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CIDADE-SHOPPING-CIDADE: O OLHAR SOBRE O BOULEVARD
SHOPPING DE FEIRA DE SANTANA, BAHIA, COMO CIDADE.
Maristela dos Santos Pinho, Mestranda em Desenho, Cultura e Interatividade,
Universidade Estadual de Feira de Santana, [email protected]
Nadia Virginia Barbosa Carneiro, Professora Titular, Universidade Estadual de Feira
de Santana, [email protected]
Lysie dos Reis Oliveira, Professora Adjunto, Universidade do Estado da Bahia,
RESUMO
Este artigo tem como objetivo realizar uma análise da implantação do Boulevard Shopping no
espaço urbano de Feira de Santana e discutir o (re)desenho por ele provocado no meio
ambiente construído desta cidade; compreender em que medida o shopping vem se tornando
uma continuidade do espaço urbano como cidade-shopping-cidade. O shopping é
compreendido neste estudo como um simulacro do ambiente citadino, que sofre as mesmas
influências da cidade de caráter comercial que o abriga. Construído sobre uma imagem e de
um estereótipo de espaço que vai oferecer o que a cidade não oferece aos transeuntes –
segurança, conforto, estacionamento, modernidades – torna-se a “cidade perfeita e tranquila,”
e vem confirmar que Feira de Santana, com a sua presença, inclui-se no âmbito da
modernidade que tanto almejou.
PALAVRAS-CHAVE: Desenho urbano; cidade; Boulevard Shopping de Feira de Santana.
1. INTRODUÇÃO
Segundo os pressupostos da pós-modernidade, o shopping intenciona ser, na atual
realidade das cidades brasileiras, um simulacro de cidade. Sugere-se que diferentes
fenômenos sociais, como a violência urbana, o niilismo, a efemeridade das relações sociais,
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aliados ao modelo do capitalismo atual, são propulsores do costume/hábito de ver os
corredores do shopping como ruas, as vitrines como fachadas, o conjunto de lojas que vendem
comida como “praça” de alimentação, enfim, considera-se que há muitas analogias entre o
estar no ambiente citadino e o atual modelo de utilização do shopping como extensão de uma
cidade.
Esse tema tem sua relevância quando se aproxima da história da cidade de Feira de
Santana. Marcada como cenário de grandes movimentações comerciais, foi sendo
naturalmente reconhecida como o território do estado em que a pujança comercial afirmava-
lhe o nome de batismo. Feira tem um papel fundamental no entendimento da história da
Bahia, e desde o seu surgimento, almeja se tornar uma cidade moderna. Mas, aspectos de sua
cultura, especialmente na sua vertente sertaneja, vêm sendo apagados ou relegados ao
esquecimento.
Pode-se pensar que a cidade negligencia suas memórias, em nome da "modernidade".
Segundo Falcão (2003), a modernidade chega a Feira de Santana para omitir a memória de
um povo que precisava acompanhar a mudança já existente em grandes cidades no país. Com
isso, Feira segue esse pensamento, perdendo elementos que são considerados como belos na
memória social da cidade, como as grandes construções arquitetônicas de estilo eclético,
algumas edificações conservadas, outras modificadas ou deterioradas, para dar espaço a novos
prédios comerciais ou a espaços vazios de estacionamento rotativo.
A instalação do Boulevard Shopping gerou mudanças na cidade. Mas, segundo os
moradores de Feira, é o progresso que chega à cidade, sendo bem visto e aceito por todos.
Afinal, Feira de Santana, cuja alcunha é “princesa do sertão”, não escaparia dessa coroação
trazida pela implantação do shopping, que vem sendo apropriado pela população como o
único lazer da cidade. Lembre-se que esse não é uma opção de lazer pontual, quase todo o
Brasil passa por isso.
O estudo do Boulevard Shopping de Feira de Santana, ainda é escasso na
comunidade científica feirense, inclusive na investigação das influências no desenho urbano
da cidade. É imprescindível todo e qualquer estudo sobre Feira de Santana, pois nos remete a
uma melhor compreensão de todo um contexto histórico em que a cidade oferece. São poucas
as pesquisas sobre a cidade e por muito tempo, os acadêmicos utilizaram de Rollie Poppino
(1968) única referência, restando somente às fontes dos jornais e arquivo público. Por isso, a
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importância de pesquisar Feira, não apenas a cidade em que eu nasci; não apenas a segunda
maior cidade do Estado da Bahia, mas aquela que hoje representa uma das grandes cidades
comerciais brasileiras e que continua a crescer.
O método utilizado para compreensão da pesquisa foi a Semiótica peirciana, que
segundo Santaella (1983) é uma teoria sígnica do conhecimento. Também faço uso à leitura
de Lynch (2010), que permite a compreensão de como as pessoas criam imagens mentais
através da observação, percepção, deslocamento e uso do espaço urbano.
2. BREVE HISTÓRIA SOBRE FEIRA DE SANTANA, A CIDADE COMERCIAL.
Nascida do comércio, Feira de Santana localiza-se na Bahia, a 109 km de Salvador.
Teve seu povoamento iniciado a partir da venda do gado e da feira livre, uma feira realizada
as segundas-feiras em torno das capelas de Santa Ana e de São Domingos, construídas pelo
casal Domingos Barbosa de Araújo e Ana Brandão em sua fazenda Sant’Anna dos Olhos
d'Água, onde se passava os tropeiros, que faziam suas rotas comerciais no alto sertão da
Bahia, comercializando os produtos oriundos da região.
Segundo Andrade (1990), este casal havia adquirido as terras dos descendentes do
português João Peixoto Veigas, os primeiros povoadores dessas terras. A partir das passadas
dos tropeiros para o descanso que também se apropria do tempo para comercializar seus
produtos, assim, foi surgindo o povoado e as casas de pedra. A cidade continuou a crescer
muito, triplicando a sua população e consequentemente, passa a ter todos os problemas e
necessidades que uma cidade do seu porte precisa. Sua condição de cidade para o comércio é
logo absorvida por muitos, o que vai resultar no seu desenvolvimento e investimentos
direcionados a construção de estradas de chão para o transporte das boiadas e de trem para o
acesso a outras regiões nos anos de 1856 a 1858. Esse discurso é apresentado por e Poppino
(1968), pesquisador estrangeiro que por muitos anos foi autor de único trabalho mais
específico sofre Feira.
Com o crescimento da cidade, do comércio e da população, vai despertar nas
autoridades e políticos da cidade, atentos à condição de Feira para o comércio, a importância
de construção de estradas que desse acesso a outras regiões para a realização desse comércio,
gerando assim um investimento maior para o desenvolvimento da urbe junto com o comércio
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entre os anos de 1837 a 1858, surgem estradas de passagem de boiadas (Feira/Morro do
Chapéu e Salvador/Feira), que permitisse o acesso a outras regiões. São os ideários de
modernidade que chega a cidade com a construção de estradas.
Hoje, a cidade de Feira de Santana, a segunda maior do estado da Bahia, conta com
uma população de aproximadamente 600.000 mil habitantes e encontra-se num dos principais
entroncamentos de rodovias do Nordeste brasileiro, servindo de ponto de encontro de três
rodovias federais e três rodovias estaduais as BR 324, 101 e 116.
2. METÁFORAS DO SHOPPING CIDADE E DA CIDADE SHOPPING.
Figura1: Desenho (projeto) do novo Boulevard Shopping de Feira de Santana, previstas para 2011. Fonte: Boulevard Shopping de Feira de Santana.
O Shopping Iguatemi de Feira de Santana chega a Feira de Santana para concretizar
seu sonho de modernidade e confirmar que a cidade é um grande pólo comercial, atualmente,
um dos maiores no país. O Shopping apresenta um ambiente citadino. Traz para a cidade lojas
multinacionais, que também passam a fazer parte do centro comercial de Feira de Santana.
Essas lojas e as praças de alimentação vêm conferindo à cidade o status de moderna.
Os shoppings foram introduzidos no Brasil na década de 70, precisamente na cidade
de São Paulo, pelo empresário Alfredo Matias, considerando uma inspiração no modelo
americano de consumo. “Ir ao shopping, comprar ou simplesmente passear, passaram a serem
símbolos de uma nova sociedade que centrava na dimensão das compras o elemento
revolucionário do shopping.” (SOUZA; SANTANA; TOSCA, 2005, p. 74).
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No Brasil, o shopping é um empreendimento que ganha espaço. Fonte do
capitalismo, o shopping surgiu para o consumo de bens e serviços. Na Bahia, o shopping
center regional vai aparecer em 1975 com a instalação do Shopping Center Iguatemi de
Salvador. Segundo Nacelice Freitas (1998) esse fato vai acontecer devido aos investimentos
que Salvador vai realizar com a implantação do CIA e COPEC. Assim como Feira de Santana,
que ganha um shopping center de grande porte após a instalação do Centro Industrial Subaé –
CIS. “Outro aspecto que deve ser lembrado está no projeto em fase de implantação com o
Shopping Center Iguatemi, que, talvez não justificasse a sua presença em Feira de Santana, se
caso aqui não estivesse presente um centro industrial importante.” (FREITAS, 1998, p. 168).
Foto 1: Av. Principal do Boulevard Shopping. Maristela Pinho, 2010.
Os shoppings centers são lugares de lazer e de tranquilidade para quem os frequenta,
e para outros, apenas um local que permite realizar suas atividades diárias, como acesso a
pequenas lojas (pagamento de contas, compra rápida, etc.), mas, odiando, desprezando esse
espaço, sem ver nele um lugar de entretenimento. Na realidade, o shopping center estava
integrado a uma nova visão do mercado, incorporando a conceitos de utilidade, lazer,
entretenimento e agregando valor ao produto a ser consumido por uma população cada vez
mais voltada para a dimensão de compras. Enfim, englobando em um mesmo local o consumo
e o lazer com tranquilidade, segurança e conforto. Essa posição também é percebida por Paco
Underhill (2004):
O aumento cada vez maior dos espaços de lazer nos shoppings é um indício
de que eles são importantes do ponto de vista econômico. O raciocínio é
simples: quando há mais diversão, mais tempo as pessoas passam dentro dos
shoppings. (...) Se essas pessoas comprarem alguma coisa, será muito bom;
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se comprarem e comerem, será melhor ainda; se elas comprarem, comerem e
se divertirem, será perfeito. (UNDERHILL, 2004, p. 110).
Este comentário de Underhill nos mostra que, no decorrer dos anos, desde a sua
criação até o momento, o shopping vem mudando. O que antes era apenas um local de
compras passou a ser um local de lazer sem deixar de lado, as estratégias para o consumo, de
uma maneira cada vez mais atraente e sedutora para o cliente. Essa afirmação é coerente
quando as lojas de grande porte, as chamadas “âncoras”, “carro chefe” são sempre
introduzidas, a fim de manter a frequência de consumidores e visitantes. Se não se compra,
que se consuma no entretenimento (cinema, praça de alimentação, etc.) ou, como muitos sem
poder aquisitivo, limitando-se ao passeio e admiração às vitrines.
Kevin Lynch (2010) irá apontar cinco elementos básicos para se olhar a cidade: as
vias, que permite a ligação entre um ponto e outro; os limites, que são representados pela
fronteira; os pontos nodais, que são os pontos marcantes pelo nosso olhar e que nos direciona
ao andar pela cidade; os cruzamentos e os bairros. Todos eles são elementos utilizados por
nós, no nosso dia a dia para melhor transitar pelo espaço urbano e perceber a cidade, pois,
para Lynch “Acima de tudo, se o ambiente for visivelmente organizado e nitidamente
identificado, o cidadão poderá impregná-lo de seus próprios significados e relações. Então se
tornará um verdadeiro lugar, notável e inconfundível (LYNCH, 2010, p. 101–102), pois “a
cidade também é extremamente visível.” (Ob. citada, p. 103).
O shopping é uma cidade planejada que busca atingir a perfeição, a atração cada vez
maior de um número de pessoas, sempre localizado em bairros distantes do centro da cidade,
em áreas que se possa evitar congestionamento no trânsito. Ele é também direcionado a uma
classe social alta. A partir das entrevistas e conversas informais realizadas com os sujeitos
pesquisados, muitos alegam, aqueles que moram longe do shopping e vão pouco ao shopping,
pelo transtorno na demora dos ônibus e da distância do shopping. Esse comentário é feito por
todos os entrevistados que vão ao shopping de ônibus. O próprio Undehill faz essa suposição.
Se você ainda precisa de provas à natureza entorpecente e insular dos
shoppings suburbanos, pense nisso: eles quase nunca podem ser acessados
via transporte público. “Se você não tem um carro para chegar até aqui”, eles
parecem dizer, “ é melhor que não venha” (UNDERHILL, 2004, p. 51).
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O shopping é construído a partir de um simulacro de cidade perfeita, tranquila
(sempre tem uma praça e um banco em volta dela para se ler, conversar ou observar as
pessoas que transitam pelas ruas, distraídos, relaxados, quase à vontade); segura, pois as
pessoas sentem-se protegidas, felizes, sem violência. A segurança está ali, em toda a parte,
sem que nem a notemos. Essa imagem é projetada no desenho da figura 1, o desenho do
projeto da nova praça de alimentação do Boulevard Shopping, uma área de entretenimento.
Para Feira de Santana, os shoppings substituem a rua, a praça, o parque, a praia, que não se
tem. Um lugar de balada dos jovens, como único espaço de lazer da cidade.
Analisando o discurso de Baudrillard (1981), a simulada cidade shopping Boulevard
confirma esse pensamento quando procura ansiosamente pela super-modernidade, a partir de
conceitos e imagens construídas em cima da perfeição, mesmo que essa perfeição seja
manipulada constantemente. E conquista um lugar de excelência para se viver, o que vai
provocar um aglomerado de pessoas, principalmente jovens, pois os espaços oferecidos são
perfeitos (lan house, cinema, comida rápida, shows, vídeo games, etc.). Segundo ainda este
autor, simulacro e simulação são coisas diferentes, porém caminham juntas.
Dissimular é fingir não ter o que se tem. Simular é fingir ter o que não se
tem. O primeiro refere-se a uma presença, o segundo a uma ausência. Mas é
mais complicado, pois simular não é fingir: <<Aquele que finge uma doença
pode simplesmente meter-se na cama e fazer crer que está doente. Aquele
que simula uma doença determina em si próprio alguns dos respectivos
sintomas.>> (Littré). Logo fingir, ou dissimular, deixam intacto o princípio
da realidade: a diferença continua a ser clara, está apenas disfarçada,
enquanto que a simulação põe em causa a diferença do <<verdadeiro>> e do
<<falso>>, do <<real>> e do <<imaginário>> (BAUDRILLARD, 1981, p.
9-10).
No olhar sobre o shopping como cidade,vemos os corredores como ruas, limpa,
bonita, sem sinaleira, trânsito, mas se contrapõe com a multidão aglomerada, carros em busca
de vaga no estacionamento. São as deficiências da infraestrutura das ruas também presente no
shopping cidade; as vitrines, fachadas agradáveis de olhar, apresentam o consumo que
almejamos no nosso dia a dia, o estar belo nas medidas perfeitas que a sociedade moderna
impõe. A imagem citadina do shopping é tranquila, sem violência (uma sensação imaginária),
sem roubo, furto, agressão. Não esperamos nenhum tipo de violência no ambiente no
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shopping cidade, mas elas existem e ocorrem, às vezes, sem percebermos, como em toda
cidade brasileira.
Foto 2: Pça. de alimentação na Av. Mª Quitéria, centro comercial de Feira de Santana. Maristela Pinho, 2011.
Foto 3: Pça. de alimentação na Av. Sampaio, centro comercial de Feira de Santana. Maristela Pinho, 2011.
Enquanto o Boulevard Shopping se apropria da imagem citadina, Feira de Santana se
apropria da imagem do shopping na área central da cidade, em espaços abertos onde a praça
de alimentação ocupa áreas que são, para muitos, área de lazer de entretenimento, como os
quiosques das avenidas Getúlio Vargas, Sampaio e Maria Quitéria, e em outros locais do
centro da cidade e bairros (fotos 2 e 3). Lugares onde as pessoas se encontram para
lancharem, beberem e conversarem, como mostra a imagem da foto 1. Esses lugares se
concentram uma grande parte de jovens, não apenas para conversar, mas para distrair-se nas
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rodas dos skates, pois os quiosques da Avenida Getúlio Vargas têm uma pista apropriada para
isso.
Essa apropriação do espaço de shopping que a cidade de Feira conquista, é mostrado
nas lojas multinacionais e nacionais que conquistam seus espaços não mais apenas no
shopping Center, mas também no centro da cidade de Feira de Santana, que aos poucos, vem
buscando a imagem do shopping em sua área comercial. Essas lojas de grande porte que
chegam a Feira de Santana em seu primeiro momento no shopping são, geralmente, carros
chefes em espaços de Shopping Center do país e no mundo inteiro. São lojas de âncoras,
como a C & A, Riachuelo, Marisa, o Hipermercado Bom Preço que chega ao comércio de
Feira com a marca Todo Dia.
O shopping vai se tornar para os feirenses e moradores de cidades vizinhas, o local
de lazer mais procurado. Esse, talvez seja o contraste que Feira apresenta uma cidade
moderna, mas sem opções de lazer, limitado no espaço do Shopping Boulevard. A cidade
ganha forma e cor quando pessoas passam a “morar” no shopping, chegando pela manhã e
encerrando o dia realizando compras no hipermercado.
A cidade shopping se redesenha utilizando-se do método que é a leitura do mundo
através da boa imagem, onde o mesmo atua como mediador entre o novo e o velho
interagindo no cenário espacial. A semiótica faz a imagem do seu universo (vidente e o
visível), parte daí a importância de se buscar a imagem manipulada que vai para a cidade
shopping; a imagem do tudo se pode, tudo é arrumado, sem problemas, produzido sempre no
bem-estar.
O Boulevard Shopping, em onze anos de existência, reflete suas mudanças nos vários
redesenhos sucedidos na redução do estacionamento para a chegada de grandes lojas
multinacional, adaptando seus espaços á pós-modernidade. Exatamente nesta época (2011),
ele está em processo de reformas. À cidade quase perfeita, que se adaptam as exigências do
mundo atual, onde tudo ou quase tudo se encontra, com tranquilidade e comodidade. A partir
daqueles que circulam por esse espaço, compreender a inserção urbana do Boulevard
Shopping de Feira de Santana, que se comportando como um simulacro de cidade;
identificando os desenhos internos realizados por seus frequentadores que lhe dão alma. Essa
é a cidade que a sociedade pós-moderna almeja, onde tudo se encontra, sem gastos do tempo,
algo muito valioso para o homem moderno.
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Para compreender essa cidade e o seu desenho inclusive o desenho das pessoas que
transitam por ela, visitam, trabalha, moram, amam, odeiam, preciso estar atenta sobre o olhar
que tenho que realizar sobre ela. Mas como se apropriar da visão que a nossa sociedade como
um todo vê a construção do Boulevard Shopping para a cidade de Feira de Santana? Segundo
o pensamento de Merleau-Ponty (2006, p. 20) para perceber, antes é preciso sentir, pois,
Tudo que eu vejo está, por princípio, ao meu alcance, pelo menos ao alcance do meu olhar, edificado sobre o plano do "eu posso". Cada um destes planos está completo. O mundo visível e o dos meus projectos motores são partes totais do mesmo Ser.
Portanto, o corpo (ser) é o responsável pela formação da consciência intelectual. Ele
também dirá que para perceber é preciso primeiro sentir, pois, a percepção chega antes do
saber e o corpo faz parte da percepção e "(...) o sujeito que percebe está diante do mundo
como o cientista diante de suas experiências." (Obra citada, p. 50).
Atentando-me à maneira de ver as coisas, sabendo buscar a visão do outro sobre o
que eu observo, pesquiso e compreendendo o que o outro tem a me dizer. Pessoas que
transitam despreocupadas com os carros, sinaleiras, assaltos, sol, chuva, vagas em
estacionamento; tomando um sorvete, comendo pipoca e olhando as vitrines das lojas,
absorvidos pela tranquilidade e segurança que os shoppings centers oferecem.
(...) a cidade contemporânea (...) com características de espaço fechado e
interno como ocorre com os shoppings centers. (...) Essa mudança de hábitos
não é casual, mas define as características das nossas cidades que convivem
com a prática de criar espaços, porque falta lugar. (...) a cidade se adapta ás
necessidades de um cotidiano instável, mas sofre suas consequências
(FERRARA, 2000, p. 178).
Mas como toda cidade moderna, os problemas existem. O que antes era uma
vantagem e considerado um dos pontos importantes para se ir ao shopping, hoje se torna um
dos grandes problemas dos dirigentes de shopping Center: o estacionamento, um problema
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também enfrentado nas ruas das cidades modernas.
Foto 4: Carro fora da área permitida de estacionamento do Boulevard Shopping. Maristela Pinho, 2009.
Observando as fotos 4 e 5, de uma área do estacionamento do Boulevard Shopping
reduzido para a chegada de novas lojas, vemos carros estacionados em área não permitida,
decorrente da falta de vaga. O discurso em defesa dos shoppings pode ser apreendido em
Dinah Pinto (2001):
Um dos grandes benefícios proporcionados pelos shoppings centers é o estacionamento de automóveis, pois se torna cada dia mais difícil estacionar nas ruas, e é difícil, senão impossível, andar de ônibus com compras relativamente grandes. O automóvel deixou, a muito tempo, de ser um veículo pertencente exclusivamente à elite, mas uma necessidade, hoje também alcançada pela classe média (PINTO, 2001, p.7).
Foto 5: Área alugada para estacionamento pelo Boulevard Shopping. Maristela Pinho, 2011.
O tempo passou a ser muito importante para a sociedade moderna e pós-moderna. Os
shoppings center tem esse ponto aos seu favor. Quase tudo se encontra nos shopping de
maneira confortável, agradável e segura. “O que o homem hoje mais busca é administrar bem
a sua vida, isso significa administrar o tempo, o dinheiro e o lazer. Esses três itens se encontra
no shopping center”. (PINTO, 2001, p. 9). Além de se ter uma grande economia de tempo,
pois se encontra no mesmo local os mais diferentes ramos de negócio.
CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
A implantação do Boulevard Shopping na cidade de Feira de Santana vai confortar o
desejo da elite feirense. A cidade se submete a novos redesenhos, conseqüências ao
desenvolvimento da cidade e o shopping corresponderá ao sonho da imagem moderna.
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A idéia de cidade-shopping-cidade se une a cidade "ideal" ou "perfeita," pudesse
existir no território do shopping, no entanto, se trata de uma cidade-shopping, essa cidade
parece reproduzir os mesmos problemas urbanos de toda cidade moderna, como a violência,
medo e insegurança, espaços reduzidos, dificuldades para estacionamento, problemas urbanos
de infraestrutura, etc. Também percebo que a ideia de cidade-shopping-cidade parece se
confirmar com a incorporação do desenho do shopping, traduzido na presença de lojas
multinacionais e de grife no urbano comercial de Feira de Santana. São as diretrizes de um
projeto de fazer uma Feira de Santana moderna em detrimento de tantos aspectos culturais
que são apagados e relegados ao esquecimento. Talvez possa dizer que o shopping hoje é o
lazer da cidade, algo limitado para uma cidade que tem todos os problemas de uma metrópole
e deixa para trás tudo que há de bom em uma cidade interiorana.
Compreendo que, o que vem sendo a representação do Boulevard Shopping para a
cidade de Feira de Santana, uma cidade interiorana, construída e sustentada pelo estereótipo
do comércio. Feira de Santana busca a modernidade e a "alcança," a partir do crescimento
acelerado e desordenado que ela vem passando. A cidade cresce e ganha ares de metrópole. O
Boulevard Shopping vai firmar essa modernidade, no momento em que um empreendimento
de grande porte, chega à cidade e vai, com a sua edificação glamorosa, confirmar que Feira de
Santana é uma cidade moderna como tanto almejou.
Feira de Santana cresceu e muito. De comércio de gado a feira livre e hoje, um
grande polo comercial no país. Com o risco de perder suas origens e sua memória com o
crescimento da cidade, um desejado alcançado pela elite do século passado. Novos desenhos e
redesenhos urbanos vão surgindo e muitos se destacando e dando margem ao
desenvolvimento da cidade, um deles é o Boulevard Shopping de Feira de Santana. Este,
talvez seja o mais procurado espaço de lazer para uma cidade que enfrenta todas as facilidades
de uma metrópole, que busca, desde a fundação, atingir essa modernidade, mas, ainda
mantém traços interioranos, como a ausência de espaços púbicos de lazer.
A partir dos conceitos apresentados, sustentáculo para uma pesquisa que permite
construir conhecimento a partir da observação do desenho e da singularidade da paisagem
urbana do Bolevard Shopping; exercitar as diversas possibilidades de leitura do desenho e do
ambiente urbano dentro de um contexto social e cultural, tendo o shopping, um simulacro de
cidade que se firma para todos como a cidade ideal e moderna, que nos oferta a perfeição
almejada. Aquela que sonhamos viver, ser feliz, morrer.
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