s demais: socioambiental,

    inovao e infraestrutura.

    No que se refere aos financiamentos infraestrutura,

    eles esto basicamente divididos em duas reas do

    banco, que so a econmica e a social. O desembolso

    na rea de infraestrutura econmica, que inclui

    os projetos de energia e logstica, vem crescendo

    estava em crescimento desde 1978. Tinha, portanto,30 anos de crescimento, acumulando projetos nas

    mais variadas categorias e capacitando pessoas

    para execut-los, quando surgisse a oportunidade.

    Quando o momento chegou, o pas possua um

    estoque de competncias e de projetos prontos.

    No Brasil, uma iniciativa importante no sentido de

    melhorar a qualidade dos projetos foi a criao, pelo

    BNDES e por bancos comerciais, da Estruturadora

    Brasileira de Projetos (EBP). A empresa elabora

    projetos com potencial de serem realizados pelo

    setor pblico. Desta forma, pode oferecer solues

    quando surgirem oportunidades de concesso.

    Hoje, conhece-se com clareza a importncia de ter

    bons projetos para seguir estimulando o crescimento

    da economia, mas essa percepo no nova para o

    BNDES. Em sua histria, o Banco sempre foi chamado

    a dar apoio institucional s polticas pblicas de

    infraestrutura, fazendo estudos ou participando, por

    meio de seus tcnicos, dos esforos de modelagem eimplementao de projetos.

    O BNDES tem sido, obviamente, um dos grandes

    instrumentos para ampliar os investimentos em

    nosso pas. Ele uma instituio que possui duas

    caractersticas muito importantes que a tornam

    capaz de entregar os compromissos aos quais ela

    induzida ou chamada a realizar: a escala e o escopo.

    Com ativos da ordem de US$ 300 bilhes, o Banco

    desembolsa em torno de US$ 80 bilhes por ano, e

    se destaca no apenas pelo seu porte, mas tambm

    por sua eficincia, que se comprova pelo nmero

    sistematicamente acima do desembolso dasdemais reas. A rea de infraestrutura econmica

    previsvel, tem projetos de longa maturao e

    vem crescendo cerca de 20% ao ano. A rea que

    chamamos de infraestrutura social a mais recente.

    Inicialmente trabalhava com saneamento e com o

    financiamento a projetos de mobilidade urbana,

    como metr e trem, e mais recentemente passou

    a financiar investimentos dos governos estaduais.

    Nossa atuao junto aos estados vem aumentando

    nos ltimos anos, e essa nova rea deve ganhar

    espao crescente em nossa instituio.

    Em suma, temos uma gama enorme de desafios

    frente na trajetria que estamos traando, no

    sentido de ampliar a quantidade e a qualidade dos

    projetos e dos investimentos em infraestrutura em

    nosso pas.

    Temos todas as condies de faz-lo, j que

    estamos em um momento muito interessante,

    porque poucas vezes na histria de nosso pashouve consenso em relao importncia dos

    investimentos para impulsionar o crescimento.

    H, entre a direita e a esquerda, ou entre o

    mais ortodoxo e o mais heterodoxo economista,

    o consenso de que o investimento deveria

    ser o carro-chefe do crescimento brasileiro.

    Essa uma bela e auspiciosa notcia, porque,

    politicamente, torna possvel a construo

    de uma maior solidariedade para superar os

    gargalos existentes em diversos setores. Nossas

    fronteiras de oportunidades e a taxa de retorno

    dessas fronteiras so muito boas atualmente.

    DEPOIMENTOS

    Com ativos da ordem de US$ 300 bilhes, oBanco desembolsa em torno de US$ 80 bilhes

    por ano, e se destaca no apenas pelo seu porte,

    mas tambm por sua eficincia (...)Joo Carlos Ferraz

  • 7/30/2019 Cadernos FGV Projetos n 21: Infraestrutura: Investindo no Desenvolvimento do Brasil

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

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    REPENSANDO ASCIDADES: MOBILIDADE,SUSTENTABILIDADE E

    CONVIVNCIA

    depoimento

    JAIME LERNER

    ARQUITETO, URBANISTA E

    EX-PREFEITO DE CURITIBA

    fundamental compreender o funcionamento das cidades

    para fazer investimentos adequados em infraestrutura

    e em desenvolvimento econmico. Em seu depoimento

    Jaime Lerner, descreve as medidas necessrias para um

    bom desenvolvimento urbano. Explica que, alm das

    necessidades bsicas de educao, sade e segurana,

    existem trs importantes pontos para o bom funcionamento

    de uma cidade: mobilidade, sustentabilidade e

    convivncia. O autor d sugestes de como investir nessas

    trs reas, dando foco relao trabalho-moradia e

    importncia de incentivar a integrao socioeconmica e

    cultural em bairros e regies. Lerner afirma que a cidade

    deve ser encarada como um organismo vivo e que possvel

    empreender grandes mudanas a favor da populao em

    um curto prazo.

    RESUMO

    Graduado em arquitetura e urbanismo pela Universidade

    Federal do Paran (UFPR), Jaime Lerner foi prefeito de

    Curitiba por trs mandatos, tendo participado do Plano

    Diretor da cidade. Foi governador do Paran por oito

    anos consecutivos, consultor das Naes Unidas para

    assuntos urbanos e, atualmente, presidente de seu

    prprio escritrio de arquitetura, desenvolvendo projetos

    no Brasil e no exterior.

    Jaime Lerner

  • 7/30/2019 Cadernos FGV Projetos n 21: Infraestrutura: Investindo no Desenvolvimento do Brasil

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    29

    DEPOIMENTOS

    No h investimento em infraestrutura nem

    desenvolvimento econmico sem considerar as

    necessidades das cidades. As cidades so estruturas

    de vida, trabalho e lazer, e essas instncias no

    podem ser pensadas separadamente. Existem

    trs pontos, alm, claro, de educao, sadee segurana, que so essenciais para o bom

    funcionamento de qualquer cidade no mundo:

    mobilidade, sustentabilidade e convivncia, esta

    ltima entendida como tolerncia e coexistncia.

    No possvel separar atividade econmica dos

    assentamentos humanos.

    Em relao mobilidade, existem algumas solues

    viveis: a primeira, est em tornar eficiente o

    sistema de transporte que j existe. Outra soluo

    o transporte pblico, o transporte individual no

    vivel. Defendo at que podemos metronizar

    o nibus, quer dizer, dar ao nibus o mesmo

    desempenho que possui o metr. Mas preciso,

    sobretudo, pensar em alternativas, seja metr,

    investimento na superfcie - como o BRT - a bicicleta,

    como alternativa sustentvel, at novos elementos,

    como o transporte pblico individual. Em Paris,

    h o Autolib, um carro eltrico, que pode ser

    compartilhado e alugado, como as bicicletas.

    O problema da sustentabilidade pode ser resolvido,

    assim como o da mobilidade. Cerca de 75% das

    emisses de carbono se originam na cidade. Sendo

    assim, devemos pensar em mecanismos para a

    diminuio dessa emisso de gases na atmosfera.

    No plano climtico e no da sustentabilidade,

    algumas aes simples podem contribuir, como usar

    menos o automvel, separar o lixo, morar mais perto

    do trabalho ou trazer o trabalho para mais perto da

    moradia. Um dos componentes importantes para

    a tolerncia, para a convivncia, a integrao

    socioeconmica e cultural. No possvel conviver

    em cidades que separam as pessoas por renda,

    idade, funes ou qualquer outro aspecto cultural. Asegregao e o isolamento so trgicos para a cidade.

    Seria ingenuidade dizer que as pessoas vo morar

    no mesmo prdio, mas a convivncia na mesma

    regio, no mesmo bairro, fundamental. Gosto de

    fazer uma metfora da cidade associando-a a uma

    tartaruga. Ao mesmo tempo em que a tartaruga um

    exemplo de vida, trabalho e movimento, seu casco

    tem o desenho de uma prefeitura urbana. Se o casco

    da tartaruga for partido ao meio, vida de um lado e

    trabalho de outro, a tartaruga morrer, e isso que

    est acontecendo em muitas cidades. A cidade ideal

    aquela onde h integrao de funes e de renda,

    estruturando assim o seu crescimento. preciso

    integrar, vida, movimento, transporte e lazer em

    uma estrutura orgnica e de crescimento. Quanto

    mais integrada, mais humana a cidade.

    Todo esse movimento de integrao, s se faz

    possvel pela sustentabilidade, que pode ser

    representada por uma equao entre o que se

    poupa e o que se desperdia. Para resumir, eudiria o seguinte: quando voc quer criatividade

    corte um zero do oramento, quando voc quer

    sustentabilidade corte dois zeros do oramento, e,

    por fim, se voc quer solidariedade, assuma a sua

    identidade e respeite a diversidade dos outros.

    O modelo de construo de habitaes populares,

    que situa as pessoas cada vez mais longe do seu

    local de trabalho, desastroso. No existe habitao

    popular decente se no for integrada cidade, e,

    infelizmente, no o que vem ocorrendo no Brasil.

    A melhor soluo nesse sentido preencher vazios

    urbanos e construir sistemas que possibilitem a

    acessibilidade das pessoas. Habitao popular nopode ter como nico destino a periferia. Habitao

    popular no periferia, integrao cidade.

    O mesmo se pode dizer em relao s favelas.

    Cada vez mais, elas devem pertencer cidade.

    Mais alternativas econmicas e de emprego

    precisam ser dadas para que essas comunidades

    se configurem como todo e qualquer outro bairro.

    Sempre defendi a ideia da zona franca da favela, na

    qual quem desenvolver uma atividade econmica

    que gere empregos, no paga impostos. A gerao

    de empregos e renda contribuiria para afastar as

    pessoas das drogas.

    Essas regies tambm apresentam graves

    problemas de habitao. Grande parte delas

    ocupam encostas e, todas as vezes em que se mexe

    no terreno ocupado, algo inadequado acontece.

    Mas h possibilidade de levar infraestrutura sem

    comprometer as moradias: como abastecimento

    de gua, energia e recolhimento do esgoto pelocorrimo das escadarias. Nem todos os problemas

    podem ser resolvidos, no entanto muitas melhorias

    podem ser realizadas: primeiro, a gerao de

    empregos, depois a resoluo do problema do lixo.

    Na verdade, esse problema de fcil soluo. Nas

    encostas de Curitiba, por exemplo, foi adotado

    o sistema de Compra do Lixo 1, um incentivo para

    que o prprio morador descarte seu lixo, em local

    apropriado, para ser recolhido. s vezes, o lixo no

    recolhido porque no h acesso para a chegada

    do caminho.

    Visto que possvel ter solues criativas nas

    comunidades, preciso repensar tambm ashabitaes para as classes mdia e alta. Digo que h

    um processo de dasluzao da construo. Esto

    confundindo valor e preo. Tanto os preos quanto

    o dimensionamento dos imveis esto absurdos,

    exagerados. As moradias esto superdimensionadas,

    com vrios pavimentos, e o aumento do nmero de

    metros quadrados aumenta o custo da obra. Outro

    problema dessa tendncia em superdimensionar

    as construes o afastamento de lugares que

    tm infraestrutura, a construo de reas sociais

    que nunca so usadas. Em relao construo, o

    comportamento do novo riquismo, custar muito

    caro para todo mundo. Em algum momento, a

    situao imobiliria ficar insustentvel do ponto de

    vista econmico.

    A cidade precisa ser pensada como um organismo

    vivo, qual todos tenham acesso. necessrio

    e possvel assegurar as condies de integrao

    de vida, trabalho, lazer, moradia e emprego. Os

    governantes precisam direcionar energia, no sentidode mudar as tendncias que no so desejveis. As

    cidades tm muita fora poltica, mas s vezes os

    gestores delegam isso burocracia. E a burocracia,

    por sua natureza, postergadora. As decises devem

    ser tomadas para benefcio imediato da populao.

    Costumo dizer que em trs ou quatro anos possvel

    fazer uma grande mudana em uma cidade e

    continuo afirmando isso.

    1O Programa Compra do Lixo constitui-se numa forma alternativa de Coleta Domiciliar, destinada a atender as camadas menos favorecidas da populao. Paracada saco de lixo contendo de 8 a 10 Kg de resduos depositados na caamba, o participante recebe um vale, que troca por produtos alimentcios. A Associaode Moradores, pelo trabalho de parceria com a Prefeitura, recebe 10% do valor pago por cada saco de lixo depositado na caamba. Este dinheiro depositadoem conta corrente bancria em nome da Associao, que utiliza este recurso em obras ou servios definidos pela prpria comunidade.

    (...) quando voc quer criatividade corte um zero dooramento, quando voc quer sustentabilidade corte dois zeros

    do oramento, e, por fim, se voc quer solidariedade, assuma a

    sua identidade e respeite a diversidade dos outros.Jaime Lerner

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    31

    CENRIOS EOPORTUNIDADES PARAO SETOR DE SERVIOS:

    PLANEJAMENTO,ENGENHARIA E ANLISE

    ECONMICA

    artigo

    CESAR CUNHA CAMPOS

    DIRETOR DA FGV PROJETOS

    O Brasil se encontra em um momento economicamente

    positivo. Inflao e taxa de desemprego seguem reduzidos,

    enquanto crescimento se mantm estvel. Esse cenrio

    impulsiona a demanda por diversos servios, como

    energia, transporte, saneamento e habitao, e alerta para

    a necessidade de investimentos em infraestrutura. Neste

    artigo, Cesar Cunha Campos, diretor da FGV Projetos,

    traa um panorama do setor, destacando as importantes

    iniciativas que vem sendo realizadas, como o Programa de

    Acelerao de Crescimento e o Programa de Investimento

    em Logstica. preciso planejamento estruturado,

    integrado e coerente para superar os gargalos existentes e,

    nesse contexto, as oportunidades para o desenvolvimento

    de projetos so excelentes.

    RESUMO

    Graduado em engenharia civil pela Pontifcia

    Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), mestre

    em administrao empresarial pela London Business

    School e doutor em planejamento de transportes pela

    Technische Universitt Wien, ustria. Desde 1975,

    integra e lidera vrios projetos em gesto, planejamento,

    engenharia, economia e finanas. Desenvolveu projetos

    para as principais empresas brasileiras, pblicas e

    privadas, especialmente anlises de viabilidade para a

    captao de recursos nos principais bancos e agncias de

    desenvolvimento (tais como BNDES, IRDB, BID e OECF) e

    tambm projetos no mbito internacional. Desde 2003,

    diretor da FGV Projetos, unidade de assessoria tcnica da

    Fundao Getulio Vargas (FGV).

    Cesar Cunha Campos

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    33

    Um dos temas centrais da agenda brasileira atual

    a questo da infraestrutura, por se caracterizar

    como base de sustentao do crescimento

    socioeconmico nacional.

    A previso do crescimento econmico brasileiro

    para 2013 da ordem de 4%, devendo manter-se

    nesse nvel ao longo da prxima dcada. Os juros

    esto em patamares historicamente baixos (7,5%

    ao ano), a inflao se mantm em torno da meta

    (4,5%, em 2012) e a taxa mdia de desemprego estem 5,4% (julho/2012). A dvida lquida do setor

    pblico prossegue sua trajetria descendente, tendo

    atingido 36,5% do PIB, em 2011. Os investimentos

    estrangeiros diretos foram de US$ 67 bilhes (2011),

    com projeo para US$ 55 bilhes em 2012, e as

    reservas internacionais do pas chegam a US$ 377

    bilhes (agosto/2012). Apesar do contexto de crise

    internacional, as exportaes seguem trajetria

    ascendente, tendo passado de US$ 137,8 bilhes

    (2006) para US$ 256 bilhes (2011), devendo atingir

    cerca de US$ 264 bilhes, em 2012.

    Para que esses nmeros se consolidem e se

    expandam, fundamental um conjunto expressivo

    de investimentos em setores de infraestrutura,

    como energia, telecomunicaes, transportes

    rodovirio, ferrovirio e areo, portos e aeroportos,

    hidrovias e saneamento bsico. Esses segmentos,

    certamente se constituem em pilares fundamentais

    para as atividades econmicas de uma nao.

    Ao longo da primeira dcada de 2000, a elevao do

    nvel de renda da populao aumentou a demanda

    por energia eltrica, transporte, saneamento

    e habitao, levando a uma expectativa social

    crescente por maiores investimentos nesses

    setores. Alm dessas necessidades, o Brasil conta

    com importantes iniciativas em andamento.

    O Programa de Acelerao do Crescimento

    (PAC), iniciado em 2007, prev investimentos

    de US$ 0,7 trilho, at 2021, na implantao

    de projetos de infraestrutura nas reas de

    transporte, energia, saneamento, habitao e

    recursos hdricos. J o Programa de Investimento

    em Logstica, anunciado em agosto de 2012,

    prev investimentos de US$ 63 bilhes, dos

    quais US$ 21 bilhes em 7.500 km de rodovias

    e US$ 42 bilhes em 10.000 km de ferrovias. Ao

    somar essas necessidades, relevante mencionaros investimentos anunciados na indstria de

    petrleo e gs natural (2012-2016), na ordem

    de US$ 236,5 bilhes, enquanto na indstria de

    minerao so estimados US$ 75 bilhes. O cenrio

    favorvel e promissor desses investimentos conta,

    ainda, com a motivao adicional da realizao

    de grandes eventos esportivos que ocorrero no

    pas, em futuro prximo: a Copa 2014 e os Jogos

    Olmpicos de 2016.

    Mesmo com esse elevado volume de investimentos

    programados, o Brasil ainda precisa ampliar seus

    recursos em infraestrutura. Assumindo um padro

    mdio de investimentos de economias consolidadas

    de 2% a 4% do PIB, sero necessrios investimentos

    adicionais da ordem de US$ 1,1 trilho ou US$ 60

    bilhes ao ano, no perodo 2013-2030.

    Os bons resultados da economia e as decises

    polticas so fatores fundamentais, mas outros

    fatores tambm necessitam de ateno. Os

    investimentos em infraestrutura, por serem

    fundamentais para o crescimento econmico e

    requererem recursos financeiros vultosos, devem

    contar com alguns mecanismos relevantes.

    Em primeiro lugar, devem ser bem planejados

    para que, de fato, promovam um aumento de

    produtividade e uma reduo nos custos de

    produo. Em segundo lugar, a expanso da

    infraestrutura deve ser suficientemente rpida

    para sustentar o crescimento econmico. Em

    terceiro lugar, devem contar com um setor pblico

    de planejamento e controle gil, eficiente e atento.

    Por fim, devem existir mecanismos financeiros

    pblicos e privados adequados, alm de uma base

    legal consistente.

    A legislao brasileira se baseia no Estado de

    Direito, com leis e regulamentos consolidadosao longo das ltimas dcadas, que permitem

    claros processos de licitao (Lei n8.666),

    Concesses Pblicas, Parcerias Pblico-Privadas,

    dentre outras possibilidades. Com relao aos

    rgos de planejamento e controle, o Brasil

    conta com uma slida estrutura de Estado,

    com instituies estatais de planejamento,

    com rgos reguladores, com consolidados

    Tribunais de Contas de atuao federal, estadual

    e municipal, bem como Ministrios Pblicos

    eficientes e atuantes. No que diz respeito aos

    agentes financeiros, o BNDES considerado o

    maior banco de desenvolvimento em aplicao de

    recursos do mundo, que disponibiliza fortemente

    seus recursos no setor de infraestrutura. Por fim,

    conta-se no Brasil com um setor financeiro slido

    e moderno, tanto privado quanto pblico: Banco

    do Brasil e Caixa.

    Nesse contexto, pode-se prever que haver uma

    forte e crescente demanda pelo setor de servios

    de planejamento no setor de engenharia e anlise

    econmico-financeira, voltada para o atendimento

    das questes tcnicas e de controle, para as

    necessidades de atendimento s caractersticas

    dos financiamentos pblicos e privados, para a

    elaborao e execuo dos projetos de engenharia

    e suas consequentes implantaes.

    Com os nmeros de investimentos expostos acima,

    e considerando que, para suportar todos esses

    recursos, ser necessrio um ciclo de planejamento

    composto de planos diretores, estudos de

    viabilidade tcnica, econmica e financeira,

    projetos conceituais, projetos bsicos e projetos

    executivos de engenharia, pode-se prever que o

    setor de servios poder contar com cerca de 5 a

    10% do total a ser investido em infraestrutura no

    Brasil nos prximos anos.

    Essa expectativa somente se materializar com

    um forte setor de consultorias especializadas, com

    tcnicas eficientes e profissionais experientes. As

    escolas brasileiras de engenharia e de economia

    devero formar um contingente expressivo de

    bons profissionais, e o mercado brasileiro de

    servios especializados se tornaro mais atraentes

    em mbito mundial.

    Diante de todo esse cenrio positivo e de grandes

    perspectivas, o Brasil vive uma ansiedade associada

    ao seu potencial de desenvolvimento e s suas

    imensas limitaes de infraestrutura. O quadro no

    momento se delineia virtuoso, com a proposio

    e viabilizao de grandes investimentos a partir

    de um planejamento estruturado, integrado e

    coerente. Ser necessrio razovel perodo para

    superao dos grandes gargalos hoje existentes,

    mas as oportunidades na rea de planejamento

    e desenvolvimento de projetos so excepcionais,

    especialmente em gesto e acompanhamento

    de obras, apoio fiscalizao e projetos em

    andamento, e avaliao da conformidade entre

    projeto e execuo.

    ARTIGOS

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

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    AS PARCERIAS PBLICO-PRIVADAS NO BRASIL E

    SEUS DESAFIOS

    artigo

    CARLOS ARI SUNDFELD

    PROFESSOR DA DIREI TO GV/FGV

    O artigo do professor Carlos Sundfeld trata das Parcerias

    Pblicos-Privadas (PPPs). O autor apresenta as diferentes

    formas parcerias entre governo e iniciativa privada ao longo

    do tempo, e a longa tradio brasileira no setor. O conceito

    de PPP como compreendido atualmente cunhado apenas

    a partir da Lei n 11.079/2004, que diferencia concesses

    administrativas e patrocinadas, mas o Brasil se utiliza

    de contratos de concesso desde o sculo XIX. Segundo

    Sundfeld, as parcerias pblico-privadas so vantajosas

    para o governo tanto quanto para a iniciativa privada e

    ainda existem muitas oportunidades a explorar.

    RESUMO

    Graduado em direito pela Pontifcia Universidade Catlica

    de So Paulo (PUC-SP), onde tambm completou mestrado

    e doutorado em direito administrativo e atua como

    professor. professor fundador da Escola de Direito de

    So Paulo da Fundao Getulio Vargas (Direito GV/FGV)

    e scio-fundador de Sundfeld Advogados. Presidente da

    Sociedade Brasileira de Direito Pblico, participou da

    criao da lei nacional de Parcerias Pblico-Privadas, da

    lei mineira de Parceria Pblico-Privada e outros projetos e

    textos legais nessa matria.

    Carlos Ari Sundfeld

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    37

    A expresso Parceria Pblico-Privada possui

    um uso bem restrito na legislao. No entanto,

    preciso estabelecer uma distino entre parceria

    pblico-privada, em sentido lato, que abrange

    diversos tipos de relacionamento contratual entre

    poder pblico e particular, e Parceira Pblico-

    Privada, em sentido stricto, o que a lei brasileira

    chama de PPP especificamente.

    A histria das parcerias pblico-privadas no

    recente, como se costuma mencionar, nem

    na experincia internacional nem no Brasil. Na

    experincia internacional, com a qual a experinciabrasileira mantm intenso dilogo, os contratos

    que, originalmente, geravam essas parcerias, eram

    chamados de contratos de concesso. Desde a

    metade do sculo XIX, existem no Brasil contratos de

    concesso que cabem na ideia de parceria pblico-

    privada tomada em sentido lato. So eles: contratos

    de concesso de servio pblico, de obra pblica e

    concesses setoriais regulamentadas por lei. Trata-

    se de vnculos de longo prazo em que o particular

    assume uma responsabilidade do Estado para

    realizar investimentos, criar uma infraestrutura e

    depois explor-la. Tal explorao se faz sob uma

    regulao, com base e origem em um contrato, que

    estabelece um vnculo e determina as regras que

    vo disciplinar a explorao da infraestrutura.

    Porm, a histria das parcerias, em sentido lato,

    tem altos e baixos na legislao e na experincia

    brasileira. A legislao do sculo XIX comeou a

    tratar desse assunto para um setor especfico: o

    ferrovirio. No sculo XX, esse movimento foi se

    estendendo a outros setores, conforme necessidade

    de desenvolv-los. Na dcada de 1930, foi

    editado o cdigo de guas 1 para regulamentar as

    concesses eltricas, que estavam em ascenso

    devido ao processo de industrializao do pas.

    No incio da dcada de 1960, foi editado o cdigo

    brasileiro de telecomunicaes, quando a Unio

    se tornou a grande prestadora de servios de

    telecomunicaes. Ao longo do tempo, em todos os

    setores foram surgindo leis para regular esse tipo

    de contrato, normalmente com nome de contrato

    de concesso e, eventualmente, com o nome de

    contrato de permisso.

    Consequentemente, foi sendo formada uma

    rica e importante jurisprudncia a respeito dos

    direitos e deveres das partes nesses contratos.

    Essa jurisprudncia espelhou-se em uma doutrina

    jurdica que sempre tratou do tema concesso

    de servio pblico ou obra pblica, procurando

    destacar os poderes que o Estado deve ter nessarelao. Ao lado disso, sempre se afirmou haver

    algo intocvel na relao contratual: o respeito

    equao econmico-financeira do contrato.

    Essa tradio foi sendo formada historicamente

    e continuou a existir mesmo durante o perodo

    de decadncia das concesses, quando o Estado,

    sobretudo a partir da dcada de 1950, passou a

    usar as grandes empresas estatais em seu projeto

    desenvolvimentista. Exemplos desse modelo so

    a Eletrobras, da dcada de 1960, e a Telebras,

    da dcada seguinte. Nesse perodo, os contratos

    de concesso com os particulares foram sendo

    cada vez menos utilizados. Porm, fundamental

    ressaltar que isso no foi feito com confiscos.

    A tradio brasileira sempre respeitou os contratos

    de concesso, criando-se, assim, uma cultura de PPP

    avant la lettre. No perodo acima descrito, o poder

    pblico comprou empresas privadas, que eram

    concessionrias, ou assumiu empresas privadas

    quebradas, sempre tentando respeitar as relaes

    contratuais existentes. Em alguns casos, deixou

    de usar os contratos de concesso, atribuindo os

    servios diretamente s empresas estatais, mas sem

    jamais abandonar a ideia de concesso.

    No que diz respeito s parcerias pblico-privadas,

    nunca na histria do direito brasileiro deixamos de

    seguir a orientao segundo a qual elas so relaes

    contratuais, a que o Estado tambm deve respeito.

    Assim, a realizao de valores pblicos sempre se

    pautou pelo contedo previsto nas clusulas dos

    contratos originais, ou nas eventuais modificaes

    realizadas pelo poder pblico, mas com observncia

    dos direitos expressos na equao econmico-

    financeira e nas normas jurdicas aplicveis.

    Na dcada de 1990, ocorre uma renovao da

    legislao, que dar origem expresso PPP.

    Diferentemente do que ocorreu em outros pases da

    Amrica Latina, essa renovao foi extremamente

    bem-sucedida no Brasil, graas slida base jurdicae institucional construda ao longo de dcadas.

    LEGISLAO

    Em 1995, foi editada a Lei N 8987, uma lei

    nacional para as concesses. At ento s havia,

    no Brasil, leis setoriais. O objetivo da nova lei era

    retomar o uso das concesses, consolidando ideias

    j seguidas na cultura e na experincia jurdica

    brasileira, para permitir privatizaes e outros

    projetos em parceria com a iniciativa privada. A

    lei consolida ideias j presentes na tradio do

    pas, ajustando apenas alguns pontos, referentes

    aos poderes da administrao e determinao de

    preos em contrato.

    Embora as concesses tivessem se consolidado a

    partir de uma relao contratual com o particular,

    administrao pblica eram reconhecidos poderes,

    chamados exorbitantes, de modificar o contrato.

    Pelo modelo jurdico existente, o governo poderia

    extinguir um contrato de concesso, retomando

    os servios e deixando o particular credor da

    administrao pblica. Era preciso, portanto,

    estabelecer limites claros e rgidos para esse tipo de

    ao, a fim de aumentar a segurana do particular.

    A nova lei de concesses manteve o poder de

    a administrao pblica encampar2 o servio

    outorgado a empresa privada concessionria,

    estabelecendo, no entanto, dois condicionantes:

    a concordncia do poder legislativo em cada

    caso, o que dificulta o processo de encampao,

    e a exigncia de pagamento de indenizao

    prvia extino do contrato. Essas iniciativas

    aumentaram a segurana do acordo, uma vez que

    tornou desvantajoso para o poder pblico extinguir

    antecipadamente esses contratos.

    No perodo das estatais, no qual algumas dessas

    empresas eram tambm concessionrias, e o

    poder pblico assumia os papis de regulador econcedente, essas relaes contratuais sofreram

    deterioraes. Esse foi o caso da fixao de

    tarifas, por exemplo. No caso de empresas estatais

    concessionrias, as tarifas acabavam sofrendo

    flutuaes conforme a poltica, sendo reelaboradas

    ano a ano, sem seguir regras contratuais. A nova

    lei retomou o valor do contrato, estabelecendo

    a obrigatoriedade de licitaes para todas as

    concesses, prevendo tarifas fixadas por contrato.

    A Lei n 8987/95 regula o que entendemos por

    concesso comum, aquela mantida integralmente

    com tarifas cobradas dos usurios finais. Essa

    lei permitiu que o processo de privatizaes, que

    havia se iniciado no governo Fernando Collor,

    passasse a ter uma slida base legislativa, baseada

    em experincias jurdicas consistentes. Desde sua

    criao, mantm-se um instrumento referencial

    para o julgamento de aes judiciais relacionadas

    ao tema.

    Em 2004, foi elaborada uma lei para completar

    a Lei n 8987/95. A Lei n 11.079/2004, por cuja

    concepo fui responsvel, inaugura o conceito

    de PPP (em sentido estrito) a partir da criao e

    regulamentao de dois novos tipos de contratos

    de concesso. Esses contratos so as concesses

    patrocinadas e administrativas, para celebrao

    de contratos de longo prazo entre poder pblico e

    1O nome se deve matriz eltrica adotada no Brasil, que priorizava a energia hidreltrica. 2 importante menci onar que, embora a encampao fosse possvel em v rios setores por lei ou pelo texto dos contratos, no houve no Brasil uma prti cageneralizada de retomada arbi trria pelo Estado de serv ios dados em concesso.

    ARTIGOS

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

    39

    iniciativa privada. Na lei brasileira, o conceito de PPP

    refere-se, portanto, a esses dois tipos de contrato.

    A concesso patrocinada a concesso de um

    servio pblico ou da explorao de uma obra

    pblica em que, alm da tarifa paga pelo usurio,

    h um adicional pago pelo poder pblico. Esse

    arranjo se aplica aos casos em que as tarifas

    cobradas dos usurios no so satisfatrias para

    compensar os investimentos realizados pelo

    parceiro privado. J a concesso administrativa, tem

    sua tarifa inteiramente paga pelo poder pblico e

    aplicada a servios de responsabilidade do Estado,

    como sade, educao ou segurana pblica,

    reas estratgicas que envolvem investimentosmacios em infraestrutura pblica, cuja gesto

    extremamente complexa e requer profundos

    conhecimentos tcnicos. A lgica que rege esses

    contratos a mesma que rege os contratos de

    concesso comum, com a diferena de que a tarifa

    paga pelo Estado e no pelo usurio final.

    Historicamente, a grande diferena entre as

    concesses administrativas e outros contratos

    utilizados pelo poder pblico para criar

    infraestrutura de primeira necessidade, a forma

    de contratao da iniciativa privada. Se antes o

    Estado abria licitaes separadas para contratar

    as aes de projetar escolas, fazer obras e comprar

    materiais, alm de realizar concursos para contratar

    profissionais em um processo operacional

    altamente complexo, com gerenciamento

    simultneo de vrios contratos, a concesso

    administrativa permite juntar esse conjunto e norme

    de operaes em um nico contrato. Assim, o poder

    pblico transfere ao particular parte do risco daconcepo do empreendimento, da flutuao de

    preos e da obsolescncia do servio.

    Alm da criao de leis nacionais para regulao

    dos modelos de concesses, o Brasil assistiu,

    desde o princpio da dcada de 1990, renovao

    e ao surgimento de uma ampla variedade de leis

    setoriais. Essas leis dedicaram-se a regular com

    mais detalhe a aplicao dos modelos em setores

    especficos, tratando suas particularidades.

    A legislao brasileira , portanto, bastante

    sofisticada e no apenas cuida de questes

    especificamente contratuais, mas tambm regula,

    disciplina, organiza e estrutura, institucionalmente,

    os vrios setores. Para isso, cria agncias

    reguladoras, com independncia, e atribui a elas a

    tarefa de estabelecer regras regulamentares, alm

    de cuidar da execuo desses contratos.

    CONSIDERAES FINAIS

    As Parcerias Pblico-Privadas apresentam

    vantagens tanto para poder pblico quanto para

    iniciativa privada. Para o governo, representama possibilidade de uma rpida expanso da

    infraestrutura independente de arrecadao

    tributria prvia. Alm disso, h uma enorme

    economia de custos, no longo prazo, gerada pela

    eficincia das contrataes.

    Do ponto de vista do setor privado, so

    oportunidades de negcio. Os modelos de

    concesso esto forando um rearranjo do setor

    privado, que se estrutura em novos tipos de

    organizao empresarial. Se, no passado, eram

    grandes empreiteiras que assumiam a implantao

    da infraestrutura pblica, por meios de contratos

    de obras, atualmente essas mesmas empresas

    se transformaram em concessionrias, com

    capacidade para desenvolver relacionamentos de

    nova natureza com todos os atores envolvidos.

    Embora a experincia brasileira no setor seja

    complexa e sofisticada, h muitas oportunidades

    ainda a explorar. Os estados e municpios tmaplicado os novos mecanismos de concesso nas

    reas que so de sua responsabilidade, como

    educao bsica, sade e segurana. O grande

    desafio est na montagem de projetos que deem

    conta de todas as etapas necessrias para a

    realizao de transferncia de capital, e sua

    posterior gesto. Nesse processo, destaca-se a

    qualidade tcnica como item fundamental para que

    o desenvolvimento do projeto seja bem-sucedido.

    ARTIGOS

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    CADERNOS FGV PROJETOS /INFRAESTRUTURA: INVESTINDO NO DESENVOLVIMENTO DO BRASIL

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    LOGSTICA EINFRAESTRUTURA NO

    BRASIL

    artigo

    MANOEL REIS

    PROFESSOR DA EAESP/FGV E

    COORDENADOR DO GVCELOG

    Nas ltimas dcadas, temos testemunhado um aumento

    de concorrncia que tornou os mercados mais dinmicos

    e globalizados. Em seu artigo, Manoel Reis fala da

    posio brasileira nesse novo cenrio competitivo, nossas

    deficincias em diversos modais de transporte e as

    consequncias desses gargalos. Comenta as duas edies do

    Plano de Acelerao do Crescimento (PAC e PAC 2) e o Plano

    Nacional de Logstica e Transporte (PNLT), desenvolvido

    pelo Ministrio dos Transportes. Por fim, o autor aponta

    perspectivas e d sugestes para que possamos suprir

    nossas deficincias de infraestruturas logsticas.

    RESUMO

    Graduado e mestre em engenharia naval pela Universidade

    de So Paulo (USP), doutor pelo Massachusetts

    Institute of Technology (MIT). Professor na Escola de

    Administrao de Empresas de So Paulo da Fundao

    Getulio Vargas (EAESP-FGV), scio-diretor da MARE

    Logstica. representante da EAESP no Captulo Brasil

    do Supply Chain Council.

    Manoel Reis

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    VISO GERAL

    At a dcada de 1960, o ciclo de vida dos produtos

    era mais longo e as incertezas do mercado menos

    intensas, com baixa concorrncia. Assim, fazia

    sentido perseguir a excelncia nos negcios atravs

    da gesto eficiente de atividades isoladas, como

    compras, transportes, armazenagem, produo,

    manuseio de materiais e distribuio.

    A partir da dcada de 1970, inciou-se no mundo

    um processo de crescimento da concorrncia,

    em virtude do aumento da oferta de bens e

    servios, que, aos poucos, superou a demanda,tornando os mercados cada vez mais dinmicos

    e globalizados, trazendo consequncias diversas,

    entre as quais se destaca o encurtamento do

    ciclo de vida dos produtos. Nesse contexto

    de concorrncia acirrada, os clientes esto se

    tornando cada vez mais informados e exigentes,

    fato que, nas ltimas dcadas, induziu o foco na

    gesto integrada das atividades que compem

    a cadeia de abastecimento, tanto internamente

    nas empresas, quanto no relacionamento entre

    os membros da cadeia estendida. Com a grande

    semelhana que vem se estabelecendo entre os

    bens produzidos por diferentes fornecedores (uma

    certa comoditizao), aflorou a necessidade de

    estabelecer a diferenciao competitiva entre

    os mesmos. Os dois fatores mais importantes

    para essa diferenciao so a reduo de custos

    e a agregao de valor, especialmente o valor

    intangvel, aquele que no est intrinsecamente

    associado ao bem, mas que oferecido juntamente

    com ele, incluindo disponibilidade, servio,atendimento, entre outros.

    A logstica a parte da gesto da cadeia de

    abastecimento responsvel por executar o fluxo

    de materiais e informaes correspondentes

    ao longo da cadeia, e tem por principal misso

    disponibilizar, de forma eficiente e eficaz,

    materiais e produtos onde se faam necessrios,

    especialmente os produtos acabados nos pontos

    O Brasil o quinto pas do mundo em extenso

    territorial, atrs da Rssia, Canad, China e Estados

    Unidos, e tem uma forte vocao para a produo

    e exportao de commodities agrcolas e minerais.

    Dentro desse contexto, fica clara a necessidade de

    modais de mais baixo custo, como o hidrovirio e o

    ferrovirio, para a movimentao de longa distncia

    dessas cargas e para a prtica da intermodalidade.

    No entanto, a distribuio modal tem uma forte

    concentrao no modal rodovirio, com 61% da

    produo de transporte; participao de 21% domodal ferrovirio; cerca de 1% do modal fluvial;

    13% do modal martimo na cabotagem; e os 4%

    restantes ficam com os modais dutovirio e areo.

    Comparada s matrizes de transporte de outros

    grandes pases, que tm participao maior dos

    modais ferrovirio e fluvial, essa distribuio modal

    mostra-se inadequada, por ser causadora de custos

    excessivos e aumento substancial nos tempos de

    trnsito, nus que rouba competitividade do pas.

    de demanda. Assim, a logstica um instrumento

    essencial na agregao de valor intangvel aos bens

    e na racionalizao das operaes e consequente

    reduo de seus custos.

    Isso posto, pode-se afirmar que uma logstica

    competente um instrumento essencial para a

    diferenciao e competitividade entre empresas

    concorrentes e, mais ainda, para a competitividade

    de um pas.

    A ATUAL CONDIO BRASILEIRA EM

    INFRAESTRUTURA LOGSTICA

    No Brasil, as mudanas j mencionadas ocorreram

    principalmente a partir do incio da dcada de

    1990, com a abertura comercial que incrementou

    sobremaneira a concorrncia para as empresas

    do pas, at ento acostumadas ao protecionismo

    do Estado.

    Claramente, a competitividade brasileira

    hoje profundamente dificultada pela situao

    calamitosa de sua infraestrutura logstica, fato

    de conhecimento geral e que vem sendo alvo de

    iniciativas governamentais que, at o momento,

    pouco alteraram o quadro, de forma que o problema

    se aprofunda e se agrava. H uma grande inpcia

    no planejamento e, em especial, na implantao de

    projetos de infraestrutura, que se arrastam no tempo,

    aumentando os custos e impedindo consistentemente

    o cumprimento dos cronogramas estabelecidos.

    Conforme o Grfico 1, em 1975, os investimentosbrasileiros em infraestrutura logstica foram de

    cerca de 1,8% do PIB. No entanto, esse percentual

    foi se reduzindo ao longo dos anos e se estabilizou

    em torno de 0,2%, entre 1990 e 2004, num

    momento em que, em virtude do brutal crescimento

    da concorrncia internacional, o pas mais

    necessitava de infraestrutura logstica adequada. A

    partir de 2004, os investimentos voltaram a crescer,

    atingindo, em 2011, cerca de 0,65% do PIB.

    Os baixos investimentos na infraestrutura geraram

    gargalos em todos os modais de transporte,

    conforme segue:

    RODOVIAS

    Nveis insuficientes de conservao e

    recuperao

    Dficit de capacidade da malha em regies

    desenvolvidas

    Inadequao de cobertura nas regies em

    desenvolvimento

    FERROVIAS

    Extenso e cobertura insuficiente da malha no

    territrio nacional

    Quantidade excessiva de passagens em nvel

    Falta de contornos em reas urbanas

    Invases de faixa de domnio

    GRFICO 1

    INVESTIMENTOS DO MINISTRIO DOS TRANSPORTES EM INFRAESTRUTURALOGSTICA ENTRE 1975 E 2010 (% DO PIB)

    FONTE: PNLT - PLANO NACIONAL DE LOGSTICA E TRANSPORTE, 2011

    ARTIGOS

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    45PORTOS

    Limitaes ao acesso martimo

    Restries ao acesso terrestre (rodo e ferrovirio)

    Deficincias de retrorea e beros

    Modelo gerencial da administrao porturia

    desatualizada

    HIDROVIAS

    Restries navegao pela inexistncia de

    eclusas

    Restries de calado

    Deficincias de sinalizao e balizamento

    PRINCIPAIS CONSEQUNCIAS DESSES

    GARGALOS

    Altos custos logsticos

    Inadequao da matriz de transportes vis--visa vocao brasileira para a produo e exportao

    de commodities

    Falta crtica de ferrovias e de sua integrao,

    com duas alternativas de bitola

    Impossibilidade da prtica da intermodalidade

    na maioria do territrio nacional

    Dificuldade de acesso terrestre e martimo aos

    portos

    Navegabilidade dos rios inviabilizada pela falta

    de eclusas

    Falta de dutos para o transporte de etanol

    Baixa utilizao da cabotagem, de grande

    potencial pela extenso da costa de cerca de

    8.000 km

    O pas enfrenta hoje um enorme desafio a ser

    vencido para atingir um patamar de competitividade

    compatvel com o atual mercado mundial, sem

    contar as necessidades geradas pelos dois grandes

    eventos que o Brasil ir sediar: Copa 2014 e

    Olimpadas 2016.

    PERSPECTIVAS

    O Plano Nacional de Logstica e Transporte (PNLT),

    considerado um plano de Estado, vem sendo

    desenvolvido pelo Ministrio dos Transportes

    desde a dcada passada e prope um conjunto

    de projetos de infraestrutura de transportes que

    objetivam dar um encaminhamento na soluo dos

    problemas de infraestrutura logstica brasileiros.

    O PNLT prev uma significativa alterao na

    matriz de transportes at 2025, tornando-a

    mais equilibrada e duplicando a produo de

    transporte de cargas por ferrovia, com as seguintesconsequncias:

    38% de aumento da eficincia energtica

    41% de reduo de consumo de combustvel

    32% de reduo de emisso de CO2

    39% de reduo de emisso de NOx

    Algumas partes do PNLT foram incorporadas s

    duas edies do PAC, mas, como j comentado, os

    resultados foram bastante insuficientes.

    Em agosto de 2012, o governo federal lanou um

    programa de investimentos de R$ 133 bilhes,

    No ano de 2007, o Governo Federal lanou o

    Programa de Acelerao do Crescimento (PAC), cujo

    objetivo era promover a retomada do planejamento

    e execuo de grandes obras de infraestrutura

    social, urbana, logstica e energtica no pas, de

    forma a contribuir para o seu desenvolvimento

    acelerado e sustentvel. Em 2010, foi lanada

    a segunda fase do Programa de Acelerao do

    Crescimento (PAC 2), que incorpora mais aes nas

    reas social e urbana, alm de mais recursos para

    continuar construindo a infraestrutura logstica e

    energtica para sustentar o crescimento do pas.

    Na realidade, os resultados das duas edies do PAC

    foram insu