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DOCUMENTO DE TRABALHO Comércio e investimento chinês e seus impactos sobre as florestas Um estudo exploratório nas florestas de miombo Laura A. German George C. Schoneveld Sheila Wertz-Kanounnikoff Davison Gumbo

Comércio e investimento chinês e seus impactos sobre as ...webdoc.sub.gwdg.de/ebook/serien/yo/CIFOR_WP/130.pdf · ZCCZ Zona de Cooperação Econômica e Comercial Zâmbia-China

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  • D O C U M E N T O D E T R A B A L H O

    Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas Um estudo exploratrio nas florestas de miombo

    Laura A. German

    George C. Schoneveld

    Sheila Wertz-Kanounnikoff

    Davison Gumbo

  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas Um estudo exploratrio nas florestas de miombo

    Laura A. German

    George C. Schoneveld

    Sheila Wertz-Kanounnikoff

    Davison Gumbo

    Documento de Trabalho 130

  • Documento de Trabalho 130

    2013 Centro de Pesquisa Florestal Internacional (CIFOR)

    O contedo desta publicao licenciado sob Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported License http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/3.0/

    German LA, Schoneveld GC, Wertz-Kanounnikoff S e Gumbo D. 2013. Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas: um estudo exploratrio nas florestas de miombo. Documento de Trabalho 130. Bogor, Indonsia : CIFOR.

    Traduzido de: German LA, Schoneveld GC, Wertz-Kanounnikoff S and Gumbo D. 2011. Chinese trade and investment and its impacts on forests: A scoping study in the miombo woodlands. Working Paper 84. Bogor, Indonesia: CIFOR.

    Foto da capa por George C. Schoneveld. Placa no canteiro de obras da Sino-Hydro, Kariba, na Zmbia.

    CIFORJl. CIFOR, Situ GedeBogor Barat 16115Indonsia

    T +62 (251) 8622-622F +62 (251) 8622-100E [email protected]

    cifor.org

    Gostaramos de agradecer a todos os os doadores que apoiaram esta pesquisa atravs de suas contribuies ao Fundo do CGIAR. Para uma lista dos doadores do Fundo, veja: https://www.cgiarfund.org/FundDonors

    Todos os argumentos expostos nesta publicao so atribudos aos autores e no necessariamente representam a posio do CIFOR, instituies representadas pelos autores ou financiadores desta publicao.

  • ndice analtico

    Abreviaturas v

    Agradecimentos vi

    Resumo vii

    1. Contexto e justificativa 11.1 Evoluo da ajuda, comrcio e investimento chins na frica 11.2 As caractersticas e a importncia das florestas e bosques da frica Austral

    para os meios de subsistncia 11.3 Escopo da anlise 2

    2. Objetivos 3

    3. Questes da pesquisa 4

    4. Metodologia 54.1 Seleo de pases para o estudo exploratrio 54.2 Metodologia do estudo exploratrio 5

    5. Resultados 75.1 Fase 1: Seleo de pases e commodities 75.2 Fase II: estudo exploratrio nospases 7

    6. Concluses e implicaes para futuras pesquisas 496.1 Concluses 496.2 Implicaes para pesquisas futuras 50

    7. Referncias 54

  • Lista de figuras, tabelas e quadros

    Figuras1 frica Austral, com a distribuio aproximada das florestas de miombo e

    os pases focados no estudo exploratrio no campo 52 Evoluo da APD chinesa para a Zmbia, 1986-2006 (milhes de USD) 113 Dez principais produtos moambicanos exportados para a China em termos de valor,

    2001-2010 (mil USD) 144 Dez principais produtos da Zmbia exportados para a China em termos de valor, 2001-2010 (mil USD) 155 Dez principais produtos do Zimbbue exportados para a China em termos de valor, 2001-2010 (mil USD) 167 Capital chins do IED por setores (exceto minerao), janeiro de 2000 a setembro de 2010 176 Projetos com base no IED chins (todos os setores, exceto minerao) em Moambique,

    janeiro de 2000 a setembro de 2010 178 Predomnio do capital chins em investimentos que envolvem investidores chineses,

    por setor, de janeiro de 2000 a setembro de 2010 189 Empenhos de IED por setor, 2000-2009 (milhes de USD) 1810 Volume de IED chins em pases ricos em florestas na frica Austral, 2008 1911 Exportaes de algodo para a China e para o mundo, em termos de valor (milhes de USD) 2112 Importaes e exportaes chinesas de folhas de tabaco manufaturadas e no manufaturadas,

    em termos de valor, 2001-2010 (milhes de USD) 2313 Exportaes de tabaco para a China e para o mundo, em termos de valor, 2001-2010 (milhes de USD) 2314 Exportaes de gergelim de Moambique para a China e para o mundo, em termos

    de valor (milhes de USD) 2715 Produo anual de cultivos de renda de pequenas e mdias propriedades em Moambique 2816 Tendncias recentes nas exportaes de madeira para a China e para o mundo,

    2000-2010 (milhes de USD) 29 17 Exportaes de madeira da Zmbia para a China e para o mundo, 2000-2010 (milhes de USD) 3018 Valor das exportaes de madeira de Moambique para a China e para o mundo,

    2000-2010 (milhes de USD) 3419 Percentagem das exportaes de madeira no processada para a China, 2001-2010 36 20 Tendncias no comrcio de minerais (excluindo combustveis minerais) com a

    China e com o mundo, 2001-2010 (milhes de USD) 40

    Tabelas1 Estatsticas de florestas e bosques para pases com floresta de miombo 22 O foco geogrfico e de commodities do estudo exploratrio de campo em pases com floresta de miombo 63 Principais variveis relacionadas com as relaes China-frica para os pases com floresta de miombo 84 Participao de commodities nas exportaes por pases com floresta de miomboa 95 Seleo dos pases para o estudo exploratrio no campo 9 6 Setores e commodities com um significante grupo de corporaes chinesas ou presena do mercado chins 207 Distribuio de espcies comerciais de madeira na Zmbia, por provncia 308 Todas as operaes de explorao madeireira nas provncias do Noroeste e Oeste (2010) 319 Florestas produtivas em Moambique, por provncia (Ministry of Finance 2010) 3210 Principais exportaes de metais e minerais do Zimbbue (mil USD) 39

    Quadros1 Tendncias de boas prticas para a assistncia internacional ao desenvolvimento 112 Agncias de crdito exportao e a competitividade das empresas chinesas

    (de German e Wertz-Kanounnikoff, em prep.) 12

  • Abreviaturas

    ACE Agncia de Crdito ExportaoAPD Assistncia Pblica ao DesenvolvimentoCAP Corte Anual PermitidoCATIC Corporao Nacional Chinesa de Aerotecnologia, Importao e ExportaoCCS Fundio de Cobre de Chambishi CEPAGRI Centro de Promoo da Agricultura (Moambique)CGA Associao dos Descaroadores de Algodo (Zimbbue)CJIC Corporao Chinesa Internacional Jiangxi CMAC Corporao Nacional Chinesa de Construo e Maquinaria Agrcola, Importao e

    ExportaoCNMC Companhia Chinesa de Minerao de Metais No Ferrosos CNTC Corporao Nacional Chinesa de TabacoCPI Centro de Promoo de Investimentos (Moambique)CSFAC Corporao Estatal Chinesa de Fazendas e Agronegcio ECZ Conselho Ambiental da ZmbiaEMA Agncia de Gesto Ambiental (Zimbbue)FOCAC Frum de Cooperao China-fricaFRELIMO Frente de Libertao de MoambiqueGDI Golden Driven InvestmentsIED Investimento Estrangeiro Direto MFEZ Zonas Econmicas Multifuncionais (Zmbia)MINAG Ministrio da Agricultura (Moambique)NFCA Companhia Africana de No FerrososNORINCO Corporao Chinesa de Indstrias do NorteODM Objetivos de Desenvolvimento do MilnioOCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento EconmicoRSC Responsabilidade Social CorporativaSINOMA Corporao Industrial Chinesa de Materiais de ConstruoTIMB Conselho da Indstria e do Comrcio do Tabaco (Zimbbue)USD Dlares norte-americanosZAFFICO Corporao Limitada de Silvicultura e Indstrias Florestais da Zmbia ZCCM Minas Consolidadas de Cobre da ZmbiaZCCZ Zona de Cooperao Econmica e Comercial Zmbia-ChinaZCMT Empresa Txtil Mista Zmbia-China de MulungushiZCTF Fora Tarefa de Conservao do ZimbbueZDA Agncia de Desenvolvimento da ZmbiaZESA Companhia de Fornecimento de Eletricidade do Zimbbue ZFU Sindicato dos Agricultores do ZimbbueZMDC Corporao de Desenvolvimento da Minerao do Zimbbue

  • Agradecimentos

    Este documento de trabalho um produto do Projeto Comrcio e investimento chins na frica: avaliando e governando trade-offs para as economias nacionais, meios de subsistncia locais e ecossistemas florestais, gerido pelo CIFOR e implementado em conjunto com o ICRAF-China e pela Universidade de Leipzig. O projeto foi possvel graas a uma doao do Ministrio Federal Alemo para a Cooperao Econmica e Desenvolvimento (Contrato BMZ-GTZ-BEAF n 81121785). Os autores tambm expressam o seu apreo pelas contribuies feitas pelos parceiros do projeto, nomeadamente, o Instituto de Investigao Agrria de Moambique (IIAM) / Plataforma para Investigao Agrria e Inovao Tecnolgica (PIAIT) e a Universidade Eduardo Mondlane (UEM), em Moambique; Universidade Copperbelt na Zmbia, e o Instituto de Estudos Africanos, da Universidade de Leipzig, na Alemanha. Reconhecemos, em particular, o apoio de Mrio Falco na UEM para a orientao para o trabalho de campo e reviso do texto sobre Moambique; Carlos Dominguez e Carmelia

    Chebeia no IIAM/PIAIT por disponibilizar uma casa institucional e pelo muito necessrio apoio logstico; e David Englehardt por fornecer dados para ajudar a orientar a nossa priorizao de mercadorias na regio. Agradecemos, tambm, os diversos indivduos de agncias governamentais (departamentos de silvicultura; ministrios de agricultura, minerao, finanas, indstria e comrcio; a proteo ambiental e as agncias de promoo de investimentos; e alfndegas), embaixadas, organizaes da sociedade civil e de agricultores, organizaes internacionais e a comunidade de pesquisa dos trs pases focais, pelo tempo disponibilizado para compartilhar conosco seus conhecimentos e experincias, mesmo com suas agendas cheias. Agradecemos Andrew Wardell e Louis Putzel pelos excelentes comentrios apresentados em uma verso preliminar deste documento, Jeff Walker pelo seu apoio com o design grfico, e os esforos dos colegas Grupo de Servios de Informao, do CIFOR, por sua assistncia na conduo desta publicao em seus estgios finais.

  • Resumo

    A presena diplomtica e econmica da China na frica tem crescido consideravelmente nos ltimos anos. Desde a criao do Frum de Cooperao China-frica (FOCAC) e os esforos para fortalecer as relaes diplomticas, culturais e econmicas com os pases africanos at o rpido crescimento do Investimento Estrangeiro Direto (IED) e do comrcio bilateral, provvel que essa relao continue a desempenhar um papel determinante na economia da regio. Estas tendncias so importantes para as naes africanas que veem essa relao como uma oportunidade para catalisar investimentos necessrios na infraestrutura e indstria, bem como para estimular a criao de empregos e exportaes. Ao mesmo tempo, no entanto, isso tem levantado preocupaes entre a sociedade civil e os parceiros tradicionais de desenvolvimento, os quais questionam se a transparncia limitada ou as condicionalidades vinculadas aos emprstimos iro prejudicar o desenvolvimento em longo prazo, atravs de um crescente endividamento e a concorrncia com as indstrias africanas, ou por meio da desacelerao dos avanos na rea de governana. A comunidade de pesquisadores tem mostrado um grande interesse nesta dinmica e comeou a lanar luz sobre as suas implicaes para o desenvolvimento econmico no hemisfrio sul1. Uma srie de estudos recentes tambm explora como o crescente setor de processamento de madeira na China est moldando o comrcio mundial de madeira e seus respectivos impactos nos pases fornecedores de madeira2. Contudo, pouca ateno tem sido direcionada para compreender como o crescente comrcio e investimento sino-africano esto impactando as florestas atravs de vetores extrassetoriais (por exemplo, setores de agricultura ou minerao) ou como as tendncias mais amplas na cooperao econmica e diplomtica esto moldando o acesso a recursos e os impactos associados.

    O objetivo deste relatrio e do projeto em que ele est inserido lanar luz sobre este debate, atravs de uma anlise comparativa dos modelos de ajuda,

    1 Jenkins e Edwards (2006); Broadman (2007); Alvarenga (2008); Rotberg (2008); Taylor (2009).2 Mackenzie (2006); Canby et al. (2007); Milledge et al. (2007); Mackenzie e Ribeiro (2009).

    comrcio e investimento com os chineses e outros parceiros de desenvolvimento, e suas implicaes sociais, econmicas e ambientais para os setores-chave (agricultura, silvicultura, minerao) que esto configurando o setor florestal africano. Para esse fim, este relatrio examina as relaes diplomticas e econmicas entre a China e trs pases com florestas de miombo (Moambique, Zmbia e Zimbbue). A nfase colocada sobre a identificao de padres-chave do comrcio e investimento sino-africano em setores de interesse, como um meio de identificar as tendncias importantes para as florestas e explorar temas-chave para investigao em maior profundidade. O relatrio uma sntese daqueles de trs pases: um relatrio sobre Moambique por German e Wertz-Kanounnikoff, um sobre o Zimbbue por Schoneveld e Gumbo e um outro sobre a Zmbia por Schoneveld, German e Gumbo (todos os trs em preparao).

    Como o produto de um estudo exploratrio, este relatrio enfrenta vrias limitaes que devem ser destacadas. Primeiro, o relatrio se baseia fortemente em dados oficiais sobre o comrcio, os investimentos e a cobertura florestal; esses dados variam muito em termos de qualidade e detalhe e, em alguns casos, so de validade questionvel. Por exemplo, as exportaes registradas pelos pases includos nesses estudos de caso muitas vezes contrastam fortemente com os dados de importao chinesa para aquelas mesmas mercadorias. No entanto, utilizamos esses dados e as suas discrepncias para ilustrar as tendncias e as possveis deficincias de governana. Em segundo lugar, como a maior parte dos dados provm de entrevistas com informantes-chave, fontes secundrias e observao pessoal, muitos resultados ainda precisam ser comprovados e estudados em maior detalhe atravs de novas pesquisas. Finalmente, muitos dos entrevistados acharam difcil diferenciar entre empresas estatais e privadas chinesas e empresas sediadas na China, e aquelas que so administradas por pessoas de origem tnica chinesa. Isso gerou alguma confuso na atribuio de determinados comportamentos a determinados conjuntos de atores. Sempre que possvel, so feitos esclarecimentos sobre propriedade estatal versus propriedade privada e sobre a origem da empresa. Contudo, os esforos para realizar tais esclarecimentos foram limitados pela

  • viii Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    disponibilidade de informaes e os esforos para definir isso mais claramente podem ter resultado em algumas imprecises.

    Os resultados sugerem que a ajuda, o investimento, o comrcio e a influncia chineses esto se expandindo rapidamente na regio sul da frica. Enquanto a presena da China na regio remonta s lutas de libertao nos trs pases estudados, a magnitude da cooperao econmica e diplomtica tem crescido consideravelmente nos ltimos anos. A assistncia ao desenvolvimento e o engajamento do setor privado da China na frica situa-se num contexto mais amplo de cooperao econmica e diplomtica consagrada no mbito do Frum de Cooperao China-frica, o Frum para a Cooperao Econmica e Comercial entre a China e os Pases de Lngua Portuguesa (no caso de Moambique) e uma srie de acordos de comrcio bilateral, de proteo de investimentos e de ajuda. A ajuda pblica ao desenvolvimento (APD) da China, para a regio, apresentada cada vez mais na forma de emprstimos ao invs de subsdios, refletindo o desejo do governo chins de distanciar-se de sua condio de doador tradicional em favor de uma cooperao econmica estilo ganhador-ganhador, de carter em grande parte comercial. Nos casos de Moambique e Zmbia, muitos desses emprstimos so preferenciais. Enquanto os laos diplomticos entre a China e o Zimbbue permanecem fortes, a APD chinesa tem sido limitada e os emprstimos esto em condies menos preferenciais do que para qualquer outro pas africano3. O influxo de capital est desempenhando um papel-chave na revitalizao da infraestrutura, do investimento e do comrcio na regio. No entanto, a tendncia de fornecer ajuda baseada em projetos, ao invs de apoio ao oramento geral (e, portanto, mal alinhada com as estratgias nacionais de reduo da pobreza), com limitada aderncia s normas contemporneas sobre emprstimos para o desenvolvimento, a proeminncia da ajuda condicional e a limitada transparncia associadas aos acordos bilaterais4 tm levantado preocupaes sobre a concorrncia com empresas nacionais, sustentabilidade da dvida e as garantias sociais e ambientais.

    3 World Bank (2008).4 A maioria desses acordos bilaterais est na faixa de multimilhes de dlares, mas alguns deles tm valores de vrios bilhes de dlares.

    Ambos os lados tm buscado ativamente o comrcio bilateral. Embora os pases alvo ofeream uma contribuio relativamente pequena s importaes chinesas, a China representa um importante destino comercial para as exportaes regionais. As importaes de produtos chineses na regio so dominadas pelos manufaturados, enquanto as exportaes para a China consistem principalmente em madeira e produtos madeireiros (Moambique), metais (Zmbia e Zimbbue) e produtos agrcolas (todos os pases). O IED chins, estimulado pela estratgia da China de Going out (Indo para fora ou ao global, igualmente significativo, principalmente nos setores de construo e minerao. Em Moambique, com os interesses do Estado chins e da iniciativa privada em apenas duas concesses de minerao avaliadas em 835 milhes de dlares e com muitas licenas de prospeco nas mos de empresas chinesas, claramente a minerao est recebendo a maior parte do capital de investimento. O mesmo verdade para a Zmbia, onde 98% do IED empenhados por empresas chinesas esto destinados aos setores de minerao e manufatura. Megainvestimentos em minerao de cobre no pas deram China uma quota de 44% do IED total empenhados desde 2000. Recentes investimentos Chineses no Zimbbue so muito menores, com o IED chins, representando menos de 4% do IED total do pas, em 2008.

    A presena de empresas chinesas no setor agrcola varia entre os pases, com uma presena muito forte de empresas privadas chinesas em contratos de cultura de algodo e tabaco no Zimbbue, e uma presena mais modesta das empresas privadas e estatais na produo de algodo e pinho-manso na Zmbia. No entanto, os mercados chineses tm um papel determinante no comrcio agrcola em todos os pases, particularmente para gergelim (no caso de Moambique), tabaco (Zmbia e Zimbbue) e algodo (Zimbbue). Mais pesquisas so necessrias para avaliar os impactos socioeconmicos e ecolgicos associados presena chinesa nesse setor. O tabaco de particular interesse, devido s ligaes histricas entre a secagem do tabaco e o desmatamento na regio; a falta de interesse registrada entre as empresas chinesas de tabaco no Zimbbue para a adoo de prticas que visam a reduzir esse impacto; e os benefcios econmicos associados capacidade de uma empresa chinesa de oferecer preos acima do mercado para os agricultores do Zimbbue. H tambm uma indicao de que o florescente comrcio de gergelim com a China tem gerado um

  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas ix

    impacto favorvel sobre os modos de subsistncia dos pequenos agricultores (como evidenciado pela substituio generalizada do algodo por esta cultura). Contudo, isso tambm poderia ter um impacto negativo sobre as florestas, se as alegaes sobre a susceptibilidade s pragas e a necessidade de que mudanas frequentes para novas reas agrcolas sejam feitas fossem verdadeiras. Em todos os pases, ainda difcil tirar concluses neste momento sobre se as prticas de trabalho, produo e meio ambiente variam entre empresas chinesas e no chinesas. As empresas chinesas tambm possuem dois dos maiores investimentos de biocombustveis na regio, com 79.300 ha recentemente assegurados por uma empresa estatal na Zmbia e 20.870 ha em Moambique. Embora seja certo que isso causa a converso de florestas, esses impactos provavelmente resultaro de esforos do pas anfitrio para canalizar investimentos para reas menos densamente povoadas do pas e poderiam tambm fazer parte de muitos empreendimentos no chineses.

    No setor florestal, as empresas e mercados chineses tm uma presena claramente definida em Moambique e, em menor medida, na Zmbia. A participao da China nas exportaes de madeira de Moambique aumentou consideravelmente, de 10% em 2001 at 82% ao final da dcada, de acordo com estatsticas oficiais. O valor do comrcio de madeira sino-moambicano atingiu 134 milhes de dlares norte-americanos em 2010. Enquanto muitos investidores de grande escala entraram recentemente em Moambique para investir em plantaes de madeira, a presena de empresas e mercados chineses s vista em madeira extrada de florestas nativas. O valor das importaes de madeira de Moambique relatado pela China excede em muito o valor das exportaes relatado por Moambique para todos os seus parceiros comerciais, sugerindo uma perda significativa na receita fiscal no comrcio com a China no perodo de 2001-2010, da ordem de 361 milhes de dlares norte-americanos. Os dados tambm mostram nveis elevados de exportao de toras no processadas (de 100% a 83% no perodo 2001-2007), apesar das polticas oficiais para promover o processamento antes da exportao. A proibio de exportao de toras, implementada em 2007, parece ter reduzido a proporo de toras no processadas nas exportaes. No entanto, o declnio sugerido pelos dados de importaes chinesas muito mais sutil do que o indicado pelos dados relatados por Moambique: os dados anteriores sugerem que 76% das exportaes para a China so de toras no

    processadas. Alm disso, quase 100% das exportaes classificadas como toras processadas referem-se a produtos minimamente processados, o que sugere uma conquista muito limitada em face dos objetivos da poltica oficial. Irregularidades nas operaes das concessionrias e comerciantes, tanto de origem chinesa quanto moambicana, apontam fraquezas significativas na aplicao da lei. Na Zmbia, as empresas chinesas tm 25% das licenas de concesso e empresas operadas por pessoal de origem tnica chinesa, taiwanesa e sul-africana estavam envolvidas no comrcio de madeira todos exportando para seus respectivos pases. Com grandes reas de concesso, registros de volumes de exportao muito baixos e um mercado domstico de madeira deprimido, foram levantadas preocupaes sobre o destino da madeira da Zmbia. Enquanto os operadores chineses estavam ativamente envolvidos com serradores artesanais de pequena escala e detentores de licena simples nos dois pases, a singularidade deste nicho econmico e os respectivos impactos sociais e ambientais ainda precisam ser confirmados.

    O comrcio sino-africano de minerao relacionado com as exportaes foi significativo para a Zmbia e o Zimbbue, com o cobre e cromo sendo as exportaes primrias, respectivamente. A presena mais notvel acontece na Zmbia, onde as injees de capital chins no setor de minerao em perodos de incerteza econmica tm ajudado a recuperar empregos e a estabilizar a balana comercial. A China o segundo maior importador de cobre da Zmbia e a estatal Companhia Chinesa de Minerao de Metais No Ferrosos (CNMC) adquiriu uma participao de 85% na mina de cobre Chambishi em 1998. Em 2008, os governos da China e da Zmbia assinaram um acordo para desenvolverem a primeira Zona Econmica de Multiempreendimentos da Zmbia, em Chambishi, a qual se espera que abrigue seis diferentes subindstrias de minerao. As principais preocupaes relacionadas aos investimentos chineses no setor foram associadas com as relaes precrias de trabalho, o deslocamento de comunidades sem qualquer compensao e incentivos excessivamente generosos, deteriorando a capacidade do pas para beneficiar-se de seus recursos atravs de investimentos privados. Todavia, muitas dessas preocupaes foram levantadas com relao ao setor privado em vez de empresas estatais. No Zimbbue, os investimentos chineses no processamento de cromo permitiram que uma indstria bastante afetada pelos baixos preos internacionais pudesse recuperar-se rapidamente. Um grande nmero de pequenos processadores de

  • x Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    cromo de origem tnica chinesa tambm compra minrio de cromita extrado ilegalmente, permitindo que mineiros artesanais superem as barreiras para a entrada no mercado formal, mas causando um surto de minerao ilegal de cromo. Os resultados tambm mostram que o Zimbbue estava hipotecando muitos de seus ativos de minerao para empresas chinesas como garantia assistncia ao desenvolvimento e emprstimos chineses, levantando preocupaes de que o Zimbbue poderia perder o controle sobre seus valiosos recursos em termos de no se verem benefcios lquidos ao longo prazo. Em Moambique, os investidores estrangeiros tiveram uma presena muito limitada no setor de minerao at muito recentemente, quando o pas iniciou uma srie de reformas para atrair investimentos para o setor. A recente descoberta de um enorme depsito de carvo levou a uma srie de investimentos de grande escala, com uma empresa estatal chinesa, assegurando a propriedade de 40% do Projeto de Carvo de Zambzia, com valor estimado de 2 bilhes de dlares norte-americanos e uma reserva de 9 bilhes de toneladas de carvo. Embora esta seja uma das poucas concesses chinesas, tem havido uma recente onda de licenas para prospeco, muitas das quais por empresas privadas chinesas. Mais pesquisas so necessrias para avaliar at que ponto as prticas empresariais variam pelo pas de origem e os respectivos impactos sociais e ecolgicos.

    O panorama apresentado acima destaca uma srie de prioridades para futuras pesquisas. A relao estabelecida entre o comrcio chins e as florestas, as fracas evidncias de prticas diferenciadas entre

    empresas e um claro desafio poltico relacionado ao aumento do investimento interno e adio de valor fazem com que mais pesquisas sobre o setor de madeira em Moambique sejam uma clara prioridade. Esta pesquisa teria como objetivo fazer uma avaliao equilibrada dos impactos econmicos e ecolgicos dos dois principais modelos de explorao no setor florestal (concesses versus licenas simples), das diferenas entre empresas dentro de cada modelo e o nvel de participao em cada modelo por empresas e atores procedentes de diferentes pases. Deste modo, contribuiria para a identificao de oportunidades e barreiras para alcanar os objetivos do setor de um modo geral e, em particular, atravs do modelo de concesso. Um segundo tema de destaque para futuras pesquisas refere-se tendncia observada entre comerciantes de origem chinesa de envolver pequenos operadores em todos os setores (produtores de algodo e tabaco, mineiros artesanais de cromo, serradores artesanais de pequena escala), em ambos os setores formal e informal. Atravs de uma avaliao comparativa entre pelo menos dois setores, a pesquisa buscaria estabelecer a singularidade desse nicho econmico e identificar os impactos ecolgicos e sociais associados a ele. Um olhar mais amplo para o papel da diplomacia bilateral chinesa na formatao das condies enfrentadas pelos operadores econmicos nos pases estudados tambm de interesse, principalmente as implicaes dos acordos de alto nvel e do financiamento pelo setor pblico s empresas privadas que operam no exterior para o posicionamento econmico de empresas chinesas e suas implicaes para as florestas.

  • 1.1 Evoluo da ajuda, comrcio e investimento chins na frica

    O comrcio africano est sendo reorientado rapidamente do Hemisfrio Norte para o Hemisfrio Leste (Carmody e Owusu 2007). O comrcio da China com a frica explodiu nos ltimos anos enquanto a demanda de importaes subiu para abastecer o setor industrial em rpida expanso, transformando a China no terceiro maior parceiro comercial da frica (Rico 2007). A China tornou-se tambm uma importante fonte de Investimento Estrangeiro Direto (IED) e apoio ao desenvolvimento, com os investimentos de empresas estatais e privadas, aumentando rapidamente devido a programas de apoio do governo (Asche e Schller 2008). Isso tem alimentado uma nova simbiose entre a frica e a China, com a demanda da China de matrias-primas, respondendo a oferta relativamente abundante de energia, minerais, madeira e terra, e a crescente demanda na frica de produtos manufaturados chineses (Rotberg 2008). Durante a recente crise financeira, as atividades econmicas e os investimentos chineses mantiveram-se robustos, mesmo que muitas empresas tenham reduzido suas operaes. O comrcio e investimento em madeira, cultivos agrcolas comerciais e biocombustveis j representam desafios para a sustentabilidade da floresta (Canby et al. 2007, Milledge et al. 2007, German et al. 2010, Mandondo e German 2011). Essa simbiose frica-China poderia, portanto, ser a construo da frica, atravs da criao de postos de trabalho, zonas de processamento de exportao e investimentos em educao e infraestrutura, ou poderia prejudicar o desenvolvimento em longo prazo atravs de mo de obra importada, concorrncia com produtos africanos, esgotamento de recursos e pela desacelerao de avanos na governana (Rotberg2008).

    O papel da China na frica de interesse por causa de mudanas no apenas de grau (percentagem do comrcio com diferentes regies do mundo, volume de comrcio), mas tambm de tipo. Tais caractersticas, que colocam a China parte de outros parceiros de desenvolvimento, incluem: (1) uma abordagem colaborativa para a poltica externa entre estado e empresa, permitindo que as

    empresas chinesas suportem os riscos que dificultam o investimento por outros atores (Edinger 2008); (2) a limitada transparncia das negociaes de alto nvel, envolvendo ajuda externa, comrcio e investimento (Huse e Muyakwa 2008); e (3) uma poltica sem perguntas sobre termos e condies de emprstimos para o desenvolvimento visto com bons olhos pelos lderes africanos interessados em maximizar a autodeterminao e minimizar as barreiras comerciais no tarifrias, mas que tem o efeito de afrouxar as salvaguardas sociais e ambientais (BIC 2006). As empresas chinesas tm sido criticadas por violaes de normas anticorrupo, ambientais, trabalhistas e sociais na frica (Asche e Schuller 2008), levantando preocupaes sobre a sustentabilidade de atividades extrativas (de Wit 2007). No entanto, as anlises anteriores das contribuies de investimentos chineses para o desenvolvimento econmico de longo prazo na frica sugerem um alto grau de variao entre os setores, no conseguem tirar concluses claras sobre os impactos no bem-estar a partir de dados existentes (Asche e Schller 2008) ou analisar os impactos sociais e ambientais locais sem uma considerao equilibrada dos benefcios sociais (White et al. 2006). Pesquisas adicionais so claramente necessrias para esclarecer o papel da China em moldar as perspectivas de desenvolvimento em longo prazo na regio.

    1.2 As caractersticas e a importncia das florestas e bosques da frica Austral para os meios de subsistnciaFlorestas e bosques cobrem reas significativas em todo o sul da frica, estimadas em 67% em 2005, segundo as estatsticas oficiais (Tabela1). Os bosques de miombo so o tipo de floresta predominante e a mais extensa formao de bosques tropicais estacionais e de florestas secas na frica, que abrange cerca de 2,4 milhes de km (World Bank 2008: 1). Com uma estimativa de 8.500 espcies de plantas superiores e 54% de endemismo de plantas, a importncia dos bosques para a conservao da biodiversidade global bem conhecida.

    Igualmente significativa a importncia do miombo para os meios de subsistncia local. A regio

    1. Contexto e justificativa

  • 2 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    habitada por cerca de 75 milhes de pessoas e um adicional de 25 milhes de residentes urbanos depende de lenha ou carvo vegetal provenientes dessas florestas para suprir suas necessidades de energia (Campbell et al. 2003, Kambewa et al. 2007, SEI 2002, citado em World Bank 2008). Quando as oportunidades no agrcolas so limitadas, at um tero do consumo das famlias pode vir de florestas secas. Elas tambm oferecem importantes oportunidades para a gerao da extremamente necessria renda monetria, atravs da venda de mel, cogumelos, lagartas, carvo e outros produtos florestais e fornecem importantes fluxos de renda na estao seca. Os bosques de miombo tambm so conhecidos por oferecerem uma importante rede de segurana ao impedir que as famlias se afundem mais ainda na pobreza, particularmente em tempos de perda de colheita ou choques domsticos e, portanto, desempenham um papel na reduo da vulnerabilidade das populaes pobres das zonas rurais (Shackleton 2006, Shackleton et al. 2007, World Bank 2008). Os meios de subsistncia de base florestal, formais e informais, tambm tm

    ajudado algumas famlias a sarem da pobreza (Shackleton2005).

    1.3 Escopo da anlise

    Este relatrio, e o projeto mais amplo no qual ele est inserido, busca compreender o que nico sobre as relaes comerciais da frica com a China no setor florestal e em outros setores que moldam as florestas e como as tendncias do comrcio e do investimento relacionadas com as florestas afetam os ecossistemas florestais-chave. O presente relatrio, derivado da anlise de fontes secundrias e um rpido estudo exploratrio em trs pases da frica Austral (Moambique, Zmbia, Zimbbue) (German e Wertz-Kanounnikoff em prep.; Schoneveld e Gumbo em prep.; Schoneveld et al. em prep.), procura caracterizar a relao diplomtica e econmica bilateral; analisar tendncias do comrcio e do investimento sino-africano nos setores agrcola, de silvicultura e minerao; e identificar temas-chave para uma pesquisa mais aprofundada.

    Tabela1. Estatsticas de florestas e bosques para pases com floresta de miombo

    Pas Cobertura florestal em 2010 (mil ha)

    Outras reas florestais em 2010

    (mil ha)

    Cobertura de florestas e outras

    reas florestais (%)

    Taxa de desmatamento 1990-2010 (%)

    Angola 58.480 0 46,9 0,20%

    DR Congo 154.135 11.513 70,6 0,19%

    Malaui 3.237 0 27,3 0,85%

    Moambique 39.022 14.566 67,0 0,50%

    Tanznia 33.428 11.619 47,6 0,97%

    Zmbia 49.468 6.075 73,8 0,32%

    Zimbbue 15.624 0 40,0 1,48%

    Fonte: FAO 2010, Mongabay, disponvel em http://rainforests.mongabay.com/deforestation_alpha.html (30 de novembro de 2011)

  • 2. Objetivos

    O principal objetivo deste exerccio exploratrio foi ganhar uma compreenso dos padres do comrcio e investimento chins nas florestas de miombo, os impactos e trade-offs do comrcio e investimento chins em setores prioritrios e das estruturas legais e institucionais que moldam esses impactos. Os objetivos secundrios so os seguintes:1. identificar pases e commodities em cada

    ecorregio (Bacia do Congo, florestas de miombo), sobre os quais o governo e o setor privado chins tm maior influncia, de modo a

    permitir a seleo estratgica de estudos de caso para uma anlise mais aprofundada;

    2. realizar uma avaliao preliminar dos impactos e trade-offs do comrcio e investimento chins em pases prioritrios, setores (agricultura, silvicultura, minerao) e commodities ; e

    3. identificar pases e commodities especficos para uma anlise mais aprofundada nas fases subsequentes da pesquisa e justificar essasescolhas.

  • As seguintes perguntas orientaram o estudo exploratrio.1. Em quais pases da ecorregio de miombo

    o governo e as empresas chinesas tm maior influncia econmica e poltica e por qu?

    2. Quais setores econmicos recebem a maior parte dos investimentos do governo ou do setor privado chins?

    3. Com quais commodities o governo e as empresas chinesas tm maior envolvimento e quo importante a influncia dessas commodities para os pases da regio?

    4. Quais so as caractersticas dos investimentos chineses, atuais e planejados, em setores de interesse (agricultura, silvicultura, minerao)? Quais commodities so importantes para a pesquisa, tanto em termos de comrcio e investimento chins como por seus impactos potenciais nas florestas?

    5. Qual a natureza da participao chinesa (e, sempre que possvel, no chinesa) em setores selecionados e/ou stios de campo para commodities de interesse: Quais so os atuais nveis de investimento

    e comrcio chins para as commodities deinteresse?

    Quem so os atores corporativos envolvidos na produo ou extrao de cada commodity e onde suas atividades esto localizadas ?

    At que ponto as diferenas nas prticas de negcios entre operadores chineses e no chineses podem ser discernidas?

    6. Que tipo de impactos sociais, econmicos e ambientais locais podem ser observados a partir de relatrios publicados e um estudo exploratrio rpido baseado em atividades de campo sobre investimentos/concesses chineses selecionados, para commodities de interesse? Um desmatamento ou degradao florestal significativo, causado a partir desses investimentos, atualmente observado ou antecipado, com base nos planos de expanso das empresas?

    7. Quais condies de governana moldam atualmente as prticas corporativas e de IED, bem como os impactos sociais e ambientais relacionados?

    8. Como os principais especialistas avaliam os trade-offs (benefcios e custos sociais) dos investimentos chineses e no chineses sobre commodities ou setores de interesse?

    3. Questes da pesquisa

  • 4. Metodologia

    A metodologia empregada para a fase exploratria foi adaptada de acordo com as etapas mais importantes da pesquisa.

    4.1 Seleo de pases para o estudo exploratrio

    A primeira etapa da fase exploratria, a qual se concentrou na identificao dos pases e commodities sobre os quais o governo e o setor privado chineses tm maior influncia, foi desenvolvida exclusivamente com base na reviso da literatura publicada e de fontes secundrias. Os pases considerados nesta fase como candidatos para uma pesquisa mais aprofundada incluram Moambique, Tanznia, Zmbia e Zimbbue. Para comear a entender as tendncias do comrcio, investimento e influncia chinesa e para afunilar ainda mais o foco exploratrio sobre pases e commodities, objetivando o estudo nos pases, foram realizadas pesquisas online em bancos de dados globais, relatrios da sociedade civil, notas de imprensa, relatrios da indstria e a literatura publicada. A coleta de dados concentrou-se no(a)(s): Proporo do total do comrcio com a China

    (para todos os pases sob considerao dentro de cada ecorregio);

    Commodities primrias exportadas para a China e a proporo do comrcio total dessa commodity que destinada para a China (para todos os pases sob considerao dentro de cada ecorregio);

    Total de cobertura florestal e taxas de desmatamento (para todos os pases sob considerao dentro de cada ecorregio);

    Acordos chave assinados entre a China e os pases africanos de interesse, incluindo o tipo de contrato (por exemplo, comrcio, ajuda, alvio da dvida, investimento, acordos de contratao ou pacotes em oferta), os valores e os setores envolvidos; e

    Localizao e natureza dos investimentos ou mega negcios chineses, atuais e planejados, incluindo o(s) setor (es) e commodity(ies), os valores e atores corporativos-chave.

    4.2 Metodologia do estudo exploratrio

    A segunda etapa do estudo exploratrio consistiu em uma explorao no nvel nacional para identificar: (1) commodities com maior impacto sobre as florestas onde empresas estatais ou privadas chinesas tm uma presena notvel; e (2) estudos de casos especficos para uma anlise mais aprofundada. Essa etapa foi conduzida em trs dos pases que tm floresta de miombo: Moambique, Zmbia e Zimbbue (Figura1). As razes para essa escolha so apresentadas na seo dos resultados.

    Essa etapa envolveu duas metodologias. A primeira, contando exclusivamente com entrevistas com informantes-chave nas capitais e uma reviso dos documentos adquiridos atravs dessas interaes, com o objetivo de capturar as principais questes e tendncias relacionadas com a cooperao econmica e diplomtica chinesa com o pas de interesse, bem como compromissos do setor privado com setores de interesse (silvicultura, minerao,

    Figura1. frica Austral, com a distribuio aproximada das florestas de miombo e os pases focados no estudo exploratrio no campoFonte: Jeff Walker; distribuio das florestas de miombo do World Bank (2008)

  • 6 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    agricultura). Entrevistas com informantes-chave foram realizadas com representantes de vrias agncias governamentais, incluindo agncias de promoo de investimento, ministrios de terras, agncias de proteo ambiental, ministrios setoriais fundamentais (agricultura, minerao), agncias florestais e, em alguns casos, os ministrios de comrcio e finanas. Entrevistas tambm foram realizadas com vrias embaixadas (chinesa, de outras economias emergentes e pases da OCDE), organizaes da sociedade civil, organizaes de pesquisa e empresas privadas.

    O segundo componente-chave, assumindo um foco subnacional, teve como objetivo verificar as principais observaes a partir de entrevistas em nvel nacional; explorar a natureza dos impactos das commodities selecionadas e os modelos de negcios sobre as florestas; e identificar questes prioritrias e as caractersticas do projeto de pesquisa para uma investigao mais aprofundada. A metodologia consistiu em entrevistas com informantes-chave, como agncias governamentais, organizaes da sociedade civil e atores do setor privado em capitais de provncia ou distrito; reviso de dados ou relatrios obtidos de informantes-chave; e rpidas visitas de campo em reas onde investimentos esto

    sendo realizados ou onde a influncia do comrcio se faz sentir, para falar com os lderes comunitrios e as famlias afetadas. Devido a limitaes de tempo e recursos, o estudo exploratrio focou-se apenas em algumas commodities consideradas como mais interessantes do ponto de vista do comrcio e investimento chins e seus impactos potenciais sobre as florestas (Tabela2). As limitaes de recursos tambm afetaram a nossa capacidade de aplicar protocolos para amostragem sistemtica, o que limita a extenso na qual os resultados de estudo exploratrio baseado em informaes de campo podem ser generalizados.

    Em alguns casos, entrevistas em nvel nacional descartaram por completo determinados setores ou commodities, fazendo com que o estudo de campo no fosse necessrio. Em outras ocasies, casos potencialmente interessantes no foram conduzidos atravs de trabalho de campo durante o estudo exploratrio no pas devido aos prazos e natureza seletiva desse levantamento de campo. Isso aplica para o tabaco do Zimbbue, o gergelim em Moambique e o algodo na Zmbia e no Zimbbue. Esses casos sero considerados para incluso em uma fase posterior do projeto.

    Tabela2. O foco geogrfico e de commodities do estudo exploratrio de campo em pases com floresta de miombo

    Pas Setor

    Agricultura Silvicultura Minerao

    Moambique O investimento e comrcio chins no setor florestal na Provncia de Cabo Delgado

    Zmbia O investimento e o comrcio chins no setor florestal nas provncias do Oeste e Noroeste

    Os investimentos chineses em minerao de cobre na Provncia de Copperbelt

    Zimbbue O investimento chins em minerao de cromo no sul de Great Dyke

  • 5. Resultados

    Os resultados so apresentados de acordo com as fases fundamentais da pesquisa.

    5.1 Fase 1: Seleo de pases e commodities

    5.1.1 Seleo dos pasesResultados relacionados s variveis-chave de interesse para seleo do pas encontram-se resumidos na Tabela3 para os pases com floresta de miombo que esto sendo considerados. Com base nesses nmeros, a Zmbia foi uma opo clara por causa dos altos nveis de dependncia do comrcio e investimento chins, recentes investimentos chineses em zonas econmicas multissetoriais e infraestrutura e evidncia de preocupaes da sociedade civil sobre a influncia chinesa. Moambique tambm foi considerado estratgico por causa de seu alto nvel de cobertura florestal e pela importncia do comrcio de madeira em geral e com a China, incluindo vrios relatrios publicados sobre o assunto (Mackenzie 2006, Mackenzie e Ribeiro 2009, Ribeiro e Nhabanga 2009). Enquanto a Tanznia poderia ter sido escolhida devido ao seu elevado volume comercial com a China e a importncia da madeira chinesa (Milledge et al. 2007), o Zimbbue foi selecionado por causa da importncia do comrcio de tabaco e do vnculo deste cultivo com o desmatamento na regio.

    5.1.2 Seleo de commoditiesDada a dificuldade para estabelecer a relao entre determinadas commodities e o desmatamento devido falta de visitas de reconhecimento no campo, foi tomada a deciso de deixar a identificao exata de commodities para o estudo exploratrio no campo. No entanto, decidiu-se realizar o estudo exploratrio do pas em cada ecorregio em trs setores, cada um dos quais tem ligaes comprovadas com o desmatamento: silvicultura, minerao e agricultura. Para identificar as commodities que deveriam ser consideradas no estudo exploratrio em cada pas, foram coletados dados adicionais. Esses dados e a racionalidade para a seleo de uma longa lista de commodities nessa fase so apresentados abaixo.

    Os dados sobre as commodities primrias negociadas por pas e a proporo chinesa de exportao desses produtos para pases com floresta de miombo prioritrios, so apresentados na Tabela4. Os dados representam o que de mais atualizado estava disponvel no momento em que este estudo foi conduzido.

    Com base nos dados das Tabelas2 e 3, um conjunto de commodities por setor foi selecionado para estudo exploratrio no campo, para pases com floresta de miombo prioritrios. Essas commodities so apresentadas resumidamente na Tabela5.

    5.2 Fase II: estudo exploratrio nospases

    Os resultados do estudo exploratrio nos pases esto divididos conforme os principais tipos de influncia (ajuda, comrcio e investimento) e os setores prioritrios em anlise.

    5.2.1 Relaes sino-africanas na frica Austral: ajuda, diplomacia e influncia poltica

    Relaes diplomticas sino-africanas na frica Austral no so novas. A Repblica Popular da China (RPC) e outros pases comunistas apoiaram as lutas para libertao em toda a regio e o governo chins continua enfatizando o apoio oferecido pelos pases da regio para ajudar a recuperar o lugar da China nas Naes Unidas em 19725. No entanto, aps um lapso em que seu olhar ficou relativamente voltado para as reformas polticas e econmicas internas, a ajuda e influncia poltica chinesa na regio tm aumentado especialmente desde o incio da dcada de 2000 quando o sistema de cooperao internacional foi esquematizado e avanou atravs do Frum de Cooperao China-frica: O enorme mercado da China e sua crescente capacidade de

    5 Ver Youde (2007); http://zm.chineseembassy.org/eng/zxxx/t780872.htm; http://www.isn.ethz.ch/isn/Current-Affairs/Security-Watch/Detail/?id=53470&lng=en (24 de fevereiro de2011).

  • 8 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    Tabela3. Principais variveis relacionadas com as relaes China-frica para os pases com floresta de miombo

    Varivel Moambique Tanznia Zmbia ZimbbueDependncia do comrcio chinsa (2008)

    4,7% 6,5% 10,3% 8,8%

    Comrcio total com a China (milhes de USD, 2008)b

    423 1.072 801 280

    Principais commodities exportadas para a China (% do total de exportaes para a China, 2008)c

    Madeira(38%), alumnio (37%), sementes de gergelim (31%)

    Minrios de metais preciosos (36%), minrios de cobre (29%), sementes de gergelim (20%)

    Cobre (64%), minrio de cobre (20%), tabaco (4%)

    Tabaco (67%), ferro (19%)

    Dependncia de investimento atual (% volume do IED chins sobre o volume total de IED)d

    1,1% 2,8% 7,6% 3,9%

    Principais investimentos planejados

    A China o segundo maior investidor em Moambique, com investimentos estimados em USD76,8 milhes, em 2009, grande parte dos quais foram direcionados a projetos de alta visibilidade, como o Estdio Nacional, prdios governamentais e ampliao de aeroportoe.

    Desenvolvimento de duas zonas econmicas especiais; 90% de licitaes para obras de infraestrutura vencidas pelos chineses.

    Zona Econmica Multifuncional de Chambishi, em operaof.

    Empresas chinesas respondem por cerca de 5% da produo total de cobre na Zmbia.

    O grupo de minerao Zhougui empenhou USD5 bilhes para minerao na Zmbia (o maior investimento privado)g.

    Investimento de USD3 bilhes em pinho-manso atravs de empreendimento conjunto (Wuhan-Biomassa PLC).

    Investimentos de USD8 bilhes em minerao, energia, habitaoh.

    Cobertura florestal (2008)i

    57% 45% 44% 24%

    Variao anual da cobertura florestal (2000-2005)j

    -0,3%

    (5.000 ha)

    -1,1%

    (412.200 ha)

    -1,0%

    (444.800 ha)

    -1,6%

    (313.000 ha)

    a UM Comtrade b Inclui exportaes e importaes.c UN Comtraded MOFCOM, 2010; UNCTADe Ver: http://www.clubofmozambique.com/pt/sectionnews.php?secao=investimento&id=14987&tipo=one; http://www.portaldogoverno.gov.mz/noticias/news_folder_econom_neg/julho2008/nots_en_357_jul_08/. So mencionados novos parques industriais com elemento agroindustrial e de minerao (Dondo, Nacala) com relao a novos investimentos chineses. f O FMI manifestou preocupao com as condies de investimento estabelecidas para as empresas chinesas entrando na zona econmica, criada em 2005, e j uma fonte de grande conflito entre trabalhadores, comunidades e investidores chineses. Ver: IMF anxious about Chambishi economic zone?, Disponvel em: http://www.minewatchzambia.com/2007/04/imf-anxious-about-chambishi-economic_03.html (5 de maio de 2010).g Agncia de Desenvolvimento da Zmbia (ZDA 2010).h A empresa chinesa Sonangol (empreendimento conjunto sino-angolano) est supostamente interessada em investir no refinamento de ouro e platina, explorao de petrleo e gs, aquisio e distribuio de combustveis e habitao. Comenta-se que os fundos j chegaram a instituies financeiras nacionais (ver: US$8 billion Chinese investment in Zimbabwe, disponvel em: http://beta.miningreview.com/node/16779, 5 de maio de 2010).i FAOSTATj Ver: http://rainforests.mongabay.com/deforestation/2000/Zimbbue.htm.

    http://rainforests.mongabay.com/deforestation/2000/Zimbbue.htm
  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas 9

    Tabela4. Participao de commodities nas exportaes por pases com floresta de miomboa

    Varivel Moambiqueb,c Zmbia Zimbbue

    Principais commodities exportadas para a China (dados de 2009)

    Madeira (38%), alumnio (37%), sementes de gergelim (31%)

    Cobre (64%), minrio de cobre (20%), tabaco (4%)

    Tabaco (67%), ferro (19%)

    Principais commodities exportadas para o mundo (dados de 2008)

    Alumnio (54%), leo (11%), tabaco (8%)

    Cobre (65%), minrio de cobre (15%), metais de base (6%)

    Plantas vivas (12%), nquel (10%), algodo (9%), tabaco (7%)

    Participao chinesa nas exportaes de commodities, % (dados de 2008)

    Alumnio 0* 0 0

    Cromo 0 0 59,9

    Cobre 0 6,3 0

    Minrio de cobre Sem comrcio 5,7 0

    Algodo 0,6 26,5 6,2

    Ferro 5,3 0 0,2

    Sementes de gergelim 57,6 Sem comrcio Sem comrcio

    Tabaco 0 2,0 9,3

    Madeira 80,2 12,3 0,4a UN Comtradeb No momento da elaborao deste relatrio preliminar, esses dados ainda no estavam disponveis para 2009, somente para2008.c Evidncias de extrao ilegal de madeira nas provncias de Zambzia, Cabo Delgado, Nampula e Niassa suportam a importncia da madeira como commodity a ser explorada, enquanto o recente aumento das exportaes de sementes de oleaginosas e cromo sugere que esses produtos tambm devem ser examinados (http:// www.clubofmozambique.com/pt/sectionnews.php?secao=investimento&id=14987&tipo=one, 14 de dezembro de 2011). Evidncias de um aumento radical nas exportaes para a China tambm devem ser observadas (ver: http://www.portaldogoverno.gov.mz/noticias/news_folder_econom_neg/julho2008/nots_en_357_jul_08/, 14 de dezembro de 2011).

    Tabela5. Seleo dos pases para o estudo exploratrio no campo

    Pas Silvicultura Minerao Agricultura

    Zmbia Madeira Cobre, minrio de cobre Tabaco, pinho-manso, algodo

    Zimbbue Cromo Tabaco, algodo

    Moambique Madeira Alumnio Gergelim

    investir no exterior tambm est suprindo Pequim com novas fontes de poder poltico com as quais alcanar os grandes objetivos estratgicos do pas, incluindo a necessidade de garantir recursos naturais e matrias-primas para alimentar sua crescente economia. (Friedberg 2006: 6). Com um supervit em conta corrente de USD253,3 bilhes em 2009, a China tem sido capaz de alcanar uma reserva cambial de USD2,3 trilhes, a maior do mundo. Enquanto cerca da metade dessa reserva est sendo aplicada em ttulos dos EUA, uma quantidade considervel est sendo investida em posicionamento geoestratgico para garantir independncia energtica

    e ajuda externa a outros pases em desenvolvimento (Ilheu 2010: 4). A capacidade financeira da China, juntamente com o que foi chamado de abordagem colaborativa entre o Estado e empresas para a poltica externa (Edinger 2008), expandiu rapidamente a ajuda pblica ao desenvolvimento (APD) para pases africanos, bem como a presena de empresas chinesas no comrcio sino-africano, no IED e licitaes pblicas para infraestrutura (Luo et al. 2010). Esta seo fornece um breve resumo da assistncia e das relaes diplomticas chinesas com os trs pases deinteresse.

  • 10 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    Moambique As relaes sino-moambicanas tm uma longa histria, que remonta luta de Moambique para sua independncia de Portugal, quando a Repblica Popular da China forneceu apoio para o treinamento de guerrilha, equipamento militar e apoio financeiro para a Frente de Libertao de Moambique (FRELIMO) (Chichava 2008). Logo aps a independncia de Moambique em 1975, os dois pases estabeleceram relaes diplomticas, mantidas intactas durante a guerra civil de 1977-1992, as quais foram intensificadas desde o acordo de paz em 1992 (Jansson e Kiala 2009). Aps o fim da guerra, as empresas chinesas estavam entre as primeiras a reentrar no pas, entre as quais empresas de construo e comerciantes de madeira.

    Em 2008, a China tornou-se o segundo maior investidor estrangeiro em Moambique, depois da frica do Sul, com investimentos no valor de USD76,8 milhes (Jansson e Kiala 2009). Uma srie de acordos bilaterais tem apoiado a consolidao da influncia chinesa em Moambique (Jansson e Kiala 2009). Esses situam-se em um quadromais amplo para a cooperao China-frica sob o FOCAC, atravs do qual os acordos de proteo de investimentos e comrcio bilateral, o tratamento de iseno de impostos e de alvio da dvida esto sendo estendidos por todo o continente. A cooperao econmica sino-moambicana tambm apoiada pelo Frum para a Cooperao Econmica e Comercial entre a China e os Pases de Lngua Portuguesa.

    A ajuda externa da China para Moambique consiste em emprstimos preferenciais e sem juros, investimentos diretos em comrcio e servios, acordos tcnicos, cancelamento da dvida e alvio de emergncia (AFRODAD 20076). Embora as doaes e os emprstimos sejam semelhantes em nmero, volumes muito maiores de ajuda vm na forma de emprstimos concessionais, a maioria deles do Eximbank da China (German e Wertz-Kanounnikoff em prep.). De acordo com o escritrio do Conselheiro Econmico e Comercial da Embaixada da China em Maputo, a cooperao bilateral entre a China e Moambique redirecionou-se da ajuda para a cooperao baseada no setor privado e em parcerias de interesse mtuo. Uma parte significativa desses recursos direcionada para infraestrutura,

    6 Tambm corroborado por entrevista do CIFOR com funcionrios da Embaixada da China em Maputo, 26 de novembro de 2010.

    particularmente a reabilitao de estradas e pontes, e a construo ou reforma de prdios pblicos.

    Alm dos cerca de USD3 bilhes em ajuda chinesa desde 2001, a China planeja investir USD13 bilhes em 19 projetos industriais, de turismo, minerao e energia nos prximos cinco anos. Os detalhes desses projetos so desconhecidos, mas comenta-se que incluem uma fbrica de cimento, uma fbrica de automveis e usinas hidreltricas, incluindo um investimento de USD300 milhes para a barragem de Moamba Major para abastecer Maputo. Sendo em grande parte baseada em projetos e negociada nos nveis mais altos da administrao pblica (AFRODAD 2007), a APD chinesa parece estar mal alinhada com alguns dos pensamentos recentes sobre a governana das finanas internacionais para o desenvolvimento (Quadro1).

    ZmbiaA APD chinesa para a Zmbia tem sido direcionada principalmente para as reas de agricultura, minerao, manufatura, construo, comunicao, transporte e sade (AFRODAD 2008). Uma anlise das estatsticas histricas sobre a cooperao para ajuda indica uma crescente dependncia de emprstimos ao invs de doaes, em relao APD (Figura2). A composio incerta da categoria cooperao econmica e tcnica sugere que a proporo de emprstimos pode ser muito maior do que esse quadrosugere.

    Os dados sobre grandes projetos financiados nos ltimos anos pela APD chinesa para a Zmbia incluindo um sistema nacional de armazenamento de gros, um estdio nacional, clnicas mveis, melhorias na ferrovia TAZARA e a reforma de edifcios do governo sugerem que, no caso de Moambique, emprstimos ambos sem juros e em condies favorveis so a forma preferida de cooperao. Isso apoia a observao de vrios analistas de que as polticas de desenvolvimento chinesas esto se afastando da ajuda e direcionando-se para a cooperao econmica ganha-ganha, de carter amplamente comercial (AFRODAD 2008).

    O financiamento baseado em projetos tambm parece ser o modo preferido de apoio por parte do governo chins para a Zmbia. De acordo com uma autoridade do Ministrio da Fazenda e Planejamento Nacional, os emprstimos para projetos esto onde as condies permitem. A condicionalidade-chave dessa ajuda parece ser a necessidade de contratar empresas chinesas. Para os projetos de construo,

  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas 11

    por exemplo, o governo chins lana licitaes na China exclusivamente para empresas chinesas. De acordo com Yang Miao, da Embaixada da China em Lusaka, atravs da ajuda, as empresas chinesas passam a conhecer melhor o ambiente de negcios da Zmbia. Algumas pessoas aproveitam a oportunidade e voltam para a Zmbia como investidores. Mesmo em projetos financiados atravs da Estratgia de Assistncia Conjunta para a Zmbia, um mecanismo de doadores para coordenar a APD e alinh-la com as prioridades nacionais de desenvolvimento, as empresas chinesas tm concorrido com empresas

    da Zmbia pelos crditos de exportao da China, particularmente no setor rodovirio. Assim, alm do tesouro pblico ser responsvel pelos juros sobre os emprstimos, quantias considerveis das finanas pblicas (na forma de pagamentos do valor principal) so efetivamente canalizadas para empresas chinesas. Alm disso, h uma percepo generalizada de que as empresas que ganham os contratos trazem a maioria dos materiais e recursos humanos necessrios da China, o que, caso sua veracidade seja comprovada, prejudicaria ainda mais as repercusses econmicas positivas para o pas anfitrio. Embora a capacidade

    Quadro1. Tendncias de boas prticas para a assistncia internacional ao desenvolvimento

    A assistncia tradicional para os pases em desenvolvimento originou-se na forma de projetos financiados e administrados por doadores especficos, com o financiamento ignorando as reservas de governos e os mecanismos de responsabilidade. Na dcada de 1990, essa abordagem comeou a atrair criticismo por focar-se nas prioridades dos doadores e no nas prioridades do pas anfitrio, por conduzir ao uso ineficiente de fundos e por minar a autoridade, a capacidade e a responsabilidade do governo destinatrio dos recursos. A comunidade internacional comeou a demandar uma mudana em direo a mecanismos de apoio oramentrio para evitar essas armadilhas e para amarrar o financiamento s prioridades polticas estabelecidas. O apoio oramentrio pode ser fornecido atravs de apoio oramentrio geral ou de apoio a oramentos setoriais, conhecido como a Abordagem Setorial Amplaa. No segundo caso, os recursos so destinados a um setor ou linha de oramento especfica (por exemplo, sade, educao) e, portanto, vinculado a polticas de setores especficos.

    Outra distino que deve ser feita aquela entre doaes e emprstimos, cada um dos quais pode caracterizar tanto apoio oramentrio quanto a projetos. Enquanto as doaes j foram consideradas superiores aos emprstimos por serem fornecidas de forma gratuita, hoje reconhecido que as doaes tambm podem trazer desvantagens na forma de ajuda reduzida aos pases mais pobres, reduo das receitas nacionais, menores incentivos para a disciplina fiscal e maior suscetibilidade a choques externos e condicionalidades dos doadoresb.

    a Ver DFID (2006), Lawson et al. (2002), Sector-Wide Approaches (SWAps) (disponvel em: http://www.who.int/trade/ glossary/story081/en /; 31 de janeiro de 2011).b Ver Gupta et al. (2003), OCDE (2007).

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    Cooperao tcnica e econmica

    Ajuda de emergncia (alimentos, dinheiro)

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    Indeterminado

    Figura2. Evoluo da APD chinesa para a Zmbia, 1986-2006 (milhes de USD)Fonte: AFRODAD 2007, Muneku e Koyi 2007

  • 12 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    das empresas chinesas de fornecerem um bom negcio pelo valor aplicado oferea benefcios bvios aos pases anfitries, o papel do governo chins em aumentar a competitividade das empresas chinesas levanta preocupaes sobre a dvida pblica e a sustentabilidade ambiental (Quadro2).

    ZimbbueAs relaes diplomticas da China com o Zimbbue datam da luta para a libertao nos anos 70. Como parte de esforos mais difundidos pelo bloco comunista para promover guerras populares ao estilo comunista, contra a hegemonia global dos

    Quadro2. Agncias de crdito exportao e a competitividade das empresas chinesas (de German e Wertz-Kanounnikoff, em prep.)

    Com a maioria dos pases doadores tendo uma ou mais agncias de crdito exportao, o apoio estatal para o setor privado no exclusivo China. No entanto, vrios instrumentos da OCDE regulam as atividades das agncias de crdito exportao financiadas pelo Estado (ACEs) em estados membros da OCDE que fornecem financiamento exportao (crditos ou seguros e garantias de crdito), para subscrever as atividades de empresas que operam no exterior. Desde 1978, o acordo sobre Crditos Exportao Oficialmente Apoiados, da OCDE, estabeleceu limitaes sobre os termos e condies dos crditos exportao com apoio oficial (por exemplo, taxas de juro mnimas, taxas de risco e prazos mximos de reembolso) e as provises de ajuda ligadaa. O acordo visa evitar que os pases compitam para oferecerem as condies mais favorveis de financiamento aos exportadores concorrentes por vendas ao exteriorb. Os Princpios e Diretrizes para promover prticas sustentveis de emprstimos na proviso de crditos oficiais de exportao para pases de baixa renda tambm fazem parte dos esforos do Banco Mundial e do FMI para ajudar pases a alcanar seus Objetivos de Desenvolvimento do Milnio (ODM), sem criar problemas de dvidas futurasc. As chamadas Abordagens Comuns, intermediadas em dezembro de 2003, tambm tentam referenciar as polticas ambientais das ACEs em pases membros da OCDE em relao quelas do Grupo do Banco Mundial e dos bancos regionais de desenvolvimento para minimizar os custos ambientais associados aos projetos respaldadas pelas ACEsd. Participantes do acordo incluem a Austrlia, o Canad, a Comunidade Europeia, o Japo, a Repblica da Coreia, a Nova Zelndia, a Noruega, a Sua e os EstadosUnidos.

    A importncia de tais financiamentos no deve ser subestimada. As ACEs representam a maior Classede instituies financeiras pblicas que operam internacionalmente, superando em tamanho o Grupo do Banco Mundial e financiando mais projetos do setor privado nos pases em desenvolvimento do que qualquer outra Classede instituio financeirae. Estimativas atuais sugerem que as ACEs financiam ou subscrevem atividades empresariais no exterior da ordem de USD430 bilhes (cerca de USD55 bilhes para financiamento de projetos em pases em desenvolvimento e USD14 bilhes em seguros para novo IED), superando todas as outras fontes oficiais de financiamento combinadasf. Mesmo representando o maior componente da dvida dos pases em desenvolvimento (mais de 25%), elas tem uma responsabilidade limitada sobre as prioridades nacionais de desenvolvimento.

    Esse cenrio desequilibrado torna muito mais fcil para os pases no signatrios, como a China, a ndia e o Brasil oferecerem emprstimos ligados e concessionaisg. Ele tambm aumenta os riscos de endividamento futuro entre as economias dos pases em desenvolvimento, visto que a tendncia em focar na disponibilidade de financiamento minar as consideraes sobre qualidade e preo, com os nveis de concessionalidade ou de risco muitas vezes repassados para os contribuintes. A China tambm no est envolvida com os mecanismos de coordenao dos doadores em Moambique e na Zmbia. Por isso, sua assistncia no est sujeita ao alinhamento com as estratgias de reduo da pobreza, iniciativas de harmonizao, normas de prestao de contas ou mecanismos de revisoh. possvel que essa paisagem poltica desigual para as ACEs esteja por trs do declnio observado no interesse dos pases membros da OCDE no financiamento de grandes projetos de infraestrutura e na habilidade do governo e das empresas chinesas em preencher esta lacuna.

    a Ver http://www.oecd.org/about/0, 3347, en_2649_34171_1_1_1_1_1, 00.html (2 de fevereiro de 2011)b Ver http://www.oecd.org/document/29/0, 3746, en_2649_34171_1830173_1_1_1_1, 00.html (2 de fevereiro de 2011)c Disponvel em http://www.oecd.org/department/0, 3355, en_2649_34179_1_1_1_1_1, 00.html (2 de fevereiro de 2011)d Ver http://www.eca-watch.org/eca/ecas_explained.html (4 de fevereiro de 2011)e Ver http://www.eca-watch.org/eca/ (4 de fevereiro de 2011)f Inclusive do Banco Mundial, dos bancos regionais de desenvolvimento e da ajuda bilateral e multilateral (http://en.wikipedia.org/wiki/Export_credit_agency)g Entrevista do CIFOR com o Chefe da Cooperao de um pas membro da OCDE, 3 de novembro de 2010h Afrodad 2007

  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas 13

    colonialistas, a China estendeu uma mo poltica em apoio ZANU (Youde 2007). As relaes diplomticas entre os dois pases solidificaram-se quando Mugabe tomou o controle do governo em 1980. No entanto, o apoio chins esfriou quando o governo do Zimbbue atraiu o apoio principalmente de doadores ocidentais, durante os primeiros anos de independncia.

    A relao entre a China e o Zimbbue aumentou, seguindo a acelerao da reforma agrria no Zimbbue no incio dos anos 2000. Enquanto os governos ocidentais e as instituies multilaterais comearam a se afastarem do Zimbbue, Mugabe voltou-se cada vez mais para o Oriente, para compensar suas deficincias (Youde 2007, Brown e Sriram 2008). A China concretizou essa relao, fornecendo apoio militar quando o Zimbbue enfrentava um embargo de armas7. Em 2003, o Zimbbue declarou oficialmente a sua Poltica de olhar para o Oriente, consolidando ainda mais essa mudana. Os objetivos subjacentes desta poltica so tanto econmicos quanto polticos: atrair o investimento to necessrio e que o Zimbbue se posicione como um defensor de sua independncia e soberania. Em 2004, o governo chins expressou seu apoio reforma agrria e defendeu a no-interferncia por outros parceiros de desenvolvimento (AFP 2004). Durante as eleies de 2008, a China e a Rssia vetaram uma resoluo do Conselho de Segurana da ONU que buscava impor novas sanes sobre Mugabe e outros lderes da ZANU-PF (BBC2008).

    Embora a China tenha sido um grande importador de tabaco do Zimbbue nos anos 80 e 90, as contribuies chinesas tangveis para o Zimbbue atravs de apoio bilateral e de investimentos tm sido limitadas. As concesses chinesas para o Zimbbue, principalmente na forma de ajuda humanitria, consistiram em cerca de USD28 milhes entre 1992 e 2007. Considerando que o Zimbbue recebeu, ao todo, quase USD3,3 bilhes durante esse perodo, a ajuda chinesa ao Zimbbue pode ser considerada

    7 Em 2000, duas negociaes de armas de pequeno porte foram concludas, uma em troca de oito toneladas de marfim e outra por USD65,9 milhes (Nuclear Threat Initiative 2004, Taylor 2008). Em 2004, a China vendeu ao Zimbbue USD240 milhes em armas, incluindo 12 avies de combate e 100 veculos militares (Taylor 2008). Entre 2005 e 2007, a China forneceu ao Zimbbue, pelo menos, USD28 milhes de armas convencionais (Brautigam 2009) e, talvez mais controversamente, pouco antes das eleies, em 2008, um grande carregamento de munio (Michel e Beuret 2009).

    negligencivel. Assim, apesar da fora da relao diplomtica entre os dois pases, a APD chinesa tem sido limitada. H evidncias que sugerem que isso se deve limitada capacidade do Zimbbue de pagar e garantir emprstimos chineses. De acordo com um relatrio do Banco Mundial (2008), os emprstimos para o Zimbbue so baseados em termos concessionais substancialmente mais difceis ou menos favorveis do que aqueles para qualquer outro pas africano, com um elemento de doao de menos de 10%. De acordo com a AFRODAD (2007), citando dados do Ministrio da Fazenda, at 2007, o governo do Zimbbue tinha acumulado USD247 milhes em dvidas resultantes de emprstimos devidos China. De acordo com fontes governamentais-chave da Reserva do Banco do Zimbbue (RBZ) e do Ministrio das Relaes Exteriores, o Zimbbue tem tentado por anos negociar grandes emprstimos para apoio oramentrio com o governo chins, mas com limitado sucesso8. Apesar de que o pas tenha conseguido garantir um fundo de crdito para exportao para equipamentos agrcolas, em apoio ao Programa de Mecanizao Agrcola do Zimbbue, de USD200milhes do Eximbank em 2007, o governo foi obrigado a colocar algumas de suas mais ricas reservas de platina como garantia (Sutton 2010). Em 2007, a China estendeu outra linha de crdito no valor de USD58 milhes para mquinas agrcolas, a ser pago em exportaes de tabaco (Edinger e Burke 2008). Durante a oitava sesso da Comisso Conjunta China-Zimbbue em 2010, uma srie de acordos bilaterais foi proposta. No incio de 2011, foi divulgado que o Banco de Desenvolvimento da China estava considerando investir USD10 bilhes nos setores de minerao, agricultura e energia no Zimbbue (Banya 2011). O governo do Zimbbue tambm est debatendo se assina um fundo de financiamento de USD3 bilhes, oferecido pelo Eximbank da China, tendo como alvo os setores agrcola e de fabricao de fertilizantes, em troca dos direitos sobre alguns de seus depsitos de platina (Muleya 2011).

    8 Por exemplo, vrias visitas teriam sido feitas China para negociar um contrato de emprstimo de USD5 bilhes. No entanto, o acordo nunca se concretizou, uma vez que a China ofereceu o emprstimo em termos exclusivamente comerciais (por exemplo, no concessionrios). Quando Mugabe viajou para Pequim em 2005, para pedir ajuda para lidar com a escassez de divisas e a escassez de combustvel do pas, ele recebeu apenas USD6 milhes para importaes de gros (Ploch 2008).

  • 14 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    Do ponto de vista regional, pode-se ver uma clara preferncia por emprstimos ao invs de ajuda nas aes chinesas de apoio ao desenvolvimento. Onde o risco de reembolso limitado, esses emprstimos podem ser realizados em termos altamente concessionais. No entanto, h tambm evidncias de que os financiadores chineses esto dispostos a negociar em ambientes incertos, em troca de acesso a recursos ou colaterais garantidos por recursos. No est claro at que ponto os nveis de financiamento, tipo de projeto ou de concessionalidade de emprstimos tambm so usados como mecanismos para garantir o acesso a matrias-primas. Muitos desses emprstimos so amarrados, condicionados contratao de empresas chinesas. Quanto ao alinhamento da ajuda com polticas oficiais e mecanismos de prestao de ajuda, a tendncia a preferir apoio baseado em projetos mina os esforos nacionais e globais para alinhar a APD com as prioridades nacionais de desenvolvimento e monitorar melhor os investimentos dos doadores. Tanto na Zmbia quanto em Moambique, a embaixada chinesa no tem sido vista por outras embaixadas (predominantemente europeias) como um participante ativo nos mecanismos de coordenao dos doadores. Alm disso, com ambos os subsdios e emprstimos, tendendo a ser condicionais e com limitada divulgao pblica dos termos de acordo, a capacidade de garantir que a ajuda chinesa esteja alinhada com as polticas oficiais e as prioridades de desenvolvimento fica comprometida (AFRODAD 2008).

    5.2.2 ComrcioO governo chins e os governos dos trs pases focais tm buscado ativamente o comrcio bilateral. Embora a contribuio dos pases focais para as importaes chinesas seja relativamente pequena, a China representa um importante destino comercial para as exportaes regionais. Esta seo relata a situao do comrcio bilateral para cada um dos trs pases estudados.

    MoambiqueO comrcio bilateral entre Moambique e a China tem apresentado um aumento acentuado e constante durante a ltima dcada, para a maioria dos produtos. As importaes moambicanas da China so dominadas por produtos manufaturados (veculos e peas, aparelhos eltricos e artigos de ferro e ao), enquanto as importaes chinesas de Moambique consistem principalmente em toras, gergelim e madeira, seguidos por propores menores de vrios minrios e seus concentrados (Figura3).

    A composio forte e crescente de toras no processadas em relao madeira processada particularmente notvel, devido ao requisito de que as concessionrias de madeira processem o produto antes da exportao, conforme previsto na Lei de Florestas e Vida Selvagem de 1999 e nos regulamentos de 2002, que tornaram ilegais as exportaes de toras para muitas das espcies mais procuradas. A exportao de toras em estado bruto para a China tem sido objeto de crescente

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    Todos os produtos

    Toras, no conferas

    Madeira serrada, no conferas

    Sementes de gergelim

    Minrios de titnio e seus concentrados

    Cobre no renado, nodos de cobre

    Minrios de ferro e seus concentrados

    Minrios de cromo e seus concentrados

    Algodo, no cardado nem penteado

    Minrios de nibio, tntalo, vandio e seus concentrados

    Toras, madeiras tropicais

    Figura3. Dez principais produtos moambicanos exportados para a China em termos de valor, 2001-2010 (mil USD)Fonte: UN Comtrade

  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas 15

    preocupao da sociedade civil e vrios relatrios de pesquisa sugerem que a prtica insustentvel (Mackenzie 2006, Mackenzie e Ribeiro 2009, Ribeiro e Nhabanga 2009). O acentuado declnio nas exportaes de toras em 2007 est supostamente relacionado a uma regulamentao que entrou em vigor em junho de 2007, a qual exige que a maioria dos exportadores exporte madeira serrada. No entanto, como evidenciado pelo aumento menos significativo nas exportaes de madeira serrada e do rpido aumento no nmero de toras no processadas em 2010, muitos exportadores simplesmente armazenaram suas toras ao invs de investir no seu processamento. Essa dinmica explorada com mais detalhes no panorama do setor florestal apresentadoabaixo.

    ZmbiaAs exportaes da Zmbia para a China aumentaram acentuadamente nos ltimos anos, de apenas USD47,8 milhes em 2003 para USD2,5 bilhes em 2010. Em 2009, a China ultrapassou a frica do Sul como o segundo maior mercado de exportao da Zmbia, depois da Sua (o que representa quase a metade das receitas da Zmbia com exportao). Com cerca de 94% das receitas de exportao da Zmbia para a China derivadas de produtos de cobre, as relaes comerciais da China com a Zmbia so definidas quase que exclusivamente pelas exportaes de minerais (Figura4). Isso reflete os padres mais amplos nas exportaes da Zmbia; antes e desde a independncia, a Zmbia tem sido altamente

    dependente do cobre para sua receita em divisas estrangeiras. Apesar da menor importncia em termos de valor de exportao, outros produtos importantes exportados para a China incluem cobalto (2,3%), tabaco (1,1%) e, desde 2010, mangans e nquel (0,9% cada).

    ZimbbueCom exceo de 2010, as exportaes do Zimbbue para a China ainda no experimentaram as fortes tendncias de crescimento vistas em Moambique e na Zmbia (Figura5). No entanto, a China continua a ser um importante mercado de exportao para o pas, com a proporo do total das exportaes para a China, variando de 2% a 18% nos ltimos anos. O forte aumento no valor das exportaes em 2010 atribudo quase exclusivamente aos produtos decromo.

    A dependncia mais forte no mercado chins evidente nos setores de tabaco, algodo e cromo (minrio de cromo e ferro cromo). As exportaes de tabaco para a China tm sido particularmente importantes. Entre 2001 e 2010, em mdia, 46% das exportaes de tabaco do Zimbbue foi para a China, constituindo aproximadamente 76% de toda a receita de divisas da China durante esse perodo.

    Para resumir, a partir de uma perspectiva regional, o comrcio sino-africano altamente varivel, com o setor da madeira (predominantemente toras no processadas) dominando as exportaes de

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    Todos os produtos

    Cobre no renado, nodos de cobre

    Ctodos de cobre, sees de ctodos brutos

    Mates de cobalto, produtos intermedirios de cobalto

    Minrios de nquel e seus concentrados

    Tabaco no manufaturado, no destalado

    Mates de cobre, cobre-cimento, precipitados de cobre

    Minrios de mangans e seus concentrados

    Minrios de cobre e seus concentrados

    Algodo, no cardado nem penteado

    Minrios de cobalto e seus concentrados

    Figura4. Dez principais produtos da Zmbia exportados para a China em termos de valor, 2001-2010 (mil USD)Fonte: UN Comtrade

  • 16 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    Moambique, da minerao (principalmente o cobre), dominando as exportaes da Zmbia e da agricultura (sobretudo o tabaco), dominando as exportaes do Zimbbue. Em cada caso, o comrcio tem sido dominado por um nico produto, com limitada diversificao do comrcio observada em Moambique (todos os setores) e no Zimbbue (no setor de minerao, com foco quase que exclusivamente em produtos de cromo).

    5.2.3 InvestimentoOs governos da maioria das economias emergentes agora incentivam as empresas locais para go global (globalize-se) (WIR 2008). Eles esto desempenhando um papel cada vez mais ativo, maximizando o apoio financeiro e no financeiro para empresas de mercados emergentes no processo de concorrncia global no qual essas empresas sofrem as desvantagens dos ltimos a agir, deficincias em capacidades distintivas e passivos de novidade e estranheza (Luo et al. 2010: 2). O investimento privado chins na frica tem sido estimulado pela China com a estratgia de Going Out (Indo para fora) ou Going Global (Globalize-se), uma iniciativa lanada em 1999 para promover os investimentos chineses no exterior no contexto de ambies geopolticas mais amplas da China (Friedberg 2006). As iniciativas subsequentes sob esse quadropoltico mais amplo ajudaram a solidificar a presena de empresas chinesas no exterior. Por exemplo, o Fundo Chins de Riqueza foi estabelecido em 2007 pela Cooperao de Investimento Chins (uma empresa de investimento quase governamental)

    para investir uma parte das reservas cambiais da China, a fim de apoiar as empresas que investem no exterior. Financiado com um capital inicial de USD200 bilhes, o Fundo canaliza financiamento pblico para as empresas chinesas sob a forma de fundos de crdito e seguros de crdito. Esta seo fornece uma viso geral da situao atual do IED chins em cada um dos trs pases focais.

    MoambiqueCom base em estatsticas oficiais do Centro de Promoo de Investimentos (CPI), de Moambique, que inclui todos os setores exceto o de minerao, o IED chins aumentou acentuadamente no final da dcada de 2000, atingindo um pico em 2008 (Figura6)9. Sessenta e seis investimentos chineses no valor total de USD216 milhes foram registrados no CPI entre 2000 e 201010. A maioria desses investimentos tanto em termos do nmero de projetos (66%) quanto dos nveis

    9 Os investidores estrangeiros em Moambique devem chegar com um investimento mnimo de USD50.000 do seu prprio capital de investimento. Embora os investidores no sejam obrigados a se cadastrarem na agncia de promoo de investimentos, a maioria o faz para ter acesso aos incentivos generosos prestados pela agncia. No entanto, essas estatsticas no contemplam muitos comerciantes chineses de pequena escala (AFRODAD 2007).10 Note-se que os dados do CPI relatam apenas os projetos registrados, o que diferente do nmero de projetos que so realmente implementados. Atualmente, no h um acompanhamento sistemtico da execuo de projetos em Moambique, tornando impossvel relatar esses nmeros (entrevista do CIFOR com funcionrio do CPI sediado em Maputo, 5 de novembro de 2010).

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    Todos os produtos

    Tabaco no manufaturado, no destalado

    Ferro-cromo (> 4 % de carbono por peso)

    Minrios de cromo e seus concentrados

    Algodo, no cardado nem penteado

    Feldspato

    Cobre (mates, cimento, precipitados)

    Tabaco no manufaturado, no destalado

    Minrios de cobre e seus concentrados

    Mates de nquel

    Minrios de nibio, tntalo, vandio e seus concentrados

    Figura5. Dez principais produtos do Zimbbue exportados para a China em termos de valor, 2001-2010 (mil USD)Fonte: UN Comtrade

  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas 17

    de investimento de capital esto concentrados no setor da manufatura (no valor de USD166 milhes) e correspondem a 77% de todo o capital de investimento chins registrado entre 2000 e 2010 (Figura7). A maior parte dos investimentos est registrada na Provncia de Maputo; sendo que as provncias do norte ricas em florestas (Cabo Delgado, Niassa, Nampula) representaram apenas 1,29% do total do IED chins, durante o mesmo perodo. Esse ltimo orientado principalmente para o setor agroindustrial (por exemplo, o cultivo

    de pinho-manso e o processamento de madeira). Esse volume de investimentos interessante, dada a declarao de funcionrios da agncia moambicana de investimentos de que a maioria dos investidores chineses est interessada no setor florestal. Assim, o baixo fluxo de investimentos para a silvicultura,

    em termos financeiros, no deve ser tomado como indicativo de uma participao limitada no setor, sobretudo levando em conta os investimentos relativamente baixos necessrios para participar na indstria madeireira e a tendncia entre muitos operadores chineses de trabalhar como comerciantes ao invs de gerentes de concesso, estabelecendo vnculos com os moambicanos detentores de licenas para a explorao de madeira.

    De acordo com funcionrios da embaixada chinesa em Maputo, os setores-chave de interesse dos chineses so a minerao (carvo, titnio), tecnologia, agricultura (arroz) e comrcio11. As aparentes contradies entre essa afirmao e os dados acima provavelmente refletem as novas tendncias do IED chins, com uma srie de novos investidores, mostrando interesse nos setores de minerao e agrcola em resposta aos ativos esforos de promoo de investimentos por parte do Ministrio de Minas e do Centro de Promoo da Agricultura (CEPAGRI). Essas tendncias setoriais so relatadas nas seesseguintes.

    Esforos para estimar a proporo de capital chins nos investimentos, envolvendo investidores chineses, sugerem que o capital chins muito mais dominante no setor florestal do que na maioria dos outros setores (Figura8). No entanto, estas estatsticas capturam apenas trs investimentos chineses no perodo 2000-2010, o que sugere que grande parte da atividade no foi captada pelas estatsticas oficiais de investimento.

    11 Entrevista do CIFOR com funcionrios da Embaixada da China em Lusaka, 26 de novembro de 2010.

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    Figura6. Projetos com base no IED chins (todos os setores, exceto minerao) em Moambique, janeiro de 2000 a setembro de 2010Fonte: Clculos baseados em dados oficiais do CPI

    Outros: 1%

    Indstria de transformao: 77%

    Construo: 4%

    Aquicultura e pesca: 12%

    Agricultura e agroindstria: 4%

    Figura7. Capital chins do IED por setores (exceto minerao), janeiro de 2000 a setembro de 2010Fonte: Clculos baseados em dados oficiais do CPI

  • 18 Laura A. German, George C. Schoneveld, Sheila Wertz-Kanounnikoff e Davison Gumbo

    ZmbiaNa ltima dcada, o IED chins na Zmbia tornou-se importante para os dois pases. No s o montante de IED chins na Zmbia alcanou pouco mais de 9% do total de USD9,50 bilhes (MOFCOM 2010, UNCTADstat), como a Zmbia tambm se tornou o terceiro destino mais importante do IED chins na frica e o seu maior destino de IED,

    excluindo petrleo (Bastholm e Kragelund 2009). A participao econmica direta da China, como demonstrado pelo comprometimento com o IED, variou de USD8,8 milhes em 2001 a USD5,47 bilhes em 2008. Os dados de 2008, no entanto, apresentam uma imagem um tanto distorcida, pois eles so fortemente influenciados por uma nica empresa de minerao chinesa, que se comprometeu a investir USD5,3 bilhes na Zmbia (o que ser discutido com mais detalhes na prxima seo). No entanto, uma tendncia ascendente claramente discernvel, com comprometimentos anuais de IED normalmente variando entre USD10 milhes e USD20 milhes na primeira metade da dcada, e entre USD100 milhes e USD250 milhes durante a segunda metade. Do total de comprometimentos de IED no perodo de 2000 a 2009, de USD13,99 bilhes, USD6,19 bilhes (44%) foram comprometidos pela China (Figura9).

    Como ilustrado pela Figuraacima, os investimentos chineses na Zmbia esto altamente concentrados, com 98% do valor do IED chins nesse perodo, visando aos setores de minerao e de manufatura. No entanto, quando descontados os USD5,3 bilhes de um nico investimento em minerao, a proporo do total do IED chins direcionado para esses setores cai para 87%: 63% para manufatura e 24% para a minerao. Dito isto, todos os principais investimentos classificados pela Agncia de

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    Figura8. Predomnio do capital chins em investimentos que envolvem investidores chineses, por setor, de janeiro de 2000 a setembro de 2010Fonte: Clculos baseados em dados oficiais do CPI

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    China

    Outro

    Figura9. Empenhos de IED por setor, 2000-2009 (milhes de USD)Fonte: Dados oficiais da Agncia de Desenvolvimento da Zmbia

  • Comrcio e investimento chins e seus impactos sobre as florestas 19

    Desenvolvimento da Zmbia como manufatura so orientados para o processamento mineral, sugerindo uma orientao setorial fortemente distorcida do IED chins para a indstria da minerao. Embora essas tendncias de investimento sejam contrrias ao interesse declarado da Zmbia na diversificao econmica distanciada de uma economia fortemente dominada pela indstria da minerao, eles tm desempenhado, no entanto, um papel crucial na estabilizao da economia e de empregos no setor da minerao na Zmbia, durante os perodos de recesso econmica.

    ZimbbueEm 2008, o montante do IED chins no Zimbbue chegou a USD60,1 milhes, o que representa menos de 4% do montante total de IED do Zimbbue, de USD1,5 bilho (MOFCOM 2009, UNCTADstat). Alm de representar uma parte relativamente limitada do montante total de IED, o crescimento do IED chins tem sido muito mais lento do que para os pases vizinhos, com um aumento de pouco mais de um ponto percentual desde 2003. O montante do total do IED chins no Zimbbue , no entanto, significativamente maior do que para os vizinhos Tanznia e Moambique (Figura10).

    5.2.4 Participao da China nos setores de interesse

    Esta seo apresenta os resulta