58
CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE SERVIÇO SOCIAL ANGÉLICA BRAGA DOS SANTOS DEMANDAS, CONDIÇÕES DE TRABALHO E EXIGÊNCIAS PROFISSIONAIS NO TRABALHO DO (A) ASSISTENTE SOCIAL NO PRESÍDIO. FORTALEZA 2013

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE SERVIÇO ... · orientação profissional de acordo com as exigências do Projeto Ético- Político. Esta ... CEAS

Embed Size (px)

Citation preview

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

ANGÉLICA BRAGA DOS SANTOS

DEMANDAS, CONDIÇÕES DE TRABALHO E EXIGÊNCIAS PROFISSIONAIS NO

TRABALHO DO (A) ASSISTENTE SOCIAL NO PRESÍDIO.

FORTALEZA

2013

ANGÉLICA BRAGA DOS SANTOS

DEMANDAS, CONDIÇÕES DE TRABALHO E EXIGÊNCIAS PROFISSIONAIS NO

TRABALHO DO (A) ASSISTENTE SOCIAL NO PRESÍDIO.

Monografia submetida à aprovação do Curso de Serviço Social do Centro de Ensino Superior do Ceará Faculdade Cearense - FaC, como requisito parcial para obtenção do grau de Graduação.

Orientador: Prof. Ms. Emanuel Bruno Lopes

FORTALEZA

2013

Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274

S237d Santos, Angélica Braga dos

Demandas condições de trabalho e exigências profissionais

no trabalho do (a) assistente social no presídio / Angélica Braga

dos Santos. Fortaleza – 2013.

56f.

Orientador: Profº. Ms. Emanuel Bruno Lopes.

Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade

Cearense, Curso de Serviço Social, 2013.

1. Trabalho profissional. 2. Serviço social. 3. Sistema

penitenciário. I. Lopes, Emanuel Bruno. II. Título

CDU 36:331

ANGÉLICA BRAGA DOS SANTOS

DEMANDAS, CONDIÇÕES DE TRABALHO E EXIGÊNCIAS PROFISSIONAIS NO

TRABALHO DO (A) ASSISTENTE SOCIAL NO PRESÍDIO.

Monografia como pré-requisito para obtenção do título de Bacharelado em Serviço Social, outorgado pela Faculdade Cearense – FAC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores. Data da aprovação: ____/____/_____

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________

Prof. Ms. Emanuel Bruno Lopes (Orientador)

Faculdade Cearense – FAC

__________________________________________________

Profª. Esp. Talitta Cavalcante Albuquerque Vasconcelos

Faculdade Cearense – FAC

__________________________________________________

Prof. Ms. Daniel Rogers de Souza Ferreira

Faculdade Cearense - FAC

Dedico este trabalho aos meus pais Maria da

Paz e Alberto, com todo meu amor e respeito.

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar agradeço a Deus, que me fortaleceu, capacitou e iluminou durante

todo o meu caminho nesta batalha.

Agradeço aos meus pais por sempre terem acreditado em mim. Ao meu pai Alberto

(in memorian), que eu tanto gostaria que estivesse partilhando desta vitória, mas sei

que onde estiver estará vibrando com a minha conquista. E em especial à minha

mãe Maria da Paz, por ter me dado forças e contribuído para que eu concluísse o

curso, da melhor maneira possível.

A minha irmã Marília, por aturar todos os meus momentos de angústia, com carinho.

Ao meu amado Eliabe, por seu companheirismo, amizade, incentivo, cumplicidade;

obrigada por seu amor.

A minha tia Fátima, pelo carinho e pela contribuição à minha formação.

A toda minha família, que sempre esteve presente, colaborando, encorajando,

estimulando e animando, sobretudo, nos momentos mais difíceis e desafiadores

dessa trajetória.

Ao meu orientador, Emanuel Bruno Lopes, por ter me aceitado com carinho, atenção

e dedicação, pela confiança sem mesmo me conhecer e assim contribuído para que

este trabalho fosse concretizado.

Aos professores Talitta Albuquerque e Daniel Rogers que aceitaram participar da

minha banca e assim tornar possível a conclusão deste trabalho.

A todos os professores que já tive, por compartilharem seus conhecimentos e por

terem feito parte da minha formação profissional.

As profissionais entrevistadas, por terem se predisposto a me prestarem seus

depoimentos e corroborado de diferentes formas para a elaboração deste trabalho.

As minhas amigas, Adelita, Dedé e Juliana, que sempre estiveram presentes quando

precisei; e entenderam as minhas ausências.

As minhas companheiras de luta Carla Lúcia, Daiane Faustino, Evilene Pessoa,

Jamylly Maciel, Marisa Albuquerque, Mayara Rodrigues e Raquel Machado que me

apoiaram nesta batalha, sem a amizade, o apoio e carinho de vocês está caminhada

não teria este sabor tão especial.

Aos colegas e amigos que tive a felicidade de conhecer durante estes quatro anos e

que contribuíram com meu amadurecimento pessoal e profissional, em especial,

Andrea Ribeiro, Daniele Soares, Eliane Avelino, Fernanda Braga, Glauciane Santos,

Haline Almeida, Samara Cipriano, Soraia Andrade, que se tornaram amigas tão

importantes nesta caminhada.

A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho,

o meu,

Muito Obrigada!

“Quem tem um porquê viver, encontrará, quase sempre, um como”. Nietzche “É possível julgar o grau de civilização de uma sociedade visitando suas prisões.” Dostoievski

RESUMO

O Assistente Social está presente nos mais diferentes espaços sócio-ocupacionais,

dentre eles o Sistema Penitenciário, o que torna sua intervenção um desafio em uma

área tão complexa. O presente estudo teve como objetivo conhecer e compreender

o trabalho do Assistente Social inserido neste espaço. Este tema foi escolhido por

sua complexidade e por uma aproximação da pesquisadora, enquanto estagiária da

instituição estudada. Realizei uma pesquisa documental, bibliográfica e de campo,

com entrevistas semiestruturada realizada com duas Assistentes Sociais que atuam

nesta área para uma melhor aproximação com a realidade do objeto de pesquisa.

Conclui-se que o Serviço Social tem um papel fundamental no enfrentamento à

violação dos direitos dos apenados, uma vez que estes sujeitos estão privados

apenas do direito à liberdade. Trate-se de um profissional que necessita responder

demandas, diante de condições de trabalho limitadas e que tenta seguir uma

orientação profissional de acordo com as exigências do Projeto Ético- Político. Esta

pesquisa torna-se relevante uma vez que traz subsídio possibilitando ampliar o

conhecimento a partir da temática tratada.

Palavras-Chave: Trabalho profissional, Serviço Social, Sistema Penitenciário.

ABSTRACT

The Social Worker is present in many different socio-occupational areas, including

the prison system, which makes his speech a challenge in an area as complex. This

study aimed to know and understand the work of the social worker entered in this

space. This theme was chosen for its complexity and an approximation of the

researcher as an intern at the institution studied. Conducted a desk research,

literature and field, with semistructured interviews conducted with two social workers

working in this field for a better approach to the reality of the object of research. We

conclude that the Social Service has a key role in dealing with the violation of the

rights of convicts, since these subjects are deprived of the right to freedom only.

Treat yourself to a professional who needs to answer demands on working conditions

and limited attempts to pursue a career guidance in accordance with the

requirements of the Ethical-Political Project. This research is relevant since it brings

allowance enabling expand knowledge from the subject treated.

Keywords: Professional Work, Social Work, Prisons.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CAGECE – Companhia de Água e Esgoto do Ceará

CAPS – Centro de Atenção Psicossocial CFESS - Conselho Federal de Serviço Social

CEAS – Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo

CTC – Comissão Técnica de Classificação

CRAS – Centro de Referência de Assistência Social

DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional

INFOPEN - Sistema Integrado de Informações Penitenciárias

INPS – Instituto Nacional de Previdência Social

IAPs – Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários

LBA - Legião Brasileira de Assistência

LEP – Lei de Execução Penal

LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social

PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

SEJUS – Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado do Ceará

SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

SESI - Serviço Social da Indústria

UECE – Universidade Estadual do Ceará

SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

SUMÁRIO

I – INTRODUÇÃO ............................................................................................ 13

1.1 Aproximação com o tema da pesquisa ...................................................... 13

1.2 Percurso Metodológico ............................................................................... 16

II – O SERVIÇO SOCIAL NA CONTEMPORANEIDADE ................................ 20

2.1 O Exercício profissional como trabalho: exigências e demandas profissionais

......................................................................................................................... 20

2.2 Os espaços sócio-ocupacionais do (a) Assistente Social .......................... 27

2.3 O perfil de profissional que se exige na atualidade .................................... 31

III – O TRABALHO PROFISSIONAL NA ÁREA SÓCIO-JURÍDICA ...................

......................................................................................................................... 34

3.1 O exercício profissional do (a) Assistente Social na área sócio-jurídica .... 34

3.2 Perfil e trajetória profissional dos assistentes sociais na prisão ................. 40

3.3 O trabalho do (a) assistente social no presídio .......................................... 41

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 49

REFERÊNCIAS ................................................................................................ 51

ANEXOS

13

INTRODUÇÃO

1.1 Aproximação com o tema da pesquisa

O tema abordado neste estudo está relacionado à questão carcerária e o

trabalho do (a) Assistente Social dentro desta realidade. O presente projeto surgiu

de várias inquietações observadas durante a vivência de estágio realizado dentro de

uma Instituição Prisional. Ao estar inserido num ambiente no qual é perceptível o

nível hierárquico dos profissionais, e que a autonomia dos mesmos muitas vezes se

limitam por imposições da instituição, a pesquisadora indagava-se como seria

possível romper com estas limitações e preconceitos, como atuar na perspectiva de

ressocialização e restauração de vínculos familiares se a própria instituição

estigmatiza e corrompe e como efetivar sua ação profissional de forma clara e

precisa, sem romper com seus princípios éticos.

Assim procuramos pesquisar e estudar sobre este assunto e fomos

percebendo os diversos preconceitos existentes em relação aos indivíduos que

estão presos e desta forma o quanto é difícil para o profissional de Serviço Social

atuar nesta área.

Considerando o processo histórico e as mudanças socioeconômicas pelo

qual a sociedade brasileira vem passando, temos como reflexo a pobreza, a miséria,

a desigualdade social, a violência, o aumento dos índices de criminalidade e

consequentemente o aumento da população carcerária.

As prisões têm a função de abrigar estes sujeitos, a fim de que se

cumpram suas sentenças, de forma a vigia-los, orienta-los, reeduca-los para a sua

reinserção na sociedade.

Uma coisa, com efeito, é clara: a prisão não foi primeiro uma privação de liberdade a que se teria dado em seguida uma função técnica de correção; ela foi desde o início uma “detenção legal” encarregada de um suplemento corretivo, ou ainda uma empresa de modificação dos indivíduos que a privação de liberdade permite fazer funcionar no sistema legal. Em suma, o encarceramento penal, desde o início do século XIX, recobriu ao mesmo tempo a privação de liberdade e a transformação técnica dos indivíduos (FOUCAULT, 2009, p. 219).

No Brasil, vivemos sob os ditames do neoliberalismo que aponta novas

formas de organização econômica, onde o avanço da tecnologia tem imposto

padrões de vida cada vez mais excludentes aqueles que não estão inseridos nos

moldes do capitalismo.

14

Porém, vale salientar que mesmo excluídos do sistema econômico

capitalista, onde perdem progressivamente as condições de suprirem suas

necessidades básicas, os indivíduos não são dispensados de obedecer às normas e

regras impostas pela legislação, principalmente a penal.

Na realidade brasileira, a exclusão é um termo impreciso, que admite vários sentidos, parece haver certo consenso em sua associação à problemática da desigualdade social. Circulando num cenário onde habitam a pobreza, a miséria, a indigência, outros termos também de contraditória definição empírica, a exclusão se delinearia e se firma como fruto perverso do capitalismo brasileiro. Constitui-se de certa forma como evolução e limite máximo, de um quadro de carências que vem se acentuando historicamente, carências essas que extrapolam as fronteiras dos bens tidos como materiais e atingem o amplo e complexo campo da privação das condições básicas para o exercício da cidadania (JUNCÁ, 1996: 108).

Segundo dados da Secretaria de Justiça e Cidadania do Ceará – SEJUS,

no ano de 2012 a população carcerária era de 17.6571, destes 12.401 em situação

de regime fechado e 5.256 em regime semi-aberto e/ou aberto. Ainda segundo

dados do DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, de 2010, o Brasil, tem um

déficit na sua capacidade para abrigar os números de presos, o equivalente a 66 %.

Sabemos que existe uma precariedade nas condições físicas e de

qualificação profissional nas prisões e que isto reflete no tratamento penitenciário, o

que pode gerar angústia e revolta entre os presos e motivar rebeliões e outras ações

violentas dentro da Instituição. Desta forma, faz-se necessário a busca por um

tratamento penal que procure minimizar as diferenças existentes na vida prisional

visando garantir medidas necessárias a assegurar ao recluso um regresso

progressivo à vida na sociedade utilizando os instrumentos legais e normativos.

Segundo Iamamoto (2011):

Os Assistentes Sociais trabalham com a questão social nas suas mais variadas expressões quotidianas, tais como os indivíduos as experimentam no trabalho, na família, na área habitacional, na saúde, na assistência social pública etc (IAMAMOTO, 2011:28).

Diante dos dados apresentados podemos ver que é constante o

crescimento da população carcerária e que se faz cada vez mais necessário à

atuação do profissional de Serviço Social nos Presídios e Casas de Privação de

Liberdade. Em determinados locais, como no caso de um presídio, assim é

necessário o uso de medidas de proteção e regras que visam manter o controle e a

1 Dados obtidos através do portal da Secretaria de Justiça e cidadania do Estado do Ceará.

http://www.sejus.ce.gov.br/index.php/gestao-penintenciaria/39/70

15

segurança dos profissionais, dos encarcerados e das pessoas que visitam esta

instituição, portanto, inserido nesta realidade o trabalho do Assistente Social está

subordinado às regras institucionais, sendo necessário que o profissional tenha um

amplo conhecimento teórico-metodológico, com dimensão ético-política e que saiba

utilizá-lo, intervindo entre o usuário e a instituição.

A atuação do SS é visceralmente polarizada por interesses sociais de classes contraditórias, inscritos na própria organização da sociedade e que se recriam na nossa prática profissional, os quais não podemos eliminar. Só nos resta estabelecer estratégias profissionais e politicas que fortaleçam alguns dos atores presentes nesse cenário. Assim sendo, a prática profissional tem um caráter essencialmente politico: surge das próprias relações de poder presentes na sociedade (IAMAMOTO, 2004, p. 122).

O trabalho do (a) Assistente Social no sistema prisional constitui uma

estratégia fundamental na defesa dos direitos humanos, na construção da

autonomia dos sujeitos encarcerados e na elaboração de projetos, instrumentos que

possam alcançar o real objetivo da demanda do usuário.

Diante deste contexto, a busca pela garantia dos direitos sociais e o

exercício da cidadania se tornam relevantes para a sociedade brasileira, sendo de

grande importância o surgimento de estudos que aprofundem esta problemática,

para que haja uma maior compreensão sobre o assunto.

Através desta realidade, o Serviço Social deve tomar um posicionamento

crítico e ético de forma a mediatizar os conflitos existentes entre as instituições

penais e os apenados, visando dar repostas aos problemas sociais com objetivos

que garantam os direitos a assistência material, à saúde, educacional, jurídica,

social e religiosa.

Portanto, o papel a ser desempenhado pelo Serviço Social, deverá ser de

levar conhecimentos e oportunidades para aquelas pessoas envolvidas neste

processo, para que tenham meios de efetivar sua condição social, seu papel de

cidadão, de responsáveis pela sociedade onde vivem, seja através de ações diretas

com os indivíduos internados ou condenados, seja com suas famílias, entendendo

que estas têm papel fundamental, enfim proporcionar condições para a integração

social.

Desta forma, surgem diversas indagações sobre a forma de atuação do

profissional de Serviço Social que está inserido no âmbito prisional: Qual a

importância do Serviço Social no Sistema Penitenciário? Como o (a) Assistente

16

Social poderá romper com a burocratização e alienação que o rotineiro ambiente de

trabalho propicia como nos é alertado por Iamamoto em suas reflexões sobre o

trabalho profissional? Quais as possibilidades e desafios que existem na atuação do

(a) Assistente Social no Sistema Penitenciário?

Portanto, o presente estudo teve como objetivo geral compreender a o

trabalho do (a) Assistente Social no Sistema Penitenciário, conhecer as principais

possibilidades e limites de sua atuação.

Assim este trabalho estrutura-se em três capítulos. O primeiro capítulo

destaca a aproximação da pesquisadora com o tema da pesquisa, que por

consequência da experiência de estágio realizada dentro de um presídio lhe

despertou curiosidade pela temática, e também a metodologia utilizada para que a

construção deste estudo fosse realizado.

O segundo capítulo apresenta o Serviço Social na contemporaneidade,

tendo como foco o trabalho do Assistente Social, suas demandas e exigências

profissionais, os seus espaços sócio-ocupacionais e também o perfil profissional

exigido dentro desta atual conjuntura.

No terceiro capítulo, destacamos um pouco da inserção do Assistente

Social na área sócio-jurídica, retratamos o perfil das entrevistadas para a realização

deste estudo e fazemos uma análise dos dados colhidos na pesquisa de campo,

com a percepção dos autores principais que trabalham esta temática.

1.2 Percurso metodológico

A realidade social é intrínseca a relação dos homens com outros homens

e com as instituições sociais. Para tanto é com base neste pensamento que

utilizamos a pesquisa social para a elaboração deste trabalho, compreendendo que

a pesquisa social é fundamental para dar respostas às investigações propostas nas

pesquisas sociais. Assim, Gil (2011) nos define essa como o processo que,

utilizando a metodologia cientifica, permite a obtenção de novos conhecimentos no

campo da realidade social.

Na realização desta pesquisa procurou-se aproximação com o tema

abordado através de uma pesquisa bibliográfica na qual através de livros, artigos e

17

publicações obtivemos dados de estudos já realizados, que foi de suma importância

para o continuo estudo do tema.

A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente. Esta vantagem se torna particularmente importante quando o problema de pesquisa requer dados muito dispersos pelo espaço (GIL, 2011, p.50).

Nesta perspectiva procuramos fazer uma seleção de artigos e livros a ser

estudado, incluindo autores como Karl Marx (2008), Marilda Iamamoto (2004, 2009,

2010, 2011), Raquel Raichelis (2009, 2011), Eunice Fávero (2005, 2009, 2010),

Sílvia Helena Chuairi (2001), Miriam Krenzinger A. Guindani (2001), para

compreendermos e fundamentarmos teoricamente as discussões deste trabalho

monográfico. Para uma melhor compreensão do objeto de estudo realizamos uma

pesquisa de campo que conforme Minayo (2012) permite a aproximação do

pesquisador da realidade sobre a qual formulou uma pergunta, mas também

estabelecer uma interação com os “atores” que conformam a realidade. Trata-se de

uma pesquisa de natureza qualitativa, pois entende-se que permite uma melhor

visão da realidade e uma maior aproximação com o cotidiano do objeto de pesquisa

e que conforme Minayo (2010):

A pesquisa qualitativa responde as questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se distingue não por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes (MINAYO, 2010, p.21).

Realizamos também uma pesquisa documental para nos apreendermos

das leis, decretos, resoluções, censos, como também jornais, revistas, e relatórios

de pesquisa, para nos possibilitar uma melhor compreensão do tema pesquisado. E

que segundo Gil (2011), a pesquisa documental vale-se de materiais que não

receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de

acordo com os objetivos da pesquisa.

A partir desta abordagem qualitativa de pesquisa, utilizei entrevistas para

coleta de dados, tendo em vista, que é indispensável para uma melhor aproximação

com a realidade do objeto de pesquisa, sendo definida como:

(...) a técnica em que o investigador se apresenta frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção dos dados que interessam à investigação. A entrevista é, portanto, uma forma de interação social. Mais

18

especificamente, é uma forma de dialogo assimétrico, em que uma das partes busca coletar dados e a outra se apresenta como fonte de informação. A entrevista é uma das técnicas de coleta de dados mais utilizada no âmbito das ciências sociais (GIL, 2011, p. 109).

Para a pesquisa de campo foram utilizadas entrevistas semi-

estruturadas, que segundo Minayo (2010) combina perguntas fechadas e abertas,

em que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema em questão

sem se prender à indagação formulada.

Assim, Goldenberg (2004) nos aponta as vantagens da entrevista:

a. pode coletar informações de pessoas que não sabem escrever; b. as pessoas têm maior paciência e motivação para falar do que para escrever; c. maior flexibilidade para garantir a resposta desejada; d. pode-se observar o que diz o entrevistado e como diz, verificando as possíveis contradições; e. instrumento mais adequado para a revelação de informação sobre assuntos complexos, como as emoções; f. permite uma maior profundidade; g. estabelece uma relação de confiança e amizade entre pesquisador-pesquisado, o que propicia o surgimento de outros dados (GOLDENBERG, 2004, p. 88).

A pesquisa ocorreu sem muitos transtornos no campo, por já existir

conhecimento com as profissionais que participaram da pesquisa, como também

conhecer o universo da prisão em virtude do período de um ano, tendo início em

dezembro de 2011 até dezembro de 2012, no qual foi realizado o estágio obrigatório

da pesquisadora, na disciplina de estágio II e III, que tem como objetivo conhecer as

áreas de atuação profissional e formular um projeto de intervenção, e assim melhor

compreender o universo no qual se insere o Assistente Social. As entrevistadas se

dispuseram as participar de imediato desta pesquisa, facilitando o dia e horário para

que fossem colhidos os dados da melhor forma possível.

Para tanto escolhemos como instituições o IPPOO II - Instituto Presídio

Professor Olavo Oliveira II e a CPPL 3 - Casa de Privação Provisória de Liberdade

Professor Jucá Neto, para melhor percepção da realidade nos ambientes desta

atuação. O IPPOO-II é um presídio para detentos indiciados, localizado na BR 116,

Km 17 no município de Itaitinga, foi inaugurado a 19 de setembro de 2002, na

gestão do então Presidente da República Dr. Fernando Henrique Cardoso, do

Ministro da Justiça o Dr. Paulo de Tarso Ramos Ribeiro, do Governador do Estado o

Dr. Benedito Claiton Veras Alcântara, sendo Secretária da Justiça a Dra. Sandra

Dond Ferreira. Hoje abriga em sua maioria, presos do regime semiaberto. Já a CPPL

3, é uma unidade voltada para preso provisório, possui capacidade para 952

19

detentos, foi inaugurada no dia 24 de agosto de 2010, pelo governador do Estado do

Ceará, Cid Gomes, e pelo secretário da Justiça e Cidadania, Marcos Cals.

Todo esse processo de coleta de dados foi realizado na manhã do dia

vinte e dois de maio do decorrente ano, as entrevistas foram realizadas em média

em 40 minutos, por consequência de ser um dia de atendimentos as famílias dos

presos, houve alguns momentos de interferência, tendo que parar a entrevista para

que a Assistente Social pudesse realizar atendimento. Foi esclarecido o motivo da

realização deste trabalho, como também a preservação de suas identidades para

garantir quaisquer prejuízos, para tal proposito foi pedida a leitura e assinatura do

termo de consentimento livre e esclarecido para a realização da entrevista.

Após a coleta de dados, iniciou-se a análise dos dados que segundo Gil

(2011) tem como objetivo organizar e sumariar os dados de forma tal que

possibilitem o fornecimento de respostas ao problema proposto par investigação.

Para sistematizar os dados foram lidas e relidas diversas vezes as

entrevistas e procuramos refletir e assimilar as falas das entrevistadas com as dos

autores que discutem a categoria trabalho, as competências profissionais, e os

antagonismos da vida profissional. Desta forma procuramos analisar, compreender e

desvelar o trabalho profissional do Assistente Social diante das possibilidades e

limites de sua atuação no Sistema Penitenciário.

20

II - O SERVIÇO SOCIAL NA CONTEMPORANEIDADE

Este capítulo retratará um breve contexto histórico do trabalho do (a)

Assistente Social na contemporaneidade, bem como os seus espaços ocupacionais

e o perfil profissional que se exige na atualidade, considerando as determinações

legais que orientam a atuação profissional.

2.1. Exercício profissional como trabalho: exigências e demandas

profissionais

No Brasil, a questão social se desenvolve nos anos 1920/1930 como

fenômeno social originário do modo de produção capitalista, elucidada através do

pauperismo e mais eminente com a exploração do trabalho e seu movimento de luta

defensiva, sendo a pobreza vista como ameaça à ordem burguesa, que exige um

posicionamento das diversas classes sociais dentre eles Estado, burguesia e

religião.

A partir dos anos 1940/1950 com o crescimento industrial, o processo de

urbanização e as migrações, trazem uma nova roupagem a questão social e exige

do Estado uma nova forma de intervenção, que ocorre por meio do surgimento das

politicas sociais públicas, sempre buscando a manutenção da ordem burguesa.

Já no início dos anos 1960 com o processo da ditadura no Brasil, a

questão social sofre um agravamento com o retrocesso da perda de algumas

conquistas, como o direito as greves, a liberdade de organização e assim o

crescimento nos níveis de exploração do trabalho e o empobrecimento das classes

subalternas.

Então nos anos 1970 com a mudança no processo do padrão de

acumulação, ocorre uma expansão da economia capitalista e mais uma vez a

questão social passa por transformações no qual surge a figura do operário em

massa, a organização do processo de trabalho e consequentemente o aumento do

consumo das mercadorias.

Nos anos 1980 temos a flexibilidade no processo de trabalho, e esta vem

mudar o cenário da questão social com a desregulamentação dos direitos do

trabalho, a informalização contratual, a terceirização, o trabalhador polivalente e ao

21

mesmo tempo o surgimento do desemprego, a insegurança do trabalho e o

chamado exército de reserva ou população sobrante, o que novamente aponta para

o crescimento da miséria.

No início da década de 1990 com a ascensão do neoliberalismo surge o

agravamento da desigualdade social e consequentemente a expansão das diversas

expressões da questão social.

As mais importantes expressões da questão social são: o retrocesso no emprego, a distribuição regressiva de renda e a ampliação da pobreza, acentuando as desigualdades nos estratos socioeconômicos, de gênero e localização geográfica urbana e rural, além de queda nos níveis educacionais dos jovens (IAMAMOTO, 2010, p. 147).

A questão social sempre foi a base do trabalho dos Assistentes Sociais, é

nesta perspectiva que este profissional deverá atuar sempre atento as mudanças

que ocorrem na sociedade.

Um dos maiores desafios que o assistente social vive no presente é desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho criativas e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes no cotidiano (IAMAMOTO, 2011, p.20).

Assim, participando deste contexto o (a) Assistente Social se insere na

produção e reprodução das relações sociais. E, portanto para dar repostas as

necessidades emergentes do modelo capitalista vigente se insere no exercício

profissional como trabalhador que busca formular e propor projetos e/ou programas

que minimizem os efeitos coercitivos deste sistema, indo além das atividades

burocráticas do emprego formal.

O exercício da profissão é mais que isso. É uma ação de um sujeito profissional que tem competência para propor, para negociar com a instituição os seus projetos, para defender o seu campo de trabalho, suas qualificações e funções profissionais. Requer, pois, ir além das rotinas institucionais e buscar apreender o movimento da realidade para detectar tendências e possibilidades nela presentes passiveis de serem impulsionadas pelo profissional (IAMAMOTO, 2011, p. 21).

Para discutirmos sobre a questão do trabalho profissional, iniciaremos

este debate a partir das análises de Marx (2008) que esclarece que o trabalho é a

atividade que diferencia o homem dos animais, é através do trabalho que o homem

transforma a natureza e transforma a si mesmo.

Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano, com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como uma de suas forças. Põe em movimento as forças naturais de seu corpo – braços e pernas, cabeça e mãos –, a fim

22

de apropriar-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma útil à vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza (MARX, 2008, p. 211).

O homem através da sua capacidade de transformar a natureza,

distinguindo-se dos outros animais e assegurando a sua existência faz com que o

trabalho surja como forma do homem torna-se ser social, entendendo o trabalho

como categoria central da vida humana.

Podemos distinguir o homem dos animais pela consciência, pela religião ou por qualquer coisa que se queira. Porém, o homem se diferencia propriamente dos animais a partir do momento em que começa a produzir seus meios de vida, passo este que se encontra condicionado por sua organização corporal. Ao produzir seus meios de vida, o homem produz indiretamente sua própria vida material (MARX e ENGELS, 1974, p. 19).

O trabalho ainda tem por finalidade a transformação do homem e

consequentemente das relações sociais. Conforme Iamamoto (2011):

Por meio do trabalho o homem se afirma como ser criador, não só como indivíduo pensante, mas como indivíduo que age consciente e racionalmente. Sendo o trabalho uma atividade prática-concreta e não só espiritual, opera mudanças tanto na matéria ou no objeto a ser transformado, quanto no sujeito, na subjetividade dos indivíduos, pois permite descobrir novas capacidades e qualidades humanas (IAMAMOTO, 2011, p. 60; grifos da autora).

De acordo com a mesma autora, todo trabalho implica um certo saber

sobre os homens em suas relações sociais e pessoais, como condição de induzir o

sujeito a efetuar os propósitos desejados (IAMAMOTO, 2011, p. 42).

Desta forma existe uma discussão que diferencia o trabalho profissional

da prática profissional, e que a segunda estaria ligada diretamente à atividade

profissional, e no trabalho existe uma complexidade, pois, todo trabalho necessita da

pesquisa, do conhecer e refletir sobre o objeto de trabalho, como também de

instrumentos que possam dar subsídios para realização da atividade.

O trabalho é, portanto, inseparável do conhecimento, de ideias e concepções de mundo, isto é, de formas de pensar a vida real. O ser que trabalha constrói para si, através de sua atividade, modos de agir e de pensar, ou seja, uma maneira especificamente humana de se relaciona com as circunstâncias objetivamente existentes, delas se apropriando, tendo em vista a consecução de fins propostos pelo sujeito na criação de objetos capazes de desempenhar funções sociais, fazendo nascer valores de uso (IAMAMOTO, 2010, p. 352; grifos da autora).

Netto e Braz (2006) apreendem que o trabalho é constitutivo do ser social,

no entanto, ressaltam que o ser social não se reduz ou se esgota no trabalho e que

23

quanto mais se desenvolve o ser social, mais as suas objetivações transcendem o

espaço ligado diretamente ao trabalho.

Segundo Netto (2006), o Serviço Social é uma profissão, e não uma

ciência, e desse modo, lhe são privados os benefícios de conceituação ampla e

definitiva, permitida às ciências.

A atuação do profissional de Serviço Social deverá estar de acordo com

as determinações legais a partir da Lei nº 8.662/93 que regulamenta a profissão, o

Código de Ética profissional (1993) e as demais resoluções do Conselho Federal de

Serviço Social – CFESS2.

Segundo o Código de Ética Profissional (1993), temos como princípios

fundamentais para orientação do trabalho do (a) assistente social:

O reconhecimento da liberdade como valor ético central, a defesa intransigente dos direitos humanos, a ampliação e consolidação da cidadania, a defesa do aprofundamento da democracia, o posicionamento em favor da equidade e justiça social, o empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, a garantia do pluralismo, a opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, a articulação com os movimentos de outras categorias, o compromisso com a qualidade dos serviços prestado e o exercício do Serviço Social sem ser discriminado (FÁVERO, 2010, p.32-33).

A Lei nº 8.662/93, por sua vez, destaca dentre outras competências do assistente social:

Realizar estudos socioeconômicos com os usuários para fins de benefícios e serviços sociais junto a órgãos da administração pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, realizar vistorias, pericias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres sobre a matéria de Serviço Social (FÁVERO, 2010, p. 32).

É impossível pensar a atuação do (a) assistente social sem remeter-se ao

projeto ético-político que rege a profissão. Devendo o profissional ter capacidade de

articular seu conhecimento teórico-metodológico, ético-político com o técnico-

operacional3 para o desenvolvimento de uma atuação que responda as

necessidades sociais. De acordo com Toniolo (2008) as dimensões de

2 O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) é uma autarquia pública federal que tem a

atribuição de orientar, disciplinar, normatizar, fiscalizar e defender o exercício profissional do/a assistente social no Brasil, em conjunto com os Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS). Para além de suas atribuições, contidas na Lei 8.662/1993, a entidade vem promovendo, nos últimos 30 anos ações, políticas para a construção de um projeto de sociedade radicalmente democrático, anticapitalista e em defesa dos interesses da classe trabalhadora. 3 De acordo com as diretrizes curriculares para os Cursos de Graduação em Serviço Social no Brasil,

propostas pela Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) essas dimensões forma o pilar da formação profissional dos Assistentes Sociais.

24

competências que embasam a formação do profissional em Serviço Social podem

ser apreendidas como:

Competência ético-política – o Assistente Social não é um profissional “neutro”. Sua prática se realiza no marco das relações de poder e de forças sociais da sociedade capitalista – relações essas que são contraditórias. Assim, é fundamental que o profissional tenha um posicionamento político frente às questões que aparecem na realidade social, para que possa ter clareza de qual é a direção social da sua prática. Isso implica em assumir valores ético-morais que sustentam a sua prática – valores esses que estão expressos no Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais (Resolução CFAS nº 273/93)5, e que assumem claramente uma postura profissional de articular sua intervenção aos interesses dos setores majoritários da sociedade; Competência teórico-metodológica – o profissional deve ser qualificado para conhecer a realidade social, política, econômica e cultural com a qual trabalha. Para isso, faz-se necessário um intenso rigor teórico e metodológico, que lhe permita enxergar a dinâmica da sociedade para além dos fenômenos aparentes, buscando apreender sua essência, seu movimento e as possibilidades de construção de novas possibilidades profissionais; Competência técnico-operativa – o profissional deve conhecer, se apropriar, e sobretudo, criar um conjunto de habilidades técnicas que permitam ao mesmo desenvolver as ações profissionais junto à população usuária e às instituições contratantes (Estado, empresas, Organizações Não-governamentais, fundações, autarquias etc.), garantindo assim uma inserção qualificada no mercado de trabalho, que responda às demandas colocadas tanto pelos empregadores, quanto pelos objetivos estabelecidos pelos profissionais e pela dinâmica da realidade social (TONIOLO, 2008, p.121-122).

O Projeto Ético-político está ligado a um projeto de transformação da

sociedade, tendo como valor ético central: a liberdade. Buscando consolidar através

da organização política, fundamentada no conhecimento teórico, por meio de

pensamento coletivo. Segundo Netto (1999) este projeto profissional se vincula a um

projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem

exploração/dominação de classe, etnia e gênero.

O Projeto Ético-Político do Serviço Social, consolidado nas décadas de 1980 e 1990, tem, como uma de suas características, pensar a profissão no contexto histórico, garantindo a análise da sua particularidade e da sua relação com outros sujeitos sociais e profissionais, na busca, sob determinadas condições sócio-econômicas, de estabelecer alianças e parcerias, na defesa de valores e princípios comprometidos com a emancipação humana (RAMOS, 2009, p.42).

Para a categoria profissional o projeto ético-político surge como alicerce

na atuação do (a) assistente social por dinamizar o compromisso com a classe

trabalhadora, na defesa dos direitos humanos, em favor da equidade, no combate ao

preconceito e na consolidação da cidadania.

25

A dimensão política do projeto é claramente enunciada: ele se posiciona a favor da equidade e da justiça social, na perspectiva da universalização do acesso a bens e a serviços relativos às políticas e programas sociais; a ampliação e a consolidação da cidadania são explicitamente postas como garantia dos direitos civis, políticos e sociais das classes trabalhadoras. Correspondentemente, o projeto se declara radicalmente democrático – considerada a democratização como socialização da participação política e socialização da riqueza socialmente produzida (NETTO, 1999, p. 16).

É fundamental que o (a) assistente social no exercício profissional

consiga unir a dimensão sócio-histórica, com o conhecimento teórico e sua

articulação política para a efetivação do projeto profissional que busca o

fortalecimento das classes na perspectiva de mudança social, visando á

emancipação social e com isso o fim das desigualdades, dominação e exploração.

Pois, de acordo com Iamamoto (2010):

As dimensões sócio-históricas e ético-políticas do projeto profissional têm consequências: supõem uma visão de mundo, articulada a uma ética correspondente e se liga à ação no sentido de interferir no comportamento dos homens, no enfrentamento dos conflitos sociais (IAMAMOTO, 2010, p. 230).

Neste sentido, o projeto ético-político aponta a necessidade de articular

com as instituições, com os outros profissionais, com movimentos sociais, para que

seja possível potencializar as propostas de democratização e ampliação da

cidadania, como também viabilizar a garantia dos direitos.

Além disso, existe o desafio de consolidar este projeto profissional como

hegemônico em meio às ameaças do projeto neoliberal explicitado na reestruturação

produtiva4, procurando ampliar as dimensões organizativas, o fortalecimento da

categoria, intervenções com competência crítica e aprofundamentos dos princípios

éticos e democráticos. A despeito disso, Iamamoto (2010) afirma o seguinte:

São muitos os desafios atuais. O maior deles é tornar esse projeto um guia efetivo para o exercício profissional e consolidá-lo por meio de sua implementação efetiva, ainda que na contramão da maré neoliberal, a partir de suas próprias contradições e das forças políticas que possam somar na direção por ele apontada (IAMAMOTO, 2010, p. 233).

Vive-se um momento de instabilidade no cenário mundial, que repercute

nos diversos segmentos sociais, tais como: economia, cultura, trabalho. E isso tem

refletido na atuação do (a) assistente social, pois, exige-se que este profissional seja

qualificado a dar retornos e ao mesmo tempo que seja um agente não só executivo,

mas propositivo. 4 Acerca da Reestruturação Produtiva, consultar Behring (2008) e Mota (2010).

26

O momento presente desafia os assistentes sociais a se qualificarem para acompanhar, atualizar e explicar as particularidades da questão social nos níveis nacional, regional e municipal, diante das estratégias de descentralização das políticas públicas (IAMAMOTO, 2011, p.41).

Por estar inserido na estrutura do trabalho, o assistente social também

vive as tormentas da flexibilização, da precarização, do subemprego e dos contratos

temporários.

Na sociedade brasileira esse quadro assume conotações particulares e mais graves, visto que ao desemprego, resultante das novas tecnologias, soma-se o persistente desemprego, estrutural, as relações de trabalho presididas pela violência, a luta de terra, o trabalho noturno, as relações de trabalho clandestinas, o trabalho escravo, que passam a adquirir uma certa “máscara de modernidade” neste país (IAMAMOTO, 2011, p.33-34).

Desta forma aumentam as exigências encontradas na atuação do

Assistente Social, que passa agora a ter que se “adequar” as exigências do mercado

formal, pois, além de se qualificar especificamente para atender as demandas

institucionais tem também que ficar atento para garantir o projeto ético-político,

sendo capaz de propor projetos que atendam as exigências institucionais sem

esquecer de garantir os direitos sociais.

Refletir sobre o trabalho da assistente social na contemporaneidade nos

faz pensar em toda a situação vivenciada pela classe trabalhadora que precisa dos

empregadores para vender sua mão de obra em troca de salários, muitas vezes

tendo seus direitos violados.

Segundo Raichelis, é necessário que os empregadores forneçam meios

para que se possam desenvolver as atividades profissionais.

São os empregadores que fornecem instrumentos e meios para o desenvolvimento das tarefas profissionais, são as instituições empregadoras que têm o poder de definir as demandas e as condições em que deve ser exercida a atividade profissional: o contrato de trabalho, a jornada, o salário, a intensidade, as metas de produtividade (RAICHELIS, 2011, p.428).

Iamamoto (2011) concorda com Raichelis (2011) quando discorre que o

assistente social precisa das organizações para executar seu trabalho, pois não

dispõe de todos os recursos necessários para efetivação de seu exercício

profissional.

Embora regulamentado como uma profissão liberal na sociedade, o Serviço Social não se realiza como tal. Isso significa que o assistente social não detém todos os meios necessários para a efetivação de seu trabalho:

27

financeiros, técnicos e humanos necessários ao exercício profissional autônomo. Depende de recursos previstos nos programas e projetos da instituição que o requisita e o contrata, por meio dos quais é exercido o trabalho especializado. Em outros termos, parte dos meios e recursos materiais, financeiros e organizacionais necessários ao exercício deste trabalho são fornecidos pelas entidades empregadoras (IAMAMOTO, 2011, p. 63).

Nesta ótica, entende-se que não é apenas conhecimento teórico,

capacidade crítica que necessita o assistente social para exercer sua atividade

profissional, mas também de recursos financeiros, estruturais que se materializam

na inserção deste profissional nos espaços sócio-ocupacionais estabelecidos na

sociedade.

2.2 Os espaços sócio-ocupacionais do Assistente Social

Conforme explicitado anteriormente o assistente social necessita de

espaços e entidades empregadoras para executar seu exercício profissional. Deste

modo é preciso pensar nas dinâmicas das relações sociais, suas expressões e o

processo histórico que insere o assistente social na atualidade.

O primeiro espaço de atuação do Serviço Social surge na década de 1920

num contexto de pauperização, altas jornadas de trabalho e movimentos de

organização popular por parte da classe operária, o que leva ao Estado a se

manifestar no âmbito da manutenção e controle da ordem. É neste momento que

vemos a atuação do assistente social que se insere como um mediador entre

proletariado e burguesia, porém, com base forte na doutrina cristã, a atuação ocorre

na perspectiva de corrigir as supostas “disfuncionalidades”5, adequando-os para os

moldes da sociedade burguesa.

Os elementos que mais colaboram para o surgimento do Serviço Social têm origem na Ação Católica – intelectualidade laica, estritamente ligada à hierarquia católica -, que propugna, com visão messiânica, a recristianização da sociedade através de um projeto de reforma social. Estes núcleos de leigos, orientados por uma retórica política de cunho humanista e antiliberal, lançam-se a uma vigorosa ação dirigida para penetrar em todas as áreas e instituições sociais, criando mecanismos de intervenção em amplos segmentos da sociedade, com estratégia de progressivamente, conquistar espaços importantes no aparelho de Estado (CASTRO, 1982, p. 40).

5 Expressão utilizada por Manuel Manrique Castro em seu livro História do Serviço Social na América

Latina (1984).

28

Em 1935 tem seu espaço vinculado ao Departamento de Assistência

Social do Estado de São Paulo, com um caráter mais assistencialista a atuação dos

assistentes sociais é direcionada a atender e intervir junto aos desvalidos, ao menor

e os trabalhadores, através de obras sociais e o chamado Serviço Social de casos

individuais.

Já em 1935 fora criado – Lei n. 2.497, de 24.12.1935 – o Departamento de Assistência Social do Estado, primeira iniciativa desse gênero no Brasil. A ele competiria: a) superintender todo o serviço de assistência e proteção social; b) celebrar, para realizar seu programa, acordos com as instituições particulares de caridade, assistência e ensino profissional; c) harmonizar a ação social do Estado, articulando-a com dos particulares; d) distribuir subvenções e matricular as instituições particulares realizando seu cadastramento (IAMAMOTO, 2011, p.185).

Já em 1940 o campo de atuação se dará nos Centros Familiares

organizados pelos CEAS6, localizados nos bairros operários e com objetivo de elevar

o nível econômico e cultural.

Nesses Centros manterão serviços diversos, como plantão para atendimento de interessados, serviços diversos, bibliotecas infantis, reuniões educativas para adultos, curso primário “para proteger as crianças cujas mães são obrigadas a trabalhar fora”, cursos de formação familiar (moral e formação doméstica para o lar), restaurante para operários etc. O tratamento dos casos será basicamente feito através de encaminhamentos, colocação em empregos, abrigos provisório para necessitados, regularização da situação legal da família (casamento) etc., e fichário dos assistidos (IAMAMOTO, 2011, p. 201).

Ainda na década de 1940 surge a Legião Brasileira de Assistência – LBA,

que dará impulsionalidade na expansão das obras assistenciais. Como também a

criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), e do Serviço

Social da Indústria (SESI), o serviço social é chamado a atuar num caráter mais

técnico, visando ações voltadas à educação, disciplinamento e qualificação do

trabalhador na indústria.

O assistente social, integrante desse quadro de técnicos manipuladores de técnicas sociais englobadas no processo educacional, aparecerá, teoricamente, na estrutura do SENAI como coordenador e reforçados dessa prática social e como explicitamente encarregado dos casos de desviança mais aparentes verificados no âmbito da instituição (IAMAMOTO, 2011, p. 281).

Na década de 1950 o Serviço Social começa outro tipo de abordagem,

relacionado às dinâmicas de grupo e estudos psicossociais, tem ação nos

programas sociais relacionados aos serviços de indústria e comércio através do

6 CEAS – Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo.

29

modelo desenvolvimentista e também está inserido na saúde e na previdência nos

IAPs e posteriormente chamado de INPS.

No período de 1960 em meio à ditadura militar o Serviço Social passa por

um momento de reflexão crítica, que desperta nos assistentes sociais a necessidade

de mudança com as formas de atuação e a formação profissional que busca uma

transformação social na perspectiva de romper com o conservadorismo, surge assim

o Movimento de Reconceituação do Serviço Social7.

Os anos 60, ao longo dos quais se processou um agravamento do quadro político nacional, encontraram o Serviço Social recuado do cenário histórico, produzindo e reproduzindo práticas incapazes de se somarem aos esforços de construção e preservação de espaços democráticos em uma sociedade oprimida por uma ditadura militar (MARTINELLI, 2010, p. 142).

Já na década de 1970 é marcada pela busca de inserir uma forma única

de intervir dentro da realidade social, embasada na ideologia estrutural-funcionalista

que procura a ordem social e o bem comum.

Em 1980 o Serviço Social ocupa os espaços da universidade e dos

movimentos sociais e se apropria da teoria marxista como suporte na atuação

profissional, procurando romper com a neutralidade da ação profissional e afirmar

seu compromisso com a classe trabalhadora, assim exerce papel importante na

elaboração e efetivação das políticas sociais.

Por fim na década de 1990 ocorre várias conquistas com a aprovação do

Código de Ética de 1993, com a implementação do Projeto Ético-Político, e com isso

a ampliação dos espaços ocupacionais. E com a globalização e o crescimento das

desigualdades sociais percebemos que crescem as expressões da questão social e

em torno deste crescimento surgem necessidades de elaborar políticas públicas que

venham atender as demandas e são nos espaços sócio-ocupacionais que melhor

percebemos estas demandas.

Nesse cenário, a questão social e as ameaças dela decorrentes assumem um caráter essencialmente político, cujas medidas de enfrentamento expressam projetos para a sociedade. A ampliação exponencial das desigualdades de classe, densas de disparidades de gênero, etnia, geração e desigual distribuição territorial, radicaliza a questão social em suas múltiplas expressões coletivas inscritas na vida dos sujeitos, densa de tensões entre consentimento e rebeldia, o que certamente encontra-se na base da tendência de ampliação do mercado de trabalho para a profissão de Serviço Social na última década (IAMAMOTO, 2009, p.343).

7 Para a análise deste evento José Paulo Netto faz uma ampla discussão no livro Ditadura e Serviço

Social: uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64.

30

O Estado vem procurar através das políticas públicas intervir nesta

realidade, e dentro desta, o assistente social se insere na elaboração, avaliação e

execução de políticas sociais que tem sido as principais mediações dentro da esfera

estatal.

Assim sendo, é o próprio Estado o grande impulsionador da profissionalização do assistente social, responsável pela ampliação e constituição de um mercado de trabalho nacional, cada vez mais amplo e diversificado, acompanhando a direção e os rumos do desenvolvimento capitalista na sociedade brasileira (RAICHELIS, 2009, p.380).

Com sua capacidade de intervir na realidade, seja por meio da execução,

planejamento, gestão e avaliação, o (a) assistente social é chamado a atuar nos

mais diferentes espaços, sejam eles de caráter público ou privado, como é o caso

das ONGs, saúde, previdência, assistência, entidades sem fins lucrativos, empresas,

hospitais, presídios, dentre outros.

Podemos observar também a atuação deste profissional nos Conselhos

municipais e estaduais, na gestão e monitoramento no terceiro setor, nas

organizações privadas, na habitação e nos espaços de formação profissional.

A ampliação destes espaços ocupacionais traz como consequência o

aumento das exigências profissionais, que fazem com que o assistente social esteja

capacitado a articular com as instituições de forma atender suas demandas sem

romper com os princípios do Código de Ética, tendo uma reflexão crítica sobre o

contexto histórico que se insere, com uma formação acadêmica contínua, preparado

para elaboração e realização de estudos e pesquisas e capacidade para atuar em

equipes interdisciplinares.

Orientar o trabalho profissional nos rumos aludidos requisita um profissional culto e atento às possibilidades descortinadas pelo mundo contemporâneo, capaz de formular, avaliar e recriar propostas ao nível das politicas sociais e da organização das forças da sociedade civil. Um profissional informado, crítico e propositivo, que aposte no protagonismo dos sujeitos sociais. Mas também um profissional versado no instrumental técnico-operativo, capaz de realizar as ações profissionais, aos níveis de assessoria, planejamento, negociação, pesquisa e ação direta, estimuladoras da participação dos usuários na formulação, gestão e avaliação de programas e serviços sociais de qualidade (IAMAMOTO, 2011, p.144).

A imersão do (a) assistente social nas diferentes esferas governamentais

faz com que seja requisitado deste profissional uma capacidade de decifrar a

31

realidade e formular projetos sociais que possam ser efetivados de acordo com a

dinâmica de cada instituição. É o que afirma Raichelis (2009):

Para os assistentes sociais será reservada, prioritariamente, a relação com os segmentos sociais mais vulnerabilizados pelas sequelas da questão social e que buscam, nas políticas públicas especialmente nas políticas sociais, em seus programas e serviços, respostas às suas necessidades mais imediatas e prementes (RAICHELIS, 2009, p.380).

Conforme Iamamoto (2011), nos diferentes espaços ocupacionais do (a)

assistente social é de suma importância impulsionar pesquisas e projetos que

favoreçam o modo de vida e de trabalho dos segmentos populacionais atendidos,

para que se possa conhecer a realidade em que estes indivíduos vivem e propiciar

respostas eficazes a demanda posta.

Assim, diante de diversos antagonismos e interesses distintos, nos

diferentes espaços de atuação, o assistente social deverá sempre buscar estratégias

que garantam a efetivação dos direitos sociais, como também a buscar incessante

pela valorização da liberdade e autonomia dos sujeitos sociais.

2.3 O perfil de profissional que se exige na atualidade

Por ser um profissional que está diretamente ligado às transformações

sociais seja no âmbito da economia, da política ou da cultura, o (a) assistente social

inserido no mundo do trabalho deverá estar sintonizado as novas exigências que

surgem com as modificações da sociedade contemporânea.

Para Iamamoto (2010) a inserção deste profissional nos mais variados

espaços profissionais vem seguido de novas requisições de qualificação.

Tais inserções são acompanhadas de novas exigências de qualificação, tais como: o domínio de conhecimentos para realizar diagnósticos socioeconômicos de municípios, para a leitura e analise dos orçamentos públicos, identificando seus alvos e compromissos, assim como os recursos disponíveis para projetar ações; o domínio do processo de planejamento; a competência no gerenciamento e avaliação de programas e projetos sociais; a capacidade de negociação, o conhecimento e o know-how na área de recursos humanos e relações no trabalho, entre outros (IAMAMOTO, 2010, p.207).

Deste modo para que sua atuação seja desenvolvida de forma ética e

qualificada, o (a) assistente social dispõe de Parâmetros, Diretrizes, Leis e Projeto

profissional que lhe dão suporte e valores éticos que orientam sua intervenção

32

profissional, sem deixar que os ditames do neoliberalismo prevaleçam na sua

atuação profissional, que requer um compromisso com a classe trabalhadora e tem

a liberdade como valor ético central da sua profissão. Assim, de acordo com Couto

(2009):

Esse profissional, atento às demandas contemporâneas, compreende o arsenal técnico-operativo como expressão de sua opção teórica, materializando o seu uso com o propósito de garantir a execução de seu trabalho na direção da construção de relações democráticas e emancipadoras, pressupostos básicos do projeto ético-político do Serviço Social (COUTO, 2009, p. 656).

Para que o (a) assistente social possa executar seu trabalho profissional

deverá propor projetos /ou programas que atendam as demandas institucionais e as

necessidades dos usuários, buscando sempre apreender o movimento da realidade.

Deste modo o (a) assistente deve estar sempre atento às modificações

sociais, procurando decifrar suas manifestações, através das dimensões objetivas e

subjetivas que são determinantes das estruturas econômicas políticas da sociedade.

Assim, afirma Yazbek (2009):

Ou seja, compreender que a prática profissional do Serviço Social é necessariamente polarizada pelos interesses de classes sociais em relação, não podendo ser pensada fora dessa trama. Permite também apreender as dimensões objetivas e subjetivas do trabalho do assistente social. Objetivas: no sentido de considerar os determinantes sócio-históricos do exercício profissional em diferentes conjunturas. Subjetivas: no sentido de identificar a forma como o assistente social incorpora em sua consciência o significado de seu trabalho e a direção social que imprime ao seu fazer profissional (YAZBEK, 2009, p. 128).

Esta afirmação nos leva a refletir sobre a capacidade investigativa do (a)

assistente social, que segundo Guerra (2009:712) a investigação é inerente à

natureza de grande parte das competências profissionais, assim vale ressaltar que a

atuação profissional está diretamente ligada a percepção dos profissionais que

devem se aprimorar dos instrumentos e técnicas de forma a propor e executar

projetos que respondam a realidade.

Para Martinelli (2006) é de extrema importância que o (a) assistente social

saiba fazer a leitura da realidade, para que seja garantida a direção do fazer

profissional.

Daí a importância dos profissionais saberem fazer leituras criticas, ético-políticas, de conjuntura, para poderem construir formas cada vez mais substantivas de consolidação do projeto profissional. Na verdade, como já afirmamos, o assistente social é um profissional que trabalha

33

permanentemente na relação entre estrutura, conjuntura e cotidiano; é no cotidiano que as determinações conjunturais se expressam e aí é que se coloca o desafio de garantir o sentido e a direcionalidade da ação profissional (MARTINELLI, 2006, p.18).

Concordando com a importância da capacidade investigativa do (a)

assistente social, Fraga (2010) nos aponta o que seria esta atitude e como ela tem

colaborado para a atuação profissional.

O que seria, então, a propalada atitude investigativa? Remete a uma postura aberta do sujeito para investigar, a permanente curiosidade, expectativa para aprender e entender o inesperado, o acaso, o que extrapola suas referencias e o leva a ir além. A atitude investigativa consiste numa postura inquieta e curiosa, por isso é fundamental na bagagem cotidiana do profissional. A ausência dessa postura pode levar à cristalização das informações, à estagnação do aprendizado profissional, o que, consequentemente, comprometerá o compromisso do assistente social com a qualidade dos serviços prestados à população usuária (FRAGA, 2010, p. 52).

Desta forma são inúmeros os desafios e exigências que se apresentam

neste contexto, dentre os já citados: desemprego, precarização do trabalho,

terceirização, podemos também apontar para a dificuldade na consolidação do

projeto ético-político, a fragmentação da classe, o excesso de profissionais, que

Iamamoto (2010:440) define como o crescimento exponencial do contingente

profissional, a curto prazo, traz sérias implicações para o exercício profissional e

para as relações de trabalho e condições salariais por meio das quais ele se realiza.

Diante de tal contexto, cabe ao assistente social ampliar seus

conhecimentos através de pesquisas, estudos, palestras, seminários, procurando

utilizar de seu arsenal teórico-metodológico, refletindo sobre os fatos, utilizando suas

atribuições privativas definidas no Código de ética, como também as aptidões

adquiridas na formação e na atuação profissional, visando formular uma capacidade

de articulação com os desafios impostos pela sociedade capitalista sem esquecer-se

do compromisso com as classes subalternas e com a busca constante pela garantia

dos direitos sociais.

34

III – O TRABALHO PROFISSIONAL NA ÁREA SÓCIO-JURÍDICA

Este capítulo buscará mostrar o exercício profissional dentro da realidade

do Sistema Penitenciário. Através da pesquisa de campo exploratória foi possível

perceber alguns fatores que especificam a atuação do (a) Assistente Social neste

espaço ocupacional na busca da garantia dos direitos humanos.

3.1 O exercício profissional do (a) Assistente Social na área sócio-

jurídica

No começo da década de 1930, com a expansão das escolas de Serviço

Social no mundo, a profissão surge vinculada ao pensamento de uma profissão que

vem auxiliar a medicina e o direito. Pois como nos lembra Manrique (1982), no Chile,

a primeira escola surge impulsionada a partir da beneficência pública, por um

médico, a partir do Estado e para auxiliar o exercício da medicina, no Brasil surge no

meio do movimento católico, e a expansão da profissão conecta-se à medicina e ao

Direito.

Os primeiros registros da atuação do Assistente Social na área sócio-

jurídica ocorrem na década de 1940, no Juizado de Menores. Passando a ocupar o

que se denomina de perito da área social, num período que ampliava o agravamento

da questão social e a tentativa de controle, tendo um espaço de ação vinculado ao

aconselhamento, orientação e encaminhamento junto aos adolescentes na Justiça

da Infância e Juventude.

Constata-se tal fato mesmo considerando que a Justiça da Infância e Juventude, por exemplo, tenha sido uma das primeiras áreas de trabalho do assistente social, e que profissionais que atuam em outros espaços institucionais, que integram o denominado sistema sócio-jurídico, relacionam-se no dia a dia com esse campo, como os que trabalham junto a abrigos, internatos, conselhos de direitos, Ministério Público, sistema penitenciário (sobretudo quando envolve mães ou pais presos) (FÁVERO, 2010, p. 12).

A inserção do Assistente Social na área sócio-jurídica8 é demandada pelo

Poder Judiciário, no qual estes profissionais deveram contribuir para a garantia de

direitos.

8 Compreende-se como sócio-jurídico o conjunto de áreas em que a ação do Serviço Social articula-

se a ações de natureza jurídica, como o Sistema Judiciário, o Sistema Penitenciário, o Sistema de

35

O trabalho do assistente social nestes serviços se caracteriza por uma prática de operacionalização de direitos, de compreensão dos problemas sociais enfrentados pelos sujeitos no seu cotidiano e suas inter-relações com o sistema de justiça. Além disso, esse espaço profissional permite a reflexão e a análise da realidade social dessa população, da efetividade das leis e de direitos na sociedade, possibilitando o desenvolvimento de ações que ampliem o alcance dos direitos humanos e a eficácia da ordem jurídica em nossa sociedade (CHUAIRI, 2001, p. 139).

Assim, tomaremos como campo específico da área sócio-jurídica, o

Sistema Penitenciário, que segundo Torres (2001), se faz necessário à atuação do

assistente social para o enfrentamento da problemática da violação dos direitos

humanos da população carcerária.

Ao Serviço Social como profissão cabe a tarefa de confrontar-se com a realidade das prisões brasileira, de modo crítico e ético, por meio de uma prática competente teórica e politicamente, viabilizando respostas que superem, também pela atuação profissional, este sistema punitivo violador incessante dos direitos humanos (TORRES, 2001, p.77).

Guindani (2001) ostenta o posicionamento semelhante ao colocar que:

O assistente social, por meio de suas múltiplas intervenções, pode conquistar um espaço fundamental, ao desenvolver o fortalecimento das relações entre sujeitos estigmatizados e despertar a comunidade para a necessidade de mudar o rumo das proporções assumidas pela violência/criminalidade. Com isso, promove o processo de inclusão social dos apenados, bem como a desmitificação da identidade socialmente construída (GUINDANI, 2001, p. 43).

O Sistema Penitenciário brasileiro está regulamentado pela Lei de

Execução Penal9 (LEP nº 7.210/84), que diz em seu Artigo 1º: “A execução penal

tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e

proporcionar condição para a harmônica integração social do condenado e do

internado”. Com relação à responsabilidade do Estado em manter a assistência ao

preso encontramos de forma clara no Artigo 10º: “A assistência ao preso e ao

internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à

convivência em sociedade”. Essa assistência é compreendida como assistência

material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa, nos quais ficam bem

explicitados nos artigos 12º ao 24º respectivamente.

Segurança, os sistemas de proteção e acolhimento como abrigos, internatos, conselhos de direito, dentre outros. (Ver Fávero, 2010). 9 LEP – Lei de Execução Penal nº 7.210/84, Publicada no Diário Oficial da União, Seção I, de 13 de

julho de 1984, p. 10227.

36

Atualmente no Ceará o Sistema Penitenciário está sobre a administração

da Secretaria de Justiça e Cidadania – SEJUS10, criada em 16 de junho de 1891,

tem como missão institucional promover o pleno exercício da cidadania e a defesa

dos direitos humanos inalienáveis da pessoa humana. Para o cumprimento de seu

dever, compete à Sejus executar a manutenção, supervisão, coordenação, controle,

segurança e administração do Sistema Penitenciário do Ceará. Além de garantir o

cumprimento das penas e zelar pelo livre exercício dos poderes constituídos.

O Sistema Penitenciário do Ceará é composto por: 05 Casas de Privação

Provisórias de Liberdade (04 no município de Itaitinga e 01 no município de

Caucaia); 01 Penitenciária Feminina (IPF - Instituto Penal Feminino

Desembargadora Auri Moura Costa); 02 Presídios Masculinos (IPPOO I - Instituto

Presídio Professor Olavo Oliveira I - desativado no início de 2013; IPPOO II -

Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II); 02 Penitenciárias Masculinas (IPPS -

Instituto Penal Paulo Sarasate; Penitenciária Francisco Hélio Viana de Araújo -

Pacatuba – PFHVA); 01 Hospital (HGSPPOL - Hospital Geral e Sanatório Penal

Professor Otávio Lobo); 01 Instituto Psiquiátrico (IPGSG - Instituto Psiquiátrico

Governador Stênio Gomes); 02 Penitenciárias Industriais (PIRS - Penitenciária

Industrial Regional de Sobral; PIRC - Penitenciária Industrial Regional do Cariri); 01

Colônia Agrícola (Colônia Agrícola do Cariri); 01 Casa do Albergado e 134 Cadeias

públicas.

Segundo dados do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias –

InfoPen do Ministério da Justiça, o total de presos no Sistema Penitenciário

Brasileiro em dezembro de 2012 era de 548,003 deste total 512,964 eram homens

e 35,039 mulheres. No Ceará, neste mesmo período, a população carcerária era de

18,619 e destes 17,846 eram presos homens e 773 mulheres. Dentre os crimes

cometidos 5.208 estão enquadrados por homicídios simples e/ou qualificados; 9.576

são qualificados entre furto, roubo, latrocínio, extorsão, estelionato, receptação;

1.007 entre estupro, atentado violento ao pudor, corrupção de menor, tráfico interno

e internacional de pessoas; 890 por tráfico de entorpecentes; 4.214 por porte ilegal

de arma e os demais se enquadram como crimes contra a paz pública, a fé pública,

a administração pública e a legislação especifica.

10

Fonte: http://www.sejus.ce.gov.br/index.php/secretaria/38/65

37

De acordo com o Ministério da Justiça o tratamento penitenciário deverá

garantir os direitos humanos:

Por ter a pessoa como objeto principal de proteção, a concepção de política penitenciária que se tenta avançar se insere na inclusão do tratamento penitenciário como política de garantia dos direitos humanos, fator de redução de danos e minimização de vulnerabilidades que o sistema punitivo produz (BRASIL, Ministério da Justiça, 2007).

Diante deste contexto o (a) Assistente Social inserido neste espaço sócio-

ocupacional deverá intervir na realidade social dos sujeitos apenados11 na busca de

garantir a efetivação dos direitos humanos.

Entre as várias requisições sobre o trabalho do (a) Assistente Social no

Jurídico, Chuairi (2001) nos aponta as seguintes atribuições:

Assessorar e prestar consultoria aos órgãos públicos judiciais, a serviços de assistência jurídica e demais profissionais deste campo, em questões específicas de sua profissão; Realizar perícias e estudos sociais, bem como informações e pareceres da área de sua competência, em consonância com os princípios éticos de sua profissão; Planejar e executar programas destinados à prevenção e integração social de pessoas e/ou grupos envolvidos em questões judiciais; Planejar, executar e avaliar pesquisas que possam contribuir para a análise social, dando subsídios para ações e programas no âmbito jurídico; Participar de programas de prevenção e informação de direitos à população usuária dos serviços jurídicos; Treinamento, supervisão e formação de profissionais e estagiários nesta área (CHUAIRI, 2001, p. 138).

Assim, a atuação do profissional de Serviço Social deverá estar de acordo

com as determinações legais a partir da Lei de Execução Penal, o Código de Ética

Profissional (1993), e a Lei nº 8.662/93.

Na lei de regulamentação da profissão (8.662/93) identificam-se os

seguintes itens que remetem as ações profissionais que são executadas nas

instituições penais:

Art. 4º - Constituem competência do Assistente Social: III- encaminhar providências, e prestar orientação social a indivíduos, grupos e à população; V - orientar indivíduos e grupos de diferentes segmentos sociais no sentido de identificar recursos e de fazer uso dos mesmos no atendimento e na defesa de seus direitos; XI - realizar estudos sócio-econômicos com os usuários para fins de benefícios e serviços sociais junto a órgãos da administração pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades. Art. 5º - Constituem atribuições privativas do Assistente Social: IV

11

Apenados são os sujeitos sentenciados a algum tipo de pena privativa de liberdade ou restritiva de

direitos que vivenciaram um processo de criminalização. (Ver Guindani, 2001).

38

- realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres sobre a matéria de Serviço Social; VI - treinamento, avaliação e supervisão direta de estagiários de Serviço Social.

Assim, na Lei de Execução Penal embora não estejam explicitamente as

competências do Serviço Social, as suas funções aparecem relacionadas no quesito

de direito à assistência social que encontra-se exposta nos artigos 22 e 23 que

definem suas finalidades:

Art. 22. A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade. Art. 23. Incumbe ao serviço de assistência social: I - conhecer os resultados dos diagnósticos ou exames; II - relatar, por escrito, ao Diretor do estabelecimento, os problemas e as dificuldades enfrentadas pelo assistido; III - acompanhar o resultado das permissões de saídas e das saídas temporárias; IV - promover, no estabelecimento, pelos meios disponíveis, a recreação; V - promover a orientação do assistido, na fase final do cumprimento da pena, e do liberando, de modo a facilitar o seu retorno à liberdade; VI - providenciar a obtenção de documentos, dos benefícios da Previdência Social e do seguro por acidente no trabalho; VII - orientar e amparar, quando necessário, a família do preso, do internado e da vítima.

Ainda no Art. 6º da referida lei, o (a) Assistente Social em parceria com a

Psicologia, que formam a CTC12 – Comissão Técnica de Classificação, deverão

acompanhar e realizar atendimento individualizado aos presos na busca de elaborar

pareceres e propor aos Juízes competentes a progressão de regime dos apenados.

Assim, a categoria perde sua identidade, que Guindani (2001) vem apontar que as

ações do (a) Assistente Social ocorrem por intermédio da CTC, ficando muitas vezes

relegado a um papel de “executor de laudos”.

É diante deste contexto institucional que está inserido o (a) Assistente

Social, que tendo como função determinada o amparo ao preso, a triagem,

assistência ao preso e seus familiares, vem também obedecer as exigências do

Poder Judiciário que tem em sua prioridade a elaboração de relatórios social,

pareceres e laudos para a finalidade da progressão de regime dos presos, o que

leva ao profissional do Serviço Social a ser um mero executor de relatórios sociais,

muitas vezes deixando as outras determinações e demandas como uma atividade

secundária. Dentro desta perspectiva Faleiros (1997), nos define a concepção da

12

CTC – Comissão Técnica de Classificação, composta por psiquiatra, psicólogo e assistente social.

(Ver Lei de Execução Penal)

39

intervenção profissional como confrontação de interesses, recursos de energias e

conhecimentos, inscritos no processo de hegemonia e contra-hegemonia, de

dominação/resistência, de conflito/consenso.

Observando tais finalidades, percebe-se a necessidade do (a) Assistente

Social de ter uma visão crítica destes instrumentos, pois, como nos lembra Silva

(2012), a área sócio-jurídica é um espaço de correlação de forças, onde o Estado,

através de determinadas instituições, efetiva a coerção, o controle social e o

disciplinamento dos sujeitos.

Os Estados mantêm, por sua vez, estruturas administrativas rudimentares para os seus “sistemas” carcerários. Além da precariedade das condições físicas de boa parte das prisões, essas, em geral, são dirigidas por pessoal qualificado mais para tarefas de segurança do que para a preparação da reinserção do condenado na sociedade (SALLA, 2001, p.35).

E conforme Guindani (2001), o início da atuação profissional do Serviço

Social no Sistema Penitenciário tinha um caráter assistencialista e burocrático,

afirmando o poder que o Estado exerce sobre os sujeitos apenados. Percebemos

que ainda existe uma hierarquia institucional e que as ações impostas por

determinação do Estado ainda apontam para uma política que garante os mínimos

sociais e que ainda detém um viés no assistencialismo, o que vai em desencontro

com a atuação profissional do Assistente Social, que busca a efetivação de direitos.

Inicialmente com forte cunho assistencial e assumindo atividades de outras categorias, adotou posição preponderante frente a toda problemática da ressocialização do sujeito apenado. Incorporava-se dessa maneira, o caráter repressor e adaptador da instituição total, não sendo, nesse momento histórico, questionada a contrariedade existente no trinômio segurança, disciplina e recuperação (GUINDANI, 2001, p. 40).

Guindani (2001) ainda afirma que,

O Serviço Social, juntamente com as equipes de CTC, construiu, no decorrer de sua história (após implantação da LEP – 1985) uma identidade instituída, vinculada aos mecanismos de controle social, com caráter tarefeiro, subalterno, sem base teórica e intencionalidade ético-político (GUINDANI, 2001, p. 42, grifos da autora).

Diante deste contexto é de grande importância que o (a) Assistente Social

atuando neste espaço ocupacional esteja atento às novas demandas e

competências profissionais que lhe são impostas, na perspectiva de fortalecer sua

autonomia, ampliar seus conhecimentos, para poder confrontar com os

antagonismos deste sistema.

40

3.2 Perfil e trajetória profissional dos Assistentes Sociais no presídio

Iniciaremos traçando o perfil13 de 02 Assistentes Sociais que atuam no

Sistema Penitenciário do Ceará, como citado anteriormente foram escolhidos como

instituições o IPPOO II - Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II e a CPPL 3 -

Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor Jucá Neto.

A primeira assistente social entrevistada foi a Orquídea que graduou-se

pela UECE, possui 20 anos de formação, já tendo atuado em diversas áreas como:

saúde, habitação e assistência social. Iniciou sua trajetória profissional assim que de

formou indo trabalhar no Hospital Psiquiátrico Mira y Lopez, depois foi trabalhar na

área da habitação no município de Granja/Ce, participou de uma seleção pra atuar

no Projeto Prosanear no Conjunto Palmeiras e quando este terminou foi para a

Secretaria de Ação Social na prefeitura de Maracanaú no qual passou oito anos,

período no qual o prefeito da época esteve a frente da prefeitura, saindo quando

terminou este período foi para a CAGECE, onde coordenou o Projeto Alvorada a

frente dos municípios de Barreira, Paramoti e Ocara, seguindo então para executar o

Projeto KFW (água e esgoto) também da CAGECE só que agora no município de

Quixadá. Ao finalizar este projeto, foi selecionada para trabalhar na Prefeitura de

Itapiúna na Educação Especial com a Equipe Multi. Seguindo depois para cidade

vizinha Capistrano pra assessorar a Secretaria de Ação Social no qual passou dois

anos. Trabalha no Sistema Penitenciário há 06 anos e 04 meses, sua inserção nesta

área ocorreu por convite de uma amiga que já atuava no sistema e lhe apresentou a

direção do presídio que a convidou para compor a equipe técnica. Atualmente

exerce sua profissão no presídio e em uma unidade do CAPS.

A segunda assistente social entrevistada foi Tulipa, que também

graduou-se pela Universidade Estadual do Ceará. Possui 24 anos de formação,

porém só veio a exercer sua profissão após 15 anos de formada, por motivos

pessoais, atuando na assistência social por 1 ano e 3 meses no Raízes da

Cidadania no Conjunto Palmeiras, executando projetos sociais: PETI, Bolsa-família,

etc. Em seguida foi trabalhar no CRAS no distrito de Pecém no município de São

Gonçalo do Amarante, por um período de um ano e três meses. Logo em seguida

trabalhou com crianças e adolescentes no Centro Educacional Martin Francisca com

13

Ressalto que os nomes das informantes foram trocados afim de preservar suas identidades.

41

Liberdade Assistida. Atua no Sistema Penitenciário há 05 anos e despertou

interesse pela área por intermédio da Pastoral Carcerária, onde realizava trabalho

voluntário desde 2004.

Podemos perceber que as Assistentes Sociais se formaram em uma

universidade pública, o que nos leva a refletir sobre o processo de aligeiramento

profissional no qual o Serviço Social vem passando na atualidade, ao se deparar

com o crescimento das universidades particulares que se detém a questão do

ensino, deixando de lado a preocupação com a extensão e a pesquisa, como

também o surgimento dos cursos com modalidade à distância14, este que fere o

compromisso com o Código de Ética ao fornecer uma educação vai de encontro com

as diretrizes curriculares e que não dão subsídios para o estágio supervisionado e

obrigatório, pois, utilizam de tutores, muitas vezes sem formação em Serviço Social

na efetivação de supervisão. Pode-se perceber também a área de maior

predominância de atuação é a assistência social, que a prefeitura é quase sempre a

principal empregadora destas profissionais e que sua inserção na área sócio-jurídica

ocorreu por convite de pessoas que já atuavam na referida área o que veio a lhes

despertar interesse em atuar no Sistema Penitenciário.

Diante das informações obtidas pelas entrevistadas foi realizada uma

análise dos dados e dividido em eixos para melhor observar o trabalho do (a)

assistente social na realidade do Sistema Penitenciário.

3.3 O trabalho do Assistente Social no presídio

Utilizaremos três eixos de análises:

1- Condições de trabalho; demandas e exigências;

2- Qualificação e instrumentação técnica para perceber as demandas

institucionais e;

3- As competências profissionais necessárias à atuação profissional.

Observa-se o crescimento da população carcerária no Brasil e sabe-se

que as condições no qual estes sujeitos vivem são de extrema precariedade, porém,

14

Para ampliação da discussão ver Art. 80 da Lei de Diretrizes e Bases - Lei 9394/96 e Decreto n.º 2.494, de 10 de fevereiro de 1998 que regulamenta o Art. 80 da LDB.

42

vale ressaltar que o assistente social também passa por um processo precário para

realização dos atendimentos a estes usuários e que as condições de trabalho nem

sempre lhes são favoráveis.

O atendimento aos internos é realizado no parlatório e este procedimento é realizado em pé, utilizando uma prancheta para o preenchimento dos dados e das demandas que chegam ao Serviço Social, tem um ruído bem forte o que dificulta a escuta e também o sigilo profissional (Tulipa). Sobre as condições de trabalho, podemos afirmar no momento que melhorou bastante, temos uma sala ampla, com ar-condicionado, o telefone agora é na sala ao lado, o que facilita as ligações para os familiares (Orquídea).

Diante das falas das entrevistadas podemos perceber que as condições

de trabalho são diferentes de acordo com a instituição na qual se esta inserida, pois

na visita feita para a pesquisa de campo foi percebido que em um determinado

presídio a sala do Serviço Social é pequena, tendo que ser compartilhada com mais

de um profissional, no atendimento as famílias é resguardado o sigilo, porém no

atendimento ao interno nem sempre é possível esta garantia por ser feito no

parlatório, no qual todos os profissionais (psicólogos, advogados, defensor público e

assistente social) dividem o mesmo espaço sendo separado somente por uma

parede, porém por conta do barulho que os internos fazem neste espaço é

necessário que algumas perguntas e demandas sejam escritas em um papel para

que não ocorra nenhuma má interpretação das falas, como também é aflitivo por

neste mesmo espaço os internos rivais podem se confrontar.

No outro presídio a assistente social cita que as condições de trabalho

melhoraram, mas, com base no período de estágio realizado pela pesquisadora,

pode-se relatar que a sala era em frente ao parlatório, local utilizado para receber

profissionais (advogados, psicólogos, assistentes sociais, promotor) para conversar

com os apenados, separado por uma grade, era pequena, quente, não havia ar-

condicionado, o telefone ficava no setor administrativo, e que todas as vezes que

necessitava realizar uma ligação o profissional deveria sair do seu setor e subir até o

departamento que ficava o telefone. O atendimento as famílias não podia ser

realizado na sala do Serviço Social por está estar na parte inferior do presídio, e que

para ter acesso a ela deveria ter que passar pelo detector de metais, e somente os

funcionários ou alguém autorizado tem acesso. Então o assistente social deveria se

deslocar de sua sala e realizar o atendimento muitas vezes no saguão de entrada do

43

presídio, mais uma vez tendo que driblar as dificuldades para garantir a efetivação

das atribuições e competências profissionais expressas no Código de Ética.

Vale salientar que na Resolução 493/2006 do CFESS dispõe sobre as

condições éticas e técnicas do exercício profissional do assistente social e nos

Artigos 2º e 3º enfatiza sobre o local adequado e as condições necessárias para o

bom atendimento.

Art. 2º - O local de atendimento destinado ao assistente social deve ser dotado de espaço suficiente, para abordagens individuais ou coletivas, conforme as características dos serviços prestados, e deve possuir e garantir as seguintes características físicas: a) iluminação adequada ao trabalho diurno e noturno, conforme a organização institucional; b) recursos que garantam a privacidade do usuário naquilo que for revelado durante o processo de intervenção profissional; c) ventilação adequada a atendimentos breves ou demorados e com portas fechadas; d) espaço adequado para colocação de arquivos para a adequada guarda de material técnico de caráter reservado. Art. 3º - O atendimento efetuado pelo assistente social deve ser feito com portas fechadas, de forma a garantir o sigilo.

Dentre as principais demandas que chegam ao Serviço Social, estão as

ligações pra família, os encaminhamentos para outros setores, cadastro de visitas e

a elaboração do relatório social.

As maiores demandas estão relacionadas às ligações para a família, encaminhamento para outros profissionais, principalmente advogados e defensor público, relatório e parecer social, atendimento individual e familiar, como também a aquisição de documentos dos internos e certidão de nascimento dos filhos dos mesmos (Orquídea). Dentre as demandas principais temos o cadastro de familiares para a visita, a triagem realizada no ingresso do interno na unidade, o encaminhamento para psicólogos, advogados, as ligações para os familiares e a elaboração do relatório social para a progressão de regime (Tulipa).

Sabendo o quanto é importante à participação da família no processo de

ressocialização dos presos, e diante desta perspectiva o (a) Assistente Social

procurar fortalecer os vínculos familiares, muitas vezes é na ligação para a família o

primeiro contato na tentativa de despertar nos familiares a responsabilidade que eles

têm em relação ao fortalecimento emocional destes presos que estão em um

ambiente hostil, expostos a todo tipo de violação de direitos e, portanto altamente

vulneráveis.

As repostas dadas como retorno as demandas são por diversas vezes

realizadas através de encaminhamentos para atendimento de outros profissionais,

44

dentre os quais o defensor público e os advogados são os mais requisitados. A

elaboração dos relatórios sociais é tida como algo constante na rotina do (a)

Assistente Social, embora sabendo que nem sempre se pode dar um parecer

preciso com somente um encontro com o preso, pois o relatório social requer um

estudo social, uma análise, uma observação, uma interpretação do sujeito e de sua

origem, ocorre que por pressão institucional esse relatórios são feitos como algo de

extrema urgência, precisão e imediaticidade para a instituição, o que aponta para

uma relação de subalternidade e subordinação deste profissional em relação as

ordem hierárquicas do Sistema Penitenciário, levando o profissional a correr o risco

de por meio da roteirização e burocratização se torna um mero perito executor de

laudos e pareceres sociais.

No âmbito dos marcos legais e normativos, as Resoluções nº 557/2009 e

559/2009 do Conselho Federal de Serviço Social - CFESS dispõe sobre a emissão

de pareceres, laudos, opiniões técnicas conjuntos entre o (a) assistente social e

outros profissionais. Na resolução 557 no artigo 2º fica claro que o assistente social

não é obrigado a exercer funções incompatíveis com as suas atribuições e

competências profissionais.

Art 2°. O assistente social, ao emitir laudos, pareceres, perícias e qualquer manifestação técnica sobre matéria de Serviço Social, deve atuar com ampla autonomia respeitadas as normas legais, técnicas e éticas de sua profissão, não sendo obrigado a prestar serviços incompatíveis com suas competências e atribuições previstas pela Lei 8662/93.

Pode-se perceber que dentre as demandas que se apresentam ao

Assistente Social muitas estão relacionadas aos objetivos prescritos na Lei Orgânica

da Assistência Social - LOAS (1993), que prevê a garantia do atendimento das

necessidades básicas, provendo os mínimos sociais.

De acordo com o Artº 2º da LOAS a assistência social tem como

principais objetivos:

I - a proteção social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da incidência de riscos, especialmente: a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes; c) a promoção da integração ao mercado de trabalho; d) a habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; e) a garantia de 1 (um) salário-mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família; II - a vigilância socioassistencial, que visa a analisar territorialmente a capacidade protetiva das famílias e nela a

45

ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, de vitimizações e danos; III - a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos direitos no conjunto das provisões socioassistenciais.

Diante deste contexto tem se o cuidado em não confundir as ações, onde

o trabalho do assistente social possa ser visto como mero executor de atitudes

assistencialistas.

As ações desenvolvidas pelos Assistentes Sociais no Sistema

Penitenciário estão fundamentadas na Lei de Execução Penal, porém para a

realização de um trabalho eficaz, surge a necessidade de maior abrangência das

legislações que efetivem os direitos humanos. É importante ressaltar que por ser um

profissional que atua diretamente com as diversas questões sociais e que trabalha

com indivíduos em estado de extrema vulnerabilidade, o assistente social deverá

estar atento as reflexões teórica e critica, como também a competência nos âmbitos

da política e da ética.

Acredito que uma das principais competências que o assistente social deve ter é o compromisso com a ética profissional, a busca pela garantia dos direitos dos indivíduos presos e de seus familiares, como também a valorização do trabalho multidisciplinar (Tulipa). Admito que dentre as competências tem que ter é coragem, segurança na sua prática e principalmente não ter preconceito. Pois tem que se trabalhar as amarras, para que não comprometa o trabalho na sua atuação dentro do presídio, outra competência importante é estar sempre se reciclando para inovar a sua prática (Orquídea).

Percebe-se nas falas das entrevistadas que a competência profissional

estar relacionada ao compromisso com os princípios do Código de Ética e que

busca a efetivação do Projeto Ético-Político, procurando romper com o preconceito,

valorizando a autonomia dos sujeitos e a garantia da justiça social.

Dentre as competências é importante observar que o profissional de

Serviço Social deverá em constante aprendizado, ampliando seus conhecimentos

através de estudos, pesquisas, palestras e seminários, que tragam novas propostas

para atuação deste profissional, em consonância com a atual conjuntura.

Nessa perspectiva Fávero (2012) se refere a este conhecimento como:

Precisamos investir em algumas frentes: fazer do campo sócio-jurídico um campo de investigação permanente, de maneira que a produção nas áreas que o compõe se configure como possibilidade de resistência à criminalização da pobreza, à judicialização dos conflitos familiares e das expressões da questão social, e de avanço efetivo em direção a um conhecimento relevante. Precisamos assumir a pesquisa como instrumento

46

de trabalho e avançar na produção sistemática de conhecimento nesse campo (FÁVERO, 2012, p. 138).

Fávero (2009) ainda aponta que:

Capacitação continuada, articulação política, domínio do conhecimento acerca da realidade e das prerrogativas institucionais, conhecimento, contato e articulação com a rede de atendimento composta por organizações públicas e privadas – tudo isso se faz necessário, de forma organizada, planejada e coletiva. Essa visão panorâmica da realidade fornece elementos para a elaboração de projetos de trabalho para além daquele atendimento “caso a caso” que, via de regra, predomina nos espaços do Judiciário (FÁVERO, 2009, p.171).

Cabe também ao Assistente Social conciliar as demandas dos usuários

junto às demandas institucionais, considerando que tais instituições têm como

objetivo o controle social, através de condutas coercitivas e manipuladoras.

Conforme Fávero, talvez seja este um dos maiores desafios encontrados na atuação

do assistente social dentro do Sistema Penitenciário.

Como agir visando a garantia de direitos perante a ineficiência das políticas públicas, dos recursos de apoio que poderiam possibilitar a efetivação de um trabalho qualificado? Possivelmente, um dos maiores desafios no exercício profissional para ir além da fundamental análise da realidade social na qual se insere o sujeito com o qual trabalhamos é a criação de alternativas de intervenções exequíveis. As respostas necessitam ser buscadas e construídas a partir dos espaços político, profissional e institucional de trabalho (FÁVERO, 2009, p. 171).

Diante de tal afirmação, a assistente social Orquídea menciona alguns

fatores que poderiam mudar no Sistema Penitenciário para que seja possível dar

condições para a efetivação do trabalho do assistente social no processo de

reinserção social do apenado.

Necessita de um olhar mais humanizado para que o trabalho de ressocialização realmente aconteça. Pois, ao meu ver não adianta somente construir presídios se não der oportunidades a quem estar se “soltando”. Portanto, necessita de políticas públicas para receber o interno que cumpriu sua pena e precisa sobreviver e constituir sua família com dignidade para que não venha a reincidir (Orquídea).

Sobre a principal importância da atuação do (a) Assistente Social dentro

dos presídios, percebemos que a busca pelo fortalecimento dos vínculos familiares

visando à reinserção social e a garantia dos direitos sociais são o que mais se

destaca nas falas das entrevistadas.

Existem várias e uma delas muito importante é fortalecer os vínculos familiares dos internos para que ao saírem de Alvará de soltura, os mesmos

47

não se sentirem sozinhos no mundo e poderem reconstituírem suas vidas fortalecidos juntamente com os familiares, não esquecendo seus valores (Orquídea). A luta pela garantia dos direitos aos presos, previsto na LEP, a conscientização de familiares sobre a importância da família no processo de ressocialização e a atuação como instrumento de reconstrução da autonomia do individuo na reinserção social (Tulipa).

Reforçamos a fala das entrevistadas no pensamento de Chuairi (2001):

O trabalho do assistente social nestes serviços se caracteriza por uma prática de operacionalização de direitos, de compreensão dos problemas sociais enfrentados pelos sujeitos no seu cotidiano e suas inter-relações com o sistema de justiça. Além disso, esse espaço profissional permite a reflexão e a análise da realidade social dessa população, da efetividade das leis e de direitos na sociedade, possibilitando o desenvolvimento de ações que ampliem o alcance dos direitos humanos e a eficácia da ordem jurídica em nossa sociedade (CHUAIRI, 2001, p. 139).

Existem ainda as condições de trabalho as quais estão submetidas às

assistentes sociais que atuam no Sistema Penitenciário, grande parcela estão

submetidas à terceirização.

A maioria é terceirizada, o trabalho é realizado em um ambiente de constante tensão e nem sempre é possível tirar férias, pois quando chega o período próximo, a empresa responsável sai e passamos por um novo processo de contratação, assim sendo impossível tirar as tão sonhadas férias (Tulipa).

Sabemos que esse processo de terceirização fragmenta as relações entre

os trabalhadores, pois são submetidos a diversas formas de contratação e salários

muitas vezes abaixo da média salarial. Com relação a esse processo Raichelis

(2011) vêm nos elencar alguns efeitos que a terceirização traz:

Os efeitos da terceirização para o trabalho social são profundos, pois ela: a) Desconfigura o significado e a amplitude do trabalho técnico realizado pelos assistentes sociais e demais trabalhadores sociais; b) Desloca as relações entre a população, suas formas de representação e a gestão governamental, pela intermediação de empresas e organizações contratadas; c) Subordina as ações desenvolvidas a prazos contratuais e aos recursos financeiros definidos, implicando descontinuidades, rompimento de vínculos com usuários, descrédito da população para com as ações públicas; d) Realiza uma cisão entre prestação de serviço e

direito, pois o que preside o trabalho não é a lógica pública, obscurecendo‑se a responsabilidade do Estado perante seus cidadãos, comprimindo ainda mais as possibilidades de inscrever as ações públicas no campo do direito (RAICHELIS, 2011, p. 432).

Contudo, as entrevistadas revelam a satisfação e realização em

exercerem sua profissão dentro deste universo tão cheio de dificuldades, de

48

precariedade e impermeabilidades, pois, sabem que precisam constantemente estar

sintonizados com as necessidades que surgem como demanda quer em nível

institucional ou profissional.

Estamos sempre na Unidade trabalhando para que consigamos que os libertos tenham um bom retorno familiar. Apesar de alguns percalços, fazemos o melhor possível. Sinto-me muito feliz de ser Assistente Social (Orquídea). Apesar do Assistente Social se apropriar de uma pseudoautonomia, devido a uma regulamentação interna do Sistema, sabemos que é de extrema importância o nosso trabalho dentro desta instituição, e busco sempre a efetivação dos direitos, e é muito gratificante ver o preso saindo daqui com um pouco de sua dignidade restaurada (Tulipa).

Diante da fala da entrevista Tulipa faz-se necessário ressaltar que o (a)

Assistente Social possui relativa autonomia com resguardo no Código de Ética

profissional, no Art. 2º que constituem direitos do profissional, no item h que nos diz:

possuir ampla autonomia no exercício da profissão, não sendo obrigado a prestar

serviços profissionais incompatíveis com suas atribuições, cargos ou funções. E para

confirmar tal perspectiva Barroco (2012) nos aponta que a autonomia é inerente da

natureza do trabalho do (a) Assistente Social.

A própria natureza do trabalho do assistente social, dado seu grau técnico teórico e ético, não pode estar sujeita à interferência técnica, o que não significa, evidentemente, negar as estruturas institucionais hierárquicas e de poder, que estão presentes e são constitutivas na relação do profissional. Afinal, mesmo quando a atuação se dá na condição de empregado, servidor, contratado e outros, sujeitando-se a regramentos administrativos, burocráticos, organizacionais, estruturais, jamais deve ocorrer a interferência na sua opinião técnica, na escolha dos métodos, técnicas e instrumentos que irá utilizar para consecução de sua atividade profissional (BARROCO, 2012, p. 153).

É imprescindível considerar, no entanto, que a confrontação entre as

competências e atribuições profissionais, e os desafios institucionais do Sistema

Penitenciário ainda é um tema com poucas pesquisas e estudos realizados, e que

abrange uma ampla discussão, podendo ser aperfeiçoado com pautas relacionadas

a mudanças macrossocietárias e a hegemonia do projeto profissional, discorrendo

novas possibilidades e lembrando que este é um processo que se constrói

coletivamente.

49

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando os entraves institucionais, como a hierarquia entre os

profissionais e os preconceitos com os indivíduos apenados, neste estudo foi

proposto há compreensão de como se configura o trabalho do Assistente Social no

âmbito do Sistema Penitenciário.

A inserção de um pesquisador num campo cheio de burocracias e

preconceito como um presídio, é algo desafiador. Neste sentido, gostaria de

compartilhar das dificuldades que surgiram na elaboração deste trabalho. Em

primeiro lugar existiu o cuidado em manter a imparcialidade perante um universo no

qual já estive inserida como estagiária, era necessário que houvesse este

distanciamento para que não ocorressem dúvidas nem objeções ao relatar e retratar

o que as entrevistadas me transmitiram.

Em segundo lugar, me perguntava como retratar esse assunto sem

comprometer as minhas percepções em relação ao Sistema Penitenciário e o

trabalho que o Assistente Social exerce dentro desta instituição, a qual considero tão

coerciva e impositiva.

Desta forma ao realizar a pesquisa de campo e ler estudos mais

aprofundados sobre a temática, pude refletir e relacionar o que achava de mais

relevante para ser apresentado neste trabalho.

Os resultados da pesquisa são pertinentes, não objetivando aqui dar

respostas concretas e acabadas. Portanto, não pressupõe que se chegue a

conclusões definitivas, pois este é um universo que abrange inúmeras reflexões.

O Código de Ética profissional, a Lei de regulamentação da profissão, as

Resoluções do Conselho Federal de Serviço Social – CFESS, a Lei de Execução

Penal vem dar subsídios para o trabalho do Assistente Social que atua no Sistema

Penitenciário.

Constatou-se que os Assistentes Sociais estão exercendo seu trabalho

em condições precárias e subalternas, em decorrência da burocratização,

hierarquização e morosidade do Sistema Judiciário, no qual exige que este

50

profissional atenda as demandas institucionais deixando em segundo plano as

demandas dos usuários, contrapondo com as legislações que direcionam o exercício

profissional.

Destaca-se que este profissional, busca garantir os direitos dos

apenados, contudo este tem seus direitos violados, demonstrando assim os

processos contraditórios a qual o Serviço Social está inserido.

Neste sentido a luta pela consolidação do Projeto Ético-Político e dos

direitos humanos dentro do presídio requer condições objetivas para o

desdobramento deste desafio e permanente batalha na busca pela consolidação de

uma nova ordem societária, que quebre com as barreiras do preconceito, que dê

autonomia aos indivíduos, e que, sobretudo garanta a ampliação e a consolidação

da cidadania.

Isto significa que é preciso pensar na formação profissional, na ação

política, na capacidade de reflexões críticas, na ampliação do conhecimento teórico-

metodológico, na ética, os estudos e pesquisas, como compromissos inerentes ao

trabalho do Assistente Social.

Não podemos deixar de registrar a satisfação das Assistentes Sociais

inseridas nesta área, que mesmo sabendo das inúmeras dificuldades e precariedade

na qual se encontra o Sistema Penitenciário, buscam com muita capacidade, ética e

compromisso com sua profissão e usuários a efetivação da garantia dos direitos

civis, sociais e humanos do qual necessitam os indivíduos que estão no processo de

cumprimento de pena, sem esquecer que estes mesmos iram retornar a sociedade e

que precisam estar em plena condição física, emocional e social restaurada, sendo

elas parte fundamental neste processo.

Sabendo então da necessidade que existe do trabalho do Assistente

Social no âmbito do Sistema Penitenciário, apontamos que essa é uma discussão

que merece atenção, e que poderá ser amplamente estudada e gerar novas

contribuições para a categoria profissional que atua nesta área.

51

REFERÊNCIAS

BAPTISTA, Myrian Veras; BATTINI, Odária (Org.). A prática profissional do assistente social: teoria, ação, construção do conhecimento. V. 1. São Paulo: Veras Editora, 2009. BARROCO, Maria Lucia Silva. Código de Ética do/a Assistente Social comentado / Maria Lucia Silva Barroco, Sylvia Helena Terra; Conselho Federal de Serviço Social – CFESS, (organizador). – São Paulo: Cortez, 2012. BRASIL. Senado Federal. Lei n. 7.210/84. Lei de Execução Penal. Brasília: Senado Federal, 2010. ________. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998. ________. LOAS. Lei orgânica da assistência social. Brasília, DF, Senado, 1993.

CASTRO, Manuel Manrique. História do Serviço Social na América Latina. Tradução de José Paulo Netto e Balkys Villalobos. 1. ed. São Paulo: Cortez, 1984. CHUAIRI, Sílvia Helena. Assistência jurídica e serviço social: reflexões interdisciplinares. Serviço Social & Sociedade, n. 67. São Paulo, Cortez, 2001. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Lei de Regulamentação da Profissão de Assistente Social. Lei nº 8662, de 07 de junho de 1993. Dispõe sobre a profissão de Assistente Social e dá outras providências. __________ Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais. Resolução CFESS nº 273, de 13 de março de 1993 com as alterações introduzidas pelas Resoluções CFESS n.º 290/94 e nº 293/94. _________. Resolução CFESS n° 557, de 15 de setembro de 2009. Dispõe sobre a emissão de pareceres, laudos, opiniões técnicas conjuntos entre o assistente social e outros profissionais. _________. Resolução CFESS n° 493, de 21 de agosto de 2006. Dispõe sobre as condições éticas e técnicas do exercício profissional do assistente social. _________. Resolução CFESS n° 559, de 16 de setembro de 2009. Dispõe sobre a atuação do Assistente Social, inclusive na qualidade de perito judicial ou assistente técnico, quando convocado a prestar depoimento como testemunha, pela autoridade competente. COUTO, Berenice Rojas. Formulação de projeto de trabalho profissional. In: Serviço

Social: direitos sociais e competências profissionais. – Brasília: CFESS/ABEPSS,

2009.

52

DESLANDES, Suely Ferreira; GOMES, Romeu; MINAYO, Maria Cecília de Souza (Org.). Pesquisa Social: Teoria, Método e Criatividade. 31ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012. FALEIROS, Vicente. Estratégias em Serviço Social. São Paulo: Cortez, 1997.

FÁVERO, Eunice Teresinha. O Estudo Social: fundamentos e particularidades de sua construção na área judiciária. In: O Estudo Social em perícias, laudos e pareceres técnicos. – CFESS, (org.). 9. ed. São Paulo: Cortez, 2010. ________. Desafios e perspectivas do exercício profissional do assistente social na efetivação de direitos. In: A Prática profissional do Assistente Social: teoria, ação, construção do conhecimento. V. I - São Paulo: Veras Editora, 2009. FÁVERO, E. T.; MELÃO, M. J; JORGE, M. R. T. (org.). O Serviço Social e a Psicologia no Judiciário: construindo saberes, conquistando direitos. São Paulo: Cortez, 2005. FRAGA, Cristina Kologeski. A atitude investigativa no trabalho do assistente social. Serviço Social & Sociedade, n.101. São Paulo, Cortez, 2010.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. 36. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. – 4. reimpr. – São Paulo: Atlas, 2011.

GUERRA, Yolanda. A dimensão investigativa no exercício profissional. Capacitação continuada para Assistentes Sociais. ABEPSS/CFESS, 2007. GUINDANI, Miriam Krenzinger A. Tratamento penal: a dialética do instituído e do instituinte. Serviço Social & Sociedade, n. 67. São Paulo, Cortez, 2001. IAMAMOTO, Marilda Vilella. O Serviço Social na Contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 20ª edição. São Paulo: Cortez, 2011. ________; CARVALHO, Raul de. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 35.ed. São Paulo: Cortez, 2011. ______. Renovação e Conservadorismo no Serviço Social: ensaios críticos. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2004. ______. Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2010. ______. Os espaços sócio-ocupacionais do assistente social. In: Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. – Brasília: CFESS/ABEPSS, 2009. MARTINELLI, Maria Lúcia. Reflexões sobre o Serviço Social e o projeto ético-político profissional. In: Emacipação. Universidade Estadual de Ponta Grossa. Departamento de Serviço Social. Ponta Grossa, PR. Editora: UEPG, v. 1, n. 1 (2001 - ).

53

______. Serviço Social: Identidade e Alienação. 15. ed. São Paulo: Cortez, 2010. MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política: livro I. 25ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Departamento Penitenciário Nacional. Dados Consolidados. In: InfoPen. Brasília (DF), 2007. Disponível em: http://www.mj.gov.br. Acesso em: 20 mai. 2013. NETTO, José Paulo. A Construção do Projeto Ético-Político do Serviço Social. In: Capacitação em Serviço Social e Política Social. Módulo 1. Brasília: CEAD/ABEPSS/CFESS, 1999. ______. Economia Política: uma introdução crítica / José Paulo Netto e Marcelo Braz. - São Paulo: Cortez, 2006. – (Biblioteca básica de serviço social; v.1). ______. Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64. 15. ed. São Paulo: Cortez, 2010. PASTORINI, Alejandra. A categoria “questão social” em debate. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2010. – (Coleção questões da nossa época; v.17). RAICHELIS, Raquel. O trabalho do assistente social na esfera estatal. In: Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. – Brasília: CFESS/ABEPSS, 2009.

______. O assistente social como trabalhador assalariado: desafios frente às violações de seus direitos. Serviço Social & Sociedade, n.107. São Paulo: Cortez, 2011. RAMOS, Sâmya Rodrigues. Limites e possibilidades históricas do Projeto Ético-Político. Revista Inscrita. Brasília, ano 8, n. 12, 2009.

SALLA, Fernando. Rebeliões nas prisões brasileiras. Serviço Social & Sociedade, n. 67. São Paulo, Cortez, 2001. SANTOS, Josiane Soares. “Questão Social”: particularidades no Brasil. São Paulo: Cortez, 2012. – (Coleção biblioteca básica de serviço social; v.6).

TONIOLO, Charles. A prática do assistente social: conhecimento, instrumentalidade e intervenção profissional. Emancipação, Ponta Grossa, 8 (1): 119-132, 2008. Disponível em http://www.uepg.br/emancipacao. Acesso em: 11/07/2013.

TORRES, Andréa Almeida. Direitos humanos e sistema penitenciário brasileiro: desafio ético e político do serviço social. Serviço Social & Sociedade, n. 67. São Paulo, Cortez, 2001.

54

APÊNDICE

55

APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Caro/a Senhor/a,

Chamo-me Angélica Braga dos Santos, sou graduanda (8º semestre) em Serviço

Social pela Faculdade Cearense – FAC. Estou realizando uma pesquisa para o meu

trabalho de conclusão de curso – TCC. A pesquisa tem por objetivo compreender o

trabalho do Assistente Social no Sistema Penitenciário.

Por essa razão, o/a Senhor/a está sendo convidado/a a participar, de forma a

responder algumas perguntas, permitir ser observado e ter depoimentos gravados.

O/a Senhor/a terá garantido o sigilo de todas as informações que dispuser, bem

como o anonimato de todo e qualquer depoimento. Terá também o direito de se

desligar da pesquisa a qualquer momento, sem que isto lhe traga qualquer prejuízo

e / ou despesa.

A sua participação nesta pesquisa é de caráter voluntário. Caso o/a Senhor/a aceite

participar, não receberá nenhuma compensação material ou financeira, como

também não sofrerá qualquer prejuízo se não aceitar.

Se tiver alguma dúvida a respeito dos objetivos da pesquisa e/ou métodos utilizados

na mesma, estarei à disposição na Faculdade Cearense, Av. João Pessoa, 3884 –

Damas, curso de Serviço Social, no horário da noite 18:30 ás 22:00 nas terças e

sextas-feiras. Meu telefone de contato é xxxxxxx e meu e-mail wwwwwwwwwww.

Caso o/a Senhor/a esteja de acordo em participar deverá preencher e assinar o

Termo de consentimento pós-esclarecido que se segue, recebendo uma cópia do

referido Termo.

56

APÊNDICE B - TERMO DE CONSENTIMENTO PÓS-ESCLARECIDO

Pelo presente instrumento que atende às exigências legais, o/a Sr/a

_________________________________________________, portador/a da cédula

de identidade __________________________, declara que, após leitura minuciosa

do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), teve oportunidade de fazer

perguntas, esclarecer dúvidas que foram devidamente explicadas pela

pesquisadora, ciente dos serviços e procedimentos aos quais será submetido e, não

restando qualquer dúvida a respeito do lido e explicado, firma seu

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO em participar de forma voluntária

desta pesquisa.

E, por estar de acordo, assina o presente Termo.

Fortaleza – CE,_________________de____________________de_________.

______________________________

Assinatura do participante

_______________________________

Angélica Braga dos Santos

Pesquisadora

57

APÊNDICE C – ROTEIRO PARA ENTREVISTA

Nome: ---------------------------------------------------------------------------------------------

Sexo -------------------- Religião -------------------------------------

Idade: ----------------------

Estado civil: ---------------- Tem filhos: -------------

Quanto tempo de formação?

Fez alguma especialização, mestrado, doutorado?

Como se deu sua trajetória profissional?

Há quantos anos você integra a Secretaria de Justiça e cidadania do Estado do

Ceará?

Como chegou a área do Sistema Penitenciário para atuação?

Quais as competências necessárias para o assistente social atuar no presídio?

Qual a sua opinião sobre o Sistema Penitenciário no Ceará?

Qual a principal importância da atuação do Assistente Social dentro dos

presídios?

Como se dá esta atuação?

Quais são as maiores demandas que chegam ao Serviço Social?

Como são as condições de trabalho?

O que você cita como principal dificuldade e exigências para o exercício

profissional dentro das instituições prisionais?

De que forma você se apropria dos princípios e parâmetros de atuação inseridos

no Código de ética profissional e no Projeto ético-político?

Que outras legislações são importantes para a sua atuação profissional?

Conte um pouco sobre o seu quotidiano na prisão.

58