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7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 1/100
aGE
E
CARVALHO .
R O R
. 198Ó-1990) .
/
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 2/100
,
. : N 0 '
c o n ta to i ni c i a l e o m c t r a b a lh o d e
A g ~
e C a r v a -
l h o , p ar e ce d e p o u c a v a l i a t e n t a r v in c u l ã - l o c o m e x c e s s i v a
p r e c i s ã o a a l g u m a d s s t e nd ê n c ia s r e c e n te s d a p o e si a b r a -
si le i ra . F a t o q u e d e r e s t o ' só a p r e se n ta v a n t a g e n s p o i s , s e .
p o r u m la d o , e n c o n tr a r tr a ç o s ' q u e p e r m i t ~ a . i n c l u sã o
e m u m c o n j u n t o , 'v i a d e r eg ra fa c i l l t a a a p r o x i m a ç ã o , p o r
o ur m , t e nd e a . s im p 1 i f i ç á - J a , t o r a a n d a p o p r e r t \ é n t e a c a -
, n h a d a a a m pl i t u de d a le i t u ra e :all o b r a , 0
à
v 6 n t a d e , a
d i s p l i c ê n c i a , o a c h a d o e n t r e 's ú b j t o e c a s u à l , o e v e n t u a l
, h u m o r d e u m t r o c a d i l h o l á o s e u t a nto g ra tu i t o , o r e l a t o
d e e pi só d io s q u e n ã o u l t ra p a s s a m o s l im it e s d o p e s s o a l , '
a t ra n s c ri ç ã o p ur a e s im p le s d e si tu a ç õ e s o r a is t o r a m c om -
p o n d o a o lo n g o d a s d u a s ú lt im a s d é c a d a s u m p a n o r a m a .
· d e d il ui ç ã o e m q u e e r a s e m pr ~ b er n -y i n d o m a i s u m p o e -
t a e s e u t e s r a t n d b ç o t i d i a n o . E b e m v e r d a d e q u e e s ~ a si - ' ,
m a çã o d ão f oi e x € l u siv a , m a s c o nc e m ro u m u it a s a te nç õ e s . '
T a lv ez o m e lh or d a é po ca , n a m a i o ri a 'd os c a so s , n ã o e s te -
j a a i , m a s t a m bé m . n ão e st á r ig id am e n t e l i g ad o a a lg um a
o u tr a t e n dê n c ia .
-, . E n t r e e s s e s c a so s p o d e - s e c o m c e r t e z a in c l u i r o d e A g e
d e C a rv a l h o , . ( ')C ) , u en ã o q u e r d i z er q u e s u a p o e s ia n ã o d e ix e
v is í v ei s s eu s p a r e n t e s c o s , a i n d a ~ u e i s. t o o co rr a d ~ m o d o
'~ .à sv e z es b as ta n t e é n v . i e s a d Q l .o t í t u l o A r q U I t e t u ra d o s o s-
SOi ( t r í p l i c e t í t u lo d e u rr r p o e m a . j i e u m a p a n e q e l i vr o
e d e
u m
l i v r o ), a p r e se n ç a r ec o r re n t e d a p ed r a e u m 'p o e -
m a d ed ic a d o a
joã o
C a b r a l d e M e lo N e to p o d e m d e im e -
d i a t o s u ge ri r c e n a s a s so c ia ç õ e s , N o e n t a n to , o p o e m a
A I -
- q u i t e t u r ; d o s o s s o s j á se in i c i a C O / Ila c o n ju g a ç ã o d e c o n s -
t r u ç ã o e a rr e ba ta m eu to n o v e r s o 'E d i f ic o f u ri os o e s ta m a -
n h ã ~ ; e a p e dr a e st á e o r n n o tá v el f re q ã ê a ci a li g ad a à s om , '
b F a e à i n d a g : J , ç a o . 1S e h á u m m ov im en t o d e a s s o c i a ç ã o e
I
a f as ta m en to e m r el a ç ã o a c e r to s m a r c o s l i t e r á r i o s , m ov i -
• m e n to q u e e m s i i 1 1 j f n in a u m a p r o d u ç ã o P Q é t i q , h á t a m - '
· b ém o u t r o s m o v i m e n t o s t ã o o u m a i s im ~ o n a n te s.
S e g u i n d o ' s u a t r i lh a , a p o e s i a d o a u t o r
de
A re n a , a re i a ,
a p r e s e n ta se n sí v e i s m u d a n ç a s n o p e r c u rs o e n t r e s e u s p r i -
m e ir os e s e u s m a i s r e ce n te s p o e m a s . U m . d is c u r s o m a i s 1 0 n -
, 'g ó , u m d ~ c u r s o ín a dS i 1 i lf l . a m a d o c~ d ( l l J p O U Ó l > p O l l C Ou ,
g á r a u ~ a m a io r c o n t e n s â 'o , a u m a m à io r 'd i s c r i ç ã o . Ü r-
r an jo d os v e r s o s , u m o u o ut r o n eo lo g i s m o , ta r a s m a n i p u ,
l a ç õ e s g r á f ic a s p e r m a n e c e m c o m o m ar c a s e x p r e ss i v a s d a
lu ta c om a s p a l av r as . E m o u tr o â m b i to , a i n t e r r o g a ç ã o f l a -
g r a n t e e v e e m e n t e , a s im a g e n s ' s u c e ss i v a s e v i ol en ta s r e -
c u am d ia n te d a s u g e s t ã o e , s ua s r es s o n â n c i a s , d a e li p se e
se u s e n t r e a b e r t o s e sp a ç o s . .E p o ss iv d a rr o la r c o n st an te s t e-
i
I . \
I r a
•
3:30
-
-
ROR
(1980·1990)
A redução no preço deste livro foi possível
pela co-edição patrocinada pela Secretaria
de Estado da Cultura de São Paulo.
L {] Livraria
L {] uas idades
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 3/100
· . - -
---~-
-
AG E D E CA RV ALH O
ROR
(1980 1990)
desenho de Tbomas Kussin
/
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 4/100
(1980-1990)
Equip e de realização
Projeto de capa ilustração: Moema Cavalcanti
Projeto grá fico : S ilvia Massaro
Revisão: Herbene Mattioli
Assessoria editorial: Mara Valles
Secretaria editorial: Gisela Creni
Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional
(Câmara Brasileira do Livro, SP, B ra sil)
ROR
Carvalho, Age de, 1958-
ROR: 1980-1990 I Age de Carvalho. - São Paulo:
Duas Cidades; Secretar ia d e E stado da C ultura 1990
(Coleção Claro Enigma)
Bibliografia
ISBN 85-235-0014-6
1 Poesia brasileira L Título
11 . Sér ie.
90-0891
CDD-869-915
Índices para catálogo sistemático:
1 Poesia: Século 20 : Literatura brasileira 869 915
2 Século 20 : Poesia: Literatura brasileira 869 915
Copyright
©
Age de Carvalho
Direitos desta edição reservados
à Livraria Duas Cidades Ltda.
Rua Bento Freiras, 158 - São Paulo
01220 - Fone: 220-5134 I 220 4702
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 5/100
P E D R A U M
(1990)
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 6/100
o
CÍRCULO na areia, o
que no
grão de
grande
há,
sim sens, não nens
a fala sem sentido
que é
isto: menos que
isto, isso
Ao meu filho, Pedra
[9]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 7/100
MARAHU REVISIT ADO
alegria de água
ruivo ruído menino
circulando pela sala,
FILHO,
De
palma em palma
abre-se
a bananeira
ilegível, as reconciliadas
portas da cabana, o círculo
em novos círculos de água
que a pedra sonora inaugura
vê: cílio que se arrasta
e queima
vírgula
contra a luz
De palma em palma
ofertado instante presente
floresce um imaturo diálogo
do ramo calado das mãos
(10)
[ 11)
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 8/100
PAI
uma edra
distante
para chorar,
um argumentado lírio
jacente, sede clara
no jarro sem som,
e esta conversa arvorada
sobre a graça do branco -
jóias da
mobil idade' ,
( in Marianne Moore)
início da primavera
[12]
A CAMINHO
o grande Verão, ãa
abre a porta, saúda:
o fumo de rosas
do atriurn parricio,
a contrabandeada estrela síria
que te acena Elena,
guerra
nos cabelos de Louise
torres de álcool folhas d' alba palmas abertas no sempre
Terra
terra parente nos sapatos de Elias e Abraão
Saúda e agradece
Rernida, consolada
uma pedra
infartada sobrevoa o coração
[13]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[ 14]
o
MOTOR DE BUDA
BEIRA
de si, mira
o rio contemporâneo
em Gars am Kamp
passando em ando, paisagem
Seguimos a seta - a Leste,
para o alto
leonado de nuvens,
lentas frases do barro
abençoando o caminho
De segunda, Grande
Marcha, roncando
sobe
a montanha
o pequeno Daihatsu
[15
J
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[16]
o PANAMÁ, a gravata
fulva-murmurante
de algas, esquinas
PASSAGEM
para a visita tardia
à rue D'Ulm: estrelas
varridas do gabinete,
verões após, por ti
Era julho
floresciam pedras
carregavas a sombra de um rio
Afogado de abril
(se abril era, data
incerta, Marte)
Chamavam-nos
agosto, norte, ninguém
verões, por ti,
Após
Irreconciliáveis
II
[17]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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UNGARETII
ROMA VIGIADA
com a outra busca
aquela, estrelada
que se abre
ao diálogo
m
guarda, quatro ciprestes
centuriões
fulguram sobre a cidade
Se una tua mano schiva Ia suentura,
Guarda:
ninguém
te espera com a mortalha
dos Sete Mártires Gregos
nem te abrigarão
desconsoladas catacurnbas
escarlates, a rosa branca
tombada à pedra
Da oliveira,
mais gue sombra, tens
com anhia
[18] [19]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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11M onik l1 Grond
FAZERCOM, FAZERDE
A CURA, e sua aura
esvaziada de abismo
.O abismo - o íntimo
ascender
Estar, entre
estrelas e pedras,
interrompido
um estrelar-se infinito
(de boca
contra) ao beijo cru
da queda
Resto de
ervas, tempo, entre dentes
detém-se
a palavra-refém,
réstia
[20]
[2 1]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[22]
LENÇÓIS, BA
I
I·
NEGRO O. Ainda aqui falo
o abismo,
o mstante
dentro da queda
mas
já não guardas
o osso,
o parente óleo noturno
carregando um destino,
o nome
mancha
que no centro
assombrado do corpo
amadurecia a dúvida -
Onde,
por falar em pedras,
fala-se diamante
sob o leito aberto
do rio deflorado
Onde,
ela, em si
a resposta
o que na pedra
é estar,
sobre teu corpo
deita fala
[23]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 14/100
[24]
REVENDO P.P. CONDURÚ
CORES
I I
no olho
louco de Alfonso
Fou'hall
Ferson, o Velho
Negrores, blau de
esfumado lume,
breus
raivas do branco
à luz ácida
da estrela doente
que nos dá companhia
entre grades e ciprestes
contra a mente - quem
te ouve?
Alvorada a
mão entrevista em Colors
entre grades
entre-
laçando confuso um gesto
pássaro, cruz
o mundo nas mãos
Com a chave rebelada
tens a arte, a alva
porta de cil ícios,
torna-te o que és: santo,
flor, dragão
dedo-
revólver
Hóspede de hospícios
[25]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[26]
HOLDERLIN
A MORTE as festas,
o anel
todo dourado-diâ
para o inédito
de uma vez
Sombra e sombra -
todo o negro
para os dedos
estiolados
de Deus
Pro-
fere
a palavra,
refere
a ferida
[27 ]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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A FAIA VERMELHA DE VINCENT
NA DUDA SE VUELVE MEMORABLE
a Teresita Segui
Era a pedra errada, repetia
Nr. 562 - Fagus silvaticaLaciniata,
o nome da árvore
E: sob proteção legal
Uma verdade
instaurada pela dúvida
(ensolarados pomos de pedra)
Floral,
cega-purpúrea,
cor-
rompida irmã, aberta -
e
para sempre
enferruja a navalha
entre remorso, ervas
Era a pedra repetia
[28] [29]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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IRMANAMENTEilumina
o leão do fósforo
K ópT J K ópT J
for tbe six seeds of an errar
The Cantos, LXXIX.
[30] [31]
uma boca, restos de conversa
Sarurno (guarda o anel
que não tivemos, guarda-
o, sombra, por nós)
aceso o tabaco da remissão
fumaça
Cerchio d'ombra (error
de assombrado lustro,
Esplendor )
levanta-se aqui agora
tarde um braço
mão humana mancha
acenando da rurba
a dizer do bardo, dez latas
atadas ao rabo, o que
nem mais interessa: inocente
E
se corrompe, ó
em círculos,
dragões no ar, tempo
*
(Zerou, morreu, ex -
aqui agora tarde
- seis figueiras se erguem
pelo erro do velho Ez)
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 18/100
PESSOA
NEGATIVO DE RICARDO REIS
.;
Agua-quando, pedr' estar
Ó de fogo ouro ou: o
Bocas roxas (não
de vinho),
sobre a testa
branca cresce a erva
Não te chamo Lídia: nada
. sabemos sobre o rio das coisas
32 )
[33]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 19/100
OCUPADO. Sinais inter-
calados de conversa nenhuma nem
sombra de voz,
a cólera
enroscada na serpente espiralada,
ramo de cifras ardendo nos dedos
para Sy/via, Benedito,
Max e Miche/
Estar, não-estar: três estrelas
de espera zumbem por ti,
três estrelas se negam soando,
chance de ser
APÓS circular o Ring -
Ó
de
[34]
ouro,
alta esfera de louros
se
ocup-
ocupado. Tentar de novo
- éramos nós agora
o real radiante anel
a coroar esta mesa rouca
do Salettl-Pavillon, sol
redor de férias em áustr ias austeras,
a contemplativa t ília de perfumados pensares
dando sombra a vozes,
uma conversa entre árvores
em julho cafés e o poema (mais tarde)
do verão
após
circular o
Ring
[35]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[36]
[37]
POR MALCOLM LOWRY
REDOR - redor
fala exférica, andar
a, andar em
círculo
devor
ando-se
Duplo, cambaleante
cai o mundo
junto à pálpebra:
*
(Ar,
ar
doze árvores em chamas
respondem' 'Presente , alguém
trouxe o barco na garrafa,
não estás sozinho
contra o muro -
beijamos a
sombra,
pronunciamos cinza
sobre a
experiência da pedra)
Hélices de álcool
ventiladores do inferno,
um corpo de gases
e destino (não estás sozinho)
entra em passagem
*
Pedra,
pedra-um
de ser e sombra,
e desce
urna
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 21/100
BRASILIENSIS I: LOGOMARCA
Quis
o design da canoa
o diz-que do risco
a Estrela do Norte
hévea letra, mata helvética
para a marca' 'Desenho da Selva
quando duas luas irmãs, reluzunindo
no arco
se desintegram:
o alvo
acerta a flecha
[38]
ROMA, ver notas
(Villa Borghese não visitada,
pedra-alma de Adriano, cosmos)
ou: revê-Ia via Greenaway
(enviando postais ao morto)
n A Barriga do Arquiteto, o
figo envenenado da simetria
reproduzido aos pares
do ventre auri-luminoso
de Xerokopia, o Duplo
última geração, anno 1986
Outras anotações: cinco laranjas
funéreas alourando a mesa do hotel,
Keats' house (por M.i.)
42 graus,
noites brancas
[39]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 22/100
OUTRO TOM: OUTONO
Desflorecer, aflorar contra -
bruno rorejante
aponta
o cabelo do futuro,
outro tom outono
a abraçar a
violentada cifra púrpura
quando declino
(falo, far-
falho)
ramos em flama: f,
fls,
has
[40]
(AUSGANG, a saída
Uma porta
se oferta
experiente
para outra porta,
aberta
(por dentro,
onde já não arde
um passo sobre
a neve
ou
o próximo
último, sem despedida)
para outra
porta)
[41]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 23/100
DESATOU-SE, o último dia
do Ano - buquês na boca
a celebrar o morto
mestre em desastres, dezembrado
Também por nós,
festejando, berram
as flores da gravata
cristal-
orvalhada
[42]
POR INNSBRUCK
A
cidade em volta -
a cidade, entre o colar
norte e o último
dialeto do branco
Estrela ferida,
adeus, aqui estreitas
o que é neve
e parte do esquecimento
[43]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 24/100
JUNTOS. Todas as velas
se apagaram, aceitemos
Confia: filho, não sei
o caminho - só tens
uma palavra, esta
minha
[44]
IN ABSENTIA
E:
ainda uma chance -
uma pedra se refolha
para o repouso,
o instante
é
sempre presença
Ror de erros,
recolho repetidos
o que ainda me pertence
[45]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 25/100
[47]
NISSO
SUMA
que ascendeu
se revelou
e esqueceu
Quantas vezes
ainda por repetir?
ponhamos uma pedra
Estão comigo, todas
de segunda mão,
não classificadas
ó anel
círculo mancha ervas
sombra relva irmã
estrela erro tumba
por companhia
[46]
pedra pedra pedra
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 26/100
A R E N A A R E I A
(1986)
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 27/100
Ao meu pai, José
Ao João, meu irmão
A Max Martins
DE AREIA, era a sombra
coroando a pedra
ausente,
a ferida do nada
Assoprada semente
celebrada sempre em
ti,
a caminho (sem
ti, tu
sêmen,
rr-
repartida suma: um)
De areia era a sombra,
de areia a
obra
[51]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 28/100
DIZ-QUE, e era a dúvida
do retorno
rolando errada na boca
(uma pedra baixando o corpo,
uma palavra perdida
baixando à pedra)
THE AGE OF THE OAK
A idade do carvalho
aflora real na pedra
(ágrafo círculo da pedra,
a sombra e a diferença)
aponta para o deserto,
declina
o ramo do nome
onde espera uma data,
a resposta
dentro, buscando
a abismado caos do instante,
o centro,
a zoada mais íntima, do início: a
[52]
[53]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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BOCA,
a minha e a tua:
o ímã das l ínguas lança promessas,
letra-sobre-letra
À
vera,
a tempestuosa mão da rasura
subjaz
negra no plural dos pêlos
à procura do selo mais profundo,
funda
[54]
VERMELHO
T u a ,
de seda e feno
no transe da metáfora
a fenda soletrada-sol,
vala de luz, vocabulário
Tua, folhagem. O
olho
alcança o Olho,
desce aos infernos:
sonha o cabelo da urna, o
vermelho
da cifra, a ferida
no centro da fogueira
Tua, tua
[55]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 30/100
MARÇO 22, três anos
depois
Círculo branco
calcinado
na pedra - ó,
ainda aqui
Vives ,
fora do nome,
todo, ósseo
[56]
A IDADE DO CARVALHO
The age of the oak
blossoms out of stone
(unwritten circle of stone,
shadow and difference)
points to the desert,
articulates
the branch of a name,
awaits a date,
the answer
[57]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 31/100
[58]
YOU'VE A SEA TO LIE
OBREUM CORPO
Caixa -de-árvore,
Terra, cabana
do Marahu - sonoro, assim
-falas o claro, o louro incêndio
das folhas, alguma linguagem
Seda de graça
corrompida,
és
Leste a água, a flor na pedra
salina,
duas juras traspassadas no verão:
traçaste
a sentença
palavra a palavra, o poema
Ó
negro, leito
crespo de sombras
circunferido,
água difícil
que esgota-
ralo, poema
- toda mensagem
Onde o mestre, a trilha
estrelas? Outras palavras
tocaste, violento:
tempo, laser,
Tens um mar para mentir,
zen,
Não
és,
ó negro
(azo, azar)
a chave, infinita, mestra
[59]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 32/100
OS INCÊNDIOS
(Não cantarei o mar: que ele se vingue
de meu silêncio, nesta concba.)
Carlos Orummond de Andrade
How alike are the groans of loue
to the groans of the dying
Malcolm Lowry
1.
Via-limite.
À
beira do abismo
vazro
de palavras, o clarão do nome
lavra sua chaga em boca
noturna, esplende em erecta paixão:
nome, dois nomes e amantes
(o ideograma sangremo de Sada riscado no corpo bár-
baro e defunto? Yvonne estelar luzindo maligna na
botelha do Cônsul, sobre a barranca sinistra? o anjo su-
jo de Cass espatifado bêbado às botas do poeta? ou
Tu, tu mesma
D.M., arfando histórica na inscrição amorosa da pedra,
furiosos cabelos na tempestade, o ramo transtornado
das mãos sobre o rosto do deserto?)
Nome, dois nomes e amantes
exasperam a urna escura para nosso verbo,
tanta violência, mas tanta ternura:
lume de vero exílio, a morte anunciada
[60]
2.
O sol
rn c id e
no tanque negro e brilha enforcado entre as árvores,
11 sol negro clamando por ti, louco astro subornado
Jlirando neste esplendor de Lowry maldito girando
qui aqui
O Vale da Sombra da Morte
1111 rc constelações, mancha de letra, o azar
(o mar, onde
o Mar?)
bananeiras indecentes alvoroçando suas pernas
rnplarnente às serpentes de pluma: antros
do inferno: as formações cruéis, passando: nuvens
V I ios verbais na paz sonora. A lata
n u lfabe ta enferruja sua metáfora,
/ltl st
cego incendeia uma floresta de vocábulos
p u lavra-vulcão o estrondo da página
v .spera do silêncio
Aqui, ex
[61]
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3.
Cessam os incandescentes signos da luz
Espelhos espaços claridades: tudo
convertido na turva escri ta das pedras
onde piso-
conciso hieróglifo
(o Mar, onde
o mar?)
Daqui, acima da tarde
e seu desastre, dos relâmpagos
destroçados, sobre a grave paisagem
(feno tornado ouro, nunca queimado)
eu
escrevo (meto) gravo
na pele rnonolítica
teu nome incinerado,
Nome
[62]
PEDRA
Erro. Ouro e cinza, aos pares
a grande Irmã trafica suas letras
Nada te revela: relva
rara, uma palavra
cega floresceu no caminho,
azuluz perene na pedra
estrangeira
Ergui-a,
levo comigo, lida
Sem resposta
(ouro e cinza, aos pares)
beijo a pedra,
sua testa indecifrada:
D.M.
[63]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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ENTRE PEDRAS, serni-
sombras sob o arvoredo, a mão
ofende a falha -
lá,
entre o fresco rumor das folhas
e dos ramos lázaros, Lá
reino azul-redor:
à luz malina, nós, descobertos
[64J
NEGRO, forceja reconhecer a laje
marcada, conspira contra a cripta:
véspera do nome,
véstia da paixão toda paixão,
aqui
cresce uma cruz na última palavra -
A ofertada, irrepetida, ir-
recusável
[65]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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AQUILES, 1982
Reúno e recuso: ainda
não aceito a oferta,
despojado, fiel a este corpo
exilado de negro e sudário,
os sapatos apartados do barro,
a cruz das mãos assinalando
o coração escuro, o mercado
feral das flores, muros de cinza.
Sim, aberto à relva mais ruiva
e salina, à cidade incendiada
e corrupta do rubro lacre,
onde Heitor, lastro vencido
em defesa ao sítio, abre-me
asportas para fundar omastro. ' ,
[66)
OS JARDINS E A NOITE
Scmoarz ist der Scblaf.
Georg Trakl
Os jardins e a noite,
graves perfumes da noite
E nada. Nada
As feras
dormem nuas em sua severa
inconsciência de músculos. Eternas
estátuas que ornam estes jardins
esquecidos mas reais: esferas do luto
- É s ru,
caranguejeira, quem nos percorre
tremenda o corpo, o sonho negro
onde da janela a morte grita
Tu, bicho obscuro dos números verdes inscri-
tos à pata na parede alva na pele da linguagem na fala
obstruída do fogo e do sexo aberto apagando este astro
ostra que mostro quente agora enquanto as árvores e um
casal e o próprio trópico incendeiam distantes o que resta
da estação o verão que rola alegre inacessível acima de
teus tentáculos rancorosos acima de abril o mais cruel
dos meses num sopro de ternura que desconheces.
Câncer de julho,
são as esfinges que fingem contigo
contigo desde a treva do ventre. A luz te fere
[67)
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- Eu te amo
As feras (heras
de sono) despertam
lentas e lambem-se no eu
A noite acolhe-nos amorosa
E nada,
nada
[68]
MÃE
Eu e tu, sombras ali
Jorge de Lima
Contigo, contigo
em tenebrosa es era
desde a treva do ventre
- véspera, as eras do sangue
Cresce, cresço
dentro,
fruta e nome,
a luminosa lepra da idade
lentamente
conduz o corpo às hastes do ofício
Cresce, cresce
o Nome,
mancha e destino,
o cabelo da letra
errando rumo à residência da palavra:
a palavra crespa
que te adora e espera,
negra,
espera, espera
Ergues a camisa de fogo e crime -
Mãe
(escura selva, Inferno)
- e Lá me tens, promessa
Contigo, contigo
em tenebrosa espera
desde a treva do ventre, amém
[69]
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CUATRO TERRITORIOS PARA JULIO Y HUGO
ou amor, jogos-rituais
com cadeias de luxo,
recintos distantes, flores inúteis
2. recintos com flores
de luxo, jogos inúteis,
cadeias de esquecimento: rituais do amor
3. ou amor
Jogos
distantes
flores rituais
4. cadeias-circuito
rituais de esquecimento
espelhismos
ou amor
[70]
CINZAS, tua boca
de sombras, interditada
Pedra sob a língua,
errante, onde
sempre tens o deserto,
esta página, gueto da letra
perdida, judeu: K
(Tua palavra, tua
mais dura palavra
- muda, irmã)
Cinzas, tu-
a boca
de sombras
[71]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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A LETRA DE SER,
como VIU
Edmond jabês,
do oásis -
sete vezes
aberto o Livro,
sete vezes
a face de Deus
em questão:
I'
être,
lettre
[72]
PODER, ervas da palavra
Raro arvoredo
aquele que enreda
azar e erro
à sua meta:
a pedra e a flor
fraturadas na mesma boca
Aflorar da rocha -
promessa, metáfora
[73]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[74]
É
a praia que chama,
o mar do sempre, sêmen
o POETA
Vigília, um rio presente
vertido e vertente
ecoa no fórum original:
ruína da careta latina,
Eneida incendiada, morto
o dador de fogo, nomen-numen
Aqui, tua aventura
de ser, o bêbado retorno
nada
azul
entre onda e vaga
água aliterada
aqui, o espelho cifrado
informado rosto
onde
branco, mira-se o alvo nome
- geração amarga do eco,
rasto vero
de
Passa o rio, ex -
sub, solitário
razão e erro
É
a prata
o corporal tempo e leito
que chama
vaga onda nada
[75]
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REINCARNA tION
and the street was narrow
even for a shadow
seven lives, three poets
black
cat
under the wheels of the cab
scrowling
thumps
squashing death
escaped
and the subterranean river speaks life
hidden
by force
of a fateful word
turned against itself
springs through flat annihilation
OUI
inheritance -
death life
life death
the three into one word: cat
black on white
delivering us
o poema Reencamação/Reinoamasia« tem duas versões, escritas si-
multaneamente durante sua concepção, em inglês e português, pe-
lo poet a norte-americano James Bogan, por Max Martins e por mim,
não exist indo portanto uma versão original do poema entre os dois
idiomas, constituindo-se ambas independentes entre si. (AC)
[76]
REENCARNAÇÃO
e a rua era estreita para a sombra
sete vidas, três poetas
negro
o gato
sob as rodas
do carro,
o grunhido
da atropelada esmagada morte
e um rio subterrâneo diz da vida,
reclusa
a pulso
numa palavra azarada
voltada contra si
saltando através da perda, aniquilando-a
herdando-a para nós
- morte e vida
vida e morte
os três numa palavra: gato
preto no branco
libertando-nos
[77]
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ENTE
para Belo /a e Zeca
~gua,pedrafundarnent~
de Tales, habita o ser,
Ser de antro: grave,
partes à alegria
do primeiro filho, cesariano
[78]
MÜHLAUER FRIEDHOF
M e -
dita, a
branca
sombra da neve,
o neva
desse silêncio, fendido: Trakl
(Arde,
arde a folha
forasteira, o louro
latim das folhas,
o ce o vento
ledor
das folhas)
Aberta, a
pedra interrogada
[79]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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ENGLISCHER GARTEN, MÜNCHEN
a Ingnd Rõderer
Aérea-
alumbrada
mão do desastre,
que sobrevoou o verão da fruta
e se fechou na sombra
jovem da pedra,
na jura grisalha que nos acolhia
(sem sim
nem não, poesia)
Arvorada em si, assinada
baixou sobre o exilado
jardim, aí,
anônima
[80)
SALZBURG, OUTONO
Fulgor da memória
no tráfico das folhas: queda
o passo
e outro
ressoante neste pátio
da Waagplatz, A-I
eco do mesmo
nome, o
rasto apagado neste pasto de pedras,
a mesma sede subterrânea
que conduz ao velho poço
(água de norurna mecânica
movendo-se em puro estar ,
estanque, o secreto lume do círculo
esplendendo fechado em sua ruína
de urina e sombra)
Cai o passo
(e outro) refolhando o poço
abandonado neste paço
e deito e rastreio
c'o
meu olho, teu olho
o
o
[81]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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EPITÁFIO PARA PAUL CELAN
após a leitura de Grabschrif t für Fran çois
N u m
mesmo outubro, num outro outono
traduzo teu poema
fechado às cinzas
de Francisco, o anônimo
Rogas da pedra
grave o que nela é muda:
Palavra, a que tombou,
a-para sempre, rosa
de ninguém,
de tumba
[82]
De boca no mundo, arfa
a palavra soterrada
de razão e chão,
Grund
[83]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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À
MERDA. Sem que possas florescer,
grita a árvore por ti, muda
Áurea-suja, uma palavra contundida
Jura -
crânio azulado,
estrela - memória cega
à cadela
morta
no asfalto
[84]
NÃO
Desfolhada, mão-
de-sete-erros,
jogas no vazio tua palavra
não. Três subterrâneos
celestes, três sinais
sobre a selva da letra,
palavra
negra, clara: Não,
o soletrado, calcinado
[85]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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o sal
pela mão
do rio-sem
DOIS ESCRITOSDE ÁGUA
para Vicente Cecim
A
JOÃO
CABRALDE MELONETO
só dizer
o que se
e duvido saber,
Vertido
no Rio Vermelho
em muro
indecifrável: Afoxé-Otun-Obá
resposta -
um luxuoso dizer, de vagar sem onda
e vaga, fluvial, não aliterado;
um dizer repetido na diferença,
barrento, semi-dito, em Não fechado;
Fechado o círculo,
outra escrita
encerrava Keats,
26, numa linha d'água:
Here fies one whose name
toas
writ in water
ou o não-dito, rios sem discurso,
nome por dizer ou dizer empedrado;
dizer sim o raro e claro do poema,
dizer difícil e atravessado, com margem
Aérea
camisa incendiada do verão,
corpo
funeral contemporâneo, é
assim
tecido o encarnado
rito entre homens, áfricas
incomunicáveis?
de erro
[86]
[87]
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[88]
Vem,
[89]
CANTO DA URCA
V e m , ó tu
baixar à praia
onde outrora era rasto
das sandálias negras de Ezra
(anno
1885
o alvorado centurião
ó tu
baixar à praia, bel
companho: si dorrnetz o veillatz?
Acorda,
não dorme, vela -
Vem,
baixar os degraus
em febre da pedra, um
e um,
inscrever o grisalho,
o que respira gris-
empedrado, letra
e letra,
lepra soletrada - A'Z
nomes contra
o funéreo sopro do azar
branco
um barco
cresce, aurora hélice
incendiada
sobre a praia, onde
outrora era rasto
das sandálias negras
de Ezra
Vem, sigamos
alvos
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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onde
ou
COBRA
Folha em-folha, entrelaçados
ao varo tempo
íntimo raro,
um em um éramos
nós,
juventude, num:
era a palavra,
a mais alta
que embaixo rastejava à cova
defendida por ninguém,
mais alta é a estação,
o ereto verão da devora,
o
oco da obra
envenenada, palavra
que se come pelo rabo
(um
em um
éramos
nó
s)
ramos
tensos sobre o grão anel da praia
emblemados contra si contra
um coração de madeira
enredando as toscas iniciais
no lenho torturado
para
o olvido,
cobra
a frase barrenta do rio
o ir, o vindo
se ouvia-se inacabada, indo, in-
do,
água esclarecida em negror
à margem do conhecimento
do rio, rio
sendo
sem solução
[90] [91]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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INTERLUZ.
o
halo bruno da coroa
devora o olho, o sinistro
(Digo: isto
é
o meu corpo
escrito, o doloroso texto
entrevisto no fulgor da carne,
uma ferida)
Inocência do olhar, resto
ao sexo,
teu V-revelado - travessia
[92]
SEM SIM NEM NÃO
Tarde
demais
A flecha
zarp
ou
da corda
[93]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[94]
NÃO ERAM DOIS
o caminho
da porta ao aberto, dois
o deserto entre a areia e o texto,
entre arena, areia
rastro, rasto
não eram dois um
lOstante '
na pedra da atenção,
mais
sombra sobre
a sombra
mais
umbria
não
À
luz selvagem
de quatro chaves
de areia, eis
a obra,
jogo de sombras -
[95]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[96)
PEDRO,
[97)
1937-1983
Arena, areia
meu filho, do fósforo
aceso num dia
d'alumbramento per
feito,
In, caminho e campo
de existência interditada, digo
a página destinada,
corpo
doloroso de fórum e fortuna,
o poema e sua experiência de morte
- para sempre
que na língua a-
final assombro,
ror de erros,
à
primeira palestra
Reina sob o número
ardente do nada
que assinalou meu pai,
sob a chave que revolve
a difícil folhagem
neste leito do nome: pedra-um
de ser e sombra, urna
de luz, lz
z
Reina,
reina, rés chão
sob o ínfero pano do exílio,
no vinho extinto da paixão,
sob seteno éter e secreta cinza,
a cada degrau da descida
Era a cidad e exata , aberta , cla ra ) -
a
ar
auro
ara
Aurora, A última queda.
Arena, areia
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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Repond s, a bsent , toi-même,
sinon
tu risques de ne pas êt re compns.
René Char
OUTRA VEZ
floresce um comércio
entre homens maduros etc
eu dizia, Não tem saída,
um corpo jogado azar sem dados possíveis irreconhecí-
vel sós e ninguém por nós ardendo num círculo sujo de
luz do batismo ó ao réquiem cirúrgico numa mesa de
operação sem saída
e tu, Mais dez anos
é tudo, fim, fragmentos destruídos diário o poema da
morte a vida inteira visto revisto e inacabado, respon-
dendo ausente sob todo risco a não ser que,
que
Outra vez
floresce etc
[9 8 1
A FA LA E NTR E P AR ÊNTESIS
(1982)
Poema escrito com
Max Martins
à moda da
renga
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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ParaMari4 Sy/via
e Benedito Nunes
Une amitié, ce n est peut-êtr« qu un échange de l xiqu
Edmond jabês
Eu era dois, diversos?
Guimarães Rosa
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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Marque d un signet rouge Ia premiêre page du
livre, car Ia blessure est invisible
ii
son
commencement,
Edmond Jabes
1
Das florestas de Blake aos topos da Ásia
quem, da confusão entre chão e carne
com seu púbis, seu discurso e chamas, QUEM
DEFENDE TEU ROSTO DESTE SUDÁRIO INFERNAL?
Teu nome é Não em cio e som farpados
sinuoso grafito gravado no muro
mudo contra o tem o Arfa
noturno, o olho do astro na memória
Este é o meu céu: numa bandeira turva
incendeia seus últ imos signos
te insinua às sombras (que estão nos antros
e subsistem ao gráfico parêntesis:
Flechas ferindo-se no espelho. Reflexos
Dança indefinida
[103]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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2
E nós dois, dois
fálus críticos, acariciando esta cri ta
que doura em sentidos, caverna
de grades negras, se lva
de pura escrita, rubrica indecifrada:
(poesia)
teu nome é Não em cio e som farpados
cilício escri to, escri ta ardendo (dentro,
se revendo), fera
do silêncio úmido, se lambendo, lábil
labiríntima.. E esta língua
de pura estria ávida se desfraldando
lâmina
e se ferindo, se punindo:
[104]
3
As bananeiras indecentes alvoroçando suas pernas
amplamente às serpentes de pluma: antros
do inferno: as formações cruéis, passando: nuvens
É que vens nu, e as nuvens te amoralçam
assanham ecos, sonham o silêncio atrás dos muros
Mais alto a fala do sol de ensiná às pedras
te insinua às sombras (que estão nos antros
- fendas noturnas)
Claro-escuro
de linguagens subterrâneas, ânus
para a fala de dois espíritos:
Escrirura,
filtro de luz, as marcas inscritas no crânio
da palavra, verão de alfabetos esquecidos,
sílabas, louras mitologias manchadas no muro
Que existe / insiste escuro para manhãs, amanhos, aventuras:
A Ilha do Tesouro, a mala do defunto, o escaravelho
- a fala
se amofina estéril e lisa, espuma
ao gozo de neblinas
[105)
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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4
Aludir, aludo:
planto medulas
Meus dédalos dedos de medo
prometem contato
Tento. Ágrafa,
a marginal vagina
subsiste ao gráfico parênresis
Mas a mão assinala o teu centro, teu
último grito de ti - de ti, verdadeiramente
[106]
.
Os corpos. Pronúncia constelada pelo amor
e morte de Faust ino, entre a crespa coroa
negra
e o teso nervo alojado em olho profundo
Corpos, falo
e vulva - falo
a silva língua genital dos amantes, galo
Para amar /morrer os corpos falam / falham
Um masturba o outro - confabulam
e se simulam
não se assimilam
Pois que a palavra é palha combustível
os corpos
com seu púbis, seu discurso e chamas
se consomem
- não se consumam
Ilhas de si, confundem-se no incêndio
natural (um come o outro), negam-se
no abraço, engastados, em seu idioma encadeado-
solo a dos uoces
- os corpos: os sexos
se dilaceram, calam neste mar de lábios
que se abrem, ébrios, e se desdizem
ou se desgastam nesta praia: esfriam
[107]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 56/100
6
Já não há mais sonhos Lá e amamos rastros
gastos no asfalto onde se arrasta a asa, resto
pútrido de um vôo que exalto e cito, excita-me
contra a parede e ex' a la a vício
fala entre parêntesis
(Negro,
negro pêlo caligráfico
que recobre selvagem o sexo escri to,
sinuoso grafi to gravado no muro:
o SONHO ACABOU
O carro-olho velocíssimo. Os girassóis
lançando-se obscenos aos fachos de luz ,
faro luminoso. Na estrada. Seguimos)
[108]
7
Um verde vaginal inscreve-se nesta tarde
- a alma de Bashô a contemplá-Ia
duma gaveta
Paradisíaca musa' ácea, página
em que me iludo ,escrevo , jogo
planto bananeiras
Tarde
-
m gue me acena adolescente, fêmea e pornográfica, a morte
Cinema-camaleão,
desvanece-se, desdobra-se invertebrada em laranja
azul, dourado - panorama
. onde o mar esporra
nas rochas, coxas
pernas seios braços púbis cu cinzelados onde penetro, caule
macio, tenro orifício do mal
azul, adentro
convulso róseo vermelho tremendo
branco branco branco
(A rã mergulha no velho container.
Gozo)
E perco a fala, branco
E o próprio branco apaga tudo, as cores deste gozo
e o próprio gozo
neste poço
cala o som da água
A tarde
fulgura arcaica no fogo de seu próprio pó,
incendeia seus últimos signos,
ilumina,
rara, um rasto inútil de memória, calendário
giz do esquecimento, palavra
[109]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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8
Jardim de escrita rara arar (orar) entre 15 pedras
Flechas ferindo-se no espelho - reflexos
110
9
Voam e voltam setas neste escudo
mudo, contra o tempo
Arfa
um coração de pedra e de silêncio entre palavras
secas que se quebram
e se quebrantam
E neste espelho
neste jardim fechado-imóvel
um tigre
é
que nos vê
(puro-feroz)
- não vemos
Nos ouve?
Atrás da pele, acaso no oco abafado de fúria
e mal, sou o outro
inominável? Azul
de Trakl no hospício?
Vozes volam para fora desta frase, corpo
e arrebentam-se no turquesa violento do verão
És um tenebroso corsário no mar salino da melancolia
É
desouvindo que nos ouve, o som negando-nos
E assim nos é, nos há: não somos
nem penetramos e sumimos
nas sombras desse olhar
da areia
Voam e voltam setas neste escudo
mudo, neste campo de riscos subscritos
onde figura tem nome apagado -
ágora telepática
sepulcro verbal
- nesta página
metáfora do Silêncio
[111]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 58/100
10
Sob a folhagem
a lua de lábios, as facas interditas
o sub-azul olhar de Lícia M. atravessando-me
Sob a folhagem
agora as cinzas pânicas se enrubescem
num sonho de palavras flagelando-se
Sob a folhagem
(profusão de letras?) rumoreja o nevo
fendido, o obscuro. Quem fala?
quem, da confusão entre chão e carne
- que cova ou boca sinistra conclama o nervo
sob a folhagem?
[112]
11
As bananeiras
loucas
agora dançam prenhas
Não mais às nuvens
púberes
mas para espelhos-
luas,
ensangüentadas
Dançam
e exibem o ventre
desvelam o frusto
o roxo cacho de egoísmo
;J
nossa gula
este coágulo
(Mancha andrógina: mastro
(fruta) em esfola, foda
(gruta) vaginácea
de pé: dança indefinida
Coreografia vegetal)
[113]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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Nascem aranhas louras destas folhas
Aranhas-homens, homens-bananeiras. E
dos lanhos-lábios nasce o nosso mimo
sebo e saliva de palavras ínguas
Dançam
dançam enlouquecidas, defloradas
salientes dançam no vento, verão
azul, as bananeiras alegres
Medusa
anã de turvas palmas múltiplas
mas pura constatação da real
árvore,
contemplação da fix.idade
[114]
QUEM DEFENDE TEU ROSTO DESTE SUDÁRIO INFERNAL?
(Na câmara escura, o pássaro
mono petri ficava os despojos sobre a rocha
e teu barroco sexo exposto jazia aprisionado
sob tua juventude, a tua pele
a pele
que deixaste na praia no último verão
a tua pele secava para outra, e caía
Teu rosto era sereno - não vi)
Estes rastros, estas rotas, estes ritos
dos olhos de nuvem, ensangüentados
Estes riscos, estas rugas, estes restos
de oceano e de cinzas pela praia
O sentido e a denúncia desta flauta quebrando-se
A demência irada destes músculos. A ferida -
Quem defende o sudário deste rosto infernal?
[115]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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13
Uma vez mais a aula das cinzas
Desce a estação traficando a folhagem
perdida, o rasto que à tua passagem azula:
grafo: a pedra, Ana
Traço
do meu gozo aos gozos de Anaiz - Joana
Arcanjo
de Laarcen
os lábios desta jaula
Teu nome de amargura me instrumenta
funda o que me escreve e nego transferindo-me
dos jardins de mim ao resto de tuas frases
A rendiz das folhas, úmido, o mus o mostra olha
o texto amado, o rosto soletrado
o frio silêncio tátil duvidando-nos
Oh égua aveludada, juventude
arranca do meu beijo este saber, sabor de cinzas
[116]
(O céu se fecha: chuva na mata
O bambuzal fulminado, a centelha estilhaçando a poça
- estrada para as estrelas
VIDA
o que se funda no corpo, em ti
ser, na raiz destroçada entre as ervas
Noturno, o olho do astro na memória)
[117]
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- eis-me
1 5
4
Este é ue é o sudário. A teia
em que me escrevo e me alivia
do san ue aiante na sua cólera
Este é o meu céu. Numa bandeira turva
Claro ideograma
sob a lanterna de lepra, disco
solar no dorso amarelo-cadeia: tigre
a Palavrasobrevoadapor astros-
constelações de minha vida, uma jura
adorada no silêncio
Amargo Id e ígneo tigre por dentro, sub
escrito risco, seta atravessando atreva
em linho corrompido amordaçando a ilha
amordaçando a chaga, aliciando a carne
anavalhada, a lua
negra na pele - eis
erótico-erosivo, o ideograma da morte
a flor da areia
Tu ésaquele que escrevee que é escrito
das florestas de Blake aos topos da Ásia
Salto relâmpago satori
Ou boustrophédon dentro de jaula rajada,
oco ti' gwer, raio apagado de idas e venidas
O Nome na escritura, eis
a palavra, o deserto da página
e o vero mistério da fé
Eis
o caminho
o branco que firo, a letra
o gueto do signo e suas estrelas
Eis-nos, em abandono
[118}
[119}
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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A RQ UIT ET UR A D OS O SS OS
(1980)
I I
i
I
i
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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Para Cunca,
Mar ia e Cira
O S Q U IN T A IS
Para Ruy de Bastos Meira
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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Tem uma caveira de burro enterrada no mundo.
Cezar Teixeira
OS QUINTAIS
Os quintais do mundo
não estão no mundo. Os quintais
- arquitetura da manhã - é a tarde
que o corpo não regula
ou
um sopro que a terra coagula
noutra tarde banida da esfera.
II
(Um beijo de lepra conduz
o planeta:
sete novos galos mortos: a goela
e a faca dentro do dia.
O Equador é uma linha enfiada na carne da cidade)
[125]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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III
Nestes dias de ódio escuro
tenho um braço no escudo
e a espada na claridade. Tenho
a mão na fronte da noite,
fecundando a noite
com os gametas da eletricidade.
Carrego no corpo a medula da árvore
- bicho de frutos. Batizo a cidade:
Santa Maria de Belém do Grão-Pará,
eu te esquecerei na Praça da República,
longe do Forte e dos canhões,
sem teus ingleses dos alfarrábios da Biblioteca Pública,
perto dos Correios e do funcionário,
na esquina da Riachuelo,
na I? de Março,
na zona.
[126]
IV
Va arei ela inexistência da cidade,
por sobre os telhados
(nunca mais pelos da Palmeira,
que rescendiam a pão,
e hoje resistem noutra tarde) da cidade,
sobre a vida que transpira na pele da idade
dos meus 20 anos
de poeta,
de aprendiz de arquiteto,
menino de sonho
e ossos no universo de um quintal do Norte.
Vagarei soturno por entre as mangueiras
com o coração exilado da cidade
(talvez num quintal de outro país),
como os gases noturnos despreendidos das usinas de
[castanha
perseguindo as nuvens levando uma esperança operária;
como um homem e outro homem
(às duas da tarde);
um homem e seu sonho; um
Brasil, um brasileiro.
[127]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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v
(A vida greva
na neve do coração. Um homem (com sua vida) bebe.
Ri
dentro do Bar do Parque.
Vinte minutos depois, vai ao banheiro
[e suicida-se',
Uma mulher (com seu filho) chora em algum canto da cidade).
A vida greva na neve do coração.
VI
Porém, há um universo de estrelas
e rosas perdidas num quintal,
com seus galos matinais e aromas de café ao fogo.
Outro universo, diverso,
os quintais da cidade
de cercas paredes e muros: geografia escolar.
Um terceiro, o indigente universo da miséria
- sol de vermes -
quintais do mundo (que não estão no mundo,
mas naquela barriga inchada da criança nigeriana
ou da Nicarágua,
e, com certeza, dessa que vive no Norte do Brasil),
lágrima de ferro.
Todos, contudo, quintais do homem.
Pois, o mundo é grande,
o quintal é grande.
[128]
VERÃO
As frutas, neste verão,
amadurecem distantes e limpas,
embora as máquinas trabalhem
sob um vento antigo de besouros.
As máquinas do verão
trabalham ao sol do século
pelos fachos da manhã,
ausentes da fruta - cão esférico -
amadurecendo na costa do planeta.
O chão, bandeja de terra
na queda do cometa: fruta.
O mar é o arco
azul para todas as referências.
O verão é móvel
quando a fruta a roda da estação.
[129]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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A CADELA
Caminhava grave pela casa,
a cadela.
A cabeça quieta era sua altivez
quadrúpede no centro da cozinha.
Caminhava. Os olhos, costelas,
o mar de ossos, o coração
pardo e lento - caminhava.
A manhã debruçava-se pela janela: cristais no pó,
o púcaro da china, horas de louça
batendo nas palavras na sala da casa.
A cadela caminhava, dura,
secular.
(Domingo dormia
prolongado como um funcionário feriado).
Vivera demais. Descansava à sombra,
peno ao quarador.
Sonhava farta, invisível,
a cadela azul,
nua
(o sexo velho e molhado,
um caranguejo arcaico sob o rabo).
Dormia, vazia.
Outubro doia longe, na Ásia,
Quando a Fuluca anunciou: A Catucha morreu .
[130]
A ÁRVORE
Sem rumo remo nem direção
navega a árvore
- um silêncio que a tudo atenta - oclusa
em seu próprio corpo, lenta.
A omoplata do tempo
apóia, plena,
o turvo sonho centrípeto
(mesmo quando seu coração
é uma revolução contida
no escudo do caule), e acena-lhe a eternidade
A árvore estanca-se.
Sujeita, a espinha curva-se;
as nádegas gastas sentam no mundo
Escura,
dorme limitada, a árvore.
[131]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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[132] [133]
CANTO DE GALO
Na madrugada dormida,
onde a chama
(agora apagada) do dia
reclama o fogo das manhãs,
um galo canta
(apodrecendo rígido ao passar das horas)
COMPOSIÇÃO PARA QUEM VIVE
A CASA
Sob o sol do dia,
no sereno do pó lunar,
a casa será construída.
De alvenaria, urna casa
seca, branca.
Dentro do universo (querendo,
no mapa), um retângulo vivo que roda,'
roda, roda.
A ÁRVORE
O fero mar
transcorre veloz e mudo
no interior do corpo: árvore.
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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A MUL HE R A que se quer no mundo,
e, por isso, absoluta: tambor
que deflagra a luta
- seja ao pão, ao amor.
A que se quer no homem,
no filho, dividida: uma, violenta,
que se deixa entrar, infinita;
a outra, explodida em carne tenra.
Ainda, a que se posta em si
(como uma árvore ou uma casa),
fitando o mundo, definitiva.
Que espera, no fundo, o fim
- a que não tem pêlos e é sem asas -,
e a árvore é sem sentido e a casa contida
OS CONDENADOS·
José, vê:
a Terra é azul
(como não foi quando nasci),
e o homem pisa em pluma
navegando os mares da Lua.
Maria/Pedro, eu te quero
uma estrela no sonho do capinzal,
minha flor.
[134]
ARQUITETURA DOS OSSOS
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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o
mar envolta-se musculoso em todos os seus azuis
enquanto a manhã crepita quente na areia e por entre
o
cajual a poucos quilômetros dali. Nada cessa sua existência
entre a plantação e
o
homem que agora caminha sozinho
à
margem da estrada que leva a essa praia inventada num
século perdido e próxima das frutas .
.Na praia, uma casa amarela ergue-se sobre o areal
deste inferno.
ARQUITE1URA DOS OSSOS
Edifico furioso esta manhã
nascida im rovável or sobre meu ombro
plúmbeo de lutas
(uma serra que se move),
crescida na vergonha argilosa de minhas unhas empobrecidas
em sua carne arruinada, funcionada
pelo motor incessante do mar,
iluminada pelo mar do sol.,
e finda pelo último homem
a tomar lugar no espaço
(suicidando-se o meio-dia),
nesta praia, infinita.
2
A laranja entrega-se em dois sóis líquidos
ao sono da urina de amanhã: é o verão da fruta
que agora serves sem cerimônia nesta jarra velha e sem estilo;
entre o mar e a cozinha da casa, na varanda da manhã,
em pleno julho.
[137]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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3
A água, a mulher arrepiou-se
na eletricidade do mar. Olha
a linha agora: o azul
costura-se em outro azul.
A Terra é redonda, pensa.
4
alavras: sol e câncer.
como em meu
5
Estando a manhã acabada, sujo as unhas de terra e entrego
os cabelos ao sacr if ício de cortá-Ias . A barba cresce em desa-
cordo com o dia. Espuma o oceano em sua raiva azul. Fre-
mem as margens ejaculando para o fim. Cega-se a lâmpada
ver tica l do sol. Amadurece a fruta. Vermelha e amarela.
É meio-dia.
[138]
6
A tarde se inicia
pelo sono, e é lenta e branda
a tarde da varanda.
Uma onda
(a tarde branca)
quebra outra quebra a onda
quebra
7
(Meu bisavô extirpava, de quando em quando,
um artelho podre. Penso que deve ter coisa
de sete dedos no par de pés. Mas
tudo parecia normal).
[139]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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8
11
Começo a decompor-me aos poucos.
9
A noite vem por ruídos
e cheiros trazidos do mar.
Vem também, inversa
(a noite oriental, meu dia),
pela anunciação da manhã
e sua própria morte e minha carne rediviva.
Caem-me as mãos, e consigo sentir-me.
(O nariz, as orelhas, já os perdi).
Depois, na fome do crepúsculo, um homem
magro amaldiçoará a vida, esquartejado:
Ó
partes perdidas, ó postas
fedorentas consumidas na lepra do mundo
Pelos bichos da terra,
pelos vagos desenhos escondidos no muro, vem
arrastada a noite em seus claros e escuros
penetrando a casa, violando
o quarto, adentrando meu corpo
inexistente feito de vapor, de medo,
sem tudo.
dia afogou-se no mar,
desesperado.
Ao mesmo tempo,
uma tristeza pânica pisou a planície do meu peito
12
lição de anatomia: não existo
10
Estou cego.
[140)
[141)
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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13
A mulher dorme.
Possuo-a pensando tê-Ia
em minha branca inconsistência
mas estou ausente e não estou em lugar nenhum.
A mulher dorme.
14
Nada me escurece o rosto
enquanto caminho para a entrega de meus ossos
à calcinação desta noite.
Porém, minhas mãos queimam
em minha própria arquitetura.
1 5
Espero.
[142]
16
Es eco reaver-me em mim mesmo.
7
Desenterro os ossos pensando reconstruir-me
na manhã próxima que pousará absurda nesta praia
à margem do mundo.
Tudo
se dá sob os reinos da invenção: morro
,hoje, nunca concluído (uma escultura na areia),
sem ruído;
amanhã,
como há milhares de anos, estarei vivo
(os cabelos num novo incêndio, o corpo
inconsútil no espaço)
e, recomeçado,
serei inacabado e breve.
[143]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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OS GUINDASTES
Mãos sórdidas, meus guindastes,
nada do que deslocas
é rota para a humanidade.
Não é nave nem guia
na lâmpada do dia.
Nem rumo tampouco mapa
do mundo que te escapa.
Não
é
bússola exata
não é vereda não é nada.
És par sujo e pendular
quando ando e sou sem razão.
[144]
Eis-me sem governo:
o caminho iluminado
é meu traço inacabado.
Meu corpo de evidências
está soterrado sob as pálpebras do mundo: escureço
(Dizem,
há guerras em países que desconheço).
(145]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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o corpo na praia
é uma voz insegura embaixo do sol.
o
corpo na praia
é uma voz insegura embaixo do sol
(como uma fruta pronta).
o
corpo na praia
é uma voz insegura embaixo do sol
(como um fogareiro morto).
o
corpo na praia
é uma voz insegura embaixo do sol
(como a pedra-pomes gasta nos pés).
Uma fruta,
um fogareiro,
uma pedra na praia.
[146]
_
o espaço desocupado em inúmeros azuis:
o tempo e o mar: a prata
deflagrada por duas esferas imensuráveis,
quase corpos, em seu perscrutar simétrico:
meus olhos vislumbram o universo efêmero
onde a morte articula-se em seu triângulo
regular de eternidade:
a praia, o tempo,
o homem.
[147]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 76/100
Homem, querem teus cabelos
acesos ao sol
como uma flor condecorada
que chora suas par tes perdidas num quintal nordestino
- como um fuzil que o sal
come, esquecido.
Aviso-te,
virão buscar tuas mechas
noturnas em tarde de fome.
(A terra arderá em trezentos sóis
egípcios, desentendidos).
E, sei, porão fim a tua fonascia
quando tua palavra - párvoa
e sepulta aos famintos - resvalar
para um túmulo de absurdos vespertinos.
[148]
u s palavras de sono e sonho caem súbito
no vasto clarão de pedra do sol,
esquecidas de teu corpo que não come
nenhuma fome porventura sentida nesta tarde
Em abismo,
há muito rolaram tuas espadas da boca
sem que percebessem a necessidade delas, . .
feito vegetais.
[149 ]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 77/100
Senão pelo corpo,
o sol engendraria
luz, os fogos na carne?
E do corpo,
como um sistema de sóis
a~~drecidos, apenas uma lâmpada,
. pálida e puntiforme (planta aérea,
um mineral escuro na noite do subúrbio),
aquece o coração do homem.
[150J
Corpo, árvore móvel
abandonada de raiz, pés
indizíveis de tanto rumo.
Corpo, matéria violada na densa
multidão que já se aproxima,
entre o grito próprio e os pássaros de anunciação,
em marcha dentro da manhã incontida
pelo chão, proclamando a miséria humana.
[151
J
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 78/100
Aqui, em meu país
irremediavelmente nordestino e miserável,
à luz elétrica de meu século,
sob todos os alfabetos do medo e da fome;
aqui.
entre o homem e o homem
(como dois sistemas totais
num universo de águas inacabado),
aqui vivo.
[152]
Ai, cabelos do sono,
viajo azul aos teus reinos, querida.
Permito-me parvo e inútil
nestas tardes de sol
_ caranguejeiras de julho.
o
oceano bate longe nas costas de Salinas.
[153]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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Recolho-te dos escombros como quem remove
flores num inverno infernal. No entanto,
é sob o escárnio incandescente do verão
que te trago à luz por minhas mãos.
Entre o fogo e o fogo,
luz, somente.
[154r
Minha mãe morreu aos 48 anos;
meu ai, aos sessenta. Uma edra,
a cadela morreu dura.
Morreu o João: câncer;
o Carlito suicidou-se
(novo novo).
O Abílio morreu, nunca mais. A Márcia,
a J ane. O Zeca, no Rio.
O esqueleto do volkswagen enferruja
histórico numa praia da Paraíba.
(Enfrento prematuro a idade
onde meus dentes estarão num álbum
e perdidos para sempre
(não sei aonde não sei aonde, meu deusl)
e terei uma lembrança e uma cadeira,
próxima à janela).
[ 155]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 80/100
3
8,
salienta o cano
que a vida é medida
- inútil o hálito dos anos.
(Cala-me portanto a todo
motor que dispare aceso
o canto
- ~ toda palavra que lavre o tolo engano:
vagina,
cabelo, vapor).
Pois, como a vida,
a bala arquiteta a mira.
Turvo, feito cão que a bala desvencilha
feito pluma quando o corpo abranda. '
(O tiro escapulido resvala na lembrança).
[156]
Abato o tempo
proclamando o futuro e convocando todos os deuses
enraivecidos que me invadem diariamente e me levam à rua,
os olhos queimando, a carne adormecida.
Tempo,
luz miserável, facho de fome, minha vida te atravessa cotidiana e de-
sapercebida da fúria com que a recebes - fora de mim, que te obser-
vo sublevado, cão odioso, inversão medonha de toda vida. Te amaldi-
'çoarei enquanto tua incidência for desprezível - e mesmo depois,
quando tu, puto, me tomares o corpo e modelares a horrenda escultu-
ra que me quiseste desde meu nascimento. Esperas - esperar, ver-
bo de tua criação - com que paciência pelo final que a ação ininter-
rupta das tuas mãos em pó fazem vislumbrar em matéria tão fraca.
Em vão conferi as idades e as fotografias
iluminadas por manhãs acontecidas; a vida, recordei-a remota mais
do que havia, e quase morro em tuas lâminas de claridade. Mais que ~
tudo, caí irreversível em tua pior invenção, Tempo: membro obsole-
to, objeto histórico, inutil idade futura: o passado.
[157]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 81/100
Em vãofoi tentada a vida,
a vida em todas as coisas
pelas quais estive em fato.
As iluminações
que do ouro banhavam a casa - estas, esqueci-as todas. No entanto
a mim foram legadas, e possuo-as no desprezo de seu brilho louro '
de sofismas. Inconciliável.
A mulher
nunc~ me terá um filho. Estou velho em demasia para o trabalho
d.a mação - e nada se reiniciará a partir deste meu corpo de obsolên-
~~ego:me, resoluto e covarde.
. Principio minha ~~ desolação, no imenso desprezo as
mlOhas mãos.
Grave, cai a tarde em seu mármore de abandono
[158]
Agora era
o
sol que vinha por detrás do muro branco e vinha
o céu mais cruel e metálico fundido no azul/cinza/verde claro da
manhã reiniciada em calor.A claridade oblíqua, dentro do arcosolar,
incidia na solidez pétrea do mar, que era calmo e contínuo, e erain-
fjnitamente presente este espelho líquido movendo-se na eternidade.
O tempo inexistia, raro. O relógio, feito de areia e vento, rolavave-
loz para fora do mundo, e as idades estavamperdidas.
Um homem de bicicleta, na estrada, passavacomo uma imagem
terrível aos olhos do outro homem que observava. Instaurava-se ali o
novo dia irreal alascom ahoravermelha na ar anta tem o e ame.
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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SETE EX ERC íC IO S
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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A FALADIDÁTICA
a P au lo P reire
Aqui me detenho, disposto:
entre homens, a vida pressupõe a FALA,·
mecanismos da boca
_- canto ferial.
Aqui me contento, deposto:
entre falas, a vida presume o VERBO,
flor acesa na boca
- fogo in/transitivo.
Aqui me enfrento, morto:
entre verbos, a vida rompe o SILÊNCIO,
exercícios do mundo
- a vera boca do povo.
[163]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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11
Tbomas Lee
Ml1hon
[164J
o
ATOR
M EXERCÍCIO PARA JOÃO
Que o mar tenha seus azuis
e a terra, dois terços
imersos; que o mundo desande
inverso ao berço:
o pão é do homem,
seja na terra, no sal,
no inferno do terço.
Ontem, julho pleno
um homem chorava-se inteiro
prestes a tomar o avião
(menos os olhos, encenando
uma comédia de Moliere).
[1 65 J
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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DISCURSO
Há palavras que a boca não fala
e lutas que o homem desconhece.
Uso da palavra (falha, palha)
como vivo delas: sem mecanismos
- e intensamente.
Das lutas, conheço algumas,
e me desfaço de toda armadura
à dura carícia de suas feras.
Mas,
há palavras que a boca não fala
e lutas que o homem desconhece.
Por isso luto: falo.
E enquanto falo a vida é apenas seu turvo incêndio.
[166]
CARLOS
Chego as tuas primeiras idades, Carlos,
e a dor que me funciona
não é igual a que carregaste,
tampouco semelhante àquela que move
a fome do mundo.
Compreendo lutar com palavras,
fei ta de consistências diárias e azuis,
e, embora talvez ria como em algum tempo
riste, tenha gestos, atitudes,
dores palavras amores;
embora mesmo que chegue a tocar um poema
como tu, a beijá-Ia com pudor
e desprezá-Ia usado na boca errada,
nada será igual nem parecido.
O mundo não é o mesmo.
(Como não será adiante e não foi no passado,
a minha infância e a tua maturidade).
Contudo, Carlos,
caminhamos.
[167]
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
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RECADO PARA O NATAL DADO EMAGOSTO
Uma voz não se porta
como secarrega uma alegria
ou um filho no ventre
(apesar de todos virem em abril
e do interior do corpo).
Não se traz a voz
senão pelo outro homem
que fala de dentro de nós
(não como um filho ou uma alegria),
posto que dele partimos para a humanidade,
pois o mar não
é
tanto
nem a terra pouca.
[168]
PEQUENO INVENTÁRIO POÉTICO
À
MEMÓRIA
DE OSWALD
ABRIL
Em Algodoal,
abril abria fogo
por sobre os rochedos da Praia da Princesa.
OS JOGADORES
Zeca e Mand,
em marcha, caíram no mato
num sonho de álcool e juventude.
Suas costas riscadas
- dois tabuleiros ardidos -
eram brigas de galo empatadas na rede.
SÉRGIO BRAGA
.- O onanismo está nas mãos
[169]
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SO C IA LISMO
À noitinha, da praia,
o vento trazia ao pátio o mar
e vozes fuzilando a casa . Discutiam.
Uma guerra com cachaça, samba e Lênin.
EU TE AMO
.Ao todo, doze pessoas. Algodoal elétrica no sol artificial, dormia.
Um homem enrolava cigarro. ~éu de gaze e estrelas na janela sem
estilo. Rede de álcool. Mar preto, olho preto junto ao rosto. Ester e
Manel. - Dói . .. Ester / Manel. Man / Est /eer l pentelhinho grosso, ai,
meu amor. Sonho de algodão em Algodoal etérea, rosa de esperma
na perna de Ester, ai, benzinho, que a Terra roda roda sobre ti sobre
nós ai, e não pára não pára a Terra como pára uma revolução ai co-
mo pára uma rev ... ai, fermata minha,
lento amor
desta noite conspirada no ócio de Algodoal
PES ADEL O DE ARR IBA R
Um pé de castanha fica.
Vai - se vai - abarrotado de cachaça
e mala o bote à J ohnnson. Até, mano,
que a lembrança é um músculo estriado do esquecimento
- Até
[170J
A ÚNGUA INSÓLITA
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[173]
A LÍNGUA INSÓLITA
o curare é uma flor
bélica
que brota na boca do homem.
Vermelha,
sua crosta férrea;
ferina, quando da língua uma lança
insólita, verdenta, surge.
Como a prata, o curare
é uma palavra dura
batendo veraz no dorso do tempo.
Curare - ticuna, genocídio adiado,
vooara,
ave líquida, uirari,
os rios paralíticos do sangue.
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a José Mana de Vi/ar Ferre ir a
POEMA COMPLEMENTAR SOBRE O RIO
TERRA NÃO
É
REDONDA
o
mundo revelado amplo,
junção de paralelas, plano
infinito do homem: o índio integral,
a utopia da terra, Quarto Mundo ,
de Gismonti
o rio consagrado: a vazante
lembrança que escoa em maré
baixa e retoma - água escura
- na reamar.
II
O rio sangrado: invólucro de céu
e margem, e duas visagens
dos caboclos amantes. O rio
O mundo tornado curto,
quadrado percorrido, turva
infância de Galileu: as arestas do vento,
o discurso dos r ios , a Amazônia,
cabeleira do mundo
passado: cismando ria crisma, paresque: _
dumas lembranças que trabalham a solidão:
o paralelo das margens, uma igara partida,
as águas sujas que sempre voltam.
[174]
[175]
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[176]
BESTIÁRIO
GÊNESIS
Algodoal, duna de silêncios,
chão remoto, tua iluminação diár ia
apaga em mim o carvão inconsis tente
que antes pensava alimentar-me, seca
em minha carne gasta (como se exposta ao sol
e curt ida por séculos)
um rio que nunca houve e que hoje
sinto paral ítico e, por vezes , imagino mover-me
sem as águas gerais do sangue
- os sais precipitados e atlânticos, as correntes
quentes, os riachos, o próprio piso de águas
que julgava aos pés quando nunca existiu.
(Nem por isso deixo de descer
aos teus infernos matinais e visitar tuas pirâmides de sal,
Algodoal, quando teu sono ultrapassa a todas as idades
e reside no começo do mundo: eu, navio suicida,
galera do medo, nave ue te ercorre inconsciente
fere teu dorso e te leva a outras eo rafias .
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o homem a mulher do homem (seu sexo) o cãopara a lua as
putas h/ases e prontas os ratos os meninos andróginos os que falam
falam falam os que dormem sozinhos os tolos a corja de advogados
que bebem indecentes o comunismo o colunismo social o mal do sé-
culo
o
cego o cego tocador de sanfona da praça. Aquela perna de
pus que esmola.
O
tirofedido no ouvido dopoeta (quando José Ve-
ríssimo morreu, uma chuva das duas encheu a Presidente Vargas,to-
mou o Teatro, varou soleirase foi parar naPágina policial de um Li-
beral atrasadolido no Maranhão).
Os analfabetos
os meus culhões disseminados - fóm/ elemen-
tar da traição- no coreto no dia num cinema escuro de 1910 à luz
do Halley no obscuro cudo mundo: Grécia obscena de Bunuel, fê-
mur esfrangalhado, arco retesado que não dispara, o universo fodi-
do de Walt Disney: a Amazônia vendida.
[179]
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BIBLIOGRAFIA
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Do autor:
Poesia
Arquitetura dos ossos. Editora Falângola/Semec, Belém, 1980.
A/ala entre parêntesis (renga
com Max Manins). Edições Gráphol Grafisal Semec,
Belém, 1982.
Arena, areia. Grafisa/Edições Grápho, Belém, 1986.
[183)
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Sobre o autor:
ALMEIDA, Miguel de. Max e Age, unidos na renga
à
brasileira . Folha de S.
Paulo, 19 jul 1982.
ARAUJO, Lats Correa de.
°
Estado de Minas, 18 jul 1982.
ÁVILA, Carlos. A fala entre parêntesis .
°
Estado de Minas, 5 ago 1982.
CASTRO, Acyr. Cantares de amigos . A Província do Pará, 10 out 1982.
CECIM, Vicenre. Rara consciência . Leia Livros, ago 1981.
·'15 pedras . A Província do Pará, 30 mai 1982.
CUNI IA, Fausto. Revista Status, secção Livros, mar 1983.
CUNHA, Helena Parente. Do Pará, um poema cr iado a quatro mãos . O Globo,
29 ago 1982.
L6BO, Clodoaldo. Quando a poesia vem doPará . ATarde, Salvador, 4 nov 1986.
MENDES, Francisco Paulo. Comentário crítico in Arena, areia. Grafisa/Edições
Grâpho, Belém, 1986.
MENEZES, Carlos. Dois poetas paraenses publicam poema escrito a quatro
mãos,
à
moda da renga : O Globo, 25 ago 1982.
NUNES, Benedito.Comentáriocrítico (prefácio) in Arquitetura dos ossos. Semec,
Belém, 1980.
Jogo marcado , in A/ala entre parêntesis . Grafisa/Edições Grápho/Semec,
--Belém, 1982.
PALMQUIST, Sérgio. A fala entre parêntesis . A Província doPará, 23 mai 1982.
PONTES, Mário. Uma renga e um álbum . Jornal do Bras il, 6 ago 1982.
[184]
ÍNDICE
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/
PEDR A U M
(1990)
o
círculo 9
Marahu revisitado 10
Filho 11
P~ 12
A caminho 13
À beira 14
O motor de Buda 15
O panamá 16
Passagem 17
Ungaretti 18
Roma vigiada 19
A cura 20
Fazer com, fazer de 21
Negro O 22
Lençóis, BA 23
Revendo P. P. Condurú 24 .
Cores 25
Da morte 26
Hõlderlin 27
Una duda se vuelve memorable 28
ROR
(1980·1990)
*
A faia vermelha de Vincent
Irrnanamente
Cerchio d'ombra
Pessoa
Negativo de Ricardo Reis
Ocupado
Após
Por Malcolm Lowry
Redor
Brasiliensis I: Logomarca
Roma
Outro rom: ourono
Ausgang
Desatou-se
Por lnnsbruck
Juntos
In absentia
Nisso
Suma
29
30
31
32
33
34
35
36
3 7
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
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ARENA, AREIA
(1986)
De areia
Diz-que
The age of the oak
Boca
Vermelho
Março
22
A idade do carvalho
Sobre um corpo
You've a sea to lie
Os incêndios
Pedra
Entre pedras
Negro
Aquiles,
1 9 8 2
Os jardins e a noite
Mãe
Cuatro territorios para
Julio y Hugo
Cinzas
A letra de ser
Poder
O poeta
5 1
5 2
5 3
5 4
5 5
5 6
5 7
5 8
5 9
60
63
6 4
6 5
6 6
67
69
É
Reincarnation
Reencarnação
Ente
Mühlauer Friedhof
Englischer Garten, München
Salzburg, outono
Epitáfio para Paul Celan
Grund
À
merda
Não
A João Cabral de Meio Neto
Dois escritos de água
Canto da Urca
Cobra
Interluz
Sem sim nem não
À
Não eram dois
1 9 3 7 1 9 8 3
Pedro
Outra vez
7 5
7 6
7 7
7 8
7 9
8 0
8 1
82
83
84
85
8 6
8 7
8 8
9 0
92
93
94
95
9 6
9 7
9 8
7 0
7 1
7 2
7 3
7 4
A FALA ENTRE PARÊNTESIS
(1982)
Das florestas de Blaee
Jardim de,
escrita
rara
1 1 0
aos topos da Ásia
1 0 3
Voam e voltam
E nós dois, dois
1 0 4
setas neste escudo
1 1 1
As bananeiras indecentes
Sob a folhagem
1 1 2
alvoroçando suaspernas
1 05
As bananeiras
1 1 3
Aludir, aludo
1 06
Quem defende teu rosto
Os corpos
1 07
deste sudánó infernal?
1 1 5
Já não há mais sonhos Lá
1 0 8
Uma vez mais a aula das cinzas
1 1 6
Um verde vaginal
Este éque éo sudánó, A teia
1 1 8
inscreve-se nesta tarde
1 0 9
Claro ideograma
1 1 9
ARQUITETURA DOS OSSOS
(1980)
OS QUINTAIS
Os quintais
Verão
A cadela
1 25
1 2 9
1 3 0
A árvore
Canto de galo
Composição para quem vive
ARQUITETURA DOS OSSOS
ARQUlTETIJRA DOS OSSOS . 1 37
Os guindastes 1 44
Eis-me sem governo 145
O
corpo na praia 146
O
espaço desocupado em
inúmeros azuis 147
Homem, querem teus cabelos 148
Tuas palavras de sono
e sonho caem súbito 149
Senão pelo corpo 150
Corpo, árvore móvel
Aqui, em meu país
Ai, cabelos do sono
Recolho-te dos escombros
como quem remove
Minha mãe morreu aos
48
anos
38, salienta o cano
Abato o tempo
Em vãofoi ten tada a vida
1 3 1
1 3 2
1 3 3
1 5 1
1 5 2
1 5 3
1 5 4
1 5 5
1 5 6
1 5 7
1 5 8
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A fala didática
Um exercício para João
O
ator
Discurso
Carlos
A língua insólita
A terra não é redonda
Recado para o Natal
dado em agosto
SETE EXERCÍCIOS
A LÍNGUA INSÓUTA
163
164
165
166
167
O
homem
mulher do homem 179
168
PEQUENO INVENTÁRIO pOÉTIco
A MEMÓR lA DE OSW A ID
169
173
174
Poema complementar sobre o rio 175
Gênesis 176
BESTIÁRIO
BIBUOGRAFIA
181
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EXEMPLAR N.
F.C.
Esta obra
compos ta pe la Paika Realizações Gráficas
Ltda., em Garamond corpo 10, para a Livra-
n a Duas Cidades, acabou de ser impressa,
pela Prol Editora Gráfica, no inverno de
/990, na cidade de São Paulo. Da edição
de 1.500 exemplares, 25 foram impressos
em papel Suzano Classic - com a rubrica
F. C. (Fora de Comércio) -, numerados e
assinados pelo autor.
APOIO CULTURAL: Metal Leve S/A
Indâstries de Papel R. Ramenzoni S/A
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J ú l i o C a s t a ã o n UIff/IJIJfI
m á ti ~ a s , m a s a e s sa v e ri f i c aç ão s e
sobrepõe
u m a a l te r a ç ã o
d e p e r s p e c ti v a . H~o m o q lJ e u m i n c e s s a n te r e f i n a m e n t c '
~o r a to d q po et a c o m s u a m a t é r ia . .
A p o e s i a d e A g e d e C a r v a l h o c a m in h a n u m s e n t i d o e m
q u e , m a is d o q u e s e v a le r d a l i n g u a g e m , r e v e l a e s t a r p e -
n e t ra n d o n a l i n g u a g e m . b '~ A b e i r a d e s i q u e s e l ê e m
u m d os p oe m a s m a i s r e c e n t e s in d i c i a o p o n tP e x tr e m a d
d e o n d e s e . c on te m p l a m d iv er s a s p a is a ge n s , i n c lu s iv e a~
d o s e r . M á s o e x tr e m o a q u e s e c h e ga s ão o s l i m i t es in I
v e i se n t r e li n g u a g e m e · s ~ ê n c i o , l im i t e s s ob r e o s q u a i s a tu a m
d e m o d o e s p e c i a l o s ú l t i m o s p o e m a s d e .A g e d e a r v a -
lh o . N o p ri m e i r o p Ç > e m a d e P e d t » . U m , a p lu ra l i z a ç o d e
t e rm o s i n v a r i á v e i s e c om
ac e pção
d e e x c lu s ã o e n f a d z l l
r e d u ç ã o a q u e - se p o d e c h e g a r n u m a fa l a s e m
s e n t i d o
. e m q u e s in í s e n s , n ã o n e n s ; r e d u ç ã o q u e s e r e s u m e n u m
. i s t o ,
I S S ó
- . d i~ t i n ç a o / d i g it a l , m í a ir a a
m o d u l a ç n ,
O N
p oe m as a in da p oê rn a q u es tã o d e
o u t ro s
m o d o s. N o m c ~ ,
m o l i v ro , o p o e m a O u t r o t o m : outono te c e u m a r de
d e
~ s Q ) t : \ â n c j a s q u e e x p õ e o v i g o r d a li n g u a g e m
e aI jusl
n ua u m a f l a m a n r e f a l a fá li c a , m a s, e m s ín te se v i s u a l
d o
m o v i m e n t o o u to n a l , ' f r a 'g m e n t a a p a l a v r a d e r r c l r lr . l '
f /f ls /ha s . C a r r e g a d a d e v i ta li d a d e n ã o s6 p o r
Slla~
i ll
. t e r r o g a ç õ e s l li a f ú e d o m u n d o , m a s t ~ b é m p o r s u a d l ~
p o s i ç ã o d ia n t e d e s e u m a te ri a l d ~ o n s tr u ç ã o , a po~
i~
I
A g e d e 'c a r v a lh o g u a r d a s in g u la re s s u r p r e s a s d e s é m ih i
l i d a d e e a r g ú c i a ,
, , \ A G E V E C i 'iR V A L H O n a sc e u e m B e l im d u J l u r J . , , J IH
F o fd l a d o e m A rq u i t e t u r l / , g r a p h ic d es i g n t r p o r /lru{ tllllu
h/ l
: I O I f a P i lg i n a d e p oe si a
G r á p h o
e m j ( ) m a i II J a r i l ~ l I l f I 11 1
1 9 8 3 · 8 5 .
P u b li c o u
A r q u i te t u r a d os
0 5, I O S
/ 9 H O ) , A h l l u
1 1 1 1 jl
r ê n t e s i s
( 1 9 8 2 ,
rt n g a
c o m
M a x M a rl t n r)
e
A r e n , ~ (r l ( I V / l r, )
O p ; e s f n l e v o l u m e r eú n e e ss es l í l u l o r d e P O tJ i tu IJ,/ I , n / 1 I 1 d r
U m ( 1 9 8 9 ) . R e s i d e a l ua / m e n te e m VIeIlO o n e l,
/r l lb 'h ~ 10 1
d i r e tó , d e à r l e e m d u a s r e v i t t a s
aUllrí l lCtJr
7/25/2019 Carvalho Age de - Ror
http://slidepdf.com/reader/full/carvalho-age-de-ror 100/100
R - . :
,l' ,.
, or.,C0rrop~e1a
d~ -
horr~r, reúne q:UaH~livf(l)sde Age d'e 'Carvalho,
dentre os quais, o inédito P edra-U m
1989 :
Desde
seutrabalho
de es-
tréia, Arq_uitetm :a
t/ ;s@ ssos 1 980},
o autor expressa odesejo €,O~S(ieflte
,
dê conciliar pesquisa e construção. Talproc;ura aponta, de modoprogres-
sivo.para o âmbito'da subjetividade, fazendo com que toda experiência
. implique necessariamente em experiment~ção. O crítico Júlici Castaôon'
I ,
sintetizou de forma definitiva esta operação lírica: a poesia de Age de
Çar'valm0caminha num sentido em que, mais do qus: sevaler da lingua-
ge D, revelá estar penetrando na linguagem' '.