Desenvolvimento Rural Conceito e Medida

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    DESENVOLVIMENTO RURAL: CONCEITO E MEDIDA1

    Angela Kageyama2

    RESUMO

    O trabalho apresenta uma reviso de alguns conceitos relacionados com odesenvolvimento rural e prope uma medida, na forma de um ndice, para essedesenvolvimento (IDR, ndice de Desenvolvimento Rural). O IDR composto porquatro ndices parciais, contemplando os aspectos populacional, econmico, social eambiental. Combinando diferentes fontes de dados, o IDR foi calculado para osmunicpios do Estado de So Paulo, que foram classificados em trs faixas dedesenvolvimento rural (alto, mdio e baixo).Palavras-chave: desenvolvimento rural, ndices, Estado de So Paulo, Brasil.

    RURAL DEVELOPMENT: CONCEPT AND MEASUREMENT

    ABSTRACT

    The paper aims to discuss some concepts regarding the rural development. Further, ameasure of rural development (Rural Development Index, RDI) is proposed. The RDI iscomposed of four partial indexes concerning social, economic, demographic andenvironmental aspects of the development. The RDI is then calculated for themunicpios of the State of So Paulo, using data from several sources. Based on thevalue of the index the municpios are then classified into three levels of ruraldevelopment (high, medium and low).Key-words: rural development, indexes, State of So Paulo, Brazil.

    INTRODUO

    Desde a publicao do primeiro Relatrio sobre DesenvolvimentoHumano pelo Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD),

    1 Aceito para publicao em dezembro de 2004.2 Engenheira agrnoma, Doutora em Economia, professora do Instituto de Economia da

    Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), So Paulo, Caixa Postal 6135, CEP 13083-857Campinas, SP. [email protected]

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    em 1990, o crescimento do Produto Interno Bruto per capita dos pases passoua ser considerado totalmente insuficiente como medida do desenvolvimento.Hoje, o IDH (ndice de Desenvolvimento Humano), idealizado e implementadonaquele primeiro relatrio como medida suplementar ao PIB per capitapara a avaliao do desenvolvimento, j est incorporado no apenas nasanlises acadmicas mas nas avaliaes e programas polticos e nos discursosde muitos governantes, servindo em alguns casos como instrumento deavaliao de resultados de intervenes em escala regional e municipal.A idia central do ndice que o desenvolvimento humano inclui o aumento darenda e da riqueza e tambm inclui outros bens e valores, nem sempre materiais,que fazem parte das aspiraes das pessoas. Por isto, o desenvolvimentohumano consiste no processo de ampliao das escolhas das pessoas. (UNDP,1999, p. 16).

    O desenvolvimento econmico, social, cultural, poltico umconceito complexo e s pode ser definido por meio de simplificaes, queincluem decomposio de alguns de seus aspectos e aproximao poralgumas formas de medidas.

    O objetivo deste trabalho revisar alguns conceitos relacionados com odesenvolvimento rural e propor um exemplo de medida, na forma de um ndice,para esse desenvolvimento.

    De acordo com Veiga (2000), no existe o desenvolvimento rural comofenmeno concreto e separado do desenvolvimento urbano. O desenvolvimento um processo complexo, por isso muitas vezes se recorre ao recurso mentalde simplificao, estudando separadamente o desenvolvimento econmico,por exemplo; ou, como prope Veiga, pode-se estudar separadamente o ladorural do desenvolvimento.

    Na seo seguinte, procura-se extrair, da literatura recente, oselementos bsicos, e de alguma forma consensuais, que devem definir odesenvolvimento rural. A partir desses elementos, prope-se, na seoseguinte, um IDR (ndice de Desenvolvimento Rural) que seria possvelcalcular em nvel municipal com as estatsticas brasileiras disponveis.Ao final, apresenta-se uma aplicao do ndice para o Estado deSo Paulo.

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    DESENVOLVIMENTO RURAL: CONCEITOS

    O que rural?

    Como explica Baptista (2001), a Sociologia Rural, no incio do sculo 20,distinguia rural e urbano

    [...] estabelecendo a conexo entre os elementos caracterizadores do primeiro eprocurando explicar, com base nalgumas variveis (ocupacionais, ambientais,tamanho das comunidades, densidade populacional, homogeneidade e heterogeneidadedas populaes, diferenciao, estratificao e complexidade social, mobilidade social,migraes, sistema de integrao social), os diferentes graus do rural e do urbano,que se ordenavam no espao, sem rupturas, num contnuo gradual entre os plosextremos. (BAPTISTA, 2001, p. 55).

    Mas esses elementos definidores do rural foram se modificando ao longo dahistria, ganhando novos contornos: a grande propriedade j no reina absoluta, aagricultura se modernizou, a populao rural passou a obter rendimentos nasadjacncias das cidades, a prpria indstria penetrou nos espaos rurais e reduziram-se as diferenas culturais entre campo e cidade:

    O espao [rural] agora procurado por urbanos, consumidores da natureza edas atividades que esta proporciona. O mercado j no se limita a pr em relao,atravs das trocas de produtos agrcolas e de equipamentos e tecnologias,dois espaos produtivos: a cidade industrial e o campo agrcola. Hoje envolvetodo o territrio numa teia diferenciada de atividades e de fluxos econmicos. (Ibid.,p. 55)

    No caso estudado por Baptista, basicamente a Europa do Sul, o elementoque sobrevive mais forte da diferenciao rural-urbano o tamanho dosaglomerados populacionais:

    Dos elementos inicialmente convocados para delimitar a especificidade do ruralresta, passado menos de um sculo da histria das sociedades rurais e do percursoda Sociologia Rural, a pequena dimenso dos aglomerados (Newby, 1983). Ler orural corresponde assim a analisar, em funo de um determinado objetivo ouperspectiva, estes povoados, onde, de um local a outro, predominam atividadeseconmicas e sociais diversas, prevalecem vertentes culturais e relaes sociaisdiferenciadas e a propriedade fundiria ocupa lugares distintos na vida social epoltica. (Ibid., 2001, p. 56).

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    Terluin (2003, p. 328-329), em estudo relacionando desenvolvimentoeconmico e rea rural, adota como unidade de anlise a regio rural assimdefinida:

    [...] uma unidade territorial com uma ou mais pequenas ou mdias cidades circundadaspor grandes reas de espao aberto, com uma economia regional compreendendoatividades agrcolas, industriais e de servios e uma populao com densidaderelativamente baixa.

    Abramovay (2003), apoiando-se no princpio de que ruralidade umconceito de natureza territorial e no-setorial, mostra que trs aspectos bsicoscaracterizam o meio rural: a relao com a natureza, a importncia das reasno densamente povoadas e a dependncia do sistema urbano. O bem-estareconmico das reas de povoamento mais disperso depende da atividadeeconmica das cidades prximas e mesmo dos grandes centros urbanos maisafastados.

    Para Veiga (2002), os critrios utilizados para demarcar as divisesterritoriais nos diversos pases so, em sua maioria, anacrnicos e noresultaram de nenhuma necessidade relacionada com o que hoje se denominadesenvolvimento territorial. No caso do Brasil, o problema de classificao doque rural mais grave, dado que se baseia numa definio de cidade sede de municpio que exagera sobremaneira o grau de urbanizao, aoconsiderar urbana toda sede de municpio (cidade) e de distrito (vila), sejamquais forem suas caractersticas.

    A discusso sobre a definio de rural praticamente inesgotvel, masparece haver um certo consenso sobre os seguintes pontos: a) rural no sinnimo de agrcola e nem tem exclusividade sobre este; b) o rural multissetorial (pluriatividade) e multifuncional (funes produtiva, ambiental,ecolgica, social); c) as reas rurais tm densidade populacional relativamentebaixa; d) no h um isolamento absoluto entre os espaos rurais e as reasurbanas. Redes mercantis, sociais e institucionais se estabelecem entre o rurale as cidades e vilas adjacentes3.

    3 Para uma discusso mais ampla, consultar Kageyama (2003).

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    Embora seja possvel eleger uma definio ideal de rural e urbano,acaba-se sempre por esbarrar na disponibilidade de informaes se o caso aplicar a definio numa pesquisa emprica abrangente e geralmente opesquisador se conforma com a definio administrativa ou legal presente nassuas fontes de dados.

    Segundo o Censo Demogrfico, que a principal fonte dos dadosutilizados neste trabalho,

    Rural a rea externa ao permetro urbano de um distrito, composta por setoresnas seguintes situaes de setor: rural de extenso urbana, rural povoado, rural ncleo,rural outros aglomerados, rural exclusive aglomerados. (IBGE, 2002,p. 66).

    Essa delimitao baseia-se na definio administrativa de distrito e depermetro urbano (linha divisria dos espaos juridicamente distintos de umdistrito, estabelecida por lei municipal) e utilizada para classificar os domicliospesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE).

    O que desenvolvimento rural?

    Para Terluin (2003), o estudo terico das foras que esto por trs dodesenvolvimento nas reas rurais carece de uma disciplina especfica, por isso necessrio recorrer a outras disciplinas que tratam do desenvolvimentoeconmico em regies rurais, como a economia regional e o campomultidisciplinar dos estudos rurais (economia rural, sociologia rural, geografiarural, demografia, etc.). Mas o desenvolvimento das reas rurais dificilmentepode ser explicado satisfatoriamente por apenas uma das teorias desses diversoscampos de estudo. No campo dos estudos rurais, por exemplo, trs enfoquespodem ser identificados: o do desenvolvimento exgeno, o enfoque dodesenvolvimento endgeno e uma combinao dos dois. No primeiro enfoque,o desenvolvimento rural imposto por foras externas e implantado em certasregies. Exemplo emblemtico o das polticas de modernizao da agriculturacomo forma de estimular o desenvolvimento rural. O enfoque do desenvolvimentoendgeno centra-se no desenvolvimento local, gerado por impulsos locais ebaseado predominantemente em recursos locais, em que os atores e asinstituies desempenham papel crucial; o caso tpico o dos modelos dosdistritos industriais. Finalmente, o desenvolvimento rural pode ser visto como

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    uma combinao de foras internas e externas regio, em que os atores dasregies rurais esto envolvidos simultaneamente em um complexo de redeslocais e redes externas que podem variar significativamente entre regies.

    De acordo com van der Ploeg et al. (2000), o paradigma da modernizaoda agricultura, que dominou a teoria, as prticas e as polticas, como a principalferramenta para elevar a renda e o desenvolvimento das comunidades rurais,vem sendo substitudo, notadamente na Europa, por um novo paradigma, o dodesenvolvimento rural, no qual se incluem a busca de um novo modelo parao setor agrcola, com novos objetivos, como a produo de bens pblicos(paisagem), a busca de sinergias com os ecossistemas locais, a valorizaodas economias de escopo em detrimento das economias de escala e apluriatividade das famlias rurais.

    O desenvolvimento rural implica a criao de novos produtos e novosservios, associados a novos mercados; procura formas de reduo de custosa partir de novas trajetrias tecnolgicas; tenta reconstruir a agricultura noapenas no nvel dos estabelecimentos, mas em termos regionais e da economiarural como um todo; representa, enfim, [...] uma sada para as limitaes efalta de perspectivas intrnsecas ao paradigma da modernizao e ao aceleradoaumento de escala e industrializao que ele impe (p. 395). Por isso, paraesses autores, o desenvolvimento rural um processo multinvel, multiatorese multifacetado. Quanto ao primeiro aspecto, deve-se considerar odesenvolvimento rural num nvel global, a partir das relaes entre agriculturae sociedade; num nvel intermedirio, como novo modelo para o setor agrcola,com particular ateno s sinergias entre ecossistemas locais e regionais; oterceiro nvel o da firma individual, destacando-se as novas formas de alocaodo trabalho familiar, especialmente a pluriatividade. A complexidade dasinstituies envolvidas no processo de desenvolvimento rural que faz comque dependa de mltiplos atores, envolvidos em relaes locais e entre aslocalidades e a economia global (redes). Por ltimo, as novas prticas, comoadministrao da paisagem, conservao da natureza, agroturismo, agriculturaorgnica, produo de especialidades regionais, vendas diretas, etc., fazem dodesenvolvimento rural um processo multifacetado, em que propriedades quehaviam sido consideradas suprfluas no paradigma da modernizao podemassumir novos papis e estabelecer novas relaes sociais com outras empresase com os setores urbanos.

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    O redescobrimento do desenvolvimento rural4 deu-se em funo danecessidade de reorientao do protecionismo da Poltica Agrcola Europia(PAC), que reconheceu, de um lado, os problemas criados pela agriculturaintensiva e, de outro, a multifuncionalidade do espao rural (funes produtivas,papel no equilbrio ecolgico e suporte s atividades de recreao e preservaoda paisagem). Segundo Sacco dos Anjos (2003), a nova filosofia da ComissoEuropia partiu de algumas premissas que permitiram, no fim dos anos 80 eincio dos 90, chegar aos novos enfoques do desenvolvimento rural. Essaspremissas eram: a) o reconhecimento de que a modernizao agrcola incidirsempre sobre o emprego no sentido de reduzi-lo, mas a populao podepermanecer no seu local de origem praticando atividades no-agrcolas;b) devido ao desemprego urbano, a populao deve ser dissuadida de abandonaro campo; c) o espao rural perde a funo primordial produtiva, e outraspassam a ser valorizadas (funes paisagstica, turstica e ecolgica);d) a desagrarizao do meio rural no deve significar a falncia da produofamiliar, mas seu fortalecimento por meio da diversificao das fontes de renda,da agregao de valor aos produtos aproveitando nichos de mercado e aconverso do agricultor em empresrio rural; e) o reforo da pluriatividade,tanto sob a forma de atividades complementares dentro do prprioestabelecimento, como pela integrao a outros setores econmicos (indstriae servios).

    Os novos esquemas de desenvolvimento rural erguem-se sobre duas estratgias ouproposies fundamentais: diversificar e aglutinar. O primeiro dos termos dizrespeito ao incentivo a todo tipo de atividades e iniciativas levadas a termo peloagricultor e seus familiares no seio da explorao ou fora dela. Aglutinar, por outraparte, significa a possibilidade de que a unio dos distintos ingressos gerados mediantea diversificao sirvam para garantir um nvel de vida socialmente aceitvel. O crucial que a especializao produtiva conduz instabilidade e dependncia exclusiva auma nica fonte de ingresso, o exerccio de mltiplas atividades simultaneamentepermite um maior grau de autonomia e uma ocupao plena da fora de trabalho dogrupo domstico. (SACCO DOS ANJOS, 2003, p. 76).

    4 O conceito de desenvolvimento rural integrado foi muito utilizado na Amrica Latina, a partirde meados dos anos 60 em contraposio idia da reforma agrria e at como seu substitutivo.Muitos planos e projetos foram elaborados, destacando-se, no Nordeste brasileiro, os PDRI (Projetosde Desenvolvimento Rural Integrado). Ver, a respeito, Sacco dos Anjos, (2003, p. 74 et seq.).

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    A natureza multifuncional das reas rurais5 est reconhecida pelaComisso Europia na reforma da PAC de 1999:

    Os dois pilares da reforma da PAC so a criao de uma agricultura competitiva,sustentvel, orientada para a qualidade que respeite o ambiente e a elaborao de umnovo quadro para o desenvolvimento rural. Juntos, esses pontos estabelecem ocontexto para uma poltica rural europia baseada em trs princpios: no se temdesenvolvimento rural sem agricultura; no se tem agricultura e nem agricultor semoutras atividades; e no h outras atividades sem o desenvolvimento de vilas ecidades de pequeno e mdio porte. (KINSELLA et al., 2000, p. 484)

    A poltica agrcola da Unio Europia tem-se voltado cada vez maispara uma poltica de desenvolvimento rural, na busca de um equilbrio entrevalores econmicos, sociais e ecolgicos. Ainda que a agricultura continue aser o corao da economia rural, em muitas reas ela j no constitui suafora motora, os empregos no-agrcolas so dominantes e os agricultores soocupados cada vez mais em tempo parcial. Uma poltica de desenvolvimentorural deve ser multissetorial e, com base num enfoque territorial, deve contribuirpara uma maior coeso econmica e social: a) na criao e manuteno deuma agricultura competitiva onde for possvel (Funo Alimentar); b) na proteoda paisagem onde for necessrio (Funo Ambiental); c) no aumento daviabilidade e da qualidade de vida das reas rurais (Funo Rural). (VANDEPOELE, 2000).

    Para a Organizao para Cooperao e Desenvolvimento Econmico(OCDE), um elemento chave do desenvolvimento rural a criao de empregos.O ponto de partida desse argumento que a globalizao da economia, aovalorizar cada vez mais a inovao tecnolgica e a qualidade dos recursoshumanos, acarretou uma mudana estrutural significativa na demanda de trabalhonas ltimas dcadas do sculo 20, no sentido de reduzir consideravelmente anecessidade de trabalho no-qualificado e de alterar profundamente as

    5 Em vez de multifuncionalidade do rural, Mollard (2003) atribui a multifuncionalidade agricultura,porque ela fornece no apenas produtos agrcolas e alimentares, mas servios ambientais eecolgicos. O conceito de multifuncionalidade responde idia de que a atividade agrcolaassegura simultaneamente funes econmicas, sociais, espaciais e ambientais (p.29). Essetrabalho procura mostrar que a anlise da multifuncionalidade, especificamente dos serviosambientais, pode ser feita utilizando o conceito de externalidades, e a introduo da dimensoterritorial auxilia a refinar a anlise.

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    categorias de trabalho qualificado necessrio (a referncia so os pasesmembros da OCDE); alm disso, as dificuldades de adaptao da oferta detrabalho geraram altas taxas de desemprego. Para enfrentar o problema dereadequao do mercado de trabalho, vrias estratgias foram implementadas(programas de qualificao do trabalhador, aumento dos empregos pblicos,etc.), entre as quais algumas direcionadas ao contexto rural. Essas estratgiasdeveriam levar em conta a diversidade das zonas rurais entre pases e nointerior de cada pas, segundo uma classificao que reflete seu grau dedesenvolvimento. Prope-se ento uma classificao territorial em trs tiposde zonas rurais, fundada no seu grau de integrao nas economias nacional einternacional:

    a) Zonas economicamente integradas: zonas rurais prsperas, geralmenteprximas de um centro urbano ao qual se integram por uma redede comunicaes bem desenvolvida, combinando as melhoresvantagens da vida no campo e na cidade, e aproveitando economiasde escala e de aglomerao, com demanda e oferta diversificadas deemprego.

    b) Zonas rurais intermedirias: so zonas tradicionalmente desenvolvidascom base num setor agrcola prspero e nas atividades a ele associadas;so geralmente afastadas de centros urbanos, mas com infra-estruturade transporte suficiente para ter acesso a eles; so zonas emprocesso de integrao econmica, em que as novas atividades(indstria, comrcio, turismo) comeam a transformar a estrutura doemprego.

    c) Zonas rurais isoladas: possuem uma populao dispersa e localizam-se em reas perifricas bem afastadas de centros urbanos (montanhase ilhas, por exemplo); a infra-estrutura e os servios locais soprecrios, a produo tradicional (agricultura e pequeno artesanatolocal), as rendas e a qualificao da mo-de-obra so bastante baixas.

    O enfoque proposto para estimular o potencial de desenvolvimentoendgeno das zonas rurais consiste em adotar medidas que levem em contaas caractersticas especficas de cada tipo de zona, mas em primeiro plano, eem comum para todas as zonas, essas medidas devem visar melhoria daqualidade de vida e a luta contra o isolamento. Esse enfoque:

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    [...] tem por objeto a redefinio do espao de sustentao econmica das zonasrurais por meio de estruturas apropriadas e de redes de relaes tanto no interiorcomo no exterior de cada zona. Trata-se de um meio de reforar a identidade daesfera local e de religar atores e atividades de maneira a formar circuitos que permitammelhorar as relaes com o exterior da regio e de tecer novas relaes. (OCDE,1995, p. 97)

    Epstein e Jezeph (2001) sugerem, para os pases em desenvolvimento,um paradigma de desenvolvimento com base na parceria rural-urbano.Partindo da constatao de que os pases pobres, mesmo aqueles em que apopulao rural ainda majoritria, tendem a concentrar seus escassos recursosno desenvolvimento industrial urbano, acelerando com isso a migrao rural-urbana e os problemas que ela traz para as cidades, os autores sugerem umredirecionamento dos esforos desenvolvimentistas (e dos recursos das agnciasinternacionais para o Terceiro Mundo), no sentido de tornar mais atrativas asreas rurais como forma a reter a populao mais pobre, potenciais migrantes.

    Em toda parte mais nfase deve ser dirigida ao desenvolvimento rural paradesencorajar a migrao rural-urbana especialmente nos pases onde a maioria dapopulao ainda vive em reas rurais. O desenvolvimento rural e o urbano precisamser considerados processos complementares, em vez de competidores por recursoslimitados. (Ibid., 1995)

    Das diversas definies apresentadas, pode-se extrair a idia de que odesenvolvimento rural deve combinar o aspecto econmico (aumento do nvele estabilidade da renda familiar) e o aspecto social (obteno de um nvel devida socialmente aceitvel), e que sua trajetria principal possa residir nadiversificao das atividades que geram renda (pluriatividade).

    O desenvolvimento rural tem de especfico o fato de referir-se a umabase territorial, local ou regional, na qual interagem diversos setores produtivose de apoio, e nesse sentido trata-se de um desenvolvimento multissetorial.Ao mesmo tempo, as reas rurais desempenham diferentes funes no processogeral de desenvolvimento e, ao longo desse processo, essas funes semodificam. A funo produtiva, antes restrita agricultura, passa a abrangerdiversas atividades, o artesanato e o processamento de produtos naturais eaquelas ligadas ao turismo rural e conservao ambiental; a funopopulacional, que nos perodos de industrializao acelerada consistia emfornecer mo-de-obra para as cidades, agora inverteu-se, requerendo-se odesenvolvimento de infra-estrutura, servios e oferta de empregos que

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    assegurem a reteno de populao na rea rural; a funo ambiental passa areceber mais ateno aps as fases iniciais da industrializao (inclusive docampo) e demanda do meio rural a criao e proteo de bens pblicos equase pblicos, como paisagem, florestas e meio ambiente em geral. Assim, odesenvolvimento rural, alm de multissetorial, deve ser tambm multifuncional.

    Pode-se extrair tambm, das abordagens apresentadas, um conjunto deelementos que favorecem (ou compem) o desenvolvimento rural:

    A integrao mercantil com cidades da prpria regio: o dinamismoeconmico das cidades de mdio porte, principalmente pela criaode atividades tercirias, favorece o desenvolvimento das comunidadesrurais adjacentes.(VEIGA, 2000, p. 195)

    A combinao de uma agricultura familiar consolidada com um processode urbanizao e industrializao endgeno e descentralizado, gerandoum mercado local de consumo de produtos diversificados efornecimento de matrias-primas e mo-de-obra rural para a indstrialocal. (Ibid.)

    A pluriatividade das famlias rurais, que permite a reteno de populaorural e reduo do xodo.

    A diversidade das fontes de renda, que permite maior autonomia (menordependncia da atividade agrcola exclusiva) e menor instabilidade darenda.

    Os programas de gerao de emprego e de melhoria da qualidade devida, que permitem reduzir as migraes e a luta contra o isolamento(OCDE, 1995).

    A existncia de recursos territoriais que permitam produzir paramercados especficos (vinhos, turismo, etc.), possibilitando ainternalizao de externalidades positivas. (MOLLARD, 2003)

    Uma anlise do desenvolvimento rural ou de seu potencial em nveislocais e regionais deveria levar em conta esses elementos. Regies com redesurbanas bem distribudas, com recursos territoriais adequados, mercados locaisque favoream a pluriatividade devem apresentar um alto grau dedesenvolvimento rural, em contraste com reas isoladas, sem privilgios naturaise sem instituies locais adequadas.

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    Segundo Abramovay (2003, p. 52),Embora existam traos comuns da ruralidade, claro que o meio rural caracteriza-sepor sua imensa diversidade. Estabelecer tipologias capazes de captar esta diversidade uma das importantes misses das pesquisas contemporneas voltadas para adimenso espacial do desenvolvimento.

    Neste trabalho, procura-se apresentar uma contribuio para essa linhade pesquisa, mostrando a diversidade do desenvolvimento rural no Estado deSo Paulo.

    A urbanizao do meio rural em So Paulo

    No Brasil houve, na dcada de 80, um recuo no ritmo do crescimentourbano, apesar do aumento no nmero de cidades e de habitantes urbanos.Invertendo a tendncia observada nas dcadas anteriores, o maior crescimentodeu-se nas cidades mdias (20 mil a 50 mil habitantes) e desconcentrou-seligeiramente a populao nas grandes cidades. A participao das regiesmetropolitanas no crescimento total baixou de 41,3% na dcada de 70 para29,7% na de 80; ao lado desse processo de reduo da metropolizao,observou-se um maior crescimento populacional nos municpios perifricos sregies metropolitanas. (MARTINE, 1995, p. 78 et seq.)

    Em So Paulo, j no incio da dcada de 70 verificou-se a reversoda polarizao da rea metropolitana. Em decorrncia das deseconomiasda urbanizao aumento do preo da terra, dos salrios e aluguis, doscustos de infra-estrutura e de controle da poluio muitas empresaspassaram a buscar alternativas locacionais. Ao mesmo tempo, criaram-se novaseconomias de aglomerao em cidades mdias do interior paulista e houvediversos tipos de incentivo fiscal para promover a desconcentrao industrial.Assim,

    [...] ocorreu grande expanso industrial no interior de So Paulo. Esse crescimento foifacilitado pela existncia de uma rede de centros urbanos de tamanho mdio, com boabase de servios modernos, por certa base industrial e pelo mercado de trabalhoprofissional, especialmente articulado com a rede universitria e de pesquisas existenteno interior do Estado. (DINIZ; SANTOS, 1995, p. 209).

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    A partir do final dos anos 80, um novo movimento de desconcentraoespacial das atividades pode ser observado em So Paulo, agora em direoao rural: a busca de melhor condio de moradia ou de reas mais baratas paraimplantar atividades industriais, a valorizao de bens como a paisagem e anatureza, a necessidade de complementar as rendas agrcolas, fizeram crescersignificativamente a atividade no-agrcola na rea rural, num processo que foichamado de urbanizao do meio rural. (SILVA, 1999). Aqui, novamente, aexistncia de uma rede de pequenas e mdias cidades do interior paulista foifundamental para viabilizar essas transformaes, ao constituir mercados (deoferta de servios e matrias-primas e demanda de produtos) para essas novasatividades.

    Apesar de ser o estado mais urbano do Pas, So Paulo constitui umcampo de estudo privilegiado para o desenvolvimento rural. Alm do mais, oestado no homogneo, possibilitando observar distintos nveis dessedesenvolvimento, como ser visto na parte final deste trabalho.

    UM NDICE DE DESENVOLVIMENTO RURAL

    O Programa de Desenvolvimento Rural da OCDE, lanado em 1991,estabeleceu trs etapas para a gerao de indicadores de desenvolvimentorural. Primeiro, estabeleceu um esquema territorial para a coleta de dados emnvel subnacional nos diversos pases-membros, que permitiu classificar asregies em trs tipos: predominantemente rurais, predominantementeurbanizadas e significativamente rurais. O indicador bsico que define asunidades territoriais rurais e urbanas e permite classificar as regies a densidadepopulacional. Em seguida, definido um conjunto de indicadores demogrficos,econmicos, sociais e ambientais. Finalmente, so produzidas as sriesestatsticas que permitem comparar e analisar as tendncias do desenvolvimentorural. (OECD, 1996)

    O que interessa especificamente o conjunto de indicadores sugeridospara descrever o desenvolvimento rural, um conceito complexo emultissetorial. A seguir, apresentam-se esses indicadores (OECD, 1996,p. 22.).

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    Obter as informaes para construir todos esses indicadores em nveisregionais adequados s possvel com um enorme esforo institucional dirigidoespecificamente ao tema. Se o pesquisador est limitado pelas estatsticasdisponveis e provavelmente coletadas para outros fins impossvelreproduzir essas medidas para todas as unidades territoriais selecionadas.

    Mas o quadro pode servir de inspirao para propor medidas factveisque levem em conta pelo menos alguns aspectos mais importantes contidos naidia de desenvolvimento rural.

    Utilizando o Censo Demogrfico de 1991, as informaes desagregadas(microdados) do Censo Demogrfico de 2000, o Censo Agropecurio de 199596por municpio e informaes adicionais do Instituto de Economia Agrcola deSo Paulo (IEA), tambm em nvel municipal, prope-se a seguir um exemplode ndice de desenvolvimento rural (IDR) que procura reunir numa medida-sntese aspectos populacionais, econmicos, sociais e ambientais que permitemclassificar os municpios de So Paulo segundo seu grau de desenvolvimentorural. Dos 645 municpios existentes em 2000, 20 foram eliminados por noexistirem em 1991 (impossibilitando o clculo da variao populacional noperodo); outros 20 municpios foram eliminados por no terem domiclios ruraisem 2000, segundo o Censo Demogrfico; para compatibilizar ainda as diferentesfontes de dados (Censo Agropecurio e produo agrcola do IEA) foinecessrio eliminar mais 13 municpios, restando 592 municpios, que constituem

    Populao e migraoDensidade

    VariaoEstrutura

    DomicliosComunidades

    Estrutura e desempenho econmicoFora de trabalho

    EmpregoParticipaes setoriais

    ProdutividadeInvestimentos

    Bem-estar social e eqidadeRenda

    HabitaoEducao

    SadeSegurana

    Meio ambiente e sustentabilidadeTopografia e clima

    Mudanas no uso da terraEspcies e habitats

    gua e soloQualidade do ar

    Indicadores rurais: um conjunto bsico

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    nosso universo de anlise. Note-se que, embora o ndice refira-se aodesenvolvimento rural, os municpios foram considerados em sua totalidade,com reas rurais e urbanas.

    Antes de apresentar o ndice, enfatiza-se que a medida proposta no anica possvel e muito menos a ideal. Utilizando os mesmos dados, outros ndicespoderiam ser gerados, alterando os pesos dos componentes ou arbitrando deforma diversa os limites propostos; trata-se apenas de um exemplo possvel demedida, a partir das estatsticas disponveis. E ainda que tenha sido o exemploselecionado, contm vrias imperfeies que podem vir a ser atenuadas pelamelhoria das estatsticas existentes e pela disponibilizao de novos dados(sobretudo os indicadores de meio ambiente), bem como pela melhor escolhade indicadores bsicos. Poderiam ser aplicadas, no caso do IDR, as palavrasde Amartya Sen ao comentar o IDH, na Apresentao do Relatrio doDesenvolvimento Humano de 1999 (UNDP, 1999, p. 23): apenas einescapavelmente um ndice bruto (nu e cru), mas pode ser um passo inicialpara incentivar as pessoas a se interessar pelo rico conjunto de informaesdesagregadas que deram origem a ele.

    Para construir o IDR, foram calculados quatro ndices parciaisrepresentando os quatro aspectos antes apontados. Cada um desses ndicesparciais composto pela mdia aritmtica de indicadores simples, apresentadosa seguir. O IDR, por sua vez, a mdia aritmtica dos quatro ndices parciais:

    IDR = (IPOP + IBES + IECO + IMA/4

    Indicadores utilizados no IDR

    Populao e migraoDensidade demogrficaVariao da populao rural entre 1991 e 2000% de populao rural em 2000% de populao que no morou sempre nomunicpio (migrantes)

    EconomiaRenda domiciliar per capitaPluriatividadeProdutividade do trabalho na agricultura

    Bem-estar socialDomiclios com instalao sanitriaDomiclios com telefoneAnos de estudo das pessoas de 7 anos e maisProporo da populao de 7 a 14 anos quefreqenta escola

    Meio ambienteAusncia de monoculturasConservao do solo

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    A seguir so descritos esses ndices parciais:1) ndice de populao (IPOP)

    4/)( pmigrpopruralvruraldensidIPOP +++=

    densid = densidade demogrfica do municpio padronizada6;vrural = variao percentual da populao rural do municpio entre 1991

    e 2000, padronizada;poprural = proporo de populao rural no municpio;pmigr = proporo da populao total do municpio que no residiu sempre

    no mesmo municpio.

    Os componentes do ndice de populao procuram medir o dinamismopopulacional que deveria favorecer o desenvolvimento rural. Em linhas gerais,quanto maior a densidade demogrfica, menor o isolamento das reas rurais emaiores as oportunidades de estabelecimento de redes sociais; quanto maior apopulao rural e seu crescimento na dcada, maior a capacidade da rearural de reter populao; quanto maior a proporo de pessoas que vieram deoutros municpios, maior a capacidade de atrao que aquele municpio exercena regio.

    2) ndice de bem-estar social (IBES):

    psanit = proporo de domiclios rurais com instalao sanitria;ptelef = proporo de domiclios rurais com telefone (fixo ou celular);anoses t = nmero mdio de anos de estudo dos moradores de 7 anos ou

    mais nos domiclios rurais (padronizado);pescol = proporo de crianas de 7 a 14 anos nos domiclios rurais que

    freqentam escola.

    6 A padronizao consiste em fazer uma transformao algbrica para que o ndice varie no intervalode zero a um. Essa transformao o quociente (valor da varivel mnimo)/(mximo mnimo).

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    IBES = ( psanit + ptelef + anosest + pescol) / 4

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    Enquanto o ndice de populao composto por variveis relativas aomunicpio como um todo, o IBES refere-se apenas situao de bem-estarnos domiclios rurais. Inclui dois indicadores de equipamentos habitacionais(sanitrio e telefone) e dois indicadores de educao. Note-se que muitos outrosindicadores desse tipo podem ser calculados com os dados disponveis, mas osselecionados so os que possuem maior poder de discriminao no Estado deSo Paulo. Indicadores como gua encanada, eletrodomsticos, ausncia deanalfabetismo, por exemplo, so uniformemente altos em praticamente todosos municpios de So Paulo.7

    3) ndice de desempenho econmico (IECO):

    renda = renda domiciliar per capita nos domiclios rurais (padronizada);pluri = proporo de ocupados em atividades no-agrcolas em relao

    ao total de ocupados nos domiclios rurais;produtiv = produtividade do trabalho na agricultura = valor da produo

    agropecuria do municpio/nmero de pessoas ocupadas nos estabelecimentosagropecurios (padronizado). Dado coletado no Censo Agropecurio de 19951996.

    Esse ndice representa o ncleo duro do desenvolvimento, por conterdois indicadores tradicionais a que geralmente se reduz o conceito dedesenvolvimento econmico, a renda e a produtividade.

    4) ndice de meio ambiente (IMA):

    nmonoc = ausncia de monoculturas que tendem a provocar problemasambientais (dados de produo e rea coletados no IEA);

    7 claro que se o objetivo fosse comparar com uma regio mais pobre, como o Nordeste, porexemplo, em que instalao sanitria e telefone no meio rural so quase inexistentes, outrosindicadores deveriam ser escolhidos.

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    IMA = (nmonoc + psolo) /2

    IECO = (renda + pluri + produtiv) / 3

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    psolo = proporo de estabelecimentos agropecurios do municpio queadotam prticas de conservao do solo (Censo Agropecurio).

    Este o componente mais problemtico do IDR, devido falta deinformaes sobre qualidade do meio ambiente no meio rural para todos osmunicpios. Mas julgou-se prefervel introduzir alguma informao, ainda queimperfeita, a deixar o aspecto ambiental totalmente ausente do ndice,principalmente porque o mesmo fator que tende a elevar a renda e aprodutividade, a modernizao qumico-mecnica da agricultura, pode contribuirfortemente para a degradao ambiental. Assim, poder-se-ia atribuir alto valorao ndice de desenvolvimento rural em determinada regio em funo de seubom desempenho econmico, mas poderia tratar-se de rea com pssimaqualidade do solo, da gua e do ar, tanto para a produo agrcola a longoprazo, como para os moradores da rea rural e do municpio como um todo.

    Dada, porm, a falta de informaes apropriadas, foi necessrio recorrera um indicador indireto de (menor) presena dos efeitos nocivos do modelo demodernizao agrcola, combinado com os efeitos compensadores das prticasde conservao de solo nos estabelecimentos agropecurios. Este segundocomponente no apresenta maiores problemas e no precisa ser comentado.Quanto ao primeiro, so necessrias algumas explicaes.

    Partiu-se da idia apresentada por Olivette et al. (2003) a respeito darelao entre presena de monoculturas e uso de tecnologias qumicas(defensivos e outros) nas regies do Estado de So Paulo, referindo-se aocomportamento da rea e da produtividade agrcola nesse estado entre 1983 e2002:

    Os resultados tambm corroboram que o aumento da produo tem sido causadopela diminuio da diversidade das culturas, gerando sistemas de produo e regiesaltamente especializadas e heterogneas entre si para uma mesma lavoura. Issodeixa evidente que essa especializao s mantida pela tecnologia que direcionaesses sistemas produtivos, transformando solos, reduzindo custos, diminuindociclos de produo, utilizando defensivos qumicos, criando novas variedades deplantas resistentes a pragas, doenas e com maior capacidade de produo.(OLIVETTE et al., 2003, p. 102)

    Essa concluso sugere que as regies mais produtivas do estado tenderama se especializar em uma ou poucas culturas modernas leia-se grandesconsumidoras de agrotxicos e/ou poluidoras do ar e/ou empobrecedoras do

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    solo. Inversamente, possvel admitir com as limitaes que isso venha a ter que nas regies de produo mais diversificada os desequilbrios ambientaistendam a ser menores.

    O indicador proposto aproveita essa idia, como um primeiro passo paraintroduzir a dimenso ambiental numa medida de desenvolvimento rural,sabendo-se de antemo que ela precria e insuficiente, mas considerandoque os benefcios ainda superam os custos metodolgicos.

    Procurou-se, inicialmente, identificar as principais monoculturas dasregies de So Paulo, selecionando-se a cana, a laranja, a soja e as pastagens.Em seguida, considerou-se que um municpio com mais de 40% da rea totaldos estabelecimentos agropecurios (dado do Censo Agropecurio de 199596) ocupada com soja ou cana ou laranja (dado do IEA para 2002) ou commais de 50% de pastagens (C.A. 1995-96) cai na categoria monocultor,recebendo valor 0; caso essas condies no se verifiquem, o municpio no monocultor e recebe valor 1. Cria-se, assim, uma varivel binria que valoracom 0 a presena de monocultura e, indiretamente, a degradao ambiental; ecom valor 1 a ausncia de monocultura e, por extenso, a menor degradaoambiental.

    Para se ter uma idia do que isso representa, dos 592 municpiosanalisados, 14 apresentaram monocultura de soja, 7 de laranja, 106 de canae 310 de pastagens. Segundo o Censo Agropecurio, em 98,3% da rea dototal de estabelecimentos com cana so usados adubos qumicos e em 90,6%usam-se agrotxicos; para a soja os valores so, respectivamente, 99,5% e96,3%; para laranja, 50,7% e 47,9%.

    O indicador de ausncia de monocultura foi em seguida combinado como indicador de conservao do solo (mdia aritmtica), gerando o ndice demeio ambiente (IMA) para cada municpio.

    Na Tabela 1 so apresentadas informaes para as variveisque entraram na composio dos ndices, tendo como unidades de observaoos municpios de So Paulo. Na Tabela 2 mostra-se a freqncia de municpiosem que os indicadores de monocultura foram iguais a 0 (ou seja,existe monocultura). Poucos municpios foram afetados pelo ndice referente asoja e laranja, mas as monoculturas de cana e pastagem foram bem maisfreqentes.

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    Quanto s variveis da Tabela 1, deve-se notar a elevada disperso emalguns casos, como densidade populacional, variao da populao rural eprodutividade agrcola. A pluriatividade (% de ocupados no-agrcolas rurais)e a conservao do solo variaram entre zero e 100% entre os municpios paulistas,mas a disperso em relao mdia no foi to elevada.

    Na Tabela 3 so apresentadas algumas estatsticas descritivas para osndices e seus componentes. As maiores disperses aparecem no IMA e noIECO, com uma clara tendncia de que o IMA dominaria o ndice final, devido sua elevada varincia. Para evitar essa maior influncia de um nicocomponente no ndice de desenvolvimento rural, os quatro ndices parciais foramtransformados em variveis reduzidas (expressas portanto em nmero dedesvios-padro), todas com varincia igual a 1, antes de calcular sua mdiaaritmtica, para efeito de classificao dos municpios.

    Tabela 2. Municpios com ocorrncia de monoculturas, Estado de So Paulo.

    ProdutoSojaLaranjaCanaPastagem

    Nmero de municpios147

    106310

    % de municpios (n = 592)2,41,2

    17,952,4

    Tabela 1. Estatsticas descritivas para os municpios do Estado de So Paulo.(n = 592 municpios).

    VariveisDensidade populacional% de populao ruralVariao pop. rural (%)% populao migrante% domiclios rurais com sanitrio% domiclios rurais com telefone% crianas na escolaAnos de estudoRenda per capita (S.M.)Produtividade agrcola (R$)% ocupados no-agrcolas rurais% estab. com conservao do solo

    Valor mnimo3,930,03

    -87,410,0

    0,00,00,0

    2,470,27

    386,00,00,0

    Valor mximo6.842,31

    78,52887,5

    92,040,055,0

    100,07,50

    15,20128.744,8

    100,099,0

    Mdia135,52

    19,72-2,650,55,1

    14,995,34,581,33

    9.779,045,652,7

    Desvio-padro486,59

    14,8947,313,76,29,06,0

    0,550,75

    10.103,319,625,6

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    8 O ndice assume valores maiores que 1 devido ao processo de reduo adotado (diviso pelodesvio-padro). Se as variveis tivessem sido, adicionalmente, centradas, para ficar com mdiazero, o ndice poderia assumir valores negativos. Talvez a expresso ndice no esteja bemaplicada aqui, podendo ser substituda por medida de desenvolvimento rural.

    OS RESULTADOS PARA SO PAULO

    O IDR foi calculado para 592 municpios do Estado de So Paulo. Aps areduo dos componentes, o IDR variou de 1,39 (no municpio de Itaoca) a6,08 (no municpio de Po), mas a composio do ndice foi muito diversa entremunicpios com valores prximos do IDR8.

    Antes de discutir os resultados, preciso no perder de vista a premissaem que se baseia o ndice, isto , que o desenvolvimento rural no apenaselevao de renda nem somente melhoria da infra-estrutura domstica, nemsomente uma agricultura moderna e dinmica. O ndice contemplasimultaneamente quatro aspectos diferentes do desenvolvimento, por isto nemsempre a expectativa que se possa ter a respeito da classificao de umdeterminado municpio cumprida. Um exemplo tpico: Miracatu e Juqui,quase no sul do estado, foram classificados como IDR alto, quando se sabeque, em geral, essa regio de baixa renda; Ribeiro Preto, com rea rural dealta renda, teve IDR mdio. Em Miracatu e Juqui os ndices de bem-estarsocial e desempenho econmico so de fato relativamente baixos, mas aproporo de populao rural e sua variao positiva, bem como a ausncia de

    Tabela 3. Estatsticas descritivas do IDR e seus componentes, para osmunicpios do Estado de So Paulo. (n = 592 municpios).

    ndicesIDRIPOPIBESIECOIMA

    Valor mnimo0,080,050,040,030,00

    Valor mximo0,480,410,480,700,97

    Mdia0,24820,18040,20620,20000,4062

    Desvio-padro0,06700,04690,05350,07620,2407

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    monocultura elevam o IDR; em Ribeiro Preto o IECO bastante alto, mas osoutros componentes tm valores abaixo da mdia; o efeito um valorintermedirio do IDR.

    Uma outra premissa que deve ser aceita a de que no haja erro nosdados, pois do contrrio tudo pode ser questionado. Por exemplo, Bertiogaaparece em segundo lugar na classificao do IDR porque o IMA elevado eseu ndice econmico o mximo entre todos os municpios (o dobro de Po,por exemplo, que o primeiro colocado no IDR); este ltimo valor se deve alta renda per capita (1,86 SM), alta pluriatividade (100% das pessoas ocupadasno meio rural tm ocupaes no-agrcolas) e alta produtividade do trabalhoagrcola (ndice mximo, igual a 1). O resultado que o IDR o segundo maiorentre todos os municpios, o que reflete a situao ideal do desenvolvimentorural: alta renda e bem-estar, alta produtividade, pluriatividade, conservaoambiental. Do ponto de vista metodolgico, portanto, o IDR proposto parececorresponder adequadamente aos dados empricos. O problema que opesquisador tem dificuldade de aceitar, ao olhar um mapa ou tabela, que Bertiogatenha praticamente o melhor desenvolvimento rural do Estado de So Paulo.Mas deve-se lembrar que Bertioga tem apenas 2,9% de populao rural,correspondendo a 861 pessoas em 2000, no sendo, portanto, representativode nenhuma tendncia relevante para o estado. O municpio de Po, primeiroclassificado quanto ao desenvolvimento rural, fica na regio metropolitana deSo Paulo, sendo tambm pouco representativo do rural paulista. Outrosmunicpios com os mais altos IDR do estado so Rosana, Itatiba, Jundia,Sumar, Holambra, Vinhedo, Mogi das Cruzes, Pirassununga.

    Vejamos o extremo oposto, o menor IDR encontrado. O municpio deItaoca fica no extremo sul de So Paulo, na divisa com o Paran, entre Ribeira,Apia e Iporanga. Entre 1991e 2000 houve uma reduo de 58% na populaorural do municpio, que ainda possui 33% de populao na rea rural (1.052pessoas); no h pessoas rurais com atividade no-agrcola (pluriatividade =0), apenas 8% dos domiclios rurais tm instalao sanitria e nenhum possuitelefone; a renda per capita baixssima (0,27 SM), assim como a produtividadeagrcola (ndice 0,01); 71% da rea dos estabelecimentos constituda porpastagens e apenas 6% dos estabelecimentos adotaram alguma prtica deconservao do solo. Todos os componentes do IDR so muito baixos e ondice atinge o seu mnimo. Novamente, bastante aceitvel que o ndice

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    proposto esteja captando adequadamente a noo que se tem dedesenvolvimento rural. Outros exemplos de municpios com os mais baixosIDR do estado so: Arape, Aparecida, Cunha, Itapira, Bananal, So Lus doParaitinga, Itaporanga, Riversul, So Jos do Barreiro.

    Para poder sintetizar os resultados num mapa, classificaram-se osmunicpios segundo o IDR em trs nveis, utilizando o primeiro e o terceiroquartis da distribuio como pontos de corte, conforme o esquema seguinte:

    IDRbaixo: IDR < primeiro quartil (2,67)IDR mdio: primeiro quartil (2,67) < IDR < terceiro quartil (3,29)IDR alto: IDR > terceiro quartil (3,29)Com essa classificao, tem-se 25% de municpios em cada extremo e

    50% dos municpios na faixa intermediria. Na Tabela 4 apresenta-se adistribuio da populao rural entre as trs faixas de municpios, mostrando ano proporcionalidade entre nmero de municpios e populao. Nos municpiosde IDR alto encontra-se mais de 50% da populao rural, enquanto nos denvel mdio, que so cerca de metade dos municpios, est aproximadamente31% da populao rural. Apenas 16,7% da populao rural de So Paulo viveem municpios de baixo desenvolvimento rural, sob as condies metodolgicasadotadas neste trabalho.

    Na Fig. 1, pode-se verificar que h duas concentraes de municpioscom alto IDR: numa rea em torno da capital, chegando a Holambra ao norte,a Capela do Alto e Araoiaba da Serra a oeste e Caraguatatuba a leste; e narea em torno de So Carlos, chegando at So Joaquim da Barra, mais ao

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    Tabela 4. Populao rural residente nos municpios paulistas segundo o nveldo IDR.

    IDRAltoMdioBaixoTotal

    Nmero de municpios148296148592

    Populao rural1.250.626

    755.236402.110

    2.407.972

    % de populao rural51,931,416,7

    100,0

  • 402

    norte. Grosso modo, a faixa no eixo sudeste-nordeste do estado tem maiorconcentrao de municpios com alto IDR e, na metade oeste (correspondenteao que seria o segundo quadrante), verifica-se a ocorrncia de vrios municpiosisolados com alto IDR.

    Com IDR baixo tambm h reas de concentrao, formando regiescontguas: numa faixa no noroeste do estado (entre So Jos do Rio Preto eVotuporanga), na parte central (em torno de Avar) e no Vale do Paraba, j nadivisa com Rio de Janeiro.

    Considerando que o resultado do IDR pode estar mais influenciado porum ou dois de seus componentes, pode-se fazer uma anlise do nvel do IDRcombinada com a disperso de seus componentes. Um IDR com todos oscomponentes altos significa um desenvolvimento rural forte e equilibrado emtodos os seus aspectos; um IDR com componentes uniformemente baixossignifica a necessidade de implementar medidas em todos os campos, doeconmico ao social e ao ecolgico, para melhorar a situao daquela regio;um IDR alto com componentes muito discrepantes significa um desenvolvimentodesequilibrado e a necessidade de alguma rota de correo.

    Uma medida simples da disperso dos componentes do ndice ocoeficiente de variao (desvio-padro/mdia). A seguir apresentam-se algunsexemplos ilustrativos de como essa medida pode auxiliar a anlise dodesenvolvimento rural:

    1) Municpios com IDR alto e alta disperso dos componentes (CV>50%):esta situao indica desenvolvimento rural alto mas desequilibrado, sugerindoa necessidade de identificar o componente problemtico para medidas deincentivo ou correo. H 36 municpios nessa situao, entre os quais SoPaulo, Limeira, Campinas, Sorocaba, Rosana, Guaruj, Nova Odessa. Nessesmunicpios, o componente econmico bastante alto, mas o ndice ambiental muito baixo. Em So Paulo, o componente populacional o fator de desequilbrio,dada a elevada densidade populacional e o grau de urbanizao. Em Rosanatambm se destaca o fator populacional como o mais alto dos componentes(74% de populao rural, com crescimento expressivo na dcada de 90).

    2) Municpios com IDR alto e baixa disperso dos componentes(CV

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    Fig.

    1. Es

    tado

    de S

    o P

    aulo

    n

    dice d

    e dese

    nvolv

    imen

    to rur

    al pa

    droniz

    ado.

  • 404

    exemplos desse tipo de desenvolvimento so Assis, Barretos, Aruj, Cosmpolis,Itirapina, Descalvado, Bom Jesus dos Perdes.

    3) Municpios com IDR baixo e baixa disperso dos componentes(CV

  • 405

    mostraram que uma medida desse tipo vivel e pode ser til nas anlisescomparativas regionais e para intervenes de polticas no meio rural.

    Os pontos indispensveis na obteno de medidas que captem a naturezamultidimensional do desenvolvimento, no caso especfico deste trabalho, dodesenvolvimento rural, podem ser assim resumidos:

    a) Escolher criteriosamente as dimenses do desenvolvimento que soconsideradas essenciais.

    b) Construir indicadores de cada dimenso que possam ser agregadospara calcular a medida-sntese.

    c) Definir as variveis que sero combinadas para formar cada indicador.d) Estabelecer critrios de ponderao para as variveis ou indicadores.e) Definir a unidade territorial de observao (municpio, microrregio,

    mesorregio, etc.). crucial, para a consecuo desses objetivos, dispor de informaes e

    dados que sejam compatveis com a unidade de observao adotada e quepossam ser comparados entre regies e ao longo do tempo. No caso aquiestudado, pde-se contar com dados especficos para os municpios paulistas,gerados pelo Instituto de Economia Agrcola, mas que provavelmente noestaro disponveis em outras unidades da federao.

    Encontrar informao disponvel, desagregada e abrangente para todasas unidades territoriais selecionadas, pode constituir um srio entrave mensurao do desenvolvimento. No caso deste trabalho, a combinao dosCensos Demogrfico e Agropecurio e de dados de produo agrcola doIEA permitiu calcular de forma bastante razovel alguns componentes do ndice.A maior falha ficou no componente ambiental, para o qual foi feita umaaproximao grosseira, dada a falta de dados para todos os municpios9.

    Mesmo assim, os resultados obtidos indicam que vale a pena investir emnovas fontes de dados e aperfeioar o ndice, a fim de superar as dificuldadesmetodolgicas para a obteno de medidas sintticas que possam servir como

    9 A Embrapa Meio Ambiente vem pesquisando uma srie de Indicadores de Sustentabilidade emAgroecossistemas, mas os resultados empricos ainda so restritos a uma microbacia hidrogrfica.

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  • 406

    ponto de partida para a discusso das heterogeneidades e das trajetrias dodesenvolvimento rural.

    A aplicao da metodologia para So Paulo mostrou que no s o nveldo IDR tem uma grande amplitude de variao entre os municpios, mas acomposio do ndice foi muito diversa mesmo entre municpios com valoresprximos do IDR, sugerindo a contraposio entre tipos de trajetrias dedesenvolvimento (equilibrado e desequilibrado). A maior concentrao demunicpios com alto desenvolvimento rural est no entorno da capital do estadoe no eixo sudeste-nordeste do estado (na direo de Jundia, Campinas, SoCarlos, Bebedouro, Barretos). Os municpios com baixos nveis do IDR tendema formar regies contguas numa faixa no noroeste do estado (entre So Josdo Rio Preto e Votuporanga), na parte central (em torno de Avar) e no Valedo Paraba, j na divisa com o Rio de Janeiro.

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