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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Produção Didático-Pedagógica
Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE
VOLU
ME I
I
GOVERNO DO PARANÁSECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃOPROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
EVANILDO VIEIRA
UNIDADE TEMÁTICA
MARINGÁ
2010
1
EVANILDO VIEIRA
UNIDADE TEMÁTICA
GESTÃO ESCOLAR: PROPOSIÇÕES, CONSTRUÇÕES E LIMITES
Unidade Temática realizada pelo Professor e entregue à SEED-PR como parte dos quesitos do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2009
Orientadora: Prof. Ms. Eliana Claudia Navarro Koepsel
MARINGÁ2010
2
SUMÁRIO
1. Introdução_____________________________________________________04
2. Gestão escolar: proposições ______________________________________06
3. Gestão escolar: contexto de referência ______________________________11
4. Gestão escolar: construções e limites _______________________________18
5. Considerações finais ____________________________________________25
6. Referências ___________________________________________________27
3
No final do século XX e início do século XXI, ocorreram várias reformas
no campo educacional. A demarcação legal das mudanças no Brasil é dada pela
Constituição Federal de 1988, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), n° 9394/96 e pelo Plano Nacional de Educação (PNE). No plano
internacional, a necessidade da reforma educacional foi expressa na Conferência
Mundial sobre Educação Para Todos, realizada em Jomtien, em 1990, que teve
como resultado a Declaração Mundial sobre Educação para Todos e no Relatório
“Educação: um tesouro a descobrir”, elaborado pela comissão presidida por
Jacques Delors, em 1996, os quais tiveram grande influência nos rumos da
educação nacional.
A justificativa da mudança nesses relatórios internacionais ou na
condução nacional pauta-se pela melhoria da qualidade de ensino. Na busca da
almejada qualidade, novas formas de gestão são traçadas. Essas alteram, não só
a rotina das escolas, como implicam em novos conhecimentos para os
professores e gestores. Para muitos as mudanças ainda não são compreendidas.
No contexto de mudanças a gestão escolar recebe atenção especial. O
termo administração é substituído por gestão. Presente em praticamente todos os
documentos legais produzidos a partir da nova realidade vivida no final do século
XX e início deste, o termo gestão torna-se familiar na nova forma de administrar o
ensino. Não se trata de mera mudança de termos, pois as palavras são
carregadas de significados, muitos deles tendo que ser compreendidos
historicamente.
O estudo da gestão no contexto das recentes reformas educacionais nos
permite a análise e o entendimento de como a educação vem sendo tratada nas
diferentes esferas de governo e seu reflexo na prática escolar, bem como nós,
agentes do processo educacional somos partícipes dessa nova forma de gestão.
Este projeto busca entender no contexto de mudanças o significado das
novas formas de gestão. Assim sendo, questiona-se: qual a relação entre as
transformações no mundo do trabalho e as novas formas de gestão escolar? Qual
o significado dessas alterações para os profissionais que atuam na escola? Qual
4
1. INTRODUÇÃO
a relação entre gestão educacional e gestão escolar? Quais os novos
fundamentos da gestão educacional e escolar?
Além disso,o referido estudo propõem-se a discutir a gestão escolar no
contexto das recentes reformas educacionais, uma vez que a investigação não
acontece num espaço social vazio e anistórico, sendo necessário referenciar em
que condições históricas mundiais elas emergiram. Por esta razão é que nos
deteremos a entender o contexto das reformas e dos novos rumos da gestão
escolar.
O presente material, produção didática do curso de formação continuada
dos professores da rede estadual de educação do estado do Paraná – PDE
(Programa de Desenvolvimento Educacional) realizado na área de Gestão
Educacional, aplicar-se-á como parte do conteúdo do curso de extensão que será
oferecido aos profissionais da educação das redes estadual e municipal de ensino
do município de São Jorge do Ivaí.
Dessa forma, construiu-se a Unidade Temática sobre três eixos principais.
O primeiro, intitulado Gestão escolar: proposições, apresenta os elementos
conceituais e legais da gestão. Assim, constituem fontes a Constituição Federal, a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e o Plano Nacional de
Educação (PNE). O segundo eixo, denominado Gestão escolar: contexto de
referência, objetiva compreender o berço das mudanças na condução da gestão
pública, no qual discutiremos a Reforma do Estado, a reforma da educação e os
novos princípios da gestão. É importante lembrar que as últimas décadas do
século XX e o início do século XXI foram marcados por transformações profundas
na materialidade das relações sociais, que decorreram da resposta do capitalismo
mundial à crise estrutural que se evidenciou a partir da década de 1970. O
terceiro eixo, denominado Gestão escolar: construções e limites, analisa como a
gestão estabelecida nos documentos basilares se materializa na escola,
mostrando a prática da gestão em nosso cotidiano escolar.
5
Neste eixo, passamos a expor as proposições em relação à gestão da
escola. Antes, cabe explicitar alguns conceitos: Política Educacional, políticas
educacionais, gestão educacional, gestão escolar e gestão democrática. Embora
simples, entendemos que esses termos carecem de explicitação, pois estão
presentes em diversos documentos (legislação e textos de apoio aos estudos
pedagógicos), enfim pertencem ao cotidiano dos gestores.
Vieira (2007) no texto Política(s) e gestão da educação básica: revisitando
conceitos simples, discute os elementos conceituais e práticos dos termos:
Política Educacional, políticas educacionais, gestão educacional, gestão escolar e
gestão democrática. Elucidaremos os termos tomando o texto citado como fonte.
Devemos ressaltar que a Política Educacional do Estado, num sentido
macro é constituída por uma série de políticas educacionais relacionadas aos
diversos aspectos da educação, uma vez que, a organização educacional está
pautada nas políticas públicas de educação que determinam desde sua oferta,
passando pelos diversos níveis e modalidades de ensino, chegando a cada
indivíduo como um direito do cidadão preconizado pela Política Educacional do
Governo.
Vieira (2007) explica que, num sentido mais conceitual, Política
Educacional seria a reflexão teórica sobre as políticas educacionais. Numa
acepção mais prática, a política educacional trata de ideias, ações, sobretudo
governamentais. E as políticas educacionais correspondem as áreas específicas
de intervenção política, por exemplo: políticas da educação infantil, políticas da
educação de jovens e adultos, do ensino superior e etc.
São nos órgãos centrais (exemplo, Ministério da Educação) e
intermediários dos sistemas de ensino (exemplo, Secretarias de Educação das
diversas instâncias governamentais) e nas unidades escolares (escolas) que as
políticas públicas se materializam na forma de Gestão. Vieira (2007) adverte que
é preciso superar a polarização quanto à construção dos processos políticos,
como se somente o Estado produzisse política(s) e a escola e outros atores
sociais fossem totalmente passivos politicamente. O fazer político envolve um
complexo jogo de forças sociais que resultam na ação prática e ações
6
2. Gestão escolar: proposições
governamentais. Por isso[...] são objeto de interesse e de análise da política educacional as iniciativas do Poder Público, em suas diferentes instâncias (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e espaços (órgãos centrais e intermediários do sistema e unidades escolares) (Vieira, 2007, p. 57).
Quanto a implementação das políticas educacionais, segundo Vieira
(2007), para atender ao que estabelece a Constituição, será de responsabilidade
de diversos segmentos da estrutura burocrática que se constitui a educação,
cabendo aos diversos agentes responsáveis pela oferta e execução dessas
políticas a sua gestão, seja ela no âmbito nacional, estadual ou municipal. Assim,
o termo gestão, amplamente utilizado na educação, está intimamente ligado a
forma de conduzir e implementar as políticas educacionais em seus diversos
níveis e instâncias, substituindo atualmente o termo administração.
Segundo Minto (2006) a partir da Constituição de 1988 o termo “gestão”
surge como pressuposto de uma gestão técnica da educação, desvinculada de
seu caráter político e orientada pelos critérios econômicos de gestão, ou seja, o
gestor passa a ser o encarregado de executar as determinações advindas dos
responsáveis pela tomada de decisões em instâncias hierarquicamente
superiores, deixando de ser um participante ativo nos processos decisórios, quer
de natureza pedagógica ou específica de cada unidade escolar.
O termo gestão, na Educação, pode estar associado a diferentes
entendimentos como: Gestão Educacional, Gestão Escolar e Gestão
Democrática.
Vieira (2007) esclarece que a gestão educacional abrange a organização
do ensino a nível federal, estadual ou municipal e sua oferta pelo setor público ou
privado, bem como sua regulamentação legal. A cada esfera de governo
responsável pela execução da Política Educacional são atribuídos papeis que se
complementam e fazem com que a educação passe a ser efetivada na prática.
Segundo Vieira (2007, p. 60) “[...] a Gestão Educacional é o espaço de ação dos
governos, sejam eles federal, estaduais e municipais”. Cabe, portanto, a cada um
desses, a execução da gestão naquilo que compete a cada esfera, estabelecido
pela Constituição Federal e pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, Lei nº 9.394/96). Vejamos como a Constituição Federal, a LDB e o
7
Plano Nacional de Educação tratam a gestão.
Na LDB, no artigo 9º, é definido que incumbe a União elaborar o Plano
Nacional de Educação, prestar assistência financeira e técnica a Estados, Distrito
Federal e Municípios, estabelecer as diretrizes para a educação infantil, ensino
fundamental e médio e autorizar, reconhecer, credenciar e avaliar os cursos de
educação superior, entre outras atribuições. Isso significa que a LDB estabelece
que o governo central é o responsável pela definição das políticas, estabelece o
Plano Nacional, as diretrizes e a avaliação. Trata-se, portanto, da centralização
das decisões no âmbito nacional. No artigo 10 a LDB determina que os Estados
elaborem e executem as políticas educacionais em consonância com as diretrizes
e planos nacionais de educação, assegurem o ensino fundamental, com
prioridade para o ensino médio para todos os que demandam. Aos municípios a
Gestão Educacional aparece no artigo 11 da LDB no que diz respeito a
obrigatoriedade da oferta da educação infantil, com prioridade ao ensino
fundamental, integrando-se às políticas e planos educacionais da União e do
Estado.
No Plano Nacional de Educação (PNE – Lei nº 10.172) aprovado em
janeiro de 2001, com duração de dez anos, no capítulo V – Financiamento e
Gestão é afirmado que existe a necessidade de uma gestão mais eficiente dos‒
recursos financeiros destinados a educação, quer pela criação de novas fontes de
receitas como pela descentralização dos recursos, direcionando-os diretamente
às escolas através de unidades executoras como Associação de Pais e Mestres
ou de Conselhos Escolares, que passaram de 11.643, em 1995, para 54.591 em
1998. Ainda no campo da gestão educacional o PNE cita a Constituição Federal
ao estabelecer a divisão de responsabilidades entre União, estados e municípios
em regime de colaboração, citando com destaque a importância da diretriz que
reforça a condição de um verdadeiro federalismo entre as partes: [...] portanto, uma diretriz importante é o aprimoramento contínuo do regime de colaboração. Este deve dar-se, não só entre União, Estados e Municípios, mas também, sempre que possível, entre entes da mesma esfera federativa, mediante ações, fóruns e planejamento interestaduais, regionais e intermunicipais. (BRASIL, 2001, p. 78).
O PNE reforça a necessidade de promover desburocratização e
descentralização da gestão nas dimensões pedagógica, administrativa e
8
financeira, devendo cada unidade escolar contar com o repasse direto de
recursos para desenvolver sua ação pedagógica e para as despesas do cotidiano.
Para a prática da gestão democrática num processo de autonomia, o PNE
defende a constituição dos Conselhos Escolares e a escolha de diretoresFinalmente, no exercício de sua autonomia, cada sistema de ensino há de implantar gestão democrática. Em nível de gestão de sistema na forma de Conselhos de Educação que reúnam competência técnica e representatividade dos diversos setores educacionais; em nível das unidades escolares, por meio da formação de conselhos escolares de que participe a comunidade educacional e formas de escolha da direção escolar que associem a garantia da competência ao compromisso com a proposta pedagógica emanada dos conselhos escolares e a representatividade e liderança dos gestores escolares. (BRASIL, 2001, p. 78).
A Gestão Escolar, como o próprio nome remete, está associada à gestão
da educação no estabelecimento de ensino. De acordo com o artigo 12 da LDB, é
dever da escola a gestão de recursos físicos, financeiros, humanos e
pedagógicos. Assim, parte do que antes era decidido nas esferas superiores da
administração da educação passa a ser de responsabilidade dos
estabelecimentos de ensino, desde a elaboração de sua proposta pedagógica, a
gestão de pessoal, dos recursos financeiros, como também a gestão da
comunidade escolar e da qualidade da educação oferecida.
A Gestão Escolar confere a escola um ar de autonomia, o que exigirá
novas posturas na forma de atuação dos gestores, e de acordo com Vieira (2007,
p. 63) “[...] a gestão educacional situa-se na esfera macro, ao passo que a gestão
escolar localiza-se na esfera micro” tendo ambas a finalidade de fazer cumprir o
artigo 205 da Constituição Federal “A educação, direito de todos e dever do
Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade [...]” e o artigo 2º da LDB, ou seja, a educação como “direito de todos”
com o objetivo de promover “[...] o pleno desenvolvimento do educando, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”
(BRASIL, 2009).
A Gestão Democrática tem seu embasamento legal na Constituição de
1988, no Art. 206 lemos que o ensino será ministrado com base nos seguintes
princípios: “[...] VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei” e na
LDB nos seguintes artigos:
9
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: […] VIII – gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino; Art.14 Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
Conforme previsto em lei, a gestão democrática deve prevalecer na
educação, seguindo o princípio da participação, viabilizada pelas instâncias
colegiadas: Conselho Escolar, Conselho de Classe, Associação de Pais e Mestres
e Grêmio Estudantil, os quais estariam oportunizando a participação da
comunidade escolar na gestão do estabelecimento de ensino, sendo cada
segmento representado por seus pares nos órgãos colegiados.
Entendemos que a gestão escolar como processo histórico caracteriza-se
por multiplicidade, diversidade, continuidades e rupturas. É fruto de múltiplas
determinações: da política, da economia, não se explica por si só. Assim, crise,
reforma do Estado, reestruturação produtiva e neoliberalismo comporão o
universo de compreensão da educação no período estudado. Diante desse
pressuposto buscaremos na sequência entender o período em que as mudanças
na esfera educacional se fizeram sentir de forma mais contundente, a década de
1990.
10
A crise mundial do capitalismo nas décadas de 1960 e 1970 coloca em
xeque o chamado Estado de Bem-Estar Social, nome dado as conquistas sociais
obtidas no pós-guerra, em especial nos países desenvolvidos da Europa
Ocidental. Caracterizado pela boa qualidade dos serviços públicos prestados à
população como saúde, educação, esportes, lazer, transporte, segurança,
moradia, previdência social, financiado pelo Estado e com a elevada carga
tributária estabelecida sobre o capital produtivo, também afetou a economia dos
países subdesenvolvidos como o Brasil.
Apesar de não termos vivido no Brasil uma situação de bem-estar
semelhante a dos países europeus, segundo Minto (2006, p. 145) no Brasil “[...]
as escassas conquistas sociais obtidas ao longo de décadas de luta pela classe
trabalhadora também seriam progressivamente revertidas”. Para Minto (2006) ao
adotar no pós-guerra um modelo de crescimento econômico dependente do
capital estrangeiro o país foi levado ao endividamento externo para financiar a
produção nacional, como também, contribuiu para o agravamento da crise
econômica e social.
Ainda segundo Minto (2006) as reformas do Estado na tentativa de aliviar o
peso da sua responsabilidade em manter o crescimento econômico e a oferta dos
serviços públicos, levou a educação a assumir um caráter mercantil inserida na
política do chamado “Estado Mínimo” neoliberal, não abriu mão do seu controle
pelo papel social estratégico que possui a educação.
A década de 1980, conhecida como a “década perdida” devido ao pequeno
crescimento da economia brasileira em comparação a década de 1970,
caracterizada pela reorganização dos movimentos sociais, possibilitou a
mobilização da população em torno da campanha das “diretas já” e na eleição de
um presidente civil em 1984, após 21 anos de regime militar. Segundo Minto
(2006, p. 147) entre inúmeras reivindicações se destacam:[...] aumento do controle público sobre o Estado, bem como a atenção a muitas das demandas sociais negligenciadas pela Ditadura. Dentre elas, merece destaque a gestão democrática da
11
3. Gestão escolar: contexto de referência
educação, tanto em seu conjunto enquanto política educacional, como também na gestão das unidades de ensino nos diversos níveis.
Nesse cenário político, esclarece Minto (2006, p.147) que [...] a instauração da chamada Nova República se deu por meio de uma reorganização das forças políticas dominantes no país, num processo que manteve no poder as velhas classes políticas que apoiaram o regime ditatorial.
Dessa maneira, para a sociedade como um todo, pouco ou quase
nenhuma foram as mudanças proporcionadas pelo novo regime, pois apenas o
retorno de um presidente civil ao poder não seria suficiente para acabar com a
herança política de um governo ditatorial que se instalara no país por mais de
duas décadas.
O papel desempenhado pela educação escolar ganha clareza e aumenta a
discussão sobre as atribuições de cada um dentro da escola, começando pelo
diretor, passando pelos professores, funcionários e até dos alunos.
Nas palavras de Minto (2006, p. 148) “Para a Educação, a década de 1980
não foi “perdida”, uma vez que, algumas das principais bandeiras de lutas dos
movimentos sociais de defesa da educação expressam esses avanços”, entre
eles, a concepção de educação pública e gratuita, a educação como direito
assegurado pelo Estado e a organização do sistema nacional de educação.
A reforma do Estado e a implementação de políticas econômicas e
educacionais de ajuste na década de 1990 no Brasil, tiveram como objetivo
segundo Oliveira (2009), a inserção do país na globalização econômica. A
implementação das reformas e das políticas educacionais do governo Fernando
Henrique Cardoso (1995-2002) objetivaram:A elevação da competitividade do país e sua inserção na globalização econômica por meio da flexibilização das relações capital-trabalho, da elevação do tempo de escolarização da força de trabalho, a partir da ênfase no ensino fundamental, do apoio ao processo de acumulação, legitimação do sistema, garantia de ordem e controle social e da implementação de novas formas de regulação dos sistemas de ensino e das escolas, visando maior concorrência, eficiência e produtividade. (OLIVEIRA, 2009, p. 242).
O governo Lula que se iniciou em 2003, sem muitas rupturas, priorizou, de
acordo com Oliveira (2009), o crescimento do país e a inclusão social por meio da
educação, com ênfase sobre “[...] a reforma da educação superior, o incentivo à
12
qualidade da educação básica, a alfabetização e fortalecimento da educação
profissional” (Oliveira, 2009, p. 242).
A administração escolar, caracterizada pela burocracia e centralização das
ações, passa a ser questionada diante uma realidade democrática que
reivindicava a participação social nos instrumentos de gestão. As conquistas no
campo da gestão escolar são expressas com a descentralização administrativa e
pedagógica, eleições diretas para diretor, formação dos colegiados eleitos pela
comunidade, constituição de comissões estaduais e municipais para o
acompanhamento das políticas educacionais.
Os planos educacionais sofreram as influências das novas formas
gerenciais, o que fez da educação o foco de uma reestruturação administrativa:A ênfase especial recaiu na reorganização das funções administrativas e de gestão da escola, pautada na descentralização administrativa, na maior autonomia das unidades escolares, bem como em um estímulo a uma maior participação dos sujeitos envolvidos no processo educacional (PERRUDE; LARA, 2009, p.47).
Neste contexto, as reivindicações e avanços refletiram-se na Constituição
de 1988, garantindo a “gestão democrática” para escola pública, sem no entanto
defini-la, o que deveria ser feito por meio de lei complementar.
Na prática, segundo Minto (2006, p. 150), as ações democráticas nas
escolas foram pouco além de reforçar os mecanismos já existentes, resultado de
conquistas da comunidade como a Associação de Pais e Mestres, os Grêmios
Estudantis e os colegiados e, não raro, de maneira deformada ou equivocada,
uma vez que a Constituição não definia o termo “democrático”.
A descentralização da educação tem como uma de suas realizações o
processo de municipalização do ensino. Segundo Peixoto (2003) essa ideia não é
nova, uma vez que nas décadas de 1920 e 1930 a municipalização foi defendida
pela Associação Brasileira de Educação, ganhando força na década de 1970, com
o governo militar, que apresentava a descentralização do ensino como um
conjunto de vantagens, nem sempre verdadeiro segundo a autora, pois, ao
mesmo tempo que a municipalização possibilita uma política educacional menos
burocrática e uma gestão mais democrática, esta pode também subordinar a
educação às oligarquias locais.
13
A reforma do Estado objetivou liberar e desimpedir a acumulação de
capital, retirando a legitimação sistêmica e o controle social da lógica
democrática, passando para a lógica da concorrência do mercado. O Consenso
de Washington teve o papel de orientar o processo de adequação dos países
periféricos às novas exigências do capital internacional. A disciplina fiscal, a
priorização nos gastos do setor público, a reforma tributária a liberalização
comercial e financeira foram as suas principais recomendações. A sustentação
ideológica para essas mudanças foi o neoliberalismo, ele forneceu a sustentação
necessária às práticas político-econômicas regidas por influências de países
hegemônicos.
O neoliberalismo, que surgiu na década de 1940, e que segundo Morais
(2010) é uma doutrina econômica que consiste no retorno das ideias do liberalis-
mo clássico que tem como principal característica a defesa da livre iniciativa, a
desregulamentação e privatização das atividades econômicas, ficando as funções
do Estado limitadas basicamente a manutenção da segurança interna e externa, a
garantia dos contratos e a responsabilidade por serviços essenciais de utilidade
pública, e atingiu a América Latina na década de 1970, tendo como pioneiros a
adotar as reformas atribuídas a onda neoliberal, o Chile em 1973 e a Argentina
em 1976.
O sucesso político do neoliberalismo na década de 80 fez com que muitos
governos assumissem o compromisso com a desregulamentação do ensino, che-
gando a ensaiar programas de privatização e tratando a educação como produto
de livre mercado, conforme Laval (2004) apresenta na obra “A Escola não é uma
empresa”:
Um dos fatores que contribuíram para naturalizar a idéia de que a educação poderia ser objeto de escolha em um mercado livre foi, evidentemente, o sucesso político do neoliberalismo nos anos 1980. A ideologia do livre mercado encontrou nos Estados Unidos e Inglaterra seu terreno clássico de aplicação antes de se difundir uni-versalmente. (LAVAL, 2004, p. 91).
A onda neoliberal liderada pelos Estados Unidos e Inglaterra na década de
1980 atingiu os quatro cantos do planeta, chegando ao Brasil de forma contun-
dente no governo de Fernando Henrique Cardoso que organizou a reforma do Es-
14
tado e promoveu um processo de privatizações em diversos setores sobre o con-
trole estatal.
Inspirados no aparente sucesso da política neoliberal implementada pelo
governo federal, alguns estados, entre eles o Paraná, foram ao longo da década
de 1990 conduzidos por uma prática semelhante de governo.
A educação nesse período familiarizou-se com termos próprios do neolibe-
ralismo como: qualidade total, planejamento, serviços, clientes, satisfação entre
outros. Os gestores submeteram-se a processos de capacitação em modelos ge-
renciais, sendo tratados como líderes responsáveis por implementar programas
de qualidade total em suas escolas.
Segundo Laval (200 ), sob o pretexto de descentralizar e desburocratizar a
gestão, a transferência de poder não teve os efeitos esperados, pois gerir a esco-
la como uma empresa exige-se:
[...] colocar no comando das unidades descentralizadas, “verdadei-ros chefes” encarregados de aplicar eficazmente as políticas de modernização decidida pelas altas esferas e capazes de mobilizar as energias; de introduzir as inovações e controlar os professores na base. Os partidários mais autênticos do neoliberalismo escolar insistem muito sobre a importância de um verdadeiro “leader” no comando das escolas [...].
Na visão neoliberal, um Estado que investe em políticas de bem-estar é um
Estado que gasta muito e é pouco eficiente, de forma que a modernização
almejada nos idos de 1990 implicou em reformas no âmbito da gestão educativa
que priorizassem a descentralização e a autonomia institucional; a abertura
institucional para a participação da sociedade e medidas de responsabilização de
resultados por meio dos sistemas de avaliação externos e internos (FREITAS,
1998).
No Brasil, as ideias sobre a reforma apareceram no documento Plano
Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (Plano MARE) de 1995, de Bresser
Pereira. O modelo administrativo proposto por Bresser Pereira no Plano MARE
era o gerencial, no qual predominam os valores da eficiência e da qualidade na
prestação dos serviços públicos e desenvolvimento de uma cultura gerencial nas
organizações. A administração pública gerencial via o cidadão como contribuinte
de impostos e como cliente de seus serviços (BRASIL, 1995). A palavra de ordem
15
nesse plano é flexibilizar.
Oliveira (1997) afirma que a gestão da educação pública pautada agora
na descentralização dos recursos e na flexibilização administrativa passa a ter na
escola o centro da gestão, sendo esta a responsável em se autogerir e garantir a
qualidade do ensino, afirmando também que “[...] a educação continua ser
invocada como ‘tábua de salvação’ para o progresso e equilíbrio social” (1997, p
71). Ou seja, a escola ainda é tida como a redentora de uma sociedade marcada
pelos fortes desequilíbrios sociais, sendo a reforma na gestão do Estado e da
educação o caminho, nesses discursos, de superação dos problemas sociais e
educacionais.
Nesse contexto, a escola passa a ser tratada como uma empresa. Do
diretor, espera-se uma capacidade gerencial, e segundo Minto (2006) o processo
educativo se transforma em algo competitivo, em que o êxito e o fracasso são
decorrência das competências de cada indivíduo.
As novas formas de gestão, centradas agora na escola com a gestão
democrática preconizada na Constituição Federal, bem como na LDB dá um ar
mais participativo e democrático à gestão. No contexto neoliberal as antigas lutas
por maior participação são agora traduzidas como desresponsabilização dos
poderes públicos, pois a tão desejada descentralização que se contrapunha a
centralização autoritária dos tempos de ditadura militar deu lugar a
desconcentração.
Ao alegar a inoperância e falta de recursos do Estado em garantir a
educação que se deseja, a educação passa a contar com o auxílio da iniciativa
privada no financiamento e nas parcerias com a escola pública, referenciando um
modelo eficaz de gestão. A eficácia desse modelo de gestão começa a ser
justificada na desconcentração das ações e dos recursos, alegando-se que o
problema não é a falta deles, mas sim, a sua má distribuição, atribuindo-se dessa
forma aos municípios e à escola a possibilidade de administrar os parcos recursos
disponíveis. Trata-se de novas práticas de gestão implementadas nas empresas
como forma de intensificação do trabalho no sentido de “fazer mais com menos”
que passou a influenciar, também, a administração pública e outras instituições,
como a escola.
16
Segundo Nogueira (2005), o Estado ao se afastar da prestação de serviços
e com crescentes e diversificados problemas sociais, faz com que sociedade
ative redes ou operações de “solidariedade” para continuar respondendo às suas
carências e necessidades, quando:O incentivo à solidariedade e ao voluntariado passa a ser, assim, quase “estrutural”. Mas acontece que a partir de um certo ponto, a solidariedade pode se fazer independentemente da reiteração dos direitos de cidadania ou mesmo de uma visão consistente a respeito de direitos sociais, obrigações estatais, leis e providências governamentais. (NOGUEIRA, 2005, p. 155).
Passamos assim a assistir nas escolas as ações de cunho assistencialista,
aos trabalhos voluntários ou filantrópicos patrocinados por empresas ou
organizações que usam deste espaço público para por em prática sua ação
social.
A reforma educacional nos anos 1990 definiram os sentidos que a
educação deveriam assumir, contudo, a escola não se constituindo em mero
reverso da(s) política(s) se “[...] configura como espaço de reconstrução e de
inovação, oferecendo elementos para a formulação de novas políticas” (VIEIRA,
2004, p. 58).
17
A gestão escolar é espaço de novas construções, como, também, é
reveladora dos limites das proposições que idealizadas ou limitadas em condições
de efetivação em nada contribuem para resolver os problemas que se põem.
A gestão escolar estabelecida pela Constituição Federal e pela LDB vai se
fazer presente na escola e no cotidiano da comunidade escolar de variadas
formas, segundo a compreensão e realidades daqueles que a materializam.
Gracindo (2009, p.135) esclarece que a gestão é executada de maneiras diversas
nos diferentes sistemas de ensino: [...] ela vem sendo desenvolvida de variadas formas a partir de diferentes denominações: gestão democrática, gestão participativa, gestão compartilhada, co-gestão, dentre outras. Sob o aparente manto da semelhança, sob cada uma dessas denominações estão alojados comportamentos, atitudes e concepções, por vezes, muito diferenciados.
Ainda segundo o mesmo autor (2009), a prática da gestão democrática nas
escolas públicas do Brasil passa pela exigência da escolha do diretor, o que pode
acontecer de diversas maneiras, de acordo com o que estabelece a legislação
dos estados e municípios a respeito dessa prática. A escolha do diretor dar-se-á
por um processo de eleição direta na escola, por indicação do poder executivo
local, pelo resultado da aprovação em concurso público para o cargo ou por meio
de formas mistas de escolha, conjugando dois ou mais desses critérios.
A escolha do diretor por meio de eleição direta na escola, tem representado
mais uma das formas de expressar a democracia restabelecida no país na
década de 1980 e garantida pela Constituição Federal de 1988, contudo, para
algumas localidades essa tem se resumido apenas na eleição de direção, como
para outras, nem usam desse meio para definir o nome a ocupar o cargo de
diretor. A eleição direta do diretor segundo Souza (2009, p. 205) representa,[...] um avanço democrático, uma conquista social; que é um exercício de liberdade, no sentido do livre arbítrio, da manifestação da opinião e da vontade coletiva acerca dos rumos, dos projetos, do método de trabalho e de gestão escolhido pela comunidade para reger a ação institucional por um determinado tempo.
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4. Gestão escolar: construções e limites
Na opinião de Souza (2009), a gestão democrática não é assegurada no
âmbito escolar com a realização de eleições para diretor em que segundo o
próprio autor:A eleição de diretor, por exemplo, pode exprimir o resultado de um processo verdadeiramente democrático no seio da comunidade, mas pode, também, ser usada como estratégia para frear a continuidade da experiência, ou mesmo para justificar medidas e ações que não implicam, obrigatoriamente, a participação coletiva, o atendimento dos projetos institucionais, os interesses da comunidade escolar.
O conselho escolar em praticamente todas as escolas públicas
caracterizou a gestão democrática na unidade de ensino. Ao ser constituído por
membros que representam os diversos segmentos da comunidade escolar, o
conselho escolar assinalou a existência da prática de uma gestão democrática, o
que segundo Gracindo (2009) “É uma prática que, se de um lado, envolve a
desconcentração do poder, de outro, traz legitimidade e aderência à todas as
ações do dirigente, posto que consensuadas”.
O papel desempenhado pelo conselho escolar em questões
administrativas, financeiras e pedagógicas são discutidas e decididas num
consenso entre os membros da comunidade escolar, reforça a sua importância
nessa forma de gestão.[...] a gestão deixa de ser prerrogativa de uma só pessoa e passa a ser um trabalho coletivo, onde todos se congregam para, juntos, construírem uma educação de qualidade socialmente relevante. Com isso, divide-se o poder e as conseqüentes responsabilidades. (GRACINDO, 2009 p. 139).
A descentralização de recursos financeiros destinados a educação básica,
em especial ao ensino fundamental passou a ser mais um elemento presente na
gestão da escola pública a partir de meados da década de 1990 com a
implantação do PDDE (Programa Dinheiro Direto na Escola), que consistiu no
repasse de recursos públicos às unidades executoras de cada estabelecimento
de ensino fundamental, tomando como base de cálculo o número de alunos
matriculados.
Cabe ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que
administra o PDDE, estabelecer as normas de aplicação dos recursos financeiros
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destinados às escolas bem como definir o valor per capita por aluno matriculado
como base do repasse dos valores às Associações de Pais e Mestres ou outro
tipo de unidade executora existente na escola, bem como as regras de como
deverá ser realizada a prestação de contas do referido recurso.
Esse repasse de recursos financeiros pelo PDDE, ao mesmo tempo que
enfatiza a condição de autonomia da gestão escolar reforçando o papel dos
colegiados, mas afasta do seu papel político. Cita Aguiar (2009, p. 176):Sustentadas pelo aparato legal-institucional, as unidades executoras foram incorporadas aos sistemas de ensino na maioria dos estados, apresentando-se como uma alternativa de gestão escolar afastada do debate que estivera, até então, centrado no projeto pedagógico e em sua dimensão política.
O repasse de dinheiro diretamente para as escolas, na opinião de Aguiar
(2009, p. 175) teria como propósito “[...] reforçar o argumento que os recursos
financeiros destinados à educação seriam suficientes para atender às demandas
educacionais, desde que fossem geridos com eficiência”. Parece que os
problemas das escolas se resolvem apenas com a reorganização da gestão,
tornando-a mais eficiente na gerência dos parcos recursos, sem que o valor
repassado entre em pauta de discussão.
Aguiar (2009), nessa perspectiva, pontua que o problema, em tese, não
estaria na falta de dinheiro, antes na sua ineficiente de aplicação. Sendo a
instituição do PDDE, além do reforço do caráter gerencial da nova forma de
gestão posicionou o gestor na contramão do Projeto Político-Pedagógico (PPP),
outro elemento característico da gestão democrática na perspectiva da
emancipação humana, uma vez que:[...] se a construção do PPP implica em processos coletivos de discussão de projetos sociais, educativos e pedagógicos, o PDDE enfatiza a eficácia e a eficiência dos processos pedagógicos e administrativos com a marca pragmática que se convencionou denominar na literatura da área de gerencialismo. (AGUIAR, 2009, p. 175).
Por outro lado, Krawczyk (1999) vê na descentralização da gestão escolar,
um dos princípios da nova gestão, a possibilidade de uma nova organização
escolar, com a formação de equipes coletivas de professores, pedagogos e
diretores, compondo uma coordenação pedagógica na articulação com as
instâncias das Secretarias de Educação.
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Nas últimas décadas do século XX, nas diferentes instâncias de governo,
foi consenso a necessidade de romper com o centralismo burocrático que
caracterizou a gestão até então. Entretanto, Krawczyk (1999, p. 136) salienta que,
a cultura antiburocratizante tem chegado em alguns casos às últimas
consequências quando “[...] o “pânico da burocratização” pode gerar efeitos
perversos [...].” negando-se a construção social e histórica da prática educativa.
Os estudos de Krawczyk (1999), mostram que, a estrutura diretiva das
escolas foram afetadas pelo novo modelo de gestão, na busca da coletivização
das responsabilidades e da autonomia institucional. Nesse aspecto, a
responsabilidade da gestão encontra-se compartilhada, conforme observa a
pesquisadora:Isso significa que a responsabilidade da direção escolar nas mãos de um ou dois profissionais – diretor e vice-diretor – é agora compartilhada com a comunidade escolar por meio de um órgão dirigente cujos membros tem poderes idênticos. No entanto, essa estrutura colegiada de gestão escolar assume diferentes formas, atribuições e responsabilidades, e envolve diferentes atores [...]. (KRAWCZYK, 1999, p.136-137).
Na composição dos diversos órgãos coletivos de auxilio a gestão escolar,
como o Conselho Escolar, Associação de País e Mestres entre outros, está
presente a figura do pai, reforçando a necessidade dos pais na gestão da escola,
o que segundo (Krawczyk, 1999, p.137) “[...] os argumentos que sustentam essa
necessidade são muito genéricos e confusos”.
Krawczyk (1999), baseando-se em pesquisas, mostra que existe uma
resistência da escola em aceitar a participação dos pais nos assuntos coletivos da
mesma, quando na opinião de diretores e professores as condições de trabalho e
de vida da população levam ao desinteresse dos pais nessa participação,
revelando, assim, uma visão distorcida da comunidade.
Além disso, afirma que muitos pais enfrentam dificuldades para se envolver
na gestão da escola, porque não se reconhecem como interlocutores instruídos o
suficiente para intervir nesse tipo de questão, porém Krawczyk (2009, p. 138)
ressalta que “[...] a participação dos pais fica clara quando se trata de
acompanhar as atividades escolares dos filhos ou arrecadar fundos, e pelo
interesse manifestado de conhecer o rendimento de seus filhos”.
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A descentralização no âmbito dos sistemas na forma de municipalização
em anos recentes tem definido caminhos de transferência de encargos, muito
parecido com os princípios da reforma do estado caracterizados por mecanismos
de procurar fazer mais com menos recursos.
Peixoto (2003) pontua que, o processo de municipalização do ensino no
Brasil começou a se concretizar na década de 1970 com a aprovação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 5.692/71, que vinculou à
educação recursos do Fundo de Participação dos Municípios, além de reforçar as
estruturas técnica e administrativa municipais para atuar na educação.
Configura-se, desse modo, uma política educacional traçada no âmbito dos projetos federais, implantados sobretudo em estados do Nordeste, introduzindo a municipalização do ensino através da transferência de encargos para o município, sem o correspondente investimento financeiro neste nível do sistema. (PEIXOTO, 2003, p.102).
Afirma Peixoto (2003) que, na década de 1990 acentuou-se o apoio do
Banco Mundial à medidas educacionais de caráter descentralizador, apontando a
organização dos sistemas de ensino como um grande obstáculo para a melhoria
da sua qualidade e seu alto custo, por se tratar de um sistema centralizador.
A Constituição de 1988 estabeleceu os marcos legais, que segundo
(Peixoto 2003, p. 104): [...] vão colocar a questão no centro das atenções, à medida em que são introduzidas alterações significativas no quadro de distribuição de poderes, responsabilidades e recursos entre as esferas governamentais.
De acordo com Peixoto (2003), o processo de municipalização do ensino
tem como um dos seus resultados a desagregação das redes municipais,
afetando a expansão e a qualidade do ensino, não representando de fato uma
democratização do ensino.
O processo de municipalização do ensino promoveu de acordo com Fávero
(2003), uma desconcentração administrativa, entendida como uma delegação na
execução de tarefas, mas não a redistribuição de poder e de autonomia
administrativa, sendo que,
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A proposta de municipalização do ensino não encontrou condições de se efetivar na maioria dos municípios, por falta de recursos, quadros e incentivos. As fortes redes de escolas estaduais jamais puderam ser absorvidas pelos poderes municipais.(FÁVERO, 2003, p. 107).
Peixoto (2003) afirma que a qualidade do ensino piorou nos municípios
mais pobres a partir de sua municipalização, pois,[...] é justamente nas regiões mais pobres, onde se concentra a maioria dos alunos matriculados e de docentes não titulados, que o ensino é mais municipalizado, numa indicação de que esse processo até hoje não representou a implementação de uma política que beneficiasse o sistema educacional brasileiro. Desse modo, a municipalização do ensino fundamental tem resultado, à exceção, talvez, do ocorrido nas capitais dos estados, numa falsa solução. Em conseqüência, oferece às populações mais pobres um ensino de baixa qualidade. (PEIXOTO, 2003, p.104-105).
Conclui Peixoto (2003) que o grande desafio é buscar construir um sistema
educacional no qual os três níveis governamentais atuem de forma integrada em
prol de uma escola pública destinada a todos os cidadãos brasileiros, onde o
município seja parte integrante de um sistema mais amplo, inserido num sistema
nacional de educação objetivando a educação das classes populares.
Partindo-se do pressuposto de que os profissionais da educação devem
conhecer e entender os mecanismos que regem a administração do ensino
público, levamos o leitor a entender a gestão educacional e a gestão escolar
como resultado do conjunto das reformas promovidas pelo Estado nas últimas
décadas do século XX e início deste. Compreender de que forma o
neoliberalismo, como política global tem afetado a condução das práticas sociais,
em especial a Educação, bem como o reflexo desses movimentos tem
influenciado e modificado a forma de conduzir a escola pública, num modelo de
gestão, que para ser entendido, muitas vezes se faz necessário romper com a
tendência da fragmentação da realidade,
[...] como se toda ela fora feita de partes que se combinam e se desprendem para novas combinações aleatórias, como é possível fazer com um conjunto de imagens fotográficas em que cada unidade é vista separadamente, abstraída do contexto que lhe dá o significado, que explica sua gênese e sua particularidade histórica (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003).
Esse tem sido o nosso esforço entender a gestão escolar sem abstraí-la do
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contexto que lhe dá significado. Ver retratado o que somos, entender porque nos
constituímos dessa forma pode possibilitar novas construções, afinal não estamos
diante do fim da história.
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Buscar o entendimento do novo encaminhamento da gestão na escola
pública contribui para compreendermos as atribuições desempenhadas pelos
atuais gestores que, a nosso ver, tem escapado, em diversos momentos, do
compromisso da escola. São as condições impostas que levam ao
desvirtuamento. Por exemplo, não raro, nos deparamos com dirigentes de escolas
ocupados com afazeres próprios de contabilistas, gerentes ou outro tipo de
burocratas.
Em meio aos discursos da gestão democrática, tem ocorrido a
transferência à escola da responsabilidade de executar tarefas que antes eram
realizadas por órgãos estatais das instâncias superiores da administração pública.
Em nome da autonomia administrativa, muitos gestores despendem um
tempo precioso para administrar a merenda escolar, para adquirir materiais de
conservação e manutenção ou na execução de pequenas reformas, realizando
desde a tomada de preços, a aquisição dos produtos até a prestação de contas
dos recursos disponibilizados para tal, desvirtuando esforços e energia que
deveriam ser canalizados na construção do projeto político pedagógico.
Quando a fragmentação é a palavra de ordem, vivenciamos a escola se
transformar em palco de ações assistencialistas, espaço fértil para a iniciativa
privada e de ONGs como se fizessem uma benesse à escola pública. As
prioridades aparecem assim invertidas e a escola é mais uma vez entendida
como redentora de todos os males da sociedade.
A gestão democrática, presente na Constituição e na LDB, não tem
conseguido atender aos anseios das lutas que se desencadearam no período
pós-ditadura, uma vez que não existe ao lado dessa gestão a autonomia
necessária para a execução das necessidades que nascem da realidade de cada
escola.
O entendimento de gestão democrática muitas vezes se dá de forma
equivocada, pelo fato dos documentos legais não serem claros nesta questão,
contribuindo para que as escolas tornem campo de atuação de leigos, ao serem
receptivas àqueles que querem colaborar com a educação, descaracterizando
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5. Considerações Finais
assim a figura do gestor relacionando-o muitas vezes às questões técnicas e
administrativas, num modelo gerencial.
Portanto, ao analisarmos e entendermos os princípios da nova forma de
gestão e como os gestores atendem a política de governo atrelada aos interesses
do capital, sendo esta, subordinada ao pensamento dominante, será possível
compreendermos qual a contribuição da escola para a consolidação da
democracia ou se a gestão democrática ainda é algo a ser construído pelos
educadores.
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