Upload
ngophuc
View
215
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA
ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE
(VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL)
Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde exerce funções de regulação, de
supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes às atividades
económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e social;
Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo
5.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;
Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde
estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º
126/2014, de 22 de agosto;
Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde
estabelecidos no artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º
126/2014, de 22 de agosto;
Visto o processo registado sob o n.º ERS/002/2015;
I. DO PROCESSO
I.1. Origem do processo
1. Em 14 de janeiro de 2014, a ERS rececionou exposição da Ordem dos Médicos,
concretamente, “documentação recebida de um grupo de médicos do Hospital
Infante D. Pedro”, relativa a “problema de funcionamento do Hospital Infante D.
Pedro – Aveiro”, a qual compilava informação relativa a alegados
constrangimentos na atividade e funcionamento de diversos serviços do Hospital
Infante D. Pedro, integrado no Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E.,
doravante CHBV, prestador de cuidados de saúde inscrito no SRER da ERS sob o
n.º 21487.
2. Em síntese, na referida comunicação eram elencados grandes grupos de
constrangimentos no funcionamento do supra referido estabelecimento prestador
de cuidados de saúde, os quais se reconduziam quer a constrangimentos
transversais ao funcionamento de toda a instituição quer a constrangimentos
específicos de determinados serviços e questões de ordem laboral, elencando
assim, in genere, eventuais irregularidades nos procedimentos seguidos pelo
CHBV.
3. Simultaneamente, a 23 de janeiro de 2015, a ERS tomou igualmente
conhecimento de notícia divulgada pela comunicação social, dando conta da
alegada existência de constrangimentos no acesso a cirurgia no CHBV, no âmbito
do programa SIGIC, os quais estariam a ser criados de forma artificial por aquele
prestador, e os quais assumiriam particular acuidade nas valências de oftalmologia
e urologia.
4. Concretamente, referia a notícia que o CHBV “[…] está a atrasar as operações aos
doentes com a marcação de cirurgias fictícias. Operações reagendadas e
consecutivamente adiadas, havendo casos em que os doentes nem sequer sabem
que têm cirurgias marcadas […].”
5. Para uma análise preliminar da supra referida exposição e bem assim do teor da
notícia divulgada, foi aberto o processo de avaliação n.º AV/013/2015.
6. Subsequentemente, face à necessidade de uma averiguação mais pormenorizada
dos factos em apreço, ao abrigo das atribuições e competências da ERS, o
respetivo Conselho de Administração deliberou, por despacho de 23 de janeiro de
2015, a abertura de processo de inquérito registado sob o n.º ERS/002/2015, para
aferição mais detalhada dos factos relacionados com os constrangimentos
verificados no agendamento de cirurgias, tal como noticiados.
I.2. Diligências
7. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, realizaram-se, entre outras, as
diligências consubstanciadas em:
(i) Consulta no Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados
(SRER) da ERS do registo do Centro Hospitalar do Baixo Vouga,
E.P.E. (CHBV);
(ii) Consulta no Sistema de Gestão de Reclamações (SGREC) da ERS
das reclamações rececionadas que diretamente pudessem evidenciar
os constrangimentos de acesso e de funcionamento relatados;
(iii) Realização de ação de fiscalização ao Hospital Infante D. Pedro –
Aveiro, no dia 11 de fevereiro de 2015;
(iv) Pedido de informação enviado à Unidade Regional de Inscritos para
Cirurgia do Centro (URGIC Centro), por ofício de 18 de fevereiro de
2015, e análise da resposta endereçada à ERS em 3 de março de
2015;
(v) Pedido de informação enviado à Unidade Central de Inscritos para
Cirurgia do Centro (UCGIC), por ofício de 18 de fevereiro de 2015, e
análise da resposta endereçada à ERS em 3 de julho de 2015.
II. DOS FACTOS
II.1 Da factualidade apurada em sede de ação de fiscalização
8. Após análise das questões suscitadas quer pela exposição endereçada pela
Ordem dos Médicos, quer pelas notícias divulgadas na comunicação social, foi
decidida a realização de uma ação de fiscalização às instalações do Hospital
Infante D. Pedro a qual teve lugar no dia 11 de fevereiro de 2015.
9. Considerando os vários constrangimentos de funcionamento elencados na
exposição rececionada pela ERS e tendo em vista a otimização da deslocação ao
local, a equipa composta por dois técnicos superiores e um perito médico,
direcionou a ação de fiscalização para a verificação in loco dos procedimentos
adstritos ao funcionamento da UHGIC e consequentemente de todos os
constrangimentos conexos à atividade cirúrgica, os quais constituem o foco do
presente processo de inquérito.
10. Para o efeito, e na ausência do coordenador da UHGIC, foi inquirida uma das
assistentes administrativas adstrita aquela unidade, a qual referiu desempenhar as
referidas funções há mais de 10 anos.
11. Assim, explicitou a referida funcionária que todos os atos médicos registados no
sistema informático SClínico são transferidos para o sistema informático de apoio
ao SIGIC, denominado SIGLIC.
12. Para controlo e confrontação dos dados inscritos em ambos os aplicativos é
efetuada pela UHGIC uma listagem mensal por especialidade que é enviada aos
respetivos diretores de serviço indicando as possíveis não conformidades
detetadas e solicitando a sua correção.
13. Foi ainda informado que todas as manhãs o secretariado da UHGIC acede ao
SClínico efetuando naquele aplicativo o pré-registo dos doentes agendados de
acordo com o movimento operatório previsto para as 4 salas de bloco operatório
existentes, o qual é comunicado por cada serviço acedendo a um ficheiro
partilhado para o efeito.
14. Diferentemente, os procedimentos adstritos ao agendamento das cirurgias, não
passam pela UHGIC já que cada serviço contacta os seus próprios utentes,
informando-os do agendamento realizado.
15. Para melhor compreensão dos procedimentos supra expostos foram solicitadas
visualizações e prints1, quer do sistema SClínico quer do sistema SIGLIC,
elegendo aleatoriamente utentes inscritos, no sentido de se perceber da
efetividade do alegado procedimento de “[…] agendamentos fictícios e sucessivas
remarcações de cirurgias […]”.
16. Assim, a título exemplificativo, veja-se o caso da utente H.S. de acordo com os
registos constantes do SClínico:
no dia 12/03/2013 é inscrita em LIC pelo serviço de Oftalmologia e
agendada nesse mesmo dia para realizar a respetiva intervenção a
25/09/2013 pelo secretariado do serviço de Oftalmologia;
no dia 25/09/2013, não foi admitida no internamento e consequentemente
não foi operada, não havendo registo do motivo do reagendamento da
cirurgia;
no dia 18/06/2014 é dada como operada, embora o pré-registo da cirurgia
pela UHGIC tenha decorrido sem que houvesse o passo prévio de
agendamento da utente, havendo para esta data registo do internamento
da utente;
no dia 19/06/2014 é feita nova inscrição, para agendamento no dia
18/06/2014, que apenas ocorre no dia 20/06/2014, sendo que o pré-registo
do dia anterior ocorre como motivo do cancelamento, falta de recursos
humanos (médico doente);
1 Conforme documentação junta aos autos cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
no dia 25/06/2014 é dada como operada, havendo registo de internamento
para esta data;
daqui decorrendo um tempo total de espera de 470 dias, sem que tenha
ocorrido a emissão de vale cirurgia.
17. Veja-se também o caso do utente M.S. de acordo com os registos constantes do
SClínico:
no dia 09/05/2013 é inscrito em LIC pelo serviço de Urologia;
no dia 13/11/2013 é feito agendamento da cirurgia para o dia 07/01/2014,
não constando o utente do movimento do bloco operatório previsto para
esse dia;
no dia 01/02/2014 é feita inscrição do utente para o agendamento do dia
07/01/2014, permitindo o sistema que tal inscrição ocorresse para uma data
de cirurgia já ultrapassada;
no dia 03/02/2014 é feito agendamento para o dia 05/02/2014, uma vez
mais não constando o utente do mapa operatório deste dia, nem se
realizando a cirurgia;
no dia 12/02/2014 o utente é operado sem que tivesse havido prévio
agendamento para esta data;
daqui decorrendo um tempo total de espera de 280 dias, sem que tenha
ocorrido a emissão de vale cirurgia.
18. Veja-se por outro lado o caso do utente A.T., de acordo com os registos
constantes do SClínico:
no dia 16/08/2012 é inscrito em LIC pelo serviço de Oftalmologia, sendo-lhe
agendada cirurgia para o dia 14/12/12, a qual não se realizou sem que
surja qualquer justificação para o efeito no sistema;
no dia 16/01/2014 é dado como operado, por via do pré-registo da cirurgia
pela UHGIC, sem que o utente tivesse sido internado e consequentemente
operado, constando como justificação da não realização engano de registo
administrativo e constando também o utente do movimento operatório
previsto para esse dia;
no mesmo dia 16/01/2014 o utente é agendado para o dia 20/06/2014,
embora não conste no movimento operatório deste dia, sendo tal
agendamento cancelado no 17/01/2014, constando como motivo,
cancelamento, faltou sem motivos plausíveis.
após este cancelamento foi criado um novo episódio cirúrgico, com nova
inscrição em LIC a 24/07/2014, sensivelmente um mês após cancelamento
do episódio anterior, com agendamento a 19/09/2014, não se realizando a
cirurgia nem constando o utente no movimento operatório desse dia;
foi operado no dia 05/09/2014;
daqui decorrendo um tempo total de espera de 719 dias, sem que tenha
ocorrido a emissão de vale cirurgia.
19. Veja-se ainda o caso da utente utente A.S., de acordo com os registos constantes
do SClínico:
no dia 24/01/2014 é inscrita em LIC pelo serviço de oftalmologia;
no dia 03/02/2014 é agendada para o dia 07/06/2014, não se tendo
realizado a cirurgia nem constando a mesma do movimento operatório para
esse dia;
no dia 22/05/2014 é inscrita para 06/06/2014, pelo coordenador da UHGIC
para correção de GDH com erro;
no mesmo dia 22/05/2014 é agendada para 24/09/2014, também pelo
coordenador da UHGIC;
no dia 25/09/2014 foi inscrita, embora não tendo nessa data sido operada
nem constasse do movimento operatório;
no mesmo dia 25/09/2014 foi agendada para o dia 02/10/2014, data em
que se realizou a cirurgia;
daqui decorrendo um tempo total de espera de 244 dias, sem que tenha
ocorrido a emissão de vale cirurgia.
20. De referir, que relativamente a este último caso concreto, foi inquirido o
secretariado da UHGIC sobre as repercussões existentes no processo clínico
devido à existência de erro de codificação, tendo sido explicitado que quando a
proposta não está devidamente codificada pelo médico que a realiza é atribuído
pelo SIGLIC um GDH de erro (código 470), o que impede a emissão de vale
cirurgia para o utente em causa, motivo pelo qual a UHGIC nas listagens mensais
que emite para cada serviço identifica as propostas que se encontram com erro a
fim de ser procedida à sua correção;
21. Foi ainda confirmado pelo secretariado da UHGIC que desde que o utente tenha
um agendamento realizado, ainda que além do TMRG fixado, o sistema não emite
vale para realização da respetiva cirurgia, sendo que paralelamente é ainda
possível agendar utentes que tenham já vale cirurgia emitido desde que o mesmo
não tenha ainda sido cativado em nenhum outro prestador.
II.2 Do pedido de informação à URGIC Centro e da resposta rececionada pela
ERS
22. Subsequentemente, e para completo enquadramento da factualidade em
presença, foi solicitado à URGIC Centro, por ofício de 18 de fevereiro de 2015:
“[…]
1. Indicação, com envio do suporte documental respetivo, de todas as eventuais
comunicações trocadas com a UHGIC do Centro Hospitalar do Baixo Vouga,
E.P.E. relativa a constrangimentos detetados no agendamento e realização de
cirurgias no âmbito do programa SIGIC nos anos de 2012, 2013 e 2014;
2. Indicação da realização de prévia auditoria aos procedimentos adotados pelo
Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. no âmbito do programa SIGIC,
acompanhada do suporte documental dos resultados obtidos;
3. Envio de cópia de reclamações respeitantes ao Centro Hospitalar do Baixo
Vouga, E.P.E. durante o ano de 2014, rececionadas ao abrigo do direito à
reclamação consagrado no § 44 alínea i) e § 46 do Regulamento do SIGIC.”.
23. Nessa sequência, veio a URGIC Centro responder ao pedido de informação da
ERS, por ofício rececionado em 3 de março de 2015, junto aos autos e cujo teor se
dá por integralmente reproduzido.
24. Assim, da informação prestada pela URGIC Centro2 cumpre destacar ter a mesma
informado que “[…] no seguimento de notícias recentes, relativas a eventuais
cirurgias fictícias no CHBV, E.P.E., procedeu esta URGIC a auditoria aos
procedimentos adotados pelo hospital no âmbito do programa SIGIC (finalizada a
10 de fevereiro de 2015) […]”, remetendo em anexo a tal informação os elementos
analisados em tal auditoria, sem que contudo os mesmos fossem acompanhados
das conclusões alcançadas e das recomendações produzidas;
2 Conforme ofício de resposta junto aos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
25. Não obstante, da análise dos supra referidos elementos cumpre destacar o quadro
de análise elaborado pela URGIC Centro para estudo da evolução dos
agendamentos cirúrgicos para abril de 2014 no CHBV, designadamente com o
propósito de verificar “[…] se os agendamento são alterados ou não, ao longo do
tempo, para os doentes que foram agendados inicialmente para Abril de 2014 e
que se vão mantendo em LIC.”;
26. Assim, dos 158 agendamentos cirúrgicos objeto de análise, todos para o mês abril
de 2014, e maioritariamente distribuídos pelas especialidades de ortopedia e
oftalmologia, concluiu a URGIC Centro que apenas 77 das cirurgias agendadas
(cerca de 48%) se realizaram na data inicialmente prevista, enquanto 61 cirurgias
(cerca de 38%) sofreram adiamento/reagendamento e 20 cirurgias (12%) se
mantinham em LIC, sem terem sido realizadas na data inicialmente prevista (abril
de 2014) e sem possuírem qualquer outra data de agendamento.
27. Não obstante, mesmo relativamente às cirurgias que se realizaram nas datas
inicialmente previstas, refere a URGIC Centro que “[…] apesar das datas se
manterem, por vezes estas já estão fora do prazo, no entanto, enquanto o episódio
se encontra com uma data de agendamento, não é emitido VC para este.”
28. Com efeito, no que se refere ao cumprimento dos TMRG fixados para realização
das cirurgias em causa, juntou a URGIC Centro informação estatística relativa à
realização de cirurgias na especialidade de oftalmologia pelo CHBV, a qual permite
concluir que no ano de 2013 apenas 55,1% das mesmas ocorreu dentro do TMRG,
enquanto no ano de 2014 a percentagem foi de 59,1%.
29. Ora, comparadas tais percentagens com as apresentadas para outros hospitais do
SNS da área de influência da mesma URGIC Centro, constata-se que as restantes
unidades listadas apresentam taxas de cumprimento dos TMRG para realização
de cirurgias na especialidade de oftalmologia que oscilam entre os 95,2% e os
100% em 2013 e entre os 89% e os 100% em 2014.
30. Mais se conclui, da análise estatística realizada pela URGIC Centro que no ano de
2013 o CHBV apresentava uma lista de inscritos para oftalmologia de 1.329
utentes para um tempo médio de espera de 8,8 meses e de 1.231 utentes em
2014 para um tempo médio de espera de 4,3 meses;
31. Quando comparada tal análise com os dados inscritos, por exemplo, para o Centro
Hospitalar e Universitário de Coimbra, E.P.E., concluímos que no período
homólogo, o CHUC apresentava uma lista de inscritos de 3.760 utentes, os quais
tiveram um tempo médio de espera de 5,3 meses em 2013, e de 3.567 utentes em
2014, para um tempo média de espera de 4,9 meses.
32. A par desta informação surge ainda a constatação de que, no ano de 2013, no
CHBV apenas 6 episódios de oftalmologia foram intervencionados noutros
hospitais, e em 2014 apenas 1 utente.
33. Informação que, uma vez mais se comparada com os dados disponíveis para o
Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, E.P.E., permite aferir que este centro
hospitalar teve em 2013, 271 utentes intervencionados noutros hospitais, e 331
utentes em 2014.
II.3 Do pedido de informação à UCGIC e da resposta rececionada pela ERS
34. Paralelamente, também por ofício de 18 de fevereiro de 2015 foi solicitado à
UCGIC:
“[…]
1. Atendendo à realidade de funcionamento do SIGIC, e sem prejuízo do
disposto no Regulamento do SIGIC e melhor concretizado no MGIC,
(i) descrição de todas as situações aceites pelo SIGLIC, atualmente e na
ótica do utilizador, como fundamento para a interrupção, suspensão ou
reinício da contagem dos prazos inerentes ao TMRG de cada proposta
cirúrgica;
(ii) indicação sobre se o SIGLIC permite, atualmente e na ótica do
utilizador, o agendamento de cirurgia, no Hospital de Origem, de
utentes com vale cirurgia emitido e não cativado; Em caso afirmativo,
indicação das circunstâncias em que tal poderá ocorrer;
(iii) indicação sobre se o SIGLIC permite, atualmente e na ótica do
utilizador, a ativação de propostas cirúrgicas que contenham erro no
preenchimento do GDH respetivo; Em caso afirmativo, indicação sobre
se uma inscrição que se encontre ativa contendo um erro no GDH
respetivo inibe a emissão de vale cirurgia, uma vez atingido o respetivo
TMRG;
2. Indicação sobre se o SIGLIC, perante o agendamento da cirurgia de
determinado utente (dentro do TMRG respetivo), possui algum mecanismo de
rotina e automático de confirmação da efetiva realização da cirurgia na data
indicada;
3. Envio do número total de vales cirurgia emitidos nos anos de 2012, 2013 e
2014 a utentes que tenham como hospital de origem o Centro Hospitalar do
Baixo Vouga, E.P.E., desagregados por:
(i) ano;
(ii) valência;
(iii) tempo parcial consumido, à data da emissão do vale, do TMRG
respetivo;
(iv) hospital de destino onde foi realizada a cirurgia;
4. Informação sobre se foi emitido vale cirurgia aos utentes infra listados, com
indicação da prioridade atribuída nas respetivas propostas cirúrgicas, da data
da realização da cirurgia e data da faturação respetiva, com envio do respetivo
suporte documental:
H.S.
M.S.
A.T.
A.S.
A.N.
L.D.
5. Indicação da realização de prévia auditoria aos procedimentos adotados pelo
Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. no âmbito do programa SIGIC
acompanhada do suporte documental dos resultados obtidos.
6. Envio do contrato programa celebrado com o Centro Hospitalar do Baixo
Vouga, E.P.E. para os anos de 2013/2014.
7. Indicação, desagregada para os anos de 2012, 2013 e 2014, para o Centro
Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E.:
(i) número total de cirurgias contratadas em modalidade de
produção cirúrgica base;
(ii) número total de cirurgias efetivamente realizadas, desagregado
por produção base e produção adicional, cirurgias que foram
realizadas naquele Centro Hospitalar, noutra unidade do SNS ou
noutro prestador convencionado.
8. Envio de cópia de reclamações respeitantes ao Centro Hospitalar do Baixo
Vouga, E.P.E. durante o ano de 2014, rececionadas ao abrigo do direito à
reclamação consagrado no § 44 alínea i) e § 46 do Regulamento do SIGIC.”.
35. Nessa sequência, e em resposta à solicitação da ERS, cumpre destacar a
informação prestada pela UCGIC em 3 de julho de 20153:
“[…]
(i) A instituição hospitalar utiliza o seu próprio sistema de informação (SIH), que
por sua vez integra dados no SIGLIC. As Instituições hospitalares do SNS,
dispõem de um conjunto de funcionalidades que permitem interrupção (ou
suspensão) da contagem do tempo de espera:
• Colocação de pendências pessoais - Necessariamente a pedido do
doente em suporte documental, por razões da sua conveniência - período
máximo igual ao Tempo Máximo de Resposta Garantido (TMRG) para a
prioridade e patologia estabelecida na proposta;
• Colocação de pendências clínicas - Necessariamente por razões
clínicas devidamente documentadas no processo, tendo em vista o
melhor interesse do utente, sendo que este tem de ter dado o seu
consentimento expresso;
O reinício da contagem do tempo de espera, decorre nas Instituições
hospitalares do SNS, necessariamente de um cancelamento prévio da
inscrição em lista (da proposta cirúrgica) e reinscrição pelo mesmo patologia
que deu origem à primeira inscrição, pode ocorrer nas seguintes situações:
• Não consentir na proposta cirúrgica nos prazos designados;
• Desistência por parte do utente;
• Falta do utente a eventos clínicos, adequadamente agendados, sem
apresentação de motivo plausível;
• Falta 3 vezes, do utente a eventos clínicos, adequadamente agendados,
mesmo com apresentação de motivo plausível;
3 Conforme ofício de resposta junto aos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
• Recusa 3 vezes, do utente a data de agendamento de intervenção
cirúrgica, adequadamente agendada, mesmo com apresentação de
motivo plausível;
• Utente incontactável, pelos meios de contacto que indicou, após 15 dias
sem resposta a contar da data de registo nos CTT de carta dirigida ao
utente;
• Recusa de intervenção cirúrgica no HD após cativação do vale, por
motivo não plausível considerado pela URGIC ou UCGIC;
• Por não utilização (cativação ou recusa) da Nota de Transferência ou
Vale de Cirurgia (NT/VC), nos prazos consignados e inscritos no
documento.
Nota: todas as situações enunciadas têm de estar suportadas
documentalmente no processo clínico do doente.
(ii) As Instituições hospitalares do SNS registam todos os agendamentos e
cancelamentos de agendamentos no SIH, sendo os mesmos integrados no
SIGLIC.
De acordo com as regras do SIGIC enunciadas no MGIC:
"Se o TMRG tiver sido ultrapassado, o agendamento tem de ser registado
com um máximo de 20 dias de antecedência em relação à data da cirurgia, ou
seja, o registo do agendamento não deve ser realizado com uma
antecedência superior a 20 dias à data da cirurgia agendada."
No entanto, os SIH não apresentam esta regra implementada. Sempre que
um agendamento é realizado e integrado no SIGLIC, o mesmo impede a
emissão de NT/VC, pois até ao momento não existe forma automática de
eliminar o agendamento incorreto no SIH.
Pelo que se confirma que é possível o hospital impedir a emissão de NT/VC,
agendando no SIH, irregularmente os utentes.
(iii) A partir do momento que o NT/VC é emitido pela Unidade Central de Gestão
de Inscritos para Cirurgia, a instituição hospitalar fica impedida de fazer
qualquer registo no SIH (episódio bloqueado no estado "transferido para"). Só
será novamente possível o registo de eventos, se a NT/VC for cancelada ou,
caso ocorra cativação, se o episódio for devolvido pelo hospital de destino.
Não obstante temos evidências (em alguns hospitais do SNS), que são
agendados e efetuados, ainda que de forma não conforme às regras do
SIGIC, episódios em estado de transferência (Vale Emitido ou Cativado em
Hospital Destino (HD)).
(iv) As Instituições hospitalares do SNS criam as propostas cirúrgicas no SIH,
sendo posteriormente integrado no SIGLIC, o que só ocorre no caso de não
existirem erros críticos, nomeadamente na codificação de diagnósticos e
procedimentos - condição necessária para o sistema classificar o episódio no
respetivo GDH. A instituição hospitalar é regularmente informada das
propostas incorretas para que proceda à sua correção e o evento possa ser
integrado.
Se a proposta não estiver integrada no SIGLIC ou se integrada apresentar
alguns erros (morada incompleta, código postal inválido, data de nascimento
incorreta, sexo do utente não correspondente com o procedimento) não é
emitido NT/VC. A instituição hospitalar deve regularmente consultar os
alarmes no SIGLIC que a informa dos erros que necessitam de correção.
(v) O SIGLIC apresenta um alarme que reporta todos os agendamentos ativos que
não apresentam registo de cirurgia, após 10 dias úteis (tempo de tolerância
para o registo de um evento clínico) da sua suposta ocorrência.
No entanto se a instituição cancelar o agendamento, com um dos motivos
válidos para o adiamento da cirurgia, o episódio já não é sinalizado no alarme
indicado.
Regularmente a UCGIC analisa os cancelamentos de agendamentos e
questiona as instituições de situações dúbias.
II.4 Da comunicação da IGAS
36. No decurso dos presentes autos, foi ainda rececionada a 12 de março de 2015
comunicação da IGAS4, dando conhecimento à ERS do teor da Informação IGAS
n.º 97/2015, elaborada no âmbito do processo “Factos relacionados com eventuais
irregularidades na marcação de cirurgias.”, no CHBV.
37. Assim, cumpre destacar do teor da predita informação os factos que infra se listam:
“[…]
4 Junta aos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
(i) Após as diligências realizadas, cabe esclarecer que se encontra totalmente
afastada a possibilidade de terem sido faturadas cirurgias não realizadas no
CHBV, ou de serem contabilizadas cirurgias não realizadas para efeitos
estatísticos ou outros, como parece veladamente a notícia deixar entender,
não tendo sido detetada qualquer irregularidade, a este nível, no CHBV.
No entanto, relativamente a agendamento para cirurgia foram detetadas
algumas desconformidades face ao Manual do SIGIC/ no que concerne ao
agendamento das cirurgias dos doentes que se encontram em LIC,
principalmente em Oftalmologia e que já foram objeto de informação anterior
[…] e que neste momento cabe atualizar e precisar nos seus termos, face
aos novos elementos existentes obtidos.
(ii) Cancelamentos das Cirurgias em Oftalmologia […] após apurada análise
dos elementos documentais disponibilizados pelo CHBV relativamente à LIC
para Oftalmologia verifica-se a existência entre 2013 e 2014 de um número
significativo de cancelamentos devidos a "Engano de Agendamento" e
"Outros" (de dezenas de casos e por vezes centenas em alguns meses). De
referir que os cancelamentos em Urologia, de acordo com a documentação
existentes, por estes mesmos motivos, deixaram de ter expressão a partir de
abril de 2014 (apenas ocorreram 5 cancelamentos por estes motivos desde
então).
(iii) Perante as evidências claras de cancelamentos por motivos
administrativos foi ouvida a Assistente Administrativa do CHBV que realiza
estes agendamentos em Oftalmologia, […] que informou, relativamente ao
procedimento instituído, o seguinte:
O procedimento que a seguir descreve vigorou até à última segunda-
feira por indicação do Dr. M.;
A cirurgia era agendada no próprio dia em que o doente era inscrito
em LIC;
Se os doentes eram prioritários, eram agendados para uma data
dentro dos 60 dias. Era utilizada uma calculadora on-line Date end
Time e era colocado 60 dias (no caso dos prioritários) e o doente era
agendado para o limite do dia indicado. Normalmente, no caso dos
prioritários, a cirurgia era normalmente antecipada, dando origem a
um cancelamento com o código 7 "Outros".
Nos doentes não prioritários (ditos normais) o agendamento era feito
também na calculadora on-line Date end time, onde era colocado
270 dias e o doente era marcado para o limite do dia indicado.
Normalmente era possível antecipar as cirurgias e reagendar para
uma data anterior.
(iv) Sobre o procedimento instituído pronunciou-se o Diretor do Serviço de
Oftalmologia, nos seguintes termos:
Esta prática no agendamento existe há cerca de 4 anos, quando o
bloco do Hospital D. Pedro encerrou por motivo de obras e passou a
funcionar em Anadia para as cirurgias de Oftalmologia.
As marcações passaram a ser realizadas, como foi referido pela
[assistente administrativa] por sugestão do então vogal executivo do
CA […].
Havia a expetativa de se conseguir diminuir a lista de espera em
Oftalmologia e de resolver o problema. Inicialmente, não havia
reclamações. Mais recentemente houve alguns doentes que foram
enviados por colegas a queixarem-se deste procedimento. Neste
momento, desde segunda-feira última (dia 16-01-2015), este
procedimento foi revisto em Oftalmologia e apenas são agendadas
as cirurgias que irão ser realizadas numa determinada data.
Relativamente à lista de espera esclarece que atualmente estão a
operar os doentes de agosto de 2014, ou seja com um atraso de
apenas sete meses.
(v) Sobre esta questão foi ouvido igualmente o Sr. Diretor Clinico:
Esclareceu que teve conhecimento da existência de
desconformidades nas marcações das cirurgias desde a
comunicação enviada […] ao CA, em 13 de março de 2014. Desde
logo, foi ponderada a mudança do Coordenador do UHGIC o que
ocorreu em 28 de março de 2014, com a nomeação do Dr. R.
Quando o novo coordenador iniciou funções, começou a fazer o
levantamento de todas as desconformidades em articulação com a
ARS do Centro […] e foi realizada uma proposta em 14 de maio de
2014, visando a regularização das desconformidades encontradas.
Foi elaborado um plano contendo uma previsão para a resolução. O
Serviço de Oftalmologia era o que apresentava mais
desconformidades, pelo que foi apresentada uma proposta ao CA e
objeto de acompanhamento aos 3, 6 e 9 meses com evidência de
melhorias em relação às desconformidades identificadas. Havia a
expectativa que a situação identificada estaria quase totalmente
regularizada.
Esclareceu ainda que estava convencido que se estava a cumprir as
regras do Manual do SIGIC para todas as especialidades, pelo
menos em 2015, e que a situação de Oftalmologia estaria a ser
resolvida.
Não tinha conhecimento dos factos com os pormenores apontados,
designadamente de que o agendamento da LIC em Oftalmologia era
feito no próprio dia da inscrição e não tinha igualmente conhecimento
que a marcação era feita sem qualquer outro critério que não seja o
Tempo Máximo de Resposta Garantida (TMRG). Sabia que era feita
dentro do TMRG e que depois, se não houvesse capacidade
instalada ou razões clínicas ou logísticas, os doentes seriam
reagendados. Também sabia que o doente não tinha igualmente
conhecimento do agendamento e estava convencido que estas
situações estavam a ser regularizadas.
Fica surpreendido com a data de segunda-feira para a regularização
do agendamento em Oftalmologia, uma vez que pensava que este
problema estava normalizado.
Irá ser realizada uma proposta ao CA no sentido de dar indicações
precisas aos serviços para o cumprimento integral das
recomendações do Manual do SIGIC.
(vi) O […] Coordenador da Unidade Hospitalar de Gestão para Inscritos em
Cirurgia do CHBV, relativamente aos agendamentos de Oftalmologista
esclareceu:
Era necessário diminuir as listas de inscritos para cirurgia, cuja
previsão inicial era de 3 meses, para que os problemas existentes
fossem corrigidos.
Para o plano funcionar era necessário que a relação
produção/procura estivesse a ser cumprida. Em outubro ou
novembro do ano passado confrontou o [diretor do serviço de
oftalmologia] para saber como estava a decorrer a execução do
plano. Num dos meses, a produção ficou acima do estabelecido, 252
doentes, quando o mínimo era superior 210, pelo que ficou tranquilo
quanto a boa evolução do plano.
Nos indicadores referentes a dezembro de 2014, nota-se uma
contínua diminuição do n.° de doentes acima do TMRG que passou
de 26,35 % em 1-04-2014 para 4,33% em 30-12-2014 e uma
diminuição substancial de erros 470.
Dedicou-se a outras áreas menos organizadas (Cirurgia, Urologia) no
sentido de acompanhar a evolução da lista de espera.
Como a produção prevista não foi realizada, o plano não produziu,
no tempo previsto, os resultados esperados.
Durante alguns meses ainda se pensou que se conseguia recuperar
a produção, de Oftalmologia, mas, dada a diminuição recente do
número de oftalmologistas, agravada por mais uma redução
previsível no próximo mês, fica inviabilizado o seu cumprimento.
De facto, em alguns meses a inscrição para cirurgia em oftalmologia
foi superior a 300 doentes e, além disso, a produção baixou.
O rácio de produção/ procura vai ser incomportável e o plano de
oftalmologia terá de ser revisto, pelo que se torna impossível ao
serviço nestas condições pensar que se pode resolver a totalidade
da lista de espera, dentro do TMRG.
Somente recentemente teve noção da necessidade de mudar o
plano.
(vii) Face à audição dos interlocutores supra referenciados, constam da
informação da IGAS as seguintes considerações:
Resulta da informação disponível que o CA, em 28-03-2014, tomou
várias medidas no sentido de resolver algumas das
desconformidades. Após a elaboração do plano do [coordenador da
UHGIC] tentou-se inverter uma situação criada devido ao
encerramento do bloco do Hospital Infante D. Pedro, por motivo de
obras, período em que a produção cirúrgica baixou significativamente
em Oftalmologia cerca de 1/6.
Logo que foi retomada a produção procurou dar resposta a todos os
doentes inscritos dentro do limite do TMRG. No entanto, o
procedimento foi mantido sem que a situação tivesse sido revertida
no sentido da diminuição da lista em ordem a possibilitar o
cumprimento das regras do manual do SIGIC e a transferência de
cirurgias para o exterior. Embora o referido desiderato não tenha sido
totalmente alcançado, foi afirmado que nas especialidades em que o
atraso na realização das cirurgias poderia prejudicar gravemente o
doente o procedimento foi alterado.
De facto, o procedimento foi normalizado em várias especialidades,
designadamente em Urologia, em que optaram por inscrever o
doente em LIC e fazer posteriormente o agendamento para a data
efetiva da sua realização. Esta alteração teve como consequência
um aumento de doentes transferidos para o exterior nesta
especialidade, em cerca de 120%, conforme se constata no capítulo
dos indicadores da presente informação.
De referir que o doente em Oftalmologia não é informado da data do
respetivo agendamento, o que constituía uma falha nos
procedimentos.
Este aspeto está consagrado no Manual do SIGIC, I volume, ponto
3.2.1.2.4. relativo à Ativação da Inscrição, como se transcreve:
"O certificado de inscrição é o documento comprovativo da inscrição
do utente na LIC e é emitido através do SIGLIC após o registo
informático das datas de validação e de consentimento da proposta
cirúrgica.
A aplicação SIGLIC gera um código de acesso individual e regista-o
no certificado de inscrição, o qual, por esta razão, deve ser
obrigatoriamente impresso através do SIGLIC e enviado por carta
registada para a morada oficial do utente ou entregue em mão contra
recibo comprovativo. Mais tarde o utente, querendo, pode alterar
este código através do e-SIGIC.
Após a emissão do certificado de inscrição, deve ser impressa uma
cópia da proposta cirúrgica registada informaticamente que o médico
proponente deve assinar, sendo depois arquivada no processo do
utente. Este procedimento destina-se à certificação da informação
registada no sistema por parte do médio proponente."
Importa desde já aditar que o referido procedimento colide com o
princípio da transparência e do direito à informação que deve orientar
a atividade desenvolvida pelas entidades públicas, cujo respeito
contribui para mitigar os riscos de ocorrência de situações
fraudulentas, para além de colidir com os princípios em que assenta
o SIGIC - princípios de equidade no acesso ao tratamento cirúrgico,
transparência dos processos de gestão e responsabilização dos
utentes e dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Note-se porem que esta situação está igualmente a ser monitorizada
pela URGIC da ARS do Centro, de acordo com a informação colhida
junto desta Unidade Regional, sendo que o CHBV não é das
instituições que apresenta piores indicadores em matéria de gestão
de listas de espera.
(viii) Quanto à questão de “Alteração da prioridade da cirurgia”:
Outra das situações reportadas prende-se com a alteração da
prioridade para a cirurgia. Ouvido o Sr. Diretor do Serviço de
Oftalmologia […] este esclareceu que os doentes prioritários têm
vindo a aumentar nas propostas cirúrgicas e a partir de novembro de
2014, decidiu começar a fazer uma avaliação clínica dos casos e que
quando detetou motivo clínico que o justificava alterou a respetiva
prioridade.
Sobre esta questão é de referir que a possibilidade de alteração de
prioridade foi enquadrada tendo por base o regulamento CHBV e o
Manual do SIGIC. De salientar que dos 2067 doentes agendados,
para o ano de 2014, apenas 19 foram objeto de alteração de
prioritária para normal.
(ix) Quanto à questão do “Erro GDH 470 nas propostas cirúrgicas”:
Ainda relativamente ao facto de algumas propostas cirúrgicas
conterem um erro designado «470»., erro este que é gerado
automaticamente pelo próprio Sistema Informático de Gestão da
Lista de Inscritos para Cirurgia (SIGLIC), quando o sistema deteta
erros no preenchimento das respetivas propostas, e que se deve ao
não preenchimento integral ou defeituoso de todos os campos no
Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC)
nacional, a mesma não é aceite e gera o erro GHD 47013.
Geralmente o médico proponente não terá conhecimento do erro
GDH 470. Somente após análise mensal estas propostas podem ser
corrigidas. As propostas constam da LIC e podem ser realizadas
internamente no CHBV. No entanto, se for ultrapassado o Tempo
Máximo de Resposta Garantida (TMRG), na prioridade respetiva, os
doentes não recebem qualquer vale cirurgia, uma vez que o sistema
não o consegue emitir.":
Ainda relativamente ao erro GDH 470, verifica-se que a [gestora do
departamento cirúrgico do CHBV] já mencionava este erro nas
comunicações que fazia via e-mail aos diretores de serviço e
esporadicamente ao CA para conhecimento. O [coordenador da
UHGIC] em agosto último fez novamente um ponto da situação e
verificou que as propostas contendo o erro 470 baixaram de um peso
de 14.6% em 1 de abril de 2014 para 4,68% em 31-08-2014, na
sequência de um trabalho pedagógico junto dos diretores dos
serviços para a completa resolução deste problema. Referiu que
alguns médicos são avessos às aplicações informáticas ou tem
dificuldade no seu manuseio, sendo igualmente verdade que muitos
programas informáticos são lentos e pouco intuitivos.
Verifica-se, na análise efetuada no ponto 2.5 da presente informação
que o número de erros GDH 470 tem vindo a diminuir, mas não foi
completamente superado, sendo mais visível em algumas
especialidades e existindo, neste momento apenas relativamente a
propostas relativamente recentes.
Acresce que a ocorrência desde problema com o erro GDH 470 não
é exclusivo do CHBV, tendo sido detetada em outras instituições,
designadamente no CHUC, que solicitou junto do URGIC da ARS do
Centro (que por sua vez solicitou junto do servicedesk do SIGLIC)
esclarecimentos sobre os motivos da existência deste erro tendo sido
informada que poderá ser devido (como se transcreve):
1. Codificação insuficiente do Diagnóstico e/ou Procedimento;
2. Morada do Utente incompleta;
3. N° do Cartão Utente incompleto;
4. N° de Contacto telefónico do Utente incompleto;"
Existem ainda outras situações aparentemente bem colocadas na
LIC e que geram o erro GDH 470, quando está tudo aparentemente
em conformidade, situação o que já foi reportada à ARS do Centro.
Sobre se existe algum interesse material ou de outra ordem que
justifique esse comportamento, todos os que foram ouvidos no
âmbito destas diligências responderam negativamente, salientado
que a existência deste erro invalida a possibilidade de ser emitido o
cheque cirúrgico. Como o CHBV não tem atividade adicional
(interna), não existe qualquer vantagem para o médico que realiza a
inscrição. Somente o CHBV poderia obter vantagem porque a
cirurgia não era realizada no exterior. No entanto, depois de analisar
as listas, verificou que nem todas as propostas, mesmo que
corretamente formuladas, são objeto da emissão de cheques
cirurgia, mesmo quando é ultrapassado o TMRG.
(x) Este procedimento de gestão dos agendamentos das cirurgias
implementado, assente no agendamento, cancelamento e reagendamento
de cirurgias potencia e origina, como se evidenciou no âmbito da presente
ação, a ocorrência de erros de registo de agendamento/cancelamento das
respetivas cirurgias.
(xi) Estabelece o Manual do SIGIC no ponto 1.6. Condições para inscrição
de um utente em LIC, do Volume II - Área de Gestão, a fls. 20 que as
situações anómalas de inclusão de utentes em LIC, detetadas em auditorias,
são consideradas não conformidades e, como tal, passíveis de
penalizações: Estabelece ainda no ponto 1.11: Monitorização das não
conformidades do serviço/ unidade funcional do mesmo volume, a fls. 24 e
25, que as não conformidades do serviço/unidade funcional, em particular as
da área clínica, ligadas ao processo de agendamento do utente, ao
conteúdo dos documentos clínicos, aos prazos de tratamento dos utentes e
à equidade no acesso ao tratamento dos utentes devem ser objeto de
monitorização sistemática por parte dos seus responsáveis. Para o efeito, o
sistema disponibiliza um sistema de avisos que permite a monitorização das
eventuais não conformidades, caso o processo não seja corrigido e das não
conformidades geradas, sujeitas a penalizações. No entanto, este sistema
de deteção de não conformidades não se encontrará ativo, segundo
informação colhida junto da URGIC integrada na ARS do Centro.
Para além das não conformidades detetadas automaticamente, a URGIC e a
UCGIC podem também aplicar não conformidades às instituições, apuradas
na sequência de auditorias e da análise de reclamações.
As não conformidades são suscetíveis de serem penalizadas, podendo os
serviços, querendo, contestar. A contestação é efetuada através do SIGLIC
e tem de ser fundamentada por meio de prova documental. As contestações
são apreciadas pela URGIC e, caso sejam aceites, as não conformidades
ficam sem efeito. No caso de não serem aceites, as instituições podem
ainda recorrer para a UCGIC, ficando as não conformidades sem efeito,
caso o recurso seja aceite.
(xii) Face às considerações tecidas produz a informação remetida pela
IGAS as seguintes conclusões:
Face ao teor da notícia publicada no Jornal de Notícias, no início de
fevereiro de 2015, verifica-se que se encontra totalmente afastada a
possibilidade de terem sido faturadas cirurgias não realizadas no
CHBV, ou de terem sido contabilizadas cirurgias não realizadas para
efeitos estatísticos ou outros, como parece veladamente a notícia
deixar entender, não tendo sido detetada qualquer irregularidade, a
este nível, no CHBV.
Todavia, até 16 de fevereiro último, existiam práticas no CHBV
relativas ao agendamento para cirurgia em Oftalmologia que não
eram conformes os procedimentos estabelecidos no Manual SIGIC,
conforme se descreveu em ponto 2.2.2. desta informação.
Estas práticas foram introduzidas no momento em que fechou o
Bloco do Hospital Infante D. Pedro, por motivo de obras, levando a
que todas as cirurgias fossem marcadas para data em que não se
sabia se poderiam ser realizadas.
De facto, a atividade cirúrgica em Oftalmologia, durante este período,
foi realizada no Hospital de Anadia registando-se uma quebra de
produção para cerca de 1/6.
Tal facto teve como consequência que muitas das cirurgias
agendadas não fossem realizadas nas datas previstas.
Quando a atividade do Bloco regressou ao normal procurou-se
normalizar a produção e reverter a situação da lista de espera.
Em março de 2014, o CA tomou algumas medidas no sentido de
corrigir os procedimentos relativos ao agendamento que teve
repercussões em algumas especialidades, destacando-se a
substituição do responsável pela Unidade Hospitalar de Gestão de
Inscritos para Cirurgia.
Em Oftalmologia foi proposto um plano visando a redução da lista de
espera e a normalização destes procedimentos, o qual foi objeto de
acompanhamento e monitorização com apresentação de resultados.
No entanto, o plano não resultou como acabaram por reconhecer o
Diretor do Departamento Cirúrgico e do Serviço de Oftalmologia e o
[coordenador da UHGIC].
Detetadas as desconformidades apontadas na presente ação, que
foram dadas a conhecer aos membros do CA no decurso da visita
dos instrutores do presente processo, foi elaborado um procedimento
pelo Sr. Diretor Clínico, que será submetido a Despacho do
Conselho de Administração, cuja finalidade se prende com o
cumprimento integral de todos os procedimentos constantes do
Manual do SIGIC no CHBV.
A regularização do procedimento dos agendamentos em
Oftalmologia poderá implicar o aumento substancial do número de
doentes transferidos, no âmbito do SIGIC.
De entre as desconformidades detetadas, destacam-se as
relacionadas com o rigor na marcação/agendamento das cirurgias,
os quais nem sempre foram devidamente comunicadas aos doentes
em devido tempo, nos termos estabelecidos no Manual do SIGLIC,
bem como as associadas a alguma falta de rigor na introdução da
informação no SIGLIC por parte dos profissionais de saúde da
instituição, e ainda, a existência de informação nos aplicativos que
não corresponde à realidade.
O Diretor Clínico tinha conhecimento parcial de alguns factos.
Admite-se por verdadeiro que, quer da parte do CA, quer dos seus
profissionais de saúde, não havia interesse em provocar as
desconformidades identificadas sobre a ocorrência do erro GDH 470.
Acresce que a ocorrência do referido erro verifica-se em outras
unidades, por vezes até com maior expressão, na área da ARS do
Centro.
Conclui-se, pois, que não terão sido devidamente valorizadas as
consequências da existência deste erro, tendo em conta o seu
impacto na qualidade dos serviços prestados (manutenção dos
doentes em lista de espera para além dos prazos estipulado pelo
SIGIC, sem a emissão do respetivo cheque cirurgia).
Embora não tenham sido recolhidos indícios de eventual prática
fraudulenta, as não conformidades evidenciadas no procedimento de
agendamentos das cirurgias, com especial incidência na
especialidade de cirurgia oftalmológica, colidem com os princípios da
equidade no acesso ao tratamento cirúrgico e da transparência dos
processos em que assenta o SIGIC, nos termos do estabelecido no
Regulamento anexo à Portaria n.° 45/2008, de 15 de janeiro.
Para além disso, os objetivos traçados em matéria de gestão da LIC,
à luz do Regulamento e do Manual SIGIC, não foram, em especial no
ano de 2014, integralmente alcançados, o que se evidencia, por
exemplo, com o acréscimo substancial do número de doentes
operados fora do TMRG (66,3%), de 2013 para 2014, apesar do
considerável acréscimo no número de doentes operados
internamente (27,2%) tendo por base os dados do aplicativo SONHO
disponibilizados pelo CHBV, EPE.
Também a coerência da informação produzida, por ausência de um
critério uniforme, em matéria de classificação dos motivos dos
cancelamentos, constituem uma reserva à qualidade da informação
produzida.
Não se mostrou ainda evidenciado a aplicação das penalidades por
parte das entidades com competências para o efeito, nos termos do
Regulamento SIGIC, Parte VIII - Não Conformidades, anexo à
Portaria n.° 45/2008, de 15 de janeiro, na sequência das não
conformidades nesta sede apuradas. […].”
III. DO DIREITO
III.1. Das atribuições e competências da ERS
38. De acordo com o n.º 1 do artigo 5.º dos Estatutos da ERS, esta tem por missão
“[…] a regulação da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de
saúde.
39. Ainda, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 5.º dos seus Estatutos, as
atribuições da ERS compreendem “[…] a supervisão da atividade e funcionamento
dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde no que respeita:
[…] b) À garantia dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à
prestação de cuidados de saúde de qualidade, bem como dos demais
direitos dos utentes;
c) À legalidade e transparência das relações económicas entre os diversos
operadores, entidades financiadoras e utentes.”.
40. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º
dos seus Estatutos “[...] todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de
saúde, do setor público, privado, cooperativo e social, independentemente da sua
natureza jurídica, nomeadamente hospitais, clínicas, centros de saúde,
consultórios, laboratórios de análises clinicas, equipamentos ou unidades de
telemedicina, unidades móveis de saúde e termas.”.
41. O que é o caso do Hospital Infante D. Pedro, prestador de cuidados de saúde
integrado no Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E., prestador de cuidados de
saúde inscrito no SRER da ERS sob o n.º 21487.
42. No que se refere ao objetivo regulatório previsto na alínea b) do artigo 10.º dos
Estatutos da ERS, de assegurar o cumprimento dos critérios de acesso aos
cuidados de saúde, a alínea a) do artigo 12.º do mesmo diploma legislativo
estabelece ser incumbência da ERS “ assegurar o direito de acesso universal e
equitativo à prestação de cuidados de saúde nos serviços e estabelecimentos do
Serviço Nacional de Saúde (SNS), nos estabelecimentos publicamente
financiados, bem como nos estabelecimentos contratados para a prestação de
cuidados no âmbito de sistemas ou subsistemas públicos de saúde ou
equiparados, acrescentando a alínea b) do mesmo artigo o dever de “prevenir e
punir as práticas de rejeição e discriminação infundadas de utentes nos serviços e
estabelecimentos do SNS, nos estabelecimentos publicamente financiados, bem
como nos estabelecimentos contratados para a prestação de cuidados no âmbito
de sistemas ou subsistemas públicos de saúde ou equiparados”.
43. Podendo fazê-lo mediante o exercício dos seus poderes de supervisão
consubstanciado no dever de “zelar pela aplicação das leis e regulamentos e
demais normas aplicáveis às atividades sujeitas à sua regulação, no âmbito das
suas atribuições”, bem como na emissão de ordens e instruções, bem como
recomendações ou advertências individuais, sempre que tal seja necessário, sobre
quaisquer matérias relacionadas com os objetivos da sua atividade reguladora,
incluindo a imposição de medidas de conduta e a adoção das providências
necessárias à reparação dos direitos e interesses legítimos dos utentes – cfr. al. a)
e b) do artigo 19.º dos Estatutos da ERS.
44. E, no que concretamente respeita à obrigação de assegurar o cumprimento dos
critérios de acesso aos cuidados de saúde, se é certo que a violação do direito de
acesso, como direito complexo, pode surgir sob diferentes formas, ou ser originada
por diferentes causas, é igualmente certo que uma das suas violações mais
gravosas e últimas se consubstancia na rejeição infundada de pacientes.
45. É também competência da ERS, prevenir e punir as práticas de rejeição e
discriminação infundadas de utentes nos serviços e estabelecimentos do SNS, nos
estabelecimentos publicamente financiados, bem como nos estabelecimentos
contratados para a prestação de cuidados no âmbito de sistemas ou subsistemas
públicos de saúde ou equiparados (cfr. alínea b) do artigo 12.º dos Estatutos da
ERS).
46. Sendo estabelecido na alínea b) do n.º 2 do artigo 61.º dos Estatutos da ERS, que
“Constitui contraordenação, punível com coima de 1000 EUR a 3740,98 EUR ou
de 1500 EUR a 44 891,81 EUR, consoante o infrator seja pessoa singular ou
coletiva:
[…]
b) A violação das regras relativas ao acesso aos cuidados de saúde:
i) A violação da igualdade e universalidade no acesso ao SNS, prevista
na alínea a) do artigo 12.º;
ii) A violação de regras estabelecidas em lei ou regulamentação e que
visem garantir e conformar o acesso dos utentes aos cuidados de saúde, bem
como práticas de rejeição ou discriminação infundadas, em estabelecimentos
públicos, publicamente financiados, ou contratados para a prestação de
cuidados no âmbito de sistemas e subsistemas públicos de saúde ou
equiparados, nos termos do disposto nas alíneas a) e b) do artigo 12.º”.
47. Já quanto ao objetivo regulatório de zelar pela prestação de cuidados de saúde de
qualidade, previsto na alínea d) do artigo 10.º, incumbe à ERS, entre outras, a
garantia do direito dos utentes à prestação de cuidados de saúde qualidade,
conforme estatuído na alínea c) do artigo 14.º dos Estatutos da ERS.
III.2 Do modelo de funcionamento do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos
para Cirurgia
III.2.1 Os direitos dos utentes
48. O direito de acesso aos cuidados de saúde encontra-se constitucionalmente
consagrado no artigo 64.º, sob a epígrafe “direito à proteção da saúde”, nos termos
do qual tal direito é garantido pela criação de um SNS assente no respeito pelos
princípios fundamentais da universalidade, generalidade e gratuitidade tendencial
e impõe-se a toda a rede nacional de prestação de cuidados de saúde.
49. Com efeito, nos termos da Base XXIV da Lei de Bases da Saúde (LBS), o SNS
deve prover pela garantia de “equidade no acesso dos utentes, com o objetivo de
atenuar os efeitos das desigualdades económicas, geográficas e quaisquer outras
no acesso aos cuidados”, o que implica que, nos estabelecimentos integrados no
SNS, os cidadãos em situação idêntica devem receber tratamento em iguais
circunstâncias, e em função das necessidades de cuidados de saúde.
50. A universalidade assenta na atribuição a todos do direito à proteção da saúde e
nessa medida, deve ser assegurado a todos os cidadãos, no âmbito do SNS, o
direito de acesso “[...] independentemente da sua condição económica, aos
cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação”, o que implica que
todos os cidadãos, sem exceção, possam aceder aos serviços prestadores de
cuidados de saúde.
51. A generalidade impõe que o SNS garanta, com maior ou menor grau, uma
prestação integrada de cuidados globais de saúde aos seus beneficiários. O
princípio da generalidade aponta para o direito dos cidadãos a obter todo o tipo de
cuidados de saúde, pelo que o Estado, com o intuito de assegurar a realização do
direito à proteção da saúde, deverá “garantir uma racional e eficiente cobertura de
todo o país em recursos humanos e unidades de saúde”. A este respeito a LBS
determina que o cidadão tem direito a que lhe sejam prestados de forma integrada
todos os cuidados de saúde, sejam primários, secundários, continuados ou
paliativos.
52. Por outro lado, a Lei n.º 15/2014, de 21 de março, que consolidou a legislação em
matéria de direitos e deveres do utente dos serviços de saúde, determina no seu
artigo 4.º que a prestação dos cuidados de saúde pelo Serviço Nacional de Saúde
e pelas entidades convencionadas ocorra em tempo considerado clinicamente
aceitável para a condição de saúde de cada utente, igualmente instituindo tal
normativo que, a Carta dos Direitos de Acesso aos Cuidados de Saúde pelos
Utentes do Serviço Nacional de Saúde, define “[…] os tempos máximos de
resposta garantidos [e] o direito do utente à informação sobre esses tempos”,
impondo aos estabelecimentos do SNS e aos do setor convencionado a obrigação
de informarem o utente do tempo máximo de resposta garantido para a prestação
de cuidados de saúde de que necessita, bem como de afixação de informação
atualizada relativa aos TMRG para os diferentes tipos de prestação e grupos de
patologia.
53. Nesse sentido, a Portaria n.º 87/2015, de 23 de março estabelece assim os TMRG
para prestações sem carácter de urgência, nomeadamente ambulatório dos
centros de saúde, cuidados domiciliários, consultas externas hospitalares, meios
complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT) e cirurgia programada.
54. Por seu turno, cada estabelecimento do SNS fixará anualmente, dentro dos limites
máximos estabelecidos a nível nacional por via da referida Portaria, os seus
tempos de resposta garantidos por tipo de prestação e por patologia ou grupo de
patologias, que igualmente deverão constar dos respetivos planos de atividades e
contratos-programa.
55. Assim, também neste âmbito se estrutura a necessidade da relação que se
estabelece entre os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde e os seus
utentes se pautar pela verdade, completude e transparência em todos os aspetos
e momentos da mesma, incluindo nos momentos que antecedem a própria
prestação de cuidados de saúde.
56. Nesse sentido, o direito à informação – e o concomitante dever de informar – surge
aqui com especial relevância e é dotado de uma importância estrutural na própria
relação criada entre utente e prestador, não se limitando ao que prevê a alínea e)
do n.º 1 da Base XIV da LBS, para efeitos de consentimento informado e
esclarecimento quanto a alternativas de tratamento e evolução do estado clínico,
motivo pelo qual a alínea d) do artigo 27º da Lei 15/2014, de 21 de Março
estabelece a obrigação do utente ser informado sempre que “[…] a capacidade de
resposta dos estabelecimentos do SNS estiver esgotada e for necessário proceder
à referenciação para os estabelecimentos de saúde do setor privado […]”.
57. Veja-se a propósito do cumprimento desta obrigação de informação do utente, o
recém publicado Despacho n.º 987/2016, de 15 de janeiro, o qual visa reforçar os
mecanismos ínsitos à disponibilização pública de informação atualizada sobre o
cumprimento dos tempos máximos de resposta garantidos.
58. Tudo concorrendo para a conclusão de que o direito à informação assume
particular relevância nos mercados de serviços de saúde, na medida em que estes
são caracterizados pela informação imperfeita que, regra geral, as pessoas
possuem relativamente à saúde e à doença, existindo uma assimetria de
informação resultante do facto de os profissionais de saúde serem mais
conhecedores dos cuidados mais adequados às necessidades dos utentes;
59. Encontrando-se intrinsecamente ligado ao direito à liberdade de escolha, na
medida em que só com base na absoluta transparência e completude de
informação é que poderá ser salvaguardado o direito de um qualquer utente de
escolher livremente o agente prestador de cuidados de saúde (alínea a), do n.º 1,
da Base XIV da LBS).
60. Com efeito, tal preocupação esteve sempre subjacente à criação do SIGIC,
constando desde logo do Regulamento anexo à Portaria n.º 45/2008, de 15 de
janeiro o direito do utente “[…] dispor de uma garantia de tratamento dentro do
tempo máximo de espera garantido para o nível de prioridade, por patologia ou por
grupo de patologias”; aceder a todo o tempo junto da unidade hospitalar de gestão
de inscritos para cirurgia (UHGIC) do seu hospital e a seu pedido aos dados que
lhe respeitem registados na lista de inscritos para cirurgia (LIC), nomeadamente o
nível de prioridade que lhe foi atribuído e o seu posicionamento relativo na
prioridade atribuída [e] escolher, quando haja lugar a transferência, de entre os
hospitais indicados para a realização da cirurgia de que carece […]” – cfr. Parte III
do Regulamento.
61. Por fim, também o direito à reclamação previsto no artigo 9.º da Lei 15/2014, de 21
de março, surge como reforço do já estipulado no Regulamento do SIGIC,
enfatizando a necessidade do integral e atempado cumprimento de todas as fases
do processo de acesso à prestação dos cuidados cirúrgicos de que o utente
necessita.
III.2.2. Das regras do SIGIC
62. Conforme descrito na Portaria n.º 45/2008, de 15 de janeiro5 que aprovou o
Regulamento do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), é
este último um sistema de regulação da atividade relativa “[…] a utentes propostos
para cirurgia e a utentes operados, assente em princípios de equidade no acesso
ao tratamento cirúrgico, transparência dos processos de gestão e
responsabilização dos utentes e dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde
(SNS) e dos estabelecimentos de saúde que contratam e convencionam com
aquele a prestação de cuidados de saúde aos seus beneficiários.”; e
63. São elegíveis para efeitos de inscrição na lista de inscritos para cirurgia (LIC) “[…]
todos os utentes dos hospitais do SNS e os utentes beneficiários deste Serviço
referenciados para os estabelecimentos de saúde do sector privado e do sector
social, ao abrigo dos contratos e convenções celebrados.”.
64. Sendo que toda a programação cirúrgica é registada no SIGLIC e deve obedecer
aos critérios:
(i) da prioridade clínica estabelecida pelo médico especialista, em função da
doença e problemas associados, patologia de base, gravidade, impacto na
esperança de vida, na autonomia e na qualidade de vida do utente,
velocidade de progressão da doença e tempo de exposição à doença; bem
como
(ii) da antiguidade na LIC, sendo, em caso de igual prioridade clínica,
selecionado em primeiro lugar o utente que se encontra inscrito na lista há
mais tempo – cfr. § 73. do Regulamento.
65. Cumprindo a este propósito ressaltar que, cronologicamente, a inscrição dos
utentes em LIC é precedida da consulta da especialidade e da consequente
elaboração de um plano de cuidados, ou seja da elaboração de uma proposta de
abordagem de um ou mais problemas de saúde do utente, onde se inscrevem e
caracterizam os eventos necessários à sua resolução, ordenados de forma
cronológica, não havendo limitação ao registo na proposta quanto ao número de
diagnósticos descritos ou procedimentos a realizar, cfr. § 3.2.1.1. e 3.2.1.2.1 do
Manual de Gestão de Inscritos para Cirurgia (MGIC).
5 Recentemente alterada por via da publicação da Portaria n.º 179/2014, de 11 de setembro.
66. Concretamente, prevê o MGIC de forma taxativa as causas de exclusão de
inscrição de atos a realizar, como sendo os atos praticados fora do bloco
operatório (BO), por não cirurgiões ou pequenas cirurgias que não necessitem de
utilização do BO;
67. Elencando igualmente os elementos de menção obrigatória no preenchimento da
proposta de cirurgia, nos quais consta, entre outros a caracterização dos
problemas a abordar, incluindo patologias associadas, em termos de descrição,
codificação e respetiva lateralidade, e episódio antecedente se aplicável cfr. §
3.2.1.2.1 do MGIC.
68. Igualmente prévia à inscrição do utente em LIC, uma vez concluído o
preenchimento da proposta de cirurgia, é a recolha do consentimento informado do
utente, garantindo que o mesmo atesta a concordância com a proposta e respetiva
inscrição em LIC.
69. Por outro lado, “[…] todos os atos relacionados com a inscrição do utente em LIC,
desde a efetivação da primeira consulta em serviço hospitalar relacionada com a
proposta cirúrgica até à realização da intervenção cirúrgica e respetiva alta, são
registados no SIGLIC, de acordo com as regras previstas no MGIC”, devendo
qualquer registo na LIC respeitar os procedimentos ali considerados, mormente os
constantes dos § 58 a 75.
70. Pelo que, “[…] após a emissão de certificado de inscrição, dá-se lugar à ativação
da inscrição do utente na LIC do serviço/unidade funcional da instituição
hospitalar.” – cfr. § 3.2.1.2. do MGIC.
71. Ademais, aos utentes é reconhecido, nomeadamente, o direito de obter um
certificado comprovativo da sua inscrição e de obter informação a todo o tempo
junto da Unidade Hospitalar de Gestão de Inscritos para Cirurgia (UHGIC) do seu
hospital e a seu pedido, sobre os dados que lhe respeitem registados na LIC,
como seja o nível de prioridade que lhe foi atribuído e o seu posicionamento
relativo na prioridade atribuída – cfr. § 44. do Regulamento.
72. Assim, a UHGIC é o principal elo de ligação do utente com o hospital, e todos os
contactos com aquele e outros factos são registados no SI, competindo-lhe a
informação aos utentes ou seus representantes, sobre o estado da inscrição, o
teor dos deveres e direitos e qualquer outra sobre as diferentes fases do processo.
– cfr. § 3.3.3. e § 3.3.5. do MGIC que remetem para o Volume II – Área da gestão.
73. Compete ainda aos responsáveis pelas unidades ou serviços dos hospitais
envolvidos nos procedimentos cirúrgicos zelar pela atualização permanente da
lista de procedimentos cirúrgicos suscetíveis de serem realizados pelos seus
serviços, garantindo que a cada um está corretamente associado o código do
sistema de codificação em vigor e ainda, garantir a seleção dos utentes inscritos
em LIC para efeito de programação cirúrgica de acordo com os critérios de
antiguidade e prioridade estabelecidos no MGIC e neste Regulamento – cfr.
alíneas b) e c) do § 57 do Regulamento.
74. Quanto aos prazos para agendamento das cirurgias estabelece o § 74 do
Regulamento que “[…] até aprovação da portaria que estabelece os tempos
máximos de espera (TME) garantidos por níveis de prioridade, por patologia ou
grupo de patologias, os utentes são classificados num dos seguintes níveis de
prioridade clínica […] Nível 4 — se a intervenção tiver que ocorrer assim que
estejam reunidas as condições necessárias à sua realização e em prazo não
superior a setenta e duas horas ou durante o período em que o utente está
internado; Nível 3 — se não for admissível que o utente possa esperar mais do
que 15 dias; Nível 2 — se não for admissível que o utente possa esperar mais do
que 2 meses; Nível 1 — se for admissível que o utente possa esperar até nove
meses […]”;
75. Fixando o mesmo Regulamento que “[…] o agendamento dos utentes classificados
no nível 3 deve ocorrer no prazo máximo de cinco dias a contar da data da sua
inscrição na LIC, devendo ser informados da data da marcação da cirurgia com um
mínimo de cinco dias de antecedência; o agendamento dos utentes classificados
no nível 2 deve ocorrer até ao limite de 50 % do tempo máximo de espera previsto,
devendo ser informados da data da marcação da cirurgia com pelo menos 10 dias
de antecedência; o agendamento dos utentes classificados no nível 1 deve ocorrer
até ao limite de 75 % do tempo máximo de espera previsto para esse nível,
devendo ser informados da data da marcação da cirurgia com um mínimo de 20
dias de antecedência […] cfr. § 78 a 80.
76. Por outro lado no §3.2.1.3.4 do MGIC, estipula-se que “[…] os episódios cuja data
de agendamento se encontra vencida sem o registo da cirurgia no SIH, nos prazos
e tolerâncias estabelecidas, serão considerados para todos os efeito não
agendados, e consequentemente, estes utentes são candidatos à transferência
quando adequado. Os agendamentos para lá do TMRG, também não são
impeditivos de se iniciar o processo de transferência. Se o TMRG já tiver sido
ultrapassado, a instituição não poderá agendar a cirurgia com uma antecedência
superior a 20 dias úteis […].”
77. Pelo que, “[…] sempre que a instituição hospitalar de origem não consegue
garantir ou a realização da cirurgia ou o seu agendamento até 100% do TMRG, o
serviço/UF tenha perdido ou a capacidade técnica para realizar a cirurgia ou
apresente piores tempos de acesso do que outro que se lhe equipare e ainda por
conveniência justificada do utente, estão criadas as condições para se dar início à
etapa de transferência. Seja qual for o tipo de transferência, esta só pode ocorrer
com o acordo expresso do utente […]”. – cfr. § 3.2.1.4. do MGIC.
78. Concretamente, no que à transferência cirúrgica diz respeito, é “[…] operada pela
emissão e cativação de NT/VC [nota de transferência/vale cirurgia6], implica
apenas a transferência da prestação dos procedimentos cirúrgicos relativos ao(s)
problema(s) identificado(s) e às eventuais intercorrências da responsabilidade da
instituição hospitalar ou complicações identificadas até sessenta dias após a alta
hospitalar […] “- cfr. § 3.2.1.4. do MGIC.
79. Ainda, “[…] a transferência de utentes através da emissão de NT/VC para outras
unidades hospitalares integradas no SNS ou unidades convencionadas é
obrigatória sempre que o hospital de origem, com os seus recursos, não possa
garantir a realização da cirurgia dentro dos TMRG estabelecidos por prioridade
clínica, por patologia ou grupo de patologias, presumindo-se a falta de garantia
quando a cirurgia não for agendada até ao limite do prazo estabelecido para cada
nível de prioridade, a contar da data de inscrição na LIC. […]”- cfr. § 3.2.1.4.1.1. do
MGIC.
80. Decorridos os prazos para agendamento da cirurgia, tal como previstos nos n.ºs 79
e 80 da Parte V do Regulamento7 sem que o agendamento no Hospital de Origem
tenha ocorrido, “[...] e não existindo HD do SNS disponível nos termos do [...]
Regulamento, a UCGIC emite de imediato um vale cirurgia a favor do utente.” – cfr.
n.º 108 da Parte V do Regulamento;
6 “[…] Quer a nota de transferência, quer o vale cirurgia, habilitam o utente a marcar a cirurgia
diretamente numa das entidades de destino […] a diferença reside no facto da primeira permitir
apenas a sua utilização no âmbito do SNS e a segunda poder ser utilizada quer nos hospitais
do SNS, quer nas instituições convencionadas do sector privado e social.” – cfr. § 3.2.1.4.1.7
do MGIC.
7 Nos termos dos n.ºs 79 e 80 da Parte V do Regulamento do SIGIC, o agendamento das
cirurgias deve ocorrer até ao limite de 50 % e 75 % do tempo de espera, respetivamente se os
utentes estiverem classificados com nível 2 e nível 1.
81. Competindo, com efeito, à Unidade Central de Gestão de Inscritos para Cirurgia
(UCGIC), nos termos da alínea l) do.º 49 da Parte IV do Regulamento do SIGIC
“[e]mitir e enviar vales cirurgia.”.
82. Efetivando-se essa mesma transferência mediante a emissão pela UCGIC de “[...]
nota de transferência a favor do utente, propondo-lhe a selecção de uma das
unidades hospitalares constante da listagem anexa de hospitais disponíveis” – cfr.
n.º 98 da Parte V do Regulamento .
83. Sendo que a emissão de vale cirurgia pela UCGIC pressupõe a aplicação de um
algoritmo automático que procura as instituições hospitalares do SNS com
capacidade para realizar o procedimento cirúrgico, indicando em primeiro lugar as
instituições do concelho de residência, seguido das instituições dos concelhos
limítrofes e por último do distrito.
84. No que tange à preparação dos episódios para transferência o HO “[…] é
responsável pela preparação do processo clínico do utente, para […] envio ao
hospital de destino selecionado […] para o que deve “[…] proceder de acordo com
as legis artis para que o processo clínico se encontre suficientemente completo e
actual, de modo a permitir documentar o médico”, cfr § 3.2.1.4.1.3. do MGIC.
85. Após o tratamento cirúrgico em HD, o HO deve […] convocar o utente para
prosseguir com os tratamentos ou consultas posteriores necessárias” e […] avaliar
o utente, concluir sobre a prestação no HD e verificar se há necessidade de outras
acções.”- cfr. § 3.2.1.4.2.3 do MGIC 3.2.3;
86. E, “[…] sempre que o HO identifique situações de negligência, má prática,
prestações insuficientes, procedimentos desnecessários, incongruências ou
insuficiências nos registos é obrigado a registar as mesmas no relatório de
consulta de revisão disponibilizado no SIGLIC.” cfr. § 3.2.1.4.2.3 do MGIC 3.2.3..
87. Refira-se, ainda, que as UHGIC ficam integradas nos hospitais, competindo-lhes:
b) Controlar e supervisionar o registo dos utentes na LIC do hospital;
c) Zelar pelo cumprimento das normas aplicáveis à LIC e respetivo
Regulamento;
g) Prever e identificar os casos dos utentes que deverão ser transferidos
para outra unidade prestadora de cuidados de saúde […].
88. As URGIC ficam integradas nas Administrações Regionais de Saúde, competindo-
lhes:
a) Monitorizar, acompanhar e controlar a produção cirúrgica realizada
pelas unidades hospitalares;
d) Monitorizar, avaliar e controlar a evolução de inscritos para cirurgia nas
unidades hospitalares, designadamente os tempos de espera;
89. Ainda, a UCGIC fica integrada na ACSS, competindo-lhe:
j) Selecionar os utentes a transferir e garantir o cumprimento e
monitorização dos protocolos de transferência definidos por parte dos
restantes intervenientes;
l) Emitir e enviar vales cirurgia;
y) Realizar auditorias aos hospitais para determinar se o registo de
informação, os processos estabelecidos e as demais obrigações
decorrentes do SIGIC estão a ser cumpridos.
III.3. Análise da situação concreta
90. Recorde-se que os factos em análise se reportam aos constrangimentos
verificados no acesso de vários utentes à realização de cirurgias, para as quais
haviam sido propostos pelo CHBV, designadamente para a especialidade de
oftalmologia e urologia.
91. Com efeito, cumpre analisar os factos apurados na perspetiva de ser aferido o
impacto que os procedimentos de agendamento de cirurgias pelo CHBV possam
constituir nas garantias instituídas para salvaguarda da tempestividade do direito
de acesso, que à ERS cumpre garantir.
92. Neste âmbito, cumpre destacar a existência de três níveis de constrangimentos, os
quais se reconduzem a:
(i) Agendamentos e re-agendamentos irregulares de utentes inscritos em LIC;
(ii) Não emissão de notas de transferência ou vales de cirurgia após decurso
do TMRG fixado para o nível de prioridade atribuído;
(iii) Inclusão em LIC de utentes contendo erros de codificação das respetivas
propostas cirúrgicas.
93. Assim, quanto à noticiada existência de “[…] agendamentos de cirurgias fictícios
[…]” pelo CHBV, foi possível apurar que o procedimento instituído, pelo serviço de
oftalmologia, passava por agendar o utente, independentemente da prioridade que
lhe estava atribuída no próprio dia da inscrição em LIC, prática que terá decorrido
por um período de aproximado de 4 anos, e à qual terá sido posto termo a 16 de
janeiro de 2015, conforme elementos constantes da informação da IGAS junta aos
autos.
94. Na prática, os procedimentos de agendamento eram os seguintes: “[…] Se os
doentes eram prioritários, eram agendados para uma data dentro dos 60 dias. Era
utilizada uma calculadora on-line Date end Time e era colocado 60 dias (no caso
dos prioritários) e o doente era agendado para o limite do dia indicado.
Normalmente, no caso dos prioritários, a cirurgia era antecipada, dando origem a
um cancelamento com o código 7 "Outros" […] nos doentes não prioritários (ditos
normais) o agendamento era feito também na calculadora on-line Date end time,
onde era colocado 270 dias e o doente era marcado para o limite do dia indicado.
[…].”
95. Assim se evidenciando que os agendamentos eram realizados sem qualquer outro
critério que não fosse ocorrerem no término (último dia) do TMRG fixado, o que
determinava que depois, se não houvesse capacidade instalada ou razões clínicas
ou logísticas o impedisse, os doentes fossem reagendados.
96. Ora, tais procedimentos de agendamento não se compaginam com o determinado
pelo Regulamento do SIGIC, que ao estipular nos seus pontos 78 a 81 a
antecedência mínima com que os utentes devem ser agendados para cada nível
de prioridade, não incorpora na sua teleologia o propósito do agendamento ocorrer
no próprio dia da inscrição em LIC e sem atender a qualquer planificação do
programa operatório, regendo-se apenas por critérios matemáticos operados por
uma calculadora de TMRG.
97. Facto que inequivocamente surge atestado na informação da IGAS junta aos
autos, “[…] até 16 de fevereiro [2015], existiam práticas no CHBV relativas ao
agendamento para cirurgia em Oftalmologia que não eram conformes os
procedimentos estabelecidos no Manual SIGIC, […] verifica-se a existência entre
2013 e 2014 de um número significativo de cancelamentos devidos a "Engano de
Agendamento" e "Outros" (de dezenas de casos e por vezes centenas em alguns
meses) […] estas práticas foram introduzidas no momento em que fechou o Bloco
do Hospital Infante D. Pedro, por motivo de obras, levando a que todas as cirurgias
fossem marcadas para data em que não se sabia se poderiam ser realizadas […]
de entre as desconformidades detetadas, destacam-se as relacionadas com o rigor
na marcação/agendamento das cirurgias, os quais nem sempre foram
devidamente comunicadas aos doentes em devido tempo, nos termos
estabelecidos no Manual do SIGLIC, bem como as associadas a alguma falta de
rigor na introdução da informação no SIGLIC por parte dos profissionais de saúde
da instituição, e ainda, a existência de informação nos aplicativos que não
corresponde à realidade.
98. Tanto se torna particularmente gravoso quanto, tais agendamentos/re-
agendamentos ocorriam sem que os utentes tivessem conhecimento de que havia
sido designada data para a sua cirurgia, conforme inequivocamente concluí a
informação da IGAS que “[…] o doente em Oftalmologia não é informado da data
do respetivo agendamento, o que constituía uma falha nos procedimentos […].”;
99. O que se apresenta como grave constrangimento do direito à informação, e dos
princípios da equidade no acesso ao tratamento cirúrgico subjacentes ao SIGIC e
bem assim ao princípio da equidade que o enforma.
100. Pelo que, tendo em conta os supra aludidos procedimentos, se torna inequívoco
o impacto e enviesamento que os mesmos introduzem nas garantias da
tempestividade do direito de acesso, quando confrontados com a informação
produzida pela auditoria realizada pela URGIC Centro que concluiu que:
(i) “[…] dos 158 agendamentos cirúrgicos objeto de análise, todos para o mês
abril de 2014, e maioritariamente distribuídos pelas especialidades de
ortopedia e oftalmologia, apenas 77 das cirurgias agendadas (cerca de
48%) se realizaram na data inicialmente prevista, enquanto 61 cirurgias
(cerca de 38%) sofreram adiamento/reagendamento e 20 cirurgias (12%)
se mantinham LIC, sem terem sido realizadas na data inicialmente prevista
(abril de 2014) e sem possuírem qualquer outra data de agendamento […]”,
cfr. informação apurada em sede de auditoria realizada pela URGIC Centro;
(ii) “[…] comparadas tais percentagens com as apresentadas para outros
hospitais do SNS da área de influência da mesma URGIC Centro, constata-
se que as restantes unidades listadas apresentam taxas de cumprimento
dos TMRG para realização de cirurgias na especialidade de oftalmologia
que oscilam entre os 95,2% e os 100% em 2013 e entre os 89% e os 100%
em 2014 […]”, cfr. informação apurada em sede de auditoria realizada pela
URGIC Centro;
(iii) “[…] no ano de 2013, apenas 6 episódios de oftalmologia foram
intervencionados noutros hospitais, e em 2014 apenas 1 utente […]”, cfr.
informação apurada em sede de auditoria realizada pela URGIC Centro;
(iv) “[…] [o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, E.P.E.] teve em 2013,
271 utentes intervencionados noutros hospitais, e 331 utentes em 2014
[…]”.
101. O que introduz a segunda perspetiva de análise: não emissão de notas de
transferência e vales cirurgia para utentes inscritos pelo CHBV que tenham visto
os TMRG fixados para as respetivas prioridades clínicas ultrapassados.
102. Ora, é inequívoca a previsão constante do § 108 do Regulamento do SIGIC de
que “[…] Decorridos os prazos para agendamento da cirurgia, tal como previstos
nos n.ºs 79 e 80 da Parte V do Regulamento sem que o agendamento no Hospital
de Origem tenha ocorrido, “[...] e não existindo HD do SNS disponível nos termos
do [...] Regulamento, a UCGIC emite de imediato um vale cirurgia a favor do
utente.”;
103. Secundada pelo estatuído no § 3.2.1.4.1.1. do MGIC. “[…] a transferência de
utentes através da emissão de NT/VC para outras unidades hospitalares
integradas no SNS ou unidades convencionadas é obrigatória sempre que o
hospital de origem, com os seus recursos, não possa garantir a realização da
cirurgia dentro dos TMRG estabelecidos por prioridade clínica, por patologia ou
grupo de patologias, presumindo-se a falta de garantia quando a cirurgia não for
agendada até ao limite do prazo estabelecido para cada nível de prioridade, a
contar da data de inscrição na LIC. […]”.
104. Pelo que se conclui que o procedimento de agendamento instituído pelo CHBV
tinha repercussões diretas na não emissão de notas de transferência/vales
cirurgia;
105. Recorde-se “[…] no ano de 2013, apenas 6 episódios de oftalmologia foram
intervencionados noutros hospitais, e em 2014 apenas 1 utente […].
106. O que surge também alinhado com as conclusões alcançadas pela auditoria
realizada pela URGIC Centro “[…] Se o TMRG tiver sido ultrapassado, o
agendamento tem de ser registado com um máximo de 20 dias de antecedência
em relação à data da cirurgia, ou seja, o registo do agendamento não deve ser
realizado com uma antecedência superior a 20 dias à data da cirurgia agendada.
[…] No entanto, os SIH não apresentam esta regra implementada. Sempre que um
agendamento é realizado e integrado no SIGLIC, o mesmo impede a emissão de
NT/VC, pois até ao momento não existe forma automática de eliminar o
agendamento incorreto no SIH. Pelo que se confirma que é possível o hospital
impedir a emissão de NT/VC, agendando no SIH, irregularmente os utentes.
107. Tanto mais que se constata que após correção de tais procedimentos ocorreu
um aumento exponencial de utentes com emissão de NT/V, conforme informado
pela IGAS “[…] o procedimento foi normalizado em várias especialidades,
designadamente em Urologia, em que optaram por inscrever o doente em LIC e
fazer posteriormente o agendamento para a data efetiva da sua realização. Esta
alteração teve como consequência um aumento de doentes transferidos para o
exterior nesta especialidade, em cerca de 120% […].”
108. Por fim, no que tange, à inclusão em LIC de propostas contendo erro de
codificação, e pese embora as conclusões alcançadas pela IGAS de que “[…] quer
da parte do CA, quer dos seus profissionais de saúde, não havia interesse em
provocar as desconformidades identificadas sobre a ocorrência do erro GDH 470
[…]”;
109. Certo é que “[…] a existência deste erro invalida a possibilidade de ser emitido o
cheque cirúrgico […]”, porquanto “[…] se a proposta não estiver integrada no
SIGLIC ou se integrada apresentar alguns erros (morada incompleta, código postal
inválido, data de nascimento incorreta, sexo do utente não correspondente com o
procedimento) não é emitido NT/VC. A instituição hospitalar deve regularmente
consultar os alarmes no SIGLIC que a informa dos erros que necessitam de
correção […].”
110. Assim, se tonando inequívoco o constrangimento que a ocorrência de tais erros
de codificação importam no funcionamento dos mecanismos instituídos para
garantia da prestação de cuidados de saúde em tempo considerado clinicamente
aceitável e em consonância com os TMRG instituídos.
111. Não obstante, de acordo com o informado pela IGAS, tal constrangimento terá
sido mitigado porquanto “[…] propostas contendo o erro 470 baixaram de um peso
de 14.6% em 1 de abril de 2014 para 4,68% em 31-08-2014, na sequência de um
trabalho pedagógico junto dos diretores dos serviços para a completa resolução
deste problema […].”
112. Termos em que, da ponderação global dos factos apurados nos presentes
autos se evidencia a necessidade de uma intervenção regulatória da ERS, à luz
das suas competências, no sentido de serem corrigidas as falhas existentes nos
procedimentos adotados pelo CHBV subjacentes ao funcionamento do SIGIC,
designada mas não limitadamente, dos procedimentos ínsitos à gestão dos
agendamentos em cumprimento dos TMRG fixados;
113. Ora, a ocorrência de tais entropias no processos de gestão de inscrição e
realização de cirurgias não se compadece com o desiderato do SIGIC de
“minimizar o período que decorre entre o momento em que um doente carece de
uma cirurgia e a realização da mesma”, estando por isso alicerçado em
mecanismos que permitem obviar a períodos de espera que ultrapassem o TMRG
fixado para efetivação da prestação de cuidados de saúde de que o utente
necessita;
114. Porquanto, assumindo o SIGIC um papel central na gestão de cirurgias no SNS,
qualquer entropia na implementação dos respetivos procedimentos é suscetível de
impactar com o direito dos utentes à prestação tempestiva e integrada de cuidados
de saúde.
115. Por outro lado, ponderado o facto de:
(i) Às UHGIC competir:
b) Controlar e supervisionar o registo dos utentes na LIC do hospital;
c) Zelar pelo cumprimento das normas aplicáveis à LIC e respetivo
Regulamento;
g) Prever e identificar os casos dos utentes que deverão ser transferidos
para outra unidade prestadora de cuidados de saúde;
(ii) Às URGIC competir:
a) Monitorizar, acompanhar e controlar a produção cirúrgica realizada
pelas unidades hospitalares;
d) Monitorizar, avaliar e controlar a evolução de inscritos para cirurgia nas
unidades hospitalares, designadamente os tempos de espera;
(iii) À UCGIC competir:
j) Selecionar os utentes a transferir e garantir o cumprimento e
monitorização dos protocolos de transferência definidos por parte dos
restantes intervenientes;
l) Emitir e enviar vales cirurgia;
y) Realizar auditorias aos hospitais para determinar se o registo de
informação, os processos estabelecidos e as demais obrigações
decorrentes do SIGIC estão a ser cumpridos.
116. E bem assim a circunstância de que não resulta evidente “[…] a aplicação das
penalidades por parte das entidades com competências para o efeito, nos termos
do Regulamento SIGIC, Parte VIII - Não Conformidades, anexo à Portaria n.°
45/2008, de 15 de janeiro, na sequência das não conformidades nesta sede
apuradas. […].”, cfr. Informação da IGAS junta aos autos;
117. Cumpre constatar que no caso concreto, os mecanismos subjacentes ao
funcionamento do SIGIC, exigíveis à atuação da UHGIC, URGIC e UCGIC, não
foram cabalmente implementados, de modo a assegurar o controlo pelas
diferentes instâncias intervenientes das competências a cada uma adstritas;
118. Prejudicando com isso a garantia dos direitos relativos ao acesso aos cuidados
de saúde, à prestação de cuidados de saúde de qualidade, bem como dos demais
direitos dos utentes, que à ERS cabe prosseguir.
119. Assim se concluindo pela necessidade de adoção da atuação regulatória infra
delineada por forma a garantir o reforço dos procedimentos de controlo existentes
para cumprimento dos TMRG fixados.
IV. AUDIÊNCIA DE INTERESSADOS
120. A presente deliberação foi precedida de audiência escrita dos interessados, nos
termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 122.º do Código do
Procedimento Administrativo, aplicável ex vi do artigo 24.º dos Estatutos da ERS,
tendo para o efeito sido chamados a pronunciarem-se relativamente ao projeto de
deliberação da ERS o Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E., a URGIC Centro
e a ACSS;
121. Sendo que no prazo fixado para o efeito e até à presente data a ERS não
rececionou a ERS qualquer pronúncia de qualquer um dos interessados;
122. Termos em que se concluí pela manutenção na íntegra da decisão projetada.
V. DECISÃO
123. O Conselho de Administração da ERS delibera, nos termos e para os efeitos do
preceituado na alínea a) do artigo 24.º, e da alínea b) do artigo 19.º dos Estatutos
da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, emitir uma
instrução Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. nos seguintes termos:
(i) O Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. deve garantir que o
atendimento dos utentes se processe dentro do estrito cumprimento das
regras de funcionamento do programa SIGIC, garantindo a efetiva
implementação de mecanismos de controlo e monitorização da evolução de
inscritos para cirurgia;
(ii) O Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. deve garantir, sempre e em
qualquer momento, que os procedimentos de agendamento de cirurgias por
si adotados se processem dentro do estrito cumprimento das regras de
funcionamento do programa SIGIC, designadamente, cumprindo todos os
formalismos de comunicação tempestiva ao utente do dia designado para
sua realização, abstendo-se da adoção de quaisquer procedimentos
incompatíveis com a atempada emissão de notas de transferência/vales
cirurgia quando aplicáveis;
(iii) O Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. deve garantir, sempre e em
qualquer momento, a adoção de todos os comportamentos que garantam,
efetivamente, o rigoroso cumprimento de todas as regras estabelecidas no
quadro legal relativo aos Tempos Máximos de Resposta Garantidos;
(iv) O Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. deve garantir que todo e
qualquer procedimento por si adotado seja capaz de promover a informação
completa, verdadeira e inteligível, com antecedência, rigor e transparência a
todos os utentes, sobre todos os aspetos relativos ao acompanhamento e
alternativas existentes no SNS para garantia de um acesso adaptado à sua
condição clínica, com clara explicitação do papel que compete a cada
estabelecimento prestador na rede nacional de prestação de cuidados de
saúde;
(v) O Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. deve dar cumprimento imediato
à presente instrução, bem como dar conhecimento à ERS, no prazo máximo
de 30 dias úteis após a notificação da presente deliberação, dos
procedimentos adotados para o efeito.
124. O Conselho de Administração da ERS delibera ainda nos termos e para os
efeitos do preceituado na alínea a) do artigo 24.º, e da alínea b) do artigo 19.º dos
Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto,
emitir uma recomendação à Administração Central do Sistema de Saúde, I.P. e à
Administração Regional de Saúde do Centro, I.P., para que as unidades de apoio
ao SIGIC nas mesmas integradas, respetivamente Unidade Central de Gestão de
Inscritos para Cirurgia e Unidade Regional de Gestão de Inscritos para Cirurgia
atuem no sentido de garantirem a existência de mecanismos de controlo e
monitorização do efetivo cumprimento pelo Centro Hospitalar do Baixo Vouga,
E.P.E. das regras de funcionamento do programa SIGIC, designadamente,
assegurando que tais procedimentos se conformem com o rigoroso funcionamento
dos mecanismos de garantia da tempestividade do direito de acesso.
125. A instrução ora emitida constitui decisão da ERS, sendo que a alínea b) do n.º 1
do artigo 61.º dos Estatutos da ERS, aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º
126/2014, de 22 de agosto, configura como contraordenação punível in casu com
coima de € 1000,00 a € 44 891,81, “[….] o desrespeito de norma ou de decisão da
ERS que, no exercício dos seus poderes regulamentares, de supervisão ou
sancionatórios determinem qualquer obrigação ou proibição, previstos nos artigos
14.º, 16.º, 17.º, 19.º, 20.º, 22.º, 23.º ”.
126. Da presente deliberação será dado conhecimento à Inspeção Geral das
Atividades em Saúde.
Porto, 9 de maio de 2016.
O Conselho de Administração.