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Contrato Psicológico, Relações de Trabalho e Mudanças Organizacionais Maria Helena Hoffmann César Augusto Tejera De Ré Roberto Moraes Cruz Introdução Los empleados y los empleadores traen expectativas y obligaciones a sus relaciones – que se modifican con el tiempo y la experiencia – y nuevas relaciones se crean cuando las circunstancias cambien (KLINGNER, 2004). Do ponto de vista etimológico, a palavra contrato deriva do latim contrahere, que significa 'assumir compromisso'. Para os Romanos, o contractus era um termo relacionado a negocium contractum, ou seja, um "acordo de vontades que cria um vínculo obrigatório", diferente do que se conhece por contrato no direito moderno, noção esta mais ajustada ao termo 'pactum ou conventio' do Direito Justiniano, que é o consenso de duas ou mais pessoas acerca da mesma coisa (FOGGATTIO, 2006). A Lei 8.666/93, que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública, em seu Art. 2°, parágrafo único, define o contrato como "[...] acordo de vontades para a formação de vínculos e a estipulação de obrigações recíprocas". O contrato, stricto sensu, é um acordo que gera um vínculo do qual derivam obrigações entre partes, e nesse sentido, enquanto compromisso mútuo, "[...] ele implica adesão de diferentes parceiros no projeto; supõe que exista uma obrigação de respeito a suas regras durante o desenrolar deste, bem como o estabelecimento de procedimentos de controle no que diz respeito ao seu seguimento". Revista de Administração do Cesusc, nº 3, Jan-Jun 2008, p. 89

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Contrato Psicológico, Relações de Trabalho e Mudanças Organizacionais Maria Helena Hoffmann César Augusto Tejera De Ré Roberto Moraes Cruz Introdução

Los empleados y los empleadores traen expectativas y obligaciones a sus relaciones – que se modifican con el tiempo y la experiencia – y nuevas relaciones se crean cuando las circunstancias cambien (KLINGNER, 2004). 

  

Do ponto de vista etimológico, a palavra contrato deriva do latim contrahere, que significa 'assumir compromisso'. Para os Romanos, o contractus era um termo relacionado a negocium contractum, ou seja, um "acordo de vontades que cria um vínculo obrigatório", diferente do que se conhece por contrato no direito moderno, noção esta mais ajustada ao termo 'pactum ou conventio' do Direito Justiniano, que é o consenso de duas ou mais pessoas acerca da mesma coisa (FOGGATTIO, 2006).

A Lei 8.666/93, que institui normas para licitações e contratos da

Administração Pública, em seu Art. 2°, parágrafo único, define o contrato como "[...] acordo de vontades para a formação de vínculos e a estipulação de obrigações recíprocas". O contrato, stricto sensu, é um acordo que gera um vínculo do qual derivam obrigações entre partes, e nesse sentido, enquanto compromisso mútuo, "[...] ele implica adesão de diferentes parceiros no projeto; supõe que exista uma obrigação de respeito a suas regras durante o desenrolar deste, bem como o estabelecimento de procedimentos de controle no que diz respeito ao seu seguimento".

Revista de Administração do Cesusc, nº 3, Jan-Jun 2008, p. 89

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O que é contrato psicológico?

No âmbito das normas e regras culturais de uma organização pública ou privada há um conjunto de expectativas que mediam as relações entre empregados e empregadores, algumas tangíveis, tais como, salários e condições do trabalho, e outras não necessariamente explícitas, tais como, atitudes e sentimentos de adequação. Os empregados geralmente esperam que o empregador possa fornecer "um trabalho interessante", "oportunidades de progredir" e "ser bem sucedido". Os empregadores, por outro lado, esperam freqüentemente "lealdade e compromisso", "cooperação", "motivação e envolvimento nas metas". Expectativas e as obrigações entre empregados e empregadores derivam de necessidades sociais, da organização, das comparações com outras organizações e da natureza da força de trabalho.

Para Anbreu e Silva (2006) o contrato psicológico no trabalho é o "entendimento subjetivo do indivíduo sobre a reciprocidade existente em um relacionamento de troca entre ele e um terceiro, baseado nas promessas feitas explícita ou implicitamente nessa relação". Esse contrato, afirmam Giordano et al. (2001), não se dá formalmente e rege o que a organização espera dos indivíduos que nela trabalham e o que esses indivíduos esperam dessa organização. Assim, o contrato psicológico do trabalho é um conjunto de expectativas de ambas as partes sobre as ações da outra parte ou seu modo de se comportar.

É nessa instância que se insere o contrato psicológico, que é, essencialmente, um interjogo de expectativas identificadas por Handy (1978, p. 45) no universo das relações de trabalho, como o conjunto de resultados que o indivíduo esperada organização e que irão satisfazer determinadas necessidades suas; em troca, despenderá parte de suas energias e talentos para satisfazer as necessidades da organização.

O conceito de contrato psicológico foi primeiramente desenvolvido por

Argyris, que o concebeu como "as percepções de ambas as partes da relação laboral, organização e indivíduo, das obrigações implícitas na relação. O contrato psicológico é o processo social por onde se chega a estas percepções" (1960,p. 96). Levinson et al (1962, p. 22) definiram o contrato psicológico como "o produto em grande parte implícito e tácito de expectativas mútuas que freqüentemente antecede as relações de trabalho". Afirmam que o contrato psicológico baseado na reciprocidade é crítico para a integração da pessoa na organização, para a satisfação de suas necessidades e para sua saúde mental. Sua importância cresce porque as expectativas implícitas não podem ser resolvidas por mecanismo como a negociação coletiva. Schein (1982, p. 18), por sua vez, define o contrato psicológico como um "conjunto não explícito de expectativas atuando em todos os momentos entre todos os membros de uma organização e os diversos dirigentes e outras pessoas dessa organização". A organização e seus membros  

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têm não somente expectativas explícitas, como também implícitas sobre o devem dar e obter da outra parte na relação de trabalho.

Esses três autores coincidem na visão do contrato psicol6gico como formado por expectativas implícitas, mútuas e recíprocas que se dão na relação de trabalho e que não constituem parte do contrato formal. A diferença é que Argyris, contrariamente aos outros dois autores, caracteriza o contrato psicológico por sua função negativa dentro de um sistema disfuncional na medida em que ele permite uma série de ambigüidades (sobre o que cada um concorda em fazer, sobre quando o fará e até sobre a existência ou não do contrato psicológico). Por isso, "o espaço para o desacordo sobre a natureza e o cumprimento do contrato psicológico é, portanto, considerável" (COOPER; ARGYRIS, 2003, p. 313). Schein e Levinson, por sua vez, entendem que o contrato psicológico tem uma finalidade positiva, pois cria uma interdependência entre os trabalhadores e a organização, que beneficia ambas as partes ao incrementar produtividade, eficiência organizacional, confiança e satisfação do trabalhador.

Na avaliação de Rousseau (ROBINSON; ROUSSEAU, 1994), o

contrato psicológico vai além de uma expectativa. Ele envolve uma promessa e obrigações recíprocas não incluídas no contrato formal de emprego. Promessas de futuro comportamento pela organização são inerentes a alguma ação do indivíduo. Contudo, a organização é percebida como fazendo essa promessa. Essas obrigações recíprocas são, de acordo com Rousseau (1994), definidas pelo indivíduo e não pela organização. Elas são, conseqüentemente, de valor subjetivo. O indivíduo interpreta as várias ações da organização e infere seu contrato psicol6gico com essa organização na base dessas ações. Empregados entram numa relação laboral com um entendimento de que seu empregador tem certas obrigações para com ele, e ele para com seu empregador. Isso cria uma atmosfera de reciprocidade. O contrato é, conseqüentemente, largamente informal, não-escrito, e constantemente alterado pelas interações do indivíduo com a organização.

Apesar de informal e não-escrito, como bem apontaram Levinson et al

(1962) e Schein (1982), ele é importante determinante do comportamento das pessoas. Essa importância tem aumentado porque na busca de maior competitividade num ambiente caracterizado por rápidas mudanças, as organizações têm racionalizado suas estruturas, afrouxado seus compromissos trabalhistas, diminuído seus quadros de pessoal e exigido maior desempenho dos funcionários remanescentes. Tudo isso, por sua vez, tem implicado mudanças na natureza dos contratos psicológicos vigentes. O contrato psicológico tradicional

Durante muito tempo, o contrato psicol6gico era perfeitamente previsível; a empresa ofertava a segurança do emprego e aumentos estáveis e

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previstos; o trabalhador, em troca, trabalhava duro e era leal à organização (fazia tudo o que seu chefe mandava fazer). Ghoshal e Bartlett (2000) afirmam que o contrato tradicional se caracterizava da seguinte maneira: os empregados desenvolviam os conhecimentos e competências especializados necessários ao negócio do empregador, aumentado assim, a eficiência da empresa, mas também limitando as suas próprias habilidades e mobilidade e, enquanto as empresas absorviam os riscos da garantia de emprego do berço ao túmulo, os empregados prometiam lealdade e obediências, proporcionando às empresas a certeza de que suas estratégias seriam implementadas com eficiência. .

O objetivo desse tipo de relação de trabalho com marcante traço paternalista, era "tornar as pessoas tão confiáveis e controláveis quanto os ativos de sua propriedade" [da empresa](GHOSHAL; BARTLETT, 2000, p. 270) gerando um forte vínculo emocional- uma espéciede lar 'psicológico', no dizer de Sennet (2006,p. 36). O vínculo era tão forte que muitas vezes as empresas se identificavam como "família" (a família IBM, ou os "IBMers", por exemplo).

As pressões competitivas, exigidas pelas transformações ocorridas no ambiente organizacional, têm levado as empresas a romperem parte do acordo psicológico que governava suas relações com os empregados. Diante dessas pressões, as organizações, que no passado proveram segurança em longo prazo e carreira para toda a vida, estão abandonando esses programas em favor de relações de trabalho orientadas para o mercado: contratos de curto prazo, estruturas temporárias e terceirizações de serviços não essenciais. Para se tornar competitiva, a nova organização precisa flexibilizar seus custos laborais, flexibilizar o número de funcionários, as horas de trabalho, competências funcionais, flexibilizar...Quais os impactos dessas mudanças operadas na base dos sistemas produtivos e gerenciais sobre a natureza dos contratos psicológicos?

Tipos de Contrato Psicológico

Como foi visto, o contrato psicológico é baseado nas crenças e percepções das pessoas. Conseqüentemente, por definição, ele é um fenômeno de natureza subjetiva, como são necessariamente os processos de natureza psicossocial. No entanto, há inevitáveis similaridades nas percepções das pessoas, as quais são freqüentemente determinadas pelas situações comuns de trabalho que elas compartilham. Isso permite, a grosso modo, o estabelecimento de categorias para classificar os contratos psicológicos.

A literatura sobre o tema consagra a classificação originariamente proposta por Rousseau (1990), o qual classificou os contratos psicológicos em um continuum bipolar que vai do contrato relacional ao contrato transacional.

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Posteriormente, na mesma linha de Blau (1964), que propôs que as interações de troca entre duas partes podem assumir uma dimensão econômica ou social, Rousseau (1995), partindo do pressuposto de se necessitar uma visão mais realista dos contratos psicológicos devido às mutáveis necessidades laborais, incluiu dois outros tipos de contrato nesse continuum,passando a ser quatro os contratos psicológicos típicos:

− Contrato Psicológico Transacional: caracterizado pelo intercâmbio de natureza econômica, pela duração limitada de curto prazo e pela explicitação e especificação do desempenho desejado. Esse tipo de contrato pode ser definido como 'um dia de trabalho bem especificado por um dia de pagamento bem definido', no qual as recompensas econômicas adquirirem um valor importante.

− Contrato Transitório (sem garantia): ocorre quando as organizações buscam grande flexibilidade. Caracteriza-se pela ausência de compromisso por parte da organização a respeito do futuro do emprego (duração limitada), assim como poucas exigências sobre os requerimentos de desempenho. Os trabalhadores não confiam na empresa. Normalmente é adotado por causa das incertezas da instabilidade do ambiente organizacional.

− Contrato Balanceado (ou Híbrido): esse tipo de contrato é uma complexa combinação do contrato transacional com o relacional. Caracteriza-se por ser de duração indefinida, com exigências sobre o rendimento bem especificadas e sujeitas a mudanças ao longo do tempo. Contemplam tanto aspectos relacionais (valores e compromissos compartilhados) como a necessidade de obter êxitos específicos nos negócios.

− Contrato Tipo Relacional: Caracteriza-se pelo envolvimento emocional que gera um compromisso mútuo e comprometimento de longo prazo para ambas as partes. Os empregados devem demonstrar habilidades organizacionais específicas e um desenvolvimento organizacional de longo prazo. Em contrapartida, os empregadores têm que proporcionar uma formação ampla, o que provoca uma mútua interdependência que faz com que a saída da empresa seja difícil.

Esses tipos de contratos têm diferentes implicações no comportamento

dos empregados em seu trabalho, em função das políticas organizacionais, em sentido amplo, da cultura e valores do trabalho e das metas do negócio. Por isso, as empresas utilizam esses diferentes tipos de contratos dependendo de sua situação estratégica, dos objetivos que têm definidos a curto e longo prazo, do ambiente e da situação econômica e financeira que vivenciam.

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Mudanças na organização do trabalho e suas implicações no contrato psicológico

Handy (1990) simboliza a nova organização como um trevo de três folhas. A primeira folha representa o pequeno grupo de profissionais, técnicos e gestores qualificados, que detêm o conhecimento que diferencia uma empresa de outra (core workers); a segunda folha diz respeito às pessoas que trabalham para a organização como subcontratados, desempenhando o que Handy chama de 'nonessencial work' (1990, p. 92). Por último, a terceira folha do trevo é formada pela força de trabalho flexível (trabalhadores em tempo parcial e trabalhadores temporários). Embora cada folha do trevo tenha sua importância, elas devem ser administradas de forma diferente, pois na opinião de Handy (1990, p. 91-92), "a velha filosofia da companhia de status único, na qual o pessoal de limpeza tinha os mesmos benefícios que os diretores, trazia como conseqüência o encarecimento dos custos com o pessoal de limpeza ou baixa remuneração para os diretores"

Na medida em que se dissemina, esse tipo de prática tem provocado rupturas no antigo modelo de contrato psicológico e produzindo profundas desigualdades sociais. Como exemplo, temos de um lado as remunerações descomunais pagas aos executivos e do outro a utilização da terceirização como forma de eximir-se da responsabilidade de manter um quadro de pessoal estável e pagar o mesmo padrão de benefícios desse pessoal.

Correlacionando a proposta de Handy (1990) com os tipos de contrato

psicológico proposto por Rousseau (1995), e considerando as profundas mudanças ocorridas no mundo organizacional nas últimas décadas, podemos afirmar que ao invés de ter um contrato psicológico único para todos os seus trabalhadores, como tradicionalmente ocorria, as empresas passaram a adotar diferentes formas de contrato para diferentes conjuntos de trabalhadores. Os contratos do tipo relacional-balanceado estão reservados para os core workers, que constantemente adquirem novas capacitações, alterando sua base de conhecimento, tornando-se essenciais para as empresas. Para aqueles sujeitos à flexibilidade numérica, que as empresas podem contratar ou demitir conforme suas necessidades operacionais, o contrato psicológico predominante assume a dimensão de um contrato transacional. Já para os trabalhadores temporários e sem qualificação,está reservado o contrato do tipo transitório.

Com base nessa correlação é possível concluir que as empresas

estão transferindo parte do risco do seu negócio para os trabalhadores. São os trabalhadores que precisam desenvolver novas habilidades, competências e carreiras, que passam a incorporar o senso de responsabilização individual pelo fracasso ou insucesso pela maior parte das dificuldades de inserção

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ou permanência no mundo das organizações. Isso fica claro na afirmação de Charness e Levine (1999),quando procuram demonstrar evidências de que, em contraste com o antigo contrato psicológico, o novo contrato prevê o aprendizado de novas habilidades para gerir a própria condição de emprego. As conseqüências psicossociais das mudanças no contrato psicológico

As profundas mudanças ocorridas no mundo organizacional nas últimas décadas tiveram efeitos fundamentais sobre o trabalho. As principais forças motrizes dessas mudanças foram:

− transformações no ambiente tecnológico e econômico.

− incremento da competição global.

− substituição da economia industrial manufatureira em economia de serviços.

As conseqüências dessas mudanças nas relações de trabalho foram o

fim do emprego vitalício, o desaparecimento das carreiras profissionais dedicadas a uma única instituição e vínculos cada vez mais tênues nessas relações, contribuindo para um sentimento de insegurança no trabalho. Segundo Sennett (2003, p. 21), "o sinal mais tangível dessa mudança talvez seja o lema 'Não há longo prazo'''. Burchell, Lapido e Wilkinson (2002), por sua vez, afirmam que a característica típica do clima social, a partir do final do Século XX, tem sido mais pressão, menos proteção, desemprego em massa, mudanças nas leis trabalhistas e desregulamentação.

Na opinião de Sennett (2006), as novas empresas, diferentemente das tradicionais, que operavam por meio de elos estáveis de controle e comando, funcionam à semelhança de um tocador de MP3, que pode ser programado para tocar apenas algumas faixas de seu repertório em qualquer ordem. Numa organização flexível "a seqüência de produção também pode ser alterada à vontade" (SENNETT, 2006, p. 49). Essas empresas podem ora inchar, ora se contrair, descartando funcionários, ao sabor dos projetos nos quais se aplicam.

Para prosperar nesse tipo de ambiente, o trabalhador tem que ter um alto grau de tolerância com a ambigüidade, mantendo sua proatividade mesmo diante de circunstâncias ambíguas (SENNETT, 2006, p. 52). Para Schwartz (2006,p. 92), as empresas querem "um trabalhador com atributos que façam lembrar um IPod capaz de armazenar 10.000 faixas de música. Quer o máximo de potência e flexibilidade, ou seja, disposição e capacidade de cumprir tarefas de modo não-linear".

O que impera na economia do conhecimento flexível é a constante ansiedade frente aos resultados das reengenharias, promovidas por consultores

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dispensados de prestar contas. Essas reengenharias corporativas terminam por reduzir drasticamente a confiança informal, aquela que nos permite saber em quem confiar.

De acordo com Sennett (2006), para prosperar nesse tipo de ambiente o ser humano tem de enfrentar três desafios: (i) cuidar das relações de curto prazo e ao mesmo tempo estar sempre migrando de uma tarefa para outra; (ii) ser capaz de desenvolver novas capacitações à medida que vão mudando as exigências da realidade; e (iii) descartar-se de experiências já vivenciadas.

Além disso, o novo sistema de trabalho tem gerado alto nível de estresse entre os trabalhadores provocado pela extensão da jornada de trabalho. Para alguns profissionais, hoje não é incomum que durante seu período de repouso e nos fins-de-semana, ele fique conectado na Internet, checando e escrevendo seus correios eletrônicos. A urgência de estar conectado, que anteriormente era uma característica de profissionais obsessivos, está se tornando uma exigência das novas organizações.

Conclusão

A relação entre um trabalhador e a organização para a qual presta serviço é regida por vários contratos que abrangem um continuum que vai desde critérios puramente legais até fatores de ordem puramente psicológica. Muitos aspectos dessa relação são cobertos pela legislação trabalhista ou convenções coletivas, como horário de trabalho, atribuições, remuneração, etc. Entretanto, eles apenas representam a dimensão formal da relação, não esgotando as normas que a regem, pois há ainda aspectos atitudinais dos indivíduos que são influenciados por fatores como cultura, religião, educação.

A relação entre empregados e empregadores encontra-se em um estado de transição. As organizações, que no passado ofertavam a perspectiva de um emprego a longo prazo e de desenvolvimento de carreira para toda a vida, estão abandonando essas políticas em favor de uma visão mais pragmática, baseada em contratos de curto prazo, pessoal temporário e terceirização de serviços.

Esse novo arranjo nas relações de trabalho provoca alterações nos

termos que caracterizavam o tradicional contrato psicol6gico. O contrato tipo relacional, outrora aplicado indistintamente a todos os empregados, tem diminuído em importância, sendo substituído por diferentes tipos de contratos, cada um deles aplicado a um público específico aprofundando a divisão do trabalho e ampliando a heterogeneização da classe trabalhadora.

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