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Monografia apresentada ao curso de Licenciatura Plena em Geografia, da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense/UERJ
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UERJ-FEBF UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA BAIXADA FLUMINENSE DEPARTAMENTO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
ALEXSSANDRA JULIANE VAZ
Caracterização e Avaliação dos Problemas de Saneamento e a Qualidade de Vida Ambiental no Bairro do Cangulo- Município de Duque de Caxias (RJ)
Monografia apresentada ao curso de Licenciatura Plena em Geografia, da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense/UERJ
Orientador: Andréa Paula de Souza
Duque de Caxias
2009
2
FICHA CATALOGRÁFICA
Vaz, Alexssandra Juliane.
Caracterização e Avaliação dos Problemas de Saneamento e a Qualidade de Vida
Ambiental no Bairro do Cangulo- Município de Duque de Caxias (RJ)/ Alexssandra Juliane
Vaz. Duque de Caxias, 2009. 87f.: il. Monografia (Licenciatura Plena em Geografia) – Universidade do Estado
do Rio de Janeiro, Faculdade de Educação da Baixada Fluminense, Departamento de Formação de Professores, 2009.
Orientador: Andréa Paula de Souza
1. Problemas Urbanos. 2. Bairro do Cangulo. 3. Problemas Ambientais
3
FOLHA DE APROVAÇÃO
Alexssandra Juliane Vaz
TÍTULO: Caracterização e Avaliação dos Problemas de Saneamento e a Qualidade de Vida
Ambiental no Bairro do Cangulo- Município de Duque de Caxias (RJ)
Aprovado em Duque de Caxias, 13 de Março de 2009.
Banca Examinadora:
______________________________________________
(Andréa Paula de Souza – FEBF/UERJ Orientador)
______________________________________________
(Flavia Lopes Oliveira – FEBF/UERJ)
______________________________________________
(Valesca Silveira Silva – PROURB/UFRJ)
4
Agradecimentos
Durante os anos de faculdade tive o apoio incondicional de pessoas muito
especiais, importantíssimos durante a minha caminhada e fundamentais para que esse
trabalho chegasse ao fim. Agradeço a Deus que me ilumina e dá forças, e aos anjos que
me protegem. Ao meu pai José, que mesmo sem ter sido alfabetizado soube me ensinar
os maiores e mais importantes valores da vida, sempre me alertando sobre a necessidade
de estudar acima de tudo. Assim como à minha mãe, Julia, que sempre cheia de ternura
procurava me ajudar e dar apoio.
Agradeço eternamente aos meus professores, por cada novo aprendizado, e que
além de transmitir conhecimentos serviram de inspiração para a carreira geográfica. E
de modo muito especial, à minha orientadora Andréa Paula de Souza, que sempre
sorrindo conseguiu tornar as coisas mais fáceis, diminuindo meu desespero de estudante.
Lembro ainda dos meus colegas de curso, fiéis companheiros de estudo e aventuras, que
me viram rir e chorar, e me proporcionaram momentos de muitas risadas que jamais
serão esquecidas.
Infinitos agradecimentos também ao bairro Cangulo, palco da minha pesquisa,
aos moradores, que muito me ensinaram durante a realização dos questionários, me
recebendo com respeito e paciência em suas casas, sempre atentos às minhas indagações.
Sem a importante participação de vocês a finalização desse trabalho não seria possível.
Obrigada ainda a todos que me ajudaram na realização dos questionários,
principalmente a minha irmã Juliana.
Não poderia deixar de agradecer ao meu querido namorado William, presente
durante todo o meu curso, por seu companheirismo, paciência, amizade e amor.
Desculpa pelos momentos de estresse e nervosismo, você não merecia meu mau humor.
E aos seus pais, Cícero e Dedé, que me aturaram durante horas na sua casa enquanto eu
usava o computador. A Todos, meus sinceros e eternos agradecimentos.
5
“Uma idéia de cidadania é mais invisível do que um
cano de esgoto, sua instalação pode dar o mesmo
trabalho, mas seu proveito público pode ser maior.
Criar cidadãos conscientes dos seus direitos e do seu
poder também é uma competência municipal”.
(Luis Fernando Veríssimo)
6
RESUMO
Diante das diferenças sócio-ambientais presentes no espaço geográfico, surge a necessidade de estudar a relação existente entre o espaço físico e o bem-estar das populações humanas. Verificando aquilo que pode ser fundamental para a qualidade de vida ambiental. Tomamos como área de estudo o bairro Cangulo no município de Duque de Caxias, analisando as condições de vida da sua população, os equipamentos e serviços urbanos necessários ao bem-estar coletivo. Sobretudo os serviços de saneamento básico, que envolvem a oferta de água tratada e canalizada, a coleta dos resíduos sólidos, a captação e tratamento do esgoto doméstico e o manejo das águas pluviais, conforme a Lei Federal 11.445/07. É traçando um paralelo com o conceito de qualidade ambiental, ao considerar que o homem e o meio exercem influências mútuas entre e sobre si. Ao resgatar o histórico e a conjuntura da Baixa Fluminense, é possível avaliar o processo de formação do município caxiense e consequentemente do bairro Cangulo. Inicialmente ocupado por volta de 1955, o bairro e seus moradores ainda sofrem com problemas de infra-estrutura urbana, revelados na precariedade dos serviços de saneamento básico, que mantém a população sem abastecimento público de água e na presença de esgoto a céu aberto. O saneamento ambiental é considerado primordial para a garantia da qualidade de vida da população. Apesar de essa qualidade ser um desejo comum entre todas as pessoas, e considerando as diversas definições atribuídas ao termo, referentes às condições ambientais e socioeconômicas, vamos partir da análise da relação da população com seu local de moradia. Atentando às necessidades dos moradores que visem o seu bem-estar pleno. Avaliar temporalmente os investimentos públicos em infra-estrutura voltados para o saneamento da região da Baixada Fluminense, seus planos de saneamento, as lutas e conquistas da população nas reivindicações por melhorias. Existe uma relação direta entre o saneamento e a saúde da população, condições ambientais impróprias para moradia acarretam diversos tipos de doenças, como parasitoses, infecções e problemas de pele. Tais enfermidades são ainda mais visíveis nos países não desenvolvidos, entre famílias pobres que habitam áreas desprovidas de saneamento básico, locais com presença de esgoto a céu aberto, água sem tratamento e ruas sem pavimentação, sobretudo na África, Ásia e América do Sul. Sendo inegável que as crianças são as mais prejudicadas. A solução desses problemas está no investimento em serviços e equipamentos de saneamento, principalmente na distribuição da água e posterior coleta e tratamento do esgoto, evitando conseqüências danosas desagradáveis para o meio e para a saúde humana. O respeito às leis que asseguram e regulamentam os serviços de saneamento, assim como o cumprimento de suas diretrizes, torna-se fundamental, constitui um direito do cidadão. Entretanto, compete a ele também participar dos planejamentos e da fiscalização. Assim com o cabe à sociedade civil participar da elaboração do plano diretor municipal. Sendo assim, governantes e cidadãos devem trabalhar em conjunto na construção e preservação do espaço, para que possamos todos gozar de um ambiente limpo e sadio, indispensável para uma vida com qualidade.
Palavras Chave: 1. Problemas Urbanos; 2. Bairro do Cangulo; 3. Problemas Ambientais
7
Lista de Figuras pág.
Figura 1. Localização da Baixada Fluminense (A), em destaque o Município de Duque de Caxias (Modificado de Farias, 2005), visualização dos distritos (B) e imagem do bairro do Cangulo (C) em 2008. Fonte: Google Earth
8
Figura 2. Planta do Bairro do Cangulo (Duque de Caxias), em A (2006), nota-se a falta de infra-estrutura urbana como calçamento, enquanto em B (1985) tem-se uma pequena lagoa que aterrada entre 2006 e 2007, em C visualiza-se área de remobilização de material, utilizado em obras. Em D tem-se a vista geral da REDUC, próximo do bairro do Cangulo. Fonte: Próprio autor
9
Figura 3 Bacia hidrográfica sujeita a inundação, a qual pertence o rio estrela (ressaltado em circulo), em A. Destaca-se em B o número dos pontos de enchentes em Duque de Caxias (Modificado de SEMADS, 2001), enquanto em C visualização de área de inundação no bairro do Cangulo (Jornal do Brasil, 2003).
10
Figura 4 Esquema demonstrando a importância da ação conjunta do poder público e da participação da comunidade para melhor condição de vida ambiental (Kobiyama et. al., 2008).
13
Figura 5 Estimativa de países afetados por mortes a partir da precariedade de qualidade e acesso a água, esgoto e falta higiene em 2000 (Clarke e King, 2005).
27
Figura 6 Esquema do ciclo de relação entre água, saneamento e pobreza (Razzolini e Günther, 2008).
32
Figura 7 Espacialização das operadoras de Água e Esgoto do Estado do Rio de
Janeiro, nota-se que o município de Duque de Caxias tem como operadora a
CEDAE (Sales, 2007).
43
Figura 8 Planta do bairro do Cangulo, em A, nota-se manchas representativas das áreas onde foram realizados os questionários de forma aleatória, enquanto em B, encontram-se tracejadas as ruas onde foram aplicados os questionários em domicílios.
51
Figura 9. Distribuição da classe etária, em A, nível de escolaridade, em B, renda média dos amostrados, em C, e tempo de moradia, em D, dos entrevistados para o Bairro do Cangulo.
56
Figura 10 Condições de moradia e propriedade de habitação (terreno), conforme questionário aplicado por entrevistados (%) por domicilio.
57
Figura 11 Maiores problemas locais por percentagem de entrevistados. Fonte: Próprio autor
58
Figura 12 Percentual de exploração/uso da água, em A, e classes de qualidade da 59
8
água por entrevistados, em B.
Figura 13 Variação percentual dos locais comuns de despejo do esgoto, segundo moradores. Fonte: Próprio autor
60
Figura 14 Variação dos problemas ambientais associados à degradação ambiental e o problema de saneamento, por ordem de importância, na percepção dos entrevistados.
61
Figura 15 Resposta sobre realização de avaliação da qualidade de água dos domicílios, em A, e se o entrevistado gostaria de ser informado sobre a qualidade em relação ao risco à saúde, em B.
62
Figura 16 Formas de abastecimento de água por domicílio, em A, características de qualidade da água, em B, periodicidade de abastecimento pela rede geral, em C, e periodicidade de compra de água em D, por entrevistado/domicílio.
64
Figura 17 Freqüência de ocorrência (%) das possíveis causas da poluição em recursos hídricos por entrevistado/domicílio. Fonte: Próprio autor
65
Figura 18 Despejo do esgotamento sanitário, em A, distância média entre fossa e poço, em B, característica de auto-contrução poço/fossa, em C, visão geral de falta de cuidado do bombeamento da água próximo à vala, em D. Fonte: Próprio autor
68
Figura 19 Associação dos entrevistados (domicílio) em relação a doenças versus problemas ambientais, em A, e ocorrência de doenças na família com falta de controle ambiental, em B.
70
Figura 20 Intenção da população local em ter algum tipo de informação ou participação efetiva no planejamento de obras públicas, em A, alegação de falta de informação sobre obras, em B, e visão das obras de saneamento no bairro, em C e D. Fonte: Próprio autor
71
Figura 21 Percepção dos moradores (domicílio) sobre o que está atrelado a qualidade de vida, em A, percepção sobre a vivência em local com qualidade, em B, opinião sobre responsabilidade na geração de poluição, em C e associação de qualidade de vida com preservação ambiental, em D.
73
9
Lista de Quadros pág.
Quadro 1 Modelo de classificação ambiental de infecções e principais medidas de controle (Razzolini e Günther , 2008)
29
Quadro 2 Relação entre o nível de acesso a água versus necessidades atendidas e grau de efeitos à saúde (Razzolini e Günther, 2008)
30
Quadro 3 Processos e definidores da poluição das águas 36
Quadro 4 Máximos valores de padrão permitidos de bacteriologia na água (Roque, 2002)
38
Lista de Anexos pág.
Anexo 1 Questionário básico para fins de caracterização geral da população local.
80
Anexo 2 Questionário complementar aplicado aos domicílios, para fins de aprofundamento dos problemas ambientais.
82
Anexo 3 Questionário Básico do Censo de 2000, conforme IBGE. 84
Anexo 4 Questionário Suplementar de Meio Ambiente de 2002, conforme IBGE. 85
Anexo 5 Fotografias ampliadas 88
10
Lista de Siglas
ABCON Associação Brasileira das Concessionárias de Serviços Públicos de Água e Esgoto
ABM Amigos de Bairro de Meriti ANAC Agência Nacional de Aviação Civil BID Banco Internacional de Desenvolvimento BNH Banco Nacional de Habitação CEBs Comunidades Eclesiais de Base CEDAE Companhia Estadual de Águas e Esgotos CIDE Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro CPRM Serviço Geológico do Rio de Janeiro CSBF Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense DNOS Departamento Nacional de Obras Públicas DSBF Diretoria de Saneamento da Baixada Fluminense ENSP Escola Nacional de Saúde Pública ETE Estação de Tratamento de Esgoto FASE Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador FEEMA Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Trabalho FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz GT Grupo de Trabalho IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICMS Imposto Sobre Circulação de Mercadorias IDH Índice de Desenvolvimento Humano IDH-M Índice de Desenvolvimento Humano Municipal IEF Instituto Estadual de Florestas IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicada JK Juscelino Kubitschek MAB Movimento Amigos do Bairro MTE Ministério do Trabalho e Emprego MUB Movimento União de Bairros ODM Objetivos do Desenvolvimento do Milênio OGU Orçamento Geral da União OMS Organização Mundial de Saúde ONG Organização Não Governamental PAC Programa de Aceleração do Crescimento PBV Programa Baixada Viva PDBG Programa de Despoluição da Baía de Guanabara PIB Produto Interno Bruto PLANASA Plano Nacional de Saneamento PMDC Prefeitura Municipal de Duque de Caxias PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PPP Parcerias Público-Privadas PSDB Partido Socialista Democrático Brasileiro REDUC Refinaria Duque de Caxias SEDEBREM
Secretaria do Estado de Desenvolvimento da Baixada e Região Metropolitana
SEMA Secretaria do Estado de Meio Ambiente
11
SEMADS Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável SERLA Superintendência Estadual de Rios e Lagoas SESP Secretaria de Estado de obras e serviços Públicos SOSP Secretaria de Estado de Obras e Serviços Públicos TCE Tribunal de Contas do Estado UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro
12
Sumário pág.
1 Introdução 13
2 Objetivos 14
3 Duque de Caxias na conjuntura da Baixada Fluminense 15
3.1 Breve característica do meio físico com relevância aos problemas
ambientais
17
4 Qualidade de Vida e Saneamento Ambiental 23
4.1 Qualidade de Vida 23
4.2 Saneamento Ambiental 30
4.2.1 História do Saneamento na Baixada Fluminense: lutas e ações
30
4.2.2 O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara 34
4.2.3 Saneamento e saúde 37
4.2.4 Tipos e Equipamentos de Saneamento 44
4.3 Características e Contraposições da Lei de Saneamento 52
4.4 Estatuto da Cidade e Plano Diretor: como instrumento de qualidade
59
5 Etapas de Desenvolvimento do Trabalho 61
5.1 Questionários 61
5.1.1 Desenvolvimento e tratamento dos dados 62
6 Análise dos Resultados 66
7 Considerações Finais 87
8 Referencias Bibliográficas 89
13
1 Introdução
As diferenças sócio-ambientais são visíveis nos inúmeros espaços terrestres,
existindo uma série de fatores responsáveis e determinantes pela qualidade de vida
ambiental das cidades. A contaminação dos recursos naturais e a poluição do meio
são fatores contribuintes para a desvalorização do espaço, que acaba por abrigar
uma população de baixo poder aquisitivo, constituindo áreas de segregação sócio-
espacial (Souza, 2000).No entanto, é importante não somente compreender como
essa desvalorização ocorre, mas também quais os interesses sociais envolvidos nos
processos relacionados à produção espacial.
Considerando as condições precárias em que vive exposta grande parcela da
população brasileira, o saneamento básico é encarado como um desafio para os
governantes administradores do país e uma meta a ser alcançado dentro do
planejamento urbano. Sabemos que as características do meio determinam de certa
forma as atividades humanas, assim como os homens exercem influência sobre o
espaço. Portanto, torna-se necessário que haja um equilíbrio entre a vida e o meio
em que vivem, onde os aspectos negativos que interferem na qualidade de vida e
ambiental devem ser superados, em prol do bem-estar das populações e gerações
futuras.
Se as oportunidades e condições de vida não são iguais para todos os seres
humanos, ao se considerar as diferenças de qualidade de vida entre os indivíduos
de uma mesma cidade, torna-se imprescindível investigar as razões das
desigualdades sócio-espaciais e a lógica de interesses dos agentes modeladores do
espaço (Feu, 2007). E que o planejamento urbano, com as contribuições do Plano
Diretor, deve ser instrumento para o desenvolvimento sócio-espacial, pensando as
políticas públicas em saneamento básico como direito assegurado por lei a todas as
pessoas, independente de posição social, visando eqüidade no atendimento e
melhoria na qualidade de vida ambiental.
O município de Duque de Caxias apresenta uma configuração espacial
desordenada onde a maioria dos recursos são destinados ao Centro, ou seja, os
investimentos aplicados no município são mais direcionados para o primeiro distrito.
Tal constatação se dá mediante as carências infra-estruturais básicas verificadas,
por exemplo, no segundo distrito de Campos Elíseos do município, que abriga
diversos bairros precariamente equipados com serviços urbanos, onde se localiza o
14
bairro do Cangulo, recorte espacial em questão. O bairro como parte importante na
vida social e econômica da cidade, merece ser estudado como parte integrante da
sua conjuntura, principalmente por se localizar espacialmente próximo a Reduc
(Refinaria Duque de Caxias), uma das maiores fontes de arrecadação econômica
para o município e para o Estado do Rio de Janeiro.
A análise do bairro envolve discussões acerca da qualidade de vida,
considerando a definição do termo que refere seu uso ao atendimento das
satisfações e necessidades humanas que visem o bem-estar coletivo. O que não
será possível sem a análise da sua inter-relação com o conceito de qualidade
ambiental. Esses, são termos de difícil definição devido às suas complexidades,
trata-se de conceitos amplos e subjetivos, cheios de componentes, que trabalhados
conjuntamente permitem resultados mais precisos. Silva (2006) diz que a qualidade
de vida depende fundamentalmente das características do meio, e termina
constatando que “a melhoria da qualidade de vida da população passa por uma
correspondente melhoria da qualidade ambiental do local onde ela se encontra
instalada” (p. 7).
2 Objetivos
Faz-se relevante caracterizar o processo de ocupação do município de Duque
de Caxias e, consequentemente, à compreensão da ocupação desordenada do
bairro Cangulo, permitindo avaliar a infra-estrutura urbana do local. Pode-se dizer
que os maiores problemas das cidades, em geral, está pautado na ausência de
instrumentos urbanos como a falta de rede de esgoto que evite o lançamento direto
dos dejetos humanos nos córregos da região; de um fornecimento de água
canalizada e tratada que evite a necessidade de perfuração de poços nos quintais,
assim como a utilização de água imprópria pelos moradores; da coleta de resíduos
sólidos nas residências para evitar o acúmulo de lixo em terrenos baldios, capazes
de facilitar a proliferação de animais transmissores de doenças para o homem.
Sendo necessário analisar como o homem altera o lugar e de que forma essas
alterações retornam para a população local e são percebidas pela mesma. Desta
forma, analisar qual o “impacto” da organização estrutural do espaço na qualidade
de vida ambiental da população local e traçar um paralelo entre a urbanização, seus
impactos no meio físico e social. Sendo assim, o presente trabalho visa:
15
- Caracterizar e apontar alguns problemas associados à falta de infra-estrutura
urbana;
- Assinalar e analisar os serviços de saneamento básico relacionados à água, ao
esgoto domiciliar e a coleta de lixo residencial, assim como sua aplicação no bairro;
- Analisar a relação entre a qualidade de vida e a falta de infra-estrutura urbana,
traçando um paralelo entre os conceitos;
3 Duque de Caxias na conjuntura da Baixada Fluminense
Será feito um breve resgate histórico e conjuntural da Baixada Fluminense
(Figura 1A) na tentativa de compreender o processo de formação, assim como as
condições de vida da população do município de Duque da Caxias (Figura 1A), que
faz parte da região metropolitana do Rio de janeiro e situa-se a 22º 47' 09'' S e 43º
18' 43''. A ocupação populacional da Baixada Fluminense teve seu marco no ciclo da
cana de açúcar, que contava com mão-de-obra escrava e no ciclo do ouro, que
utilizava a região como passagem para o escoamento da produção, e seus rios
pertencentes à bacia hidrográfica da Baia de Guanabara faziam a conexão entre o
interior (Minas Gerais) e o litoral (Rio de Janeiro). No final do século XIX, o ciclo do
café (que não substituiu a cultura da cana) propiciou a construção das primeiras vias
férreas. No mesmo século, foram instaladas as primeiras fábricas, de pólvora e
indústria têxtil, que proporcionou o surgimento de vilas operárias, igrejas, armazéns,
escolas, entre outros (Silva, 2007). Destaca-se ainda no final do século o início do
cultivo da laranja, principalmente em Nova Iguaçu.
Investimentos públicos foram realizados no final da década de 1920 para
expansão do sistema de transportes: abertura das avenidas Washington Luís,
Automóvel Clube e antiga rodovia Rio-São Paulo. Além da expansão da rede
elétrica, da eletrificação da Ferrovia Central do Brasil, que caracterizou uma
expansão urbana pelo eixo ferroviária entre 1940 e 1960 e a implantação de
programas de saneamento em 1934, durante o governo Getúlio Vargas. Essas
medidas contribuíram para o desenvolvimento da região, importante fornecedora de
mão-de-obra para a cidade do Rio de Janeiro, o que caracterizou os municípios
como “cidades dormitório” entre os anos de 1940 e 1970 (Figuerêdo, 2004 apud
Silva, 2007). Durante o auge do processo migratório a região foi importante por
16
absorver o excedente populacional da capital, devido sua fácil ligação com a
metrópole e os baixos custos de moradia.
Como os serviços e programas sociais eram direcionados à metrópole, a
região apresentou ao longo da sua história um déficit de equipamentos urbanos de
cultura, lazer, hospitais, universidades, transportes etc. Verifica-se assim uma
precariedade nas ofertas de serviços públicos ou privados que contribuem para a
marginalização social dos seus moradores.
De acordo com o SEDEBREM (Secretaria do Estado de Desenvolvimento da
Baixada e da Região Metropolitana) 2005, a região conta atualmente com 13
municípios, sua área total representa 61% da área total da região metropolitana. E
segundo o Censo Demográfico do IBGE (2000) sua população corresponde a 33%
dos habitantes da região metropolitana, correspondendo a 25% do contingente
populacional do Estado.
Tratando especificamente de Duque de Caxias, seu povoamento data do
século XVI, começou em uma área doada a vários sesmeiros por Estácio de Sá em
1565, onde hoje fica o Núcleo Colonial São Bento. O cultivo da cana-de-açúcar foi a
atividade econômica que ensejou a ocupação da área. Foi importante ponto de
passagem durante o ciclo da mineração, e quando esse entrou em declínio
funcionou como ponto de descanso, abastecimento e transbordo de tropeiros e
mercadorias. Até 1943 chamava-se Vila Meriti, pertencente ao município de Nova
Iguaçu, conseguindo a emancipação política em 31 de dezembro do mesmo ano.
Em 1971, Duque de Caxias foi decretada como Área de Segurança Nacional pelo
regime militar, e retomou sua autonomia em 1985.
Seus limites fazem fronteira com os municípios de Miguel Pereira, Nova
Iguaçu, Petrópolis, Magé, São João de Meriti e Rio de Janeiro. Possui quatro bacias
hidrográficas principais: Meriti, Sarapuí, Iguaçu e Estrela. Até o ano 2000 a
população caxiense correspondia a 23% da população da Baixada, enquanto em
2007 contava com 842.686 habitantes (IBGE, 2007). Nas últimas décadas seu
crescimento populacional se manteve estável em 1,7% ao ano.
O bairro Cangulo em análise localiza-se no segundo Distrito do município, ou
seja, o distrito industrial de Campos Elíseos, responsável por 10% da arrecadação
de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias) do Estado (Prefeitura de
Duque de Caxias), e que engloba os bairros Jardim Primavera, Saracuruna, Vila São
José, Parque Fluminense, Campos Elíseos, Cangulo, Cidade dos Meninos, Figueira,
17
Chácaras Rio-Petrópolis, Chácaras Arcampo e Eldorado. De acordo com a planta do
bairro fornecida pela prefeitura sua área é de 371,35 hectares, e foi instituído
oficialmente no ano de 1987, (Decreto nº 1.864, artigo 1º) a partir do Plano Diretor
Urbanístico sob mandato do prefeito José Carlos Lacerda (Secretaria de
Planejamento e Urbanismo).
Começou a ser ocupado por volta de 1955 (Magalhães et al, 2006) e conta
atualmente com 5.539 habitantes (IBGE, 2007). Trata-se de uma área próxima aos
mangues, de difícil ocupação e escassez de água potável, onde era comum a
plantação de arroz, até os desastres de 1966 e 1967 onde diversos óbitos ocorreram
em decorrência das chuvas, segundo informação do Corpo de Bombeiros do Estado
(Magalhães et al, 2006).
Já com 50 anos de existência o bairro não dispõe de posto de saúde, de
opções de lazer, serviço de abastecimento de água encanada e tratada, nem rede
de esgoto. A coleta de lixo começou a ser promovida recentemente, mas apenas em
algumas ruas de mais fácil acesso e locomoção. Tem apenas uma escola municipal,
uma praça, e poucas ruas asfaltadas. Possui muitas igrejas e alguns pontos
comerciais, como padaria, mercadinho, pequenas lojinhas e duas casas de material
de construção que atendem a população local.
3.1 Breve característica do meio físico com relevância aos problemas
ambientais
O município de Duque de Caxias tem área total de 464,573 km², divida em
quatro grandes Distritos: 1º Centro, 2º Campos Elíseos, 3º Imbariê e 4º Xerém
(Figura 1B). Em termos de características de ocupação da superfície ocupada pelo
homem associada à geomorfologia existem dois principais domínios
geomorfológicos segundo Dantas (2000), o primeiro são planícies Colúvio-Alúvio-
Marinhas (Terrenos Argilo-Arenosos das Baixadas). Superfícies subhorizontais, com
gradientes extremamente suaves e convergentes à linha de costa, e interface com
os Sistemas Deposicionais Continentais (processos fluviais e de encosta) e
Marinhos. Terrenos mal drenados com padrão de canais meandrante e divagante.
Presença de superfícies de aplainamento e pequenas colinas ajustadas ao nível de
base das Baixadas. O outro domínio é o de Colinas Isoladas, com formas de relevo
residuais, com vertentes convexas e topos arredondados ou alongados, com
18
sedimentação de colúvios, remanescentes do afogamento generalizado do relevo
produzido pela sedimentação flúvio-marinha que caracteriza as baixadas litorâneas.
Estão também classificadas ilhas oceânicas. Densidade de drenagem muito baixa
com padrão de amplitudes topográficas inferiores a 100m e gradientes suaves.
A geologia é caracterizada como depósitos fluviais e flúvio-marinhos, areno-
siltico-argilosos com camadas de cascalheiras associadas a depósitos de tálus e
sedimentos lacustrinos e de manguezais retrabalhado. Além de depósito marinho e
flúvio-marinho, síltico-areno-argilosos, ricos em matéria orgânica, englobando linhas
de praias atuais e antigas, além de manguezais (CPRM, 2001). Outra característica
é de colinas isoladas, com formas de relevo residuais, com vertentes convexas e
topos arredondados ou alongados, essas áreas, em geral são utilizadas para
retirada de material para a construção e obras, que acaba sendo agravante, uma
vez que feições como estas estão sendo apagadas da paisagem, além do material
mobilizado ficar exposto a erosão superficial e posteriormente carreado para os
canais, o que acaba por contribuir para processos como enchentes (Figura 2B e C).
Assim como na grande parte da Baixada Fluminense, no município de Duque
de Caxias predomina o clima tropical semi-úmido, com uma temperaturas média de
24ºC. Porém, apresenta temperatura mais amena no 3º e 4º distrito (Imbariê e
Xerém, respectivamente) em virtude da área verde e da proximidade com a Serra
dos Órgãos. As chuvas são abundantes no verão, enquanto o inverno se apresenta
seco.
O bairro do Cangulo se encontra inserido na Bacia do Saracuruna que
abrange parte dos Municípios de Duque de Caxias e Petrópolis, e a partir da
confluência com o Inhomirim, passa a se chamar Rio Estrela (Figura 3A). Os
formadores têm suas cabeceiras nas escarpas da Serra do Mar, com acentuada
declividade e alta densidade de drenagem. O início da área de planície coincide com
os primeiros núcleos urbanizados, onde as inundações são decorrentes,
principalmente, da baixa declividade e de estrangulamentos (SEMADS, 2001).
As enchentes urbanas constituem-se num dos mais importantes impactos
sobre a sociedade, são normalmente localizadas e podem ser provocadas por
crescimento desordenado, além do estrangulamento da seção do rio devido a
aterros e pilares de pontes, estradas, assoreamento do rio e lixo. Outro impacto em
relação à produção de sedimentos (Figura 2C) tem conseqüências ambientais
graves para as áreas urbanas, como assoreamento da drenagem, com redução da
19
capacidade de escoamento de dutos, rios e lagos (Figura 2B); transporte de
substâncias poluentes agregadas ao sedimento devido à lavagem das ruas,
ressalta-se ainda a degradação da qualidade da água drenada pelos esgotos
pluviais e contaminação dos aqüíferos.
Pode-se dizer que o Município de Duque de Caxias não é diferente da
realidade brasileira, pois segundo SEMADS (2001), em 2000 existiam 123 pontos,
isto é, responsável por 19.2% do total de pontos críticos da Região Metropolitana
(Figura 3B). O bairro do Cangulo também é alvo do processo de inundação,
conforme pode ser notado na Figura 3C, que mostra a ocorrência de enchente em
2003.
20
8
A
B Município de Duque de
Caxias
Figura 1 Localização da Baixada Fluminense (A), em destaque o Município de Duque de Caxias (Modificado de Farias, 2005), visualização dos distritos (B) e imagem do bairro do Cangulo (C) em 2008. Fonte: Google Earth
C
A
21
Figura 2. Planta do Bairro do Cangulo (Duque de Caxias), em A (2006), nota-se a falta de infra-estrutura urbana como calçamento, enquanto em B (1985) tem-se uma pequena lagoa que aterrada entre 2006 e 2007, em C visualiza-se área de remobilização de material, utilizado em obras. Em D tem-se a vista geral da REDUC, próximo do bairro do Cangulo. Fonte: Próprio autor
Sentido REDUC
A
B
C
D
9
22
Figura 3. Bacia hidrográfica sujeita a inundação, a qual pertence o rio estrela (ressaltado em circulo), em A. Destaca-se em B o número dos pontos de enchentes em Duque de Caxias (Modificado de SEMADS, 2001), enquanto em C tem-se a visualização de área de inundada no bairro do Cangulo (Jornal do Brasil, 2003).
B
C
10
A
23
4 Qualidade de Vida e Saneamento Ambiental
4.1 Qualidade de Vida
A qualidade de vida é um desejo comum entre as pessoas, independente da
sua posição social e de suas aspirações futuras, sendo imprescindível para o bem-
estar humano em qualquer fase da vida, desde a infância, quando é fundamental
para o desenvolvimento físico e mental, até a velhice. O viver bem pode ter diversas
visões e significados, mas talvez seja o objetivo fundamental das sociedades
humanas, assim como a busca por felicidade.
Após os anos 1920, os cientistas sociais se dedicaram a desenvolver
indicadores socioeconômicos como: perfil demográfico, atividade econômica e infra-
estruturas. Com o passar dos anos, a noção de qualidade de vida também começou
a ser discutida, e do ponto de vista do desenvolvimento, passou por uma evolução
(Silva, 2007), ganhando mais expressividade nos últimos 30 anos (Feu, 2007). Até
os anos 1950, o conceito estava relacionado diretamente ao víeis econômico (renda,
PIB, emprego), uma década depois já havia entrado no debate a questão do bem-
estar. Na década de 1970 o conceito ganhou uma conotação mais abrangente ao
considerar a questão social, como escolaridade, saúde e emprego, se tornando
“uma referência nas discussões do planejamento do desenvolvimento e dos padrões
de intervenção do Estado, principalmente no nível local” (Vitte, 2002 apud Silva,
2007, p. 40).
Já na década de 1980, é incorporado ao debate a questão ambiental. Tanto
no Brasil, como nos demais países da América do Sul, o fator ambiental ganhou
mais visibilidade a partir de três eventos de importância internacional: a Conferência
das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, realizado na Suécia, em 1972; a
divulgação do “Relatório Brundtland”, no documento “Nosso Futuro Comum” da
Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1988), marco
referencial do conceito de desenvolvimento sustentável (Viola, 1992), e na
Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - Rio-92
(1992). Dentre esses, a Rio-92 destaca-se como um marco na discussão ambiental
brasileira, onde o ambiente, passou a ser visto também como ambiente social e o
movimento ambientalista ganhou destaque como importante ator social (Viola,
1992). Contando com a participação de diversos segmentos da sociedade, o evento
24
teve como principal fruto a elaboração da Agenda 21, colocando em pauta direitos e
responsabilidades em relação ao meio ambiente (Viola, 1992).
Dessa forma, a manutenção da qualidade de vida futura depende da
sustentabilidade urbana, que segundo a Agenda 21 brasileira depende, entre outras
estratégias, de:
- buscar o equilíbrio dinâmico entre população e a base ecológico-territorial,
diminuindo significativamente a pressão do homem sobre os recursos disponíveis ou
remanescentes;
- ampliar a responsabilidade ecológica, disseminando informação e
promovendo a capacidade dos diversos atores de identificar as relações de
interdependência dos fenômenos sociais, ecológicos, econômicos, e aceitar o
princípio da co-responsabilidade, isto é do governo e da sociedade para a gestão de
recursos (naturais e humanos), conforme exemplo da Figura 4;
- formular e implementar políticas sistemáticas de alteração dos padrões
atuais de produção e consumo. Buscar uma utilização menos intensiva de recursos
naturais na própria confecção dos produtos. Controlar e diminuir resíduos. Na linha
do consumo individual, vale a cultura dos “três erres” – reduzir, reciclar, reutilizar;
- recuperar áreas degradadas e repor estoque de recursos estratégicos (solo,
água, cobertura vegetal);
- manter a biodiversidade natural e cultural;
- combater a pobreza urbana, praticando os princípios da economia solidária
e promovendo sempre que possível estratégia de desenvolvimento econômico que
integrem dimensões ambientais relevantes (troca de lixo reciclável por cestas
básicas, mutirão de reflorestamento com remuneração da comunidade, garis
comunitários, recuperação de praças e jardins).
25
Figura 4 Esquema demonstrando a importância da ação conjunta do poder público e da participação da comunidade para melhor condição de vida ambiental (Kobiyama et. al., 2008).
Se o bem-estar social depende das condições do meio físico, deve haver um
equilíbrio entre os componentes do sistema, que propicie um estado de normalidade.
Mudanças podem provocar um stress ambiental, sendo preciso compensá-lo
posteriormente por meio da restauração, recuperação ou reabilitação da condição
ambiental anterior. Toda localidade deve possuir a capacidade de produzir e
consumir reduzindo impactos, possibilitando assim uma sustentabilidade urbana.
Para que os municípios cumpram esse papel a administração pública deve
assegurar determinados serviços, que atendam às necessidades humanas de
sobrevivência de forma satisfatória. A qualidade de vida ambiental deve ser
produzida de forma socialmente justa, ambientalmente sustentável e
economicamente viável (Silva, 2006).
Constata-se que a qualidade de vida depende da interação entre os aspectos
do meio físico, do meio biótico e dos elementos socioeconômicos, e caminha junto
com a qualidade ambiental, devendo haver um equilíbrio entre ambas, porque “a
melhoria da qualidade de vida passa, necessariamente, pelo atendimento do
contexto ambiental onde se insere uma determinada população” (Silva, 2006).
26
A palavra ambiente já não remete somente à idéia de natureza, é encarado
como “produto social resultante da relação sociedade-natureza no processo de
construção do espaço” (Galvão, 1992 apud Feu, 2007), ou seja, está associada ao
processo histórico de ocupação do espaço geográfico, a transformação da natureza
a partir do trabalho humano. Assim, o meio é analisado como ambiente socialmente
construído, houve uma junção entre o urbano e o ambiental. E sendo os problemas
ambientais todos aqueles que atingem negativamente a qualidade de vida das
pessoas, a partir da sua interação com o ambiente (Souza, 2000), estima-se que as
questões ambientais devem levar em consideração a forma como as sociedades se
organizam no espaço. Sendo assim, são questionáveis os grandes eventos
ambientais de caráter internacional, como os já citados acima, que lançam propostas
e objetivos em escala global, desconsiderando as peculiaridades de cada lugar.
Juntam no mesmo pacote diversos países que viveram processos históricos
diferentes, onde as relações sócio-ambientais são diferentes, com formas de
ocupação diferentes, devido à cultura diferenciada de cada povo. Dessa forma, os
debates ambientais precisam estar de acordo com o ambiente socialmente
construído, políticas ideais para um país podem ser irrelevantes para outro, se
considerarmos que nem todos os lugares apresentam as mesmas necessidades e
deficiências.
A qualidade de vida é uma abordagem de diversos campos disciplinares, mas
sobre o prisma geográfico é considerada a partir da construção social e histórica do
espaço.
Em uma perspectiva geográfica, o conceito de qualidade de vida e seu uso como instrumento à gestão do território (através de seus indicadores) permite a detecção de desigualdades espaciais que um determinado território apresenta, constituindo-se em uma base de diagnóstico e perspectiva útil aos processos de planejamento e formulação de políticas públicas para o desenvolvimento. (Feu, 2007, p. 2).
Para Souza (2002), o desenvolvimento vai além da esfera econômica, se
traduz numa mudança para melhor, porque altas taxas de crescimento econômico
não garantem a erradicação da pobreza, nem melhoria nas condições de vida. Tem
aqueles que acreditam que para o desenvolvimento de fato acontecer é necessário
haver um controle da natalidade e distribuição de terras. Mas o desenvolvimento
sócio-espacial só será de fato possível, quando houver mais justiça sócio-ambiental,
com melhor distribuição de renda e conseqüente erradicação da pobreza, não
adianta ter a posse da terra e viver segregado, sem os equipamentos urbanos
27
mínimos necessários, como o saneamento básico, que permitam uma melhor
qualidade de vida ambiental.
A população tem o direito não somente ao saneamento básico, mas
principalmente ao saneamento ambiental que, conforme Kobiyama et. al. (2008),
visa o aproveitamento do meio ambiente para obter um bom saneamento, pois
possui alta potencialidade no alcance do desenvolvimento sustentável. Ainda de
acordo com Souza (2002), havendo justiça social “a satisfação das necessidades
básicas dos grupos menos privilegiados terá prioridade sobre a satisfação das
necessidades não-básicas dos grupos mais privilegiados” (p. 64), o que parece
inatingível nas sociedades modernas capitalistas, onde não existe equidade nem
comprometimento com os ideais de justiça entre os homens.
De acordo com Silva (2007), o debate sobre qualidade de vida ganha ainda
mais fôlego nos últimos anos a partir do planejamento, que para Souza (2002) deve
ter como objetivo fundamental o desenvolvimento urbano, que deve levar ao
aumento da justiça social, afirma ainda que “a finalidade última do planejamento e
da gestão é a superação de problemas, especialmente fatores de justiça social, e a
melhoria da qualidade de vida, ambos deveriam ser vistos como pertencentes ao
amplo domínio das estratégias de desenvolvimento” (p. 73). Segundo Souza (2000),
esses dois fatores estão interligados, são essencialmente complementares. O
planejamento é então referência para instrumentalizar à ação pública mediante o
conhecimento das necessidades coletivas, já que o planejamento ajuda no
cumprimento dos compromissos sóciopolíticos. “A avaliação das condições de vida
da população de um município através dos indicadores sociais pode revelar
situações importantes na identificação de carências e deficiências quanto ao acesso
a serviços e bens públicos” (Silva 2007, p. 1).
Segundo o mesmo, a qualidade de vida de uma população não deve ser
discutida “sem antes identificar e refletir sobre as condições que permitem satisfazer
as necessidades de bem-estar social dessa população” (p. 7). Assim, a qualidade de
vida depende tanto das condições de vida, que engloba a má distribuição de renda,
o baixo nível de escolaridade e as condições de habitação, quanto do déficit social,
definido por Jannuzzi (2003, p. 3) como a “parcela da demanda populacional não
atendida adequadamente em termos de programas sociais ou de bens públicos e
privados, segundo um padrão normativo desejável de bem-estar”.
28
Outro fator importante na busca por qualidade de vida é a possibilidade de
maior autonomia para os indivíduos, nas palavras de Souza (2002), “sem autonomia
individual, dificilmente muitos dos fatores que garantem uma boa qualidade de vida
podem ser concretizados” (p. 66). Assim, qualidade de vida significa menos
privação, como acesso aos bens e serviços públicos, e mais liberdade (Feu, 2007).
Verifica-se que a complexidade do tema qualidade de vida engloba diferentes
dimensões no debate dos autores que tratam à questão, há inclusive, aqueles que
falam de fatores que negam a qualidade de vida, como o desemprego, a exclusão
social e a violência (Minayo et al., 2000). De acordo com a OMS (Organização
Mundial de Saúde), a qualidade de vida é definida como sendo “a percepção do
indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos
quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e
preocupações” (Silva, 2007. p. 10).
Em Nahas (2002 apud Silva, 2007):
o uso da expressão “qualidade de vida” remete à demanda por melhores condições de saúde e bem-estar, face aos impactos e desigualdades sociais geradas pelo crescente processo de urbanização, mas remete sobretudo, a componentes de caráter imaterial, imprimindo ao conceito o enfoque indivíduo, da pessoa, vinculado a aspirações por felicidade, bem-estar e satisfação social (p. 27).
Essa afirmação vai ao encontro de Souza (2000), que diz que a qualidade de
vida engloba:
coisas que não podem ser simplesmente adquiridas pelos indivíduos no mercado (e, em vários casos, nem se quer podem ser mensuradas, a não ser eventualmente, em uma escala ordinal), mas que interferem no seu bem-estar. Exemplos são a beleza cênica, a qualidade do ar e a liberdade política (p. 117).
Akerman (1996 apud Silva, 2006) “afirma que a qualidade de vida pode ser
entendida como a possibilidade de melhor distribuição e usufruto da riqueza social e
tecnológica auferida por um determinado agrupamento humano” (p. 29). O PIB
(Produto Interno Bruto) e o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) servem de
índices para avaliar a qualidade de vida em escala nacional, porém, não são
adequados para a realidade brasileira devido às suas diferenças regionais e enorme
heterogeneidade (Silva, 2006). Em âmbito nacional, dados da pequena minoria
detentora de renda escamoteia os resultados reais. Por isso, foi criado pelo IPEA
(Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) e pela Fundação João Pinheiro (1996),
o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M), considerando os
indicadores: renda familiar per capta média, o número médio de anos de estudo da
população adulta (acima de 25 anos) e a taxa de analfabetismo. Cabe ressaltar que
29
esse índice também é falho, em geral seus resultados não são capazes de mostrar o
conjunto da realidade, e acarretam na distorção quando avaliados.
Assim tanto os elementos ambientais quanto os socioeconômicos servem
para qualificar a vida da população, mas de acordo com Silva (2006), as
características sociais e econômicas sempre receberam maior atenção, assim como
todos os critérios sempre privilegiaram a vida na cidade em detrimento da vida no
campo.
É preciso considerar também que os padrões de qualidade podem variar de
um lugar para outro, de um indivíduo para outro, e da percepção individual dos
sujeitos. Segundo Feu, a “qualidade de vida não diz respeito somente a
necessidades básicas, os demais fatores estão ligados diretamente ao que cada
sociedade ou cultura valoriza” (2007, p. 9). Logo, a qualidade de vida não é
percebida da mesma forma em todos os lugares, não sendo possível um consenso
universal para o termo, principalmente devido à carga de subjetividade que carrega.
As prioridades para alcançar qualidade de vida ambiental nos países da Europa são
muito diferentes das prioridades dos países latino-americanos, por exemplo. Nesses,
onde o processo de urbanização acelerado não contou com o planejamento
necessário, a qualidade de vida é mais discutida a partir da não universalização de
parâmetros como direito à moradia, alimentação saudável, serviços de saúde,
educação e saneamento básico (Feu, 2007).
Os tipos de bens e aspirações almejadas pelas diferentes classes sociais
variam muito, mesmo que concentradas na mesma área territorial da cidade, já que
as realizações possíveis e as oportunidades oferecidas não são acessíveis a todos.
São grandes as diferenças em relação aos níveis de exigência para a satisfação,
“isso está ligado à questão da percepção individual, e também às conquistas já
realizadas (ou não realizadas) pela população em relação aos direitos sociais,
fazendo com que as aspirações e níveis de exigência mudem” (Feu, 2007, p. 20).
Se analisarmos do ponto de vista da habitação, sendo a salubridade, no
tocante à habitação um indicador muito útil para avaliar a qualidade de vida (Souza,
2002), percebe-se que algumas pessoas possuem rede de esgoto em casa
enquanto outras não, o que acaba sendo igual para todas se considerarmos a
necessidade de um rede coletora que envolva todo o bairro, já que os dejetos de
todas as casas tem o mesmo destino final, ou seja, algumas questões que envolvem
a qualidade de vida só fazem sentido quando pensadas a partir da coletividade,
30
como bens e investimentos públicos, obras de engenharia e infra-estrutura em
saneamento básico, que visam o bem coletivo da população.
Assim, concorda-se com todas as interpretações sobre a qualidade de vida
apresentadas acima, mas pretende-se analisá-la a partir da questão estrutural da
população com seu local de moradia. Devido à multiplicidade do conceito, vamos
pensá-lo no âmbito local, mediante as necessidades coletivas do conjunto dos
moradores que podem refletir em melhoria de vida ambiental para todos, avaliando
suas satisfações e insatisfações, mesmo que não tenham consciência sobre seus
direitos sociais garantidos juridicamente. Segundo Feu (2007), a imprecisão com
relação à qualidade de vida está associada ao uso que se dá ao conceito, e não a
sua definição, aqui vamos utilizá-lo para atentar às necessidades dos moradores do
bairro que visem seu bem-estar pleno.
4.2 Saneamento Ambiental
4.2.1 História do Saneamento na Baixada Fluminense: lutas e
ações
A Baixada Fluminense, ao longo da sua história, passou por vários processos
de crescimento econômico com importância significativa para a economia do Estado
do Rio de Janeiro, principalmente devido a sua localização e às características do
solo e dos rios, que eram navegáveis. Participou da produção açucareira (século
XVII); do escoamento do ouro entre Minas Gerais e a metrópole, através dos portos
(século XVIII); da produção cafeeira (século XIX); e da produção de laranjas (século
XX).
Devido esses fatores econômicos, durante as décadas de 1920 e 1930,
aumentaram os investimentos públicos visando a melhoria de infra-estrutura da
região, porém, de acordo com Amador (1997)
o saneamento da Baixada foi sem dúvida um dos exemplos mais perversos de agressão a natureza e reprodução e acumulação de capital, praticados com recursos públicos. Enormes somas de dinheiro foram utilizadas na valorização das terras de grandes proprietários, que as adquiriam (se é que adquiriram) por preço vil, e as revenderam com grandes lucros, na medida em que passaram a ser loteadas e vendidas para a população proletária, que foi empurrada para a Baixada inóspita (p. 338).
Já na década de 40, com o declínio do ciclo da laranja houve a necessidade
de redirecionar as atividades econômicas, passando a interessar os loteamentos
31
populares (Oliveira, 1991). “Os loteamentos que se desenvolveram na Baixada
Fluminense na sua grande maioria não tiveram nenhum planejamento nem seguiram
as condições mínimas de infra-estrutura” (p. 11). Resultando em uma ocupação
desordenada e predatória sob o ponto de vista urbano e ambiental.
A ocupação sem planejamento mais o assoreamento dos canais ocasionou
problemas de insalubridade que afetavam a qualidade de vida daquela população.
Para o autor, a luta pelo saneamento básico era a luta pela democracia, porque ela
permite o acesso de milhões de pessoas a melhores condições de vida. O saneamento básico possibilita melhores condições de saúde, acessibilidade, segurança, lazer e relação saudável como o meio ambiente. O direito ao saneamento básico possibilita, enfim, uma melhor apropriação da cidade por seu habitante (p. 65).
Segundo Monteiro (2008), entre os anos de 1906 e 1930 ocorreram algumas
tentativas de sanear a Baixada Fluminense, foram propostas políticas de
saneamento para toda a região que se encontrava em estado pantanoso propício às
endemias. Em 1910, durante o governo Nilo Peçanha foi criada uma comissão para
estudar a região, desencadeando algumas obras até 1916. No governo Getúlio
Vargas em 1930 foram criadas propostas um pouco mais eficazes para a
configuração da área (Monteiro, 2008). Em 1933 foi criada a Comissão de
Saneamento da Baixada Fluminense, sob subordinação do Departamento de Portos
e Navegação do Ministério da Aviação e Obras Públicas. Esta tornou-se autônoma
em 1936 passando a chamar-se Diretoria de Saneamento da Baixada Fluminense,
“que representou a consolidação da atuação dos engenheiros na intervenção
ambiental visando o saneamento de regiões rurais” (Fadel, 2008, p. 1), legitimando
as medidas de combate à malária, sob comando do engenheiro Hildebrando de
Araújo Góes.
Órgão de escala nacional, o DNOS (Departamento Nacional de Obras e
Saneamento) criado na década de 1940, afirma em seus relatórios ter saneado
4.500 quilômetros da região e desobstruído 3.800 quilômetros de rios, além da
construção de diques, canais e reservatórios de compensação (Monteiro, 2008).
Anos mais tarde, o autoritarismo do golpe militar de 1964 desarticulou diversas
organizações e perseguiu lideranças populares e sindicais. Na Baixada a
desarticulação mais imediata foi nos centros pró-melhoramentos de bairros (Oliveira
et. al., 1995). Ainda assim, no final da década de 70 a ONG FASE (Federação de
Órgãos para Assistência Social e Educacional) começa a atuar na Baixada,
32
articulando as federações de moradores e capacitando suas lideranças, papel
desempenhado até os dias atuais.
O PLANASA (Plano Nacional de Saneamento) foi criado em 1971 com
recursos do BNH (Banco Nacional de Habitação) para superar o déficit no acesso
aos serviços de saneamento, se antes o objetivo era o controle das enchentes
vinculado aos interesses econômicos da Baixada, dentro desse projeto a meta para
a região passou a ser o abastecimento de água. Durante esse período, segundo
Porto “a Baixada Fluminense, na qualidade de espaço periférico, tem intervenções
pontuais, geralmente concentradas nos centros dos seus municípios e capturadas
pelos interesses políticos e eleitorais que dominam essas cidades” (2003, p. 63).
Na segunda metade da década de 70 ressurgem os movimentos populares,
articulados com dois atores importantes, a igreja católica com as comunidades
eclesiais de base (CEBs) e os partidos comunistas, com destaque para o PCB
(Partido Comunista Brasileiro) e o PC do B (Partido Comunista do Brasil). Ambos
atuavam na denúncia do autoritarismo e na crítica à espoliação urbana,
principalmente na questão da saúde e das enchentes. “As enchentes eram nesse
período a calamidade pública que denunciava a ausência de serviços de
saneamento que atingia o conjunto dos moradores da região” (Porto, 2003, p. 65).
Até início da década de 1980 a luta pelo saneamento da Baixada se apoiava no
discurso da espoliação urbana e da desigualdade social.
Em 1984 surge o Comitê Político de Saneamento da Baixada Fluminense,
uma conquista das federações de moradores de Nova Iguaçu – Movimento Amigos
do Bairro (MAB); Duque de Caxias – Movimento União de Bairros (MUB); São João
de Meriti – Amigo de Bairros de Meriti (ABM); Nilópolis – Pró-Federação das
Associações de Moradores de Nilópolis. Inicialmente faziam manifestações públicas
diante da sede dos governos municipais, posteriormente estenderam as
reivindicações ao governo do Estado. Lutavam com o apoio da igreja católica pela
melhoria das condições de habitalidade, denunciando o abandono da região,
promoviam encontros para discutir os problemas comuns e elaborar as
reivindicações, sendo as principais:
• Maior aplicação de verbas públicas em saneamento básico para a
Baixada;
• Prioridade dos orçamentos municipais e estaduais para saneamento
básico;
33
• Participação das associações de moradores através de suas
federações, nos planejamentos e projetos de obras;
• Aplicação de recursos de maneira integrada, oriundos do governo
municipal, estadual e federal.
Toda essa articulação promoveu um encontro com o então Secretário de
Obras e Meio Ambiente, Luis Alfredo Salomão, em dezembro de 1984, culminando
na elaboração do Plano Global de Saneamento e Meio Ambiente na Baixada
Fluminense. As obras começaram em 1985, mas foram paralisadas no ano seguinte
com a extinção do BNH, pelo governo José Sarney. As obras retomadas em 1987
sob o governo Moreira Franco não foram suficientes para evitar as enchentes de
1988 que deixaram milhares de desabrigados na região. Outras ações importantes
foram a inauguração da primeira estação piloto de tratamento de esgoto da Baixada,
em Vilar dos Teles (1989) e as obras de limpeza e canalização dos rios e afluentes
(1990).
As enchentes de 1988 que deixaram à região em estado de calamidade
reorientaram a agenda política do comitê, elaborando um plano emergencial de
saneamento. Mobilizações de massa serviram para que o Estado elaborasse um
projeto de macro e mesodrenagem que viesse a minimizar as enchentes, dentro do
Projeto Reconstrução Rio. Entretanto, o comitê precisou organizar uma caravana
para Brasília com mais de 20 ônibus para pressionar o Governo Federal, pois
mesmo com a aprovação do projeto pelo Banco Mundial as obras esperaram dois
anos para ter início. Esse projeto foi de ação emergencial e esteve centrado na
prevenção das enchentes. Entretanto, devemos considerar o caráter paliativo
dessas obras, “visto que as condições climáticas (de chuvas intensas), de topografia
(terrenos baixos) e de geologia serão mantidas, e que persistem os fatores
responsáveis pelo assoreamento dos canais fluviais, como o desmatamento, o uso
irracional do solo e a erosão na bacia” (Amador, 1997, p. 377). Dessa forma, o cerne
do problema persiste, ocorrendo apenas uma ilusão temporária de recuperação da
área, que estimula as ocupações.
Em 1990 a dimensão ambiental foi incorporada à luta do comitê, que passou
a chamar-se Comitê Político de Saneamento e Meio Ambiente da Baixada
Fluminense. Mais tarde, em 1994, introduziu uma nova temática - a habitação,
passando a chamar-se Comitê Político de Saneamento, Habitação e Meio Ambiente
da Baixada Fluminense. Esse órgão era reconhecido pelo Estado como interlocutor
34
do movimento organizado, se constituiu como uma das principais organizações
populares do Rio de Janeiro.
A luta do comitê era uma luta clara pela cidadania, por justiça sócio-
ambiental. Em 1991, solicitaram uma audiência pública com o então, governador do
Estado Leonel Brizola, através de uma carta com o título “Saneamento Básico:
direito à cidade, direito à vida”, que ressaltava:
A luta pelo saneamento básico da Baixada significa para sua população sofrida melhores condições de vida. Significa diminuir os índices de mortalidade infantil e os números de doentes; ter mais segurança no seu local de moradia; ter direito a morar com dignidade, com espaços de lazer e um ambiente ecologicamente saudável. Enfim, a luta pelo saneamento altera consideravelmente as desigualdades sociais impostas ao povo da Baixada Fluminense.
Com a eleição de Marcelo Alencar para o governo do Estado pelo PSDB
(Partido da Social Democracia Brasileira) houve uma desarticulação do Comitê com
a esfera governamental, que estruturou uma política enfraquecedora em torno do
saneamento, dando vez às máquinas partidárias clientelistas locais (Porto, 2003).
Passou a vigorar uma nova política de saneamento dentro do Programa Baixada
Viva (PBV), com atuação reduzida para o âmbito dos bairros, contando com atuação
da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) no intuito de desenvolver
estudos e reuniões com objetivo de intervenção no PBV.
4.2.2 O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara
É de suma importância, considerar o Programa de Despoluição da Baía de
Guanabara (PDBG) ao analisar os programas de saneamento na Baixada
Fluminense, de acordo com Kornis e Vargas (2002) esse é o mais ambicioso projeto
de intervenção ambiental da história recente do Estado do Rio de Janeiro. E um
“instrumento de melhoria da qualidade de vida dos habitantes dos 15 municípios
limítrofes com a Baía de Guanabara” (Kornis e Vargas, 2002, p. 16). Constitui uma
tentativa de reverter o quadro de degradação ocasionado pelo modelo de
desenvolvimento, segundo Amador (1997), o modelo agrícola-exportador e depois o
industrial-urbano promoveram “modificações radicais no cenário físico e humano da
região da Guanabara” (p. 8). Segundo o mesmo, a ocupação da região foi
predatória, e as atividades no seu entorno geram problemas ambientais assim como
sua utilização para transporte de cargas e mercadorias, “a atividade que é dádiva da
baía colabora efetivamente para sua destruição” (p. 333). Com a execução do Plano
de Metas do presidente JK (marco do crescimento da poluição da Baía de
35
Guanabara) a baía passou por vários aterros para instalação de indústrias, com
destaque para a construção da refinaria de Duque de Caxias (REDUC), hoje
considerada a principal fonte de poluição das águas da baía.
Esse crescimento urbano-industrial atraiu um fluxo migratório de
trabalhadores ocasionando um incremento populacional da metrópole, o que
aumentou consideravelmente os níveis de degradação da baía devido à falta de
planejamento urbano:
A maioria esmagadora da população da Bacia da Guanabara vive em condições de miséria, desassistida dos serviços urbanos mais elementares como saneamento básico, rede de esgoto, coleta de lixo, transportes adequados etc. o que acaba comprometendo a Baía de Guanabara, que recebe quase todo o esgoto bruto produzido na Baixada e o lixo flutuante trazido pelos rios (Amador, 1997, p. 346).
Outros problemas são decorrentes dos desmoronamentos, assoreamento,
lançamento de esgoto e resíduos sólidos, elementos líquidos industriais, entre
outros.
O PDBG começou a ser discutido na década de 1980, principalmente a partir
de 1987, quando foi criada a Comissão para a Recuperação Gradual da Baía de
Guanabara, integrada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA),
Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA), Instituto Estadual de
Florestas (IEF), Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (SERLA), e a
Secretaria Estadual de Desenvolvimento Urbano e Regional. Em 1991, é firmado um
convênio entre o Brasil e o Japão para realizar junto a FEEMA um diagnóstico dos
processos de deterioração socioambiental da Baía de Guanabara, e em 1993 o
governo do Estado cria a Comissão Coordenadora para a Execução do PDBG. Com
apoio do Banco Internacional de Desenvolvimento (BID), o programa entra em
funcionamento em 1994 com a missão de recuperar a Baía de Guanabara, tendo
como prioridade o saneamento básico (Kornis e Vargas, 2002), e como principais
objetivos reduzir a carga orgânica industrial, a carga orgânica do esgoto lançado “in
natura”, a carga tóxica industrial, o volume de óleos e graxas e o destino do lixo
produzido. Para os autores, esse é um ambicioso projeto ambiental com impacto
direto sobre o desenvolvimento do Rio de Janeiro.
O programa é realizado por etapas e conta com agências co-executoras para
gerenciamento técnico, administrativo e financeiro em unidades próprias. Sob a
coordenação da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE), pretende
melhorar a oferta de água tratada na Baixada Fluminense, e em São Gonçalo,
beneficiando 1 milhão de habitantes. Outros 5 milhões serão beneficiados com os
36
investimentos em esgotamento sanitário, mediante a construção e recuperação de
estações de tratamento de esgoto (ETE), assentamentos de rede coletora,
construção de emissários terrestres e submarinos, estações elevatórias e ligações
domiciliares. Já os resíduos sólidos ficam a cargo da Secretaria de Estado de Obras
e Serviços Públicos (SOSP), para melhorar os sistemas de coleta e destinação do
lixo, com instalação de usinas de reciclagem e compotagem, aterros sanitários e
aquisição de veículos de coleta. Neste setor Duque de Caxias merece atenção
especial devido à presença do aterro sanitário de Jardim Gramacho, devido a sua
extensão, e sua localização às margens da Baía, e pela consequente quantidade de
resíduos que recebe (5.000 toneladas/dia) de vários municípios do Estado. Calcula-
se o beneficiamento de 2,8 milhões de pessoas. A macrodrenagem é de
responsabilidade da SERLA, e compreende obras de canalização, retificação e
recuperação dos muros laterais de rios, visando o controle de enchentes, sendo
capaz de beneficiar 550 mil habitantes, principalmente de comunidades ribeirinhas.
Em suma, no decorrer das três últimas décadas, a Baixada recebeu pelo
menos seis grandes projetos de saneamento: Plano de Impacto (1975); Projeto
Especial de Saneamento para a Baixada Fluminense e São Gonçalo (1984); Plano
de Setorialização da Rede de Abastecimento de Água da Baixada (1986); Projeto
Reconstrução Rio (1988); Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (1994);
Programa Nova Baixada (1995). Porém, para Porto (2003), ainda está “longe de
expressar maior justiça social e ampliação dos direitos da cidadania. Na região ainda
vigoram fortes desigualdades sociais e ambientais, que se traduzem no baixo
acesso a bens e serviços urbanos” (p. 14). O saneamento é encarado como uma
questão social na Baixada Fluminense, porque as políticas adotadas atendiam as
necessidades de uma clientela específica.
Para o autor, o padrão das políticas públicas de saneamento adotadas na
Baixada nos últimos 30 anos foram patrimonialistas e clientelistas, fundado na
apropriação privada dos recursos públicos, para atender as elites locais e as
empreiteiras responsáveis pela execução das obras. O que explica o fato de 1 bilhão
de dólares investidos não terem causado alterações significativas na qualidade de
vida da população.
37
4.2.3 Saneamento e saúde
É de conhecimento mundial a relação existente entre saneamento e saúde,
principalmente por parte da ciência médica, responsável pelo diagnóstico e
tratamento das enfermidades humanas. Países desenvolvidos apresentam melhores
condições de saneamento ambiental, o que pode ser atribuído a uma melhor
qualidade de vida da sua população. Enquanto países não desenvolvidos,
principalmente na África, América do Sul e partes da Ásia, enfrentam problemas de
saúde quase inexistentes entre os países ricos. São problemas associados à falta de
infra-estrutura urbana, como os serviços de saneamento básico, que ainda matam
centenas de pessoas todos os anos (Figura 5), principalmente aquelas que vivem
em áreas abandonadas pelo poder público, em contato com valas-negras, esgoto a
céu aberto, água sem tratamento, ruas sem pavimentação.
O quadro de desigualdade social verificado entre países e regiões está
associado aos problemas de saúde relacionados à pobreza e à falta de acesso a
políticas sociais, e os investimentos em promoção de saúde não dão vazão à
demanda. Pesquisa do Datafolha revelou que 29% dos entrevistados citaram a
saúde como sendo o principal problema do Brasil (Folha de São Paulo, 31/03/2008).
No país, a falta de saneamento básico ainda é responsável por um grande número
das internações nos hospitais públicos. Ou seja, fica evidente que a “dimensão
ambiental penetra no social” (Iniguez e Oliveira, 1996, p. 2). É possível estabelecer
uma relação entre a queda da mortalidade infantil e o aumento da expectativa de
vida às melhorias das condições sanitárias (Minayo et al., 2000; Minayo, 2006).
Vemos constantemente ruas sem calçamento, inexistência de redes de
esgotos e para o escoamento das águas pluviais, valas negras e mosquitos. Toda
essa precariedade urbana é intensificada pela falta de postos de saúde e hospitais
capazes de atender as necessidades dos moradores. Assim, o descuido com a
saúde pública e o saneamento faz com que essas periferias tornem-se espaços de
endemias e epidemias (Corrêa, 2001). É inadmissível, o número de pessoas
acometidas por parasitoses, doenças de pele, respiratórias e diarréicas, que na
maioria das vezes tem como causa a falta de higiene e, como agravamento o próprio
local de moradia, que deveria ser assistido pelo poder público. Sendo o espaço
geográfico produzido socialmente, possui formas associadas ao poder político,
econômico, sócioambiental e cultural. É uma das funções da geografia, assim como
38
de outras ciências, estudar a produção do espaço e seus agentes modeladores,
buscando a compreensão das desigualdades sociais e do ordenamento espacial.
Dessa forma, encontra-se na saúde da população mundial respaldo para as lutas e
reivindicações por melhores condições de moradia, de vida.
Em Corrêa (1988) vemos que caminham juntos, “a subnutrição, as doenças, o
baixo nível de escolaridade, o desemprego, ou o subemprego (p. 29)”. Enquanto,
Jannuzzi diz que os tipos e formas dos domicílios é outro fator que deve ser
considerado, para buscar melhores condições de vida:
A adequação domiciliar na zona urbana depende, entre outros fatores, do acesso à rede de serviços de infra-estrutura básica de luz elétrica, abastecimento de água tratada, saneamento e coleta de lixo. Historicamente os grandes progressos contra a mortalidade infantil no Terceiro Mundo, decorrente de doenças infecto-parasitárias, se devem à ampliação da cobertura desses serviços. (Jannuzzi, 2003, p. 109)
A água como substância essencial à existência dos homens é um direito de
todas as sociedades, mas segundo Clarke e King (2005) mais de 1 bilhão de
pessoas não tem acesso a fontes de água segura, e que 2,3 bilhões de pessoas
sofrem de doenças disseminadas pela água, informações compartilhadas também
pela OMS. O Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (2007) aponta a febre
tifóide, a disenteria, o cólera, a diarréia, a hepatite, a leptospirose e a giardíase como
sendo as enfermidades mais transmitidas pela água no país. Dentre elas, a diarréia
é a de maior abrangência entre os países não desenvolvidos, “cerca de 4 milhões de
pessoas são afetadas anualmente, e muitas delas, na maioria crianças, morrem em
conseqüência da desidratação que acompanha os casos de diarréia” (Clarke e King,
2005, p. 47), conforme mostra a Figura 5. O TCE-RJ (2007) ressalta ainda que “a
água de qualidade também é importante fator de inclusão social, uma vez que a
população de baixa renda dificilmente tem condições de pagar medicamentos para
tratar as doenças de veiculação hídrica, ou até mesmo ter recursos para acesso à
água de qualidade para beber” (p. 15).
39
Figura 5 Estimativa de países afetados por mortes a partir da precariedade de qualidade e acesso a água, esgoto e falta higiene, em 2000 (Clarke e King, 2005).
Muitos estudiosos têm desenvolvido pesquisas que apontam a relação direta
entre a qualidade da água servida e disponível e a saúde da população, dentre os
serviços de saneamento básico, esse é o que tem recebido maior atenção nos
trabalhos acadêmicos. Razzolini e Günther apontam que “a falta ou a precariedade
do acesso à água representa situação de risco que propricia aumento da incidência
de doenças infecciosas agudas e da prevalência de doenças crônicas” (2008, p. 21),
conforme Quadro 1. Ainda corroboram, que as condições de abastecimento trazem
conforto, bem-estar, prática de hábitos de higiene e produtividade econômica.
Áreas sem rede de abastecimento de água, além de agravar as condições de
vida obriga a busca por fontes alternativas, onde a qualidade sanitária é duvidosa. O
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em trabalho
desenvolvido em 2005, estabeleceu como meta no documento Objetivos do
40
Desenvolvimento do Milênio, reduzir em 50% a população mundial sem acesso à
água segura. Assim, reduziria as longas distâncias percorridas diariamente por
pessoas (principalmente mulheres e crianças) para buscar água em outras fontes,
que pode comprometer sua estrutura física, devido o peso carregado em baldes e
vasilhames, às vezes sobre a cabeça, propiciando a ocorrência de doenças
crônicas, como as dores nas costas. Essa prática é ainda mais grave quando
praticada por crianças, já que a ossatura não está devidamente formada,
comprometendo seu desenvolvimento (Razzolini e Günther, 2008).
O abastecimento seguro e constante também evitaria a prática de estoques,
que propicia a criação de larvas. Na maioria dos casos a coleta, o transporte e o
armazenamento da água são feitos de forma inadequada, os utensílios utilizados
ficam nos quintais, sem proteção alguma, e podem estar sujos, contaminando a
água. E por dispor de um volume diário baixo, muitas atividades são comprometidas,
como a higienização das roupas, o banho diário, a lavagem das mãos e utensílios
domésticos e o preparo dos alimentos (Quadro 2).
Segundo Feachem e col (1983 apud Razzolini e Günther, 2008) existem cinco
grupos de enfermidades associadas à água: a) vinculadas à falta de higiene pessoal
e doméstica pela ineficiência do abastecimento; b) contato com a água; c)
transmitida por vetores aquáticos; d) as que são disseminadas pela água, e e) as
que são transmitidas pela água. Exemplos são os casos de febre tifóide, de
tracomas, de diarréias, de parasitoses, dores de barriga e doenças de pele. E os
indivíduos mais atingidos e suscetíveis a essas doenças são aqueles com sistema
imunológico comprometido, seja por desnutrição ou por não estar plenamente
desenvolvido, como as crianças menores de cinco anos. Também se enquadram os
idosos e os imunodeprimidos.
No mundo todo, as crianças são indiscutivelmente as mais prejudicadas. A
diarréia que atinge amplamente essa classe etária pode matar por causar
desidratação, e em sua fase crônica a criança já desnutrida fica ainda mais
vulnerável. Quando não mata debilita o doente de tal forma que torna-se facilmente
suscetível a outros males. Um bom exemplo é a esquistossomose, parasita que
retarda o crescimento e o desenvolvimento das crianças. Não dá para afirmar se a
pobreza agrava essas doenças ou se é a própria causa delas.
No Brasil, a qualidade da água para atendimento humano deve atender a
padrões de potabilidade, segundo a Portaria nº 518/2004 (Ministério da Saúde), a lei
41
especifica parâmetros físico-químicos, químicos e bacteriológicos por contaminação
fecal. Fezes humanas ou animal contaminam a água com bactérias e outros agentes
causadores de doenças infecciosas (disenteria amebiana, cólera, tifo, e poliomielite).
O solo também é contaminado por esses agentes patogênicos, constituindo perigo
para as pessoas que estão em contato direto com ele.
Quadro 1 Modelo de classificação ambiental de infecções e principais medidas de controle (Razzolini e Günther , 2008)
Classificação
Infecção
Via dominante
de transmissão
Principais medidas de controle
Doenças feco-orais não-
bacterianas
Enterobíase,amebíase, giardíase, balantidíase
Pessoal e doméstica
• Abastecimento doméstico de água
• Educação sanitária • Melhorias habitacionais
• Instalação de fossas
Doenças feco-orais
bacterianas
Salmonelose, cólera, disenteria bacilar, diarréia por E. Coli
Pessoal, doméstica, por água e alimentos
• Abastecimento doméstico de água
• Educação sanitária • Melhorias habitacionais
• Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes do
lançamento ou do reuso da água
Helmintos do solo
Ascaridíase, tricuríase, ancolostomíase
Jardim, campos e culturas agrícolas
• Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes da aplicação no solo
Teníases
Teníases
Jardim, campos e pastagens
• Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes da aplicação no solo
Helmintos hídricos
Esquistossomose e outras doenças causadas por
helmintos
Água
• Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes do
lançamento na água • Controle do reservatório
animal Doenças
transmitidas por insetos
Filariose e todas as infecções anteriores, das quais moscas e baratas podem ser
vetores
Vários locais contaminados
por fezes
• Identificação e eliminação de criadouros
de insetos vetores
42
Quadro 2 Relação entre o nível de acesso a água versus necessidades atendidas e grau de efeitos à saúde (Razzolini e Günther , 2008)
Nível de acesso
Distância percorrida e tempo gasto
Provável volume
coletado
Demanda atendida
Grau de efeitos
Sem acesso
> 1 km e > 30 minutos
Muito baixo (em torno de 5 L per capita
por dia)
Consumo não assegurado, o que
compromete a higiene básica e dos
alimentos
Muito alto
Acesso básico
< 1 km e < 30 minutos
Média não excede a 20 L per capita por
dia
Consumo pode ser assegurado e deve-
se possibilitar a higiene básica e dos
alimentos. Há dificuldade de se
garantir a lavagem da roupa e banho,
atividades que podem ocorrer fora dos
domínios do domicílio
Alto
Acesso intermediário
Água fornecida por torneira pública (à
distância de 100 m ou 5
minutos para coleta)
Média aproximada de 50 L per
capita por dia
Consumo assegurado. Não há comprometimento da higiene básica e dos alimentos. É possível garantir a lavagem da roupa e o banho, que
provavelmente ocorrem dentro dos
domínios do domicílio
Baixo
Acesso ótimo
O Suprimento de água ocorre
mediante múltiplas torneiras
Média aproximada de 100 L a 200 L per
capita por dia
Consumo assegurado. Práticas
de higiene não comprometidas.
Lavagem da roupa e banho ocorrem dentro
dos domínios do domicílio
Muito baixo
A ausência da rede de esgoto agrava ainda mais esses problemas, “o
descarte seguro das fezes humanas é um fator básico na luta contra muitas doenças
infecciosas, e o esgoto seguro sem tratamento constitui um problema de saúde
permanente” (Clarke e King, 2005, p. 50). O despejo sem tratamento em rios, lagos
e oceanos é um problema a ser enfrentado por todos os países, mas nas áreas mais
pobres existe carência até de instalação de vasos sanitários. Assim, falta
privacidade e incentivo para as práticas de higiene, é impossível ensinar as crianças
a lavar as mãos após fazer suas necessidades fisiológicas se elas não dispõem de
banheiro, torneiras e água. Razzolini e Günther completam que “as ações de
43
saneamento se tornam ainda mais efetivas quando acompanhadas de intervenção
de educação sanitária, capazes de promover mudança comportamental na
população, que se traduz na incorporação de hábitos e práticas de higiene” (p. 29).
Melhores condições de governabilidade, desempenho do governo são necessários
para terminar com esse quadro de insustentabilidade ambiental e desrespeito aos
direitos humanos. Verificados na iniqüidade social, na degradação ambiental e na
exclusão dos serviços públicos básicos.
Analisando especificamente os dados de saneamento básico do município de
Duque de Caxias, o estudo socioeconômico do município apresentado pelo TCE-RJ
(2007), apurou dados no ano 2000, informando que “no tocante ao abastecimento de
água, Duque de Caxias tem 69,3% dos domicílios com acesso à rede de
distribuição, 27,9% com acesso à água através de poço ou nascente e 2,7% têm
outra forma de acesso à mesma” (p. 17). Pesquisas também foram feitas com
relação aos resíduos urbanos, no tocante ao município caxiense, o TCE-RJ (2OO7)
informou que “88,9% dos domicílios tem coleta regular de lixo, outros 3,6% têm seu
lixo jogado em terreno baldio ou logradouro, e 6,8% o queimam” (p.18). Já a
Fundação CIDE (2006) informa que são coletadas 756,8 toneladas de lixo por dia
em Caxias, tendo como destino o Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho, no
próprio município. No relatório do TCE-RJ (2007) “a rede coletora de esgoto
sanitário chega a 57,1% dos domicílios do município; outros 20,9% têm fossa
séptica, 4,3% utilizam fossa rudimentar, 13,2% estão ligados a uma vala, e 3,5% são
lançados diretamente em um corpo receptor (rio, lagoa ou mar)” (p. 18).
Pesquisa divulgada pela ENSP (Escola Nacional de Saúde Pública) com
dados do IPEA (2008) revela que “apesar do crescimento de 3,2 pontos percentuais
desde 2001 na cobertura dos serviços de saneamento no país, 34,5 milhões de
pessoas ainda vivem sem acesso à coleta de esgoto nas áreas urbanas” (Fiocruz,
2008). No mesmo artigo, pesquisadora da instituição diz: "os mais pobres têm
menos saneamento, é isto que temos que discutir" (p. 01) e pesquisador do Ipea e
Anac “cita dados dos censos demográficos de 1980 a 2000 e mostra que as famílias
com renda acima de dez salários mínimos têm cobertura de água 50% maior e, na
coleta de esgoto, quase 100%, concluindo que os investimentos, embora
majoritariamente públicos, não conseguiram anular os efeitos da concentração de
renda (p.02). Confirmando a relação direta entre pobreza, carência dos serviços de
saneamento básico e doenças, conforme elucida a Figura 6.
44
Figura 6 Esquema do ciclo de relação entre água, saneamento e pobreza (Razzolini e Günther, 2008).
4.2.4 Tipos e Equipamentos de Saneamento
A distribuição pública de água exige sua posterior coleta, para afastamento
da área servida capaz de evitar a poluição do solo e contaminação das águas
superficiais e subterrâneas. De acordo com Pereira (2003) “o rápido afastamento
dos dejetos e águas servidas é um dos objetivos quando da construção das
habitações, o que precisa ser realizado de forma tecnicamente correta, pois, caso
contrário, essas águas residuárias poderão poluir/contaminar as proximidades e até
mesmo locais mais distantes da habitação, trazendo conseqüências danosas e
desagradáveis para o meio ambiente e para a saúde pública” (P. 37).
São comuns as reivindicações por abastecimento de água, mas pouco nota-
se em relação as manifestações em prol da instalação de rede de esgoto, e muitos
ainda desconhecem sua necessidade de tratamento. Considerando o abastecimento
de água e a rede de esgoto que são elementos fundamentais e inseparáveis do
saneamento básico, segue uma abordagem sobre os principais tipos desses
equipamentos (Layrargues, 2002, Rosso et. al., 2002, Braga et al., 2002).
����Esgoto e Água
Existem três tipos básicos de esgoto:
45
1) Esgoto Sanitário: proveniente de atividades domésticas,
comerciais e públicas, composto basicamente por substâncias orgânicas,
água de banhos, fezes, urina, restos de comida, sabão e detergentes;
2) Esgoto Industrial: composto por substâncias orgânicas e
minerais, pode causar obstruções e corrosões na tubulação devido à
presença de resíduos ácidos;
3) Esgoto Pluvial: é intermitente e sazonal por depender do regime
de chuvas, a precipitação provoca lavagem do terreno, telhados, tubulações,
entre outros. Possui elevada carga poluente e muitas vezes é difícil conter
seu fluxo para tratamento.
A população em sua maioria não dá muita atenção ao manejo de águas
pluviais, que consiste no “conjunto de intervenções estruturais e não estruturais, com
o objetivo de controlar o escoamento superficial das cidades, evitando assim
desastres naturais relacionados ao excesso de água e doenças decorrentes de
inundações” (Bernardes et al., 2006 apud Kobiyama et al., 2008). Segundo os
autores, o manejo das águas pluviais é fundamental no contexto da saúde pública,
as inundações podem acarretar contaminações, principalmente quando poços e
fossas se rompem e transbordam espalhando os detritos.
Vamos nos ater ao esgoto sanitário, que tem por objetivo coletar e remover
de forma rápida e segura as águas residuárias, evitar a poluição do solo, tratar os
afluentes e eliminar odores e aspectos estéticos desagradáveis. É constituído por
99,9% de água e 0,1% de matéria sólida orgânica ou mineral, além de bactérias
aeróbias (Layrargues, 2002, Braga et al. 2002).
Um esquema de esgoto sanitário é constituído por dispositivos e canalização
para coletar e afastar os resíduos das residências, existindo diversos tipos de
coletores (Rosso et al., 2002). Exemplo:
- coletores prediais: canalização que leva as águas residuárias das
edificações para coletores públicos;
- coletores secundários: canalização que recebe os efluentes dos
coletores prediais;
- coletores tronco: canalização principal que recebe afluente de vários
coletores e conduz para interceptores ou emissário;
- coletores interceptores: canalização que evita descargas diretas em
praias, lagos e cursos d’água por interceptar fluxos coletores;
46
- emissários: conduto final que afasta os efluentes da rede pública até
seu local de lançamento não recebendo contribuições ao longo do curso;
- estação elevatória: instalações eletromecânica comum em terrenos
planos que empurra as águas através de bombeamento, não necessitando de
declividade para o escoamento, para entrada dos efluentes em estação de
tratamento ou corpo d’água receptor.
Em locais que não dispõem dos serviços públicos de esgoto são adotadas
medidas individuais por parte dos moradores, sendo comum à privada sanitária ou a
fossa séptica. A primeira é mais comum em áreas rurais e com pouca
disponibilidade de água, porque não ocorre o transporte dos dejetos. A segunda é
uma solução para residências que dispõem de abastecimento de água.
• Privada Sanitária: as excretas humanas são lançadas em um buraco no
terreno, o solo possui um poder depurador que irá decompor a matéria orgânica
presente nas fezes e na urina através da ação das bactérias. Ocorre decomposição
aeróbia (presença de oxigênio) na parte externa da excreta e anaeróbia (sem
oxigênio) na parte interna, gerando odores fétidos. Devem ficar longe de poços
porque as excretas podem contaminar o lençol freático. Logo a adoção de privadas
sanitárias não é uma solução adequada para o bairro Cangulo, onde grande parte
das residências utiliza água de “poções” perfurados nos quintais.
• Fossas Sépticas: consiste em câmaras construídas abaixo do nível do
terreno, onde o esgoto fica retido para decantação dos sólidos e retenção das
gorduras provenientes das cozinhas, lavanderias, chuveiros, vasos, ralos, entre
outros. A fossa permite a saída de líquido isento de matérias decantáveis e
flutuantes, mas com odor desagradável devido a decomposição, e grande
quantidade de bactérias. Esse material será lançado em corpos de água receptores
(geralmente rios); em sumidouros (escavações com paredes protegidos com tijolos,
pedras ou madeiras sem rejuntamento para facilitar a infiltração. Deve ficar
localizado a uma distância mínima de 20 metros de qualquer fonte subterrânea,
segundo NB-41/81); vala de infiltração (manilhas de juntas abertas ou tubos
perfurados para infiltração no terreno); vala de filtração (duas canalizações
superpostas com camada de areia entre elas, imprópria para solo com baixa
capacidade de absorção segundo NBR 7229/93); filtros de areia (mesmo princípio
da vala de filtração, mas utilizado para unidades maiores de fossas sépticas).
47
A parte sólida (lodo) que fica retida no fundo da fossa deve ser removida no máximo
a cada três anos pra não comprometer sua eficiência. Antes de começar a limpeza a
fossa deve ficar aberta para permitir a saída do gás produzido, que é danoso à
saúde (Kobiyama et al., 2008). Quando em pequena quantidade pode ser
descartado na solo ou em rios, caso contrário deve ser transportado até uma ETE.
Já as medidas coletivas de disposição do esgoto podem ser e três tipos:
1º) Lagoas de estabilização: é um sistema de tratamento biológico mediante a
decomposição da matéria orgânica pela ação de bactérias (aeróbias e anaeróbias) e
algas. Tem como vantagem o baixo custo de operação e manutenção;
2º) Emissários submarinos: sistema que utiliza o poder de depuração da água do
mar (mais rápido que em água doce) para matar bactérias. Ocorre grande diluição e
dispersão, dos poluentes para bem longe das praias. No Rio de Janeiro é obrigatório
que haja um tratamento prévio do esgoto antes de ser despejado no mar para
retirada de sólidos grosseiros;
3º) Estação de tratamento de esgoto (ETE): o Rio de Janeiro foi à terceira cidade do
mundo a ter uma ETE, um conjunto de instalações que tratam o esgoto em
diferentes níveis (preliminar, primário, secundário, terciário) e tempo de
processamento de acordo com o uso que será dado no corpo receptor (banho,
irrigação, abastecimento). Sua implantação se justifica quando se pretende atender
toda uma bacia ou região. O grau de tratamento pode conter processos físicos,
químicos e biológicos.
Pereira (2003), chama atenção para os inconvenientes do lançamento de
esgoto bruto em corpos de água, como o prejuízo ao aspecto estético, a redução do
teor de oxigênio e a contaminação da massa líquida. Complementa dizendo que
após o tratamento do esgoto é preciso cuidar do destino final dos subprodutos
gerados, o lodo e os gases. Geralmente, os efluentes gasosos são coletados e
lançados na atmosfera, enquanto o lodo é encaminhado para aterros sanitários e
incineradores.
Em relação à água para consumo, pode-se dizer que estas são poluídas de
diversas formas, o que depende da origem, a qual poder ser de fonte poluidora
natural ou humana, conforme o Quadro 3 abaixo, nota-se os principais processos
poluidores.
48
Quadro 3 Processos e definidores da poluição das águas
Deve-se ressaltar a questão da poluição do solo, uma vez que eventuais
mudanças em suas características podem acarretar em problemas nocivos à
população. Os cuidados quanto à poluição do solo estão principalmente associados
à relação água-solo superficial e subsuperficial, assim como a preservação da
qualidade das águas.
Em relação à poluição associada a atividades humanas, são atribuídas à
disposição de resíduos sólidos e líquidos, a urbanização e ocupação do solo, as
atividades agropecuárias, as atividades extrativas e a acidentes no transporte de
cargas (Rosso et al., 2002). Atividades de cultivo, plantações de diversas espécies
vegetais, fundação para edificações, aterros, estradas, sistema de disposição de
resíduos, entre outros, podem ocasionar impactos ou modificações importantes
relativos às:
●obras civis, a partir de urbanização e ocupação do solo, alterações na estrutura e
no ciclo hidrológico;
●na exploração extrativa do solo: remoção de grandes quantidades de materiais,
alteração do relevo e erosão;
●nas atividades agrícolas com a aplicação de nutrientes e defensivos agrícolas
altera o ambiente, polui as águas superficiais e subsuperficiais. A remoção sazonal
da cobertura vegetal ocasiona a erosão.
A solução para o controle da poluição da água e do solo leva em
consideração estratégias que se considere a bacia hidrográfica como um todo, para
Processos Definição Contaminação Lançamento em água de substancias químicas orgânicas,
inorgânicas e microorganismos, nocivas a saúde e as espécies de vida aquática, como por exemplo, patogênicos e metais pesados.
Assoreamento Acumulo de areia. argila e outras substancias minerais ou orgânicas (lodo) em um corpo d'água que provocara a redução de sua profundidade e de seu volume útil.
Eutrofização Lançamento de excesso de nutrientes na água (nitrogênio e fósforo), ocasionando um crescimento excessivo e descontrolado de algas e plantas a aquáticas.
Acidificação Queda de pH, como decorrência da chuva acida (chuva que carreia substancias químicas, tais como bióxido de enxofre, óxido de nitrogênio, amônia e bióxido de carbono, provenientes da poluição do ar), contribuindo para a degrada da vegetação e da vida aquática.
49
efeito de planejamento das atividades urbano-ambientais, uma vez que tal não
ocorra o controle terá eficiência limitada. Desta forma, deve-se considerar a
implantação de sistemas de coleta e tratamento de esgotos sanitários e industriais; o
controle de focos de erosão, sendo importante considerar o papel da drenagem
pluvial; recuperação dos rios, permitindo a restauração de suas condições naturais,
anteriores a degradação. Conforme o PDBG (Rosso et al., 2002, Roque, 2002), as
medidas que devem ser tomadas visam atender as leis de controle de poluição
vigentes: abastecimento de água, esgotamento sanitária, coleta e destino de lixo,
disciplinamento dos usos e da ocupação do solo, reflorestamento e reintrodução de
espécies de animais e peixes.
Segundo Roque (2002), em relação ao padrão de potabilidade da água,
o Ministério da Saúde define no Brasil os padrões de água para consumo
humano. Enquanto que a resolução CONAMA no 20/86 divide as águas do território
nacional em função dos usos em águas doces (salinidade <0,05%), salobras (salinidade
entre 0,05% a 0,3%) e salinas (salinidade 0,3%). A Portaria no 36/90 do mesmo
ministério estabelece um conjunto de valores máximos permissíveis das
características da água. Em relação a algumas características das águas, ressaltam-
se as seguintes:
●Cor - a cor da água, quando e de origem natural, não apresenta riscos à
saúde, mas se a origem for de atividades humanas como, por exemplo,
despejos industriais podem ser tóxicos. A cor existe devido a material
dissolvido na água.
●Sabor e Odor - não apresentam riscos à saúde em águas naturais, o sabor é
associado à combinação entre o gosto (salgado, doce, azedo e amargo) e o
odor (cheiro), podem causar repulsa ao consumo.
●Turbidez - o grau de turbidez traduz a turvação da água, de forma geral não
apresenta inconvenientes sanitários diretos, porém, é esteticamente
desagradável e os sólidos suspensos que geram a turbidez podem servir de
abrigo para microorganismos patogênicos.
Algumas substâncias causam desconforto visual, como: o ferro e o manganês
causam manchas nos tecidos, louças e tem grande importância na fabricação de
papel e celulose; enquanto os sulfatos e o magnésio produzem efeitos laxativos; a
dureza pode causar odor desagradável e não permite a formação de espuma,
50
aumentando o consumo de sabão, podendo causar incrustações em tubulações de
água quente, como caldeiras e aquecedores.
Dentre os padrões nocivos associados ao consumo humano, deve-se
considerar os que são provenientes das atividades industriais, dos detergentes, do
processamento e refinamento de petróleo e dos agrotóxicos. Relevantes também
são as características bacteriológicas da água, as quais indicam a presença de
coliformes fecais, diretamente associadas ao saneamento, conforme Quadro 4
notam-se os valores de padrão máximo.
Quadro 4 Máximos valores de padrão permitidos de bacteriologia na água (Roque, 2002)
Características Unidade Valor máximo permitido
Bacteriológicas
Coliformes fecais
Coliformes totais
NMP/100ml
NMP/100ml
ausente*
ausente
Ausente - NMP/100ml – número mais provável de microorganismos coliformes ou coliformes fecais
por 100 ml de água. *Somente se aplica quando for água para consumo
Os coliformes são grupos de bactérias indicadores de contaminação da água por fezes
ou esgotos, utilizados para detectar microorganismos patogênicos capazes de causar
doenças em uma determinada amostra de água, para cada individuo a media de eliminação
de bactérias é em torno de 10 a 100 bilhões de bactérias/por dia. Os coliformes totais são
utilizados como indicadores indiretos da probabilidade de a água estar contaminada por outros
microorganismos, capazes de causarem doenças, enquanto os coliformes fecais são
utilizados como indicadores para padrões de banho como mar e piscina, com limite de NMP
coliformes fecais 1000/100m (Braga et al. 2002).
O Documento-Base para Formulação da Fase II do PDBG (Rosso et al.,
2002) especifica os sistemas responsáveis pelo abastecimento de água dos
municípios que integram a bacia da Baía de Guanabara, que juntos atendem a
7.700.000 habitantes:
� Sistema integrado do Rio de Janeiro e Baixada Fluminense (Guandu,
Ribeirão das Lajes e Acari);
� Sistema integrado de Niterói e São Gonçalo;
� Sistemas isolados para municípios de Itaboraí, Magé, Cachoeiras de
Macacu e Rio Bonito.
51
O município de Duque de Caxias é abastecido pelo primeiro dos sistemas
expostos, ficando sob responsabilidade da CEDAE, que infelizmente não atende a
todos os bairros do município, como verificado no bairro Cangulo. O sistema de
distribuição da água precisa ser monitorado periodicamente para evitar estragos à
água servida, já que ela pode sofrer uma série de mudanças no caminho que
percorre entre a estação de tratamento e a casa do consumidor, como variações
químicas e biológicas. Segundo Freitas et al. (2008), “a qualidade da água liberada
para o consumidor pode variar espacial e temporalmente dentro do sistema de
distribuição” (p.111). Os principais fatores dessa variação podem ser: a qualidade
química e biológica da fonte hídrica; a eficácia no processo de tratamento,
reservatório e distribuição; a idade e o projeto de manutenção da rede; a qualidade
da água tratada; e a mistura de diferentes fontes (Clark e Coyle, 1990 apud Freitas
et al., 2008).
Esse cuidado com a rede de distribuição, além de melhorar a qualidade da
água distribuída, evitaria as perdas, principalmente de água já tratada e potável, que
dependendo do caso pode chegar a 60% (Kobiyama et al., 2008). Os domicílios que
não contam com abastecimento público utilizam água proveniente de: poço freático;
poço artesiano; cisterna; carro-pipa. Ou percorrem longos caminhos para buscar
água em bicas e canos, o que pode ocasionar problemas físicos (conforme item
Saneamento e Saúde) e contaminação da água (Quadro 2). Fica sempre a dúvida
quanto à qualidade dessas águas, sobretudo para as populações mais carentes que
desconhecem a existência de laboratórios de análise de potabilidade da água, ou
não podem arcar com os custos cobrados.
A ONU, reconhecendo o elevado número de mortes infantis em conseqüência
da carência de água potável, condições higiênicas saudáveis e esgotamento
sanitário adequado, instituiu o ano de 2008 como o Ano Internacional do
Saneamento. Dados do PNUD (2008) confirmam que 41% da população mundial
não tem acesso ao saneamento básico. O objetivo da ONU é promover um alerta
mundial para essa situação, promovendo uma sensibilização que acelere o
cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). A cúpula do
milênio, que contou com 189 países, reunida em Nova Iorque no ano 2000
estabeleceu uma série de objetivos visando melhoras em saúde, educação,
habitação, saneamento, meio ambiente e promoção da igualdade de gênero.
52
No tocante ao saneamento, a meta é reduzir pela metade, até 2015 o
contingente populacional sem acesso a água potável e esgotamento sanitário. No
Brasil, melhoras são esperadas com a implantação do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) lançado em 2007 pelo Ministério do Planejamento. De acordo
com o Ministério das Cidades (2008) 40 bilhões deverão ser investidos no setor
entre 2007 e 2010. Dentro do PAC fica estabelecido: políticas de desenvolvimento
econômico, de infra-estrutura, de urbanização de favelas e saneamento, contando
com investimentos do Orçamento Geral da União (OGU), do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço (FGTS) e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
A participação do Brasil no Ano Internacional do Saneamento contou com um
Grupo de Trabalho (GT) formado pelo governo e pela sociedade civil e coordenado
pela Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades. Foi
criada uma agenda de ações com os seguintes objetivos: avançar na
universalização dos serviços; colaborar no alcance aos ODM; apoiar a produção e
disseminação de informações sobre o setor integrando pessoas e instituições;
mobilizar e articular entidades gestoras, prestadores de serviços, instituições de
ensino, pesquisadores, entre outros.
A necessidade estabelecer um ano como “O Ano Internacional do
Saneamento” acena para a gravidade do problema em âmbito mundial e para o
descaso em que vivem milhões de pessoas pela falta dos serviços básicos de
saneamento. Porém, no Brasil, somente com cumprimento da Lei 11.445 é que os
objetivos apresentados poderão ser alcançados, beneficiados ainda pela
regulamentação da Lei dos Consórcios (11.107/2005), o que caracteriza um
momento promissor para o setor no país (Costa, 2007 apud Sales, 2007).
4.3 Características e Contraposições da Lei de Saneamento
No Brasil, existem diversas leis elaboradas para assegurar e regular os
direitos e os deveres da população brasileira, assim como garantir sua segurança e
bem-estar. Segundo as intenções desse trabalho, a Lei das Águas (9.433/1997) e a
Lei de Concessões (8.987/1995) que regulamenta a participação do capital privado
nos serviços públicos, são exemplos claros, por abordar especificamente assuntos
relacionados ao saneamento básico. Entretanto, vamos nos ater a Lei 11.445,
aprovada em 2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento
53
básico e cria regras para usuários, operadoras e titulares. Pode-se dizer que essa
Lei, elaborada pelo Ministério das Cidades, é um marco regulatório do saneamento
no país, "acenando para um novo tempo de investimentos" (Sales, 2007, p. 17).
Dessa forma, o setor de saneamento passa por uma reformulação, durante o
governo militar, o PLANASA foi um modelo centralizador, mas com a aprovação da
Lei 11.445/2007 o setor caminha para sua descentralização (Sales, 2007).
Durante a década de 1980 o país passou por um processo de
democratização, e com a promulgação da Constituição Federal de 1988 houve uma
descentralização de poder e de responsabilidades. União, Estados, Municípios e
Distrito Federal são dotados de autonomia, ao contrário do que ocorria nas
Constituições anteriores, principalmente com relação aos municípios. Com a maior
autonomia dos municípios houve a municipalização de alguns serviços, assim como
a transferência de verbas. Mas, segundo Oliveira Filho (2007 apud Sales, 2007) “as
mudanças começaram a serem sentidas com a criação de políticas originadas pelo
processo de democratização, como a elaboração de leis orgânicas municipais, a
criação de planos diretores, do orçamento participativo, o fortalecimento dos
conselhos municipais e das transferências de verbas” (p. 68).
Quando trata-se de governo, descentralização é o mesmo que transferência
de responsabilidades e poder da União para outros entes da Federação, com
destaque para o município, já que a maioria dos serviços é de interesse local. Assim
sendo, essa esfera governamental ganha novas atribuições e responsabilidade,
além de subsídios para a sustentação dos serviços, exigindo uma reestruturação
das prefeituras. Segundo Sales (2007), "a titularidade dos municípios não impede,
no entanto, que outras esferas de governo atuem nos mesmos setores, desde que
amparados por legislação pertinente" (p.36). Este é um fator importante, tendo em
vista a desigualdade existente entre as regiões. De acordo com o censo demográfico
do IBGE, em 2005 o Brasil contava com 5.564 municípios, mas nem todos possuem
capacidade de gerar receitas próprias, sendo dependentes de transferências de
recursos financeiros de outras esferas do governo. Em valores absolutos, o
município de Duque de Caxias apresenta um dos maiores PIB do estado, no qual a
força econômica explica-se, principalmente, por sua inserção na cadeia produtiva do
petróleo, conforme a Fundação CIDE (2003) o PIB per capita (R$) é de 11.477,26,
em relação ao Estado do Rio de Janeiro.
Talvez ainda não esteja claro que esfera governamental é de fato
54
responsável pelos serviços de saneamento básico, mas fica evidente que existe
disputa pela titularidade de determinados serviços capazes de gerar lucros
orçamentários. Diz-se que "se as estruturas físicas necessárias à prestação do
serviço ultrapassam os limites municipais, o serviço deixa de ser de interesse local
e passa a ser de interesse comum, assim de competência do Estado" (Sales, p. 39),
entretanto, o interesse gira em tomo das concessões, principalmente sobre as
grandes cidades e regiões metropolitanas.
Prefeituras sem recursos econômico-financeiros precisam ser atendidas
pelas companhias estaduais que, "perdendo as concessões das grandes cidades,
ficariam impedidas de praticar o princípio da subsidiaridade e arcariam com o ônus
de espaços geográficos que não apresentam capacidade de auto-sustentação"
(Sales, 2007, p. 39). Ou seja, o Estado não quer perder as concessões sobre as
áreas lucrativas, e o município deseja receber subsídios para o setor. A verdade é
que as companhias estaduais continuaram com o monopólio do setor mesmo após
a titularidade municipal, e isso só começou a ser modificado com a aprovação da
Lei de Concessões (8.987/1995) em 1995.
Sabe-se que o objetivo da Lei 11.445/2007 é atingir a universalização nos
serviços de saneamento básico, e os serviços de água e esgoto no Brasil vêm
sendo feito através dos contratos de concessão, conforme pode ser observado na
Figura 7 para o Estado do Rio de Janeiro. Ou seja, uma entidade privada ou uma
concessionária fica responsável pelos serviços nas atividades de gestão,
manutenção, operação e investimentos, por um período de 15 a 30 anos, mas os
ativos permanecem como propriedade do poder público. Ao término do contrato, se
o investimento não for recuperado a concessionária deverá ser ressarcida pelo
concedente. Os serviços prestados são pagos diretamente pelo consumidor, e se
os custos de operação e capital ultrapassar a renda líquida o próprio órgão privado
arca com as despesas extras. Essa modalidade tem sido adotada no país
principalmente após a aprovação da Lei de Concessões (8.987/1995). No setor de
saneamento, de acordo com a ABCON (Associação Brasileira das Concessionárias
de Serviços Públicos de Água e Esgoto), 51 municípios apresentam concessões
privadas, dentre estes se encontra o Estado do Rio de Janeiro conforme Figura 7.
55
Figura 7 Espacialização das operadoras de Água e Esgoto do Estado do Rio de Janeiro, nota-se que o município de Duque de Caxias tem como operadora a CEDAE (Sales, 2007).
O mercado de concessões nos serviços de água e esgoto entra em
expansão no país após a aprovação da Lei de Saneamento Básico, porque serve
de estímulo para a realização de parcerias com o poder público (gerando enorme
competição no período de licitação), visando à ampliação dos serviços necessária
para a universalização no atendimento. Essa meta depende fortemente dos
Mu
nic
ípio
de
Du
qu
e d
e C
axia
s
56
municípios, “responsáveis” pela titularidade do setor, não existe em âmbito nacional
uma agência reguladora e as agências estaduais já não têm capacidade de
investimento. O PLANASA foi o primeiro plano de saneamento a nível nacional, sob
regulação do BNH, almejava o abastecimento de água para 90% da população e os
serviços de esgoto para 65% da população de regiões metropolitanas e cidades de
grande porte, (conforme item 5.1) até 1990, não atendendo as zonas rurais, já que
concentrou os investimentos nas áreas mais desenvolvidas. Entretanto, existia a
necessidade de regulação do setor, através da criação de regras que delineassem
seu desenvolvimento. Tal necessidade decorreu na aprovação da Lei de
Saneamento Básico no início de 2007.
Esta Lei constitui um marco regulatório para o saneamento básico do país
ao anunciar um novo cenário de desenvolvimento, que pode ampliar a participação
do capital privado no setor, porque diminui os riscos de investimentos. Isso pode
ocasionar uma ampliação das Parcerias Público-Privadas (PPP) que segundo a
ABCON é o caminho necessário para atingir a universalização no atendimento. Uns
dos princípios fundamentais da Lei é a universalização do acesso, a integralidade
dos serviços e a transparência das ações. E considera como serviços de
saneamento básico a limpeza urbana, o manejo e drenagem de águas pluviais, o
abastecimento público de água potável e o esgotamento sanitário. Também
estabelece a integração entre os serviços e os recursos hídricos, tendo como base
a bacia hidrográfica na qual se insere o município.
O problema é que a própria Lei torna-se confusa por não apresentar clareza
na distribuição das tarefas entre as três esferas do governo, não define a quem
cabe as competências, atribuições e responsabilidades estipuladas em seu corpo.
Também não define uma estrutura para conselhos federais, estaduais e municipais
que venha a constituir um sistema nacional, e isso torna ainda mais difícil o controle
dos serviços pela população. A existência de conselhos com participação no âmbito
municipal, estadual e federal, conforme a esfera de interesse e a titularidade
facilitaria o controle das atividades pela sociedade. Esse grupo de interesse precisa
de uma participação maior, não só para exigir e reivindicar, mas porque são
importantes fontes de consulta para os órgãos, empresas e concessionárias
responsáveis pela execução das obras e serviços de saneamento prestados.
Entretanto, de forma geral, ainda não há de fato casos em que a população local
seja consultada antes da intervenção ambiental para obras públicas, mesmo
57
sabendo-se que eles conhecem mais que ninguém seu local de moradia. Trata-se
de um conhecimento empírico, adquirido no cotidiano, que pode ignorar, por
desconhecimento, os termos técnicos dos profissionais, mas sabem relatar com
precisão os problemas locais, assim como a incidência dos fatos negativos que
afligem a comunidade. Cita-se como exemplo as características da água e a
regularidade do abastecimento, que podem ser informados pelos moradores,
conforme pesquisado nos questionários aplicados nas residências do bairro
Cangulo.
Além de contribuir com a experiência vivida os moradores locais deveriam
atuar na fiscalização do cumprimento das normas, tarefa que dificilmente será
desempenhada sem a concretização de uma agência reguladora. A ausência da
agência reguladora é outro ponto negativo a ser analisado, porque caberia a ela
definir e fiscalizar o cumprimento da Lei de acordo com as normas estabelecidas.
Juntamente com a sociedade civil organizada, conforme exemplo de organização e
ação do orçamento participativo verificado em algumas cidades. Porém, com intuito
de controle sobre as políticas de saneamento, não tendendo apenas para o caráter
reivindicatório como é mais comum nesse tipo de participação.
No capítulo II que trata da titularidade dos serviços fica uma impressão
ambígua que compromete sua implementação (Feu, 2007), apenas estabelece ser
dever do titular formular a política pública de saneamento básico, elaborando
planos que deverão ser revisados dentro de um prazo de até quatro anos,
antecedendo a elaboração do Plano Plurianual. É dever dos titulares também fixar
os direitos e deveres dos usuários, assim como estabelecer mecanismos de
controle social.
A Lei aponta o controle social como um dos princípios da prestação dos
serviços, mediante a seguinte definição de controle social: “o conjunto de
mecanismos e procedimentos que garantem à sociedade informações,
representações técnicas e participações nos processos de formulação de políticas
de planejamento e de avaliação relacionados aos serviços públicos de saneamento
básico” (Inciso IV, Artigo 2º). Assim, parece demonstrar que o saneamento não é
apenas um direito do cidadão, mas que compete a este também participar do seu
planejamento e da sua fiscalização. Porém, não define os mecanismos para que o
controle social seja exercido.
Outro fator negativo que cabe ser mencionado é a não garantia da
58
participação popular no planejamento (Capítulo IV), apenas divulga a realização de
audiências e consultas públicas. Se o usuário constitui o principal beneficiado com
a eficiência da prestação dos serviços de saneamento, o interesse da coletividade
popular deveria no mínimo ser levado em consideração. Mesmo que a Lei assegure
o acesso às informações sobre os serviços prestados mediante divulgação pública,
contando com registros atualizados, nada estabelece sobre a periodicidade desse
tipo de publicidade.
Resta ainda outra questão relevante, ainda que a Lei garanta o acesso às
informações sobre os serviços prestados, permanece a dúvida quanto aos órgãos
de reclamação. Não se sabe a quem recorrer para fazer reclamações, a
responsabilidade pelos serviços é da prefeitura ou da empresa/concessionária
contratada para sua execução? Se a Lei estabelece que o saneamento básico é
um direito, deveríamos ser tratados como cidadãos e não como meros
consumidores de um serviço prestado (Feu, 2007). Considero o saneamento básico
como um direito social, que constitui uma conquista da população, dessa forma,
não deveríamos procurar um órgão de defesa do consumidor para fazer uma
reclamação, como quem compra uma mercadoria com defeito.
Ainda que, a Lei faça menção à qualidade de vida (satisfação das
necessidades básicas e manutenção do bem-estar coletivo) ao estabelecer sua
articulação com políticas de interesse social (desenvolvimento urbano, habitação,
combate à pobreza, promoção da saúde, proteção ambiental), comete falhas que
precisam ser reparadas, porque sua legislação parece ser insuficiente, apresenta
acertos importantes e necessários para a política de saneamento, mas parece
esquecer de alguns pontos chaves indispensáveis para sua eficácia.
Sabe-se que, a manutenção da qualidade de vida ambiental depende, entre
outras coisas, do monitoramento permanente dos serviços de saneamento básico
prestados, tanto pelo poder público quanto por empresa privada. A fiscalização
desses serviços é indispensável para o seu cumprimento, mas, sobretudo para
monitorar sua regularidade, por isso a participação da população é tão importante.
Se o abastecimento de água não é regular obriga a população a manter a prática
de estocagem e reduzir o volume de consumo diário, que pode comprometer sua
higienização. Se a coleta de lixo domiciliar não é periódica provoca o acúmulo de
resíduos sólidos que podem atrair vetores.
Diante das informações apresentadas, esclareço tratar-se de interpretações
59
pessoais sobre o corpo da Lei, com base nas interrogações que ela deixa no ar, já
que não disponho do conhecimento jurídico necessário para uma análise mais
sucinta.
4.4 Estatuto da Cidade e Plano Diretor: como instrumento de qualidade
Institucionalmente, o país teve alguns avanços no que concerne à proteção
ambiental para garantia de ambiente mais sadio para sua população. Em âmbito
nacional, foi criada dentro do Ministério das Cidades (2003), a Secretaria Nacional
de Saneamento Ambiental, tendo como missão “assegurar os direitos humanos
fundamentais de acesso à água potável e à vida em ambiente salubre nas cidades e
no campo, mediante a universalização do abastecimento de água e dos serviços de
esgotamento sanitário, coleta e tratamento dos resíduos sólidos, drenagem urbana e
controle de vetores reservatórios de doenças transmissíveis” (Rezende & Heller,
2008).
O Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001) é uma legislação criada com o
princípio de construir cidades ideais, ou seja, sustentáveis, estipulando a criação de
planos diretores municipais. Segundo o Estatuto, até o ano de 2006, os municípios
com mais de 20.000 habitantes, os que pertençam a regiões metropolitanas e
aglomerações urbanas, e integrantes de áreas de interesse turístico e sujeitas à
atividades de impacto ambiental, deveriam promover a elaboração e aprovação de
seus plano diretores.
Dessa forma, preconizado pelo Estatuto da Cidade, o Plano Diretor é uma lei
municipal que estabelece diretrizes para a ocupação da cidade, devendo identificar e
analisar suas características físicas, as atividades predominantes, as vocações da
cidade, assim como seus problemas e suas potencialidades. Sua elaboração deve
considerar aspectos econômicos, sociais, culturais, ambientais e urbanos. Ele deve
ser discutido e aprovado pela Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito,
mas além dos setores do governo podem participar da sua discussão e elaboração,
associações de moradores, sindicatos, conselhos comunitários, comerciantes,
universidades, ONGs, conselhos regionais, incorporadores imobiliários, entre outros.
Segundo Brandt (2008), “o Plano Diretor é um instrumento da Política Urbana, é o
plano de desenvolvimento da cidade, de modo a garantir uma cidade eqüitativa no
que diz respeito a condições de moradia, trabalho, transporte, saúde, mobilidade e
60
equipamentos urbanos”. Já em Silva apud Brandt (2008), “o Plano Diretor é um
plano, porque estabelece os objetivos a serem atingidos, o prazo em que estes
devem ser alcançados, as atividades a serem executadas e quem deve executá-las.
É diretor porque fixa as diretrizes do desenvolvimento urbano no Município”.
Assim sendo, Duque de Caxias instituiu seu Plano Diretor Urbanístico em
outubro de 2006, estabelecendo diretrizes e normas para o ordenamento físico-
territorial e urbano do município, tendo como um dos seus princípios fundamentais:
Art. 3º. Este Plano Diretor e suas revisões sucedâneas devem promover o
pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade e o uso
socialmente justo e ecologicamente equilibrado do território, de forma a assegurar
aos habitantes condições de bem estar e segurança.
Assim, é possível trabalhar para uma cidade mais justa, diminuindo as
injustiças sociais. De interesse direto para o tema deste trabalho, cito como sendo
fundamental os artigos abaixo apresentados do presente plano diretor:
Capítulo II - dos objetivos estratégicos
Art. 6º. III Promover a destinação de verbas orçamentárias para elevar as
condições gerais de mobilidade e segurança pública, de habitação de interesse
social e saneamento ambiental, em especial de infra-estrutura de rede de esgotos,
de macro-drenagem, de abastecimento de água, bem como para áreas verdes
urbanas, de interesse ambiental e para o ordenamento urbano.
Capítulo II - das políticas sociais
Art.12. As políticas sociais são aquelas que visam prover benfeitorias e
serviços de saúde, educação, lazer e habitação de interesse social à população, de
forma a garantir e promover eqüidade social e qualidade de vida.
Capítulo IV – da política de obras e de infra-estrutura urbana
Art.20. Constituem infra-estrutura urbana os Sistemas de Abastecimento de
Água, de Drenagem Pluvial, de Esgotamento e Tratamento Sanitário, de
Fornecimento de Energia em suas diversas modalidades, de Iluminação Pública e
de Disposição de Resíduos Sólidos, com foco permanente em processos de
reciclagem;
Art.22. O órgão municipal competente de obras deverá promover a integração
de ações de instalação e manutenção de infra-estrutura de água, esgotos e
drenagem pluvial aos programas de saúde pública e educação sanitária, em
consonância com as normas de proteção ao meio ambiente.
61
Verifica-se no município que o centro (1º distrito) é mais contemplado com
infra-estruturas e equipamentos urbanos, em detrimento das áreas periféricas
distantes da sede administrativa, naturalmente ocupadas por população mais
carente, onde predomina a precariedade na oferta de serviços. Seguidas as metas
do recente aprovado Plano Diretor da cidade será possível uma melhor alocação de
recursos, e reordenamento de acordo com as peculiaridades da dinâmica da cidade,
contribuindo para solucionar e abrandar seus problemas, decorrentes do seu
processo histórico e da ineficácia das políticas até então implementadas.
5 Etapas de Desenvolvimento do Trabalho
Para a melhor compreensão das características dos problemas urbanos e
ambientais, faz-se necessário o desenvolvimento de nível compilatório e correlatório,
importante salientar, para uma melhor avaliação dos resultados. Além disso, foi e é
de primordial importância as etapas como de levantamento bibliográfico da área de
estudo, para a análise mais detalhada da formação espacial e localização do
município de Duque de Caxias e do bairro do Cangulo, assim como a etapa de
campo para o reconhecimento da área, estudo do meio físico e da infra-estrutura
local, a qual permite a avaliação dos problemas sócio-ambientais associados ao
saneamento.
5.1 Questionários
Questionários são instrumentos para se aferir dados quantitativos, assim
como qualitativos, já as entrevistas são primordiais na obtenção direta de
informações qualitativas, embora seja possível a obtenção de informações de
caráter quantitativo. Muitas vezes, essa última é indispensável para se iniciar a
construção de questionários. Em relação aos questionários, é importante ressaltar
que estes devem apresentar uma redação objetiva, clara, seguida de um
agrupamento das questões, uma boa apresentação gráfica e concisa (Marangoni,
2005). Para não haver problemas na obtenção dos dados em campo, faz-se
primordial uma preparação prévia na elaboração do questionário, sendo assim foi
realizado um primeiro campo prévio de reconhecimento da área. Posteriormente, a
percepção de alguns problemas ambientais no Bairro, foi-se elaborado o
62
questionário (Anexo 1 e 2) e discutida a relevância das perguntas a partir da base
teórica do trabalho. Para uma maior acuidade das informações foram utilizadas no
trabalho algumas variáveis com base no questionário básico do censo demográfico
do IBGE, de 2000, conforme Anexo 3, assim como o questionário suplementar de
meio ambiente da mesma instituição, de 2002, com mostra o Anexo 4. Uma vez
finalizada tais etapas o mesmo foi aplicado em um universo total de 123
questionários, tais foram levados para laboratório com fins de quantificação e análise
dos dados, o que permitiu a geração de informações.
5.1.1 Desenvolvimento e tratamento dos dados
Para a obtenção de resultados de qualidade faz-se necessário alguns critérios
como: considerar os objetivos da pesquisa, elaborando um questionário apropriado
ao tema proposto. Ressalta-se que, cada quesito a ser abordado deve ser
cuidadosamente analisado quanto a sua utilidade para os resultados a serem
alcançados, uma vez que a aplicação de questionário no campo exige um grande
dispêndio de tempo e trabalho.
Algumas indagações foram realizadas para fins de caracterização da
população local, isto é, se constituiu como técnica de classificação socioeconômica
do indivíduo. Para fins de uma boa investigação o universo de amostragem foi
caracterizado e delimitado em duas etapas, a primeira foi realizada com indivíduos
ao acaso e a segunda , posteriormente foi proferida em unidades domiciliares
(Figura 8 A e B).
63
Figura 8. Planta do bairro do Cangulo, em A, nota-se manchas representativas das áreas onde foram realizados os questionários de forma aleatória, enquanto em B, encontram-se tracejadas as ruas onde foram aplicados os questionários em domicílios. (Fonte: Prefeitura de Duque de Caxias, 2009, adaptada pelo autor)
Área de distribuição dos questionários em rua
Área de distribuição dos questionários em rua domicílios
A
B
64
Segundo Marangoni (2005) o pesquisador deve ter um prévio conhecimento
das pessoas que serão alvo das questões formuladas. É de fundamental importância
que o pesquisador tenha prévio conhecimento das pessoas que serão alvo das
questões formuladas, principalmente no que se refere à linguagem a ser utilizada,
uma vez que deve ser adequadamente compreendida pelo público.
Pode-se dizer que para um bom desenvolvimento da pesquisa de campo a
partir de questionários é importante:
- elaboração de listagem de toda e qualquer pergunta que possa ser feita, cuja
resposta deva atender de forma direta ou indireta as intenções do pesquisador,
possibilitando a seleção posterior das perguntas que de fato interessem ao melhor
conhecimento em relação ao objeto de estudo e a hipótese de trabalho.
- composição de lista de possíveis cruzamentos das variáveis em questão, tal pode
ser fundamental para elaborar quesitos não lembrados, ou para mostrar a inutilidade
de dados que a priori seriam interessantes. Ressalta-se que cada pergunta que não
se refira ao tema específico resulta em perda de tempo e pode prejudicar o
desenvolvimento e analise dos resultados.
- deve-se considerar uma ordem lógica de encadeamento entre as perguntas, acaso
essas sejam desconexas podem acarretar em má compreensão do indivíduo
questionado.
- para cada quesito indagado deve-se pensar no formato da resposta, como por
exemplo, o número de categorias possíveis, assim como a facilidade de aplicação
do questionário e tabulação dos dados. Pode-se dizer que cada pergunta
corresponde a uma variável, e as respostas possíveis, a categorias da variável,
conforme Marangoni (2005). Segundo o mesmo autor as perguntas podem: prever
respostas abertas sem condução, quando não se prevêem as categorias possíveis,
ou fechadas, quando se predeterminam as categorias que devem ser indicadas.
Ressalta-se que embora formato fechado facilite o preenchimento do questionário e
a tabulação dos dados, não se deve utilizá-lo de forma indiscriminada, dessa forma
acaba-se perdendo informações preciosas. Normalmente, questionários utilizados
para obter uma grande variedade de dados apresentam mais de uma maneira de
formulação de questões.
- importante fazer teste de aplicação e tabulação dos dados e posteriormente corrigir
eventuais problemas.
65
- posteriormente a aplicação dos questionários deve-se proceder à tabulação dos
dados, o mais cedo possível, para que não se percam detalhes sobre o
procedimento e se possam corrigir eventuais falhas de informação.
Ressalta-se que a sistematização de dados quantitativos, aplica-se a qualquer
tipo de informação, seja ela produto de questionários ou mesmo de medições
específicas em cada área do conhecimento (Galvani, 2005).
A analise de um conjunto de dados com uso de tendência central nos permite
avaliar para onde converge o dado. Desta forma, foi aplicada no tratamento dos
dados a média aritmética e freqüência.
A media aritmética é uma metodologia simples e comum, passível de
aplicação a qualquer conjunto de dados, e expressa o somatório de todos os
elementos da serie dividido pelo numero total de elementos. Em que Xi e cada
elemento da serie, e i varia de 1 a ni n e o numero de elementos e o símbolo L
significa somatório de todos os elementos da série (Galvani, 2005). Tal é expressa
pela equação abaixo:
Já para o calculo de variáveis ordinais ou quantitativas estas se expressam a
partir da freqüência, tal é o número de vezes que determinado evento ocorreu entre
todos os elementos amostrados, isto é, segundo Galvani (2005) o número de vezes
que determinado evento ocorreu (na) em relação ao número total de elementos da
serie (n), a qual é dada pela seguinte equação:
Obs. Ambos os dados gerados no questionário foram manipulados em termos
de percentagem.
66
6 Análise dos Resultados
O resultado dos questionários realizadas no bairro Cangulo (Anexo 1),
possibilitaram uma boa avaliação quanto à infra-estrutura local, no que tange a
ausência ou precariedade dos serviços de saneamento básico, considerados
fundamentais para a qualidade de vida ambiental. Para a obtenção dos mesmos
foram aplicados 72 questionários e descartados quatro, totalizando 68,
posteriormente foram quantificados os dados no quesito perguntas fechadas e,
assim como, a criação de classes quanto a perguntas abertas.
Foram realizadas perguntas relacionadas à faixa etária, renda, escolaridade,
profissão, tempo de residência no bairro, características de condições de saúde,
oferta de serviços, competência do trabalho da prefeitura, e problemas locais. Além
desses, também foram avaliados o acesso à água e qualidade da mesma, coleta de
lixo, ocorrência de alagamento, condições da rede de esgoto e sua relação com
problemas de saúde e degradação ambiental.
Após a análise dos resultados obtidos no primeiro questionário, foi elaborado
um segundo questionário (Anexo 2), no mesmo formato do primeiro, porém, com
perguntas mais específicas sobre as questões apontadas pelos moradores no
questionário anterior, aprofundando tanto os dados quantitativos quanto os
qualitativos obtidos no primeiro contato. Ressalta-se que, durante a elaboração do
segundo questionário seguiu-se alguns padrões já pré-estabelecidos pelo IBGE
(Anexo 3 e 4). A diferença é que no questionário 1 os entrevistados foram abordados
aleatoriamente nas ruas do bairro, enquanto no questionário 2, foram feitas visitas
às residências, totalizando um total de 51 casas, distribuídas por 23 ruas do bairro.
Apenas três perguntas se repetiram em ambos os questionários, as referentes à
faixa etária, escolaridade e tempo de moradia no bairro. As demais perguntas eram
referentes à forma de abastecimento de água, a periodicidade do recebimento, o
volume das caixas da água, o tipo de poço, a qualidade da água para consumo,
assim como do rio local, e as possíveis fontes poluidoras do recurso hídrico,
conforme Anexo 2. Questionou-se também o tipo de escoadouro dos dejetos
humanos e do esgoto doméstico, o destino dos resíduos sólidos, se existia relação
entre esses serviços de saneamento e a saúde dos moradores. Interrogou-se sobre
a atuação da prefeitura ou de outros órgãos públicos no monitoramento da qualidade
da água e no diálogo com a população local sobre as obras de pavimentação
67
realizadas atualmente no Cangulo e finalizando com questões relacionadas à
percepção dos moradores sobre a qualidade de vida ambiental do lugar em que
vivem.
Em relação às características gerais da população local (conforme
questionário 1) e relações de propriedade (conforme questionário 3), pode-se dizer
que o maior número de entrevistados está na faixa etária dos 20 aos 50 anos (Figura
9 A), em conformidade com o município (Farias, 2005). Em torno de 75% têm
apenas o primeiro e segundo seguimento do ensino fundamental de escolaridade
(Figura 9 B), possuem uma renda média de dois salários mínimos (Figura 9 C), e em
maioria trabalham com serviços e comércio, característica também encontrada para
o município como um todo (MTE, 2003). E conforme Silva (2006), deve-se observar
que a qualidade de vida depende tanto das condições de vida, que engloba a má
distribuição de renda, o baixo nível de escolaridade e as condições de habitação,
quanto do déficit social.
Trata-se de pessoas que, em sua maioria, residem no bairro entre 11 e 25
anos (Figura 9 D), dando maior consistência as informações obtidas, uma vez que
moram a mais de 10 anos, assim como nasceram no próprio local. Em cada
domicílio residem em torno de 3 pessoas, em média, o que vai de acordo com o
trabalho de Farias (2005) para o Município de Duque de Caxias. Tais informações
foram reafirmadas a partir das três perguntas repetidas, conforme colocado
anteriormente, quais obtivemos resultados semelhantes aos do questionário 1, ou
seja, trata-se de pessoas com idade entre 20 e 50 anos, que moram no bairro a mais
de 16 anos e possuem o ensino fundamental incompleto, na sua maioria, conforme
pode ser percebido na Figura 9.
68
Figura 9. Distribuição da classe etária, em A, nível de escolaridade, em B, renda média dos amostrados, em C, e tempo de moradia, em D, dos entrevistados para o Bairro do Cangulo.
A B
C D
56
69
Já em relação ao quesito posse do terreno ou domicílio, de grande
importância por indicar relações com o espaço vivido, pode-se observar que 85%
dos entrevistados têm domicílio próprio (Figura 10 A), enquanto ao que se refere a
posse da propriedade (terreno) 77% é proprietário, menos de 20% vive em terreno
cedido e apenas uma pequena parcela tem algum outro tipo de condição sobre a
propriedade ou não respondeu, por não saber quais suas condições de habitação
(Figura 10 B).
Figura 10. Condições da fora de moradia e propriedade de habitação (terreno), conforme questionário aplicado por entrevistados (%) por domicilio.
próprio (quitado)
próprio (quitando)
alugado
cedido (por empregador)
cedido (outra forma)
outra condiçãocondição do domicílio
A
B
0 20 40 60 80 100
próprio
cedido
outra condição (aluguel ou invasão)
não respondeu condição do terreno
% entrevistados
70
A grande maioria dos moradores não mostrou vontade de residir em outro
bairro, principalmente pela baixa violência, entretanto em um primeiro instante
detectam que a falta de infra-estrutura, transporte e serviço são piores problemas
locais, conforme 80 % dos amostrados, e associam tal a baixa qualidade do trabalho
da prefeitura.
Ao questioná-los quanto à qualidade do serviço de saneamento, o
abastecimento de água foi considerado o pior serviço para 41% dos entrevistados,
enquanto a coleta do lixo foi considerado o mais eficiente, contemplando 91% das
residências, por atender a maior parte do bairro (Figura 11). Próximo dos 40%
percebem que suas casa se encontram em área de alagamento, mas não tem
consciência que estão sujeitos a enchentes.
Figura 11 Maiores problemas locais por percentagem de entrevistados. Fonte:
Próprio autor
A quase totalidade dos domicílios não dispõe de abastecimento de água
encanada, de responsabilidade da CEDAE, 82% das residências utilizam poços
perfurados nos quintais para o consumo familiar, a minoria compra e alguns não
sabem nem de quais lugares provem à água de consumo (Figura 12 A). Porém,
muitos duvidam da qualidade da água disponível que consomem, foram apontados
problemas relacionados principalmente a cor (27%), ao sabor atrelado ao salobro
(21%) e a poluição (24%), conforme Figura 12 B. Tais classificações variam
71
conforme a localização do domicílio no bairro, uma vez que o mesmo se encontra
em área de ocupação sobre mangue. Em suma, pode-se dizer que o abastecimento
de água é tão precário quando a captação do esgoto. Este conjunto de fatores
acarreta nas condições de saúde da população.
Figura 12 Percentual de exploração/uso da água, em A, e classes de qualidade da água por entrevistados, em B.
Quanto ao sistema de esgotamento sanitário, percebe-se o desconhecimento
dos moradores sobre o que é a rede de esgoto, já que quase metade dos
entrevistados (49%) disseram dispor da mesma em sua casa, contraditoriamente
apontaram como destino final dos dejetos as valas negras presentes nas ruas
(Figura 13), enquanto outros, simplesmente não souberam responder. Tal retrata a
situação do próprio município, pois conforme o censo (IBGE, 2002), expõem-se que
em relação ao saneamento que apenas 56% dos domicílios no município têm
saneamento adequado, isto é, esgotamento sanitário, abastecimento de água e
coleta de lixo. Ressalta-se que o IBGE considera como adequada às ligações de
esgoto na rede geral, não há distinção entre galerias de captação de esgoto e
galerias de captação de águas pluviais. Sabe-se que em geral, as galerias são
utilizadas com dupla função, o que ocasiona o despejo do esgoto “in natura” nos rios
da região e na Baía de Guanabara. Em geral, os domicílios não possuem saídas de
esgoto ligadas à rede geral ou fossa séptica, o que significa que continuam a lançar
o esgoto diretamente nas valas.
A B
72
Os entrevistados afirmam saber que a falta de tratamento do esgoto traz
prejuízos ambientais, mas não sabem apontar quais são de fato. Quando indagados
da relação esgoto sem tratamento x saúde, foram quase unânimes em concordar
com a questão, as doenças foram apontadas como o maior prejuízo decorrente do
esgoto a céu aberto. No entanto, não souberam identificar quais são as doenças
advindas da questão. Ou seja, sabem da relação entre os dois fatores, mas
desconhecem as causas e os problemas afins. Quanto aos problemas decorrentes
do esgoto a céu aberto, os moradores classificaram como sendo os maiores: a
transmissão de doenças (38%), a presença de insetos e ratos (22%) e o mau cheiro
(22%), conforme Figura 14.
Figura 13 Variação percentual dos locais comuns de despejo do esgoto, segundo moradores. Fonte: Próprio autor
73
Figura 14 Variação dos problemas ambientais associados à degradação ambiental e o problema de saneamento, por ordem de importância, na percepção dos entrevistados.
Quando do maior aprofundamento dos quesitos relativos às questões
domiciliares (questionário 2) explana-se, de forma geral, que mais de 50% não
dispõe de abastecimento de água pública, fazem uso de poços, construídos
principalmente pelos próprios moradores, sem a participação de um técnico
responsável pela perfuração. Tal vai de encontro ao exposto por Faria (2005) e TCE
–RJ (2007), pois o Município de Duque de Caxias tem 69.3% com fornecimento de
água por rede geral. Enquanto, do tocante da população do município 27,9% tem
acesso à água através de poço ou nascente e 2,7% têm outra forma de acesso à
mesma. Desta forma, deve-se advertir para a questão da concentração de alguns
equipamentos urbanos principalmente na área do primeiro distrito (centro) do
município, o que não responde a realidade local.
Além disso, mais de 90% dos poços nunca passaram por nenhum tipo de
análise quanto à qualidade da água (Figura 15 A), ou seja, a prefeitura não tem a
preocupação de monitorar a água consumida pela população ali residente. E os
próprios moradores não têm essa iniciativa, seja por desconhecimento ou pelo alto
valor cobrado em laboratórios que fazem esse tipo de serviço, considerando aqui o
baixo poder aquisitivo da população local (Figura 9 C), que recebe em média um
74
salário mínimo, conforme resultado do primeiro questionário. Porém quando
perguntados se era de interesse saber a qualidade da água que consomem e se ela
traz algum risco para a saúde, mais de 90% dos entrevistados disseram que sim
(Figura 15 B).
Figura 15 Resposta sobre realização de avaliação da qualidade de água dos domicílios, em A, e se o entrevistado gostaria de ser informado sobre a qualidade em relação ao risco à saúde, em B.
Do total de moradores que utilizam água proveniente de poço (Figura 16 A),
mais de 50% deles utilizam uma espécie de poço coletivo, ou seja, um único local de
perfuração atende a diversos domicílios, concomitantemente, devido o fato de serem
poucos os locais possíveis de captar água em condições para consumo imediato.
Quanto às características associadas à falta de qualidade da água, o sabor foi
apontado como o principal fator negativo, seguido da cor e do odor (Figura 16 B).
Muitos moradores informaram que não possuem poço no próprio quintal porque a
água captada naquele ponto apresenta-se muito amarelada, com alto teor de
ferrugem e gosto salgado, não servindo para beber, mesmo após processo de
filtração. Conforme Roque (2002), de forma geral, a cor e sabor quando de origem
natural não são tão nocivas à população. Entretanto, algumas substâncias causam
desconforto visual e alguns pequenos problemas domésticos como manchas em
roupas ou utensílios, que acabam por onerar o gasto como, por exemplo, o sabão.
Entre os moradores usuários de poços, mais de 50% dispõem de água canalizada
em pelo menos em um cômodo da casa, através da instalação de canos e bombas
avaliação sobre qualidade da água 7,84%
92,2%
avaliação sobre qualidade da água
sim
não
90,2%
9,8%
simnão
informações sobre qualidade de água
informações sobre qualidade de água
A B
75
que fazem a sucção da água diretamente do poço para caixas de água, a maioria
com capacidade para mil litros de água, sendo necessário o reabastecimento diário
da mesma, o que é feito por mais da metade desse percentual de pessoas.
Entre os demais moradores que não dispõe de poço (Figura 16 A), 20% deles
são abastecidos por uma rede geral, ligada ao sistema da CEDAE. Porém, a
irregularidade no recebimento da água faz com que muitos moradores se vejam
obrigados a comprar água, prática realizada através de carros pipas. Pouco mais de
40% dos entrevistados disseram receber água diariamente através dos canos da
CEDAE, outros quase 40% informaram receber água entre uma e duas vezes por
semana, enquanto quase 20% só são abastecidos a cada quinze dias (Figura 16 C),
cabe ressaltar que foi percebido, em diversas vezes, que os moradores confundem o
bombeamento da água de poço com o fornecimento da CEDAE, pois alguns têm os
dois sistemas.
É importante salientar, que a compra de água é praticada também entre
alguns moradores usuários de poço, porém esses compram garrafões de água
apenas para beber e preparar alimentos para crianças ainda de colo, por
desconfiarem da qualidade da água que utilizam. Há ainda uma parcela menor de
moradores que não dispõe de poço nem são abastecidos por sistema público de
água. Desse percentual de pessoas, mais de 40% compram água, segundo os
dados analisados, apresentando uma certa freqüência de uma a duas vezes por
semana, enquanto outros só podem efetuar a compra quinzenalmente (Figura 16 D),
não por dispor de uma capacidade maior de armazenamento do galão para
consumo, mas por não ter condições financeiras de comprar em intervalos menores.
Concomitante ao já mencionado, a maioria dos residentes do bairro sobrevive com
um salário mínimo (Figura 9), sendo assim, a necessidade de comprar água, além
de comprometer o orçamento das famílias faz com que o uso diário seja reduzido,
comprometendo sua higiene pessoal e consequentemente sua saúde, conforme
demonstra o trabalho de Razzolini e Günther (2008). E ainda conforme os mesmos,
se o abastecimento de água não é regular obriga a população a manter a prática de
estocagem e reduzir o volume de consumo diário, que pode comprometer sua
higienização.
76
Figura 16 Formas de abastecimento de água por domicílio, em A, características de qualidade da água, em B, periodicidade de abastecimento pela rede geral, em C, e periodicidade de compra de água em D, por entrevistado/domicílio.
23,7%
26,3%
36,8%
11,8%1,32%
0 10 20 30 40 50 60
somente da rede geral
poço ou nascente
rede geral e compra
poço e compra
somentecompra
outras formas
forma de abastecimento de água
0 10 20 30 40 50
diáriamente
1-2 vezes por semana
quinzenal
periodicidade de abastecimento de água
0 10 20 30 40 50
diáriamente
1-2 vezes por semana
quinzenal
periodicidade na compra de água
Odor
Cor
Sabor
nenhum
não resondeu
A B
C
D
(%) (%)
64
77
Ao interrogá-los sobre as possíveis causas da poluição desse recurso hídrico,
o despejo de esgoto doméstico foi apontado por mais de 40% dos entrevistados,
constituindo, na opinião dos moradores, o principal motivo da contaminação, logo
após foram assinalados consecutivamente, a disposição inadequada dos resíduos
sólidos, o despejo de resíduos industriais, o derramamento de óleos ou graxas, entre
outros (Figura 17). Notou-se que, embora não estejam satisfeitos com a água
consumida os mesmos não tem informações plausíveis sobre a qualidade da água
consumida o que deve ser considerado um problema, pois conforme a Lei de
saneamento é assegurado o acesso às informações sobre os serviços prestados
mediante divulgação pública, contando com informação atualizada, embora não
sejam encontrados registros sobre a periodicidade desse tipo de informação.
Figura 17 Frequência de ocorrência (%) das possíveis causas da poluição em recursos hídricos por entrevistado/domicílio. Fonte: Próprio autor
0 5 10 15 20 25 30 35
Despejo de resíduos industriais
óleos ou graxas (inclusive derramamento de petróleo)
Ocupção irregular em área de recarga de lençois
Despejo de esgoto doméstico (inclusive fossa rudimentar)
Disposição inadequada de resíduos sólidos (lixo)
Ocupação irregular em área de proteção permanente
possíveis causas da poluição da água
78
Assim como no primeiro questionário, o serviço de coleta dos resíduos sólidos
apresentou resultado positivo, representando novamente o melhor dos serviços de
saneamento desenvolvido pela prefeitura no bairro. Mais de 70% dos entrevistados
disseram ter seu lixo coletado por serviço público de limpeza, pouco mais de 10%
precisam levá-lo até uma caçamba de coleta, outros jogam em terreno baldio ou
queimam se o carro de coleta demorar demasiadamente para fazer o serviço, tais
dados obtidos vão de acordo com o trabalho de Faria (2005) e TCE-RJ (2007).
Sendo assim, não vamos nos ater a questão do lixo doméstico, e sim a análise do
esgoto doméstico.
Na observação do destino do esgoto (Figura 18 A) das residências do bairro,
mais de 40% das casas utilizam à fossa séptica, a fossa rudimentar foi apontada por
um número inexpressivo de entrevistados. Outros 40% apontaram como destino a
rede geral de esgoto, que no caso do bairro está atrelada à rede de coleta de água
pluvial, ou seja, o esgoto pluvial e o esgoto doméstico têm o mesmo destino. E
menos de 10% dos entrevistados mostraram como destino do esgoto as valas, ainda
existentes em alguns logradouros, tendo em vista que nem todo o bairro foi atendido
pelas obras de pavimentação recentemente implementadas, entretanto vale
ressaltar que a diferença temporal entre os questionários nos mostra dois
momentos, uma vez que quando do primeiro instante a maioria colocou as valas
como destino final do esgoto (Figura 12), enquanto no segundo momento tal não
aparece com mesmo percentual. Cabe contrapor tal informação, as obras
recentemente implementadas são perceptíveis e já causaram mudanças no sistema
de coleta do esgoto ou muitos moradores realmente não tem consciência do despejo
final.
Com a tentativa de verificar a relação existente entre esgoto doméstico,
poluição e saúde, os moradores foram interrogados quanto a esses fatores.
Constatamos que quase 70% dos domicílios possuem apenas um banheiro com
sanitário, mais de 20% disseram ter dois banheiros e outros disseram não ter
nenhum ou mais de dois banheiros. Entre o total de entrevistados, mais de 60% não
acreditam que seu esgoto seja capaz de poluir a água, mesmo o esgoto doméstico
tendo sido considerado um dos principais fatores de contaminação do recurso,
conforme já mencionado na Figura 17. Essa resposta foi mais comum entre aqueles
que utilizam o chamado poço coletivo (mais de 50% dos entrevistados), até por que
79
a distância entre o poço e a fossa destes é bem maior do que aqueles que possuem
poço próprio, ou seja, no quintal.
Adverte-se que, dentre as estratégias da Agenda 21 Brasileira tem-se a
questão de ampliar a responsabilidade ecológica, disseminando informação e
promovendo a capacidade dos diversos atores de identificar as relações de
interdependência dos fenômenos sociais, ecológicos, econômicos, e aceitar o
princípio da co-responsabilidade, isto é, do governo e enfatizando da sociedade para
a gestão de recursos, embora a grande maioria não tenha consciência quase
nenhuma de suas responsabilidades. Toda localidade deve possuir a capacidade de
produzir e consumir reduzindo impactos, possibilitando assim uma sustentabilidade
urbana (Silva, 2006).
A maioria dos entrevistados não soube dizer qual é a distância existente
exata entre o poço e a fossa. Mas em um grande número de residências essa
distância não chega ao mínimo necessário (20 metros) para evitar a contaminação
da água do poço. Em mais de 10% das residências essa distância não chegou aos
quinze metros, e em apenas quase 30% a distância é maior que trinta metros
(Figura 18 B).
Embora, muitos domicílios tenham sistema de esgoto ligado à rede geral ou
fossas, cabe ressaltar que, a grande maioria não somente faz autoconstrução para o
poço, mas também para sua fossa, Figura 18 C e D, logo indaga-se a forma ou
padrão destas construções. Dentre a carga poluidora da água os efluentes
domésticos possuem elevada concentração de carbono orgânico, cloretos,
nitrogênios, sódio, magnésio sulfato, alguns metais pesados, dentre os de maior
risco à água são os nitrogênios e microorganismos patogênicos. Hirata (2001),
exemplifica tal mostrando que em áreas de densidade populacional de 20 pessoas
por hectare pode gerar uma carga de 100kg/ha/ano de nitrogênio que se oxidado por
100mm/a de infiltração de água da chuva, pode resultar em recarga local de
100mg/L de nitrato para o aqüífero, isto é, dez vezes maior que o aceitável para o
nível de potabilidade. Segundo o mesmo autor, o estabelecimento de zonas de
proteção em torno de um poço é fundamental, pois tal estratégia baseia-se na idéia
de que, quanto mais próxima uma atividade do poço, maior é o perigo de
contaminação.
80
0 5 10 15 20 25 30 35 40
até 15
15-30
> 30
não sabe
distância entre fossa e poço
B
(%)
Dis
tân
cia
em m
etro
sauto-construçãopoço/fossa
construção coletiva
técnico
41,4%
55,2%
3,45%
construção de poço/fossa
C D
0 10 20 30 40 50
rede geral de esgoto ou pluvial
fossa séptica
fossa rudimentar
rede geral mais fossa
vala
rio, lago ou mar
outro tipo deescoadouro
ligação sanitária do domicílio
A
(%)
Figura 18 Despejo do esgotamento sanitário, em A, distância média entre fossa e poço, em B, característica de auto-contrução poço/fossa, em C, visão geral de falta de cuidado do bombeamento da água e próximo à vala, em D. Fonte: Próprio autor 68
81
Na sequência do questionário, a saúde e as doenças começaram a ser
abordadas, perguntando sobre os problemas de saúde que atingem as famílias.
Com relação aos problemas associados às doenças, mais uma vez a poluição do ar
ganha destaque, foi o fator mais apontado pelos entrevistados, assim como a
presença de esgoto a céu aberto, presença de lixo na proximidade e questões
relacionadas à água, como poluição e contaminação (Figura 19 A). Fatores como
desmatamento, ocupação irregular, contaminação do solo, queimadas e a poluição
sonora foram apontados quase na mesma proporção pelo total de entrevistados.
A poluição atmosférica apontada como o principal fator pode estar
relacionada à proximidade com a Refinaria Reduc, já que os moradores conseguem
perceber que a constante presença de fumaça, próximo às casas, polui o ar,
comprometendo o bom funcionamento dos pulmões, e consequentemente a saúde,
sobretudo das crianças que apresentam problemas respiratórios, conforme apontado
no primeiro questionário. Em segundo lugar, apontaram à qualidade da água como
provável fator dos problemas de saúde, seguida pelo esgoto e pelo lixo. Entretanto,
um número considerável de entrevistados (em torno de 20%) não apontou nenhum
desses problemas ou não soube responder, Figura 19 B.
82
0 3 6 9 12 15
Contaminação de nascente ou de água subterrânea
DesmatamentoOcupação irregular e
desordenada do territórioTráfego pesado em vias urbanas
Contaminação de rio, baia, lago, lagoa, açude
Escassez de água
Poluição do ar
Presença de esgoto a céu aberto
Contaminação de recurso solo
Inundação
Poluição sonora
Queimadas
Deslizamento de encosta
Presença de lixão na área de ocupação
não respondeu
doenças versusproblemas ambientais
Figura 19 Associação dos entrevistados (domicílio) em relação a doenças versus problemas ambientais, em A, e ocorrência de doenças na família com falta de controle ambiental, em B.
0 5 10 15 20 25 30
qualidade de água
sanitárioesgoto
resíduoslixo
poluição atmosférica
nenhum dos itens
associação desaúde comproblemas
A
B
83
Ao se observar as obras de reestruturação do bairro realizadas durante o
período de pesquisa do trabalho, também constatou-se com a população local a
ausência de diálogo entre os setores responsáveis pela infra-estrutura do bairro e
seus moradores, interessados diretos no investimento em equipamentos urbanos.
Mais de 90% (Figura 20 A, C, D) dos entrevistados mostraram interesse em
participar de alguma reunião de esclarecimento ou de simplesmente ser informado
sobre as obras em andamento. Porém, mais de 60% deles alegaram não ter
recebido nenhum tipo de informação sobre o que seria feito (Figura 20 B, C, D).
Cabe ainda retornar a questão da Lei 11.445/07, na qual aponta o acesso as
informações pela sociedade como um dos princípios de prestação dos serviços,
mediante a seguinte definição de controle social: “o conjunto de mecanismos e
procedimentos que garantem à sociedade informações, representações técnicas e
participações nos processos de formulação de políticas de planejamento e de
avaliação relacionados aos serviços públicos de saneamento básico” (Inciso IV,
Artigo 2º), compete ao cidadão não somente o direito, mas também participar do
seu planejamento e da sua fiscalização, mas nem tais premissas foram expostas à
população local, pois o interesse da coletividade popular deveria no mínimo ser
levado em consideração.
92,2%
5,88% 1,96%intenção de ser informado e de
participar de reuniões
simnãonão respondeu
35,3%
62,7%
1,96%Informação à população
sim
simnãonãorespondeu
A B
C D
Figura 20 Intenção da população local em ter algum tipo de informação ou participação efetiva no planejamento de obras públicas, em A, alegação de falta de informação sobre obras, em B, e visão das obras de
saneamento no bairro, em C e D. Fonte: Próprio autor
84
Na finalização do questionário, algumas situações básicas foram apontadas
como necessárias à qualidade de vida, o fato de ter ou não hospital próximo à
residência foi o item mais assinalado pelos moradores, considerado primordial para
que vivam bem, ficando à frente de questões como a canalização da água, a
regularidade no abastecimento e a presença de rede de esgoto. Podemos
estabelecer uma relação com a constante necessidade de cuidados médicos dos
moradores e a distância dos postos de saúde e hospitais públicos.
Por fim, buscou-se avaliar o que é qualidade de vida na opinião dos
moradores do bairro, através de uma pergunta aberta os entrevistados puderam dar
sua definição. O item saneamento básico foi apontado pela maioria, aparecendo
com freqüência de 25% (Figura 21 A), confirmando a importância do investimento
nesse setor para o bem-estar da população, assim como esse trabalho almejou
demonstrar. O item saúde ficou em segundo lugar, o que mais uma vez revela a
carência dessa população nesse setor, que tem relação direta com o saneamento
ambiental. Respostas referentes à cidadania e assistência social ficaram na terceira
colocação (Figura 21 B), merecendo atenção emergencial por parte das autoridades
do governo, sobretudo do poder executivo municipal. O complemento a essas
respostas aparece na quarta colocação, o emprego. A geração de postos de
trabalho que atenda a uma mão-de-obra de baixa escolaridade e qualificação, o que
não é um problema apenas local. O lazer, a moradia e o meio ambiente também
foram apontados, em menor índice, como importantes para a qualidade de vida
ambiental dos moradores do Cangulo.
De acordo com as definições de qualidade de vida apontadas pelos
moradores, percebe-se que eles são privados daquilo que consideram mais
importante para que possam viver bem, coisas que dependem mais da atuação da
prefeitura, no investimento em serviços de infra-estrutura urbana. Pode-se dizer que
a percepção de qualidade de vida para os entrevistados ainda é dúbia, uma vez que
ao se indagar sobre a qualidade de vida da família a diferença entre o ter e não ter
foi entorno de menos de 15% (Figura 21 C), além de não se perceberem imbuídos
no processo de degradação do ambiente, pois em 64% das vezes não se acham
fontes de poluição para os recursos hídricos, embora mais de 80% acreditem na
relação entre qualidade de vida e meio ambiente preservado (Figura 21 D).
85
0 5 10 15 20 25 30
saúde
saneamento
emprego
lazer
moradia
cidadania e assistencia social
meio ambiente
não respondeu
percepção de qualidade de vida
(%)
A
não respondeu
43,1%
54,9%
1,96%
ter qualidade de vida
percepção sobre ter qualidade de vida
sim
não
não respondeunão respondeu
B
23,5%
64,7%
11,8% população como geradora de poluição
população como geradora de poluição
simnãonão respondeu
C
86,3%
9,8%3,92%
qualidade de vida
qualidade de vida versus ambiente preservado
sim
nãonão respondeu
D
Figura 21 Percepção dos moradores (domicílio) sobre o que está atrelado a qualidade de vida, em A, percepção sobre a vivencia em local com qualidade, em B, opinião sobre responsabilidade na geração de poluição, em C e associação de qualidade de vida com preservação ambiental, em D. 73
86
De certa forma, os entrevistados disseram não ter qualidade de vida,
justamente pela má atuação da prefeitura no bairro, que ainda não conseguiu
atender às suas necessidades básicas de cidadãos. Tal resultado concorda com o
encontrado no primeiro questionário, onde 80% dos entrevistados reprovaram o
trabalho realizado pela prefeitura no bairro.
O Exposto vai de encontro ao Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001), assim
como ao art. 3º do Plano Diretor de Duque de Caxias, de 2006, uma vez que tem
premissas em promover o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e
da propriedade e o uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado do território,
de forma a assegurar aos habitantes condições de bem estar e segurança.
Deve-se considerar a relação do morador com a identidade do espaço vivido,
pois grande número dos entrevistados não tem como objetivo morar em outro bairro
ou cidade (ver questionário 1), por acreditar que esses problemas podem ser
resolvidos mediante investimento em serviços públicos, como os de saneamento e
saúde, já que consideram o Cangulo como um bairro tranqüilo para morar, com
baixos índices de violência, fator que tem afligido considerável parcela da população
do Estado.
87
7 Considerações Finais
Após o primeiro estudo do bairro Cangulo, notou-se a baixa qualidade de vida
ambiental dos moradores, no que se refere às condições de saneamento básico,
consideradas medidas indispensáveis para o bem-estar da população. Apesar de a
grande maioria dispor de domicílio e terreno próprio, as condições de moradia
muitas vezes são consideradas insalubres, devido à presença de esgoto a céu
aberto, não abastecimento de água canalizada e tratada, dúvida quanto à qualidade
da água dos poços, e ruas sem calçamento e sistema de drenagem. Dentre os
serviços de saneamento, a coleta de lixo é o único que atende a maior parte dos
moradores. Compreende-se que a falta desses serviços compromete o meio físico
trazendo prejuízos diretos para a saúde, o que impede o desfrutar de uma vida
saudável. Mesmo os moradores não tendo consciência dos problemas ocasionados
à sua saúde pela carência em saneamento, é consenso que a falta desses serviços
constitui o maior problema do bairro.
Pode-se dizer que os moradores não tem consciência de serem integrantes
do ambiente que vivem, uma vez que não se percebem como possível fonte
poluidora, embora a grade maioria tenha interesse em obter informações referentes
a intervenção do espaço, mas também sobre a qualidade do meio físico.
Recomenda-se o desenvolvimento de trabalhos mais acurados a partir de
monitoramento da qualidade de água e suas relações com o desencadeamento de
doenças nocivas a população. Sendo assim, o investimento nesse setor contribuiria
indiscutivelmente para a melhoria da qualidade de vida ambiental dos moradores do
Cangulo.
Constata-se aqui o descaso com o saber e os interesses dos moradores, pois
quando não são consultados sobre as intervenções no seu próprio espaço perdem o
direito de opinar sobre aquilo que julgam melhor para si. E nem é preciso dizer que a
preservação do meio só se concretiza com a participação conjunta do poder público
e dos habitantes da cidade, por isso é proposto à participação das associações de
moradores e organizações da sociedade na formulação dos planos diretores
municipais.
Em suma, pode-se dizer que é a partir da prática de participação que se faz o
aprendizado social, uma vez que permite a maior integração e estreitamento das
relações sociais no espaço e a conseqüente defesa dos interesses coletivos e
88
alcance das informações. Para tal, retoma-se a importância primordial da valoração
do saber local, que juntamente com o conhecimento da ciência possibilita maior
eficiência em políticas públicas, no planejamento urbano e ambiental, assim como
uma justa qualidade de vida ambiental.
89
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92
ANEXO 1 Questionário básico para fins de caracterização geral da população local.
93
94
ANEXO 2 Questionário complementar aplicado aos domicílios, para fins de aprofundamento dos problemas ambientais.
95
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ANEXO 3 Questionário Básico do Censo de 2000, conforme IBGE.
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ANEXO 4 Questionário Suplementar de Meio Ambiente de 2002, conforme IBGE.
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99
100
ANEXO 5 Fotografias utilizadas nos gráficos, de modo ampliado. Fonte: própria.
(Página: 9)
(Página: 9)
101
(Página: 9)
(Página: 10)
102
(Página: 58)
(Página: 58)
103
(Página: 60 e 65)
(Página: 65)
104
(Página: 68)
(Página: 71)
105
(Página: 71)