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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Produção Didático-Pedagógica
Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE
VOLU
ME I
I
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO Superintendência da Educação
Diretoria de Políticas e Programas Educacionais Programa de Desenvolvimento Educacional
UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná
RITA SABRINA KRUG DIAS
MATERIAL DIDÁTICO PEDAGÓGICO
UNIDADE DIDÁTICA
GUAÍRA 2010
2
Professora PDE: Rita Sabrina Krug Dias
Orientadora: Carla Cristina Nacke Conradi
Área/disciplina: História
IES vinculada: UNIOESTE – Marechal Cândido Rondon
Núcleo: Toledo
Escola de aplicação: colégio estadual Jardim Zeballos
Público objeto de intervenção: ensino médio da EJA
Unidade Didática: Conhecendo O Quilombo Manoel Ciriaco dos Santos: A
Ressignificação da Cultura Afro-Brasileira.
3
UNIDADE DIDÁTICA
Foto (1) Quilombo Manoel Ciriaco dos Santos-Guaíra PR
Figura 1- Mapa de localização quilombo Manoel Ciriaco dos Santos-Fonte: Prefeitura municipal de Guaira. 28/04/2010-
4
Esta unidade didática tem como objetivo estudar a Comunidade Negra
Manoel Ciriaco dos Santos, localizada no município de Guaíra PR, faz parte da
comunidade do Maracaju dos Gaúchos. Apenas em 2007, o grupo foi
reconhecido como remanescente de quilombo.
Melhor especificando o que seja remanescente de quilombo, em
consonância com o moderno conceito antropológico aqui disposto, a condição
de remanescente de quilombo enfatiza os elementos identidade e território.
Com efeito, o termo em questão indica: a situação presente dos segmentos
negros em diferentes regiões e contextos e é utilizado para designar um
legado, uma herança cultural e material que lhe confere uma referência
presencial no sentimento de ser e pertencer a um lugar específico (ALMEIDA,
1999).
A mesma passou a ser denominada Comunidade Quilombola Manoel
Ciriaco dos Santos em homenagem ao senhor Manoel, o patriarca do grupo.
Este estudo busca discutir a cultura afro-brasileira a partir da inserção destes
remanescentes quilombolas na história da região oeste do Paraná.
O histórico abaixo retrata o que de mais recente se escreveu sobre a
história do Quilombo Manoel Ciriaco dos Santos no Município de Guaira,
estado do Paraná.
Segundo relato feito a Clemilda Santiago Neto, no dia 15-01-2007 na
Comunidade remanescente de Quilombolas do Município de Guaíra pelos
descendentes do Sr. Manoel Ciriaco dos Santos. José Maria Gonçalves, Adir
Rodrigues dos Santos, Joaquim dos Santos, Kelly Cristina Martiliano, falam
sobre a história de seus antepassados:
―A história de nosso bisavô escravo negro chamado José João Paulo,
casado com a negra Maria Joana. O lugar que eles moravam em Minas Gerais,
na cidade de Santo Antonio do Intambé do Serro, aonde eles eram
escravizados pelo sinhô na época da escravidão. Eles eram escravizados no
garimpo, tirano ouro e pedras preciosas, ele e sua esposa naquela época
trabalhavam junto no garimpo e tiveram filhos e filhas.
Os filhos eram criados com os restos doados pelo sinhô. Quando o
alimento era escasso misturavam terra no meio da comida para render mais
porque a comida era pouca, a água era retirada da mina, eles tinham que
beber água suja para poder até cozinhar, aí se um negro chegasse perto dessa
mina, eles era amarrado e chicoteados e ficavam preso numa das parte da
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senzala e ficavam muitos dia, até sem comer e doentes por causa das
chicotadas que eles levavam em Minas Gerais.
Seu lugar de descanso era chamado de Lapa (caverna ou casa de pedra). Ali
se abrigavam em muitos para poder dormir, acendia um fogo para poder
aquecer do frio, porque não tinham roupa e nem sapato, andavam descalço, e
assim criaram os seus filhos. Como meu avô, Joaquim Paulo dos Santos que
se casou com Maria Zidora dos Santos, seus filhos chamados: Manoel Ciríaco
dos Santos, Sebastião Vicente dos Santos e Ana Raimunda dos Santos. Na
época que os patriarcas se casaram, eles não eram mais escravos, já eram
alforriados e trabalhavam para os senhores do retiro nos garimpo e na lavoura
de cana e café. A cana para poder fazer a cachaça, a rapadura e o melado.
Manoel Ciríaco dos Santos casou-se com Maria Olina do primeiro casamento e
teve quatro filhos com sua primeira esposa. Jovelina Ciriaco dos Santos, Luíza
Ciriaco dos Santos, Olegário da Silva e João Loriano dos Santos. E aí foi
trabalhar para poder criar seus quatro filhos, no Estado de Minas Gerais, em
Santo Antonio do Intambé do Serro.
O meu pai trabalhava no retiro dos fazendeiros com carpi lavoura de
mandioca, retirano carvão e no garimpo do ouro.
Transportava a cachaça, queijo, rapadura e carne secada no sol, farinha de
mandioca e milho. O transporte era feito na cangaia, no lombo de burro, que
era o trabalho que meu pai fazia. Era pra quem ele trabalhava que ele chamava
de seus fulanos, que eram os fazendeiros, para sustentar a sua primeira
família. Com o passar do tempo o meu pai, perdeu a minha irmã, que faleceu
com oito anos lá em Minas Gerais, ela se chamava Luíza Ciríaco dos Santos.
Meu pai ficou viúvo aí ele ficou sozinho para poder cuidar dos filhos, aí
resolveu casar de novo com a minha mãe, lá mesmo em Minas Gerais e o
nome da minha mãe era Ana Rodrigues dos Santos, aí tiveram quatro filhos, lá
no Estado de Minas Gerais.
◦ Eurides dos Santos
◦ Sebastiana Feliciana dos Santos
◦ Antonio Gregório dos Santos
◦ José Maria Gonçalves (que sou eu)
Aí eu saí dali com minha mãe e meu pai e meus irmãos, eu tinha seis
meses de vida, aí naquela época meu pai deixou o meu irmão com sete anos,
o João Loriano dos Santos.
6
Aí nós fomos para o Estado de São Paulo, na cidade de Caiabú, perto
de Presidente Prudente, no ano de 1956, município de Martinópolis, meus pais
tiveram mais dois filhos:
◦ Joaquim dos Santos
◦ Geralda dos Santos
Lá meu pai trabalhou torrando farinha pro meu tio, aí ele foi pra uma
fazenda, arrendo uma terra de fazendeiro, aí prantô amendoim, algodão, feijão,
aí depois de oito anos nóis saímos de lá e vinhemos para o Paraná em 1964.
Na cidade de Guaíra no patrimônio do Maracajú dos Gaúchos. Aonde nóis
residimos até o dia de hoje. Mais na chegada aqui era tudo mato, aí eu, meu
pai e meus irmãos mais velhos ajudamo meu pai a roçar e derrubar o mato.
Fizemos uma barraca de lona e acampamos no meio do mato, aí com o tempo,
fizemos um rancho com talbinha de cedro e cercado de coqueiro e no chão
passava argila, misturada com esterco de vaca, nóis dormia no chão e minha
mãe cozinhava no fogão de barro, mais mesmo assim, nóis passava
necessidade, tinha dia que nós não tinha nem o angu pra comer, nem feijão.
Caçava caça do mato, pescava, assava e comia porque a gordura nóis não
tinha. Minha mãe lavava a nossa roupa, no lugar do sabão — porque não tinha
—- usava cinza de madeira e lavava na mina. Aí com o tempo nóis fomo
roçano, fomo preparando a terra e aí saiu a lavoura, que nóis comecemo a
plantar, com o tempo tivemo mais treis irmãos:
◦ Paulo dos Santos
◦ Adir Rodrigues dos Santos
◦ João Aparecido dos Santos
Com o tempo meu irmão Paulo, ele era deficiente mental e aí veio a
falecer, com 15 anos, depois faleceu o Sr. Manoel Ciriaco dos Santos, com 69
anos, aí depois faleceu Antonio Gregório dos Santos faleceu com 35 anos,
depois faleceu, Sebastiana Feliciano dos Santos, depois faleceu Ana
Rodrigues dos Santos, aí depois que meus pais e meus irmãos faleceram,
ficamo só nóis os filhos. Continuamos lidando com a terra, mais com muita
dificuldade, passamo fome e humilhação pelos grande fazendeiro, porque na
época que meu pai faleceu deixou muita dívida, por causa da lavoura, aí
começamo a trabaiá, por dia pra podê sustenta as nossa família, e assim
mesmo tinha muitas dificuldade para podê pagar as conta por causa disso, nóis
nunca pudemos ir pra frente, só ficamo pra traiz aqui nesse lugar, passamo a
trabaiá, mais por dia pros outros, nas lavoura de mandioca, para pequeno e
grande agricultor, para podê pagar as nossas contas, e mesmo assim não
7
conseguimo, porque se pagasse as conta ficava sem come. Trabalhamo no
rancadão de mandioca, para pode se alimenta, com muita dificuldade
trabalhamo, mês, dia, ano e até hoje continuamo no mesmo serviço, sem futuro
pra nóis e nossos filho, isto é um pouco da nossa história, da nossa
comunidade, e o contador da história é o negro José Maria Gonsalves filho do
Manoel Ciríaco dos Santos.
Foto (2) Quilombo Manoel Ciriaco dos Santos- Guaira -PR
A formação de comunidades negras no extremo oeste paranaense, aqui
citando mais especificamente o município de Guaíra está ligada a: I) O transito
de gaúchos (famílias e agregados) através da Bacia do Prata1 em direção ao
Mato Grosso para a extração e comercialização de erva mate e/ou em fuga das
guerras da Bacia do Prata no final do XIX19; II) Migração de contingentes
famílias negras de outras regiões para o trabalho em obras públicas vinculadas
a questão das fronteiras (relato de comunidade negra de Guaíra); III) A forte
presença negra e a formação de quilombos no Mato Grosso (ANJOS,2005).
A Associação Brasileira de Antropologia-ABA (1994), considera que
quilombo não são grupos isolados ou uma população homogênea em sua
composição racial, ou seja, a raça negra da população não pode ser utilizada
1A bacia do Rio Prata possui uma superfície de 3.200.000 km², é a quinta maior bacia
hidrográfica do mundo e a segunda maior do continente. Sua extensão é de 275 km, sua largura máxima é de 221,5 km e seu fluxo é superior a 22.000 m³/seg. Abarca importantes faixas territoriais da Argentina, Brasil, Paraguai, Bolívia e Uruguai.
8
como único critério para a definição desse grupo étnico; também esses grupos
nem sempre são descendentes de escravos fugidos, mas consistem em grupos
que desenvolveram práticas cotidianas de resistência na manutenção e
reprodução de seus modos de vida característicos e na consolidação de um
território próprio (ABA, 1994).
A tarefa de fundamentar teoricamente a atribuição de uma identidade
quilombola a um grupo e, por extensão, garantir, ainda que formalmente - o seu
acesso à terra trouxe à tona a necessidade de redimensionar o próprio conceito
de quilombo, a fim de abarcar a gama variada de situações de ocupação de
terras por grupos negros e ultrapassar o binômio fuga-resistência, instaurado
no pensamento corrente quando se trata de caracterizar estas conformações
sociais. Sabe-se que essas comunidades de ex-escravos organizavam-se de
diversas formas, se constituíram a partir de uma grande diversidade de
processos, que incluem não só as fugas com ocupação de terras livres e
geralmente isoladas, mas também as heranças, doações, recebimento de
terras como pagamento de serviços prestados ao Estado, a simples
permanência nas terras que ocupavam e cultivavam no interior das grandes
propriedades, bem como a compra de terras, tanto durante a vigência do
sistema escravocrata quanto após a sua extinção (MARTINS 1980).
Ainda no que diz respeito à dinâmica organizacional das comunidades
quilombolas, estas não existiam de forma exclusivamente isolada, embrenhada
por entre mata fechada e apartada do resto da sociedade. Ao contrário,
firmavam laços com a sociedade do entorno e realizavam negócios com
fazendeiros e comerciantes que lhes auxiliavam com proteção e meios para
fuga (LITTLE, 2002).
Através do relato do Sr. Adir Rodrigues dos Santos, e sua história de
vida constata-se que as comunidades lutam por um território próprio e para se
manterem unidas e travam ainda a difícil missão de vencer também o
preconceito e as dificuldades que se apresentam: ―Meu nome é Adir Rodrigues
dos Santos, sou presidente do quilombo Manoel Ciriaco dos Santos. Nasci ao
20 de fevereiro de 1969.Aqui neste território. Minha adolescência foi de muito
sofrimento e muita discriminação aqui neste lugar.Quando estudamos na
escola de Maracaju dos gaúchos sentimos na pele a separação dos branco e
negro,nós não tinha o que vestir nem o que calçar,as vezes nem o que
9
comer.Nós tinha que ficar olhando as outras pessoas.Eu consegui terminar a
quarta serie daí não ―podi‖ mais estudar porque tinha que trabalhar na roça
para ajudar minha família.Mais a nossa cultura era diferente da cultura deles.
―Poriço‖ nos escondia e tinha vergonha de falara porque eles riam da gente.
Passado algum tempo sem nenhuma oportunidade de vida, ―as pessoas da
comunidade começa a ir embora,daqui tanta família começa ir embora,a gente
fica em pouco.Resistindo neste lugar,em noventa e quatro eu caso com minha
esposa Solange,tivemos três filhos,Michael,Bruno e Tainara.Começa uma nova
vida de alegria e felicidade.Para criar nossos filhos eu as vezes ficava sem
comer para deixar para eles comer,mas graças a Deus superei. Quando nossa
comunidade foi reconhecida surgiu uma grande esperança de viver. Mas em
dois mil e nove surge um grande impacto ―nas‖ nossa vida. Sobre um trabalho
do INCRA onde as pessoas não quiseram saber dessa nossa luta por um
futuro melhor, ‖para nós lutar‖ que vem se arrastando séculos, hoje estou nesta
luta por uma causa justa.
Foto (5) Quilombo Manoel Ciriaco dos Santos2- Guaira PR
2 Entrevista sobre educação Quilombola- Educadora Rita e representante do Quilombo Manoel
Ciriaco dos Santos.
10
Existem comunidades quilombolas em pelo menos 24 estados do Brasil:
Amazonas, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão,
Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco,
Paraná, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul,
Rondônia, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.
Foto (4) 3 Quilombo Manoel Ciriaco dos Santos- Guaira PR
As terras de quilombo foram conquistadas por meio de diversas formas de
resistência. Não só por meio das fugas com a ocupação de terras livres e
geralmente isoladas, mas também do recebimento de heranças e de doações,
como pagamento de serviços prestados ao Estado, pela compra e ainda pela
ocupação de áreas no interior de grandes propriedades.
Outra formação de quilombo foi através de doações dos senhores de
terras às famílias dos ex-escravos e a compra de terra também pelos ex-
escravos, a partir da Lei de Terra de 1850, e mais tarde com a Lei Áurea de 13
de Maio de 1888 que ―dava fim à escravidão negra‖. Entende-se que os
quilombos não foram só movimentos de resistência e rebeldia. A identidade
desses grupos também não se define por um número de membros, mas por
experiência vivida e versões compartilhadas de sua trajetória comum e da
3Plantação de cabaças para instrumentos musical_ Berimbau utilizado na capoeira (dança-luta)
pela comunidade.
11
continuidade como grupo. Constitui grupos étnicos conceituados pela
antropologia como tipo organizacional que confere pertencimento por normas e
meios de afiliação ou exclusão (O’DWYER, 1995).
No depoimento do Sr. Joaquim dos Santos, o mesmo relata as dificuldades,
as lutas para conquistar suas terras e seu espaço e a maneira como ainda
necessita-se de resistência para manter as mesmas: ―Aqui eu conto um
pouquinho da minha história. Conto também a história de nossa comunidade.
chegamos aqui em 1964, era mata fechada ai começou nossa luta. Os meus
pais vieram de Minas gerais para o estado de São Paulo e depois para Guairá
,onde nós estamos até hoje com muita luta. O meu pai faleceu em
1989,ficamos muito desgostosos. Aqui nós éramos 82 pessoas,todos
parentes,até 1992.Meu irmão mais velho resolveu ir embora para o interior de
São Paulo em 1994,depois faleceu minha querida mãezinha.Quando em 2004
fomos reconhecidos pelo Governo federal e a Fundação dos Palmares,começa
outra luta.Aqui nós sempre teve vizinhos bons. Mas ai a partir de 2009,o
INCRA veio fazer um trabalho de regularização de nosso território e todos os
vizinhos começaram a ficar com raiva da gente e de todas as pessoas de
nossa comunidade. Hoje em dia não temos mais vizinhos,fizeram várias
reuniões para nem um deles dar serviço para ninguém da nossa
comunidade.Mas temos muita fé que tudo vai acabar bem‖ .
Como se segue especificando a respeito do trabalho realizado pelo
INCRA acima citado No Depoimento do Sr. Joaquim dos Santos: O Decreto
4887/03, de 20 de novembro de 2003 Regulamenta o procedimento para
identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras
ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o
art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. O presente decreto
declara que: § 2o São terras ocupadas por remanescentes das comunidades
dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social,
econômica e cultural (BRASIL, 2003)
O território não é concebido pelos quilombolas como uma mercadoria
que possa ser dividida e comercializada. O território é a história, a identidade, a
liberdade conquista. O local onde nasce vive e que permanece como herança
para os descendentes (AESBAERT, 2004).
Para Clovis Moura (2001), Historicamente o quilombo aparecerá como
12
uma unidade de protesto e de experiência social, de resistência e reelaborarão
dos valores sociais e culturais do escravo em todas as partes em que a
sociedade latifundiário-escravista se manifestou. As comunidades quilombolas
foram fundadas a partir de diferentes processos de resistência. Ocupam
ecossistemas muito diversos e desenvolvem diferentes estratégias de
exploração dos recursos de seus territórios.
Segundo Ecléa Bosi (1998) o individual e o coletivo nos agrupamentos é
uma maneira importante de se preservar a origem dos antigos costumes:
O grupo é suporte da memória se nos identificamos com ele. As lembranças grupais se apóiam umas nas outras formando um sistema que subiste enquanto puder sobreviver a memória grupal. Se por acaso esquecemos, não basta que os outros testemunhem o que vivemos. É preciso mais: é preciso estar sempre confrontando, comunicando e recebendo impressões para que nossas lembranças ganhem consistência (BOSI, 1998, p. 414).
Se os Povos e Comunidades tradicionais caracterizam-se por modos
específicos de ser, viver e fazer, são seus territórios os espaços de produção
destas manifestações e neste sentido, condição fundamental para
sobrevivência da própria comunidade. Constituem-se assim, os territórios
sociais ou terras tradicionalmente ocupadas como o ―espaço vital‖ de produção
e reprodução física e social destes povos, em permanente e recíproca
construção de identidade (O’DWYER, 1995).
Para saber mais:
INDICADORES SOCIAIS DA POPULAÇÃO NEGRA TÊM MELHORAS, MAS CONDIÇÕES DE VIDA SEGUEM INFERIORES ÀS DOS BRANCOS
Os índices de escolaridade, renda e pobreza da população negra
registraram melhoras entre 1996 e 2006, mas as condições de vida continuam
13
inferiores às dos brancos no Brasil. A avaliação é de estudo sobre
desigualdade racial e de gêneros divulgado pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA). O estudo do IPEA tomou como base dados da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) lançada pelo IBGE entre
os anos de 1993 e 2006. A designação ―branca‖ ou ―negra‖ foi estabelecida
segundo autodeclaração dos pesquisados.
Segundo dados do estudo, em 1996, 82,3% dos negros estavam
matriculados em etapas do ensino fundamental adequadas à sua idade e
apenas 13,4% no ensino médio. Em 2006, essa porcentagem subiu para 94,2%
no ensino fundamental e 37,4% no médio. A proporção de negros e negros que
estudavam no ensino médio, entretanto, ainda é muito menor que a de brancos
- que chegou a 58,4% em 2006. A renda média do trabalhador negro também
cresceu, embora o aumento não seja muito expressivo: o rendimento médio de
2006 foi R$ 19 mais alto que em 1996, ou 3,93%. A queda da diferença entre
os dois grupos se deu devido a diminuição dos rendimentos dos homens
brancos, que passaram de R$ 1.044,20 a R$ 986,50. Os brancos ainda vivem
com quase o dobro da renda mensal per capita dos negros - pouco mais de um
salário mínimo a mais. Outras constatações do estudo mostram que a
população negra é menos protegida pela Previdência Social do que os brancos
- especialmente no caso da mulher negra - e começa a trabalhar mais cedo
para se aposentar mais tarde.
14
A renda dos negros é extremamente baixa comparada à dos brancos, e
está muito próxima ao valor do salário mínimo. A oscilação da renda de negros
e brancos teve sinais diferentes entre 1996 e 2006 porque os acréscimos ou
decréscimos nos pagamentos têm diferentes origens. Nesses últimos 13, 14
anos, acompanhou a queda na renda média da população. Já a dos negros
está associada à evolução da política do salário mínimo. Além do crescimento
dependente das políticas públicas, a evolução da renda entre negros e queda
entre os brancos não se refletiu na erradicação da pobreza. Se em 1996 46,7%
dos negros eram pobres, o percentual desceu em 2006 para 33,2. Na prática,
cerca de 2 milhões de pessoas deixaram a pobreza num período em que a
população ganhou mais de 32 milhões de brasileiros. Entre os brancos, o
número absoluto de pessoas que deixaram a pobreza foi de cerca de 5
milhões, mesmo a queda em pontos percentuais tendo sido menor - de 21,5%
para 14,5%. Educação básica deficiente e pouco universalizada, a herança
15
histórica deixada por séculos de escravismo e uma tradição de ocupar
empregos de pouco prestígio social estão entre as causas da diferença.
O fim da escravidão sem a criação de um mercado de trabalho que
absorvesse a mão-de-obra negra e herança de concentração fundiária na mão
de ricos produtores agrícolas privou a população negra de acesso a
mecanismos democráticos de ascensão social, econômica e cultural. A
sociedade brasileira foi constituída em três séculos de colonização e quatro de
escravidão. Isso gerou uma estrutura de segregação absoluta que foi sendo
superada ao longo do século 20, mas não na velocidade necessária para
democratizá-la (SALLES,2010).
Foi principalmente com a Constituição Federal de 1988 que a questão
quilombola entrou na agenda das políticas públicas. Fruto da mobilização do
movimento negro, o Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT) diz que: ―Aos remanescentes das comunidades dos
quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade
definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os respectivos títulos‖ (BRASIL,2009).
A partir do Decreto nº 4.887/2003, do Presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, foi concedido a essas populações o direito à auto-atribuição como único
critério para identificação das comunidades quilombolas, tendo como
fundamentação a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho
16
(OIT), que prevê o direito de autodeterminação dos povos indígenas e tribais.
Ainda de acordo o Decreto, que regulamenta o procedimento de regularização
fundiária: São terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos
quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social,
econômica e cultural (BRASIL,2003).
A concretização desse direito suscitou logo de início um acalorado
debate sobre o conceito de quilombo e de remanescente de quilombo.
Trabalhar com uma conceituação adequada fazia-se fundamental, já que era
isso o que definiria quem teria ou não o direito à propriedade da terra.
A regularização fundiária da Comunidade Manoel Ciriaco dos Santos
vem sendo motivo de reuniões no município de Guaira, O Instituto de Nacional
de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) realizou uma reunião com
agricultores do Maracajú dos Gaúchos e representantes da Comunidade
Quilombola Manoel Ciriaco dos Santos e representantes do legislativo
municipal. Também representantes do Ministério Público Federal, Polícia
Federal, Polícia Militar, Procuradoria da República, Fundação Palmares, Grupo
Clovis Moura e Prefeitura Municipal (PREFEITURA MUNICIPAL DE
GUAIRA,2010).
As comunidades do Maracajú dos Gaúchos e Manoel Ciriaco dos Santos
entraram em conflito depois que o INCRA iniciou trabalhos para elaborar um
estudo antropológico da comunidade quilombola, vizinha ao Maracajú. O
estudo gerou polemica, já que o objetivo do trabalho é regularizar os territórios
e garantir a manutenção das terras dos herdeiros quilombolas. O estudo
antropológico foi realizado em parceria com a UNIOESTE (Universidade
Estadual do Oeste do Paraná). A preocupação do Instituo é com um iminente
clima de conflito instaurado após o anúncio do estudo na localidade. O
reconhecimento da comunidade como descendente de quilombo fez se
realizasse estudos antropológicos e o estudo de regularização fundiária
(PREFEITURA MUNICIPAL DE GUAIRA, 2010).
Através de leitura de jornais constata-se que em se tratando dos
recentes conflitos existentes entre a comunidade quilombola Manoel Ciriaco
dos Santos e proprietário de terras da comunidade de Maracaju dos gaúchos
decidiu-se que para garantir os trabalhos, autoridades e policiais garantirão o
livre acesso dos servidores do INCRA e outras instituições parceiras a
17
comunidade quilombola. A polícia Federal, a Policia Militar e o Ministério
Publico Federal desenvolverão em conjunto um trabalho de inteligência a fim
de identificar e levantar os fatores, inclusive externos que motivam o conflito
em questão. Também ficou estabelecido a criação de uma comissão com
participação das policias Federal, Militar, Poder Público de Guaíra, Grupo de
Trabalho Clovis Moura e da comunidade da cidade a fim de monitorar a tensão
instalada na Comunidade Manoel Ciriaco Dos Santos. Os representantes legais
do INCRA comprometem acelerar os trabalhos necessários para a conclusão
da analise e parecer do relatório antropológico referente a área em questão
(PREFEITURA MUNICIPAL DE GUAIRA, 2010).
ATIVIDADES
ATIVIDADE 1 Pesquisar sobre projetos em ação que estejam contribuindo para o fortalecimento da rede da Comunidade Quilombola Manoel Ciriaco Dos Santos
ATIVIDADE 2
Como se deu a formação das comunidades quilombolas no oeste do Paraná, na qual se inclui a Comunidade negra de Manoel Ciriaco dos Santos.
18
.
Sugestão cultural
Documentário de Rodrigo Siqueira, ―Terra Deu, Terra Come‖, que aborda aspectos culturais da comunidade remanescente de quilombo Quartel do Indaiá, distrito de Diamantina, Minas Gerais (ESCOREL, 2010). Filme: Quilombo – O filme tem a preocupação de mostrar os três últimos ―governos‖ de Palmares: Acotirene, Ganga Zumba e Zumbi. Ano: 1984- Duração: 120 min. Crash - no limite- O filme fala de preconceito em vários segmentos e trata sobre tensões raciais e sociais em Los Angeles. A Cor Púrpura- trata de questões de discriminação racial e sexual. Filme Cafundó: conta, de forma romanceada, a vida de João de Camargo (vivido por Lázaro Ramos), ex-escravo que viveu em Sorocaba, interior de São Paulo, entre o final do século 19 e início do século 20.
ATIVIDADE 3 Pesquisar sobre a comunidade quilombola Manoel Ciriaco dos santos: Como os mesmos se mobilizam pela continuidade no que diz respeito aos princípios para preservar a origem dos antigos costumes, valores sociais e culturais.
ATIVIDADE 4 Como se desenvolve a relação social e como são tratados os conflitos existentes na comunidade quilombola Manoel Ciriaco dos Santos?
19
.
SUGESTÃO DE LITERATURA
. Literatura Sobre Quilombo e Quilombola:
• Saudação a Palmares – Castro Alves/1870
• Eu, Pássaro-Preto – Adão Ventura
• Quilombo – Adão Venturo
• Zumbi – Adão Venturo
• Serra da Barriga – Jorge de Lima
• Da Agonia – Cuti
• Quilombo de Frechal – Paula Saldanha
• Histórias de Dona Fiota – Kelly Cardozo/ Rosangêla Gontijo
• Zezé e os Tambores – Bete Gontijo/Pablo Matos Camargo
• ―Descrição Curiosa‖ - *Joaquim José Lisboa
• Revista Historia e lutas de classe - Pedro Funari et all.
• Histórias de Quilombolas - Mocambos e comunidades de senzalas no rio de janeiro, século XIX - Flavio Dos Santos Gomes
• Zumbi - Um Escravocrata, o Movimento Negro e os Quilombolas- Félix Maier
• Revista.Guia de Políticas sociais-Quilombolas.
• Quilombos, geografia africana, cartografia étnica e territórios tradicionais- Rafael Sanzio Araújo dos Anjos
• A Roda de São Gonçalo na Comunidade Quilombola da Lagoa da Pedra em Arraia- Wolfgang Teske
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SUGESTÃO DE PESQUISAS
●Internet - Documentário: Quilombolas – Uma viagem humana pelo universo quilombola no estado de São Paulo:http://eufabrico.com/quilombolas/
●Internet - Documentário -Uma viagem humana pelo universo quilombola no estado de São Paulo: http://www.youtube.com/watch?v=glv7exOlby4&feature=player embedded
●Internet: Revista Palmares.http://www.palmares.gov.br/003/00301009 jsp? . ttcd_chave=412
●Fórum Social Mundial .www.forumsocialmundial.org.br
● Instituto da Mulher Negra.www.geledes.org.br.
● Revista Palmares – Fundação Cultural Palmares. www.palmares .gov.br/003/00318005.jsp?ttCD
●O que são comunidades quilombolas. http://www.cpisp.org.br/comunidades /html/i_oque.html ● Identidade negra- Blog-http://identidadenegra.zip.net/ ● Blog dos Negros do Rosário de Jardim do Seridó. http://negrosdorosario .blogspot.com/
● Negros Blog Afro. http://negros.us.splinder.com/post/158551
●Vídeo- Raça negra A situação dos negros escravos e as formas de luta contra a escravidão. O trabalho moderno e a escravidão. As diferentes formas de discriminação. Alternativas para a questão racial.Produção: Século Vídeo/VHS - NTSC Duração: 23min.
●Vídeo- Se o rei Zulu já não pode andar nú ... Documentário político-musical inspirado pela visita de Desmond Tutu ao Brasil e "costurado" por músicas de Gilberto Gil, Leci Brandão, Sandra de Sá e Dona Ivone Lara.Produção: Rita Moreira Produções.Direção: Rita Moreira e M. Lucia.
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REFERÊNCIAS
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