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META Mostrar a dinâmica conceitual a partir das transformações do mundo rural. OBJETIVOS Ao final desta aula, o aluno deverá: compreender as mudanças de paradigmas no meio rural Analisar a evolução das transformações nas relações de produção PRÉ-REQUISITOS Compreendido o processo de desintegração do campesinato abordado na aula anterior. Aula DINÂMICA CONCEITUAL E ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO AGRÁRIO (Fonte: http://farm1.static.flickr.com).

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METAMostrar a dinâmica conceitual a partir das transformações do mundorural.

OBJETIVOSAo final desta aula, o aluno deverá:compreender as mudanças de paradigmas no meio rural Analisar aevolução das transformações nas relações de produção

PRÉ-REQUISITOSCompreendido o processo de desintegração do campesinato abordadona aula anterior.

AulaDINÂMICA CONCEITUAL EORGANIZAÇÃO DO ESPAÇOAGRÁRIO

(Fonte: http://farm1.static.flickr.com).

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Geografia Agrária

INTRODUÇÃO

O entendimento do conceito de espaço não é consenso dentro daprópria geografia, pois há outras conotações empregadas pelos geógrafos,gerando divergências conceituais e conseqüentemente, maneiras diferen-tes de compreender a realidade, pois o homem, por meio da evoluçãointelectual e tecnológica, otimiza a capacidade de criar e recriar novasformas de intervenção no tempo e no espaço, produzindo assim, novasmaneiras de interpretar e compreender o espaço e suas relações, comopode ser percebido em Harvey quando diz que as diferentes práticas huma-nas estabelecem diferentes conceitos de espaço, conceitos que sob certas circunstânciassão por nós empregadas (apud CORRÊA, 2000, p.19).

O conceito de espaço tem uma multiplicidade de sentidos e empre-gos, sendo necessária uma discussão sistemática para que se tenha umanoção geral e clara do conceito e sua aplicação enquanto categoria deanálise a ser utilizada na pesquisa.

Contudo, cabe aos geógrafos perceberem as mudanças contemporâ-neas e tentar propor novas formas de interpretação ou aplicação de ve-lhos conceitos reestruturados, de forma consistente e coerente, para quese consiga resultados satisfatórios em seus trabalhos de pesquisa.

Diante da discussão espacial e regional e da necessidade de atualiza-ção do entendimentodos conceitos, é funda-mental compreender acomplexidade das rela-ções espacial e regionalcriadas pelo desenvolvi-mento tecnológico esuas formas variadas deatuar no espaço econsequentemente naregião. Para Castells(1995), “a economia globalnão é aquela que abrangetodos os países, regiões e ci-dade; é aquela que selecio-na, no mundo inteiro, pon-tos específicos que conectam-se entre si” (p. 66).

(Fonte: blogdofavre.ig.com.br).

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Aula

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ESPAÇOS GEOGRÁFICOS POR MEIO DAUNIVERSALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO

O processo de globalização caracterizado pelos avanços tecnológicos temintegrado/desintegrado os espaços geográficos por meio da universalizaçãoda produção, das telecomunicações e da informática, entre outros. Tal proces-so pode promover a desterritorialização e o desenraizamento da populaçãoem várias partes do mundo, não somente no aspecto material, mas tambémdesenraizamento social, cultural e perda da identidade diante das relações depoder proporcionadas pelo sistema vigente.

As transformações do espaço resultadas do processo de integraçãopodem ser percebidas através da abstração espacial por meio das novastecnologias, em que o lugar, a cultura, os costumes estão cada vez mais seuniversalizando. Tais mudanças têm como motor de desenvolvimento osistema capitalista pautado na expansão imperialista do capital.

À medida que o capital se mundializa em velocidade crescente, jun-tamente como ele, ocorrem mudanças responsáveis pela organização ereorganização espacial em escalas as mais diversas, com repercussões eimplicações diferenciadas no espaço geográfico. Nesse processoexpansionista o Estado torna-se vulnerável, servindo muitas vezes comoaliado na expansão capitalista. Conforme Mendes,

“ O ritmo das transformações econômicas no que tange à estruturados setores produtivos e das relações sociais tem sido tão aceleradoque tem provocado alteração na concepção de mundo, onde odesenvolvimento tecnológico junto com a expansão do comérciovai alterar, num período relativamente curto, a organização socialda produção, passando a exigir uma divisão internacional dotrabalho” (1996, p. 70).

Com essa integração dos espaços globais e locais, estes tornam-semais periféricos e desiguais em função de não competir de forma justa, doponto de vista econômico, com os espaços globais. Assim Diniz Filhorelata que “ a expansão da fronteira econômica, aliada a própria diversida-de dos recursos naturais disponíveis para a exploração, favorecem o de-senvolvimento de mercados nacionais amplos e de sistemas produtivoscom elevado nível de diversificação setorial e regional” (1997,p. 103).

A globalização econômica incentiva à competitividade nas escalasregional e local, gerando desequilíbrio entre esses espaços em função dacentralização tecnológica associada à concentração econômico e do po-der. Com isso, a produção local torna-se mais integrada e, ao mesmo tem-po, vítima do mercado mundial, “na medida em que os lugares mais dis-tantes passaram a conhecer semelhantes estruturas e formas, pois somen-

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te assim foi possível o processo de expansão do sistema capitalista comoum todo” (Mendes, 1996, p. 70).

A velocidade das transformações ocorridas no mundo contemporâ-neo por causa das inovações tecnológicas tem provocado adesnacionalização da produção, dos espaços e do sentimento depertencimento do lugar, assim como da mutação da identidade e das ori-gens. Tais avanços tecnológicos contribuíram para a integração de comu-nidades com diferentes características de espaço-tempo. Para Hall, “essasnovas características temporais e espaciais, que resultam na compressão de distânciase de escalas temporais, estão entre os aspectos mais importantes da globalização a terefeito sobre as identidades culturais” (1997, p. 72).

Com maior tendência à interdependência global, as identidades cul-turais caminham em direção ao desmanche cultural provocando, por ou-tro lado, uma fragmentação ou multiplicidade de manifestações que po-demos denominar de pluralismo cultural.

“A medida em que as culturas nacionais tornam-se mais expostas ainfluência externas é difícil conservar as identidades culturais intactasou impedir que elas se tornem enfraquecidas através dobombardeamento e da infiltração cultural” (Idem,1997, p. 78-79).

Pode-se perceber tal processo de infiltração das culturas globais atra-vés da identificação de diversos elementos materiais ou simbólicos presen-tes sobretudo no lugar, entendido como espaço de convivência ou do seucotidiano, desde elementos ligados à telecomunicação, como antenas para-bólicas, TV, rádio, internet em alguns casos, até modelos de vida, de com-portamento, de consumo. Além disso, outros fatores que também contribu-em para a incorporação de culturais plurais, como a migração, o turismo, a

(Fonte:http//www. images.quebarato.com.br)

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música, o cinema, entre outros segmentos que manifestam a hegemoniacultural dos países dominantes na economia global. Tal processo foi deno-minado por Featherstone (1995) de globalização da cultura liderada pelahegemonia dos Estados Unidos, influenciando direta ou indiretamente nosEstados-Nação denominado pelo referido autor de terceira cultura.

Assim, a expansão ideológica do progresso, do consumismo se expandediferentemente no espaço-tempo e chega às áreas periféricas, principalmenteno período pós-guerra. É nesse contexto que os ideais de modernização docampo, com introdução de equipamentos, ferramentas, racionalização ecapital criados pelos Estados Unidos com a Revolução Verde, emergemnos países subdesenvolvidos, caso do Brasil, repercutindo na infiltração devalores, símbolos e imagens pautadas em ideais externos.

Diferentemente da cultura global que busca a homogeneização a par-tir do modelo norte-americano, a cultura local é percebida usualmentecomo uma particularidade, conforme relatado por Featherstone (1995),“emprega-se frequentemente esse conceito para se fazer referência à cul-tura de um espaço relativamente pequeno, limitado, no qual os indivídu-os que ali vivem têm relacionamento diários, cara a cara” (p. 130 – 131).

Com isto, evidencia-se na cultura local o senso de pertencimento, asexperiências sedimentadas, as manifestações, o modo de vida particulardo lugar, os costumes e tradições. Castells (1999, p. 22), conceitua iden-tidade a fonte de significado e experiência de um povo.

Nesse contexto o autor fortalece o conceito quando diz,

“(...) entendo por identidade o processo de construção de significadocom base em um atributo cultural, ou ainda um conjunto de atributosculturais inter-relacionados, o(s) qual(is) prevalece(m) sobre outrasfontes de significado. Para um determinado indivíduo ou aindaum ator coletivo, pode haver identidades múltiplas” (Idem, p. 22).

(Fonte:http://www.vestibular.brasilescola.com)

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Para Ianni (1996), existem vários mecanismos de apropriação dasculturas locais a partir da universalização da produção, da economia, dapolítica, das migrações, entre outros.

“É claro que são muitas as formas culturais mutiladas ou mesmodestruídas pela globalização. O capitalismo expande-se mais oumenos avassalador em muitos lugares, recobrindo, integrando,destruindo, recriando ou subsumindo. São poucas as formas devida e trabalho, de ser e imaginar, que permanecem incólumes dianteda atividade ‘civilizatória’ do mercado, empresa, forças produtivas,capital” (Idem, p. 95).

O processo de globalização é contraditório, pois ao mesmo tempoem que busca a integração, interdependência ou homogeneização, cria erecria novas formas de pensar, agir, de trabalho, gerando a fragmentaçãoou diversidade do espaço territorial.

A modernização tecnológica na agricultura familiar é responsável pelosurgimento de novas atividades não-agrícolas ao mesmo tempo que padro-niza o modelo de produção e consumo moldando diferentes formas de pro-dução do espaço, muitas das vezes, sem história, sem identidade. Assim, talprocesso tem promovido o deslocamento de atividades e de trabalhadoresdo campo gerando conflitos no espaço rural e no espaço urbano. Muitosautores “(...) se reportam a essa dinâmica como um processo de‘desterritorialização’, o qual seria, se não a marca fundamental do nossotempo, uma de suas marcas fundamentais” ( Haesbert, 2000, p. 166).

A racionalização dos meios de pro-dução advinda com a tecnificação da agri-cultura possibilitou o crescimento econô-mico, porém, aprofundou ainda mais asrelações entre a produção e o processoprodutivo induzindo o campo à novasorganizações espaciais.

Em contraposição ao modo marxistade perceber como se estabelece a evolu-ção da agricultura na sociedade capitalis-ta, encontra-se CHAYANOV (1974), queem sua obra La Organizacíon de la UnidadEconómica Campesina coloca a persistên-cia de uma economia essencialmente fa-

miliar e artesanal fora do sistema capitalista. O aumento da força de traba-lho da família camponesa que se traduz em desenvolvimento para ativida-de agrícola deve ser compensado. A falta de capital no interior da família

(Fonte:http://www.es.gov.br)

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camponesa chayanoviana é apenas e quando necessário, um condicionantede equilíbrio dessa unidade de produção, como expressa o próprio autor:

“Mas la mano de obra de la unidad que explota la unidad, al noencontrar empleo em la explotación se vuelca a atividades artesanalescomerciales y a otras actividades no agrícolas para alcanzar elequilíbrio económico con las necessidades de la família que noresultan cubiertas con el ingreso de las actividades artesanales ycomerciales” (CHAYANOV, 1974, p.101).

Desta forma, o autor não nega a relativa subordinação do camponêsao capital, mas explicita que o mesmo está essencialmente preocupado écom as condições internas de sua unidade produtiva, podendo assim, re-agir às forças destruidoras do capitalismo através da criação e recriaçãode estratégias de sobrevivência.

Kautsky (1980), baseado no método do materialismo histórico edialético proposto por Marx, também esboça questões ligadas às transfor-mações pelas quais passou a agricultura com a expansão do modo deprodução capitalista no campo, através principalmente da explosão deinovações. Segundo o mesmo, o grande estabelecimento deve mostrarsua superioridade em relação ao pequeno e conseqüentemente destaca ofenômeno da proletarização dos pequenos proprietários colocando que:

“... os pequenos lavradores são menos atirados, mais conservadorese estão menos familiarizados com os progressos técnicos e asnecessidades do mercado internacional que os grandes agricultorese os capitalistas. Foram os grandes latifundiários que primeirointroduziram as grandes indústrias em suas terras. (p. 344)

O autor, atento às dificuldades que estabelecimentos produtores de mer-cadorias, principalmente os médios e pequenos, passam em decorrência dafuga do trabalhador rural para a cidade, comenta que quando a industrializa-ção da agricultura não leva o pequeno estabelecimento à decadência, eladecreta pelo menos sua dependência para com a fábrica, única compradorados seus produtos e este pequeno produtor, então, passa a ser seu escravo.

Ao analisar a incorporação do agro brasileiro às regras do capitalismooligopólio contemporâneo, Muller (1989) afirma que o tipo de industria-lização da agricultura, implantada no país, nas décadas de 60 e 70, foi oda mecanização e quimificação (especialmente o uso de fertilizantes edefensivos químicos), devido ao pacote tecnológico de origem norte-ame-ricana, aplicado em vários países do mundo pós-guerra. Isto levou a umamodernização parcial segundo regiões, produtos e tipo de produtores.Conforme o autor citado anteriormente,

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“... seu impacto foi geral. Os pequenos produtores, por exemplo,com solos exaustos, baixa fertilidade, sem acesso ou condiçõespara tomar crédito, sementes apropriadas e orientação técnica, cujosprodutos não contavam sequer com o estímulo de altos preços emvirtude da interceptação pelos intermediários, esses pequenosprodutores passaram (ou acentuaram) a viver em situação depobreza” (MÜLLER, 1989, p.130).

A integração dos produtores ao processo de industrialização da agri-cultura ocorreu desde o inicio de maneira parcial, ora baseados em suacapacidade de resposta à expansão e diversificação suscitadas pelasagroindústrias, ora à sua capacidade de acesso ao crédito rural. Dessaforma, apenas alguns grupos de tradição mercantil ou aqueles organizados emassociações passam a ter acesso à quase todo crédito estatal, de investi-mento, custeio e de comercialização.

O processo de modernização da agricultura brasileira, nesse período,conduziu a uma evolução favorável da produtividade, tanto de terra comode trabalho, porém, aumentou as taxas de desemprego, de sub-ocupaçãoe até do sobre-trabalho como crianças e mulheres que fazem parte dascategorias não-remunerados e trabalhadores volantes.

As forças produtivas colocam a tecnologia a serviço das grandesempresas da mesma maneira que disponibilizam chances no mercado paraos produtores camponeses, permitindo assim, que o campesinato eleve asua produtividade de trabalho e até acumule economias que muitas vezesreaplicam na compra de terra. Na maioria das vezes, essas terras são ad-quiridas de vizinhos que optaram pela migração ou foram literalmenteexpropriados (Oliveira, 199, p. 39).

(Fonte:http://www.folhadomate.com.br)

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A migração não significa necessariamente abandono da terra, comoenfatiza Diniz Filho (1996, p. 169), mas pode ser estratégia camponesapara aumentar a área cultivada. Por exemplo, uma família compra ou ar-renda terras ou fragmenta-se e seus filhos mudam-se para outro estabele-cimento em novas áreas. Ainda sobre as estratégias de sobrevivência nocampo o autor coloca a questão da substituição de produtos tradicionaispor outros mais rentáveis, o uso de insumos modernos e trabalho externoà unidade de produção que pode ser efetivado em sítios ou propriedadesbem distantes e por períodos longos.

Romeiro (1998) estabelece uma dura crítica à análise marxista clássi-ca sobre a dinâmica de inovações na agricultura brasileira. O autor co-menta que este ponto de vista é extremamente determinista exatamentecomo os de Kautsky e Lênin, pois, mostra que a partir da década de 60, oque ocorreu no Brasil, como reflexo das transformações capitalistas naagricultura mundial, foram às mudanças nas relações de trabalho pré-ca-pitalistas e na base produtiva. Portanto, nessa realidade predomina a gran-de propriedade mecanizada com base no trabalho assalariado. A perma-nência de unidades familiares como base principal da produção agrícola,nos países de capitalismo avançado é explicada pela maior competitividadedestas em comparação às baseadas no trabalho assalariado em decorrên-cia das especificidades do setor agrícola, ou seja:

“...o trator substituiu o cavalo, os fertilizantes químicos, a matériaorgânica; as ferramentas e equipamentos se sofisticaram ediversificaram, mas continuaram a ser instrumentos cuja boautilização depende de arte e habilidade do agricultor” (ROMEIRO,1998, p.179-182)

O autor apresenta, também, comentários sobre agricultura eagroindústria, estabelecendo relação às técnicas agrícolas e a produção dealimentos e matérias-primas. Quanto às técnicas, cita que o problema prin-cipal está na degradação que os padrões tecnológicos modernos provo-cam ao ecossistema agrícola e, consequentemente, nos custos de produ-ção. Quanto à segunda questão, o problema central do padrão agrícolamodernizante brasileiro, para a grande maioria dos produtores, reside naprópria fragilidade destes diante dos grandes complexos agroindustriais,os quais mantêm sua margem de lucro passando para o pequeno produtoros prejuízos das eventuais quedas de preços agrícolas.

No Brasil dos anos 60 e 70 e mais acentuadamente dos anos 80, o queocorreu não foi um processo de proletarização do camponês, mas o queSilva (1999) chama de “lumpenização” dos mesmos, pois, argumenta que:

Ou permanecem como parte da superpopulação ativa do campo, comomembros não-remunerados da força de trabalho familiar nas pequenasexplorações ou são lançados nas zonas urbanas ao” rebotalho da socieda-

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CONCLUSÃO

Ao analisar as transformações e as perspectivas da agricultura brasi-leira Pessoa (2000) enfatiza que as mudanças resultantes da moderniza-ção, iniciada na década de 50, serviram para vincular cada vez mais osetor agrícola ao setor urbano-industrial. A autora ainda afirma que essamodernização atinge metas antes inacreditáveis, como transformar áreasimprodutíveis em produtivas, o que ocorreu com o cerrado brasileiro parao cultivo de cana-de-açúcar, café, soja e laranja. Nesse contexto da déca-da de 70 o Estado assume o papel de interventor, através das políticaspúblicas comandadas pelo instrumento de crédito rural subsidiado, favo-recendo, principalmente, à capitalização da grande propriedade, havendotambém muitas pequenas propriedades, no país, que foram beneficiadaspor aquelas políticas.

Na década de 80 deu-se o enfraquecimento do padrão de financia-mento, baseado no crédito agrícola, devido entre outras coisas, à quedade preços dos produtos e a política agrícola do país que passa a ser co-mandada pelo preço mínimo. A década de 90 traz ainda mais o acirra-mento a crise e o enfraquecimento da capacidade financeira do Estadodeixa a agricultura profundamente afetada.

RESUMO

A globalização econômica incentiva à competitividade nas escalas re-gional e local, gerando desequilíbrio entre esses espaços em função da cen-tralização tecnológica associada à concentração econômico e do poder.

A velocidade das transformações ocorridas no mundo contemporâneopor causa das inovações tecnológicas tem provocado a desnacionalizaçãoda produção, dos espaços e do sentimento de pertencimento do lugar, as-sim como da mutação da identidade e das origens.

de “- o lumpesinato -, constituído pelos trombadinhas, prostitutas, men-digos e ladrões. (p.103)

O crédito agrícola, a política de preços mínimos, a assistência técni-ca, a educação rural, os incentivos fiscais, os subsídios, entre outras ques-tões, são formas de intervenção do Estado na agricultura. No entanto, oque se pode perceber ao longo de várias décadas de intervenção estatalnesse setor, é o seu direcionamento para beneficiar a grande produçãocapitalista e deixar à margem desse processo o pequeno produtordescapitalizado (Santos, 2000, p. 40-41).

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ATIVIDADES

1) Elabore um texto mostrando a influência da globalização no processodinâmico do espaço local relacionado com as atividades agropecuárias.2) O que você entender por agroindústria?

COMENTÁRIO SOBRE AS ATIVIDADES

O processo de modernização da agricultura brasileira conduziu a umaevolução favorável da produtividade, tanto de terra como de trabalho,porém, aumentou as taxas de desemprego, de sub-ocupação e até dosobre-trabalho como crianças e mulheres que fazem parte dascategorias não-remunerados e trabalhadores volantes.

PRÓXIMA AULA

Na próxima aula vamos estudar o desenvolvimento da agriculturafamiliar relacionado com a sustentabilidade de suas práticas em relaçãoao meio ambiente e conseqüentemente ao próprio homem.

A racionalização dos meios de produção advinda com a tecnificaçãoda agricultura possibilitou o crescimento econômico, porém, aprofundouainda mais as relações entre a produção e o processo produtivo induzindoo campo à novas organizações espaciais

Por fim, a modernização da agricultura brasileira realmente contri-buiu para aumentar a produção e a produtividade de algumas culturas,porém, os benefícios desse crescimento não foram redistribuídos entre osdiversos setores da sociedade.

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REFERÊNCIAS

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