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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
CURSO DE EXTENSÃO E
APERFEIÇOAMENTO EM GESTÃO
CULTURAL
I ETAPA A DISTÂNCIA
AULA 3:
Patrimônio Cultural Material e Imaterial
Roseane Norat
2015
Material Didático
PATRIMÔNIO CULTURAL MATERIAL E IMATERIAL
Curso de Extensão em Aperfeiçoamento em Gestão Cultural
RESPONSÁVEL: Prof. MSc. Roseane da Conceição Costa Norat
Belém, 21 de janeiro de 2015.
SUMÁRIO
1. Patrimônio cultural e gestão urbana: evolução e apreensão conceitual. ................ 6
2. Patrimônio material e imaterial, cultura, patrimônio, valores, autenticidade ........... 8
3. Educação patrimonial. ......................................................................................... 10
4. Sistema Nacional de Patrimônio Cultural (SNPC) ................................................ 11
5. Tombamento e Registro (mundial, federal, estadual, municipal). ......................... 12
6. Legislação para o patrimônio cultural: material, imaterial, arqueológico, tesouros
humanos e paisagem cultural. .................................................................................... 14
6.1. Patrimônio material ....................................................................................... 14
6.2. Patrimônio imaterial ...................................................................................... 17
6.3. Patrimônio arqueológico ............................................................................... 19
6.4. Paisagem cultural ......................................................................................... 19
6.5. Outros marcos legais importantes em âmbito federal ................................... 20
7. Leis de incentivo e fomento ................................................................................. 21
8. Cooperação internacional. ................................................................................... 22
9. PAC das Cidades Históricas. ............................................................................... 22
10. A gestão municipal e a preservação cultural ........................................................ 23
11. Referências ......................................................................................................... 25
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Bens culturais a preservar. .......................................................................... 7
Figura 2 – Diversidade de bens culturais: Patrimônio material - (A) bens imóveis (Solar
em Santarém/PA); (B) bens móveis (imagem sacra do MAS/SECULT/PA); (C)
paisagem cultural e patrimônio arqueológico (Serra das Andorinhas/PA); Patrimônio
imaterial - (D) celebração, saberes e tradições associadas (Círio de Nazaré/PA). ...... 10
Figura 3 – Ação educativa em obras de restauro em Belém/PA: (A,a) Projeto Arte na
Obra, Catedral de Belém, 2009/2010; (B,b) obras de restauração da Igreja do Carmo,
2014. .......................................................................................................................... 11
Figura 4 – Eixos e objetivos do Sistema Nacional de Patrimônio Cultural (SNPC). ..... 12
Figura 5 – Esquema básico de tramitação de processos de tombamento. ..............Erro!
Indicador não definido.
Figura 6 – Esferas de tombamento. ............................................................................ 13
Figura 7 – (A,a) Fachada e interior do edifício Paris N’Ámérica classificado como P.A.I.
e (B) fachada de imóvel no CHB classificado como P.A.P. conforme categorias da
legislação de patrimônio no município de Belém/PA. .................................................. 16
Figura 8 – (A,a) Fachada e estudo para recuperação de vãos de imóvel no CHB
classificado como R.A.; (B) imóvel da categoria acompanhamento A. de tipologia
conhecida como “raio-que-o-parta”, de meados do século XX no CHB; (C) imóvel de
renovação arquitetônica R., conforme categorias da legislação de patrimônio no
município de Belém/PA. .............................................................................................. 16
Figura 9 – Planejamento e inventário na gestão patrimonial.Erro! Indicador não
definido.
Figura 10 – Área de entorno do eclético Mercado de São Braz (1910-1911) e da
modernista Escola Benvinda de França Messias (1951), tombadas pelo município de
Belém (Fonte: DEPH/FUMBEL). ................................................................................. 24
LISTA DE TABELAS
Quadro 1 – Estratégias de gestão urbana segundo Vargas e Castilho (2006).
...................................................................................................................... ...............8
Quadro 2 – Livros de tombo previstos na Legislação Estadual. .................................. 15
Quadro 3 – Categorias de preservação, critérios de intervenção e incentivos ficais
previstos na Legislação Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural de Belém,
pela Lei 7.709/1994. ................................................................................................... 16
Quadro 4 – Objetivos e diretrizes para o CHB e seu entorno conforme o Plano Diretor
do Município de Belém/PA. ......................................................................................... 17
Quadro 5 – Livros de registro dos bens imateriais de acordo com a Legislação Federal.
....................................................................................... Erro! Indicador não definido.
Quadro 6 – Livros de registro dos bens imateriais de acordo com a Legislação
Estadual. ..................................................................................................................... 18
Quadro 7 – Instrumentos, previstos na Lei nº 10.257 (Estatuto da Cidade), que podem
ser utilizados pelos municípios, para auxiliar a gestão e estratégias de reabilitação
urbana em áreas de interesse cultural. ........................... Erro! Indicador não definido.
Quadro 8 – Leis de incentivos fiscais. ......................................................................... 21
1- Patrimônio Cultural e Gestão Urbana: evolução e apreensão
conceitual
Hoje, o Patrimônio Cultural é apreendido de forma abrangente e pode ser
definido como o conjunto dos bens culturais de natureza material, imaterial e o
conjunto do meio ambiente reconhecidos pela sua importância, histórica, artística,
arqueológica, cultural e ambiental, para a formação da identidade e memória coletiva
de uma sociedade; produtos humanos na sua relação de criação, produção e meio
ambiente.
A concepção inicial do conceito de patrimônio cultural está relacionada ao
culto aos monumentos e à consciência histórica da necessidade de preservação de
elementos da memória social e coletiva. A primeira Comissão dos Monumentos
Históricos (França, 1837) reconhecia três categorias de monumentos históricos, as
quais eram constituídas pelos remanescentes monumentos da Antiguidade, pelos
edifícios religiosos da Idade Média e por alguns castelos. Com o tempo, esse conceito
foi evoluindo, absorvendo outras categorias e adquiriu maior abrangência, conforme
observa Choay:
“A especificidade do monumento deve-se precisamente ao seu modo de atuação sobre a memória. Não apenas ele a trabalha e mobiliza pela medição da afetividade, de forma que lembre o passado fazendo-o vibrar como se fosse presente. Mas esse passado invocado, convocado, de certa forma encantado, não é um passado qualquer: ele é localizado e selecionado para fins vitais, na medida em que pode, de forma direta, contribuir para manter e preservar a identidade de uma comunidade étnica ou religiosa, nacional, tribal ou familiar” (CHOAY, 2001).
A função antropológica constitui a essência do monumento, que também
tende a acumular funções. Como ato consciente e proposital, a preservação e a
vigilância, a partir dos monumentos romanos, desde o séc. XV foram estimuladas
pelos papas, que como letrados guardiões de exemplares do passado religioso,
atuavam na tarefa da conservação.
Na era industrial, que representa profundas transformações sociais e
urbanas, a ideia de monumento histórico somada a outros fatores, como o
romantismo, agregou determinações novas relativas às suas próprias delimitações
espaço temporais, à hierarquia dos valores, ao estatuto jurídico e ao tratamento
técnico, privilegiando, pela primeira vez, os valores da sensibilidade, principalmente os
estéticos. Fatos históricos e muitos pensadores, especialmente no século XIX,
marcam a trajetória desse pensamento.
Ao longo do século XX, encontros e conferências internacionais consolidariam
conceitualmente a questão da preservação cultural e urbana (CURY, 2000).
A partir da década de 1960, o culto ao patrimônio histórico alargou-se e a essa
herança foram incluídos novos tipos de bens, ampliando o quadro cronológico e as
áreas geográficas, no interior das quais, os bens se localizavam. O domínio do
patrimônio passa a ser mais abrangente, não se restringindo mais aos edifícios
individuais, mas aos aglomerados de edificações e malha urbana, numa preocupação
de caráter internacional, no processo de interações e multiculturalidade. A Conferência
Internacional, sobre Conservação e Restauração de Monumentos e Sítios (Carta de
Veneza, 1964), foi fundamental para a disseminação da condição de preservação do
patrimônio histórico.
A partir da década de 1970, em seminários internacionais e nacionais,
promovidos por instituições vinculadas à preservação do Patrimônio Cultural
(UNESCO1, ICOM2, ICOMOS3, ICC4, ICROM5, IPHAN6), várias discussões apontaram
caminhos para a percepção contemporânea da questão cultural, suas problemáticas e
direcionamentos aos profissionais atuantes na preservação patrimonial.
A ideia de preservar passou a incorporar o Patrimônio Histórico e Cultural,
para além da visão monumentalista da preservação, que era organizada em períodos
estritamente arquitetônicos e pautados, quase que exclusivamente, em valores
histórico, artístico e de antiguidade. Passou-se a reconhecer a importância do
arcabouço do envoltório, substituindo-se, assim, a visão isolada de monumento, por
procedimentos que o incorporam ao conjunto paisagístico e imaterial.
Figura 1 – Bens culturais a preservar.
1 Organização Educacional, Científica e Cultural das Nações Unidas.
2 Conselho Internacional de Museus.
3 Conselho Internacional de Monumentos e Sítios.
4Instituto Internacional para Conservação de Trabalhos Históricos e Artísticos.
5 Instituto Internacional para o Estudo da Preservação e Restauração da Propriedade Cultural.
6 Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Ao longo do tempo, a gestão urbana na área patrimonial foi se ajustando a
esse conjunto de conceitos, os quais, resumidamente, podem ser agrupados em três
fases, segundo Vargas e Castilhos (2006), as quais são descritas na Quadro 1, a
seguir:
PERÍODO ESTRATÉGIA
RENOVAÇÃO URBANA
(1950-1970)
Preferência pelo novo, a partir da demolição e construção para renovar; - na Europa: associada ao Movimento moderno; - Solução de problemas de congestionamentos e à prática de reconstrução do pós-guerra, com a recuperação de espaços públicos; - Na América do Norte: contra-fluxo do processo de suburbanização: demolição de áreas e tecidos urbanos e sua reconstrução (não havia interesse na preservação); - Mudança de uso do solo, retorno à natureza entre edifícios, uso exclusivo de áreas de pedestres.
PRESERVAÇÃO URBANA
(1970-1990)
Consciência histórica sobre a questão da preservação; - Negação dos preceitos modernistas; - Destaque para as relações de vizinhança e restauração de edifícios históricos: estações de trem, armazéns, mercados, teatros – usos variados (comércio, serviços, lazer, cultura); - Legislações de preservação; - Reconstrução de edificações, em nome da preservação do ambiente construído; - Desponta o papel da UNESCO; - Órgãos de preservação: áreas históricas x planejamento urbano; - Experiências restritas a prédios monumentais isolados (não refletem o mesmo cuidado com o entorno); - Objetivos: valorização da memória, organização da sociedade pela defesa do patrimônio e discurso sobre os centros históricos, como essenciais para vida urbana, geradores de identidade e orgulho cívico.
REINVENÇÃO URBANA
(1980-2000)
- Reconhecimento da diversidade dos grupos sociais e evolução dos meios de comunicação; - Território: mercadoria de consumo (cidadãos de renda elevada, investidores, turistas); - Capital imobiliário: localizações privilegiadas induzindo à demanda, por meio da oferta; - Poder público: valorização positiva da cidade para a captação de investimentos externos, destinados ao desenvolvimento da economia urbana; - Planejamento de mercado e técnicas de markenting urbano; - Objetivo: criar ou recuperar a base econômica das cidades, para gerar emprego e renda, reconstruindo ou reinventando o ambiente construído: promoção política partidária.
- Ampla divulgação: surgimento de grupos e associações envolvidas nas intervenções; Alvos: projetos de áreas urbanas centrais, estruturas obsoletas: edificações industriais, portuárias, orlas, etc.; - Atributos do lugar, regionalismo, valores étnicos, valorização do ser singular; Imagem da cidade: atração de capital e pessoas; intensa competição urbana, lugares e festivais públicos; - Gentrification: mascarada pela imagem do urbanismo espetacular, que simula a requalificação do centro – legitimando a ação do poder público.
Quadro 1 – Estratégias de gestão urbana segundo Vargas e Castilho (2006)
2- Patrimônio material e imaterial, cultura, patrimônio, valores,
autenticidade
Patrimônio intangível ou imaterial são termos utilizados por ressaltarem uma
oposição ao que seja material ou construído, tangível. Reforçam a importância dos
processos de criação e manutenção do conhecimento, sobre o seu produto. Isto é,
enfatizam o conhecimento, o processo de criação e o modelo, mais do que
propriamente o resultado, embora este seja sua expressão material sobre o produto.
Os conceitos de cultura tradicional e popular, como parte do patrimônio
universal, tiveram sua referência ampliada a partir da “Recomendação sobre a
Salvaguarda da Cultura Tradicional e Popular” (Paris, 15/11/1989), que reconhece a
Cultura Tradicional e Popular como parte do patrimônio universal da humanidade e
afirmação de sua identidade cultural, já que, a construção da identidade cultural de um
povo é resultante de um processo histórico e dinâmico, de um conjunto de criações
que se fundem diante das diferentes necessidades e interesses, costumes e valores
assimilados e transmitidos por uma dada população, grupo ou comunidade em seu
tempo e espaço.
Na Conferência Mundial sobre as Políticas Culturais (ICOMOS, México, 1985)
a cultura passa a ser compreendida como o conjunto dos traços “distintivos espirituais,
materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade e um grupo social,
englobando, além das artes e das letras, os modos de vida, os direitos fundamentais
do ser humano, os sistemas de valores, as tradições e as crenças”.
Na Carta de Cracóvia (2000), dos Princípios para a Conservação e Restauro
do Patrimônio Construído, o conceito de patrimônio é definido como o “conjunto de
obras do homem nas quais uma comunidade reconhece os seus valores específicos e
particulares e com os quais se identifica”. A identificação e a especificação do
patrimônio é, assim, um processo relacionado com a seleção de valores.
Mas a questão da valoração incorporada aos bens culturais é relativa. Não há
valores absolutos, permanentes, senão aqueles que as diferentes gerações transferem
aos objetos. A significação de valor responde às necessidades da sociedade e das
trocas de paradigmas culturais. Resulta de reconhecer uma qualidade no objeto, seja
originária (intrínseca ao objeto a sua origem) ou adquirida (obtida por seu uso ou
resultante de elementos extrínsecos). Os valores podem ser urbanos, arquitetônicos,
artísticos, simbólicos, antropológicos (MADRI, 2003).
A diversidade de culturas e patrimônios, valores e autenticidade, como
aspectos do desenvolvimento humano, foram discutidos na Conferência sobre
Autenticidade (Nara, Japão, 1994). A autenticidade, vista como fundamental nos
estudos científicos sobre patrimônio cultural; nos planos de conservação e
restauração, aparece como principal fator de atribuição de valores.
A Carta de Brasília, de 1995, ressalta que a autenticidade passa pela
identidade, e esta é dinâmica, vista como forma de pertencimento e de participação,
que nos faz capazes de encontrar nosso lugar, através de vínculos com as pessoas
que compartilham a mesma cultura. A autenticidade está ligada à idéia de verdadeiro,
sobre o qual não há dúvida. Os edifícios e lugares são objetos materiais em um
contexto social e cultural determinado e sua compreensão e aceitação, pela
comunidade, os converte em patrimônio. O objetivo para a preservação da memória e
de suas referências culturais deve ser estabelecido a partir da sua função ao
enriquecimento do homem, muito além do material. Assim, o suporte tangível não
deve ser o único objetivo da conservação.
Gonçalves (2002) sugere pensarmos os “patrimônios culturais” como
determinado gênero de discurso, como modalidades de expressão escrita ou oral, e
não, como sendo simplesmente uma coleção de objetos e estruturas materiais que
existem por si mesmas, porque, na verdade, como as modalidades de expressão
humana, os patrimônios culturais também são discursivamente construídas.
Essa visão antropológica constata a evolução e apreensão do conceito de
patrimônio, o qual se consubstanciou, ao longo do tempo, consolidando-se nos
documentos internacionais, que passaram a ser referenciais no seio das nações e
sociedade contemporâneas.
O valor econômico, o tratamento como bem de consumo, as diversidades e
heterogeneidade dos bens culturais assim como a apreensão do tempo e lugar, na era
da informática e da Internet em escala planetária, impõem desafios ao homem
moderno no tratamento e destinação do seu patrimônio cultural.
Figura 2 – Diversidade de bens culturais: Patrimônio material - (A) bens imóveis (Solar em Santarém/PA)/RN; (B) bens móveis (imagem sacra do MAS/SECULT/PA)/S; (C) paisagem cultural e patrimônio arqueológico (Serra das Andorinhas/PA)/S; Patrimônio imaterial - (D)
celebração, saberes e tradições associadas (Círio de Nazaré/PA).
3- Educação patrimonial.
“Trata-se de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no patrimônio cultural como fonte primária de conhecimento e enriquecimento individual e coletivo. Isto significa tomar os objetos e expressões do patrimônio cultural como ponto de
partida para atividade pedagógica, observando-os, questionando-os e explorando todos os seus aspectos, que podem ser traduzidos em conceitos e conhecimentos” (HORTA, 2003)
De acordo com o dinamismo e os padrões culturais estabelecidos em cada
sociedade, o patrimônio cultural se reveste de novos valores, estimulando a criação de
outros bens culturais. Para que esses bens sejam protegidos e preservados para
outras gerações, são necessárias ações para além dos instrumentos legais ou
coercitivos. O conhecimento que gera o reconhecimento, sobre determinado bem
cultural, na coletividade, consolida-se na ação de educar, estabelecida a partir de um
diálogo permanente, entre os diversos atores sociais.
A ação educativa tem como base a sensibilização desses atores que
interagem em um processo, e envolve, desde gestores, professores e produtores
culturais, até ao mais amplo alunado e público sem distinção quanto aos segmentos
que compõe a pluralidade da sociedade, com atuação por meio de oficinas, eventos,
mídias pedagógicas, visitas às obras de restauração, espetáculos temáticos, entre
outros.
O processo educativo e de mobilização em defesa do patrimônio cultural
também se dá a partir dos conselhos, fóruns, seminários e demais espaços de
promoção e discussões das questões culturais, inclusive as mídias digitais e sociais.
A educação patrimonial consiste em provocar situações que possibilitem o
conhecimento, a valorização e a apropriação dos bens que constituem o patrimônio
cultural. Não basta saber que um bem é de valor cultural relevante, é necessário
conhecer e divulgar esse valor, tomar consciência do que significa ou pode vir a
significar para um grupo social.
A própria comunidade elege e legitima seus bens culturais. A democratização
e acesso aos bens culturais, além de considerar as diversidades e a valorização dos
povos e comunidades tradicionais, são basilares para a ampliação do processo de
educação patrimonial.
Figura 3 – Ação educativa em obras de restauro em Belém/PA: (A,a) Projeto Arte na Obra, Catedral de Belém, 2009/2010; (B,b) obras de restauração da Igreja do Carmo, 2014
4- Sistema Nacional de Patrimônio Cultural (SNPC)
Propõe formas de relação, entre as esferas de governo, que permitam
estabelecer diálogos e articulações para gestão do patrimônio cultural, conforme os
eixos e objetivos dispostos na Figura 4.
Com o quadro do patrimônio cultural consolidado e a mobilização, junto aos
governos municipais, objetiva constituir uma base de ação efetiva para a consolidação
de uma política e um sistema nacional de patrimônio cultural.
Figura 4 – Eixos e objetivos do Sistema Nacional de Patrimônio Cultural (SNPC).
5- Tombamento e Registro (mundial, federal, estadual, municipal)
Tombamento é o ato administrativo realizado pelo poder público, nos níveis
federal, estadual ou municipal, que reconhece e declara o bem cultural como de
interesse à preservação. O ato de tombamento não altera o direito de propriedade do
bem e não significa desapropriação, ou seja, o bem tombado não muda de
proprietário, podendo ser alugado ou vendido.
Em geral, decorre de abertura de processo (Figura 5), por iniciativa de
qualquer cidadão ou instituição pública, com o objetivo de preservar bens de valor
histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e, também, de valor afetivo para a
população, impedindo a destruição e/ou descaracterização de tais bens. O
tombamento recairá em bens do patrimônio material (bens imóveis, bens móveis,
patrimônio arqueológico) de interesse cultural e/ou ambiental.
Figura 5 – Esquema básico de tramitação de processos de tombamento
VANTAGENS – como instrumento legal legitima a atuação do poder público e
dele decorrem a atuação com legislações e normativas pertinentes, que podem
conter incentivos e penalidades.
DESVANTAGENS – quando a legislação que acompanha o processo não
traduz adequadamente a melhor estratégia para a conservação de edificações
ou áreas de interesse à preservação pode se tornar ineficaz; uso inadequado
para captação de recursos, resultando na banalização do instrumento.
A esfera de tombamento ocorrerá conforme a representatividade do bem
cultual em relação à sua influência e/ou importância histórica para uma ou várias
comunidades local, regional, nacional ou em âmbito mundial.
Figura 6 – Esferas de tombamento.
No caso dos bens do patrimônio imaterial, por sua natureza intangível, não se
aplica o instrumento do tombamento, mas sim, de REGISTRO e COMPANHAMENTO
das manifestações, para os quais são adotadas as metodologias de pesquisas do
Inventário Nacional de Referências Culturais/INRC.
A salvaguarda dos bens imateriais decorre essencialmente do seu
reconhecimento e das ações de sensibilização e divulgação, estímulos para sua
permanência e transmissão para as futuras gerações.
6- Legislação para o Patrimônio Cultural: material, imaterial,
arqueológico, tesouros humanos e paisagem cultural.
6.1 - Patrimônio material
LEGISLAÇÃO FEDERAL
O marco legal da questão patrimonial no país é o Decreto Lei n° 25 de 30 de
novembro de 1937, que conceituou e organizou a proteção do patrimônio histórico e
artístico nacional. A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, (Art. 215
e 216) definiu o patrimônio cultural brasileiro como aquele formado por
“bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem as formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas, as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais, os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico”.
A Portaria MINC Nº 54/2012, de 08/05/2012, publicada no DOU em
10/05/2012, efetivou o tombamento do Centro Histórico de Belém (CHB), em âmbito
federal, e deve constituir, futuramente, instrumentos mais práticos para a atuação de
fiscalização e controle urbanísticos, pelo IPHAN/PA, em âmbito local.
LEGISLAÇÃO ESTADUAL/PARÁ
O Decreto Lei Nº 5.629/1990 trata da Preservação e Proteção do Patrimônio
Histórico, Artístico, Natural e Cultural do Estado do Pará e reafirma diversos aspectos
abordados no Decreto Lei 25 e encarrega o Departamento de Patrimônio Histórico,
Artístico e Cultural da Secretaria de Estado de Cultura/DPHAC e a Secretaria de
Cultura do Estado/SECULT pela proteção do patrimônio, bem como, pelas inscrições
nos Livros de Tombo do Estado (Quadro 2). A partir da data de recebimento da
solicitação de tombamento, o bem terá garantida sua preservação e proteção, até
decisão final.
LIVROS DE TOMBO INSCRIÇÕES
1 - de Bens Naturais Incluindo-se paisagens, espaços ecológicos, recursos hídricos, monumentos e sítios ou reservas naturais, parques e reservas federais, estaduais e municipais.
2 - de Bens Arqueológicos e Antropológicos Bens arqueológicos e antropológicos.
3 - de Bens Imóveis De valor histórico, arquitetônico, urbanístico, rural, paisagístico, como: obras, cidades, edifícios, conjuntos e sítios urbanos ou rurais.
4 - de Bens Móveis De valor histórico, artístico, folclórico, iconográfico, etnográfico, incluindo-se acervos de bibliotecas, arquivos, museus, coleções, objetos e documentos de propriedade pública e privada.
Quadro 2 – Livros de tombo previstos na legislação estadual
LEGISLAÇÃO MUNICIPAL – BELÉM/PA
O centro histórico de Belém (CHB) foi tombado pela Lei Orgânica em 1990,
mas somente foi regulamentado pela Lei Nº 7.709 de 18/05/1994. Essa lei trata
especificamente da preservação e proteção do patrimônio histórico, artístico,
ambiental e cultural do município, indicando os modelos urbanísticos, tanto para o
CHB, quanto para sua área de entorno, definindo as categorias de preservação, os
índices e os critérios de uso e de ocupação do solo da área histórica e, ainda, as
penalidades e incentivos fiscais (inclusive para bens fora da delimitação do CHB). O
desconto de IPTU é anual, mediante processo aberto pelo interessado, e após
avaliação técnica do DEPH/FUMBEL, que encaminha o processo à SEFIN, para a
concessão.
Um resumo sobre as categorias de preservação, os critérios de intervenções e
os incentivos fiscais podem ser observados no Quadro 3 e nas Figuras 7 e 8, a seguir:
CATEGORIAS DE
PRESERVAÇÃO CRITÉRIOS DE INTERVENÇÕES INCENTIVOS FISCAIS
Preservação Arquitetônica Integral (P.A.I.)
Intervenção destinada à preservação das características arquitetônicas, artísticas e decorativas internas e externas do imóvel em questão;
Desconto de IPTU – De 0 a 100%
Isenção de taxa para licenciamento da obra
Preservação Arquitetônica Parcial (P.A.P.)
Intervenção destinada à conservação das características arquitetônicas, artísticas e decorativas externas do imóvel em questão;
Desconto de IPTU – De 0 a 100%
Isenção de taxa para licenciamento da obra
Reconstituição Arquitetônica (R.A.)
Intervenção destinada à recuperação das características arquitetônicas, artísticas e decorativas que anteriormente compunham a fachada e cobertura na época da construção do imóvel em questão;
Desconto de IPTU – De 0 a 100%
Isenção de taxa para licenciamento da obra
Acompanhamento (A.)
Intervenção destinada à conservação da fachada externa e da cobertura do imóvel que, embora não tenha características arquitetônicas de interesse à preservação, não interfere substancialmente na paisagem, devendo manter-se a harmonia volumétrica.
Desconto de IPTU – De 0 a 100%
Isenção de taxa para licenciamento da obra.
Renovação Arquitetônica (R.)
Intervenção destinada à construção de nova edificação e ou substituição de uma edificação que não tem interesse à preservação.
X
Quadro 3 – Categorias de preservação, critérios de intervenção e incentivos ficais previstos pela Lei 7.709/1994 da legislação municipal de preservação do patrimônio cultural de Belém.
Figura 7 – (A,a) Fachada e interior do edifício Paris N’América, classificado como P.A.I./F; (B) fachada de imóvel no CHB, classificado como P.A.P. conforme categorias da legislação de
patrimônio, no município de Belém/PA/JM
Figura 8 – (A,a) Fachada e estudo, para recuperação de vãos, de imóvel no CHB classificado como R.A./JM; (B) imóvel da categoria acompanhamento A., de tipologia conhecida como “raio-que-o-parta”, de meados do século XX no CHB/JM; (C) imóvel de renovação arquitetônica R.
conforme categorias da legislação de patrimônio no município de Belém/PA/JM.
PLANO DIRETOR MUNICIPAL E A PRESERVAÇÃO URBANA (BELÉM/PA)
A Lei Nº 8.655, de 30/07/2008, que dispõe sobre o Plano Diretor do Município
de Belém, e dá outras providências, reorganizou o zoneamento do CHB, observando
aspectos da atualidade, resguardou gabaritos e modelos urbanísticos compatíveis com
as áreas, originalmente estabelecidos em 1994, o que tornou sem eficácia as
alterações impetradas por decretos pontuais à Lei 7.709, que atendiam interesses
privados e contrários aos pareceres técnicos de preservação.
.ZAU 7 – Setor I (Engloba o CHB e seu entorno)
Objetivos Diretrizes
Requalificar, preservar e conservar o núcleo histórico. Reabilitar o núcleo histórico;
Requalificar as edificações degradadas.
Estabelecer o equilíbrio entre o direito de veiculação da informação e divulgação e o direito público de proteção aos impactos de poluição visual e sonora na paisagem urbana.
Estimular o uso habitacional Promover programas habitacionais.
Promover a melhoria da infraestrutura Melhorar a infraestrutura urbana.
Potencializar as atividades de turismo e negócios afins. Reabilitar os espaços públicos destinados às atividades de cultura, lazer e de turismo.
Quadro 4 – Objetivos e diretrizes para o CHB, e seu entorno, conforme o Plano Diretor do Município de Belém/PA
6.2 - Patrimônio Imaterial
LEGISLAÇÃO FEDERAL
O decreto Nº 3.551/2000, instituiu o registro dos bens culturais de natureza
imaterial, sendo criados 4 (quatro) livros de registro (Tabela 3). Vale ressaltar que, por
sua natureza imaterial, estes bens não são “tombados” e sua preservação se dá por
meio do REGISTRO e ACOMPANHAMENTO de suas manifestações, seguindo a
metodologia de pesquisa do Inventário Nacional de Referências Culturais/INRC.
LIVROS DE REGISTRO INSCRIÇÕES
1 - dos Saberes Para os conhecimentos e modos de fazer, enraizados no cotidiano das comunidades.
2 - de Celebrações Para os rituais e festas que marcam vivência coletiva, religiosidade, entretenimento e outras práticas da vida social.
3 - das Formas de Expressão Para as manifestações artísticas em geral.
4 - dos Lugares Para mercados, feiras, santuários e praças, onde são concentradas ou reproduzidas práticas culturais coletivas.
Quadro 5 – Livros de Registro dos Bens Imateriais, de acordo com a legislação federal
O Círio de Nazaré foi a primeira manifestação cultural registrada no Livro das
Celebrações, em 2004, enquanto que as Festividades do Glorioso São Sebastião, na
Região do Marajó, só vieram se beneficiar desse registro, em 2013. O Carimbó,
recentemente, em 2014, foi reconhecido como patrimônio cultural imaterial brasileiro.
O Decreto nº. 7.387 de 09/12/2010 inovou ao criar o Inventário Nacional da
Diversidade Linguística (INDL), que visa o reconhecimento e valorização das línguas
portadoras de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira.
LEGISLAÇÃO ESTADUAL/PARÁ
O Decreto N° 1.852 de 25/08/2009 instituiu o registro de bens culturais de
natureza imaterial, que constituem patrimônio cultural paraense e criou o Programa
Estadual do Patrimônio Imaterial.
LIVROS DE REGISTRO INSCRIÇÕES
1 - dos Saberes e Fazeres Conhecimentos e modos de fazer cristalizados no cotidiano das comunicações.
2 - das Celebrações Rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade e do entretenimento.
3 - das Formas de Expressão Manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas, além de outras práticas da vida social.
4 - de Línguas As diversidades linguísticas e os modos de expressão verbal característicos de um determinado grupo, como elemento de sua identidade.
Quadro 6 – Livros de registro dos bens imateriais de acordo com a legislação estadual.
Contudo, no âmbito local, embora a legislação siga as diretrizes do Decreto
Federal, na prática, as declarações de patrimônio imaterial tem sido aplicadas por atos
políticos, sem o devido processo de instrução e inventariação, refletindo o não
entendimento do processo e suas especificidades.
TESOUROS HUMANOS VIVOS
A UNESCO, desde 2003, estabeleceu na Convenção para a Salvaguarda do
Patrimônio Imaterial as diretrizes para a criação dos Sistemas Nacionais de Tesouros
Humanos Vivos. Nessa categoria o Mestre é reconhecido como o portador ativo de
uma tradição, uma vez que ele guarda em seu corpo a memória de um saber coletivo.
É um patrimônio vivo, porque se relaciona ao saber e integridade daquele que detém o
conhecimento.
Vários países reconhecem essa categoria, com diferentes nomenclaturas.
Países como na França, o Japão e as Filipinas, onde os mestres da cultura já contam
com o reconhecimento, titulação e auxílio financeiro, para continuarem a difundir sua
arte, contribuindo, desse modo, com a valorização e perpetuação da cultura. No Brasil,
alguns Estados, como Ceará, Bahia, Pernambuco e Alagoas já criaram lei para o
registro de mestres da cultura tradicional. Além do título, os mestres recebem um
auxílio financeiro, no valor de um salário mínimo.
Em âmbito local, os estudos não avançaram, para além de projeto de lei,
enquanto muitos desses mestres, espalhados pelo território paraense, ainda
aguardam ser reconhecidos como tesouros humanos vivos.
6.3 - Patrimônio Arqueológico
A Lei Nº 3.924/1961 (Lei da Arqueologia) dispõe sobre os monumentos
arqueológicos e pré-históricos existentes no Território Nacional e de todos os
elementos que neles se encontram, e torna público e coletivo o Patrimônio
Arqueológico Brasileiro. A Constituição Federal de 1988 declara que os sítios
arqueológicos são bens da União. O IPHAN é o órgão legal responsável pela gestão,
preservação, fiscalização e autorização de pesquisa e exploração dos sítios
arqueológicos no País.
São considerados sítios arqueológicos: sambaquis, tesos, grutas, cemitérios,
inscrições rupestres, entre outros locais, nos quais se encontrem vestígios humanos
de interesse arqueológico. O tombamento de bens arqueológicos é feito,
excepcionalmente, por interesse científico ou ambiental.
6.4 - Paisagem Cultural
O Brasil é autor de documentos e signatário de cartas internacionais que
reconhecem a paisagem cultura e seus elementos, como patrimônio cultural, e
preconizam sua proteção. A portaria Nº 127, de 30/04/2009, chancela a Paisagem
Cultural Brasileira, definindo-a como uma porção peculiar do território nacional,
representativa do processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida
e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores. Considera, também, o
caráter dinâmico da cultura e da ação humana sobre as porções do território, a que se
aplica, convive com as transformações inerentes ao desenvolvimento econômico e
social sustentáveis e valoriza a motivação responsável pela preservação do patrimônio
cultural.
A portaria Nº 127, implica, ainda, no estabelecimento de pacto que pode
envolver o poder público, a sociedade civil e a iniciativa privada, visando a gestão
compartilhada a ser acompanhado pelo IPHAN, prevendo relatórios de monitoramento
das ações e de avaliação periódica das qualidades atribuídas ao bem, revalidada num
prazo máximo de 10 anos. O processo de revalidação deve ser formalizado e instruído
a partir dos relatórios de monitoramento e de avaliação, juntando-se manifestações
das instâncias regional e local, para deliberação pelo Conselho Consultivo do
Patrimônio Cultural.
6.5 - Outros marcos legais importantes, em âmbito federal
Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, Estatuto da Cidade: Vários instrumentos
desse estatuto podem ser utilizados nos planos diretores, para auxiliar políticas de
gestão e valorização do patrimônio arquitetônico e urbanístico, tais como:
INSTRUMENTO ESTRATÉGIAS
Parcelamento, edificação ou utilização compulsória
Define prazos para o proprietário de terreno, não edificado, subutilizado ou sem nenhuma benfeitoria, dividir a área, construir ou reformar seu imóvel
IPTU Progressivo no Tempo
Não sendo cumprido o prazo anterior, fica o proprietário sujeito a uma taxa aplicada pela Prefeitura. E, como punição, terá seu imóvel, subutilizado ou sem uso, submetido a uma taxa maior a cada ano, por cinco anos seguidos, chegando o imposto a subir até 15% do preço estipulado para o bem.
Desapropriação Quando o proprietário, ainda que tenha pago por cinco anos o IPTU, não der utilização ao imóvel, pode a Prefeitura desapropriar o bem, sendo o pagamento, através de títulos da dívida pública, parcelados em dez anos.
Direito de Preempção O município terá preferência na compra de um imóvel urbano, situado em área previamente delimitada por Lei Municipal, assegurado seu valor de mercado.
Operações Urbanas Consorciadas
O município pode coordenar a execução de um conjunto de medidas, visando a preservação ambiental, recuperação ou transformação de áreas urbanas, introduzindo melhorias sociais e de infraestrutura, contando com a participação de moradores, proprietários, usuários permanentes e investidores privados.
Consórcio Imobiliário
Quando o proprietário não possui condições de parcelar, edificar ou utilizar o seu imóvel, ele poderá transferi-lo à Prefeitura, para que se realize um empreendimento imobiliário no local, recebendo, como pagamento, unidades (casas, apartamentos, espaços comerciais ou lotes urbanizados) em valor equivalente ao preço do imóvel antes da execução das obras.
Estudo de Impacto de Vizinhança
Alguns empreendimentos e atividades privadas ou públicas, para serem implantadas em área urbana, dependem da elaboração de um estudo de análise dos efeitos positivo e negativo na vida da população que mora nas suas proximidades. Esse estudo pode incluir o aumento da população na vizinhança, o tráfego que vai ser gerado e a demanda por transporte público, condições de ventilação e iluminação, assim como o impacto no patrimônio cultural e ambiental.
Quadro 7 – Instrumentos previstos na Lei nº 10.257 (Estatuto da Cidade) que podem ser utilizados pelos municípios, para auxiliar a gestão e estratégias de reabilitação urbana, em
áreas de interesse cultural
Instrução Normativa nº 1 de 25/11/2003: dispõe sobre a acessibilidade aos bens
culturais imóveis, acautelados em nível federal, e outras categorias, e tem como
referência básica a LF 10.098/2000, a NBR 9050 da ABNT. Ela busca soluções
para a eliminação, redução ou superação de barreiras na acessibilidade à bens
culturais imóveis, em compatibilização com sua preservação.
Decreto-Lei nº 5.264 de 5/11/2004: Instituiu o Sistema Brasileiro de Museus, com
a finalidade de promover a interação entre museus e a valorização e o
desenvolvimento das áreas e gestões integradas; e o desenvolvimento das
instituições.
7 Leis de incentivo e fomento
As leis de incentivos fiscais, em âmbito federal, estadual e municipal (Tabela
8) são, de certa forma, fontes de financiamento público consolidadas ao longo do
tempo, embora a captação de recursos ainda seja tarefa árdua e um desafio para a
gestão e o acesso democrático ao financiamento, o qual é reflexo de renúncia fiscal
dos governos. A descentralização de aplicação dos recursos, a capacitação e a
disseminação de políticas; construídas e implantadas democraticamente com o
envolvimento dos diversos atores interessados; são desafios para a gestão cultural.
ÂMBITO Legislação Mecanismos
Federal
Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei nº. 8.313/91), a Lei Rouanet
POLÍTICA DE EDITAIS
PONTOS DE CULTURA, MAIS CULTURA;
Concessão de incentivo fiscal (dedução de imposto de renda) à pessoa física ou jurídica, mediante doação ou patrocínio a projetos culturais aprovados pelo MINC.
Estadual LEI Nº 6.572, DE 8 DE AGOSTO DE 2003 (Lei Semear)
Concessão de incentivo fiscal (dedução de ICMS) para a realização de projetos culturais, no Estado do Pará, e dá outras providências.
Municipal (Belém/PA) Lei Tó Teixeira e Guilherme Paraense
Concessão de incentivo fiscal (dedução de ISS ou IPTU) para realização de projetos culturais ou esportivos, amadores, no âmbito do Município de Belém.
Quadro 8 – Leis de incentivos fiscais.
Além destas, os organismos internacionais (UNESCO, BID) e as fundações
privadas nacionais e internacionais ligadas à cultural, às artes e ao patrimônio cultural
são, também, referenciais para o financiamento dos mais diversos projetos culturais.
Outras fontes podem ser encontradas em editais de órgãos, como os
Ministérios das Cidades, do Turismo, da Justiça, entre outros, que podem ser
acessados facilmente pelo portal de convênios SICONV (www.convenios.gov.br).
8 Cooperação internacional.
No Brasil, o IPHAN é a instituição que representa as ações governamentais
na área da preservação do patrimônio cultural e é considerado pioneiro neste campo,
na América Latina, acumulando conhecimento e métodos, ao longo de sua existência,
sendo reconhecido como referência para instituições assemelhadas de países de
passado colonial.
O acervo cultural brasileiro é vasto e diversificado e reflete, além da herança
pré-histórica e indígena, anterior ao colonizador europeu; inúmeras contribuições de
outros povos que aqui se estabeleceram. A ele somam-se o acervo compartilhado,
que o país divide com outros países, por proximidade de fronteiras ou situações
históricas em comum, por influências culturais recebidas ou transmitidas.
Esta situação propicia a demanda de vários países do mundo, que desejam
desenvolver acordos internacionais e parcerias nos mais diversos projetos de
cooperação internacional. Técnica e cientificamente, muitas universidades também
tem caminhado nessa perspectiva de cooperação internacional, que podem ser
fundamentais, não apenas na captação de recursos, para projetos e obras, mas,
também, para troca de experiências, metodologias de intervenções, diagnósticos e
inventários nos mais diversos campos e na capacitação técnica e até na preparação
de dossiês, para a apresentação ao Comitê de Patrimônio Mundial da Unesco.
Conheça as principais agências de cooperação internacional e
desenvolvimento de diversos países e organismos internacionais que podem ser
acionadas nos mais diversos campos, acionando o portal Iphan
(http://portal.iphan.gov.br/).
9 PAC das Cidades históricas
Trata-se de uma ação intergovernamental, articulada com a sociedade, para a
preservação do patrimônio cultural brasileiro, a valorização da cultura e promoção do
desenvolvi mento econômico e social, com sustentabilidade e qualidade de vida para
os cidadãos. Busca consolidar os resultados obtidos a partir do incremento das
políticas culturais, em especial, da implementação do Programa Monumenta, criado
em 1999 pelo Ministério da Cultura, com financiamento do Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID) e apoio da Organização Educacional, Científica e Cultural das
Nações Unidas/UNESCO, que tinha por objetivo a recuperação de imóveis integrantes
de sítios históricos, tombados pelo IPHAN, como também propiciar ações de
fortalecimento institucional (treinamento de equipes, atualização legislativa urbana,
educação patrimonial), formação de mão de obra, para restauro, e fomento de
atividades econômicas, promovendo impactos positivos, para comunidades de 26
municípios beneficiados.
Assim, o objetivo do PAC Cidades Históricas é de ampliar a abrangência
dessa estratégia de desenvolvimento, posicionando o patrimônio cultural como eixo
indutor e estruturante, e baseia-se em políticas intersetoriais e parcerias estratégicas,
com destaque para os Ministérios do Turismo, Educação e Cidades, Petrobrás,
Eletrobrás, Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, Caixa
Econômica Federal e Banco do Nordeste do Brasil – BNB.
10 A gestão municipal e a preservação cultural
Os municípios devem criar, considerando suas especificidades, instrumentos
legais para a proteção de seu patrimônio material imóvel ou móvel, paisagem cultural
e imaterial. O papel dos municípios, na gestão do patrimônio arquitetônico e
urbanístico, é fundamental, pois são eles os responsáveis diretos por legislar
urbanisticamente. Duas estratégias são fundamentais nesse processo (Figura 9):
Figura 9 – Planejamento e inventário na gestão patrimonial.
O primeiro passo refere-se ao conhecimento sobre o que há de relevante na
memória arquitetônica e urbanística da cidade. O recorte histórico, territorial e
estilístico deve considerar a realidade local e sua referência para a memória coletiva.
O acervo a preservar, não necessariamente, estará contido no núcleo urbano, mas
pode estar disposto em vilas e comunidades rurais distantes da sede do município. O
inventário desses acervos, associado ao processo de mobilização e sensibilização,
para a preservação, através da educação patrimonial, são essenciais para esse
reconhecimento, inclusive os registros dos saberes e práticas do patrimônio imaterial,
os relatos dos mestres e tesouros humanos.
No campo urbanístico, o plano diretor, preferencialmente, delimitará as áreas
de proteção, conceituará e definirá seus objetivos e diretrizes, remeterá a instrumentos
regulamentares específicos, com a definição de modelos urbanísticos, gabaritos
(alturas máximas para construções), níveis e ou categoriais de preservação, conforme
sua realidade e características do sítio urbano e físico.
Também podem conter instrumentos para incentivos fiscais, tais como,
isenção de taxas para licenciamento de obras, descontos de IPTU e outros impostos
locais, além dos mecanismos coercitivos e penalidades.
É importante, ao pensar a gestão patrimonial urbana, a definição de áreas de
entorno, para os bens tombados (Figura 10). Essas áreas buscam resguardar a
ambiência, vizinhança, garantir a estabilidade e a visibilidade do bem tombado e
proteger a unidade arquitetônica e paisagística. Quando não delimitadas no
tombamento, genericamente toma-se um raio de preservação imediato, a partir do
bem ou bens tombados, usualmente de 100 a 300m.
Figura 10 – Área de entorno do eclético Mercado de São Braz (1910-1911) e da modernista Escola Benvinda de França Messias (1951), tombadas pelo município de Belém (F).
Referências
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CRÉDITOS IAMGENS/FIGURAS/QUADROS
Acervo digital DEPH/FUMBEL (F)
Acervo digital DPHAC/SECULT (S)
Juliana Moreira (JM)
Roseane Norat (RN)