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Consequências da protrusão bilateral e crônica da glândula ... · disposição anatômica, a glândula túbulo acinar correspondente (glândula da terceira pálpebra) está profundamente

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Page 1: Consequências da protrusão bilateral e crônica da glândula ... · disposição anatômica, a glândula túbulo acinar correspondente (glândula da terceira pálpebra) está profundamente

Consequências da protrusão bilateral e crônica da glândula da terceira pálpebra

em canino

Consequences of bilateral protrusion and chronic of the third eyelid gland in

canine

FILGUEIRA, K. D.1*

; RODRIGUES, R. T. G. A.1; FERREIRA, M. B.

1;

FERNANDES, K. S. B. R.1

1UFERSA

*e-mail: [email protected]

Palavras-chave: oftalmologia, patologia de anexo ocular, Canis familiaris.

Revisão da literatura

A manutenção da transparência do globo ocular é essencial para a transmissão e

refração do raio luminoso sobre a retina e pela pressão interna que mantém o globo

distendido. Essas funções estão relacionadas com o filme lacrimal (não é uma camada

anatômica e sim fisiológica), córnea, humor aquoso, lente e humor vítreo (LAUS,

2009). A terceira pálpebra (ou membrana nictitante) corresponde a uma camada fina de

tecido observada no canto medial de cada olho. Enquanto a mesma encontra-se em sua

disposição anatômica, a glândula túbulo acinar correspondente (glândula da terceira

pálpebra) está profundamente assentada e não visível, mas contribuindo com uma

significativa proporção do filme lacrimal aquoso (GELATT et al., 2013). As afecções

da glândula da terceira pálpebra associam-se com um volume importante das

oftalmopatias, seja pela sua frequência ou porque são causadoras de muitas doenças

corneias (HERRERA, 2008). Dentre as enfermidades primárias da mesma, destaca-se o

prolapso ou protrusão, pelo canto nasomedial ocular. A permanência de tal condição

patológica tende a refletir em outros componentes oftálmicos, uma vez que a glândula

da terceira pálpebra mantida em sua posição não anatômica tende a produzir menor

quantidade de lágrima, gerando uma enfermidade denominada de ceratoconjuntivite

seca (MENEZES, 2007). Essa se caracteriza pela deficiência da fração aquosa do filme

lacrimal, resultando em dessecação e inflamação da conjuntiva e córnea, dor, doença

corneana progressiva e redução da visão (ALMEIDA et al., 2004). Além de ocasionar

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os diversos transtornos já citados ao sistema visual, a ceratoconjuntivite seca também

resulta na ceratite pigmentar, a qual é considerada um reflexo de condições corneais

crônicas do que uma enfermidade propriamente dita. Pode conduzir a cegueira se a

causa não for adequadamente diagnosticada e abolida (LAUS, 2009). Nesse sentido, o

presente trabalho objetivou a descrição da apresentação clínica do prolapso persistente

das glândulas da terceira pálpebra e das enfermidades secundárias geradas.

Relato do caso

Uma cadela, oito anos de idade, raça Pinscher, possuía o histórico de alteração ocular

desde o período pediátrico. Nunca houve diagnostico e/ou tratamento prévio.

Atualmente foi percebido pelos tutores redução da acuidade visual da fêmea canina.

Na avaliação física, verificou-se normalidade dos parâmetros vitais. Todavia, na

semiologia oftálmica foi constatada, de localização bilateral, aumento de volume com

sinais de inflamação, emergindo do canto medial palpebral. O achado foi compatível

com protrusão da glândula da terceira pálpebra. Também ocorria redução do brilho e

neovascularização da superfície corneal, hiperemia conjuntival, secreção ocular mucosa

e blefaroespasmos. Realizou-se o teste lacrimal de Schirmer, um método

semiquantitativo de verificação da produção do componente aquoso da lágrima. Os

valores obtidos no olho direito e esquerdo corresponderam a 0 mm/minuto e 2

mm/minuto, respectivamente. Mediante a tais achados foi verificada a presença de

ceratoconjuntivite seca grave. Descartou-se a ocorrência de ceratite ulcerativa, uma vez

que, ao se utilizar o teste com tiras de fluoresceína, não houve a fixação do corante no

estroma de ambas as córneas. Todavia, existia deposito de pigmento (similar à

melanina) no epitélio e estroma subepitelial, da córnea direita e esquerda, característicos

de ceratite pigmentar. Como condutas terapêuticas, inicialmente prescreveu-se pomada

manipulada de ciclosporina 1% (1 cm/olho, a cada 12 horas, até novas recomendações),

lubrificante ocular (gel líquido, a base de carbômer, instilando-se uma gota/olho, a cada

seis horas, até novas recomendações) e solução oftálmica de prednisolona 1% (uma

gota/olho, a cada seis horas, por 60 dias). Transcorridos dois meses do tratamento,

constatou-se redução da inflamação de ambas as glândulas da terceira pálpebra, com

regressão da sintomatologia associada à ceratoconjuntivite seca (nesse momento,

produção lacrimal situava-se em 15 mm/minuto, em cada olho) e estabilização no

acumulo de melanina corneal relacionada à ceratite pigmentar. A terapia com o

corticosteroide oftálmico foi suspendo, mantendo-se os demais fármacos. Realizou-se a

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reintrodução cirúrgica das glândulas da terceira pálpebra, com a utilização da técnica de

bolsa conjuntival. Foi realizado seguimento da paciente, sem ocorrência de recidiva de

protrusão glandular, manutenção normal da produção lacrimal e estabilização da

pigmentação corneal.

Discussão

A protrusão da glândula da terceira pálpebra ocorre com relativa frequência em cães é

caracteriza-se pelo aparecimento e exposição constante ou intermitente de uma massa

de tecido glandular e conjuntival, inflamada, no canto medial do olho (MENEZES,

2007). Pode ser tanto unilateral quanto bilateral e geralmente ocorre antes dos anos de

idade. A etiologia relaciona-se como resultado da astenia ou ausência do tecido

conjuntivo entre a porção ventral da terceira pálpebra e os tecidos periorbitários,

permitindo que a glândula (que até então estava normalmente localizada ventralmente),

se desloque dorsalmente, onde se torna exposta de modo anômalo (GELATT et al.,

2013). Sugerem-se ainda como fatores predisponentes a hereditariedade em alguns

indivíduos e predisposição racial (MENEZES, 2007). Animais das raças Cocker

Spaniel, Beagle, Boston Terrier, Pequinês, Basset Hound, Bulldog Inglês, Shih-Tzu,

Lhasa Apso e Mastin Napolitano estão entre os mais acometidos (ALMEIDA et al.,

2004; RANZANI et al., 2004). As citações acima justificaram o aparecimento da

patologia da glândula da terceira pálpebra em questão. Todavia houve uma divergência

em relação ao padrão racial do indivíduo analisado, uma vez que não se encontrou

dentre os mais sujeitos a oftalmopatia. A glândula da terceira pálpebra contribui na

produção de 30% da fração aquosa do filme lacrimal. Nesse sentido, afecções de tal

estrutura, como a protrusão (e principalmente com ocorrência bilateral e de curso

crônico), favorecem a anormalidades qualitativas e quantitativas do componente aquoso

e podem alterar a dinâmica e função do filme lacrimal função devido à interação

complexa entre os componentes primários da lágrima (aquoso, lipídico e mucoproteico).

Com isso, há predisposição para o desenvolvimento de ceratoconjuntivite seca

(ALMEIDA et al., 2004). A mesma é definida uma inflamação crônica das glândulas

lacrimais, córnea e conjuntiva, com disfunção na secreção, retenção, distribuição e

drenagem do filme lacrimal trilaminar (LAUS, 2009). Uma das principais caracteristicas

que levam a suspeição da doença é o acumulo de secreção mucosa ocular, tambem

podendo existir hiperemia conjuntival difusa, vascularização corneal superficial e

ceratite pigmentar (HERRERA, 2008). Na cadela em discussão, a sintomatologia da

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ceratoconjuntivite seca foi similar com a literatura e a sua gênese (e caráter severo),

possivelmente relacionou-se com a exposição bilateral e permanente da glândula da

terceira pálpebra. Além da relação com enfermidades da glândula da terceira pálpebra, a

ceratoconjuntivite seca canina também é incriminada com desordem imunomediada,

anormalidades congenitas, doenças infecciosas (cinomose), endocrinopatias e

administração de fármacos, como sulfato de atropina e sulfonamidas (LAUS, 2009). A

ceratite pigmentar (também denominada de ceratite pigmentar superficial) resulta da

pigmentação corneal decorrente da migração de melanócitos do limbo esclerocorneal e

da conjuntiva perilimbial, com deposição subepitelialmente no estroma superficial. O

processo é acompanhado de vascularização e infiltração inflamatória (HERRERA,

2008; GELATT et al., 2013). Associa-se com a permanência crônica de insutos locais,

como a ceratoconjuntivite seca, distrquíase, triquíase da plica nasal, entrópio, ectrópio,

euribléfaro. O depósito de melanina frequentemente progride com tendência em ocultar

o centro da córnea e pupila, com interferência na capacidade visual. Muitos tutotres não

estão cientes do problema até que o animal torne-se debilitado visualmente (GELATT et

al., 2013). No presente relato, a cronicidade da ceratoconjuntivite seca conduziu ao

aparecimento da ceratite pigmentar, já que outras prováveis causas foram abolidas

durante o exame oftálmico. O acúmulo de tal pigmentação melânica em ambas as

córneas justificou a redução da acuidade visual no animal em evidência. A remoção da

glândula da terceira pálpebra prolapsada pode reduzir a produção de lágrima em 30 a

57% e assim acelerando o desenvolvimento da ceratoconjuntivite seca e respectivas

consequências (RANZANI et al., 2004). Na cadela descrita, apesar do longínquo tempo

de protrusão das glândulas da terceira pálpebra, a adoção de uma técnica cirúrgica

apropriada para a preservação e reposicionamento das mesmas foi essencial para a

estabilização das sequelas corneais e da fisiologia visual. Para o tratamento de múltiplas

moléstias oftalmológicas, há necessidade de terapia com fármacos, cirurgia ou mais

provavelmente uma combinação de ambos (HERRERA, 2008). A associação do

tratamento clínico e cirúrgico refletiu positivamente na sanidade ocular da paciente em

questão.

Considerações finais

A protrusão da glândula da terceira pálpebra não deve ser negligenciada e/ou

subestimada na rotina oftalmológica de animais de companhia uma vez que pode

conduzir a sequelas que interferem no bem estar e qualidade de vida dos pacientes.

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Referências

ALMEIDA, D. E.; MAMEDE, F. V.; ORTIZ, J. P. D.; LAUS, J. L. Iatrogenic

keratoconjunctivitis sicca in a dog. Ciência Rural, v. 34, p. 921-924, 2004.

GELATT, K. N.; GILGER, B. C.; KERN. T. J. Veterinary ophthalmology. 5.ed. Iowa:

Wiley-Blackwell, 2013. p. 2186.

HERRERA, D. Oftalmologia clínica em animais de companhia. São Paulo: Medvet,

2008. p. 300.

LAUS, J. L. Oftalmologia clínica e cirúrgica em cães e em gatos. São Paulo: Roca,

2009. p. 230.

MENEZES, C. L. M. Prolapso da glândula da terceira pálpebra em cães. 2007. 37 f.

Monografia (Graduação em Medicina Veterinária) – Faculdade de Veterinária,

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007.

RANZANI, J. J. T.; BRANDÃO, C. V. S.; RODRIGUES, G.; CREMONINI, D. N.;

PEIXOTO, T. P.; LIMA, L. S. A.; CHIURCIU, J. L. V. Prolapso da glândula da terceira

pálpebra em cães: comparação entre duas técnicas de reposicionamento. Brazilian

Journal of Veterinary Research and Animal Science, v. 41, p. 62-63, 2004.

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