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MINISTÉRIO DA ECONOMIA Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade Subsecretaria de Competitividade e Melhorias Regulatórias Coordenação-Geral de Desregulamentação e Competitividades Nota Técnica SEI nº 36442/2020/ME Assunto: Consulta e Audiência Públicas nº 03/2020, da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). 1. SUMÁRIO EXECUTIVO 1. A presente nota técnica tem por objetivo analisar e contribuir com a proposta objeto da Consulta e Audiência Públicas nº 03/2020, da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Ambas visam obter subsídios e informações adicionais sobre a minuta de resolução com especificação do diesel verde e as obrigações quanto ao controle de qualidade a serem atendidas pelos agentes econômicos que comercializarem esse combustível no território nacional. 2. Trata-se de iniciativa meritória da ANP, pois a regulamentação do diesel verde permite a produção e comercialização no país de mais um tipo de combustível renovável para uso nos motores à combustão do ciclo Diesel. Ademais, a oferta do diesel verde no mercado permite que se viabilize a produção do bioquerosene de aviação, contribuindo ainda mais para elevar a oferta de biocombustíveis. 3. Esta nota técnica foca a análise nas questões de concorrência e outras afetas ao bem-estar do consumidor. De modo geral, avalia-se que a minuta de resolução distingue o diesel verde dos demais tipos de biodiesel em circulação no mercado em função da tecnologia utilizada no processo produtivo desses bens. Essa distinção tem implicações concorrenciais que podem agravar problemas de competição e de outros incentivos à eficiência econômica no mercado de biodiesel. 4. Como já se comentou, a proposta da consulta pública é meritória por regulamentar mais uma possibilidade de consumo de biocombustível. No entanto, indicam-se restrições à concorrência que justificariam ajuste da regulação de modo a não agravar contexto atual de barreiras à entrada e outros obstáculos à eficiência que comprometem o bem-estar do consumidor. 2. INTRODUÇÃO 5. A Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade do Ministério da Economia (SEAE/ME) apresenta, por meio desta nota técnica, considerações sobre a Consulta e Audiência Públicas 03/2020, da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), buscando contribuir com o processo nos termos de suas atribuições relativas à promoção da concorrência definidas na Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, e no Decreto nº 9.745, de 08 de abril de 2019 1 . 6. A mencionada consulta pública tem por objetivo obter contribuições, subsídios e sugestões dos agentes econômicos e demais interessados para o aprimoramento da minuta de resolução que estabelece a especificação do diesel verde, bem como as obrigações quanto ao controle da qualidade a serem atendidas pelos agentes econômicos que comercializarem esse combustível em território nacional.

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MINISTÉRIO DA ECONOMIASecretaria Especial de Produtividade, Emprego e CompetitividadeSecretaria de Advocacia da Concorrência e CompetitividadeSubsecretaria de Competitividade e Melhorias RegulatóriasCoordenação-Geral de Desregulamentação e Competitividades

Nota Técnica SEI nº 36442/2020/ME Assunto: Consulta e Audiência Públicas nº 03/2020, da Agência Nacional de Petróleo, Gás Naturale Biocombustíveis (ANP).

1. SUMÁRIO EXECUTIVO

1. A presente nota técnica tem por objetivo analisar e contribuir com a proposta objeto daConsulta e Audiência Públicas nº 03/2020, da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural eBiocombustíveis (ANP). Ambas visam obter subsídios e informações adicionais sobre a minuta deresolução com especificação do diesel verde e as obrigações quanto ao controle de qualidade a serematendidas pelos agentes econômicos que comercializarem esse combustível no território nacional.

2. Trata-se de iniciativa meritória da ANP, pois a regulamentação do diesel verde permite aprodução e comercialização no país de mais um tipo de combustível renovável para uso nos motores àcombustão do ciclo Diesel. Ademais, a oferta do diesel verde no mercado permite que se viabilize aprodução do bioquerosene de aviação, contribuindo ainda mais para elevar a oferta de biocombustíveis.

3. Esta nota técnica foca a análise nas questões de concorrência e outras afetas ao bem-estardo consumidor. De modo geral, avalia-se que a minuta de resolução distingue o diesel verde dos demaistipos de biodiesel em circulação no mercado em função da tecnologia utilizada no processo produtivodesses bens. Essa distinção tem implicações concorrenciais que podem agravar problemas decompetição e de outros incentivos à eficiência econômica no mercado de biodiesel.

4. Como já se comentou, a proposta da consulta pública é meritória por regulamentar mais umapossibilidade de consumo de biocombustível. No entanto, indicam-se restrições à concorrência quejustificariam ajuste da regulação de modo a não agravar contexto atual de barreiras à entrada e outrosobstáculos à eficiência que comprometem o bem-estar do consumidor.

2. INTRODUÇÃO

5. A Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade do Ministério da Economia(SEAE/ME) apresenta, por meio desta nota técnica, considerações sobre a Consulta e Audiência Públicasnº 03/2020, da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP),buscando contribuir com o processo nos termos de suas atribuições relativas à promoção daconcorrência definidas na Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, e no Decreto nº 9.745, de 08 deabril de 20191.

6. A mencionada consulta pública tem por objetivo obter contribuições, subsídios e sugestõesdos agentes econômicos e demais interessados para o aprimoramento da minuta de resolução queestabelece a especificação do diesel verde, bem como as obrigações quanto ao controle da qualidade aserem atendidas pelos agentes econômicos que comercializarem esse combustível em território nacional.

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Além disso, a referida consulta permite identificar, de forma mais ampla possível, todos os aspectosrelevantes do tema tratado, conferindo publicidade e transparência ao debate em linha com as boaspráticas regulatórias. São iniciativas meritórias da agência que amparam regulamentação de mais umapossibilidade de consumo de biocombustível.

7. As considerações contidas nesta nota técnica visam contribuir com a regulamentação dotema objeto de consulta pública, sob as óticas regulatória e concorrencial, em vista de restrições àcompetição identificadas na minuta de resolução em apreço. São contribuições decorrentes dasatribuições citadas da SEAE/ME e que não deixam de levar em conta as próprias competências legais daagência reguladora, que tem autonomia institucional para regulamentar o setor de combustíveis.

3. ANÁLISE

8. Segunda Nota Técnica da ANP Nº 4/2020 2, “o diesel verde, biocombustível paramotores à combustão de ciclo diesel, consiste em conjunto de hidrocarbonetos produzidos a partir dematérias-primas renováveis, com as mesmas propriedades químicas do diesel proveniente de fontefósseis. Esse biocombustível pode ser produzido a partir de diferentes rotas tecnológicas e diferentesmatérias primas, como gorduras de origem vegetal e animal, cana-de-açúcar, álcool e biomassa, emgeral”.

9. A ANP observa que a regulamentação da produção e comercialização de Diesel Verde émotivada pela Política Nacional de Biocombustíveis, instaurada pela Lei nº 13.576, de 2017, que busca aexpansão do uso de biocombustíveis na matriz energética brasileira, com vistas a segurança energética,mitigação das emissões de gases efeito estufa e previsibilidade para a participação competitiva dosdiversos biocombustíveis no mercado nacional de combustíveis.

10. Ainda segundo a ANP, a Política Nacional de Biocombustíveis estimulará o incentivo àprodução de biocombustíveis que efetivamente reduzam a pegada de carbono, abrindo leque deoportunidade de investimentos também para o diesel verde, o que promove o desenvolvimentodescentralizado de empreendimentos agrícolas e industriais com seus inerentes efeitos multiplicadoressobre a economia do país.

11. Além disso, a produção de biocombustíveis no âmbito de biorefinaria geraconcomitantemente diferentes bioprodutos em um mesmo processo e viabiliza a produção ecomercialização de bioquerosene de aviação regulamentado pela Resolução ANP nº 778, de 2019.

12. Antes de iniciar a análise da minuta de resolução propriamente dita, esta nota técnicatrata de alguns tópicos sobre o produto biodiesel, incluindo a definição regulatória do combustível, o seumercado e potenciais problemas de concorrência. Essa contextualização é importante para entendimentode potenciais efeitos sobre a competição decorrentes da minuta de resolução proposta.

3.1. Lei, normas e def inição do biodiesel

13. A Lei nº 9.478, de 1997, dispõe sobre a política nacional de petróleo e gás natural eestabelece as atribuições da ANP. A mencionada lei foi alterada pela Lei nº 11.097, de 2005, queintroduz o biodiesel na matriz energética brasileira, e pela Lei nº 12.490 , de 20113, que amplia acompetência da agência reguladora para toda a indústria de biocombustíveis. Com edição dessa última lei,a ANP ficou responsável por regular esse mercado e fiscalizar a qualidade do biodiesel produzido. Arealização periódica dos leilões de compra e venda de biodiesel para o teor de mistura obrigatória com oóleo diesel também é uma das atribuições da agência reguladora.

14. No tocante aos biocombustíveis e o biodiesel, o art. 6º da Lei nº 9.478, de 1997, trouxe asseguintes definições:

Biocombustível4: substância derivada de biomassa renovável, tal como biodiesel,etanol e outras substâncias estabelecidas em regulamento da ANP, que pode ser

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empregada diretamente ou mediante alterações em motores a combustão interna oupara outro tipo de geração de energia, podendo substituir parcial ou totalmentecombustíveis de origem fóssil; Biodiesel5: biocombustível derivado de biomassa renovável para uso em motores acombustão interna com ignição por compressão ou, conforme regulamento, parageração de outro tipo de energia, que possa substituir parcial ou totalmentecombustíveis de origem fóssil.

15. Observa-se, portanto, que a definição legal dada para o biodiesel é ampla, abrangendoqualquer combustível derivado da biomassa renovável para uso em motores do ciclo Diesel, não havendorestrição de rota tecnológica para a referida classificação. Conforme será visto mais adiante, a definiçãopara o biodiesel é genérica o suficiente para contemplar o Diesel Verde, podendo ser esse último umavariante de rotas tecnológicas para a produção do biodiesel.

16. A obrigatoriedade legal de mistura do biodiesel com óleo diesel (diesel B) foi trazida peloart. 2º da Lei nº 11.097, de 2005. A exigência de mistura do biodiesel no óleo diesel (Diesel B) entrouem vigor em janeiro de 2008 com percentual mínimo de 2% (B2), em todo o território nacional. Com oamadurecimento do mercado brasileiro de biodiesel, o teor de mistura obrigatório foi sucessivamenteampliado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Atualmente, a Resolução CNPE nº 16,de 2018, determina a proporção mínima de 12% do biodiesel, elevando esse percentual gradativamenteano a ano até alcançar o patamar de 15% em 01 de março de 2023. Esse é o percentual máximo dorenovável no Diesel B delimitado pela Lei nº 13.033, de 24 de setembro de 2014.

17. Em 2004, a ANP estabeleceu as especificações do biodiesel por meio da ResoluçãoANP nº 42, de 2004, definindo o biocombustível como sendo composto por uma mistura de ésteres deácidos graxos. Essa resolução foi revogada e, atualmente, está em vigor a Resolução ANP nº 45, de2014, que estabelece as especificações do biodiesel, mantendo a mesma definição da regulação originaldo combustível. Dessa forma, a regulação infralegal restringe o tipo de tecnologia para que ocombustível seja classificado como biodiesel. Segue a transcrição do conceito do biodiesel, disposto noart. 2º Resolução ANP nº 45, de 2014, in verbis

Art. 2º Para efeitos desta Resolução, definem-se:I - Biodiesel: combustível composto de alquil ésteres de ácidos carboxílicos de cadeialonga, produzido a partir da transesterificação e/ou esterificação de matérias graxas,de gorduras de origem vegetal ou animal, e que atenda a especificação contida noRegulamento Técnico, parte integrante desta Resolução.

18. O exposto indica que a regulação do biodiesel pela ANP adota definição mais restrita debiodiesel do que a descrita em lei. Trata-se de circunstância cujos efeitos econômicos são avaliados nasseções subsequentes desta nota. Como já se esclareceu, o objetivo é contribuir para o debate sobre aregulamentação do diesel verde. Para tanto, serão apresentadas inicialmente as principais característicasdo mercado do biodiesel no Brasil.

3.2. Característ icas do Mercado de Biodiesel no Brasil

19. O biodiesel foi introduzido na matriz energética brasileira, no ano de 2005, pela Lei no

11.097 de 13 de janeiro de 2005, por meio da adição ao diesel fóssil para compor mistura a sercomercializada junto ao consumidor final. Na ocasião, o governo entendeu ser estratégico para o país opromover um combustível renovável que pudesse promover o desenvolvimento regional, reduzir asdesigualdades sociais e a necessidade de divisas para importação de óleo diesel (Mendes & Costa,2010)6.

20. Nos anos de 2005 e 2007, foi autorizada a mistura de 2% (B2) no óleo diesel

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comercializado para o consumidor final. Até esse momento, a mistura foi prevista de forma nãocompulsória. A mistura de 2% (B2) passou a ser obrigatória em janeiro de 2008. No segundo semestre de2008, o percentual foi elevado para 3% (B3); no segundo semestre de 2009, para 4% (B4); e em janeirode 2010, a mistura passou para 5% (B5), meta prevista inicialmente para 2013. Atualmente, o percentual éde 12% (B12), elevando-se em 1º de março de cada ano para 13%, 14% e 15%, respectivamente, nosanos de 2021, 2022 e 2023. conforme estabelecido pela Resolução CNPE nº 16, de 2018.

21. Nota-se, portanto, que existe um crescimento ao longo dos anos na participação dobiodiesel na matriz energética brasileira como reflexo do aumento do teor de mistura obrigatória dessecombustível ao óleo diesel A.

22. Pelo lado da demanda, o mercado de biodiesel é dado pela dinâmica do consumo de óleodiesel e, principalmente, pela obrigatoriedade legal e regulatória da mistura ao combustível fóssil para avenda ao consumidor final, conforme mencionado anteriormente. As restrições orçamentáriase preferências do consumidor não definem a participação do combustível renovável no mercado de óleodiesel.

23. Os principais demandantes de biodiesel são os distribuidores de combustíveis automotivosque comercializam Óleo Diesel A. Considerando as aquisições de biodiesel para o teor de misturaobrigatória, a Petrobras Distribuidora S.A aparece com a maior fatia do mercado, adquirindo, em 2019,cerca de 1,7 milhões de m³ de biodiesel, seguida por Ipiranga Produtos de Petróleo S.A, com cerca de1,2 milhões de m³ e da Raízen Combustíveis S.A, com aproximadamente 1,1 milhões de m³ de biodiesel.

24. Pelo lado da oferta, o mercado de biodiesel apresenta atualmente 51 (cinquenta e um)agentes autorizados pela ANP a produzirem e participarem dos leilões de aquisição do produto 7. Dessetotal, segundo o MAPA (2020)8, existem 41 (quarenta e um) produtores de biodiesel que possuem o SeloCombustível Social.

25. Em relação à estrutura da oferta, segundo Mendes & Costa (2010. p. 264-265), a indústriade biodiesel é formada por três tipos de empresas: (i) empresas integradas; (ii) parcialmente integradas; e(iii) não integradas. As primeiras são aquelas que plantam ou comercializam a cultura vegetal (soja,girassol, algodão, etc.), esmagam o grão para produzir o óleo vegetal e produzem o biodiesel com basenesse óleo vegetal. As empresas integradas têm a opção de vender o grão, vender o óleo vegetal ouvender o biodiesel, tendo em vista o custo de oportunidade. Geralmente, elas optam por vender osprodutos que tiverem as melhores margens num determinado período. Além disso, são empresas maiscompetitivas e mais eficientes na comercialização do biodiesel, apropriando-se de melhores margens doque as empresas não integradas.

26. No segundo grupo estão as empresas parcialmente integradas, que são aquelas quedispõem de plantas de esmagamento para a produção do óleo vegetal e o biodiesel. Podem comercializartanto o óleo vegetal quanto o biodiesel, mas são empresas que não plantam nem comercializam a culturavegetal.

27. O terceiro grupo refere-se às empresas não integradas, que não têm a opção de fabricarprodutos diversificados, uma vez que produzem única e exclusivamente o biodiesel. Para sua produção,as empresas adquirem o óleo vegetal a preço de mercado e não a custo de produção como as empresasintegradas.

28. Por serem mais competitivas, há uma tendência de as empresas integradas ou verticalizadasaumentarem sua participação de mercado. Essa tendência foi constatada pelo PDE-2029, queindicou tendência dos produtores de biodiesel de adotarem estratégias de verticalização à montante dacadeia. Essa tendência pode estar relacionada com a importância da matéria-prima para a competitividadeda firma no mercado de produção do biocombustível. In verbis:

Nos últimos anos, observou-se a paralisação das atividades de várias empresas,principalmente as de pequeno porte, que tiveram dificuldades em ofertar biodiesel apreços competitivos nos leilões. Nota-se que as companhias verticalizadas se mantêmeconomicamente mais estáveis que as pequenas, não verticalizadas (PDE-2029, p.

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214).

29. No ano de 2019, as nove maiores empresas produtoras comercializaram cerca da metadede todo volume adquirido nos leilões, ou seja, aproximadamente 2,8 milhões de m3. Quando se observa omarket share de cada uma delas, nenhuma possui mais do que 6% (seis por cento) das vendas debiodiesel, indicando que não há concentração de mercado significativa nesse elo da cadeia9 . Dessaforma, os dados de market share e do número de agentes autorizados para a produção de biodiesel (51)sugerem uma estrutura de mercado propícia à concorrência no mercado.

30. Do mesmo modo, utilizando-se de índices de concentração conhecidos na literaturaeconômica, Amaral & Abreu (2016) concluem que o mercado de biodiesel possui concentraçãomoderada entre as maiores empresas participantes, tendo as seguintes características:

i. grau de concentração de mercado é moderado tanto a nível técnicoquanto no nível econômico, sendo que algumas empresas sãoresponsáveis pela maior parte da produção;

ii. há barreiras à entrada devido aos vários requisitos que devem seratendidos pelas empresas produtoras do biocombustível, além dosfatores logíst icos;

iii. os produtos não são diferenciados, ou seja, são homogêneos, que adiferenciação, quando existe, se dá no nível da qualidade ou dasespecif icações do produto;

iv. os preços são mant idos invariáveis, pois são estabelecidos pela ANP,havendo pouca probabilidade de que a concorrência via preços seja aforma ut ilizada para eliminar concorrentes e aumentar a fat ia demercado; e

v. importantes descont inuidades de escala e de técnicas de produçãopermitem a coexistência de empresas de variados tamanhos e, emconsequência, de diferentes níveis de custo de produção.

31. Nos primeiros anos do biodiesel na matriz energética brasileira, é possível que o mercadofosse mais concentrado, fruto das incertezas de uma indústria nascente ou mesmo da necessidade deincentivar a formação de fornecedores para esse produto. No entanto, com o passar dos anos, essaconcentração foi se reduzindo com a entrada de novos produtores. Nesse contexto, segundo Coronel et.al. (2011), levando-se em conta a participação de mercado dos quatro maiores produtores (CR4), aconcentração do mercado de biodiesel reduziu-se a partir do momento que houve o aumento de empresascom capacidade de participar desse mercado, in verbis:

Os dados analisados mostraram que o mercado do biodiesel no Brasil iniciou-se comum nível de concentração maior, como já se poderia esperar, principalmente pelamenor quantidade de empresas habilitadas a participarem desse mercado, que ocorreatravés dos leiloes, além da própria estruturação dessas empresas, considerando oresultado do CR4. No entanto, em um período de tempo relativamente pequeno, aquantidade de empresas com capacidade de produzir e participar desse mercado seeleva e, assim, reduz o nível de concentração.

32. O exposto não sugere, portanto, que o mercado de biodiesel apresenta características demonopólio natural ou restrições competitivas mais severas, representativas de falhas de mercado quepoderiam conferir racionalidade econômica para a implementação de mecanismos que substituem aconcorrência de mercado usual via sistema de preços.

3.3. Leilões de Comercialização de Biodiesel

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33. Ao revisitar a literatura sobre a formação do mercado do biodiesel no Brasil, algunsestudos (BNDES, 200710; Machado & Perez, 201411; e Amaral & Abreu (2016)12 apontam que o leilãopúblico de comercialização do combustível foi um mecanismo importante no processo inicial deformação do mercado, facilitando reunir oferta dispersa do produto e, dessa forma, contribuiu para oatendimento das metas de teor mínimo obrigatório do combustível renovável. Inclusive, segundo BNDES(2007, p. 41), “o mercado de biodiesel no Brasil se iniciou, de fato, em 2006, com compras decombustível via leilão da ANP”. Os leilões foram desenhados no período voluntário da mistura dobiodiesel e diesel fóssil como forma de viabilizar a antecipação de capacidade operacional para oatendimento da demanda obrigatória de biodiesel a partir de 2008 (BNDES, 2007).

34. Os leilões de compra de biodiesel podem ter sido importantes na formação do mercado dobiodiesel, garantindo-se que essa política pública prosperasse. Uma vez desenvolvido esse mercado,inclusive com contínua elevação da produção interna para atendimento das crescentes exigências depercentual de mínimo obrigatório no abastecimento do mercado interno, cabe avaliar a necessidade demanutenção desse tipo de mecanismo. Isso porque a racionalidade econômica do leilão é a de simularconcorrência nas situações em que falhas de mercado comprometem a livre iniciativa de impulsionar acompetição, como na existência de características de monopólio natural, ou assimetrias de informaçõesque dificultam o equilíbrio entre oferta e demanda. Em estruturas de mercado mais próximas do modelocompetitivo, como no caso da produção de biodiesel que conta com mais de cinquenta agentesautorizados, sendo os maiores com market share de até 6%, a justificativa econômica do leilão é menosclara.

35. Em linha com o comentado no parágrafo anterior, o biodiesel comercializado no mercadoautomotivo caracteriza-se como um produto homogêneo, cujo valor é amplamente conhecido visto queseu custo de oportunidade é dado pelo preço de commodities, como o óleo de soja que é a principalmatéria prima para a produção. Trata-se de circunstância típica de mercados potencialmente competitivos.

36. Também não se observam assimetrias de informações relevantes no mercado de biodiesel,inclusive, porque a regulação da atividade favorece a transparência de informações necessárias para asdecisões de oferta e demanda, minimizando a assimetria de informação entre os agentes do setor.Ademais, a divulgação dos percentuais de mistura obrigatória garante previsibilidade ao mercado efavorece a projeção do aumento de demanda futura. Enfim, são indicativos diversos que a estrutura demercado do biodiesel aproxima-se a de um segmento competitivo em que a substituição da concorrênciade mercado por mecanismos que a simulam, como o leilão, não possui justificativa econômica.

37. Note-se que o leilão do biodiesel possui três grandes atores: os produtores de biodiesel, aPetrobras e as distribuidoras de combustíveis automotivos. O mercado funciona da seguinte forma: adistribuidora compra da Petrobrás, considerada pela ANP, a única adquirente de biodiesel, que, por suavez, compra das usinas, porém as distribuidoras retiram pessoalmente o biodiesel das usinas, mas odinheiro faz o seguinte fluxo: Distribuidora-Petrobras-Usina.

38. Toda essa sistemática do leilão gera custos de transação que oneram tanto o poder públicoquanto o consumidor final. Da parte do poder público, a ANP disponibiliza recursos humanos efinanceiros para a preparação e publicação do edital, habilitação de fornecedores e cálculo do preçomáximo de referência. São recursos que poderiam estar sendo aplicados para melhorar outrasfuncionalidades da agência, tendo em vista que os recursos são escassos. Para a realização do leilão, aPetrobras disponibiliza recursos humanos, financeiros e tecnológicos; em contrapartida, cobra umaremuneração para a realização dessas atividades que, no final das contas, é arcada pelo consumidor final.

39. Atualmente, a Petrobras cobra o valor de R$ 25,00 por m3 de biodiesel, sendo que essevalor está previsto no Regulamento de Comercialização de Biodiesel da empresa13. Considerando osleilões realizados em 2019, com exceção do Leilão 68° complementar, a remuneração totalizou,aproximadamente, R$ 150 milhões. Esse custo é incorporado ao preço final do óleo diesel B e pode serentendido como um dos custos de transação da sistemática atual de leilões. É um valor que pode deixar deexistir caso houvesse uma flexibilização das relações comerciais entre agentes do mercado, de formaque as distribuidoras pudessem adquirir diretamente dos produtores.

40. Além disso, sob a ótica estritamente privada, os produtores de biodiesel e as distribuidoras

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de combustíveis devem cumprir diversos requisitos para a participação nos leilões, que geram custos paraestes agentes. Inclusive, a cada leilão os produtores devem cumprir exigências de habilitação. Taisexigências representam custos de transação para a comercialização do biodiesel e que não seriamnecessárias no ambiente de liberdade das relações comerciais.

41. Dessa forma, há diversos custos de transações no processo de comercialização dobiodiesel por meio dos leilões que poderiam ser minimizados, caso essa forma de comercialização forsubstituída por uma maior liberdade de arranjos negociais entre os agentes produtores e distribuidores.Esses custos de transação geram ineficiências que tendem a onerar o poder público e o consumidor final.

42. Outra fonte de custo dos leilões de biodiesel são as atividades logísticas (Mendes &Costa, 2010, p. 269)14. O leilão da ANP seleciona os produtores sem o custo de frete, que é um encargocusteado pelos distribuidores 15. Em razão disso, o custo de transporte não é devidamente precificado,ocasionando ineficiências no sistema produtivo que recaem no consumidor final.

43. O apresentado até aqui aponta problemas potenciais de concorrência e outros incentivos àeficiência econômica resultantes da aplicação da sistemática de leilões de comercialização de biodieselem substituição aos canais usuais de rivalidade da competição por meio da livre iniciativa e do sistema depreços.

3.4. Reserva de Mercado do Selo Combustível Social (SCS)

44. O SCS é um componente de identificação concedido pelo Ministério da Agricultura,Pecuária e Abastecimento (MAPA) aos produtores de biodiesel que cumprem os critérios descritos naPortaria nº 144, de 2019. Além de garantir subsídios fiscais por meio de alíquotas de PIS/PASEP eCOFINS com coeficientes de redução diferenciados que variam de acordo com a matéria-prima adquiridae região da aquisição, as usinas detentoras do SCS detêm participação assegurada de 80% do biodieselnegociado nos leilões públicos da ANP, bem como acesso às melhores condições de financiamentojunto aos bancos que operam o PNPB.

45. Como contrapartida destes benefícios, o produtor de biodiesel assume algumasobrigações definidas na Portaria nº 144, de 2019, conforme segue: (i) adquirir um percentual mínimo dematérias-primas dos agricultores familiares no ano de produção do biodiesel; (ii) celebrar previamentecontratos de compra e venda de matérias-primas com os agricultores familiares ou com suas cooperativase com reconhecimento de firma em cartório ou declaração da entidade representativa da agriculturadaquele município e/ou estado; e (iii) assegurar preços mínimos, capacitação e assistência técnica aosagricultores familiares.

46. Do total de 51 (cinquenta e uma) empresas autorizadas pela ANP para produzirem eparticiparem dos leilões de biodiesel, 41 (quarenta e uma) delas possuem o Selo Combustível Social. Noentanto, cabe registrar que o Selo Combustível Social pode afetar negativamente o bem-estar doconsumidor pelas suas consequências sobre a concorrência e o incentivo a ganhos de eficiênciaeconômica.

47. Os percentuais mínimos de aquisição de produtores com SCS nos leilões decomercialização de biodiesel configuram uma reserva de mercado, que como qualquer outra constitui umabarreiras à entrada. Trata-se, então, de uma restrição à concorrência cujo efeito esperado é prejudicial aoconsumidor. Há o risco de que a participação mínima obrigatória mantenha no mercado usinas de biodieselque não teriam competitividade para estarem caso tivessem de competir em igualdade de condições comos demais produtores. Assim, a restrição à concorrência ocasionada pela reserva de mercado podeonerar o consumidor ao incluir na composição da oferta agentes de produção com maior custo deprodução. Face ao exposto, o SCS mostra-se como mais uma instituição do mercado do biodiesel criadapela regulação que limita a concorrência, amparando consequências adversas sobre o bem-estar.

48. Também chama atenção o fato de que a de concessão de incentivos pelo programa de selosocial ser permanente no tempo. Tanto os incentivos fiscais e tributários, como a reserva de mercado nacomercialização interna do combustível, são garantidas aos detentores do selo sem prazo de usufruto.

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comercialização interna do combustível, são garantidas aos detentores do selo sem prazo de usufruto.Com isso, reduzem-se os incentivos para os agentes beneficiados buscarem ganhos de eficiência quepodem reduzir custos para o consumidor.

49. Além disso, os incentivos concedidos pelo programa do selo social também não variam deacordo com a participação da agricultura familiar nas aquisições de biodiesel da usina certificada. Assim,existem agentes com diferentes custos para obter o selo social, que recebem os mesmos benefícios.Isso pode gerar ineficiências, elevando de modo desnecessário o custo da política, concedendo maissubsídios do que seria necessário para agentes com menor custo de inclusão de agricultores familiaresem seu leque de fornecedores.

50. Complementarmente, não se identificam critérios de concessão do selo que incentivamganhos de eficiência dos agentes beneficiados. Do exposto nesta seção, o SCS constitui mais umainstitucionalidade criada pela regulação do setor com efeitos potencialmente negativos sobre aconcorrência e o bem-estar do consumidor.

3.5. Def inição do percentual da mistura

51. Uma vez especificado a qualidade dos tipos de biodiesel disponíveis nesse mercado –biodiesel à base de éster e biodiesel à base de hidrocarbonetos parafínicos -, uma discussão a serrealizada refere-se ao teor da mistura obrigatória de biodiesel. Neste ponto, a Lei nº 13.033, de 2014,que dispõe sobre a adição obrigatória de biodiesel ao óleo diesel comercializado com o consumidorfinal, determina o seguinte:

Art. 1º São estabelecidos os seguintes percentuais de adição obrigatória, em volume,de biodiesel ao óleo diesel vendido ao consumidor final, em qualquer parte doterritório nacional: I - 8% (oito por cento), em até doze meses após a data de promulgação desta Lei;II - 9% (nove por cento), em até vinte e quatro meses após a data de promulgaçãodesta Lei; III - 10% (dez por cento), em até trinta e seis meses após a data depromulgação desta Lei. Parágrafo único. O Conselho Nacional de Política Energética - CNPE poderá, aqualquer tempo, por motivo justificado de interesse público, reduzir essepercentual para até 6% (seis por cento), restabelecendo-o por ocasião danormalização das condições que motivaram a redução do percentual.Art. 1º-A Após a realização, em até doze meses contados da promulgação destaLei, de testes e ensaios em motores que validem a utilização da mistura, é autorizadaa adição de até 10% (dez por cento), em volume, de biodiesel ao óleo dieselvendido ao consumidor final, em qualquer parte do território nacional, observado odisposto no inciso XI do art. 2º da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997. Art. 1º-B Após a realização, em até trinta e seis meses contados da promulgaçãodesta Lei, de testes e ensaios em motores que validem a utilização da mistura, éautorizada a adição de até 15% (quinze por cento), em volume, de biodiesel aoóleo diesel vendido ao consumidor final, em qualquer parte do território nacional,observado o disposto no inciso XI do art. 2º da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997.

52. Pelo disposto nesta lei, é autorizado ao elevar o percentual de adição da misturaobrigatória em até 10% (quinze por cento), nos primeiros doze meses (art. 1-A) de promulgação da lei, ede até 15% (quinze por cento), passados trinta e seis meses (art. 1-B)16. Ou seja, o acréscimo de adiçãode mistura obrigatória a partir do percentual de 10% (dez por cento) depende de regulamentação por partedo CNPE.

53. Em se tratando do biodiesel, o CNPE editou a Resolução CNPE nº 16, de 2018,estabelecendo os seguintes percentuais de mistura obrigatória do biodiesel: (i) 11% (onze por cento), apartir de 1º /06/2020; (ii) 12% (doze por cento), a partir de 1º /03/2020; (iii) 13% (treze por cento), a partir

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de 1º /03/2021; 14% (quatorze por cento), a partir de 1º /03/2022; e 15% (quinze por cento), a partir de1º /03/2023.

54. A resolução do CNPE condiciona que o acréscimo no biodiesel na mistura com óleodiesel depende de testes e ensaios em motores, bem como do aprimoramento das especificações dobiodiesel puro por parte da ANP para tornar o biocombustível apto para o consumo. Registra-se que aresolução em comento não faz qualquer distinção de tecnologia para a produção do biodiesel.

55. A determinação do teor de mistura em âmbito infralegal limita o mercado revelar o teor demistura mais eficiente. Isso porque não se permite que os agentes escolham a proporção no intervalodefinido em lei (entre 10% e 15%) e factível tecnologicamente, considerando os custos do combustívelrenovável relativamente ao diesel fóssil. Caso esses preços relativos fossem levados em conta nadeterminação da proporção em tela, o mercado poderia ofertar a combinação de menor custo,favorecendo o bem-estar do consumidor. Esse favorecimento poderia ocorrer ainda com outrasestratégias dos agentes para atender a preferência dos consumidores17. Fato é que a fixação emregulamento da proporção de biodiesel na mistura impede que o mercado ofereça essas estratégias comganhos potenciais de bem-estar para o consumidor e de eficiência para toda a economia.

3.6. Guia de Concorrência da OCDE

56. Para avaliar os problemas concorrenciais no mercado do biodiesel, é importante observaro disposto na metodologia de análise dos impactos concorrenciais desenvolvida pela Organização ParaCooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)18. A metodologia da OCDE consiste um conjuntode questões a serem verificadas na análise do impacto de políticas públicas sobre a concorrência. Oimpacto competitivo poderia ocorrer por meio de quatro efeitos:

1º efeito - limitação no número ou variedade de fornecedores, provável no casode a política proposta:Conceder direitos exclusivos a um único fornecedor de bens ou de serviços;Estabelecer regimes de licenças, permissões ou autorizações como requisitos defuncionamento;Limitar a alguns tipos de fornecedores a capacidade para a prestação de bens ouserviços;Aumentar significativamente os custos de entrada ou saída no mercado; e,Criar uma barreira geográfica à aptidão das empresas para fornecerem bens ouserviços, mão-de-obra ou realizarem investimentos. 2º efeito - limitação da concorrência entre empresas, provável no caso de apolítica proposta:Limitar a capacidade dos vendedores de fixar os preços de bens ou serviços;Limitar a liberdade dos fornecedores de fazerem publicidade ou marketing dos seusbens ou serviços;Fixar padrões de qualidade do produto que beneficiem apenas alguns fornecedores ouque excedam o nível escolhido por determinados consumidores bem informados; e,Aumentar significativamente o custo de produção para apenas alguns fornecedores(especialmente dando tratamento diferente aos operadores históricos e aosconcorrentes novos). 3º efeito - diminuir o incentivo para as empresas competirem, prováveis nocaso de a política proposta:Estabelecer um regime de autorregulamentação ou de corregulamentação;Exigir ou estimular a publicação de dados sobre níveis de produção, preços, vendasou custos das empresas; e,Isentar um determinado setor industrial ou grupo de fornecedores da aplicação dalegislação geral da concorrência;

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4º efeito – Limitação das opções dos clientes e da informação disponível,provável no caso de a política proposta:Limitar a capacidade dos consumidores para escolherem o fornecedor;Reduzir a mobilidade dos clientes entre fornecedores de bens ou serviços por meio doaumento dos custos, explícitos ou implícitos, da mudança de fornecedores; e,Alterar substancialmente a informação necessária aos consumidores para poderemcomprar com eficiência.

57. Assim, segundo a metodologia acima, o impacto sobre a concorrência poderia ocorrer pormeio de: (i) limitação no número ou variedade de fornecedores; (ii) limitação na concorrência entreempresas; e (iii) diminuição do incentivo às empresas competirem; e (iv) limitação das opções dosclientes e da informação disponível.

58. Com base na estrutura de mercado mencionada na seção 3.2, e tendo em vista os efeitosmencionados pela metodologia da OCDE, uma análise preliminar do mercado de biodiesel sugere que omodelo regulatório atual pode apresentar regras com efeitos nocivos à concorrência. São eles:

os leilões de compra de biodiesel têm o condão de limitar a concorrência entreempresas (2º efeito), ao impossibilitar a competição entre produtores de biodiesel porintermédio do usual sistema de preços;

o selo combustível social pode limitar o número ou variedade de fornecedores (1ºefeito) e não estimular a eficiência, tendo em vista que cria uma reserva de mercadopara determinados produtores de biodiesel, constituindo-se uma barreira à entrada paranovos entrantes na atividade de comercialização junto aos distribuidores de óleo dieselB;

a regulamentação infralegal, ao impedir que o mercado escolha o percentual da misturaobrigatória no intervalo entre o limite mínimo e máximo legal definido para a mesma,pode limitar a concorrência entre empresas (2º efeito), pois fixa mix de produtos quenão necessariamente é o de menor custos e mais aderente às preferências dosconsumidores; e

pode limitar as opções dos clientes (4º efeito), pois limita a capacidade dos clientesde escolherem o fornecedor, considerando-se diferentes níveis de custo e qualidade.

59. A análise a partir do guia da OCDE aponta igualmente limitações à concorrência nomercado de biodiesel, em conformidade com comentários anteriores sobre instituições criadas pelaregulação do setor. No caso dos leilões de comercialização, avalia-se que uma consequência é o que oguia da OCDE classifica como 2º efeito anticompetitivo, que é o de cercear a competição entreempresas, ao substituir o sistema de preços e a respectiva livre iniciativa, com rivalidade e interação atodo tempo entre os agentes, por um mecanismo ex ante para o qual não se identificam justificativaseconômicas, conforme explicado em seção precedente.

60. No que caso do SCS, as consequências prováveis são o que o guia da OCDE classificacomo 1º e 4º efeitos anticompetitivos. O primeiro decorre da falta de incentivo à eficiência esperadacom a definição de uma reserva de mercado para determinados tipos de produtores. Já o 4º efeito, alimitação das opções dos clientes ou consumidores de diesel B, ocorre porque a referida reserva trata-sede certa forma de um obstáculo para agentes econômicos escolherem diferentes tipos de produtos deacordo com suas restrições orçamentárias e preferências. De modo geral, impossibilita-se o mercado derevelar a mistura de menor custo e mais aderente às preferências do consumidor.

61. Como será visto na próxima seção, a iniciativa de regulamentar o diesel verde éoportunidade de reduzir as barreiras à entrada elencadas, bem como os demais empecilhos à eficiênciaeconômica. Por isso, cabe avaliar risco de não se aprofundarem essas barreiras e obstáculos queprejudicam o bem-estar do consumidor.

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3.7. Consulta e Audiência Públicas nº 03/2020 da ANP

3.7.1. Escopo da revisão regulatória

62. No modelo proposto pela minuta de resolução da ANP, ora em análise, o diesel verdenão é tratado como uma categoria de biodiesel, sendo considerado produto distinto, in verbis:

Art. 3º (....)VII - diesel verde: biocombustível composto por hidrocarbonetos parafínicosdestinado a veículos dotados de motores do ciclo Diesel que seja produzido a partirdas rotas indicadas no art. 2° e que atenda às especificações técnicas contidas noAnexo desta Resolução;

63. De qualquer forma, a minuta de resolução define o diesel verde como biocombustível.Porém, não há o enquadramento desse biocombustível como biodiesel.Consequentemente, nos termos daminuta de resolução objeto da consulta pública, o diesel verde não será utilizado para fins de cumprimentodo mínimo obrigatório da mistura de biodiesel ao diesel tipo A (diesel B). A minuta de resolução trata odiesel verde como combustível distinto do biodiesel atual, in verbis:

Art. 5º O diesel verde produzido a partir das rotas descritas no art. 2º pode seradicionado ao diesel A para formulação do diesel B, em qualquerproporção, resguardado o teor compulsório de biodiesel na mistura ternáriacomposta por diesel A, diesel verde e biodiesel, podendo a mistura resultante serdestinada a veículos dotados de motores do ciclo Diesel, de uso rodoviário.§ 1º É vedado o uso da mistura composta por diesel A e diesel verde, sem biodieselno teor compulsório. (Grifo nosso)

64. Embora a ANP considere o diesel verde como novo tipo de biocombustível, esse produtopode pertencer à categoria de biodiesel produzido por rotas tecnológicas distintas do biodieselcomposto de alquil ésteres de ácidos carboxílicos de cadeia longa, que é a especificação relacionada aoteor de mistura obrigatória para a composição do óleo diesel B atualmente considerada. Isso porque o art.5º da minuta da Resolução exclui a possibilidade da nova especificação de biocombustível de participarda composição do teor de mistura obrigatório ao biodiesel. Complementarmente, a oferta do diesel verdese restringirá, portanto, ao mercado que, atualmente, é atendido integralmente pelo óleo diesel A.

65. Assim, o diesel verde não é classificado como uma categoria de biodiesel que apresentarotas tecnológicas diferentes de produção. Vale acrescentar que há propriedades químicas do dieselverde semelhantes ao do diesel fóssil. É uma característica que poderia acirrar a competição no mercadode biocombustíveis, pois, dessa forma, existiriam dois produtos que poderiam competir na reserva demercado da mistura obrigatória com rotas tecnológicas distintas, o biodiesel à base éster e o diselrenovável à base hidrocarbonetos parafínicos, sendo cada um deles com suas vantagens e desvantagenspara o abastecimento do mercado.

66. Dessa forma, a definição restritiva do diesel verde pode apresentar implicaçõesconcorrenciais para o mercado de biocombustíveis. Com a definição proposta, restringe-se o tipo detecnologia para a produção do que se considera biodiesel e, consequentemente, impõem-se barreiras àentrada no mercado desse combustível.

67. Considerando um cenário amplo de concorrência no mercado de biodiesel, bem como aqualidade e eficiência do diesel verde em comparação aos combustíveis substitutos, a liberdade de rotatecnológica para o enquadramento de biocombustíveis como biodiesel no cômputo da reserva demercado do teor de mistura obrigatória poderia incentivar arranjos negociais mais eficientes e, dessaforma, via competição entre tipos de biocombustíveis, representar um menor custo para o consumidorfinal.

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68. Na contramão do disposto na minuta de resolução ora em análise, a Empresa de PesquisaEnergética (EPE), por meio da Nota Técnica DGP-SDB nº 01/202019 argumenta que as característicasdo diesel verde permitem que esse biocombustível seja utilizado no cômputo do teor de misturaobrigatório ou de forma substituta, total ou parcial, ao óleo diesel A. Segue a transcrição do referidodocumento:

...o termo biodiesel pode ter significado mais amplo, incorporando tanto o éster como ohidrocarboneto. Neste sentido, o uso do biodiesel base hidrocarbonetos parafínicos(diesel verde) poderia contribuir para a melhoria da estabilidade da mistura quecompõe o diesel B, entre outros benefícios.

69. Complementarmente, a EPE reforça que não há restrição de uso do diesel verde emmotores do ciclo diesel, podendo inclusive melhorar o desempenho do motor, conforme trecho transcritoa seguir.

O biodiesel base hidrocarbonetos parafínicos (diesel verde) é um combustível drop-in, sem qualquer restrição ao uso em motores do ciclo Diesel e, consequentemente,pode tanto ser adicionado ao diesel fóssil como também fazer parte da mistura comdiesel B. Este biocombustível pode ser utilizado em motores Diesel da frota atual semquaisquer modificações, assim como em motores a serem comercializados a partir de2023 (PROCONVE P8). Além disso, apresenta um elevado número de cetano,melhorando o desempenho do motor.

70. Segundo a ANP, o diesel verde já é realidade em muitos países. No entanto, essebiocombustível não está regulamentado pela ANP, o que inviabiliza a sua comercialização no Brasil.Destaca-se que esse produto é gerado junto à produção de bioquerosene de aviação que se encontraregulamentado pela Resolução ANP nº 778, de 2019.

71. O mercado de aviação, inclusive, é outra motivação para a regulamentação do diesel verdeporquanto viabiliza a produção e comercialização de biocombustível para o referido mercado. Essacircunstância ilustra a relevância de regulamentar o diesel verde, permitindo sua obtenção pelas diversasrotas tecnológicas disponíveis. Nesse sentido, destaca-se o mérito da consulta pública em comento.

72. Segundo a ANP, são os seguintes os pontos positivos da proposta:

i. Amplia o número de agentes econômicos fornecedores de combustíveisrenováveis;

ii. Amplia a compet ição de fornecedores de biocombustíveis no Brasil;iii. Amplia a oferta de combustíveis renováveis, est imulando a concorrência;iv. Amplia a oferta de biocombustíveis a serem ut ilizados em motores a

combustão do ciclo diesel, ampliando as opções para o consumidor decombustíveis renováveis;

v. Sob o aspecto ambiental, este biocombustível apresenta menores emissõesde GEE e de outros poluentes, como enxofre e NOX (em comparação aodiesel fosse e biodiesel), permit indo a redução da pegada de carbono notransporte rodoviário; e

vi. Pode viabilizar a produção do bioquerosene de aviação (BioQAV).A presenteproposta busca ampliar o mercado de combustíveis comercializados emterritório nacional, incluindo os biocombustíveis que terão papel chave noalcance das metas de redução de emissões de GEE, com contribuição para odesenvolvimento ambiental, econômico e social.

73. A proposta de resolução ainda garante que a demanda do diesel verde seja constituída peloprodutor de diesel A e pelo distribuidor de combustíveis líquidos, conforme art. 8º , transcrito a seguir.

74.

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Art. 8º A mistura ternária, de que se trata o art. 5º , somente pode ser formulada pelodistribuidor de combustíveis líquidos e pelo produtor de diesel A, autorizados pelaANP.

75. Além de autorizar a produção doméstica de diesel verde, a referida minuta de resoluçãoautoriza a importação do referido biocombustível, atribuindo também a esse agente o atendimento decritérios de qualidade, conforme o art 6º transcrito a seguir.

Art. 6º O importador e o produtor de diesel verde devem garantir a qualidade dodiesel verde comercializado e emitir o certificado da qualidade de amostrarepresentativa, cujos resultados devem atender aos limites especificados na Tabela Ido Anexo.§ 1º O importador e o produtor de diesel verde devem manter uma amostra-testemunha sob sua guarda e à disposição da ANP pelo prazo mínimo de trêsmeses, a contar da data de saída do produto das instalações do produtor de dieselverde, e de quatro meses da comercialização do produto, no caso deimportação.§ 2º O volume mínimo das amostras-testemunha deve ser de dois litros, devendo serarmazenadas em embalagens de igual volume, fechadas e com lacre que deixeevidências em caso de violação, mantidas em local protegido de luminosidade.

3.7.2. Efeitos sobre a Concorrência

76. Apesar do mérito da proposta de ampliar a disponibilidade de combustíveis renováveis parao mercado, observa-se que proposta regulatória impõem barreiras à entrada. Isso porque veda o dieselverde de competir com os demais tipos de biodiesel que compõem parte da mistura obrigatória com oDiesel A.

77. A minuta de resolução propõe que o diesel verde deve competir apenas com o diesel A,uma vez que a obrigatoriedade de mistura com combustível renovável seria restrita para o biodiesel àbase éster. À primeira vista, esse arranjo parece ser vantajoso, pois o diesel A ou fóssil é responsávelpor 88% do volume da mistura do diesel B.

78. Pondera-se, entretanto, que, os possíveis custos mais elevados da indústria nascente dodiesel verde não tornam factível a competição com o diesel fóssil. Espera-se que, em um primeiromomento, o diesel verde tende a apresentar custos maiores do que outros produtos cuja tecnologia temsido utilizada há mais tempo no mercado. Trata-se circunstância inerente ao ciclo do produto verificadaem várias indústrias. Dessa forma, restringir a concorrência do diesel verde com o diesel fóssil pode nãoincentivar o aumento da produção do primeiro e aproveitar o potencial de aumentar a competição nomercado de combustíveis automotivos com a regulamentação de mais uma alternativa de abastecimento.

79. Outro ponto a considerar é que o diesel fóssil, diferentemente do biodiesel, é contestadopelo mercado internacional. Essa contestação é um dos principais fatores de fomento à concorrência emqualquer mercado de bens (tradables).

80. O gráfico abaixo ilustra a contestação do mercado interno de diesel fóssil porimportações. Nota-se que os preços do produtor interno de diesel A não se afastam da cotaçãointernacional Situam-se por vezes acima do preço externo em vista da paridade de importação. Como opaís é importador líquido de diesel fóssil, a precificação de mercado esperada inclui os custos deinternação do produto – adiante explicita-se também gráfico que exibe a condição de importação liquidado mercado nacional desse combustível.

Evolução das Cotações de Óleo Diesel A (Ref. Golfo Americano)

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Fonte: MME (Relatório Mensal do Mercado de Derivados de Petróleo/jun-20)

Óleo Diesel - Exportação e Importação: Média anual e valores mensais de jun/18 a mai/20

Fonte: MME (Relatório Mensal do Mercado de Derivados de Petróleo/jun-20)

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81. Ademais, como observado nas seções anteriores, o mercado de biodiesel apresenta umarcabouço normativo que limita a concorrência, com os leilões obrigatórios de comercialização debiodiesel, o Selo Combustível Social e inflexibilidade da proporção da mistura – definido emregulamento, ao invés de ser revelada pela eficiência de mercado. Aliado a essas barreirasconcorrenciais e de eficiência econômica, o desenho regulatório atual dos leilões de comercializaçãoimpede que seja utilizado biodiesel importado e se ampare a contestação do mercado internacionalcomentada há pouco para o diesel fóssil.

82. Assim, com base no contexto atual do mercado de biodiesel, as restrições àcomercialização do diesel verde constantes na minuta objeto da Consulta Pública ANPno 03/2020 podem criar barreiras adicionais para a promoção da concorrência no mercado decombustíveis automotivos.

83. O próximo gráfico ilustra como as falhas de concorrência no mercado de biodiesel tornamo preço desse produto significativamente superior ao do diesel fóssil. De acordo com a formação depreço do óleo diesel B do mês de junho deste ano, o preço do biodiesel foi de, aproximadamente, R$2,57/litro na média para o Brasil. Já o preço diesel A situa-se na faixa de R$ 1,60/litro no mesmo períodoe média20. O exposto indica que o custo do biodiesel é significativamente superior ao do óleo dieselfóssil, cerca de 60% mais caro do que esse último.

Óleo Diesel S-100 (B12), composição do preço ao consumidor (R$/litro e %): 21/06/2020 a 27/06/2020

Fonte: MME (Relatório Mensal do Mercado de Derivados de Petróleo/jun-20)

84. Os dados explicitados apontam que os problemas de concorrência no segmento dobiodiesel são superiores aos existentes para o segmento do óleo diesel A. Descreveram-se os diversosentraves à concorrência e outros incentivos à eficiência econômica para o primeiro, inclusive, defechamento ao comércio internacional, o que não ocorre para o combustível fóssil. Os referidos entravesnaturalmente se refletem em custos maiores do biodiesel comparativamente ao óleo diesel A, o queimplica maiores gastos para o consumidor na aquisição de combustível e, consequentemente, em perda debem-estar resultado das falhas de competição citadas.

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85. Em vista das circunstâncias enumeradas, o efeito da regulamentação do diesel verde naconcorrência de combustíveis automotivos seria potencializado com a possibilidade de competição comos demais tipos de biodiesel comercializados atualmente no mercado. Ao invés de se criar mais umabarreiras à entrada no mercado desse produto, poder-se-ia iniciar processo de redução dessas barreiraspermitindo a contestação de mercado citada.

86. A competição do diesel verde com o biodiesel contribuiria para amenizar as falhas decompetição comentadas no segmento renovável e torná-lo paulatinamente mais dinâmico até se aproximardas condições de custo do óleo diesel A e poder competir com o mesmo, ainda que necessárias revisõesda regulação para tanto. Trata-se de percurso já realizado nos mercados de etanol e gasolina, em que aevolução da competitividade do primeiro permitiu a rivalidade de ambas alternativas de produto pra oconsumidor final. O gráfico seguinte mostra essa rivalidade e a proximidade de custos entre ambos osprodutos.

Evolução dos preços dos combustíveis: fev/17 a mai/20

Fonte: MME (Relatório Mensal do Mercado de Derivados de Petróleo/jun-20)

87. Menciona-se, ainda, que o diesel verde possui vantagens em relação ao etanol hidratadocomo combustível renovável. Isso porque o diesel verde não requer adaptações nos motores do cicloDiesel. Isso ocorre com os veículos que funcionam com álcool e gasolina, exigindo maior reforço naestrutura do motor para resistir à corrosão e de uma taxa de compressão mais elevada que os motores àgasolina. Também não irá requerer software para reconhecimento do combustível que está sendo utilizadopelo veículo – álcool ou gasolina -, que estão presentes nos veículos Flex, pois as características dodiesel são semelhantes ao diesel fóssil, com a vantagem de serem bem menos poluente.

3.7.3. Redução recente do teor de mistura obrigatória

88. Cabe registrar a decisão recente da ANP que se refere à redução temporária do percentualde mistura obrigatória do biodiesel no diesel A, de 12% para 10%, conforme disposto no art. 1º daResolução nº 821, de 17 de junho de 2020, transcrito a seguir.

Art. 1º Fica autorizada a redução do percentual de mistura mínima obrigatória do

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biodiesel ao diesel A de doze por cento para dez por cento, no período entre os dias16 e 21 de junho de 2020, de modo a garantir o abastecimento interno de diesel B.

89. Observa-se que a redução do teor de mistura não está relacionada à diminuição da demandade óleo diesel A. Pelo contrário, foi uma medida de ajuste de curto prazo a fim de evitar que odesbalanceamento entre oferta e demanda de biodiesel afetasse o cumprimento da mistura obrigatória e,por conseguinte, a oferta interna de óleo diesel B.

90. Nesses termos, a ANP 21 afirmou que a referida medida é necessária para dar continuidadeao abastecimento nacional, uma vez que as entregas de biodiesel previstas para o período 16 e 21 dejunho de 2020 poderiam não ser suficientes para atender a mistura de 12% ao diesel B.

91. A referida medida regulatória é um reflexo das ineficiências do mercado de biodiesel,representadas por barreiras à maior promoção da concorrência. Essas ineficiências são ainda maioresdevido à impossibilidade de as importações contestarem o mercado doméstico, pois o biodiesel deorigem estrangeira não pode participar dos leilões de comercialização.

92. Assim, os efeitos negativos das barreiras concorrenciais não se restringem ao maior preçopago pelos consumidores, mas alcançam, sobretudo, a capacidade do mercado para o atendimento dademanda obrigatória de biodiesel. Traduzem-se em restrições à ampliação da oferta de biodiesel, asquais serão ainda maiores, a partir da vedação presente na minuta de resolução objeto da Consulta eAudiência públicas ANP no . 3/2020 que impõem restrição à participação do diesel verde para compor oteor de mistura obrigatória. Essa medida, conjuntamente com a reserva de mercado das usinas detentorasdo SCS, os leilões de comercialização e a falta de contestabilidade do biodiesel importado tendem aimpactar negativamente o ajuste das condições de oferta às possíveis flutuações da demanda.

3.7.4. Indicações

93. O exposto aponta que o mercado de biodiesel cerca-se de barreiras à entrada instituídaspela regulação da atividade. Por esse motivo, as revisões em curso poderiam evitar a criação de novasbarreiras e o amparo de incentivos para contornar as atualmente existentes. A regulamentação do dieselverde é uma oportunidade para se fomentar a concorrência no mercado de combustíveis automotivos econferir os incentivos citados.

94. Portanto, as condições de consumo do renovável em apreço poderiam ser moldadas paraproporcionar maior competição no mercado de biodiesel. Isso ocorreria com a possibilidade de o dieselverde concorrer com os atuais tipos de biodiesel regulamentados no mercado.

95. Ao possibilitar a concorrência do diesel verde com as categorias de biodiesel atualmenteaceitas pela regulação, incentiva-se a concorrência entre as diferentes tecnologias de produção derenováveis. Isso contribui para premiar a tecnologia mais eficiente e reduzir custos de produção,elevando a oferta do produto e reduzindo o preço para o consumidor final. Assim, o mercado terá opçõesde escolher o produto renovável mais eficiente – o biodiesel base éster ou o biodiesel à basehidrocarbonetos parafínicos - sopesando questões como custo de produção, qualidade do produto,aderência ambiental, logística, preço final ao consumidor, entre outros aspectos.

96. Constata-se, então, que a regulamentação deve proporcionar uma inserção maiscompetitiva do diesel verde no mercado de combustíveis renováveis, com vistas a endereçar problemasconcorrenciais que estão presentes no mercado de biodiesel. De modo mais específico, sugere-se que aregulamentação: i) permita que o diesel verde concorra com tipos diferentes de biodiesel; ii) incentive aconcorrência entre diferentes tipos de tecnologias na produção do biodiesel; e (iii) permita que omercado revele o combustível mais eficiente e aderente às preferências do consumidor.

CONCLUSÃO

97. A Audiência e Consulta Públicas ANP n o 03/2020 são iniciativas meritórias da agênciareguladora em propor a especificação de um novo tipo de biocombustível, o diesel verde,

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contribuindo para a ampliação da oferta de produtos renováveis no mercado de combustíveis automitivo.Outra constatação é que essa iniciativa contribui para a viabilidade econômica da produçãode bioquerosene da aviação.

98. Em que pese o mérito comentado, a minuta da resolução constante dos referidosprocedimentos apresenta dispositivos que impõem restrições à concorrência, as quais são fatos quemotivam ajuste da proposta de regulação de modo a não agravar o contexto atual de barreiras à entrada eoutros problemas de eficiência econômica que comprometem o bem-estar do consumidor, conformeexposto nessa nota técnica.

99. Portanto, reitera-se que a regulamentação do diesel verde é uma oportunidade de conferirmaior promoção da concorrência no mercado de biodiesel. Isso porque medidas infralegais podempermitir que o novo biocombustível (diesel verde) possa competir com biodiesel base éster, mitigando osempecilhos à competição elencados.

100. Por fim, cabe registrar que esta manifestação decorre das competências da SEAE,previstas no Decreto nº 9.745/2019, e busca promover a concorrência e outros incentivos à eficiênciaeconômica do mercado de biodiesel. Ademais, trata-se de posicionamento para a presente data.

1 Com redação dada pelo Decreto nº 10.072, de 18 de outubro de 2019.2 Disponível em: http://www.anp.gov.br/arquivos/cap/2020/cap3/cp3-2020-nota-tecnica.pdf. Acesso em18 de agosto de 2020.3 Medida Provisória nº 532, de 2011.4Inciso XXIV, redação dada pela Lei nº 12.490, de 2011.5 Inciso XXV, incluído pela Lei nº 11.097, de 2005.6 Mendes, André P. do Amaral & Costa, Ricardo da C. (2010). Mercado Brasileiro de Biodiesel ePerspectivas Futuras. BNDES Setorial, n. 31, p. 253-280, mar. 2010. Disponível em:https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/2483. Acesso em 10 de agosto de 2020.7 http://www.anp.gov.br/arquivos/prod-fornecimento-biocombustiveis/biodiesel/mapa-biodiesel-19052020.png8 Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA (2020). Dados atualizados em 06 defevereiro de 2020. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/agricultura-familiar/biodiesel/arquivos/empresas-com-selo-combustivel-social.pdf/view. Acesso em 11 de agosto de2020.9No mercado a jusante da cadeia produtiva, na comercialização de óleo diesel no atacado (ou seja, omercado de distribuição de combustíveis), a concentração do mercado é bem mais significativa, poisapenas três maiores empresas concentram-se cerca de 73% das vendas no atacado.10 BNDES Setorial. Formação do Mercado de Biodiesel no Brasil. Rio de Janeiro, n. 25, p. 39-64, mar.2007. Disponível: https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/2528. Acesso em 11 de agosto de 2020.11 Machado, Carina T. da Costa & Perez, Ronaldo Análise do mercado brasileiro de biodiesel atravésdas perspectivas dos leilões públicos. Revista Debate Econômico, v.2, n.1, p. 74-102, jan/jun 2014. Site:https://publicacoes.unifal-mg.edu.br/revistas/index.php/revistadebateeconomico/article/view/133. Acessoem 11 de agosto de 2020.12 Op. cit.13 http://www.anp.gov.br/arquivos/distribuicao-revenda/leiloes-biodiesel/69/regulamento-de-venda-biodiesel-l69.pdf14Op. cit.15 O custo de logística é fator determinante para a produção de biodiesel. Por isso, os produtores, via deregra, estão localizados próximos à produção da matéria-prima ou próximos aos grandes centrosconsumidores. Por isso, grande parte das plantas estão localizadas nas regiões Centro e Sul.16 De forma similar, a Lei nº 8.723, de 1993, que dispõe sobre a adição de álcool etílico anidro

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combustível (etanol) à gasolina, fixa um percentual de vinte e dois por cento de percentual obrigatório,podendo ser elevado pelo Poder Executivo até o limite de 27,5% (vinte e sete e meio por cento) oureduzido para 18% (dezoito por cento). Dessa forma, a lei estabelece o limite de variação de mistura doetanol anidro à gasolina, sendo o percentual de mistura exato definido por ato infralegal.17 Uma estratégia, por exemplo, é a diferenciação de produto em que a concorrência envolve outrosparâmetros, além do preço, como a qualidade do produto.18 OCDE (2017). Guia de Avaliação da Concorrência. Versão 3.0. Disponível em:http://www.oecd.org/daf/competition/49418818.pdf. Acesso em 22 de maio de 2019.19 Empresa de Pesquisa Energética – EPE (2020). Combustíveis Renováveis Para Uso em Motores doCiclo Diesel – Nota Técnica DGP-SDB nº 01/2020. Rio de Janeiro, Março de 2020. Disponível em:https://www.epe.gov.br/pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes. Acesso em 20 de agosto de 2020.2 0 Para a apuração do preço do biodiesel por litro, foi considerada a razão entre o preço dessecombustível, sem tributos e margens de distribuição e revenda, e o percentual de mistura obrigatória de12%, conforme previsto na Resolução CNPE nº 16, de 2018. Complementarmente, o preço do óleodiesel A por litro considerou o volume de 88% desse combustível na composição do óleo diesel B. 21 Agência Nacional de Petróleo. Notícias: ANP reduz temporiamente Percentual de Biodiesel Misturadoao Diesel. Disponível em: http://www.anp.gov.br/noticias/5795-anp-reduz-temporariamente-percentual-de-biodiesel-misturado-ao-diesel. Acesso em 21 de agosto de 2020. À consideração superior.

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JEFFERSON MILTONMARINHO

Assistente

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PATRICIA DA SILVA PEREIRA

Coordenadora

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MAURICIO MARINSMACHADO

Coordenador-Geral

De acordo.

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ADRIANO DE CARVALHO PARANAÍBA

Subsecretário de Competitividade e Melhorias Regulatórias

De acordo.

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GEANLUCA LORENZON

Secretário de Advocacia da Concorrência e Competitividade

Documento assinado eletronicamente por Geanluca Lorenzon,Secretário(a) de Advocacia da Concorrência e Competitividade, em02/09/2020, às 13:34, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento noart. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por Adriano de Carvalho Paranaíba,Subsecretário(a) de Competitividade e Melhorias Regulatórias, em02/09/2020, às 14:16, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no

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02/09/2020, às 14:16, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento noart. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por Maurício Marins Machado,Coordenador(a)-Geral, em 02/09/2020, às 14:17, conforme horário oficialde Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 deoutubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por Patrícia da Silva Pereira,Analista de Planejamento e Orçamento, em 02/09/2020, às 14:18,conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, doDecreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por Jefferson Milton Marinho,Coordenador(a), em 02/09/2020, às 14:23, conforme horário oficial deBrasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 deoutubro de 2015.

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Referência: Processo nº 10099.100613/2020-18. SEI nº 10240477