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eduarda-estrada-arantes
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Deserto, vazio, imensidão e silêncio, tempestades de areia, calor abrasador,
oásis e repouso
“Anuncia-lhes Que a água deve ser bebidaPor diversas sedes / A maior e a menor
Não avalies a bondade da águaPelo tamanho da tua bilha
A parte prometidaA parte permitida / A cada umÉ aquela que pode caber Na palma de suas mãos
Anuncia-lhes aindaQue a água só é vivaPara aqueles que têm sede...”
Jean-Yves Leloup, em “Deserto, Desertos"
Existe a bondade da água,e existe a palma das mãos...
- Desertos -
O deserto nos situa fora dos
acontecimentos do tempo e
do espaço
Onde o tempo é abolido,
Onde o espaço não tem limites,
O espaço perde os limites
O tempo é abolido
Assim o deserto nos conduz às fronteiras do tempo-espaço
À sede do dia
Pouca coisa interessa ao caminhante
Salvo o encontro com a Fonte
No deserto, você não se deita duas vezes sobre a mesma duna
O sangue a pulsar nas veias
O tempo tudo transforma, tudo
modifica
Os pés-de-vento nas areias
O mundo que está vindo a ser
Já não é mais o que era antes
Chega-se ao deserto
no dia em que se
descobre que sempre se esteve
ali
E o que nos escondia o deserto?
Um certo conforto
Mas lá estava eleFiel,
Um certo esquecimento
tenaz
Partir para o deserto é
partir para o mais longe de
si mesmo
...
E dali depois voltar para o mais perto
Adereços e ornamentos
dispensáveis não têm vez no
deserto,pois, para
atravessá-lo, apenas do
essencial não se deve prescindir
E, nessa travessia, o que vem a ser
essencial?
Essencial é recordar a lição da flor de lótus,
que, em meio ao lamaçal do pântano, emerge
límpida e resplandecente.
Essencial é cultivar um coração puro e radiante,
tal qual a flor de lótus.
O essencial em geral tem a ver com a simplicidade, estando ao alcance de quem o queira buscar.
Simplicidade como beber água direto na nascente, com a concha formada pela palma das mãos vazias.
Mãos limpas e abertas são necessáriasàqueles que almejam alcançar a Fonte.
Essencial é a sede espiritual.
vivifica, dignifica, purifica...
A água límpida da Nascente
Essencial é compartilhar os bens e os dons com os quais fomos agraciados pela Vida.
Compartilhar o nosso excedente com aquele que se encontra
privado do necessário.
“Não se enriquece sendo miserável;
ninguém empobrece sendo generoso.”
antigo ditado oriental
Essencial é respeitar e proteger a vida, em todas
as suas manifestações.
Essencial é buscar o conhecimento, o saber.
Essencial é o amor.
Amar tem mais a ver com “encontrar” do que com “escolher”.
E ao se compartilhar sonhos e anseios, dores e alegrias,
o mundo se torna mais leve.
Essencial é a família.
Não nos é dado escolher a família onde nascemos...,
...mas está nas nossas mãos o cultivo de relações familiares harmoniosas,
amando, quando possível, perdoando, sempre que necessário.
“Uma família feliz nada mais é que o
paraíso antecipado.”
Essencial é recordar que, apesar de todas as aparentes diferenças,
- de raça, credo, idioma...
...pertencemos todos a uma única família, - a família humana...,
...e que todos compartilhamos os mesmos anseios por dignidade,
liberdade e uma vida plena.
Somos todos raios de uma mesma Luz,
ecos de uma mesma Voz...,
...navegantes do mesmo mar da Vida.
Essencial é proteger a infância.
Essencial é garantir as condições necessárias
para que toda criança desenvolva seu
pleno potencial,- físico, mental,
emocional, social, espiritual...
Essencial é recordar que as crianças têm muito mais para
ensinar do que aprender, essencial é saber ver,
querer ouvir.
Essencial é o devido respeito aos idosos.
Essencial é fazer sábio uso do vigor da juventude...
Essencial é amparar o enfermo,socorrer o necessitado.
Essencial é não permitir que a rotina nos torne alheios aos mistérios e encantos que a vida entesoura.
Antes das tantas cidades erguidas, o que havia, senão o deserto?
Essencial é não esquecer
as lições do
deserto.
A lição de seguir adiante, de não se deixar abater diante do
vento abrasador, do calor escaldante, das noites sem luar
A lição da fugacidadee da fragilidade da existência humana,
a nos recordar a todo instante de quão delicada e breve é
a nossa passagem terrena
A busca por sentido,por algo que transcenda as cores e as formas efêmeras,
por algo maior do que as miudezas do dia-a-dia
“O que é o homem?”,
“O que é o mundo?”,
perguntavam-se os antigos povos do deserto.
“Uma gota de orvalho na borda de um cântaro”
diria mais tarde o
profeta Isaías.
Uma gota de orvalho que se desvanece mais célere ainda sob o sol do deserto.
O deserto nos ensina a ver a claridade que há no olhar da criança,
e a luminosidade, no olhar do ancião.
Uma luz que viu e atravessou a noite,
uma inocência que nada ignora das durezas e dos esplendores da existência.
O caminhante que resolve percorrer a imensidão e o silêncio do deserto, em direção ao Infinito, não embarca numa empreitada de aniquilamento.
Antes, haverá de reatar os laços com aquilo que o ser humano tem de Eterno,
e que se achavam velados pelas ocupações e preocupações do tempo.
“O mundo é a extremamente pesada presença das coisas, onde se sente por vezes a demasiadamente viva ausência de Deus...”
“O deserto é a extremamente dura ausência das coisas, onde se sente às vezes a
demasiadamente doce presença de Deus.”Jean-Yves Leloup
Formatação: [email protected]
Tema musical: Dancing on Water, Finjan