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CONSENSO DE WASHINGTON E COSMOPOLÍTICAS NA ATUALIZAÇÃO DOS SENTIDOS NA AMÉRICA LATINA Sebastião Guilherme Albano da Costa 1 Abstract The essay seeks to point out the main issues that led political and cultural history during Latin American last 20 years. With an integrating point of view, this text gathers economic and politic themes in order to describe great culture figures within the period. The coming of new information and communication technologies, the rise of new great accounts such as globalization, multiculturalism and so on are related to politics that have not to do with traditional nation state limits, that provoked nationalism, and are concerned to improve cosmopolitics measures. Keywords Washington Consensus, cosmopolitics, and Latin American culture. Resumo Este texto visa a descrever os principais tópicos que orientaram a história política e cultural da América Latina nos últimos 20 anos. Com um método integrador, buscou- se reunir aspectos de ordem econômica, como o Consenso de Washington, e político, como o fim das ditaduras no Cone Sul, a fim de dar conta das grandes figurações culturais do período. O advento das novas tecnologias de informação e comunicação, a emergência de novos relatos totalizantes, como a globalização, o multiculturalismo etc., suscitaram a necessidade de medidas menos condicionadas pelos limites tradicionais dos Estados nacionais, ou nacionalistas, e favoreceram uma atitude que classificamos de cosmopolítica. Palavras-chave Consenso de Washington, cosmopolícia e cultura latino-americana. RAZÓN Y PALABRA Primera Revista Electrónica en América Latina Especializada en Comunicación www.razonypalabra.org.mx “SEMIÓTICA Y COMUNICOLOGÍA: Historias y propuestas de una mirada científica en construcción” Número 72

CONSENSO DE WASHINGTON E COSMOPOLÍTICAS NA … · ... últimos 20 anos até o advento e popularização das novas mídias e as ... sociais e o aparecimento de ... e com discurso

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CONSENSO DE WASHINGTON E COSMOPOLÍTICAS NA ATUALIZAÇÃO

DOS SENTIDOS NA AMÉRICA LATINA

Sebastião Guilherme Albano da Costa1

Abstract

The essay seeks to point out the main issues that led political and cultural history

during Latin American last 20 years. With an integrating point of view, this text

gathers economic and politic themes in order to describe great culture figures within

the period. The coming of new information and communication technologies, the rise

of new great accounts such as globalization, multiculturalism and so on are related to

politics that have not to do with traditional nation state limits, that provoked

nationalism, and are concerned to improve cosmopolitics measures.

Keywords

Washington Consensus, cosmopolitics, and Latin American culture.

Resumo

Este texto visa a descrever os principais tópicos que orientaram a história política e

cultural da América Latina nos últimos 20 anos. Com um método integrador, buscou-

se reunir aspectos de ordem econômica, como o Consenso de Washington, e político,

como o fim das ditaduras no Cone Sul, a fim de dar conta das grandes figurações

culturais do período. O advento das novas tecnologias de informação e comunicação,

a emergência de novos relatos totalizantes, como a globalização, o multiculturalismo

etc., suscitaram a necessidade de medidas menos condicionadas pelos limites

tradicionais dos Estados nacionais, ou nacionalistas, e favoreceram uma atitude que

classificamos de cosmopolítica.

Palavras-chave

Consenso de Washington, cosmopolícia e cultura latino-americana.

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Introdução

O conjunto destas linhas poderia ser intitulado “América Latina fechada para balanço:

200 anos de independência, 20 anos do Consenso de Washington”, mas se optou por

um título mais temperado, em que pese haver grassado eventos que permitem a

conformação de cenários para a tragicomédia. O drama da nossa história constitui-se

de diretrizes políticas, que vestem o atuendo da economia e da cultura, mesmo que

haja revezamento no protagonismo, com a cultura a investir uma roupagem

econômica e política ou ainda vice-versa. Como este texto não pretende ser nem uma

teoria nem uma crítica da modernidade, optou-se por uma descrição panorâmica ou

uma análise de alguns tópicos centrais no debate público nos últimos anos e seus

desdobramentos na região. Serão relacionados desde o desempenho do Consenso de

Washington como marco regulatório do formato social dos últimos 20 anos até o

advento e popularização das novas mídias e as modalidades pelas quais os latino-

americanos se apropriaram delas e as consumiram, desde a crise dos intelectuais aos

novos modelos de produção, distribuiçao e exibição de cinema na região.

1.Consenso de Washington, intelectuais e cosmopolíticas

Cumpre advertir ainda que essa mesma visão convergente é um avatar da

modernidade na América Latina, um dado valorizado nos últimos anos em todo o

mundo com o propalado e ambíguo fim dos grandes relatos políticos, econômicos ou

sociais e o aparecimento de um substituto como símbolo da miríade, a culturalização

do mundo (Yúdice, 2004). Importa dizer também que para os latino-americanos,

oriundos de uma aventura de exploração mercantilista vinculada a uma empresa de

doutrinamento religioso, a distinção que alguns autores fazem entre civilização, como

um sistema de relações meramente materiais, e cultura, como um sistema de relações

espiritualizadas, nunca pareceu procedente (Williams, 1976, p. 76-81; Elias, 1994).

O Consenso de Washington, um dos marcos regulatórios em que se desenvolveram as

sociedades depois do fim da União Soviética e da queda do Muro de Berlin, derivou

na desqualificação do trabalho intelectual tradicional, um pouco menos ao

empreendido na academia por conta de uma necessidade de construir correligionários

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entre cientistas sociais e humanistas, que multiplicam temas e pontos de vista e dão

publicidade séria a eventos de toda ordem. De fato, as universidades norte-

americanas, algumas das mais equipadas do mundo, nunca estiveram tão guarnecidas

de intelectuais de fôlego como na atualidade. Isso se deve à emergência de

professores provindos sobretudo da Ásia e que adotaram os Estados Unidos como

base para seu projeto de provincianização da Europa (Chakrabarty, 2000), algo já

realizado pelos americanos há bastante tempo. Mesmo assim, a imprensa, os meios de

comunicação audiovisuais e a internet, ou os discursos que usam como base o

computador e suas estruturas textuais (computer-based media), ascenderam ao nível

de preceptores das relações sociais, como antes o eram as instituições controladas

pelos Estados nacionais, principalmente suas estruturas de legitimação, a academia e

os intelectuais orgânicos. Beatriz Sarlo (2002) acredita que o declínio da influência

dos intelectuais, uma figura notadamente moderna e vinculada às esquerdas políticas,

pode ser, por outro lado, um dos sinais de emergência de um novo paradigma social

inscrito na noção de pós-modernidade, válido mais ou menos a partir do último

quartel do século XX.

Ainda com a patente reorganização do trabalho intelectual e a refiguração social de

seus entes, pode-se refutar a suposição da autora com os seguintes argumentos. Se a

cunhagem do título de intelectual foi realizada há cerca de um século e meio (Bobbio;

Matteucci; Pasquino, 2004, pp. 637-40) e aos poucos foi se tornando, por sinonímia,

emblema de pessoa cultivada e comprometida socialmente, isto é, à esquerda do

espectro político, a função do intelectual como membro de uma categoria de homens

de instrução superior, mediadora e crítica entre o Estado e a sociedade civil, existe

desde muito antes, vejam-se o caso dos sofistas públicos do mundo helênico, por

exemplo.

Ademais, pode-se dizer ainda que a antonomásia intelectuais/esquerda se deveu a que

foram eles a elaborarem a crítica mais incisiva à sociedade burgesa e capitalista, às

interseções do Estado formal de direito e o Estado social, ao advogarem uma

alternativa em que os benefícios da propriedade e dos meios de produção e troca

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fossem socializados, inspirando-se nas doutrinas socialistas já em voga na Europa do

século XIX. Como hoje não permanecem as mesmas modalidades de produção e o

capitalismo deixou de ser apenas um sistema de produção econômica e passou a ser

um sistema de civilização, descura-se do pensamento da esquerda tradicional e, como

consequência, do trabalho desse tipo de intelectual. A falácia inscrita nessas ideias é

desvelada pelo que denominamos de reorganização do trabalho intelectual. Na

atualidade, os ideólogos e legitimadores da ordem social são os profissionais dos

meios de inforrmação e comunicação, do jornalista ao publicitário e do

mercadotécnico ao engenheiro de redes. A ampla gama de suas atribuições representa

a interação de saberes que validam a formação social contemporânea e conformam a

figura de um novo intelectual.

Outro corolário do Consenso de Washington é relativo à globalização, possível

eufemismo designativo de neoliberalismo. Ambas as denominações ensejaram uma

reforma no ordenamento jurídico dos países latino-americanos que participam mais

ou menos ativamente do concerto internacional. As mudanças no desenho das Cartas

Magnas nacionais operaram em três áreas: reforma fiscal, privatização de empresas e

serviços e abertura da economia ao capital externo (Baker, 2009). Há muitos casos

exemplares: a subscrição do México no North American Free Trade Agreement

(NAFTA) em 1994, a atuação das empresas espanholas como a Telefónica e o grupo

Santander na região, a privatização do serviço de fornecimento de água na Bolívia,

bem como da Telmex no México e das teles no Brasil. A liberalização da economia se

tornou a senha para o acesso à globalização, logo globalização e liberalismo são faces

da mesma moeda.

Os anos 1990 estiveram marcados pela aclimatação desse novo ideário durante os

primeiros governos democraticamente eleitos depois de longos períodos de ditaduras

ou de desvios sistêmicos. Seus executantes foram personagens políticos que têm peso

distinto na balança da história, como Carlos Andrés Péres, Carlos Menen, Carlos

Salinas de Gortari, Fernando Henrique Cardoso, Julieta Barrios de Chamorro,

Patricio Aylwin, entre outros. Em muitas nações a globalização significou uma perda

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significativa dos poderes de representatividade política, como o legislativo e o

executivo, e uma consequente concentração de tarefas no judicário, poder cuja

representatividade é antes funcional que política. Essa instância passou a dirimir,

tecnicamente, assuntos das mais variadas procedências que antes eram atribuição do

legislativo.

Por conta desse protagonismo do judiciário, da incapacidade das instituições do

Estado nacional controlarem os fluxos de capital no mercado financeiro bem como de

certo conteúdo cultural provindo de várias partes do mundo por intermédio da

televisão e depois da internet, em meados do decênio de 1980 começou-se a

popularizar a denominação de formações sociais pós-políticas (Canclini, 1995), isto é,

ocorreu uma suposta desvalorização dos procedimentos políticos de negociação

social. As recentes rusgas entre a presidenta argentina, Cristina Kirchner, e o

presidente do Banco Central (BC), Martín Redrado, ilustram a situação. Depois de

exonerado, o economista recorreu ao Supremo Tribunal daquele país e foi

reempossado no dia seguinte, em sete de janeiro de 2010. Nem os membros do

supremo nem o presidente do BC são cargos submetidos a escrutínio público. De

qualquer maneira, é um equívoco alegar que a independência do BC em matéria de

normatização monetária o isenta de atitudes de cunho político. Alan Greenspan, o

presidente do Federal Reserve (FED) até 2006, o Banco Central dos Estados Unidos e

paradigma para os demais bancos centrais, deu mostras de atuar politicamente durante

toda sua longa estância no cargo e recentemente foram suas atuações políticas em

coordenação com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que atenuaram a mais

recente recessão mundial, para muitos ocasionada pelo mesmo FED.

Importa notar que entre 1980 e 1995 todos os países da América Latina, talvez salvo

o Haití e Cuba, alinharam-se ao formato economicista do Consenso. O mais instigante

do processo é que esse mesmo viés economicista e pós-político da história regional

ocorreu justamente em um período de restabelecimento das instituições democráticas,

ou a redemocratização da América do Sul, notadamente da Argentina (1983), do

Brasil (1985), do Uruguai (1989) e do Chile (1989), seguido do fim dos conflitos

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armados na América Central, com o acordo de paz em El Salvador e Nicarágua em

1990 e na Guatemala em 1996, e da troca de liderança no México (2000), em que o

Partido Revolucionário Institucional (PRI) esteve no poder por 70 anos. Esse

cruzamento de séries históricas realça tanto a dependência das proposições políticas e

econômicas, emoldurada, no caso, pelas tensões e distensões da Guerra Fria, como a

forja utópica e ideológica da desconfiança nos projetos sociais centralizados nos

Estados nacionais. O fato é tão determinante que ainda hoje, estando a região crivada

de governos de perfil socialista e com discurso crítico ao liberalismo (Argentina,

Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Nicarágua, Venezuela etc.) as linhas diretoras para o

desempenho econômico traçadas em fins dos anos 1980 estão já naturalizadas num

discurso que prega a ética da responsabilidade. Pode-se dizer que estamos

consumindo o Consenso de Washington (Baker, 2009).

A despeito dessa assimilação dos postulados do Consenso, a indicação de redução do

Estado implícita nas medidas sugeridas não foi de todo acatada e tornou-se mais um

lance conjuntural do que propriamente uma linha histórica sustentada. Primeiro

porque se na América Latina os Estados tinham bastante ingerência em certa

dimensão da vida cotidiana dos cidadãos, essa era realizada em registro autoritário e

nunca chegaram de fato a constituir instituições modernas tão sólidas a ponto de se

lhes poder denonimar Estados fortes (Domingues, 2009), isto é, que promovessem as

condições para que as relações sociais fossem as mais organizadas, justas e dinâmicas

possíveis, como mais ou menos ocorria em Estados de tradição liberal mais sólida,

como a Inglaterra, os Estados Unidos e mesmo a França, guardadas as reservas sobre

seus desempenhos.

Segundo porque, em verdade, ao invés de diminuição atualmente em vários países há

um crescimento dos corpos institucionais do Estado, mesmo que algumas dessas

instâncias já nasçam incapazes de desempenhar funções que ultrapassem a

circunscrição nacional, isto é, não tenham qualidades para a observância das

prerrogativas que vinculam políticas internas e políticas externas no mundo

contemporâneo. Muitas delas agora devem refletir sobre a performance de suas

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similares em países ocidentais, menos da Europa que dos Estados Unidos (Habermas,

2000), cuja ordem social é multifacetada mas obedece à dialética entre valores

considerados locais e valores considerados globais, estes últimos em sua maior parte

talhados pelos próprios norte-americanos. Ademais, no caso desse país, essa postura

existe há quase dois séculos, muito embora se acentuasse com o fim da visão

isolacionista que manteve até a Grande Guerra (1914-1917).

No que tange à América Latina, mesmo com a aludida ordem convergente, devem-se

observar as novas e explícitas modalidades de interação entre economia e cultura e

esboçar medidas que se podem chamar de cosmopolíticas tanto internamente, para a

formulação de um ordenamento jurídico que concerne às práticas sociais advindas do

avanço das novas tipologias comunicacionais e informacionais, como externamente, a

fim de estabelecer um marco de atuação que lide com as pressões dos países

tecnologicamente mais desenvolvidos e com as demandas por canais de

representatividade simbólica. O caso das mudanças nas políticas culturais nos últimos

25 anos na região pode ser um indicativo dessa transição para a cosmopolítica

(Cheah; Robbins, 1998) e nos concentraremos nesse ponto mais adiante.

O século passado foi caracterizado pela diversidade das técnicas de comunicação e

informação. Se nos séculos XV e XVI a invenção dos tipos móveis da máquina de

imprensa de Gutemberg proporcionou a possibilidade de impressão de vários

exemplares de um mesmo texto, no século XIX a invenção dos métodos de propulsão

com combustíveis fósseis como o carvão iniciou uma aproximação física e uma

redução nas distâncias temporais entre dois pólos de comunicação, os quais talvez

possamos associar, sob licença poética, ao emissor e ao receptor. No século XX esses

paradigmas espaço-temporais de contato entre esses elementos do modelo

comunicacional são potencializados e o fluxo de mensagens verbais, numéricas,

sonoras e icônicas se tornou uma atividade imediata, ao passo que as trocas de

mercadorias são realizadas de maneira cada vez mais célere e eficiente. Afora isso,

fatores políticos como o molde do Estado nacional e o sistema democrático

representativo se aperfeiçoaram e foram adotados como modelos de organização

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política em quase todo o mundo. Se esse processo de compartilhamento de métodos

de convivência resultou na formação de uma cultura popular internacional

(Ortiz,1999), na atualidade, em que se faz necessário um pensamento cosmopolítico,

já podemos considerar que essa cultura popular internacional possui uma tradição de

expressividade, mesma que, assemelhando-se às inúmeras contradições atribuídas há

muito ao capitalismo (Marx; Engels, 1981), está calcada nos quadros de

representação nacionalistas.

Em razão desse processo hoje as medidas que incentivam o reconhecimento e o

sentimento de pertença à esfera pública global devem integrar a cosmopolítica. Não

se concorda com a ideia de Manuel Castells de que toda política se tornou política dos

meios, politics is media politics (2009, p. 320), mas como já dissemos há signos que

os alçam a uma situação de regência dos sentidos sociais. Por certo, é nos cenários

preparados pelos meios em que se representam, simulam, dramatizam e se encenam o

drama social, da política partidária até a exposição das grandes narrativas deste início

do século, entre elas os direitos humanos, o ecologismo, o multiculturalismo, a

globalização etc., este último movimento caudatário dos debates acadêmicos das

ciências sociais e humanas. Ao minorar as substâncias culturais cujo campo de

atuação simbólica está confinada a uma comunidade idiomática, territorial e

populacional determinada, em favor daquelas substâncias com maior campo

interpretativo, muitas das instituições nacionais de promoção de identidades fortes

buscam desviar-se da pecha de conservadoras ou mesmo da obsolescência. Aquelas

que determinavam ou apenas incentivavam as formações discursivas dos meios de

comunicação como o cinema, a televisão, o rádio e as canções feitas para seu

formato, até a literatura, o teatro e as artes plásticas, viram-se na necessidade de

reorganizar suas funções.

Nesse diapasão, sistemas de signos como o literário, tanto em gêneros como o conto e

os romances, para não falar do poema, tornam-se cada vez mais excêntricos

(Gumbrecht, 1998). De fato, se antes os idiomas nacionais alcançavam máxima

expressão na arte literária e os filólogos e historiadores da gramática atc. Eram

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reputados como grandes intelectuais, hoje, para não chegar tão longe, as pessoas

devem aprender a ler imagens, são alfabetizadas no abecedário da digitalização, são

letradas em ícones, símbolos, cores, traços, e a intelecção da cidadania parece ser

independente do logos verbal. Inclusive se pode advertir uma reacomodação das

estruturas da visualidade, das imagens e das iconografias que vai além do estilo

episódico. Quando percebemos a necessidade de Luis Inácio Lula da Silva em

transformar seu modo de apresentação pública ao longo do período em que foi

candidato à presidência até alcançar sua meta (1989-2002), inferimos certa

substituição de ideias por imagens. Filmes como Central do Brasil (1998), Cidade de

Deus (2002) e Tropa de Elite (2007), demonstram também esse enquadramento da

representação dos grandes tópicos nacionais, como o Nordeste, a favela e o conflito

de classes, pasteurizados no esquema narrativo, plástico, estético enfim, dos filmes

latino-americanos realizados depois do Consenso de Washington, que provocou o fim

do apoio direto do Estado aos produtos da indústria cultural. De acordo com a

classificação de Dudley Andrew para as fases históricas do cinema, vivemos no

período do global cinema (2010, p. 86).

De qualquer maneira, estabelecemos que se erigiu no século XX uma tradição de

cultura popular internacional baseada nas mídias audiovisuais e em sua capacidade de

elaborar figurações nacionalistas, cujo conteúdo divergia pouco entre os países que

participam do concerto mundial, isto é, aqueles que pertencem aos organismos

multilaterais de decisão política e econômica, mas em que a forma sempre foi

bastante semelhante. Malgrado essa fosse dependente sobretudo das técnicas e

plataformas midiáticas notadamente transnacionais, não podia se desviar da

necessidade de granjear e abarcar um público tão amplo como o Estado nacional

comportasse, consubstanciado na categoria de massa, situação condicionada a uma

atuação coordenada com os programas políticos conjunturais, sobretudo devido a que

esses meios se instalaram na América Latina (notadamente o rádio e a televisão) sob

os protocolos da concessão pública (Sinclair, 1999). Cumpre ressaltar uma vez mais a

simbiose das elites econômicas, políticas e culturais na região, de vez que mesmo sob

o estatuto de serviço público estabelecido nas constituições, os meios audiovisuais

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aqui sempre sustentaram um projeto mercadológico (Jambeiro, 2001). Hoje a

autonomia das novas mídias em relação aos Estados indica um recrudescimento do

processso de analogias das estruturas retóricas de convencimento e legitimação,

sobretudo as que justificam a base política e econômica dos meios de comunicação.

Jürgen Habermas se refere a essa posição hegemônica da comunição e seus meios

como um sistema pragmático universal (1979), embasado talvez no que Immanuel

Wallerstein denominou world-system (1984).

Em paralelo com essa reorganização da política e dos discursos da mídia tradicional,

as conseqüencias sociais da popularização das novas tecnologias midiáticas e sua

consignação no espaço público global, segundo Manuel Castells um campo suscitado

e controlado pelos novos meios de comunicação e informação (2009, p.44 e p.320),

são um dos principais terrenos de atuação da cosmopolítica. Bruce Robbins atesta o

caráter culturalista do termo cosmopolítica (1999), sem a inflexão pejorativa,

portanto se pode afirmar que as políticas culturais hoje não são prerrogativas apenas

dos Estados, a despeito desses seguirem como poderosos reguladores de identidades,

mas se manifestam cifradas em atitudes grupais politizadas em favor do

reconhecimento de signos não identificados, ao menos da maneira em que nos

ensinaram, com a nação representada tão somente pelo território, pelo idioma e pela

população. Os signos da nacionalidade, que permanecem no idioma ou no sotaque, na

memória coletiva e histórica e nos costumes representados, transitam agora mais ou

menos cifrados em instâncias que se dizem intangíveis, como a sensibilidade, o gosto

e as trocas símbolicas que decorrem da recepção e da utilização dos produtos

audiovisuais e de outras textualidades, principalmente as que a tecnologia digital

propicia, e nesse sentido aparecem na produção e no consumo de bens da cultura

global.

Com efeito, a cosmopolítica mobilizada por atores sociais aparentemente dispersos

tende a desenvolver uma educação sentimental que relativiza a autoridade do regime

de representações identitárias fortes que o Estado levou a termo até mais ou menos o

decênio de 1980, com estratégias de formalização de conteúdos nacionais ostensivos.

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Consideramos então agentes de cosmopolíticas esses grupos ou comunidades

interpretativas (Radway, 1984) porquanto compõem novas esferas públicas cuja

espacialidade e as marcas referenciais navegam em imaginários transnacionais e em

ambientes virtuais que suscitam experiências de cunho intercultural. Não obstante

esse caráter horizontal e cool dessas práticas, o suporte em que suas políticas

informais atuam são meios de comunicação com rígidos sistemas de gestão (Harvey,

2006) capitaneados por sujeitos corporativos que instauram uma nova divisão do

trabalho internacional e, por meio da propriedade intelectual, projetam formas e

conteúdos que antes operavam precisamente contra a mercantilização de determinado

âmbito da vida cotidiana e que proclamavam uma modernidade diversa ou múltipla.

De qualquer maneira, quando observamos as características de intervenção de grande

parte dos latino-americanos nesses meios o ideário composto pelas políticas

nacionalistas e que resultou em ensaios, romances, filmes, música, teatro, artes

plásticas, dança e até arquitetura com acentuada cor local, ou ao menos em um

determinado sistema de representações regionais ou em uma poética cultural

(Teixeira, 1999), não parece ter sido de todo aplacado pela entrada de novos atores ao

cenário da história. Sobrevivem figuras de contestação junto a certo miserabilismo

populista (Passeron; Grignon, 1991), mesmo nas esferas discursivas que permitem,

além da representação, uma simulação digital das identidades e uma narratividade

interativa e em tempo real. Essa hipótese remete a um estranho jogo de espelhos

entre signos e referências, auspiciado em parte pelo quadro de desconfiança dos

produtores de conteúdo acerca da realidade social permeada tanto pelas estruturas

locais ou regionais do Estado, da nacionalidade, do idioma, como pela manifestação

do poder simbólico em si, seja doméstico ou global. De qualquer maneira, olvida-se

uma imbricação entre poder e significação, constituinte das construções teóricas

vistas como produções sociais,

A ritualização racionalizada do tempo nacional, aquele em que datas cívicas marcam

o ritmo do trabalho e do descanso dos cidadãos e orientam sua imaginação, e que os

meios de comunicação audiovisuais corroboraram com sua grade de programas

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orientada para as horas do dia em que cada segmento do público pode consumir suas

mensagens, bem como obedece às estações do ano e às festividades do calendário

cristão e nacional, hoje passa por uma crise. Os ciclos fixos dessas instituições não

compaginam mais com as dinâmicas do interesse e das disponibilidades temporais do

público contemporâneo, atento às maneiras de subverter qualquer iniciativa

autoritária no que concerce à organização da vida e dos gostos. Henry Jenkins em

Convergence Culture. Where Old and New Media Collide (2008) sintetiza a

comparação com um capítulo com título poderoso, “Photoshop for Democracy”, e um

exemplo retirado de uma anúncio da Apple Box feito no início da década. Na peça,

um adolescente aponta com um controle remoto para a câmera que o focaliza, do

ponto de vista do qual o vemos, e diz: “You‟ve got three minutes. Impress me.”

2.Consumo, novas tecnologias e razão comunicativa

Segundo se infere dos comentários especializados sobre o formato social que se

estabelece, as comunidades interpretativas parecem se articular por via do consumo

de bens culturais globais (música, filmes, games, sites etc.), mas essa atividade é

realizada em uma chave de entretenimento que de algum modo remedeia a raiz

econômica de suas propostas intelectivas e estéticas, a ponto de não perceberem que

estão consumindo o resultado de uma produção (Harvey, 2006), seja quando se usa a

rede, por exemplo, apenas como dispositivo de comunicação ou informação ou

quando se lhe utiliza como suporte para práticas de pesquisa ou de realização

artística. Pode mesmo haver uma tendência à indisposição com a problemática das

relações de poder, o que leva ao olvido conveniente, ao menos por um período, da

imanência da política na conduta humana em sociedade, à opção pelas promessas de

felicidade comum que estão inscritas nas práticas midiáticas, sustentadas por

iniciativas vinculadas ao liberalismo.

Mary Douglas e Baron Isherwood anotavam há mais de 30 anos em The World of Goods

que o consumo torna a cultura visível e estável (1979, p. 38). Nós podemos agregar que, no

período entre essa observação a este termo, as práticas capitalistas de consumo se

consolidaram elas mesmas como formas culturais, atualizações de arquétipos que remetem

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a outras tipologias de trocas assimiladas. O que se chama globalização parece desenvolver-

se num momento em que “se le pide a la cultura que resuelva problemas que antes eran la

provincia de la política y la economía” (Yúdice, 2002, p. 20). Mesmo com o

esclarecimento, resta o matiz sobre um deslocamento ainda mais sub-reptício das categorias

de política, economia e cultura, de vez que resíduos de hábitos milenares, vicissitudes

históricas e pressões econômicas arraigadas e sempre urgentes, ademais da cooptação, por

omissão, do Estado em relação a essas práticas na América Latina, as orientam a uma

posição sempre à margem, e quando há remissão ou valorização essa decorre de uma

inusitada dimensão plástica que não se lhe havia atribuido nunca.

O tema do consumo e da recepção dos produtos midiáticos, sejam da publicidade

convencional, do merchandising realizado na diégese desenvolvida nos textos midiáticos

ou simplesmente de seus programas (telejornais, telenovelas etc.), foi um recorte

epistemológico que apareceu no último quartel do século XX e em princípios deste, muito

embora na América Latina essa perspectiva já esteja bem consolidada no campo literário

em suas vertentes de teorias da interpretação e da recepção (Vital, 1995). Autores como

Ana Wortman (2003), Guillermo Orozco e Guillermo Sunkel (1992, 1999), entre outros,

seguem mais ou menos as diretrizes da segunda geração dos intelectuais envolvidos com os

Estudos Culturais anglófonos, tais como Stuart Hall (1980) e David Morley (1980a;1980b)

e mais recentemente Robert Stam e Ella Shohat (2000), com um viés pós-colonial. Essas

marca econômica impressa nos produtos da indústria cultural, mesmo os mais sofisticados,

é considerada no momento de se elaborar modelos ou esboços teóricos que deem conta das

condições de recepção e, certamente, das determinações econômicas do público

consumidor.

Mas a teoria da recepção aplicada ao consumo dos produtos dos meios, como em sua matriz

literária certamente com maior necessidade de erigir categorias com maior grau de

abstração, leva em consideração tanto aspectos textuais como contextuais, evitando o que

se chamou close reading. Bhaskar Sarkar (2010) fez um estudo das reações dos públicos de

Los Angeles ao assistirem filmes de artes marcias realizados em Hong Kong e de Hong

Kong ao assitirem filmes de Jackie Chan, feitos em Los Angeles. O resultado, no caso, foi

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que os filmes chineses que se tornaram cultuados nos Estados Unidos e agora no mundo

todo muitas vezes eram lidos em chave de comédia, desvalorizando o lado aventureiro

desses filmes e criando sentidos cômicos à revelia das intenções dos distribuidores, dos

diretores e da estrutura dramática e narrativa original. Por seu turno, as obras de Jackie

Chan não são lidas como comédias puras em Hong Kong. Um das conclusões a que chega é

que “something is always lost in translation” (Sarkar, 2010, p.37).

Diverse practices of the imagination in different regions of the world,

drawing on local cultural resources in tandem with more universalized

sensibilities, produce variegated conceptions of modernity and globality.

In place of monolithic globality, we now speak of a range of globalities.

(Sarkar, 2010, p. 44).

Na América Latina as instâncias de produção de sentido e validação social que as novas

comunidades ativam mediante o consumo consubstanciam uma espécie de projeto politico

inconsciente (Jameson, 1992), de vez que muitas dessas expressões tendem a ser

alternativas (pirataria, trabalho informal, vindicação de direitos sociais) e parecem ir de

encontro à razão mercadológica da sociedade da informação, malgrado não haja temas

impertinentes para os meios, cujos parâmetros discursivos, mais ainda ao abrigo dos

postulados do Consenso de Washington, canibalizam sem delongas quase toda dissidência.

Propostas relativas a projetos claramente políticos como as páginas da Asamblea Popular

de los Pueblos de Oaxaca (asambleapopulardelospueblosdeoaxaca.blogspot.com) no

México, bem como a que nos enlaça com o Ejército Zapatista de Libertación Nacional

(www.enlacezapatista.ezln.org.mx) e os www.cacerolazos.com argentinos, ou de reflexão

estética como o do grupo Corpos Informáticos (www.corpos.org) do Brasil (um pouco

menos), ou os sites de curta-metragens para a web, como www.tech-mex.mx.org,

www.solocortos.com e www.tuminuto.com, do México, ou www.videometraje.com.ar, da

Argentina, crivam a rede de conteúdos engajados e nacionalistas.

Seus produtores de contéudo assimilaram a herança de combate social de seus países e as

imagens que o cinema global e outros meios de representação fizeram e fazem deles e as

traduzem, em registro estético claro ou obtuso, aos parâmetros discursivos do espaço

virtual, detatando a existência de uma sensibilidade transnacional. Sua meta é invocar uma

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comunidade interpretativa dispersa histórica e geograficamente mas de gosto aproximado,

uma comunidade cultural, que tende a organizar os enunciados políticos como signos

estéticos e lê as mensagens sociais por intermédio de estímulos estilísticos. Apesar da

suposta dissipação do conteúdo político, a resposta obtida por meio de mensagens postadas

ou por meros acessos ou ainda pelo feedback residual, implícito no vocabulário cotidiano,

no corpo, na moda etc. pertencem ao plano da experiência virtualizada, mas contam com

alguma base material, tal como asseverou David Harvey sobre as operações capitalistas

modernas, mais claramente as operações financeiras, em aparência desmaterializadas mas

com grande capacidade de metamorfose. Um exemplo é o saneamento do dinheiro

resultante de práticas as mais primitivas, tais como os empreendimentos têxteis norte-

americanos com base na Nicarágua ou na China (2006).

A constatação do possível substrato crítico de parte importante desse consumismo

produtivo local dos meios globais é o motivo para que se pense que a grande contribuição

da América Latina à cyberculture é o viés social de suas expressões, notadamente aquelas

que concernem ao cyberprotest, à netwar (Pitman, 2006, 86). Uma ideia da coloração

nebulosa que ganharam alguns de nossos hábitos na cyberculture está explicitado em

Networks and Netwars: The Future of Terror, Crime, and Militancy, de John Arquilla e

David Rondfeldt (2001), em que atividades de procedência moral tão diversa como o crime

organizado e os movimentos sociais entroncam-se para ser observados com a mesma lente.

Mas este parece ser mais um capítulo da ficção de igualitarismo promovida pela rede e por

seus publicistas da Wired e, antes, da Mondo 2000.

Pelo que foi comentado até o momento, parece que houve uma transição bem delineada da

modernidade para a pós-modernidade, do espaço público burguês (Habermas,1984),

baseado no jornalismo e no letramento, ao espaço público multimidiático (Canclini, 1994),

baseado no consumo de repertórios sígnicos múltiplos em que se combinavam modalidades

de verossimilhança com cronotopos nacionalistas, até alcançar o espaço público global

(Castells, 2009), com uma virtualização das formas e conteúdos tradicionais e uma

instauração de novos projetos utópicos e ideológicos, ademais de uma anulação do sujeito

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autoral e das representações que seriam substituidas pelos discursos anônimos e pelas

simulações.

Em verdade, nenhum desses períodos e tópicos têm um início e um final determinado e,

nesse sentido, tampouco há uma ruptura tão determinante para que se estabeleça que essas

marcas da modernidade levaram ao que se chama de pós-modernidade, tratando-se antes de

um postulado da consciência diante dos avanços técnicos que de uma realidade de mudança

de paradigmas. Com efeito, ao não se lhes considerarem ciclos completos, evita-se o afã

fetichista desses recortes temporais e epistemológicos, cujos títulos (modernidade, pós-

modernidade, representações, simulações etc.) são utilizados aqui de modo operacional, o

que não impede que se assegure a crescente relevância de uma racionalidade baseada nos

modelos retóricos de apresentação das proposições da vida cotidiana e se reafirme uma

estetização do mundo com diretrizes já prenunciadas no Renascimento, senão antes. Essa

constatação do caráter arquitetônico da modernidade ocasionou já reações na América

Latina, da parte de José Joaquin Brunner (1992) ao perceber que se houvesse mesmo um

sistema de enunciados modernos nunca alcançamos tal estádio e mesmo nos países centrais,

quando Bruno Latour intitulou seu livro mais proeminente We Have Never Been Modern

(1993), questionando a estabilidade das proposições que caracterizam a modernidade.

A atual tendência determinista suscitada pela consagração de uma espécie de razão

comunicativa dota a dialética entre o universal e o particular de uma falsa síntese, de vez

que não há reconciliação desses termos nos âmbitos da globalização e do multiculturalismo,

por exemplo, os grandes motes ideológicos contemporâneos. O desempenho dessas

categorias, nascidas nas ciências sociais e humanas e hoje insoslaiáveis do debate público,

da academia à pauta dos meios de comunicação, pode ser alojada na dimensão de

subnarrativas da culturalização do mundo, o que permite entrever um subtexto em que o

não-idêntico é conduzido a algum lugar da identidade. Por sua vez, termos menos usados

como interculturalismo e transnacionalismo seriam mais descritivos nas circunstâncias do

cotidiano, em que as migrações são vistas como diásporas épicas e o intercâmbio de

significados é realizado em ruínas indiciais como os sotaques, as migalhas dos hábitos de

alimentação etc., propiciando a conformação de sujeitos fronteiriços. O fenômeno das

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migrações e imigrações, como já atestou Arjun Appadurai (1996), pode redundar num

fortalecimento da visão culturalizada do mundo, de vez que a experiência do deslocamento

físico ou corporal acarreta nuances de sentido em todas as esferas da vida em sociedade. O

histórico de ditaduras, guerras civis e contingências econômicas motivou que parte da

população latino-americana optasse pela saída de seus países, especialmente rumo aos

Estados Unidos e à Espanha. De acordo com Marta Nubia Bello (2005, p.69-92), que

reproduz cifras conservadoras, há mais de 650 mil latino-americanos na Espanha, sendo

que os equatorianos e os colombianos representam a maior parte. Nos Estados Unidos,

estimam-se 12 milhões de mexicanos ilegais.

Na América Latina, são as viscissitudes por que passaram as políticas culturais a partir do

fim das ditaduras e das guerras civis onde se encontram as constantes que caracterizam as

formações discursivas que dão conta e legitimam essas noções. Como foi mencionado, na

região as estruturas e as funções políticas, econômicas e culturais sempre estiveram

articuladas e quando se ensaiou a autonomização de um desses âmbitos, como pareceu

ocorrer na Europa e nos Estados Unidos com as crises da representação e a criação das

epistemes ou esferas axiológicas (Foucault, 1966; Rouanet, 1989) e com os debates sobre a

arte pura ou arte pela arte (Bourdieu, 1995), sempre aparecia uma nota pelintra. As

instituições de apoio à produção cultural e os regimes de representação condicionados, na

medida do possível, ao seu quadro regulatório, delineam um perfil imaturo e difícil de

caracterizar esteticamente, devendo ser reduzido à escala sociológica sempre, algo que

compraz a tônica do pensamento pós-colonial, também tributário dos Estudos Culturais.

Finalizaremos este estudo com um comentário sobre as práticas de apoio à produção

audiovisual, notadamente o cinema, na região e sua reverberação na fatura fílmica, na

diégese e nos componentes formais de articulação.

3.Imaginação consensual e poética da responsabilidade no cinema da América Latina

De acordo com Néstor García Canclini hoje as identidades são “las maneras-cambiantes-

en que las sociedades se imaginan y construyen relatos sobre su origen y su futuro” (1999,

p.35). Quando se observam as vicissitutes pelas quais passaram os esquemas de realização

cinematográfica na América Latina se estabelece o trajeto das políticas nacionalistas às

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cosmopolíticas e os signos que denotam e conotam as mudanças na sensibilidade de cada

período, conferindo identidades provisórias mas sempre amparadas por estímulos

discursivos. As ideias de imaginação consensual e poética da responsabilidade já foram

abordadas anteriormente em outros estudos, mas parece útil mantê-las como eixos

descritivos desses percursos. O que as anima corresponde à constante norma da

compatibilidade entre as conjunturas políticas e econômicas e as estruturas estéticas que

moldam os estilos cinematográficos. Essa tensão certamente advém do modo de produção

da obra fílmica, vinculado às circuntâncias das técnicas de representação que, por sua vez,

são caudatárias dos avanços da ciência e de sua aplicabilidade a algum tipo de mercado,

seja de feitio neoliberal, seja orientado pelos Estados.

Segundo Sabine Hake, os elementos para a criação de uma cinematografia nacional são o

star system, os gêneros e os diretores (2008, p. 17). Nós acresceríamos à lista a construção

de infraestrutura, a mão de obra qualificada e um repertório de temas ao lado de uma

inconografia de identificação com os valores locais. A Argentina, o Brasil e o México

lograram preencher todos esses quesitos. Entre 1930 e 1950, os intentos de formação de um

paque industrial e de um público para as cinematografias nacionais na América Latina

foram insuflados pela entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra (1941). A criação de

grandes estúdios no Brasil (Cinédia, 1930; Atlântida, 1941; Vera Cruz, 1949), na

Argentina, (Sono films, 1933, e San Isidro, 1937, este com apoio Francês e Alemão, e

Aires, mais ou menos em 1958) e no México (CLASA Films, 1934, e Estudios

Churubusco, 1945, ambos com apoio norte-americano) tiveram o fim de promover a

produção de imagens locais com forma e conteúdo mais ou menos alinhados aos

parâmetros de Hollywood, porquanto se reproduzia uma imaginação consensual por

intermédio de uma poética da responsabilidade. Este último termo é uma adaptação da

reputada ética da responsabilidade, tributária da racionalização burocrática do mundo social

e relacionada com a consecução de uma ação que visa aos fins, à diferença da ética da

convicção e dos valores (Weber, 2000).

De fato, muitos dos técnicos, atores e diretores que logo comporiam os poderosos

sindicatos mexicanos da indústria cinematográfica tinham passagem pelos estúdios de Los

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Angeles, e nos outros países havia proliferação de estrangeiros entre os envolvidos nas

produções. Já as chanchadas, os sainetes camperos e as comedia rancheras foram os

subgêneros locais que de alguma maneira espelhavam os melodramas e os musicais de

Hollywood, mas com um regime de representações ostensivamente nacionalista. Um dado

importante é que todas essas iniciativas de formação de cinematografias nacionais foram

mormente realizadas por empresários, com um apoio relativo do Estado, que atuava mais

em questões atinentes às leis de quotas de exibição, na criação de cinemas educativos e na

orientação representativa.

Mas a hegemonia alcançada pelos modelos norte-americanos no pós-guerra ocasionou o

declínio das indústrias locais latino-americanas, cujos esquemas de produção e de

representação estavam há muito embasados em Hollywood. Logo da Revolução Cubana

(1959) há a possibilidade de um deslocamento das forças que reverbera na produção

fílmica, tanto em seus modos de captação de recursos para a realização como em sua

elaboração estética, malgrado os sistemas de representação permanecerem ostensivamente

nacionalistas depois da criação dos Novos Cinemas Latino-Americanos. Entre 1960 e 1988

foi o período mais prolífero do cinema da região, tanto em número de filmes como em

formulação de uma poética (Getino, 2006; Sanchez Ruiz, 2006). Nesse período surgiram a

EMRAFILME, no Brasil, que patrocinava até 100% das produções, na Argentina houve

um incremento das atividades do Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales

(INCAA) e do Fondo de Fomento Cinematográfico, criado em fins de 1950, e no México o

presidente Luis Echeverría (1970-1976) nacionalizou a atividade. Um exemplo do

necessário lastro industrial do sistema de produção, distribuição e exibição de cinema pode

ser ilustrado com o caso da Guatemala, o maior país da América Central, a subregião mais

carente da América Latina, onde entre 1949 e 1994 foram filmados apenas 40 longas-

metragens (Cortés, 2005, p.174) e mesmo assim com intenso apoio de empresários e

artistas mexicanos.

Com a queda do Muro de Berlim (1989) e o fim das ditaduras na América Latina, o ideário

liberal norte-americano se espraiou por todos os quadrantes e dimensões da vida social. O

Consenso de Washington foi o golpe final às alternativas políticas e econômicas ao

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capitalismo liberal e a ascensão das novas técnicas de comunicação e informação consagrou

a dominância da dinâmica social dos Estados Unidos em relação ao restante do mundo.

Segundo Fredric Jameson (1998, p.65) “the free movement of American movies in the

world spells the death knell of national cinema everywhere, perhaps of all national cinemas

as distinct species”. Apocalítico ou não, é fato que nos últimos anos as indústrias culturais

da região enfrentaram-se com a emergência do vizinho do norte como organizador dos

sentidos da globalização, a tal ponto que várias das empresas norte-amercianas de atuação

no mercado latino-americano de música, de cinema, de televisão etc., terem base em Miami

e de lá gerirem seus negócios hispánicos e várias das grandes redes de comunicação da

região (Globo, Televisa, Cisneros etc.) contarem com sucursais ou mesmo sedes nessa

cidade da Flórida. Miami se tornou, de alguma maneira, uma espécie de capital cultural da

América Latina. Nesse sentido, George Yúdice assevera que

La tranformación de los sistemas de comunicación mediante procesos

neoliberales (privatización, desregulación, eliminación de los servicios

proporcionados por el Estado benefactor por razones políticas y

económicas) resulta en una recomposición y resignificación de territorios

y públicos. La transnacionalización y (neo) liberalización de las industrias

culturales impone (1) la necesidad de insertase en una economia

supracional y (2) reestructuraciones para facilitar esa inserción,

respondiendo a „una dialéctica de la uniformización y de la

diferenciación‟ (Yúdice, 2002, 21-22).

Essa nova ordem global teve ascendência em quase todos os planos do sistema

cinematográfico. Na América Latina as medidas tomadas pelos primeiros governos

no início do decênio de 1990 foram a eliminação dos órgãos estatais que estavam

encarregados de apoiar as produções nacionais e a consequente promoção de canais

para parcerias internacionais, num claro sinal de transição das polítcas nacionalistas

para cosmopolíticas. Nessa última rubrica, destacam-se o programa Ibermedia, que

fomenta co-produções entre países da América Latina e da península Ibérica, o

Sundance Institute e o Hubert Bals Project, com o apoio do Festival de Rotterdam,

que mantém um nível de patrocínio de filmes de países em desenvolvimento. A

criação de produtoras independentes na região também foi importante, como a

argentina Patgonik (produziu Nueve Reinas, 2000, e Kamchatka, 2002), a mexicana

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Altavista (Amores perros, 2000) e a brasileira Videofilms (Cidade de Deus, 2002 e

Madame Satã, 2002). Na distribuição ocorre uma concentração de multinacionais

Buenas Vista International, Sony Pictures, Miramar Films e 20th Century Fox. É

importante comentar que a despeito dessa reacomodação de forças no sistema

cinematográfico da região, segundo Deborah Shaw logo na primeira página da

introdução de Contemporary Latin American Cinema. Breaking Into the Global

Market (2007) hoje “there are more Latin American films than ever before on

secreens in big cities in Europe, the United States [...] There has never been such

visibility for films from the region”.

Antes de se chegar nesse estágio, no Brasil em 1990 Fernando Collor de Melo fechou

a Embrafilme e o Concine, e entre 1990 e 1991 não houve produção nacional

nenhuma exibida nas telas dos cinemas. Mas entre 1994 e 1999 há cerca de 110

filmes realizados mediante diversos modos de produção, mesmo que apenas 88

tenham sido comercializados (Getino, 2006, pp. 211-216). Filmes como Carlota

Joaquina, 1995, de Carla Camurati, Terra estrangeira, 1996, de Walter Salles, Um

céu de estrelas, 1996, de Tata Amaral, Baile perfumado, 1997, de Lírio Ferreira,

Central do Brasil, 1998, de Walter Salles, Bicho de sete cabeças, 2001, de Lais

Bodansky, Cidade de Deus, 2002, de Fernando Meirelles, Madame Satã, 2002, de

Karim Ainouz, Carandiru, 2002, de Hector Babenco, Amarelo manga, 2003, Cláudio

Assis, Cinema, aspirinas e urubus, 2005, de Marcelo Gomes, Árido movie, 2006, de

Lírio Ferreira etc. marcam o que se chama de retomada, não obstante haja uma

divergência importante tanto nos segmentos mencionados que compõem o sistema do

cinema (produção, distribuição e exibição) como dos regimes de representação, que

envolvem desde iluminação, à constituição de planos, à tipologia dos personagens, às

histórias etc. Se não convém condicionar uma obra de intenção poética com uma

ordem de dinâmicas sociais, como se uma fosse reflexo da outra, pode-se, para

desviar-nos do debate requentado, como disse Antonio Candido , perceber funções

históricas por intermédio das estruturas fílmicas (Candido, 2000, p. 153).

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Na Argentina em 1994 é sancionada a Nueva Ley de Fomento y Regulación de la

Actividad Cinematográfica, mas se mantém a estrutura do Instituto Nacional de Cine

y Artes Audiovisuales (INCAA) e se fortalece Fondo de Fomento Cinematografico.

Se em 1990, esse fundo era de cerca de 3 milhões de dolares, em 1994, passou para

oito mlhoes e em 1997 subiu a 57 milhoes. Na Argentina há quase 20 anos são

produzidos uma média de 40 filmes por ano. Agora, se a exibição e a distribuição na

Argentina era feira mormente por empresas nacionais, como ocorreu no restante do

continente agora a última e controlada pelas empresas comentadas, na exibição as

salas de exibição multiplex de origem americana desempenham 70 por cento dessa

função. O recente destaque internacional dos filmes nacionais se deve às fórmulas já

mencionadas. Ha grandes obras como Plata quemada, 2000, de Marcelo Pineyro,

Nueve reinas, 2000, de Marcelo Pineyro, La niña santa, 2004, de Lucrecia Martel,

Machuca, 2004, de Andrés Woods, El pasado, 2007, de Hector Babenco, que

incorrem na prática de uma imaginação consensual e conformam uma poética da

responsabilidade. Segundo a fórmula irônica de Tamara Folicov (2004, p.335) nesses

filmes se percebe a existência de filmes norte-americanos falados em espanhol.

Já no México em 1992 o governo de Carlos Salinas de Gortari promulga uma nova

Ley Federal de Cinematografía, em que contempla o desaparecimento de empresas

estatais de distribuição, como Películas Nacionales, e de exibição, como COTSA, e

reduz a quota de exibição de filmes nacionais de 50% para 10%. Depois da

desestatização do Instituto Mexicano de Cinematografía (IMCINE), encabeçado nos

primeiros anos por Ignacio Durán Loera, não obstante a queda inicial na produção,

houve uma recuperação dos filmes nacionais no mercado local e mundial. Devido a

medidas como o incremento das co-produções, foi possível realizar filmes que

trouxeram o público de volta às salas, como foram os casos de Como agua para

Danzón, 1991, de María Novaro, e Cronos, 1993, de Guillermo del Toro. Se na

década de 1980, houve uma média de 88 filmes mexicanos por ano, entre 1990 e

2000 o índice foi 35 (Sánchez Ruiz, 2006, pp. 61-65). Entre 1999 e 2001 foi criado o

FIDECINE, órgão de apoio à produção, a cargo do IMCINE. Em 2000, das 100

películas mais assistidas, oito foram nacionais e 86 foram norte-americanas (Sánchez

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Ruiz, 2006, p. 25). Nos últimos dez anos, outros êxitos foram granjeados pelos filmes

nacionais, não só no país mas também no exterior, como Todo el poder, 2002, de

Fernando Sariñanas, Vivir mata, 2002, de Nicolás Echeverría, Y tu mamá también,

2001, de Alfonso Cuaron, .Amores Perros, 2000, Alejandro Gonzales Inarritu e El

violín, 2005, de Francisco Vargas.

4.Considerações finais

Este estudo tencionou descrever as grandes figurações históricas que nortearam nos

últimos 20 anos na América Latina a composição das emoções e cognições coletivas,

por intermédio dos discursos da mídia audiovisual e do debate público ocorrido nas

ciências sociais e humans e no jornalismo. O método de cunho ensaístico empregado

aqui tratou de desviar-se dos paralelismos que consistem em assinalar as questões de

ordem social de um lado e sua ocorrência em obras específicas de outro e buscou uma

dinâmica de correlação visando a alcançar diversas camadas de sentido e assim

seguir o curso da reflexão contemporânea. Foi dito, por exemplo, que se a

refuncionalização do tipo e da atuação dos intelectuais na sociedade deveu-se ao

desencanto e à desvalorização dos conteúdos da antiga esquerda política, essa veio

em paralelo com um reposicionamento da ferramenta de maior préstimo utilizada por

eles, a palavra escrita, que na atualidade aperece em concorrência com o audiovisual

como sistema de signos de maior influência na sensibilidade e no pensamento.

A propósito, há um amplo repertório de aspectos imaginativos, iconográficos e

verbais que aludem, representam e simulam as práticas sociais não apenas como um

objeto dramatizado e fechado tal qual uma obra, mas como um processo de

articulação de estímulos que não chegam a desestabilizar os paradigmas intelectivos

anteriores, mas forçam uma intereseção performática entre séries provadas e novas. O

problema da verossimilhança e do cronotopos, nitidamente renovado com a

emergência das novas textualidades que atuam nos suportes virtualizados, foi

tangenciado nas análises dos modos em que os latino-americanos se encarregam de

utilizar essas tecnologias de comunicação e informação.

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Outro assunto sinalizado corresponde à lógica comunicacional imperante e seu

substrato caótico, não representativo, inconsciente etc., que de alguma maneira está

contrabandeado nas formas e nos sentidos das práticas sociais racionalizadas, como

nas imigrações que desmaterizalizam as culturas nacionais baseadas em idioma,

território e hábitos de sobrevivência (alimentação, vestuário, comércio etc.) bem

como na cada vez mais visível internacionalização do gosto e da pauta de problemas

sociais, manifestada principalmente em filmes, músicas, obras literárias, e também

em sites de relacionamento ou temáticos, no jornalismo e nas medidas políticas e

econômicas. Uma perspectiva generalizante como a proposta enseja ao menos

associar essa intuição das sombras que aparecem em certas práticas a uma espécie de

insubordinação dos signos (Richard, 1994) ou ao menos a um acosso latente e crítico

ao substrato coercitivo das linguagens (Barthes, 1997), de vez que boa parte da

validação social na atualidade se estabece mediante uma comunicação mediada

tecnicamente ou tecnologicamente, mas de perfil retórico e sofístico.

Um assunto fulcral no texto foi o Consenso de Washington e suas propostas de

reformas das Constituições nacionais na América Latina a fim de propiciar maior

liberdade ao capital financeiro, suscitando um fortalecimento do poder judicário na

tomada de decisões das Repúblicas. Como consequência, batizou-se de

cosmopolíticas algumas das ações do executivo e do legislativo e, sobretudo, alguns

dos modos de atuação comunitária, especialmente o realizado por intermédio da

internet, um suporte que simboliza a necessidade atual de velocidade no fluxo de

dados, sejam números referentes aos mercados financeiros, sejam mensagens de

textos, imagens ou sons. Por certo, deixou-se mais ou menos patente que o tempo das

instituições modernas tradicionais é bem diverso ao desempenhado nos novos meios,

bem como o tempo das vontades sociais tornou-se ainda mais urgente.

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1 Profesor de la licenciatura en Comunicación y de la maestría en Estudios de Medios de la

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Brasil. Tiene estudios en México, Estados

Unidos y Brasil. Ha sido profesor en la Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM, 1991-

1994 y 2006) y visiting scholar and researcher en la University of Texas at Austin (UT, 2009). Tiene

textos publicados en México, Estados Unidos y Brasil. Su dirección eletrónica es [email protected] y

[email protected].

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