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Paulo Victorino
CAPÍTULO DEZ
O FIM DA REPÚBLICA MILITAR
TANCREDO DERROTA O SISTEMA
E SE ELEGE PRESIDENTE
Recolhidos os cacos, feita a contabilidade dos prejuízos, logo
se percebeu que o demônio não era tão feio quanto parecia. A
emenda das diretas não passou, mas, em 15 de janeiro de 1985
haveria eleições indiretas e embora as chances, a princípio, fossem
poucas, poderia ser conseguida uma reversão, impulsionada pelo
clamor do eleitorado.
Na prática, embora se tratando de eleições indiretas, o
eleitorado influiria da mesma forma nos resultados, pois, como
repetia Ulisses Guimarães, nenhum parlamentar vota,
impunemente, contra suas bases.
E, como se viu, o povo, havendo retomado quase que à força o
seu direito de cidadania, não estava disposto a abrir mão dele.
Além do mais, a política é dinâmica e, nos quase nove meses que
nos separavam das eleições, muita coisa poderia acontecer. E
como aconteceram!
A votação da emenda Dante de Oliveira, para a volta das eleições diretas, se
iniciou às nove horas da manhã do dia 25 de abril de 1984, encerrando-se na
madrugada do dia seguinte.
- 206 –
Não que não pudesse ser mais rápida. Acontece, porém, que, a despeito do
cerco policial, vários grupos de entusiastas das Diretas se concentravam na
frente do Congresso, esperando pelos resultados, e temia-se que, caindo a
emenda, como de fato caiu, poderiam ocorrer tumultos, com interferência da
polícia e com resultados imprevisíveis.
Assim, tanto a situação quanto a oposição mantiveram ajustado que a
votação caminharia em ritmo lento, para terminar altas horas da noite, quando
as torcidas já houvessem sido desmobilizadas.
E não era para menos. A Câmara Federal tinha 479 membros e a emenda
somente seria considerada aprovada com dois terços desse universo, ou seja,
com pelo menos 320 votos favoráveis, o que todos sabiam ser difícil de
conseguir.
Todos, menos – é claro – os cidadãos que se aglomeravam em frente ao
Congresso e se iludiam com a larga margem de vantagem que o "sim" levava
sobre o "não". A vantagem era ampla, mas não suficiente para atingir o quórum
qualificado para emendas constitucionais. Na prática, todos os deputados que
se ausentaram estavam, implicitamente, votando também pelo “não”.
Às duas da madrugada, após 17 horas de trabalho, são computados os
resultados: 298 deputados disseram "sim"; apenas 65 disseram "não"; 3
se abstiveram de votar; finalmente, 113 fugiram ao seu dever, deixando de
comparecer para não se comprometer com seus eleitores. Por 22 votos,
apenas 22 votos, a emenda foi rejeitada e arquivada, tornando-se
desnecessária a votação no Senado.
Os jornais atrasaram suas edições e, no mesmo dia 26, saíram às bancas
com os resultados e os comentários da histórica sessão. A Folha de S. Paulo
abriu uma tarja negra ao alto da primeira página com os dizeres: "use preto pelo
Congresso Nacional".
Não precisava pedir. O clima, nas ruas, era de funeral. As pessoas comuns,
alheias à complexidade das leis, não compreendiam bem a mecânica da votação
e a proporção de 5 por 1 a favor das Diretas dava a todos a certeza de que a
emenda passaria com tranquilidade.
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Errado, pois contra a Emenda também foram computadas as abstenções e
as ausências, umas e outras somadas aos votos contrários. Na prática, os que
se abstiveram e os que ficaram em casa, também estavam dizendo "não" às
diretas, embora sem declarar seu voto.
Recolhidos os cacos, feita a contabilidade dos prejuízos, logo se percebeu
que o demônio não era tão feio quanto parecia. Em 15 de janeiro de 1985
haveria eleições indiretas e embora as chances, a princípio, fossem
poucas, poderia ser conseguida uma reversão, impulsionada pelo clamor
do eleitorado.
Tancredo Neves diria, pouco depois: "Vamos para as Indiretas. Com o
nariz tampado, sim, mas vamos." Era uma oportunidade, pois, para repetir as
grandes concentrações públicas, num trabalho de esclarecimento popular e de
renovação das esperanças.
Na prática, embora se tratando de eleições indiretas, o eleitorado influiria da
mesma forma nos resultados, pois, como repetia Ulisses Guimarães, nenhum
parlamentar vota, impunemente, contra suas bases.
E, como se viu, o povo, havendo retomado quase que à força o seu direito
de cidadania, não estava disposto a abrir mão dele. Além do mais, a política
é dinâmica e, nos quase nove meses que nos separavam das eleições, muita
coisa poderia acontecer. E como aconteceram!
Oposição em dificuldades
Na votação da emenda das Diretas, há 479 parlamentares aptos a votar e
todos eles deverão participar, como eleitores, nas eleições indiretas à
presidência da República, em 15 de janeiro de 1985.
As condições, porém, serão diferentes, pois a eleição se dará por um
colegiado formado pela Câmara de Deputados, pelo Senado, e por
representantes de cada Estado, eleitos pelas respectivas Assembleias
Legislativas. O colegiado foi um dos casuísmos feitos por Geisel no
“Pacote de Abril”, para diminuir o peso da derrota sofrida pelo governo nas
últimas eleições legislativas
- 208 -
Agora são 688 eleitores privilegiados a escolher o novo Presidente e a maioria
deles está sob controle, pelo menos aparente, do poder central, que detém a
chave do cofre, regulando a distribuição de verbas aos Estados e municípios,
segundo a fidelidade de cada um.
Por outro lado, os deputados que no primeiro tempo estavam favoráveis às
diretas agora tenderão a votar no candidato de seu partido. Com efeito, eles
defendiam as eleições diretas, mas não a infidelidade partidária.
Além do mais, o governo Figueiredo, escaldado com a debandada que se
ensaiou na votação de 25 de abril, de 1984, passa a se empenhar vigorosamente
para evitar nova rebeldia, pondo em ação todo seu staff, em particular o chefe
da Casa Civil, Leitão de Abreu, e o ministro da Justiça, Ibraim Abi Ackel,
para domar os mais irrequietos, seja pelo convencimento, seja pela intimidação.
Essas serão algumas das dificuldades que a oposição precisará enfrentar
para, efetivamente, participar com candidato próprio nas eleições de 15 de
janeiro de 1985.
A situação no partido governista
Não menos fácil é a situação dentro do partido do governo, o PDS, tanto que
o Presidente, por mais de uma vez, desistiu de coordenar o processo sucessório
por não obter consenso entre as várias correntes.
O problema, neste caso era inverso. Se a oposição tinha dificuldade em
encontrar um candidato sob medida, já na situação havia candidatos
saindo pelas tubulações. Havendo atraído para a antiga Arena a nata dos
políticos em voga na Terceira República (1945-1964) e tendo criado, no decurso
dos governos militares, alguns nomes mais, capazes de assumir o mais alto
cargo da nação, precisava refrear as ambições de todos eles e chegar a um
denominador comum reunindo todas as tendências dentro do PDS.
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Entre os mais insistentes, como pré-candidatos, estavam o vice-
Presidente Aureliano Chaves (já queimado por Figueiredo), Marco Maciel,
Hélio Beltrão, Paulo Maluf, o general Otávio Medeiros e o coronel Mário
Andreazza. Mas, na periferia, circulava uma quantidade enorme de postulantes,
esperando uma oportunidade para fazer valer os seus nomes.
A preferência pessoal de Figueiredo recaia sobre o coronel Mário
Andreazza, ministro do Interior, amigo particular e elemento de sua confiança,
por intermédio de quem se pretendia a continuidade do regime militar no poder.
A noviça rebelde
Pode parecer paradoxal, mas foi importante a atuação de Paulo Salim
Maluf para a reintrodução do país à vida democrática, pelo menos pelo fato
de que sua grande atração pelo poder o levou a, pelo menos duas vezes,
enfrentar a autoridade incontestável dos governos militares.
O primeiro confronto ocorreu em 1978 quando, baseado numa lista tríplice, o
presidente Geisel indicou o banqueiro Laudo Natel como próximo governador
biônico de São Paulo, remetendo o nome ao PDS para confirmação.
- 210 -
Maluf não se conformou em ser preterido e, usando de um direito de cidadão
e membro do partido, apresentou-se para concorrer ao cargo, causando uma
divisão nas hostes governamentais.
Com métodos que lhe são peculiares e uma habilidade política em que
ninguém o supera, Maluf conseguiu reverter as opiniões dentro da convenção
partidária, a qual, contrariando o Sistema, referendou seu nome. Ato contínuo,
o colégio eleitoral elegeu-o governador do Estado de São Paulo para o período
de 1978 a 1982, afastando Laudo Natel definitivamente da política.
Maluf, uma pedra no sapato de Figueiredo
Bem-sucedido na primeira aventura, resolveu repetir o confronto nas eleições
presidenciais. Escolhido o nome do coronel Mário Andreazza como candidato de
consenso, Maluf reagiu e decidiu submeter também o seu nome à Convenção
Nacional do PDS, para se contrapor ao príncipe-eleito, não havendo quem o
demovesse de tal propósito.
Uma virada de 180 graus
Há muito tempo que, no Brasil, não se assistia a uma convenção partidária
tão agitada como aquela em que o PDS realizou a escolha de seu candidato à
presidência da República.
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Toda a linha de apoio ao Presidente, senão por gosto, pelo menos por
conveniência e matreirice, fechou fileiras em torno do candidato oficial do
Planalto que, já sabemos, era o coronel Mário Andreazza.
Maluf, por seu lado, reuniu uma animada e barulhenta claque, que faria inveja
à banda de música de Carlos Lacerda, na antiga UDN. Os partidários do
candidato avulso infernaram a vida do presidente do PDS, José Sarney e tanto
barulho fizeram que era praticamente impossível o prosseguimento da reunião.
Sentindo-se desautorizado, José Sarney anunciou que, a partir daquele
momento, deixava de ser o presidente nacional do PDS e, em seguida,
abandonou a mesa, retirando-se do recinto, no que foi acompanhado pela
ala liberal do partido.
Por essa, não esperavam os opositores. O vice-presidente, que deveria
assumir a mesa no lugar do renunciante, não se achava presente. A sessão foi
suspensa, e só duas horas depois pôde ser aberta, para nada mais decidir.
Paulo Salim Maluf foi confirmado em outra Convenção e tornou-se o único
candidato do PDS a ser referendado nas eleições de 15 de janeiro de 1985, mas
o mar já não era mais calmo e sereno. Uma borrasca se aproximava, e seria a
maior tempestade política que um governo militar já enfrentara, desde o
movimento de 1964.
Os elefantes do general Figueiredo, uma vez mais, fizeram um estrago nas
tropas governistas e, desta vez, o rombo não seria mais consertado.
A equação resolvida
Vejamos como iam os acontecimentos na oposição. Dois nomes apareciam
em todas as conversas como candidatos viáveis para enfrentar as urnas. Um era
o do deputado Ulisses Guimarães, do PMDB, conhecido como "Sr. Diretas"
pela sua participação destacada na campanha das Diretas-Já e pelo equilíbrio
de suas opiniões, que lhe valeu o respeito dos demais partidos da coligação.
- 212 -
O outro nome, igualmente de peso, era o do governador de Minas Gerais,
Tancredo de Almeida Neves, extremamente conservador, mais para a direita
do que para os ideais mudancistas da oposição. Ninguém poderia contestar,
porém, que, por seu poder de conciliação, uma eventual vitória de Tancredo seria
mais facilmente assimilada nos quartéis, ainda suficientemente fortes para virar
a mesa, se achassem conveniente.
Nos outros partidos, era difícil o surgimento de algum nome de consenso.
Leonel Brizola ainda encontrava enormes barreiras nos círculos castrenses e
nos meios políticos. Luís Inácio Lula da Silva, além de ser apontado como
radical de esquerda, não tinha força política suficiente para se impor junto ao
colégio eleitoral.
Pouco a pouco, o nome de Tancredo foi se destacando sobre os demais. Em
16 de maio de 1983, ele já admitia ser o candidato ambivalente, expressão
criada para definir um nome que fosse palatável a todos os partidos de oposição.
Tancredo Neves e seu neto Aécio, então com 20 anos
Aliás, essa manifestação de que poderia ser candidato aconteceu na
presença de dois auxiliares de Figueiredo, os ministros Danilo Venturini e
Nestor Jost, em visita às plantações da pequenina cidade de Iraí de Minas, na
região de Patrocínio, dando a entender que havia entendimentos de bastidores
prevendo a hipótese de a oposição sair vitoriosa.
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Aumentava a possibilidade de a oposição sujar as mãos e participar das
eleições indiretas que tanto combatera. Só não se sabia como ganhar, e ganhar
era preciso, pois seria decepcionante lançar apenas um candidato de protesto,
como em algumas eleições anteriores. Uma segunda derrota, após a campanha
das diretas, seria fatal para a opinião pública. Mas ganhar como?
Esta era a grande incógnita da oposição, uma equação que, aparentemente,
não tinha resposta. Foi então que surgiu inesperada ajuda do deputado Paulo
Salim Maluf na Convenção Nacional do PDS, cujos acontecimentos narramos
no tópico anterior.
Surge a Frente Liberal (FL)
A partir da Convenção Nacional do PDS, os acontecimentos se
precipitam. Todo o bloco moderado do partido se afasta para organizar a
Frente Liberal (FL), que mais tarde viria a ser a base de um novo partido
político, o PFL. Mas, neste momento, era apenas uma frente partidária, uma
facção do PDS e não um novo partido político, e assim seria até as eleições.
Do bloco participavam, entre outras figuras de primeira linha do partido
governista, Aureliano Chaves, vice-presidente da República; José Sarney, até
há pouco o presidente nacional do PDS; Antônio Carlos Magalhães, ex-
governador da Bahia, Cláudio Maciel, ex-ministro da desburocratização, Hélio
Beltrão e muitos outros.
Não era um rompimento com o Planalto, mas apenas uma medida de
sobrevivência, já que, com a eleição de Paulo Maluf, todos eles perderiam seu
espaço político no governo que iria se formar.
Políticos detestam o vácuo, preferem o confronto ao ostracismo.
Enquanto estiverem sendo atacados, continuarão vivos politicamente, em
condições de recuperar o espaço perdido. Seus nomes continuarão
presentes na mídia e o eleitorado irá se posicionando em face dos novos
acontecimentos. O ato, pois, representava apenas uma estratégia que
poderia ser mudada, na medida em que o panorama político se alterasse.
Era preciso deixar as portas abertas para um eventual recuo. A formação
da frente até foi comunicada ao governo central.
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Na primeira quinzena de julho de 1985, o panorama político começou a
se definir. Paulo Salim Maluf era o candidato oficial do PDS. Do outro lado,
8 governadores do PMDB e mais Leonel Brizola, presidente nacional do
PDT, se reuniram em São Paulo para dar apoio ao nome de Tancredo Neves
como candidato da oposição.
Nesse mesmo período, consolida-se a Frente Liberal (FL), pela articulação
de Aureliano Chaves e Marco Maciel. Então, todo o bloco moderado rompe
com o PDS e passa a apoiar Tancredo Neves que, como sabemos, é um nome
bem visto no Palácio do Planalto, como opositor a Maluf.
Em 18 de julho de 1984, a Frente Liberal (que não é partido) escolhe José
Sarney para compor a chapa de Tancredo (PMDB) como candidato a vice-
Presidente e, nesse momento, é firmado um acordo entre a FL e o PMDB,
surgindo dessa coalizão um novo bloco que recebeu o nome de Aliança
Democrática (AD). O PDT de Brizola, já o dissemos, também apoiava o nome
de Tancredo e fazia parte do bloco.
É a Aliança Democrática que irá, daqui para a frente, coordenar os rumos
da campanha da oposição.
Um trabalho de engenharia política
Se julho foi o mês dos ajustes, agosto de 1984 passa a ser o mês das
decisões. No dia 11, uma nova Convenção Nacional do PDS escolhe Paulo
Salim Maluf como seu candidato às eleições presidenciais.
No dia 12, realiza-se a Convenção Nacional do PMDB. Como a Frente
Liberal não é partido, José Sarney – e apenas ele – filia-se ao PMDB,
regularizando sua situação política e, em seguida, o partido lança as
candidaturas de Tancredo Neves à Presidência e José Sarney à vice-
Presidência. (Sarney gostou tanto do novo ninho que permaneceu
definitivamente no PMDB, não se transferindo ao Partido Frente Liberal,
quando este foi, mais tarde, legalizado).
- 215 -
No dia 13, Antônio Carlos Magalhães manda uma carta ao presidente João
Batista Figueiredo anunciando a adesão da Frente Liberal à candidatura de
Tancredo Neves. Nota-se o extremo cuidado em não romper com o Palácio.
Enquanto Tancredo e Sarney iniciam sua campanha pelo Brasil, como se
estivessem em eleições diretas, o PT e alguns outros partidos alheios à Aliança
Democrática saem realizando comícios, insistindo nas eleições diretas, que já
eram, a essa altura, matéria vencida.
Mas como seria isso viável? Simples. Estava tramitando no Congresso
Nacional a emenda Abi-Ackel (nome do ministro da Justiça), propondo
mandato tampão de quatro anos, como sugerido por Figueiredo. A
oposição pretendia apresentar um destaque a tal emenda, propondo, outra
vez, a realização de eleições diretas.
Paralelamente, outros avanços ocorrem. O Senado revoga a Lei Falcão, que
inibia a propaganda política pelo rádio e televisão. A mesa do Senado
regulamenta as eleições indiretas de 15 de janeiro de 1985, estabelecendo,
para o desespero de muitos, que a votação será aberta, com a presença do rádio
e da televisão, e cada membro do Colégio Eleitoral deverá dar seu voto "em
pé e em voz alta". Em resumo, termina o "voto envergonhado" surgido quando
da votação da emenda Dante de Oliveira pelas Diretas..
Neste panorama, encerra-se o tumultuado, mas esperançoso ano de 1984.
Dentro de 15 dias ocorrerá a última reunião do Colégio Eleitoral, elegendo o
primeiro Presidente civil, após 21 anos de ditadura. Ganhe Tancredo ou Maluf,
ficará sepultando de vez o regime militar.
Índio quer apito
Esse período da vida nacional contou com a participação, algumas vezes
folclórica e outras polêmica, do cacique Mário Juruna, líder dos Xavantes,
nascido em Mato Grosso, mas eleito pelo PDT do Rio de Janeiro e, neste
momento, com 42 anos de idade, embora aparentasse menos.
Suas primeiras aparições, junto com outros chefes indígenas, despertaram
interesse e curiosidade, pela simplicidade de seu raciocínio e pela desconfiança
nata com relação ao homem branco, valendo-se sempre de um gravador para
registrar suas conversas com as autoridades.
- 216 -
Eleito deputado federal pelo PDT de Brizola, queria tomar posse vestido a
caráter, isto é, com indumentária indígena e cocar na cabeça, símbolo de sua
autoridade de chefe. Foi difícil demovê-lo desse propósito e convencê-lo a usar
paletó e gravata como todo cara pálida.
Certa vez, almoçou em um restaurante de luxo no Rio de Janeiro e, na hora
de pagar a conta, declarou-se isento, por ser cacique e deputado federal. A conta
foi encaminhada à Câmara, que se encarregou de liquidá-la, advertindo o
cacique de que, no mundo civilizado as regras precisam ser obedecidas.
De outra feita, usando de seu direito regimental, ocupou a tribuna e falou, sem
censura o que pensava a respeito do presidente Figueiredo (imaginem tudo o
que ele disse!), ocasionando uma crise entre Executivo e Legislativo. Com muito
trabalho, seus pares o convenceram a se retratar e apresentar um pedido de
desculpas, evitando enquadramento na Lei de Segurança Nacional.
Agora, desenvolvendo-se a campanha num ambiente de acusações sobre
corrupção e compra de votos no Colégio Eleitoral, o cacique-deputado Mário
Juruna reúne inopinadamente a imprensa e, diante dos olhos esbugalhados dos
repórteres, despeja pacotes e mais pacotes de dinheiro sobre a mesa, dizendo
que havia recebido toda aquela grana das mãos de Galim Eiro (Calim Eid) para
votar em Maluf.
- 217 -
Uma vez mais lhe foi explicado que as coisas não podem ser feitas assim. É
preciso ter prova de todas as acusações que se faz, para não cair no descrédito
e, de quebra, sofrer um processo por crime contra a honra. "Branco é
complicado", comenta o decepcionado cacique.
Maranhão quase desafina
O poder central, com sua ação, mantinha sob controle praticamente todas as
Assembleias Legislativas que iriam eleger os representantes estaduais para o
Colégio Eleitoral.
Surgiu, porém, um foco de rebeldia no Maranhão, onde os parlamentares se
achavam propensos a escolher nomes mais próximos ao deputado José Sarney,
maranhense, ex-presidente nacional do PDS e agora candidato a vice-
Presidente na chapa da oposição. Mesmo desligado do partido e estando filiado
ao PMDB, Sarney controlava uma parte da bancada na Assembleia Legislativa
do Maranhão.
Poucos dias antes da escolha, os deputados recalcitrantes foram
postos em um avião e levados a Brasília, para uma conversa com o
presidente da República. Não foi uma preleção coletiva, como se faz nos
vestiários de um clube antes de começar o jogo. Não, de maneira nenhuma.
O Presidente se ocupou de receber a portas fechadas, em audiência
privada, cada um dos parlamentares, numa conversa ao pé-do-ouvido. Não
se sabe o que foi dito, nem lhes foi perguntado, mas o poder de
convencimento de Figueiredo funcionou.
Pelo sim, pelo não, os deputados estaduais voltaram ao Maranhão e se
tornaram hospedes do governo em hotel de luxo, longe de influências malévolas,
e, no dia da votação, saíram de lá em ônibus especial que os levou diretamente
ao plenário, sem qualquer contato espúrio durante todo o trajeto. A quarentena
valeu, garantindo uma delegação da confiança do PDS.
Eleições – Uma festa como antigamente
Chega, finalmente, o dia 15 de janeiro de 1985. Embora tratando-se de
eleições indiretas, as atenções do Brasil estavam voltadas para a sede do
Congresso Nacional, olhos postos na televisão ou ouvidos colados ao rádio,
acompanhando, voto a voto, o desenrolar do processo.
- 218 -
Para atingir a maioria absoluta (metade mais um do colégio eleitoral,
incluindo ausentes), seriam necessários 344 votos. Eram mais de 11 horas
da manhã quando o deputado João Cunha, chamado pela ordem, declarou
o 344º voto a Tancredo Neves, fazendo estremecer o plenário e
repercutindo o entusiasmo por toda a nação, que acompanhava o evento.
A Folha de S. Paulo de 16 de janeiro reporta aquele momento:
"A festa começou, em Brasília, ao raiar do dia: já havia
entusiasmados manifestantes nos jardins do Congresso e nas
imediações da residência de Tancredo, na Superquadra Sul 206. E
explodiu às 11h35, momento em que o deputado João Cunha
(PMDB-SP), 45, deu a Tancredo o voto número 344, suficiente para
garantir a vitória. (...)
"Proclamado o resultado (houve nove ausências e dezessete
abstenções), Tancredo fez o discurso da vitória, no qual se
comprometeu a promover ‘a organização institucional do Estado’,
convocou todo o povo brasileiro ‘ao grande debate constitucional’
e afirmou que a Constituição ‘não pode ser ato de algumas elites.
É responsabilidade de todo o povo".
Somente o Estado do Espírito Santo não tinha o que comemorar naquele
momento, pois um deslizamento de terra em Tabuazeiro, na região da Grande
Vitória, causou a morte de uma centena de pessoas e um número não calculado
de feridos, o que obrigou o governador Gerson Camata a voltar inesperadamente
ao seu Estado. É a vida que segue a sua rotina...
Como o governo recebe
os resultados
Computados os resultados, a posição final passou a ser a seguinte: votos
dados a Tancredo de Almeida Neves, 480; votos dados a Paulo Salim Maluf,
180; abstenções, 17; ausências, 9; total: 686.
A Folha de S. Paulo narra como foi, do outro lado, a reação à vitória de
Tancredo Neves:
- 219 -
"Antes do discurso, logo após a proclamação, Tancredo
recebeu telefonema de cumprimentos do presidente Figueiredo, do
hospital em que está internado no Rio. Tancredo agradeceu e
retribuiu, desejando ‘muitos anos de vida’ ao Presidente, que
estava [nesse dia] completando 67 anos.
"Paralelamente, Figueiredo deu ordens para que sejam
colocados à disposição de Tancredo, como Presidente eleito, os
serviços de segurança e apoio logístico em suas viagens. O
esquema entrará em funcionamento já na viagem que o eleito fará
ao Exterior, possivelmente a partir do dia 23.
"Figueiredo também reiterou a oferta da granja do Riacho
Fundo, atualmente sem utilização, para que Tancredo nela resida
até a posse, no dia 15 de março."
E Maluf, que perdeu as eleições, como reagiria ele?
“Paulo Maluf, apesar de derrotado, não deixou de sorrir e até se
proclamou ‘vitorioso’, por entender que sua candidatura ‘garantiu o
processo político’, como disse no discurso que encaminhou a
votação o nome do PDS.
"E pouco depois do telefonema do Presidente a Tancredo,
[Maluf] apareceu no auditório em que o vencedor acompanhou a
votação, deu-lhe um forte abraço e lhe desejou muitas felicidades."
A “democracia relativa” do
Presidente Figueiredo
Durante o resto de sua vida, nas entrevistas que concedeu, o general João
Batista Figueiredo sempre se proclamou o fiador da redemocratização do país,
que, segundo ele, somente se completou devido ao seu trabalho, detendo a ação
dos radicais e proporcionando condições para que as eleições, embora indiretas,
ocorressem com plena liberdade.
Os acontecimentos nos bastidores do governo, entretanto, apontam para um
caminho diferente. Figueiredo insistiu bastante em um mandato tampão de
quatro anos (depois pechinchou para três) e seu ministro da Justiça, Ibraim
Abi Ackel, chegou a enviar emenda ao Congresso nesse sentido.
- 220 -
Paralelamente – é o que foi revelado pela imprensa em meados de 1985
– o mesmo ministro vinha articulando com a oposição a possibilidade de
se estender o mandato do presidente Figueiredo, pelo menos por dois ou
três anos, a fim de completar o processo de transição. Em troca do apoio
a essa proposta, o ministro assegurava que, transcorrido o citado período,
seriam realizadas eleições diretas. Tais negociações eram um segredo de
Polichinelo e, a certo momento, foram reveladas pelo próprio ministro Abi
Ackel, saindo, pois, do terreno das especulações.
Pelo PMDB, participaram dos entendimentos o próprio Tancredo Neves,
virtual candidato, o senador Fernando Henrique Cardoso e o ex-deputado
Renato Archer, este último um antigo companheiro de Carlos Lacerda, que a
esta altura já tinha falecido.
De sua parte, Figueiredo nunca deixou de se manifestar contrário às eleições
diretas, questionando se o povo realmente desejava essa mudança, como se
depreende de sua resposta a um interlocutor, o deputado Maluli Neto, do PDS.
Naquele momento, diz Figueiredo:
"Muitas vezes o anseio do povo não representa a vontade da
Nação, pois a massa é manipulável. Veja a ascensão de Hitler na
Alemanha. Ele tinha o apoio do povo e deu no que deu."
Mas os detalhes de toda essa manipulação e da crise que se desenvolveu
nos bastidores, a população só veio a conhecer muitos anos mais tarde, quando
a revista "Isto É", em edição de 8 de janeiro de 1992, publicou os resultados
de entrevista que lhe foi concedida pelo ex-ministro, Maximiano da Fonseca.
- 221 -
As origens do golpe
O almirante Maximiano da Fonseca foi o ministro da Marinha de Figueiredo
até que começou a demonstrar suas simpatias pela campanha das Diretas-Já.
Num primeiro momento, quando todos os ministros eram solicitados a
desconversar, Maximiano declarou, alto e a bom som:
"Só o Congresso pode mudar a Constituição. Que mude e faça as
eleições diretas."
Em março de 1984, o governo procurava disseminar a ideia de que as
Diretas-Já faziam parte de um plano de subversão da ordem, atentatório à
segurança nacional. Já o ministro da Marinha, Maximiano da Fonseca foi claro
ao declarar que não via baderna alguma nos comícios pelas diretas, destoando
assim das declarações pelos demais ministros. Foi, então, levado a demitir-se.
A revista “Isto É” entrevistou também o almirante Alfredo Karam,
igualmente um ex-ministro de Figueiredo, o qual narrou com detalhes uma
reunião havida em setembro de 1984 – dois meses antes das eleições
indiretas – na granja do Torto:
"A reunião foi em setembro, não me lembro o dia, e terminou no
final da noite. Teve a presença do presidente Figueiredo, dos
ministros da Marinha [ele próprio], do Exército, general Valter Pires,
da Aeronáutica, brigadeiro Délio Jardim de Matos, do Estado Maior
das Forças Armadas, brigadeiro Valdir Vasconcelos, do chefe do
SNI, general Otávio Medeiros e do chefe do Gabinete Militar,
general Rubem Ludwig. (...)
"Não foi, é evidente, uma reunião de rotina. Nela tivemos a
oportunidade de definir nossa posição em defesa da legalidade e
do compromisso assumido pelo Presidente perante a nação, de
fazer deste país uma democracia.
"Posso dizer apenas que naquela oportunidade admitiu-se uma
virada de mesa, mas a legalidade era a opção das Forças
Armadas."
Conspiração à sombra do Poder
Tais informes foram confirmados pelo brigadeiro Valdir Vasconcelos,
também presente à reunião. Embora este aponte como origem do encontro na
granja do Torto as tensões causadas pela campanha das diretas, em verdade
esse assunto já fora sepultado em abril, cinco meses antes.
- 222 –
A causa verdadeira foi a formação da Aliança Democrática, com o PMDB, o
PDT e os dissidentes do PDS. Era contra os dissidentes, sobretudo, que o
governo se voltava, pois, eles é que criaram condições para a eleição de
Tancredo Neves, que o presidente costumava chamar de "Tancredo Never"
(nunca, em inglês). Conta a revista “Isto É”:
“Em 1º de junho, em voo de retorno da China, o senador
Marcondes Gadelha teria lançado a seguinte proposta a
Figueiredo: ‘Presidente, outra hipótese que se coloca é a
prorrogação de seu mandato por mais alguns anos’, no que o
Presidente respondera: ‘Eu topo, mas não por dois anos, como
andaram falando por aí, mas por quatro. E sem essa história de
convocar-se uma Constituinte depois. ’ Pressionado a confirmar
essa versão, Gadelha mais tarde se desculpa, dizendo que tivera
uma ‘alucinação auditiva’.
Em 25 de agosto de 1984, na solenidade comemorativa do Dia do Soldado,
o ministro do Exército, general Valter Pires, referiu-se a "minorias radicais e
estéreis que desejam apenas semear a desordem e o caos".
Em 4 de setembro de 1984, portanto, a alguns dias da reunião, o ministro da
Aeronáutica, Délio Jardim de Matos, vai a Salvador e faz um discurso virulento
cujo alvo é o ex-governador Antônio Carlos Magalhães, que aniversariava nesse
dia: "A História não fala bem dos covardes, nem dos traidores."
Antônio Carlos, que não costuma deixar barato, passou a Roberto Marinho
um texto de resposta, que foi divulgado pelo seu jornal e pela Rede Globo:
"Trair os propósitos de seriedade e dignidade da vida pública,
é fazer o jogo de um corrupto..." (Referia-se, nas entrelinhas, ao
candidato do PDS, Paulo Maluf, contra quem ACM afirmava ter
caminhões de provas de corrupção. Esses caminhões devem ter
encalhado em alguma estrada, pois nunca chegaram à justiça e o
assunto foi esquecido após as eleições.)
Um pouco antes, falando ao telefone com Tancredo Neves, que telefonara
para cumprimentá-lo pelo aniversário, ACM manifestou sua opinião de que
estava sendo tramado um golpe contra a candidatura oposicionista ou pelo
menos se procurava, desde já, intimidar o Colégio Eleitoral.
- 223 –
Ministro da Aeronáutica, Délio Jardim de Matos
Enfrentando a crise
Tancredo Neves, que fora ministro da Justiça de Getúlio Vargas na década
de 50 e que passara por várias crises semelhantes em sua longa carreira política,
tratou de montar um Estado Maior informal com homens de sua confiança, para
estabelecer um contato permanente com os militares para, com um intercâmbio
de informações, manter a temperatura em nível suportável, evitando a explosão.
De sua parte, a Marinha, ou o grande número de almirantes contrários ao
golpe, havia preparado um plano a ser executado se houvesse tentativa de
interromper o processo rumo à democracia. Disse Maximiano em sua entrevista:
- 224 -
"Havia gente interessada em se manter no poder. Por isso,
decidi tomar posição com um plano contra o golpe. Nós íamos
bloquear os portos, ocupar áreas vitais, como pontes, com os
fuzileiros navais e denunciar o golpismo à nação. A ocupação dos
portos e a imediata movimentação dos fuzileiros, além do alerta dos
navios de guerra, seriam capazes de responder o golpismo."
Como se sabe, nada disso foi necessário. Aos trancos e barrancos, o
processo eleitoral seguiu até o dia das eleições e, divulgados os resultados, o
Presidente prometeu dar todo o apoio de retaguarda ao presidente eleito
Tancredo Neves. Melhor assim.
Os problemas de fato ocorridos no dia da posse tiveram origem na
doença de Tancredo Neves e sua súbita internação no Hospital de Base em
Brasília. Mas esse é um assunto que não se refere a este capítulo e, mais
ainda, já faz parte da Quinta República que surgia com o fim do período
militar, representado com a posse, no exercício da Presidência, do Vice
eleito com Tancredo, o até então Senador José Sarney.
E a Quinta República não será assunto desta obra, porque ainda está sendo
escrita pelos seus personagens, os que vieram do período anterior, e os que
surgiram no cenário político após a redemocratização do país.
A Quinta República é notícia, é informação, é documentário jornalístico,
mas ainda não é História, pois falta o necessário distanciamento para uma
análise crítica isenta de envolvimento emocional, que oblitera a razão e prejudica
a real visão dos acontecimentos.
Conclusão
O general-presidente João Batista de Oliveira Figueiredo perdeu o
bonde da História. Pelo menos por duas vezes o bonde passou à sua frente
e Figueiredo deixou-o ir, quando poderia ter assumido o lugar que a
História lhe reservara.
Uma dessas vezes foi por ocasião do atentado ao Riocentro,
visivelmente um ato de terrorismo que partiu de dentro do Sistema.
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Como chefe supremo das Forças Armadas, caberia a ele, desde o primeiro
momento, interferir no processo, garantindo sua lisura, mas, ao invés disso,
preferiu deixar que as investigações seguissem pelo caminho tortuoso da
dissimulação, e ao sabor de interesses corporativistas, culminando naquela peça
de ficção preparada pelo coronel Job Lorena. Preferiu se omitir e passou a vida
tentando, sem qualquer sucesso, justificar seu injustificável procedimento.
A outra vez foi por ocasião da campanha das Diretas-Já, uma clara
aspiração da nação brasileira, que ele preferiu classificar como
manipulação da opinião pública.
Tivesse Figueiredo assumido de corpo inteiro a campanha das Diretas,
permitindo que o Colégio Eleitoral restrito fosse substituído pelo grande
eleitorado nacional – fosse qual fosse o resultado – Figueiredo se tornaria o
grande herói nacional, poderia candidatar-se às eleições seguintes ou, se
desejasse, fazer eleger até um poste, tal a popularidade que adviria desse gesto.
Não só se omitiu como, pior ainda, trabalhou abertamente contra as Diretas e
até mesmo contra a redemocratização do país, cuja paternidade sempre
reivindicou.
Figueiredo perdeu o bonde da História ou, para usar uma linguagem que
lhe é familiar, deixou passar o cavalo encilhado e não montou nele. Não
houve outra oportunidade. Seu divórcio com o povo tornou-se irreversível.
Com o tempo, os próprios amigos o foram abandonando, tornando-se uma figura
triste e raivosa, oculta por trás dos portões do seu “Sítio do Dragão”, onde os
incautos visitantes eram atendidos pelo próprio monstro...
Depois, mudou-se para um apartamento, onde, no burburinho da cidade, o
isolamento aparentou maior ainda. Figueiredo morreu em 24 de dezembro de
1999 e o jornal O Estado de S. Paulo disse em seu necrológio:
"Poucos amigos ainda visitavam o apartamento do ex-
Presidente na zona sul do Rio O ex-ministro Ernâni Galveas era um
deles, assim como o general Meton Gadelha, mais assíduo. Nos
últimos meses, a mulher de Figueiredo, Dulce – também apenas
uma lembrança da esfuziante primeira-dama – começou a barrar
as visitas, mesmo as mais íntimas. Alegava ordens do presidente."
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A vida é, em alguns momentos, fatalista, mas, na maior parte dela, é permitido
a cada um de nós o livre arbítrio, dando ao ser vivente a possibilidade de traçar
seus próprios caminhos e colher os resultados daquilo de plantou em sua
existência. Assim, é muita comodidade atribuir ao fatalismo a inapetência em
buscar os próprios caminhos e abrir as portas que surgem diante de cada um,
por vezes trancadas à chave, mas por outras (na maioria dos casos), que se
abrem a um simples girar da maçaneta. Figueiredo escolheu seu futuro.
Emérito criador de frases, o presidente João Batista Figueiredo moldou uma,
que lhe poderia servir de epitáfio: "Me esqueçam."
O povo já o esqueceu, e há muito. Não o odeia, nem o ama, simplesmente o
ignora. Fez por merecer.