Upload
vuongphuc
View
216
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
CRIMES EM ESPÉCIE – PONTOS RELEVANTES
Prof: Reinaldo Rossano Alves1
I- Dos Crimes contra a vida
1- Do homicídio. Espécies delitivas: simples; privilegiado; qualificado;
culposo e híbrido (qualificado-privilegiado ou privilegiado-qualificado).
Homicídio praticado por milícia privada ou por grupo de extermínio (Lei nº
12.720/2012).
a) Sujeito ativo: qualquer pessoa;
b) Sujeito passivo: idem. Tratando-se das autoridades enumeradas no art.
29 da Lei nº 7.170/83 (Presidente da República, Deputado Federal, Senador ou
Ministro do STF), o fato pode constituir crime contra a segurança nacional, a
depender da motivação e dos objetivos do agente (art. 2º da Lei nº 7.170/83),
e não homicídio;
c) Dolo: amimus necandi ou occidendi.
d) Consumação: com a morte, tratando-se de crime material (de
resultado). O critério legal hoje é o da ―morte encefálica‖ comprovada, criado
pela Lei nº 9.434/97 – Lei de Transplantes de Órgãos (art. 3º);
e) Tentativa: possibilidade;
f) Tentativa abandonada (arrependimento eficaz e desistência
voluntária): possibilidade. Não repetição de disparos disponíveis. Desistência
voluntária e disparo de arma de fogo em via pública: art. 15 da Lei nº
10.826/03 – impossibilidade, devendo responder pelo crime do art. 132 do CP.
g) Tentativa inidônea (crime impossível): possibilidade. Arma de brinquedo.
Arma defeituosa.
h) Teoria do dolo geral (dolus generallis) ou erro sucessivo. Aberratio
causae (erro sobre o nexo causal).
1 Defensor Público do Distrito Federal. Membro do Conselho Penitenciário do Distrito Federal. Autor do
Livro ―Direito Processual Penal‖ – Editora Impetus – 8ª Edição.
i) Dolo de primeiro grau e de segundo grau (ou de conseqüências
necessárias);
j) Concurso de pessoas. Teoria monista. Teoria do domínio do fato: co-
autor, autor e partícipe. Autoria mediata ou indireta. Autoria colateral e
autoria incerta.
k) Erro de tipo essencial e acidental. Aberratio ictus e error in persona.
Casos práticos.
l) Descriminantes putativas;
1.1) Homicídio privilegiado (§1º):
a) Privilégio: causa de diminuição de pena, cujo fator de redução as
circunstâncias do art. 59 do CP (1/6 a 1/2);
b) Discricionariedade ou obrigatoriedade do benefício? Júri.
c) Hipóteses: (1) relevante valor moral: quando o fim é individual, ligado a
interesses particulares do agente. É o típico exemplo da eutanásia (ação) ou
da ortotanásia (omissão) que causam a morte, com a finalidade de evitar a
dor; (2) relevante valor social: quando o objetivo é coletivo para o bem da
sociedade, ou seja, o motivo diz respeito aos interesses ou fins da vida coletiva;
(3) emoção: diferença para atenuante genérica do art. 65, III, c, do CP.
d) Comunicação em caso de concurso de agentes: impossibilidade.
e) Paixão: divergência.
1.2) Homicídio qualificado (§2º): interpretação analógica – enumeração
casuística e fórmula genérica. Trata-se de circunstâncias, algumas de caráter
pessoal (subjetivas: I, II e V) e outras de caráter real (objetivas: III e IV).
Comunicabilidade em caso de concurso de pessoas: só as objetivas, desde
que haja ciência (conhecimento) do outro agente.
a) Paga ou promessa de recompensa ou outro motivo torpe: torpe é o
motivo moralmente reprovável, desprezível, abjeto, repugnante. Parâmetro:
senso comum da coletividade.
- Homicídio mercenário: responsabilização do mandante: divergência: STJ
(RHC 14.900/SC (Rel. Ministro Jorge Scartezzini, Quinta Turma, julgado em
17.06.2004, DJ 09.08.2004 p. 277; REsp 467.810/SP, Rel. Ministro Felix Fischer,
Quinta Turma, julgado em 20.11.2003, DJ 19.12.2003 p. 576): impossibilidade,
pois é circunstância de caráter pessoal e, portanto, incomunicável.
(*) A 6ª Turma do STJ, no entanto, entende que respondem pela qualificadora
tanto quem paga como quem recebe, em razão de ser esta ―elemento do
tipo qualificado‖, é circunstância que não atinge exclusivamente o executor,
mas também o mandante ou qualquer outro co-autor‖. (HC 99.144-RJ, Rel.
Min. Og Fernandes, julgado em 4/11/2008 – Informativo nº 375). Em recente
decisão, reafirmou esta mesma posição: AgRg no REsp 912.491/DF, Rel. Ministra
Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 09/11/2010, DJe
29/11/2010.
- Vingança: deve ser analisada no caso em concreto, conforme se vê na
seguinte decisão:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO.
MOTIVO TORPE. VINGANÇA. VERIFICAÇÃO. DECISÃO DOS JURADOS.
SOBERANIA. LIMITES DE APRECIAÇÃO NA VIA ELEITA I - A verificação se a
vingança constitui ou não motivo torpe deve ser feita com base nas
peculiaridades de cada caso concreto, de modo que, não se pode
estabelecer um juízo a priori, seja positivo ou negativo. Conforme ressaltou o
Pretório Excelso: a vingança, por si só, não substantiva o motivo torpe; a sua
afirmativa, contudo, não basta para elidir a imputação de torpeza do motivo
do crime, que há de ser aferida à luz do contexto do fato."(HC 83.309/MS, 1ª
Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 06/02/2004).
II - Dessarte, não há como, na via eleita, concluir se a vingança narrada na
denúncia, e submetida a apreciação dos jurados, traduziria hipótese de
configuração do motivo torpe, eis que, para tanto, seria indispensável o
reexame aprofundado do material fático-probatório, incompatível com o rito
do habeas corpus (Precedente). Ordem denegada.
(HC 80.107/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em
08/11/2007, DJ 25/02/2008, p. 339).
b) Motivo fútil: é o motivo insignificante, vil, desproporcional em relação ao
crime praticado. Parâmetro: senso comum da coletividade. Não se confunde
com motivo torpe. Além disso, ambas de repelem. Ação anterior da vítima.
- Futilidade e embriaguez: possibilidade.
- Ciúme: possibilidade de caracterização.
- Ausência de motivo: divergência: doutrina: possibilidade; jurisprudência:
impossibilidade (STJ - REsp 769.651/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA
TURMA, julgado em 04.04.2006, DJ 15.05.2006 p. 281).
c) Meio insidioso e veneno: venefício. O emprego insidioso de outras
substâncias, como o açúcar e o sal, traz a possibilidade de configuração da
qualificadora, pois o que qualifica o homicídio não é o objeto escolhido ou
usado para a prática do crime, mas o modo (meio) insidioso que dificulte ou
torne impossível a defesa da vítima.
d) Meio cruel: Ocorre quando o agente efetua o ato com manifesto intuito
de maldade, impondo à vítima um sofrimento desnecessário (RT 768/559).
Exige-se, ainda, que o agente esteja com o ânimo (mente, espírito) calmo ao
empregar a crueldade, pois só este estado permite ao agente a escolha dos
meios capazes de infligir maior padecimento à vítima.
e) Asfixia: exige-se o conhecimento do agente de que está matando a
vítima mediante este meio. Asfixia é a falta de oxigênio no sangue (anoxemia)
ocasionada por: esganadura (constrição do pescoço da vítima com as mãos);
estrangulamento (constrição muscular com fios, arames, cordas, seguros pelo
agente); enforcamento (constrição pelo próprio peso da vítima); afogamento
(submersão em meio líquido); soterramento (submersão em meio sólido);
sufocação (uso de objetos como travesseiros, mordaças, etc); ou
confinamento (colocação em local onde não penetre o ar).
f) Tortura: diferença para o crime de tortura qualificada pelo resultado
morte previsto no art. 1º, §3º, da Lei nº 9.455/97 (crime preterdoloso): vontade
(dolo) do agente. Possibilidade de concurso de crimes em caso de desígnios
autônomos.
g) Traição: Traição é a quebra de confiança existente entre o agente e a
vítima. Para que a traição qualifique o crime de homicídio é necessário que o
ataque seja brusco e inopinado. Diferença entre ―tiros nas costas‖ e ―tiro pelas
costas‖. Surpresa: possibilidade, quando não houver a quebra de confiança
entre o agente e a vítima (outro recurso que reduza ou impossibilite a
capacidade de resistência da vítima).
h) Emboscada: é a chamada tocaia, que pressupõe necessariamente a
premeditação do delito, a qual, por si só, não mais constitui qualificadora do
delito em exame.
i) Dissimulação: é a ocultação da intenção hostil, para acometer a vítima
de surpresa.
j) Conexão: espécies: teleológica (assegurar a execução), conseqüencial
(assegurar a vantagem, a impunidade ou a ocultação) e ocasional (praticado
por ocasião de outro crime). Previsão do CP.
1.3) Homicídio duplamente/triplamente qualificado: nestas situações,
apenas uma circunstância incidirá como qualificadora. As demais deverão ser
levadas em consideração como circunstâncias judiciais (art. 59) para a
fixação da pena-base, a qual já tomara por base os limites do homicídio
qualificado (12 a 30 anos). Há posição jurisprudencial (RT 641/324; RJTJESP
118/525), todavia, no sentido de que, presentes duas ou mais circunstâncias,
uma deve ser considerada como qualificadora e a (s) outra (s) como
agravante genérica (se prevista no rol do art. 61). Esta última só seria
considerada como circunstância judicial se não prevista no art. 61. Assim, as
demais causas não aplicadas como qualificadoras do homicídio devem ser
consideradas como agravantes genéricas. Nesse sentido: HC 168.481/ES, Rel.
Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 27/03/2012, DJe 03/04/2012; HC
192.824/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 20/03/2012,
DJe 26/03/2012; REsp 139.908/DF, Rel. Ministro José Dantas, Quinta Turma,
julgado em 07.10.1997, DJ 18.05.1998 p. 126; REsp 284.342/DF, Rel. Ministra
Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 16.09.2004, DJ 11.10.2004 p. 367. Ocorre
que todas as qualificadoras do homicídio estão previstas no art. 61 como
agravantes genéricas. A questão, porém, não é pacífica, existindo outras
decisões que reconhecem apenas a aplicação destas circunstâncias na
fixação da pena-base e não como agravantes, pois o "caput" do art. 61 do CP
as excluem da incidência da agravante genérica, quando diz: "são
circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou
qualificam o crime‖. Neste sentido, recente decisão do STJ: HC 163.815/MS,
Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 14/02/2012, DJe
15/03/2012. E, ainda: RHC 7176/MS, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Sexta
Turma, julgado em 19.03.1998, DJ 06.04.1998 p. 163; RJTJSC 72/546.
1.4) Homicídio híbrido ou qualificado-privilegiado ou privilegiado-
qualificado: possibilidade, desde que as circunstâncias sejam compatíveis
(qualificadoras objetivas). Não é hediondo segundo pacífica posição
jurisprudencial.
1.5) Homicídio culposo. Delito de homicídio culposo no trânsito (art. 302 do
CTB). Causas de aumento de pena. Omissão de socorro.
1.6) Causa de aumento de pena (art. 121, §4º, do CP). Homicídio doloso e
culposo.
1.7) Perdão judicial (§5º). Natureza jurídica da sentença concessiva. Efeitos
da condenação.
1.8) Homicídio praticado por milícia privada ou por grupo de extermínio
(§6º). A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for
praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de
segurança, ou por grupo de extermínio. A Lei 12.720/2012 criou essa causa de
aumento, dispondo, ainda, sobre o crime de milícia privada no artigo 288-A do
Código Penal (Art. 288-A. Constituir, organizar, integrar, manter ou custear
organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a
finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código: Pena -
reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos).
Em princípio, não há óbice que o agente responda pela causa de aumento
de pena e pelo crime do artigo 288-A de forma autônoma.
Quatro pontos merecem ser destacados: a) a lei não tipifica como crime
hediondo o crime de homicídio praticado por milícia privada (é claro que se o
homicídio for qualificado será hediondo); b) a norma não dispõe sobre o
número mínimo de participantes para a caracterização do crime do artigo
288-A, devendo ser adotada a posição da doutrina de que é necessária a
presença de três ou mais pessoas, como ocorre com o crime de quadrilha do
artigo 288 (redação dada pela Lei 12.850/2013); c) não configura crime de
milícia privada a associação para a prática de crimes não previstos no Código
Penal, como ocorre com o tráfico, tortura, etc, em face da redação final do
artigo 288-A; d) a pena prevista para o delito do artigo 288-A é muito alta, o
que tem levado parte da doutrina a sustentar a sua inconstitucionalidade, por
ofensa ao princípio da proporcionalidade.
2- Participação em suicídio.
a) Suicídio – matar a si mesmo; é o extermínio de si próprio. O Direito Penal
não pune o crime de suicídio por razões de política criminal. Além disso, a
conduta suicida não lesa interesses de terceiros, sendo, por isso, impossível
criminalizá-la, em respeito ao princípio da alteridade ou da
transcendentalidade. Assim, o suicida não comete um fato típico.
b) Tipo Penal: art. 122. Conduta. Importância. No homicídio, autor é quem
pratica o núcleo da ação (―matar‖) e partícipe aquele que de qualquer
forma concorre para produção do resultado. A participação se dá na forma
de instigação, induzimento e auxílio (adoção da teoria restritiva). No delito do
art. 122, o partícipe do suicídio é punido a título de autoria, eis que a
participação (instigação, induzimento ou auxílio) constitui o próprio núcleo do
tipo penal. Ou seja, quem vai ser punido é o partícipe, aquele que contribui de
qualquer forma para produção do resultado, com a instigação, induzimento
ou auxílio. Insta notar que se o agente vier a realizar a conduta ―matar‖ ele
estará cometendo o delito de homicídio (art. 121) e não o de participação em
suicídio (art. 122).
Condutas:
- Induzir (apoio moral): quando o suicida não tem em mente o suicídio por sua
própria vontade, porém alguém o induz a cometer o ato.
- Instigar (apoio moral): quando outra pessoa reforça a idéia do autor de tirar
sua própria vida, sendo que já existia uma predisposição para o ato.
- Prestar auxílio (apoio material): quando o autor é ajudado com meio material
para obtenção do resultado morte.
(*) Se o sujeito praticar a conduta ―matar‖ (ex: puxar o gatilho, abrir a torneira
de gás), responderá por homicídio.
c) Sujeito ativo: é a vítima, que pode ser qualquer pessoa, tratando-se de
crime comum.
d) Sujeito passivo: do suicida exige-se a capacidade de consentir em
dispor de sua vida. Então, torna-se necessário saber a partir de qual idade a
pessoa pode consentir. A presunção penal está no Código Penal que
determina a idade de 14 anos (é o que determina a norma do art. 224 que
trata da presunção de inocência nos crimes contra os costumes). Então, se a
criança for menor de 14 anos o crime será de homicídio (ou de tentativa de
homicídio). O mesmo ocorre com um alienado mental. Assim, nas duas
hipóteses (criança menor de 14 anos ou de pessoa alienada mental).
Causas de aumento de pena: aplica-se o dobro se o induzimento, a
instigação ou o auxílio é ocasionado por: (1) Motivo egoísta – art. 122, I Ex.:
herança, vingança; (2) Vítima com capacidade reduzida de resistência – 122,
II. Ex. embriaguez.
(3) Vítima menor? Qual a idade a ser considerada? - somente quando for
menor entre 14 e 18 anos, porquanto se for menor de 14 anos haverá
homicídio.
e) Consumação e Tentativa. Consuma-se o delito com a lesão grave ou a
morte do agente. É impossível a tentativa, pois se o suicida, mesmo instigado,
induzido ou auxiliado, não conseguir o suicídio, não havendo, ainda, lesão
grave ou morte, o fato será atípico (doutrina dominante).
- Lesão Grave e morte: a doutrina discute acerca da natureza jurídica
destes elementos. Alguns os consideram como condição de punibilidade do
crime do art. 122 (Hungria e Zaffaroni). Deste modo, se o agente induziu,
instigou ou auxiliou a vitima a suicidar-se e esta não tentou o suicídio ou não
sofreu lesões graves ou morte, o fato será típico, antijurídico e culpável, porém
não punível.
No entanto, a doutrina dominante os considera como elementos do tipo.
Desse modo, na hipótese anterior, o fato praticado pelo agente seria atípico.
- Não existe tentativa no crime de participação em suicídio, o crime é
consumado, pois se exige o resultado lesão grave, pelo qual o agente
responde por crime de participação em suicídio, cuja pena é de 01 a 03 anos,
ou o resultado morte, cuja pena é de 02 a 06 anos. Assim, tem-se a seguinte
situação: - A pessoa prestou auxílio, e a outra tentou o suicídio e não morreu
nem sofreu lesão: não responde por crime algum; - Tentou suicídio e sofreu
lesão corporal grave: art. 122, pena de 1 a 3 anos. - Tentou suicídio e morreu:
art. 122, pena de 2 a 3 anos.
3- Infanticídio.
a) Tipo Penal (art. 123).
b) Sujeito ativo e passivo. Trata-se de crime bi-próprio, pois exige qualidade
especial tanto do sujeito ativo (mãe) como da vítima (próprio filho, que deve
ser o nascituro – nascente ou neonato).
(*) Se a mãe, conscientemente, matar outro filho, sob a influência do estado
puerperal, haverá o crime de homicídio e não de infanticídio. Ressalva-se a
possibilidade de erro sobre a pessoa (§3º do art. 20 do CP), quando a mãe
continuará respondendo pelo infanticídio, como se tivesse atingido o próprio
filho.
c) Caracterização do infanticídio. Critérios: - psicológico, pelo qual se justifica
o privilégio, fundado no desejo de preservar-se a honra pessoal por meio da
ocultação da maternidade; e - psicofisiológico, adotado pelo CP, pelo qual se
caracteriza o delito pela influência do estado puerperal.
- De fato, reconhece-se que a presença do puerpério pode: (1) Não produzir
nenhuma alteração na capacidade de entendimento da mulher; (2)
Acarretar-lhe perturbações psicossomáticas que a levem a matar o próprio
filho; (3) Reduzir-lhe a capacidade de entendimento ou de determinação; o
que seria algo superior a mera perturbações psicossomáticas; ou (4) Provocar-
lhe doença mental. No primeiro caso, a mulher responderá pelo homicídio. No
segundo, haverá infanticídio. O terceiro configura infanticídio, respondendo a
mulher, porém, com a pena reduzida (parágrafo único do art. 26), em face de
sua semi-imputabilidade, ou com a imposição de medida de segurança. Na
última hipótese, há exclusão da imputabilidade, ficando a mulher isenta de
pena, na forma do caput do art. 26.
d) Momento do crime: exige-se que o crime seja cometido durante ou
logo após o parto. O início do parto ocorre com o rompimento do saco
amniótico (entendimento dominante). Por sua vez, a expressão ―logo após‖
deve ser entendida nos limites do tempo de duração do estado puerperal,
que vai de 6 (seis) dias a 6 (seis) semanas. Mas não se exclui a possibilidade de
que este prazo de 6 (seis) semanas venha a ser superado. Assim, a existência
ou não do puerpério deve ser analisada em cada caso.
e) Elemento subjetivo do tipo: pune-se o infanticídio somente a título de
dolo. Caso a mãe, sob a influência do estado puerperal, durante ou logo após
o parto, venha a matar, por culpa, o próprio filho, discute-se por qual delito
deve responder a mãe. Noronha, Mirabete, Bitencourt e Capez afirmam que a
mãe deveria responder por homicídio culposo. Para Frederico Marques e
Damásio, o fato é atípico. Entende-se correta esta última posição.
f) Consumação e Tentativa. Consuma-se com a morte do filho. É possível a
tentativa.
g) Concurso de Pessoas. Divergência.
- Comunicabilidade das elementares: é possível um 3º, que atue em concurso
com a mãe da vítima, ser condenado pelo crime de infanticídio? É preciso
distinguir três situações: (1) O terceiro é autor (ele mata a criança) e a mãe é
partícipe (instiga, induz ou auxilia o terceiro a matar a criança); (2) A mãe é
autora (ela mata o filho) e o terceiro é partícipe (instiga, induz ou auxilia); e (3)
Mãe e terceiro são co-autores, realizando o núcleo ―matar‖. É pacífico que, no
primeiro caso, o terceiro deve responder pelo crime de homicídio. Aqui não há
divergências quanto à questão da comunicabilidade das circunstâncias. Ora,
o terceiro é quem pratica, na espécie, a conduta principal que, no caso, se
subsume ao tipo penal de homicídio (art. 121) e não de infanticídio. Quanto à
mãe, entende-se que ela, apesar de ser partícipe do crime praticado pelo
terceiro (homicídio) deve responder pelo infanticídio, face ao princípio da
culpabilidade. Veja: se a mãe que ―mata‖ o próprio filho, sob a influência do
estado puerperal, comete o crime de infanticídio; não poderia ela cometer
crime mais grave - o homicídio (como partícipe) - se não ―mata‖, mas apenas
―instiga, induz ou auxilia‖. Assim, a melhor solução é responder a mãe,
partícipe, pelo crime de infanticídio.
No que se refere à segunda e à terceira hipótese, a doutrina diverge acerca
da possibilidade do terceiro (partícipe ou co-autor) responder pelo infanticídio.
A doutrina dominante (Hungria, Noronha, Damásio, Mirabete, Bitencourt,
Capez,) inclina-se no sentido da comunicabilidade. De acordo com os
adeptos desta corrente, as elementares do tipo penal do infanticídio (estado
puerperal, mãe, próprio filho) comunicam-se aos terceiros, partícipes ou co-
autores, bastando que tenham ingressado na sua esfera de conhecimento.
Aplica-se, no caso, a regra do art. 30 do CP.
A corrente minoritária, encabeçada por Heleno Fragoso, com base na lição
de Hungria (este, em sua última obra, alinhou-se à corrente dominante), não
admite a comunicabilidade, por entender que ―estado puerperal‖, ―mãe‖ e
―próprio filho‖, dados previstos no art. 123, são circunstâncias ―personalíssimas‖,
e, portanto, incomunicáveis, não se tratado de elementares.
Nota-se, em verdade, que a solução pugnada pela doutrina dominante, em
que pese a não ser a mais justa, é a que emprega melhor técnica jurídica.
Ora, os dados ―estado puerperal‖, ―mãe‖ e próprio filho‖ são elementares e
não circunstâncias do tipo infanticídio. Esses elementos integram o crime de tal
forma que, na sua ausência, há o delito de homicídio, e não infanticídio.
Ademais, não há como aceitar a tese de que são circunstâncias
―personalíssimas‖ - e, portanto, incomunicáveis - pois tal espécie de
circunstância (―personalíssima‖) não foi prevista pelo legislador penal pátrio.
Portanto, as elementares do tipo penal do infanticídio (estado puerperal, mãe,
próprio filho) comunicam-se aos terceiros, partícipes ou co-autores, bastando
que tenham ingressado na sua esfera de conhecimento, na forma
determinada pelo art. 30 do CP.
4- Aborto.
a) Conceito: Aborto é a interrupção da gravidez com a morte do produto da
concepção, seja ele ovo, embrião ou feto, pois a lei não restringe a fase de
evolução da vida intra-uterina. No sentido etimológico, aborto significa
privação (ab) do nascimento (ortus).
b) Consumação e tentativa. Consuma-se o aborto, por conseguinte, com
a interrupção da gravidez e morte do feto, sendo possível a tentativa quando
não ocorrer o óbito do feto, por circunstâncias alheias à vontade do agente.
c) Espécies de aborto: provocado, natural e acidental. O primeiro
consiste na interrupção da gravidez por intervenção humana, seja da própria
gestante ou de terceiro. Aborto natural é a interrupção espontânea da
gravidez. Aborto acidental é a interrupção da gravidez por conduta humana
não intencional, isto é, provocada, não por dolo, mas por culpa. Destas, a
única espécie que constitui crime é o aborto provocado.
d) Espécies delitivas: o auto-aborto (aborto provocado pela gestante em si
mesma) ou com o consentimento da gestante (art. 124); o aborto provocado
por terceiro sem o consentido da gestante (art.125); e o aborto provocado por
terceiro com o consentido da gestante (art. 126).
e) Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (art. 124).
- Tipo penal.
- Sujeito ativo. Trata-se de crime de mão própria, dirigido à gestante.
Nada impede, porém, que terceiro venha a praticar o delito, como partícipe,
induzindo, instigando ou auxiliando a gestante a praticar o aborto. Impossível,
no entanto, que terceiro seja co-autor do delito em estudo. Assim, por
exemplo, se o terceiro comprar um remédio abortivo e o entregar para a
mulher, ambos, terceiro e gestante, responderão pelo crime do art. 124, ela
como autora e ele como partícipe. Se, porém, o terceiro colocar o remédio na
boca da gestante, sobrevindo o aborto, a gestante responde pelo crime do
art. 124 (consentir que outrem lho provoque) e o terceiro pelo art. 126 (aborto
consensual). Conclui-se que, quando o terceiro participa do aborto
(instigando, induzindo ou auxiliando a gestante), comete o crime do art. 124.
Quando provocar o aborto, com o consentimento da gestante, responde pelo
art. 126. Se não houver o consentimento da gestante, o delito será o do art.
125.
f) Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante (art.
125).
- Tipo penal.
- Sujeito ativo. Trata-se de crime comum, podendo ser cometido por
qualquer pessoa.
- Dissentimento: a ausência de consentimento por de ser real (expresso)
ou tácito (presumido). Será real, quando a vítima expressamente for contrária
ao aborto, ou quando o agente empregar violência, grave ameaça ou fraude
para a obtenção de seu fim. A ausência de consentimento é presumida na
hipótese do parágrafo único do art. 126 do CP, ou seja, quando a gestante
tiver menos de 14 anos ou for alienada ou débil mental. Para a caracterização
do delito, não é necessário que o dissentimento da gestante seja expresso.
Basta que a gestante desconheça a prática abortiva realizada pelo terceiro.
g) Aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante (art. 126).
- Tipo penal.
- Sujeito ativo. O CP se alinhou, neste caso, à teoria dualista (há um crime
para os autores e co-autores e outro para os partícipes da ação delituosa).
Com efeito, gestante e seus partícipes respondem pelo crime do art. 124
(pena de detenção de 1 a 3anos); e o provocador do aborto e seus partícipes
pelo crime do art. 125 (pena de reclusão de 3 a 10 anos), se ausente o
consentimento da gestante; ou pelo delito do art. 126 (pena de reclusão de 1
a 4 anos), havendo o consentimento da gestante. É necessário que a gestante
tenha capacidade de consentir, pois, em caso contrário, seu dissentimento
será presumido (parágrafo único do art. 126 do CP). Assim, por exemplo, se o
terceiro praticar o aborto com o consentimento de uma gestante de 13 anos
de idade, ainda que venha a responder pelo crime do art. 126 (aborto com o
consentimento da gestante), sofrerá a mesma pena prevista no art. 125. É o
que determina o parágrafo único do art. 126: responde pelo crime de aborto
consensual (art. 126), com a pena do tipo do art. 125.
h) Formas ―Qualificadas‖.
- Natureza jurídica. Trata-se, na verdade, de causas de aumento de
pena, e não de qualificadora, em razão do resultado, já que o CP não
estabelece novos limites, mínimo e máximo de pena, mas apenas majora
aquelas previstas nos artigos 125 e 126. Com efeito, se do aborto resultar lesão
grave na gestante, a pena deve ser aumentada de um terço; se resultar a
morte, a sanção penal será duplicada. Por outro lado, sobrevindo lesões leves
na gestante, estas ficam absorvidas pelo aborto.
- Preterdolo. Cuida-se de figura preterdolosa, na qual o resultado
qualificador (morte ou lesão grave) é obtido a título de culpa. Por sua vez, se
houver dolo do agente em relação à morte ou à lesão grave, responderá ele
por dois delitos em concurso formal: aborto (vítima é o bebê) e lesão grave ou
homicídio (vítima é a gestante).
- Ausência de aborto e existência do resultado qualificador. O aumento
da pena deve ocorrer ainda que o aborto não se consume, pois o resultado
qualificador, na dicção do próprio art. 127, pode ocorrer em conseqüência do
aborto ou dos ―meios empregados para provocá-lo‖. De fato, tratando-se de
figuras preterintencionais não se pode falar em tentativa. Nesse sentido,
pronuncia-se Capez. Entendendo, porém, cuidar-se de hipótese de delito de
aborto ―qualificado tentado‖, manifestam-se, na doutrina, Fragoso e Rogério
Greco.
- Aplicação da causa de aumento de pena. Somente se aplica aos
casos de aborto praticado por terceiro, sem ou com o consentimento da
gestante, previstos nos artigos 125 e 126. Não se aplica, deste modo, ao delito
do art. 124 (auto-aborto e aborto consentido).
- Responsabilização do terceiro partícipe da gestante, havendo morte ou
lesão grave nesta. Questiona-se por qual crime deve responder o partícipe da
gestante, se esta vier a falecer ou sofrer lesão grave em razão da prática
abortiva.
Na doutrina, há três posições: (1) Responde somente por homicídio culposo ou
lesão culposa (Hungria); (2) Responde somente pela participação no crime do
art. 124 (Noronha e Mirabete); (3) Responde pela participação no crime do
art. 124 e por homicídio culposo ou lesão culposa, em concurso formal, sendo
inaplicável, na hipótese, o art. 127. É a posição de Damásio e Capez, com a
qual concordamos.
- Diferença entre aborto ―qualificado‖ pelas lesões graves e lesões graves
qualificadas pelo aborto (art. 129, §2°, V). A diferença reside no dolo do
agente. Com efeito, no delito do art. 129, o agente não quer o aborto, que
resulta a título de culpa. Nesse crime, o sujeito pretende tão-somente lesionar a
vítima. A seu turno, no aborto ―qualificado‖, a intenção do sujeito é provocar o
aborto, sobrevindo a lesão grave na gestante ou a sua morte a título de culpa.
Assemelham-se, por fim, por serem ambos os delitos preterdolosos.
i) Aborto legal (art. 128).
- Espécies. No inciso I, há a figura do aborto necessário (ou terapêutico);
no inciso II, a do chamado aborto sentimental (humanitário ou ético).
- Beneficiário. Em ambos os casos, somente o médico – profissional
registrado no Conselho Regional de Medicina – e sua equipe são os
beneficiários da excludente. É pacífico, porém, que se o aborto for praticado
por outra pessoa - uma enfermeira, por exemplo -, sem a presença de um
médico, para salvar a vida da gestante, será ela beneficiada pelo estado de
necessidade de terceiro (art. 24), não respondendo por nenhum delito, ante a
licitude de sua conduta. Por outro lado, se praticou o aborto na situação do
inciso II, não será beneficiada pela excludente do art. 128 nem pela do art. 24,
pois não está ela salvando vida alguma.
- Natureza jurídica. Trata-se de causas de exclusão da antijuridicidade, e
não de isenção de pena, pois o legislador penal excluiu a punição do fato
(―não se pune o aborto‖), e não do agente (neste caso, o CP usa a frase ―é
isento de pena‖).
Rogério Greco defende que, no aborto sentimental, há causa de excludente
da culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa. Discordamos desse
entendimento, porquanto, adotada pelo CP, a teoria da acessoriedade
limitada, que prevê a punibilidade do partícipe quando o fato praticado pelo
autor for típico e antijurídico, os integrantes da equipe médica, ainda que
presentes os requisitos legais, seriam punidos. Veja que, a se adotar a causa
como excludente da culpabilidade, o fato praticado pelo médico seria típico
e antijurídico, o que acarretaria a punição de todo a equipe médica, à
exceção do beneficiário direto da dirimente (médico).
- Aborto necessário. Requisitos. Não impõe o CP qualquer condição para a
prática do aborto necessário, eis que o próprio inciso I do §3° do art. 146
permite a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente
ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida.
- Aborto sentimental. São requisitos à sua configuração o consentimento da
gestante, ou de seu representante legal, conforme o caso, e que o médico
esteja convencido de que a gravidez é conseqüência de prática delituosa.
Não exige, assim, o legislador qualquer documento que comprove a
instauração ou encerramento de inquérito policial ou mesmo de processo
relativo ao estupro, para que o médico possa vir a realizar o aborto. É
conveniente, no entanto, que o médico se acautele, exigindo prova cabal do
consentimento e da prática do estupro. Dispensável, porém, autorização
judicial ou prova de condenação do agente pelo crime sexual. Aliás, a
autorização judicial, neste caso, poderá, inclusive, representar pré-julgamento
do delito contra os costumes. Boletim de ocorrência, testemunhos colhidos
perante a autoridade policial são provas hábeis à comprovação da prática
do estupro. Constata-se, no entanto, que dificilmente, na prática, um médico
realiza aborto sentimental sem autorização judicial. Situação igual não ocorre,
se a gravidez resultar do crime de sedução (revogado pela Lei n° 11.106/005)
ou de corrupção de menores, pois estes delitos não possuem a mesma
regência do crime de estupro, não podendo ser a eles equiparados para
efeito de concessão do benefício.
j) Aborto Eugênico. Também chamado de eugenésico ou piedoso ou
antecipação terapêutica do parto (denominação específica para os casos
de anencefalia). Nesses casos, o aborto é realizado para impedir que a
criança nasça com deformidade ou enfermidade incurável. É conhecida a
situação dos fetos anencéfalos (sem cérebros), cujo tema chegou inclusive, no
final de 2004, a ser debatido no âmbito do Supremo Tribunal Federal que
cassou liminar anteriormente concedida, em sede de argüição de
descumprimento de preceito fundamental, para negar a autorização
requerida para a prática de aborto de feto acometido de anencefalia.
Novamente, a questão foi ao plenário do STF, na ADPF 54, de relatoria do
Ministro Marco Aurélio, que reconheceu como atípica a conduta consistente
na interrupção da gravidez de feto anencéfalo (Informativo nº 661).
II- Das Lesões Corporais (art. 129).
a) Conceito. Lesão corporal é toda ―ofensa à integridade corporal ou
saúde‖, ou seja, ―todo e qualquer dano ocasionado à normalidade funcional
do corpo humano, quer do ponto de vista anatômico, quer do ponto de vista
fisiológico ou mental‖ (Exposição de Motivos da Parte Especial do CP, item 42).
b) Bem jurídico tutelado, autolesão e princípio da insignificância. Tutela-se
a integridade física e a saúde da pessoa, as quais são bens jurídicos
indisponíveis. Assim, ainda que a vítima consinta no ato, o crime de lesão
corporal subsistirá. Todavia, tem-se admitido a aplicação do princípio da
insignificância, neste delito, quando a lesão for ínfima, incapaz de ofender de
forma significativa o bem jurídico tutelado. Por outro lado, a autolesão é
penalmente irrelevante, pelas mesmas razões por que não se pune o suicídio.
c) Tipo penal (art. 129).
- Elemento subjetivo. Diferença para homicídio. O crime de lesão
corporal, não obstante ser próximo do homicídio, com ele não se confunde. A
diferença básica entre os dois delitos está na intenção, no dolo do agente. No
homicídio, o elemento subjetivo é o chamado animus necandi ou occidendi.
Na lesão corporal, o elemento subjetivo é o animus laedendi ou nocendi. Em
outras palavras, no crime de lesão corporal, o agente deseja somente lesionar,
e jamais matar a vítima, nem assume o risco de resultado morte. Já, no
homicídio, a intenção do agente é matar a vítima (dolo direto) ou, ao menos,
ser indiferente ao resultado morte (dolo eventual). Somente a prova colhida
nos autos poderá determinar se o agente desejava matar ou lesionar.
Na prática, dois elementos ajudam, mas não resolvem, a descobrir se a
intenção do agente era matar ou apenas lesionar a vítima: a lesividade da
área atingida e a letalidade do instrumento do crime. Assim, por exemplo, um
sujeito, exímio atirador, que dispara arma de fogo (instrumento letal) em
direção à cabeça da vítima (área de alta lesividade), dificilmente poderá
alegar que apenas queria lesioná-la. De fato, somente os elementos do caso
concreto poderão definir a real intenção do sujeito.
d) Espécies delitivas. O caput do art. 129 cuida da lesão corporal de
natureza leve (simples). As lesões corporais de natureza grave, em sentido
amplo, encontram-se descritas nos §§1° e 2° do mesmo artigo.
Doutrinariamente, porém, afirma-se que as hipóteses do §1° referem-se às
lesões graves, em sentido estrito; e as do §2°, às lesões gravíssimas. Para o CP,
todavia, não existem as lesões gravíssimas, mas somente lesões graves. Assim,
quando o legislador penal menciona lesão grave, como ocorre nos casos de
participação em suicídio, aborto e estupro, está referindo-se aos casos dos
§§1° e 2° do art. 129, e não somente aos do §1°. Há, ainda, as lesões corporais
seguidas de morte, o chamado homicídio preterdoloso ou preterintencional,
previstas no §3° do art. 129.
As lesões leves são identificadas por exclusão. Com efeito, não se
enquadrando em nenhum dos casos definidos nos §§1° a 3° do art. 129, a
lesão será leve. Caso contrário, cuidar-se-á de lesão grave em sentido amplo,
sendo grave stricto sensu, se prevista no §1°; gravíssima, se no §2°, ou seguida
de morte (caso este resultado seja previsível), no §3°.
e) Ação penal. As lesões graves, gravíssimas e seguidas de morte sujeitam-
se à ação penal pública incondicionada. Por força do art. 88 da Lei n°
9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais), os crimes de lesão corporal leve e
culposa passaram a sujeitar-se à ação penal pública condicionada à
representação. Por fim, com o advento da Lei nº 11.340/2006 (Lei da Violência
Doméstica ou Familiar contra a Mulher), surgiu ponderável parte da doutrina
para a qual, por força do art. 41, que exclui a aplicação da Lei nº 9.099/95 aos
crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher,
independentemente da pena prevista, o delito de lesões corporais culposas
ou leves cometidos nesta hipótese (com violência doméstica ou familiar
contra a mulher) passou a se sujeitar a ação penal pública incondicionada.
A nosso ver, entretanto, a novel legislação, por meio do art. 41, somente
desejou excluir a aplicação dos institutos despenalizadores (composição civil,
transação penal e suspensão condicional do processo) aos delitos cometidos
mediante violência doméstica ou familiar contra a mulher, não vedando a
aplicação das demais disposições da Lei nº 9.099/95, em especial o art. 88.
Tanto é assim, que a própria Lei de Violência Doméstica criou procedimento
especial para a renúncia e retratação da representação no art. 16, exigindo
que ambas sejam apresentadas perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o
Ministério Público. Assim, entendemos que os crimes de lesões leves e culposas
continuam a se sujeitar a ação penal pública condicionada à representação,
ainda que cometidos mediante violência doméstica ou familiar contra a
mulher. É a posição da Damásio.
O STJ havia firmado posição no sentido de que a ação penal, nesta hipótese,
era pública condicionada à representação (Resp 1.097.042/DF). Contudo, o
STF, no julgamento da ADI 4424/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9.2.2012,
reconheceu a natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de
lesão corporal, praticado mediante violência doméstica e familiar contra a
mulher. Nesse contexto, considerando o efeito vinculante da decisão do
Pretório Excelso, o STJ mudou sua posição anterior: HC 222.528/SE, Rel. Ministro
OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 22/03/2012, DJe 11/04/2012; HC
136.333/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em
15/03/2012, DJe 02/04/2012.
f) Consumação. Consuma-se o delito no exato momento em que resulta a
lesão à integridade física ou à saúde da vítima. É crime material, sendo exigida
a produção do resultado (ofensa à integridade corporal ou à saúde da vítima)
para a sua consumação.
g) Tentativa. Ainda que exista certa resistência de parte da doutrina, o
entendimento dominante inclina-se pela possibilidade de tentativa de lesão,
quando ficar evidenciado o animus laedendi do agente, e este, tendo
iniciada a execução do crime, não conseguir o resultado por circunstâncias
alheias à sua vontade. Deve ser admitida inclusive a possibilidade de lesão
corporal grave (ou gravíssima).
h) Lesões qualificadas pelo resultado (§§1º a 3º). Obtenção por dolo ou
culpa. É pacífico que a qualificadora do §3° do art. 129 só pode existir a título
de culpa, tratando-se de crime preterdolodo ou preterintencional. Com efeito,
se o agente tiver desejado ou assumido o risco de produzir a morte da vítima,
o delito será homicídio e não lesão corporal. Por sua vez, os resultados
qualificadores dos §§ 1º e 2º, podem ser obtidos a título de dolo ou culpa. Ou
seja, o agente pode ter desejado ou assumido o risco de produzir o resultado
qualificador, ou ter atuado apenas com culpa. No primeiro caso, há crime
qualificado pelo resultado no sentido estrito; no segundo, crime preterdoloso.
Cumpre destacar que, nas hipóteses, de lesões preterdolosas será impossível a
tentativa. Igual não ocorre no caso de lesão qualificada pelo resultado estrito
sendo, obtido a título de dolo.
i) Lesões Graves e Gravíssimas. As causas dos §§1° e 2° estão inter-
relacionadas, pois as que ensejam a lesão gravíssima são sempre um plus em
relação aos de lesão grave, ou seja, há uma correspondência entre ambos os
parágrafos. Assim, por exemplo, se a vítima fica incapacitada para as
ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias, haverá lesões graves; se
resultar, incapacidade permanente para o trabalho, as lesões são gravíssimas.
Os dados dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 129 são circunstâncias e não elementares
do crime de lesão corporal. E são circunstâncias objetivas, pois nenhuma delas
diz respeito ao motivo do crime. Sendo objetivas, elas se comunicam ao outro
sujeito, desde que tenham ingressado na sua esfera de conhecimento,
principalmente face à sua condição de poder evitar o resultado.
j) Hipóteses. Paralelo entre as lesões graves e gravíssimas. Essa
correspondência facilita a interpretação sobre as qualificadoras. Vejamos.
k) Lesão Corporal Grave (§1°)
a) Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias
(I)
Qualifica o delito em tela o fato de o ofendido, em função das lesões
corporais, ficar incapacitado para as ocupações habituais por mais de trinta
dias. O termo ―ocupações habituais‖ compreende todas as atividades
desenvolvidas pela vítima, como estudo, laser, e não somente aquelas de
natureza lucrativa (RT 526/393-4).
A incapacidade por mais de 30 (trinta) dias deve ser comprovada
por meio de exame de corpo de delito complementar, que atestará,
efetivamente, o período no qual a vítima ficou incapacitada. A perícia poderá
ser suprida por prova testemunhal, na forma prevista no §3° do art. 168 do CPP,
quando desaparecem os vestígios. No entanto, a jurisprudência e a doutrina
somente admitem a substituição do exame complementar direto (realizado
por perito) pelo indireto (feito a partir de testemunhas) quando o primeiro
laudo apresentar, no mínimo, um diagnóstico do perito, no qual se indique a
probabilidade de vir a vítima a ficar mais de 30 (trinta) dias afastada de suas
atividades habituais. Logo, se o perito não fizer esse prognóstico no laudo
inicial, não se pode suprir o exame complementar por testemunhas, apesar da
literalidade do § 3º, do art. 168, CPP.
O exame complementar deve ser realizado logo que decorra o prazo
de 30 (trinta) dias, contados da data do crime (§2° do art. 168 do CPP). Mas tal
prazo não é peremptório, pois apenas visa prevenir que o decurso do tempo
leve ao desaparecimento dos elementos necessários à verificação da
existência de lesões graves. Assim, mesmo transcorrido o prazo, se houver
elementos que permitam a afirmação da ocorrência de lesões graves, nada
impede que se faça o exame complementar (RT 785/634; RJTJERGS 187/97). É
certo, todavia, que quanto mais tempo decorrer, mais difícil será provar a
incapacidade temporal de que trata o inciso I do §1° do art. 129.
b) Perigo de Vida (II)
Havendo risco de vida, ocasionado pelas lesões, estas se tornam
qualificadas. E para qualificá-las, não basta o risco potencial, aferido pela
natureza e sede das lesões. O perigo de vida deve ser reconhecido segundo
critérios objetivos, comprobatórios do perigo real a que ficou sujeita à vítima,
mesmo que por pequeno lapso de tempo (RT 579/431). É necessário que os
peritos médicos, reportando-se ao quadro patológico apresentado pela
vítima, esclareçam os sintomas que os levaram à certeza da probabilidade do
êxito letal (RJTJESP 142/334).
Para a doutrina, esta qualificadora só pode ser obtida a título de
culpa, tratando-se de crime preterdoloso. Assim, se o agente lesionar e
dolosamente causar o perigo para a vida vítima, responderá por tentativa de
homicídio, e não por lesão grave. De fato, se o agente atua com a vontade
de trazer um perigo de vida à vítima há, no mínimo, dolo eventual quando ao
resultado morte, sendo o bastante para caracterizar o delito de homicídio e
não o de lesões corporais.
c) Debilidade Permanente de Membro, Sentido ou Função (III)
Debilidade significa mau funcionamento, redução ou
enfraquecimento. Quando o CP se refere ao termo ―permanente‖ não quis
dizer que se trata de debilidade ―definitiva‖. O termo permanente deve ser
entendido como ―imprevisível‖, significando não se saber quando o membro,
sentido ou função atingido vai voltar ao funcionamento normal ou, mesmo, se
vai voltar a funcionar.
Membros são partes do corpo que se prendem ao tronco,
classificando-se em superiores (braços, antebraços e mãos) e inferiores (coxas,
pernas e pés). Os sentidos são cinco: visão, olfato, paladar, audição e tato.
Função é atividade específica de cada órgão, tais como a respiratória, a
circulatória, a digestiva, entre outras.
A perda de um dedo da mão caracteriza debilidade permanente de
membro. Igualmente, tem-se decidido nos casos de perda de um olho, de
uma orelha, de um rim, mantido o outro órgão íntegro, e não abolida a
função (RT 591/309). É possível, no entanto, que, nos casos de perda de olho e
de orelha, ocorra a hipótese de deformidade permanente, tratando-se de
lesão gravíssima, quando se tratar de dano estético.
Por outro lado, para que se configure a gravidade resultante da
perda de dente é necessário que esta tenha acarretado debilidade
permanente da função mastigatória (RT 612/317). Assim, não havendo esta
debilidade, o crime será de lesão leve.
A qualificadora em estudo ―debilidade permanente de membro,
sentido ou função‖ pode ser produzida pelo agente a título de dolo ou de
culpa.
d) Aceleração do Parto (IV)
A última causa de lesão grave em sentido estrito ocorre quando dela
resulta aceleração do parto, ou seja, quando se antecipa o nascimento,
sendo expulso o feto antes do termo final da gravidez.
Deve-se notar que, apesar de o CP se referir à ―aceleração‖, o termo
significa ―antecipação‖, pois só se acelera aquilo que já está em andamento.
Na verdade, ―aceleração do parto‖ significa ―antecipação‖ do parto,
acarretando o nascimento da criança antes do tempo previsto.
Justifica-se a qualificadora devido ao perigo que o parto prematuro
traz à vida do bebê e da gestante. Imprescindível, ainda, que a criança nasça
com vida, pois se houver aborto a lesão será gravíssima, respondendo o
agente pela qualificadora do inciso V do §2° do art. 129 do CP.
É necessário, por fim, que o agente conheça a gravidez da vítima ou,
ao menos, que o estado gestacional seja previsível, para que incida a
qualificadora, sob pena de responsabilidade objetiva.
l) Lesão Corporal ―Gravíssima‖ (§2°)
a) Incapacidade permanente para o trabalho (I)
A primeira causa que qualifica as lesões, tornando-as gravíssimas, é a
incapacidade permanente para o trabalho. A qualificadora ocorre quando o
ofendido ficar totalmente privado da possibilidade física de se dedicar a
qualquer atividade lucrativa, e não somente daquela que era exercida no
momento das lesões, de acordo com o entendimento dominante na doutrina.
Em sentido contrário, manifesta-se Rogério Greco para quem a qualificadora
subsiste quando a vítima ficar privada da atividade lucrativa que exercia no
momento das lesões.
O termo permanente deve ser entendido como ―imprevisível‖, no
sentido de não se saber quando se vai voltar a exercer atividade laboral, e
não como perpetuidade. Permanente é a incapacidade duradoura no
tempo, sem previsibilidade de cessação.
Observa-se que esta qualificadora possui relação com aquela
definida no inciso I do §1° do art. 129. Diferem-se, no entanto: a definida no §1°
é temporária (mais de 30 dias) e relaciona-se às ocupações habituais, não se
restringindo às de natureza lucrativa, enquanto que a qualificadora do §2° é
de cunho permanente, isto é imprevisível, e refere-se especificamente às
atividades laborais, ou seja, as de natureza lucrativa.
b) Enfermidade Incurável (II)
Enfermidade incurável é aquela que a medicina ainda não
conseguiu conter ou sanar. Basta que a impossibilidade de cura seja relativa,
não estando a vítima, a fim de curar-se da enfermidade, obrigada submeter-
se a intervenção cirúrgica arriscada. Por outro lado, se o ofendido se submeter
com êxito à cirurgia resta descaracterizada a qualificadora.
A qualificadora em tela ocorre quando a saúde da vítima, em
relação ao corpo ou à mente, é atingida de forma permanente, em virtude
da lesão recebida. Não se confunde com a majorante prevista no inciso III do
§1° do art. 129 (debilidade permanente de membro, sentido ou função).
Bitencourt, citando Blinda, afirma que debilidade permanente é o estado
consecutivo a uma lesão traumática, que limita duradouramente o uso, a
extensão e energia de uma função, sem comprometer o estado geral do
organismo.
A enfermidade deve ser entendida como o estado que
duradouramente altera, e progressivamente, agrava o teor de um organismo.
Esta, conforme ressaltado por Bitencourt, é a característica que melhor define
as diferenças entre as duas majorantes, permitindo a solução mais justa para
cada caso concreto.
c) Perda ou Inutilização de Membro, Sentido ou Função
Distingue-se esta qualificadora daquela prevista no inciso III do §1° do
art. 129 (debilidade permanente de membro, sentido ou função). Enquanto
esta última se refere a ―debilidade‖, a majorante em exame menciona ―perda
ou inutilização‖. Perda é a ablação, inutilização, inaptidão do órgão à sua
função específica. Há perda quando um membro ou órgão é extraído ou
amputado ou quando cessa o sentido ou função. Ocorre inutilização quando
cessa ou se interrompe definitivamente a atividade do sentido, função ou
membro, permanecendo este ligado ao corpo, mas inoperante em sua
atividade própria ou função.
A inoperância deve ser total para que se reconheça a majorante. Já
se decidiu pela não-aplicação da qualificadora, quando a vítima teve sua
visão reduzida, mas não inutilizada. O argumento é de que o CP se refere a
perda ou inutilização de membro, sentido ou função, fato que não ocorre se,
embora com diminuto alcance, ainda pode o ofendido usar a vista atingida
pela agressão do réu (RT 404/269).
Como já ressaltado anteriormente, a perda de um dedo da mão não
configura a qualificadora em tela (lesão gravíssima), mas caracteriza
debilidade permanente de membro, sendo caso de lesão grave em sentido
estrito. Da mesma forma, tem-se decidido nos casos de perda de um olho, de
uma orelha, de um rim, mantido o outro órgão íntegro e não abolida a função
(RT 591/309). No entanto, conforme ressaltado anteriormente, nos casos de
perda de olho e de orelha, há de se considerar a hipótese de deformidade
permanente, o que, pode caracterizar, de acordo com o caso concreto,
lesão gravíssima, qualificadora que será analisada a seguir.
d) Deformidade Permanente (IV)
Deformidade é o dano estético de certa monta, permanente, visível,
irreparável e capaz de causar impressão vexatória. É permanente a
deformidade que não se auto-restaura para devolver ao tecido o mesmo e
anterior aspecto, a não ser por cirurgia reparadora (RT 554/329). Constituem
deformidade permanente marcas originadas por lesão, que causem desgosto
a seu portador ou chamem a atenção de qualquer desconhecido, ficando
evidente a impressão vexatória.
Pouco importa, porém, que a deformidade possa ser removida por
cirurgia estética, uma vez que ninguém está obrigado a ela se submeter, além
dos riscos inerentes ao procedimento cirúrgico. Se a vítima de deformidade,
no entanto, voluntariamente e com êxito se submete a cirurgia reparadora, a
figura delituosa deve ser desclassificada (JTACRIM 11/74).
É irrelevante o local da lesão, pois a deformidade permanente não se
limita ao rosto da vítima, podendo localizar-se em qualquer parte do corpo,
desde que visível. Igualmente, o fato de a vítima encobrir, dissimulando o dano
estético, não exclui a qualificadora em exame (RT 522/396).
A perda de um olho ou de uma orelha configura a qualificadora em
tela, quando associada ao dano estético. Conforme ressaltado na
jurisprudência, o dano estético representado pela falta de um olho representa,
sem contestação, uma deformidade permanente que não se descaracteriza
pela implantação de um olho de vidro (RT 480/346; 563/306). O mesmo ocorre
na hipótese de arrancamento com dentada de parte ou de toda a orelha
(JTACRIM 59/161; RT 542/372, 369/198).
Já a perda de dentes não caracteriza a majorante em questão (RT
475/311).
e) Aborto (V)
A última circunstância que configura a lesão gravíssima é o aborto.
Trata-se do chamado aborto preterdoloso ou preterintencional, no qual o
resultado qualificador (aborto) só pode existir a título de culpa. Com efeito, se
o agente atua com dolo, direto ou eventual, em relação ao aborto, há dois
crimes, cometidos em concurso de crimes: um de lesão corporal (que não
pode ser qualificado pelo aborto, em razão deste já constituir crime
autônomo, nada impedindo, porém, a incidência de outra qualificadora) e
aborto (art. 125).
É necessário, por fim, que o agente conheça a gravidez da vítima ou,
ao menos, que o estado gestacional seja previsível, para que incida a
qualificadora, sob pena de responsabilidade objetiva.
m) Lesão Corporal Praticada por grupo de extermínio ou por milícia privada
(§7º). Vide observações sobre homicídio.
III- Dos crimes contra a honra.
a) Honra objetiva e subjetiva. Diferença. A honra objetiva: - refere-se à
reputação da pessoa; - é a idéia que as pessoas têm em relação ao titular da
honra objetiva; - é ferida mediante a imputação de um fato. A honra
subjetiva: - é a idéia que a pessoa faz de si mesmo (qualidade da pessoa); - é
ferida com a imputação de uma qualidade negativa à vítima (diferente da
objetiva quando há a imputação de um fato). Subdivide-se em honra
subjetiva dignidade: diz respeito a um atributo moral (chamar alguém de
ladrão); e em honra subjetiva decoro: diz respeito a honra profissional (chamar
uma pessoa de incompetente).
Assim, quando digo que João é ladrão estou ferindo a sua honra subjetiva
(não imputei fato, mas apenas uma qualidade negativa à vítima). Neste caso,
em tese, estarei cometendo o crime de injúria.
Quando afirmo que vi João roubando a carteira de Maria atinjo a sua honra
objetiva (imputei um fato – roubo da carteira de Maria – que desabona a
honra da vítima). Se o fato imputado constituir um crime, em tese poderei estar
cometendo o delito de calúnia. Não constituindo crime, o delito poderá ser
difamação.
b) Princípio da especialidade: Há crimes contra a honra definidos no CP,
no Código Eleitoral e na Lei de Segurança Nacional. Assim, em atenção ao
princípio da especialidade das leis, antes de se enquadrar o fato em um dos
tipos penais do CP, é necessário verificar se a conduta se amolda em uma das
referidas leis especiais.
c) Elemento subjetivo. A doutrina exige para a configuração dos delitos
em exame que o agente atue com a finalidade específica de ofender a
honra da vítima. É o chamado animus injuriandi vel diffamandi, consistente no
ânimo de denegrir a honra da vítima. Assim, por exemplo, fica excluído o
delito, se o agente atuar com animus jocandi (gracejo, vontade de caçoar,
ausente a seriedade da ofensa – RT 492/355); animus narrandi (relato singelo
do fato – RT 749/565; 768/523-4; 686/393; RT 514/448); animus defendendi
(vontade de se defender em processo - JSTJ 41/309; RT 722/459; RSTJ 109/329);
animus criticandi (crítica justa e não-maliciosa).
1. Da Calúnia (art. 138).
a) Tipo penal. Núcleo:
Caput: caluniar= imputar à vítima fato definido como crime, falsamente
§1º: - propalar= repetir a informação por meio verbal); - divulgar (repetir a
informação por outros meios).
b) Falsidade da imputação.
FALSAMENTE: expressão contida no caput. Significa tanto a certeza (dolo
direito) quanto a incerteza (dolo eventual) que o fato definido como crime é
falso.
SABENDO FALSA: expressão contida no §1º. Refere-se somente ao dolo direto
– o agente tem certeza de que é falsa a informação. Desse modo, se tiver
dúvidas quanto a falsidade da informação e mesmo assim propalá-la ou
divulgá-la o fato não será calúnia, podendo responder por difamação.
c) Sujeito passivo.
- mortos: § 2º - o morto sofre a ação da calúnia, mas os sujeitos passivos
são os parentes do de cujus os quais podem vir a sofrer com a calúnia
perpetrada.
- inimputáveis: a doutrina e a jurisprudência dominantes admitem que os
inimputáveis podem sofrer a ação da calúnia, ou seja podem ser considerados
sujeito passivo do crime de calúnia. É necessário que o titular do bem jurídico
atingido possua capacidade para entender o significado da ofensa. Como
afirma Damásio, é risível dizer que há delito contra a honra no fato de alguém
dizer que um menor, de dois anos de idade, é desonesto ou que praticou um
furto. Conforme leciona Rogério Greco, a razoabilidade deve ser empregada
para afastar a calúnia nesse caso, ante a impossibilidade de entendimento da
vítima da falsa imputação que lhe foi dirigida.
- pessoa jurídica: em tese é possível ser vítima de calúnia desde que seja
possível responsabilizá-la penalmente e não somente a seus administradores. A
Constituição Federal de 1988 e a Lei nº 9.605/98 (art. 21 e 22) permitem
expressamente a responsabilização criminal da pessoa jurídica pela prática de
crime ambiental. Mesmo assim, existe ponderável corrente que inadmite a
prática delituosa pela pessoa jurídica. Segundo essa corrente, somente
podem ser responsabilizados os administradores (pessoas físicas) das empresas
(pessoas jurídicas). No entanto, o melhor entendimento é aquele que permite
a responsabilização penal das pessoas jurídicas pelos delitos ambientais. Assim,
caso alguém venha a caluniar, falsamente, uma pessoa jurídica da prática de
crime ambiental poderá cometer o crime de calúnia, sendo a pessoa jurídica
sujeito passivo desse delito contra a honra. É certo que a pessoa Jurídica tem
honra objetiva, e, ainda que não se aceite a calúnia, o crime será de
difamação.
(*) Todavia, o STF não admite que a pessoa jurídica seja vítima do crime de
calúnia ou de injúria, somente permitindo no caso a difamação. De acordo
com o STF, a imputação da prática de crime a pessoa jurídica gera a
legitimidade do sócio-gerente para a queixa-crime por calúnia (STF -
RHC 83091 / DF – Rel. Min. Marco Aurélio - DJ 26-09-2003 PP-00013; Pet-AgR 2491
/ BA – Rel. Min. Maurício Corrêa - DJ 14-06-2002 PP-00127). STJ: REsp 53.761/SP,
Rel. Ministro ASSIS TOLEDO, QUINTA TURMA, julgado em 21.11.1994, DJ
12.12.1994 p. 34374.
Atualmente, porém, o STJ não admite que a pessoa jurídica seja vítima de
qualquer crime contra a honra (mesmo difamação). Confira: AgRg no Ag
672.522/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 04/10/2005,
DJ 17/10/2005 p. 335; REsp 603.807/RN, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA
TURMA, julgado em 07/10/2004, DJ 08/11/2004 p. 278; HC 29.861/SP, Rel.
Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 09/12/2003, DJ 25/02/2004 p.
198.
d) Imputação falsa de fato definido como contravenção. Configura o
crime de difamação, não constituindo calúnia.
e) Diferença entre calúnia e denunciação caluniosa (art. 339 do CP). Este
último delito protege a Administração da Justiça, enquanto a calúnia a honra.
Assim, na denunciação caluniosa a falsa imputação é formulada com a
inequívoca vontade do agente em ver a instauração de inquérito policial, de
processo judicial, investigação administrativa, inquérito civil ou ação de
improbidade administrativa, prejudicando a vítima.
f) Consumação. Ocorre quando um terceiro, que não seja co-autor ou
partícipe do crime, toma ciência do fato. O resultado exige, assim, a presença
de três pessoas: o autor da falsa imputação, a vítima e o terceiro.
g) Tentativa: A possibilidade de tentativa está ligada ao meio de
cometimento do crime. Com efeito, se o delito for cometido por meio verbal
por se tratar de crime unissubsistente, consubstanciado num único ato, não
caberá tentativa. Se o crime for cometido por meio escrito, o iter criminis
poderá ser fracionado (crime plurissubsistente), permitindo-se a tentativa.
h) Exceção da verdade. A exceptio veritatis diz respeito à liberdade da
manifestação. Assim, se o fato imputado, propalado ou divulgado for
verdadeiro não haverá crime de calúnia. Consiste, portanto, no direito de se
provar que o fato imputado não é falso, pois provada a verdade da
imputação, a conduta do réu será atípica. Trata-se de uma exceção
substancial, na qual se permite a discussão acerca do mérito da demanda. No
crime de calúnia, a regra é a admissibilidade da exceptio veritatis. No entanto,
não será admitida quando: (1) o crime imputado for sujeito à ação privada e
não houver condenação irrecorrível por esse delito. Preserva-se, aqui, a
titularidade da ação penal que, no caso, pertence exclusivamente à vítima.
Ora, se fosse admitida a exceção da verdade nessa hipótese, o autor da
imputação estaria usurpando a titularidade da ação penal relativa ao delito
objeto da suposta calúnia; (2) a vítima da calúnia for o Presidente da
República ou Chefe de Governo Estrangeiro. Protege-se o cargo
desempenhado pela vítima. Aqui, há de ser admitida a analogia, para se
vedar a exceção da verdade no caso de Chefe de Estado (figura diversa do
Chefe de Governo, nos regimes Parlamentaristas), para se honrar o cargo
desta autoridade. É a pacífica orientação da doutrina; (3) no crime imputado,
houver absolvição irrecorrível. A exceção da verdade, na espécie, se
admitida, ofenderia à própria coisa julgada.
- Foro especial: Tratando-se de calúnia praticada contra pessoa que
possua foro especial por prerrogativa de função, a exceção da verdade deve
ser julgada pelo respectivo tribunal, conforme dispõe o art. 85 do CPP.
Ressalte-se que a exceptio veritatis deve ser oferecida e processada em
primeira instância, sendo apenas julgada em segundo grau de jurisdição, no
respectivo tribunal.
- Exceção da notoriedade: O CPP (art. 523) prevê, também, a chamada
exceção de notoriedade, figura cabível somente na calúnia, quando o
agente quiser demonstrar que suas afirmações são de conhecimento público.
2. Da Difamação (art. 139).
a) Tipo penal. Núcleo: Imputar. Propalar ou divulgar: em que pese não ter
o CP descrito a conduta do propalador ou divulgador, é pacífico o
entendimento de que o propalador ou o divulgador comete novo crime de
difamação.
b) Falsidade do Fato. O fato imputado não necessita ser falso. Assim,
comete o delito mesmo aquele que faz uma imputação verdadeira de um
fato que ferirá a honra objetiva da vítima. É por essa razão que, em regra, não
se admite a exceção da verdade neste delito.
c) Sujeito passivo: É pacífico que os inimputáveis (com capacidade de
discernimento – v. observações sobre calúnia) e as pessoas jurídicas podem ser
vítimas do delito de difamação. O mesmo ocorre com os desonrados, pois não
há pessoas absolutamente desonradas. Reconhece-se, desse modo, que
sempre há um mínimo de honra que pode ser atingida com a difamação.
Por outro lado, não se pune a difamação cometida contra os mortos, pois o
CP não repetiu, no art. 139, a regra do §2° do art. 138.
d) Consumação e tentativa: são aplicadas as mesmas observações
relativas à calúnia.
e) Exceção da verdade. Regra é a inadmissibilidade da exceptio veritatis.
Exceção: quando a difamação é cometida contra funcionário público e a
ofensa é relativa ao exercício de suas funções. Na Lei de Imprensa, permite-se
a exceção da verdade no crime de difamação também no caso de: a) a
vítima ser órgão ou entidade que exerça funções de autoridade pública; b) o
ofendido permitir a prova.
- Exceção de notoriedade: impossibilidade.
(*) Foro especial. Já se decidiu que a exceção da verdade, na hipótese de
difamação, deverá ser julgada no tribunal competente, caso a vítima tenha
foro especial, nos mesmos moldes do que ocorre no crime de calúnia (STJ -
AgRg na ExVerd. 21/CE, Rel. Ministra Eliana Calmon, Corte Especial, julgado em
17.11.1999, DJ 30.10.2000 p. 118). Não é essa, todavia, a posição adotada pela
doutrina dominante e pelo STF, que entendem que, no caso de exceção da
verdade, o foro especial somente subsistirá na hipótese de calúnia. A
propósito, vale conferir as seguintes decisões: AP 305 QO-QO/DF, DJ 10-09-1993
p.18374; EV 601/MT, DJ 08-04-1994 p. 07223; EV 522/RJ, DJ 03-09-1993 p. 17742;
ExVerd . 37/PB, DJ 19.12.2003 p. 299; HC 29.862/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti,
Sexta Turma, julgado em 21.09.2004, DJ 06.02.2006 p. 328). Em recente decisão,
porém, o STJ entendeu cabível a aplicação da regra do foro especial em
exceção da verdade ofertada em crime de difamação (ExVerd . 42/ES, Rel.
Ministro HAMILTON CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em 20.06.2007, DJ
03.09.2007 p. 109).
(*) O crime contra honra cometido contra funcionário público em razão de
suas funções difere-se do desacato (art. 331): neste delito, a ofensa é
cometida na presença do funcionário público. Já a difamação é cometida na
ausência do funcionário público.
3. Da Injúria (art. 140).
a) Tipo penal. Conduta: injuriar.
b) Sujeito Passivo
Inimputáveis: podem ser vítimas de injúria, desde que tenham um mínimo de
capacidade de compreender a injúria.
Pessoas jurídicas: não podem ser vítimas de injúria.
Mortos: não podem ser injuriados. Nada impede que exista a injúria pela via
oblíqua. Mas, neste caso, a vítima é a pessoa viva que tem sua honra atingida
obliquamente. A Lei de Imprensa pune a injúria cometida contra os mortos
(art. 24 da Lei n° 5.250/67).
c) Consumação: quando o sujeito passivo toma ciência da injúria,
independentemente de sentir-se ofendido em sua honra subjetiva e da ofensa
chegar ao conhecimento de terceiros.
d) Tentativa: possibilidade quando cometida por meio escrito.
e) Exceção da verdade e de notoriedade: impossibilidade.
f) Figuras Típicas.
- Simples – caput;
- Qualificada - §2° - Injúria Real.
(*) Emprego de violência ou vias de fato que por sua própria natureza sejam
aviltantes (pequenos) com a intenção de ferir a honra subjetiva da vítima. A
grave ameaça não caracteriza a injúria qualificada, pois o tipo só se referiu a
―violência ou vias de fato‖, embora a grave ameaça (vis compulsiva) seja
inferior à violência (vis absoluta), devendo ser observada a tipicidade estrita.
Para a caracterização do delito, de acordo com a norma do §2°, tanto a
violência quanto as vias de fato devem ser aviltantes por sua natureza, isto é,
em si mesmas; ou em razão do meio empregado. São aviltantes em si mesmas:
a bofetada, o corte ou puxão de barba, a apalpação de certas partes do
corpo (sem fim libidinoso), o levantar a saia de uma mulher ou rasgar-lhe as
vestes, virar-lhe o paletó pelo avesso. Por sua vez, são aviltantes pelo meio
empregado: bater em alguém com chicote ou rebenque, dar-lhe
palmatoadas, ou atirar-lhe excremento ou outra imundice (todos os exemplos
são de Hungria).
(*) Sendo cometida por meio de vias de fato, o agente responde unicamente
pela injúria real. Caso a injúria seja cometida por meio de violência, o agente
deve responder pelo crime de lesão (leve ou grave) em concurso formal com
o delito de injúria real (as penas, no entanto, devem ser somadas, em razão do
§2º).
- Qualificada - §3° - Qualificada por Preconceito de Raça, Cor ou Idade
ou Deficiência (inovação do Estatuto do Idoso – Lei 10.741/2003) - §3º.
(*) Não se confunde com o crime de racismo (Lei 7.716/89). As condutas
caracterizadoras do racismo encontram-se previstas na Lei 7.716/89.
(*) Também difere-se do crime previsto no §1° do art. 96 do Estatuto do Idoso.
De fato, a injúria praticada contra pessoa idosa, por qualquer motivo, que não
em razão da idade da vítima, configura o crime do §1° do art. 96 (pena:
reclusão de seis meses a um ano e multa); no entanto, se a injúria foi cometida
em razão da idade da vítima idosa, há crime de injúria qualificada pelo
preconceito previsto no §3° do art. 141 do CP (pena: reclusão de um a três
anos e multa). Portanto, da expressão ―por qualquer motivo‖ (§1° do art. 96 do
Estatuto do Idoso) deve ser excluída a injúria cometida em razão da idade,
pois ofensa configura delito mais grave: injúria qualificada pelo preconceito
(§3° do art. 141 do CP).
g) Perdão judicial (§1°). Nos casos definidos no §1° do art. 140, prevê o CP
a aplicação do perdão judicial (ver observações realizadas na análise do
crime de homicídio), causa de extinção da punibilidade. Compreendem os
casos de provocação da vítima e de retorsão a uma outra injúria. Na primeira
hipótese, a vítima apenas provoca a injúria, sem ter cometido outra
anteriormente. Na segunda pratica, necessariamente, uma injúria anterior.
Ambas as figuras, provocação e retorsão, devem ser diretas e imediatas, isto é,
cometidas na presença da vítima e sem intervalo de tempo. A provocação
pode consistir em outro crime, como calúnia, difamação, ameaça ou lesão
corporal, mas não injúria, pois, neste caso, há retorsão. Pode ser, ainda, uma
outra conduta reprovável e inoportuna, como, por exemplo, mexer com a
namorada da vítima.
A retorsão não existe apenas na injúria verbal, sendo admitida também na
escrita, como no exemplo clássico de Hungria, em que dois desafetos, à mesa
de refeição de um hotel, trocam, por intermédio do garçom, bilhetes injuriosos.
Não se admite, porém, o perdão judicial quando a retorsão é praticada em
razão de ofensa dirigida a terceiro. Neste sentido, já se decidiu que não se
reconhece a retorsão imediata na conduta do agente que pretendeu revidar
ofensa dirigida a seu irmão, pois somente a este cumpria, em tese, o exercício
daquele direito, vez que ninguém pode exercer em nome próprio direito
alheio, e nem a relação de parentesco confere, por si só, a função de
procurador, máxime quando não há qualquer notícia de que o referido irmão
tenha-se sentido ofendido por algum ato praticado pelo queixoso (RJTACRIM
45/203).
Parte da doutrina (Bitencourt e Capez), a nosso ver corretamente, entende
que a retorsão deve ser proporcional à primeira. Assim, por exemplo, quando
o agente retorquir uma injúria comum praticando uma injúria real (§2°) ou,
principalmente, uma injúria em razão de preconceito (§3°), o perdão judicial
não será concedido, em face da desproporcionalidade da retorsão.
Em nosso entendimento, nada obsta a concessão do perdão judicial à injúria
real (§2°), bastando apenas que a retorsão seja empregada contra outra
injúria real, a fim de que seja observada a exigência da proporcionalidade.
Não deve ser admitida, porém, a retorsão na hipótese de injúria qualificada
pelo preconceito (§3°), pois este delito ofende um dos objetivos fundamentais
da República Federativa do Brasil, previsto no inciso IV do art. 3° da
Constituição Federal (Capez), qual seja ―promover o bem de todos, sem
preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação‖.
4. Disposições comuns.
a) Causas de Aumento de Pena (Art. 141).
Um terço: (1) vítima Presidente da República ou Chefe de Governo
Estrangeiro. Chefe de Estado: predomina o entendimento de ser possível a
aplicação da majorante neste caso, embora discordemos desta posição; (2)
contra o funcionário público, em razão de suas funções; (3) na presença de
várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da
difamação ou da injúria. Exige-se, neste caso, a presença mínima de três
pessoas, excluídos deste quantum o agente, eventuais partícipes e a própria
vítima. Isto porque toda vez que o CP se refere a mais de uma pessoa,
considerando suficiente duas, fê-lo expressamente, o que não ocorreu na
majorante em tela; (4) vítima maior de 60 anos ou portadora de deficiência,
exceto no caso de injúria (neste caso, a injúria já é qualificada).
Dobro: crime cometido mediante paga ou promessa de recompensa.
b) Causas de Exclusão do Crime (Art. 142).
- Natureza Jurídica: Para alguns, liderados por Hungria, trata-se de causas
de exclusão da culpabilidade. Outros entendem que excluem a própria
tipicidade, afastando-se o elemento subjetivo do agente. Por fim, predomina,
a nosso ver com razão, a corrente que as vêem como excludentes da ilicitude.
- Hipóteses:
(1) Ofensa irrogada em juízo: imunidade judiciária.
beneficiários da norma: parte (inclusive o MP, quando atua como parte) ou
seu procurador (advogado, defensor público). Juiz e promotor (custos legis)
têm suas imunidades fixadas nas Leis Orgânicas respectivas.
Requisitos da imunidade judiciária: ofensa em juízo; nexo causal entre a
ofensa e a discussão da causa; injúria ou difamação, estando excluída a
calúnia, portanto.
Limite da imunidade judiciária: juiz ou membro do MP (atuando como custos
legis) não podem ser vítimas da ofensa em juízo, conforme pacífico
entendimento jurisprudencial.
(2) Opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo
quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar;
(3) O conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação
ou informação que preste no cumprimento de dever de ofício.
c) Retratação (Art. 143).
Cabimento: somente na calúnia e na difamação, sendo inadmitida na
injúria. O crime deve ser sujeito a ação penal privada, eis que o CP refere-se a
―querelado‖. (excluem-se os crimes de calúnia e difamação cometidos contra
o Presidente da República, Chefe de Governo Estrangeiro ou funcionário
público, em razão de suas funções, pois, nesses casos, a ação será pública
condicionada).
Requisito: retratação antes da sentença. Não se trata da sentença
transitada em julgado, mas da primeira condenação, ainda que passível de
recurso.
Comunicabilidade em caso de concurso de agentes: feita a retratação
por um dos agentes, ela não se estende aos demais. Trata-se de ato pessoal
do agente e, portanto, incomunicável.
d) Pedido de Explicações em Juízo (art. 144).
Prazo: antes do prazo decadencial, no caso de crime sujeito a ação
penal privada ou pública condicionada à representação do ofendido.
Foro especial: a interpelação judicial deverá ser oposta no foro
competente em que deva ser julgado o agente.
Ausência das explicações: é entendimento pacífico que o interpelado
não está obrigado a responder ao pedido de explicações, não podendo,
inclusive, ser prejudicado pela ausência das explicações, em que pese a
redação final do art. 144.
(*) O pedido de explicações em juízo não interrompe o prazo decadencial
para oferecimento de queixa ou representação.
e) Ação Penal (Art. 145).
Regra: ação penal privada (a honra é um bem jurídico disponível)
Exceções:
- Injúria real com resultado lesão corporal (ainda que seja leve): ação
penal pública incondicionada.
(*) A injúria qualificada pelo preconceito sujeitava-se à ação penal privada.
Porém, passou a se submeter à ação penal pública condicionada à
representação, a partir da Lei nº 12.033/2009.
- Presidente da República ou Chefe de Governo Estrangeiro como
vítimas: ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça.
- Funcionário público, em razão de suas funções, como vítima: ação
penal pública condicionada à representação, de acordo com o parágrafo
único do art. 145. Ocorre que a jurisprudência entende que a legitimação
para a ação, neste caso, é concorrente, sujeitando-se o crime tanto à ação
penal privada quanto à pública condicionada. É o que diz a Súmula 714 do
Supremo Tribunal Federal. Assim, ao ofendido é facultado oferecer
representação ao MP para que este denuncie o agente (o MP não é obrigado
a denunciar – eficácia objetiva da representação), ou a queixa dando, desde
logo, início a ação penal. Além disso, oferecida a representação, caso o MP
não ofereça a denúncia, a vítima pode oferecer a queixa, respeitado o prazo
decadencial.
IV- Dos crimes contra o Patrimônio.
1. Furto (artigo 156).
a) Tipo Penal (Art. 155 do CP)
- Núcleo: subtrair.
- Elementos Objetivos do Tipo: coisa móvel alheia móvel.
(*) Coisa sem dono (res nullius), abandonada (res derelicta) e de uso comum
(res commune omnium) não podem ser objeto do crime de furto. A coisa
achada (res desperdita) pode dar ensejo ao crime do art. 169, II, do CP
(apropriação de coisa achada).
(*) Furto de coisa própria (proprietário que não tem a posse da coisa):
divergência doutrinária: - Crime do art. 346 do CP: Hungria e Fragoso
(dominante – princípio da especialidade); - crime de furto (a expressão alheia
se refere também à posse alheia - Magalhães Noronha); - não há crime (Cezar
Roberto Bitencourt).
- Elemento Subjetivo do Tipo: ―para si ou para outrem‖ (finalidade especial do
agente – ânimo de assenhoreamento definitivo da coisa alheia). Animus rem
sibi habendi.
(*) Furto de Uso: admissibilidade, desde que a coisa seja entregue nas mesmas
condições em que se encontrava antes da subtração. Constitui causa de
exclusão da tipicidade, pois há ausência de um elemento subjetivo do tipo (v.
TJDFT – APR 1998021000001-6; APR 2002071009644-9).
b) Princípio da Insignificância (Bagatela): possibilidade de aplicação do
princípio, sendo o fato atípico.
c) Sujeito ativo: trata-se de crime comum. Sujeito ativo é aquele que subtrai a
res ou concorre de qualquer modo para que ela seja subtraída. Assim, o
agente que encomenda o furto e recebe a coisa furtada não responde pelo
crime de receptação, mas pelo delito de furto. É evidente que, nesta hipótese
de furto, a coisa era determinada.
d) Consumação.
Diversas teorias procurarm abordar a questão do momento consumativo
do delito. Consoante lição lapidar de Hungria, "em torno do momento
consumativo do crime de furto, debatem-se várias teorias, umas extremadas,
outras temperadas: a da contrectatio, a da aprehensio, a da amotio, a da
ablatio. Se para alguns basta o tocar com as mãos a coisa móvel alheia, cum
affectum furandi, para que o furto se consume, outros, divergindo ex diametro,
entendem que sòmente ocorre a consumação quando a res furtiva é levada
ad locum quo destinaverat fur. Mas há os que buscam um meio-têrmo entre
tais extremos: não basta tocar com as mãos, nem tampouco segurar ou
apreender a coisa, mas também não é necessário que o agente consiga
transportá-la a um predeterminado lugar ad quem: é suficiente a deslocação
da coisa, mas de modo que esta se transfira para a posse exclusiva do ladrão”
(grifo nosso).
Repare que o mestre, no primeiro momento, está se referindo as teorias da
contrectatio e da aprehensio. Com efeito, para a teoria da contrectatio o
crime se consuma quando agente consegue tocar a coisa. Para a aprehensio
(ou apprehensio), é necessário que o agente segure a coisa para o delito
atinja seu momento consumativo.
Por outro lado, na segunda parte, Hungria quis mencionar as teorias da
ablatio e da amotio, aquelas que entendem estar consumado o delito
quando há inversão da posse. De fato, a teoria da ablatio, exige que o agente
tenha a posse tranqüila da res, ainda que por pouco tempo, ou seja, que a
coisa saia da esfera de vigilância da vítima, mesmo que brevemente. Para a
amotio, o crime de furto está consumado quando houver a inversão da posse,
ou seja, quando o agente deslocar, remover a coisa para retirá-la da esfera
de vigilância da vítima, não sendo necessário que o sujeito tenha a posse
tranqüila da coisa furtada. Ou seja, as duas teorias divergem-se acerca do
conceito de inversão da posse. Tal fato foi perfeitamente delineado por
Hungria, veja: ―Mas, aqui, também, há controvérsia. Que se deve entender por
essa transferência de posse, ou, melhor, quando se pode dizer realizada tal
transferência? Afirmam uns que surge a posse do ladrão quando este
consegue afastar-se da esfera de atividade patrimonial, de custódia ou de
vigilância do dominus, ainda que, perseguido, venha a ser imediatamente
despojado. Opinam outros, entretanto, que é necessário estabelecer-se um
estado tranqüilo, embora transitório, de detenção da coisa por parte do
agente. Inclino-me, decididamente, por esta última solução. Penso, aliás, que
é a única aceitável perante o nosso direito positivo. O furto não se pode dizer
consumado senão quando a custódia ou vigilância, direta ou indiretamente
exercida pelo proprietário, tenha sido totalmente iludida. Se o ladrão é
encalçado, ato seguido à apprehensio da coisa, e vem a ser privado desta,
pela fôrça ou por desistência involuntária, não importa que isto ocorra quando
já fora da esfera de atividade patriomonial do proprietário: o furto deixou de
se consumar, não passando da fase de tentativa. Não foi completamente
frustrada a posse ou vigilância do dono. Não chegou êste a perder, de todo, a
possibilidade de contato material com a res ou de exercício do seu poder de
disposição sôbre ela. A sua propriedade sofreu sério perigo, mas não
pròpriamente uma efetiva lesão: a sua posse, como exercício da propriedade
foi perturbada, mas não definitivamente suprimida. Portanto, o mestre
inclinava-se pela adoção da teoria da ablatio”.
Há, ainda, quem se refira a outra teoria chamada de illatio, a qual exige,
para a consumação do delito, que a coisa seja levada ao local desejado pelo
ladrão para tê-la a salvo.
De fato, pode dizer que as duas primeiras teorias – contrectatio e
apprehensio – são extremamente rigorosas com os agentes deste delito. Por
outro lado, as teorias da ablatio e da illatio, bastante favoráveis. E a última –
amotio – constitui uma teoria intermediária entre as quatro anteriores.
Nesse contexto, tem sido extremamente relevante a discussão acerca da
consumação do delito de furto, principalmente nos casos de perseguição
imediata ao agente, quando este não consegue a subtração definitiva da
coisa, vindo a ser preso em flagrante. Suponha a seguinte situação: ―A‖ subtrai
a carteira de ―B‖ que consegue notar a subtração e, ato contínuo, sai em
perseguição ao agente, vindo a alcançá-lo 2 km após, e, contando com a
ajuda de terceiros, consegue recuperar a res. ―A‖ deverá responder por furto
tentado ou consumado?
A resposta acerca da consumação, ou não, do crime de furto, em casos
tais, dependerá de qual das três teoriais forem aplicadas.
Adotada as teorias da contrectatio e da apprehensio ―A‖ deveria
responder por furto consumado, pois conseguiu ―tocar‖ ou ―segurar‖ a coisa.
De acordo com a teoria da ablatio, o furto não se consumou, pois ―A‖
não obteve a posse tranqüila da res, vez que a perseguição se iniciou
imediatamente, só se interrompendo com a recuperação da carteira. Nesse
caso, responderia por tentativa de furto. O mesmo ocorreria ao se aplicar a
teoria da illatio, já que o agente não conseguira levar a coisa para o local
desejado.
Por outro lado, adotando-se a teoria da amotio, o furto estaria
consumado, pois houve a inversão da posse, com o agente removendo a
coisa para retirá-la da esfera de vigilância da vítima.
As teorias da contrectatio, da apprehensio e da illatio não encontram
mais adeptos na doutrina e na jurisprudência.
A jurisprudência, em um passado muito próximo, adotava a teoria da
ablatio, exigindo que a coisa saísse da esfera da vigilância da vítima, com o
agente obtendo a posse tranqüila da res. (STJ - REsp 663900/RS).
No entanto, o STF, após o RE 102.490 (Rel. Min. Moreira Alves, julgado em
17.9.87, DJ 16-08-1991 PP-10787), passou a aplicar a teoria da amotio,
entendendo ser desnecessário a posse tranqüila da res, sendo o bastante que
o agente invertesse a posse para retira-la da esfera de vigilância da vítima. Ou
seja, para a consumação tornou-se desnecessário que a coisa saia da esfera
de vigilância da vítima. Nesse sentido: HC 69753⁄SP, 1ª Turma, Rel. Min.
Sepúlveda Pertence, DJ de 19⁄02⁄1993.
O STJ, então, adotou a mesma teoria da amotio: REsp 808.626/RS, Rel.
Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 02.05.2006, DJ 05.06.2006 p. 316;
REsp 767.584/RS, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em
14.03.2006, DJ 24.04.2006 p. 453; REsp 302632⁄MG, 6ª Turma, Rel. Min. Fernando
Gonçalves, DJ de 06⁄06⁄2005; REsp 407.162/SP, Rel. Ministro Fernando
Gonçalves, Sexta Turma, julgado em 18.06.2002, DJ 25.08.2003 p. 378.
Na 6ª Turma do STJ, porém, a questão é tormentosa, porquanto, embora
tenha adotado a teoria da amotio (REsp 302632⁄MG, 6ª Turma, Rel. Min.
Fernando Gonçalves, DJ de 06⁄06⁄2005; REsp 407.162/SP, Rel. Ministro Fernando
Gonçalves, Sexta Turma, julgado em 18.06.2002, DJ 25.08.2003 p. 378), há
precedentes exigindo para a consumação a posse tranqüila. A propósito, a
seguinte decisão:
Furto (crime consumado/tentado). Pena (circunstância atenuante).
1. Caso de tentativa, e não de crime consumado – "em nenhum momento o
réu deteve a posse tranqüila da res furtiva, porquanto foi imediatamente
perseguido pela vítima").
2. "A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da
pena abaixo do mínimo legal" (Súmula 231).
3. Recurso especial do qual se conheceu pela alínea c e ao qual se deu
provimento em parte (item 2).
(REsp 678.220/RS, Rel. Ministro Hélio Quaglia Barbosa, Rel. p/ Acórdão Ministro
Nilson Naves, Sexta Turma, julgado em 07.06.2005, DJ 13.03.2006 p. 391).
Nem mesmo no STF pode-se dizer que a questão está pacificada, pois, em
decisão proferida no ano de 2006, a despeito de não ter se afastado da teoria
da amotio, considerou não ter consumado o crime, devido ao fato de o
agente ter sido o tempo inteiro monitorado por policiais. Ou seja, não houve a
inversão da posse, pois a coisa não foi afastada da esfera de atividade
patrimonial, de custódia ou de vigilância do agente, em virtude do
monitoramento feito pela polícia. Confira a decisão:
HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO TENTADO OU CONSUMADO. CONTROVÉRSIA.
Ainda que o agente tenha se apossado da res, subtraída sob a ameaça de
arma de brinquedo, é de se reconhecer o crime tentado, e não o
consumado, considerada a particularidade de ter sido ele a todo tempo
monitorado por policiais que se encontravam no cenário do crime. Hipótese
em que o paciente subtraiu um passe de ônibus, o qual, com a ação dos
policiais, foi restituído imediatamente à vítima. Ordem concedida.
(HC 88259/SP – Rel. Min. Eros Grau - DJ 26-05-2006 p. 039).
Em recente decisão, o STF voltou a aplicar este entendimento. Confira:
PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO PRÓPRIO. CONCURSO DE PESSOAS.
(CP, ART. 157, § 2º, II). MOMENTO CONSUMATIVO. POSSE MANSA E PACÍFICA.
PRESCINDIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA DO STF. CASO CONCRETO.
INAPLICABILIDADE. PECULIARIDADE. MONITORAMENTO PELA POLÍCIA.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA CRIME TENTADO (CP, ART. 14, II). ORDEM
CONCEDIDA. 1. A consumação do crime de roubo, em regra, independe da
posse mansa da coisa, bastando que, cessada a violência ou grave ameaça,
ocorra a inversão da posse; tese inaplicável nas hipóteses em que a ação é
monitorada pela Polícia que, obstando a possibilidade de fuga dos imputados,
frustra a consumação por circunstâncias alheias à vontade dos agentes, nos
termos do art. 14 do Código Penal. 2. É cediço na jurisprudência da Corte et
pour cause reclama o uso da analogia com o fato punível julgado pela
Segunda Turma no HC 88.259/SP, no qual a ordem foi concedida em acórdão
assim ementado: ―HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO TENTADO OU
CONSUMADO. CONTROVÉRSIA. Ainda que o agente tenha se apossado da res,
subtraída sob a ameaça de arma de brinquedo, é de se reconhecer o crime
tentado, e não o consumado, considerada a particularidade de ter sido ele a
todo tempo monitorado por policiais que se encontravam no cenário do
crime. Hipótese em que o paciente subtraiu um passe de ônibus, o qual, com
a ação dos policiais, foi restituído imediatamente à vítima. Ordem concedida.‖
(HC 88.259/SP, Relator Min. Eros Grau, Segunda Turma, Julgamento em
2/5/2006, DJ 26/5/2006). 3. In casu, os pacientes, em união de desígnios e
mediante violência física, subtraíram da vítima a quantia de R$ 20,00 (vinte
reais), sendo imediatamente perseguidos e presos em flagrante pela Polícia
Militar, que passava pelo local durante o ato delituoso. 4. Ordem concedida,
para desclassificar o delito para roubo tentado, remetendo-se ao juízo de
primeira instância a alteração na dosimetria da pena.
(HC 104593, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/11/2011,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-230 DIVULG 02-12-2011 PUBLIC 05-12-2011 RB v. 24,
n. 579, 2012, p. 53-56).
De fato, o agente ao remover a coisa (invertendo a posse) já tem a
disponibilidade da res, podendo destruí-la ou mesmo escondê-la, não
havendo razão para se exigir que a posse seja tranqüila, mesmo porque este
requisito não está previsto na lei.
Contudo, a questão da inversão da posse deve ser vista à luz da
razoabilidade. Assim, por exemplo, não se pode concluir pela consumação do
crime se o agente, por exemplo, após já estar com a carteira da vítima, em
um furto cometido no interior de um ônibus, vem a ser preso em flagrante,
antes mesmo que saia do veículo. Não se pode concluir pela consumação de
um crime de furto se o sujeito, em um furto cometido no interior de uma
residência, é surpreendido ainda dentro desta, já estando de posse da res
furtiva. Como bem sustentado pelo Ministro Moreira Alves, “a fuga com a coisa
em seu poder traduz inequivocamente a existência de posse. E a perseguição
- não fosse a legitimidade do desforço imediato - seria ato de turbação
(ameaça) à posse do ladrão” (RE 102.490).
Ora, são diversas as teorias da apprehensio com a da amotio. Inversão da
posse não é o mesmo que apreensão do bem. É certo, porém, que, no próprio
RE 102.490, as duas teorias foram abordadas como sinônimas, o que levou a
jurisprudência a equipará-las (AgRg no REsp 1245318/RS, Rel. Ministro Sebastião
Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 13/09/2011, DJe 28/09/2011;. HC
133.176/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 12/04/2011, DJe
04/05/2011.
e) Tentativa. Possibilidade.
f) Crime impossível.
- Sistemas de vigilância: caso de crime tentado e não de crime impossível (a
impropriedade do objeto ou a ineficácia do meio, nestes casos, são relativas e
não absolutas). É a posição pacífica do STJ, confira: REsp 710.667/RS, Rel.
Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 23.08.2005, DJ
03.10.2005 p. 324; REsp 554.233/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma,
julgado em 23.08.2005, DJ 26.09.2005 p. 436; REsp 633.656/RS, Rel. Ministro José
Arnaldo da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 05.10.2004, DJ 08.11.2004 p.
285.
- Alarmes anti-furto: idem.
- Ausência do objeto do crime: caso de subtração de carteira: (1) bolsos
vazios: crime impossível; (2) carteira em outro bolso: tentativa.
g) Desistência voluntária. Possibilidade.
h) Arrependimento posterior (art. 16 do CP). Possibilidade. Reparação do
dano anterior ao recebimento da denúncia: configura arrependimento
posterior (art. 16 do CP): a pena deve ser reduzida de um a dois terços.
i) Figuras Típicas: (1) Furto Simples: caput; (2) Furto ―Noturno‖ (praticado
durante o repouso noturno): §1º; (3) Furto Privilegiado ou Mínimo: §2º; (4) Furto
de Energia Elétrica: §3º; (5) Furto Qualificado: §4º; (6) Furto de Veículo
Transportado para outro Estado ou para o exterior: §5º.
j) Furto Noturno (Durante o período do repouso noturno - Critério
Psicossociológico – aferido de acordo com os costumes locais, onde a vítima
dorme): não se trata de furto durante a noite (critério físico-astronômico), mas
de furto praticado durante o período do repouso noturno.
Divergência: 1ª Corrente: fato deve ser praticado em casa habitada e os
moradores devem estar repousando no momento da subtração.
Entendimento minoritário na jurisprudência; 2ª Corrente: basta que o furto
ocorra durante o período noturno, sendo irrelevante o local do crime ou que
esteja habitado. Entendimento majoritário na jurisprudência (STF e STJ). O
fundamento da causa de aumento de pena reside na maior vulnerabilidade
que há no período do repouso noturno. (v. STJ – RESP 509590/SP). ―Aplica-se a
majorante prevista no art. 155, § 1º, do Código Penal, se o delito é praticado
durante o repouso noturno, período de maior vulnerabilidade inclusive para
estabelecimentos comerciais, como ocorreu in casu. (Precedentes)‖ (REsp
704.828/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 02.08.2005,
DJ 26.09.2005 p. 448). No mesmo sentido: HC 29.153/MS, Rel. Ministro GILSON
DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 02.10.2003, DJ 03.11.2003 p. 335.
(*) Não se aplica esta causa de aumento às figuras qualificadas (§§ 4º e 5º).
Neste caso, o fato de o furto ter sido praticado durante o período noturno
deve ser considerado pelo juiz no momento da fixação da pena-base
(circunstâncias judiciais – art. 59 do CP). Nesse sentido: HC 10.240/RS, Rel.
Ministro FERNANDO GONÇALVES, SEXTA TURMA, julgado em 21.10.1999, DJ
14.02.2000 p. 79.
k) Furto Privilegiado (§2º)
Benefícios: substituição da pena de reclusão por detenção; diminuição de
um a dois terços da pena; aplicação somente de pena de multa.
(*) Cumulativos? Possibilidade (jurisprudência e doutrina).
(*) O juiz, presentes os requisitos ensejadores, está obrigado a conceder o
benefício.
Requisitos: - Réu primário: para a doutrina dominante é o não reincidente.
Maus antecedentes, portanto, não impediriam a concessão do benefício, que
pode só poderia ser afastado com a reincidência. A jurisprudência, no
entanto, exige que as circunstâncias judiciais sejam favoráveis (STJ - RESP
207181/DF; RESP 369816/MA) e, neste caso, maus antecedentes impedem a
concessão do benefício.
- Coisa de pequeno valor: a que não alcança um salário mínimo vigente à
época da subtração. Deve ser aferido no momento da prática do delito e não
da ação penal. Não se trata de pequeno prejuízo sofrido pela vítima, mas de
coisa de pequeno valor. O critério do salário mínimo não é rígido, podendo ser
flexibilizado em determinadas situações.
l) Energia Elétrica (§3º).
Ligação clandestina: furto qualificado pela fraude.
Alteração do medidor de energia: estelionato.
Natureza da subtração: crime permanente (e não instantâneo), não
havendo em que se falar em concurso de crimes, se só houve uma ação
criminosa, ainda que tenha sido subtraída a energia em várias oportunidades.
Água. Possibilidade de aplicação do mesmo entendimento.
Sinal de TV a cabo: o entendimento dominante inclina-se pela ausência de
delito. Nesse sentido, recente decisão do STF: HC 97261/RS, rel. Min. Joaquim
Barbosa, 12.4.2011. Não pode se tratar de furto, pois o sinal de TV a cabo não
é coisa móvel, nem muito menos pode ser equiparado a energia elétrica. Não
se admite a configuração do estelionato, pois não há prejuízo alheio (a
emissora apenas não ganha, mas não se pode afirmar que sofre prejuízo).
(*) O STJ, porém, não tem trancado inquéritos policiais, sob este fundamento,
entendendo tratar-se, em tese, de crime de furto (REsp 1123747/RS, Rel. Ministro
GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe 01/02/2011; REsp
1076287/RN, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em
02/06/2009, DJe 29/06/2009; HC 21.175/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA
TURMA, julgado em 03.02.2004, DJ 23.08.2004 p. 276; HC 17.867/SP, Rel. Ministro
GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 17.12.2002, DJ 17.03.2003 p. 243).
m) Furto Qualificado (§4º). Aplicação.
(1) Destruição (desfazimento) ou rompimento (abertura) de obstáculo à
subtração da coisa. É pacífico que o dano à própria coisa não qualifica o
crime.
Obstáculo -> proteção, para a doutrina dominante, deve ser externo à
coisa. Sendo ele inerente à coisa não haveria a qualificadora.
Veículos – Destruição de vidros ou do quebra-vento. Divergência:
(a) O STF (v. HC 77675/PR – Rel. Min. Néri da Silveira - DJ 18-08-2000 p. 82)
reconhece que a destruição de vidros ou do quebra-vento para a subtração,
tanto de acessórios como do próprio veículo, qualifica o furto, pois a lei não
exige que o obstáculo seja externo à coisa, podendo ser a ele inerente.
Conforme asseverado pelo Ministro relator no julgado citado: ―não é de ter
como razoável acolher-se o entendimento segundo o qual o arrombamento
de carro para subtrair toca-fitas ou objetos existentes em seu interior qualifica o
furto, o que não sucede se o arrombamento colima subtrair o próprio
automóvel. Sem o arrombamento da porta ou do sistema de segurança do
carro, não se faria possível o furto; sem a violência em foco, o delito não se
consumaria, quer numa situação, quer noutra‖.
(b) O STJ (v. RESP 294503/DF; REsp 743.615/RS, DJ 29.08.2005 p. 436; REsp.
618.236⁄RS, DJ de 07.03.2005; REsp 739.772/DF, DJ 14.11.2005 p. 397) entende
que a referida destruição somente qualifica o furto se a subtração for de
acessórios do veículo. Ou seja, se o agente destruir os vidros do automóvel
para subtraí-lo, o furto será simples, pois o obstáculo deve ser externo à coisa;
se realizou a destruição para subtrair acessórios ou objetos (e não o veículo)
que se encontravam no interior do carro, responderá pelo furto qualificado;
(c) Como a mencionada destruição efetivada para a subtração do veículo
(crime mais grave) não qualifica o furto, vez que o obstáculo deve ser externo
à coisa, a subtração de acessórios (crime menos grave) também não poderá
qualificá-lo. Há recente decisão do STJ nesse sentido: AgRg no REsp
922.395/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em
03/02/2011, DJe 21/02/2011.
Momento da destruição ou rompimento: sempre antes da consumação do
delito (durante o iter criminis). Após a consumação, há concurso material de
crimes (furto simples e dano).
Prova pericial: a prova do rompimento, necessária à condenação, deve ser
realizada por meio de perícia, sob pena de nulidade, consoante
entendimento do STF (v. STF – HC 70519/SP). Assim, sendo possível a sua
realização, a prova do rompimento ou da destruição do obstáculo, deve ser
feita por meio de perícia (exame direto). A propósito, confira: AgRg no REsp
1224372/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado
em 20/09/2011, DJe 28/09/2011; HC 207.588/DF, Rel. Ministro Og Fernandes,
Sexta Turma, julgado em 23/08/2011, DJe 08/09/2011; REsp 1250021/MG, Rel.
Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 28/06/2011, DJe 01/08/2011.
(2) Com abuso de confiança.
Diferença para apropriação indébita (art. 168): neste crime, o agente possui
a posse desvigiada da coisa, enquanto que no furto a posse é vigiada. (ex:
empréstimo de livros). Ademais, na apropriação indébita: o dolo do agente só
surge após a posse da coisa; no furto (e no estelionato), o dolo é inicial (ab
initio), precedendo à posse (ou detenção) da res.
(3) Mediante fraude.
Difere-se da fraude elemento constitutivo do crime de estelionato (art. 171 –
pena: reclusão de 1 a 4 anos). No delito de furto, a fraude qualifica a ação
típica (reclusão de 2 a 8 anos). Releva notar que, enquanto no furto a fraude é
utilizada para que a vítima não pressinta a saída da res de sua posse (no furto
há subtração), no estelionato, ela faz com que a vítima livremente disponha
(entregue) a coisa ao agente.
(*) Diferença entre furto qualificado pela fraude, estelionato e apropriação
indébita: suponha a seguinte situação: o agente deseja apoderar-se de um
livro de uma biblioteca. Para efetuar tal intento poderá, por exemplo: 1)
aproveitar-se da relação de confiança que, em regra, existe entre a biblioteca
e o usuário e colocar o livro dentro de sua bolsa, ―subtraindo-o‘, sem que seja
notado pela bibliotecária; ou 2) tomar por empréstimo o livro e dele
―apoderar-se‖. Na primeira situação, cometerá o delito de furto qualificado
pela fraude, pois ao empregá-la (simulação de ser apenas usuário da
biblioteca) o agente fez com que a vítima não pressentisse a saída da res de
sua posse. No segundo caso, o agente cometeu o crime de estelionato, pois
ao empregar a fraude fez com que a vítima livremente lhe entregasse o livro.
Se o agente só manifestasse a intenção de permanecer com o livro após o
empréstimo (posse da res) haveria o crime de apropriação indébita.
(4) Escalada: escalar significa transpor. No caso, a escalada consistiria na
transposição de algo para à subtração da coisa.
(5) Destreza: é a chamada punga. Punguista é o batedor de carteiras
(Dicionário Aurélio).
O parâmetro para aferir se o agente agiu com destreza é a própria vítima.
Se esta perceber que está sendo furtada, a destreza deve ser desconsiderada
(entendimento pacífico).
(*) Discute-se, na doutrina e na jurisprudência, se é possível o reconhecimento
desta qualificadora quando o agente é surpreendido não pela vítima, mas por
terceiro. Neste caso, a jurisprudência majoritária inclina-se no sentido da
possibilidade de configuração da qualificadora, visto que a vítima não havia
notado a subtração.
(6) Chave Falsa: chave falsa é qualquer espécie de gazua (Nelson Hungria).
Gazua é qualquer ferro com que se pode abrir fechaduras. A qualificadora só
se justifica quando a chave falsa é utilizada externamente a "res furtiva",
vencendo o agente o obstáculo propositadamente colocado para protegê-la
(STJ – REsp 43047/SP). Assim, o uso da chave falsa refere-se ao acesso do
agente à coisa (STJ – 284385/DF). Deste modo, tem-se entendido que o uso de
chave falsa diretamente na ignição não qualifica o delito. Diversa, no entanto,
é a situação quando o agente se utiliza da chave falsa para abrir o veículo e
na seqüência a emprega na ignição, pois, neste caso, a qualificadora deve
existir.
Entretanto, o STJ modificou sua posição entendendo que a qualificadora
incide mesmo se chave for inserida apenas na ignição. Confira: REsp
906.685/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 19/06/2007,
DJ 06/08/2007 p. 683.
(7) Mediante concurso de duas ou mais pessoas.
Divergência: presença in loco dos concorrentes:
(a) Imprescindibilidade: Hungria e Bitencourt e STJ (STJ - HC 16140/PA; REsp
90451/MG)). A qualificadora funda-se na maior dificuldade de defesa da res,
ou seja, no maior risco ao patrimônio, visto que formado o concurso de
agentes reduz-se a possibilidade de defesa da coisa.
(b) Prescindibilidade: Damásio, Capez, Mirabete e STF (HC 70395/RJ). A
qualificadora funda-se na maior periculosidade dos agentes. Ademais, o CP
refere-se a concurso de agentes que engloba, inclusive, a participação
daquele que não está presente no local do crime.
(*) O melhor entendimento é o da primeira corrente. Contudo, como se viu,
esta não é a posição do STF. Nada obstante, não está excluída a possibilidade
de que o concurso ocorra na modalidade participação, desde que o
partícipe se encontre no local do crime (ex: motorista que dará fuga aos
agentes). Cabe lembrar que partícipe é aquele que concorre (instiga, induz ou
auxilia) para a prática do crime, sem realizar o núcleo da ação típica (no
caso, ―subtrair‖).
Absolvição do co-réu: implica na exclusão da qualificadora, devendo o
agente ser condenado por furto simples.
Co-réu inimputável: pode ser computado para a formação do concurso de
agentes.
Crime de quadrilha (art. 288): o reconhecimento da qualificadora de
concurso de agentes não impede a condenação destes pelo crime de
quadrilha, segundo entendimento jurisprudencial e doutrinário dominante. O
delito do art. 288 do CP se consuma com a própria associação e não com a
prática de outra infração pena. Assim, tratando-se de vítimas distintas e de
momentos consumativos diferentes nada impede o reconhecimento da
qualificadora e também do crime de quadrilha.
Prisão de um dos agentes e consumação do delito: na hipótese de um dos
agentes vir a ser preso em flagrante e o outro conseguir escapar trazendo
consigo a res, há a consumação do crime de furto para todos, inclusive para o
que foi preso em flagrante.
Inconstitucionalidade? César Bitencourt e Luiz Lênio Streck argumentam que
a qualificadora do crime de furto é inconstitucional, pois fere o princípio da
proporcionalidade, vez que neste delito (art. 155) a pena é duplicada (passa a
ser de reclusão de 2 a 8 anos), enquanto que no roubo (art. 157), o concurso
de agentes tão somente conduz ao aumento da pena de um sexto a um
terço.
Todavia, essa não é a posição que tem prevalecido na jurisprudência.
Veja, a propósito, as seguintes decisões: REsp 778.813/RS, Rel. Ministro Gilson
Dipp, Quinta Turma, julgado em 06.12.2005, DJ 01.02.2006 p. 606; ). , ao julgar o
REsp 453573/RS, REsp 709.100/RS, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, Quinta
Turma, julgado em 28.09.2005, DJ 07.11.2005 p. 364; HC 40.093/RJ, Rel. Ministro
Paulo Medina, Sexta Turma, julgado em 08.03.2005, DJ 12.09.2005 p. 375. Esta,
inclusive, é a inteligência da Súmula 442 do STJ.
n) Comunicabilidade das circunstâncias: tratando-se de circunstâncias
objetivas são comunicáveis, desde que tenham ingressado na esfera de
conhecimento do outro agente.
o) Transporte De Veículo Automotor (§5º).
Conceito de veículo automotor: todo veículo a motor de propulsão que
circule por seus próprios meios, e que serve normalmente para o transporte
viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículos utilizados para o
transporte de pessoas e coisas. O termo compreende os veículos conectados
a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico). – A
definição consta no Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro.
Significado da expressão ―que venha a ser transportado para outro estado
ou para o exterior‖: a qualificadora pressupõe uma subtração anterior
(consumação do furto) e, ato contínuo, a transposição da fronteira estadual
ou internacional (configuração da qualificadora). Há no caso uma dupla
consumação.
A tentativa, em tese, é possível, quando existirem elementos suficientes que
atestem a subtração do veículo e o provável transporte do veículo para outro
estado ou para o exterior. Todavia, há de se admitir que, na prática, é de difícil
configuração.
p) Furto Privilegiado-Qualificado: há pouco tempo, os tribunais superiores não
admitiam esta figura. Sustentava-se que o fato de o furto qualificado (§4º) ter
sido colocado após o privilegiado (§2º) evidencia a vontade do legislador em
não reconhecer o privilégio nas hipóteses previstas no §4º. Nesse sentido: STJ -
HC 102.863/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA,
julgado em 25/09/2008, DJe 20/10/2008; REsp 664.272/SP, Rel. Ministro JOSÉ
ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 22.03.2005, DJ 18.04.2005
p. 379; HC 36.331/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em
01.03.2005, DJ 28.03.2005 p. 297; REsp 509.581/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, julgado em 06.05.2004, DJ 28.06.2004 p. 389.
Contudo, os tribunais modificaram sua posição anterior, passando a aceitar o
reconhecimento da figura, havendo compatibilidade entre as qualificadoras e
as privilegiadoras. Nesse sentido: STF - HC 97051/RS, rel. Min. Cármen Lúcia,
13.10.2009; HC 98265/MS, rel. Min. Ayres Britto, 24.3.2010 – STJ: HC 239.262/SP,
Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe
20/06/2012; HC 166.736/ES, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado
em 22/05/2012, DJe 04/06/2012.
Aliás, esta sempre foi a opinião dominante na doutrina, a qual sempre
entendeu possível o reconhecimento do furto privilegiado-qualificado,
havendo compatibilidade entre as circunstâncias.
q) Furto Noturno-Privilegiado: possibilidade de reconhecimento, de acordo
com a jurisprudência e com a doutrina.
r) Furto Duplamente Qualificado: havendo a presença de duas ou mais
circunstâncias do §4º no crime de furto, apenas uma delas deve ser
considerada como qualificadora. As demais deverão ser sopesadas pelo juiz
na fixação da pena-base, sendo, portanto, consideradas como circunstâncias
judiciais(art. 59 do CP).
s) Furto Qualificado (§4º) – Qualificado (§5º): neste caso, somente há que se
considerada a qualificadora do §5º. A circunstância do §4º deve ser levada
em conta apenas na fixação da pena-base (circunstância judicial).
2. Roubo (artigo 157).
a) Tipo Penal (Art. 157 do CP).
- Núcleo: subtrair
- Elementos Objetivos do Tipo: coisa móvel alheia – grave ameaça –
violência – qualquer meio que reduza à vítima a capacidade de resistência
- Elemento Subjetivo do Tipo: ―para si ou para outrem‖ (finalidade
especial do agente – ânimo de assenhoreamento definitivo da coisa alheia).
(*) Roubo de Uso: inadmissibilidade.
(*) Princípio da insignificância. Impossibilidade.
a.
b) Roubo Próprio e Impróprio. Diferenças. Reconhecem-se duas modalidades
de roubo: o próprio, figura prevista no caput do art. 157, e o impróprio,
disposto no §1º. Ambas recebem a mesma sanção penal, todavia distinguem-
se em relação:
(1) ao momento do emprego da violência ou da grave ameaça. No roubo
próprio, a vis é exercida antes ou durante a subtração, ou seja, é empregada
para que o agente consiga a posse da res. Por outro lado, no roubo impróprio,
a violência (moral ou física) é utilizada logo após a subtração, com o fim de
garantir a impunidade do crime ou a detenção da coisa, isto é, a vis é
utilizada para assegurar a posse da res.
(2) aos meios de cometimento do delito. No roubo próprio, permite-se o
emprego da violência própria (violência e grave ameaça) e da imprópria
(outro meio que impossibilite a vítima de exercer a sua capacidade de
resistência). A seu turno, no roubo impróprio, só se admite a utilização da vis
própria (entendimento dominante).
(3) ao momento consumativo.
(4) à possibilidade de tentativa.
c) Roubo Próprio (Caput)
(1) Meios de Execução.
- Grave ameaça: vis compulsiva.
(*) Obs: simulação de arma; arma de brinquedo; defeituosa ou desmuniciada.
Possibilidade de caracterização, pois há intimidação da vítima.
- Violência: vis absoluta.
(*) Trombada e Arrebatamento de preso: violência contra o objeto: furto;
lesões corporais na vítima: caracteriza roubo.
- Violência imprópria: qualquer outro meio que reduza à impossibilidade a
capacidade de resistência da vítima. Ex: bebida alcoólica, narcóticos e
soníferos.
(*) Diferença para violência presumida.
(2) Consumação. Inversão da posse (teoria da amotio). Consuma-se com a
cessação da violência, subtraída a coisa. Entendimento dominante. (v. RESP
311.088/SP – STJ – ERESP 197.848/DF – STJ – HC 21812/SP – STJ – RESP 237.292/SP –
STJ – RESP 417.974/SP – STJ – RESP 579254/RS -- APR 2000.03.1.002415-2 – TJDF).
Veja que a inversão da posse pressupõe, no roubo, a cessação da
clandestinidade. Assim, por exemplo, se o agente é preso no interior de uma
loja quando ainda ameaça as vítimas, não há que se falar em consumação
do crime.
(*) Posse tranqüila da res, ainda que por pouco tempo (teoria da ablatio).
Entendimento minoritário.
(*) Perda ou deterioração da coisa: há a consumação do delito de roubo.
(3) Tentativa. Possibilidade quando não houver a inversão da posse.
(4) Crime impossível. Diversamente do que ocorre no crime de furto, o
delito de roubo não admite a figura do crime impossível nas hipóteses de
ausência do objeto do crime (v. observações sobre crime impossível
expendidas no delito de furto). Isso porque o delito de roubo é crime
complexo, isto é ―crime que, embora juridicamente uno, apresenta na sua
estrutura como essentialia ou circunstâncias qualificativas, em relação de meio
a fim, fatos vários, que, em si mesmos, constituem crimes. No seu tipo
fundamental, o roubo encerra, fundidos em unidade jurídica, o furto (que é o
crime-fim), o constrangimento ilegal e a lesão corporal leve (ou a
contravenção de vias de fato, que, por sua vez, é absorvida pelo
constrangimento ilegal), chamados crimes famulativos" (Hungria). E, nesses
crimes, consumado o crime-meio, é de se reconhecer a tentativa, sendo
irrelevante a discussão acerca da impropriedade ou não do objeto material
da subtração, para fins de caracterização da tentativa. Nesse sentido: REsp
306.739/DF, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, julgado em
21.10.2003, DJ 15.12.2003 p. 411. Em sentido contrário, admitindo a figura do
crime impossível no roubo, posiciona-se Capez.
d) Roubo Impróprio (§1º).
(1) Momento da grave ameaça ou da violência (logo após a subtração).
Finalidade Especial (elemento subjetivo do tipo) – Assegurar: a detenção da
coisa; ou a impunidade do crime (que não se confunde com impunidade do
agente).
(2) Modos de execução: só violência e grave ameaça. Violência imprópria:
impossibilidade.
(3) Consumação. Com o emprego da violência ou da grave ameaça, que
ocorre, no roubo impróprio, logo após a subtração. Emprego da violência e
não subtração da coisa: consumação? Para o entendimento dominante o
crime está consumado.
(4) Tentativa: é inadmissível, de acordo com o entendimento majoritário.
Ou o agente emprega a violência ou a grave ameaça, consumando o crime
de roubo, ou desiste do seu emprego, configurando o crime de furto
consumado. (v. TJDF - APR 2000.01.1.022291-2; STF - RE 102391/SP; STJ - HC
39.220/RJ, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 28.06.2005, DJ
26.09.2005 p. 414; REsp 46.275/SP, Rel. Ministro Assis Toledo, Quinta Turma,
julgado em 20.02.1995, DJ 20.03.1995 p. 6137).
PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 157, §§ 1º E 2º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL.
ROUBO IMPRÓPRIO MAJORADO. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA.
O crime previsto no art. 157, § 1º, do Código Penal consuma-se no momento
em que, após o agente tornar-se possuidor da coisa, a violência é
empregada, não se admitindo, pois, a tentativa (Precedentes do Pretório
Excelso e desta Corte).
Recurso provido para restabelecer a r. sentença condenatória que
reconheceu a ocorrência do crime de roubo na forma consumada.
(REsp 1025162/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em
11/09/2008, DJe 10/11/2008).
e) Roubo ―Qualificado‖ (§2º) – Na Verdade Roubo Circunstanciado. Trata-se
de causas de aumento de pena e não de tipo qualificado (não há previsão
de pena mínima e máxima para o delito).
- Comunicabilidade da circunstância em concurso de agentes –
possibilidade se ingressou na esfera de conhecimento do outro agente.
- Roubo Qualificado e crime de quadrilha qualificado - possibilidade de
caracterização de ambos os crimes em concurso material (os delitos
consumam-se em momentos distintos). (v. HC 76213/GO – STF)
- Qualificadoras e roubo impróprio: possibilidade.
- Roubo ―duplamente qualificado‖. Predomina o entendimento segundo
o qual deve o juiz considerar uma só delas como causa de aumento de pena,
admitindo as demais como circunstâncias judiciais (art. 59 do CP), na fixação
da pena-base. Assim, por exemplo, se o roubo tiver sido cometido com
emprego de arma e mediante concurso de agentes, o juiz deverá escolher,
em primeiro lugar, qual das circunstâncias (emprego de arma ou concurso de
agentes) utilizará como causa de aumento de pena, lembrando que a causa
escolhida só será aplicada na 3ª fase da aplicação da sanção penal. Em
seguida, considerará as demais causas na fixação da pena-base (1ª fase da
aplicação da pena). Na 2ª fase, o sentenciante aplica as agravantes e
atenuantes genéricas. Por fim, o magistrado aplica a circunstância
inicialmente escolhida, aumentando a pena de um terço até a metade (3ª
fase da aplicação da pena).
Cabe destacar que o STJ sedimentou o entendimento de que o número de
circunstâncias (critério aritmético) não pode, por si só, ser utilizado como
fundamento para o aumento da pena nesta fase. Nesse sentido, o teor da
Súmula 443 do STJ: “O aumento na terceira fase de aplicação da pena no
crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo
suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de
majorantes”.
(1) Emprego de Arma.
- Espécies de Arma: - Própria (fabricada especificamente para o ataque e
para a defesa. Ex: revólver, fuzil, etc.); e - Imprópria (não fabricada para esse
fim, mas que é capaz de ofender a integridade física. Ex: facão, faca de
cozinha, barra de ferro, etc. O emprego de qualquer delas aumenta a pena
do roubo.
- Fundamentos para a qualificadora: (a) Maior poder de intimidação que
reduz a capacidade de resistência da vítima para defender seu patrimônio;
(b) Perigo real que há para a vida da vítima (entendimento majoritário).
(*) Questões:
(a) Arma de brinquedo, desmuniciada, defeituosa. Cancelamento da
Súmula 174 do STJ (No crime de roubo, a intimidação feita com arma de
brinquedo autoriza o aumento da pena). Observância do fundamento: perigo
real para a vida da vítima. (v. STF – HC 70534/RJ – HC 69515/RJ – HC 71051/MG
--- STJ – RESP 442.075/RS – RESP 323.410/SP).
(b) Simulação. Impossibilidade de agravamento da pena.
(c) Manejo da arma e porte ostensivo. Caracterização da ―qualificadora‖,
ainda que o agente não retire a arma da cintura, desde que o porte tenha
sido ostensivo, criando um perigo real para a vida da vítima, como também
lhe embutido um maior poder de intimidação. (v. APR 2000.07.1.004552-5 –
TJDF)
(d) Apreensão da arma – laudo pericial – necessidade – nem sempre. (v.
AGA 410117/MG – STJ --- APR 2001.07.1.015324-5 – TJDF). REsp 870.574/RS, Rel.
Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 06.03.2007, DJ
19.03.2007 p. 392.
―PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. EMPREGO DE ARMA.
APREENSÃO E PERÍCIA. PRESCINDIBILIDADE. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO
LEGAL. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA MAIS GRAVOSO. RÉU PRIMÁRIO.
GRAVIDADE EM ABSTRATO DO DELITO. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. ORDEM
PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. A jurisprudência majoritária da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça
é no sentido da prescindibilidade da apreensão e perícia da arma de fogo
para a caracterização da causa de aumento de pena do crime de roubo (art.
157, § 2º, I, do Código Penal), quando outros elementos comprovem sua
utilização.
2. Nos termos da Súmula 718/STF, "A opinião do julgador sobre a gravidade em
abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de
regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada".
3. A fixação da pena-base no mínimo legal, por serem favoráveis as
circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, com o estabelecimento do
regime inicial fechado para o cumprimento da reprimenda pela prática do
crime de roubo majorado, com base apenas na gravidade genérica do delito,
constitui constrangimento ilegal, por inobservância do disposto no art. 33, § 2º,
alínea b, do Código Penal.
4. Ordem parcialmente concedida para fixar o regime inicial semi-aberto.
(HC 108.451/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado
em 07/10/2008, DJe 03/11/2008).
(*) Nova posição da 6ª Turma do STJ: imprescindibilidade nos casos em que
não é possível aferir a eficácia da arma por outros meios de prova, quando
não há como se apurar a sua lesividade e, portanto, o maior risco para o bem
jurídico integridade física. Confira: HC 59.350/SP, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI,
Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA,
julgado em 24.11.2006, DJ 28.05.2007 p. 402; HC 115.534/SP, Rel. Ministra JANE
SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado
em 16/10/2008, DJe 03/11/2008; HC 102.785/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES,
SEXTA TURMA, julgado em 02/10/2008, DJe 20/10/2008.
(e) Roubo Qualificado e porte ou posse ilegal de arma (art. 14 e 16 da Lei
nº 10.826/2003). O emprego da arma poderá, de acordo com o caso
concreto, configurar o delito de porte ilegal, previsto no art. 14 (arma de fogo
de uso permitido) ou no art. 16 (uso restrito) da Lei nº 10.826/2003. Inclusive, há
concurso material de crimes quando o agente não adquiriu a arma
especificamente para a prática do delito de roubo (fato que absorveria o
crime de porte ilegal de arma – ato preparatório para o crime de roubo), vez
que os delitos se consumaram em momentos distintos atingindo vítimas
diversas. (TJDF - APR 2001.09.1.006595-5).
(f) Concurso de Agentes. Exige-se a participação efetiva de ambos os
agentes para caracterizar a qualificadora (presença in loco)? Não
(entendimento do STF) e sim (STJ). (v. questão relacionada ao furto).
(g) Se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente
conhece tal circunstância. A causa de aumento só incide na presença destes
dois requisitos: - a vítima deve estar em ―serviço de transporte de valores‖, fato
que exclui a causa de aumento quando os valores pertencem à própria vítima
(ex: motorista de táxi); e - o agente deve conhecer tal circunstância.
(h) Se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado
para outro estado ou para o exterior. Dupla consumação.
(i) Se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.
(*) Seqüestro relâmpago: divergência. O roubo, neste caso, é cometido
mediante a restrição da liberdade da vítima. Esta privação deve ser breve e
utilizada apenas para que o agente consiga a subtração. Assim, se a restrição
da liberdade permanecer mesmo após a subtração, ou por tempo superior ao
necessário a obtenção desta, há concurso de crimes, devendo o agente
responder pelo roubo, com a pena aumentada, em concurso material com o
delito de seqüestro (art. 148 do CP) ou mesmo extorsão mediante sequestro
(artigo 159 do CP).
Por outro lado, reconhece-se que a privação, por curto prazo, pode
ser conseqüência natural da própria consolidação da posse sobre a res furtiva
(Moura Teles) e, nesse caso, o agente responderá pelo crime de roubo com a
causa de aumento de pena.
Há precedentes do TJDFT, contudo, que afastam a ocorrência da
majorante quando a restrição se dá por tempo necessário à subtração da res
furtiva.
Aparentemente, a vontade do legislador, ao criar a causa de
aumento de pena, foi alcançar os casos conhecidos como ―seqüestro
relâmpago‖, em que o agente, mediante violência ou grave ameaça, obriga
a vítima a realizar saques em sua conta-corrente.
Bitencourt sustenta que os casos de ―seqüestro relâmpago‖, nos quais
a vítima é colocada em porta-malas de veículos, pelas mãos de marginais
perigosos, que percorrem horas a fio os mais variados bairros da cidade,
exigindo-lhe mais bens ou valores, às vezes violando-a sexualmente, configura
crime mais grave que a simples majorante da restrição da liberdade, sendo o
caso de responsabilizar os agentes pelo crime mais grave, qual seja o de
extorsão mediante seqüestro, restando absorvidas as demais figuras delitivas,
eis que não passam de mero detalhe acidental ou circunstancial do evento.
Ousamos discordar do mestre. A nosso ver, o ―seqüestro relâmpago‖,
entendido como aquele em que o agente, mediante violência ou grave
ameaça, obriga a vítima a realizar saques em sua conta-corrente configura, a
priori, o crime de extorsão (vide observações sobre a diferença entre roubo e
extorsão). Não se pode olvidar, entretanto, que, atualmente, face às
limitações impostas pelos bancos aos saques em terminais eletrônicos, houve
um plus nestas ações criminosas, pois os agentes passaram, também, a subtrair
outros pertences da vítima. Nestas hipóteses, em nosso entendimento, ele
estará cometendo roubo em concurso material com extorsão. Este, inclusive, é
o entendimento atual do STJ, conforme reiteradas decisões (HC 43.989/SP, Rel.
Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 06.12.2005, DJ 19.12.2005 p. 450;
REsp 697.622/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 22.03.2005,
DJ 02.05.2005 p. 404).
Aliás, a situação não se alterou com a Lei nº 11.923/2009, que criou o
chamado ―seqüestro relâmpago‖ (conforme ementa da norma), porquanto o
legislador o inseriu como figura qualificadora do crime de extorsão,
acrescentando o §3º ao art. 158. Ou seja, atualmente, é possível reconhecer o
concurso de crimes na hipótese prevista no parágrafo anterior, respondendo o
agente pelos delitos de roubo e de extorsão qualificada pela restrição de
liberdade (§3º do art. 158).
E é cabível, conforme o caso, que se apliquem tanto a causa de
aumento de pena do crime de roubo, prevista no inciso V do §2º do art. 157,
quanto a qualificadora do §3º do art. 158, se a restrição da liberdade foi
empregada em ambos os delitos.
Por fim, se a restrição da liberdade ocorrer por tempo considerável,
superior ao necessário para a obtenção do objetivo inicial do agente, aí sim
será cabível falar em sequestro ou mesmo extorsão mediante sequestro,
conforme o caso. Esse período considerável, porém, deve ser analisado
detidamente em cada caso. Por certo, trata-se de lapso inferior a 24 horas,
pois este prazo, inclusive, qualifica a extorsão mediante seqüestro, não
podendo servi-la para caracterizá-la.
f) Roubo Qualificado pelo Resultado (§3º).
(1) Resultados Qualificadores: lesão corporal grave ou morte (latrocínio).
(2) Meio de cometimento do crime: violência (vis absoluta) ―se da
violência resulta (...)‖. Mister que a violência tenha sido utilizada para o fim ou
para garantir a subtração. Inexistente essa finalidade (obter ou garantir a
subtração) há concurso de crimes (roubo e o respectivo crime contra a
pessoa).
Grave ameaça ou outro meio? Impossibilidade do reconhecimento. O
agente, neste caso, deve responder por dois crimes: roubo em concurso
formal com homicídio (culposo ou doloso).
(3) Vítimas diversas: permanece o crime na hipótese da vítima patrimonial
ser diferente daquela que sofre as lesões ou a morte (ainda que esta seja de
um dos agentes do crime, no caso de ter sido morto por um comparsa por erro
na execução – aberratio ictus consideram-se as condições da vítima
―virtual‖ – pessoa contra quem era dirigido o ato).
(4) Pluralidade de vítimas e única subtração patrimonial: há um único
delito.
(5) Aplicação das causas de aumento de pena do §2º impossibilidade.
(6) Crime qualificado pela lesão corporal grave
(a) Consumação: com as lesões, ainda que o agente não consiga a
subtração (Súmula 610 do STF).
(b) Crime Preterdoloso possibilidade
(c) Tentativa: inadmissibilidade quando o crime for preterdoloso.
Possibilidade quando o resultado qualificador for auferido por meio de dolo do
agente.
(d) Crime hediondo? Não.
(e) Concurso de pessoas: todas respondem pelo resultado, se o roubo foi
cometido com emprego de arma, pois assumiram, no mínimo, o risco de
produzir o resultado (lesão corporal grave).
(7) Crime qualificado pela morte (latrocínio)
(a) Consumação: com a morte, ainda que o agente não consiga a subtração
(Súmula 610 do STF). Se o agente conseguir a subtração e a vítima não morrer,
há tentativa de latrocínio.
(b) Crime Preterdoloso possibilidade (STJ - HC 20819/MS; HC 27152/MG - Rel.
Min. Félix Fischer, DJ 30.06.2003 p. 279). Ainda assim, é chamado de latrocínio,
conforme doutrina dominante.
(c) Tentativa: inadmissibilidade quando o crime for preterdoloso. Possibilidade
quando o resultado qualificador for auferido por meio de dolo do agente e
não houver a morte da vítima. Não há necessidade de ocorrência de lesão,
sendo suficiente a comprovação de que o agente tinha a intenção de matar
para subtrair. Nesse sentido:
―[..] 1. Para a configuração da tentativa de latrocínio, é irrelevante a
ocorrência de lesão corporal, seja de natureza leve ou grave, sendo suficiente
a comprovação de que o agente tinha a intenção de matar para subtrair
coisa móvel de outrem e de que o delito não se consumou por circunstâncias
alheias à sua vontade.[...]‖ (HC 80.491/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES
LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 23/09/2008, DJe 03/11/2008).
Igualmente: HC 187.075/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado
em 19/04/2012, DJe 30/04/2012. Confira a recente decisão da 6ª Turma do STJ:
HABEAS CORPUS. PENAL. TENTATIVA DE LATROCÍNIO. OCORRÊNCIA.
POSSIBILIDADE. SUBTRAÇÃO CONSUMADA. ANIMUS NECANDI CONFIGURADO.
EVENTO MORTE QUE NÃO SE CONSUMOU POR CIRCUNSTÂNCIAS ALHEIAS À
VONTADE DO AGENTE.
1. Não obstante a existência de eventual posicionamento em sentido
contrário, inclusive do Pretório Excelso, a jurisprudência desta Corte tem
entendimento pacificado no sentido da possibilidade da ocorrência de
latrocínio tentado nas hipóteses em que, configurada a subtração e
demonstrado o animus necandi, o evento morte não se concretizou por
circunstâncias alheias à vontade do agente.
2. Ordem denegada.
(HC 151.920/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em
15/09/2011, DJe 21/11/2011)
O STF, porém, em recentes decisões, não vem admitindo a tentativa de
latrocínio. Nesse sentido: RHC 94775, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira
Turma, julgado em 07/04/2009, DJe-121 DIVULG 30-06-2009 PUBLIC 01-07-2009
EMENT VOL-02367-03 PP-00532; HC 91585, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO,
Segunda Turma, julgado em 16/09/2008, DJe-241 DIVULG 18-12-2008 PUBLIC 19-
12-2008 EMENT VOL-02346-03 PP-00817. No primeiro caso, o STF reconheceu a
ocorrência da figura do crime de roubo qualificado pela lesão grave; no
segundo, crimes autônomos de tentativa de homicídio e roubo, o que reclama
a competência do júri.
- Concurso de crimes ou delito único?
a) Assalto a várias pessoas com mais de uma subtração: no caso de em um só
contexto (bancos, supermercados, etc), o agente vir a subtrair bens de várias
pessoas, haverá tantos crimes, em concurso formal, quantas vítimas forem
lesadas. Nesse sentido: STJ- REsp 723.568/RS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido,
Sexta Turma, julgado em 31.08.2005, DJ 14.11.2005 p. 412; REsp 662.999/RS, Rel.
Ministro Felix Fischer, DJ 21.02.2005 p. 224; REsp 476349/RN, Rel. Ministro Paulo
Medina, Sexta Turma, julgado em 03.06.2003, DJ 04.08.2003 p. 467 – TJDF:
20030910041883APR, Relator Sérgio Bittencourt, 1ª Turma Criminal, julgado em
05/05/2005, DJ 14/09/2005 p. 113; 20020510000870APR, Relator Lecir Manoel da
Luz, 1ª Turma Criminal, julgado em 02/10/2003, DJ 05/11/2003 p. 57;
20010610043629APR, Relator Waldir Leôncio Junior, 1ª Turma Criminal, julgado
em 19/09/2002, DJ 12/02/2003 p. 63. Possibilidade de aplicação do concurso
formal imperfeito, devendo ser as penas somadas? Não para o entendimento
dominante.
b) Assalto a várias pessoas com uma única subtração: segundo Capez, há um
único crime de roubo, pois só houve uma subtração.
c) Ameaça a uma única pessoa que traz consigo bens pertencentes a outras
pessoas: havendo a subtração de todos os bens, entende-se que há crime
único, pois, segundo a doutrina, o que se tutela é a posse. Na verdade, o
agente deve responder por um único crime, pois seu dolo (vontade e
consciência) era subtrair bens pertencentes à vítima. No HC 18321/RJ, o STJ
entendeu haver crime único no roubo cometido contra instituição securitária,
que abriga valores de diversos clientes, em cofres, e não concurso formal, em
virtude de a guarda de valores estar confiada apenas à pessoa jurídica (Rel.
Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 27.11.2001, DJ 25.02.2002 p.
420). Assim, suponha que o sujeito, mediante grave ameaça, exercida com
emprego de arma de fogo, subtraia bens da vítima e de seus patrões que
trazia consigo. Há crime único. Considera-se, que a vítima do crime foi apenas
aquela contra a qual foi exercida a grave ameaça. Para que ocorra o
concurso formal em casos tais é preciso ao menos duas vítimas presentes na
cena do crime. Nesse sentido: 20020810005142APR, Relator Edson Alfredo
Smaniotto, 1ª Turma Criminal, julgado em 29/04/2004, DJ 23/06/2004 p. 56.
d) Subtração dividida: o agente que, no mesmo contexto, ante a
impossibilidade de levar consigo todos os objetos, imobiliza as vítimas,
retornando ao local do crime para terminar a subtração, deve responder por
crime consumado, ainda seja preso antes de conseguir a subtração de todos
os objetos.
e) Roubo e quadrilha: da mesma forma do que ocorre no furto, tem-se
reconhecido a possibilidade de concurso entre o delito de roubo, majorado
pelo concurso de agentes, e o de quadrilha. Afirma-se que o ―delito tipificado
no artigo 288 do Código Penal e aqueloutros que a quadrilha venha a praticar
são autônomos, até porque aquele se aperfeiçoa e é punível
independentemente da prática de crimes subseqüentes da quadrilha, pelos
quais respondem especialmente os seus agentes e, não, o bando todo‖ (HC
31.687/MS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, julgado em
17.02.2005, DJ 25.04.2005 p. 365). Nesse sentido: RHC 14.152/MS, Rel. Ministro
Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, julgado em 03.05.2005, DJ 06.02.2006 p. 310;
HC 29.400/RJ, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 15.09.2005, DJ
10.10.2005 p. 398. O STF possui o mesmo entendimento, admitindo a
possibilidade de concurso entre os referidos delitos: HC 84669/SP, Rel. Min.
Joaquim Barbosa, DJ 17-06-2005 p. 007; HC 76.213, Rel. Min. Sepúlveda
Pertence, DJ 14.04.1998.
Contudo, há decisões em contrário, no sentido da impossibilidade de
cumulação: STF - HC 65717/SP – Rel. Min. Octavio Gallotti - DJ 24-06-1988 p.-
16113.
f) No crime de latrocínio, havendo uma única subtração patrimonial, com dois
resultados qualificadores (morte), há concurso formal impróprio (artigo 70,
parte final, do Código Penal). Nesse sentido: STJ - HC 33.618/SP, Rel. Ministro
Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, julgado em 31.05.2005, DJ 06.02.2006 p.
333); STF - RE 103094/PR – Rel. Min. Djalci Falcão - DJ 15-04-1988 PP-08400. Há
outra decisão do STJ nesse sentido, confira:
―[...] 1. Na esteira da já consolidada jurisprudência desta Corte Superior, no
caso de latrocínio (artigo 157, parágrafo 3º, parte final, do Código Penal), uma
única subtração patrimonial, com dois resultados morte, caracteriza concurso
formal impróprio (artigo 70, parte final, do Código Penal). Precedentes. [...] (HC
56.961/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 18/12/2007,
DJ 07/02/2008 p. 1)‖.
Em recente decisão, o STJ reafirmou este entendimento. Confira:
RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE ROUBO
CIRCUNSTANCIADO E DE LATROCÍNIO. VERBETE SUMULAR N.º 284 DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. CONCURSO FORMAL IMPRÓPRIO QUANTO AOS CRIMES DO
ART. 157, § 3.º, IN FINE, DO CÓDIGO PENAL. CONSTATADO PELAS INSTÂNCIAS
ORDINÁRIAS QUE OS CRIMES RESULTARAM DE DESÍGNIOS AUTÔNOMOS.
OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO ENTRE A DENÚNCIA E A
SENTENÇA. RECONHECIMENTO DE PESSOAS. LEGALIDADE. ELEVAÇÃO DA PENA-
BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. POSSIBILIDADE, SE AS CIRCUNSTÂNCIAS
JUDICIAIS DO CRIME EXTRAPOLAM CONSIDERAVELMENTE AS NORMAIS À
ESPÉCIE. PLEITO DE DIMINUIÇÃO DA PENA-BASE DE WENDER SANTOS SANTANA.
AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E,
NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
[...]
2. Aplica-se o concurso formal impróprio entre os delitos de latrocínio (artigo
70, parte final, do Código Penal), pois ocorreram dois resultados morte, ainda
que apenas uma subtração patrimonial tenha sido efetivada. Na hipótese em
exame, restou comprovado que os Agentes não se voltaram apenas contra
um patrimônio, mas que, ao contrário, os crimes resultaram de desígnios
autônomos.
3. Com efeito, as instâncias ordinárias, após o cotejo minucioso das provas
produzidas ao longo da instrução criminal, decidiram que os Réus desejavam
"praticar mais de um latrocínio, tendo em cada um deles consciência e
vontade, quando efetuaram os disparos contra as vítimas".
[...]
(REsp 1164953/MT, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em
27/03/2012, DJe 03/04/2012)
Todavia, há decisões do STJ em sentido contrário, considerando que nos casos
de uma única subtração patrimonial com dois ou mais resultados
qualificadores (morte) há crime único de latrocínio, devendo os homicídios
serem considerados como circunstância judicial para aumentar a pena-base.
Nesse sentido:
―[...] 2. A morte de mais de uma pessoa com a subtração de um só patrimônio,
ao tempo que caracteriza o latrocínio como crime único, autoriza a fixação
da pena-base acima do mínimo legal, porquanto desfavoráveis as
circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal (consequências do crime).
3. Ordem denegada. (HC 91.231/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA,
QUINTA TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 03/08/2009)‖.
―[...] 1. Relativamente às matérias comuns a ambos os réus, e de caráter não
pessoal, como é o caso do reconhecimento da unidade do crime de
latrocínio, quando, mesmo sendo diversas as vítimas, for atingido um único
patrimônio, há de ser estendida a mesma solução ao co-réu.[...]‖ (HC
88.200/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado
em 02/09/2008, DJe 22/09/2008).
Na verdade, deve ser analisado o caso concreto. Assim, se o agente praticou
a conduta visando a ofender mais de um patrimônio, o caso é de se
considerar o concurso de crimes. No entanto, se a intenção era lesar apenas
um patrimônio (ex: roubo a um banco, resultando morte de dois seguranças),
há crime único de latrocínio.
g) No crime de latrocínio, havendo uma única morte e várias subtrações
patrimoniais: há concurso entre o latrocínio e os respectivos roubos em
concurso formal.
h) Roubo e latrocínio: impossibilidade de reconhecimento de continuidade
delitiva, pois não se tratam de crimes da mesma espécie. Assim, deve ser
reconhecido o concurso material de crimes. Nesse sentido: AgRg no REsp
961.928/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA,
julgado em 08/02/2011, DJe 28/02/2011; HC 161.595/RJ, Rel. Ministro VASCO
DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), SEXTA TURMA,
julgado em 13/03/2012, DJe 26/03/2012. Mas, em recente decisão, o STJ
reconheceu o concurso formal, quando, em um mesmo contexto fático e
circunstancial, por meio de uma única ação, abordou vítimas distintas,
atingindo-lhes os patrimônios material e emocional (HC 192.927/SP, Rel. Ministro
MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 15/03/2012, DJe
23/04/2012).
(d) Crime hediondo? Sim.
(*) v. art. 9º da Lei nº 8.072/90: acréscimo de metade da pena, quando a
vítima estiver em uma das situações do art. 224 do CP. Trata-se de majorante
revogada com o advento da Lei nº 12.015/2009.
(e) Concurso de pessoas: todos respondem pelo resultado, se o roubo foi
cometido com emprego de arma, pois assumiram, no mínimo, o risco de
produzir o resultado (morte). É a posição do STJ: HC 35895/DF, Rel. Ministro Felix
Fischer, Quinta Turma, julgado em 02.09.2004, DJ 04.10.2004 p. 334; REsp
418.183/DF, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 03.06.2003, DJ
04.08.2003 p. 362; HC 31.169/SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma,
julgado em 16.12.2004, DJ 06.02.2006 p. 330.
3. Extorsão (artigo 158).
b.
a) Tipo Penal (art. 158).
- Meios de Execução: (1) Violência; (2) Grave ameaça (aquela que
efetivamente é idônea e necessária à intimidação da vítima). A vítima que
serve como parâmetro para aferir se a ameaça é grave, e não o homem
médio como dizem alguns doutrinadores.
(*) Violência imprópria? Não há previsão.
(*) Ameaça de divulgação de fato difamatório à honra da vítima
(chantagem): caracteriza a grave ameaça. Igualmente, a ameaça de
divulgação de segredo e de delação à polícia.
- Finalidade Especial: vantagem econômica e indevida.
(*) Vantagem devida: configura o crime de exercício arbitrário das próprias
razões, sem prejuízo do crime relacionado à pessoa (lesão corporal ou
homicídio).
(*) Vantagem não econômica: configura o delito de constrangimento
ilegal.
- Conduta: é dirigia a obrigar a vítima a: - fazer (ação); - não fazer
(omissão); ou – tolerar que se faça (permissão).
b) Consumação. Configura-se o delito de extorsão quando realizados os
elementos do tipo penal respectivo que, na lição de Hungria são "(...) a)
emprego de violência física ou moral (grave ameaça); b) coação, daí
resultante, a fazer, tolerar ou omitir alguma coisa; c) intenção de obter, para si
ou para outrem, indevida vantagem econômica" (Nelson Hungria,
Comentários ao Código Penal, Vol. VIII, Editora Forense, 3º Edição),
independentemente da obtenção da vantagem. Súmula 96 do STJ.
Simulação de seqüestro (v. RESP 303792/RS, STJ). Configura extorsão.
c) Tentativa. Possibilidade. Quando a grave ameaça (nesse caso escrita) não
chegar ao conhecimento da vítima; ou quando a vítima não se intimidar com
a grave ameaça ou violência, não conseguindo o agente que aquela faça,
deixe de fazer ou tolere que se faça alguma coisa.
d) Formas Típicas. (1) Simples (caput); (2) Causa de Aumento (§ 1º); (3)
Qualificada (§2º) – resultado lesão grave ou morte; (§3º) Qualificada pela
Restrição da Liberdade (§3º) – Lei nº 11.923/2209.
(*) Crime hediondo? Só a forma qualificada com o resultado morte (lesão
grave não). Por equívoco do legislador, a figura inserida no §3º, pela Lei nº
11.923/2009, não pode ser considerada como crime hediondo.
e) Distinções
(1) Extorsão e concussão: emprego de violência ou grave ameaça só
existe na extorsão, sendo ausente na concussão. Logo, o funcionário público
que, empregando violência ou grave ameaça, em razão de sua função exige
vantagem indevida, pratica o crime de extorsão (pena maior) e não o de
concussão (art.316 do CP).
(2) Extorsão e constrangimento ilegal: a vantagem buscada no
constrangimento ilegal não é econômica.
(3) Extorsão e Exercício arbitrário das próprias razões: neste, a vantagem
almejada pelo agente é devida.
(4) Extorsão e Roubo: existem 3 critérios: (a) a diferença consiste em que, na
extorsão, a vítima entrega o bem ao agente, enquanto que, no roubo, o bem
é subtraído (Nelson Hungria); (b) a diferença consiste em que, na extorsão, o
mal prometido e a vantagem são futuros, enquanto que, no roubo, são
contemporâneos; (c) a diferença está no comportamento da vítima: na
extorsão, é imprescindível a atuação da vítima (ex: fornecimento da senha
para saques em conta-corrente); no roubo, não (ex: subtração de bolsa).
(*) Seqüestro relâmpago: em princípio, só havendo saques na conta-corrente
configura extorsão.
(*) Concurso material entre roubo e extorsão: possibilidade.
4. Extorsão Mediante Sequestro (artigo 159).
c. a) Tipo Penal Fundamental
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
- Natureza da vantagem. Expressão ―qualquer vantagem‖. Econômica? Caso
concreto: STJ: REsp 9922/PB, Rel. Ministro Adhemar Maciel, Sexta Turma,
julgado em 15.03.1993, DJ 17.05.1993 p. 9363. Vítima sequestrada e morta no
caso de ―queima de arquivo‖.
- Sujeito passivo. Vítimas sequestrada e patrimonial.
- Meio de cometimento. Cárcere privado?
c) Momento da Consumação do Delito.
d) Tentativa
e) Formas Qualificadas
e.1) Qualificadoras do §1º
- Contagem do prazo de 24 horas: da privação da liberdade ou da exigência
da vantagem?
- Diferença para o lapso majorante do sequestro (art. 148, §1º, III, CP).
- Idade da vítima: menor de 18 anos ou maior de 60 anos de idade. Vítima
menor de 14 anos. Momento de aferição da idade: arrebatamento.
Impossibilidade de aplicação da causa do artigo 9º da Lei nº 8.072/90.
- Sequestro cometido por bando ou quadrilha. Bis in idem?
e.2) Qualificadoras dos §§2º e 3º
- Resultados qualificadores: lesão grave ou morte. Possibilidade de
reconhecimento a título de dolo ou culpa.
- Resultados advindos dos maus-tratos. Possibilidade, pois a lei não exigiu que
decorressem apenas da violência.
- Vítima: só a sequestrada. Caso contrário: concurso de crimes.
f) Delação Premiada (§4º)
5. Extorsão Indireta (Art. 160)
d. a) Tipo Penal
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
- Exigência. Ausência de violência e grave ameaça.
- Abuso da situação de necessidade do devedor.
c) Momento da Consumação do Delito e Tentativa
d) Instauração do Procedimento Criminal. Possibilidade de concurso com o
crime de denunciação caluniosa? Divergência.
e) Crime de Usura (art. 4º da Lei nº 1.521/51). Absorção.
6. Apropriação Indébita (Art. 168)
e. a) Tipo Penal Fundamental
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
- Diferença para furto e estelionato.
- Animus rem sibi hadendi. Apropriação indébita de uso: conduta atípica.
- Coisa imóvel. Não pode ser objeto destes crimes, podendo o agente
responder pelo crime de estelionato, na modalidade de disposição de coisa
alheia como própria (art. 171, §2º, I, CP).
c) Espécies de Apropriação Indébita
- Apropriação indébita propriamente dita e por negativa de restituição.
d) Consumação e Tentativa
- De acordo com a espécie de apropriação.
e) Apropriação Indébita ―Qualificada‖.
f) Apropriação Indébita Privilegiada.
7. Apropriação Indébita Previdenciária (Art. 168-A)
f. a) Tipo Penal Fundamental
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
- Antigo artigo 95 da Lei nº 8.212/91. Princípio da Continuidade Normativa
Típica.
- Conduta mista. O agente primeiro recolhe a contribuição do contribuinte
(ação) para, na seqüência, deixar de repassá-la à previdência (omissão).
- Animus rem sibi habendi. Prevalece a orientação que é irrelevante a
destinação que o sujeito tenha dado às contribuições não repassadas à
previdência social, ou mesmo o dolo específico do agente em fraudar a
previdência social, pois o que se exige é o não repasse daqueles tributos no
prazo legal. Nesse sentido, é o entendimento do STJ (REsp 1194510/SP, Rel.
Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, Dje 01/02/2011; REsp 510.742/RS, Rel. Ministro
Hélio Quaglia Barbosa, Sexta Turma, julgado em 09.12.2005, DJ 13.02.2006 p.
855; RHC 17.354/SP, Rel. Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, julgado em
18.10.2005, DJ 21.11.2005 p. 297; REsp 714.327/RJ, Rel. Ministro Felix Fischer,
Quinta Turma, julgado em 02.06.2005, DJ 01.08.2005 p. 544; RESP 501935 / PR –
Rel. Min. Laurita Vaz – DJ 30.08.2004 Pg 00319; RESP 309970/AL – Rel. Min. Gilson
Dipp – DJ 28.06.2004 Pg 00382; ERESP 331982/CE – Rel. Min. Gilson Dipp – DJ
15.12.2003 Pg 00179) e do STF (HC 87107/SP – Rel. Min. Cezar Peluso – julgado
em 02/06/2009).
(*) Corrente contrária: necessidade do elemento subjetivo. Confira: STJ – AgRg
no REsp 1041306/CE – Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 31/08/2011).
- Princípio da insignificância: o STF não tem admitido a aplicação do princípio
neste delito. Confira: STF: HC 98021/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
22.6.2010; HC 102550/PR, rel. Min. Luiz Fux, 20.9.2011. Contudo, o STJ vem
reconhecendo a possibilidade de aplicação deste princípio no crime em
questão, levando em conta o mesmo parâmetro utilizado no delito de
descaminho, correspondente ao quantum que a Fazenda Nacional não
executa (R$ 10.000,00 – artigo 20 da Lei 10.522/2002). Confira: HC 195.372/SP,
Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 12/06/2012, DJe 18/06/2012;
AgRg no REsp 1214866/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em
07/02/2012, DJe 22/02/2012. Isso em razão da Lei nº 11.457/2007, que passou a
considerar os débitos decorrentes de contribuições previdenciárias como
dívida ativa da União.
c) Condutas Assemelhadas (§1º)
d) Consumação e Tentativa
- O STF, entretanto, passou a entender ser o delito em exame omissivo material,
exigindo para a consumação do crime a quantificação do prejuízo. Assim,
enquanto não decidido, na via administrativa, o valor do débito não há que
se falar em consumação, inviabilizando tanto a propositura da ação penal
quanto a manutenção do inquérito. Nesse sentido: Inq 2537 – Rel. Min. Marco
Aurélio – Informativo nº 498. O STJ seguiu este mesmo entendimento: Rcl
5.064/BA, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em
23/05/2012, DJe 01/06/2012; HC 170.459/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia
Filho, Quinta Turma, julgado em 02/12/2010, DJe 13/12/2010.
- É inadmissível a tentativa.
e) Estado de Necessidade e Inexigibilidade de Conduta Diversa
g) Causa de Extinção de Punibilidade (§2º do artigo 168-A – atualmente
inaplicável).
- Pagamento do tributo e parcelamento do débito: extinção da punibilidade e
suspensão da pretensão punitiva. Artigo 9º da Lei 10.684/2003 – artigos 68 e 69
da 11.941/2009 - artigo 83 da Lei 9.430/95 (redação dada pela Lei
12.350/2010).
h) Perdão Judicial ou Multa (§3º)
8. Estelionato (Art. 171)
g. a) Tipo Penal Fundamental
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
- Significado de ―stellio‖: camaleão.
- Fraude: são espécies o artifício e o ardil.
- Idoneidade da fraude: necessidade, sob pena de crime impossível.
- Fraude bilateral: caracterização do crime.
- Natureza da vantagem: deve ser indevida. Patrimonial? Divergência.
- Falsificação como meio para o estelionato: é comum que o agente se valha
de uma falsificação como meio de cometimento do crime de estelionato.
Nestes casos, há relevante divergência, se o agente responderia por ambos os
delitos, falsificação e estelionato, em concurso, ou por apenas um deles. Na
verdade, podem-se apontar as seguintes correntes: a) a falsidade de
documento público (art. 297 do CP) absorve o estelionato, por ser mais grave
do que este (RT 581/312); b) o estelionato absorve o falso, quando este se
exaurir com a prática daquele (é a posição expressa na Súmula 17 do STJ); a
contrario sensu, admite-se o concurso de crimes, se a falsificação permanecer
potencialmente idônea para a prática de outros delitos (Mirabete). Neste
sentido: CC 107.100/RJ, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em
26/05/2010, DJe 01/06/2010; HC 45.900/SC, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta
Turma, julgado em 11.10.2005, DJ 28.11.2005 p. 323; HC 146.521/SP, Rel. Ministra
Maria Thereza De Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 15/04/2010, DJe
07/06/2010; HC 125.331/MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Rel. p/ Acórdão Ministro
Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 09/02/2010, DJe 08/03/2010; HC
24.059/SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, julgado em
27.05.2003, DJ 12.08.2003 p. 261; c) há concurso formal de crimes (é a posição
atual do STF – RT 737/545; 735/532; 582/399; RHC 83990/MG, Rel. Min. Eros Grau,
DJ 22-10-2004 p. 018; HC 73386/RJ, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ 13-09-1996 p.
33232); d) há concurso material (era o entendimento anterior do STF – RTJ
85/491).
(*) A solução dependerá do caso concreto.
- Sujeito passivo: é imprescindível que o enganado tenha capacidade de
discernimento. Assim, se a fraude for empregada contra menor ou contra débil
mental, restará configurado o crime de abuso de incapazes (art. 173), delito
mais grave do que o estelionato, ante a maior reprovação social da conduta
do agente neste caso.
c) Consumação e Tentativa
d) Estelionato Privilegiado (§1º)
e) Reparação do Dano no Estelionato
- Artigo 16 do CP.
- Súmula 554 do STF.
f) Figuras Assemelhadas ao Estelionato (§2º)
g) Estelionato ―Qualificado‖ (§3º)
9. Receptação.
a) Tipo Penal (art. 180).
- Modalidades: receptação própria e imprópria.
- Sujeito ativo: sujeito ativo do crime é qualquer pessoa, com exceção da
que praticou o delito anterior, regra que vale tanto para a receptação própria
como para a imprópria.
- receptação em cadeia (―receptação da receptação‖): possibilidade.
- receptação de coisas objetos de diversos crimes: - Em momento único:
apenas uma receptação; - Em mais de um momento: receptação
continuada.
- Receptação e Favorecimento Real (art. 349): na receptação, o agente
tem a intenção de lucrar (animus lucrandi). No crime de favorecimento real,
inexiste esta intenção do agente, que apenas deseja auxiliar o criminoso.
b) Receptação Própria
- Condutas: adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar.
- Objeto do delito: coisa (móvel ou imóvel) proveniente de crime (exclui a
contravenção).
(*) Há ponderável corrente doutrinária (Hungria, Noronha, Damásio,
Bitencourt, Capez, Moura Teles, Nucci, entre outros) e jurisprudencial (STF – RTJ
97/148, 102/48; RT 546/413, 554/425) no sentido de que somente as coisas
móveis podem ser objeto do delito em questão, pois só estas (e não as
imóveis) podem provir de crime anterior. Além disso, o termo ―receptáculo‖,
do qual provém o tipo receptação, significa abrigo, esconderijo, e somente as
coisas móveis podem ser ocultadas. Por fim, a conduta descrita no tipo penal
pressupõe o deslocamento da coisa, o que exclui, por questão lógica, os bens
imóveis.
No entanto, há de se lembrar que o CP, diversamente do que fez com outros
delitos (furto e apropriação indébita, por exemplo), não se referiu
exclusivamente à coisa móvel, o que, à evidência, indica não ter sido à
vontade do legislador excluir, de plano, os bens imóveis do delito em tela.
É certo que nas modalidades ―conduzir‖, ―transportar‖ e ―ocultar‖ faz-se
necessário o deslocamento da coisa, mas nas demais (―adquirir‖ e ―receber‖)
não há motivo para impor este requisito à consumação do delito.
- Dolo do agente: exige-se que o agente saiba (dolo direto) que a coisa
é proveniente de crime e que a utilize em proveito próprio ou alheio.
(*) A má-fé (conhecimento da procedência criminosa da coisa) do adquirente
ou recebedor deve ser aferida no momento em que a coisa é adquirida ou
recebida. No entanto, caso o agente venha saber que a coisa é proveniente
de crime somente após a aquisição (recebimento) e mesmo assim continuar
com ela estará cometendo o delito de receptação própria, na modalidade
―ocultar‖. Nesta situação, podem surgir as seguintes hipóteses: (1) o agente
dispõe da coisa antes de saber que ela é proveniente de crime: não comete
nenhum crime; (2) o agente dispõe da coisa após conhecer que ela é
proveniente de crime: comete, em tese, o crime de estelionato, na
modalidade disposição de coisa alheia como própria (art. 171, §2º, I, CP); (3) o
agente oculta a coisa após saber que a coisa é proveniente de crime:
comete o crime de receptação por ocultar coisa que sabe ser proveniente de
delito.
- Consumação: com a tradição da res.
- Tentativa: possibilidade.
c) Receptação Imprópria.
- Condutas: influir que 3º de boa-fé adquira, receba ou oculte a coisa.
- Objeto do delito: coisa (móvel ou imóvel) proveniente de crime (exclui a
contravenção)
- Dolo do agente: exige-se que o agente saiba (dolo direto) que a coisa
é proveniente de crime e que o 3º adquirente, receptor ou ocultador esteja de
boa-fé.
(*) Se estiver de má-fé (sabendo que a coisa é proveniente de delito), o 3º
deve responder pelo crime de receptação própria (como autor), enquanto
que o agente influenciador responderá pela receptação própria a título de
participação (induzir, instigar ou prestar auxílio).
(*) O fato de o agente influir 3º de boa-fé a ―transportar‖ ou ―conduzir‖ coisa
que sabe ser produto de crime não configura o delito de receptação
imprópria, eis que tais condutas não foram incluídas no tipo penal.
- Consumação: com a o ato de influir, não sendo necessário que o
terceiro de boa-fé adquira, receba ou oculte a coisa.
- Tentativa: inadmissibilidade.
d) Delito Anterior: exige-se prova do delito anterior (boletim de ocorrência, por
exemplo), sem que seja necessária a condenação por esse delito. Nesse
sentido, dispõe o §4º do art. 180 do CP.
e) Receptação ―Qualificada‖ – na verdade, trata-se de um tipo autônomo,
pois amplia as condutas descritas no caput, incluindo os núcleos ―ter em
depósito‖, ―desmontar‖, ―montar‖, ―remontar‖, ―vender‖, ―expor à venda‖.
- Tipo penal.
- Crime próprio: trata-se de um crime próprio que só pode ser cometido
por comerciante (no exercício de sua profissão) ou equiparado na forma do
§2º do art. 180 do CP.
- Elemento subjetivo do tipo. Na receptação própria e na imprópria,
definidas no caput do art. 180, o agente sabe que a coisa é produto de crime.
Na receptação qualificada (§1º), o agente adquire (recebe, etc.) a coisa que
deve saber ser produto de crime. Parte da doutrina (Hungria) entende que o
termo sabe indica certeza, constituindo o dolo direto do agente. Já o termo
deve saber significa incerteza, referindo-se ao dolo eventual. Na verdade, os
termos sabe e deve saber são elementos do tipo penal, indicando o primeiro a
certeza do agente, enquanto o segundo a incerteza.
Damásio entende que o comerciante que sabe ser a coisa proveniente de
delito deve responder pelo tipo penal do caput, vez que o §1º (receptação
qualificada) só previu a conduta daquele que deve saber. Nesse mesmo
sentido, afirma o mestre que, caso o comerciante (ou equiparado), no
exercício de sua função, venha a adquirir (receber, etc.) coisa que deve saber
ser proveniente de crime, deverá responder pelo tipo do §1º, utilizando-se, no
entanto, a pena do caput, em obediência ao princípio da individualização da
pena.
Porém, a posição que tem prevalecido nos tribunais é a de que o §1º, ao
dispor a conduta daquele que deve saber (dolo eventual), também previu a
do agente que sabe (dolo direto). Neste caso, apenas se faz uma
interpretação declarativa e não extensiva.
f) Receptação Culposa (§3º)
- Indícios – a culpa está expressa no termo devia presumir-se, manifestando-se
quando: a natureza da coisa (ex: relógio rolex marcado com nome de 3ª
pessoa); a desproporção entre o valor e o preço da coisa (o preço deve ser
vil); a condição de quem oferece a coisa evidenciarem ser produto de
crime.
- Tipo fechado: em regra o tipo culposo é aberto, ou seja, o legislador não
descreve a conduta que o configura (ex: homicídio culposo: ―se o homicídio é
culposo‖). Porém, no caso de receptação culposa, o tipo é fechado, pois o
Código Penal enumera as condutas do receptador culposo. Assim, a culpa se
manifesta quando o agente, tendo em vista a natureza, a desproporção
entre o valor e o preço da coisa ou a qualidade de quem a oferece, devia
presumir ser ela proveniente de um crime. Se o agente sabe ou deve saber
que a coisa é proveniente de delito, o crime é de receptação dolosa.
g) Receptação Privilegiada (§5º).
- Receptação culposa: o juiz deve aplicar o perdão judicial se as
circunstâncias forem favoráveis ao agente.
- Receptação dolosa: se a coisa é de pequeno valor (no máximo, 1 salário
mínimo) e o agente é primário (não reincidente, ainda que de maus
antecedentes), o juiz deve: substituir a pena de reclusão por detenção;
diminuí-la de um a dois terços; ou aplicar somente a pena de multa.
h) Causa de Aumento de Pena (§6º).
10. Disposições Gerais dos Crimes contra o Patrimônio – Arts. 181 A 183.
a) Imunidade Penal Absoluta (Art. 181). Trata-se de escusa penal absolutória,
por meio da qual o Estado, mesmo diante de um fato típico, antijurídico e
culpável, deixa de aplicar a pena, por razões de política criminal. Estas
escusas absolutórias possuem a mesma natureza jurídica das causas de
extinção da punibilidade, tendo o condão de impedir a instauração de
inquérito policial ou mesmo a propositura de ação penal.
- Casos: crimes contra o patrimônio cometidos contra: (1) cônjuge, na
constância da sociedade conjugal: ainda que exista separação de fato (e
não a judicial ou a medida cautelar de separação de corpos) subsiste a
imunidade absoluta. De igual modo, esta escusa penal absolutória é conferida
ao companheiro (a), na constância da união estável. (2) ascendente ou
descendente.
- Inaplicabilidade da imunidade absoluta: quando o crime contra o patrimônio
for de roubo ou extorsão (inclusive a indireta, de acordo com o entendimento
dominante), ou cometido com violência ou grave ameaça a pessoa. Além
disso, a imunidade não se estende a terceiro que tenha praticado o delito em
concurso com o beneficiado, ou quando a vítima for maior de 60 anos. É o
que determina o art. 183 do CP.
b) Imunidade Penal Relativa (Art. 182).
- Conseqüência: o delito passa a ser sujeito à ação penal pública
condicionada à representação.
- Casos: crimes contra o patrimônio cometidos contra: (1) cônjuge separado
judicialmente (desquitado); (2) irmão; (3) tio ou sobrinho, com que o agente
coabita.
- Inaplicabilidade da imunidade relativa: idem à imunidade absoluta.
V- Dos Crimes contra a Administração Pública
No Título XI da Parte Especial, o CP dispõe acerca dos crimes
contra a administração pública. Referido título é, atualmente, depois das
alterações promovidas pelas Leis n° 10.028/2000 e 10.467/2002, composto por
cinco capítulos, quais sejam.
Capítulo I – Dos crimes praticados por funcionários públicos
contra a administração em geral (artigos 312 a 327);
Capítulo II – Dos crimes praticados por particular contra a
administração em geral (artigos 328 a 337-A);
Capítulo II-A (acrescentado pela Lei n° 10.467/2002) – Dos
crimes praticados por particular contra a administração pública estrangeira
(artigos 337-B a 337-D);
Capítulo III – Dos crimes contra a administração da justiça
(artigos 338 a 359); e
Capítulo IV (acrescentado pela Lei n° 10.028/2000) – Dos
crimes contra as finanças públicas.
O termo administração pública é utilizado pelo CP no sentido
de proteção ao interesse da normalidade funcional, probidade, prestígio,
incolumidade e decoro (Hungria). Atinge, desse modo, não só as atividades
do Poder Executivo, como também a dos demais poderes constituídos.
Os crimes podem ser cometidos por funcionários públicos e por
particulares.
O conceito de funcionário público é aquele conferido pelo art.
327 do CP. Trata-se de definição bem mais ampla do que a apresentada pelo
Direito Administrativo, que emprega, atualmente, a denominação ―servidor
público‖. Isso porque, para fins penais, é o bastante o exercício de uma
função de natureza e interesse público.
Com efeito, estende-se a qualidade a todas as pessoas que
exerçam qualquer atividade com fins próprios do Estado, ainda que estranhas
à administração pública, com ou sem remuneração (Mirabete). Na lição de
Hungria, ―não é propriamente a qualidade de funcionário público que
caracteriza o crime funcional, mas o fato de que é praticado por quem se
acha no exercício de função pública, seja esta permanente ou temporária,
remunerada ou gratuita, exercida profissionalmente ou não, efetiva ou
interinamente, ou per accidens (ex.: o jurado, a cujo respeito achou de ser
expresso o art. 438 do Código de Processo Penal; o depositário nomeado pelo
juiz, etc.)‖.
Cumpre transcrever o referido dispositivo:
Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem,
embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou
função pública.
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou
função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora
de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da
Administração Pública.
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes
previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de
função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta,
sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo
poder público.
O caput alcança inclusive os que exercem cargo, emprego ou
função de caráter transitório ou sem remuneração (jurado, depositário judicial,
etc). Refere-se aos agentes que desempenhem cargo, emprego ou função na
administração direta (ministérios, secretarias, etc) e indireta (autarquias,
fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas),
pois, para fins criminais, não há a divisão da administração pública nestes
ramos.
Originariamente, a primeira parte do §1° (funcionário público
por equiparação) constava no parágrafo único do art. 327, sendo
posteriormente renumerado pela Lei n° 6.799/1980 que inseriu ainda o atual
§2°, que contém uma causa de aumento de pena. A Lei n° 9.983/2000, por sua
vez, alterou a redação do §1° para incluir a atual segunda parte do
dispositivo.
A despeito da clareza da redação, há grande divergência na
doutrina em relação à norma do art. 327 do CP. Há quem entenda que os
empregados das entidades paraestatais não são considerados como
funcionários públicos para efeitos penais, tendo em vista o fato de tais entes
não desempenharem funções próprias do Estado. O entendimento, porém, só
subsiste de lege ferenda.
Outros aduzem que, em relação aos entes previstos no §2°,
somente os dirigentes (ocupantes de cargos em comissão ou de função de
direção ou assessoramento) são considerados funcionários públicos para os
efeitos penais. Tal posição, com a devida vênia, contrasta com a orientação
ampliativa da expressão funcionário público, utilizada pelo Direito Penal.
De fato, a norma não deixa dúvidas: são funcionários públicos,
para efeitos penais, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade da
administração direta ou indireta, bem como em entes paraestatais, mesmo
que transitoriamente ou sem remuneração. Se o delito for cometido por
ocupante de cargo em comissão ou de função de direção ou assessoramento
de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa
pública ou fundação instituída pelo poder público, sobre a pena incidirá o
aumento de um terço. Porém ante a ausência de previsão legal, os dirigentes
de autarquias não sofrerão a incidência da majorante do §2°.
Além disso, por força da parte final do §1°, também é
funcionário público quem trabalha para empresa prestadora de serviço
contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da
Administração Pública, como serviço de iluminação, saúde, transporte,
segurança pública, energia elétrica, etc. Como afirma Damásio, a norma não
alcança a contratos e convênios firmados sem a finalidade de exercício de
atividades típica da a Administração, o que exclui os funcionários de empresas
contratadas para a execução de obras ou serviços de interesse da própria
Administração Pública, como a construção, reforma ou mesmo limpeza de um
edifício público.
Não são funcionários públicos para efeitos penais as pessoas
que exercem um munus público, em casos nos quais prevalece um interesse
privado, e que não se confundem com função pública. São as hipóteses do
tutor, curador, inventariante e depositário judicial, síndico e liquidatário, entre
outras.
Divergem-se, ainda, doutrina e jurisprudência acerca da
seguinte questão: o conceito do art. 327 só se aplica aos crimes previstos no
Capítulo I ou também aos delitos previstos no Capítulo II? Ou seja, somente se
adota o conceito do art. 327 quando o ―funcionário público‖ for sujeito ativo
do delito, ou também se ele for vítima da ação delituosa? Assim, por exemplo,
questiona-se se o desacato cometido contra funcionário público por
equiparação constitui o delito do art. 331 do CP?
Há ponderável corrente doutrinária (Hungria, Noronha, Capez,
Moura Teles) e jurisprudencial (JSTJ 8/244; RT 483/312; 378/181; 409/70; 606/449)
no sentido de que a equiparação ocorre apenas com relação ao sujeito ativo
do crime, fundamentando-se na disposição topográfica do art. 327, inserido
no Capítulo I, que trata dos crimes cometidos por funcionário público contra a
administração.
Acredita-se, no entanto, que a razão está com Fragoso e
Mirabete, para o qual ―referindo-se a lei genericamente a ‗efeitos penais‘, não
há porque se excluir do conceito de sujeito passivo do crime aqueles que a lei
equipara ao funcionário público como agente do delito (RT 655/324), máxime
quando se admite como vítima de crimes praticados contra funcionários
públicos, aqueles que não o são no sentido estrito‖. Este é, inclusive, o
entendimento do STF (RT 788/526; 606/449; HC 79.823-RJ, Informativo n° 183).
Cumpre registrar, ademais, que é pacífica a orientação de
que o conceito do art. 327 do CP é aplicado a outros tipos previsto na
legislação penal brasileira. A divergência, portanto, restringe-se aos crimes do
Capítulo II.
Doutrinariamente, denomina-se crime funcional o que
somente pode ser cometido por funcionário público, tratando-se de delito
próprio. São, por exemplo, os definidos no Capítulo I. Os crimes funcionais
dividem-se em próprios e impróprios. No primeiro caso, retirado o elemento
funcionário público, o fato deixa de ser típico, configurando a hipótese de
atipicidade absoluta, como ocorre nos casos de prevaricação e
condescendência criminosa. Na hipótese de crime funcional impróprio,
ausente a elementar funcionário público, ocorre uma tipicidade relativa, pois
o agente responde por outro delito. É o caso do peculato, no qual a exclusão
da ementar funcionário público não retira a possibilidade de existir outro crime,
como apropriação indébita ou furto, conforme o caso.
Cumpre destacar que, mesmo nos crimes funcionais, não se
pode deixar de se reconhecer a possibilidade de o particular responder pelo
delito em caso de concurso de agentes. É que, tratando-se de elementar (e
não circunstância), a qualidade de funcionário público comunica-se ao outro
agente, à luz do art. 30 do CP, desde que tenha ingressado na esfera de seu
conhecimento. Neste sentido: RT 683/333; 513/391-2; 712/465; RTJ 71/354.
Neste curso, somente serão analisados os principais delitos
contra a administração pública, previstos nos Capítulos I e II.
1. Peculato (Art. 312)
a) Tipo Penal Fundamental
Art.312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
[...]
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
O crime de peculato possui diversas figuras típicas. Cuida o
caput do peculato próprio, contendo o peculato-apropriação (1ª parte) e o
peculato-desvio (2ª parte); no §1°, há o peculato impróprio, chamado de
peculato-furto; no §2°, o peculato culposo; e no §3°, uma norma permissiva,
que extingue a punibilidade ou diminui a pena.
Doutrinariamente, reconhece-se, ainda, a figura do peculato-
malversação, quando o bem apropriado ou furtado pelo funcionário público
pertencer a terceiro particular, encontrando-se, porém, na posse lícita da
Administração. Observa-se que o próprio caput prevê a possibilidade de
apropriação de bem particular.
O tipo penal do peculato próprio é formado pelos núcleos
―apropriar-se‖ ―desviar‖ e pelos elementos ―funcionário público‖, ―dinheiro,
valor ou qualquer outro bem móvel‖, ―público ou particular‖, ―de que tem a
posse em razão do cargo‖, ―em proveito próprio ou alheio‖.
Na modalidade ―apropriar-se‖, há o chamado peculato-
apropriação; na ―desviar‖, o peculato-desvio. No primeiro caso, assim como
ocorre no crime de apropriação indébita, atua o agente com o chamado
animus rem sibi hadendi, que consiste na vontade do agente de se tornar
dono da coisa, o chamado ânimo de assenhoreamento definitivo. No
peculato-desvio, o sujeito visa a obter proveito próprio ou alheio.
Apropriar-se significa fazer a coisa como sua, passando a agir
como se fosse seu proprietário, quando somente tem a sua posse ou
detenção. É imprescindível que o agente tenha a posse do bem em razão do
cargo (rationi oficii).
Desviar é alterar o destino ou aplicação, dando a coisa
destinação diversa, em proveito próprio ou alheio. Deste modo, quando o
desvio se verifica em favor da própria administração, mas com utilização
diversa da prevista em lei, ocorre o crime de emprego irregular de verbas
públicas (art. 315) e não peculato (RT 520/347; 490/293).
Sujeito ativo do crime é o funcionário público (art. 327), nada
impedindo, conforme já ressaltado, na hipótese de concurso de agentes, a
responsabilização criminal de terceiro que não se revista desta qualidade.
Exige-se que o particular conheça não só a condição de funcionário público,
como também que o bem apropriado se encontra na posse deste em razão
do seu cargo.
Na hipótese de funcionário usurpador, indivíduo que não é
funcionário público, mas executa ilegalmente atos próprios da função pública,
não haverá o crime de peculato, mas dois delitos, usurpação de função
pública e apropriação indébita em concurso material (Hungria, Noronha). Não
impede, porém, a configuração do peculato o fato de o agente, legalmente
nomeado, ter deixado de tomar posse ou prestar compromisso. Reconhece-
se, inclusive, que o agente nomeado irregularmente ou ilegalmente, até que
se anule sua nomeação, pode cometer o crime de peculato (Noronha,
Mirabete, Capez).
Sujeito passivo do delito é o Estado, como também o
particular, na hipótese de peculato-malversação.
O autor apropria-se ou desvia de dinheiro, valor ou qualquer
outro bem móvel. Dinheiro é moeda corrente; valor é título, documento que
represente uma importância pecuniária. Exige o CP que ao bem seja móvel.
Assim, havendo disposição de coisa imóvel pelo funcionário público,
configurado estará o crime de estelionato, na modalidade de disposição de
coisa alheia como própria (art. 171, §2º, I, CP), podendo, conforme o caso,
incidir a majorante do §3° do art. 171.
A utilização se serviços de um funcionário público em proveito
próprio ou alheio não configura peculato, pois a apropriação deve recair
sobre bens e não pessoas (JTJ 201/324; RT 506/326). Igualmente, a mera
utilização de veículos ou equipamentos pertencentes à Administração Pública,
eis que inexiste a figura de peculato de uso (RT 749/669-70; 796/716; 541/342).
Diversa, porém, deve ser a solução no caso de crime de responsabilidade de
prefeito, pois o Decreto-Lei n° 201/67, art. 1°, II, tipifica o peculato uso (RJTJESP
60/373).
Tem-se admitido a adoção do princípio da insignificância,
com forças para excluir a própria tipicidade do fato, na hipótese de bens e
valores insignificantes e inservíveis, sem qualquer proveito próprio ou alheio (RT
736/705).
Mas a aplicação do princípio da insignificância em crimes
contra a administração pública é discutível, especialmente na jurisprudência
dos Tribunais Superiores.
c) Peculato Impróprio (§1°)
Art.312 -
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.
[...]
Prevê o §1° uma hipótese de peculato impróprio, chamado de
peculato-furto. Há dois núcleos do tipo: ―subtrair‖ e ―concorrer‖. No primeiro
caso, o verbo é o mesmo do crime de furto, qual seja ―subtrair‖. Na segunda
hipótese, o agente concorre para que terceiro realiza a subtração, o qual,
ainda que não funcionário público, responderá também pelo peculato, desde
que conheça a qualidade de seu comparsa.
Trata-se de situação inusitada, pois o terceiro, a despeito de
realizar a subtração, responderá como partícipe do crime de peculato, já que
a conduta principal, ―concorrer‖, pertence ao funcionário público.
No peculato-furto, o funcionário público não tem a posse do
bem em razão do cargo, o que só ocorre no peculato próprio (caput). No
entanto, é necessário que à subtração o agente tenha se valido da facilidade
que lhe proporciona a qualidade de funcionário. Ausente a elementar da
facilitação, restará configurado o crime de furto.
d) Peculato Culposo (§2°)
Art.312 -
§ 2º Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.
[...]
Neste caso, o agente, com sua conduta culposa, cria uma
oportunidade para a prática de um crime doloso, funcional ou não, por parte
de outrem.
Imprescindível que exista relação entre o ato culposo do
funcionário e o crime praticado por outrem, evidenciando-se que este só
ocorreu devido à culpa do agente. Ou seja, o autor do delito doloso deve ter
se aproveitado pelas facilidades proporcionadas pela conduta culposa do
agente.
Não se trata, como é pacífico, na doutrina, de hipótese de
concurso de agentes, pois não há participação culposa em crime doloso. Na
existência de vínculo subjetivo, ambos os sujeitos responderão por peculato
doloso, próprio e impróprio, não havendo no que se falar em peculato
culposo.
e) Momento da Consumação do Delito
A consumação variará de acordo com a espécie de peculato.
Com efeito, no peculato-apropriação, consuma-se o delito
quando o agente se apropria do dinheiro, valor ou bem móvel e desvia em
proveito próprio ou alheio, ou seja, no momento em que o sujeito passa a
dispor do objeto material como se fosse seu. Trata-se de delito material.
Observam, porém, doutrina e jurisprudência que, não se
tratando de delito contra o patrimônio, o dano inerente ao peculato é aquele
inerente à violação do dever de fidelidade para a administração, associado
ou não ao patrimonial. Assim, a restituição do objeto ou a sua apreensão
posterior não descaracteriza o delito. Ademais, pouco importa que o sujeito
aufira vantagem do crime.
Por sua vez, na modalidade peculato-desvio, o crime estará
consumado no instante em que o funcionário público der à coisa destinação
diversa da prevista em lei, sendo irrelevante a obtenção do proveito próprio
ou alheio.
No peculato-furto, a consumação ocorrerá com a subtração do
bem pelo funcionário público ou por terceiro, nos mesmos moldes do que
ocorre no crime de furto, sendo desnecessária, portanto, a posse tranqüila da
res, bastando a sua inversão (teoria da amotio). Não haverá o delito
consumado, mas tentativa, quando o funcionário público, concorrendo para
que terceiro realize a subtração do bem, esta não ocorrer, por circunstância
alheia à vontade dos agentes.
O peculato culposo estará consumado quando houver a
apropriação, desvio ou subtração do bem por terceiro, motivado por sua
negligência, imprudência ou imperícia.
e) Tentativa
A tentativa é admissível em todas as espécies dolosas de
peculato, quando o agente, iniciada a execução do delito, não conseguir o
resultado (apropriação, desvio ou subtração) por circunstâncias alheias à sua
vontade.
Será incabível na hipótese de peculato culposo. Assim, não se
consumando o crime anterior (peculato-apropriação/desvio/furto) por parte
do terceiro, inexistirá o peculato culposo. Neste caso, a despeito de não se
poder responsabilizar penalmente o agente pelo peculato culposo, o terceiro
será responsabilizado por tentativa de peculato doloso, próprio ou impróprio.
f) A Reparação do Dano no Peculato (§3°)
Art. 312. [...]
§ 3º No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.
Prevê o CP que, no caso de peculato culposo, o agente terá a
punibilidade extinta se a reparação do dano ocorrer até o trânsito em julgado
da sentença condenatória. Sendo posterior, a reparação reduz a pena pela
metade.
Mas a reparação do dano também incide no peculato doloso.
Com efeito, se realizada antes do recebimento da denúncia, configura
arrependimento posterior (art. 16 do CP), reduzindo obrigatoriamente a pena
de um a dois terços. Levada a efeito após o recebimento da denúncia e
efetivada antes da sentença faz incidir a atenuante genérica do art. 65, II, b,
do CP; na instância recursal, a reparação do dano poderá fazer exsurgir a
atenuante inominada do art. 66 do CP.
Além disso, atualmente, após a inserção do §4° ao art. 33 do
CP, pela Lei n° 10.763/2003, a reparação do dano constitui, para o condenado
por crime contra a administração pública e cometidos depois da alteração
legislativa, requisito para a progressão de regime.
2. Concussão e Excesso de Exação (Art. 316)
a) Tipo Penal Fundamental
Art.316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.
[...]
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
Dispõe o CP, no art. 316, sobre os crimes de concussão (caput)
e excesso de exação (§§1° e 2°).
O termo concussão deriva do latim concutare que, de acordo
com Carrara (citado por Noronha), significa sacudir uma árvore, para fazer os
seus frutos caírem.
O tipo do caput é formado pelo núcleo ―exigir‖ e pelos
elementos ―para si ou para outrem‖, ―direta ou indiretamente‖, ―ainda que
fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela‖, ―vantagem
indevida‖.
Exigir significa ordenar, reivindicar, impor como obrigação. Vale-
se o agente de sua qualidade (funcionário público), incutindo na vítima um
temor de represálias, imediatas ou futuras, relacionadas à função por ele
exercida.
Se a exigência for acompanhada de grave ameaça ou
violência, a conduta caracterizará o crime de extorsão (art. 158) e não
concussão. Assim, se o funcionário público, mediante violência ou grave
ameaça, constranger a vítima com o objetivo de obter indevida vantagem,
praticará o delito de extorsão.
A concussão, igualmente, não se confunde com o crime de
corrupção passiva. Com efeito, na concussão, o agente exige; na corrupção,
solicita. ―Exigir implica obrigar a alguma coisa, sob certa pena. Solicitar é
simples pedido. Enquanto no primeiro caso a vítima é levada pelo medo a
atender à exigência, no segundo satisfaz o pedido livremente, recebendo ou
não, em contrapartida, alguma vantagem‖ (RT 564/327).
São exemplos de condutas que configuram o delito de
concussão: aliviar sanções impostas em decorrência de infração de posturas
municipais (RT 534/343); promessa de libertar preso (RT 512/345, 597/365);
promessa de dar andamento a procedimento administrativo (RT 783/775),
inclusive para deferir aposentadoria (RT 796/745).
Cuidando-se de exigência de vantagem feita pelo funcionário
do Fisco com o fim de deixar de cobrar ou lançar o tributo ou cobrá-lo
parcialmente, o agente deve responder por crime funcional contra a ordem
tributária, previsto no art. 3º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, em face do princípio
da especialidade.
O CP prevê a exigência direta, chamada de explícita, e a
indireta, conhecida como implícita. No primeiro caso, a concussão é realizada
abertamente pelo agente, por meio de represálias; no segundo, o sujeito
encobre a exigência da vantagem indevida, ao empregar malícia, ou deixa
entender à vítima que a vantagem é devida.
Reconhece-se, inclusive, que a vantagem pode ser exigida por
terceiro intermediário que atue em concurso com o funcionário público.
Diversa é a hipótese, porém, quando o agente simula ser funcionário público,
como no caso daquele que se faz passar por policial e exige dinheiro para
não prender a vítima. Afirma Victor Rios Gonçalves que, na espécie, haveria o
crime de extorsão. De fato, não há de se falar em concussão.
Porém, só será correto falar em extorsão quando a simulação
vier acompanhada de violência ou grave ameaça (o que ocorreu naquela
situação), meios configuradores da extorsão. Caso contrário, havendo apenas
a simulação e não o emprego da vis o delito será o de estelionato (art. 171).
O fim buscado pelo agente é auferir vantagem indevida. Assim,
se for devida a vantagem, não haverá o delito de concussão, podendo haver
outro delito, como, por exemplo, excesso de exação.
Diverge-se a doutrina acerca da natureza desta vantagem.
Prevalece o entendimento de que a vantagem deve ser necessariamente
econômica. Neste sentido, posicionam-se Hungria, Noronha, Damásio,
Bitencourt e Delmanto.
A posição minoritária (Mirabete, Bento de Faria, Capez), a nosso
ver com razão, entende que a vantagem pode ter qualquer natureza, que
não necessariamente patrimonial, pois o delito tutela primordialmente a
Administração Pública e não o patrimônio, visando ao regular funcionamento
de suas atividades e a moralidade administrativa.
É imprescindível que o agente se valha de sua função, que
exerce ou vai exercer, sendo irrelevante, no entanto, que dela esteja
afastado, por férias ou qualquer licença. Conforme previsto no tipo, a
vantagem é buscada em razão da função.
c) Consumação
O crime consuma-se com a exigência da vantagem indevida,
pouco importando que venha a recebê-la, o que constitui mero exaurimento
da conduta, conforme pacífico entendimento doutrinário e jurisprudencial.
Trata-se, deste modo, de delito formal.
Questão interessante refere-se aos em que a vítima avisa a
polícia da concussão, sendo orientado a marcar dia, local e hora para
entregar a vantagem indevida, sendo o agente preso em flagrante no
momento do recebimento.
Discute-se, inicialmente, se houve o delito ou se trata de crime
impossível, incidindo, na espécie, a Súmula 145 do STF.
De fato, não há que falar em crime impossível, pois o delito,
conforme visto, se consumou com a exigência, o que, no caso, ocorreu antes
mesmo da comunicação à polícia. É a posição francamente majoritária da
jurisprudência (RT 780/540, JSTF 260/372).
Outro tema de relevo diz respeito à legalidade do flagrante. A
jurisprudência dominante inclina-se pela ilegalidade do flagrante, sob o
argumento de que o ―crime de concussão é eminentemente formal e
consuma-se com o simples fato da exigência da indébita vantagem. Assim
sendo, se a prisão dos pacientes se verificou dias depois, não há falar em
flagrância‖ (RT 487/271). No mesmo sentido: RT 780/540, JSTF 260/372.
Acredita-se, no entanto, que o flagrante em casos tais é legal.
Ainda que já consumado, os efeitos do delito se estenderam da exigência até
o recebimento, o que autorizou a prisão. Além disso, não há de se reconhecer
a figura do flagrante preparado, mas sim esperado, pois não houve qualquer
intervenção policial na fase da exigência. Por fim, há de se cogitar que, a
partir do momento em que o agente comparece ao local marcado, nova
exigência está sendo feita pelo agente, autorizando o flagrante. Neste
sentido: RT 691/314.
d) Tentativa
A exigência pode ser feita verbalmente ou por meio de escrito.
No primeiro caso, a tentativa é inadmissível, pois se trata de crime
unissubsistente.
Na segunda situação, a tentativa é, em tese, possível, pois o iter
criminis pode ser fracionado, cuidando-se de delito plurissubsistente.
e) Excesso de Exação (§1°)
Art. 316. [...]
§ 1º Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
§ 2º Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
No §1° do art. 316, prevê o CP uma forma especial de
concussão chamada de excesso de exação. A pena, nessa figura, mantém o
mesmo quantum máximo de 8 (oito) anos do tipo do caput, o que não ocorre
com a sanção mínima a qual é aumentada de 2 (dois) para 3 (três) anos
(redação dada pela Lei n° 8.137/1990).
Por sua vez, o §2° dispõe sobre um tipo especial de excesso de
exação quando o tributo recolhido é desviado em proveito próprio ou alheio,
não sendo recolhido aos cofres públicos. A sanção penal, neste caso, é
elevada para o máximo de 12 (doze) anos. No entanto, por descuido do
legislador (a Lei n° 8.137/1990 somente alterou a pena da figura do §1°), a
pena mínima (2 anos) deste tipo penal, que é mais grave do que o anterior, é
menor do que a do §1° (3 anos). Neste contexto, Mirabete afirma, com razão,
que, por coerência lógica, o julgador, quando se tratar da forma qualificada,
não poderá impor pena inferior a 3 (três) anos de reclusão, mínimo fixado para
o crime simples.
Exação é a cobrança rigorosa de uma dívida ou imposto, ou a
exatidão, pontualidade, correção. Com efeito, o CP não pune a exação, mais
o seu excesso, o qual se configura de duas formas.
Na primeira, o funcionário exige tributo que sabe ou deve saber
indevido. Para Mirabete, o termo ―sabe‖ indica o dolo, direto e eventual, do
agente, enquanto ―deveria saber‖ representa a culpa do sujeito, que incide
na falta do dever de cuidado objetivo, cobrando um tributo indevido. No
entanto, o melhor entendimento é de Damásio (Capez), para quem a
expressão ―deveria saber‖ indica a incerteza, o dolo eventual: o sujeito ―não
tem plena certeza da natureza indevida da cobrança (dolo direto;
modalidade anterior), mas tem conhecimento de fatos e circunstâncias que
claramente a indicam‖.
Na segunda, o tributo é devido, mas o agente emprega na sua
cobrança meio vexatório ou gravoso que a lei não autoriza. Vexatório é o
meio que expõe o contribuinte à vergonha, à humilhação, ferindo a sua
dignidade. Gravoso é o que lhe impõe maiores despesas. Trata-se, por óbvio,
de meios não autorizados pela lei para a cobrança do tributo.
Imprescindível, porém, nos dois casos, que o tributo recolhido se
reverta para os cofres públicos. Caso contrário, desviando o valor em proveito
próprio ou de terceiro, o agente responderá pela figura do §2°.
O CP refere-se, por cautela, a exigência de tributo ou
contribuição social. É que, no Direito Tributário há divergência, que atualmente
venha sendo dissipada, acerca das espécies de tributo previstas no
ordenamento jurídico pátrio. Alguns entendem que tributos são apenas os
previstos nos incisos I, II e III do art. 145 da Constituição Federal, quais sejam
impostos, taxas e contribuições de melhoria. Para a maioria, porém, são
tributos além daqueles, as contribuições sociais e o empréstimo compulsório.
Sujeito ativo do crime é o funcionário público, ainda que não
seja encarregado da arrecadação. Neste sentido: Noronha, Capez. Em
sentido contrário, porém, manifesta-se a doutrina dominante para quem o
delito só pode ser cometido por funcionário público encarregado da
arrecadação. Nesse caso, não exercendo essa função, a conduta pode
caracterizar o crime de extorsão ou mesmo o previsto no §2º do art. 316.
Por sua vez, são vítimas do delito o Estado e, secundariamente,
o contribuinte.
Consuma-se o crime com a exigência indevida ou com o
emprego do meio vexatório na cobrança do tributo. Trata-se de crime formal,
no qual é irrelevante o pagamento do tributo.
No tipo qualificado do §2°, a consumação ocorre com o desvio
do valor recolhido, em proveito próprio ou alheio.
A tentativa é possível em todas as modalidades.
f) Aspectos Diferenciadores
Tarefa árdua dirigida ao intérprete é aquela consistente na
tipificação da conduta do agente. No caso dos crimes contra a
administração pública, a dificuldade aumenta, pois há grande semelhança
entre os delitos. Todavia, há de se ter, em primeiro lugar, uma visão geral,
acerca desses delitos, a fim de que o trabalho dessa tipificação seja menos
dificultado.
Com efeito, nas infrações em questão, o fator inicial
diferenciador encontra-se na finalidade específica do agente ao praticar a
conduta. Nesse contexto, podemos separar, de um lado, os delitos nos quais o
sujeito atua com a intenção de obter uma indevida vantagem, e, de outro,
aqueles em que não possui essa finalidade.
No primeiro grupo, encontram-se os crimes de peculato,
corrupção passiva, concussão e tráfico de influência. Assim, quando o agente
objetivar uma indevida vantagem sua conduta caracterizará um desses
delitos. No crime de peculato, o sujeito se apropria do bem que tem em seu
poder na qualidade de funcionário público (peculato próprio) ou subtrai ou
concorre para que a res seja subtraída, neste último caso, quando não tem a
posse, valendo-se, porém, da qualidade de funcionário público (peculato
impróprio).
A seu turno, nos delitos de corrupção passiva e de concussão, o
funcionário público possui atribuição para praticar o ato, infringindo, desse
modo, o seu dever funcional. Ou seja, exige, solicita, recebe ou aceita
promessa de indevida vantagem, sob a condição de que irá infringir seu dever
funcional. A diferença entre esses dois delitos reside na ação do agente:
quando solicita (mero pedido sem imposição de qualquer condição), recebe
ou aceita a promessa de indevida vantagem incide no crime de corrupção
passiva; se exige (ordena, reivindica, impõe como obrigação) estará
praticando o delito de concussão.
Já no tráfico de influência, embora objetive uma indevida
vantagem, o agente não possui atribuição para a prática daquele ato, não
havendo infração de dever funcional. É por isso que essa infração criminal não
se encontra prevista no capítulo pertinente aos crimes praticados por
funcionário público, mas no dos delitos praticados por particular contra a
administração pública. Até mesmo um funcionário público poderá ser sujeito
ativo do crime de tráfico de influência, desde que não possua atribuição para a
prática do ato funcional motivador da indevida vantagem, sendo, nesta
hipótese, tratado como particular.
Por outro lado, não visando à obtenção de uma indevida
vantagem, a conduta do sujeito poderá configurar os crimes de corrupção
passiva privilegiada, prevaricação, condescendência criminosa ou advocacia
administrativa.
3. Corrupção Passiva (Art. 317)
a) Tipo Penal Fundamental
Art.317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena - reclusão, de 2 (um) a 12 (oito) anos, e multa.
[...]
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
O tipo é formado pelos núcleos ―solicitar‖, ―receber‖ e ―aceitar‘
e pelos elementos ―para si ou para outrem‖, ―direta ou indiretamente‖, ―ainda
que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela‖, ―vantagem
indevida‖.
A pena máxima do delito foi aumentada de 8 (oito) para 12
(doze) anos pela Lei n° 10.763/2003.
Como se observa, a norma do art. 317 é formada praticamente
pelos mesmos elementos do tipo de concussão. Difere-se, no entanto, a
concussão da corrupção passiva. Com efeito, na concussão, o agente exige;
na corrupção, solicita. ―Exigir implica obrigar a alguma coisa, sob certa pena.
Solicitar é simples pedido. Enquanto no primeiro caso a vítima é levada pelo
medo a atender à exigência, no segundo satisfaz o pedido livremente,
recebendo ou não, em contrapartida, alguma vantagem‖ (RT 564/327). Ou
seja, na corrupção a vítima cede por sua própria vontade, e não pelo temor a
represálias, o que ocorre na concussão.
Solicitar é pedir, buscar, manifestar o desejo de receber. A
solicitação pode ser direta ou indireta. Isto é, explícita ou implícita; feita pelo
próprio agente ou por intermediário, que, no caso, também responde pela
corrupção passiva como partícipe. Nesta modalidade, não se faz necessária a
prática de qualquer ato do terceiro (extraneus), pois o tipo se aperfeiçoa tão
só com a solicitação do funcionário público (intraneus). Por esta razão, a
doutrina afirma que a bilateralidade (existência de dois delitos) não é requisito
indispensável do crime de corrupção passiva.
Receber é tomar, obter, acolher, entrar na posse. Aceitar é
consentir, concordar, estar de acordo. Aqui, não há o recebimento da
vantagem por parte do intraneus. Nas duas modalidades, o oferecimento
anterior de vantagem indevida por parte do extraneus é pressuposto essencial
para a configuração do delito.
A conduta do terceiro, na espécie, é tipificada
autonomamente, optando o CP por excetuar a teoria unitária, para aplicar,
na espécie, a teoria dualista. Embora exista concurso de agentes, intraneus e
extraneus respondem cada qual por delito autônomo; o primeiro pela
corrupção passiva (art. 317); o segundo, pela corrupção ativa (art. 333).
Ressalte-se que o delito do intraneus permanecerá mesmo quando o
extraneus foi inimputável ou não for identificado.
Do mesmo modo que ocorre na concussão, é imprescindível
que o agente se valha de sua função, que exerce ou vai exercer, sendo
irrelevante, no entanto, que dela esteja afastado, por férias ou qualquer
licença. Conforme previsto no tipo, a vantagem é buscada em razão da
função. Mister, deste modo, que o ato a ser praticado, em face da indevida
vantagem, se insira na competência do intraneus.
Assim, não há corrupção passiva, mas tráfico de influência (art.
332), quando a vantagem visada não decorre da atribuição do intraneus (RT
505/296, 526/356, 538/324), a não ser que este atue em conjunto com o
funcionário com a competência para a prática do ato, sendo, então, o
intermediário (partícipe). Igualmente, se o agente retarda ou deixa de praticar
o ato, sem que tenha havido qualquer proposta do extraneus, mas agindo por
interesse ou sentimento pessoal, o delito será de prevaricação (art. 319).
O sujeito que se faz passar (simulação) de funcionário público
para solicitar ou receber indevida vantagem não comete o crime de
corrupção passiva, podendo, em tese, responder pelo delito de estelionato (RF
215/291). Se a solicitação tiver sido feito a pretexto de influir em ato praticado
por outro servidor, o delito será de tráfico de influência (art. 332).
Fala-se em corrupção própria quando o ato que o intraneus
pratica é ilegítimo, injusto ou ilícito. Neste último caso, responderá o funcionário
público pelo respectivo delito e pela corrupção passiva, em concurso, formal
ou material. Por sua vez, corrupção imprópria é aquela na qual o ato a ser
praticado é legítimo, lícito, justo. Em ambos os casos, há o crime de corrupção
passiva.
Quando a indevida vantagem é entregue ao intraneus antes
da prática do ato, há a figura conhecida, doutrinariamente, por corrupção
antecedente. Ocorrendo a entrega após este momento, existe a corrupção
subseqüente. Reconhece-se, assim, que o funcionário pode praticar o ato na
esperança ou convicção de obter a indevida vantagem. Nesta hipótese, não
é preciso um prévio acordo de vontades entre o intraneus e o extraneus.
A vantagem buscada pelo agente deve ser indevida. Sendo
devida, o fato será atípico. Do mesmo modo, conforme leciona Hungria,
gratificações usuais de pequena monta por serviço extraordinário (não se
tratando de ato contrário à lei) e pequenas doações ocasionais, como as
costumeiras ―boas festas‖ de natal ou ano novo, não podem ser consideradas
corrupção passiva.
Permanece neste delito, como menor intensidade, é verdade, a
questão acerca da natureza da vantagem. Diferentemente, porém, do que
ocorre no crime de concussão, a posição majoritária é no sentido de que a
vantagem pode ter qualquer natureza, que não necessariamente patrimonial,
pois o delito tutela primordialmente a Administração Pública e não o
patrimônio, visando ao regular funcionamento de suas atividades e a
moralidade administrativa. Neste sentido, posicionam-se Fragoso, Noronha,
Mirabete, Bento de Faria, Damásio e Bitencourt.
Hungria, por sua vez, entende que a vantagem deve ser
necessariamente econômica.
Por fim, é imprescindível que a vantagem indevida se destina ao
próprio agente ou a terceiro, pois se esta se reverte em benefício do próprio
serviço não há o crime em exame. Neste sentido, não se entendeu
caracterizado o crime na conduta do delegado de polícia que, embora
aceitara a oferta em dinheiro, a aplicou na aquisição de gasolina para
viatura, a fim de intensificar o policiamento da cidade (RT 527/407).
c) Consumação e Tentativa
A corrupção passiva consuma-se com o ato de solicitar,
receber ou aceitar. No primeiro caso, é irrelevante que o extraneus entregue a
vantagem indevida ao funcionário. No núcleo aceitar, da mesma forma, é
dispensável que o intraneus receba a vantagem.
Em ambos os casos, é prescindível que o ato funcional seja
praticado, omitido ou retardado pelo intraneus. Se isto ocorrer, há mero
exaurimento da conduta, o qual, entretanto, faz incidir a causa de aumento
prevista no §1°.
A tentativa é possível, nos mesmos moldes da concussão.
d) Causa de Aumento de Pena – Exaurimento da Conduta (§1°)
Art. 317. [...]
§ 1º A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
Como visto anteriormente, é irrelevante à configuração da
corrupção passiva que o ato funcional seja praticado, omitido ou retardado
pelo intraneus, o que constitui mero exaurimento da conduta.
No entanto, o exaurimento da conduta, na espécie, faz incidir a
causa de aumento em tela, majorando a pena em um terço.
e) Corrupção Passiva Privilegiada (§2°)
Art. 317. [...]
§ 2º Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
Trata o §2° da chamada corrupção passiva privilegiada, a qual
é punida com pena de detenção de 3 (três) meses a 1 (um ) ano ou multa.
Nesta modalidade, o intraneus não pratica o ato ou deixa de
praticá-lo na intenção de receber indevida vantagem, mas por outro
sentimento. Apenas cede ao pedido do extraneus. E é a atuação deste que
diferencia a corrupção passiva privilegiada da prevaricação, pois, neste
último crime não há qualquer proposta do extraneus, agindo o funcionário por
interesse ou sentimento pessoal.
4. Facilitação de Contrabando ou Descaminho (Art. 318)
a) Tipo Penal
Art.318 - Facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho (art. 334):
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
O tipo é formado pelo núcleo ―facilitar‖, e pelos elementos
―com a infração de dever funcional‖, ―prática de contrabando ou
descaminho‖.
Mais uma vez o CP, do mesmo modo que fez na corrupção
passiva, excepciona a teoria unitária, tipificando autonomamente as condutas
do funcionário público, que facilita o contrabando ou o descaminho, e do
terceiro que realiza o próprio contrabando ou descaminho. Com efeito,
embora exista concurso de agentes, respondem cada qual por delito
autônomo; o funcionário pela facilitação (art. 318); o terceiro, pelo crime de
contrabando ou descaminho (art. 334).
Facilitar é tornar fácil, auxiliar, afastar os obstáculos que
impediriam a prática do contrabando ou descaminho. A facilitação pode
ocorrer por ação ou omissão. Conforme leciona Mirabete, tanto aquele que
indica ao contrabandista as vias mais seguras para a entrada ou saída da
mercadoria, como o que, dolosamente, não efetua regularmente as
diligências de fiscalização destinadas a evitar o contrabando ou o
descaminho, incide no delito em tela. É necessário, porém, o dolo do agente,
consubstanciado na vontade de facilitar o contrabando ou o descaminho,
bem como na consciência de estar violando o seu dever funcional (o tipo se
refere a ―infração do dever funcional‖). Ausente este último elemento, o
funcionário será partícipe do crime de contrabando ou descaminho (art. 334).
Não se pune, desse modo, a conduta culposa do funcionário
que deixa de tomar as cautelas necessárias hábeis a impedir o contrabando
ou descaminho. Por outro lado, não se exige que o agente facilite o
contrabando ou descaminho visando a receber vantagem.
Contrabando é a importação ou exportação fraudulenta de
mercadoria, cuja entrada ou saída seja absoluta ou relativamente proibida.
Por sua vez, descaminho é o ato fraudulento que se destina a evitar, total ou
parcialmente, o pagamento de direitos e impostos previstos pela entrada,
saída ou consumo de mercadorias.
Sujeito ativo do delito é o funcionário público que, por lei, tem o
dever funcional de reprimir o contrabando ou o descaminho. Assim, não
pratica o delito em questão o funcionário em cujas atribuições não se incluir a
repressão ao crime do art. 334 do CP (RT 771/711). Neste caso, todavia, e na
hipótese de, tendo a competência, não realizar a conduta no exercício de
sua função, responderá como partícipe do crime de contrabando ou
descaminho (art. 334), assim como ocorre com qualquer particular.
A facilitação pode ocorrer inclusive nas modalidades
equiparadas previstas no §1° do art. 334.
c) Consumação e Tentativa
Cuida-se de crime formal. Assim, consuma-se com a prática da
facilitação pelo agente, ainda que não se realize o contrabando ou o
descaminho. Conforme ressalta a doutrina, é possível a ocorrência do crime
de facilitação sem que esteja até mesmo iniciada a execução do
contrabando ou do descaminho.
A tentativa somente é cabível na conduta comissiva, não
havendo o conatus na hipótese de omissão.
5. Prevaricação (Art. 319)
a) Tipo Penal
Art.319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
―Prevaricação é a infidelidade ao dever de ofício, à função
exercida. É o não cumprimento das obrigações que lhe são inerentes, movido
o agente por interesse ou sentimento próprios‖ (Noronha).
O tipo é formado pelos núcleos ―retardar‖, ―deixar de praticar‖
e ―praticar‖, e pelos elementos ―indevidamente‖, ―ato de ofício‖, ―contra
disposição expressa de lei‖, ―para satisfazer interesse ou sentimento pessoal‖.
No primeiro caso, o funcionário público retarda ou deixa de
praticar indevidamente ato de ofício. Na segunda modalidade, pratica o ato
contra disposição expressa de lei.
Em ambos os casos, porém, o agente atua movido para
satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Com efeito, se o funcionário visava a
obter indevida vantagem o delito será de corrupção passiva. Além disso, é
imprescindível que o terceiro não apresente qualquer proposta ao funcionário
público, pois se esta existir o crime também será de corrupção passiva. Ou
seja, não pode existir pedido ou intervenção do extraneus.
Interesse pessoal, que, no crime de prevaricação, não pode ser
patrimonial, é a relação de reciprocidade entre um indivíduo e um objetivo
que corresponde a determinada necessidade daquele. Sentimento pessoal é
um estado afetivo ou emocional, decorrente de uma paixão ou emoção,
amor, ódio, vingança, simpatia, caridade, etc.
Retardar é atrasar, protelar, protair. Difere-se do núcleo ―deixar
de praticar‖. Neste, o agente não tem a intenção de praticar o ato; naquele,
a vontade do sujeito é apenas prolongar ou procrastinar a prática do ato,
deixando de executá-lo no prazo previsto ou em tempo útil para que produza
seus normais efeitos. Nas duas modalidades, o crime é cometido por omissão.
Trata-se de omissão indevida, ou seja, injusta, ilegal. Indevido é
o ato reprovável, contra o senso comum de moralidade. Todavia, não basta
que o ato seja indevido, sendo necessário que seja ―de ofício‖. Este é o que se
insere nas atribuições ou competência do agente. Deste modo, se o ato
refoge ao âmbito da competência funcional do funcionário não há de se falar
em prevaricação.
Por sua vez, no núcleo ―praticar‖ a conduta é comissiva, por
meio da qual o agente executa o ato de formal ilegal, contra disposição
expressa de lei. Imprescindível, deste modo, que exista uma norma jurídica em
sentido estrito (o que exclui, por conseqüência, portarias, regulamentos,
resoluções), não se punindo o agente quando o ato for praticado em
violação ao princípio da moralidade. O ato, da mesma forma do que ocorre
nas condutas omissivas, também se insere no âmbito da competência
funcional do agente (―ato de ofício‖).
Como elementares que são, o interesse ou o sentimento pessoal
devem restar descrito na denúncia do MP, conforme pacífico entendimento
jurisprudencial.
c) Consumação e Tentativa
Consuma-se com o retardamento, omissão ou prática do ato.
A tentativa é inadmissível nas condutas omissivas (―retardar‖ e
―deixar de praticar‖), sendo cabível no núcleo ―praticar‖.
6. Condescendência Criminosa (Art. 320)
a) Tipo Penal
Art.320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente:
Pena - detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa.
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
Todo funcionário público tem o dever legal de responsabilizar o
subordinado que tenha cometido infração administrativa, ou então, de levar o
fato ao conhecimento da autoridade competente para aplicar a punição.
Não fazendo isto, viola o funcionário ato de ofício. Esta violação
poderá ocorrer por interesse ou sentimento pessoal, quando restará
caracterizado o crime de prevaricação.
Mas o CP reconhece que a omissão no dever de punição do
funcionário público pode ter ocorrido por indulgência, que é um estado
anímico de tolerância, clemência, complacência, dó. E, nesta hipótese, pune
o agente com menos rigor do que no crime de prevaricação.
O tipo é formado pelos núcleos ―deixar‖ e ―não levar‖, e pelos
elementos ―funcionário‖, ―indulgência‖, ―responsabilizar subordinado que
cometeu infração no exercício do cargo‖, ―quando lhe falte competência‖,
―autoridade competente‖.
Neste contexto, a condescendência criminosa é uma espécie
de prevaricação privilegiada, na qual o agente deixar de agir movido por
indulgência. Ausente este motivo, o crime será de prevaricação.
Mas é necessário lembrar que o sujeito pode, inclusive, ser
responsabilizado pela corrupção passiva privilegiada se na espécie houver
intervenção ou pedido do funcionário faltoso, ou mesmo por corrupção
passiva, simples ou qualificada, quando, na situação anterior, o agente atuar
visando um interesse patrimonial.
O tipo estabelece duas condutas omissivas. Na primeira, o
agente deixa de responsabilizar o subordinado faltoso, quando era
competente para aplicar-lhe a punição. Na segunda, o sujeito, não possuindo
atribuição legal para aplicar a punição, deixa de comunicar o fato à
autoridade competente.
Exige-se, porém, que o sujeito ativo seja superior hierárquico do
agente, pois o próprio tipo se refere a ―subordinado‖. Pressupõe, ainda, que
este tenha praticado uma infração, que tanto poderá consistir um mero ilícito
administrativo como um crime funcional. Imprescindível, porém, que a
infração do subordinado se relacione ao exercício do cargo. Conforme
aponta a doutrina (Hungria, Noronha, Mirabete e Capez), ficam de fora do
âmbito do tipo penal os crimes não funcionais e as faltas disciplinares que
importam demissão de cargo, como a de procedimento irregular ou
incontinência pública e escandalosa, vícios de jogos proibidos e embriaguez,
as quais não se relacionam ao exercício do cargo.
c) Consumação e Tentativa
Consuma-se com a omissão, a qual se caracteriza quando o
agente, ciente da infração funcional de seu subordinado não lhe
responsabiliza ou deixa de comunicar o fato à autoridade competente.
A tentativa é inadmissível, pois trata-se de crime omissivo
próprio.
7. Tráfico de Influência (Art. 332)
a) Tipo Penal
Art.332 - Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função.
Pena - Reclusão, de dois a cinco anos, e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário.
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
O objeto na tutela penal é o interesse público em seu mais
amplo sentido, o qual é ferido pelo agente que expõe a honra e o prestígio da
Administração Pública à situação de mercadejamento, transformando o
funcionário em aparentemente corruptível (RJTJESP 16/471).
Com efeito, o sujeito vale-se de um suposto prestígio junto à
Administração Pública para buscar uma vantagem.
O tipo é formado pelos núcleos ―solicitar‖, ―exigir‖, ―cobrar‖ e
―obter‖, e pelos elementos ―para si ou para outrem‖, ―vantagem ou promessa
de vantagem‖, ―a pretexto de influir em ato praticado por funcionário no
exercício da função‖.
Solicitar é pedir, buscar, manifestar o desejo de receber. Exigir
significa ordenar, reivindicar, impor como obrigação. Cobrar é pedir
pagamento; e obter é receber ou adquirir.
Trata-se de uma espécie de estelionato, acrescido da ofensa
ao prestígio e a honra, ferindo a imagem da Administração Pública.
É imprescindível que o sujeito não goze realmente de influência
junto à Administração Pública. De fato, se o autor do crime realmente gozar
de influência e dela se utilizar, poderá haver outro crime, como, por exemplo,
corrupção ativa, que absorverá o delito em exame.
Exige-se, ainda, que o agente alardeie prestígio, atribuindo-se
influência sobre o funcionário, não sendo necessário a menção de seu nome,
mas somente da função, cargo ou emprego que ocupa. Assim, não se pode
cogitar do delito quando não se sabe junto a que funcionário pretextava influir
na obtenção de vantagem (JTACRIM 27/108).
Neste contexto, utiliza-se o autor do delito de fraude contra o
comprador da influência, que deve ser apta a influenciar a vítima, pois, caso
contrário, não haverá o delito pela absoluta ineficácia do meio, tratando-se
de hipótese de crime impossível.
Cumpre ressaltar que não há qualquer participação do
funcionário público na ação criminosa, o qual é apenas envolvido pela fraude
do agente. Nem é necessário que o agente afirme ao comprador da
influência que a vantagem se reverterá também ao funcionário. Havendo esta
insinuação, porém, o agente responderá pelo crime com a pena aumentada
da metade, na forma do parágrafo único do art. 332, uma vez que, na
espécie, o desprestígio para a Administração Pública é maior.
A vantagem buscada pelo agente pode ser de natureza
material, moral ou mesmo sexual, sendo irrelevante à configuração do delito
se o fim objetivado é lícito ou ilícito.
Sujeito ativo do delito é o particular, mas nada impede que o
funcionário público também seja autor do crime.
Por sua vez, sujeito passivo é o Estado. Reconhece-se que o
comprador também é vítima secundária do delito, mesmo que o fim por ele
buscado seja ilícito. Nesta hipótese, supõe ele estar praticando um crime de
corrupção ativa, que só existirá se realmente houver a influência efetiva sobre
o funcionário, Conforme ensina a doutrina, há, na espécie, crime putativo
quanto à participação na corrupção ativa.
Entende-se que o termo ―funcionário público‖ deve ser
interpretado nos mesmos moldes do art. 327 do CP, em que pese a
divergência já apontada acerca da aplicação ou não do conceito deste
artigo aos crimes previstos no Capítulo II do Título XI da Parte Especial. A
jurisprudência, porém, neste crime, não tem aceitado a ocorrência deste
delito quando se trata de pessoa equiparada a funcionário público (§1° do
art. 327). Neste sentido: RF 235/307; RT 409/70.
Quando se trata de juiz, jurado, órgão do Ministério Público,
funcionário da justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha, o crime passa
a ser o de exploração de prestígio (art. 357).
c) Consumação e Tentativa
Nas modalidades solicitar, exigir e cobrar, o crime consuma-se
com a prática de uma dessas ações, sendo irrelevante o recebimento da
vantagem. Trata-se de crime formal.
No núcleo obter, o crime se consuma no momento em que o
agente recebe a vantagem ou sua promessa. Cuida-se de crime material.
A tentativa é admissível em todas as modalidades.
8. Corrupção Ativa (Art. 333)
a) Tipo Penal
Art.333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
Pune o CP, neste delito, a conduta do extraneus, do particular,
ou do funcionário público que não haja nesta qualidade, que oferece ou
promete vantagem indevida a funcionário público.
Conforme já ressaltado, corrupto e corruptor, a despeito de
agirem em concurso são responsabilizados cada qual por um delito. O primeiro
responde pelo crime de corrupção ativa; o segundo, pela corrupção ativa.
Cuida-se de exceção à teoria unitária.
Oferecer é colocar à disposição, apresentar. Prometer é
obrigar-se, anunciar, fazer promessa.
As observações expendidas quando da análise do crime de
corrupção passiva, às quais se remetem o leitor, são inteiramente aplicáveis ao
presente delito.
Reconhece-se que a oferta ou promessa de vantagem não
precisa ser feita diretamente ao funcionário público, podendo haver a figura
de um intermediário (STJ – HC 2.467/RJ, DJU 25/04/94; RT 542/323).
A vantagem buscada pelo agente pode ter qualquer natureza,
que não necessariamente patrimonial, pois o delito tutela primordialmente a
Administração Pública e não o patrimônio, visando ao regular funcionamento
de suas atividades e a moralidade administrativa. Apenas se exige que ela
seja indevida. Esta é a não prevista em lei, a que o funcionário não tem direito.
O delito configura-se com a oferta ou promessa, sendo
prescindível que o funcionário público a aceite. Caso ocorra a aceitação,
haverá corrupção passiva por parte do funcionário.
O termo ―funcionário público‖ deve ser interpretado nos
mesmos moldes do art. 327 do CP, incluindo os funcionários equiparados.
Se a conduta for dirigida a testemunha, perito, tradutor ou
intérprete, não haverá o crime em exame, mas o do art. 343.
A conduta do agente é dirigida ao funcionário público para
―determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício‖. Assim, não há que se
falar em corrupção ativa quando a oferta ocorre após a atuação ou omissão
voluntária do ato de ofício pelo funcionário público (RT 508/439). Ou seja,
exige o delito uma promessa anterior de recompensa (RT 792/626). Como
ensinam Noronha e Damásio, não se pune a corrupção ativa subseqüente.
Como visto anteriormente, é prescindível à configuração da
corrupção ativa que o ato funcional seja praticado, omitido ou retardado
pelo intraneus, o que constitui mero exaurimento da conduta.
No entanto, o exaurimento da conduta, na espécie, faz incidir a
causa de aumento do parágrafo único, majorando a pena em um terço.
c) Consumação e Tentativa
O crime consuma-se com a oferta ou promessa de
vantagem do extraneus ao intraneus, não sendo necessário que este a aceite,
ou mesmo que infrinja o seu dever funcional. Trata-se de crime formal.
A tentativa é admissível.
9. Contrabando ou Descaminho (Art. 334)
a) Tipo Penal
Art.334 - Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 1º Incorre na mesma pena quem:
a) pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei;
b) pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando ou descaminho;
c) vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem;
d) adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal, ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos.
§ 2º Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências.
§ 3º A pena aplica-se em dobro, se o crime de contrabando ou descaminho é praticado em transporte aéreo.
b) Elementos do Crime – Adequação Típica
Mais uma vez o CP, do mesmo modo que fez na corrupção
passiva, excepciona a teoria unitária, tipificando autonomamente as condutas
do funcionário público, que facilita o contrabando ou o descaminho, e do
terceiro que realiza o próprio contrabando ou descaminho. Com efeito,
embora exista concurso de agentes, respondem cada qual por delito
autônomo; o funcionário pela facilitação (art. 318); o terceiro, pelo crime de
contrabando ou descaminho (art. 334).
Contrabando é a importação ou exportação fraudulenta
de mercadoria, cuja entrada ou saída seja absoluta ou relativamente
proibida. Por sua vez, descaminho é o ato fraudulento que se destina a evitar,
total ou parcialmente, o pagamento de direitos e impostos previstos pela
entrada, saída ou consumo de mercadorias.
No §1° do art. 334, o CP dispõe acerca dos fatos
assemelhados a contrabando ou descaminho.
O tipo é formado pelos núcleos ―importar‖, ―exportar‖ e
―iludir‖, e pelos elementos ―mercadoria proibida‖, ―no todo ou em parte,
pagamento de direito ou imposto‖, ―devido pela entrada, pela saída ou pelo
consumo de mercadoria‖.
A primeira parte do artigo refere-se ao contrabando; a
segunda, ao descaminho.
Importar significa trazer para o país; exportar é levar para
fora do país.
Não há que se falar, assim, em contrabando ou
descaminho, quando a mercadoria de origem brasileira apenas circula no
território nacional, de um estado a outro, sem que venha a sair do país. Isto
porque é requisito à configuração do delito em exame a entrada ou saída da
mercadoria do país, conclusão que decorre das próprias condutas (importar e
exportar) previstas no tipo. Este entendimento deve ser aplicado, inclusive, na
figura do descaminho, pois a normal penal se refere a imposto ―devido pela
entrada ou pela saída ou pelo consumo‖.
Exige-se que a mercadoria seja proibida. Esta adquire esta
qualidade, por razões de ordem pública, que leva o Estado a proibi-la. Cuida-
se de norma penal em branco, que deve ser complementada por outra, de
cunho não penal, que indique quais mercadorias são proibidas. A proibição
pode ser absoluta (mercadoria proibida em si mesma) ou relativa (proibida
apenas em determinadas circunstâncias).
Na hipótese de mercadoria fabricada no Brasil e destinada
exclusivamente a exportação, tendo em vista ser proibida sua
comercialização no país, a sua posterior introdução clandestina no território
nacional, configura contrabando ou descaminho.
Diverge-se, no entanto, a jurisprudência quanto à sua
capitulação. Já se decidiu que ―a reintrodução no País de pacotes de cigarros
nacionais, fabricados exclusivamente para exportação, caracteriza o crime
de contrabando‖ (TRF 1ª Região - RT 776/695) e que ―caracteriza o crime de
contrabando e não o de descaminho a reintrodução no país de produtos de
fabricação nacional destinados, exclusivamente, à exportação e de venda
proibida no Brasil (TRF 1ª Região - RT 755/735).
No STF, porém, tem prevalecido a orientação que a
conduta constitui descaminho, na forma das alíneas ―c‖ e ―d‖ do §1° do art.
334 (RT 559/443; RTJ 100/853).
De fato, conforme ensina Damásio, ―a capitulação do fato
pode ser feita em face do caput do art. 334, uma vez que a norma fala em
‗mercadoria proibida‘ e não ‗mercadoria estrangeira‘. E também pode
adequar-se o fato às incriminações das alíneas c e d., tendo em vista a
presença da elementar ‗mercadoria de procedência estrangeira‘. Note-se
que o tipo não descreve como elemento ‗mercadoria estrangeira‘, mas
‗mercadoria de procedência estrangeira‘. Importa saber se a mercadoria,
sendo proibida, procede do exterior, tornando-se irrelevante a circunstância
de ser nacional ou estrangeira‖.
Ressalte-se que, quando a importação de determinadas
mercadorias constituir outro ilícito penal previsto em legislação penal especial,
o agente deve responder somente por este crime, o qual absorve o
contrabando ou descaminho. É o que ocorre, por exemplo, no tráfico ilícito de
entorpecentes.
No tocante ao tráfico de armas de fogo, previa a Lei n°
9.437/97 (art. 10, §2°) que, tratando-se de contrabando ou descaminho de
armas de fogo ou acessórios de uso proibido ou restrito, devia o agente ser
responsabilizado inclusive pelo crime do art. 334 do CP. Entretanto, a Lei n°
10.826/2003, que rege atualmente o tema, criou a figura do tráfico
internacional de arma de fogo (art. 18), não prevendo mais a
responsabilização criminal do agente também pelo crime de contrabando ou
descaminho.
No descaminho, a conduta é iludir, que significa empregar
fraude para evitar o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada ou
saída de mercadoria não proibida. Com efeito, iludir ―traduz idéia de enganar,
mascarar a realidade, simular, dissimular; o agente vale-se de expediente para
dar impressão de não praticar conduta tributável. Há, pois, fraude, por ação
ou omissão. No primeiro caso, ilustrativamente, procura evidenciar a
mercadoria a, como b; no segundo, se a pessoa indagada pelo agente
fazendário porta objeto tributável, figurando não compreender, deixa de
responder, ou não toma a iniciativa de evidenciar o fato‖ (RSTJ 97/423).
Ou seja, não basta a entrada ou a saída da mercadoria
sem o recolhimento do imposto devido, sendo necessário o emprego da
fraude, pois só assim se pode falar em ato capaz de ―iludir‖ a autoridade
fazendária. Ausente o meio fraudulento, a conduta caracteriza mero ilícito
fiscal.
O próprio STF já decidiu que: ―Apreensão de bagagem
depois de normalmente liberada pela fiscalização fazendária. Fraude alegada
que não se configura, pois em nenhum momento se caracterizou o dolo.
Flagrante preparado, sem qualquer indício e que tenha sido iludido o
pagamento de impostos acaso incidentes na liberação da mercadoria de
ingresso não proibido no país. Recurso provido para trancar a ação penal‖ (RT
642/366).
Sujeito ativo do delito é o particular, podendo o crime
também ser cometido por funcionário público, que não possua o dever
funcional de impedir o contrabando ou descaminho. Tendo o funcionário o
dever funcional de repressão ao contrabando ou descaminho, responderá
pelo crime de facilitação (art. 318).
Se o contrabando ou descaminho é praticado em
transporte aéreo a pena é aplicada em dobro, incidindo a causa de aumento
de pena do §3°. Justifica-se a majorante pela maior dificuldade de
fiscalização das mercadorias transportadas. Assim, entende-se que os vôos
regulares não estão incluídos na espécie, pois nestes há fiscalização
alfandegária. Portanto, a causa de aumento de pena só incide nos vôos
internacionais clandestinos. Neste sentido: Damásio, Delmanto, Bitencourt e
Capez.
c) Consumação e Tentativa
Conforme ensina Capez, é preciso distinguir duas situações:
ingresso ou saída do território nacional pelos caminhos normais; e ingresso ou
saída clandestinamente.
No primeiro caso, o contrabando consuma-se no momento
em que ultrapassada a zona fiscal, mesmo que a mercadoria não tenha
chegado ao seu destino (RT 728/511; RSTJ 54/26). O descaminho, por sua vez,
está consumado com a liberação da mercadoria pela alfândega (RT 728/511).
Na hipótese de entrada ou saída clandestina, o
contrabando e o descaminho consumam-se com a transposição da fronteira
do território nacional.
A tentativa é admissível tanto no contrabando como no
descaminho.
PROCESSO PENAL – INQUÉRITO POLICIAL
1- Inquérito Policial. Persecução criminal. Fases: investigação e processual.
a. Natureza jurídica: procedimento administrativo de cunho inquisitivo e
sigiloso, que objetiva servir de base para a denúncia ou queixa (apuração
da infração penal e de sua autoria).
b. Início: ofício ou requisição do Juiz, do MP ou de requerimento do ofendido.
- Espécie de ação penal. Identificação: artigo, capítulo ou seção. Ação
penal nos contra a honra (art. 145, parágrafo único, do CP; Súmula 714 do
STF). Lei 12.033/2009. Ação penal nos crimes contra o patrimônio (artigos 182
e 183 do CP).
- Notitia criminis: (a) cognição direta ou imediata (conhecimento direto
pela autoridade policial, por meio de suas atividades rotineiras ou
comunicação não formal. Ex: jornais, investigação realizada por subalternos
ou pela polícia ostensiva); (b) cognição indireta, mediata ou provocada
(comunicação formal da existência do delito); (c) coercitiva (prisão em
flagrante).
- Delatio criminis: qualquer do povo ou vítima. Simples: mero aviso de
ocorrência; postulatória: pedido de instauração da persecução penal.
- Delatio criminis anônima (noticia criminis inqualificada): possibilidade,
com as devidas cautelas, de acordo com a doutrina dominante e STJ (RHC
7.329-GO, DJU 04/05/1998, p. 208; HC 38.093/AM, Rel. Ministro GILSON DIPP,
QUINTA TURMA, julgado em 26.10.2004, DJ 17.12.2004 p. 589).
―Ainda que com reservas, a denúncia anônima é admitida em nosso
ordenamento jurídico, sendo considerada apta a deflagrar procedimentos
de averiguação, como o inquérito policial, conforme contenham ou não
elementos informativos idôneos suficientes, e desde que observadas as
devidas cautelas no que diz respeito à identidade do investigado‖. (HC
44.649/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 11.09.2007, DJ
08.10.2007 p. 322).
(*) O STF, no entanto, já entendeu que a ―denúncia anônima‖ não pode
servir para o (Informativo nº 475 – HC-84827 – Rel. Min. Marco Aurélio):
‖Entendeu-se que a instauração de procedimento criminal originada
apenas em documento apócrifo seria contrária à ordem jurídica
constitucional, que veda expressamente o anonimato. Salientando-se a
necessidade de se preservar a dignidade da pessoa humana, afirmou-se
que o acolhimento da delação anônima permitiria a prática do
denuncismo inescrupuloso, voltado a prejudicar desafetos, impossibilitando
eventual indenização por danos morais ou materiais, o que ofenderia os
princípios consagrados nos incisos V e X do art. 5º da CF. Ressaltou-se, ainda,
a existência da Resolução 290/2004, que criou a Ouvidoria do STF, cujo
inciso II do art. 4º impede o recebimento de reclamações, críticas ou
denúncias anônimas‖.
Na verdade, a atenta leitura dos votos proferidos no julgamento do referido
habeas corpus permite divisar que, no entendimento da Suprema Corte, a
delação anônima, desprovida de qualquer base empírica, não pode servir
de base para o início da persecução criminal. Ou seja, por si só, a notícia-
crime anônima não pode sustentar o inicio de um procedimento de
investigação. Portanto, a delação anônima não deve ser rejeitada de
plano, podendo, inclusive, sustentar o início de um IP, quando existirem
indícios da ocorrência do delito, a narrativa for séria e objetiva ou o
anonimato ter servido para evitar risco à vida do comunicante ou de sua
família, não constituindo, nestes casos, um ―denuncismo irresponsável‖, mas
uma notícia crime de deve ser investigada pela autoridade policial.
c. Indiciamento: constrangimento ilegal? Possibilidade de configuração em
caso de manifesta ilegalidade (STF: HC 86149/SP; HC 86120/SP). Diferença
entre suspeito e indiciado. Juízo de possibilidade e de probabilidade:
existência de fatores positivos indicativos da prática do delito e de sua
autoria.
- Necessidade de fundamentação – Lei nº 12.830/2013 – artigo 1º, §6º;
- Requisição de indiciamento: impossibilidade.
- Indiciado menor de 21 anos e maior de 18 anos. Nomeação de curador.
Desnecessidade.
- Agente com prerrogativa de função: o STF passou a entender
recentemente que a autoridade policial não pode indiciá-lo sem
autorização prévia do Ministro-Relator do inquérito. Na verdade, sequer
pode proceder a abertura de inquérito em que envolvido titular de
prerrogativa de foro sem a mencionada autorização. Nesse sentido: Inq
2411 QO/MT, Rel. Min. Gilmar Mendes, 10.10.2007 (Informativo n° 483).
d. Finalidade. Servir de base para a denúncia. Recebimento da denúncia:
avaliação da existência da materialidade e de indícios de autoria (Juízo de
Prelibação). Recebida a denúncia, tem-se por iniciada a ação penal,
sendo o inquérito policial mantido nos autos.
- Dispensabilidade e indisponibilidade do inquérito.
e. O inquérito policial visto como garantia do cidadão em não ser processado
sem a presença de elementos mínimos indicativos da autoria. Manutenção
no processo: constitucionalidade?
f. Atos de investigação (elementos de informação) e prova em sentido estrito.
Atos repetíveis e irrepetíveis (de contraditório diferido). A repetição do ato
necessária para a transformação do indício em prova em sentido estrito,
colhida esta última sob o crivo do contraditório. Provas técnicas: são
irrepetíveis, sendo dado a elas um contraditório diferido. O contraditório
diferido foi acolhido pela Lei n° 11.690/2008, que deu nova redação ao art.
159, §5°, do CPP: ―Art. 159. [..] §5° Durante o curso do processo judicial, é
permitido às partes, quanto à perícia: I – requerer a oitiva dos peritos para
esclarecerem a prova ou para responderem a quesitos, desde que o
mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem esclarecidas
sejam encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias,
podendo apresentar as respostas em laudo complementar; II – indicar
assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a ser
fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiência. [..]‖.
g. Condenação com base apenas nos elementos colhidos durante o IP:
impossibilidade. Aliás, cumpre destacar a nova redação ao art. 155 do CPP
(dada pela Lei n° 11.690/2008), segundo a qual ―o juiz formará sua
convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório
judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas
cautelares, não repetíveis e antecipadas‖.
h. Contraditório e ampla defesa. Inexistência. Exceções: inquérito judicial na
falência (não existe mais – Lei 11.101/2005); expulsão de estrangeiro (art. 71
da Lei nº 6.815/80 c/c art. 103, §§4º a 7º do Dec. 86.715/81 – Regulamento
único caso – esgota-se em si mesmo).
i. Sigilo: Art. 20 do CPP. Sigilo externo (publicidade versus intimidade, honra e
imagem dos investigados) e interno (investigado e seu advogado).
j. Sigilo frente ao advogado. Art. 20 do CPP versus art. 7º, inciso XIV, Lei nº
8.906/94.
O STF, colocando uma pá de cal sobre o tema, em sessão realizada no
dia 3.2.2009, resolveu editar a Súmula Vinculante nº 14, com o seguinte teor:
―É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo e
irrestrito aos elementos de prova que, já documentado em procedimento
investigatório, realizado por órgão de competência de polícia judiciária,
digam respeito ao exercício do direito de defesa‖.
Consequências do descumprimento do direito de acesso aos autos do
IP: Súmula 523 do STF: falta de defesa. Posição dominante: mera
irregularidade, pois vícios do IP não contaminam a ação penal.
k. Vícios. Repercussão no processo. Inexistência. Repercute:
- Prisão cautelar: relaxamento.
- Prova ilícita. Repercussão. Desentranhamento. STF: HC 73.271-2; STJ: RHC
12.717.
l. Identificação criminal: conflito entre art. 5º, LVIII, CF versus art. 6º, VIII, do CP
e Súmula 568 do STF. Regulamentação: Lei nº 10054/00 (atualmente
revogada pela Lei nº 12.037/2009). Sem identificação civil (prazo de 48
horas para apresentá-la); civilmente identificado: hipóteses (a) crimes:
homicídio doloso, contra o patrimônio cometidos mediante violência ou
grave ameaça à pessoa, receptação qualificada, contra a liberdade
sexual ou de falsificação de documentos públicos; (b) suspeita de
falsificação ou adulteração do documento; (c) má conservação do
documento ou distância temporal da expedição do documento; (d)
existência de outros nomes em registros que impossibilitem a completa
identificação do indiciado; (e) existência de registro de extravio do
documento. Nova hipótese: Lei n° 11.340/2006 – art. 12, inciso VI (violência
doméstica). De acordo a Lei nº 12.037/2009, o civilmente identificado (art.
2º) não será submetido à identificação criminal, salvo nos casos previstos
em seu art. 3º, quais sejam: ―Art. 3º [...] I – o documento apresentar rasura ou
tiver indício de falsificação; II – o documento apresentado for insuficiente
para identificar cabalmente o indiciado; III – o indiciado portar documentos
de identidade distintos, com informações conflitantes entre si; IV – a
identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo
despacho da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou
mediante representação da autoridade policial, do Ministério Público ou da
defesa; V – constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes
qualificações; VI – o estado de conservação ou a distância temporal ou da
localidade da expedição do documento apresentado impossibilite a
completa identificação dos caracteres essenciais‖.
m. Nemo tenetur se detegere. Participação em reprodução simulada de
crime. Acareação. Fornecimento de padrões de escrito para exame
grafológico. Recusa. Possibilidade. Hipóteses não alcançáveis pelo direito
ao silêncio: - interrogatório de qualificação; - exame de reconhecimento de
pessoas; e – identificação criminal.
n. Maus antecedentes. IP em andamento. Doutrina e STJ e STF impossibilidade.
Súmula 444 do STJ . Questão submetida ao Plenário do STF (RE 595519).
o. Incomunicabilidade: conflito entre art. 136, §3º, CF versus art. 21 do CPP.
Impossibilidade. Divergência. Com o advogado: impossibilidade.
p. Encerramento: relatório da autoridade policial. Prazo.
- Réu preso: regra: 10 dias, contados da data da prisão (em flagrante ou
preventiva) ou do término da prisão temporária. Exceções: Justiça federal:
15 dias prorrogáveis por mais 15 (art. 66 da Lei nº 5.010/66); Nova lei de
drogas - Lei nº 11.343/2006 – de acordo com a lei, os crimes definidos no
Capítulo II da novatio legis (artigos 33 a 39) deverão se encerrar em 30 dias,
se o réu estiver preso, e 90 dias, se solto, prorrogáveis, em ambos os casos,
por igual período (art. 51).
- Prazo penal ou processual penal? Posição dominante: penal.
- Réu solto: regra: 30 dias, prorrogáveis; exceção: crime contra economia
popular: 10 dias (art. 10, §1º, Lei nº 1.521/51).
(*) Crime sujeito à ação penal privada: emprego da analogia.
(*) Descumprimento do prazo: relaxamento da prisão. Não repercute,
porém, na ação penal ou mesmo na validade do IP. Denúncia já oferecida:
superação do constrangimento.
q. Destino do IP.
- Crime sujeito à ação penal pública: imediato: MP; mediato: juiz.
- Crime sujeito à ação penal privada: encaminhamento ao juízo
competente, onde aguardarão providência do ofendido (art. 19 do CPP).
r. Providências do destinatário.
- Juiz: remete os autos ao MP (ação penal pública) ou aguarda
providência do ofendido (ação penal privada).
- Vítima (ação penal privada): oferecer queixa, requisitar diligências ou
requerer o arquivamento (neste caso, o pedido equivale a renúncia,
devendo ser obrigatoriamente atendido pelo juiz).
- Ministério Público: no prazo legal (réu preso: 5 dias; réu solto: 15 dias),
deve: oferecer denúncia, requisitar diligências ou requerer o arquivamento.
(*) Descumprimento do prazo: conseqüências: oportunidade da vítima
oferecer a queixa subsidiária, relaxamento da prisão. Ação privada:
relaxamento da prisão (não repercute no processo, pois só há perempção
quando se tem por iniciada a ação penal).
2- Arquivamento do IP. Ação penal pública.
a. Sujeitos: MP (requer) e Juiz (determina o arquivamento). Delegado de
polícia: impossibilidade. Arquivamento de ofício pelo juiz ou delegado de
polícia: impossibilidade.
b. Razões de arquivamento:
- inexistência de base empírica para a denúncia (ausência de provas);
- atipicidade do fato. Princípio da insignificância. STJ: possibilidade (RHC
18.099/SC, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, Sexta Turma, julgado em
07.03.2006, DJ 27.03.2006 p. 333).
- extinção da punibilidade. Causas extintivas: art. 107 do CP (rol
exemplificativo).
(*) Prescrição antecipada (retroativa, em perspectiva, projetada).
Impossibilidade. STF e STJ. Doutrina.
- excludente de antijuricidade. Divergência: doutrina e jurisprudência.
- excludente de culpabilidade. Impossibilidade para o entendimento
dominante.
- ausência de condição de procedibilidade.
c. Decisão de arquivamento e coisa julgada:
- Regra: não faz. Desarquivamento. Súmula 524 do STF e art. 18 do CPP.
Novas provas. Novas pesquisas. Procedimento. Procurador-Geral ou
decisão do Juiz.
- Exceção: faz coisa julgada. Nem novas provas são capazes de fazer
ressurgir o inquérito policial. Hipóteses:
(1) Atipicidade do fato: mesmo em caso de decisão proferida por juiz
absolutamente incompetente (STF: HC 83346/SP); reconhecida a
atipicidade em razão do princípio da insignificância, mesmo em caso de
equívoco na apuração do valor do tributo (STJ - RHC 18.099/SC, Rel. Min.
Hélio Quaglia Barbosa, Sexta Turma, julgado em 07.03.2006, DJ 27.03.2006 p.
333).
(2) Extinção da punibilidade: mesmo em caso de nova qualificação
acerca dos mesmos fatos, ocasionando um novo prazo prescricional,
impede nova persecução, ainda que surjam novas provas (STF: HC
84253/RO). Mesmo em caso de reconhecimento da prescrição em
perspectiva.
(*) Morte do agente e certidão de óbito falsa. Possibilidade de
desarquivamento. Fato falso. STF (HC 84525/MG).
(*) Excludente de ilicitude: não faz coisa julgada (REsp 738.338/PR, Rel.
Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 25.10.2005, DJ 21.11.2005 p.
292; RHC 16.788/SC, Rel. Min. Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em
02.12.2004, DJ 09.02.2005 p. 204). Ou seja, novas provas são capazes de
proporcionar o desarquivamento do IP, bem como o ajuizamento da ação
penal.
(*) Nova posição do STJ: faz coisa julgada, ainda que prolatada por juiz
absolutamente incompetente. Confira:
―RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA
AÇÃO PENAL. ARQUIVAMENTO DO FEITO. RECONHECIMENTO DE CAUSA
EXCLUDENTE DE ILICITUDE. DECISÃO PROFERIDA POR JUÍZO ABSOLUTAMENTE
INCOMPETENTE. INSTAURAÇÃO DE AÇÃO PENAL PERANTE O JUÍZO
COMPETENTE. IMPOSSIBILIDADE. COISA JULGADA. PRECEDENTES.
1. A teor do entendimento pacífico desta Corte, o trancamento da ação
penal pela via de habeas corpus é medida de exceção, que só é
admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência
do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.
Precedentes do STJ.
2. No caso, resta evidenciada essa excepcionalidade. O arquivamento do
inquérito policial no âmbito da Justiça Militar se deu em virtude da
promoção ministerial no sentido da incidência de causa excludente de
ilicitude.
3. Embora o inquérito policial possa ser desarquivado em face de novas
provas, tal providência somente se mostra cabível quando o arquivamento
tenha sido determinado por falta de elementos suficientes à deflagração
da ação penal, o que não se verifica na espécie. Precedentes.
4. Ainda que se trate de decisão proferida por juízo absolutamente
incompetente, nos termos do disposto no art. 9.º do Código Penal Militar,
porquanto praticado por militar fora do exercício da função, produz coisa
julgada material.
5. Recurso conhecido e provido para determinar o trancamento da ação
penal n.º 200420500013, em trâmite na 5.ª Vara Criminal do Tribunal do Júri
da Comarca de Aracajú/SE.
(RHC 17.389/SE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em
20.11.2007, DJe 07.04.2008).
STF: não faz. Confira: Informativo nº 538. ―A Turma, por maioria, indeferiu
habeas corpus no qual pleiteado o trancamento de ação penal
instaurada a partir do desarquivamento de inquérito policial, em que
reconhecida excludente de ilicitude. No caso, o citado inquérito apurava
homicídio imputado ao paciente, delegado de polícia, e a outros policiais,
sendo arquivado a pedido do Ministério Público do Estado do Espírito
Santo, que reputara configurado o estrito cumprimento do dever legal.
Passados dez anos da decisão judicial, fora instalado, pelo parquet, o
Grupo de Trabalho para Repressão ao Crime Organizado - GRCO naquela
unidade federativa — que dera origem, posteriormente, a Comissões
Parlamentares de Inquérito em âmbito estadual e nacional —, cujos
trabalhos indicariam que o paciente e os demais policiais não teriam agido
em estrito cumprimento do dever legal, mas sim supostamente executado
a vítima (―queima de arquivo‖). A partir disso, novas oitivas das mesmas
testemunhas arroladas no inquérito arquivado foram realizadas e o órgão
ministerial, concluindo pela caracterização de prova substancialmente
nova, desarquivara aquele procedimento, o que fora deferido pelo juízo
de origem e ensejara o oferecimento de denúncia. A impetração alegava
que o arquivamento estaria acobertado pelo manto da coisa julgada
formal e material, já que reconhecida a inexistência de crime, incidindo o
Enunciado 524 da Súmula do STF (―Arquivado o inquérito policial, por
despacho do Juiz, a requerimento do Promotor de Justiça, não pode a
ação penal ser iniciada, sem novas provas.‖).[...] No mérito, também por
maioria, denegou-se a ordem. Aduziu-se que a jurisprudência da Corte
seria farta quanto ao caráter impeditivo de desarquivamento de inquérito
policial nas hipóteses de reconhecimento de atipicidade, mas não
propriamente de excludente de ilicitude. Citando o que disposto no
aludido Verbete 524 da Súmula, enfatizou-se que o tempo todo fora
afirmado, desde o Ministério Público capixaba até o STJ, que houvera
novas provas decorrentes das apurações. Ademais, observou-se que essas
novas condições não afastaram o fato típico, o qual não fora negado em
momento algum, e sim a ilicitude que inicialmente levara a esse pedido de
arquivamento. Vencidos os Ministros Menezes Direito e Marco Aurélio que
deferiam o habeas corpus por considerar que, na espécie, ter-se-ia coisa
julgada material, sendo impossível reabrir-se o inquérito
independentemente de outras circunstâncias. O Min. Marco Aurélio
acrescentou que nosso sistema convive com os institutos da justiça e da
segurança jurídica e que, na presente situação, este não seria observado
se reaberto o inquérito, a partir de preceito que encerra exceção (CPP, art.
18).
HC 95211/ES, rel. Min. Cármen Lúcia, 10.3.2009. (HC-95211)‖.
d. Concordância do pedido. Arquivamento direto (explícito).
e. Discordância do pedido. Aplicação do art. 28 do CPP. Princípio da
devolução. Transferência da palavra final do Poder Judiciário ao Chefe do
MP (ou Câmara de Revisão). Promotor designado: longa manus,
obrigatoriedade de denunciar (entendimento dominante).
f. Arquivamento em Feitos de Competência Originária. Revisão da decisão do
Procurador-Geral. Colégio de Procuradores de Justiça (art. 12, inciso XI, Lei
n° 8.625/93) ou Câmara de Coordenação (Lei Complementar n° 75/93).
(*) Pedido realizado pelo próprio Procurador-Geral (Justiça ou da
República). Atendimento compulsório? Doutrina e jurisprudência. STF: Pet
3297; 3197; INQ 1538. Nova posição. Só há atendimento compulsório nas
hipóteses em que o arquivamento não faz coisa julgada (falta de base
empírica para a denúncia). Requerido o arquivamento com base na
atipicidade do fato ou em causa extintiva da punibilidade, o STF entende
que o Tribunal deve avaliar o pedido. Discordância do tribunal:
providências?
(*) O STJ, porém, vem mantendo a mesma posição entendendo que o
pedido de arquivamento, realizado pelo Procurador-Geral de Justiça (ou
por outro membro agindo em seu nome) em feitos de competência
originária dos tribunais é de atendimento compulsório. Nesse sentido: HC
64.564/GO, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em
13.03.2007, DJ 09.04.2007 p. 259.
g. Inquérito Policial Legislativo. Deve ser obervado o Regimento Interno.
TÍTULO IX
DA ADMINISTRAÇÃO E DA ECONOMIA INTERNA
CAPÍTULO III
DA POLÍCIA DA CÂMARA
Art. 267. A Mesa fará manter a ordem e a disciplina nos edifícios da Câmara e suas adjacências.
Parágrafo único. (Revogado pela Resolução nº 25, de 2013)
Art. 268. Se algum Deputado, no âmbito da Casa, cometer qualquer excesso que deva ter repressão
disciplinar, o Presidente da Câmara conhecerá do fato e requisitará à Corregedoria Parlamentar a
abertura de sindicância ou inquérito destinado a apurar responsabilidades e propor sanções
cabíveis. (Artigo com redação dada pela Resolução nº 25, de 2013)
Art. 269. Quando, nos edifícios da Câmara, for cometido algum delito, instaurar-se-á inquérito
a ser presidido pelo diretor de serviços de segurança ou, se o indiciado ou o preso for membro
da Casa, pelo Corregedor ou Corregedor substituto.
§ 1º Serão observados, no inquérito, o Código de Processo Penal e os regulamentos policiais
do Distrito Federal, no que lhe forem aplicáveis.
§ 2º A Câmara poderá solicitar a cooperação técnica de órgãos policiais especializados ou
requisitar servidores de seus quadros para auxiliar na realização do inquérito.
§ 3º Servirá de escrivão funcionário estável da Câmara, designado pela autoridade que
presidir o inquérito.
§ 4º O inquérito será enviado, após a sua conclusão, à autoridade judiciária competente.
§ 5º Em caso de flagrante de crime inafiançável, realizar-se-á a prisão do agente da infração,
que será entregue com o auto respectivo à autoridade judicial competente, ou, no caso de
parlamentar, ao Presidente da Câmara, atendendo-se, nesta hipótese, ao prescrito nos
arts. 250 e 251.
Art. 270. O policiamento dos edifícios da Câmara e de suas dependências externas, inclusive de blocos
residenciais funcionais para Deputados, compete, privativamente, à Mesa, sob a suprema direção do
Presidente, sem intervenção de qualquer outro Poder.
Parágrafo único. Este serviço será feito, ordinariamente, com a segurança própria da Câmara ou por esta
contratada e, se necessário, ou na sua falta, por efetivos da polícia civil e militar do Distrito Federal,
requisitados ao Governo local, postos à inteira e exclusiva disposição da Mesa e dirigidos por pessoas
que ela designar.
Art. 271. Excetuado aos membros da segurança, é proibido o porte de arma de qualquer espécie nos
edifícios da Câmara e suas áreas adjacentes, constituindo infração disciplinar, além de contravenção, o
desrespeito a esta proibição.
Parágrafo único. Incumbe ao Corregedor, ou Corregedor substituto, supervisionar a proibição do porte
de arma, com poderes para mandar revistar e desarmar.
Art. 272. Será permitido a qualquer pessoa, convenientemente trajada e portando crachá de
identificação, ingressar e permanecer no edifício principal da Câmara e seus anexos durante o
expediente e assistir das galerias às sessões do Plenário e às reuniões das Comissões.
Parágrafo único. Os espectadores ou visitantes que se comportarem de forma inconveniente, a juízo do
Presidente da Câmara ou de Comissão, bem como qualquer pessoa que perturbar a ordem em recinto da
Casa, serão compelidos a sair, imediatamente, dos edifícios da Câmara.
Art. 273. É proibido o exercício de comércio nas dependências da Câmara, salvo em caso de expressa
autorização da Mesa.
___________________________________________________________________________________
____________________
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão:
I - desde a expedição do diploma:
a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública,
sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato
obedecer a cláusulas uniformes;
b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis ad
nutum , nas entidades constantes da alínea anterior;
II - desde a posse:
a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato
com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada;
b) ocupar cargo ou função de que sejam demissíveis ad nutum , nas entidades referidas no inciso I, a ;
c) patrocinar causa em que seja interessada qualquer das entidades a que se refere o inciso I, a ;
d) ser titulares de mais de um cargo ou mandato público eletivo.
Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior;
II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;
III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa
a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;
IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;
V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;
VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.
§ 1º É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso
das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens
indevidas.
§ 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou
pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou
de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
§ 3º Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de
ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros ou de partido político representado no
Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
§ 4º A renúncia de parlamentar submetido a processo que vise ou possa levar à perda do mandato, nos
termos deste artigo, terá seus efeitos suspensos até as deliberações finais de que tratam os §§ 2º e
3º. (Parágrafo acrescido pela Emenda Constitucional de Revisão nº 6, de 1994)
5- Da prisão preventiva.
a. Competência (art. 311 do CPP):
(1) Anteriormente à Lei 12.403/2011: só o juiz, de ofício (só durante a
instrução criminal, de acordo com a doutrina dominante) ou a
requerimento (no curso do IP ou da instrução criminal). Todavia, nos
termos do art. 311 do CPP, pode ser determinada de ofício pelo juiz
mesmo durante o IP. Violação ao sistema acusatório? Divergência
na doutrina e na jurisprudência.
(2) Após a Lei 12.403/2011: vedou-se a decretação, de ofício, da
prisão preventiva no curso do inquérito, só o permitindo durante a
ação. Desse modo, a segregação no curso do inquérito só será
cabível se for precedida de provocação dos legitimados.
Não se pode esquecer, por outro lado, que o inciso II do art. 310
(redação dada pela Lei nº 12.403/2011) permite ao magistrado, no
caso de prisão em flagrante, a conversão desta em preventiva. E
esta conversão, por certo, poderá ser efetivada de ofício, presentes
os requisitos do art. 312 (v. item 9.1).
Na verdade, a Lei nº 12.403/2011 criou três espécies (tipos,
modalidades ou formas de decretação) de prisão preventiva: -
inicial, autônoma ou originária; - convertida ou derivada; e -
substitutiva de outra medida cautelar descumprida.
A primeira (inicial) encontra-se prevista no art. 311, e não poderá ser
decretada de ofício no curso do inquérito, só se admitindo a sua
decretação, nessa fase da persecução, se houver requerimento do
Ministério Público ou do querelante ou representação da autoridade
policial.
Por sua vez, a derivada (convertida do flagrante) tem seu berço no
inciso II do art. 310. Aqui, não se veda ao magistrado a conversão,
de ofício, do flagrante em prisão preventiva.
Finalmente, a prisão preventiva substitutiva de outra medida cautelar
não cumprida decorre do parágrafo único do art. 312 e do §4º do
art. 282 do CPP. Neste caso, entendemos não ser possível a
decretação no curso do inquérito sem que haja provocação, diante
da inteligência do §2º do art. 282, segundo o qual ―as medidas
cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento
das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por
representação da autoridade policial ou mediante requerimento do
Ministério Público‖. Ademais, a decretação de ofício da cautelar,
neste caso, ofenderia, a nosso ver, o sistema acusatório.
Portanto, no regime instituído pela Lei nº 12.403/2011, só será válida a
decretação de ofício da preventiva, no curso do inquérito policial,
quando decorrer da conversão do flagrante, na forma do inciso II do
art. 310 do CPP, vedando-se a prisão preventiva inicial e da
substitutiva de outra medida cautelar descumprida, nesta fase da
persecução penal, sem que o magistrado seja provocado. Questão
relevante: recebendo o auto de prisão em flagrante, poderá o
magistrado relaxar a prisão (por considerá-la ilegal) e no mesmo ato
e, de ofício, decretar a prisão preventiva?
b. Legitimidade e momento de decretação (art. 311 do CPP):
(1) Anteriormente a Lei 12.403/2011: delegado de polícia (no IP) ou
promotor de justiça (no IP ou na instrução criminal) ou do querelante
(no IP ou na instrução criminal). Decretação na fase recursal?
Possibilidade, pois o termo deve ser entendido como processo. Prisão
decorrente de sentença condenatória recorrível ou de pronúncia:
possibilidade. Razão histórica: o CPP, em sua redação original, previa
a decretação automática da prisão cautelar quando o réu era
condenado na primeira instância. Tornava-se, deste modo,
desnecessária a decretação da prisão preventiva, após a sentença
condenatória. A discussão perdeu importância com a Lei
11.719/2008, a qual, dando nova redação ao art. 387, parágrafo
único, do CPP, permitiu a decretação da prisão preventiva no
momento da prolação da sentença condenatória.
(2) Após a Lei 12.403/2011: o assistente passou também a ter
legitimação para requerer a prisão preventiva. Evidente que essa
possibilidade restringe-se ao curso da ação penal, porque a
assistência, em processo penal, não é admitida no curso do
inquérito, mas apenas no curso da lide. A prisão pode ser decretada
em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal.
c. Requisitos: subdividem-se em pressupostos (prova da existência do
crime e indícios suficientes de autoria), o chamado fumus comissi
delicti, e em fundamentos (garantia da ordem pública, da ordem
econômica, da conveniência da instrução criminal e da garantia da
aplicação da lei penal), isto é, no periculum libertatis.
(1) Pressupostos: trata-se do chamado fumus comissi delicti,
caracterizado pela prova da existência do crime (materialidade do
fato) e pelos indícios suficientes de autoria (são cumulativos). A partir
da Lei nº 12.403/2011, foi criado um terceiro pressuposto para a
decretação da prisão cautelar, qual seja a impossibilidade de sua
substituição por outra medida cautelar menos gravosa prevista no
art. 319 do CPP, evidenciando-se o espírito da nova legislação de
colocar a prisão no seu devido lugar, como medida de exceção.
- Pedido de novas diligências no curso de IP e indiciado preso: a
prisão torna-se ilegal, devendo ser revogada, pois, se ainda não há
indícios de autoria suficientes para a denúncia, também não há
para a manutenção da custódia cautelar.
(2) Fundamentos: cuida-se do periculum libertatis, consubstanciado
na garantia da ordem pública, da ordem econômica, da
conveniência da instrução criminal e da garantia da aplicação da
lei penal (são alternativos). A Lei 12.403/2011 criou um quinto
fundamento apto a decretação da preventiva, consistente no
descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de
outras medidas cautelares alternativas à prisão (art. 319), quando da
impossibilidade de substituição ou cumulação destas com outras
(art. 282, §4º).
- Garantia da ordem pública. Neste ponto, a prisão cautelar possui
mais um cunho social do que propriamente cautelar, pois cerceia
um direito individual para proteger a coletividade. Aspectos:
(*) Gravidade do crime (genérica ou abstrata): impossibilidade: STJ -
HC 39.879/PA, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, julgado em
16.05.2006, DJ 01.08.2006 p. 550.
(*) Gravidade concreta (específica): a jurisprudência permite a
prisão cautelar quando fundada na chamada ―gravidade
concreta‖ do delito, que faz denotar a periculosidade em concreto
do agente. São situações nas quais a ação do agente (modus
operandi) transcende à conduta descrita no tipo penal, fazendo
surgir a necessidade da prisão como garantia da ordem pública.
Assim, por exemplo, se não se pode prender cautelarmente alguém
pelo só fato de estar sendo acusado de um crime de latrocínio
(gravidade genérica), é possível a segregação quando o agente
tiver, por exemplo, matado a vítima, que não oferecia resistência à
subtração, esquartejada. Ou seja, o caso concreto serviu para
demonstrar a periculosidade do agente, surgindo a necessidade da
prisão. Nesse sentido: HC 120.108/ES, Rel. Ministra Jane Silva
(Desembargadora Convocada do TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado em
23/06/2009, DJe 10/08/2009; HC 112.329/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz,
Quinta Turma, julgado em 26/05/2009, DJe 15/06/2009. O STF tem a
mesma posição, conforme se vê na seguinte decisão:
Prisão Preventiva e Fundamentação
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que pronunciado por 2 homicídios qualificados e lesão corporal de
natureza grave alegava falta de motivação da prisão cautelar contra ele decretada. Pleiteava o direito de aguardar em
liberdade até a conclusão do processo-crime e aduzia que a gravidade em abstrato do delito não justificaria a sua
custódia. Reputou-se que a justificativa da garantia da ordem pública seria apta para sustentar o decreto de prisão
preventiva do paciente, mantido pela sentença de pronúncia. Realçou-se a dificuldade de formulação conceitual
para a expressão “ordem pública” e consignou-se que, quando a situação for de evidente necessidade de
acautelamento do meio social, não haveria como rejeitar-se a aplicabilidade do conceito de ordem pública.
Entendeu-se, no caso, que o juízo processante — ao fazer a identificação entre a necessidade de preservação da
ordem pública e o resguardo do meio social — dera razões capazes de atestar a evidente necessidade de
acautelamento do meio social, tendo em conta o contexto empírico da causa, o qual revelaria a gravidade
concreta — periculosidade — da conduta protagonizada pelo paciente, de violência incomum. Nesse sentido,
enfatizou-se que sempre que sobressair da forma de execução do crime a extrema periculosidade do fato
increpado ao agente, confere-se, ao decreto de prisão, a possibilidade de estabelecer um vínculo funcional entre
o modus operandi do suposto delito e a garantia da ordem pública. Por fim, assinalou-se que o decreto
prisional, além de apontar o paciente como investigado em vários outros crimes, encontraria apoio, ainda, na
fuga do acusado logo após o cometimento do delito, a demonstrar o intento de se frustrar a aplicação da lei
penal. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ para relaxar a prisão ao fundamento de que as premissas
lançadas pelo juízo não seriam enquadráveis no art. 312 do CPP, porquanto apenas aludiriam à gravidade da
imputação, à periculosidade do paciente (sem antecedentes criminais) e a sua fuga do distrito da culpa. Ademais,
salientando que a custódia provisória já extravasara o período de 2 anos, considerava configurado o excesso de prazo.
HC 97688/MG, rel. Min. Carlos Britto, 27.10.2009 (Informativo nº 565).
(*) Crime hediondo: só se presentes os pressupostos e os
fundamentos da cautelar, de acordo com a doutrina. A gravidade
do crime, conforme se viu, não serve, por si só, para justificar a prisão.
(*) Clamor popular: impossibilidade. O Poder Judiciário ficaria a
mercê da mídia sensacionalista.
(*) Credibilidade da justiça: divergência – possibilidade: HC 89143/PR
– Rel. Min. Ellen Gracie - Julgamento: 10/06/2008; Órgão Julgador:
Segunda Turma - DJe-117 DIVULG 26-06-2008 PUBLIC 27-06-2008;
HC 92848 / PR - Rel. Min. Ellen Gracie - Julgamento: 10/06/2008;
Órgão Julgador: Segunda Turma - DJe-157 DIVULG 21-08-2008
PUBLIC 22-08-2008; STJ: HC 109.563/GO, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 07/10/2008, DJe
28/10/2008 – impossibilidade: HC 93315/BA – Rel. Min. Cezar Peluso;
Julgamento: 27/05/2008; Órgão Julgador: Segunda Turma; DJe-117
DIVULG 26-06-2008 PUBLIC 27-06-2008; HC 93641/RJ – Rel. Min. Eros
Grau - Julgamento: 20/05/2008; Órgão Julgador: Segunda Turma;
DJe-152 DIVULG 14-08-2008 PUBLIC 15-08-2008.
(*) periculosidade concreta do acusado – evitar a reiteração da
prática de atos criminosos: possibilidade. Crítica garantista.
(*) Folha de antecedentes penais: é comumente utilizada na prática
para justificar o decreto de prisão, fundado na garantia da ordem
pública. Nesse sentido: STJ - HC 119.391/CE, Rel. Ministra MARIA
THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 31/05/2011, DJe
08/06/2011; HC 184.321/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 31/05/2011, DJe 27/06/2011. A
questão, entretanto, é divergente, pois existem decisões no sentido
contrário, inadmitindo o tão só uso dos antecedentes penais para
fundamentar a decretação da prisão preventiva. Confira as
seguintes decisões:
CRIMINAL. HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE ROUBO QUALIFICADO. QUADRILHA. APELO EM
LIBERDADE NEGADO. MANUTENÇÃO DA ORDEM PÚBLICA. CREDIBILIDADE DA JUSTIÇA.
ARGUMENTO QUE NÃO SE PRESTA A RESPALDAR A CUSTÓDIA. GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI
PENAL. POSSIBILIDADE DE FUGA. MERA CONJECTURA. MAUS ANTECEDENTES. MOTIVAÇÃO
INIDÔNEA. RÉU QUE PERMANECEU SOLTO DURANTE A INSTRUÇÃO CRIMINAL. REGULAR
ANDAMENTO DO FEITO. APRESENTAÇÃO ESPONTÂNEA. NECESSIDADE DA SEGREGAÇÃO NÃO
DEMONSTRADA. ORDEM CONCEDIDA.
[...]
V. A Terceira Seção desta Corte pacificou o entendimento no sentido de que a suposta configuração de maus
antecedentes, e até mesmo de reincidência, por si só, não basta para respaldar a decretação de prisão cautelar quando
da prolação de sentença condenatória, sendo indispensável a presença de concreta fundamentação para o óbice ao
direito de apelar em liberdade, com base nos pressupostos exigidos para a prisão preventiva, na hipótese de o réu ter
permanecido solto durante a instrução processual, sem ter criado qualquer obstáculo ao regular andamento do feito.
Precedentes.
[...]
VII. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.
(HC 183.426/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe 01/02/2011).
Informativo 559 - Prisão Cautelar e Fundamentação
A mera sujeição de alguém a simples investigações policiais ou a persecuções criminais ainda em curso não basta, por
si só, para justificar a decretação de prisão cautelar. Ao aplicar esta orientação, a Turma concedeu habeas corpus para
invalidar decreto de prisão exarado contra a paciente fundamentado na existência de inquéritos e procedimentos
penais que tramitam em seu desfavor. Assentou-se que a prisão processual, de ordem meramente cautelar, mesmo que
mantida ou decretada em sentença condenatória recorrível, tem, como pressuposto legitimador, a existência de
situação de real necessidade — não configurada na espécie —, apta a ensejar, ao Estado, quando efetivamente
ocorrente, a adoção — sempre excepcional — dessa medida constritiva de caráter pessoal. Ressaltou-se que a
submissão de uma pessoa a meros inquéritos policiais — ou, ainda, a persecuções criminais de que não haja derivado,
em caráter definitivo, qualquer título penal condenatório — não se reveste de suficiente idoneidade jurídica para
autorizar a formulação, contra o indiciado ou o réu, de juízo (negativo), em ordem a recusar, ao que sofre persecutio
criminis, o acesso a determinados benefícios legais. Observou-se que tal entendimento — que se revela compatível
com a presunção constitucional juris tantum de inocência (CF, art. 5º, LVII) — ressalta, com apoio na jurisprudência
dos tribunais, que processos penais em curso, ou inquéritos policiais em andamento ou, até mesmo, condenações
criminais ainda sujeitas a recurso não podem ser considerados, enquanto episódios processuais suscetíveis de
pronunciamento judicial absolutório, como elementos evidenciadores ou justificadores da restrição ou supressão do
direito de permanecer em liberdade.
HC 100091/RJ, rel. Min. Celso de Mello, 15.9.2009. (HC-100091)
(*) Folha de antecedentes infracionais (menor): também vem sendo
utilizada em casos excepcionais, em razão da idade do agente. Por
exemplo, réu com dezoito anos, primário e portador de bons
antecedentes, possuindo, no entanto, várias passagens por atos
infracionais. Confira:
HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. ROUBO DUPLAMENTE AGRAVADO. EXISTÊNCIA DE
ANOTAÇÃO PELO COMETIMENTO DE ATO INFRACIONAL. INCLINAÇÃO PARA A PRÁTICA DELITIVA.
GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. SEGREGAÇÃO JUSTIFICADA E NECESSÁRIA. CONDIÇÕES
PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO.
1. Embora atos infracionais não possam ser considerados como maus antecedentes e nem se prestem para induzir a
reincidência, tais elementos demonstram a inclinação para a prática delitiva, o que, por si só, é suficiente para
justificar a medida constritiva antecipada, a bem da ordem pública, a fim de evitar-se a reiteração.
2. Condições pessoais, mesmo que realmente favoráveis, em princípio, não têm o condão de, por si sós, garantirem a
revogação da preventiva, se há nos autos elementos suficientes a demonstrar a imprescindibilidade da sua
continuação, como ocorre na hipótese.
3. Ordem denegada.
(HC 156.329/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 27/04/2010, DJe 24/05/2010)
(*) proteger a integridade física de terceiros: possibilidade.
(*) preservação da integridade física do preso: impossibilidade. No
entanto, confira a seguinte ementa deste julgado o STF:
“3. Quanto ao requisito da garantia da ordem pública, em linhas
gerais e sem qualquer pretensão de exaurir todas as possibilidades
normativas de sua aplicação judicial, destaco as seguintes
circunstâncias principais: i) a necessidade de resguardar a
integridade física do próprio paciente ou dos demais cidadãos; ii) o
imperativo de impedir a reiteração das práticas criminosas, desde
que tal objetivo esteja lastreado em elementos concretos expostos
fundamentadamente no decreto de custódia cautelar; e iii) para
assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial do
Poder Judiciário, quanto à visibilidade e transparência de políticas
públicas de persecução criminal e desde que diretamente
relacionadas com a adoção tempestiva de medidas adequadas e
eficazes associadas à base empírica concreta que tenha ensejado a
custódia cautelar. Precedentes: HC nº 82.149/SC, 1ª Turma, unânime,
Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 13.12.2002; HC nº 82.684/SP, 2ª Turma,
unânime, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 1º.08.2003; HC nº
83.157/MT, Pleno, unânime, rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 05.09.2003;
e HC nº 84.680/PA, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de
15.04.2005.” (HC 89090/GO – Rel. Min. Gilmar Mendes - Julgamento:
21/11/2006; Órgão Julgador: Segunda Turma – DJe-117 DIVULG 04-
10-2007 PUBLIC 05-10-2007).
- Garantia da ordem econômica: quando a conduta tenha por
objeto ou possa limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a
livre concorrência ou a livre iniciativa; dominar mercado relevante
de bens ou serviços; aumentar arbitrariamente os lucros; e exercer de
forma abusiva posição dominante.
- Conveniência da instrução criminal: visa a obstar que o criminoso
desapareça com provas do crime, seja apagando vestígios, seja
subornando, aliciando ou ameaçando testemunhas. Deve apoiar-se
em fatos concretos e não em meras suposições. Cabe lembrar que o
acusado não é obrigado a colaborar com a investigação ou
produção de provas, em razão da consagração do princípio nemo
tenetur se detegere. Pode, portanto, portar-se de maneira passiva na
instrução sem que isso implique na sua prisão. O que lhe é vedado é
a atuação ativa, com o fito de destruir provas.
- Garantir a aplicação da lei penal: quando houver risco de fuga do
sujeito. Conforme decidido pelo STF, a simples fuga do acusado do
distrito da culpa, tão logo descoberto o crime praticado, já justifica o
decreto de prisão preventiva (RT 497/403). Porém, a decisão não
pode ser fundada na condição econômica do acusado, seja ele
mais ou menos abastado. Ademais, a ausência de documento
comprobatório de residência não pode servir, por si só, para a
decretação ou manutenção da prisão sob a justificativa de ser
necessária a segregação para assegurar a aplicação da lei penal.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, em recente decisão
noticiada no Informativo nº 558, concedeu liberdade provisória a
acusado, morador de rua, que fora preso para assegurar a
aplicação da lei penal, sob a justificativa de não possuir residência
fixa nem ocupação lícita. A questão, no entanto, é polêmica, pois
há vários julgados, especialmente do TJDFT, no sentido de que é
legítima a exigência de documento comprobatório de residência
para afastar o periculum libertatis.
e. Condições de admissibilidade (art. 313):
(1) Anteriormente a Lei 12.403/2011: crime doloso punido com
reclusão. Contravenção ou crime culposo? Impossibilidade. Crime
doloso punido com detenção: só nas hipóteses dos incisos II a IV do
art. 313, quais sejam: quando se apurasse que o agente era vadio
ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecesse ou não
indicasse elementos para esclarecê-la, ou se o réu tivesse sido
condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em
julgado. Permitia-se, ainda, a prisão preventiva em casos de
violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei
específica, para garantir a execução das medidas protetivas de
urgência.
(2) Após a Lei 12.403/2011: só é cabível a prisão preventiva nos
crimes dolosos punidos com reclusão cuja pena máxima seja superior
a 4 anos. Continua não sendo admitida nas contravenções e em
crimes culposos.
Excepcionalmente, porém, permite-se a prisão preventiva mesmo
em crime doloso cuja pena máxima seja igual ou inferior a 4 (quatro)
anos, ou em crime culposo, quando o acusado já tiver sido
condenado por outro crime doloso, ressalvado o disposto no inciso I
do art. 64 do CP (lapso superior a 5 anos do cumprimento ou
extinção da pena e a prática da nova infração). Ou, ainda, se o
crime envolver violência doméstica e familiar não somente contra a
mulher, mas também em detrimento de criança, adolescente, idoso,
enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das
medidas protetivas de urgência deferidas.
O CPP aqui passa a se adaptar ao Código Penal. Ora, o acusado,
primário e de bons antecedentes, que vem a ser condenado por
crime doloso a pena não superior a 4 (quatro) anos, ou por crime
culposo qualquer que seja a pena cominada, não cumprirá pena
privativa de liberdade, porque o art. 44 do Código Penal permite (na
verdade, obriga) a substituição da reprimenda por sanção restrita de
direitos. Nesse sentido, não há motivos para prender alguém antes
da condenação, para depois desta colocá-lo em liberdade. Para
essas situações, a Lei nº 12.403/2011 reserva outras medidas
cautelares diversas da prisão (art. 319), as quais também só devem
ser aplicadas se adequadas e necessárias (art. 282). Assim, se desde
o primeiro momento, já se tem a certeza da não imposição de pena
privativa de liberdade, porque o réu é primário e o crime pelo qual
está sendo acusado, sendo doloso, possui pena máxima não superior
a 4 (quatro) anos, ou é culposo, não é cabível a sua prisão cautelar,
pois seria heterogênea, desproporcional.
Admite-se, também, a prisão preventiva quando houver dúvida
sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer
elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser
colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo
se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.
As condições de admissibilidade do art. 313 do CPP devem ser
afastadas (embora a lei não seja expressa nesse sentido) em caso de
prisão preventiva decretada por descumprimento de qualquer das
obrigações impostas por força de outras medidas cautelares
anteriormente fixadas, diante da impossibilidade de substituição ou
cumulação destas com outras, na forma dos artigos 312, parágrafo
único, e 282, §4º. De fato, fixada uma medida cautelar e sendo esta
descumprida imotivadamente a prisão preventiva poderá ser
decretada, se, claro, for necessária e adequada. Mas, aqui, não se
pode impedir a segregação só pelo fato de o crime doloso não ter
pena máxima superior a 4 (quatro) anos e ou ser culposo. A prisão,
nesta hipótese, é medida excepcionalíssima, e será decretada
diante da falta de compromisso do agente com a sociedade. E a
proporcionalidade, neste caso, restaria observada, por ser medida
adequada, diante da desídia do acusado.
f. Outras hipóteses de vedação da prisão preventiva: a prisão
preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas
provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato sob o
abrigo de uma causa excludente da ilicitude (legítima defesa,
estado de necessidade, exercício regular de um direito e estrito
cumprimento do dever legal), conforme dispõe o art. 314 do CPP. A
prisão preventiva também não poderá ser decretada se à infração
não for isolada, cumulativa ou alternativamente, cominada pena
privativa de liberdade (art. 283, §1º, CPP).
Eugênio Pacelli cita, ainda, outras duas hipóteses, não reguladas na
legislação, nas quais a prisão preventiva também não seria cabível,
ante a sua desproporcionalidade, quais sejam: nas infrações de
menor potencial ofensivo e nos casos de cabimento da suspensão
condicional do processo (infrações de médio potencial ofensivo).
g. Fundamentação. A decisão deve ser necessariamente
fundamentada, e para a fundamentação não bastam meras
citações de artigos de lei, sendo imprescindível a demonstração,
caso a caso, da existência dos requisitos legais.
- Fundamentação Per Relationem: técnica por meio da qual o
magistrado se utiliza da manifestação do órgão acusador para a
decretação da prisão, invocando o famoso ―adoto como razões de
decidir‖. A nosso ver, neste caso, imprescindível se mostra a
transcrição, na decisão judicial, dos fundamentos indicados no
requerimento. A Suprema Corte, todavia, possui posição diversa
admitindo a simples remissão ao pleito acusatório. Nesse sentido: HC
102864, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em
03/08/2010, DJe-173 DIVULG 16-09-2010 PUBLIC 17-09-2010 EMENT
VOL-02415-02 PP-00424. Evidente que a segregação só será lícita se a
aludida manifestação tiver baseada em elementos aptos
necessários à decretação da preventiva. Mas, seguindo a posição
pretoriana, se o pleito ministerial estiver apoiado em elementos
concretos indicativos da periculosidade do agente, não haverá
nulidade na decisão que o acolheu, mediante simples remissão aos
seus termos.
- Supressão da fundamentação pelo Juízo ad quem: impossibilidade.
h. Princípio da proporcionalidade: deve ser aplicado no campo das
prisões provisórias, inclusive, no tocante a seus três subprincípios:
necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito.
Portanto, a prisão deve ser adequada (presença do fumus comissi
delicti), necessária (periculum libertatis) e proporcional
(homogeneidade), sob pena de ser relaxada. Aliás, o postulado da
proporcionalidade foi acolhido expressamente pela Lei nº
12.403/2011, ao conferir nova redação ao art. 282 do CPP, ao
estabelecer a necessidade e a adequação como critérios de
imposição de medida cautelar pessoal (prisão ou outra cautelar
alternativa à prisão).
i. Princípio da homogeneidade: ―A medida cautelar a ser adotada
deve ser proporcional a eventual resultado favorável ao pedido do
autor, não sendo admissível que a restrição à liberdade, durante o
curso do processo, seja mais severa que a sanção que será aplicada
caso o pedido seja julgado procedente. A homogeneidade da
medida é exatamente a proporcionalidade que deve existir entre o
que está sendo dado e o que será concedido‖ (Paulo Rangel).
Levando-se a termo a homogeneidade não se pode admitir que
um indiciado ou um réu seja preso preventivamente, quando se
constatar que ao final do processo o mesmo não será submetido ao
regime de prisão para cumprimento de sua pena. É a aplicação do
princípio da razoabilidade/proporcionalidade no campo da prisão
provisória. Assim, é heterogênea a prisão preventiva concedida em
processo cujo crime fatalmente permitirá a aplicação de pena
restritiva de direitos.
j. Fixação do regime semiaberto de cumprimento de pena e
manutenção da prisão preventiva: divergência na doutrina e na
jurisprudência:
- impossibilidade, por ser desproporcional, implicando um regime de
cumprimento mais gravoso do que aquele decidido na sentença.
Nesse sentido:
―RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ROUBO QUALIFICADO. PRISÃO
EM FLAGRANTE. NEGATIVA DO BENEFÍCIO DA LIBERDADE PROVISÓRIA. FUNDAMENTAÇÃO
INIDÔNEA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL.
CONDENADO QUE FAZ JUS AO REGIME INICIAL SEMIABERTO. MANUTENÇÃO DO CÁRCERE.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
1. Quando a negativa do apelo em liberdade utiliza-se dos mesmos fundamentos da decisão que indeferiu anterior
pedido de liberdade provisória, é possível examinar a legalidade da custódia preventiva mantida na sentença
condenatória prolatada após a impetração do habeas corpus.
2. A situação flagrancial e a gravidade em abstrato do delito, dissociadas de qualquer outro elemento concreto e
individualizado, não têm, por si sós, o condão de justificar a custódia cautelar. É imprescindível, portanto, que a
prisão provisória seja decretada ou mantida com motivação válida e aliada a um dos requisitos legalmente previstos
no art. 312 do Código de Processo Penal. Precedentes.
3. O Recorrente, ademais, teve a pena-base fixada no mínimo legal, com o reconhecimento de circunstâncias judiciais
favoráveis, fazendo jus ao regime inicial semiaberto, motivo pelo qual a negativa do apelo em liberdade se constitui
em constrangimento ilegal 4. Recurso provido para assegurar ao Paciente o benefício da liberdade provisória, com a
consequente expedição do alvará de soltura, se por outro motivo não estiver preso, sob a condição de comparecimento
a todos os atos processuais e não mudar de endereço sem a permissão da autoridade judiciária.
(RHC 21.361/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 08/02/2010)‖.
Sentença penal condenatória (prolação). Prisão (provisória). Fundamentação (necessidade). Regime semiaberto
(aplicação). Apelação em liberdade (possibilidade).
1. A prisão provisória só há de ser imposta por meio de decisão fundamentada, por exemplo, no caso da preventiva, o
despacho (ou a decisão) que a decretar "será sempre fundamentado".
2. Tal é o que, de igual sorte, acontecerá com a sentença penal, se e quando o juiz entender que o réu, para apelar,
haverá de ser recolhido à prisão.
3. A gravidade abstrata do delito e mera conjectura sobre a possibilidade de reiteração criminosa, por si sós, não
justificam se imponham restrições ao direito de apelar em liberdade.
4. São incompatíveis na sentença condenatória o estabelecimento do regime inicial semiaberto e a negativa ao réu de
apelar em liberdade.
5. Faltando à sentença persuasiva motivação, o melhor dos entendimentos é o de que o réu, já em liberdade, pode
apelar em liberdade.
6. Ordem concedida a fim de se permitir ao paciente aguardar em liberdade o julgamento da apelação.
(HC 119.880/MG, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 24/08/2009, DJe 19/10/2009)
- possibilidade: não há incompatibilidade de manutenção da prisão,
se presentes os requisitos legais. Nesse sentido: HC 184.002/PA, Rel.
Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 14/04/2011, DJe
16/05/2011; HC 89.773/RJ, Rel. Ministro Nilson Naves, Rel. p/ Acórdão
Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, julgado em 18/09/2008, DJe
28/10/2008.
k. Prazo: até o trânsito em julgado da condenação ou até a
sentença absolutória. No entanto, o prazo para encerramento da
instrução criminal pode intervir na prisão cautelar, caso venha a ser
desrespeitado sem motivo razoável, tornando a segregação
processual ilegal.
(*) Prazo para encerramento da instrução criminal: - anteriormente a
Lei 11.719/2008: 81 dias. Conseqüência da superação do prazo:
ilegalidade da prisão que deveria ser relaxada. Flexibilização do
prazo. Princípio da razoabilidade: Súmula 52 do STJ (instrução já
encerrada); contribuição da defesa para o atraso no feito; causa
complexa; - após a Lei 11.719/2008: razoabilidade, não tendo a
jurisprudência, até o presente momento, eleito um prazo parâmetro,
diversamente do que ocorria anteriormente.
(*) Para parte da doutrina, reconhecida a alegação de excesso de
prazo e relaxada a prisão, não é possível nova decretação da prisão
preventiva. Em sentido contrário, já se manifestou o STJ (HC
17.256/RJ, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em
16.08.2001, DJ 17.09.2001 p. 180). Confira, a propósito, a recente
decisão do STF (Informativo 598):
Prisão Cautelar: Excesso de Prazo e Nova Decretação
O relaxamento de prisão preventiva, por excesso de prazo, não impede sua decretação por outros fundamentos
explicitados na sentença. Com base nessa orientação, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se
pleiteava o direito de recorrer em liberdade. No caso, o paciente, preso em flagrante delito por transportar e trazer
consigo substâncias entorpecentes, tivera sua constrição relaxada em virtude do excesso de prazo. Após a prolação da
sentença condenatória (Lei 11.343/2006, artigos 33 e 35), o juiz decretara nova segregação cautelar, invocando os
fundamentos do art. 312 do CPP. A impetração sustentava a falta de motivação da custódia, bem como a ausência dos
seus pressupostos autorizadores. Reputou-se que o réu, por ostentar a suposta condição de líder de grupo de tráfico, se
solto, representaria fundado risco à ordem pública e que, por se tratar de crime hediondo, caberia ao magistrado,
motivadamente, decidir sobre eventual direito de o sentenciado recorrer em liberdade. Vencido o Min. Marco Aurélio,
que deferia a ordem por entender que essa nova prisão, com aparência de cautelar, configuraria execução precoce da
pena imposta. Reputava não ser possível, num mesmo processo, considerado o mesmo quadro, ter-se novamente uma
prisão, uma vez reconhecido o anterior excesso de prazo, o qual seria definitivo e não se interrompera com a liberdade
do acusado.
HC 103881/MG, rel. Min. Dias Toffoli, 31.8.2010. (HC-103881)
l. Nova decretação ou revogação: possibilidade. Aplicação da
cláusula rebus sic stantibus (as coisas permanecem como estão se
mantidas as mesmas condições).
m. Recurso. Indeferimento: RSE; Deferimento: não cabe, podendo ser
impetrado habeas corpus. O RSE, neste caso, é secundum eventum
litis, só sendo cabível contra a decisão de indeferimento da
preventiva.
6- Da prisão em flagrante
a) Natureza jurídica: é medida administrativa (outrora tida como
prisão cautelar) que visa a resguardar a ordem social, servindo de
meio preventivo para inibir a prática de outros delitos. Até a Lei nº
12.403/2011, era vista como espécie de prisão cautelar, sendo
mantida no decorrer do processo quando presentes os motivos
autorizadores da prisão preventiva. Todavia, com o advento da
novel norma, o flagrante não mais subsistirá, devendo o juiz
convertê-lo em prisão preventiva, caso decida por manter a
segregação (art. 310, inciso II, do CPP), ou, relaxar a prisão, se ilegal,
ou conceder liberdade provisória. Assim, a prisão em flagrante agora
terá vida efêmera e natureza eminentemente administrativa.
b) Atos: detenção – voz de prisão – encaminhamento à DP –
Lavratura do APF (auto de prisão em flagrante) – encarceramento.
Da prisão captura e da prisão custódia.
c) Da atuação do DP: lavratura do APF ou liberação do conduzido.
Verificação da existência de crime e de indícios de autoria, bem
como da situação de flagrante. Existência do crime: para a doutrina
dominante, a análise, neste caso, restringe-se à chamada tipicidade
aparente (processual), não devendo o delegado adentrar no exame
de eventuais excludentes da ilicitude ou da culpabilidade (salvo
menoridade).
d) Da atuação do juiz: controlador da legalidade. Manutenção da
prisão, por meio da conversão do flagrante em prisão preventiva,
relaxamento ou concessão de liberdade provisória (necessidade da
prisão). Deve o magistrado, desse modo, analisar a legalidade e a
necessidade da prisão. A segregação só será mantida se presentes
os requisitos do art. 312 do CPP, oportunidade em que o juiz
converterá o flagrante em prisão preventiva. Caso contrário, o
magistrado deverá optar pela concessão da liberdade provisória,
com ou sem fiança, na hipótese de prisão legal, ou relaxar a prisão
ilegal. A análise deve ser realizada independentemente de
provocação.
e) Modalidades de flagrante.
- Quanto ao momento da prisão (art. 302): (1) próprio, perfeito,
real, propriamente dito (I e II); (2) impróprio, imperfeito ou quase-
flagrante (III): perseguição imediata e incontinenti: momento da
perseguição, logo após o crime e não à notícia do crime; duração:
não há prazo (24 horas: mito da mídia); (3): presumido ou ficto (IV): a
expressão ―logo depois‖ indica um lapso maior do que ―logo após‖;
instrumentos ou objetos do crime; análise no caso concreto.
- Quanto à pessoa que realiza a prisão (art. 301): (1) facultativo:
qualquer do povo; juiz e promotor; (2) obrigatório (compulsório):
policiais; (*) retardado, diferido, prorrogado, protelado ou ação
controlada: art. 2º, II, da Lei nº 9.034/95. Lei nº 11.343/2006 (tráfico).
Exceção ao flagrante obrigatório.
- Quanto à legalidade da prisão: (1) esperado: sistemas de vigilância
de lojas; tráfico; extorsão; (2) forjado: ilegalidade; (3) preparado,
esperado, quase-crime, delito de ensaio, delito putativo praticado
por obra do agente provocador: requisitos: a) instigação do agente
(colocação de isca); e (b) monitoramento da ação, impedindo de
forma absoluta a consumação do crime. Trata-se de hipótese de
crime impossível, nos termos da Súmula 145 do STF, sendo ilegal a
prisão neste caso.
- Sujeito passivo do flagrante: qualquer pessoa. Exceções: a) pessoas
que não podem ser presas em flagrante delito: menores de 18 anos;
agentes com imunidade diplomática; presidente da república (art.
86, §3°, CF – somente pode ser preso após o trânsito em julgado da
sentença condenatória). Situações excepcionais: (a) magistrados
(art. 33, II, LOMAN), membros do ministério público (art. 40,III, LOMP),
do congresso nacional (art. 53, §1°, CF) e deputados estaduais e
distritais (art. 27, §1°, CF): somente podem ser presos em caso de
flagrante por crime inafiançável (não podem ser presos em razão de
outra prisão cautelar); (b) advogados (art. 7°, §3°, Lei n° 8.906/94):
somente podem ser presos por atos praticados no exercício da sua
função, em razão de crimes inafiançáveis.
e) Apresentação espontânea: impede a prisão em flagrante, pois
não há a chamada prisão por apresentação, mas não a
decretação de uma prisão preventiva ou de temporária.
f) Auto de prisão em flagrante. Peça inicial do inquérito policial.
Requisito à legalidade da prisão.
- Local da lavratura: onde foi realizada a prisão. Lavratura em local
diverso (da prática do crime): inexistência de nulidade, pois não se
fala em competência para autoridades policiais.
- Autoridade com atribuição para lavrá-lo: delegado de polícia ou
juiz (impedimento para ação).
- Aspectos: informativo (serve de base para a denúncia) e
coercitivo (legitima a prisão).
- Diligências realizadas: depoimentos (ordem: condutor - pessoa
que deu voz de prisão -; testemunhas; vítima; conduzido); perícias;
atos de investigação. Presença de advogado. Inexistência de
contraditório. Nenmo tenetur se detegere. Lei nº 11.113/2005:
assinatura após cada depoimento.
- Nota de culpa (art. 306): requisitos. Prazo: 24 horas.
- Prazo para lavratura: imediatamente (prazo máximo: mesmo da
nota de culpa). Razoabilidade.
- Lei nº 11.449, de 15 de janeiro de 2007: passou a exigir, no prazo
de 24 horas contados da prisão, o encaminhamento do auto de
prisão em flagrante ao juiz competente. Além disso, passou-se a
prever a obrigatoriedade, no caso de o autuado não informar o
nome de seu advogado, de se encaminhar cópia integral para a
Defensoria Pública do APF. A providência tem por objetivo permitir
que o autuado possa requerer ao Poder Judiciário, de imediato, o
relaxamento da prisão ou a concessão de liberdade provisória,
evitando, com isso, que indiciados e acusados permaneçam presos
durante a persecução penal, quando não estiverem presentes os
motivos da custódia cautelar. Por outro lado, caso venha a ser
desrespeitada acarretará a ilegalidade da prisão.
- Lei nº 12.403/2011: a nova redação trouxe a obrigatoriedade de
comunicação da prisão ao Ministério Público, o que já ocorria antes
mesmo da novel norma, por força do art. 10 da Lei Complementar nº
75/93, Lei Orgânica do Ministério Público da União, mas aplicável,
por analogia, aos Ministérios Públicos Estaduais. Houve, ainda, a
troca da expressão ―dentro de 24 horas‖ para ―em até 24 horas‖,
realçando o legislador que o prazo previsto deve ser interpretado
como um lapso temporal máximo, só se admitindo a sua superação
à luz da razoabilidade, consoante já mencionado anteriormente.
- Vícios. Caráter coercitivo e informativo. Repercussão na ação
penal: prova e prisão.
(*) Uso de algemas: Súmula vinculante nº 11 – Só é lícito o uso de
algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de
perigo a integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou
de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de
responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da
autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se
refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.
QUESTÕES DE CONCURSO (CESPE):
(Cespe – TJ/AL –2012 - Analista) 1. A coação moral irresistível e a obediência à ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico são causas de exclusão da A imputabilidade. B tipicidade subjetiva. C ilicitude. D culpabilidade. E tipicidade objetiva.
(Cespe – STJ – 2012 – Analista Judiciário) 2. Considere a seguinte situação hipotética. Luís trafegava a 65 km/h por uma via cujo limite máximo de velocidade era de 50 km/h. Augusto, que trafegava pela mesma via a 50 km/h, tendo ignorado o sinal luminoso vermelho indicativo de “Pare”, colidiu seu veículo contra o dirigido por Luís. Em decorrência da colisão, Paulo, um pedestre que passava pelo local do acidente, foi atropelado. Os três, Luís, Augusto e Paulo, ficaram gravemente feridos. Nessa situação, deve-se aplicar a Luís e a Augusto a concorrência de culpas. (Cespe – STF – 2008 – Analista Judiciário) 3. Uma vez aplicado o princípio da insignificância, que deve ser analisado conjuntamente com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado, a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material, é afastada ou excluída.
(Cespe – MPU – 2010 – Analista Processual) 4. Diógenes desferiu, com animus necandi, golpes de faca em Jacó e fugiu do local dos fatos. Jacó foi socorrido pelo Corpo de Bombeiros e levado ao hospital, onde foi constatado que as lesões sofridas não eram graves, tendo sido a vítima submetida a rápido procedimento médico e liberada em seguida. Entretanto, Jacó faleceu dois dias após o atendimento médico. Feita a perícia, comprovou-se a morte por infecção generalizada decorrente de contaminação por bactéria encontrada nos instrumentos hospitalares. Nessa situação, como todos os fatos que antecederam o resultado foram indispensáveis à sua ocorrência, evidenciando-se a relação de causalidade entre as lesões sofridas e o resultado morte, de acordo com a teoria da equivalência dos antecedentes causais, adotada pelo Código Penal brasileiro, Diógenes deve responder por homicídio consumado. 5. No sistema penal brasileiro, o arrependimento posterior, a desistência voluntária e o arrependimento eficaz são causas obrigatórias de diminuição de pena, previstas na parte geral do Código Penal, exigindo-se, para sua incidência, que o fato delituoso tenha sido cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa. 6. O indulto, incidente na execução penal, resulta na extinção da pena privativa de liberdade. (Cespe – STM – 2011 – Analista Judiciário) A respeito da tipicidade, ilicitude e culpabilidade, julgue os itens subsequentes. 7. As causas legais de exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa incluem a estrita obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico. Caso o agente cumpra ordem ilegal ou extrapole os limites que lhe foram determinados, a conduta é culpável. 8. Por expressa disposição legal, não há crime quando o agente pratica o fato no exercício regular de direito ou em estrito cumprimento de dever legal.
(Cespe – DPAC – 2012 – Defensor) 9. O médico que, em procedimento cirúrgico, tiver esterilizado uma paciente devido à inobservância de regra técnica, impossibilitando-a de engravidar, responderá por lesão corporal A culposa, porque agiu contrariamente à regra técnica da profissão. B dolosa leve, pois não era possível prever a perda da função reprodutora da paciente. C dolosa leve, uma vez que não era possível prever a debilidade permanente da função reprodutora da paciente. D dolosa grave, visto que causou debilidade permanente da função reprodutora da paciente. E dolosa gravíssima, já que causou a perda da função reprodutora da paciente. 10. Uma mulher grávida, prestes a dar à luz, chorava compulsivamente na antessala de cirurgia da maternidade quando uma enfermeira, condoída com a situação, perguntou o motivo daquele choro. A mulher respondeu-lhe que a gravidez era espúria e que tinha sido abandonada pela família. Após dar à luz, sob a influência do estado puerperal, a referida mulher matou o próprio filho, com o auxílio da citada enfermeira. As duas sufocaram o neonato com almofadas e foram detidas em flagrante. Nessa situação hipotética, A a mulher e a enfermeira deverão ser autuadas pelo crime de infanticídio; a primeira na qualidade de autora e a segunda na qualidade de partícipe, conforme prescreve a teoria monista da ação. B a mulher e a enfermeira deverão ser autuadas pelo crime de infanticídio; a primeira na qualidade de autora e a segunda na qualidade de coautora, visto que o estado puerperal consiste em uma elementar normativa e se estende a todos os agentes. C a mulher deverá ser autuada pelo crime de infanticídio e a enfermeira, pelo crime de homicídio, já que o estado puerperal é circunstância pessoal e não se comunica a todos os agentes. D a mulher e a enfermeira deverão ser autuadas pelo crime de homicídio, consoante as determinações legais estabelecidas pelas reformas penais de 1940 e 1984, que rechaçam a compreensão de morte do neonato por honoris causae. E a mulher deverá ser autuada pelo crime de infanticídio e a enfermeira, pelo crime de homicídio, uma vez que o estado puerperal é circunstância personalíssima e não se comunica a todos os agentes. 11. No crime de calúnia, a procedência da exceção da verdade é causa A de exclusão de culpabilidade, uma vez que, sendo verdadeiro o fato imputado, a conduta não será considerada reprovável. B de extinção de punibilidade, já que, se verdadeiro o fato imputado, não será necessário aplicar a pena. C de exclusão de crime, porque, se o fato imputado for verdadeiro, não haverá crime, já que nunca existiu a falsidade da imputação. D de exclusão de ilicitude, pois, caso o fato imputado seja verdadeiro, a conduta não se caracterizará como antijurídica. E irrelevante, visto que, caso seja verdadeiro o fato imputado, a conduta deverá ser analisada com base em teses eventualmente obtidas mediante defesa escrita. (Cespe – TRE/MS –2013 - Analista) 12. Em relação aos crimes contra a honra, assinale a opção correta. A A lei penal prevê a impossibilidade de arguição da exceção da verdade no crime de calúnia se o fato imputado for crime de ação privada e o ofendido não tiver sido condenado por sentença irrecorrível. B O crime de difamação não admite a exceção da verdade, mas permite que o agente ofereça a exceção de notoriedade do fato, de modo a demonstrar que, para o agente, o fato era de domínio público, afastando o dolo da conduta. C A configuração do crime de calúnia prescinde da imputação falsa de fato definido como crime ou contravenção, podendo ser suprida mediante a determinação e a presença do animus caluniandi. D A consumação do crime de calúnia se dá com o conhecimento, por parte do sujeito passivo, da imputação falsa de fato definido como crime, independentemente da ciência ou divulgação por parte de terceiros.
E O autor de imputação falsa de fato descrito como infração penal que, na mesma circunstância, der causa à instauração de investigação policial e de processo judicial contra a vítima responderá em concurso material pelos crimes de calúnia e denunciação caluniosa. (Cespe – AGU – 2012 – advogado) Julgue os itens subsecutivos, a respeito dos efeitos da condenação criminal e de crimes contra a administração pública. 13. Em regra, não se concede o direito de recorrer em liberdade ao réu que tiver permanecido preso durante toda a instrução do processo, pois a manutenção do réu na prisão constitui um dos efeitos da respectiva condenação. 14. O tipo penal denominado peculato desvio constitui delito plurissubsistente, podendo a conduta a ele associada ser fracionada em vários atos, coincidindo o momento consumativo desse delito com a efetiva destinação diversa do dinheiro ou valor sob a posse do agente, desde que haja obtenção material do proveito próprio ou alheio. 15. É inaplicável o princípio da insignificância aos crimes contra a administração pública, pois a punição do agente, nesse caso, tem o propósito de resguardar não apenas o aspecto patrimonial, mas, principalmente, a moral administrativa. 16. Considera-se efeito genérico e automático da condenação a restrição ao exercício de cargo público. (Cespe – MPPI – 2012 – Analista Processual) 17. Nos crimes praticados por servidor público contra a administração, a exoneração da função pública, decorrente de condenação criminal, resulta como efeito automático da sentença, desde que reconhecida a existência de abuso de poder ou violação de dever funcional, consoante tratamento diferenciado estabelecido no Código Penal (Cespe – STM – 2011 – Analista Judiciário) Sobre os crimes contra a administração pública, julgue os próximos itens! . 18. Nos crimes de favorecimento pessoal e real, caso o sujeito ativo seja ascendente ou descendente do criminoso, fica isento de pena! . 19. A pessoa que exige para si vantagem a pretexto de influir em ato praticado por servidor público no exercício da função comete crime de tráfico de influência. Caracteriza-se a exploração de prestígio quando a solicitação é feita a pretexto de influir, por exemplo, sobre juiz ou funcionário da justiça. 20. Caso o indivíduo X, servidor público, aceite dinheiro oferecido pelo indivíduo Y para retardar o andamento de processo que tramita na vara onde X exerce suas funções, os dois deverão responder por corrupção passiva, em concurso de pessoas. (Cespe – TJDFT – 2008 – Analista Judiciário – Cargo 3) Julgue os itens que se seguem, relacionados aos crimes contra a administração pública. 21. Pratica crime de prevaricação o funcionário público autorizado que insere dados falsos nos sistemas informatizados ou banco de dados da administração pública, com o fim de causar dano a outrem. 22. No crime de peculato culposo, se o sujeito ativo reparar o dano até a data da sentença irrecorrível, sua punibilidade será extinta. (Cespe – TJDFT – 2008 – Analista Judiciário – Cargo 2) A respeito dos crimes contra a administração pública, julgue os itens seguintes.
23. Pratica crime de advocacia administrativa quem patrocina, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário, sendo que, se o interesse for ilegítimo, a pena será mais grave. Trata-se de crime de mão própria, isto é, que somente pode ser praticado por advogado ou bacharel em direito. 24. Pratica crime de excesso de exação o funcionário público que pratica violência no exercício de função ou a pretexto de exercê-la. (Cespe – MPPI – 2012 – Analista Processual) 25. Os inquéritos policiais ou ações penais em andamento não podem, em razão do princípio constitucional do estado presumido de inocência, ser considerados para fins de exasperação da pena-base, seja a título de maus antecedentes, seja de má conduta social ou personalidade, salvo motivação judicial específica, com lastro em elementos concretos existentes nos autos. (Cespe – TRE/RJ –2012 - Analista) A respeito das provas e das normas procedimentais para os processos perante o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, julgue o item abaixo. 26. O firme e coeso depoimento da vítima é suficiente para comprovar o emprego de arma de fogo pelo réu no delito de roubo. (Cespe – TRE/MS –2013 - Analista) 27. Assinale a opção correta a respeito da prisão e da liberdade provisória. A Decretada de ofício ou a requerimento das partes, a prisão preventiva por descumprimento a medida cautelar anteriormente imposta não se submete aos requisitos fáticos e normativos previstos no CPP, pois, nesse caso, se trata de prisão cautelar subsidiária. B A decretação da custódia preventiva de acusado reincidente em crime doloso — que prescinde da observância do requisito de ser a infração crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos — requer, tão somente, que a infração penal seja dolosa e que estejam presentes os requisitos fáticos previstos no CPP. C A prisão preventiva, como medida constritiva da liberdade, poderá ser decretada de ofício pelo juiz em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, presentes os requisitos autorizadores. D A prisão preventiva, na atual sistemática processual penal, poderá ser decretada como conversão da prisão em flagrante ou por descumprimento de medida cautelar anteriormente imposta. E A prisão preventiva é admitida quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o acusado permanecer preso, após a identificação, se for recomendada a manutenção da medida, mesmo que ele tenha praticado crime culposo. (Cespe – MPU – 2010 – Analista Processual) 28. Tratando-se de crimes de menor potencial ofensivo para os quais não haja previsão de pena privativa de liberdade, em hipótese alguma se imporá a prisão em flagrante ao autor da infração. 29. As prisões decorrentes de pronúncia e de sentença penal condenatória com recurso pendente de julgamento pela instância superior não estão elencadas entre as hipóteses de prisão cautelar, visto que se sustentam em instrumento jurídico distinto, isto é, em sentença. (Cespe – PF – 2012 – Agente) 30. A prisão preventiva, admitida nos casos de crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos, pode ser decretada em qualquer fase da persecução penal, desde que haja prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Cespe – TJES – 2011 – Analista Judiciário)
31. Caberá prisão preventiva na persecução penal para a apuração de crimes dolosos e culposos sujeitos à punição com pena de reclusão ou detenção. (Cespe – PF – 2012 – Agente) 50. A legislação processual obsta a decretação da prisão preventiva e temporária no caso de o acusado apresentar-se espontaneamente em juízo ou perante a autoridade policial, prestar declarações acerca dos fatos apurados e entregar o passaporte, assim como no caso de o juiz verificar, pelas provas constantes dos autos, que o agente praticou o fato em estado de necessidade, legítima defesa ou no estrito cumprimento do dever legal. (Cespe – TJDFT – 2008 – Analista Judiciário – Cargo 2) A respeito das prisões em flagrante, preventiva e temporária, julgue os próximos itens. 51. Nas infrações permanentes, entende-se o sujeito ativo do crime em flagrante delito nas primeiras 24 horas após o início da execução do crime.
Gab: 1-d; 2- Anulada; 3-c; 4- Anulada; 5-C; 6-e; 7-c; 8-c; 9-a; 10-b; 11-c; 12-a;
13-e; 14-e; 15-Anulada; 16-e; 17-e; 18-e; 19-c; 20-e; 21-e; 22-c; 23-e; 24-e; 25-e;
26-c; 27-b; 28-c; 29-e; 30-c; 31-e; 32-e; 33-e