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Resumo de DES 0211 - Direitos Fundamentais - Faculdade de Direito do Largo de São Francisco - Universidade de São Paulo.- Teoria dos Direitos Fundamentais - Robert Alexy Robert Alexy Principios Conflitos Regras Mandamentos de Otimização Humberto Ávila Virgilio Afonso da Silva
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Resumo da matéria: direitos fundamentais 1
Prova Substitutiva: 04/07/2014, 20h, Sala Alcântara Machado
1º. Semestre / 2014
Thiago Alves Ferreira
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
1
Evolução dos DF
Esclarecimentos iniciais
a. Esclarece que evolução dos DF não será analisada tão
somente historicamente (e sim o será quando tiver
conexão com o tema)
Introdução
a. A discussão sobre DF ganha importância na Inglaterra
nos anos 90 – até 1998 não havia no país uma
declaração nos moldes conhecidos em outras
democracias contemporâneas
b. Dworkin: acreditava que a declaração deveria vincular
o Parlamento, diferentemente de Waldron, que
pensava de modo conservador (para Inglaterra sempre
foi “tabu” algo que ferisse supremacia do Parlamento)
c. Human Rights Act promulgado em 1998
d. Quatro perguntas básicas a serem respondidas no
texto: Por que deve haver uma declaração de direitos?
Como fundamentá-los? Como surgiram? Como
evoluíram?
e. Consideração metodológica: a fundamentação será
analisada por último
Precursores das declarações de direitos
a. Por que Inglaterra demorou tanto a ter declaração?
Primeiramente, documentos como Magna Carta e Bill
of Rights destinavam-se a garantir direitos de
determinadas classes; em segundo lugar, vincular o
parlamento, como já dito, era “tabu”
b. Mas isso não significa que deixavam de pensar em
direitos naturais como os propostos por Locke, só que
esses pensamentos não culminaram nos mesmos
resultados obtidos com a Revolução Francesa e a
Declaração de Virgínia
As grandes declarações
A declaração de Virgínia
a. Ideia de “declarar” direitos já existentes
A revolução francesa
a. Ideia de superação do absolutismo, os direitos seriam
respostas a abusos do Antigo Regime
b. Mas àquela época a ideia da declaração de direitos não
era consensual, cabe novamente a pergunta: “por que
ter uma declaração de direitos?”
Dois conceitos de liberdade
a. Liberdade positiva (dos antigos) x liberdade negativa
(dos modernos)
b. A declaração de direitos francesa foi precedida por
esse debate
c. Baseados em Rousseau, muitos defendiam que num
Estado em que fosse garantida a liberdade positiva o
povo participaria garantindo seus próprios direitos (não
seria necessária declaração)
d. Concepção vencedora, no entanto, foi a de liberdade
negativa, ou liberdades públicas, ou, ainda, direitos de
primeira geração
As gerações de direitos
a. Uma geração não supera a anterior, são
complementares, por isso muitos autores preferem
falar em “dimensões”
As liberdades públicas
a. Primeira geração, garantem uma esfera de liberdade
de atuação dos indivíduos contra ingerências estatais:
liberdade de expressão, de associação...
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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Os direitos políticos
a. Também fazem parte da primeira geração
b. Ressurge a ideia de liberdade positiva – participação na
tomada de decisões, o que levou à pressão por outros
tipos de direitos que superassem a ideia das meras
liberdades negativas
Os direitos sociais e econômicos
a. Segunda geração
b. Em decorrência da pressão de movimentos sociais, que
afirmavam que as liberdades públicas (que seriam
meramente formais) só seriam plenamente desfrutadas
por aqueles que tivessem condições materiais para
tanto
c. Não podem ser chamados de direitos “socialistas” pois
na verdade garantem estabilidade e manutenção do
capitalismo
d. Exigem prestação estatal, em oposição às liberdades
públicas, que exigem sua abstenção
Prestações positivas em sentido amplo e restrito
a. Autor acha necessário fazer breve digressão para
explicar este tópico
b. Nem toda exigência de prestações por parte do Estado
é decorrência de direitos sociais ou econômicos (só
prestações em sentido estrito)
c. Segundo Alexy, direitos sociais são aqueles cujo titular,
se dispusesse de meios para tanto, poderia garantir
independentemente do Estado
d. Mas há direitos à prestações que não são direitos
sociais, como direito à segurança
A efetividade dos direitos sociais
a. Segundo Alexy, há diferença estrutural entre direitos a
abstenções e direitos a prestações estatais; as
liberdades públicas requerem abstenção e vedam toda
e qualquer medida que desobedeça essa exigência; os
direitos a prestações exigem medidas eficazes
b. Problema: Quem deve decidir o que é eficaz?
Executivo, Legislativo ou Judiciário?
c. Questão da reserva do possível: a Constituição
brasileira exige muito e Judiciário, se respeitar a
reserva do possível, não pode intervir
Os direitos de solidariedade
a. Seriam os direitos difusos, a terceira geração de
direitos
b. Não têm titularidades definíveis, seriam o pilar
fraternidade da Revolução Francesa
c. “Vulgarização dos direitos fundamentais”; tais direitos
são sim importantes mas a falta de contornos claros
pode levar-nos a considerar direitos de
fundamentalidade duvidosa
d. Em seguida ele pretende voltar à questão da
fundamentação de tais direitos
A fundamentação dos direitos humanos
a. O elemento justificador por excelência foi a ideia de
direitos naturais (presente em Aristóteles, Locke...)
b. Utilitarismo de Bentham critica a ideia, que “renasce”
após a segunda guerra
Direitos Humanos na ordem internacional
a. Nesse mesmo contexto, surge a Declaração Universal
do Direitos do Homem
b. As três gerações analisadas anteriormente
reproduziram-se na ordem internacional
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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c. Os mesmos ataques ao direito natural sofridos no
âmbito interno reproduziram-se internacionalmente
d. A falta de efetividade é um problema ainda maior no
direito internacional
As gerações de direitos na ordem internacional
a. Além de direitos econômicos e sociais, a Declaração
conta principalmente com direitos de primeira geração,
visto que esses foram os mais afetados na guerra
b. A segunda geração se consagrou mais tardiamente
c. A terceira geração foi abordada a partir da década de
70, com tentativas mais recentes como a do Protocolo
de Kyoto
A fundamentação dos direitos humanos na ordem
internacional
a. Crise quanto à ideia de direitos humanos: estes seriam
universais, no entanto esse é um pensamento
ocidental, que é considerando por vezes uma
imposição, uma tentativa de dominação
b. Há defensores do chamado relativismo (ex.: se os
direitos humanos fossem de fato universais, não
seriam necessárias fronteiras, vistos etc.)
A efetividade dos direitos humanos na ordem internacional
a. Há menos efetividade do que nacionalmente; fala-se
na falta de remédios constitucionais, na questão da
soberania dos Estados etc.
b. Fala-se no valor do discurso e das palavras
Robert Alexy – Teoria dos Direitos Fundamentais
A estrutura das normas de direitos fundamentais
I - Regras e princípios
Dentro do conceito de norma fundamental podem ser
feitas diversas diferenciações, mas a mais importante delas,
para a teoria dos direitos fundamentais, é a distinção entre
regras e princípios.
Sem tal distinção não pode haver uma teoria sobre as
colisões, restrições, nem sobre o papel dos direitos
fundamentais no sistema jurídico.
As normas de direitos fundamentais são muitas vezes
caracterizadas como “princípios”, ou como valores, objetivos.
Mas quando se afirma que a Constituição deve ser seguida
como lei, está se dando a essas normas um status de
“regras”. Mas não há uma distinção precisa entre esses dois
conceitos.
1. Critérios tradicionais para a distinção entre
regras e princípios
A tentativa de distinguir entre princípios e regras não é
recente e nela impera a falta de clareza.
Alexy irá reunir regras e princípios sob o conceito de
norma, pois ambos dizem o que deve ser, podem ser
formulados por meio de expressões deônticas. Para ele, os
princípios são, tanto quanto as regras, razões para juízos
concretos de dever-ser, ainda que de espécie muito
diferente.
Um dos critérios mais usados para distinguir entre esses
dois conceitos é o da generalidade, segundo o qual as
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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regras teriam um grau de generalidade relativamente baixo
e os princípios, um grau de generalidade relativamente alto.
Outros critérios seriam o da determinabilidade dos
casos de aplicação, as formas de surgimento (normas
criadas e desenvolvidas), entre outros. Também podem ser
diferenciados por serem razões para regras, ou eles
mesmos regras; no fato de serem normas de argumentação
ou normas de comportamento.
Com base nesses critérios, são possíveis três teses:
a) Toda tentativa de diferenciar as normas em duas
classes estaria fadada ao fracasso;
b) As normas podem ser divididas de forma relevante
em regras e princípios, mas tal diferenciação é
somente de grau (nessa tese o critério da
generalidade é essencial);
c) As normas podem ser distinguidas em regras e
princípios e entre ambos não existe apenas uma
diferença gradual, mas uma qualitativa – seria a tese
“correta”.
2. Princípios como mandamentos de otimização
O ponto decisivo nessa distinção seria o de que os
princípios são “normas que ordenam que algo seja realizado
na maior medida do possível dentro das possibilidades
jurídicas e fáticas existentes”. E podem ser satisfeitos em
graus variados.
O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos
princípios e regras colidentes.
Já as regras são normas que devem ser sempre
satisfeitas ou não. Se uma regra vale, então deve ser feito
exatamente aquilo que ela exige, elas contém, portanto,
determinações no âmbito daquilo que é fática ou juridicamente
possível.
Assim, a distinção é qualitativa, e toda norma ou é uma
regra ou um princípio.
3. Colisões entre princípios e conflitos entre
regras
A diferença entre princípios e regras é mais nítida nos
casos de colisões entre princípios e conflitos entre regras. O que
é comum nesses dois casos é o fato de que duas normas, que
se isoladamente aplicadas, levariam a resultados inconciliáveis
entre si. A distinção está na forma de solução dos conflitos.
3.1. O conflito entre regras
Segundo ele, um conflito entre regras só pode ser
resolvido inserindo-se uma cláusula de exceção em uma delas
ou declarando uma delas inválida. O conceito de validade
jurídica não é graduável, não é possível que dois juízos
concretos de dever-ser contraditórios entre si sejam válidos.
Certas vezes a inclusão de uma cláusula de exceção não
é suficiente e, então, uma das regras deve ser declarada
inválida, mas não há uma determinação sobre qual das regras
deve ser invalidada.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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3.2. A colisão entre princípios
Quando há colisões entre princípios, o que se percebe é a
precedência de um em face do outro, sob determinadas
condições. Pois, sob outras condições, a precedência pode
ocorrer de forma oposta.
Por isso se diz que os princípios têm pesos diferentes.
3.2.1. A lei de colisão
Exemplo da incapacidade de participar de audiência processual
(o acusado corria o risco de sofrer um infarto ou um derrame).
Tensão entre o interesse estatal de aplicar o Direito Penal e o
do acusado de ver a garantia de seus direitos constitucionais.
Não há uma precedência absoluta entre esses deveres, então o
conflito deve ser solucionado por sopesamento, que tem como
objetivo definir qual dos interesses – que no plano abstrato
estão no mesmo nível – tem maior peso no caso concreto.
Se houvesse apenas o princípio da operacionalidade do direito
penal, a realização da audiência seria obrigatória, ou pelo
menos permitida. Se houvesse apenas o princípio da proteção
da vida e da integridade física, a realização da audiência seria
proibida. Isoladamente esses princípios conduzem a uma
contradição.
A solução para isso é o estabelecimento de relações de
precedência condicionadas entre eles, na relação no caso
concreto. Isso consiste na fixação de condições sob as quais um
princípio tem precedência sobre o outro.
Esquema: P1 – direito à vida e integridade física – proibida a
audiência
P2 – operacionalidade do direito penal – obrigatória a
audiência
Símbolo da relação de precedência P
C – condições sob as quais um princípio tem precedência em
face do outro
(1) P1 P P2
(2) P2 P P1
(3) (P1 P P2) C
(4) (P2 P P1) C
(1) e (2) são relações incondicionadas de precedência, são
relações abstratas, ou absolutas, mas como nenhum dos
interesses tem precedência por si só sobre o outro, essas
hipóteses estão excluídas.
(3) e (4) são relações condicionadas, de precedência
concreta ou relativa. A questão é sob quais condições um
princípio deve prevalecer e qual deve ceder.
C desempenha um duplo papel quando se decide a
precedência, pois é a condição de precedência e é pressuposto
fático de uma regra que se cria, que diz que, por exemplo, se h
preenche C, então h é proibida sobre o ponto de vista do
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Tribunal. Essa ideia de criação de uma regra é chamada de “lei
de colisão”.
3.2.2. Resultados de sopesamentos como normas
de direito fundamental atribuídas
Exemplo do caso Lebach: uma emissora de TV planejava exibir
um documentário chamado “O assassinato de soldados em
Lebach”, que pretendia contar a historia de um crime, no qual 4
soldados sentinelas de um depósito de munições do Exército
Alemão, perto de Lebach, foram mortos enquanto dormiam e
armas e munição foram roubados para cometer outros crimes.
Um dos condenados como cúmplice estava para ser libertado da
prisão na época em que estava prevista a exibição do
documentário e achou que sua ressocialização seria prejudicada
e outros direitos fundamentais estariam sendo feridos, por isso
pediu a proibição da exibição do documentário.
Tensão: proteção da personalidade e liberdade de informar.
Há diversas formas de se nomear os objetos do
sopesamento, uma delas é “valores constitucionais”.
Depois de constatar uma colisão entre princípios, o Tribunal
Constitucional, em um segundo passo, sustenta uma
precedência geral da “liberdade de informar” (P2), no caso de
uma informação atual sobre casos criminosos (C1), ou seja (P2
P P1)C1. Essa precedência é geral ou básica, nem toda
informação atual é permitida.
A decisão ocorre na terceira etapa, quando o tribunal decide
que ao repetir uma notícia sem interesse atual e que coloca em
risco ressocialização do autor (C2), a proteção da personalidade
(P1) tem precedência sobre a liberdade de informar (P2). Assim,
o enunciado de precedência seria (P1 P P2) C2.
C2 é composto por quatro condições: repetição/ausência de
interesse atual pela informação/grave crime/ risco à
ressocialização. A regra C2 implica em um resultado R, que é
uma regra com quatro suportes fáticos:
(6)T1 e T2 e T3 e T4 → R
Foram designadas como normas de direitos fundamentais tanto
aquelas estabelecidas diretamente pela Constituição quanto
aquelas atribuídas, que é uma regra à qual se podem subsumir
os elementos do caso concreto, como se fosse uma regra
positiva. Foi o que aconteceu no caso Lebach.
4. O distinto caráter prima facie das regras e dos
princípios
Princípios exigem que sejam realizados no maior grau possível
dentro das possibilidades fáticas e jurídicas, pois não possuem
um mandamento definitivo, apenas prima facie. Já as regras
exigem que seja feito exatamente aquilo que determinam,
tendo sua extensão limitada.
Contesta-se assim, por considerá-lo muito simplista, o modelo
proposto por Dworkin, em que regras incidiriam de maneira
“tudo ou nada” enquanto princípios apenas indicariam uma
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direção. A ideia de “tudo ou nada” das regras pode ser
superada por meio de cláusulas de exceção, que não são nem
teoricamente enumeráveis.
Princípios formais são aqueles que estabelecem que regras
criadas por autoridades competentes devem ser seguidas sem
relativizações. Quanto maior o peso atribuído a esses princípios,
maior será o caráter prima facie (de preponderância) das
regras.
O caráter prima facie de princípios pode ser fortalecido por meio
de uma carga argumentativa a favor de um princípio ou de uma
classe de princípios, enquanto o das regras é baseado em
condições.
5. Regras e princípios como razões
Trata-se de razões distintas: enquanto regras são razões
definitivas, princípios são prima facie. Podem ser razões:
Para normas (como defende Dworkin, no âmbito da
ciência do Direito, por lidar com o dever ser): universais
ou individuais.
Para ações (Raz): indiretamente, apenas em decorrência
da norma que incide no caso concreto.
Afasta-se a hipótese de que princípios seriam razões para
regras, que por sua vez seriam razões para normas individuais
(decisões dos tribunais). Isso tendo em vista que regras podem
gerar outras regras, assim como também princípios podem
gerar uma norma individual (exemplo do direito à vida definindo
o caso supracitado da audiência, gerando a chamada norma
individual).
Fala-se em razão definitiva quando uma regra gera um juízo
concreto válido, aplicável e infenso a exceções. Quando um
princípio, diante de uma lei de coalisão, evidencia uma
referência, definindo uma regra, gera uma razão definitiva para
juízo concreto.
6. Generalidade e princípios
O critério de generalidade não é totalmente correto, visto que
existem regras gerais, também. Diante disso, propõe-se outro
critério diferenciador, como, por exemplo, sua importância de
fundamentação no ordenamento jurídico.
7. Três objeções ao conceito de princípio
7.1 Colisões entre princípios podem ser
resolvidas pela declaração de invalidade de um
deles.
Há, sim, contradições entre princípios. Mas tais só
gerarão a declaração de invalidade quando um deles
estiver fora do ordenamento jurídico (exemplo do
princípio da segregação racial). Mas como tal teoria lida
com conflitos dentro do sistema jurídico, vale destacar
que o teorema da colisão pressupõe previsão no
ordenamento jurídico e, portanto, validade. Assim, um
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princípio não pode ser genericamente inválido: pode
apenas ser afastado num caso concreto.
7.2 Existência de princípios absolutos
Aceitar a existência de princípios absolutos negaria a
existência de direitos fundamentais, visto que
correspondem a princípios prima facie, ou seja, que não
são absolutos e exigem ponderação.
7.3 A generalidade dos princípios faria deles um
conceito inútil
Supera a distinção feita por Dworkin entre princípios
(âmbito individual) e políticas (interesses coletivos) e
defende que a utilidade de princípios reside justamente
quando há situações conflitantes.
8. A teoria dos princípios e a máxima da
proporcionalidade
Desenvolve-se aqui uma “fundamentação a partir dos
princípios fundamentais”. A própria natureza dos
princípios implica a máxima da proporcionalidade
(adequação, necessidade/meio menos gravoso,
proporcionalidade em sentido estrito/sopesamento). No
caso da proporcionalidade em sentido estrito, tendo em
vista que princípios são mandados de otimização,
relativizados pelas possibilidades jurídicas, verifica-se aí a
incidência da lei de colisão. Já na avaliação da adequação
e necessidade, as limitações são fáticas. No primeiro
caso, avalia-se se a medida é adequada para fomentar
ou atingir determinado objetivo, enquanto no segundo há
uma comparação de meios, optando-se pelo menos
danoso ao indivíduo.
Fichamento texto Alexy – Seminário 2
O bom entendimento das normas de direitos fundamentais passa
necessariamente por uma análise aprofundada da distinção entre
regras e princípios, que, embora muito utilizada, nunca é explicada
com detalhes.
Existem vários critérios para a distinção entre regras e princípios,
como o grau de generalidade, princípios teriam um conteúdo
axiológico mais latente, ou princípios seriam normas de argumentação
e regras normas de conduta. O que proporemos agora é uma forma
de distinção que, ao mesmo tempo em que se relaciona a várias
dessas não se identifica. É uma distinção que não as baseia em graus,
porque acreditamos que regras e princípios possuem estrutura
distinta.
A diferença básica é que princípios são mandamentos de otimização,
isto é, não são como regras que determinam uma consequência
jurídica necessária toda vez que ocorre determinada situação jurídica
(mandamento definitivo), mas devem ser aplicados na medida do
possível, de acordo com as condições fáticas e jurídicas de cada caso
concreto. A partir daqui trabalhamos um série de distinções
acessórias.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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Quando duas normas não podem ser aplicadas a um mesmo caso, por
serem mutuamente excludentes, haverá, no caso de regras, um
conflito e no caso de princípios, uma colisão. O conflito entre regras
se decide declarando a invalidade de uma delas, através de inúmeros
critérios, até mesmo, caso não se encontre um critério melhor, a
conveniência. Ainda pode abrir-se uma exceção a uma delas. Já as
colisões entre princípios se decidem a preferência de um sobre o
outro naquele caso. Embora em tese pudesse ser, dificilmente um
princípio terá uma preferência incondicionada sobre outro, isto é, o
tribunal determina condições de preferência, que podem dar origem a
uma regra, por exemplo: “se uma ação h preenche o conjunto de
condições C, então, sob o ponto de vista dos direitos fundamentais, h
é proibida”.
Outra distinção se dá através do caráter “prima facie” distinto de
princípios e regras. Os princípios possuem sempre um caráter “prima
facie”, no sentido de que eles são a princípio aplicáveis, mas ao
decidir-se uma questão serão aplicados apenas na medida do possível
fático e jurídico. As regras, embora pareçam incidir toda vez que se
observa sua hipótese de incidência, acabam conflitando com outras
regras e, portanto, em algumas condições são inaplicáveis, por isso
também possuem um caráter “prima facie”. Apesar disso, o caráter
prima facie de uma regra é muito mais forte do que de um princípio,
portanto, continua havendo uma distinção rígida.
Tornando a distinção ainda mais apurada, podemos colocar regras e
princípios com razões. Embora alguns digam que os princípios são
apenas razões para outras normas e as regras podem ser razão para
um caso concreto (norma individual), entendemos que princípios
também podem ser razões para casos concretos. A diferença é que
regras são razões definitivas, enquanto princípios são razões prima
facie.
Existem três objeções básicas à nossa teoria. Primeiro, poderiam falar
que princípios podem ser inválidos, como um princípio da segregação
racial. Sem dúvida, esse princípio jamais teria preferência sobre outro.
Seria um caso de invalidade. O que ocorre é que, quando analisamos
a preferência de um princípio sobre o outro, já pressupomos que
pertence ao ordenamento.
Outra objeção é a de que haveria princípios absolutos, e dão o
exemplo da dignidade humana. Temos alguns exemplos de casos em
que os tribunais decidiram a preferência de princípios da coletividade
sobre a dignidade humana. O que ocorre é que existe tanto uma
regra quanto um princípio da dignidade humana, daí a sensação de
que ele seja absoluto, mas não o é.
Quanto à objeção à amplitude do conceito de princípios, Dworkin
diferencia entre princípios e políticas, mas logo depois diz que
chamará genericamente de princípios. Ao nosso ver, isso apenas
evidencia a desnecessidade desse tipo de distinção, pois o
funcionamento deles é idêntico.
A teoria dos princípios está profundamente ligada à máxima da
proporcionalidade, que engloba adequação, necessidade e
proporcionalidade stricto sensu. A proporcionalidade stricto sensu se
dá quando, para otimizar o mandamento de um princípio P1, temos a
opção de uma medida M1 ou uma medida M2, sendo que M1 afeta
negativamente outro princípio P2, enquanto M2 não. Por isso, em
nome da proporcionalidade, colocamos em prática M2. A necessidade
se dá quando tanto M1 como M2 prejudicam P2, portanto teremos
que escolher a medida menos gravosa, em nome da necessidade.
Quanto à adequação, se M1 é indiferente para P1 e prejudicial a P2,
não adotamos M1.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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Virgílio Afonso da Silva
Virgílio contrapõe as teorias de Alexy e Dworkin, que impoem
deiferenças qualitativas entre regras e princípios, da teoria de
Humberto Ávila, muito aceita no Brasil, em que se considera que a
diferença entre regra e princípio é uma questão de grau. Por isso, são
comuns no Brasil assertivas do tipo: os princípios são as normas mais
fundamentais, que regem o funcionamento global do direito. Assim,
uma norma como “não há lei sem crime anterior que o defina”,
embora seja considerada por Dworkin e Alexy como regra, no Brasil
ninguém tem coragem de tirá-la da lista dos princípios.
A teoria de Humberto Ávila comporta várias críticas. Ele diz por
exemplo, que essa colisão que ocorre entre princípios também
ocorreria entre regras, em que às vezes também ocorrem longos
debates e ponderações sobre qual regra aplicar. A nosso ver, Ávila
confunde a determinação da preferência com a própria interpretação
do direito, caindo no erro de não diferenciar a norma do texto da
norma. Ele também acredita que a colisão entre princípios é apenas
aparente, pois aparece durante o processo de interpretação mas na
sentença some. Se for assim, só poderia ser considerado colisão
aquelas antinomias indissolúveis, mas estamos entrando num âmbito
de discussão da filosofia do direito.
Humberto diz que a colisão entre princípios seria igual ao conflito
entre regras, visto que um princípio terá que ser afastado, mas isso
não significa que ele será declarado inválido como a regra.
Ana Paula Barcellos critica a distinção entre princípios e regras pelo
caráter prima facie dos primeiros, e defende que a diferença está no
fato de os princípios terem variadas formas de ser colocados em
prática. Para Virgílio, toda norma que tem como dever-ser uma
conduta positiva admite diferentes formas de ser cumprida. A regra
penal que proíbe a omissão de socorro pode ser cumprida pelo
chamamento do salva-vidas, por ação própria, levando ao hospital,
etc. Da mesma forma que um princípio eminentemente negativo,
como o da liberdade de pensamento, não permite diferentes
cumprimentos: o Estado não deve limitar essa liberdade, na medida
das condições fáticas e jurídicas. A maioria dos princípios tem um lado
positivo, de ação estatal, e um negativo, de omissão.
Por último, criticamos o sincretismo metodológico que aparece no
Brasil, pois todos adotam a distinção entre princípios e regras e tem
ganhado popularidade no país a teoria estruturante do direito de
Friedrich Müller, totalmente incompatível com aquela.
Humberto Ávila
Costuma-se distinguir as regras e princípios pelo modo de aplicação.
Tanto Dworkin como Alexy afirmam, de formas diferentes, que regras
se aplicam na base do tudo ou nada, enquanto princípios são mais ou
menos aplicados. Basta ver alguns exemplos da jurisprudência para
perceber que as regras também sofrem um sopesamento, como no
caso em que, diante de uma norma penal que define como estupro o
ato sexual com menor de 14 anos, o tribunal decidiu afastar a norma
porque considerou que a menina, de 12 anos, apresentava
comportamento e aparência adulta. Embora possam dizer que isso
seria uma questão de interpretação e não de ponderação, temos que
admitir que a distância entre essas duas atividades não é tão grande.
Mesmo quando, diante de duas regras, abrimos uma exceção, essa
exceção se dá através da ponderação das razões de uma rega e da
outra diante do caso concreto. Portanto, o conflito entre regras não
se dá apenas no plano abstrato (no âmbito da validade), mas
também, assim como o princípio, no âmbito do caso concreto.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
11
Fala-se que os princípios teriam uma dimensão interna de peso. Na
verdade, quem dá essa dimensão de peso é o aplicador, analisando
as razões e finalidades de cada princípio, e o mesmo faz com as
regras. Portanto, o princípio não é um mandado de otimização, mas
deve ser aplicado integralmente. O aplicador que, ao se ver diante de
uma colisão, dirá as formas de otimizar as aplicações, tanto pelas
condições do caso concreto com pelas razões e finalidades.
Assim como as regras sofrem colisões que vão além de declarar a
invalidade de uma delas, os princípios podem entrar em uma situação
de conflito: se as finalidades de cada princípio são mutuamente
excludentes, a preferência de um sobre outro levará a um
afastamento total do outro. Por mais que, ao afastar uma regra
tenhamos a sensação de que ela não interferiu no caso, pode
interferir no juízo valorativo dentro da norma que prevaleceu.
Embora acreditemos que todo tipo de norma sofre ponderação,
admitimos que essa ponderação é diferente pois, enquanto nas regras
já existem consequências mais definidas pela adoção de uma ou
outra, nos princípios há uma liberdade maior por parte do aplicador.
Portanto, a ponderação entre princípios é mais intensa e de fácil
fundamentação, enquanto entre regras fica mais próximo de um
afastamento total de uma delas, e a fundamentação obriga ao
aplicador ir contra uma série de crenças, como da segurança jurídica,
do Estado de Direito, etc.
Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios
jurídicos
Humberto Ávila
Palavras-chave: regras; princípios; exceções; ponderação de razões
e contra-razões; sopesamento.
Distinção entre princípios e regras:
1. Quanto ao modo final de aplicação
Ávila inicia o texto fazendo uma análise das teorias de modo de
aplicação de regras e princípios formulada por Dworkin e por Alexy.
Dworkin fundamenta-se na teoria do “all or nothing” para as regras,
ou seja, essas são ou não válidas (aplicáveis) para o caso concreto,
embora possa haver exceções a tais regras. Os princípios, por sua
vez, seriam normas com fundamentos que direcionam uma decisão.
Alexy trata as normas como premissas que são ou não preenchidas
pelas circunstâncias do caso concreto, sem que haja qualquer
ponderação destas. Já os princípios instituiriam obrigações prima
facie( à primeira vista), que podem ser derrogadas por outros
princípios.
Após a exposição de tais teorias, Ávila faz críticas:
O modo de aplicação de normas jurídicas não é determinado pelo
objeto do texto, mas pelo que o intérprete faz com ele. Normas
aparentemente de caráter absoluto podem, portanto, ser sobrepostas
em um processo complexo de ponderação de razões e contra-
razões. Um exemplo: na atual legislação brasileira, se um menor de
14 anos tem relações sexuais com um maior, há presunção
incondicional de crime de estupro. Entretanto, o STF, ao analisar um
caso, deu relevância a questões particulares não previstas na norma,
afastando o tipo penal, pois a menor aparentava ser maior de idade e
houve consenso na prática do ato. Logo, a obrigação tida como
absoluta foi superada por circunstâncias não previstas na regra.
Conclusão: a consequência estabelecida pela norma pode deixar de
ser aplicada por razões relevantes que não foram previstas pelo
legislador. Pessoal, atenção porque esse é o centro da teoria do Ávila.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
12
Segunda crítica: tanto as regras quanto os princípios são dotados de
vagueza (não são só os princípios como Dworkin disse). A diferença
entre regras e princípios está no momento anterior à
aplicação destes: nos princípios há maior abstração referente à
norma de comportamento a ser determinada, pois não vinculam uma
situação específica; nas regras, as consequências normativas para
determinado ato são verificadas facilmente, pois já estão
predeterminadas. No momento da aplicação, segundo Ávila, a
diferença entre R e P* é reduzida pois a aplicação de ambos exige
uma interpretação recíproca e complementar. Nesse sentido, o autor
propõe que tanto os princípios, quanto as regras, permitem a
consideração de aspectos concretos e individuais do caso. A diferença
estaria no fato de os P designarem um “estado das coisas” que deve
ser garantido, sem descrever qual a conduta para se chegar lá. O
comportamento é adotado porque se deseja chegar a um fim. Logo,
os P geram para a argumentação razões finalísticas ou substanciais.
Já nas R, adota-se um comportamento não porque se deseja chegar a
um fim, mas porque ele é correto, ou seja, está previsto em uma
regra. As pessoas seguem as regras por causa da autoridade que vem
da vigência delas. Logo, as R geram para a argumentação razões
autoritativas ou de correção. O que enquadra uma norma como regra
ou princípios seria a sua aplicação comportamental ou finalística,
respectivamente.
Ávila nega as afirmações de Dworkin e Alexy de que, se o que estiver
previsto em uma regra ocorrer no plano fático, a consequência deve
ser estabelecida.
Por que não?
1º Porque há casos de aplicação de regras sem que as condições de
tais regras sejam satisfeitas, como ocorre na analogia (semelhança de
casos não previstos com aqueles previstos na hipótese normativa)
2º Porque há casos em que as regras não são aplicadas, apesar de
suas condições terem sido satisfeitas, como quando circunstâncias do
caso concreto e não previstas na regra excluem a sua aplicação.
Outros autores costumam afirmar que as regras são ou não aplicadas,
enquanto os princípios podem ser aplicados mais ou menos. Ávila
questiona: não são os princípios que são aplicados mais ou menos,
mas é o estado de coisas que pode ser aproximado. Mesmo assim,
um princípio é ou não adotado. Dizer que os princípios são aplicados
de forma gradual é confundir a norma com seus aspectos exteriores.
Conclusão:
- As razões que impõem a implementação de regras podem ser
ultrapassadas.
- A consideração de aspectos concretos e individuais das regras deve
ser validamente fundamentada.
2. Quanto ao conflito normativo
Para alguns autores, a diferença entre R e P estaria no funcionamento
do conflito normativo.
O conflito entre R seria verdadeiro pois ou declaro uma delas inválida
ou abro uma exceção
No conflito entre P, chamado de imbricamento (sobreposição), faço
uma ponderação que atribui uma dimensão de peso a cada um dos
princípios em questão.
Para Dworkin, os princípios possuem uma dimensão de peso que vem
à tona no caso de colisão. Um se sobrepões ao outro sem que este
perca sua validade.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
13
Para Alexy, os P estabelecem deveres de otimização, aplicáveis em
vários graus, de acordo com as possibilidades normativas e fáticas.
No caso de colisão, há uma ponderação e um deles prevalece.
Crítica feita por Ávila:
O conflito normativo ajuda no estudo das espécies normativas (R e
P), mas não resolve o problema, pois precisa ser aperfeiçoado. Não é
certo dizer que a ponderação só cabe aos princípios, nem que estes
possuem uma dimensão de peso. Ambos estão suscetíveis a um
sopesamento: balanceamento de razões e contra-razões que culmina
com a decisão de interpretação.
Ávila garante que às regras também podem ser atribuídos pesos em
caso de conflito, sem perda de validade de uma delas. Logo, a
solução do conflito entre regras está no plano da aplicação, e não da
validade, como afirmam alguns autores.
Ávila nos faz 3 esclarecimento acerca do tema:
1. O conflito entre regras não é abstrato
2. O conflito não estabelece que uma delas seja inválida. A declaração
de invalidade pode sim ocorrer mas não é necessária, é eventual.
3. Regras podem ter seu conteúdo superado por razões contrárias (é
o centro da teoria dele, por isso essa ideia é repetida várias vezes).
O que fazer quando regras entram em conflito? O juiz deve atribuir
peso maior a uma delas, de acordo com a finalidade pretendida.
3. Relação das regras com exceções
Para Ávila, como já foi dito, as regras podem ter seu conteúdo
superado por razões contrárias. Seria o caso, portanto das exceções.
As exceções a uma regra podem ou não estar previstas no
ordenamento. Quando estão, o juiz deve ponderar razões,
circunstâncias e argumentos e buscar outras razões em outras
normas. A aplicação da regra não está, portanto, condicionada
somente pela descrição do comportamento. Quando não há exceção
prevista, situação em que o aplicados avaliará a importância das
razões contrárias à aplicação da regra, sopesando os argumentos
para verificar se vale a pena criar uma exceção diante do caso.
Alguns críticos podem afirmar que a relação ente regras e exceção
não tem a ver com a colisão de princípios. Por quê?
1º Porque as regras são interpretadas e princípios ponderados, pois a
relação entre R e E já estaria prevista no ordenamento, cabendo
somente ao aplicados interpretá-la.
2º Porque R e E não entram em conflito, já que somente uma vai ser
aplicada. Os P, por sua vez, podem entrar em conflito, pois os dois
princípios conflitantes seriam aplicados (um com mais peso que o
outro).
Essas críticas não convencem Ávila, pois para ele, em ambos os casos
há sopesamento de razões e contra-razões e porque a relação entre R
e E e entre P que colidem não difere na ponderação, mas na modo
como essa ponderação é feita.
Questão crucial: saber em que casos o aplicador deve se manter fiel
aos elementos da hipótese normativa e quando pode recorrer à razão
justificativa. Essa decisão depende da ponderação entre as razões
que justificam a obediência incondicional à regra e as razões que
justificam seu abandono. A aplicação ou não de um precedente
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
14
depende de uma ponderação A ponderação de regras é feita pelas
formas argumentativas da analogia e do argumento contrário
Para Ávila, R e P precisam de ponderação, cada um com um tipo. O
princípios não tem dimensão de peso, são às razões e aos fins aos
quais eles fazem referência é que deve ser atribuída uma dimensão
de importância. Diferentemente, nas regras o peso resulta do juízo de
valor do aplicador, pois esse determina, mediante o caso concreto,
quais elementos serão privilegiados.
Alexy diz que, ao determinar pesos aos princípios, os define como
mandatos de otimização, pois seu conteúdo deve ser aplicado na
máxima medida. Ávila discorda pois diz que nem sempre é assim. Diz
que há 4 formas de relação entre P:
1º O fim de um leva ao fim do outro. Não aplico na máxima medida,
mas na medida necessária.
2º Um fim exclui o outro. Há rejeição de um deles.
3º A realização de um fim leva à realização de parte do fim de outro.
Há limitação e complementação recíproca de sentido
4º Um fim não interfere no outro.
4. Conclusão do texto:
- Regras e princípios têm o mesmo conteúdo de dever-ser e
ambos devem ser realizados totalmente.
- Uma importante diferença entre regras e princípios está no
fato de as primeiras terem um comportamento já previsto na
norma, enquanto os segundo estabelecerem fins normativos,
mas não a conduta a ser seguida. Essa depende de um ato
institucional.
- Por fim, princípios não são mandatos de otimização como
propunha Alexy, mas seu uso sim: mandato porque há uma
proposição normativa e de otimização porque o conteúdo de
um princípio deve ser otimizado na ponderação.
Lógica e Metodologia Jurídica 2012 – Professor
Ronaldo Porto Macedo Jr.
Seminário 01
Texto: DWORKIN, Ronald. “O Modelo de Regras I” in Levando os
direitos a sério, trad. Nelson Boeira, 3ª ed., São Paulo, Martins
Fontes, 2010, pp. 23 – 50.
1. Dworkin afirma que o conceito de “obrigação jurídica” e
“direito” é frágil e mal definido, devido às dificuldades para a
aplicação prática de ambos os conceitos. Eles não são
suficientes para solucionarem todos os casos concretos
existentes. O autor ainda cita que o judiciário necessita
identificar os princípios para que haja uma aplicação
consistente da norma.
2. Critica de Dworkin aos nominalistas e à teoria mecânica do
direito
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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2.1 Dworkin acredita que os nominalistas, por considerarem o
“direito” e as “obrigações jurídicas” como mitos, não
elaboram técnicas para a utilização desses conceitos. O
autor faz ressalvas sobre os nominalistas afirmando que
alguns tratam do funcionamento real das instituições,
assim como os positivistas também fazem.
3. Preceitos relevantes do Positivismo.
3.1 O direito é um conjunto de regras válidas, identificadas por
um teste fundamental, cujas sanções são de
responsabilidade do poder público.
3.2 Em casos de lacunas, os juízes possuem discricionariedade
para solucionar os conflitos.
3.3 Não existe obrigação jurídica sem uma regra que a
preceda.
4. Teste fundamental segundo Austin.
4.1 Para Austin, a única forma de uma regra ser válida é
quando ela é emanada pelo soberano.
4.2 Contudo, Dworkin acredita que não há possibilidade desse
modelo de regra ser imposto em sociedades complexas,
pois o controle político é pluralista.
4.3 Segundo Austin, a soberania advém da força. Porém, de acordo com a concepção de Dworkin, essa afirmação não possui fundamentos suficientes para uma sociedade complexa, uma vez que apenas a força física não embasa o direito.
5. Versão de Hart sobre o positivismo.
5.1 Hart discorda de Austin e propõe um modelo no qual as
normas são subdivididas em primárias e secundárias.
5.1.1 As normas primárias são normas que geram
obrigações e concedem direitos.
5.1.2 As normas secundárias, por sua vez, regularizam as
primárias.
5.2 Segundo Hart, as normas devem ser fundamentadas pela
autoridade competente e não depender exclusivamente da
força.
5.3 Fontes possíveis para a regra.
5.3.1 Aceitação do costume como uma obrigação.
5.3.2 Imposição de uma regra pela autoridade.
5.4 Regras secundárias.
5.4.1 Essas regras permitem a identificação do que é ou
não é direito.
5.4.2 A regra de reconhecimento, dentro de um sistema
jurídico, é a única cuja obrigatoriedade depende de
sua aceitação.
6. Ataque de Dworkin ao positivismo.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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6.1 Na resolução de casos complexos, os juristas lançam mão
de padrões que não funcionam como regras e que,
portanto, não são validadas por regras de reconhecimento.
7. Distinção entre princípios e regras para Dworkin.
7.1 Dworkin demonstra situações em que princípios modificam
a aplicação de regras em casos concretos.
7.2 As regras possuem exceções e quanto mais enumeras
forem essas exceções, mais completo serão os enunciados
das regras.
7.3 As exceções dos princípios não são enumeráveis.
7.4 Ao contrário dos princípios, as regras não possuem a
dimensão de peso. Ou seja, ao entrarem em conflito, uma
regra afasta a aplicação da outra enquanto os princípios
são ambos aplicados, só que com pesos diferentes.
8. Relação entre princípios e o conceito de obrigação.
8.1 Os princípios desempenham papel fundamental na
formulação de direitos e obrigações jurídicas
8.1.1 Existem duas formas de aplicar os princípios.
8.1.1.1 Podemos considerar que o direito inclui o princípio
e que este tem a sua aplicação obrigatória, assim como a
regra.
8.1.1.2 Ou os princípios podem ser aplicados, ou não, de
acordo com a discricionariedade do juiz; uma vez que são
extralegais e, portanto, não são obrigatórios como as
regras.
8.2 Portanto, na primeira forma de aplicação de princípios, se
os juízes estão aplicando princípios jurídicos obrigatórios, estão
também aplicando direito e obrigações jurídicas.
Henrique Filogonio.
Felipe Lage.
Jusaine Nogueira.
Juízo jurídico e a falsa solução dos princípios e das regras.
I- Objetivos do texto:
Ia- mostrar que a distinção entre princípios e regras não pode
propriamente dizer respeito à natureza normativa de duas
categorias normativas; ou seja, não há o porquê de
diferenciar duas espécies de normas, princípios e regras.
Sendo assim, aquele que invoca princípios em lugar de
regras não esclarece em nada o procedimento ou raciocínio
de quem decide.
Ib- mostrar que a exposição da tese de Dworkin peca por
ignorar a história do problema. Isto porque os juristas
germânicos já conhecem os problemas levantados por
Dworkin. Em que as interpretações sistemática, histórica e
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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literal já são conhecidas e técnicas hermenêuticas são
investigadas por distintas correntes. O centro do problema
levantado por Dworkin está na união entre preceitos
jurídicos e éticos/morais, no entanto a discussão da ética
por critérios racionais já foi praticamente banida do
universo mental dos juristas que são incapazes de explicitar
fundamentos comuns à ética e ao direito, por isso valem-se
muitas vezes do trabalho de Dworkin, sem atentar para as
suas dificuldades conceituais.
II- Texto e desenvolvimento dos pontos Ia e Ib:
Ia- Aplicar regras e aplicar princípios são coisas semelhantes.
No sentido de provar isso, os seus argumentos (*) se
desenvolvem da seguinte forma:
* Juízo: consiste em uma predicação e se expressa em uma
proposição. Existem juízos normativos (predicações normativas, proposições normativas, preceitos, máximas) e assertivos (proposições afirmativas ou negativas sobre o que é).
Não há juízo sem sujeito; em comparação, a língua não produz palavras por si, assim como o ordenamento não produz decisões por si. Dessa forma, a língua é apenas um instrumento dos juízos e o ordenamento á apenas o meio ou condição para decisões.
Kant: “A faculdade do juízo em geral é a faculdade de pensar o particular contido no universal. No caso de este (a regra, o princípio, a lei) ser dado, a faculdade do juízo, que nele subsume o particular, é determinante. (...) Porém, se só o particular for dado, o qual ela deve encontrar o universal, então a faculdade do juízo é simplesmente reflexiva.”.
Certas confusões fazem crer que o jurista, ao deparar-se com um caso, faz um juízo apenas determinante. Porém, é
claro que ele se envolve em juízos reflexivos, ou seja, dado um fato, o juiz procura o universal (a regra) ao qual submetê-lo.
* Juízos jurídicos: o juízo jurídico deve ser qualificado como
uma situação de fato, isto é, se qualifica um fato específico quando se está julgando ou se trata de criar fatos que serão qualificados no futuro. Quando há a qualificação de um fato futuro, uma norma é criada e a partir disso esse fato vira uma classe, já o fato específico que ocorreu no passado e que é analisado pelo juiz durante o processo vira um tipo quando está dentro de uma classe que é descrita na norma.
Quando um juiz vale-se de um juízo, ou seja, tenta subsumir um fato a uma norma, a dificuldade, na maior parte das vezes, não está em saber a regra, mas se o fato se sujeita a uma regra e não a outra. Essa dificuldade ocorre tanto quando se trata da aplicação de uma regra quanto na aplicação de um principio. Dizer que um fato se submete a um principio significa dizer que se submete a uma espécie de norma e para se submeter a uma espécie de norma é preciso tipifica-lo.
* Dworkin em seu texto “Levando os direitos a sério” indica
que a diferença entre princípios e regras está no fato de os primeiros serem aplicados por ponderação e as regras por um juízo de validade. Porém, para JRL Lopes não é isso que ocorre, tanto regras quanto princípios para serem aplicados dependem de algo mais: “construção de premissa menor” (Karl Engish):
Premissa maior = norma (matar alguém, pena de 20 anos de reclusão)
Premissa menor = fato (B matou A) Conclusão (subsunção) = B sofrerá a
pena
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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A premissa menor nunca é dada ao juiz, o processo serve para estabelecer o juízo contido na premissa menor (B matou A). Esse juízo tem caráter constitutivo e não meramente descritivo. MacCormick também fala disso ao dizer que o juízo jurídico lida com fatos primários e secundários, exemplo: Adultério:
(a) as pessoas podem aceitar que existe uma lei que sanciona o adultério, porém, podem discordar sobre os eventos, sobre se X realmente cometeu o adultério; (b) ou as pessoas podem até concordar que certos atos foram praticados ou certos eventos ocorreram, mas discordam da sua classificação dentro do tipo/da classe. A partir disso o julgador fica diante de uma questão, que MacCormick chama de questão de classificação (classificar significa dizer que um fato, evento, conduta ou individuo está contido em uma classe definida de uma regra – ou seja, seria uma questão de saber se os fatos ocorridos são fatos que contam para a regra) ou questão de interpretação (interpretar significa dizer que a classe inclui um fato, evento, conduta ou ser que se apresenta diante do sujeito – ou seja, seria uma questão de saber qual a extensão da regra para os fatos ocorridos).
Pontes de Miranda também chegou a esse ponto sobre aplicação do direito, ao dizer que é necessário determinar os fatos, saber se ocorreram ou não. É preciso definir os fatos, isto é, determinar o sentido das normas, sua extensão e significado para saber do que se tratam. É necessário classificar o fato, saber se é da classe dos fatos
determinados na norma, ou na linguagem, se a norma incide sobre os fatos. Pontes de Miranda defendia que a generalidade é uma característica essencial das leis e que descer de sua generalidade abstrata para sua aplicação concreta é o que cria o fato jurídico propriamente dito. Para ele um problema na aplicação das normas é a aplicação injusta que decorre de uma interpretação inesperada ou de uma classificação inadequada dos fatos.
* A partir de Engish, MacCormick e Pontes de Miranda, vê-
se que tanto regras quanto princípios defrontam-se com a classificação e a interpretação.
* Para MacCormick falar que regras são aplicadas tudo-ou-
nada e princípios são por ponderação é, na verdade, usar a palavra “ponderação” de fora meramente metafórica. Tanto regras quanto princípios são gerais, a diferença entre os dois é que os princípios são mais gerais que as regras, assim, o processo de tensão entre as normas (princípios e regras), que por definição são genéricas, e os fatos, que por definição são específicos, faz com os princípios tenham um caráter provisório de generalidade, já que ao longo da aplicação do princípio gera a sua especificação. Em outras palavras, durante a aplicação de um principio por um juiz em um julgamento, os fatos ocorridos na vida real vão ter de ser “encaixados” nos preceitos/na classe que o princípio estabelece, essa ação de “encaixar” os fatos faz como que o grau de generalidade daquele principio naquele caso especifico diminua. Dessa fora, JRL Lopes defende que recorrer aos princípios não elimina o trabalho mental exigido para a aplicação das regras, as quais também vão ditar um preceito/uma classe e os fatos da vida real, no julgamento, vão ter de ser “encaixados” para que a regra seja
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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propriamente aplicada, o que também diminui o grau de generalidade da regra.
Além da questão da generalidade, para JRL Lopes, as regras não são aplicadas tão claramente como tudo-ou-nada, em que uma regra pode ser perfeitamente válida, ser levada em consideração pelo julgador e ser afastada em um caso concreto porque os fatos que são transformados em premissa menor (os fatos que são subsumidos a regra) não se consideram do tipo ou classe prevista em lei. Assim, o choque entre regras deve ser resolvido em primeiro lugar pela investigação dos fatos, e não simplesmente dizer que uma delas é invalida ou ainda simplesmente recorrer a um princípio. O juízo da premissa menor é, portanto, o ponto central da controvérsia jurídica, sendo que a solução dessa controvérsia não é dada saltando-se de regras para princípios.
* Fazer a premissa menor = juízo de subsunção =
enquadramento da situação concreta na classe dos casos = considerar ou supor um caso individual a um tipo geral = adequação do singular ao universal. Considerando isso, o juízo de subsunção de uma regra é semelhante a de um princípio. * Uma diferença entre princípios e regras pode ser estabelecida quando se afirma que os princípios são regras superiores, das quais as regras dependem.
Princípios em sentido próprio são pontos de partida não demostráveis e não demostráveis porque evidentes. Eles são indemonstráveis são os pontos de partida para além dos quais não há o que demonstrar. Os princípios são inteligíveis, mas não demonstráveis. Um exemplo é o principio da isonomia, já que as regras são sempre preceito de igualdade. Outro ainda o princípio da boa-fé, no qual várias regras específicas são concretizadas.
Ib- A tradição hermenêutica que Dworkin não menciona:
- defeitos (*) da tese de Dworkin:
* Primeiro: ao se consultar os clássicos do pensamento
jurídico europeu percebe-se que várias das dúvidas e dos problemas que assaltam Dworkin já foram enfrentados. Assim, quando ele diz que o juiz ao decidir um caso deve proceder com certo respeito a princípios que dão forma a todo o sistema jurídico é uma expressão da tradicional interpretação sistemática (esta significa que toda vez que se aplica a regra mais especifica das regras jurídicas, o juiz está, na verdade, aplicando todo o ordenamento jurídico). Dworkin, assim ignora toda a tradição hermenêutica, jurídica e não jurídica, fora dos Estados Unidos.
O que seria relevante na tradição hermenêutica pouco ou nada mencionada por Dworkin? A palavra-chave para essa resposta é “sentido”. De fato, toda interpretação é a busca de sentido, a compreensão dos termos em função do sentido. Na tese de Dworkin, o “sentido” está na sua noção de “resposta certa” ou “integridade”.
* Segundo: O projeto de Dworkin em afirmar que existem
direitos morais ao lado de direitos legais, não é algo que parece original novamente, ao ter-se em vista a doutrina kantiana. Para Kant, o direito é em ultima instancia moral, para seres incapazes de moral não há direito.
* Terceiro: O proposito de Dworkin é de legitimar as
decisões interpretativas do direito. Nesse sentido ele tem razão ao dizer que todo ato de aplicação é um ato de interpretação que é por sua vez um ato de criação. Isso, porém, não é algo que os juristas europeus e latino-americanos já não tenham falado. A única diferença da teoria de Dworkin para a de Kelsen, por exemplo, é que o
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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primeiro quer salvar a racionalidade desse processo de interpretação dizendo exatamente que a racionalidade da aplicação das regras precisa ser complementada por uma ponderação de princípios. A aplicação da ponderação de princípios é uma tarefa racional de justificativa.
Uma justificativa para que a teoria de Dworkin tenha recebido tanta atenção apesar da semelhança acima colocada com o movimento alemão da teoria do direito, foi que a de Dworkin é uma teoria claramente crítica e moderna, enquanto a do segundo era idealista não propriamente crítica, culturalista e com tinha tons conservadores (apelava para valores como para objetos, sem maior interesse pela análise do processo propriamente lógico de aplicação).
* Quarto: como já foi colocado no ponto Ia, outro defeito
está exatamente em diferenciar princípios e regras com base na aplicação. Além de todos os pontos colocados acima, JRL Lopes diz que a afirmação de que os princípios, quando em conflito, são aplicados por ponderação, abriu as portas da “criatividade” para os aplicadores do direito, dando a entender que os princípios são afirmações genéricas de intenções e que cada um está autorizado a ter os seus (indo exatamente no caminho contrário da racionalidade que Dworkin defende em sua teoria).
Outra crítica é que, hodiernamente, a maneira como alguns usam e aplicam a expressão “princípios” mostra-se perigosa para a vida democrática e para as liberdades. No caso do direito constitucional isso fica evidente, fala-se de princípios fundamentais para coisas muito diferentes. Isto, pois as constituições contemporâneas são repositórios de regras de distribuição, estas determinam o que é o seu de cada um e criam “esferas de justiça”. Essas regras pressupõem discussões éticas. Discussões essas que podem ser racionais, não é por acaso que Dworkin se envolve em
várias dessas. Porém, diferentemente do que ele defende, a aplicação das regras de distribuição/princípios não podem ocorrer sob a justificativa de que é mais flexível e que permite a ponderação. Já que aplicar dessa forma a regra significa que quem está aplicando está fugindo da demonstração e justificação do seu juízo. As regras distributivas/princípios são aplicáveis, mas, exigem tanto qualquer outra regra um processo de justificação, sair disso, é cair no gosto, no sentimento e nas boas intenções das pessoas. Sociedades democráticas são, porém, sociedades burocráticas, ou seja, sociedades em que os critérios aplicação de regras são impessoais e só podem validar-se com apelo a regras universais.
III- Conclusão:
Os argumentos de Dworkin podem ser salvos no ponto em que ele tenta demonstrar que os pontos de partida de um sistema jurídico são os mesmos pontos de partida de outros sistemas normativos e, pois, da razão prática em geral. O próprio Dworkin reconhece que as diferenças lógicas entre regra e principio talvez não sejam o mais importante, ele ainda coloca que a relação mais importante seria, na verdade, entre princípios e direitos.
The End of Empire: Dworkin and Jurisprudence in the 21st Century-
Brian Leiter
- A NYU em seu website descreveu Dworkin como
provavelmente a pessoa que mais tem influência no direito
anglo-americano, e que ele provavelmente vai ser um dos
autores que vai continuar sendo lido daqui há 200 anos – o
autor discorda e diz que Dworkin incentivou a pesquisa com
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
21
seu trabalho, mas que a maioria dos trabalhos na filosofia do
direito vão contra a sua teoria.
- Para sustentar essa ideia, dois argumentos: o primeiro é de
que nas áreas mais “quentes” da filosofia do direito atual,
Dworkin foi bastante irrelevante; o segundo é de que nas
áreas em que ele teve importância- teoria do direito e da
adjudicação- seus argumentos eram implausíveis e sem mérito
filosófico.
- Desenvolvimento da filosofia do direito nos últimos anos:
1. Expansão da teoria de direito criminal para questões além
das tradicionais: “quais os limites do direito penal?” e “ qual a
justificativa da pena?”- o direito penal como uma matéria mais
importante para a filosofia do direito.
2. O crescimento de trabalhos de filosofia do direito na
conceituação e fundamentação moral em questões de direito
privado.
3. As questões fundamentais, porém abstratas, de filosofia do
direito (tratadas por Kelsen e Hart) se beneficiaram de uma
análise mais profunda sobre conceitos que permaneciam sem
uma teoria abrangente, conceitos como “autoridade” e
“regra”, que foram a questão central de alguns teóricos nas
últimas décadas.
4. Nos últimos 25 anos, o conceito jusnaturalista do direito
renasce em alguns teóricos que tentam tirar as premissas
teológicas que são irrelevantes no pós-Iluminismo.
5. Nos últimos 25 anos, a metafísica, a linguagem e a
epistemologia emergem para basear as antigas questões da
natureza do direito, da relação entre direito e moral e também
para fundamentar diversas áreas importantes do direito,
principalmente direito penal e evidência.
- Em nenhum desses cinco campos de desenvolvimento da
filosofia do direito nos últimos anos, Dworkin teve importância.
- O primeiro ponto que poderia se criticar o autor: sobre o
debate Dworkin VS. Hart -um ponto que foi bem discutido-
que começou na década de 60, já foi superado faz tempo e
sem controvérsias (para o autor, lógico que o Dworkin estava
errado); porém, ele admite que o trabalho do Dworkin e as
suas críticas ao Hart contribuíram bastante para o
desenvolvimento do positivismo jurídico nos últimos 30 anos e
enquanto se for estudar Hart e positivismo, o Dworkin não vai
desaparecer.
- O segundo ponto é que o estímulo primário acerca do recente
debate acerca de metodologia na filosofia do direito não foi
com Dworkin, e sim com Stephen Perry.
- Mesmo que o Dworkin não foi muito significante para nenhum
dos 5 campos mencionados ou para o debate de metodologia,
ele foi importante em uma área: o desenvolvimento de sua
própria visão sobre o direito e adjudicação.
- Então, qual realmente a contribuição dele para a filosofia do
direito? Aqui vai um resumo.
1. Num momento, ele construiu uma teoria de que o direito e
a adjudicação tinham que atender a dois padrões
diferenciados por sua aplicação lógica: as regras e os
princípios. Depois que outros mostraram que essa distinção
era instável, ele desistiu do seu argumento chave para atacar
Hart.
2. Num outro momento ele sustentou a importância da
diferenciação entre “políticas” e “princípios”, mas depois de
Neil MacCormick escrever o texto Legal Reasoning and Legal
Theory, e John Bell, o Policy Arguments in Judicial Decisions,
ele também abandonou este argumento absurdamente
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
22
implausível.
3. Dworkin diz que uma teoria do direito tem que explicar
como o que é necessário para ser direito dá uma justificação
geral para o exercício do poder coercitivo pelo Estado e
apresenta uma teoria para desafiar a do Hart. Como o Hart
nunca disse que esse era o conceito dele de direito e que o
Dworkin nunca mostrou como uma norma era válida a partir
disso, muitos consideraram o debate entre os dois sem
importância.
4. No Law‟s Empire, ele constroi uma teoria sobre
interpretação que é muito criticada e ninguém na área achou
plausível ou adotou o que ele disse. Dworkin parece ter
abandonado sua tese sobre a interpretação.
5. Dworkin diz que todas as teorias do direito menos a dele
são vítimas do “ferrão semântico”. E que o propósito deste
argumento era mostrar que usar o mesmo conceito não
significa usar o mesmo critério de aplicação dele; mas, como
todos concordam, ninguém seria vítima disto. Dworkin diz que
quem discute sobre o conteúdo do direito cai em
considerações morais que o positivismo não consegue
explicar; mas o positivismo faz isso faz tempo, só o Dworkin
que não vê. Dworkin tem a mesma visão que o Hart acerca do
que seria uma teoria descritiva adequada do direito e ela não
bate com a sua visão de interpretação
6. Ele diz que existe uma resposta certa para todos ou quase
todos os casos de direito, já que a resposta certa seria uma
questão moral; porém, como diz John Mackie, não há
objetivamente nenhuma resposta correta para questões
morais, como poderia ter para o direito então? E por isso
todos ignoraram essa afirmação do Dworkin, menos um
professor de Cambridge que disse que era implausível.
7. Dworkin ao longo de sua carreira manteve o argumento de
que “isso e isso” é válido em tal jurisdição, mas confrontando
as teorias de Dworkin com outros positivistas, ele dá
argumentos implausíveis sobre adjudicação que a teoria deles
não vincula (?)
- Por que apesar de tudo isso ele ainda é tão famoso? Porque
ele escreve muito bem, porque ele sempre confronta decisões
da Suprema Corte, o que dá muita audiência, principalmente
em casos polêmicos.
- Dworkin diz que tanto no Reino Unido quanto nos Estados
Unidos, o cenário legal está cheio de positivistas, mas como
sempre, ele está incorreto. Ele desistiu de mostrar que as
teorias positivistas não são interessantes e também de
responder quem criticou suas visões.
Eu não coloquei umas partes por achar irrelevante, mas quem
quiser, por favor, pode complementar.
Direitos Fundamentais – Semana 5
5-1.Testo do MacCormick
1- Direito: O autor se considera um pós-positivista analítico,
pois acredita que o direito é conhecido através de
distinções, classificações, na forma da teoria dogmática
positivista. Entretanto, ele não acredita numa separação
entre direito e moral como ocorre no positivismo: ele
acredita que o direito tem necessariamente uma função
de busca pela justiça (seria mais ou menos como os
positivistas mais contemporâneos – Hart e Raz). O direito
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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não é só o estatal – é qualquer ordenamento normativo
institucional, seja religioso, internacional etc. Entretanto,
as pessoas tem mais motivos para obedecer o direito do
Estado do que os outros, por seu poder coercitivo. Seja
porque as pessoas acreditam que sem direito seria pior,
seja por medo da sanção. O direito, mesmo num âmbito
democrático, coloca as pessoas em situação de
heteronomia, inevitavelmente. O direito nunca chega à
ideia de autonomia kantiana, que só pode se fazer
presente na moral.
2- Aplicação, interpretação e argumentação: a maioria dos
Estados são baseados em três poderes distintos,
dividindo-se o criador e o aplicador da lei. Diante das
distorções do movimento político, o magistrado tem
papel fundamental no direito. Pode ser que as normas
sejam consideravelmente claras, os fatos de fácil
comprovação e classificação, e o juiz decide por um
processo silogístico simples. Entretanto, muitas vezes o
processo silogístico é difícil: tanto a premissa maior
quanto a menor devem ser construídas, e ao mesmo
tempo, porque o conhecimento dos fatos tem um quê de
jurídico e das normas tem um quê de fatídico. Além
desses problemas de classificação, avaliação,
interpretação, pode surgir ainda questão de relevância:
“isso é realmente uma questão jurídica?”. Ainda assim,
sempre há o direito de estar em juízo, porque mesmo
para dizer que uma questão não é jurídica, é necessário
uma análise jurídica.
3- Os três Cs: Toda decisão judicial tem uma ambição de
universalidade, pois é natural do discurso jurídico que
seja assim: de alguma forma, a sentença quer dizer que,
se acontecer outro caso, com estas mesmas
características relevantes, a decisão deve ser a mesma. A
decisão judicial tem um peso muito grande, portanto, na
formação do direito, por isso o magistrado tem que saber
lidar com argumentos antagônicos e tomar a decisão
mais “razoável”. Para isso, ele tem que levar em conta as
consequências de sua decisão, isto é suas implicaçoes
imediatas. Se fosse só isso, seu trabalho não diferiria do
Legislativo (o direito não se distinguiria da política). Por
isso os outros dois Cs: coerência, que é a consideração
dos princípios postos pela legislação, e a consistência,
que é a obediência a regras que não podem ser
afastadas mesmo que as consequências fossem boas e
não houvesse problemas de coerência, como a regra de
que não há crime sem lei anterior que o defina.
4- Então o que é razoável? : Esses três Cs servem apenas
para dar uma orientação a análise do razoável, que só se
efetua no caso concreto. A razoabilidade é fruto da
própria essência de justiça que acompanha o direito: é
natural que uma decisão judicial tenha que ser razoável.
Seu correspondente em outros países é o que se chama
de proporcionalidade. Para uma decisão ser razoável, é
preciso analisar as razões de cada parte para ter
praticado as ações que estão sob juízo. Por mais que os
advogados consigam fazer com que todas as ações
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
24
pareçam razoáveis, o juiz, gozando de sua
imparcialidade, decide o caso. Caso perceba-se que
ambas as ações foram igualmente razoáveis, a decisão
mais razoável é a votação por maioria que se faz nos
tribunais superiores.
5-3. Texto do Virgílio
O STF tem usado largamente o chamado princípio da
proporcionalidade ou da razobilidade. Nosso objetivo é traçar
algumas noções sobre as origens e o uso desses termos para
que a jurisprudência não caia nas incoerências que tem caído
ultimamente. Os ministros do STF se baseiam muito nas ideias
do tribunal constitucional alemão sobre proporcionalidade, que
têm origem em Alexy. Entretanto, eles misturam com o uso
americano em que se fala muito mais de razoabilidade.
Independentemente da corrente que se adote, é preciso ter
coerência. Nesse texto vamos detalhar a concepção proveniente
de Alexy.
A primeira coisa a ressaltar é que, nessa concepção,
diferentemente do que o STF tem feito, a proporcionalidade se
distingue da razoabilidade, de forma que nem tudo que é
razoável é proporcional. Enquanto a razoabilidade é um mero
topoi, em defesa de uma descriteriosa relação entre meios e
fins, a regra da proporcionalidade obedece a três sub-regras:
adequação, necessidade e proporcionalidade stricto sensu.
A regra da proporcionalidade é uma necessidade lógica da
acepção estrutural que Alexy desenvolve sobre os princípios:
mandamentos de otimização,que estabelecem deveres prima-
facie. De acordo com Ávila, os princípio da proporcionalidade
não é um princípio no mesmo sentido dos outros princípios.
Nisso ele tem razão, pois não é realmente um mandado de
otimização, pois sempre que houver colisão entre princípios
deve ser observado: é o próprio fundamento de solução das
controvérsias sobre os princípios. Por isso, Ávila dirá que é um
postulado normativo, e passa a chamar de dever da
proporcionalidade: ora, se não é uma norma (não é nem
princípio nem regra), então não é dever. Além disso, para nós,
a proporcionalidade é uma regra, ainda que não exatamente
positivada. Cabe ressaltar ainda que não podemos ignorar a
força pragmática de chamar algo de princípio, ainda que seja
terminologicamente equivocada. Não dá para mudar os usos da
linguagem tão facilmente.
Muitos tentam justificá-la como implícita na ideia de Estado de
Direito, enquanto outros buscam uma série de normas da
Constituição, mas nenhuma diz claramente o que é. Para nós, é
simplesmente uma regra proveniente de determinada acepção
do direito que os juristas podem ou não adotar, que é a análise
estrutural de princípios e regras de Alexy.
Como dissemos, a proporcionalidade possui três itens. O STF,
quando diz que está aplicando o princípio de proporcionalidade,
chega até a citar esses itens, mas sem critério algum,
parecendo muito mais o topoi da razoabilidade. A doutrina
nacional já trata bastante do assunto, mas de forma muito
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
25
breve, sem levar em conta a importância desta regra no âmbito
dos direitos fundamentais, que são na maior parte princípios.
O primeiro critério é o da adequação: é objetivo, no sentido de
não envolver comparações e ponderações. Trata-se da
pergunta: “tal medida adotada pelo legislador será capaz de
promover, no todo ou em parte, ou mesmo fomentar a
realização do fim estabelecido pelo princípio?”. Se a resposta for
não, paramos a análise da proporcionalidade por aqui, pois a
medida não é proporcional. Se sim, independentemente de soar
desproporcional, continuamos a análise.
O segundo critério é o da necessidade: aqui já entre uma
comparação. “Existem medidas igualmente adequadas para
promover ou fomentar a realização daquele fim que seja menos
gravosa a outros direitos?” Se sim, a medida é desnecessária e
portanto desproporcional. Se não, continuamos a análise, ainda
que pareça evidente a desproporcionalidade. É importante
destacar que só podem ser comparadas medidas de eficácia
idêntica, pois a decisão de fomentar mais ou menos a realização
do fim proposto pelo princípio pertence ao legislador.
O terceiro e último é a proporcionalidade stricto sensu, que
nada mais é que a famosa ponderação entre princípios, em que
se concluirá qual interesse a ser defendido tem maior peso.
Aqui sanam-se todas as desproporcionalidades que passaram
pelos dois primeiros crivos. Insistimos que, mesmo que
parecesse evidentemente desproporcional a sequência deveria
ser seguida, senão destruiriamos a regra da proporcionalidade e
voltaríamos a aplicar o topoi da razoabilidade. Imaginemos que
o governo tome uma medida absurda de encarcerar todos os
indivíduos portadores de HIV em função do princípio de
proteção à saúde pública. É sem dúvida uma medida adequada
para este fim. É necessária, pois não há nenhuma medida tão
eficaz quanto essa para impedir a disseminação do vírus,
independente de ofender direitos individuais. Entretanto, não é
proporcional, pois a ponderação entre saúde pública e dignidade
humana, direito de ir e vir entre outros inclina para a não
adoção da medida. Pode ser que a ofensa ao direito é mínima, e
a eficácia da medida é máxima, mas se por ponderação
entendermos que o tal direito é muito mais importante que o
outro princípio/direito que está em jogo, a medida não deverá
ser adotada.
5-2. Texto do Humberto Ávila
Humberto Ávila repete muitas das ideias já colocadas outro
texto dele já lido. Ele adota uma diferença apenas de grau e
não estrutural entre princípios e regras. Ele desenvolve essa
análise para o campo das ideias de proporcionalidade e
razoabilidade. Para ele, o direito é um sistema institucional que
possui várias figuras além de normas (regras e princípios).
Possui critérios, postulados, valores e topoi.
A “máxima da proporcionalidade” foi criada por Alexy, pois é
uma necessidade lógica da adoção do conceito de princípios
como mandados de otimização. Os juristas perdem tempo
tentando encontrar a justificação no texto normativo sendo que
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
26
a proporcionalidade não é uma norma, mas sim um postulado
normativo, por isso chamaremos a partir de agora de dever de
proporcionalidade (o que, como mostrará Virgílio, soa
incoerente). É um postulado, porque é uma verdade
necessariamente pressuposta, para que o objeto do
conhecimento (no caso o Direito) possa ser estudado. Alexy
percebe que não é uma norma, portanto deixa-o fora da
classificação (para Virgílio, o Alexy disse que é uma regra).
Mesmo sabendo que a proporcionalidade deriva da criação de
Alexy, com o qual não concordamos, nós acreditamos na
distinção entre princípios e regras, e do nosso conceito de
princípio, também a proporcionalidade é pressuposto
lógico/postulado normativo. Refinando mais a distinção entre
princípios e regras, repudiamos também a classificação
mediante a qual princípios são normas incondicionadas e regras
condicionadas. Na verdade, enquanto nos princípios fica mais
claro a finalidade, na regra fica mais clara a conduta prescrita,
mas ambos tem razões nas quais se baseia e tem hipóteses
normativas. Por isso definiremos princípios como aquelas
normas diretamente ligadas aos fins e indiretamente às
condutas, enquanto as regras são o contrário. A diferença entre
princípios e regras é pré-interpretativa, já que depois da
interpretação as diferenças praticamente desaparecem.
Para Ávila, proporcionalidade é diferente de razoabilidade.
Enquanto a proporcionalidade se baseia nas relações meio-fim
através de três desmembramentos (adequação, necessidade e
proporcionalidade), a razoabilidade se refere a critérios
pessoais: é a equidade em relação aos caracteres e
circunstâncias pessoais do sujeito sob crivo do tribunal.
A adequação é igual à explicação do Virgílio, porém sem
detalhamento. A necessidade é a inexistência de meios menos
gravosos e a proporcionalidade é simplesmente a proibição de
excesso (é uma análise muito menos clara que a do Virgílio e
não se mostra convincente). Não há uma sequência de
aplicação.
No direito tributário, destaca-se a proibição de excesso, e no
direito penal, a adequação às finalidades da norma.
A DISTINÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS E A
REDEFINIÇÃO DO DEVER DE PROPORCIONALIDADE
Humberto Ávila
1. Introdução
A proporcionalidade tem sido cada vez mais usada no Direito
brasileiro. Ex: proteção ao núcleo inviolável de um princípio /
determinar a exigência de racionalidade na decisão judicial.
Analisando decisões do STF, o autor chega a duas conclusões:
a) a exigência de proporcionalidade vem sendo aceita como um dever
jurídico-positivo
b) a utilização do princípio da proporcionalidade nem sempre tem o
mesmo sentido. Nos exemplos houve: razoabilidade; racionalidade na
decisão judicial; limite à violação de um princípio fundamental;
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
27
proibição do excesso; equivalência; limitação da pena. Sua aplicação
NÃO é fundamentada de modo claro e objetivo.
A proporcionalidade surgiu no Direito brasileiro por influência
alemã. Ainda não é fundamentada solidamente pela doutrina e seu
fundamento de validade é duvidoso – varia de Estado de Direito,
direitos fundamentais, supremacia da Constituição ou a conjunção de
todos.
Ávila defende que a proporcionalidade não é um princípio, mas
um POSTULADO NORMATIVO APLICATIVO. Não decorre implícita ou
explicitamente de nenhum texto normativo, mas é consequência
lógica da sistemática do ordenamento jurídico. Não é princípio, nem
regra, nem apelo à equivalência ou à razoabilidade, nem proibição de
excesso. Precisa ter uma aplicação por critérios objetivos.
2. Os princípios e o dever de proporcionalidade
A) Definição de princípio da doutrina:
A distinção entre regras e princípios varia de acordo com o critério
distintivo usado, seu fundamento teórico e a finalidade da divisão.
Unanimidade: os princípios são as normas mais importantes de um
ordenamento. O objetivo do autor é defini-los de modo que sua
aplicação concreta seja intersubjetivamente controlável.
Distinção pelo GRAU DE ABSTRAÇÃO E GENERALIDADE e pelo
FUNDAMENTO DE VALIDADE: princípios são gerais e abstratos, regras
se dirigem a grupos menores de pessoas e são mais concretas quanto
à conduta. Princípios são dedutíveis do Estado de Direito, regras, de
textos normativos. São exemplos:
*ESSER: princípios são fundamentos, não ordens(regras). Dinstinção
qualitativa.
*WOLLF-BACHOF e FORSTHOFF: são fundamentos de validade
jurídica para as decisões. Dedutíveis objetivamente do Estado de
Direito, da ideia de Direito e da ideia de Justiça.
*LARENZ: estabelecem fundamentos normativos para a aplicação e
interpretação do Direito. Deles decorrem normas de comportamento.
Essas definições procuravam mostrar que decisões judiciais não se
baseiam apenas em regras e redefinir o Direito(como algo a mais que
os textos positivados).
Procurando critérios mais objetivos para distinguir e assim aplicar
praticamente, surgiram novas concepções. São elas:
*CANARIS: distinção com base na explicitude do conteúdo axiológico
dos princípios. O conteúdo deles é estabelecido por um processo
dialético de complementação e limitação. Precisam ser concretizados
por meio das regras.
*DWORKIN: Faz uma distinção quanto a estrutura lógica, com base
em critérios classificatórios. Regras tem aplicação tudo ou nada(se
existe a condição e a regra é válida, ela é aplicada; caso contrário,
não se aplica) e quando colidem, uma deverá ser inválida. Princípios
possuem uma dimensão de peso(quando colidem, aquele com maior
peso de sobrepõe, mas o outro não perde validade) e não
determinam a decisão, mas fundamentam em conjunto com outros.
*ALEXY: Princípios são DEVERES DE OTIMIZAÇÃO, aplicáveis segundo
as condições normativas(depende dos princípios e regras que a eles
se opõem) e fáticas. Quando colidem, deve-se ponderar a
preponderância de cada um no caso concreto. Cláusula de reserva:
aplica-se um princípio “se no caso concreto um outro princípio não
tiver maior peso”. A pondereção de princípios conflitantes é feita por
regras de prevalência, o que faz com que eles também sejam
aplicados ao modo tudo ou nada. A dinstinção entre regras e
princípios se dá no conflito. Nas primeiras, quando elas colidem
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
28
alguma está fora da ordem jurídica – problema do dentro ou fora – já
nos segundos, o conflito acontece dentro da ordem – teorema da
colisão. Segue Dworkin em relação às regras e acrescenta que num
conflito pode-se criar uma exceção a alguma das regras. Diferenciam-
se quanto à colisão e quanto a obrigação que instituem (regras:
obrigação absoluta / princípios: obrigação prima facie).
B) O dever de proporcionalidade como implicação dos princípios:
É do modo de solução da colisão de conflitos que se induz o dever
de proporcionalidade. Não existe uma ordem de primazia dos
princípios no plano abstrato, ela é averiguada no caso concreto. As
regras de colisão são estabelecidas através da ponderação, que, por
sua vez, considera as condições fáticas para escolher aquela que
melhor realiza ambos os princípios.
Deve-se escolher um meio ADEQUADO e NECESSÁRIO à
realização do fim procurado. Alexy: “As possibilidades fáticas de
aplicação dos princípios implicam no dever de adequação e
necessidade.” Das possibilidades normativas resulta a necessidade de
proporcionalidade em sentido estrito: se o meio implica a total não-
realização de algum princípio, ele é vedado. O dever de
porporcionalidade é implicação do caráter principal das
normas(implicação lógica) – diz Alexy e Ávila concorda.
3. Análise crítica
A) Redefinindo os princípios:
A.1 Crítica às concepções dominantes:
Alexy concorda com Dworkin que as regras são premissas a serem
ou não preenchidas. Ávila ressalva que NEM SEMPRE a consequência
de uma regra é implementada quando acontece sua condição. Há
regras ambíguas e vagas (ex: com termos indeterminados) e variadas
relações entre regras (ex: exceções) que podem mudar decisões. A
teoria da aplicação tudo ou nada só tem sentido depois de superadas
as questões sobre validade, sentido e subsunção final dos fatos.
A característica das regras de implementar uma consequência pré-
determinada só surge depois de um processo de interpretação. O
suposto método tudo ou nada pra aplicar regras não pode ser usado
pra distingui-las dos princípios, já que elas também precisam de
análise prévia de sentido e das condições fáticas para escolher o
método de aplicação. No ato de aplicação, regras e princípios se
aproximam, estando a diferença no grau de abstração no ato
interpretador. Atente-se ainda que ambos precisam um do outro ao
serem aplicados.
Ávila afrima que os princípios TÊM CONSEQUÊNCIAS
NORMATIVAS (o fim que almeja alcançar). Além disso, diz que a
interpretação pode fazer de uma norma princípio ou regra. Os
princípios em si não têm uma dimensão de peso, mas sim os
objetivos deles, dos quais devem ser analisados os graus de
importância. A dimensão de peso não é um atributo empírico dos
princípios, mas juízo atribuído.
Na hipótese de princípios conflitantes com fins divergentes, a
inconsistência normativa é eliminada sem que nenhum deles seja
declarado nulo, como dito anteriormente. Entretando, quando
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
29
conflitam princípios que buscam o mesmo fim, com diferença de
meio, um dos dois deverá ser declarado nulo NAQUELE CASO
CONCRETO. O último caso se assemelha a quando se resolve conflito
de regras por meio de exceção: as duas regras superam o conflido
mantendo-se válidas.
Ávila diz que nem sempre os princípios devem ser aplicados na
máxima medida. Para aprovar, passa a análise dos tipos de conflitos
entre princípios:
a) Quando a realização do fim estipulado por um levar à realização do
fim estipulado por outro: não há dever de realizá-los na máxima
medida, apenas na necessária para que se concretizem os fins.
b) Quando a realização do fim estipulado por um excluir a realização
do fim estipulado pelo outro: não há limitação e complementação
recíproca de sentido, os dois devem ser totalmente aplicados, mas um
impede o outro. Semelhante à colisão de regras.
Tanto regras quanto princípios devem ser aplicados totalmente e
possuem conteúdo de dever-ser. Diferem quanto à determinação da
prescrição de conduta que resulta da interpretação: a dos princípios
não determina diretamente a conduta a ser seguida, estabelece
objetivos; já a das regras depende menos do ato institucional de
aplicação.
A.2 Proposta de definição de princípios:
Direito como um conjunto de normas cuja interpretação e
aplicação depende de postulados normativos, critérios normativos,
topoi e valores. Esses elementos extra-norma se relacionam aos atos
de aplicação, em maioria.
Os princípios jurídicos (dever-ser; caráter deontológico) não são
os valores (o que é melhor; caráter axiológico). Também não são
mero estabelecimento de fins (que, por si só, não estabelecem dever-
ser). Princípios não são critérios (meta-regras de aplicação das
normas). Não são axiomas (verdades por si mesmas existentes), nem
postulados.
Os postulados normativos são condições de possibilidade de
conhecimento do fenômeno jurídico. Não fundamentam decisões, mas
explicam como se pode conhecer o Direito. Ex: coerência, integridade,
reflexão.
Os princípios prescrevem conteúdos lidagos à conduta humana,
direta ou indiretamente. As normas juríridicas podem ser
condicionais(ditam a consequência de determinada condição) ou
incondicionais. As regras, normalmente são condicionais gerais; já os
princípios são incondicionais(não se referem a uma situação prática).
Ambos precisam de condições reais para sua incidência, e a diferença
consiste no grau de abstração.
A diferença não está na condicionalidade em sim, mas na ligação
da previsão normativa com a concretização de fins(princípios) ou de
condutas(regras). Nas normas finalísticas, o fim é o conteúdo
imediato e as condutas para a realização dele são o conteúdo
mediato. Ambos os tipos de normas possuem condutas como objetos.
A diferença é que normas finalísticas precisam de condutas
ADEQUADAS à realização do fim, normas condicionais PRESCREVEM a
conduta.
DEFINIÇÃO DE PRINCÍPIOS: “normas que estabelecem
diretamente fins, para cuja concretização estabelecem com menor
exatidão qual o comportamento devido (menor grau de determinação
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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da ordem e maior generalidade dos destinatários), e por isso
dependem mais intensamente da sua relação com outras normas e de
atos institucionalmente legitimados de interpretação para a
determinação da conduta devida.”
DEFINIÇÃO DE REGRAS: “normas que estabelecem indiretamente
fins, para cuja concretização estabelecem com maior exatidão qual o
comportamento devido (maior grau de determinação da ordem e
maios especificação dos destinatários), e por isso dependem menos
intensamente da sua relação com outras normas e de atos
institucionalmente legitimados de interpretação para a determinação
da conduta devida.”
Assim, o caráter das normas não é determinado pelo que diz o
legislador em sua letra, nem é fixo - pode ser mudado conforme a
interpretação e o caso concreto em que se aplique. Já as disposições
de princípios que se auto-qualificam como tais, são obviamente
superiores hierarquicamente no ordenamento. A definição adotada de
pricípios explica a sua hierarquia sintática e semântica, além de sua
grande importância na contrução do Direito.
B) Redefinindo o dever de proporcionalidade:
B.1 Dever de proporcionalidade como postulado normativo
aplicativo
Seria uma norma-princípio? NÃO. Sua descrição abstrata não
permite a concretização de um único objetivo; sua aplicação
independe dos fatos e de outras normas; não precisa ser ponderado;
é uma estrutura formal.
LARENZ: princípio material ou critério material. Ávila NEGA. O
dever de porporcionalidade não é um critério. Não serve para tomar
uma decisão sobre aceitação ou rejeição de variáveis; ao contrário,
estabelece uma organização para de duas variáveis(dois princípios
diferentes) sejam aplicados de modo balanceado.
O dever de proporcionalidade estabelece uma estrutura formal de
aplicação dos princípios envolvidos: o meio escolhido deverá ser
adequado, necessário e não excessivo. KAUFMANN: é um critério
formal – Ávila concorda.
PENSKY: é uma regra geral. Ávila DISCORDA. Não é um regra
jurídica, não se refere à conduta humana ou à aplicação de normas,
mas estabelece CONDIÇÕES para interpretação e aplicação dos
princípios.
DEFINIÇÃO DO DEVER DE PROPORCIONALIDADE: consiste num
postulado normativo aplicativo decorrente da estrutura principal das
normas e da atributividade do Direito e dependente do conlito de
bens jurídicos materiais e do poder estruturador da relação meio-fim,
cuja função é estabelecer uma medida entre os bens jurídicos
concretamente relacionados.
Impõe uma condição formal para a aplicação de normas. A
instituição simultânea de direitos e garantias individuais e de
finalidades públicas e normas de competência, como faz a
Constituição de 88, implica o dever de ponderação. A
proporcionalidade tem a função de estabelecer limites à atividade
estatal e garantir ao máximo a liberdade dos cidadãos.
Uma medida é adequada se o meio escolhido está apto a alcançar
o resultado pretendido; necessária se, dentre todas as disponíveis e
igualmente eficazes para atingir um fim, é a menos gravosa em
relação aos direitos envolvidos; proporcional em sentido estrito se ,
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
31
relativamente ao fim perseguido, não restringir excessivamente os
direitos envolvidos.
O dever de porporcionalidade decorre da estrutura do Direito e de
suas normas, mas não se esgota nisto, na medida em que pressupõe
o conflito entre bens jurídicos materiais e o poder estruturador da
relação meio-fim.
O dever de RAZOABILIDADE NÃO SE IDENTIFICA com o dever de
proporcionalidade. Este último faz a análise abstrata do bem jurídico
protegido por um princípio e a medida relativa a um fim. Já o primeiro
é um exame concreto-individual dos bens jurídicos envolvidos, em
razão da particularidade do caso individual – analisa a aplicação de
uma medida a um determinado sujeito. Impõe a observância das
condições pessoais na determinação das consequências normativas.
Entretanto, o STF trata os dois deveres como a mesma coisa.
B.2 Aplicação a proporcionalidade no Direito Tributário e Penal
No direito tributário destaca-se a proibição de excesso, nas
questões em que há ameaça a direitos fundamentais; sem que a
relação jurídica de meio-fim se configure. Depois, é o princípio da
igualdade que norteará a ponderação em relação a normas
tributárias. Porám quando elas assumirem o caráter de finalidade
extrafiscal, vê-se a proporcionalidade no seu caráter trifásico.
Já na área Penal, a adequação às finalidades da norma é
preponderante.
O proporcional e o razoável - Virgílio
Afonso da Silva
1. Introdução
O artigo pretende fornecer um “conceito técnico adequado” de
proporcionalidade no controle judicial da constitucionalidade das leis
restritivas de direitos fundamentais, uma vez que muitas vezes a
doutrina e a jurisprudência têm tratado erroneamente a
proporcionalidade como sinônimo de razoabilidade.
O autor não pretende uma discussão apenas teórica: “Pretende-se,
pelo contrário, não só contribuir para a discussão sobre direitos
fundamentais, mas também fornecer subsídios para a atividade
jurisprudencial, especialmente aquela ocupada com a proteção dos
direitos fundamentais contra atos estatais que os restrinjam”.
A regra da proporcionalidade (regra de interpretação e aplicação do
direito) é usada principalmente nas situações que envolvem um ato
estatal, que visa promover a realização de certo direito fundamental
ou de um interesse coletivo, acaba por restringir outro(s) direito(s)
fundamental (fundamentais). “É, para usar uma expressão
consagrada, uma restrição às restrições”.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
32
O ato estatal deve passar pelos três exames (sub-regras da regra da
proporcionalidade):
Adequação, Necessidade e Proporcionalidade no sentido estrito.
2. Questões terminológicas preliminares
O termo mais utilizado no Brasil é “princípio da proporcionalidade”. No
entanto, quando é adotado o conceito de princípio em contraposição
a regra (baseado na teoria de Robert Alexy), a utilização do termo
“princípio” pode ser errônea.
Para Alexy, os princípios são “mandamentos de otimização”, ou
seja, são "normas que obrigam que algo seja realizado na maior
medida possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas".
A divisão de Alexy não se baseia em critérios de especialidade e
generalidade da norma, mas na estrutura e na forma de aplicação.
“Regras expressam deveres definitivos e são aplicadas por meio de
subsunção. Princípios expressam deveres prima facie, cujo
conteúdo definitivo somente é fixado após sopesamento com
princípios colidentes”.
Ávila afirma que Alexy não chega a enquadrar a proporcionalidade em
outra categoria, mas sem dúvidas a exclui do âmbito dos princípios.
No entanto, para Virgílio, essa afirmação não é de todo correta. Sobre
isso ele nos diz: “É correto, como já dito, que o chamado princípio da
proporcionalidade não é um princípio no sentido acima descrito. Mas
Alexy enquadra-o, sim, em outra categoria, pois classifica-o
explicitamente como regra”.
Humberto Ávila utiliza o termo “dever de proporcionalidade”, o que
para Virgílio não resolve o problema, apenas o contorna. Deveres são
normas e normas, por sua vez, ou são regras ou são princípios. O
autor nos diz que o termo mais apropriado é “regra de
proporcionalidade”.
Tendo em vista a prática jurídica brasileira, o autor pondera que, em
relação ao termo “princípio”, não há como esperar que seja usado
apenas no sentido de contraposição a regra jurídica. “Quando se
fala em princípio da proporcionalidade, o termo "princípio"
pretende conferir a importância devida ao conceito, isto é, à
exigência de proporcionalidade”. “Mais importante do que a
ingênua ambição de querer uniformizar a utilização do termo
"princípio" é deixar claro que ele, na expressão "princípio da
proporcionalidade", não tem o mesmo significado de "princípio" na
distinção entre regras e princípios, na acepção da teoria de Robert
Alexy”.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
33
A regra da proporcionalidade não pode ser utilizada como sinônimo
de proibição de excesso. Pois, muito embora a regra da
proporcionalidade ainda seja entendida em grande parte como
controle de excesso do poder estatal, ela também pode ser um
instrumento contra a omissão ou contra a ação insuficiente do
poder estatal.
3. Proporcionalidade e razoabilidade
No discurso jurídico, os termos princípio da razoabilidade e princípio
(ou regra) da proporcionalidade possuem (cada um) uma conotação
técnico jurídica própria. Não podem mais ser considerados como
sinônimos, pois embora possuam o mesmo objetivo de controlar as
atividades legislativa ou executiva, limitando-as para que não
restrinjam mais do que o necessário os direitos dos cidadãos,
possuem maneiras diferentes de controle.
O autor constata confusões entre razoabilidade e proporcionalidade
não só na jurisprudência do STF, mas também em trabalhos
acadêmicos e relatórios de comissões do Poder Legislativo.
A regra da proporcionalidade possui uma origem e uma estrutura
distinta da razoabilidade, vejamos um “breve excurso histórico”:
Não há que se falar de proporcionalidade na Magna Carta de 1215.
Podemos questionar até mesmo a existência da razoabilidade na Magna Carta, pois na Inglaterra fala-se em princípio da irrazoabilidade.
Na verdade a origem concreta do princípio da irrazoabilidade (na forma como aplicada na Inglaterra) se encontra em decisão judicial proferida em 1948.
O teste da irrazoabilidade ( também chamado de teste Wednesbury) consiste tão somente na rejeição de atos que sejam excepcionalmente irrazoáveis. Ou seja, é destinado a afastar atos absurdamente irrazoáveis.
“A não-identidade entre os dois conceitos fica ainda mais clara quando se acompanha o debate acerca da adoção do Human Rights Act de 1998 na Inglaterra. Somente a partir daí passou a haver um real interesse da doutrina jurídica inglesa na aplicação da regra da proporcionalidade, antes praticamente desconhecida na Inglaterra”.
Um ato desproporcional não necessariamente será considerado irrazoável. Um ato ser considerado desproporcional não implica, necessariamente, que ele seja extremamente absurdo, irrazoável.
“A regra da proporcionalidade no controle das leis restritivas de direitos fundamentais surgiu por desenvolvimento jurisprudencial do Tribunal Constitucional alemão e não é uma simples pauta que, vagamente, sugere que os atos estatais devem ser razoáveis, nem uma simples análise da relação meio-fim”.
Assim como desenvolveu a jurisprudência alemã, a proporcionalidade possui uma estrutura racional, com sub-elementos independentes: a análise da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. Esse sub-elementos são aplicados em uma ordem pré-definida.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
34
4. A jurisprudência do STF
Na jurisprudência do STF o recurso à regra da proporcionalidade
apenas contribui para a ideia errônea da regra da proporcionalidade
como sinônimo do princípio da razoabilidade. “Em inúmeras decisões,
sempre que se queira afastar alguma conduta considerada abusiva,
recorre-se à fórmula "à luz do princípio da proporcionalidade ou da
razoabilidade, o ato deve ser considerado inconstitucional"”.
Nos Tribunais não há uma aplicação estruturada e racional da regra
da proporcionalidade, há apenas sua citação. O raciocínio simplista é
assim esquematizado:
. a constituição consagra a regra da proporcionalidade.
. o ato questionado não respeita essa exigência.
.·. o ato questionado é inconstitucional.
Nem sempre o recurso à regra da proporcionalidade é devidamente
justificado pelo STF. “Muitas vezes é a fundamentação simplesmente
pressuposta, como se se tratasse da utilização de um princípio
constitucional de larga tradição no direito brasileiro. Quando alguma
fundamentação é fornecida, é quase sempre mencionado o art. 5º,
LIV, e o chamado substantive due process of law”.
Para o Tribunal, é proporcional aquilo que não extrapola os limites do
razoável.
A razoabilidade exige uma “compatibilidade entre o meio empregado
pelo legislador e os fins visados, bem como a aferição da legitimidade
dos fins”. Isso claramente nos mostra a não-identidade da
razoabilidade com a proporcionalidade, uma vez que a razoabilidade
“corresponde apenas à primeira da três sub-regras da
proporcionalidade, isto é, apenas à exigência de adequação”.
5. A regra da proporcionalidade e seus elementos
A doutrina brasileira salienta bem a subdivisão da regra da
proporcionalidade em três sub-regras (adequação, necessidade e
proporcionalidade em sentido estrito). Entretanto, a análise dessas
sub-regras não tem sido feita de maneira clara e aplicável na prática
jurisprudencial.
“Muitas vezes é fornecido apenas um conceito sintético de cada uma
delas, sem que se analise, no entanto, a relação entre elas, nem a
forma de aplicá-las”. Sendo assim, algumas regras importantes
para a aplicação da regra da proporcionalidade acabam sendo
ignoradas. A primeira regra essencial é a ordem pré-definida que a
sub-regras devem ser aplicadas. “A análise da adequação precede a
da necessidade, que, por sua vez, precede a da proporcionalidade em
sentido estrito”.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
35
Uma importante característica que merece a devida atenção é a
relação subsidiária das sub-regras entre si (“a aplicação da regra da
proporcionalidade nem sempre implica a análise de todas as suas três
sub-regras”). “Em termos claros e concretos, com subsidiariedade
quer-se dizer que a análise da necessidade só é exigível se, e
somente se, o caso já não tiver sido resolvido com a análise da
adequação; e a análise da proporcionalidade em sentido estrito só é
imprescindível, se o problema já não tiver sido solucionado com as
análises da adequação e da necessidade. Assim, a aplicação da regra
da proporcionalidade pode esgotar-se, em alguns casos, com o
simples exame da adequação do ato estatal para a promoção dos
objetivos pretendidos”.
Há três tendências diversas quanto ao número de sub-regras:
1) Amplamente majoritária – seguida por Virgílio - adota a divisão em três sub-regras: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
2) Adotada principalmente pelos críticos do sopesamento como método de aplicação do direito, aceita apenas a análise da adequação e da necessidade, excluindo o sopesamento que a análise da proporcionalidade em sentido estrito implica.
3) Costuma identificar um elemento adicional: a análise da legitimidade dos fins que a medida questionada pretende atingir.
O autor irá utilizar dois casos já decididos pelo STF para analisar e
explicar cada umas das três sub-regras. São os casos:
Exemplo 1: ADC 9-6, racionamento de energia.
Exemplo 2: ADIn 855-2, pesagem de botijões de gás.
5.1. Adequação
No Brasil há um conceito de adequação que sugere que um meio é
adequado quando for "apto para alcançar o resultado pretendido". No
entanto, esse conceito não é o mais correto (esse erro tem origem na
incorreta tradução da palavra alemã fördern que foi traduzida como
“alcançar”, mas que na verdade significa “fomentar”). “Adequado,
então, não é somente o meio com cuja utilização um objetivo é
alcançado, mas também o meio com cuja utilização a realização de
um objetivo é fomentada, promovida, ainda que o objetivo não seja
completamente realizado”.
Exemplo 1: ADC 9-6, racionamento de energia
As medidas governamentais dos arts. 14 e 18 da MP 2152-2 (Tais
artigos “disciplinam as metas de consumo de energia elétrica e
preveem as sanções para aqueles que não as cumprirem A medida
que aqui interessa é a suspensão do fornecimento de energia
elétrica”) foram muito questionadas. Por esse motivo, o Presidente da
República propôs essa ação declaratória de constitucionalidade.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
36
“O teste da adequação da medida limita-se, como já visto, ao exame
de sua aptidão para fomentar os objetivos visados. O objetivo do
plano de racionamento de energia elétrica é [...] "compatibilizar a
demanda e a oferta de energia elétrica, de forma a evitar
interrupções intempestivas ou imprevistas do suprimento de energia
elétrica". É questionável se a previsão de suspensão do fornecimento
de energia elétrica, nos moldes previstos pela MP 2152-2, é medida
adequada - ou a mais adequada - para que sejam completamente
evitadas "interrupções intempestivas ou imprevistas do suprimento de
energia elétrica". Mas é inegável que, devido ao seu caráter
coercitivo, a medida pressiona os consumidores a economizar energia
elétrica e, ainda que, sozinha, não seja necessariamente capaz de
evitar as interrupções no fornecimento de energia, colabora para que
esse objetivo possa ser alcançado. Destarte, pode-se dizer que as
medidas previstas nos arts. 14 a 18 da MP 2152-2 são adequadas,
nos termos exigidos pela regra da proporcionalidade”.
Exemplo 2: ADIn 855-2, pesagem de botijões de gás
Uma lei do Estado do Paraná exigia que os botijões de gás fossem
pesados na presença do consumidor, para que possíveis variações no
peso do botijão vendido, ou possíveis sobras de gás no botijão
devolvido, fossem devidamente ressarcidas ou abatidas do preço do
botijão novo. O STF aceitou o argumento de que tal lei violaria os
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
“No exame da adequação deve-se indagar simplesmente se a medida
empregada promoveria a defesa do consumidor. Com base em
parecer do Inmetro, afirmou-se que não. Em primeiro lugar, porque o
tipo de balança necessária para a pesagem seria extremamente
sensível, desgastando-se facilmente, o que poderia acarretar
desregulagem. Em segundo lugar, porque a pesagem impediria que o
consumidor adquirisse o botijão em local distante do veículo, como é
feito frequentemente. Nenhum dos argumentos é, contudo, suficiente
para decretar a inadequação da pesagem para a proteção do
consumidor. Se a balança desregula-se facilmente, basta que haja
controle por parte do poder público. E o fato de o consumidor ter que
andar até o veículo para acompanhar a pesagem pode até ser
considerado incômodo, mas não altera em nada a efetividade da
medida. A medida pode, portanto, ser considerada adequada para
promover a defesa do consumidor, porque fomenta a realização dos
fins visados”.
5.2. Necessidade
“Um ato estatal que limita um direito fundamental é somente
necessário caso a realização do objetivo perseguido não possa ser
promovida, com a mesma intensidade, por meio de outro ato que
limite, em menor medida, o direito fundamental atingido”. Por
exemplo, o Estado adota uma medida M1, mas existe uma medida M2
que é tão adequada quanto M1 e limita menos o direito fundamental
que M1. Sendo assim, M1 não é necessária. O exame da necessidade
é comparativo, enquanto que o exame da adequação é absoluto.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
37
Exemplo 1: ADC 9-6, racionamento de energia
Na análise da necessidade das medidas dos arts. 14 a 18 da MP 2152-
2 é necessária a comparação dessas com outras medidas que possam
promover o mesmo objetivo com a mesma intensidade, mas que
limitem menos os direitos fundamentais em questão.
“Se uma pessoa P1 consumiu, em média, nos meses de maio, junho e
julho de 2000, 125 kWh de energia elétrica, e outra, P2, em moradia
idêntica, consumiu, no mesmo período, 250 kWh de energia elétrica,
não poderá P1 ultrapassar, a partir do início do racionamento de
energia, 100 kWh por mês, sob pena de ter seu fornecimento
suspenso (art. 14, II e §§ 2º e 4º da MP 2152-2), enquanto P2
poderá consumir até 200 kWh por mês, sem maiores consequências.
A limitação ao direito de igualdade perante a lei (CF, art. 5º, caput e
inc. I) parece evidente. Mas não só a igualdade é limitada pelo plano
de racionamento de energia. Também a livre iniciativa, quando esta
depende de fornecimento de energia que supere os limites fixados. O
direito ao trabalho, pelas mesmas razões. Em última análise, até
mesmo o direito a uma vida digna é limitado”.
Sendo assim, seria necessária uma análise minuciosa de medidas
alternativas (tão adequadas quanto e menos gravosas na restrição
dos direitos dos cidadãos), o que no caso não foi feito pelo STF.
Exemplo 2: ADIn 855-2, pesagem de botijões de gás
O direito fundamental que está sendo restringido, segundo a autora
da ação, é a liberdade de iniciativa. Sugeriu-se outra medida no lugar
da pesagem na presença do consumidor, o controle do peso dos
botijões por amostragem.
“Alega-se que os consumidores são protegidos e que as empresas
não se locupletam [enriquecem] com o que resta de gás nos botijões
recolhidos, porquanto tais sobras "são levadas em conta na fixação
dos preços pelo órgão competente, beneficiando, assim, toda a
coletividade dos consumidores finais".59 Mesmo em um cenário de
preços controlados, o argumento não é suficiente para decidir pela
desnecessidade da medida, uma vez que ela não exclui esse controle
por amostragem, mas a ele se soma. Caso a medida se destinasse
apenas a evitar locupletamento indevido por parte das empresas,
poder-se-ia argumentar que o controle por amostragem seria não só
menos restritivo à livre iniciativa, mas também tão ou mais eficiente
do que a pesagem na frente do consumidor. Mas a exigência de
pesagem tem também outra finalidade: proteger o consumidor
individualmente, para que ele não pague pelo que não recebeu. E,
para a consecução dessa finalidade, a exigência de pesagem é
certamente mais eficiente do que o controle por amostragem. Nesse
sentido, a exigência de pesagem na presença do consumidor pode ser
considerada como necessária, nos termos da regra da
proporcionalidade”.
5.3. Proporcionalidade em sentido estrito
A proporcionalidade em sentido estrito “consiste em um sopesamento
entre a intensidade da restrição ao direito fundamental atingido e a
importância da realização do direito fundamental que com ele colide e
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
38
que fundamenta a adoção da medida restritiva”. A
desproporcionalidade no sentido estrito ocorre quando as razões que
fundamentam a adoção de uma medida não possuem “peso
suficiente” para a justificação da limitação do direito fundamental que
na questão seria atingido.
Exemplo 1: ADC 9-6, racionamento de energia
Tendo em vista a relação de subsidiariedade entre as sub-regras da
proporcionalidade, como anteriormente se chegou a conclusão de que
a medidas previstas pelos arts. 14 e 18 não são necessárias, logo não
se precisa verificar se há nessas medidas a proporcionalidade no
sentido estrito.
Exemplo 2: ADIn 855-2, pesagem de botijões de gás
“Na análise da proporcionalidade em sentido estrito deve ser
questionado se a proteção ao consumidor justificaria essa pequena
limitação à liberdade de iniciativa. A resposta parece óbvia, e não foi
à toa que me referi à limitação à liberdade de iniciativa, nesse caso,
como pequena. A proteção ao consumidor parece ter um peso maior
do que uma restrição mínima à liberdade de iniciativa. O Supremo
Tribunal Federal, no entanto, decidiu de forma diversa”.
6. A regra da proporcionalidade no direito brasileiro
Apesar das opiniões de inúmeros juristas qualificados, no sentido de
se buscar uma fundamentação jurídico-positiva no ordenamento
brasileiro da regra da proporcionalidade, para Virgílio Afonso essa
busca é infrutífera.
Para ele, a exigibilidade da regra da proporcionalidade decorre da
própria estrutura dos direitos fundamentais. “Se se admite que a
grande maioria dos direitos fundamentais são princípios, no sentido
defendido por Robert Alexy, analisado brevemente no tópico 2,
admite-se que eles são mandamentos de otimização, isto é, normas
que obrigam que algo seja realizado na maior medida possível, de
acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. E a análise da
proporcionalidade é justamente a maneira de se aplicar esse dever de
otimização ao caso concreto. É por isso que se diz que a regra da
proporcionalidade e o dever de otimização guardam uma relação de
mútua implicação”.
As possibilidades fáticas se referem às medidas concretas que podem
ser utilizadas para a promoção e a proteção dos direitos
fundamentais. Há um princípio P1 e para o seu fomento as medidas
M1 e M2 (igualmente adequadas). Mas se M1 restringe outro direito
fundamental P2, a otimização do princípio P2 exigirá que seja aplicada
a medida M2. Isso nada mais é do que uma análise da sub-regra da
necessidade.
“Quando dois ou mais direitos fundamentais colidem, a realização de
cada um deles depende do grau de realização dos demais e o
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
39
sopesamento entre eles busca atingir um grau ótimo de realização
para todos. A otimização de um direito fundamental, nesse caso, vai
depender das possibilidades jurídicas presentes, isto é, do resultado
do sopesamento entre os princípios colidentes, que nada mais é do
que a sub-regra da proporcionalidade em sentido estrito”.
7. Conclusão
(obs.: aqui só copiei do texto os trechos que julgava mais
importantes)
1. Proporcionalidade e razoabilidade não são sinônimos. Enquanto
aquela tem uma
estrutura racionalmente definida, que se traduz na análise de suas
três sub-regras (adequação, necessidade e proporcionalidade em
sentido estrito), esta ou é um dos vários topoi dos quais o STF se
serve, ou uma simples análise de compatibilidade entre meios e fins;
2. Na forma como discutida neste artigo, a regra da
proporcionalidade tem origem na jurisprudência alemã, e não na
jurisprudência inglesa ou norte-americana;
3. A aplicação da regra da proporcionalidade pelo Supremo Tribunal
Federal consiste
apenas em um apelo à razoabilidade;
4. As sub-regras da proporcionalidade guardam uma relação de
subsidiariedade, o que
significa dizer que nem sempre será necessária a aplicação de todas
elas;
5. Para que uma medida seja considerada adequada, nos termos da
regra da
proporcionalidade, não é necessário que o seu emprego leve à
realização do fim pretendido, bastando apenas que o princípio que
legitime o objetivo seja fomentado;
6. A regra da proporcionalidade não encontra seu fundamento em
dispositivo legal do
direito positivo brasileiro, mas decorre logicamente da estrutura dos
direitos fundamentais como princípios jurídicos;
7. Se se aceita, portanto, a definição de princípio jurídico como
mandamento de otimização, necessário é também aceitar a aplicação
da regra da proporcionalidade, pois ambos guardam uma relação de
implicação.
Dizer que a regra da proporcionalidade decorre de uma posição
teórica acerca da estrutura dos direitos fundamentais, e não de uma
norma de direito positivo ou do Estado de Direito, significa também
esvaziar um pretenso caráter universal dessa regra. Para aqueles que
sustentam que a exigência de proporcionalidade é decorrência do
Estado de Direito ou do devido processo legal, resta a tarefa de
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
40
justificar a sua não utilização, por exemplo, pela Suprema Corte dos
Estados Unidos, ou por qualquer outro tribunal de países onde,
inegavelmente, vige um Estado de Direito.
Que fique claro, pois, que se cobra apenas coerência nos julgados no
STF, e não a aplicação da regra da proporcionalidade. Se o Supremo
Tribunal Federal, por ter outra concepção acerca da estrutura dos
direitos fundamentais ou da forma de controlar a colisão entre eles,
sustentasse que a regra da proporcionalidade não é aplicável ao caso
brasileiro, poder-se-ia criticar essa concepção, mas não a sua
coerência. Mas, a partir do momento em que o STF sustenta que a
regra da proporcionalidade tem "fundamental importância para o
deslinde constitucional da colisão de direitos fundamentais", e assim o
faz não com o intuito de se manter meramente no plano retórico, isto
é, de recorrer a um topos - como acontece quando menciona o
princípio da razoabilidade -, mas com o expresso intuito de ir além, e
passar para o plano da aplicação sistemática e estruturada de um
modelo pré-existente, é de se esperar, então, que dele seja cobrada
coerência.
CASO ELLWANGER
O CASO
Siegfried Ellwanger foi acusado de prática do crime de
racismo contra o povo judeu, em razão do teor de sua obra
“Holocausto – Judeu ou Alemão? Nos Bastidores da Mentira do
Século”, que retrata o holocausto como algo inventado pelos
judeus, e não como histórico que realmente ocorreu. Assim, ainda
que o autor busque qualificar-se como historiador revisionista,
acredita-se tratar-se de obra com conteúdo antisemita.
VOTO (VISTA) – GILMAR MENDES
Princípio da proporcionalidade
- A liberdade de informação deve ser exercida de modo compatível com o direito à imagem, à honra e à vida privada (CF, 5o, X), de modo que, para o Min. Gilmar Mendes, tal dispositivo não só legitima, como também reclama eventual intervenção estatal a fim de se proteger tais valores.
o A liberdade de expressão, portanto, não se afigura absoluta, encontrando limites em valores outros como os da igualdade e da dignidade humana (que, no caso em apreço, são “atingidos” pelas manifestações de conteúdo discriminatório ou de conteúdo racista)
- Descrição da Teoria de Alexy Princípio da Proporcionalidade: oferece um método para a solução geral de conflitos entre princípios.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
41
“(...) a aplicação do princípio da proporcionalidade
se dá quando verificada restrição a determinado
direito fundamental ou um conflito entre distintos
princípios constitucionais de modo a exigir que se
estabeleça o peso relativo de cada um dos direitos
por meio da aplicação das que integram o
mencionado principio da proporcionalidade. São três
as máximas (...): adequação, necessidade e a
proporcionalidade em sentido estrito”.
1. Adequação: a condenação é adequada para se alcançar o fim de salvaguardar uma sociedade pluralista, onde reina a tolerância. (dignidade, pluralismo, repudio ao terrorismo e ao racismo)
2. Necessidade: ausência de outro meio menos gravoso e igualmente eficaz, a partir da própria definição constitucional (que determina a imprescritibilidade do crime de racismo).
3. Proporcionalidade em sentido estrito: proporcionalidade entre objetivo (preservação dos valores inerentes à sociedade plural e à dignidade) e o ônus imposto à liberdade de expressão. É inegável que a liberdade não possa alcançar a intolerância racial e estímulo à violência.
- VOTO: Negou o habeas corpus
VOTO – MARCO AURÉLIO
- A liberdade de expressão presta-se a construir uma sociedade democrática; contudo, ainda que forme o núcleo essencial do princípio democrático, não pode ser caracterizada como um direito absoluto, livre de qualquer restrição ou acomodação.
- Contudo, tal restrição não pode ser pautada em mera alegação de que a opinião manifestada seja racista ou discriminatória; devem existir elementos concretos para a limitação.
- Teoria de Alexy: o choque de princípios encontra solução na dimensão do valor, a partir do critério da “ponderação”, que possibilita um meio-termo entre a vinculação e a flexibilidade dos direitos.
o A ponderação é feita no caso concreto, de modo que não é correto se fazer um exame entre liberdade de expressão e proteção da dignidade humana de forma abstrata e se tentar extrair daí uma regra geral. Logo, atentar-se para a realidade brasileira é imprescindível.
- Argumentos: 1. Ellwanger instigou ou incitou à prática de
racismo? Existem dados concretos que demonstrem, com segurança, esse alcance? Para o Min. Marco Aurélio, não.
“(...) confesso que não identifiquei
qualquer manifestação a induzir o
preconceito odioso no leitor. Por óbvio, a
obra defende uma ideia que causaria
repúdio imediato a muitos (...), mas a
defesa de uma ideologia não é crime, e
por isso, não pode ser apenada”.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
42
2. O conteúdo de um livro não é transmitido ao leitor independentemente de sua vontade, ou seja, só se prolifera a partir do momento em que a sociedade seja tendente a aceitá-lo.
3. A sociedade brasileira não é predisposta a discriminar os judeus, o que se depreende por mera análise histórica.
a. Seria mais defensável a proibição de um livro que versasse sobre o tema da integração do negro, do índio ou do nordestino preconceito arraigado na sociedade.
Princípio da proporcionalidade
- reexamina as três máximas, de uma maneira distinta daquela traçada pelo Min. Gilmar Mendes.
1. Adequação: proibir a publicação, apreender e destruir as obras editadas não são meios adequados para acabar com o risco de se incitar à discriminação.
2. Necessidade: o menos gravoso é garantir a liberdade de expressão, já que sua restrição não garantirá a conservação da dignidade do povo judeu.
3. Proporcionalidade em sentido estrito: não é razoável restringir-se determinada manifestação de opinião por meio de um livro se inexiste, na sociedade brasileira, mínimos indícios de que o livro causará qualquer impacto.
CONFIRMAÇÃO DE VOTO – CELSO MELLO
- O direito à liberdade de expressão do pensamento não se reveste de caráter absoluto, pois sofre limitações de natureza ética e de caráter jurídico. Os abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento, quando praticados, legitimarão, sempre a posteriori, a reação estatal, expondo aqueles que os praticarem a sanções jurídicas, de índole penal ou de caráter civil.
- No caso em apreço, contudo, Ellwanger não goza de um “direito à liberdade de expressão”. Isto porque tal prerrogativa não se destina a proteger manifestações de natureza criminosa (como a praticada no caso, em sua opinião).
o Não há, pois, de um conflito de direitos básicos titularizados por sujeitos distintos, nem um confronto entre liberdades e prerrogativas asseguradas pela Constituição.
- Inclui, em seu voto, diversos trechos do livro a fim de demonstrar a incitação ao ódio público contra o povo judeu, o que configuraria crime de racismo (tipificado, seja pela lesão propriamente efetivada, ou pelo mero perigo de lesão).
CONFIRMAÇÃO DE VOTO – CARLOS BRITTO
- Mantém-se favorável ao habeas corpus, porque: o O livro seria um ataque ao sionismo (que, por sinal, é
considerado racista), logo, quem critica um movimento racista, não pode ser racista.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
43
o Provocando o livro leituras tão diversas, não se pode minar sua circulação. (“A população tem o direito de fazer o seu julgamento”)
VOTO – MARCO AURÉLIO
- abre seu voto trazendo duas passagens de natureza histórica, a fim de ilustrar um prejuízo intelectual decorrente da proibição.
o Rui Barbosa, quando queima todos os documentos referentes à escravidão, na tentativa, falha, de apagar esse instituto da memória nacional
o Index, impedindo a circulação de livros contrários à doutrina católica.
- Liberdade de expressão e Estado Democrático de Direito:
“(...) os direitos fundamentais localizam-se na
estrutura de sustento e de eficácia do princípio
democrático. Nesse contexto, o específico direito
fundamental da liberdade de expressão exerce
um papel de extrema relevância, insuplantável,
em suas mais variadas facetas: direito de
discurso, direito de opinião, direito de imprensa,
direito à informação e a proibição de censura.
(...) promovem a autonomia individual e formam
o ambiente plural de participação democrática.”
- Destaca, ademais, que a proteção à liberdade de expressão garante não só o amadurecimento político e social do país, mas permite o controle do exercício do Poder Público (por
meio, por exemplo, de uma crítica desimpedida aos programas de governo e aos rumos políticos do país). a restrição “as opiniões discordantes ou minoritárias, enclausura a sociedade em uma redoma que retira o oxigênio da democracia e, por consequência, aumenta o risco de se ter um povo dirigido, escravo dos governante e da mídia”.
- A condenação do pensamento manifestado, e a consequente configuração do crime de racismo só seria possível se Ellwanger distribuísse panfletos, nos quais as mensagens fossem: “morte aos judeus”, “vamos expulsar estes judeus do país”.
Caso Elwanger
O texto é formado por fragmentos de um acórdão em que o STF julga
o pedido de habeas corpus de um homem que foi condenado em 1ª e
2ª instância em razão de crime de racismo, praticado através da
publicação de um livro com notáveis colocações antissemitas.
Permeia o debate uma discussão quanto à imprescritibilidade do
crime de racismo, pois o livro já havia sido publicado em várias
edições a décadas. De acordo com os outros ministros, Moreira Alves,
cujo voto não consta no trecho selecionado do acórdão, teria
concedido o habeas corpus por considerar inconstitucional a
imprescritibilidade do racismo e, portanto, julgar o crime praticado
como prescrito.
Entretanto, o grande debate se dá quanto à colisão entre os princípios
da liberdade de expressão e a dignidade humana. O voto de Gilmar
Mendez é bastante simples: ele descreve a teoria de Alexy sobre a
natureza dos princípios (mandamentos de otimização) e a forma de
solucionar as colisões entre os mesmos (princípio da
proporcionalidade, que Alexy chama de máxima). Ressalta o fato de
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
44
não poder haver uma preponderância pré-concebida entre os dois
princípios, já que ambos são importantes para o Estado Democrático
de direito. Faz o caminho dos três requisitos da proporcionalidade,
como manda a Alexy. A medida (prisão de Elwanger) é adequada
para proteger o princípio da dignidade humana, a proteção da
tolerância em uma sociedade pluralista. É necessário, pois com
certeza não há medida tão eficaz quanto proibir a venda do livro,
confiscar as cópias já produzidas e punir penalmente o agressor. É,
por fim, proporcional, pois justifica-se uma pequena restrição a
liberdade de expressão em oposição à relevância da proteção da
tolerância racial. Portanto Gilmar Mendes denega o pedido.
Marco Aurélio inicia seu voto exaltando a importância da liberdade de
expressão, concluindo porém ao fim que não é um direito absoluto.
Inclina-se para a aceitação do pedido, devido à vários fatores. O
primeiro é o fato de não ter identificado nenhum trecho que denota
claramente a consideração de que judeus fossem uma raça inferior.
Além disso, não há uma perseguição histórica a judeus no Brasil como
houve em outros países, e a chance de um livro como este incitar a
violência a ponto de presenciarmos atitudes neonazistas é
insignificante. Seria mais justificável no caso do Brasil a proibição da
censura de um livro contra os negros, por exemplo. O livro é uma
fonte de expressão que ninguém entra em contato a não ser por
vontade própria (diferentemente de um comercial de TV ou um
outdoor). O livro simplesmente dá uma versão diferente de um fato
histórico, e a ciência funciona assim: através da contestação, e não
da imposição de verdades absolutas. Impedir que as pessoas deem
versões diferentes de um fato, ainda que as consideremos absurdas,
seria afirmar nossa infalibilidade. Em seguida, Marco Aurélio repete a
teoria de Alexy, para dizer que a medida não foi adequada, nem
necessária e nem proporcional. Faz isto, porém de forma muito
resumida e pouco rigorosa, apenas para dar um arcabouço teórico à
sua argumentação.
O ministra Celso de Mello começa seu voto idêntico a Marco Aurélio:
elogia insistentemente a liberdade de expressão e depois diz que não
é direito absoluto. Celso foca na questão criminal: se o ato praticado
pelo paciente (aquele que pede Habeas corpus) é crime, não há o que
se discutir. Caso contrário, todos os tipos penais que possuem clara
conotação de restrição à liberdade de expressão (difamação, calúnia,
injúria) seriam extremamente frágeis. Qualquer utilização da liberdade
de expressão que implica crime é uma restrição previamente colocada
pelo legislador que deve ser seguida. Celso de Mello coloca vários
trechos que demonstram a incitação à violência com fundamentos
racistas, do tipo “povos antijudaicos do mundo, uni-vos” ou “mais vale
o sacrifício de algumas centenas de milhares de judeus do que um
prejuízo no bolso”. O crime de racismo, previsto em lei especial
(7.786/89) e fundamentada no Art.5º, inc. XLII tipifica não só a lesão,
mas também o perigo de lesão (“ofensa”), de modo que é irrelevante
se o livro resultou ou vai resultar em agressões diretas aos judeus.
Já o ministro Carlos Britto foi na mesma linha de Marco Aurélio,
aceitando o habeas corpus. Trouxe novos argumentos interessantes.
Segundo ele, o livro seria um ataque direto ao sionismo, que é
condenado por muitos como um movimento racista por parte dos
judeus. Quem critica um movimento racista não é por sua vez racista.
Se os próprios ministros do STF tem dúvida sobre a natureza racista
do livro, o mais prudente a fazer é deixar a veiculação, pois se o
racismo fosse escancarado não estaria havendo essa discussão. Cita
uma frase de Voltaire: ”não concordo com uma só palavra que dizeis,
mas defenderei até a morte vosso direito de dizê-las”.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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Por fim, temos o voto final de Marco Aurélio, exaltando
insistentemente o valor da liberdade de expressão no Estado
Democrático de Direito e a sua consciência de que, embora a decisão
vem pelo voto da maioria, a corrente minoritária também participa da
formação das opiniões: daí a importância de votar em favor do
habeas corpus ainda que seja voto vencido. Daí também permitir a
divulgação de livro, pois ainda que a maioria das pessoas não
concordem com o que está escrito, será um incentivo para uma
apuração mais detalhada do ocorrido no holocausto. A humanidade só
aprende com o passado na medida em que mantém livre as
lembranças, e não enterrando determinados fatos e proibindo a
discussão para que se torne um capítulo esquecido da humanidade.
Novamente, negar a expressão de outra versão dos fatos é negar a
própria falibilidade humana.
Texto Owen M. Fiss
Nos EUA têm surgido novas discussões sobre a liberdade de
expressão. Esse país, que tem sido extremamente liberal nesse
sentido, agora está dividido em torno dos temas sobre discurso
odioso, pornografia e financiamentos milionários de campanhas.
A 1ª emenda à constituição diz que o Congresso não pode fazer leis
que comprometam a liberdade de expressão. Como o Congresso tem
ficado imóvel nessas questões, pequenas restrições à liberdade foram
feitas por parte do poder Judiciário, sob a fundamentação de que a
14ª emenda, que garante a igualdade, também deve ser levada em
conta.
A única grande restrição a essa liberdade promovida pelo governo
aconteceu na Guerra Fria, quando o discurso comunista foi proibido. A
fundamentação seguia a seguinte ordem: a disseminação de ideias
comunistas levará a uma posterior supressão, não só da liberdade de
expressão, como de todas as outras liberdades, em nome da
promoção de uma igualdade insuportável.
Embora muitos comparem esse fato histórico à discussão atual, hoje a
situação é mais delicada, tanto que os próprios liberais estão divididos
quanto à solução do problema.
O que acontece é que não existe uma discussão entre liberdade e
igualdade, embora esta possa permear o debate. A dúvida principal
está no seio da própria liberdade de expressão. A liberdade total de
expressão de alguns tem suprimido a expressão de outros:
1) No caso do discurso de ódio, que seria a expressão pública de
ideias racistas, tem colocado os grupos minoritários criticados
em um descrédito e desprezo tão grande, que ninguém mais
leva em conta sua opinião no debate público.
2) Na pornografia, a veiculação de materiais que colocam as
mulheres como objetos sexuais faz com que os homens
deixem de levar a sério as ideias femininas.
3) O esquema atual de financiamento de campanha faz com que
os ricos tenham muito mais condições de influenciar o debate
público do que os pobres.
Como a expressão de alguns tem suprimido a expressão de outros no
âmbito do debate público, a tendência é que todo o aparato estatal
deixe de levar em conta os interesses destes grupos, portanto as
novas leis e novas políticas levarão a uma exclusão cada vez maior.
Percebam que a regulamentação da liberdade de expressão é agora
uma forma de promover a liberdade.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
46
Portanto, a discussão que se trava no próprio seio do liberalismo é
quanto ao papel do Estado. Enquanto tradicionalmente o Estado, por
ser dotado de grande força coercitiva, foi visto como inimigo das
liberdades públicas, hoje se enxerga a possibilidade de usar essa
força coercitiva em defesa das liberdades. A regulamentação pode até
restringir alguns âmbitos de liberdade, mais permite coibir abusos e
distorções naturais da vida pública, promovendo uma liberdade mais
abrangente.
Nos estudos americanos usa-se muito a expressão do Estado como
“parliamentarian”. Significa que o Estado deve se portar como um
bom parlamentar que ouve todas as opiniões. Portanto talvez seja a
hora do Estado dizer: “Ricos, racistas e empresários da pornografia, já
ouvimos bastante as suas opiniões, então precisamos agora do
silêncio de vocês para ouvir outras opiniões.”.
SEMINÁRIO 10 – ACÓRDÃO CÉLULAS TRONCO – ADI
3.510/DF
Pg. 134 a 141:
Trata-se de ADIn contra a lei de biossegurança
(11.105/05), que em seu art. 5º regulamenta pesquisas com
células tronco embrionárias, permitindo seu uso em pesquisas
com fins terapêuticos. Não se admite que isso signifique uma
violação do direito à vida, nem que seu uso configure aborto.
Essa lei fomenta direitos fundamentais, por pretender assegurar
uma vida digna, por meio da garantia do direito à saúde e ao
planejamento familiar. Considera-se que uma interpretação
conforme a Constituição seria descabida nesse caso, por
significar um controle desnecessário que impediria tais
pesquisas. Julga-se então pela improcedência total da ação.
I) As células tronco-embrionárias são células
encontradas em cada embrião humano de até 14 dias
e, para outros, apenas aquelas presentes na fase de
blastocisto. Não cabe ao STF decidir se a pesquisa
com células-tronco adultas é ou não mais promissora
do que aquela feita com células tronco embrionárias,
entendo-as como complementares.
II) Tal pesquisa visa o enfrentamento e cura de doenças
que degradam a vida de parte da população, portanto
não significa um desprezo pelo embrião in vitro, e sim
um meio que pode ajudar na superação do infortúnio
alheio. Considerando que nossa Constituição apregoa
"a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça" como
valores supremos de nossa sociedade, tal pesquisa
não fere o direito à vida, nem a dignidade humana,
mas permite o exercício dos direitos à felicidade e do
viver com dignidade, numa celebração solidária da
vida, se legitimando em nosso contexto de
“constitucionalismo fraternal”. (Ministro Celso de
Mello)
III) Dada a inexistência de disposição sobre o marco
inicial da vida humana em nossa CF, percebe-se que
não se faz de qualquer estágio da vida um bem
jurídico autônomo. O embrião referido na Lei de
Biossegurança (in vitro, apenas) não é uma vida a
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
47
caminho de outra vida virginalmente nova, porquanto
lhe faltam possibilidades de ganhar as primeiras
terminações nervosas, sem as quais o ser humano
não tem factibilidade como projeto de vida autônoma.
A potencialidade de algo para se tornar pessoa
humana já merece proteção jurídica, mas apenas
infraconstitucionalmente.
IV) Nem todo embrião humano desencadeia uma
gestação igualmente humana, em se tratando de
experimento in vitro. A Lei de Biossegurança não
veicula autorização para extirpar o embrião do corpo
feminino, portanto, nesse caso, não se cuida de
interromper gravidez humana, pois ela aqui não se
pode cogitar. Conclui-se então que "a controvérsia
constitucional em exame não guarda qualquer
vinculação com o problema do aborto." (Ministro
Celso de Mello).
V) Em nossa sociedade, há conjugação constitucional
entre a laicidade do Estado e o primado da
autonomia da vontade privada, nas palavras do
Ministro Joaquim Barbosa, de modo que a opção do
casal por um processo in vitro é protegida, sem que
isso acarrete para o este o dever jurídico de
aproveitamento reprodutivo de todos os embriões
viáveis, dado também a existência dos direitos ao
planejamento familiar e à maternidade. Tal
imposição poderia violar o instituto do planejamento
familiar, na perspectiva da paternidade responsável e
também significaria tratar o gênero feminino de
maneira degradante, por impor a maternidade. Nessa
situação, o princípio fundamental da dignidade
da pessoa humana opera por modo binário: de
um lado, é protegido quando se dá ao casal esse
poder de escolha, de outro, ao contemplar os
porvindouros componentes da unidade familiar.
Assim, para que ao embrião in vitro fosse reconhecido
o pleno direito a vida, necessário seria reconhecer a
ele o direito a um útero, proposição não autorizada
pela Constituição.
VI) O direito à saúde, positivado como um dos primeiros
dos direitos sociais de natureza fundamental (art. 6º
da CF) é garantido mediante ações e serviços
qualificados como "de relevância pública" (art. 197,
CF). Nesse sentido, a Lei de Biossegurança se revela
um instrumento capaz de conjugar o direito à saúde
com a própria Ciência.
VII) A lei de Biossegurança representa um meio de
densificação do direito constitucional à liberdade de
expressão científica. O termo "ciência", enquanto
atividade individual, figura dentre os direitos
fundamentais da pessoa humana (inciso IX do art. 5º,
da CF). Assim, nesse caso, há compatibilização da
liberdade de expressão científica com os deveres
estatais de propulsão das ciências que sirvam a
melhoria das condições de vida para todos os
indivíduos. (Ministra Cármen Lúcia).
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
48
VIII) A Lei de Biossegurança revela-se uma regração legal
livre de arbitrariedades num assunto tão polêmico.
Partindo do pressuposto da intrínseca dignidade de
toda forma de vida humana, ou que tenha
potencialidade para tanto, adota cautelas e
restrições suficientes quanto à condução de
pesquisas com células-tronco embrionárias.
IX) Julga-se pela improcedência total da ação,
afastando-se o uso da técnica de "interpretação
conforme", pela inexistência de pressupostos para sua
aplicação, já que a lei em questão não padece de
polissemia nem de plurissignificatividade. Não se
justificariam, portanto, restrições tendentes a
inviabilizar as pesquisas com células-tronco
embrionárias.
*Foram votos vencidos os ministros: Menezes Direito, Ricardo
Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e o presidente Gilmar
Mendes. Os demais votaram de acordo com o relator Ayres
Britto.
Pg. 324:
Pronunciamento (explicação) do Sr. Ministro Presidente Gilmar
Mendes, que ressalta a relevância do debate e cita Alexy ao
dizer que “o parlamento representa o cidadão politicamente, o
tribunal constitucional, argumentativamente”, afirmando que a
jurisdição constitucional justifica-se justamente por esse
processo reflexivo-argumentativo.
Pg. 449 a 460:
Voto do Eros Grau:
Cita a importância do pedido de vista do Ministro Carlos Alberto,
para poder refletir e formular seu voto sem influência de
emoção. Embora reconheça que a Corte deva acatar a
Constituição, afirma que o intérprete do Direito não se limita a
debruçar-se sobre os textos do dever ser, devendo atentar
também à realidade, aos movimentos dos fatores reais do
poder, ao momento histórico, o que fará que transponha a
esfera textual para a esfera normativa. Embora admita
influência de concepções pessoais nos votos da maioria dos
juízes, afirma que a fundamentação será sempre jurídica,
destacando que seu voto será guiado pela análise do direito à
vida e à dignidade humana. Fala que, embora tal questão
seja frequentemente apresentada como um embate entre
religião e ciência, se revela um embate entre religião e religião,
dado o tamanho dogmatismo que a ciência por vezes adota,
substituindo a razão científica por inesgotável fé na ciência,
transformando-a em expressão de fanatismo religioso. Esse
posicionamento científico sempre favorável a pesquisas,
segundo ele, leva à conclusão equivocada de que, caso fossem
impedidas, estaria se pondo obstáculos à cura imediata de
doenças.
Inicialmente, analisa a proposição do CC de 2002 que, em seu
artigo 2º, define que "a personalidade civil da pessoa começa
do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a
concepção, os direitos do nascituro". Afirma então que, dado
que a lei civil confere ao nascituro um curador e que a lei penal
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
49
o protege cominando penas ao crime de aborto, o nascituro
(incluindo-se aí o embrião) seria, sim, sujeito de direito.
Para ele, bastariam então tais razões para encaminhar a
conclusão de que a utilização de células-tronco obtidas de
embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não
usados no respectivo procedimento afronta o direito à vida e à
dignidade da pessoa humana. No entanto, como o termo
embrião pode ter diferentes conotações, é necessário que
sua argumentação não se finde aí. Assim, no contexto do artigo
5º da Lei n. 11.105/05, embrião é óvulo fecundado fora do
útero, portanto, nesse caso, embrião não corresponde a um ser
em processo de desenvolvimento vital, em um útero, de
maneira que não há vida humana no óvulo fecundado fora de
um útero que o artigo 5º da Lei n. 11.105/05 chama de
embrião, não havendo sentido cogitar, em relação a esses
"embriões", nem vida humana a ser protegida, nem dignidade
atribuível a alguma pessoa humana.
Afirma também que tal lei pode promover a dignidade da
pessoa humana na medida em que potencialmente permitirá a
evolução dos métodos de tratamento médico do ser
humano e o aprimoramento da sua qualidade de vida, o que o
fará concluir pela constitucionalidade do artigo 5º da Lei
n. 11.105/05.
Mas não se trata de uma decisão irrestrita, e sim cautelosa,
sendo preciso estabelecer alguns limites para impedir
manipulação genética e impedir que se abra precedente
favorável ao aborto, pois há nítida distinção entre a destruição
da vida (no aborto) e o que pode vir a ser a construção da vida
(na pesquisa em torno das células tronco), de modo que não se
abra espaço para um processo de reificação da vida.
Tendo em vista o caráter aberto da ação direta de
inconstitucionalidade, uma interpretação conforme a
Constituição conduziria à declaração de inconstitucionalidade.
Mas não é recomendável, contudo, que os riscos supracitados
sejam dessa forma combatidos. Vota então pela
constitucionalidade do artigo, numa decisão aditiva,
visando a superar a incompletude. Assim, i) pesquisa e terapia
mencionadas serão empreendidas unicamente se previamente
autorizadas por comitê de ética e pesquisa do Ministério da
Saúde (e não apenas das próprias instituições de pesquisa e
serviços de saúde), II) proíbe-se a seleção genética, admitindo-
se a fertilização de um número máximo de quatro óvulos por
ciclo e a transferência, para o útero da paciente, III) a obtenção
de células-tronco a partir de óvulos fecundados será admitida
somente quando dela não decorrer a sua destruição, salvo
quando se trate de óvulos fecundados inviáveis.
Pg. 596 a 600:
Trecho do voto de Gilmar Mendes.
Afirma que as discussões focaram-se na coletividade e nas
decisões democráticas, considerando suas complicações
éticas, jurídicas e morais, por nossa sociedade ter como lastro
os valores de vida e dignidade humana.
Destaca o caráter contra majoritário do Superior Tribunal, o
que permite que essa decisão judicial supere os dissensos da
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
50
sociedade. Pontua o posicionamento da Suprema Corte em
questões em que o Legislativo se omite. Contra o argumento de
que os juízes podem se influenciar por suas próprias
concepções, cita Dworkin, que afirmou que “os EUA são uma
sociedade mais justa do que teriam se seus direitos
constitucionais tivessem sido confiados à consciência de
instituições majoritárias” (como o Parlamento, p. ex.). Defende
que uma atuação passiva do Judiciário poderia piorar essas
questões, mostrando que o Supremo pode ser também uma
“casa do povo”, ao lidar com um pluralismo político, ético e
religioso.
Nesse caso, tal debate foi fomentado pela realização de
audiências públicas e amicus curiae, reconhecendo-se aí
legitimidade democrática. Para tanto, cita Alexy ao dizer "O
princípio fundamental: „todo poder estatal origina-se do povo‟
exige compreender não só o parlamento, mas também o
tribunal constitucional como representação do povo. A
representação ocorre, de certo, de modo diferente. O
parlamento representa o cidadão politicamente, o tribunal
argumentativamente. Com isso, deve ser dito que a
representação do povo pelo tribunal constitucional tem um
caráter mais idealístico do que aquela pelo parlamento. A vida
cotidiana do funcionamento parlamentar oculta o perigo de que
maiorias se imponham desconsideradamente, emoções
determinem o acontecimento, dinheiro e relações de poder
dominem e simplesmente sejam cometidas faltas graves. Um
tribunal constitucional que se dirige contra tal não se dirige
contra o povo senão, em nome do povo, contra seus
representantes políticos. Ele não só faz valer negativamente que
o processo político, segundo critérios jurídico-humanos e
jurídico-fundamentais, fracassou, mas também exige
positivamente que os cidadãos aprovem os argumentos do
tribunal se eles aceitarem um discurso jurídico-constitucional
racional. A representação argumentativa dá certo quando o
tribunal constitucional é aceito como instância de reflexão do
processo político. Isso é o caso, quando os argumentos do
tribunal encontram eco na coletividade e nas instituições
políticas, conduzem a reflexões e discussões que resultam em
convencimentos examinados. Se um processo de reflexão entre
coletividade, legislador e tribunal constitucional se estabiliza
duradouramente, pode ser falado de uma institucionalização
que deu certo dos direitos do homem no estado constitucional
democrático. Direitos fundamentais e democracia estão
reconciliados." Verifica-se então a legitimidade da decisão
tomada.
SEMINÁRIO 11/1: Princípio é Preguiça? – Carlos Ari Vieira Sundfeld 1. INTRODUÇÃO Atualmente no direito público brasileiro, princípios vagos
podem ser usados para justificar qualquer decisão, sendo que o objetivo do texto é posicionar-se contrariamente a essa deterioração da qualidade do debate jurídico.
Ao deliberar com base em textos normativos extremamente indeterminados, ou seja, princípios, o juiz precisa ter o ônus da competência e o ônus do regulador.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
51
2. O QUE SÃO PRINCÍPIOS Fala-se de princípios para designar casos extremos de
indeterminação normativa; são princípios textos que somos levados a entender como normativos, mas com conteúdo tão escasso que não é capaz de nos revelar a norma que os textos supostamente contêm.
- Ex. a administração pública está sujeita aos princípios de “moralidade” e “eficiência”. A incerteza quanto ao conteúdo a ser extraído dessas palavras é enorme, pois há pouco texto, poucos elementos para identificar uma hipótese e um mandamento.
Problema: se a norma não está no texto, será este mesmo uma norma, ou seja, o Estado estará juridicamente obrigado a fazer algo em nome da garantia de direitos tutelados por princípios? Se sim, onde está a norma para especificar as garantias que o Estado deve fornecer? Quem a decifra?
O termo “princípio”, no direito, tem dois significados: 1) O de norma inicial (princípio x fim); normas iniciais,
insuficientes, indeterminadas, cujo conteúdo precisa ser especificado por outras normas, as finais, para que elas possam funcionar.
2) O de norma principal (principal x secundário); norma importante, relevante.
Nesse texto, todas as afirmações sobre princípios consideram o primeiro sentido da palavra.
Os princípios não precisam necessariamente ser escritos, sendo chamados de princípios implícitos, mas estes proporiam o desafio maior de sua identificação. Porém, esse desafio não se materializa, já que o que se reconhece como princípios implícitos são os lugares-comuns, como “segurança jurídica”, “boa-fé” e “proporcionalidade”, os quais não vale a pena negar.
Também é importante ressaltar os princípios ocultos, que são princípios culturais, derivados de ideias vagas sobre a ordem da política, da economia, da vida, etc., ideias essas divulgadas por juristas e das quais se procura extrair efeitos normativos, mesmo que não sejam apresentadas com o nome de princípios jurídicos.
- Ex. “Poder de polícia”: nunca houve no BR uma lei geral ou princípio prevendo um “poder geral de polícia”, mas isso não impediu que o STF, citando juristas, o utilizasse para referendar medidas arbitrárias de autoridades.
Textos ocos podem ser considerados plenos de conteúdo se, existindo prática e consenso anteriores em torno do sentido dos termos que utilizam, os aplicadores acordarem em reconhecer normatividade também a esses elementos externos (prática e consenso).
- Ex. A Petrobrás conseguiu especificar na CF que o “petróleo é monopólio da União”, visando dominar sozinha o setor. O objetivo foi alcançado devido ao fato de a palavra “monopólio” já ter tido seu sentido bem elaborado pela experiência e legislação prévias. Os negros, porém, conseguiram inserir na constituição o seguinte texto: “aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos definitivos”. Nesse caso, questões fundamentais da norma ficaram em aberto, devido à sua novidade e ao uso de termos que ainda não tinham significado construído pelo direito, como o que são “comunidades dos quilombos”, como identificar “remanescentes”, etc. - A indeterminação não decorre diretamente das palavras, mas sim de não haver no direito prática e consenso anteriores quanto ao seu sentido.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
52
Essas grandes indeterminações não seriam tão desafiadoras se os textos normativos não surgissem com tanta frequência, criando mais coisas a serem decifradas, pois, com o tempo, um texto muito aberto acaba se fechando devido às práticas jurídicas.
Atualmente fala-se o tempo todo em princípios do direito público brasileiro, e isso se dá por três razões principais:
1) A “fábrica de princípios” lança produtos sem parar, então o trabalho de absorvê-los é constante e ruidoso.
2) As pessoas estão cada vez mais dispostas a levar os princípios a sério como fontes do direito, o que gera dificuldades enormes.
3) A operação de um sistema como esse, que tem um alto nível de incerteza normativa, gera muita confusão, o que não se sabe é se essa confusão é positiva ou negativa.
3. PRINCÍPIOS SÃO BONS OU RUINS? Há como e por que combater a proliferação dos princípios
nos textos normativos e nas decisões judiciais? É difícil evitar as indeterminações pois existem razões claras
para que elas sejam adotadas. - Alguns textos não são escritos de forma tão exata não porque o legislador não consegue fazê-lo, mas sim porque envolvem interesses antagônicos, falta de consenso e de apoio político, o que leva à redação de textos com alto grau de indeterminação para agradar a todos. - Em certos casos, as indeterminações normativas envolvem um adiamento pragmático de decisões difíceis, por exemplo, no princípio constitucional da igualdade, em que várias questões fundamentais como, “em que casos
é importante igualar pessoas”, ou “que graus de diferenciações são aceitáveis” ficaram sem solução. Respostas a essas questões podem ser construídas e até se tornarem consensuais no meio jurídico, mas elas não estão no próprio texto, foram “deixadas para depois”, devido à complexidade de sua elaboração.
Quem tem influência e poder consegue obter textos precisos do legislador que convirjam para seus objetivos (Ex. Petrobrás e quilombolas).
As indeterminações normativas são necessárias aos jogos de poder da sociedade.
O problema de um sistema jurídico não está na utilização frequente de princípios, mas sim na comodidade que podem oferecer aos espertos e aos preguiçosos. Um esperto, com um argumento cômodo (baseado em princípios), consegue ocultar a fragilidade de sua pretensão de mérito, por exemplo. Um juiz preguiçoso, que não queira analisar a plausibilidade de seu pedido, pode simplesmente deferir ou indeferi-lo pela aceitação ou negação do princípio invocado.
- Para que isso não aconteça, é preciso impor a quem emprega os princípios (seja o juiz, as partes, os advogados, as autoridades administrativas, etc.) os ônus inerentes a essa prática.
4. O ÔNUS DA COMPETÊNCIA Em direito público, debates judiciais sobre a aplicação de
princípios sempre envolvem questões de divisão de competências institucionais.
- Isso tem sido obscurecido pela crença de que o Judiciário pode assegurar qualquer direito sem extrapolar os limites de sua missão; postura de onipotência judicial em relação aos direitos.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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A estrutura judiciária passou a agir em descompasso com a ordem jurídica atual, conferindo direitos de modo indeterminado e aberto e antecipando o trabalho do legislador e do administrador público na construção dos mesmos.
- Essa antecipação se dá por meio de normas iniciais, de princípios.
O Judiciário tem sim seu papel de corrigir falhas legislativas e administrativas, mas não é seu papel o de construir direitos.
Então, qual é a competência do Judiciário na ordem jurídica atual?
- Elas são ditadas em sua maioria por princípios, então cabe ao próprio Judiciário interpretar esses textos e se autodefinir e autolimitar!
A jurisprudência vem elaborando parâmetros gerais para definir a competência e extensão do Judiciário, sendo que vários deles traduzem uma concepção restritiva da intervenção judicial.
Não existe fundamento para a presunção absoluta de que cabe ao Judiciário e não aos outros órgãos a formulação de soluções específicas a partir de princípios; ele não tem legitimidade para transformar, em qualquer situação, princípios em regras e atos.
Sendo assim, quando, em direito público, os juízes são chamados a decidir com base em princípios, o primeiro cuidado que se deve tomar é o de saber se estão legitimados a agir.
- A deliberação quanto a isso precisa ser formulada com fundamentação consistente e específica, considerando a necessidade de respeitar os papéis assumidos por cada órgão estatal.
- A motivação do juiz deve ser capaz de explicar a intervenção judicial, evidenciando os elementos especiais de ordem institucional que a justificam.
Resumindo, o juiz tem que suportar o ônus de legitimar a própria competência.
Se os textos não forem vagos, mas sim muito claros, é inadmissível que o juiz não decida um caso com base na lei em questão, mas sim em princípios, criando um regime jurídico alternativo que lhe pareça melhor.
- A criação de regras com base em princípios em alguns casos não é válida somente pelo grau de indeterminação do texto, mas sim pelo fato de o juiz não se chocar com o legislador que, em casos específicos, delegará ao primeiro a competência para especificar textos normativos indeterminados.
Um dos aspectos que os juízes têm que considerar antes de afirmarem-se competentes para editar regras com base em princípios é o da rigidez das normas que serão produzidas.
- O Legislativo, ao elaborar uma norma, tem soluções normativas bastante amplas à sua disposição, o que o dá o poder de modular a regulação, fazendo escolhas. - O Judiciário, porém, legisla quando não tem escolha, ou seja, sem ter diversas soluções normativas ao seu dispor para escolher a que melhor se adapte ao problema em questão. - Quanto a isso, há um problema: é bem mais difícil alterar normas criadas da segunda forma do que da primeira.
5. O ÔNUS DO REGULADOR No direito público atual, é muito comum que juízes
argumentem com “bons princípios”, com fins justos e de contornos vagos, para deixarem de lado as regras das leis.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
54
Ao julgarem com base em princípios, os juízes exercem função regulatória, e não podem fazer isso de forma superficial. O sistema pode até suportar que substituição de regulações legais ou administrativas por aquelas feitas pelo Judiciário, pode até admitir que a tarefa de regular seja delegada aos juízes, mas tudo isso desde que estes cumpram os mesmos ônus que têm os reguladores:
- Elaborar e enunciar com clareza e precisão a regra que, a partir de princípios, entendem que deve ser usada na solução dos casos concretos em geral, da mesma forma que o regulador faz regulamentos, com suas especificações, antes de sair tomando atitudes caso a caso; - Estudar profundamente a realidade em que irão mexer; - Entender as características e razões da regulamentação anterior; - Identificar as alternativas regulatórias existentes; - Antever os possíveis custos e impactos da nova regulação que se cogita instituir; - Comparar as características da legislação existente e da cogitada.
Resumindo, é preciso que o Judiciário, ao ser transformado em regulador, se comporte como tal, assumindo todos os ônus que isso envolve.
Seminário 11
“PONDERAÇÃO E OBJETIVIDADE NA
INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL”
Virgílio
Afonso da Silva
O texto tem o objetivo de discutir alguns dos déficits de
objetividade e racionalidade imputados ao sopesamento como
forma de aplicação do direito
O texto divide-se em 4 (quatro partes) :
o 1) Problema e questões
o 2) Objetividade
o 3) Sopesamento e garantia de objetividade
o 4) Conclusão
1) Problema e questões
Há um fenômeno: a axiologização dos direitos
fundamentais
Como produto deste fenômeno, tem-se a elevação da
ponderação ou do sopesamento como a forma de aplicação
por excelência dos direitos fundamentais, o que leva à
hipertrofia da ponderação e do sopesamento
Essa hipertrofia vem sendo alvo de críticas, sobretudo na
Alemanha, por uma vertente crítica, segundo a qual os direitos
fundamentais, compreendidos como princípios, valeriam para
qualquer coisa e não teriam nenhum conteúdo determinado
Estaria havendo um recurso exagerado aos princípios, ao
sopesamento e à ponderação, como forma de aplicação do
direito
São 3 os principais autores desta vertente:
1. Friedrich Müller:
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
55
a. Para este autor, o sopesamento nada mais
seria do que a expressão das pré-
compreensões mal explicadas daquele que
decide e de suas ligações efetivas com o
caso concreto
b. Ponderar seria mais sugestão do que
decisão
c. “o sopesamento seria a expressão de certa
preguiça em face do trabalho interpretativo”
2. Böckenförde:
a. Para este autor, o sopesamento é a saída
fácil para se obter qualquer resposta do que
se queira
b. Com o sopesamento como forma primordial
de aplicação dos direitos fundamentais, a
constituição deixa de ser uma constituição
normativa e vinculante, sendo rebaixada a
mero material de sopesamento do juiz
3. Habermas:
a. Para este autor, o sopesamento, além de
irracional, implica um enorme risco para a
garantia dos direitos fundamentais, que
perderiam o seu caráter vinculante
b. As normas deixariam de veicular o que deve
ser, e passariam a ser um material para se
discutir o que é bom ou o que é ruim
Essas críticas baseiam-se no conceito de objetividade
Haveria racionalidade e objetividade na aplicação e
na interpretação do direito? Se sim, como mensurá-
la?
2. Objetividade
Para responder a pergunta de fechamento do tópico
anterior, deve-se considerar que:
o Primeiramente, não é possível buscar uma
racionalidade ou uma objetividade que
exclua por completo qualquer
subjetividade na interpretação e na aplicação
do direito
o Para o Profº Virgílio, não existe método
totalmente objetivo, que pressuponha uma
completa exclusão da subjetividade na
aplicação do direito
o Objetividade não é sinônimo de
demonstrabilidade inequívoca, por isso na
argumentação jurídica, há um ônus
argumentativo, e não demonstrativo
A objetividade apresentaria DUAS VARIÁVEIS, que
podem ser analisadas a partir de TRÊS ASPECTOS
o VARIÁVEIS: 1ª CONTROLE
INTERSUBJETIVO
2ª PREVISIBILIDADE
aumentando-se a 1ª + aumentando-se a 2ª = aumenta-se a
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
56
OBJETIVIDADE
o ASPECTOS: 1º METODOLÓGICO
2º TEÓRICO
3º INSTITUCIONAL
3. Sopesamento e garantia de objetividade
3.1 Aspecto Metodológico
O sopesamento não pode ser entendido como uma
relação de preferência simples e sem qualificativos,
mas sim como uma relação de preferências
fundamentais, escalonada e condicionada
Qual a diferença entre esses dois tipos de relações?
Veremos isso por meio de dois exemplos:
o 1º EXEMPLO (relação de preferência
simples): Caso do Estatuto do Desarmamento
Uma ADI foi proposta no STF contra essa
lei
Em um dos pareceres de um jurista (não de
um juiz), o debate foi tratado de forma
maniqueísta, basicamente da seguinte
forma: “você prefere ficar indefeso diante
do bandido armado ou você prefere estar
preparado (armado) para reagir?”
Algo é “preferível” a outro algo
o 2º EXEMPLO (relação de preferência
fundamental, escalonada e condicionada):
Caso da publicação de fotos da princesa Carolina de
Mônaco por uma revista alemã
O Tribunal decidiu por um escalonamento
Alguns fatos implicavam numa maior
restrição da privacidade: fotos da princesa
com seu filho; outras, numa restrição
média: a princesa numa parte reservada do
restaurante; e outras ainda, em uma menor
restrição: fotos da princesa andando de
bicicleta no parque
É basicamente esse tipo de situação que
Alexy faz menção ao propor uma
classificação das restrições a direitos
fundamentais (restrições pequenas, médias
e grandes)
O uso do escalonamento e da classificação não impede a
discordância em relação ao resultado, nem em
relação aos próprios argumentos
o EXEMPLO: a Corte Européia de Direitos Humanos
reavaliou o caso e decidiu que a privacidade da
princesa não foi garantida suficientemente pela
decisão do Tribunal Alemão
o O que houve não foi uma simples divergência
quanto ao resultado da decisão, mas sim, uma
divergência quanto à fundamentação de algumas
relações de precedência
o “simples preferências são infensas a qualquer
controle intersubjetivo”
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
57
Com o escalonamento é possível comparar o grau de
restrição a um direito fundamental com o grau de
realização do direito que com ele colide, abrindo a
possibilidade de um diálogo intersubjetivo
É possível discordar quanto à correção de um
escalonamento
3.2 Aspecto Teórico
Os métodos de interpretação e aplicação dos direitos
fundamentais são vazios em si mesmos, isto é, são
instrumentos que têm que ser preenchidos com alguma
substância
Essa substância pode ser conferida pela EXPOSIÇÃO DE
PREMISSAS e PRESSUPOSTOS TEÓRICOS ( é este o
foco do aspecto teórico!)
Para se entender essa “exposição de premissas”, deve-se
partir de duas perguntas:
o 1ª “Qual o papel dos direitos fundamentais no
ordenamento jurídico e na aplicação do direito em
geral?”
o 2ª “Há direitos fundamentais mais importantes do
que outros? Por quê?”
Essas duas perguntas levam a uma terceira pergunta:
o “Qual a teoria dos direitos fundamentais de que se
parte?”
Dois exemplos ilustram bem isso:
o 1º EXEMPLO - Caso Ellwanger
Observa-se uma falta de disposição para a
exposição de premissas teóricas
Isso levou alguns ministros que tinham
recorrido ao mesmo método de
aplicação do direito (a proporcionalidade)
a conclusões diferentes, alguns a favor
de uma maior liberdade de expressão,
outros a favor de uma maior restrição
A discordância nas conclusões poderia ter
resultado de razões teóricas (mas no caso
não foi o que ocorreu)
Essas razões teóricas residiriam no “status”
conferido à liberdade de expressão e à
liberdade de imprensa num Estado
Democrático de direito e numa teoria dos
direitos fundamentais
Possíveis perguntas para se chegar a
esse “status”:
o Essas liberdades teriam
precedência em relação a
outros direitos?
o Os direitos subjetivos
especiais, a honra e a
dignidade devem exercer
uma função de bloqueio?
Se se parte do pressuposto de que a
liberdade de expressão tem uma
fundamentalidade maior do que outros
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
58
direitos e essa premissa teórica é
fundamentada de forma consistente,
tem-se um bom começo para se realizar um
sopesamento
Essa premissa poderia ser: a própria
liberdade de expressão e o livre fluxo da
comunicação é que deveriam mostrar que,
eventualmente, o autor do livro estaria
errado ao negar o holocausto
Essa premissa se ocuparia do valor dos
direitos fundamentais X grau de
paternalismo do Estado quanto aos
direitos fundamentais
o 2º EXEMPLO – Reality shows
partindo-se de uma postura mais
paternalista de que o Estado deve proteger
as pessoas, que são incapazes de se
defender sozinhas, o resultado tenderia
para uma inadmissibilidade de programas
como esses
por outro lado, caso parta-se do
pressuposto de que esses programas não
geram grandes problemas e que as pessoas
consentem em se expor daquela maneira, o
resultado tenderia a permitir esses
programas
O resultado de um sopesamento depende da teoria
da qual se parte, isso permite um maior controle
intersubjetivo e uma maior previsibilidade,
conferindo maior objetividade a esse método e à
interpretação em geral
Contudo, a opção por uma teoria de direitos
fundamentais continua envolvendo um certo grau
de subjetivismo, ainda que dependa de fundamentação
Além disso, pode-se dizer que a mera explicitação de
um ponto de partida confere mais objetividade ao
sopesamento, pois isso permite maior possibilidade de
diálogo e controle intersubjetivo
3.3 Aspecto Institucional
Esse aspecto tem importância não só no debate do
sopesamento ou da ponderação, mas sobre a objetividade
de qualquer método e está mais ligado à questão da
previsibilidade
Quanto maior a previsibilidade, menor a insegurança
jurídica e maior a objetividade
O aspecto institucional pode ser subdividido em dois
subaspectos: respeito aos precedentes e controle social
o 1º SUBASPECTO: RESPEITO AOS
PRECEDENTES
Quanto maior for o respeito a decisões
judiciais tomadas em casos semelhantes,
menor será a liberdade subjetiva do
aplicador do direito ao realizar um
sopesamento
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
59
As seguintes regras de Alexy (na obra
Teoria dos Direitos Fundamentais) devem
ser consideradas:
“(1) Se é possível utilizar um
precedente favorável ou
contrário a uma decisão, ele
deverá ser utilizado”
“(2) Aquele que pretende
afastar o precedente tem o ônus
argumentativo para tanto”
A possibilidade de decisões irracionais e
exclusivamente subjetivas em um
sopesamento diminui na proporção em que
se aumenta o respeito a precedentes
Um sopesamento que considera apenas o
texto constitucional tenderá a ser mais
subjetivo do que um sopesamento que
inclua a história jurisprudencial e os
precedentes judiciais
o 2º SUBASPECTO: CONTROLE SOCIAL
Esse controle deve ser feito por todos, mas,
sobretudo, pela comunidade acadêmica e
jurídica e pela imprensa
Quanto maior o controle, maior a
transparência e maior a publicidade das
decisões dos tribunais, menor será a
possibilidade de decisões ad hoc, assim,
maior é a segurança, maior a previsibilidade
e maior a objetividade
Um maior controle exige que haja um
acompanhamento isento da história e da
atividade dos tribunais superiores
4. Conclusão
Não existe objetividade absoluta e demonstrável,
mas existe a possibilidade de uma objetividade em
um sentido mais fraco
Esta última objetividade depende da conjugação
dos aspectos metodológico, teórico e institucional
Considerando-se esses 3 aspectos, é possível que o
sopesamento desempenhe um papel preponderante
Caso alguém afirme que há métodos mais objetivos
e racionais do que o sopesamento para a aplicação
dos direitos fundamentais, deve mostrar isso
utilizando-se desses 3 aspectos
The core of the case against judicial review
Jeremy Waldron
A crítica que Waldron faz contra a revisão judicial de decisões
legislativas é condicional, pois ele não quer atacar todo tipo de
revisão judicial, mas apenas aquelas que ele considera
nucleares. Essa revisão nuclear é a chamada revisão judicial
forte, isto é, aquela em que o juiz ou a corte tem o poder de
afastar uma decisão legislativa e estabelecer em seu lugar uma
outra regra de direito. Não se incluem as revisões fracas, como
ocorre no Reino Unido, em que o juiz apenas pode fazer uma
declaração pedindo que se analise aquela norma legislativa, mas
deve aplicá-la no caso concreto – a este tipo não se faz
nenhuma objeção.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
60
Além disso, a revisão judicial, para ser um caso nuclear, tem que
ocorrer em um país que respeite as quatro “assumptions”
(suposições):
A primeira se refere ao legislativo: este deve ser composto e
funcionar nos moldes democráticos modernos, isto é,
respeitando o direito ao voto e a igualdade política. Não precisa
ser um poder legislativo perfeito, mas basta que seja razoável
dentro das condições atuais das democracias ocidentais mais
desenvolvidas.
A segunda se refere às instituições judiciais: para que a crítica
faça sentido, temos que levar em conta um Poder Judiciário
pautado em algo próximo ao que vemos hoje nos EUA. Os juízes
não são democraticamente eleitos, mas sim nomeados pelo
presidente ou passam por algum outro método de seleção,
desde que sejam uma certa elite político-intelectual. Tem como
princípios só agir na medida em que houver litígios, de forma
binária (defesa e acusação) e com uma certa preocupação com
os precedentes e com a ordem jurídica em geral.
A terceira é a ideia de que as pessoas em geral levam os direitos
efetivamente a sério. Muitas das defesas à revisão judicial
passam por negar esta condição, dizendo que apenas os juízes
que se sentiriam vinculados a um Bill of Rights (o documento
através do qual se reconhecem os direitos pode ser tanto a
constituição como uma declaração qualquer) e por isso levariam
os direitos a sério. Se isso fosse verdade, estaríamos em uma
situação não nuclear, e por isso a crítica de Waldron não caberia,
mas ele acredita que essa consciência geral dos cidadãos é
muito mais realista do que parece. As pessoas em geral têm
respeito a estes documentos, até porque são marcos da história
do país e, na hora de participar das instituições democráticas,
sabem diferir suas opiniões de seus interesses, isto é,
defenderiam um direito ainda que trouxesse consequências
negativas para si mesmo.
A quarta e última condição está intimamente ligada à terceira: os
cidadãos divergem sobre as formas de proteger os direitos. Isso
não acontece porque eles não são capazes de reconhecer os
direitos dos outros, mas sim por causa da própria complexidade
dos temas envolvidos. Prova de que essas duas condições são
aplicáveis aos EUA é o caso das ações afirmativas: existiam
negros a favor, negros contra, brancos a favor e brancos contra,
e todos tinham motivos razoáveis para sustentar sua opinião.
Partindo agora do panorama de um Estado que segue essas
quatro suposições, podemos dividir o estudo dos prós e contras
de uma decisão legislativa e uma decisão judicial sobre direitos
fundamentais através de dois aspectos: quanto ao processo
(process-related) e quanto ao resultado (outcome-related). A
relação entre estes aspectos é como pedir para alguém escolher
o carro melhor e mais barato. Para alguns a legitimidade do
processo decisório é mais importante que o resultado ser bom
ou ruim, mas ambos os aspectos devem ser levados em conta. A
tese vulgar é a de que a decisão legislativa é mais legítima,
porém a decisão judicial traz resultados melhores. Essa posição é
uma caricatura que não corresponde à realidade. No restante
do texto, vamos argumentar no sentido de que a
legitimidade processual realmente é maior no legislativo,
embora existam argumentos para defender o Judiciário.
Já quanto ao resultado, vamos demonstrar, a partir das
condições dadas, que não há nada para justificar uma
preferência pelo Judiciário, e até mesmo que os
resultados tendem a ser melhores no legislativo.
Especificando melhor a questão do resultado, temos que
nenhuma instituição sempre trará resultados bons, até porque é
difícil dizer quando um resultado é bom, pois os direitos são
complexos e há motivos racionais para as pessoas divergirem
quanto à melhor solução. Muitos dizem que o resultado da
revisão judicial costuma ser melhor do que a decisão legislativa
porque o Judiciário analisa casos concretos, ou seja, observa
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
61
como aquela regra sobre direitos fundamentais pode realmente
influenciar a vida dos cidadãos. Esse argumento é fraco,
primeiramente porque, ao observarmos as decisões dos tribunais
superiores, percebemos que na maioria das vezes eles se
afastam muito do caso concreto, e acabam regulamentando a
matéria como um todo. Além disso, dentro do legislativo há uma
série de lobbies e pressões sociais que trazem a tona situações
concretas. Outros dizem que o fato de o Judiciário não ser eleito
é uma vantagem, pois assim eles não sofrem tantas pressões e
podem analisar de forma mais neutra a situação. Isso também é
uma falácia, pois ninguém consegue se colocar numa situação de
neutralidade: todos são de alguma forma influenciados quando
tomam as decisões, e todos tem que saber separar seus
interesses de suas opiniões.
Também colocam que o Judiciário tem uma estrutura mais apta
a lidar com um Bill of Rights. Como já dissemos, se imaginarmos
uma sociedade dentro das condições propostas, os cidadãos
comuns também possuem grande respeito nesse sentido. A
estrutura judicial na verdade é mais propícia para distorções: os
juízes tendem a ter uma interpretação mais textual do Bill of
Rights, sendo incapazes de adaptar essa declaração antiga (no
caso dos EUA, séc. XVIII, com complementação no séc. XIX) aos
dias atuais. Por fim, todos estes argumentos a favor da revisão
judicial tentam de alguma forma dizer que o judiciário lida
melhor com argumentos morais, como diria Dworkin, grande
defensor desse mecanismo. Entretanto, a realidade mostra
justamente o contrário. Os juízes, devido à sua falta de
legitimidade processual (que será demonstrada abaixo), se
preocupam demais com legalismos, apoiar-se em precedentes,
mostrar que estão apenas interpretando e não criando. Tudo
isso desvia a atenção do verdadeiro debate. No caso do aborto,
por exemplo, grande parte do acórdão da Suprema Corte se
dedicava a essas justificações da atitude dos juízes, e a
verdadeira questão moral a ser debatida ocupava poucas
páginas. Já no Reino Unido, em que esse debate se deu no
parlamento, observamos as questões centrais sendo debatidas
intensamente.
Quanto à questão do processo. São pouquíssimos os que
duvidam de que o legislativo seja mais legítimo a decidir essas
questões, por ser uma instituição mais democrática. Ainda assim,
existem alguns argumentos em favor dos juízes que costumam
ser levantados. Grande parte dos assuntos levantados aqui passa
pelo critério majoritário de decisão e, consequentemente, por um
dos assuntos mais levantados em defesa da revisão judicial: a
tirania da maioria. Quando uma pessoa se vê obrigada a seguir
uma decisão, para saber se essa decisão é legitima, ele irá se
pergunta qual é o motivo de obedecê-la. No caso do legislativo,
ele terá que a decisão foi tomada num ambiente democrático, e
o critério da maioria nada mais é que o fruto da aplicação da
ideia de igualdade política, aliada ao direito de participação
política. No caso acima referido, do aborto na Inglaterra, os
“pro-choice” (a favor do aborto) venceram os “pro-life” (contra o
aborto), mas ainda assim tivemos alguns pro-life que
reconheceram a derrota e agradeceram por sua opinião ter sido
atenciosamente ouvida. Agora, que cidadão americano pro-life
que, ao ler o acórdão da Suprema Corte legalizando o aborto,
sente que sua opinião foi bem ouvida?
Se insistirmos no ponto do critério majoritário, temos que o
judiciário também usa esse critério nas cortes, mas não tem
nenhuma fundamentação teórica: é construído meramente pela
necessidade da decisão. O critério da maioria só faz sentido
quando os votantes são os próprios cidadãos (no caso das
eleições) ou os representantes destes (no caso das votações
parlamentares). O que significa dizer que 5 dos 9 membros da
Suprema Corte decidiram de um jeito, sendo que foram
simplesmente nomeados, sem nenhuma relação de
proporcionalidade com a opinião dos cidadãos?
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
62
Quanto à tirania da maioria, precisamos de uma classificação
importante. Podemos diferenciar a “decision majority” da “topical
majority”, assim como a “decision minority” e a “topical
minority”. É a diferença entre a opinião adotada na votação e o
fato de ter ou não seus direitos atingidos. Estamos partindo do
pressuposto que as pessoas levam os direitos a sério, o que
significa que é plenamente possível (e mais comum do que se
imagina) que o grupo minoritário que perdeu na votação
(decision minority) não seja o mesmo grupo que sofreu prejuízos
em razão da decisão. Além disso, em última instância, toda
decisão sobre direitos fundamentais é uma decisão tirânica, pois
tirania, em sentido lato, nada mais é que a violação de um
direito individual. Isso decorre da própria natural divergência das
pessoas quanto aos direitos fundamentais: uma pessoa pode
razoavelmente acreditar que tenha um direito, enquanto outra
pode razoavelmente entender que esse direito não existe
naquela situação. Portanto, para tratar a questão da tirania da
maioria de forma séria, temos que ter essas coisas em mente.
Vamos então imaginar agora uma “verdadeira tirania da
maioria”: um grupo minoritário (topical minority) saiu
prejudicado por uma decisão da maioria. Por que um indivíduo
que fez parte tanto da decision minority quanto da topical
minority se sentiria legitimamente obrigado a obedecer a
decisão? A resposta é justamente pelo processo em que a
decisão foi tomada: se ele teve a sua opinião ouvida e a maioria,
embora não concordou com ele, teve boa-fé na hora de ouvi-lo
(isto é, estava disposta a reconhecer que estava errada se os
argumentos da minoria fossem mais convincentes do que os
deles), então tem motivos para obedecê-las. O que estamos
querendo dizer é que a tirania da maioria realmente pode
ocorrer nesse sentido, mas se as instituições legislativas
obedecem às condições colocadas, não há o que se temer. E não
há porque acreditar que as minorias seriam ouvidas melhor no
Judiciário, até porque o Judiciário é formado por uma elite
político-intelectual, onde sabemos que é muito mais difícil
estarem presentes as minorias.
É claro que se imaginássemos um país em que o legislativo é
mal organizado, corrupto, com uma série de distorções
estruturais, e o Judiciário se comporta razoavelmente bem,
talvez fosse conveniente uma revisão judicial no sentido forte.
Mas, novamente, estamos falando de uma situação não nuclear.
As instituições democráticas necessitam de um contínuo
melhoramento para que respeitem melhor os ditos princípios da
igualdade política e direito de participação. Muitos defensores da
revisão judicial dizem que a maioria não é capaz de perceber que
os mecanismos de participação não estão satisfazendo as regras
democráticas. Quando um direito é desprotegido justamente por
causa dessas distorções representativas, segundo eles, o
Judiciário tem que agir, pois não são os direitos fundamentais
que estão sendo violados, mas sim os princípios democráticos.
Respondemos a essa crítica no sentido de que as instituições
democráticas também sabem proteger os princípios
democráticos, mesmo quando estes não estão sendo
devidamente aplicados. Basta ver os extensos debates políticos
quanto a voto majoritário clássico, proporcional ou distrital:
estamos presumindo que a maioria leva os direitos a sério, e por
isso terá a boa-fé de tentar corrigir as distorções de estão
levando a uma opressão da minoria. Esse argumento se baseia
no famoso brocardo jurídico “nemo iudex in sua causa”
(“ninguém deve ser juiz de sua própria causa”), ou seja, a
maioria não poderia tomar uma decisão que envolve melhorar ou
piorar a sua situação, mas este brocardo vai contra as quatro
suposições do início do texto.
Um último caso não nuclear importante é aquele de uma minoria
tão isolada e pequena que as instituições democráticas não
fossem capaz de dar voz e fazer com que a maioria pudesse
levar seus direitos a sério. São situações muito raras, que
justificariam uma revisão judicial, como no caso da “Carolene
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
63
Products footnote four”, uma empresa que tinha um interesse
tão específico que a Suprema Corte entendeu que ela não estava
protegida pelos métodos democráticos de representação.
Outras vezes, embora determinada classe minoritária não tenha
voz, presume-se que seus direitos são observados nas
instituições democráticas, como no caso das crianças e dos
doentes mentais.
Beatriz M. Camões – sala 14 – N. USP 7635366
Abramovich
1. Refuta pensamento de que os direitos civis e políticos
pressupõem obrigações negativas por parte do Estado e os
econômicos, socias e culturais, obrigações positivas
1.1. Trata-se de visão distorcida e simplista
1.2. As duas classes de direitos se distinguem em uma questão de
grau
1.3. Alguns dos direitos tradicionalmente considerados civis e
políticos ganham caráter social
1.4. Nos casos concretos, a diferenciação tende a desvanecer,
principalmente quanto à tutela
1.5. Há uma gradação segundo uma identificação maior ou menor
com obrigações estatais positivas ou negativas. Autor
distingue três tipos de obrigação positiva do Estado
1.5.1. Pode se ver obrigado a estabelecer algum tipo de
regulamentação
1.5.2. Pode se ver na posição de limitar ou restringir poderes
dos cidadãos ou impor obrigações
1.5.3. Pode cumprir sua obrigação ao fornecer serviços
2. As estratégias judiciais são numerosas para direitos econômicos,
sociais e culturais
2.1. Há dificuldades conceituais (caráter coletivo de reivindicações
etc.)
2.2. Instrumentos processuais
2.2.1. Em casos que envolvem certas violações de direitos,
inexistem instrumentos concretos
2.2.2. Em alguns casos, são viáveis ações judiciais tradicionais
2.3. No descumprimento de obrigações positivas, surgem mais
questionamentos, pode ser difícil promovê-lo por meio de
atuação judicial
2.3.1. Muitas vezes o Estado as cumpre em parte, há
possibilidade de questionar violação por discriminação;
assim, a igualdade de tratamento é uma via para exigir
direitos
2.3.2. O descumprimento do Estado pode se reformular em
termos de violação individualizada, concreta, ou mais
amplamente afetar “interesses ou direitos individuais
homogêneos”
3. Atuação judicial pode reconhecer omissão estatal e intimar Estado
a assumir a devida conduta
3.1. Pode apontar fins a serem atingidos ou indicar determinada
ação a ser adotada
3.2. Quanto à implementação
3.2.1. É um nível de atuação mais concernente ao poder
público, mas Judiciário tem seu papel
3.2.2. Pode estabelecer marco jurídico e reencaminhar caso
para se definir uma política pública
4. Ativismo do Judiciário
4.1. Legitimado pela debilidade das instituições democráticas de
representação
4.2. Deve se basear na Constituição ou em leis, confrontando-as
com políticas públicas
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
64
4.3. Deve estabelecer “diálogo” entre poderes para concretizar
programa jurídico-político
4.4. Em circunstâncias excepcionais, definir concretamente as
medidas a serem adotadas
4.5. Quatro situações típicas são delineadas
4.5.1. Intervenções judiciais para dar conteúdo jurídico a
medidas políticas
4.5.2. Tribunal examina compatibilidade da política pública
com o princípio jurídico aplicável
4.5.3. Pode estabelecer adoção de medida à sua escolha e
ordenar sua realização
4.5.4. Ou declarar omissão ilegítima do Estado (sua mora ou
descumprimento de obrigações)
4.6. Serve para encaminhar agenda pública
4.7. É útil estabelecer articulações com outras estratégias de
incidência política (supervisão de políticas públicas, lobbying,
negociação, mobilização social, campanhas de opinião pública
etc.)
5. Recorrer à intervenção judicial pode ter outros fundamentos
5.1. Pode ser apenas para mostrar outras frentes abertas com
“enfoque procedimental”, complementando as ações de
incidência política
5.2. Pode ser necessária para efetivar um acordo, em que as
características dos direitos sociais em questão determinar
interpretação do alcance das obrigações que emanam do
acordo
5.3. As ações de acesso à informação costumam ser vias legais
para supervisão de políticas sociais e documentação de
violações aos direitos econômicos, sociais e culturais
5.3.1. Direito à informação é importante para efetivo controle
cidadão de políticas públicas, cabendo ao Estado garantir
acesso à informação em condições de igualdade
6. Conclusão
6.1. As vias judiciais não são o centro da estratégia de
exigibilidade de direitos, mas servem para afirmar as demais
ações políticas
6.2. Os instrumentos legais complementam o trabalho de
incidência política, não há opções excludentes
Relatório PET
O judiciário e as Politicas Publicas de saúde no Brasil: o caso
Aids
O relatório foca no tema da judicialização da política com enfoque
na atuação do Poder Judiciário na revisão judicial das politicas
publicas do Executivo.
A partir da análise de casos, ficou evidente que o Judiciário interfere
na politica sem levar em conta critérios necessários e os impactos
econômicos e logísticos já que as questões distributivas (disputa de
recursos escassos) não são abordadas pelo Tribunal paulista de forma
adequada.
O relatório se baseia em dois pilares: na pesquisa empírica e na
teorização.
Judicialização da Política É necessário delimitar o significado do termo „‟judicialização da
política‟‟:
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
65
Alguns conceituam como utilização de mecanismos tipicamente judiciais na área de deliberação politica.
O Poder Judiciário apresenta uma multiplicidade de
manifestações de tratamento judicial em relação as questões politicas.
Inicialmente, a atuação restringe-se à limitação e regulação das
atividades das instituições legislativas (Ex. Controle de
constitucionalidade). O Judiciário ainda exerce controle e regulação da
conduta de atores políticos. Além disso, também é uma „‟arena de
discussão e decisão‟‟ em relação a implementação das politicas
públicas (veto player -veto points).
Dotar o Judiciário com essa ultima atuação, que é o enfoque
do texto, consiste em romper com o princípio da separação de
poderes ( segurança jurídica e unidade na aplicação judicial) segundo
a visão clássica. Deve-se, portanto, interpretar de uma nova maneira
o ideal de separação de poderes, analisando o Estado como prestador
de serviços e não mais seguir a lógica do livre-mercado.
Diante da evolução político-social que conferiu ao Estado
novas áreas de atuação, (o Estado como provedor), as normas
passaram a ter um caráter mais técnico e especifico ao invés do
caráter clássico de generalidade e abstração. Esse processo gerou
uma jurisdicialização das relações sociais. O judiciário começou a „‟ter
contato‟‟ com questões que até então não seriam levadas a esse
órgão.
O Judiciário começa a ter uma atuação interpretativa do texto legal (legislando ao aplicar o direito)
Percebe-se que o Poder Judiciário começa a julgar
levando em conta os preceitos constitucionais referentes à
justiça social, parâmetros de eficiência e oportunidade de
atuação governamental.
A evidente a deficiência do sistema político em cumprir com as
demandas sociais faz com que a busca do Judiciário torne-se uma
forma mais rápida e efetiva de garantir os direitos
constitucionalmente previstos.
Paralelamente a esse cenário, há a tendência de redefinição do
papel estatal: Estado não é mais visto como provedor e sim como
regulador .
Judicialização da política no Brasil Esse fenômeno começa a ser relevante após a Constituição de
1988. Essa constituição forneceu um caráter normativo aos princípios
de justiça social fazendo com que os juízes se manifestassem sobre
as politicas públicas a fim de efetivar as garantias sociais expressas
no texto legal.
Segundo Marcos Faro de Castro e Werneck Vianna o controle de
constitucionalidade concentrado permitiria a contestação judicial das
politicas aplicadas por atos normativos. Paralelamente, as ações de
caráter coletivo permitiriam o controle da administração publica
através da contestação judicial da moralidade de certos atos.
Veto Player: O judiciário figura de forma ativa na realocação de recursos estatais. Ocorre quando o cidadão, em busca da consecução das garantias constitucionais, provoca o Judiciário através de procedimentos comuns.
o Tribunais atuando como „‟centros de regulação‟‟. Caso Aids Em 1991 houve a distribuição gratuita da Zidovudina (AZT) para
portadores do vírus da imunodeficiência adquirida (HIV). Em 1996 foi
outorgada a Lei 9.313 que tornou obrigatória a distribuição universal
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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e gratuita dos antirretrovirais. Para garantir que essa meta fosse
cumprida, o Ministério da Saúde criou o Programa DST/AIDS.
O Programa tem três objetivos: I- promover a saúde, prevenção
contra a transmissão; II- o diagnóstico, tratamento e assistência às
pessoas portadoras e III- desenvolvimento institucional e gestão do
projeto.
Apesar do estabelecimento pela Constituição que as políticas
públicas relacionadas à saúde sejam de responsabilidade concorrente
entre todos os entes da federação, o fornecimento de medicamentos
antirretrovirais, através de um pacto tripartite de responsabilidade, é
responsabilidade exclusiva do Ministério da Saúde.
Atualmente são distribuídos somente 15 medicamentos,
determinados e distribuídos pelos Comitês Assessores para Terapia
Antirretroviral. Ou seja, nem todos os antirretrovirais disponíveis no
mercado são distribuídos pela rede publica do Programa devido a
escassez de recursos públicos e da necessidade de padronização da
prestação de serviços
É necessário, para a obtenção dos medicamentos já previstos na
lista do Programa, que o mesmo além de ser aplicável ao tratamento,
estar de acordo com aos procedimentos referentes ao caso do
paciente.
O pacto tripartite de responsabilidades, além de definir como
responsabilidade exclusiva do Minstério da Saúde o fornecimento de
medicamentos, obriga uma „prestação de contas‟, na qual as
coordenações estaduais e municipais devem oferecer informações
(dados epistemológicos, estoque de medicamentos e etc.) ao
Ministério da Saúde.
Em relação aos medicamentos previstos, o Programa tem sido
bastante eficaz. O problema está relacionado aos medicamentos que
não estão previstos no Conselho Terapêutico.
Para analisar essa ultima questão, o relatorio seleciona os
acórdãos desde marco de 1997 ate junho de 2004. A analise desses
acórdãos se deu tanto de forma quantitativa como qualitativa.
Análise do material empírico (144 acórdãos) Critérios e analise:
i - identificação da classe processual e número do acordão: o a maioria pertencia à classe processual definida como
agravos de instrumento interpostos contra a decisão de primeira instancia.
ii – identificação das partes : o a maioria das ações foi proposta contra a Fazenda
Publica do Estado de São Paulo
iii- Pedido formulado na ação ordinária: o referiu-se a concessão de medicamentos não incluídos
na lista do Ministério da Saúde. iv- Antecipação da tutela e seu fundamento:
o em todos os casos ela foi concedida podendo ter sido, eventualmente cassada pelo Tribunal nos casos de acórdãos denegatórios.
o Principal argumento do paciente: o paciente vir a falecer (dano irreparável) e comprovação do estado do paciente
o Principal argumento da Fazenda: irreversibilidade da decisão.
v- reconhecimento pelo julgador do direito à saúde como politica publica:
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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o foi realizada em todos os casos, tanto nos de concessão quanto nos de não-concessão.
o Não-concessão: a efetivação do direito a saúde se daria na implementação de politicas publicas.
vi- classificação do direito à saúde como coletivo ou individual o Concessão: os julgadores consideram o direito à saúde
como individual na maioria dos casos. o Não-concessão: a maioria considerou o direito à saúde
como coletivo. vii- utilização de critérios econômicos para a decisão
o Não-concessão: a maioria considerou que os recursos públicos são escassos e que a administração estaria vinculada a previsão orçamentária.
o Concessão: somente 8.9% reconheceu o aspecto econômico
viii- consideração de possíveis impactos sociais da decisão o Não-Concessão: a maioria argumentou a respeito dos
prejuízos para a coletividade gerados pela alocação de recursos.
A idéia de se aplicar conceitos econômicos para entender,
analisar e
prescrever funções para o sistema jurídico deriva de uma série de
diferentes correntes e tradições da teoria econômica anteriores
mesmo aos Chicago Boys. Somente após os anos 1960 que o
pensamento adquire corpo de teoria, com as obras fundamentais de
Ronald Coase e Guido Calabresi. Consolida-se, então, a necessidade
de um processo contínuo de abordagens e estudos que procuram
explicar a interação entre direito e economia, pesquisa marcadamente
influenciada pelos seus ideais econômicos neoclássicos. A partir desse
ponto, a análise econômica das regras e de institutos jurídicos
espalha-se por diversos outros ramos do direito, como contratos,
responsabilidade civil, direito penal, direito internacional, entre outros.
A análise econômica do direito pretende ser um modelo de
compreensão da realidade, de como funciona e de como deve
funcionar a sociedade com base em premissas econômicas e como o
sistema jurídico estimula ou não o comportamento social tendo em
vista princípios econômicos. Daí a razão pela qual a aceitação dessa
teoria depende em grande medida da identificação com as teorias e
pressupostos econômicos que lhe deram origem, predominantemente
neoclássicos.
Nesse sentido, o cidadão, racional e bem-informado, estaria
sempre apto a analisar se o benefício obtido ao praticar determinada
conduta seria maior que o custo com o qual deverá incorrer. Caberia,
então, ao direito estabelecer a correta relação de equivalência entre o
comportamento ilícito do indivíduo e a sanção imposta, pois essa
"justa” ou eficiente proporção – quase que uma lógica econômica de
prestação e contraprestação, através de punições e recompensas –
incentivaria os comportamentos humanos. Como conseqüência lógica
das premissas anteriores, as normas jurídicas devem ser formuladas e
interpretadas em função da eficiência de sua aplicação. Eficiência
significaria maximização do bem-estar social.
Diversas foram as críticas sofridas pela visão que a teoria da
análise
econômica do direito pretendia incorporar ao sistema jurídico. Muitas
dessas críticas se devem aos pressupostos utilitaristas de suas
ideologias. A premissa do agente racional, capaz de maximizar suas
satisfações, também procurou ser rebatida pela teoria da
racionalidade limitada. Além disso, as maiores críticas ao pensamento
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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neoclássico tradicional vieram da chamada "nova economia do bem-
estar", procurando incorporar o elemento ético ao pensamento
econômico.
Outra forma de análise juridoco-econômica adotaria o critério
de bem-estar social (welfarism) ao invés da comparação de custo-
benefício. Assim que a medida de bem-estar social requereria a
análise do bem-estar de
cada um dos indivíduos.
Com base nessas premissas, a forma de distribuição da renda
torna-se importante para o bem-estar social. A distribuição de renda
afeta a distribuição de utilidade. Primeiro, para uma pessoa pobre um
dólar a mais vale muito mais do que um dólar a mais para uma
pessoa rica. Segundo, a distribuição de renda afeta o bem-estar
social, pois a utilidade individual pode depender da distribuição de
renda da população como um todo, simplesmente por um sentimento
de altruísmo ou compaixão. Nesse sentido, mesmo se um indivíduo
rico e um indivíduo pobre percebem a mesma utilidade marginal por
um dólar a mais, ainda assim o bem-estar social pode ser aumentado
com uma distribuição de renda mais igualitária, que beneficie o
indivíduo pobre. Conclui-se dessa forma que o que vale não é
simplesmente a maximização da satisfação coletiva, mas também o
modo como esta é distribuída, pois esse modo determina a proporção
da felicidade e a medida do bem-estar. Como a justiça na distribuição
da felicidade é condição do bem-estar, o caráter distributivo estaria
implícito. A função de aplicar essa distribuição de renda, porém, não
estaria no âmbito jurídico, pouco eficiente, mas sim no âmbito
tributário, através de políticas públicas destinadas a esse fim.
É claro que não se pode chegar à absurda conclusão de que
políticas
distributivas e de transferências de recursos para objetivos sociais
sejam ineficientes. Investimentos públicos e esforços governamentais
no sentido de se criar programas que beneficiem determinados
grupos necessitados, ainda que representem sacrifícios e custos na
sua implementação, produzem significativas externalidades positivas
para aqueles que recebem o benefício, mas também grande parte
desse ganho é recebida indiretamente pela coletividade. Na área da
saúde pública, uma política estruturada para promover
universalização de acesso e combate de epidemias gera inúmeros
ganhos para toda a sociedade.
No caso do programa de fornecimento de medicamentos a
portadores do
vírus HIV a economia que se tem feito com a redução do número de
internações
hospitalares e a queda nas taxas de mortalidade em função das
doenças
oportunistas são indicadores do sucesso de sua implementação. Não
parece restar dúvida a direta relação entre a política de distribuição
de medicamentos, a
estabilização no número de novos casos e o aumento da qualidade de
vida de
portadores do HIV. Essa forma de política de transferência de gêneros
contribui
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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diretamente para elevar a qualidade de vida dos indivíduos e produz
eficiência,
mesmo no sentido neoclássico tradicional.
De qualquer forma, independentemente de todos as críticas
que surgiram
contra a visão da análise econômica do direito, não se pode negar o
seu grande
mérito: estabelecer um critério de decisão e uma regra útil na
argumentação, que
procura se perguntar quais os incentivos e consequências que a
norma irá provocar no futuro.
Seminário 03
PRINCÍPIOS E REGRAS: MITOS E EQUÍVOCOS ACERCA
DE UMA DISTINÇÃO
Virgílio Afonso da Silva
Neste texto o Virgílio pretende fazer uma distinção entre duas
espécies de norma: regras e princípios, dentro do direito brasileiro.
Ele diz que há muita discussão acerca do tema, e ele fará um resumo
das teorias dos principais autores sobre esse assunto, apontando
críticas.
(querido amigo, se são 04:00 da madruga do dia da prova e agora que vc começou a
ler esse seminário, que é apenas o terceiro dos TREZE, uma dica, leia só os pontos 1
e 2 desse resumo – ah! E o 7 tb, que é só uma frase, não precisa entender o
exemplo. O resto não é mto importante!)
1. Princípios e regras
Os dois principais autores desse debate são Ronald Dworkin e Robert
Alexy.
Os dois concordam que há uma separação qualitativa de caráter
lógico (calma, tudo será explicado à frente) entre regras e princípios.
Por exemplo, a tese mais difundida no Brasil é de que esses conceitos
se diferem pelo grau de generalidade, abstração ou
fundamentalidade.
1.1 Ronald Dworkin
Dworkin critica o positivismo de Hart: se você considera o
direito como um sistema composto só de regras, o juiz não consegue
fundamentar suas decisões em casos complexos em que não existe
regra aplicável, a não ser que ele recorra à discricionariedade judicial,
criando direito novo.
Regras só possuem a dimensão de validade.
Princípios possuem também a dimensão de peso.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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Logo, regras só podem ser válidas, ou não serem válidas, é o “tudo
ou nada”. Já princípios não, para cada caso o juiz deve analisar qual
princípio é mais importante, qual tem maior peso naquele caso.
1.2 Robert Alexy
A distinção entre princípios e regras é qualitativo e não de
grau.
Princípios são mandamentos de otimização: são normas
que estabelecem que algo deve ser realizado na maior medida
possível, diante das possibilidades fáticas e jurídicas existentes no
caso em questão. (Por isso que não se pode dizer que um princípio X
sempre prevalecerá sobre um princípio Y, porque tudo depende das
variáveis do caso concreto)
Muitas vezes, porém, há colisão de princípios, e aí deve se
usar do sopesamento para se alcançar um resultado ótimo.
Princípios expressam deveres e direitos prima facie:
isso porque eu posso restringir esses direitos e deveres dependendo
do sopesamento feito com princípios colidentes. Diferente do que
ocorre com as regras que, uma vez determinadas válidas, deve-se
realizar exatamente aquilo que elas prescrevem, sem nenhum tipo de
restrição ou ampliamento.
(a partir dos próximos tópicos ele discutirá como o Brasil recebeu essa
base teórica estrangeira, acima exposta - os tópicos são meio
independentes entre si.)
2. Um problema terminológico e tipológico
A literatura jurídica brasileira trata princípios e regras de
maneira diferente da dos dois autores acima:
Princípios: são as normas mais fundamentais do sistema. (“mandamentos nucleares”, “disposições fundamentais”, “núcleos de condensação”)
Regras: são concretizações dos princípios e, por isso, têm um caráter mais instrumental e menos fundamental.
(o objetivo principal de Virgílio nesse texto é comparar as concepções
de Dworkin e Alexy acerca do conceito de regras e princípios com a
concepção brasileira)
Diferença entre os conceitos: para Alexy a fundamentalidade
da norma ou não em NADA interfere na diferenciação entre
princípios e regras, “já que uma norma é um princípio apenas
em razão de sua estrutura normativa – qual seja,
„mandamento de otimização‟.” (o conceito de princípio na teoria
desse autor é axiologicamente neutra)
Um erro comum cometido pelos juristas brasileiros é dizer que estão
usando a concepção de Dworkin ou Alexy para distinguir princípios e
regras, mas logo em seguida começam a escrever: “pois o princípio
da legalidade..”, note, que se você está seguinda a linha de Alexy, o
“princípio da legalidade ou da anterioridade” entre outros, NÃO SÃO
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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PRINCÍPIOS, MAS SIM REGRAS. Pois justamente devido a sua
fundamentalidade eles não são passíveis de sopesamento (logo, não
são princípios). Eles atuam no regime de “tudo ou nada” (ou seja,
regras).
(só leia isso se você ainda não entendeu direito: exemplo, em
nenhum caso da Justiça Brasileira eu vou pensar em sopesar o
princípio da legalidade com qualquer outra coisa – ex. eu só posso ser
condenado por um crime que está na lei e mediante pena prescrita
em lei -, eu nunca vou dizer, “ah, sei lá, nesse caso aqui, o crime foi
muito grave e por isso, mesmo que a lei não se refira a nada disso,
eu vou mandar esse cara pra cadeira elétrica”, não! Esse princípio
será sempre aplicado em sua totalidade e nunca relativizado,
flexibilizado, sopesado, e por isso, segundo Alexy é uma REGRA, ok?)
3. Texto e norma
Humberto Ávila: a diferença está no grau de abstração.
Princípios: mais abstratos. Passam por um processo interpretativo.
Regras: menos abstratos. Elas também devem passar por um processo interpretativo. No entanto, não funcionam no modelo de “tudo ou nada”, pois precisam passar por esse processo interpretativo. As características delas só são identificadas após a interpretação feita em cima do caso concreto.
Crítica de VAS à essa corrente:
- Ávila coloca o termo “tudo ou nada” como sinônimo de
“imediatidade”, sendo que não é isso o que o termo expressa;
- Ávila desconsidera uma distinção fundamental que existe entre:
texto e norma. (texto é o enunciado linguístico e norma é o produto
da interpretação desse enunciado). Logo, a distinção entre regras e
princípios é uma distinção entre dois tipos de normas e não entre dois
tipos de textos. Ambos precisam da interpretação.
(gente, não sei se ficou muito claro esse último ponto, porque, na
verdade, pra mim não fez sentido. Eu achei que o VAS critica uma
coisa que o Ávila não disse, mas ok. Eu não acho q essa parte seja
importante, mas se vc quiser voltar ao original para entender esse
ponto está nas PP. 9, 10 e 11 do PDF. Sorry.)
4. Deveres prima facie e deveres definitivos
Inocêncio M. Coelho diz que a colisão entre princípios só pode ser
uma colisão aparente. Isso porque os princípios não tem uma
hipótese determinada como as regras, logo não teria como haver
colisão.
VAS diz que Inocêncio está errado, pois os princípios possuem sim
consequências abstratamente determinadas.
1º. Semestre / 2014 RESUMO DA MATÉRIA: DIREITOS FUNDAMENTAIS 1[ ]
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Ex.: é clara a colisão entre a liberdade de expressão e o direito à
privacidade em n casos.
Inocêncio ainda diz que a colisão seria aparente, pois o problema
residiria apenas no fato de saber qual o princípio que será aplicado.
VAS contra ataca dizendo que isso significaria que “depois de
resolvida, a colisão revelou-se apenas aparente”. Nesse sentido
então, todas as colisões seriam aparentes, exceto as irresolúveis.
Distinção entre deveres prima facie e deveres definitivos: Regras expressam deveres definitivos.
Princípios expressam deveres prima facie.
Dever definitivo é o resultado de uma ponderação entre deveres
prima facie em conflito.
Ex p/ entender: João prometeu ir à festa do amigo A. Porém, no dia
da festa, o amigo B liga p/ João dizendo estar muito doente. João faz
um sopesamento ou uma ponderação entre o dever de cumprir
promessas e o dever de ajudar os amigos doentes e decidi ir ajudar o
amigo doente.
Ou seja, no caso concreto, ambos eram deveres prima facie, mas
quando João decidiu ir ajudar o amigo doente, esse dever tornou-se o
dever definitivo.
5. Mandamentos de otimização
Humberto Ávila discorda que princípios sejam mandamentos de
otimização, pois, segundo ele, existem casos em que essas normas
não devem ser realizadas na “máxima medida possível”. Tanto
princípios quanto regras devem ser aplicadas de modo que seu
conteúdo de “dever-ser” seja realizado totalmente.
Ele sugere a classificação da colisão entre princípios em 4 categorias:
a) a realização do fim determinado por um princípio leva também à
realização do fim determinado pelo outro.
b) a realização do fim determinado por um princípio exclui a
realização do fim determinado pelo outro (isso inclui, portanto, a
exclusão de um deles como ocorre em colisão de regras).
c) a realização do fim determinado por um só leva a realização parcial
do fim do outro.
d) a realização do fim de um não interfere na realização do fim
buscado pelo outro.
VAS contra ataca: somente o item b é uma colisão! Os demais não
configuram colisão!
a) nesse caso Ávila dá a entender que um princípio existiria só em
função do outro. Como ele não dá exemplos fica difícil imaginar que o
primeiro seja até mesmo um princípio.
b) Ávila equivoca-se ao dizer que esse caso assemelha-se à colisão de
regras pois nos casos em a realização de um princípio impossibilita a
realização do outro, isso não significa que esse principio não aplicado
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seja inválido e deva ser excluído do ordenamento como ocorre com as
regras que, uma vez perdendo uma colisão deve ser retirada do
ordenamento. Isso só significa que naquele caso o princípio não era
cabível, mas que em outros ele pode ser.
VAS ainda tenta explicar o porque que eu não posso dizer que ambas
as espécies devem ter o conteúdo do “dever ser”realizado “no todo”.
Isso porque os princípios emitem deveres prima facie, que quando
analisados no caso concreto e ponderados chega-se a escolha da
prevalência de um deles e o resultado dessa escolha então é o dever
definitivo, que esse sim dever ser cumprido “no todo”, mas isso
porque ele é o conteúdo do “dever ser” de uma regra que surgiu
como produto do sopesamento entre os princípios colidentes e que
valerá apenas para aquele caso concreto.
6. A liberdade estrutural
Ana Paula de Barcellos utiliza dois critérios para distinguir regras e
princípios:
indeterminação de seus efeitos (parecido com o que Humberto Ávila diz)
multiplicidade de meios para atingi-los: - princípios: existem vários meios para atingir o fim
pretendido por esse tipo de norma.
- VAS contra ataca: isso não é uma característica só
dos princípios, mas de qualquer tipo de norma que imponha
uma ação e não uma omissão. Logo, esse não pode ser o
ponto chave para distinguir princípios e regras.
7. A teoria do direito e a distinção entre princípios e
regras
VAS diz que, no Brasil, tem ocorrido muito o fenômeno do
“sincretismo metodológico” = adoção de teoria incompatíveis como se
compatíveis fossem.
Exemplo: recepção da distinção entre regras e princípios
considerando que os princípios exigem um sopesamento para serem
aplicados e a recepção da teoria estruturante do direito de Fridrich
Muller a qual uma das conclusões é justamente a rejeição expressa
do sopesamento como método de aplicação do direito, como se
complementares fossem.
Natália Massuia
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