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DIREITO REGULATÓRIO

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DIREITO REGULATÓRIOAGÊNCIAS REGULADORAS

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MARCIO IORIO ARANHA

Manual de DireitoRegulatório

(Fundamentos de DireitoRegulatório)

2ª edição ampliada e atualizada

Page 3: DIREITO REGULATÓRIO

Laccademia Publishing2014

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Copyright © 2014 Marcio Iorio Aranha

All rights reserved.

Publicado por Laccademia Publishing Limited

Suite 12 New Dunn Business Park, GL 16 8JD

Coleford, Gloucestershire, United Kingdom

1ª edição (2013)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

(CIP)

A662m

Aranha, Marcio Iorio, 1974-

Manual de Direito Regulatório: Fundamen-

tos de Direito Regulatório / Márcio Iorio

Aranha. 2. ed. rev. ampl. – Coleford, UK: Lac-

cademia Publishing, 2014.

viii, 152 p. ; 22 cm.

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ISBN 978-14-947-0383-7

1. Direito regulatório 2. Manual de direito

regulatório. 3. Fundamentos. I. Título.

CDD: 341.3782

CDU: 346.5:65

Índice para catálogo sistemático:

Brasil : Direito Regulatório 341.3782

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – É proibida a reprodução total ou

parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio.

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Impresso nos Estados Unidos/Printed in the United States

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Dedicatória

O interesse pelo estudo do Direito

Regulatório nos cursos de

graduação e pós-graduação da

Faculdade de Direito da Universid-

ade de Brasília brotou a partir de

semeadura de projetos de pesquisa

e de ensino implementados em ini-

ciativas conjuntas com o saudoso

professor Carlos Eduardo Vieira de

Carvalho. Passada uma década de

tais iniciativas, dedico este estudo

à memória do Professor que tão

profundamente marcou a cátedra

de Direito Administrativo da

Faculdade de Direito da Universid-

ade de Brasília e que dá nome ao

Núcleo de Direito Setorial e Regu-

latório que hoje coordeno.

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Agradecimentos

Aos alunos e professores dos cursos de pós-

graduação em regulação de telecomunicações,

integrantes do Centro de Políticas, Direito,

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Economia e Tecnologias das Comunicações

da Universidade de Brasília (CCOM/UnB),

onde surgiu o interesse pelo aprofundamento

da temática de direito regulatório.

Aos integrantes da Faculdade de Direito da

Universidade de Brasília, que incentivaram o

aprofundamento da pesquisa em Direito

Regulatório, mediante institucionalização da

disciplina de graduação de Direito Adminis-

trativo 3 e da disciplina de Mestrado e

Doutorado em Direito, Estado e Constituição

intitulada Estado e Regulação.

Aos professores e alunos do Centro de

Estudos em Regulação de Mercados da

Universidade de Brasília (CERME/UnB), que

propiciaram o espaço institucional de desen-

volvimento e teorização do Direito Regu-

latório frente a um público especializado em

diversos setores regulados

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OBRAS DO AUTOR

Livros e capítulos de livros selecionados:

1. Direito das Telecomunicações: Histórico Normativo e

Conceitos Fundamentais. 2ª ed., Coleford, UK: Lacca-

demia Publishing, 2014.

2. Comentários aos artigos 221 a 224 da Constituição

Federal brasileira de 1988: CANOTILHO, J. J. Gomes

[et al.] (org.). Comentários à Constituição do Brasil.

Coimbra/São Paulo: Almedina/Saraiva, 2013, p.

2051-2077.

3. Coletânea de Normas e Julgados de Telecomunicações.

Brasília: Getel/UnB, 2006 a 2013.

(http://www.getel.org/GETELcbdt.html)

4. Glossário Brasileiro de Direito das Telecomunicações.

Brasília: Getel/UnB, 2006 a 2013

5. Temas de Telecomunicações Referenciados. Brasília:

Getel/UnB, 2011 a 2013.

6. Normas e Julgados do Setor de Telecomunicações.

Brasília: Getel/UnB, 2011 a 2013.

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7. Direito das Telecomunicações: estrutura institucional

regulatório e infraestrutura de telecomunicações no

Brasil. Brasília: Universidade de Brasília, 2005.

8. Política de Patentes em Saúde Humana. São Paulo: At-

las, 2001.

9. Interpretação constitucional e as garantias institucion-

ais dos direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 1999 e

2000. (3ª edição de 2014).

Artigos selecionados:

1. The Institutional Indicator of Federalism from the Per-

spective of the TLICS Model: Juridical Variables for the

ICT Comparative Studies. Comparative Law eJournal,

Vol. 12, No. 52, June 25, 2012, p. 1-13, ISSN 1556-5068.

2. Telecommunications Law Indicators for Comparative

Studies (TLICS) Model: A Hermeneutical Approach.

Americas Information and Communications Network

Conference 2011, p. 283-294.

3. Diálogos Políticos-Jurídicos na Comparação de Mode-

los Regulatórios de Comunicação. RBPC 1, 2011.

4. Restricted mobility and fixed-mobile convergence in

Brazil. Info (Cambridge. Print) 13:32-42, 2011.

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5. Direito, Estado e Telecomunicações: a força grav-

itacional da banda larga. RDET 3(1): 1-42, 2011.

6. Digital TV in Brazil and its Interactive Possibilities

through Mobile Networks. Cátedra Europa 2009. Edi-

ciones Uninorte, 2009, p. 185-194.

7. Direito, Estado e Telecomunicações: o ano em que o es-

pectro novamente encolheu. RDET 2(1): 1-44, 2010.

8. Direito, Estado e Telecomunicações: dos primórdios ao

novo modelo regulatório. RDET 1(1): 1-76, 2009.

9. Democracia participativa e a agência reguladora de

telecomunicações brasileira. In: Anais do I Seminário

Internacional de Regulação de Serviços Públicos:

Direito Comparado da Energia Elétrica e das Telecomu-

nicações. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2008.

10. Renovação dos contratos de concessão da Telefonia

Fixa no Brasil. Notícia do Direito Brasileiro 13:225-238,

2006.

11. Mundialización informativa, informacional y cultural.

Política y Cultura 26:71-91, 2006.

12. Ambiente normativo brasileiro de prestação de serviços

em setores regulados: o caso da desestatização do

Sistema Telebrás como arquétipo do direito

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administrativo de conjuntura. Revista Notícia do

Direito Brasileiro 12: 103-128, 2006.

13. Poder normativo do Executivo e teoria da regulação.

Revista Notícia do Direito Brasileiro 9: 135-154, 2002.

14. Conteúdo essencial das cláusulas pétreas. Revista Notí-

cia do Direito Brasileiro 7: 389-402, 2000.

15. As dimensões objetivas dos direitos e sua posição de

relevo na interpretação constitucional como conquista

contemporânea da democracia substancial. Revista de

Informação Legislativa 35: 217-230, 1998.

16. Jurisdição constitucional e política: interpretativismo,

não-interpretativismo e suas alternativas políticas e

jurídicas - Teoria estética - Estudo da obra “Contem-

porary constitutional lawmaking” de Lief H. Carter.

Revista de Informação Legislativa 33(132): 297-311,

199.

17. O método apropriado à interpretação da parte dogmát-

ica das constituições. Revista da Fundação Escola Su-

perior do Ministério Público do Distrito Federal e Ter-

ritórios 5: 143-155, 1997.

18. Intervencionismo social e neoliberalismo, ou liberal-

ismo construtor: a precisão de seus conceitos mediante

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a análise da gradação do controle estatal e de sua polít-

ica de prioridades. Revista de Informação Legislativa

135(34): 237-251, 1997.

19. Segurança jurídica stricto sensu e legalidade dos atos

administrativos: convalidação do ato nulo pela im-

putação do valor de segurança jurídica em concreto à

junção da boa-fé e do lapso temporal. Revista de In-

formação Legislativa 134: 59-73, 1997.

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SUMÁRIO

Introdução ao Direito Regulatório

Estado, Poder e Direito público

Pressupostos teóricos do EstadoRegulador

2.1. Cerne da regulação: o mercado dedireito

2.2 Direitos fundamentais objetivados eEstado Regulador

2.3 O Estado Administrativo e a sep-aração de poderes

2.4 Legitimidade no Estado Regulador

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2.5 Poder regulamentar na tradiçãofrancesa

2.6 Situando o conceito de EstadoSubsidiário

2.7 O fenômeno da regulação e seusignificado

Teoria jurídica da regulação

3.1 Public Choice theory versus teoriaprocessual administrativa da regulação

3.2 Situação jurídica do cidadão co-partícipe no Estado Regulador

Ordenamento jurídico dinâmico

4.1 Velocidade da inovação tecnológica,linguagem setorial e especializaçãoregulatória

4.2 Globalização, conhecimento e polít-ica pública setorial

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2.3 Função normativa conjuntural doExecutivo

2.4 Conceito de regulação

2.5 Regulação versus desregulação

Regulação no brasil

3.1 Fases da regulação no Brasil

3.2 Espécies de regulação

3.3 Estruturas de Regulação Setorial

Bibliografia

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Parte I

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INTRODUÇÃO AODIREITO

REGULATÓRIO

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ESTADO, PODER EDIREITO PÚBLICO

Pressuposto à compreensão dodireito regulatório, o conceito de direitopúblico e sua posição relativa frente aos deEstado e poder político permitem situar did-aticamente o direito regulatório como ramopartícipe da tradição de direito público, em-bora tributária dos ramos de direito setorial.

Afora a discussão histórica sobre arelação entre Direito e Estado,partindo-se de um dualismo que visualizavano Estado uma força política primordial dis-tinta do seu sistema jurídico, seguido poruma teoria pura do direito que identificava

Estado e sistema jurídico[1]

, para finalmenterepousar nas teorias constitucionalistas de

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mediação entre Estado e Sociedade[2]

, oEstado, sob o enfoque jurídico, nada mais édo que um centro de imputação normativadotado do especial qualificativo do exercíciode poder político como uma relação de

autoridade.[3]

Em termos jurídicos, poder signi-fica a possibilidade de interferência unilater-

al na esfera jurídica alheia.[4]

O Estado, en-quanto produto constitucional, encarna asmedidas de poder – competências – delega-das pelo documento constitucional nos lim-ites das finalidades para as quais foram cria-das – funções. Desse batimento entre suascompetências e funções, têm-se sua iden-tidade jurídica: o Estado é um centro de at-ributos jurídicos qualificado pela intensa in-cidência do direito público via manifestaçãode aspectos sobreviventes da soberania, taiscomo a possibilidade jurídica do uso da força

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física e sua exclusividade, bem como a não-oponibilidade interna e externa para afirm-ação do ordenamento jurídico vigente.

Como tal, ao Estado é reservada adefinição de pessoa jurídica de direitopúblico, que se apresenta como uma unid-ade, no direito internacional público, mascomo um conjunto de pessoas jurídicas dedireito público para o direito interno –União, Estados-membros, Municípios e suasautarquias. O Estado, portanto, é definidoa partir do direito público; não oinverso.

Elevado à categoria de elementodistintivo do Estado, embora não restrito aele, o direito público depende da categoria depoder político para ser aquilatado. Como tal,o direito público é o regramento jurídico dopoder político entendido como uma posiçãodiferenciada no ordenamento jurídico, se-gundo a qual um centro de imputaçãonormativa encontra-se em posição de

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interferir unilateralmente na esfera jurídicade outrem. Em termos mais analíticos, odireito público é o regramento jurídico dopoder político caracterizado pela estrutur-ação do poder, pela conformação dos direit-os, pelo estudo das relações envolvendo oEstado e seus delegatários e pela autolimit-ação do poder.

Em outras palavras, ao direitopúblico cabe a função não só de disciplinar aestrutura de poder como a de expressar a di-mensão jurídica de influência sobre esferasjurídicas alheias. A regulação de atividadesrelevantes é manifestação preponderante-mente pública, embora não exclusivamentepública. Daí dizer-se que o direitoregulatório manifesta-se como um ramo dedireito público, em especial quando os aspec-tos de interferência unilateral em determ-inado campo de atividades socialmente rel-evantes tomam a forma de órgãos ou en-tidades estatais com poderes específicos de

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redirecionamento de tais atividades. Odireito regulatório, portanto, é umramo de direito público.

Ao se concluir pelo posiciona-mento didático do direito regulatório comoramo de direito público, entretanto, não sequer dizer que o estudo jurídico da regulaçãose resuma à disciplina de estruturas regu-latórias e comandos regulatórios. Em grandemedida, as disciplinas jurídicas setoriaisabarcam a disciplina regulatória, ampliandoo escopo de análise para tratar de toda a dis-ciplina regulatória a partir de um recortetransversal. Ou seja, o direito das telecomu-nicações, dos recursos naturais, da saúde, dodesporto, dos portos, aeroportos e fronteiras,dos transportes, dos recursos hídricos,dentre outros, afiguram-se como disciplinasjurídicas que mesclam ramos tradicionais deconhecimento jurídico – direito constitu-cional, administrativo, tributário, civil,comercial, consumidor, ambiental, dentre

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outros – com a disciplina jurídica regulatóriaespecífica de cada setor, compondo umquadro mais completo do regramentojurídico incidente sobre um setor de ativid-ades reguladas.

O diferencial do direito regu-latório, enquanto direito de caráter amploabrangente de diversos setores de atividadesrelevantes encontra-se fora das ativid-ades mesmas que regula. Este livropreocupa-se com o que é onipresente àsabordagens regulatórias. As disciplinas dedireito setorial, por outro lado, trazem outrorecorte didático ao aglutinarem característic-as próprias de cada setor relevante da eco-nomia – saúde, educação, energia, telecomu-nicações, petróleo, águas, transportes –, apartir de um poutporri de abordagens inter-disciplinares – exemplificativamente dodireito constitutional, administrativo, civil,comercial, do consumidor, ambiental e aindado direito regulatório. Assim, a identidade

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do direito regulatório repousa sobre pres-supostos indiferentes às peculiaridades decada setor de atividades reguladas, tais comosobre os conceitos de direitos fundamentaisobjetivados, Estado Regulador, Estado Ad-ministrativo, legitimidade regulatória, poderregulamentar e regulação, que serão analisa-dos no próximo capítulo.

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PRESSUPOSTOSTEÓRICOS DO ESTADO

REGULADOR

2.1. CERNE DA REGULAÇÃO: OMERCADO DE DIREITO

A objetivação dos direitos a partirda categoria dos dirietos sociais do séculoXX explica a preocupação com a concretiza-ção de direitos, mas não responde à questãobásica do porquê da regulação, ou seja, porque dita concretização necessitaria advir deum método especial de intervenção estatalcapaz de se readequar conjunturalmente deacordo com as respostas originadas do sis-tema controlado.

Dentre os fundamentos daregulação, encontram-se, de fato, a naturezaobjetiva dos direitos, os conceitos de EstadoAdministrativo, separação de poderes,

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Estado Regulador, poder regulamentar,Estado Subsidiário, que serão tratados emseguida, mas todos eles são pressupostos in-suficientes para justificarem por si sós o atu-al quadro regulatório.

O fundamento da regulação e, porconsequência, do direito regulatório,encontra-se na necessidade de proteção deum determinado objeto errático. Não se podenegar que a competição tem sido identi-ficada como tal objeto e opera um efeito de-cisivo no modelo regulatório atual. Ela é,portanto, um dos fundamentos da regulação,todavia, não se apresenta como seu funda-mento central. O cerne da regulação resideem outra seara qualificadora do mercado: odireito à igualdade.

Trata-se do mesmo direito que,segundo leituras históricas mais aprofunda-

das[5]

, teria dado origem à Revolução Amer-icana, quando os protestos dos colonos emBoston em 1773 dirigiam-se menos à

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tributação do chá holandês em benefício doinglês então transportado pela Companhiadas Índias Orientais, do que à isençãotributária do chá inglês em flagrantebenefício anti-isonômico ao monopólio exer-cido por dita empresa. A igualdade entre osatores econômicos foi a razão pela qual ascorporações empresariais foram vistas commuitas ressalvas após a independência dosEstados Unidos da América. Elas somentepodiam ser constituídas para propósito es-pecífico e por duração em geral limitada a

vinte anos.[6]

Somente mais tarde, via juris-prudência da Suprema Corte estadunidense,é que a personalidade jurídica das corpor-ações empresariais passou a ser reconhecidapara fins de exercício de direitos à igualdadede exação obtida quando da negativa de oit-iva do caso Santa Clara County v. SouthernPacific Railroad (118 U.S. 394), de 1886, e,recentemente, a afirmação da igualdade depessoas jurídicas e físicas para fins de

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direitos políticos de financiamento de cam-panhas no caso Citizens United v. FederalElection Commission (558 U.S. 310), de2010.

Por detrás das limitações à atu-ação das corporações empresariaisencontrava-se a compreensão de que a pro-gressiva atribuição de personalidade jurídicaa elas desequilibraria o esquema de forçasdos atores econômicos em prol de pessoasjurídicas com vantagens competitivas nãousufruíveis por seres humanos, por definiçãofinitos no tempo e com capacidade de invest-imento limitada.

Assim, o controle regulatóriosobre pessoas jurídicas não surgiu, em suaorigem, por razões de preservação do mer-cado, dos preços, ou mesmo para defesa dosconsumidores, mas por um fundamento in-erente à igualdade, pois a mera existênciadas pessoas jurídicas empresariais constituium fator desequalizador das relações

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econômicas ao introduzirem seres desuman-izados em um ambiente de acumulação decapital e técnica impossível de ser alcançadopor suas contrapartes humanas, dotadas detempo finito de vida e fadados à responsabil-ização pessoal por seus atos.

O mercado existe como instituiçãoprotegida nos dias de hoje desde que referidopor elementos constitutivos básicos, dentreeles, a concepção de se afigurar como espaçoregrado de atores econômicos em igualdadede condições. O mercado é um bem jurídicoa ser protegido porque decorre do direito àigualdade, mas o inverso – o de se proteger aigualdade em virtude do mercado – não éverdadeiro. O original dessa relação repousano lado do direito à igualdade enquanto de-claração constitucional inaugural da vidapolítica em um Estado de Direito. Nessa re-lação, o mercado é um produto de-rivado do direito.

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Assim, é inquestionável que omercado deva ser protegido, mas ao se dizerisso permanece oculto o verdadeiro protag-onista do cenário regulatório: o direito àigualdade de condições concorrenciais.Quando da simplificação do significado daregulação, o direito à igualdade foi encobertopelas areias do tempo, sobrevivendosomente seu corolário: a competição e suapersonificação, o mercado. Por isso, a regu-lação não é um método de alcance da com-petição onde ela não exista, mas uma de-manda inafastável derivada da constataçãode que o próprio Direito criou seres imortaisque desequilibram as relações humanas deacumulação de capital, técnica e vantagenscompetitivas, exigindo, portanto, a regulaçãopor princípio; não por consequência de defi-ciência do meio concorrencial. Deficiente elejá o é por sua natureza.

Para além dessa constatação decentralidade do direito à igualdade para a

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regulação, o ser humano somente será livrepara o exercício de sua criatividade e uso deatributos de relacionamento humano quandoo meio de campo inicialmente desvirtuado –ou instrumentalizado pela própria existênciadas regras jurídicas – for conjunturalmenteajustado perante a mutação normativa nat-ural à qualquer sociedade política. Sem oacompanhamento conjuntural da realidadeoperado pelo direito regulatório, o Direitotrasnforma-se em uma instituição indomadacapaz de servir a fins não previstos em suaconformação teleológica: a sua finalidade deprocesso de preservação da convivênciasocial.

A regulação moderna, que serádefinida mais adiante, é o elemento de civil-ização da instituição jurídica na disciplinadas condições do jogo dos atores econômi-cos, quando dita instituição jurídica passou aser dirigida por forças germinadas na placade Petri do próprio mundo jurídico: a

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empresa; a corporação; a associação; afundação, enfim, a pessoa jurídica com pre-tensão de atuação econômica. A regulação éo acompanhamento do crescimento das cul-turas lá germinadas. Nessa placa de Petri,que fornece o ambiente artificial de in-cubação de novos seres imortais, as regrascompetitivas são definidas por fronteiras quenecessitam da dinâmica regulatória para quenão estrangulem os seres que justificarem asnovas criaturas: seus criadores, os titularesdos direitos fundamentais humanos, quecontinuam figurando como norte valorativode todo o sistema jurídico-político. A regu-lação é uma necessidade decorrente do sis-tema jurídico moderno para preservação desua finalidade: o criador – o ser humano; esomente mediatamente sua criatura – o serjurídico e o mercado.

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2.2 DIREITOS FUNDAMENTAISOBJETIVADOS E ESTADOREGULADOR

O século XX significou a afirm-ação dos direitos individuais como institu-ições jurídicas dependentes do contexto so-cioeconômico; significou, em outras palav-ras, a tentativa de solução do conflito entre apercepção dos direitos, de um lado, como en-tidades ideais e impalpáveis – liberdades ab-stratas – e, de outro lado, como configur-ações tangíveis resultantes de atuação diretaestatal conformadora dos direitos – liber-dades concretas. O século XX representou omomento teórico de afirmação das garantiasconstitucionais dos direitos fundamentais,desde que se vulgarizou o entendimento dainsuficiência de enumeração de direitos paraproteção dos seus titulares por intermédio da

teoria das garantias institucionais.[7]

Fala-se, portanto, do século de apresentação do

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Estado como um componente essencial nadefinição do conteúdo dos direitos funda-mentais mediante enraizamento do conceitode serviço público e da ampliação concretado rol de direitos dos cidadãos.

Em que medida tais conjecturasse relacionam com o conceito de regulação?Na medida em que o Estado Regulador seapropria, como seu pressuposto, da ideia deque o papel interventor estatal, inscrito naregulação de setores assumidos como de in-teresse público, legitima-se por sua essen-cialidade (do Estado) na concretização dosdireitos a eles relacionados (aos setoresregulados); apropria-se da indissociabilidadeentre o enunciado abstrato de um direitosubjetivo e o contexto socioeconômico epolítico, enfim, cultural, de sua fruição. Opressuposto do Estado Regulador,portanto, é a compreensão da inter-venção estatal como garantia de pre-servação das prestações materiais

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essenciais à fruição dos direitos fun-damentais, sejam elas prestações de ser-viços públicos ou privados, sobre as quais seaplica a insígnia da regulação, ou sejam elasoutros tipos de atividades, tais como o exer-cício do poder de polícia, atividades de fo-mento e prestações positivas tradicionais deíndole concreta e normativa.

O direito subjetivo somente podeser compreendido atualmente se encaradoem comunhão com sua faceta objetiva, querepousa na determinação de conteúdo apartir da dinâmica do ordenamento jurídicoem meio às potencialidades concretas cria-das por políticas públicas, por ordens norm-ativas, por investimento empresarial, enfim,por acompanhamento conjuntural do desen-volvimento de um setor de atividades de in-teresse público como, por exemplo, ossetores de saúde, educação, recursos hídri-cos, energia, telecomunicações e transporte.A plena fruição do direito à saúde em suas

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diversas dimensões de devido diagnóstico,prognóstico e tratamento médico encontra-se intrinsecamente relacionada com as dis-posições concretas de financiamento da edu-cação universitária médica e de áreas afins,de financiamento das pesquisas universitári-as relativas ao desenvolvimento de equipa-mentos e métodos laboratoriais, de con-strução de uma rede de energia elétrica con-fiável para preservação dos equipamentosauxiliares, de edificação de redes nacionais einternacionais de banda larga para telemedi-cina, do devido equacionamento e acompan-hamento da liquidez de sistemas de saúdesuplementar, enfim, de uma lista abrangentede atuação estatal e não-estatal concertadasegundo uma batuta unificada na figura in-terventora, mesmo que indireta, do Estado(não do governo) como espaço público deconstrução de soluções.

A complexidade alcançada na de-terminação de conteúdo jurídico dos direitos

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fundamentais revela que a precisão de ditoconteúdo exige a análise do dispositivonormativo, como cristalização cultural que é,associado aos influxos de transformações dasideias legislativas, jurisprudenciais, sociais,enfim, da realidade cultural circundante. Adeterminação de sentido normativo deixoude ser remetida ao ambiente puramente es-

trutural do fenômeno jurídico[8]

; deixou deprocurar extrair de um dispositivo escrito oudoutro elemento cultural cristalizado – juris-prudência, doutrina, costumes – todo o sig-nificado regrador da realidade; deixou decrer na possibilidade de alcance de um únicosignificado estático frente a uma realidadedinâmica e multifacetada. Em outras palav-ras, o conteúdo normativo encontra-se clara-mente remetido a decisões de normatizaçãosecundária, significando que o adens-amento do conteúdo dos direitos fun-damentais depende, hoje, em grandemedida, de decisões estatais influentes

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sobre os setores tidos como essenciaisao desenvolvimento socioeconômicodo país e o fenômeno da regulaçãoocupa posição privilegiada em tal es-paço decisório.

2.3 O ESTADO ADMINISTRATIVO E ASEPARAÇÃO DE PODERES

Mas não basta referir-se à causaque justificou o Estado Regulador, pois elapoderia ter resultado em diversas con-sequências, que não a de valorização da reg-ulação, mediante reforço, por exemplo, daatividade jurisdicional, ao invés de se enfat-izar a normatização e administração conjun-tural de atividades de relevância social. Daídecorre que outro pressuposto do EstadoRegulador encontra-se na identificação

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mesma do Estado Administrativo, emque as noções de profissionalismo e expertisetradicionalmente aplicadas aos negóciosprivados são adaptadas ao conceito de ex-pertise na atividade de governar com a co-notação de permanência, treinamento e es-pecialização de funções.

O início do século XX, mais pre-cisamente a partir da Primeira Guerra Mun-dial, presenciou a transformação da Admin-istração Pública em um substantivo, deixan-do de ser percebida como uma atividadeperiférica para se apresentar como uma ciên-cia que combina e se utiliza de muitasespecialidades, apresentando-se como o

“negócio mestre de todos os outros”[9]

aosubsumir e sintetizar os demais.

A teoria da separação de poderesconstituiu terra fértil à formação da teoria doEstado Administrativo. Inicialmente as-sentada em afirmações que rechaçavam o

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poder absoluto do monarca, mediante a ideia

de uma “monarquia limitada”[10]

e funcion-al, no sentido de que “reis são feitos para o

reino, não reinos para o rei”[11]

, a ideia daseparação, desde os escritos de Bolingbrokede 1748, vem amenizada na literatura clás-sica pela referência ao equilíbrio de poderes– equilibrium of powers, reciprocal restric-tions, reciprocal control, reciprocal delayand detention –, exigindo, com isso, a inter-penetração entre os poderes. Nem mesmo énecessário remeter-se a clássicos da liter-atura utópica – A República, de Platão; Uto-pia, de Thomas Morus; Oceana, de JamesHarrington – para que se afirme a interpen-etração de funções na divisão dos poderes. Aprópria classificação de Montesquieu dasatividades conjunturais como próprias aoPoder Executivo demonstra como a divisãotripartite de poderes e funções não conseguiaabranger toda as dimensões de atividades

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estatais.[12]

Igualmente perplexo pela insufi-ciência da referência aos três poderes comoabrangentes de todas as atividades estatais,mas preocupado com a manifestação jurídica

da normatização infralegal, Eros Grau[13]

diferencia normas primárias e secundárias,procurando enquadrar em um conceito maisamplo de atividade normativa as atividades

conjunturais de administração das leis.[14]

A noção de Estado Administrativonasce em meio à constatação de insuficiênciado modelo tripartite de separação de poderespara afirmar que a Administração Pública, aíincluída a jurisdição sob o viés tradicional deseparação de poderes, situa-se em um es-paço de íntima relação e harmonia entre aadministração e a política; uma teoria que senutre da assertiva já de Montesquieu de queos poderes contêm várias funções para quese impeça o domínio de uns pelos outros. Da

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mesma forma que a atividade executiva, nosidos da institucionalização da separação depoderes pelos framers da Constituição dosEstados Unidos da América, era vista comoinscrita tanto no Executivo quanto no Judi-ciário, quando se esperava que os juízes ser-vissem como “brotos nascidos do terreno ex-

ecutivo”[15]

, formando uma aliança defens-iva com o Executivo contra o Congresso eparticipando ativamente da execução das

leis[16]

, a teoria administrativista do séculoXX voltou seus olhos para inscrever ao ladoda jurisdição uma atividade essencialmentedistinta da atividade executiva: a atividadede administração das leis, que teve sua apar-ição institucional a partir de 1883, nos Esta-dos Unidos da América, com o surgimentodas agências independentes – independentestablishments – e, no Brasil, tanto com aabsorção da concepção autárquica de origemitaliana da primeira metade do século XX,

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quanto pelo movimento mais visível de cri-ação dos órgãos reguladores da segundametade da década de 1990. É bem verdadeque a concepção do Estado Administrativofoi fomentada em meio ao movimento re-formista estadunidense de fortalecimento doPoder Executivo em detrimento da entãoconsiderada invasão das atividades adminis-trativas por parte do Legislativo e do Judi-ciário, mas isso não afasta a consideração deque o Estado Administrativo consistiu emum movimento crítico quanto à imprecisãoinstitucional da administração das leis.

Sob o enfoque do Estado Admin-istrativo, a percepção de alastramento dasfunções entre os poderes estatais implicatambém a compreensão da função adminis-trativa como uma realidade equidistante dasclássicas funções estatais. Trata-se, portanto,da progressiva institucionalização da admin-istração como algo ligeiramente distinto dasfunções executivas, legislativas e

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jurisdicionais. A grande novidade da teoriaadministrativista do século XX está justa-mente na identificação da administração es-tatal como algo distinto das funções exec-utivas presidenciais de comando supremodas forças armadas e aplicação das leis. OEstado Administrativo expressa uma funçãoseparada das demais – a administração dasleis – como uma atividade intermediáriaentre as funções clássicas executivas, legis-lativas e jurisdicionais: um “reino de expert-

ise” imune à influência política direta.[17]

A identidade da atividade propria-mente administrativa como distinta da exec-utiva, judicial e legislativa explica, por exem-plo, a presença inafastável dos termos“poderes quase legislativos e quase jurisdi-cionais” (quasi-legislative e quasi-judicialpower) na literatura estadunidense sobre asagências reguladoras, bem como a institu-cionalização das agências como órgãos

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independentes do Executivo e a consideraçãoda administração como espécie da atividadede execução da vontade do Estado, ao ladoda atividade executiva e da jurisdicional, masem oposição à atividade de decisão da polít-ica – a legislativa. As agências reguladorasencarnam, na tradição do Estado Adminis-trativo estadunidense, a afirmação de umaestrutura estatal responsável pela adminis-tração das leis como algo essencialmente dis-tinto da formulação das leis e, por isso,definida por exclusão, ou seja, trata-se daregulação entendida como a adminis-tração das leis que não se confundecom a formulação da política públicacorrespondente, o que não significa dizerque a administração das leis seria despida deconteúdo normativo.

A teoria administrativista quecunhou o conceito de Estado Administrativo,no entanto, não vê uma diferença essencialentre política e administração. Pelo

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contrário, são fases de um mesmo processoadministrativo, que define um Estado emque a separação entre política e adminis-tração obedece a uma finalidade utilitária depreservação de espaço para a especializaçãofuncional. O Estado Administrativo é assimdefinido como um Estado dotado de um pro-cesso administrativo único, que permeia to-das as funções governamentais, abarcando apolítica e a administração propriamente dita.Trata-se, portanto, de um Estado queencarna como função primeira oplanejamento mestre de toda a eco-nomia, presentes duas funções primordiais:a de planejamento e execução adminis-trativa, de um lado; e a de veto político, de

outro.[18]

Não é difícil de se ver a íntimaconexão dessa concepção de Estado com avalorização dos órgãos reguladores de hoje,quando, em virtude da amplitude, dimensãoe importância do poder regulamentar dasagências reguladoras, estas são percebidas

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como um quarto poder, que sintetiza o gov-erno moderno como um governo adminis-

trativo.[19]

2.4 LEGITIMIDADE NO ESTADOREGULADOR

O Estado burocrático, planejador,eminentemente administrativo, enquantosubversão da clássica separação dos poderes,embora sofra com a indignação políticaproduto do aparente menosprezo da funçãolegislativa, detém muito maior aderência àrealidade de produção do poder regulatóriodo que o ideal de separação tripartite depoderes, que é útil enquanto permite a pre-servação de uma estrutura representativa deíndole formal. Teóricos do direito constitu-cional e administrativo têm se debatido com

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o tema e com a diferenciação entre políticapública e regulação.

Dito Estado Administrativo –mais precisamente, sua teoria – não se re-stringe, todavia, ao questionamento dasbases filosóficas da estrutura do poder in-stituído, ou seja, à reestruturação dospoderes em duas funções, em que a funçãoadministrativa resta agigantada; ele tambémquestiona as bases filosóficas da legitimidadedo poder, ou seja, como ocorre a interaçãoentre a estrutura burocrática estatal e suajustificação democrática perante o titular dopoder político. Nesse aspecto, já não operaefeitos ter-se em conta a aderência entre aprática do poder político e sua teoria embas-adora, pois a questão do fundamento de le-gitimidade precede à institucionalização dopoder político no Estado. Pode-se sustentar,portanto, o Estado Administrativo como umEstado estruturado em duas funções primor-diais de planejamento/execução

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administrativa e delimitação política, e, aomesmo tempo, questioná-lo quanto ao seupressuposto de exaltação da figura do ad-ministrador como seu cerne de legitimidadepolítica.

Assim, outro pressuposto doEstado Regulador está na questão do modusoperandi de manifestação da legitimidadepolítica. É certo que o Estado Regulador, aobeber da estruturação administrativa doEstado Administrativo, do engrandecimentoda figura burocrática, da expertise técnica eda concentração da funções estatais na etapade planejamento e execução das leis, ames-quinha a antes dominante função legislativade canalização da legitimidade política e,com isso, lança a questão fundamental sobrecomo a agora predominante função adminis-trativa do Estado, indiferenciada da funçãopolítica – ou, sob outro enfoque, tendoavançado sobre ela –, angaria legitimidadepolítica.

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A resposta a essa questão foi alvode preocupação dos clássicos e se alastra portoda a história das ideias políticas inscrita naquestão de quem deve governar. Se para

Bakunin[20]

e Kropotkin[21]

, a resposta aessa pergunta é a de que ninguém deve gov-ernar, para uma tradição muito maisabrangente e recorrente na filosofia política,os governantes legítimos são os mais varia-dos: para Platão, são os guardiães dotadosde inteligência, capacidade e prestativid-

ade[22]

; para Francis Bacon, são os filóso-

fos[23]

; para Augusto Comte, são os homens

de ciência[24]

; para Bossuet, são os monar-cas dotados de autoridade hereditária,

sagrada e absoluta[25]

; para Filmer, são osmonarcas, cujo poder é justificado por seus

direitos patriarcais[26]

; para Locke, são

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aqueles responsáveis pela proteção dosdireitos naturais à vida – inclusive à saúde –,liberdade e propriedade, mediante o alcanceda paz e prosperidade via supremacia de umpoder legislativo limitado pelo bem comum

da sociedade[27]

; para Burke, são aquelescujo juízo e indústria estão dedicados à dis-

cussão política[28]

; para Maquiavel, sãoaqueles que conseguem ascender ao poder ereformar as instituições para engrandeci-

mento do poder estatal[29]

; para Marx, o

proletariado[30]

; para Schmitt, a figura in-stitucional da unidade simbólica do

povo[31]

; para Kelsen, a Corte de Constitu-cionalidade é a responsável pela parcela dedecisão política sobre o significado das de-cisões fundamentais inscritas na constituição

de um país[32]

; para os teóricos da

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democracia representativa liberal, é o parla-

mento[33]

; para Hannah Arendt, é o homemcriativo livre das necessidades da vida, mas

preso à necessidade de ação política[34]

.

Os teóricos do Estado Adminis-trativo também têm sua fórmula: a legitim-idade de governar recai sobre o ad-

ministrador.[35]

Nesse aspecto, os camin-hos do Estado Administrativo e do EstadoRegulador se bifurcam, à medida que sepode cogitar do Estado Regulador com basenas mais diversas explicações de legitimid-ade, muito embora o reforço da relação entrelegitimidade e expertise técnica seja bem-vinda a pensadores daquela tradição doEstado Administrativo. Não é incomum,entretanto, relacionar-se o Estado Reguladoràs tradições de participação política da vir-

tude política[36]

e do republicanismo[37]

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em um movimento de despersonalização dalegitimidade, que deixa de ser referida aoguardião, ao filósofoso, ao estrategista, aocientista, ao monarca, ao proletariado, aoFührer, para ser referida à institucionaliza-ção da dimensão política do ser.

Assim, os pressupostos do EstadoRegulador gravitam entre as percepções daregulação como o reino da expertise, pas-sando pela concepção do administradorcomo síntese de legitimidade de uma dis-tribuição de poderes estatais dividida entre aadministração das leis e o poder de vetopolítico e, finalmente, a compreensão da reg-ulação como espaço público ou como institu-cionalização de virtude política erepublicanismo.

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2.5 PODER REGULAMENTAR NATRADIÇÃO FRANCESA

O agigantamento da função ad-ministrativa não foi, todavia, um aconteci-mento isolado da tradição anglo-americana;ele granjeou espaço significativo nadoutrina administrativista francesa,que tanto influenciou o direito administrat-ivo brasileiro. Foram dois os momentos deafirmação do direito administrativo francêscomo um direito especial da administraçãopública: a afirmação da justiça adminis-trativa como uma jurisdição com peculiarid-ades tais de celeridade e amplitude que exi-giam dela não só um método próprio, comotambém que se situasse no ceio da própriaadministração como algo distinto da justiçacomum; e a ampliação do poderregulamentar.

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O primeiro momento de afirm-ação do direito administrativo clássico naFrança concentrou-se na identidade institu-cional da justiça administrativa, que domin-ou a Restauração francesa, em especial apósa Carta Constitucional de 1814 e que seapoiava nos fundadores do direito adminis-

trativo clássico francês – Gérando[38]

, Ma-

carel[39]

e Cormenin[40]

. A diferença entreo sistema então inaugurado do contenciosoadministrativo na França em oposição àopção brasileira pelo sistema de jurisdiçãouna impede, em grande medida, que as dis-tinções doutrinárias e jurisprudenciais deentão operem efeitos na prática jurídicabrasileira. Influentes foram, nesse período,as considerações doutrinárias que não dis-sessem respeito à divisão de poderes.

O segundo momento pode serdidaticamente situado, embora não restrito àinstauração do 2º Império, com Napoleão

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III, no bojo da Constituição francesa de1852, que implicou o declínio do primado dateoria da separação dos poderes,questionando-se a onipotência do Legislat-ivo, mediante exaltação da autoridade do Ex-

ecutivo.[41]

Ambientada na Constituição de1852 e na criação do Tribunal de Conflitos,em 1849, para julgamento de conflitos decompetência entre a justiça administrativa ea comum, a doutrina administrativista pas-sou a evidenciar a expansão de fato do poderregulamentar tanto devido a mandatos con-stitucionais, quanto em virtude de delegaçãolegislativa, impondo o reconhecimento deque as disposições regulamentares decorreri-am da mesma fonte das disposições legis-lativas, ambas apoiadas no poder reguladorda sociedade, fazendo-se dos “regulamentosadministrativos (...) em essência assemelha-

dos às obras legislativas”[42]

.

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No final do século XIX e início doXX, parcela da doutrina administrativistafrancesa reconhecia a inafastável constataçãode que, mesmo com a crescente disciplinaconstitucional limitadora do poder regula-mentar, este, na prática, bebia do mesmomaterial das leis formais. Confrontado-se

com essa constatação, Laferrière[43]

dividiuo poder regulamentar entre regulamentosdestinados à execução das leis – executórios–, de um lado, e regulamentos de adminis-tração pública, de outro, estes últimos volta-dos ao exercício de mandato entregue ex-pressamente pelo Legislativo ao Executivopara, mediante o uso do poder regulamentar,complementar e desenvolver disposiçõespertinentes a determinadas matérias.

Os regulamentos em número cres-cente na prática institucional francesa e in-dependentemente da forma de governo,fosse ela o império, a monarquia ou a

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república, seriam manifestações cada vezmenos enquadráveis na definição de merasexecuções de leis. Divergindo de Hauri-

ou[44]

, que diferenciava materialmente leise regulamentos, Duguit entendia que taisregulamentos com força de lei obrigam, coma mesma força das leis formais, “os particu-

lares, os administradores e os juízes”[45]

,concluindo que os fatos são mais fortes queas constituições. Contra a concepção de queas leis formais trariam princípios gerais aserem detalhados pelos regulamentos, Mor-eau define os regulamentos como regras, sóque “impostas por uma autoridade distinta

do Legislativo”[46]

.

Tais concepções ampliativas dopoder regulamentar sofreram críticas deautores que aderiam a uma separação rígida

entre leis e regulamentos, como Jèze[47]

,

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Barthélemy e o já citado Hauriou, mas ocorpo de doutrina favorável ao reconheci-mento do poder regulamentar como algomais do que a simples execução e detal-hamento de leis tinha a seu favor a práticainstitucional francesa: o argumento de que aprática institucional do poder regulamentarnunca teria, de fato, respeitado uma pretensaseparação entre a lei e o regulamento.

É nessa linha de avaliação dascondições concretas de normatização queparcela da doutrina administrativistabrasileira questiona a viabilidade do Legis-lativo exercer o gerenciamento normat-ivo da realidade apoiada na insuficiênciade um modelo tradicional de separação depoderes. A partir dessa nova visão muito in-fluenciada por demandas políticas concretasde reestruturação do Estado brasileiro,nutrindo-se e nutrindo consultorias inter-nacionais de privatizações setoriais da se-gunda metade da década de 1990, um novo

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direito administrativo passou a encarar defrente a realidade de maior intervencionismoestatal sob a forma de planejamento egerenciamento, mediante “contínua

edição e substituição de normas”[48]

decor-rente não só do direito, quanto das condiçõesconcretas do setor regulado: foi-se o tempodas sínteses de direito administrativo descol-adas da realidade setorial.

2.6 SITUANDO O CONCEITO DEESTADO SUBSIDIÁRIO

Até o momento, foram identifica-dos os principais pressupostos do EstadoRegulador inscritos, agora de trás parafrente, na afirmação de um Estado eminente-mente interventor sobre realidades setoriaiscomplexas, de um Estado em que a adminis-tração das leis, como planejamento e

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gerenciamento contínuo, engrandece a fun-ção administrativa, de um Estado cuja ex-pressão de legitimidade se desloca para afigura do administrador ou, alternativa-mente, para o processo ou para o espaçopúblico regulador, de um Estado cujo con-teúdo normativo dos direitos depende de suaconformação objetiva em ambientes regula-dos, de um Estado que internaliza o mercadoem sua apresentação como produto dodireito fundamental à igualdade de con-dições competitivas.

Dado esse cenário teórico, onde sesitua a noção de Estado Subsidiário?

Entendido o Estado Subsidiáriocomo uma opção societária sobre o nível deinterferência estatal na esfera privada, ele seapresenta resumido na máxima: o governodeve fazer pelos cidadãos somente aquiloque eles não puderem fazer por si próprios, enada mais. Trata-se, portanto, de noção queengloba ditames de orientação política de

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predomínio da iniciativa privada sobre apública, de consequente limitação da atuaçãoestatal, mas, ao mesmo tempo, de atribuiçãoao Estado da função de fomento, coorde-nação e fiscalização da iniciativa privadapara potencialização dos negócios dos partic-ulares, ou mesmo o incremento de parceriaspúblico-privadas para o fim de subsídio à

iniciativa privada[49]

.

Enquanto mera orientação polít-ica de dosagem cuidadosa do nível de inter-ferência estatal na economia, o princípio dasubsidiariedade não afirma, nem infirma oEstado Regulador. Dito princípio pode regero discurso de um chefe de governo com pre-tensões de expansão da regulação estatal,sem que isso afete o nível de interferência naeconomia, desde que dita interferência sejustifique para o fim de preservação das re-gras equânimes de interação negocialprivada em determinado setor regulado, ou

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seja, desde que se justifique para o fim depreservação do ambiente mercadológicopertinente.

A desconexão entre o princípio dasubsidiariedade e o Estado Regulador ex-surge, contudo, quando ao conceito deEstado Subsidiário agrega-se a ideia de queos direitos fundamentais individuais sãomelhor garantidos pela ausência do Estado,o que contraria o pressuposto regulador deque a atuação estatal reguladora é essencial àconexão entre os riscos da atividade econôm-ica e a sociedade política, que pretende tersua voz presente na constante reorientaçãopolítica para preservação dos direitos funda-mentais de todos os envolvidos ameaçadospor distorções produzidas por um mercadolivre. Assim, quando o Estado Subsidiáriodeixa de servir como guia político dedosagem da interferência estatal, mediante oprincípio da subsidiariedade, para se ap-resentar com formatos totalizantes de ideal

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de eliminação da atuação estatal, somente aídito Estado Subsidiário deixa de contribuirpara a noção de Estado Regulador e passa aminá-la.

Assim entendido o princípio dasubsidiariedade, pode-se acrescentá-lo àlistagem de pressupostos do Estado Regu-lador, que sinteticamente são: a) o Estadogarante da igualdade de condições competit-ivas; b) o Estado interventor; c) o Estado Ad-ministrativo, por sua apresentação de agi-gantamento da função de planejamento egerenciamento das leis; d) o Estado legitim-ado na figura do administrador, do processode gerenciamento normativo da realidade oudo espaço público regulador; e) o Estado dedireitos dependentes de sua conformaçãoobjetiva em ambientes regulados; f) o EstadoSubsidiário, em sua apresentação de poten-cialização da iniciativa privada via funçõesde fomento, coordenação e fiscalização desetores relevantes.

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2.7 O FENÔMENO DA REGULAÇÃO ESEU SIGNIFICADO

A maior dificuldade na definiçãode pressupostos ao Estado Reguladorencontra-se na definição do seu qualificativocentral: a regulação. Afinal, se a regulação,

em sua acepção mais fundamental[50]

, sig-nifica um processo de realimentação con-tínua da decisão pelos efeitos dessa decisão,reconformando a atitude do regulador emuma cadeia infinita caracterizada pelo plane-jamento e gerenciamento conjuntural darealidade, há diversos elementos conceituaisda regulação que especificam essa noção fun-damental. São eles: a) a manifestação da atu-ação reguladora como uma atuação de poderpolítico, caracterizando-a como um projetode direito público; b) a consciência de que se

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regula algo que tem suas próprias leis, e que,portanto, a regulação potencializa as forçasda iniciativa privada em um ambiente par-cialmente preexistente e parcialmente criadopela própria atividade reguladora; c) a final-idade da regulação como o alcance de umequilíbrio dinâmico das interações dos atoressetoriais em conformidade com um objetivode interesse geral e não o de mera potencial-ização de um mercado regulado pre-tensamente indiferente ao contexto dosdireitos políticos e sociais circundantes.

A regulação, portanto, é uma forçade coerência sistêmica – de resgate da ordem– quando as contradições internas em de-terminado sistema social revelam uma dis-funcionalidade. Em ciências sociais, todavia,a referência ao resgate de um estado decoisas do passado é frágil à medida que ahistória da vida social apresenta-se como umfenômeno sempre inédito, mas o aspecto daregulação enquanto força de coerência

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sistêmica frente a movimentos de estrutur-ação social considerados disfuncionais emdeterminado momento histórico não deixade ser um conceito tentador.

A definição da regulação como umresultado da disfuncionalidade de um sis-tema explica o fenômeno de auto-pro-

clamação[51]

do caráter regulador de ór-gãos e entes estatais e paraestatais. Ela tam-bém explica o alastramento do uso do termoregulação sobre diversas realidades que, hápouco tempo atrás, sequer se cogitariaqualificá-las como regulatórias. Hoje, fala-seem regulação para cada vez mais temas antes

alheios à terminologia regulatória[52]

, taiscomo pesticidas agrícolas, pesquisas comembriões, mercado financeiro, ordenamentoterritorial, uso do espectro, posições orbitais,profissões, comercialização de hemoderiva-dos, exploração petrolífera, infraestruturaaeroportuária, comércio eletrônico, enfim,

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de uma miríade de tópicos que se apropriamda linguagem regulatória para o exercício deuma função que se justifica no paradigma doEstado Regulador.

A regulação de mercados comouma “forma jurídica de engenharia so-

cial”[53]

não é novidade como lembra Ogusao analisar o período Tudor e Stuart naInglaterra, bem como na alegação de Geof-

frey Elton, em seu clássico livro de 1953[54]

,de que Thomas Cromwell (séc. XVI) teriasido o inaugurador do governo burocráticomoderno. Na mesma linha de pensamento, ouso de contratos, termos, planejamento eacompanhamento administrativo remonta,na tradição brasileira, à valorização do ser-viço público dos clássicos do serviço públicofrancês. O norte de planejamento e geren-ciamento, contudo, assim encarado como ca-racterística central da atuação de poder, é oque faz da regulação, hoje, um termo

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onipresente. A regulação não se contentacom o governo pelas leis; ela exige o com-promisso público pela administração das leispari passu. O diferencial da regulação de ho-je está nos seus pressupostos, que ampli-aram sua amplitude, alcançando mais do queos comandos jurídicos destinados a eviden-ciar quando uma atividade regulada tornou-se disfuncional – a metáfora da regulaçãocomo um sinal vermelho – para encarnar oconjunto interdisciplinar de planejamento egerenciamento conjuntural de atividades deinteresse geral – o poder público como partí-cipe do setor regulado – ambientadas nospressupostos do Estado Regulador, ou seja,na era do Estado Regulador.

É bem verdade que os conceitosmuitas vezes se misturam, quando, por ex-emplo, a crítica ao Estado Dirigista, So-cialista ou proprietário dos meios deprodução toma o termo ‘planejamento’ comopróprio desse formato estatal em que a

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resposta às demandas sociais adquire oformato da estatização. Essa identificaçãoentre planejamento econômico e estatizaçãodos meios de produção foi ambientada namemória ainda recente dos anos 1990, queidentificava a planificação econômica com oregime comunista do bloco soviético e res-ultou na percepção maniqueista entre Estadoe mercado, em que o mercado passava a servisto como uma entidade desligada do

Estado, ao invés de um seu produto.[55]

Estudos inaugurais do Estado Reguladorcom esse viés de identificação do qualificat-ivo do ‘planejamento’ com aquele Estadoapoiado na estatização dos setores

produtivos não são incomuns.[56]

Afora aapropriação indevida do conceito de planeja-mento ao de Estado Socialista, algo negadopela extensa literatura do Estado Social eDemocrático de Direito, o qualificativo

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‘planejador’ é hoje inafastável do EstadoRegulador.

A regulação assimila a qualidadedo ‘planejamento’ estatal não como ideolo-gia, mas como método, ou melhor ainda,como tecnologia; como forma de expressãohumana criativa oriunda da relação do ser

humano com a natureza.[57]

Enquantotecnologia, a regulação é uma forma deprodução da existência social dependente deum projeto humano de acompanhamentoconjuntural dos sistemas sociais. Assim en-tendida, a regulação seria melhor definidacomo uma tecnologia social de sanção aflit-iva ou premial orientadora de setores relev-antes via atividade contratual, ordenadora,gerencial ou fomentadora.

A literatura apontada como inaug-uradora do olhar estatal regulador é vasta e

multifacetada.[58]

Em seu núcleo de

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significado, a regulação não exige, nem dis-pensa a ideia de agências reguladoras emenos ainda a de agências reguladoras inde-pendentes. A identidade entre a regulação etais estruturas estatais das agências regu-ladoras ocorreu mediante a interdependên-cia construída pela literatura do século XX einício do século XXI entre regulação e EstadoRegulador, em que foi acoplado à definiçãode regulação o meio ou veículo de mediação

entre o ser político e o setor regulado[59]

in-augurado pela prática institucional es-tadunidense. A íntima relação entre a con-strução conceitual da regulação e a históriainstitucional do Estado Regulador dos mode-los estadunidense e europeu permite falar-sede momentos regulatórios.

Em síntese, o termo regulação, in-augurado como um processo de adminis-tração de sistemas sociais mediante retroali-mentação contínua, foi transparecido,

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incialmente, em comandos estatais de con-trole sobre a conformação e os resultados dainiciativa privada para, a partir do processode desregulação das décadas de 1970 a 1990,expressar, hoje, modos de regulação maisefetivos, mediante instrumentos de planeja-mento racional da atividade reguladora porvários canais, tais como a aplicação de méto-dos de controle menos restritivos e baseadosem incentivos, a aplicação de administraçãode riscos às questões regulatórias, a ap-licação de técnicas de análise de custo-bene-fício e de impacto regulatório, ou mesmo aaplicação de uma perspectiva minimalista deauditagem de controles regulatórios internosàs empresas, de auto-regulação ou mesmo deexclusiva homenagem a incentivos demercado.

A regulação, portanto, parte desua configuração original de ideia pro-gramática inscrita em um sistemaautomático de retroalimentação e controle

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para se apresentar hoje como uma tecnolo-gia de governo de sistemas sociais, que podeestar sediada em órgãos estatais – a regu-lação por excelência do Estado Regulador –,em mecanismos internos de controleempresarial – a meta-regulação, em que oEstado audita os regimes de controle internodas empresas –, em mecanismos institucion-ais privados – auto-regulação –, no vencedordo jogo político entre os atores setoriais – olivre mercado – ou, finalmente, em umacomposição de tais opções.

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TEORIA JURÍDICA DAREGULAÇÃO

3.1 PUBLIC CHOICE THEORYVERSUS TEORIA PROCESSUALADMINISTRATIVA DA REGULAÇÃO

O fenômeno regulatório detém di-versas faces visíveis ou invisíveis segundo ateoria que procure explicá-lo. A ciência econ-ômica, embora não tenha sido a primeira ase debruçar sobre aspectos da regulação,desenvolveu todo um ramo de estudos dedic-ados exclusivamente à regulação e à sua pre-cisão conceitual, enquanto a análise jurídica,precedendo em mais de um século as novasanálises regulatórias econômicas, tratou daregulação como um subproduto de uma dis-ciplina maior da teoria do serviço público.Não se trata aqui de se estabelecer

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precedência ou grau de importância entre asabordagens econômicas e jurídicas, mas dese identificar a teoria jurídica da regulaçãopara além de olhos leigos como uma teoriamuito mais influente e fundamental para acompreensão do fenômeno regulatório.

Desnecessário frisar que há teori-as jurídicas da regulação, à medida que odireito lida diretamente com uma manifest-ação proeminente da regulação, ou seja, aregulamentação normativa. Sob o enfoquegeral de que regular significa, para a ciênciajurídica, regulamentar por intermédio depreceitos normativos, todas as teoriasjurídicas destinadas à disciplina da técnicalegislativa, da técnica regulamentar e da es-trutura administrativa e seus limites con-stitucionais explicam a regulação, como defato o fazem para fins de definição do quepode ou não ser disciplinado pelo poder reg-ulamentar, de como os poderes instituídosdevem se manifestar sobre determinada

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matéria regulada, de quais são os limitesdesses mesmos poderes frente às garantiasconstitucionais dos direitos fundamentais,de quais são as áreas e serviços passíveis deregulação, enfim, de uma miríade de temasque são tratados pela ciência jurídica desdeque se cogita do regramento normativo decondutas humanas.

A regulação moderna, ao ser el-evada ao patamar de categoria conceitualdefinidora do ethos estatal, não se contenta,todavia, com tais abordagens gerais que aencaram apenas como um subprodutojurídico. Imersa no meio regulatório, a ciên-cia jurídica reagiu antes de envidar esforçosno sentido de destacar a categoria regu-latória de seus estudos tradicionais, mas aofim e ao cabo, encontrou o caminho de trata-mento científico da regulação via direito ad-ministrativo especial de cunho setorial: odireito setorial e regulatório.

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Ao contrário do preceituado pelosexpoentes da teoria econômica da publicchoice, a teoria jurídico-institucional da reg-ulação vê na estrutura regulatória uma con-sequência necessária da divisão funcional depoderes e uma garantia institucional da pre-servação do interesse público em setoresregulados: trata-se, portanto, da preeminên-cia dos controles substantivos e procedimen-tais de legitimidade da instituição regu-ladora. A teoria processual administrativa da

regulação[60]

afasta os pressupostos dateoria da public choice, de que haveria ina-fastáveis incentivos à cooptação dos regu-ladores rumo a uma regulação de grupos de

interesse ou special interest regulation.[61]

Aquela teoria jurídica, pelo contrário, revelaa dimensão jurídico-processual da regulaçãocomo uma regulação de interesse público oupublic-interest regulation. Em outras palav-ras, a teoria jurídica da regulação enfoca um

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aspecto pouco aprofundado pela teoria econ-ômica: o processo jurídico-institucional depreservação da dicção funcional do direito.

Ao se opor, de um lado, a regu-lação de grupos de interesse e, de outro, aregulação de interesse público, o que se querdizer com isso é que, de um lado – do lado daregulação de grupos de interesse –, os bene-fícios regulatórios são atribuídos a parcelasda sociedade em detrimento desproporcionala toda a sociedade, ou seja, o custo dos bene-fícios de poucos excedem o retorno eficientee competitivo usufruído pelos beneficiários.Pelo contrário, a regulação de interessepúblico é visível quando os benefícios regu-latórios à sociedade como um todo excedemo, ou empatam com os benefícios alcançadospor poucos na linha do critério econômico dacurva de eficiência de Kaldor-Hicks. Atradução jurídica desse critério econômicoapoiado na eficiência de Pareto encontra-seinscrita em princípios constitucionais da

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eficiência administrativa, da preeminênciado interesse público e da proporcionalidadede medidas restritivas de direitos. Ambos osenfoques – econômico e jurídico – portantodetêm categorias conceituais para aquilatar-em a regulação como prejudicial à sociedadeem benefício de grupos de interesse, oucomo virtuosa ao interesse público. A seguir,são identificadas as principais característicasdessas duas teorias representativas das anál-ises econômicas e jurídicas.

A teoria econômica da publicchoice afirma, em síntese apertada, que oprocesso decisório da regulação é umproduto necessário da troca de vantagenspolíticas entre representantes eleitos, gruposde interesse e agências reguladoras. Paratanto, ela parte de estudos econômicos sobrea democracia e decisão política, concluindopela ínsita inadequação da regulação ou

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intervenção estatal sobre a economia como

meio de alcance do interesse público.[62]

Por outro lado, a teoria jurídico-institucional da regulação parte da próprianatureza e razão de ser do processo decisóriodas agências reguladoras ou órgãosreguladores: trata-se, portanto, do estudoprocessual da manifestação do poder admin-istrativo, algo, aliás central para a análise dofenômeno regulatório. Daí poder-se dizerque se trata de uma teoria processual ad-ministrativa da regulação ou teoria do pro-cesso administrativo regulatório. Ela se pre-ocupa com a dimensão processual do fenô-meno regulatório em sua justificativa fun-cional de autonomia do processo de tomadade decisões regulatórias. Exatamente ao de-fender a consequência jurídica de autonomiadecisória das estruturas regulatórias via dis-ciplina jurídica do processo administrativopertinente, a teoria processual

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administrativa da regulação nega o funda-mento básico da teoria da public choice, qualseja, a dependência da tríade congressistas -grupos de interesse - regulador.

As categorias conceituais quecompõem a base da teoria processual admin-istrativa da regulação são, sinteticamente, asseguintes: a) procedimento administrativo;b) neutralidade do processo administrativo;c) ambiente jurídico-institucional adminis-trativo. Cada um desses elementos forneceum conjunto de pressupostos tradicionais àteoria geral do direito público, que dirigem,constrangem ou afastam os incentivos quefariam do regulador uma peça inerte no jogode trocas políticas.

Exemplificativamente, a neutral-idade do processo administrativo apoia-se nanatureza jurídico-funcional da decisão ad-ministrativa, enquanto a exteriorização doprocesso via procedimento administrativoapoia-se na transparência, visibilidade,

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obtenção de apoio social, melhoria do con-teúdo de regulamentações propostas, ante-cipação de críticas dos atores setoriais eoportunidades de ajuste da proposta. Final-mente, no que diz respeito ao ambiente in-stitucional regulatório, este abre espaço àconstrução de propostas regulatórios via es-tabilidade profissional do regulador, via con-tatos perenes com comitês acadêmico-científicos, via incentivos à defesa do in-teresse público por parte do servidor-regu-lador, via apoio de outras estruturas depoder à preservação da competência dasagências reguladoras, ou mesmo via controleexterno e interno da atividade reguladora.

Não é por acaso que a literaturado novo direito administrativo dedique tantotempo e esforço ao desenvolvimento de con-ceitos de autonomia dos órgãos reguladores,independência administrativa, transparênciaprocessual, e processo decisório

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administrativo.[63]

Esses temas se ap-resentam invariavelmente como os temas in-augurais da teoria jurídica da regulação viaespecialização do direito administrativo esão indispensáveis à compreensão da auto-nomia do fenômeno regulatório.

Da mesma forma que a teoria pro-cessual da regulação reage à concepção daregulação como um produto da composiçãode interesses dos atores regulados, enfatiz-ando o aspecto processual da formação dedecisão regulatória, outra vertente de análisejurídica da regulação reage àquela concepçãoao considerar a regulação como umfenômeno jurídico-institucional de proteçãode bens jurídicos maiores externos à estritarelação entre os atores regulados e seusinteresses. Fala-se aqui da corrente repres-entada por dois expoentes da análise jurídicada regulação, nomeadamente dois publicis-tas: Stewart e Sunstein. Ela é conhecida

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como a teoria social da regulação, emoposição à teoria econômica da regulação.

A teoria social da regulação foiambientada na crise do Estado Regulador es-tadunidense da década de 1960, em que aspretensões regulatórias deixaram de se cir-cunscrever ao bom funcionamento de umsetor específico da economia para atingiratividades que se alastram por diversossetores, tais como defesa do consumidor,meio ambiente e saúde do trabalhador. Aregulação social acrescentou preocupaçõesde direitos sociais às decisões regulatórias,qualificando, na literatura estadunidense, ochamado Estado Social Regulador. Segundo

Stewart[64]

, esse tipo estatal se caracterizapela apresentação da regulação não maiscomo uma solução pontual de conflitos entreos atores econômicos, mas como produçãode estratégias jurídicas de comando desetores regulados. Em outras palavras,

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Stewart defende a compreensão da regulaçãocomo a juridicização dos conflitos setoriaiseconômicos. Sunstein parte do mesmoprincípio de que a regulação dos anos 1960 e1970 nos Estados Unidos sofreu mudançasprofundas ao deixar de se preocupar exclu-sivamente com a estabilização da economiaou com controle de preços e de entrada nomercado regulado para passar a representara defesa da saúde e segurança pública contrariscos, bem como para compensar, apoiadaem enunciados de direitos fundamentais, a“subordinação social de grupos em posição

de desvantagem”[65]

. A diferença de fundoentre a teoria processual administrativa daregulação e a teoria social da regulação estáem que, embora ambas advoguem a insufi-ciência da análise econômica centrada na po-tencialização dos interesses dos atores priva-dos envolvidos em um mercado regulado, aprimeira delas preocupa-se com a dimensãoprocessual de tomada de decisão regulatória,

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afirmando a possibilidade de decisões regu-latórias em prol do interesse público via con-strições procedimentais, enquanto a segundadelas concentra-se na dimensão substantivada regulação, ou seja, no conteúdo da discip-lina regulatória voltada à concretização dedireitos.

Tais correntes de pensamento sãorepresentativas das dimensões jurídicas pro-cessual e substantiva da regulação, mas nãoesgotam as descrições e explicações jurídicasda regulação. Nem todas as teorias jurídicasde regulação são facilmente enquadráveiscomo exclusivamente substantivas ou pro-cessuais, mas elas são identificáveis por suascaracterísticas prevalecentes.

Um expoente da criminologia,John Braithwaite, ao analisar crimes de col-arinho branco, crimes corporativos e justiçarestaurativa, por exemplo, propõe que a reg-ulação seja compreendida como um esforçode criação de incentivos morais para o

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cumprimento da lei.[66]

Na tentativa de ul-trapassar o debate entre regular e desregu-lar, Braithwaite propõe a chamada regulação

responsiva (responsive regulation)[67]

, se-gundo a qual a efetividade da regulação de-pende da criação de regras que incentivem oregulado a voluntariamente cumpri-las, me-diante um ambiente regulatório de constantediálogo entre regulador e regulado. A regu-lação, para Braithwaite, consiste em um con-junto de atividades distribuídas em umapirâmide em que, na base, encontram-seatividades persuasivas da conduta do regu-lado, enquanto, no topo, um conjunto depenas draconianas de condutas indesejadas.Portanto, à primeira vista, trata-se de umaanálise processual da regulação em que oautor propõe a constante interação entre reg-ulador e regulado na construção do ótimoregulatório de incentivos os mais efetivospara persuasão dos regulados via reavaliação

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de sucessos e fracassos da políticas regu-latórias implementadas sem definir, a priori,quais seriam os elementos substantivos queguiariam a atuação regulatória. Ocorre, to-davia, que a análise mais detida da propostade Braithwaite pode divisar uma dimensãosubstantiva da regulação quando se identi-fica como objetivo da regulação o alcance dapersuasão do regulado, apelando para o val-or da responsividade como norte e razão daregulação.

Outro exemplo de estratégia reg-ulatória processual que tenta se afastar deabordagens ordenadoras de comando e con-trole (command and control) encontra-se naproposta de uma regulação inteligente

(smart regulation) de Gunningham[68]

, se-gundo o qual o momento de se abandonar aregulação ordenadora em prol de métodosregulatórios mais sutis estaria na detecção deuma ‘comunidade de destino partilhado’

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(community of shared fate), quando a per-formance negativa de um de seus membrosprejudica a todos, o que promoveria um in-centivo processual a que todos os atores set-oriais, inclusive competidores, se apoiassempara evitarem efeitos perniciosos do maudesempenho de um sobre todos

Os exemplos de propostas deabordagem regulatória apoiadas em con-cepções jurídicas processuais ou substant-ivas são inúmeros, restringindo-se aqui aenumerar os mais significativos. Cumpre fi-nalmente ressaltar que os dois exemplosenumerados se enquadram em uma tradiçãojurídico-filosófica que caminha nos passosdados por Habermas e Luhmann e sintetiza-dos em Gunther Teubner de tentativa desolução da compreensão do direito como sis-

tema autopoiético[69]

, fechado em simesmo, ampliando seus horizontes via pro-

cesso reflexivo[70]

com o meio regulado.

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Em síntese, a análise jurídica daregulação contempla duas vertentes. En-quanto a regulação social afirma o conteúdosubstantivo da regulação em direitos sociais,as teorias processuais de regulação, em suavariedade de abordagens, apresenta técnicasde regulação voltadas ao alcance do interessepúblico via regulação reflexiva, responsiva,ou simplesmente de direito públicoadministrativo.

3.2 SITUAÇÃO JURÍDICA DOCIDADÃO CO-PARTÍCIPE NO ESTADOREGULADOR

Um dos efeitos da análise jurídicada regulação está na compreensão do EstadoRegulador a partir da situação jurídica doparticular frente à produção de poder estatal.Enquanto no Estado-Polícia, ao particular é

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reservada a função jurídica de súdito; noEstado Liberal, a de bourgeois dotado de at-ributos oponíveis ao Estado; no Estado So-cial, a função de beneficiário utente de ser-viços públicos estatais definidores da esferaconcreta dos direitos fundamentais; noEstado Regulador, o particular é um ator doambiente regulador, partilhando com oEstado a responsabilidade pelo alcance dointeresse público.

O cidadão do Estado Regulador éuma engrenagem essencial e uma força mo-triz necessária à implementação do interessepúblico, mediante co-participação naprestação de atividades socialmenterelevantes.

3.2.1 ARBITRAMENTO E ARBITRAGEM NAREGULAÇÃO

No paradigma do Estado Regu-lador, as fronteiras de atributos de direitopúblico e privado continuam bem definidas,

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mas sua atribuição não se encontra reser-vada ao poder público. Pelo contrário, é nafigura do Estado Regulador que se avolum-am as manifestações jurídicas de entidades

privadas com poderes públicos.[71]

Também encontra-se inserido naprincipiologia jurídica do Estado Reguladoro ambiente propício à expansão de mecanis-mos autocompositivos e heterecompositivosde conflitos por meio de compromissos vin-culantes privados, que têm sido absorvidos àprática regulatória setorial como instru-mentos de partilhamento de responsabilid-ades na condução do interesse público.Trata-se aqui, em especial, da arbitragem ede sua distinção conceitual do arbitramentoadministrativo.

A arbitragem se configura em ummétodo alternativo de resolução de disputasde caráter heterocompositivo voltado à aber-tura de alternativas de decisão para além dos

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jogos de soma zero da teoria dos jogos, emque o sucesso de uma parte implica, neces-sariamente, a derrota da outra parte. O âm-bito de aplicação da arbitragem resume-se alitígios relativos a direitos patrimoniaisdisponíveis (art. 1º, da Lei 9.307/96), po-dendo, segundo entendimento doutrinário,decorrer de acordo entre partes ou de im-

posição regulatória ou legal.[72]

De outra parte, o arbitramentocomum na prática regulatória é um processoadministrativo de resolução de disputas, que,enquanto tal, caracteriza-se como o modonormal de atuação estatal via manifestaçãoprocessual administrativa no uso de com-petência administrativa expressa em lei,constituindo-se em requisito à produção deatos administrativos pertinentes à solução delitígios perante a Administração Pública.

Enquanto o arbitramento admin-istrativo admite, como regra, pedido de

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reconsideração administrativa e, emqualquer caso, recurso amplo ao Judiciáriosobre forma e mérito do ato administrativo,que deve respeitar o contraditório e a ampladefesa devido a seu enquadramento nahipótese de situações de litígio do art. 5º, LVda Constituição Federal de 1988, a arbit-ragem está apoiada em características pró-prias, umas mais ou menos distantes dos re-quisitos funcionais de um processo adminis-trativo de resolução de disputas, quais se-jam: a) ampla participação das partes noprocedimento arbitral; b) maior autonomiana definição do procedimento do juízo arbit-ral; c) exigência de prévia aquiescência daspartes para constituição de cláusula com-promissória; d) definição dos árbitros por in-dicação das partes, exceto no caso de com-promisso arbitral fixado por sentença judi-cial; e) sigilo das informações trazidas aojuízo arbitral; f) limitação da matériapassível de arbitragem a direitos

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patrimoniais disponíveis; g) imposição detentativa de conciliação prévia; e finalmenteh) o caráter mais distintivo de todos, a inad-missibilidade de recurso revisional de méritoà esfera administrativa ou judicial.

Fartas são as hipóteses de arbitra-mento administrativo na prática regulatória.Basta citar, por exemplo, o caso dearbitramento inter-setorial decorrente denormatização conjunta da ANATEL, ANEELe ANP. O Regulamento Conjunto de Resol-ução de Conflitos das Agências Reguladorasdos Setores de Energia Elétrica, Telecomu-nicações e Petróleo, aprovado pela ResoluçãoConjunta nº 2, de 27 de março de 2001, pre-vê a criação de Comissão Permanente deResolução de Conflitos das Agências Regu-ladoras, disciplinando o processo de resol-ução administrativa de conflitos sobre com-partilhamento de infraestrutura dos setoresenvolvidos. A distinção entre o processo ad-ministrativo de resolução de disputas e a

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arbitragem foi expressamente fixada na ter-minologia utilizada quando da consultapública referente ao Regulamento emquestão, que se utilizou da distinção entrearbitragem civil e processo administrativode resolução de disputas para especificar oescopo da regulamentação submetida à con-sulta pública, qual seja, exclusivamente oprocesso administrativo, excluída a arbit-ragem civil. Um exemplo internacional servepara esclarecer que a distinção não se re-strinje ao direito brasileiro. A diretivaeuropeia 2002/21/EC, no seu art. 20, pará-grafo 2º, define que o dever das autoridadesreguladoras de redes e serviços de comu-nicação eletrônica de decidirem sobre dis-putas do setor via arbitramento administrat-ivo pode ser afastado pela normatização dosEstados-partes se for detectada a possibilid-ade de arbitragem ou mediação da questãoao alcance das partes. Se, todavia, a medi-ação ou arbitragem não solucionarem a

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disputa em até quatro meses, a autoridadereguladora local deve se comprometer a de-cidir a questão, fazendo uso de seu poder dearbitramento administrativo.

Não tão fartas na regulamentação,embora presentes em nível de cláusulas decontratos de concessões de diversos setores,estão as previsões de instalação de juízos ar-bitrais em dois formatos bem distintos: a) ojuízo arbitral em que o poder público figuracomo árbitro, por meio do órgão reguladorcorrespondente; b) o juízo arbitral em que opoder público figura como parte, por meiodo compromisso arbitral firmado entre órgãoregulador e entidade regulada.

A previsão normativa de incorpor-ação de agência reguladora na função de ár-bitra não é incomum e visa, basicamente, in-troduzir um método de resolução de disputasmais aberto e participativo para questões atéentão exclusivamente definidas pelo métodotradicional de processo administrativo de

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solução de disputas entre prestadores de ser-viços regulados ou entre eles e os usuáriosdos serviços.

Muito mais delicada é, entretanto,a inserção de um órgão regulador como parteem juízo arbitral envolvendo disputas entre opróprio órgão regulador e prestadores deserviços por ele regulados. De imediato, osprincípios de direito público de indisponibil-idade do interesse público, irrenunciabilid-ade de competência administrativa (art. 11,da Lei 9.784/99) e indelegabilidade deedição de atos de caráter normativo, de de-cisão de recursos administrativos e dematérias de competência exclusiva do órgãoou autoridade (art. 13, da Lei 9.784/99),surgem como obstáculos à definição damatéria que pode ser atingida por cláusulacompromissória arbitral.

Não obstante tais limitações deponto de partida, tanto a prática de cláusulascompromissórias em contratos de concessão,

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quanto a avialiação doutrinária e jurispru-dencial favorável à arbitragem dentro de cer-tos limites é inquestionável na experiênciajurídica brasileira. Para justificar a presençade cláusulas compromissórias arbitrais emcontratos de concessão para prestação deserviços públicos, parte-se da distinção dodireito administrativo clássico entre ativid-ades administrativas de autoridade versusatividades administrativas de gestão patri-monial. Enquanto para as atividades deautoridade na prestação de serviços públicosnão cabe qualquer tipo de negociação paracomposição de conflitos via juízo arbitral,para as consequências ou repercussões patri-moniais dos atos administrativos manifest-antes do poder de autoridade estatal, o juízoarbitral tem sido aceito. Assim, o primeirorequisito para a introdução de cláusula com-promissória arbitral em contratos de con-cessão está na delimitação de seu escopopara repercussões patrimoniais abarcadas

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pelas cláusulas econômico-financeiras docontrato. Há quem, inclusive, argumentepela exigência de cláusula compromissória

arbitral em contratos de concessão[73]

, me-diante aplicação do art. 25, XV, da Lei 8.987/95, que prevê, dentre as cláusulas essenciaisdo contrato de concessão, o foro e modoamigável de solução das divergênciascontratuais.

O entendimento jurisprudencialem tribunais recursais estaduais de validadedas cláusulas compromissórias e com-promissos arbitrais em contratos de con-cessão, tendo como parte, o órgão reguladortitular do poder concedente, não é recente,mas somente em 2011, o STJ, por sua 3ªTurma, decidiu, para além de reconhecer alegalidade de cláusula compromissória arbit-ral em contratos de concessão para disputasentre o concessionário e o próprio poderconcedente, também firmar o entendimento

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de que a ausência de previsão de arbitragemno edital de licitação ou no contrato de con-cessão consequente não invalida com-promisso arbitral posteriormente firmadoentre a concessionária e o poder con-

cedente.[74]

Pinçando-se um exemplo do setorde telecomunicações que evidencia a aderên-cia entre a normatização setorial e a possibil-idade jurídica de arbitragem entre conces-sionária e órgão regulador, a ResoluçãoANATEL nº 341/2003, que aprova modelosde contrato de concessão do Serviço Tele-fônico Fixo Comutado, criou capítulospróprios à arbitragem, detalhando os limitesmateriais e formais de sua aplicação. Nomodelo de contrato de concessão do STFC namodalidade local, a Cláusula 16.2, IV, dispõesobre o direito da concessionária de solicitara instauração de procedimento de arbit-ragem em hipóteses do Capítulo XXXIII do

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contrato. A Cláusula 16.12, parágrafo único,por sua vez, possibilita lançar-se mão de pe-dido de arbitragem para cumprimento de de-ver de interconexão da rede da conces-sionária por parte de serviço de interessecoletivo. Finalmente, o Capítulo XXXIII docontrato detalha o requisito de que tenhahavido prévia decisão em processo adminis-trativo próprio com a qual a concessionáriaquedou inconformada. O mesmo capítuloimpõe a instalação de Tribunal Arbitral, ex-ceto se comprovado não se tratar de matériaautorizada para esse fim, ou seja (Cláusula33.1): violação do direito da concessionáriaà proteção de sua situação econômica; re-visão das tarifas; ou indenizações devidasquando da extinção do contrato de con-cessão, inclusive quanto aos bens revertidos.Ainda, o Capítulo XXXIII, em sua Cláusula33.3, define a composição do Tribunal Arbit-ral com dois membros efetivos e suplentesindicados pelo Conselho Diretor da

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ANATEL, desde que não pertencentes aosquadros da Agência, dois membros efetivos esuplentes indicados pela concessionáriadentre pessoas não empregadas por ela e ummembro efetivo e suplente indicado pelospróprios membros acima. Finalmente, aCláusula XXXIII, em diversos momentos,refere-se, expressamente, à aplicação da Lei9.307/96, a Lei da Arbitragem.

Com isso, mesmo no campo tradi-cional da decisão administrativa, parcela dasquestões antes exclusivamente tratadas emprocesso administrativo de resolução de dis-putas, têm colhido a contribuição dospróprios interessados na composição do lití-gio ou concordância na sua heterocom-posição via arbitragem.

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ORDENAMENTOJURÍDICO DINÂMICO

4.1 VELOCIDADE DA INOVAÇÃOTECNOLÓGICA, LINGUAGEMSETORIAL E ESPECIALIZAÇÃOREGULATÓRIA

O componente inovador de trans-formação constante do sentido das dis-posições normativas para atualização do sis-tema jurídico à realidade existencial foisobremaneira incrementado nas últimasdécadas em razão do fator velocidade. Atransformação, antes tida como antípoda doregramento, passou a compor sua essência.Há cada vez menos espaço para a cogitaçãode regramentos estanques, quando se tratade normatizar setores complexos de ativid-ades ou subsistemas jurídicos, cuja

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característica central é a constante atualiza-ção dos fatores influentes sobre os rumos dosetor, dentre eles, o tecnológico.

A velocidade de transformaçãotecnológica é um dos fatores de desestabiliz-ação do sistema normativo. Não se querdizer, com isso, que se exija do regramentorespostas às necessidades dos atores setori-ais – governo, empresas, usuários/consum-idores – para facilitar-lhes a consecução deseus objetivos. O ordenamento jurídico, pelocontrário, traduz em preceitos a políticapública setorial segundo filtros normativosde nível constitucional e infraconstitucional,

direcionando[75]

, portanto, a realidade.

Dada a especificidade de cada set-or regulado, a eficácia da influência preten-dida pelos preceitos normativos é direta-mente proporcional a sua sintonia com a lin-guagem falada no setor, ou seja, com a con-formação e dinâmica setorial. A indução de

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comportamento na direção do interessepúblico em um complexo setor de atividadesdepende de visão abrangente sobre o pas-sado do setor e sobre a sua forma específicade ser, algo somente possível de se exercitarpor estruturas especializadas e estruturadaspara a função de acompanhamento paripassu das alterações conjunturais.

A política pública setorial de-pende, portanto, do conhecimento set-orial para produzir regramentos viá-veis. Ela depende de acompanhamento dodesenvolvimento tecnológico para orientareventuais desígnios utilitaristas de mercado(ou dos atores do mercado) na direção do in-teresse público.

4.2 GLOBALIZAÇÃO,CONHECIMENTO E POLÍTICAPÚBLICA SETORIAL

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Não é somente o desenvolvimentotecnológico que impõe valorização da per-spectiva dinâmica do ordenamento jurídico.O termo globalização, por intermédio de seus

inúmeros significados[76]

, exige a adaptaçãodo ordenamento jurídico mediante uniform-ização internacional, cujo efeito intensific-ador da superação das fronteiras nacionais

gera a cogitação de um direito global[77]

.

Em poucas palavras, a globaliza-

ção é um processo[78]

, que se apresenta comsignificados complementares nos ramos doconhecimento científico. Comumente,aponta-se a liberdade de mercado inter-nacional como a síntese econômica da glob-alização orientada por discursos de dei-

ficação das economias modernas.[79]

Aliás,a terminologia adotada para designar o pro-cesso de aproximação mundial denota a

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posição central do aspecto econômico de

abertura comercial.[80]

Para suainstrumentalização, idealizou-se a uniform-ização normativa, a estandardização socialem padrões culturais e a padronização téc-nica, reflexo tecnológico do movimento deglobalização. Neste último item, evidencia-semelhor a importância da linguagem setorial.Ao lado dessas características, costumam-seenumerar também outros fatores como acrescente influência das multinacionais, datecnologia da informação, do consumismo,da integração regional, da internacionaliza-ção dos direitos humanos, das redes temát-

icas de pessoas[81]

. A rede de influência so-cial sobre a política pública ampliou-se emcomplexidade e extensão, gerando novasexigências de estruturação do Estado e da so-ciedade. Com a aproximação dos interessesinternacionais das fronteiras estatais, o forode discussão da legislação setorial foi, em

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parte, deslocado para organismos inter-nacionais e acordos bilaterais. Os paísesperiféricos deixaram de deter as rédeas deopção política e passaram a ter de negociarsuas legislações nacionais, gerando o fenô-

meno do realinhamento constitucional[82]

.

A partir de então, o conhecimentodetém peso decisivo na determinação dapolítica pública setorial, pois dele depende oconvencimento dos demais partícipes dacomunidade internacional quanto à ne-cessidade ou irrelevância de cada opçãopolítica interna. Somente o conheci-mento setorial habilita os países afazerem frente à crítica de mera re-cepção dos padrões internacion-

ais[83]

. Isso ocorre porque a globalizaçãocarrega consigo a uniformização jurídica. Aspolíticas públicas nacionais não mais podemdestacar-se das ponderações internacionais.Ampliado o rol de partícipes na formulação

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da política pública, também foi potencializ-ada a inovação. No plano privado, a referên-

cia à tecnoestrutura de Galbraith[84]

es-clarece o movimento de transformação domercado, que deixa de ser o mecanismo dealocação eficiente de recursos viabilizado

pelo Estado[85]

, e passa a ser dirigido pelainteligência organizada da empresa e, port-anto, pelo investimento na criação de ne-cessidades por via de estratégias demarketing.

Disso tudo resulta a constataçãode valorização do momento dinâmicopresente na implementação das políticaspúblicas. Não é mais suficiente tratar arealidade com previsões abstratas pet-rificadas em instrumentos normativosperenes, que teoricamente absorveri-am a maior parte da carga de litigi-osidade. Hoje, é necessário que o Estadotrabalhe com a realidade mediante

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estabelecimento de metas variáveis de

acordo com as situações que se põem.[86]

Apolítica pública encontra-se espelhada naevolução de cada setor de atividades relev-antes, constituindo um dos elementos ne-cessários para qualificação de tais atividadesem direção à produção de bem-estar.

Tais considerações situam-se noâmbito do chamado governo por políticas(government by policies) como qualificativorepresentativo do século XX. Como con-sequência, a intervenção estatal nos setoresrelevantes de atividades é um pressupostopara se relacionar a evolução setorial com oadensamento dos direitos fundamentais emsua dimensão concreta. Por tudo isso o con-hecimento é tão relevante: conhecimentosetorial para ponderação das fronteir-as de regulação no gerenciamentonormativo da realidade voltado à

otimização da eficiência[87]

dos

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setores representativos da economianacional dentro de patamares éticosde desenvolvimento. A introdução deentes de direito público tematicamente espe-cializados – as agências reguladoras –, prin-cipalmente a partir da segunda metade dadécada de 1990, no Brasil, responde, emparte, à referida demanda por um conheci-mento setorial capaz de produzir regulaçãoem ambientes complexos e em constatetransformação.

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MODERNIZAÇÃO DODIREITO

ADMINISTRATIVO

5.1 REGIMES JURÍDICOS DEPRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

Alterada a perspectiva no trata-mento da política pública setorial, velhostemas de direito administrativo, que pas-saram despercebidos enquanto o estudojurídico não se via ameaçado por novas de-

mandas de otimização e de dinamização[88]

,exigiram maior aprofundamento.

O fenômeno da publicatio[89]

,predominante na história administrativabrasileira dos três primeiros quartéis doséculo XX e de nítida tradição francesa,

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evidenciou tratamentos jurídicos estanquesentre o serviço considerado público e oprivado. Esgotadas as forças de divisão pre-cisa entre papel estatal e liberdade individu-al, o serviço reservado ao Estado deixou decarregar o caráter de exclusividade aomesmo tempo que a atividade privada pas-sou a comportar interferências públicas, am-bos cedendo espaço para a apropriação deum conceito anglo-saxão mais abrangente: o

de atividade regulamentada.[90]

No campo do tratamento jurídicodos direitos fundamentais, a passagem doEstado Liberal para o Estado Social produziuclaras transformações de pontos de vista,que obrigaram o mundo jurídico a contem-plar a face objetiva de concretização dosdireitos ao lado da face subjetiva de sua puratitularidade. Enquanto isso, no que diz re-speito à postura estatal frente aos setores daeconomia, o efeito do mesmo período

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histórico foi exatamente o inverso, na me-dida em que ocorreu o fortalecimento do mo-vimento liberal de separação entre o públicoe privado, agora sob o enfoque da prestaçãoestatal de serviços. O diferencial do EstadoSocial nesse particular não foi, portanto, o dese alterar a percepção jurídica de seg-mentação entre prestações públicas e priva-das, mas o de ampliar, consideravelmente, orol de atividades reservadas ao Estado, comoocorreu com as inversões estatais dossetores de energia e telecomunicações demeados do século XX no Brasil como formade arrogar a si as necessidades da coletivid-ade para promoção de bem-estar.

O fenômeno de prestação de ser-viços e sua normatização não foi enfraque-cido pelo pensamento social como ocorreucom a visão individualista dos direitos fun-damentais. Nestes, a evolução concreta dastensões sociais da segunda metade do séculoXIX exigiu participação ativa estatal para

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reequilibrar as situações jurídicas indi-viduais, facultando a todos usufruírem dasprevisões abstratas de direitos mediantefornecimento, pelo Estado, das condiçõesconcretas de acesso aos direitos de liberdade.Os direitos à vida, à propriedade, à liberdadee à igualdade formal, dentre outros, forammelhor concretizados com o incremento dedireitos a prestações positivas estatais, taiscomo a previdência social, a tutela do hipos-suficiente no direito do trabalho, a atividadede fomento a juros baixos para aquisição dacasa própria, o acesso gratuito ao Judiciário,dentre outros. Para consecução desses objet-ivos, embasado na tradição francesa de se-gregação dos serviços, o Estado assumiusetores de atividades econômicas, buscandocompensar o déficit de acesso da população aserviços básicos ou mesmo viabilizar apadronização de atividades produzidas emlarga escala.

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A tradição liberal de separaçãoentre Estado e sociedade deu origem à se-gregação entre serviços públicos e privadoscomo compartimentos estanques do sistemanormativo brasileiro. Não se quer dizer, comisso, que a distinção entre serviços públicos eprivados esteja em decadência, pois o que ca-racteriza o direito brasileiro é exatamente asubmissão da Administração a um direito es-

pecial destacado do direito comum[91]

, masa compreensão de que a característicapública ou privada não está eternamente am-arrada a um determinado serviço, que podeperder sua essencialidade com o tempo oumesmo ganhá-la. Além disso, a compreensãode que um mesmo rol de serviços podeconter âmbitos de prestação em regimepúblico, convivendo com formas deprestação em regime privado revela a com-plexidade da dinâmica regulatória. Um fenô-meno muito próximo se fez presente nahistória jurídico-constitucional brasileira

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desde a Constituição Federal de 1934[92]

,em que os chamados doutrinariamente deserviços sociais submeteram-se, e se sub-metem até hoje, a regimes jurídicos públicoou privado conforme a pessoa que os presta.

Enquanto os serviços forem defin-idos, a priori e ad eternum, como públicosou privados, a realidade de aplicação dodireito continuará destoando muito da pre-visão normativa. Para fugir da decisãocasuística e não-programada, maspressionada pela realidade, o Direitobrasileiro absorveu a maleabilidadena percepção da realidade de um ser-viço, ou seja, na percepção de seucaráter concreto de essencialidade. Osserviços mudam e as necessidades da colet-ividade também. De que adianta fincar-se abandeira do serviço público em serviços quesofrem defasagem de interesse social emcurto espaço de tempo. É o direito tramando

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contra sua própria função de orientador decondutas. Um serviço hoje tido por essencial– portanto público –, como a telefonia fixa,pode perder seu status ou ombrear com out-ros serviços mais abrangentes, como pro-mete o fenômeno da convergência tecnoló-gica no âmbito das telecomunicações. O or-denamento jurídico petrificado ostentariaum serviço morto como palavra de ordempublicista e o restante dos serviços restariaabandonado a sua própria fortuna pelosimples fato de que a imprecisão terminoló-gica entre serviços públicos e privados de-corre exatamente da procura exagerada poruma definição eterna e universal do que épúblico, acorrentando-o em dispositivos ex-

clusivistas.[93]

Atente-se, por fim, para ofato de que não se está aqui defendendo a ex-tinção da distinção entre regimes público eprivado, mas a simples possibilidade de queseus objetos – serviços públicos e privados –sejam melhor ponderados e atualizados às

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transformações ínsitas à regulação setorial eque não se rendam a definições simplis-

tas[94]

, que substituem a maleabilidadejurídica pela imprecisão terminológica aptaàs negociações privadas do interesse público.

O que se apresenta hoje é maisuma etapa de reaproximação, que demandacorrespondência no ordenamento jurídicomediante modernização do direito adminis-trativo. Se por um lado, a prestação exclu-siva dos serviços públicos pelas mãos doEstado sofreu críticas de eficiência, univer-salização e modicidade de tarifas, por outrolado, a complexidade dos setores de ativid-ades e suas inter-relações levaram o Estado arepensar o benefício do sistema exclusivistae segregado entre serviços públicos e priva-dos. A partir daí, a transformação do modelodispôs-se à coexistência de regimes jurídicosno mesmo rol de serviços para congregar adinâmica, eficiência e concorrência de preços

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(não necessariamente a livre concorrência e

a livre iniciativa[95]

) com o desígnio públicode universalização e continuidade. A etapaatual da regulação foi o caminho aberto paracompatibilizar dois sistemas, cuja convivên-cia parecia inaceitável no modelo anterior deabsoluto antagonismo entre público e

privado.[96]

A partir de então, à sociedade,por suas instituições, foram abertos espaçosde atuação no desenvolvimento setorial,principalmente por meio das figuras daaudiência pública e da consulta pública.Presente, diretamente, na prestação dos ser-viços, o Estado não pôde, isolado da so-ciedade, responder às demandas de rápidaevolução social. A modernização dodireito administrativo desloca oEstado para o intervencionismo in-direto, resultando na entrega de maiorpoder normativo as instituições regu-ladoras coerentemente com o novo

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modelo de prestação de serviçospúblicos.

5.2 REGIMES JURÍDICOS DEPRESTAÇÃO DE SERVIÇOSREGULADOS: DIVISÃOCONSTITUCIONAL DETITULARIDADE

As mudanças introduzidas no or-denamento jurídico brasileiro rumo à mod-ernização do direito administrativo, en-tretanto, precisam ser justificadas em meioàs críticas de carência de sintonia entre asmudanças idealizadas e as assimiladas pelodireito, que remontam à discussão de fundosobre a natureza e o regime jurídico deprestação de um serviço regulado.

As emendas constitucionais setor-iais de 1995 enfatizaram a imperfeição datradicional classificação de direito

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administrativo, que gravava um rol de ativid-ades, em seu conjunto, pelo caráter públicoou privado. A pergunta aprofundada após asemendas setoriais encontra-se na cogitaçãodo regime jurídico aplicável aos serviços reg-ulados. Estariam eles, agora, submetidos, aoregime público ou ao privado? Tais serviçosregulados, enfim, estariam submetidos, in-tegralmente ao regime público ou a um du-plo regime, público e privado?

Para compreensão destas ind-agações, dois conceitos devem ser esclare-cidos: regime jurídico; e titularidade con-stitucional das atividades econômicas emsentido amplo.

Regime é o sistema de uma dis-ciplina jurídica. Assim, é o conjunto de re-gras jurídicas integradas para consecução deuma finalidade comum. Quando esta finalid-ade é de interesse público em meio a uma re-

lação vertical[97]

caracterizada pela

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manifestação de poder extroverso estatal,chama-se dito sistema de regime público.Poder extroverso, por sua vez, é a possibilid-ade de imposição de deveres ao outro sujeitoda relação jurídica sem sua concordância.Decorre do poder público, da prevalência dointeresse público e da possibilidade do usoda força física e sua exclusividade peloEstado. Trata-se da manifestação do poderpolítico assim entendido quando um centrode imputação normativa interfere unilateral-mente na esfera jurídica de outrem. Poderextroverso é, portanto, a possibilidade deobrigar unilateralmente a terceiros. Opõe-se,portanto, ao chamado poder interno, que é opoder próprio das relações privadas consub-stanciado na possibilidade do sujeito dedireitos constranger sua própria esferajurídica.

Um dos elementos fundamentaispara determinação do regime a ser aplicadoa uma relação jurídica qualquer é a natureza

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da atividade em jogo. Se a atividade for con-siderada exclusiva do Estado, ou mesmoprivativa do Estado, o regime jurídico ap-licável será o público, em maior ou menorextensão conforme o caso. Se a atividade forconsiderada um serviço social, o regimevariará conforme a pessoa prestadora. Final-mente, se a atividade estiver caracterizadacomo atividade econômica, o regime a elaaplicável será, em regra, o privado, à exceçãode atividade monopolista.

Embora a distinção acima ap-resentada seja relativamente clara, a defin-ição da natureza das atividades não o é. O ín-dice mais seguro para se estabelecer a dis-tinção provém do texto constitucional, em-bora ele não seja uma fonte autoexplicativa edidática. É dele, portanto, que se extrai a tit-ularidade das atividades em geral.

Há atividades que são atribuídasao Estado de forma exclusiva, tais como asatividades de trato soberano, como

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jurisdição, normatização, poder de polícia,tributação e orçamento. São de titularidadedo Estado e são impassíveis de transferênciaaos particulares.

Próximas às atividades exclusivasencontram-se as atividades privativas doEstado. Elas são de titularidade estatal, masa própria constituição permite a transferên-cia de sua prestação ao particular. Como aprestação de ditas atividades somente podeser transferida aos particulares por intermé-dio de contratos administrativos de con-cessão ou de permissão (art.175 da Constitu-ição Federal de 1988), o Estado continua re-sponsável subsidiariamente por suaprestação.

Dentre as atividades privativas,encontra-se a parcela de serviços reguladosessenciais à sociedade em seu conjunto e queabrangem, a depender do autor, todos ouparcela dos serviços de telecomunicações,

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energia elétrica, mineração, transportes,dentre outros.

Há uma categoria especial de ser-viços, que são de titularidade integralmentetanto do Estado como dos particulares, comoos serviços de saúde e de educação. Quandoprestados pelo Estado diretamente, ou porintermédio de terceiros, submetem-se a re-gime público. Se, entretanto, forem presta-dos por conta e risco dos particulares,submetem-se a regime privado.

Finalmente, o campo das ativid-ades econômicas é residual. Enquadram-senessa categoria todas as atividades não ex-pressamente definidas como atividades ex-clusivas, privativas ou sociais pela Constitu-ição Federal de 1988.

O conceito de serviço públicosurge assim como um elemento aglutinadordas atividades de titularidade do Estado, e

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por consequência, tidas como essenciais àsociedade.

Tradicionalmente, os serviços reg-ulados, no Brasil, foram considerados ser-viços públicos e, portanto, submetidos, viade regra, a regime especial administrativo(regime público). Com a modificação imple-mentada pelas emendas setoriais de 1995, otratamento dos serviços exprimiu uma cisãodos setores em atividades submetidas a re-gime público e atividades submetidas a re-gime privado, mediante a expurgação dotermo serviço público do texto correspond-ente a cada setor e a introdução de com-petência da União para autorização de ser-viços regulados. Ao lado, portanto, dos con-tratos administrativos de concessão e de per-missão de serviços públicos regulados, sur-giu a possibilidade de mera liberação de am-arras administrativas ao exercício de ativid-ades econômicas reguladas. É sobre essanovidade constitucional que se apoia o

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modelo brasileiro atual de regulação deatividades essenciais.

Em resposta à questão formuladamais acima sobre que regime jurídico dever-ia ser aplicado aos setores regulados, a prát-ica das instituições reguladoras tomou afrente dos administrativistas brasileiros pararevelar o que já se praticava em diversossetores muito antes de ditas emendas con-stitucionais: a atribuição de regimejurídico público ou privado, não a umsetor em seu conjunto, mas a segmen-tos de atuação concreta intestinos aum setor essencial de atividades. O ser-viço universal obrigatório passou a se dirigira um subconjunto de atividades de um setor

regulado[98]

: à cobertura de determinadaslinhas regulares, no setor de transportes; aoserviço postal de cartas, nos correios; aoatendimento médico patrocinado peloEstado, no setor de saúde; aos serviços

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básicos de telefonia, a um serviço universalde TV por assinatura, e à eventual extensão àbanda larga, nas telecomunicações; aogerador em regime de serviço público, nosetor elétrico.

5.2 AUTORIZAÇÃO DE SERVIÇOS

A discussão existente na doutrinabrasileira sobre o conceito de autorização deserviços na Constituição Federal de 1988 de-corre de acusada incongruência constitu-cional no emprego do termo. Enquanto o art.175 trata da prestação dos serviços públicospor concessão ou permissão, os arts. 21, XI eXII e 223 prevêem serviços inscritos na com-petência da União, mas passíveis deprestação indireta mediante concessão, per-missão ou autorização.

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As hipóteses interpretativas po-dem ser resumidas em duas: (i) a autoriza-ção prevista nas emendas setoriais de 1995nada mais seria do que uma terceira formade delegação da prestação de serviços públi-cos e, portanto, o art. 175 teria estabelecidorequisitos específicos para prestação de ser-viços públicos em regimes de concessão e depermissão, remetendo, implicitamente, otratamento dos serviços públicos prestadospor meio de autorização às regras gerais doregime público; (ii) a autorização previstanas emendas setoriais de 1995, por outrolado, indicaria o reconhecimento constitu-cional de que subconjuntos dos serviços reg-ulados são, na verdade, atividades econôm-icas em sentido estrito, dependentes documprimento de normas administrativaspara seu exercício por particulares, res-ultando na compreensão da coexistênciaentre serviços públicos (concessão e permis-são) e atividades econômicas stricto sensu

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(autorização) no mesmo rol de serviços regu-

lados[99]

.

A par dessas considerações, háainda a crítica à aplicação prática do insti-tuto da autorização, que, embora qualificadopela doutrina tradicional como ato unilater-al, discricionário e precário, apresenta, porexemplo, na Lei Geral de Telecomunicaçõesbrasileira (Lei nº 9.472/97), característica devinculação, que seria própria da li-

cença.[100]

Não se deve esquecer, todavia,que a base argumentativa contra o uso do in-stituto da autorização para atividades econ-ômicas stricto sensu assenta-se na defesa dadiscricionariedade como elemento essencialde sua definição e na insistência de queaquele instituto teria significado unívoco. Ouseja, o fundamento teórico que vem sendoutilizado por parcela da doutrina

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administrativista brasileira para justificar aexclusividade de serviços públicos no rol deatividades reguladas decorre de uma posiçãointransigente sobre o conceito jurídico deautorização. Essa intransigência não temsido confirmada, em quase duas décadas devigência do atual modelo regulatóriobrasileiro, pelas agências reguladoras, pelalegislação setorial ou mesmo pelo Poder

Judiciário.[101]

A Constituição não esgota osentido, nem limita de forma apriorística eprecisa, a autorização. Ela dificilmente daráa solução didática e unívoca para satisfaçãodo intérprete. Ela muito menos se arvora nacondição de carrasco da evolução do direito.Isso não quer dizer que a norma infracon-stitucional esteja livre para criar, mas não sepode utilizar da Constituição para em-basamento de argumentos totalizantes, queretirem da discussão jurídica o ensaio desoluções melhoradas e desviem a atençãodos aplicadores do direito.

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A autorização, portanto, tem sidoaceita, na prática brasileira, embora ques-tionada em teoria, como instrumento de re-conhecimento administrativo documprimento dos requisitos impostos aosadministrados para exercício de atividades jápreviamente inscritas em sua esfera jurídicaprivada.

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Parte II

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FUNDAMENTOSDEDIREITO

REGULATÓRIO

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DIREITO REGULATÓRIOE ESTADO REGULADOR

O posicionamento jurisprudenciale doutrinário que vem se cristalizando no or-denamento jurídico brasileiro acerca denovas formas de tratamento jurídico-admin-istrativo de setores de atividades relevantestransparece especialização suficiente para acogitação de um ramo de estudos direcion-ado às especificidades da regulação, à semel-hança do ocorrido, em outros tempos, com odireito do trabalho, o direito financeiro, odireito tributário, o direito do consumidor, odireito ambiental.

Em busca de elementos comunsque viabilizem uma visão mais ampla e con-strutiva do fenômeno setorial, o direito daregulação, ou direito regulatório, encontra-senesse estágio já vivenciado por outras

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disciplinas e caracterizado pela sedi-mentação de índices distintivos de seuestudo, cujo ponto de partida é o de formu-lação de princípios intersetoriais comunsaptos a retratarem um ramo de conheci-mento útil à compreensão e solução de

questões alinhadas à regulação.[102]

Algumas considerações já podem

ser encontradas sobre o tema.[103]

Enumera-se, como princípio intersetorial domodelo brasileiro atual de regulação a desin-

tegração vertical[104]

entre infraestruturasde uso comum e serviços singularizados, vi-abilizando a chamada transparência inform-ativa, veículo necessário ao controle das sub-venções cruzadas. A este, pode-se acres-centar a conexão de infraestruturas, comodeterminação normativa de manutenção ouedificação de uma infraestrutura essencialpara um determinado setor de atividades, e a

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compatibilização de regimes jurídicos, emque, a partir da tradicional distinção entre osserviços públicos (ou serviços submetidos aoregime público) – essenciais, universais,contínuos e subsidiados por fundos – e osserviços privados (ou serviços submetidos aoregime privado) sujeitos a efetivos diss-

abores de riscos de mercado[105]

, inserem-se, nos arcabouços normativos setoriais, dis-posições que viabilizem a convivência de ser-viços prestados nos dois regimes jurídicos.

Revela-se mais adequado, todavia,assentar-se o direito regulatório na procurapor princípios ou instituições verdadeira-mente gerais norteadores da regulação comoum todo, ou ainda, distintivos da regulaçãoenquanto tal frente a conceitos próximos,como o de intervenção, de controle e depoder de polícia, e que não pactuem comideologias ocasionais de escolha do melhordirecionamento econômico da atividade,

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pois, se se quisesse detalhar o rol de princípi-os intersetoriais enunciados no parágrafoanterior, dever-se-ia começar pela própriaorientação à concorrência como requisito domodelo atual de regulação inscrito na com-patibilização de regimes jurídicos, algo quenão se afigura essencial para a cogitação daregulação.

O esforço de identificação dessesíndices de regulação setorial dos nossos tem-pos em detrimento de índices gerais é, certa-mente, meritório para o desenvolvimento dopensamento setorial, mas não pode maculara regulação com o estigma – certo ou erradosegundo cada ideologia que o analisa – dacompetição e orientação pelo mercado. Asinstituições de regulação são neutras quantoà aplicação isenta das estações de humorpolítico, embora conscientes de sua presençano jogo político e de seus reflexos no ordena-mento jurídico. Em outras palavras, dizerque a ‘convivência de regimes jurídicos em

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um mesmo rol de atividades’ ou a ‘de-sagregação vertical’ são instituições interset-oriais hoje predominantes não significa dizerque a regulação somente seja objeto deestudo do direito regulatório se qualificadapor tais índices. Esses índices – de-sagregação vertical, compatibilizaçãode regimes jurídicos, conexão de in-fraestruturas – são qualificativos es-pecíficos da regulação, mas não sãocaracterísticas inerentes a ela, pois ori-entações regulatórias distintas podem exigir,por exemplo, ordens normativas que privile-giem a duplicação de infraestruturas ao invésdo trânsito de serviços por uma infraestru-tura única, bem como a horizontalização deuma cadeia produtiva, ou mesmo a seg-mentação de serviços em determinado setorde atividades em silos isolados de regimespúblicos e privados.

No Brasil, a conformação regu-latória predominante na segunda metade da

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década de 1990 até os dias de hoje revela aopção por uma forma de regulação com cara-cterísticas específicas. Ela não resume o sig-nificado da regulação enquanto objeto deestudo de um direito regulatório que pre-tenda transcender as configuraçõespresentes no ordenamento jurídico nacional,em que sequer há a previsão de órgãos regu-ladores para todos os setores regulados. Em-bora, sob o ponto de vista estritamente con-stitucional, somente exista a previsão de es-truturas reguladoras especializadas para doissetores (serviços de telecomunicações, noart. 21, XI, e pesquisa, lavra, refinação, im-portação, exportação e transporte de pet-róleo, gás natural e outros hidrocarbonetosfluidos e seus derivados, no art. 177, §2º, III),pode-se afirmar que arcabouço normativoinfraconstitucional expandiu consideravel-mente esse modelo de regulação assentadoem órgãos reguladores para o conjunto dossetores regulados, como se verá mais a

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frente, com o detalhamento das estruturasregulatórias brasileiras. Apenas a título ex-emplificativo, no país tido como fonte domodelo regulatório das agências independ-entes, vale dizer, nos Estados Unidos daAmérica, não há previsão constitucional denenhuma autoridade administrativa inde-

pendente.[106]

O importante, assim, é ter-seem mente que a presença de tais estruturasse insere dentre as formas teóricas possíveisde regulação, quais sejam: a regulação pelomercado, em que se confia na densidade daconcorrência para corrigir distorções; a reg-ulação por órgãos reguladores, em que se cri-am superestruturas estatais técnicas paraacompanhamento setorial; a regulação endó-gena, alcançada via estatização dos presta-

dores dos serviços regulados[107]

; a regu-lação por contrato, que se satisfaz com regrascontratuais acordadas caso a caso e, port-anto, em termos jurídico-administrativos,

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resume-se às normas firmadas em contratosadministrativos (concessão e permissão). Se-gundo essa classificação, o modelo regu-latório brasileiro pré-1995 pode ser perfeita-mente compreendido como um modelomisto de regulação tradicional via contratosadministrativos e de regulação endógena viaestatização da prestação dos serviços. Assim,a opção por um modelo de regulação de-penderá das peculiaridades de cada modelo

regulatório[108]

, dentro das possibilidades

abertas pelo texto constitucional[109]

e, porisso, o conceito geral de direito da regulaçãonão se restringe ao modelo regulatóriobrasileiro vigente, muito embora suas in-stituições – desagregação vertical, conexão ecompartilhamento de infraestruturas, com-patibilização de regimes jurídicos, com-petição – sejam importantes objetos deestudo. Nenhum deles, entretanto, se

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apresenta como característica intrínseca àregulação em si mesma.

Deve-se, portanto, entender a reg-ulação por suas instituições básicas para, apartir deste núcleo de significado, expandir oconhecimento geral, regional ou setorial aprincípios comuns, como os dirigidos à regu-lação setorial vigente.

Assim, a identidade do direitoregulatório depende do enunciado do signi-ficado da regulação propriamente dita.

Em uma primeira abordagem dosignificado de regulação, é esclarecedor quese faça um exercício comparativo que, em-bora simplificador de momentos históricos,divisa o aspecto regulador de outras opçõesde atuação estatal. Como oposição à opçãohistórica de proeminência da função regu-ladora estatal, tem-se, de um lado, o papelempreendedor ou prestador de serviços doEstado, ou também chamado Estado

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provedor de bem-estar, interventor direto eexecutor. Trata-se, em outras palavras, dopapel complementar ou substitutivo doEstado ao mercado como Estado con-centrado na atuação social e empresarial,sem que isso signifique inexistência de regu-lação. Esse tipo estatal é representado pelostermos Estado do Bem-Estar Social (welfarestate), Estado Providência (État-provid-

ence)[110]

ou Estado Desenvolvimentista.Inteiramente distinto do Estado Providência,mas ainda oposto à proeminência da funçãoreguladora estatal, tem-se, de outro lado, acentralidade do mercado como mecanismode alocação eficiente de recursos por ex-celência. Em tal configuração estatal, aomercado é dado o papel de coordenador dasatividades econômicas e ao Estado, o papelde garantidor unicamente da propriedade edos contratos essenciais ao bom funciona-mento do mercado excluídas funções de in-tervenção no plano econômico e social. Fala-

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se, nesse último caso, do Estado mínimo ouabstencionista, cujas funções reguladorastambém presentes se ocupam da preservaçãoda fronteira entre a atuação estatal e asatividades econômicas.

Como diferencial dos dois mode-los ideais de Estado liberal e de Estadosocial, encontra-se o chamado Estado regu-lador, que se define pela proeminência nãoda interferência direta para promoção dodesenvolvimento econômico social, nemmesmo da não-intervenção para dinamiza-ção do mercado, mas pelo papel de coorde-nação, de gerenciamento, de controle, de in-

tervenção indireta[111]

, ou sinteticamente,de regulação estatal, entendendo-se esta úl-tima como resultado da compreensão doEstado e do mercado não mais como entesestanques ou antípodas, mas como fenô-menos interdependentes e essenciais à con-solidação dos direitos fundamentais.

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Assim, a regulação não é, em simesma, uma característica diferencial domodelo atual de Estado regulador, pois apresença de competências regulatórias no

Estado brasileiro não é recente.[112]

O difer-encial moderno inscrito no significado deEstado regulador está na proeminência deuma espécie de regulação estatal presente naconformação atual dada ao Estado. Damesma forma, o Estado regulador não seconsubstanciou em oposição somente a umEstado Social-Burocrático empregador deprestadores de serviços essenciais à so-ciedade, mas também como opositor a umEstado caracterizado pela inexistência ouaversão à interferência no âmbito econômicoe social, ou seja, à crença no mercado autor-regulado. O Estado regulador, portanto, nãoé um Estado intervencionista, nem mesmoabstencionista, no sentido que se costumaatribuir às expressões, mas um Estado que,embora não promova diretamente o

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desenvolvimento econômico e social (Estadodo Bem-Estar Social) nem opte pela entregadessa função a um terceiro mediante desreg-ulação do mercado (Estado mínimo), atuacomo “regulador e facilitador ou financiadora fundo perdido desse desenvolvi-

mento”[113]

. O Estado regulador, portanto, édefinido pelo caráter dirigente e gerencial deque se reveste a Administração Pública paraconformação das atividades essenciais se-gundo ordens de promoção dos direitos fun-damentais delas dependentes.

Fala-se, no Estado regulador,de uma Administração Pública geren-cial no lugar de uma AdministraçãoPública burocrática. Enquanto, na Ad-ministração Pública burocrática, a garantiados direitos sociais é remetida à contrataçãodireta de servidores públicos atuantes nosdiversos ramos das atividades econômicas,na Administração Pública gerencial, o

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mercado é tomado como instrumento paraconsecução dos direitos fundamentais medi-ante acompanhamento conjuntural e pon-derado de custos, infraestrutura, serviços,bens públicos, tarifas, áreas de cobertura,dentre outros componentes das opções de in-vestimento de um setor regulado. Em outraspalavras, no Estado regulador, há um acom-panhamento gerencial da concretização dosdireitos fundamentais mediante opções reg-ulatórias de encaminhamento do setor.Nesse sentido, o Estado regulador é um fenô-meno recente caracterizado por transcendera visão maniqueísta de oposição entreEstado e mercado, ou entre Estado e so-ciedade, de conflito entre forças ilusóriasque, ao final de contas, são um único sub-strato utilizado para consecução dos direitosfundamentais. O Estado regulador é umEstado reconciliado com o mercado,entendendo-o não como um ser autônomo eindependente, mas como produto de

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regulação estatal. Da mesma forma, a inser-ção do mercado na equação regulatória nãose presta à extinção da equação em prol daatuação autônoma do mercado. O mercadose justifica enquanto dirigido pela regulaçãorumo ao interesse público. O pressuposto doEstado regulador é a persistência de ambos.

O Estado regulador, portanto, éum modelo estatal assentado na atuaçãoconcertada de intervenção estatal frente aosreflexos verificados pari passu no setor regu-lado. Por isso, dizer-se que o Estado regu-lador envolve atuação administrativa con-juntural, pois dependente de acompan-hamento pari passu do desenvolvimento deum setor de atividades essenciais. Assim,tanto o mercado, quanto a intervenção es-tatal, são colocados, para o Estado regulador,como variáveis, cujo comportamento inter-fere nos rumos tomados por uma Adminis-tração Pública gerencial em prol da con-secução dos direitos fundamentais.

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No Estado regulador, há a sub-stituição da parcela de desenvolvimento eco-nômico e social antes absorvida na estruturaburocrática estatal do Estado Social por umcontrole indireto regulatório sobre os merca-dos. A posição do Estado regulador comomeio termo entre dois modelos ideais ideolo-gicamente bem definidos – Estado Liberal eEstado Social – explica o porquê do surgi-mento dessa figura de Estado regulador emconjunto com propostas de desregulação oudesregulamentação, assim entendidas comoa diminuição do papel estatal regulamenta-

dor das atividades econômicas.[114]

Ditadesregulação nunca foi, entretanto, pro-jetada como uma ode contra a regulação.Pelo contrário, o alvo da desregulaçãodirigiu-se aos excessos da regulação. Exem-plo esclarecedor dessa postura está no fatode que a atividade reguladora foi reforçadapelo inaugurador das privatizações européi-as, o Reino Unido, onde “os monopólios

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naturais privatizados exigiam agora redo-

brada regulação”[115]

.

Não é difícil, em meio a todas es-sas considerações, confundir-se Estado regu-lador com a regulação que lhe é peculiar, jáque esse tipo de Estado se preocupou em en-castelar a regulação em sua própria desig-nação. A regulação, em si mesma, não foierigida como bastião do Estado reguladorbrasileiro, mas o foi uma forma de regu-lação: a regulação por intervenção estatal in-direta de atividades essenciais e presumivel-

mente competitivas.[116]

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REGULAÇÃO: OBJETO DEESTUDO DO DIREITO

REGULATÓRIO

Tendo em vista o posicionamentoteórico do Estado regulador, já se pode ante-cipar a conclusão de que o Estado reguladornão é o objeto de estudo do direito regu-latório, mesmo porque, se assim o fosse, adisciplina jurídica dependeria de umfenômeno político-jurídico situado e datadono tempo e, portanto, fadado a ser superado.O ramo de estudo de direito preocupado coma regulação certamente não se presta aoestudo de um momento histórico somente,mas de um fenômeno jurídico que teve umade suas manifestações – a intervenção estatalindireta sobre a atividade econômica em sen-tido amplo – erigida a qualificativo

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identificador do Estado contemporâneo: aregulação propriamente dita.

O objeto de estudo do Direito reg-ulatório é, portanto, a regulação em simesma, que detém diversas dimensões. É,portanto, relevante, para o entendimento doobjeto do direito regulatório, o estudo das es-pécies de regulação. Por esse meio, restarámais claro o fato da regulação, enquantofenômeno abrangente, transitar entre tiposdistintos de intervenção, resguardando-se aconcepção mais ampla de regulação comoacompanhamento do destino de atividadesessenciais à sociedade.

2.1 FORMAS DE REGULAÇÃO

O grau de centralização regu-latória de serviços transparece a maior oumenor confiança do Estado no alcance do

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interesse público, mediante outorga de sua

prestação à iniciativa privada.[117]

Há doisconceitos que evidenciam como a regulaçãodos serviços públicos opera ao longo dahistória: controle pela descentralização

e controle pela centralização.[118]

Con-trole pela descentralização implica a aceit-ação, pelo Estado, de que suas finalidadespossam ser plenamente alcançadas pela açãodos particulares. Fala-se, então, em “regu-

lação desconcentrada”[119]

como sinônimode desregulamentação, esta comumenteutilizada em diversos significados. Por outrolado, o controle pela centralização denotafalta de confiança na iniciativa privada parao alcance espontâneo dos fins patrocinadospelo Estado independentemente de suaintromissão. Fala-se então em “regulação

concentrada”[120]

, ou impropriamente, emregulamentação.

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A par dos conceitos de centraliza-ção regulatória ou descentralização regu-latória, existe o esforço de distinção quantoàs formas de manifestação da regulação,apresentando-se basicamente como: regu-lação operacional; e regulaçãonormativa.

Regulação operacional ou diz re-speito a afetar atividades à iniciativa privadaou ao Estado. É a referência ao plano físico-estrutural da regulação dos serviços.Pergunta-se: quem irá exercê-los?Responde-se pela opção quanto à regulaçãooperacional dos serviços. Regulação opera-cional, portanto, é a intensidade com que oEstado avoca a si e a suas entidades atarefa de desempenhar certas ativid-

ades.[121]

Por outro lado, a regulação norm-ativa diz respeito à ampliação ou à restrição

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das atividades alcançadas por regramento

estatal direto.[122]

Tal distinção entre regulação op-eracional e regulação normativa permite an-alisar com maior precisão a forma de con-centração regulatória dos serviços públicos edas atividades econômicas. A concentraçãoregulatória pode ocorrer somente no âmbitooperacional ou somente no âmbito normat-

ivo. A tendência[123]

mais recente é a deregulação descentralizada operacionalmentee de normatividade complexa, ou seja, deregulação normativa centralizada, mas re-metida a autoridades administrativas.

2.2 EFEITOS DAS OPÇÕESREGULATÓRIAS

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Em síntese, de um lado tem-se apergunta sobre quem prestará o serviço e en-tão se trata de falar em regulação operacion-al centralizada – intervencionismo

direto[124]

– ou descentralizada. Por outrolado, questiona-se se há regramento es-pecífico da atividade, remetendo-se agoraaos conceitos de regulação normativa cent-ralizada – intervencionismo indireto – oudescentralizada.

A regulação normativa centraliz-ada permite que sejam identificadas, noEstado, atividades de fomento, regula-mentação, monitoramento, mediação, fisc-alização, planejamento e ordenação da eco-

nomia[125]

sem que ele assuma a prestaçãodireta dos serviços. Assim, a opção pela regu-lação operacional descentralizada não esgotaas opções estatais regulatórias. O fato doEstado não mais intervir sob o pontode vista operacional – de não mais

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prestar diretamente uma utilidade àpopulação – não significa que ele es-teja intervindo menos. Tanto é assim,que o que caracteriza o conceito de agênciareguladora, analisado mais a frente, é a es-trutura normativa de maior intervencion-ismo estatal, pois a política de baixo inter-vencionismo estatal é abraçada pela formatradicional de regramento jurídico geral, ab-strato e totalizante, que transfere ao Judi-ciário a solução das peculiaridades geradaspela dinâmica social; é a crença de que a mãoinvisível do mercado solucionará percentualelevado de transgressões normativas e que oPoder Judiciário lidará com o ilícito reman-

escente[126]

. Na regulação operacional des-centralizada, para a qual o Brasil tem se in-clinado, o Estado continua detendo umamargem de manobra normativa, que não seresume a simples opção entre exarar ou nãoregramento sobre o serviço. Ao optar pelaregulação normativa centralizada, o Estado,

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agora, enfrenta outra questão, tão antigaquanto o conceito de interesse público: a dese definir a forma de controle da prestaçãodos serviços pelos particulares; a de se saberpara onde estará orientada a política estatalde regulação dos serviços descentralizados;enfim, a de se escolher a corrente depensamento que orientará a regulação.

Duas correntes clássicas depensamento se opõem, sabendo-se que a di-visão é didática e imprecisa, comportandodiversas subdivisões: uma delas voltada acolocar em primeiro plano a remuneração docapital empregado no serviço para atração deinvestimentos estrangeiros; a outra, voltadaa valorizar os conceitos de interesse público,de adequação do serviço e do bem-estar doconsumidor, condicionando o retorno do in-vestimento aos níveis de satisfação e à con-

tinuidade do serviço.[127]

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2.3 FUNÇÃO NORMATIVACONJUNTURAL DO EXECUTIVO

A função regulamentar representaa parte normativa da regulação que cabe aoExecutivo, sem, todavia, esgotá-la, pois ela éuma normatividade condicionada à legalid-ade da medida e, portanto, submissa àsdiretivas de políticas públicas de regulaçãoexaradas pelo Legislativo. A prescrição decomportamentos para orientação de con-dutas por intermédio de previsões de situ-ações de fato, ao lado das determinações dediretrizes e metas de desempenho, repres-entam uma margem de manobra normativaem um modelo que exige a coexistência deregimes distintos no mesmo rol de ativid-ades, gerando, com isso uma normatividadecomplexa.

Exatamente no que diz respeito àcitada margem de manobra normativa é

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que dito modelo de normatividade complexaencontra críticas. Elas estão centradas naalegação de que o Executivo estaria in-vadindo prerrogativas legislativas ao se util-izar da regulamentação de setores para im-plementação de políticas públicas. O fenô-meno se avolumou com a descentralizaçãooperacional dos serviços públicos, desviandoo foco de preocupação do Estado Social, queera definido pela intervenção direta, para oincremento da produção normativa. OEstado deixou de prestar ele mesmo oserviço, passando-o às mãos dos particu-lares, mas, para tanto, ultimou um projetonormativo mais elaborado voltado às espe-cificidades de cada setor econômico. Esteprojeto evidencia mais nitidamente o papeldo Poder Legislativo como formulador depolíticas públicas gerais e de estruturaçãodos setores de interesse público, enquanto oPoder Executivo assume, com clareza, a fun-ção normativa conjuntural destinada a

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acompanhar o setor no seu dinamismo, masdentro da legalidade.

A substituição que o Estado Socialdeterminou na política pública liberal dogovernment by law pela política pública so-cial do government by policies perpetuou-secomo exigência de acompanhamento da real-idade por produção normativa voltada àpolítica de orientação da conjuntura econ-ômica não mais sob a forma de intervençãodireta, mas mediante regulação normativacentralizada em entes estatais autônomos. Aquestão que surge, neste ponto, está emsaber se, de fato, o ocorrido evidenciaria mi-gração de funções do Poder Legislativo parao Poder Executivo, por intermédio das agên-cias criadas para o fim de produção norm-ativa complementar ou se refletiria umaclaramento da sempre existente especializ-

ação funcional dos poderes.[128]

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2.3.1 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO EO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES

A hipótese de que teria havidotransferência de poderes normativos do Le-gislativo para o Executivo, ferindo, assim, acláusula pétrea constitucional brasileira daseparação de poderes despreza a evolução deseu sentido histórico sintetizada em Mont-

esquieu[129]

e fundamentada nas aborda-

gens dadas por Aristóteles[130]

, Boling-

broke[131]

e Locke[132]

.

Dentre as atividades entregues aoExecutivo por Montesquieu, estão as ações

momentâneas ou instantâneas[133]

, quesão, portanto, conjunturais, dinâmicas, in-stáveis. A capacidade normativa de conjun-

tura de que fala Eros Roberto Grau[134]

estáinserida no contexto de produção normativapor órgãos e entes da Administração para o

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fim de acompanhamento setorial, exercendo,com isso, função própria – não delegada –,pois inerente à condição dinâmica e flexíveldo Poder Executivo. Assim, o Executivo ex-erce função normativa, que difere dafunção legislativa. Esta última é definidaa partir de critério subjetivo – orgânico ouinstitucional –, em que vale mais para suadefinição o conjunto dos atores do Poder Le-

gislativo que propriamente sua função[135]

.Já a função normativa é divisada não apartir dos Poderes estatais – Legislativo, Ex-ecutivo, Judiciário –, mas das matérias nelesinseridas sem caráter de exclusividade.Tanto é assim, que a Constituição Federal de1988 enuncia, em diversos dispositivos, osatos normativos dos três poderes (CF/88:art. 49, V; art. 97, caput; art. 102, I, a; art.

102, §2o; art. 103, §3o; art. 125, §2o; art. 169,

§4o). Não se olvida o fato de que as ações ab-stratas de análise da constitucionalidade de

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atos normativos não podem ser suscitadascontra regulamentos em geral do Poder Ex-

ecutivo[136]

, mas a razão deste posiciona-mento do STF está na questão estrutural emjogo: o juízo destas ações é de constitucional-idade, enquanto a análise dos regulamentosé de legalidade. Dessa forma, o termo atonormativo dos artigos correspondentes aocontrole abstrato de constitucionalidade in-scritos na Constituição Federal de 1988 nãoexclui os regulamentos por não serem pre-scrições normativas, mas em razão do re-quisito do juízo de constitucionalidade da

medida.[137]

Além disso, se há atos normat-ivos com força de lei para os fins de questio-namento de constitucionalidade e de com-

petência do STF[138]

, é porque há ato norm-ativo sem força de lei no sistema jurídicobrasileiro. Não há, portanto, delegação depoderes, em sentido próprio, mas utilização

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de função normativa originariamente at-ribuída ao Executivo. Isso não significa queele possa exercê-la quando quiser e inde-pendentemente de prévia atuação legislativa.O sistema constitucional brasileiro, em razãodas vinculações estruturais da separação depoderes, impõe que o espaço normativo doExecutivo esteja previamente aberto por dis-positivo de lei e daí a característica de fonte

secundária a seguir esmiuçada.[139]

Esseraciocínio evita a perplexidade comumenteverificada na análise da jurisprudêncianorte-americana ao constatar que o princípiobásico de proibição de delegação funcionalentre os poderes (non-delegation) somente é

aplicado em casos extremos.[140]

São ex-tremos porque excepcionais, já que os de-mais casos tidos como de aplicação tímida doprincípio, na verdade são de utilização decompetência própria do Executivo.

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A função normativa está as-sentada na primariedade do enunciadonormativo: ela se impõe por força própria,podendo existir em decorrência do exercíciode poder originário – Legislativo (em sen-tido subjetivo) – ou em decorrência de poderderivado – Executivo (em sentido subjet-

ivo).[141]

O conceito de função normativa,portanto, abarca a função legislativa, a fun-ção regulamentar e a função regiment-

al.[142]

Estas funções não se confundemcom a possibilidade de controle dos demaispoderes pelo Legislativo, que Montesquieu

chamou de poder regulador.[143]

O art. 25, do Ato das DisposiçõesConstitucionais Transitórias, da ConstituiçãoFederal de 1988, suscita certas consideraçõesque, aparentemente, indicariam a proibiçãoconstitucional da presença de atos

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normativos do Executivo no novo ordena-mento jurídico instaurado. Segundo odispositivo:

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ConstituiçãoFederal

brasileira de1988

Art. 25. Ficam revogados, apartir de cento e oitenta diasda promulgação da Constitu-ição, sujeito este prazo aprorrogação por lei, todos osdispositivos legais que at-ribuam ou deleguem a órgãodo Poder Executivo com-petência assinalada pelaConstituição ao CongressoNacional, especialmente noque tange a:I - ação normativa;II - alocação ou transferênciade recursos de qualquerespécie.

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Da leitura do art. 25 do ADCT,poder-se-ia extrair a conclusão de que apartir de cento e oitenta dias da promulgaçãoda Constituição, não poderia mais existir leique atribuísse competência legislativa ao Ex-ecutivo exceto em caso de sua prorrogaçãomediante decisão do próprio Legislativo,que, por ser exceção, não se poderia estenderao infinito. É exatamente isso que o disposit-ivo diz e deve ser precisamente isso o aplic-ado. O desejo do constituinte de extirpar doordenamento jurídico dispositivos legais queferissem o princípio da não-delegação depoderes está evidente no art. 25 do ADCT.Ele significa a proibição de delegação depoder legislativo por lei ao Executivo à ex-ceção, é claro, da previsão expressa constitu-cional de lei delegada, com as respectivaslimitações contidas no art. 68 da Constitu-ição Federal de 1988. Não há nada a ser re-parado no enunciado constitucional. Ele nãodiz respeito ao tema ora analisado do

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exercício de poder normativo próprio do Ex-ecutivo mediante abertura legal exigida pelaseparação de poderes vista sob o enfoque es-trutural. Não há delegação de poder normat-ivo, mas reconhecimento e autorização deseu exercício dentro da sistemática de dis-tribuição de funções normativas para o Exec-utivo. Ele – Poder Executivo – não pode ex-ercer competências normativas reservadasao Congresso Nacional nem que estas lhe se-jam entregues por lei, mas não se pode fur-tar, e portanto deve exercer suas competên-cias normativas abertas por dispositivos le-gais que definam parâmetros de atuaçãonormativa regulamentar.

2.3.2 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO EO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

No contexto da regulação, o re-speito à legalidade apresenta dois sentidos:a) submissão do órgão ou ente da Adminis-tração responsável pela emissão de

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regulamentos setoriais à correspondente leidefinidora de competências; b) respeito aosdispositivos emanados de normas legais ouregulamentares. Este último entendimentoameniza a enraizada polêmica da existênciade conflito entre a legalidade e o poder regu-lamentar, viabilizando o modelo atual de es-cala industrial de produção de regulamentospor órgãos reguladores.

Note-se que não há aqui apologiaà produção em escala de regulamentos, masjustificação do modelo de regulação in-

staurado no Brasil perante o art. 5o, II, da

Constituição Federal de 1988[144]

: “nin-guém será obrigado a fazer ou deixar de fazeralguma coisa senão em virtude de lei”. Otermo lei aqui referido não pode ser com-preendido no seu sentido mais estrito e issonão é nenhuma novidade ou argumentaçãopuramente doutrinária: é a própria práticado sistema constitucional brasileiro aplicada

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pelo Supremo Tribunal Federal. É cediço queum dos argumentos proibitivos de trata-mento de matéria penal substantiva por me-

dida provisória é o de que o art.5o, XXXIX,da Constituição Federal de 1988, ao prescre-ver que “não há crime sem lei anterior que odefina” exprimiu lei em seu sentido “exclu-

sivamente formal”[145]

. Por isso, mesmo amedida provisória – ato normativo comforça de lei – não pode tratar de disposiçõesque definam crimes e cominem penas. Se o

termo lei do art.5o, XXXIX, da ConstituiçãoFederal de 1988 é tão restrito a ponto de in-viabilizar o uso da medida provisória,mesmo antes das limitações expressas advin-das da Emenda Constitucional n. 32, de 2001(art. 62, §1º, I, b da CF/88), isso significa

que a previsão de lei do art.5o, II, da Con-stituição Federal de 1988 é, no mínimo,menos restritiva, pois não se pode sustentarque ele não se refira a disposições veiculadas

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por medidas provisórias. Se assim o é, o ar-gumento comumente utilizado contra a ex-istência de poder normativo do Executivo de

que o termo lei do art.5o, II, ou do restanteda Constituição Federal de 1988, deve ser in-terpretado restritivamente é falho, pois, aomenos há níveis de sua extensão: lei estrita-mente formal do Legislativo; lei, como in-strumento normativo com força de lei form-al; e – porque não – lei como ato normativo.

Ainda, poder-se-ia acenar com ar-gumentos periféricos, como o que se assenta

na redação do art. 5o, II, da ConstituiçãoFederal de 1988, que proíbe o constrangi-mento de direitos exceto em virtude de lei.Segundo este argumento, o texto constitu-cional não resumiria o condicionamento dedireitos a comando legal. Toda limitação de-corrente de prévia abertura legal, inclusivepor ato normativo da Administração, seria,assim, condizente com o texto constitucion-al, desde que não ultrapassasse o âmbito de

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atuação permitido por lei. Mas este argu-mento não se sustenta se não estiver clara aquestão da delegação inconstitucional defunções legislativas, ou seja, da distinçãoentre função legislativa e função norm-

ativa.[146]

Sob o ponto de vista estrutural, a

legalidade exige lei que atribua[147]

com-

petência executiva secundária[148]

, poispressupõe prévia abertura legal, e nãosimplesmente subordinada, para produçãode regulamentos setoriais. A mesma legalid-ade também justifica a vinculação dos atoressetoriais (prestadoras e usuários/consum-idores) à orientação emanada da funçãonormativa conjuntural do Executivo (em ger-al, por meio de superestruturas adminis-trativas autônomas) pela produção de dis-posições regulamentares – parte da funçãonormativa que foi distribuída entre os

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poderes estatais no diploma constitucional.A regulamentação emanada do Executivo,neste caso, não desrespeitará a hierarquianormativa, pois mesmo que seja independ-ente de atribuição explícita e pontual de fun-ção normativa, afigura-se como atribuiçãoimplícita decorrente da destinação de com-petências de certos setores ao Executivo. Alei em sentido formal – decorrente de pro-cesso legislativo – é, portanto, o único cam-inho constitucionalmente autorizado a abrirespaço à interferência do Executivo na pre-cisão dos direitos, como historicamenteocorre em questões como as de posturas

urbanas e regras de trânsito.[149]

O reconhecimento da existênciadestes regulamentos problematiza a questão,que deixa de ser analisada e discutidaquando simplesmente se nega constitucion-alidade aos inúmeros atos normativos do Ex-ecutivo, que, por serem indesejados, não são

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menos reais.[150]

Não menos real também éa constatação da presença de função admin-istrativa no Legislativo quando da imple-mentação de políticas concretas de governopor via de leis formais no auge do Estado So-cial, resultando nas chamadas leis-medida(Massnahmegesetze). A distinção existenteentre lei e regulamento, submetendo esteàquela não significa eliminar a função norm-ativa do Executivo, mas parametrizá-la se-

gundo uma hierarquia[151]

prevista no sis-tema constitucional sem olvidar a divisãomaterial dos conteúdos normativos entre ospoderes estruturais do Estado.

Superados os obstáculos à possib-ilidade de atividade normativa regulamentar– função normativa do Executivo –, enfatiza-se a compreensão de que o Poder Executivodesvia a finalidade desta atividade se sub-stitui manifestações propriamentelegislativas.

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2.3.3 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO EENTES ADMINISTRATIVOS AUTÔNOMOS

A discussão sobre a plausibilidadejurídica da regulação como ela se apresentahoje no ordenamento jurídico brasileiro nãose esgota na discussão da plausibilidadejurídica da produção normativa do exec-utivo. Há uma questão subsequente: comoaceitar a presença de entes administrativosditos independentes para o desempenhodesta função normativa natural ao Executivose a Constituição Federal de 1988 atribuiucompetência exclusiva ao Chefe do Executivopara expedir decretos e regulamentos parafiel execução da lei (art. 84, IV e parágrafoúnico) e para a direção superior da Adminis-tração Pública (art. 84, II)?

A primeira parte da questão é di-rigida aos chamados regulamentos exec-utivos, que tiveram seu significado restritodoutrinariamente à orientação de atuação da

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Administração Pública, com fundamento nopoder hierárquico do Chefe do Executivo,para instrumentalizá-la ao cumprimento dasdisposições legais. O enunciado constitu-cional de competência exclusiva do Chefe doExecutivo para expedição de decretos e regu-lamentos para fiel execução de lei não es-gota, portanto, o sentido da função norm-ativa do Executivo. Esta se apresenta in-cólume no âmbito de preenchimento norm-ativo do ordenamento jurídico que não se re-suma a ordens estruturadoras da Adminis-tração para viabilização da lei. Persiste a pos-sibilidade de utilização da função normativado Executivo para regulamentar atividadesexpressamente atribuídas por lei, em que im-plicitamente se destina função normativa aoórgão ou ente competente para fazer fun-cionar o setor mediante preenchimento reg-ulamentar submisso à legalidade, esta sim,fonte definidora da política pública setorial.O art.84, IV, da Constituição Federal de

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1988, explicita a condição infralegal, masnão despida de normatividade, do Chefe doExecutivo quando da orientação estruturalda Administração Pública a partir da hierar-quia inerente ao Poder Executivo.

Não há, portanto, proibição ao ex-ercício de função regulamentar por intermé-dio de entes administrativos com competên-cia atribuída à gestão de um conjunto deatividades, muito embora isto não signifiquealienação do Executivo frente à lei em sen-tido formal. Esse raciocínio evita a perplex-idade que se apresenta nas exposiçõesdoutrinárias brasileiras sobre o tema, que,cientes da realidade constitucional do país,vêem-se obrigadas a encerrar sua argu-mentação com o reconhecimento do fracassohistórico do esforço de efetividade das dis-posições constitucionais do art.84, IV, eparágrafo único, apontando para a “antiga,difundida e tolerada (...) prática de queórgãos autárquicos regulamentem as

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leis”[152]

. O que falta, portanto, é o apro-fundamento dogmático da questão para quefique bem definida a fronteira além da qual opoder normativo do Executivo deixa de sersecundário, transformando-se em incon-stitucional. A acusação de inconstitucionalid-ade total e apriorística de qualquer normatiz-ação de entes autárquicos do Executivo levouà ridicularização do argumento jurídicofrente à imposição prática da natureza dasrelações funcionais do Estado.

A análise do art. 84, II, da Con-stituição Federal de 1988, assenta-se em ar-gumentos semelhantes. Ao se dizer que oChefe do Executivo desempenha a direçãosuperior da Administração Pública, isso nãosignifica subserviência de consciência, nemmuito menos disponibilidade de cargos se-gundo a vontade do Presidente soberano daRepública: a maior parte da carreira admin-istrativa está fora do alcance do juízo de

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oportunidade do Chefe do Executivo, poisgarantida pela burocracia que a protege.Logo, não há nada de excepcional empermitir-se a presença de conselheiros oudiretores de entes da Administração indiretaque não estejam envergados ao gosto e des-gosto do Chefe do Executivo. Aspecto in-teiramente distinto encontra-se na consider-ação dificilmente encontrada nos críticos domodelo regulatório atual e pertinente à im-possibilidade de análise final de decisão daAdministração por ausência de recursos ad-ministrativos que cheguem ao Chefe do Ex-ecutivo, tolhendo o juízo final de oportunid-ade que lhe teria sido outorgado pelo art. 84,II, da Constituição Federal de 1988. Essa ar-gumentação poderia levar a certa perplexid-ade se já não se convivesse com modelos detribunais administrativos afastados da re-visão de suas decisões pelo Ministério a queestão vinculados, pois, de fato, o que oart.84, II, diz é que a estrutura da

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Administração Pública encontra-se sub-metida às orientações hierarquicamente su-periores do Chefe do Executivo. Contudo, odispositivo constitucional não torna amatéria normativa exclusiva do último es-calão da estrutura administrativa, remetendoesta consideração à produção legislativa, decujo processo, não se deve esquecer, o Chefedo Executivo faz parte.

Tais considerações não descon-hecem a possibilidade de superação da dis-cussão sobre a constitucionalidade de en-tidades administrativas regulatórias medi-ante a referência à previsão constitucional dedois dos atuais órgãos reguladores –

ANATEL e ANP[153]

. Previstos na Constitu-ição Federal de 1988, eles encarnariam ex-ceções aos dispositivos de competência re-servada ao Chefe do Executivo (art. 84, II eIV, da Constituição Federal de 1988). Esseponto de vista, que apoia a

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constitucionalidade de regulamentação in-fralegal de atividades essenciais na presençade referência expressa a órgãos reguladoresrevela, contudo, dois problemas: a) somenteduas das atuais agências reguladoras seriamregulares e estariam aptas a cumprir suasfunções regulamentares; b) mesmo estasduas agências poderiam ter sua autonomiaquestionada por violação da separação dospoderes por via transversa ao implementar-em exceção a incisos do art. 84, que funcionacomo divisor de águas entre o Legislativo e oExecutivo. Desta forma, a explicação daautonomia regulatória das agências por meiode normas constitucionais excepcionais pecapor privilegiar soluções pontuais, quando apresença de tais entidades já decorre natur-almente da harmonia preconizada entre ospoderes por meio de distribuição não exclu-siva de funções. O argumento da previsãoconstitucional ‘excepcionadora’ obedece aopressuposto, acima questionado, de

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exclusividade de tratamento normativo peloPoder Legislativo e que não condiz com acomplexidade institucional atual.

E qual seria, portanto, o efeitojurídico da previsão constitucional de ditosórgãos reguladores? Como não existem ter-mos inúteis no ordenamento jurídico, as pre-visões concernentes à regulação do petróleoe das telecomunicações devem operar algumefeito. Este efeito está na distinção entrepoder normativo secundário e subordinadoexplicitada linhas acima. Por estarem ex-pressamente previstos na ConstituiçãoFederal de 1988 como órgãos reguladores,eles não tem somente a tradicional com-petência secundária, mas também subordin-ada, pois a dicção constitucional exige que otratamento legal de tais órgãos lhes definacom os elementos característicos da regu-lação setorial.

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2.3.4 ATIVIDADE NORMATIVA DO EXECUTIVO EREVISÃO JUDICIAL

Finalmente, a atividade normativado Executivo, no âmbito da regulação deatividades essenciais, suscita tambémquestões referentes à extensão de sua revisãopelo Poder Judiciário. Sob o enfoqueestritamente jurídico-formal, a ConstituiçãoFederal de 1988 estipula expressamente a in-afastabilidade da jurisdição quanto a

qualquer lesão ou ameaça a direito (art. 5o,XXXV). Entretanto, não se pode furtar à dis-cussão do grau de atuação jurisdicional daídecorrente. Em outras palavras, até onde irá,de fato, a revisão, pelo Judiciário, daprodução normativa conjuntural do Exec-utivo, que é, por natureza, técnica e, às vezes,fundada em prognósticos da Administraçãosobre a evolução futura de um setor deatividades?

O termo comumente utilizadopara descrever o fenômeno de abertura de

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opções administrativas por meio da defin-ição técnica como argumento de autoridadeé o da discricionariedade técnica da Ad-ministração Pública. Esse termo transparecea afirmação de que certas decisões, por suaelevada complexidade de ordem técnica,somente poderiam ser tomadas por quemnelas é especializado, deixando ao Judiciárioa possibilidade de se pronunciar somentequanto aos erros manifestos.

O próprio conceito de discricion-ariedade técnica é atacado como uma con-tradição em si, pois reuniria em sua postu-lação termos que se anulariam, já que a dis-cricionariedade pressupõe espaço decisórioaberto por lei, enquanto a tecnicidade car-regaria, em si, uma determinação precisa decritérios a serem seguidos, estrangulandoaquele espaço que se pretendia previsto nalei, transformando, assim, o ato cogitado emato vinculado, ou seja, em ato no qual não hámargem de opções possíveis a serem

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tomadas, mas somente um comportamentopreviamente estabelecido a ser imple-mentado pela Administração Pública.

Para compreensão da questão dadiscricionariedade técnica, é necessárioprimar por precisão terminológica. Há umgrande salto entre os conceitos de discricion-ariedade externa e discricionariedadeinterna.

A discricionariedade externa, im-propriamente inserida em casos de discri-cionariedade técnica, significa a margem deopções possíveis do administrador previstaem formulação jurídica que contém, dentreoutros, dados técnicos. Neste caso, o admin-istrador deve partir dos elementos técnicosjá esclarecidos na fundamentação de sua de-cisão e lançar mão da clássica discricionar-iedade administrativa aberta expressamentepelo texto legal. Seria o caso de uma normaque estabelecesse opções para o adminis-trador destruir ou apreender uma substância

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tóxica. A determinação da natureza da sub-stância é um juízo técnico prévio à opção doadministrador entre destruir ou apreender oproduto. Logo, a discricionariedade externapressupõe a solução do significado dos dadostécnicos contidos na previsão normativa.

Já a discricionariedade internarevela a verdadeira temática da discricionar-iedade técnica e se define pela cogitação deum espaço discricionário aberto pela di-ficuldade de se determinar o sentido dotermo técnico inscrito na lei. A discricionar-iedade técnica está na entranha dos juízos

técnicos.[154]

Quem conhece tecnicamente, éverdade, tem condições de decidir melhor

sobre o significado objetivo[155]

de umtermo técnico, mas não necessariamente deforma mais adequada ao ordenamentojurídico, que agrega caráter teleológico aos

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dados técnicos, vinculando-os a uma finalid-ade específica normativa, cuja prerrogativade proteção última situa-se no Poder Judi-ciário. A tecnicidade do tema afasta, na prát-ica, a ponderação científica do juiz sobre osprós e contras da opção por uma ou outratecnologia (esta é uma constatação fática);ela reserva a órgãos formados por especialis-tas de cada área a definição da extensão decertos conceitos, como os de substância tóx-ica, de margem de segurança, de medica-mento, de bioequivalência, de interferênciaprejudicial eletromagnética, mas não invi-abiliza – antes indica em face da presença de

standards precisos[156]

–, a necessidade de,a partir de laudos técnicos, verificar a per-tinência da decisão tomada frente às determ-inações legais. Finalmente, deve-se levantara questão de que tais standards precisos nãosão assim entendidos por serem predeter-minados, mas por estarem remetidos à mo-tivação da decisão administrativa, analisada

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no controle judicial do ato, que confirmaráou não a determinação concreta dos parâ-metros técnicos razoáveis frente ao contato

da norma com o plano fático.[157]

Ditosparâmetros técnicos são esculpidos na mo-tivação da decisão administrativa, o que geraa possibilidade e exigência de revisão judicialdos critérios técnicos utilizados para tomadade posição do administrador.

O juízo de legalidade é prerrogat-iva inafastável do Poder Judiciário, que, poroutro lado, deve cingir-se, quanto ao juízo deoportunidade do administrador, à veri-ficação da proporcionalidade da medida.Neste caso, as valorações do administrador,desde que legais, vinculam a atuação estatalmesmo que em detrimento da melhorsolução segundo novos parâmetros de quemenxerga, do futuro, o fenômeno completo,muito embora se possa exigir a melhorsolução possível segundo o nível de dados

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disponíveis e assimiláveis no momento dadecisão. A par do juízo de oportunidade doadministrador, há a opção por critérios téc-nicos, que carregam consigo certo grau dehermetismo. Por isso, exige-se consciênciasetorial do julgador para compreensão dasimplicações menos óbvias das opções do ad-ministrador, bem como se exige ampla mo-tivação da decisão administrativa para per-mitir o controle judicial. O conhecimento,por parte do julgador, dos meandros técnicosdos setores de atividades relevantes para oEstado é condição para o necessário controlejudicial da assim chamada discricionar-iedade técnica. Em outras palavras, a tecni-cidade pode encobrir, no juízo de oportunid-ade, o juízo de legalidade; pode tomar de-cisões, no juízo de oportunidade do espe-cialista, que diminuam as opções de legalid-ade do julgador sem que ele perceba tais de-cisões, fechando as soluções antes abertaspela legislação. Tais características afloradas

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no modelo regulatório estatal evidenciam anecessidade do Judiciário, bem como das es-truturas postulatórias perante o Judiciário,de se empenharem em tomar consciência dasperspectivas abertas pela tecnicidade dasquestões setoriais, que obscurece a nitidezdas fronteiras limitadoras dos juízos deoportunidade, que, por natureza estão vincu-lados aos parâmetros dos juízos delegalidade.

Além da ampla discussão geradapela discricionariedade técnica, a atividadenormativa do Executivo depara-se com a in-fluência de políticas orientadoras de decisõessetoriais. O modelo de regulação deslocapara órgãos e entes administrativos específi-cos decisões de intenso caráter prognósticocarregadas de orientações políticas de plani-ficação administrativa. Essa é, por exemplo,a opção pela forma de se implementar acompetição em determinado setor. Os casosde implementação de orientações

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planificadas na esfera do Executivo, ao con-trário do que ocorre com a discricionar-iedade técnica, não se submetem à interfer-ência do Judiciário no cerne das opçõespolíticas, pois disso resultaria restrição, porparte do Judiciário, das funções naturais aoExecutivo. Não é, no entanto, o Executivosomente que delimita o cerne de seu poderde orientação política por planificação ad-ministrativa. Cabe ao Legislativo estabeleceros standards dentro dos quais o Executivoproduz suas políticas próprias, tanto no

tocante à sua estruturação[158]

, quanto paranormatização de setores relevantes de ativid-ades. A pertinência entre os prognósticos le-gislativos e executivos inscritos em suas cor-respondentes produções normativas, poróbvio, encontra-se no campo do juízojurisdicional.

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2.4 CONCEITO DE REGULAÇÃO

Ao se tratar da produção norm-ativa do Poder Executivo, abordou-se apenasuma manifestação regulatória, que é parte doseu significado e, embora seja um dos signi-ficados mais característicos da regulação,não a representa em sua integralidade. Aregulação é um fenômeno mais abrangentede interferência estatal na atividade econôm-ica em sentido amplo, envolvendo os ser-viços públicos e as atividades econômicas emsentido estrito. Mas a definição de regulaçãocomo um fenômeno fático é insuficiente aoestudo do direito. O objeto de estudo dodireito regulatório, por princípio, éalgo jurídico e, portanto, para os finsdo direito regulatório, a regulação,como objeto de estudo, encontra-severtida no termo regime jurídicoregulatório.

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O uso do termo regime jurídicoregulatório responde à busca de um signific-ado mais palpável à imprecisão terminoló-gica trazida pelo enunciado da regulação.

Como explica Sueli Dallari, a reg-ulação foi definida, no século XVIII, comoum mecanismo técnico voltado à preser-vação de uma constante em meio a perturb-ações exteriores para alcance de estabilidade,por exemplo, um termostato. No século XIX,foi definida como um conjunto de ajusta-mentos biológicos capazes de preservar oequilíbrio dinâmico de um corpo. O séculoXX trouxe para o termo o significado demecanismo promotor de correções da atu-ação de um sistema qualquer por intermédioda avaliação dinâmica das informações rece-bidas do ambiente regulado. Como teoria dossistemas, introduziu-se na economia, na so-

ciologia, na ciência política e no direito.[159]

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Na economia, o conceito de regu-lação tomou matiz próprio ao encobrir a ca-racterística sistêmica propriamente regu-ladora sob o significado projetado a partir dofinal do século XIX de atividade estatal

voltada a suprir as falhas de mercado.[160]

Já, na tradição anglo-saxã, o significado deregulação foi apropriado como o conjunto deatos de controle e direção, assim entendidoscomo normas legais e outras medidas decomando e controle de intervenção pública

sobre o mercado.[161]

Em âmbito inter-nacional, o Bando Mundial assimilou esse úl-timo significado da regulação como controlesimpostos pelo governo sobre aspectos denegócios, distinguindo-os da propriedade es-tatal dos meios de produção e da atividade

de fomento por incentivos fiscais.[162]

Aregulação, portanto, internaliza em seusenunciados jurídico-administrativos, direta

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ou indiretamente, a característica de atuaçãogerencial da administração, que se tornavisível no direcionamento do setor por inter-ferências estatais ponderadas pari passu epor constante reavaliação da pertinênciaentre o caminho seguido pelo ambiente regu-lado e os direitos afetados. O mercado e osseus senhores jurídicos – a livre iniciativa e alivre concorrência – podem ser itensdiretores de parcela da atuação regulatória,mas não se apresentam como princípiosjurídicos exigíveis para o conjunto das ativid-

ades reguladas.[163]

A regulação, portanto, enquantoregime jurídico regulatório, apresenta-secomo um conjunto de disposições norm-ativas e administrativas caracterizadas porseu caráter conjuntural de influência ou con-

trole[164]

sobre o ambiente regulado medi-ante batimento entre resultados esperados eresultados efetivamente alcançados. O

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mecanismo regulador presente na origemterminológica da regulação apresenta-secomo um diferencial do regime jurídicoregulatório, revelando-o como um conjuntode atuações normativas e administrativascapazes de interagir pari passu com osrumos efetivamente detectados no ambienteregulado para redirecioná-lo aos deveresnormativos de concretização dos direitosfundamentais.

O regime jurídico regulatóriotransparece, portanto, o conjunto de

produções não só normativas[165]

, mas ad-ministrativas de diuturna reconfiguração doambiente regulado, como também do form-ato estatal de ataque aos problemas nele de-tectados, entendida a indispensabilidade deatuação estatal no que se refere à preser-vação dos princípios do serviço público, me-diante políticas regulatórias ínsitas aosprincípios jurídicos inscritos na ideologia

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constitucionalmente adotada.[166]

Dita diu-turna reconfiguração é voltado tanto para oambiente regulado quanto para a própriaconformação estatal interventora, na medidaem que a projeção da atuação estatal regu-latória parte do pressuposto de atuaçãodinâmica e proativa governamental, ou seja,da consciência, por parte do governo deplantão, de que sua atuação é necessária àconcretização dos direitos fundamentais. Odepoimento de George Soros sobre a crisefinanceira iniciada em 2007 e resultante dodéficit regulatório do sistema financeironorte-americano dirige-se ao cerne daquestão ao defender a necessidade de um

governo que acredite no governo[167]

, valedizer, de um governo que acredite no seu pa-pel decisivo e imprescindível para aper-feiçoamento do sistema democrático e dasrelações econômicas a ele subjacentes. Emoutras palavras, a regulação integra o modo

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de ser da liberdade democrática ao repres-entar a convicção de que não existe uma re-gião de atividades econômicas livre de leis;não há um setor desregulado no sentido pre-ciso da palavra. Uma sociedade pautada naliberdade não significa uma sociedade avessaà regulação. Mesmo Friedrich Hayek con-firma a onipresença da regulação em

qualquer modelo estatal.[168]

Dentre as categorias de atuaçãoestatal reveladas no estudo do regimejurídico regulatório, encontram-se: fomento,regulamentação, monitoramento, mediação,

fiscalização, planejamento[169]

e ordenação

da economia;[170]

gerenciamento normativo

de conflitos;[171]

regulamentação de ativid-ades inseridas em âmbito de competência es-

tatal;[172]

ordenação da atividade

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econômica[173]

, inclusive da atividade

monopolista[174]

; outorga de serviços eautorização de uso de meios para universal-ização ou expansão geográfica, enfim, ativid-ades de índole normativa e administrativaúteis, sob o ponto de vista individual, e ne-cessárias, se vistas em conjunto, ao acom-panhamento e redirecionamento de ativid-ades econômicas em sentido amplo. A com-posição das funções normativa e adminis-trativa em um ambiente de acompan-hamento e controle é, em síntese, o diferen-cial de autonomia do ramo de estudos dodireito regulatório.

A regulação, em síntese, é apresença de regras e atuação adminis-

trativa (law and government)[175]

decaráter conjuntural pautadas no pres-suposto de diuturna reconfiguraçãodas normas de conduta e dos atos

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administrativos pertinentes para a fi-nalidade de redirecionamento con-stante do comportamento das ativid-ades submetidas a escrutínio, tendo-sepor norte orientador parâmetros reg-ulatórios definidos a partir dos enun-ciados de atos normativos e adminis-trativos de garantia dos direitosfundamentais.

Traduzindo-se o enunciado daregulação em termos práticos, a regulação,por exemplo, do Serviço Telefônico FixoComutado – atividade submetida a exame eacompanhamento estatal minucioso – faz-sepor intermédio de disciplina normativa in-fralegal da Agência Nacional de Telecomu-nicações (resoluções), e por atos adminis-trativos pertinentes, tais como autorizações,concessões, atos de fiscalização, monitora-mento e mediação de disputas, segundoparâmetros de comportamento das ativid-ades reguladas derivados do enunciado

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constitucional dos direitos fundamentais àvida, à liberdade, à igualdade, à segurança eà propriedade, minudenciados nas políticaspúblicas setoriais emanadas da normatizaçãosecundária do Ministério das Comunicações(portarias ministeriais) e da Presidência daRepública (decretos presidenciais), em proldo objetivo de maior aproximação possívelentre a prestação efetiva do serviço e aprestação do serviço esperada da integral ap-licação de regras e princípios jurídicos. Aregulação apresenta-se como o rol de ativid-ades de reorientação diuturna dos atores set-oriais – governo, empresas, usuários/con-sumidores, cidadãos e estrutura regulatória– rumo à maior sintonia possível entre omodelo ideal de funcionamento do ambienteregulado ordenado pelo Direito e o efetivocomportamento das atividades reguladas.Regulação é a reconfiguração conjun-tural do ambiente regulado voltada àconsecução de um modelo ideal de

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funcionamento do sistema e dirigidapor regras e princípios inscritos e es-pelhados nos direitos fundamentais.

No presente contexto regulatóriobrasileiro inaugurado em meados da décadade 1990, o rol de instituições jurídicas carac-terísticas da regulação resume-se aos concei-tos de gerenciamento normativo da realid-ade, outorgas de serviços, controle de meios,assimetria regulatória e fiscalização. Todoseles são compatíveis com a dinâmica vislum-brada na evolução do direito administrativopara o acompanhamento cotidiano dastransformações nas atividades de interessepúblico. Eles, todavia, não esgotam o sub-strato de estudo do direito regulatório, quese projeta para além de atividades de inter-venção indireta no mercado e alcança, comose viu, atividades de fomento, de planeja-mento, de intervenção direta, enfim, a inter-ferência estatal em atividades econômicaslato sensu. Regulação, enfim, é intenção de

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direcionamento conjuntural da atividadeeconômica no Estado.

Tais instituições regulatórias –regulamentação, monitoramento, fiscaliza-ção, planejamento, ordenação, fomento,outorgas, alocação de meios – abrem espaçopara políticas públicas que não estejam in-tegralmente entregues, por exemplo, ao idealde otimização funcional por intermédio daconcorrência. Uma teoria jurídica de carátergeneralizante não serviria a seus propósitosse inviabilizasse sua adequação a tipos deregulação fundados em pressupostos depolítica pública distintos. Em outras palav-ras, não se pode propor uma teoria jurídicada regulação que esteja comprometida comideais, sejam eles de competição ou demonopólio, de mercado ou de planificaçãoestatal, mas como instrumento de reuniãodos sucessos e fracassos das políticaspúblicas de fontes ideológicas distintas. Ateoria jurídica da regulação serve como seara

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de discussão e de orientação a quem não serende a argumentos unificadores e destruid-ores da diversidade de pontos de vista, que écaracterística do estudo científico.

Para compreensão dos princípiose das instituições regulatórias, é essencial apesquisa sobre o histórico regulatóriobrasileiro em geral.

2.5 REGULAÇÃO VERSUSDESREGULAÇÃO

O estudo da regulação nos obrigaa cogitar dos nossos pressupostos jurídicos.Enquanto juristas, temos a consciência deque o esquema de forças sociopolíticas de-tém um componente normativo subjacente,ou seja, de que a realidade de forças sociais,como a vemos hoje, assenta-se em pres-supostos de convivência social e em

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pressupostos estritamente jurídicos, como osconceitos de propriedade, de igualdade, deliberdade.

Quando a regulação é lançadapara discussão como a presença organizadado Estado em setores relevantes, há o natur-al questionamento originado de concepçõesde eficiência econômica, de que a interferên-cia estatal deveria se restringir ao mínimonecessário para preservação da esfera de atu-ação livre do particular no mercado. A vul-garização dessa concepção econômica leva,indevidamente, à conclusão de que umaopção de política pública setorial poderia sera desregulação do setor para que o mercadocaminhe livre, mas essa não é uma propostaque se sustente quando se parte do pres-suposto de que o que se considera como mer-cado, hoje, não passa de um produto norm-ativo, protegido por direitos de propriedade,de igualdade, de liberdade. Em outras palav-ras, o substrato dos modelos de negócio, da

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eficiência e da possibilidade de sucesso dopróprio mercado, é um conjunto complexode disposições normativas que garantem, àsexpensas dos tributos de toda a sociedade, alucratividade e a própria viabilidade de umsetor de atividades.

No setor de atividades maisfestejado como a forma de organização socialdo século XXI – a chamada sociedade da in-

formação, do conhecimento ou de rede[176]

– é ainda mais evidente que a lucratividadedos negócios do setor depende primordia-mente dos pilares jurídicos de proteção dosdireitos de propriedade afirmados nanormatização setorial e garantidos por carasestruturas executivas e judiciárias de fiscaliz-ação e aplicação do direito.

A desregulação eventualmenteproposta em um determinado setor deatividades relevantes significa, portanto, nãoa extinção da regulação, mas a diminuição de

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apenas uma dimensão da regulação estatal,que é a que procura dirigir o mercado ou im-por compensações pelos benefícios garan-tidos pelo Estado para quem nele operanegócios. O primeiro pressuposto, portanto,quando se trata de discutir a regulação é o deque ao se propor a desregulação de um setor,o argumento por detrás da desregulaçãonunca poderá ser o de que o setor funcion-aria melhor sem intervenção estatal. O fun-damento para a chamada desregulação res-ulta, pelo contrário, de uma ponderaçãosobre os ganhos sociais oriundos da atitudede diminuição da regulação estatal voltada àcompensação social ou à orientação do mer-cado. O afastamento do Estado dessas espé-cies de regulação somente se justifica secomprovada que a abstenção estatal no dire-cionamento do setor regulado rumo à com-pensação social e à eficiência do mercadoresultaria em maior eficácia dos direitos fun-damentais envolvidos. Não faz parte,

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portanto, do discurso jurídico, a cogitação dadesregulação como um fenômeno apoiado noargumento de que um setor de atividadesrelevantes tem seu valor e eficiência diminuí-dos pela simples existência da regulação: umsetor de atividades relevantes é um produtoda regulação jurídica.

O exemplo da internet é marcantequando se trata de evidenciar a insuficiênciada afirmação do mercado como um ente vivointeligente e eficiente, ao invés de entendê-locomo um produto da atuação regulatória, ouseja, de atuação concertada e inteligente doambiente político-jurídico capaz de formatá-lo em benefício dos direitos fundamentais.Se não fosse uma atuação governamentalativa, o mercado teria enterrado o projetoque deu vida à internet, deixando o mundo

preso na idade do papel.[177]

Por diversasvezes, o governo norte-americano e umcentro de pesquisa europeu tentaram

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convencer a iniciativa privada a encampar oprojeto da rede mundial de computadores,mas a resposta foi unânime de que, nadécada de 1970, o projeto não diria respeitoaos negócios de interesse de uma grandeempresa de telecomunicações, a AT&T, e,mais tarde, na década de 1980, já com aWorld Wide Web, seria um sistema “muitocomplicado”. Em outras palavras, a lógica dainiciativa privada expressou sua visão da in-ternet como um negócio não correlato ao dastelecomunicações. Se não fosse o investi-mento governamental em estudos uni-versitários e a necessidade de uma redeeletrônica de informações para o desenvolvi-mento de tais estudos, o mundo não teria afeição marcante da idade da internet e doseu substrato econômico: a sociedade-rede.

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REGULAÇÃO NO BRASIL

3.1 FASES DA REGULAÇÃO NOBRASIL

Uma visão histórica das fases deregulação dos serviços públicos no Brasil so-fre estudo aprofundado e responsável em

Aguillar[178]

e compõe passo fundamental àcompreensão do período atual de conform-ação da regulação operacional e normativabrasileira.

Do Brasil Colônia ao Primeiro Im-pério, vigorou um modelo regulador de ser-viços públicos comprometido com a con-cepção patrimonialista de Estado. Daí seidentificar com a fase da regulação patri-monialista, “sinônimo de apropriação do

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Estado por seus governantes”[179]

, cuja le-gitimidade esteve apoiada na probabilidadede reconhecimento de uma estrutura de

autoridade[180]

representada, no Brasil,pelo caráter tradicional de legitimidadeadvinda da pessoa do governante assentadana devoção aos costumes. Isso tudo trans-parecia, nessa fase, um momento em que seentendia o próprio Estado como propriedadeprivada do soberano e, portanto, remetia aextensão da regulação à vontade subjetiva dodetentor do poder político. A prestação dosserviços públicos, nessa fase, é pequena e suaevolução aponta para a correlação entre ofenômeno da prestação de serviços públicose o da urbanização do país: construção deedifícios públicos civis e militares; medidasde saneamento básico; serviço de iluminaçãopública; serviço de correios e telégrafos; ser-viços bancários, com o Banco do Brasil, em1808. Em grande parte, as atividades eram

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puramente controladas por regulação norm-ativa sem intervenção direta estatal por-tuguesa. A única atividade oficial era a cha-mada feitoria, que visava exploração damadeira para a indústria têxtil européia. Opau-brasil estava submetido a regime demonopólio português, utilizando-se dosmecanismos jurídicos da concessão e do ar-rendamento para a sua exploração. O BrasilColônia, portanto, é caracterizado como per-íodo de regulação por descentralização op-eracional – prestação de serviços afastada doEstado – e por centralização normativa –concentração de normatização sobre ativid-ades reguladas –, reforçando-se a idéia deprivilégio e monopólio estatal de todas asatividades relevantes. A manifestação de des-centralização da regulação operacionalsomente se justificava, então, pelo desin-teresse do governo português em viabilizar,com recursos próprios, a colonização do

Brasil.[181]

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A fase de regulação descon-centrada sucedeu a de regulação patrimo-nialista e está situada do Segundo Impérioaté os anos 30 do século XX. O liberalismoeconômico desempenhou seu papel, impri-mindo a idéia de regulação normativa des-centralizada, ou, em outras palavras, de des-regulamentação da atividade econôm-

ica[182]

. Da mesma forma, esse movimentotambém surtiu efeitos na regulação opera-cional, que passou a ser descentralizada comintensa participação de capital estrangeiro. Aidéia do liberalismo econômico extremadode que tudo que o Estado faz, faz mal, emesmo que fizesse bem, mal faz, serviu defator de contenção da interferência estataltanto normativa quanto operacional à ex-ceção das ferrovias e da infraestrutura por-

tuária.[183]

Da década de 30 ao final dadécada de 80 do século XX, o advento

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progressivo do Estado Social legitimou ocontrole estatal dos serviços de interessepúblico em face da derrocada do modelo deeconomia de mercado abstencionista e abriuespaço para a fase de regulação con-centrada, cujos postulados também es-tavam afinados com a irrupção do nacional-ismo, que, por sua vez, desempenhou relev-ante papel na concentração de setores comoo de energia elétrica e o de telecomu-nicações. Em termos jurídico-positivos, foi aprimeira referência constitucional ao regimedas concessões expressa no art. 137 da Con-

stituição Federal brasileira de 1934[184]

. Alegislação federal genérica sobre o regimejurídico da concessão, no entanto, teve deaguardar a Lei 8.987, de 1995, muito emboraregulamentações específicas já fossem imple-mentadas desde então. Na década de 30, oregime da concessão foi transformado,tolhendo-se a garantia de juros mínimos aoconcessionário mediante o art. 142 da

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Constituição Federal brasileira de 1934[185]

.Outras referências históricas evidenciam amudança de perspectiva regulatória comoevidencia a edição do Código das Águas(Decreto 24.643/34) e a criação das primeir-as ‘agências’ estatais no Período Vargas,como órgãos de implementação de planeja-mento e fiscalização das políticas setoriais:Conselho Nacional do Petróleo; ConselhoNacional de Águas e Energia Elétrica; De-partamento Nacional da Produção Mineral;Departamento Administrativo do ServiçoPúblico; Coordenação de Mobilização Econ-ômica; Departamento Nacional de Estradasde Rodagem; Departamento Nacional dosPortos; Comissão Administrativa de DefesaEconômica, embrião remoto do atual Con-selho Administrativo de Defesa Econômica;Inspetoria de Obras Contra as Secas. A fasede regulação concentrada, enfim, foi carac-terizada como de regulação centralizada op-eracional e normativa. Já com a volta de

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Getúlio Vargas, em 1951, ocorreu o que seconvencionou chamar de inversões estataisem energia elétrica com a paulatina estatiza-ção do setor mediante a criação da Eletro-

brás. Os setores de telecomunicações[186]

,energia, transportes, correios e saneamentobásico foram intensamente regulados já dur-ante o Governo Militar tanto normativacomo operacionalmente.

A fase seguinte é a do EstadoRegulador, em que as posturas clássicas doEstado Mínimo (liberal) e do EstadoProvedor (intervencionista) abrem espaço

para o ideal contemporâneo[187]

de menorintervencionismo direto e maior interven-cionismo indireto, ou, em outras palavras,regulação operacional descentralizada e reg-ulação normativa centralizada e qualificadapela delegação de poderes ao ente regulador,

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separando-se as figuras do controlador e do

prestador.[188]

Nesta fase, tomou força o princí-pio da subsidiariedade, gerando outro termodesignador daquele momento histórico: oEstado Subsidiário, cujas diretrizes apon-tam para a revalorização da autonomia indi-vidual em detrimento do controle social,para a abertura de espaços nas instituiçõespúblicas de participação direta da sociedade,para fomento e regulamentação das ativid-ades privadas, visando otimizar seu sucesso,e para a promoção de parcerias entre opúblico e o privado como auxílio à viabiliza-ção de atividades antes fora do alcance deste

último.[189]

O marco normativo dessatransição para o Estado Regulador encontra-se no início do processo descentraliz-

ador[190]

, no Programa Nacional de

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Desburocratização do final da década de1970, objetivando dinamizar e simplificar ofuncionamento da Administração Pública

Federal[191]

. Na década seguinte, o Decreto95.886, de 29 de março de 1988, deu novoimpulso, transferindo “para a iniciativaprivada determinadas atividades econômicas

exploradas pelo Poder Público”[192]

. O pre-ceito ditado pelo art. 173, da ConstituiçãoFederal de 1988, de limitação da interferên-cia do Estado na atividade econômica, excetose presentes imperativos de segurançanacional ou relevante interesse coletivo,forneceu o arcabouço normativo para a in-trodução do Programa Nacional de Desestat-ização por intermédio da Medida Provisória155/90 convertida na Lei 8.031, de 12 de ab-ril de 1990. As forças políticas favoráveis aonovo modelo de política de descentralizaçãoencontraram ambiente favorável paraaprovação das Emendas Constitucionais

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números 6, 8 e 9, de 1995, que possibilit-aram a abertura dos setores de petróleo etelecomunicações ao capital estrangeiro e àiniciativa privada nacional mediante privat-ização de empresas estatais com a venda dos

ativos públicos em telecomunicações.[193]

A partir de então, a assimetriaregulatória foi eleita a palavra de ordempara viabilizar a convivência dos conceitos decompetição (ou mais propriamente, ambi-

ente concorrencial[194]

) e da universaliza-ção. Tal assimetria, em termos gerais, signi-fica a distinção de tratamento regulatórioentre os participantes operacionais dos ser-viços públicos e das atividades a eles con-exas. De um lado encontram-se os presta-dores de serviços públicos sujeitos ao regimede direito público e, por isso, carregandoônus maiores para implementação dos seusobjetivos; de outro lado, os prestadores deserviços em regime privado. Na relação entre

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eles, a assimetria regulatória desenha umparâmetro de competição, que exige difer-ença de tratamento normativo para possibil-itar isonomia entre prestadores de serviçosem regime público e privado. Essa nova es-trutura regulatória ampliou a viabilidade docontrole social da prestação de serviçospúblicos em virtude da abertura inserida nasestruturas das atuais agências reguladoras.Todas estas modificações na concepção deprestação de serviços e controle de ativid-ades ainda foram acrescidas das inovaçõesda Emenda Constitucional nº 19, de 4 dejunho de 1998 – a conhecida Reforma Ad-ministrativa –, em que os conceitos de efi-ciência, produtividade, participação popu-lar e autonomia viabilizaram novas formasde relação do Estado com órgãos, com en-tidades da administração direta e indireta,ou mesmo, com pessoas de direito privado,mediante contratos de gestão e fixação demetas de desempenho.

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3.2 ESPÉCIES DE REGULAÇÃO

A regulação, assim entendidacomo atuação normativa e administrativa di-uturna para reconfiguração do ambiente reg-ulado, pode se apresentar em três categorias,a depender do critério de segmentação doque se pretende regular. Fala-se, assim, emregulação regional, geral ou setorial.

Entende-se como regulação re-gional aquela voltada ao controle de ativid-ades econômicas lato sensu, tendo em contaa divisão espacial federativa de poderpolítico. Dita regulação regional pode seridentificada, no sistema brasileiro, nos re-

gimes especiais de tributação.[195]

Neles, aintervenção por indução reflete uma regu-lação que leva em conta a disposição espacial

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de poder político.[196]

Trata-se também deregulação regional o chamado federalismofiscal direcionado às regiões menos desen-volvidas com base na distribuição de percen-tuais do valor de certos impostos a fundos de

desenvolvimento dessas regiões.[197]

Já, a regulação geral destina-se aimplementar o controle estatal sobre a total-idade da economia independentemente da

consideração de regiões ou setores[198]

. Aregulação geral está desconectada de setoresda economia, desligando-se de um rol deprestações setoriais específicas, devendo,portanto, ser encarada como regulação deáreas de interesse estatal, como é o caso dasopções políticas geradoras do regime jurídicodo consumidor, da concorrência e do meioambiente. Podem ser visualizadas, no Brasil:em certos entes reguladores estaduais e

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municipais[199]

; nos mecanismos de con-trole da concorrência direcionados a todos os

setores da economia[200]

; nos mecanismosde proteção do consumidor; nas propostassobre agência reguladora do meio ambi-

ente[201]

; e nos demais instrumentos fix-adores de pautas em subsistemas jurídi-

cos[202]

.

Finalmente, a regulação setorialdiferencia-se das demais por operar em de-terminados segmentos de atividades defini-das convencionalmente como afins. Temascomo educação, saúde, telecomunicações,energia, petróleo, transportes, recursoshídricos, sistema financeiro, dentre outros,justificam a referência setorial. A regulaçãosetorial é, sem dúvida, a mais repres-entativa dos estudos de direito regu-latório muito em virtude da

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coincidência de sua projeção em con-junto com as reformas estruturais doEstado brasileiro de meados dadécada de 1990.

Exemplos históricos de entes es-tatais voltados à regulação de setores, ou àregulação de atividades específicas desetores, todos de interesse público, demon-stram que este tipo de regulação não é re-cente no Brasil: Comissariado de Ali-mentação Pública, criado em 1918, de fun-ções emergenciais voltadas a racionalizar asdificuldades de abastecimento advindas daprimeira guerra mundial; Instituto de DefesaPermanente do Café, criado em 1923 e suce-dido primeiramente pelo Conselho Nacionaldo Café, de 1931, e em seguida, pelo De-partamento Nacional do Café, de 1933, até oaparecimento da autarquia de regulação

econômica[203]

denominada Instituto

Brasileiro do Café – IBC, em 1952[204]

;

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Instituto do Açúcar e do Álcool – IAA, tam-bém uma autarquia de regulação econômica,

criada em 1933[205]

; Instituto Nacional doMate, de 1938; Instituto Nacional do Sal, de1940; Instituto Nacional do Pinho, de 1941;Departamento Nacional de Energia Elétrica

– DNAEE, de 1968[206]

, cujas funções fo-ram assimiladas pela ANEEL; Conselho Na-

cional do Petróleo – CNP[207]

. A eles, sãoacrescidas as atuais agências reguladoras

federais[208]

: AEB[209]

; ANATEL[210]

;

ANEEL[211]

; ANP[212]

; ANVISA[213]

;

ANS[214]

; ANA[215]

; ANTT[216]

;

ANTAQ[217]

; ANCINE[218]

. O modelobrasileiro tem semelhança com modelos deregulação setorial implantados em outros

países. No Reino Unido: OFWAT[219]

;

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OFCOM[220]

; OFGEM[221]

. Nos Estados

Unidos da América: ICC[222]

; FCC[223]

;

FERC[224]

. Na Alemanha: Bundesnetzagen-

tur[225]

; entre vários outros. O modelo tam-bém encontra sintonia no ambiente inter-

nacional: UIT[226]

; OMS[227]

; FAO[228]

;

UNESCO[229]

; UPU[230]

; IAEA[231]

, e estáapoiado na divisão funcional ligada a conjun-tos de temas unidos por um conhecimentotécnico-científico específico.

Das espécies de regulação anteri-ormente apresentadas, a que maior presençainstitucional obteve na década de 1990, emâmbito federal, no Brasil, foi a setorial, rev-elando a preocupação de reestruturação es-tatal e investimento em instituições capazesde promover o preenchimento normativo dediretrizes regulatórias atualizáveis no ritmo

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de alteração da própria atividade regulada,ou seja, em instituições capazes de promoverà regulação, atuando retroalimentada pelasreconfigurações diuturnas do setor. Visualiz-ado o campo de atividades que demanda in-tromissão estatal, seja pela natureza da

atividade, seja pela finitude[232]

do meio desua manifestação, ou mesmo pelo dever es-tatal de otimização do potencial uso de umbem público, as instituições reguladoras pas-saram a desempenhar papel nuclear nadinâmica organizacional daquelasatividades.

Por força da novidade terminoló-gica das agências reguladoras, o resgate deestruturas administrativas do passado rev-elará aspectos mais precisos do formato deregulação setorial adotada no Brasil.

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3.3 ESTRUTURAS DE REGULAÇÃOSETORIAL

3.3.1 CONSELHOS ECONÔMICOS

A partir da década de 1930, sur-giram, no Brasil, os assim chamados consel-hos econômicos resultantes da ampliação eda especialização das atividades estatais. A

origem[233]

da preocupação de criação deconselhos consultivos para fornecimento debagagem técnica às decisões políticas foievidenciada na Constituição Federalbrasileira de 1934, que facultou a criação,por lei ordinária, de Conselhos Technicos eConselhos Geraes para assistirem os Min-istérios, chegando mesmo a vincular a delib-eração do Ministro de Estado correspond-

ente.[234]

Embora a Constituição de 1934previsse expressamente o Conselho Superiorde Segurança Nacional (art. 159) e o

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Conselho Nacional de Educação (art. 152), arepercussão prática da novidade foi tímida,resumindo-se à criação do Conselho Nacion-al de Educação pela Lei 174, de 1936, e àprevisão, na Constituição de 1937 (arts. 57 a63) do Conselho da Economia Nacional, quenão se repetiu nas constituições de 1946 (art.148, caput) e 1967 (art. 57, VI), inclusiveEmenda Constitucional n.1, de 1969 (art.160, V).

Da imprecisão semântica dosconselhos, podem-se extrair, todavia, certoselementos conceituais como o da colegialid-ade de funções, cuja definição weberiana sedá por sua oposição à autoridade monocrát-

ica[235]

. O plural, o corpo, o coletivo, a re-união, enfim, a assembléia decisória fazemparte do significado histórico dos conselhos.Tais características incrementam o caráterinstitucional de convencimento e discussão,chegando, no direito espanhol, a ser erigido

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à condição de princípio definidor da

natureza dos órgãos consultivos[236]

. Acolegialidade permite, assim, maior pro-fundidade das decisões, que é obtida às cus-tas de maior grau de imprecisão e morosid-

ade.[237]

Ela divide a responsabilidade dadecisão, atomizando-a em manifestações

parciais.[238]

Pode-se dizer, portanto, que is-enção, profundidade e morosidade identi-ficam a forma colegial de decisão. En-tretanto, não depõem, a priori, contra ou afavor do modelo de decisão colegial, mas in-dicam os limites para sua manifestação. Apresença dos conselhos pode ser vista comouma resposta estatal ao desequilíbrio geradopela especialização do ambiente privadosobre determinados setores tidos por relev-antes para o Estado. O conhecimento espe-cial superior dos interessados atores de um

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determinado setor da economia, que, porserem partes, são naturalmente facciosos,somente pode ser contrastado mediante apresença de conselhos econômicos no ambi-ente estrutural do Estado para nortearem aregulação estatal. A existência dos conselhossegue uma constatação de Max Weber, deque o conhecimento técnico dos privados ésuperior ao da burocracia pública. Daí a im-portância de uma estrutura poderosa, espe-cializada e independente para o exercício daatividade regulatória, que tenha acesso aoconhecimento técnico produzido em níveldos conselhos, ou mesmo, em nível

acadêmico-institucional.[239]

Opõe-se a tal constatação de im-prescindibilidade dos conselhos, sua impre-cisão terminológica e consequente aplicaçãocasuísta.

No que tange à imprecisãoterminológica, tem-se a divisão entre

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conselhos de especialização, conselhos con-sultivos e instâncias colegiais controlador-as. De um lado, há as corporações de espe-cialização, que são formadas dentro da es-trutura burocrática estatal por técnicos ha-bilitados em razão de seus conhecimentosespeciais. Ditas corporações ombreiam comas corporações consultivas, que, na classi-ficação de Weber, são formadas por in-teressados privados no setor em pauta. Poroutro lado, as instâncias colegiais contro-ladoras estão presentes nas conformaçõesburocráticas da economia privada, como o

conselho fiscal de uma empresa.[240]

Dita classificação, no entanto, nãofoi absorvida pela prática institucionalbrasileira, o que não impede a conclusão deque há ao menos duas formas essencial-mente distintas de manifestação dos consel-hos: os de produção de massa crítica paraoutros atores do processo decisório estatal; e

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os de influência no processo decisório porparte do diálogo estabelecido entre o Estadoe o setor regulado, diálogo este inserido nainstituição estatal dos conselhos, ou seja, napossibilidade da interferência dos interessa-dos na escolha dos temas e na solução dosproblemas referentes ao setor de atividadesvisado. Seguindo esta classificação, os con-selhos integrantes da estrutura estataldiferenciam-se das instâncias colegiais con-troladoras presentes na economia privadapelo critério da força das decisões. Os consel-hos presentes na economia privada fornecema própria deliberação perseguida, enquantoos da esfera estatal refletem funções basica-mente técnicas e opinativas.

Emerge destas constatações, que oconceito de conselho, embora tenha hojeperdido sua dimensão inicial, tem sua con-tribuição de conceito geral do qual de-rivaram outros atualmente festejados, comoo de comissão e o de agência. Antes, os

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conselhos exerciam função meramente con-sultiva, mas, com o tempo, alguns deles fo-ram além em face de sua especialização e desua condição de complexos perenes frente a

autoridades efêmeras.[241]

A abertura conceitual do termoconselho gerou o surgimento de outros ter-mos que denotam vinculação decisória parase contraporem ao aspecto consultivoagregado aos conselhos hoje existentes. Issonão quer dizer que todos os conselhos doEstado brasileiro estejam maculados com a

função meramente consultiva[242]

, mas estaé, sem dúvida, a característica mais difun-

dida.[243]

O aspecto consultivo dos consel-hos inseriu neles a demanda de composição

plural para formação de consenso.[244]

Aparticipação de diversas tendências e

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interesses erigiu-os a colaboradores e prin-cipais enriquecedores da discussão imple-mentada em outras instituições decisórias.Isso é melhor visualizado na recente criaçãode conselhos no âmbito das agências admin-

istrativas reguladoras.[245]

3.3.2 CONSELHOS VERSUS AGÊNCIAS

A procura por índices de diferen-ciação entre os conselhos e as agências es-barra na consciência de que os critérios daíextraídos são muito mais apanhados de as-pectos formais reincidentes do que propria-mente distinções de essência entre as duasinstituições. Não se pode esquecer a paulat-ina evolução conceitual dos conselhos,desembocando na imprecisão dos termosque hoje designam as instituições estatais decontrole. Mas esta constatação não chega aoponto de desmerecer divisões didáticas, queexistem para possibilitar a melhor

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visualização do contexto conceitual de con-selhos e agências.

Desse modo, no tocante ao seufuncionamento, os conselhos estão voltadosà solução de questões específicas em razãodas quais houver sido suscitada sua reunião,enquanto as agências possuem um quadropermanente destinado a funcionamento os-tensivo. Por isso, em geral, os membros deconselhos não se afastam de outras funçõesna esfera pública ou privada, ao passo que seexige, dos membros de agências, especialdedicação à atividade que lá desempen-

ham.[246]

A personalidade jurídica dedireito público interno é da essência dasagências administrativas, enquanto os con-selhos, em geral, consubstanciam-se em ór-gãos, portanto, centros de competências des-personalizados do Estado. Enfim, a agência,enquanto terminologia, surgiu, no Brasil, nadécada de 1990, respondendo a uma

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demanda de precisão terminológica das cole-gialidades funcionais de caráter regulatório,que eram relegadas a adotarem os conceitosde conselhos ou comitês e que, assim, nãotranspareciam, de imediato, suas referidaspeculiaridades, sofrendo, como sofriam, in-

gerência política acentuada.[247]

O caso doConselho Nacional de Telecomunicações(CONTEL) é exemplo de conselho criadocom características autônomas de comissão

interministerial[248]

, ou mesmo, de órgãosimilar à Federal Communications Commis-

sion (FCC) norte-americana[249]

, que foisendo progressivamente esvaziado e su-plantado pela Administração direta doEstado.

Com isso, pode-se definir agência

administrativa como uma autarquia[250]

es-pecial identificada como instituição estatal

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de regulação operacional ou normativa, quepassou a integrar os aspectos estruturais eorganizacionais do Estado para fins de espe-cialização, celeridade e maior autonomia de-cisória. Tais características das agências ad-ministrativas vêm mensuradas para que suaatuação, embora protegida da influência var-iável da política de governo, permaneça vin-culada à política de Estado, pois os aspectosde segregação da agência frente ao Estadosomente se justificam para o alcance da fi-nalidade de sua existência, qual seja, adesobstrução do formalismo burocratizante

de seus procedimentos[251]

, desde que in-strumental ao cumprimento dos fins públi-cos que qualificam uma autarquia.

As agências administrativasdividem-se em duas modalidades no Brasil:agências executivas; e agências reguladoras.Destas, as agências reguladoras alcançaramstatus evidente na organização (aspecto

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dinâmico) e estruturação (aspecto estático)do Estado brasileiro de finais do século XX.

3.3.3 AGÊNCIAS EXECUTIVAS VERSUS AGÊNCIASREGULADORAS

Previstas na segunda metade da

década de 1990[252]

, as agências executivassignificam um signo, sinal, insígnia, rótulo,enfim, um símbolo identificador da regu-lação operacional descentralizada. O nome‘executiva’ indica que suas atribuições nãosão normativas, mas operacionais. Sua cri-ação busca administrar políticas públicas emmatéria de serviços públicos, diferenciando-as das agências reguladoras, que se preocu-pam também com o preenchimento normat-ivo secundário a partir das políticas públicasoriundas do processo legislativo primário. Ofoco das agências reguladoras, portanto, é aregulação normativa. A diferença entre

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agências executivas e reguladoras é, port-anto, funcional.

Agências executivas são autar-

quias e fundações públicas federais[253]

quese candidatam a receber a insígnia de agên-cia executiva, mediante submissão a umcontrato de gestão, onde se estabelecemmetas a serem alcançadas mediante ap-resentação de um plano estratégico dereestruturação e desenvolvimento e níveis dequalidade na prestação de serviços a usuári-os. A formação da agência executiva implica

processo interno de autonomia[254]

. Orótulo de agência executiva, no entanto, nãotransforma a natureza da pessoa jurídica dedireito público interno, que continua como

autarquia ou fundação pública[255]

. O queocorre é que estas autarquias ou fundaçõespúblicas com status de agências executivassão destinatárias de mais um rol de normas

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que estabelecem prerrogativas especiais de-rivadas da lei e que não derrogam o regimepúblico – e nem poderiam –, mas amenizamas limitações intestinas à própria estruturahierárquica da Administração Pública,refletindo-se, por exemplo, na maior auto-nomia para abrir concursos, desde que hajavagas e recursos disponíveis, podendo editarregras próprias de avaliação dos servidorespara progressão funcional, além da im-possibilidade, por parte do Executivo, decontingenciamento de recursos. Em trocadesses benefícios, surgem deveres específicosda autarquia para com o poder central,deveres estes derivados do contrato degestão firmado. Por isso, a agência executiva,em si mesma, não é exceção ao regimepúblico, desde que compreendida a extensãodo que pode vir a ser tratado no contrato de

gestão. As críticas[256]

dirigidas às agênciasexecutivas, portanto, não revelam incoerên-cia de concepção, mas evidenciam o risco da

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utilização de seu conceito para ultrapas-sagem de fronteiras impostas pelo regimepúblico.

A novidade no sistema das agên-cias executivas está na sua íntima conexãocom as propostas recentes de compromissoda própria entidade da administração in-direta com o poder central e de aferição deresultados como requisito de sua sobre-

vivência[257]

, algo caro à proposta, cujatramitação se iniciou no Congresso Nacionalem 2004, para aplicação do contrato degestão também a todas as agências regu-ladoras brasileiras. A criação de uma agênciaexecutiva, enfim, por se tratar tão-somentede signo aposto a uma entidade de direitopúblico preexistente, depende de Decreto doPresidente da República, após o processoprevisto na Lei 9.649/98, cuja primeira con-cretização ocorreu na qualificação do Insti-tuto Nacional de Metrologia, Normatização e

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Qualidade Industrial (INMETRO) comoagência executiva, por meio do Decreto semnúmero de 29 de julho de 1998.

Por outro lado, como instituiçõesde regulação, em regra, setorial, as agênciasreguladoras ou agências reguladoras e fisc-

alizadoras brasileiras[258]

surgiram comomecanismos reguladores normativos, queoperam com poderes de supervisão, fiscaliza-

ção e normatização[259]

de atividades,sendo dotadas de maior agilidade na imple-mentação de políticas públicas em razão desua estrutura especializada. Foram um novo

passo no processo descentralizador[260]

daAdministração Pública, que se diferencioudos anteriores pela visível postura de maiordesvinculação de suas decisões frente apressões políticas, como também à tentativade redirecionamento da política regulatóriapara os interesses dos usuários dos serviços

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concedidos, permitidos ou simplesmentefiscalizados.

A inserção dos serviços em um re-gime especial, que partilha a competiçãocom os desígnios sociais, fez com que asagências reguladoras brasileiras desempen-hassem três tipos de regulação: regulaçãodos serviços públicos, que são de titularidadedo Estado; regulação das atividades econ-ômicas stricto sensu, que são de titularidadedos particulares; e regulação social, medi-ante vinculação do setor ao dever de general-idade dos serviços, de cumprimento da fun-ção social da propriedade afeta ao serviço, oumesmo, de potencialização do uso de benspúblicos essenciais ao serviço regulado.Como se pode notar, as categorias regulatóri-as variam, mormente segundo critérios deescopo da atividade reguladora: regional,geral, setorial, sobre serviços públicos, sobreatividades econômicas em sentido estrito,

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rumo à princípios de regulação social, dentreoutros.

A singularidade das agências reg-uladoras na estrutura administrativa doEstado brasileiro não está isolada comopolítica pública, mas inserida no flanco deum movimento de objetivos maisabrangentes, cuja compreensão é exigidapara formação de visão multifacetada sobreeste fenômeno estatal.

Por detrás da criação das agênciasreguladoras, há política pública voltada àconsecução de medidas que aumentem a at-ratividade do mercado brasileiro para o fin-anciamento de infraestrutura. Em outras pa-lavras, a introdução do modelo de agênciasreguladoras na Administração Públicabrasileira resultou da identificação de um dé-ficit de regulamentação traduzido nos

seguintes aspectos[261]

, cuja concretizaçãopersegue: política tarifária definida e estável;

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marcos regulatórios mais claros, que detal-hem as relações entre os diversos atores decada setor, seus direitos e obrigações;mecanismo ágil e eficiente para a solução dedivergências e conflitos entre o poder con-cedente e a concessionária; garantias contraos riscos econômicos e políticos dos investi-mentos em setores econômicos. Ditos aspec-tos contribuíram para a criação de entes reg-uladores setoriais dotados de atributos de es-pecialidade, imparcialidade e autonomia de-cisória. As novas características de maiorautonomia e promoção dos interesses dosusuários são, portanto, comumente esclare-cidos por sua motivação de aproximação aomercado e de incentivo à competição, argu-mentos estes que fugiriam à tradição

jurídico-institucional brasileira.[262]

O modelo adotado na década de1990, no Brasil, entretanto, não se rende adita simplificação. Nem mesmo a afirmação

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de semelhança entre dito modelo e o pratic-

ado nas commissions[263]

norte-americ-

anas[264]

, inicialmente esboçadas nas cha-

madas railroad commissions[265]

, é convin-cente, já que o pressuposto existente nomodelo brasileiro de titularidade de grandegama de atividades prestacionais pelopróprio Estado não encontra, segundo umaabordagem jurídico-formal, similar nomodelo norte-americano.

Pode-se, entretanto, afirmar queas agências reguladoras servem como mode-lo regulador alternativo à regulação pelopróprio mercado ou à regulação por inter-médio de contratos administrativos. Asagências reguladoras vieram nesse contextode satisfação da demanda por prestação deserviços públicos e fiscalização de serviçosprivados mediante regulação. Enfim, o mod-elo brasileiro de agências reguladoras

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assimila, em uma mesma estrutura adminis-trativa, duas formas de regulação de setores,quais sejam: controle de andamento dasatividades setoriais pelas agências; transfer-ência da prestação dos serviços públicos deum determinado setor para empresas priva-das e sua consequente regulação por inter-médio de contratos administrativos acom-panhados pari passu por estruturas dotadasde conhecimento técnico.

O ano de 1995 foi decisivo para in-trodução do modelo de agências reguladorasno Brasil e a Lei Geral de Concessões e Per-missões (Lei 8.987, de 13 de fevereiro de1995) foi um marco fundamental, que, coer-ente com o Plano Diretor da Reforma doAparelho do Estado proposto pelo Executivoem 1995, determinou, no seu art.29, I, ser in-cumbência do poder concedente regular efiscalizar o serviço concedido e, no art.30,previu que a fiscalização do serviço seriafeita por órgão técnico do poder concedente

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ou por entidade com ele conveniada e, peri-odicamente, por comissão composta por rep-resentantes do poder concedente, da conces-sionária e dos usuários. Um parêntese pararetomada do tema das comissões, que emnada se aproximam das commissions norte-americanas, para que se evidencie que, noBrasil, elas têm caráter de ajuste periódicodos interesses em jogo, possibilitando umambiente interativo de construção desoluções e de levantamento de problemas.Afiguram-se, portanto, em meio de sensibil-ização da agência reguladora para questõesrelevantes na óptica dos partícipes do pro-cesso, como também em meio para alcancede consenso na diversidade.

Não foi somente a Lei Geral deConcessões e Permissões que marcou o anode 1995. As modificações constitucionais fo-ram decisivas e transpareceram,basicamente, não-discriminação entre capit-al nacional e internacional aliado à abertura

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para o controle privado de atividades antesreservadas ao Estado, como a possibilidadede concessão dos serviços locais de gás can-alizado (Emenda Constitucional n. 5, de 15/08/95), a extinção do tratamento diferen-ciado dado às antes consideradas empresasbrasileiras de capital nacional (EmendaConstitucional n. 6, de 15/08/95), a retiradada referência constitucional à predominânciade armadores nacionais e navios de bandeirae registros brasileiros e à reserva da nave-gação de cabotagem e da navegação interioràs embarcações nacionais (Emenda Con-stitucional n. 7, de 15/08/95), a possibilid-ade de concessão, permissão e autorizaçãode serviços de telecomunicações não maistaxados, a priori, de públicos, juntamentecom a previsão de criação de um órgão regu-lador do setor (Emenda Constitucional n. 8,de 15/08/95) e a retirada da proibição diri-gida à União de conceder qualquer tipo departicipação na exploração de jazidas de

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petróleo ou gás natural simultaneamente àintrodução da previsão de órgão reguladordo monopólio de pesquisa e lavra de jazidasde petróleo e gás natural, de refinação dopetróleo, sua importação, exportação e trans-porte (Emenda Constitucional n. 9, de 09/11/95).

Todas essas modificações imple-mentadas pela política pública setorial fizer-am com que o sistema brasileiro de regu-lação migrasse do modelo de estruturas in-tegrantes dos respectivos Ministérios ou daPresidência da República, com dependênciaorçamentária e decisória, para um modelopautado progressivamente na titularidade deinstrumentos de regulação e fiscalização set-orial por parte de autarquias especiais, comorçamentos próprios e relativa autonomia

financeira do Poder Executivo.[266]

Dessas considerações prelimin-ares resulta a identificação das agências

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reguladoras brasileiras como formas de reg-ulação setorial com personalidade de direitopúblico interno, e função normativa secun-dária, que excepcionalmente exteriorizamcaráter operacional, como no caso do mecan-ismo da intervenção, revelando a finalidadede fiscalização da prestação dos serviçospúblicos concedidos ou permitidos, dos bensescassos correspondentes e das atividadesprivadas afins.

As agências reguladoras brasileir-as passaram por um processo de especializa-

ção.[267]

Elas transpareceram a especializa-ção funcional exigida por seu objeto de anál-ise e, assim, compõem a equação de edi-ficação do correspondente subsistema

jurídico.[268]

Existem, no Brasil, agências fede-rais, estaduais ou municipais, de acordo coma competência político-administrativa do

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poder concedente. Visualizando-as a partirda especialização funcional, as agênciasfederais apresentam-se, hoje, como setoriais,remetendo-se aos setores de telecomu-nicações, energia elétrica, petróleo e gásnatural, vigilância sanitária, saúde suple-mentar, recursos hídricos, transportes ter-restres, transportes aquaviários, dentre out-ros. No campo estadual e municipal,inaugurou-se uma maior presença de agên-

cias de regulação geral, como a ADM[269]

,embora convivendo com agências setoriais,

como a AMSS[270]

e a CSPE[271]

, ou

mesmo, multissetoriais[272]

, tais como

ASEP[273]

, AGERGS[274]

, ARCE[275]

,

ARCON[276]

, ARSEP[277]

e AGERBA[278]

.O modelo estadual tende a formar núcleos decompetência setorial específicas em razão desua potencial relação de fomento com a

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União, já que, no modelo brasileiro, a ativid-ade reguladora vinculada à gestão dos ser-viços públicos pode ser transferida da Uniãopara os Estados-Membros da Federação por

intermédio de convênio[279]

, em face nodisposto no art. 241 da Constituição Federalbrasileira de 1988, com redação dada pelaEmenda Constitucional nº19/98, que autor-iza a gestão associada de serviços públicos,bem como a transferência total ou parcialde encargos, serviços, pessoal e bens essen-ciais à continuidade dos serviços trans-feridos. A possibilidade de convênio, no ent-anto, depende da existência de lei, autoriz-ando a gestão associada dos serviços preten-didos, como ocorre com o setor de energia

elétrica, em que a lei regente[280]

permite aexecução das atividades complementares deregulação, controle e fiscalização dos ser-viços e instalações de energia elétrica pelosEstados e pelo Distrito Federal, mediante

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convênio de cooperação. O convênio, por suanatureza, não transfere a titularidade do ser-viço do ente regulador, que pode retomá-lo aqualquer momento, exigíveis as devidascompensações.

A partir do momento em que fo-ram introduzidas no modelo regulatóriobrasileiro, as agências reguladoras fizeramaflorar o conceito de otimização funcional,que vem exigir dois requisitos para sua im-

plementação[281]

: autonomia da agênciareguladora; e escolha de instrumentos queincentivem a eficiência produtiva e alocativa.Fala-se muito em independência da agênciareguladora, cuja origem tem como referêncianatural a distinção da doutrina norte-amer-icana entre as regular ou oldline agencies e

as independent agencies[282]

, mas paramaior precisão terminológica, o ideal seria autilização do conceito de autonomia, maiscondizente com a necessária interpenetração

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estrutural do Estado.[283]

Tal autonomianão deve ser entendida como arbítrio docolegiado decisório – autonomia sem vínculofinalístico. Ela é exatamente definida peloseu fim de promoção do interesse públicovisualizado preponderantemente, quanto aosserviços, no interesse do usuário e da so-ciedade e, quanto à política industrial, de umlado, na eficiência da atividade regulada e deoutro, na vinculação da atividade ao fim deincremento do espaço público. Estes fatores,sob um ponto de vista jurídico, prevalecemsobre outros objetivos de maximização dolucro e concentração de empresas emsetores mais rentáveis do mercado, doponto de vista das prestadoras, e maximiza-ção das receitas fiscais, do ponto de vista do

Estado.[284]

A autonomia característica dasagências reguladoras não se restringe à idéiaabstrata de menor vinculação política. Ela

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demanda conformações estruturais e organ-izações concretas, que se manifestam na per-sonalidade de direito público interno, naautonomia de objetivos, de instrumentos,orçamentária, financeira e na autonomiadecisória, que engloba o processo de in-dicação e inamovibilidade de seus membrose irrecorribilidade das suas decisões.

O primeiro passo para visualiza-ção de um grau de independência das agên-cias está na sua natureza jurídica de pessoade direito público interno, revelando, assim,seu destaque da Administração direta comoautarquia federal, estadual ou municipal,conforme o ente político – União, Estados-Membros, Distrito Federal ou Municípios – aque estiver ligada.

Argumentos como o descrédito dodirigismo estatal absoluto, a ineficiência ecomprometimento político das atividadesdesempenhadas pelas empresas estatais e aspressões internacionais de abertura dos

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setores econômicos são carregados de pre-concepções de mundo que valorizam um dosinúmeros aspectos exaltados no momentohistórico da opção pela introdução das agên-cias reguladoras na década de 1990 noBrasil. Eles teriam feito com que uma das ca-racterísticas apontadas ou desejadas para asagências reguladoras fosse a sua autonomiado poder público central.

Pode-se enunciar, ainda, comooutra causa da autonomia das agênciasfrente ao poder público central, a busca porum espaço público, cuja presença somentepode ser sentida quando este não se con-funde com os interesses de governo. Ao con-trolar o órgão regulador, a AdministraçãoDireta do Estado faz prevalecer o interessepolítico sobre a eficiência e qualidade daprestação do serviço, sobre o próprio in-teresse público de modicidade das tarifas esobre o interesse público no equilíbrio da re-lação. Apesar da fluidez das análises

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esboçadas, sob quaisquer dos pontos de vistacitados, a questão da autonomia de gestão daagência reguladora apresenta-se como apedra de toque do modelo idealizado noBrasil.

Independentemente do acerto ouequívoco das afirmações anteriores, o fato éque a estrutura desenhada para regulaçãosetorial, no Brasil, permitiu a fixação de umesquema de forças quadripartite: a)produtor da utilidade pública; b) usuário/consumidor; c) Poder Público detentor darede essencial à prestação do serviço ou titu-lar do monopólio de exploração e, final-mente; d) o próprio ente regulador. O mode-lo brasileiro posicionou a agência reguladoraem local equidistante dos outros três atoresdo esquema de relativa autonomia. O enteregulador pode sobrevalorizar um dos outrostrês componentes, mas o fará sob pena deperder sua condição de espaço público dediscussão e contato entre os atores setoriais

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e, portanto, em detrimento da credibilidadeperante os demais atores preteridos. Opróprio esquema de forças vem simplificadoao extremo, pois não contempla a distinçãointestina de interesses, por exemplo, aospróprios usuários/consumidores, já que háusuários e consumidores efetivos e potenci-ais; há usuários e consumidores assinantes eeventuais. Por exemplo, os usuários e con-sumidores efetivos detêm o interesse naturalde diminuição tarifária, que poderá levar adiminuir o ritmo de expansão do serviçopara aqueles que ainda não o alcançaram,contrastando, assim, com o interesse dos

usuários e consumidores potenciais.[285]

A complexidade do esquema deforças e, em certos setores, como o de tele-comunicações, energia, petróleo e saúde, doexpressivo peso do poder econômico,aumenta a preocupação com o conhecidorisco de captura da agência pelo setor

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regulado. O esforço em se evitar que as agên-cias passassem a fazer às vezes de meras pro-motoras do sucesso econômico do setor reg-ulado em detrimento dos valores públicosque as justificaram não necessariamente res-ultou na conformação dos mecanismos decontrole social visualizados nas agências dadécada de 1990, mas serve como aceno decomposição do modelo de regulação setorialpara um viés de publicização das discussões.

Aqui, a valorização do controle social[286]

previsto nas estruturas centrais de decisão

das agências reguladoras.[287]

3.3.4 AUTONOMIA DAS AGÊNCIASREGULADORAS

No tocante à relação entre a agên-cia reguladora e o poder público, existem as-pectos reveladores do seu grau de auto-nomia, que auxiliam na compreensão domodelo regulador brasileiro. São eles: o

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processo de indicação dos membros da agên-cia e de seu afastamento; autonomia orça-mentária e financeira; garantia de inamovi-bilidade de seus membros; irrecorribilidadedas decisões de sua competência na esferaadministrativa; reserva de poderes normat-ivos suficientes à adequação das metas setor-iais à dinâmica de cada atividade.

Iniciando por esse último índicede autonomia, o poder normativo das agên-cias reguladoras tratado acima costuma seracusado de usurpar função reservada aoPoder Legislativo. Poder normativo da Ad-ministração Pública somente pode existir soba égide da submissão das atividades dasagências reguladoras à lei, ou seja, à normat-ização primária. Assim, o poder normativoda agência reguladora não pode ser conver-tido em criação normativa independente danorma primária sobre a qual se apoia. Poroutro lado, a constitucionalidade da lei at-ributiva de poder normativo à agência

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reguladora correspondente dependerá daprevisão simultânea de “standards sufi-cientes” capazes de afastarem a acusação de“delegação pura e simples de função legis-

lativa”[288]

.

Ao lado da reserva de poderesnormativos suficientes à otimização dos in-teresses envolvidos na regulação setorial, ex-istem outros índices úteis a evitar que aagência seja sufocada pela exiguidade de es-paço para promoção de estratégias setoriais.

Os títulos de independência deuma agência reguladora que a qualificamcomo tal são: independência decisória, inde-pendência de objetivos, independência deinstrumentos e independência financeira.Destacando-se das nuanças cotidianas daspolíticas de governo, o Estado implementapolíticas públicas por intermédio das agên-cias, mas estas não se podem tornar

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instrumentos do jogo político em particu-

lar.[289]

A independência decisória con-siste em dar condições para que a agênciareguladora resista às pressões de grupos deinteresse, mediante procedimento compartil-hado de nomeação dos dirigentes com parti-cipação necessária do Executivo e Legislativoe fixação de mandatos de longo prazo escal-onados e não coincidentes com o períodoeleitoral. Associado a isso, encontram-se re-gras legais definidoras das formas de perdados cargos de direção da agência, visandoafastá-la, ao máximo, de interferências in-desejáveis por parte do governo ou da in-

dústria regulada.[290]

Esse quadro de pro-teção expressa dos cargos decisórios dasagências reguladoras podia ser visto na legis-lação de telecomunicações, em que, paraproteção do mandato de seus dirigentes, es-tipulava, até sua alteração pela Lei 9.986, de

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18 de julho de 2000, que somente podiamperdê-lo em razão de renúncia, condenaçãojudicial transitada em julgado ou processo

administrativo disciplinar.[291]

A decisão colegiada produz, emtese, os efeitos já mencionados da colegialid-ade de funções, atomizando a responsabilid-ade e impondo maior discussão e oportunid-ade de participação dos interessados naquestão mediante mecanismos de consultapública. As decisões do colegiado não estãosujeitas à revisão na esfera administrativa,submetendo-se, entretanto, à cláusula pétreabrasileira de inafastabilidade da jurisdição.

Para o fechamento do modelo, asregras de preenchimento dos cargos dedireção das agências prevêem mecanismosde isenção dos seus ocupantes frente aos in-teresses privados tutelados, tais como regrasproibitivas de vínculos dos diretores das

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agências com os setores regulados[292]

e re-gras de incompatibilidades de mandatos, queimponham exclusividade na função dirigente

da agência[293]

. Um dos mecanismos deproteção das agências reguladoras contra aconfusão entre interesses privados e osdesígnios públicos reguladores encontra-sena quarentena, que visa impedir o recruta-mento imediato de dirigentes das agênciaspelo setor regulado mediante custeio inden-izatório do período em que os ex-dirigentesdas agências permanecem tolhidos do pleno

desempenho de suas atividades.[294]

Quanto à possibilidade de exoner-ação dos diretores das agências reguladoras,o Supremo Tribunal Federal brasileiropronunciou-se liminarmente sobre aquestão, posicionando-se pela impossibilid-ade de interferência unilateral legislativa naexoneração de dirigentes de agência

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reguladora[295]

, exigindo-se, no entanto,justo motivo para afastamento de dirigentede agência pelo Chefe do Executivo em vir-tude da fixação de mandato por lei e daforma complexa de nomeação com parti-cipação dos poderes Executivo e Legislativo.

Independência de objetivos signi-fica a determinação das finalidades da agên-cia em lei, afastando-a da hierarquia admin-istrativa quanto à identificação de pautas deconduta. Eventualmente, essa autonomiapode vir a ser ampliada mediante um con-

trato de gestão.[296]

Ainda, a independência de instru-mentos implica o fornecimento de um rol demeios para que a agência reguladora possadosar a aplicação de sanções com os objet-ivos perseguidos. A presença da hipótese defixação de multas, de tarifas, extinção daconcessão, permissão ou autorização e

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intervenção na prestadora de serviço públicoevidencia a preocupação normativa com adisponibilidade de instrumentos eficazespara atuação direcionada às peculiaridadesde cada caso.

Finalmente, a independênciafinanceira manifesta-se na presença de re-cursos materiais e humanos compatíveis comas finalidades a serem atingidas pela agênciareguladora. Ela é alcançada, em geral, com afixação de taxas de fiscalização, preços deutilização de bens escassos e percentuais detarifas para formação de fundos geridospelas agências. Mesmo presentes tais entra-das de recursos, tem-se verificado a fragilid-ade de tal independência, tendo-se em vistaque, na dinâmica brasileira de orçamento in-dicativo, há possibilidade de contingen-ciamento de recursos pelo Executivo.

Há, ainda, dois conceitos que de-vem ser levados em conta para análise daprogressiva autonomia das agências

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reguladoras e seus limites. Diferencia-sedoutrinariamente autonomia de autorregu-lação. A autorregulação é caracterizada pelagestão de uma atividade pelos próprios regu-

lados.[297]

Dar autonomia a um ente dedireito público interno autárquico para queregule um âmbito de atividades de sua com-petência é sensivelmente diferente de se pre-ver a gestão de atividades pelos próprios reg-ulados. No Brasil, o setor de comunicação demassa e o setor postal resistem à regulaçãonormativa centralizada acenando com os be-nefícios da autorregulação. A substituição daexorregulação – regulação pelo Estado –pela autorregulação sofre críticas doutrinári-as por levarem à “institucionalização de

autênticas corporações de ofício”[298]

, o queafastaria das instituições de autorregulação oaspecto de espaços públicos.

O limite da autonomia de setoresregulados apresenta-se no conceito de

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autorregulação, que não condiz com o poderde polícia exercido pelas agências regulador-

as.[299]

Estas exercem regulação de

caráter público[300]

, mas inseridas em am-biente autônomo.

O fato de um ente público terautonomia não desvirtua seu caráter público,pelo contrário, o enfatiza mediante sua is-enção de interesses políticos momentâneosem nome de interesses políticos perman-entes plasmados no texto constitucional e re-produzidos na legislação infraconstitucional.A crítica à progressiva autonomia das agên-cias reguladoras seria pertinente se a inde-pendência fosse total. Por isso, embora a le-gislação setorial brasileira, em geral, fale emindependência, o termo jurídico mais apro-priado será sempre autonomia regulatória.

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SOBRE O AUTOR

Marcio Iorio Aranha é professor efetivo de Direito Constitu-

cional e Administrativo da Faculdade de Direito da Univer-

sidade de Brasília e Visiting Fellow na Annenberg Research

Network on International Communication da University of

Southern California (ARNIC/USC). Ele é vice-presidente da

Americas Information and Communications Research Net-

work (ACORN-REDECOM), diretor do Núcleo de Direito

Setorial e Regulatório (www.ndsr.org) e coordenador de

área jurídica do Centro de Políticas, Direito, Economia e

Tecnologias das Comunicações da Universidade de Brasília,

onde edita a Revista de Direito, Estado e Telecomunicações

(http://www.getel.org/GETELSEER/index.php/rdet).

Email: [email protected]. Personal website:

www.marcioaranha.com.

ABOUT THE AUTHOR

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Page 316: DIREITO REGULATÓRIO

Marcio Iorio Aranha is tenured Professor of Constitutional

and Administrative Law in the School of Law at the

University of Brasilia and Visiting Fellow at the Annenberg

Research Network on International Communication at the

University of Southern California (ARNIC/USC). He is vice-

president of the Americas Information and Communica-

tions Research Network (ACORN-REDECOM). He coordin-

ates the Center for Sectorial and Regulatory Law

(www.ndsr.org) and is the principal law researcher at the

Center for Communication Policy, Law, Economics, and

Technology (CCOM/UnB), where he is the editor of Law,

State and Telecommunications Review

(http://www.getel.org/GETELSEER/index.php/rdet).

Email: [email protected]. Personal website:

www.marcioaranha.com.

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IMPRESSÃO E DISTRIBUIÇÃO

Amazon

Scotts Valley, California

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[1]Vide KELSEN, Hans. Reine

Rechtslehre. Einleitung in die recht-swissenschaftliche Problematik. Viena:Franz Deuticke, 1934.[2]

Evidenciando o conceito de poder con-stituinte francês como aquele que in-troduzira o Estado como fenômeno da ordemjurídica, vide: ZWEIG, Egon. Die Lehrevom “Pouvoir Constituant”: EinBeitrag zum Staatsrecht des französ-ischen Revolution. Tübingen: J. C. B.Mohr/Paul Siebeck, 1909. Sob o enfoque in-stitucionalista, entendendo o Estado comoente ou instituição jurídica, vide: ROMANO,Santi. Princípios de direito constitu-cional geral. Trad. Maria Helena Diniz, SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 1977, p. 61. Noâmbito da teoria da constituição, afirmandoque o Estado só se concebe hoje comoEstado Constitucional, vide: CANOTILHO,

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J. J. Gomes Canotilho. Direito constitu-cional e teoria da constituição. 7ª ed.,Coimbra: Almedina, 2003, p. 92.[3]

“O poder no sentido social ou político im-plica autoridade e uma relação entre o super-ior e o inferior (...) O poder do Estado é opoder organizado pelo direito positivo – é opoder da lei, ou seja, a eficácia do direitopositivo.” (KELSEN, Hans. General The-ory of Law and State. Trad. Anders Wed-berg. Cambridge: Harvard University Press,1945, p. 190).[4]

Vide OLIVEIRA, Régis Fernandes de.Delegação administrativa. São Paulo:Revista dos Tribunais, 1986, p. 17.[5]

Vide LABAREE, Benjamin Woods. TheBoston Tea Party. Boston: NortheasternClassics, 1979.[6]

Vide JONHSTON, David Cay. The Fine Print. NewYork: Penguin, 2012, p. 23.

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[7]Vide ARANHA, M. I. Interpretação

constitucional e as garantias institu-cionais dos direitos fundamentais. SãoPaulo: Atlas, 1999.[8]

O direito não mais se restringe a ordenarsituações estruturais, voltando sua atençãopara a “regulação de situações conjunturais,o que impõe sejam as normas dotadas deflexibilidade e estejam sujeitas a contínua re-visibilidade” (GRAU, Eros Roberto. Odireito posto e o direito pressuposto.

3a ed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 23.Conferir também: p. 86; 88-89; 136-139).[9]

WALDO, Dwight. The AdministrativeState: A Study of the Political Theoryof American Public Administration.New Brunswick (USA): Transaction Publish-ers, 2007, p. 93.[10]

BOLINGBROKE, Henry St John, Vis-conde de. The Idea of a Patriot King. p. 381.

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In: The Works of Lord Bolingbroke.Philadelphia: Carey and Hart, 1841, p.372-429.[11]

Idem, p. 380.[12]

MONTESQUIEU, Charles Louis de Se-condat, baron de la Brède et de. O espírito

das leis. 2a ed., Brasília: Editora Universid-ade de Brasília, 1995.[13]

Vide GRAU, Eros Roberto. O direitoposto e o direito pressuposto. 3ª ed.,São Paulo: Malheiros, 2000.[14]

A noção de expressão primária e secun-dária da função política fora aprofundadapor Goodnow, em 1900, quando ele identi-ficou a presença da função política em doisgraus: o primário, de decisão sobre a vontadedo Estado; e secundário, de execução davontade do Estado. Vide: GOODNOW, F. J.Politics and Administration. New York:The Macmillan Co., 1900.

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Page 323: DIREITO REGULATÓRIO

[15]MADISON, James; HAMILTON, Alexan-

der; JAY, John. The Federalist Papers.New York: New American Library, 1961(1787-1788, Federalist nº 47), p. 303.[16]

Vide SCIGLIANO, Robert. The Two Ex-ecutives: The President and the SupremeCourt. p. 277-293. In: LAWLER, Peter A.;SCHAEFER, Robert M. (org.). The Americ-an Experiment: Essays on the Theoryand Practice of Liberty. Lanham, MD:Rowman and Littlefield, 1994, p. 285-286.[17]

Vide SCIGLIANO, Robert. The Two Ex-ecutives: The President and the SupremeCourt. p. 277-293. In: LAWLER, Peter A.;SCHAEFER, Robert M. (org.). The Americ-an Experiment: Essays on the Theoryand Practice of Liberty. Lanham, MD:Rowman and Littlefield, 1994, p. 111-117.[18]

Vide GULICK, Luther; LYNDALL, Ur-wick (coord.). Papers on the Science of

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Vide CROLEY, Steven P. Regulationand Public Interests: The Possibilityof Good Regulatory Government. Prin-ceton: Princeton University Press, 2008, p.14.[20]

Vide BAKUNIN, MikhailAleksandrovich. Statism and Anarchy.Trad. Marshall Sharon Shatz, Cambridge:Cambridge University Press, 2002.[21]

Vide KROPOTKIN, Peter Alekseevich.Anarchism: a collection of revolution-ary writings. Mineola (N.Y.): DoverPublications, 2002.[22]

“Devemos selecionar dentre aqueles ho-mens [guardiães e auxiliares] uns poucospara serem governantes (...)” (GROTE, Ge-orge (org.). Plato and the other

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Page 325: DIREITO REGULATÓRIO

companions of Socrates. Vol. III, Lon-don: John Murray, 1865, p. 56).[23]

Vide ANDERSON, Fulton H. (org.).Francis Bacon: The New Organon andRelated Writings. Indianapolis: TheBoobs-Merrill Company, 1960.[24]

“(...) o poder arbitrário, sendo exercidopela própria sociedade, geraria as maioresinconveniências (...) [A lei suprema da razão]exclui igualmente a arbitrariedade da teolo-gia, os direitos divinos dos reis, a arbitrar-iedade da metafísica e a soberania do povo.”(LENZER, Gertrud (org.). Auguste Comteand Positivism: The Essential Writ-ings. 5ª ed., New Brunswick (N.J.): Trans-action, 2009, p. 49-50).[25]

Vide RILEY, Patrick (org.). Bossuet:Politics Drawn from Holy Scripture.Cambridge: University of Cambridge Press,1999.

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Page 326: DIREITO REGULATÓRIO

[26]Vide SOMMERVILLE, Jóhann P. (org.).

Filmer: Patriarcha and Other Writ-ings. Cambridge: University of CambridgePress, 2000.[27]

Vide LOCKE, John. Two Treatises ofGovernment. London: Whitmore andFenn, 1821.[28]

Vide BROWNE, Stephen H. Speech tothe Electors of Bristol: The Space of Rethor-ical Virtue, p. 67-81. In: Edmund Burkeand the Discourse of Virtue. Tuscaloosa:The University of Alabama Press, 1993.[29]

MACHIAVELLI, Niccolò. Comentáriossobre a primeira década de Tito Lívio:Discorsi. Trad. Sérgio Bath, 3ª ed., Brasília:Editora Universidade de Brasília, 1994.[30]

O uso da expressão Estado Trabalhador– workers’ state – é significativa para apresente análise, quando Marx responde à

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crítica de Bakunin a um governo do prolet-ariado: “Ele [Bakunin] deveria ter se pergun-tado: que forma podem assumir as funçõesadministrativas em um Estado trabalhador,se lhe agrada chamá-lo assim?”(McLELLAN, David. Karl Marx: SelectedWritings. Oxford: Oxford University Press,1982, p. 563).[31]

Vide SCHMITT, Carl. Sobre el parla-mentarismo. Trad. Thies Nelsson e RosaGrueso, 2ª ed., Madrid: Editorial TECNOS,1996.[32]

Vide KELSEN, Hans. ¿Quién debe serel defensor de la Constitución? Trad.Roberto J. Brie, 2ª ed., Madrid: EditorialTECNOS, 1999.[33]

Vide GUIZOT, M. Histoire des ori-gines de gouvernement représentatifen Europe. Tomo I. Bruxelles: Wouters,1851.

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Page 328: DIREITO REGULATÓRIO

[34]Vide ARENDT, Hannah. Sobre a Re-

volução. Lisboa: Relógio D’Água Editores,2001.[35]

Vide WALDO, Dwight. Op. cit., p.89-103.[36]

Vide ARANHA, M. I. Políticaspúblicas comparadas de telecomu-nicações (Brasil-EUA). Tese de Doutor-ado: CEPPAC (UnB), 2005.[37]

Vide OLIVEIRA, Artur Coimbra de. Re-publicanismo, instituições e a ingestãode normas internacionais por setoresregulados brasileiros. Dissertação deMestrado: Faculdade de Direito (UnB),2011.[38]

Vide GÉRANDO, Joseph-Marie de. In-stitutions de Droit Administratif. Par-is: Librairie de la Cour de Cassation, 1829.

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Page 329: DIREITO REGULATÓRIO

[39]Vide MACAREL, Louis Antoine. Élé-

ments de Droit Politique. Paris: Librairiede la Cour de Cassation, 1833.[40]

Vide CORMENIN, Barão de. Questionsde Droit Administratif. Paris: Chez M.Ridler, 1822.[41]

Vide CASTRO, Marcus Faro de. Violên-cia, medo e confiança: do governo misto àseparação dos poderes. In: RevistaForense 382: 157-180, novembro/dezem-bro de 2005.[42]

TEIXEIRA, Victor Cravo. A trajetóriado poder regulamentar nopensamento político francês e seus re-flexos no Brasil: um olhar para alémdos manuais jurídicos. Dissertação deMestrado: Faculdade de Direito (UnB), 2012,p. 102.

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Page 330: DIREITO REGULATÓRIO

[43]Vide LAFERRIÈRE, Édouard. Traité

de la Jurisdiction Administrative etdes Recours Contentieux. Tomo I. Paris:Berger-Levrault et Cie, 1896.[44]

Vide HAURIOU, Maurice. Précis deDroit Administratif et de Droit PublicGénéral. Paris: L. Larose, 1900.[45]

DUGUIT, Léon. Les transformationsdu Droit Public. Paris: Librairie ArmandColin, 1913, p. 88.[46]

MOREAU, Félix. Le Règlement Ad-ministratif. Étude Théorique etPratique de Droit Public Français. Par-is: Albert Fontemoing, 1902, p. 2.[47]

Vide JÈZE, Gaston. Le Réglement Ad-ministratif. In: Revue Généraled’Administration, p. 6-22, maio de 1902.

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[48]SUNDFELD, Carlos Ari. Serviços públi-

cos e regulação estatal, p. 17-38. In: Idem(org.). Direito Administrativo Econ-ômico. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 30.[49]

Vide DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.Parcerias na Administração Pública:concessão, permissão, franquia, terce-irização e outras formas. 3ª ed., SãoPaulo: Atlas, p. 25.[50]

Sueli Dallari sintetiza os usos do termo apartir do século XVIII: “O conceito de regu-lação, no século XVIII, está ligado à técnica,expressando um sistema de comando desti-nado a manter constante o valor de umagrandeza, quaisquer que sejam as perturb-ações que a possam fazer variar, como, porexemplo, o termostato. No século XIX, ele sedifunde pela fisiologia, significando osequilíbrios dinâmicos do corpo, e, assim,definem-se seus traços essenciais: ‘manter

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um ambiente equilibrado; apesar das per-turbações exteriores, graças a um conjuntode ajustamentos’. Seu uso só se disseminanas ciências sociais, entretanto, durante oséculo XX, sob influência do desenvolvi-mento da cibernética, que implica sempreum mecanismo de auto-regulação, per-mitindo aos sistemas organizados corrigirsuas ações por meio das informações sobreseus resultados recebidas do ambiente. É,então, a teoria dos sistemas que irá se in-troduzir na teoria das organizações, na eco-nomia, na sociologia, na ciência política e nodireito.” (DALLARI, Sueli. Direito Sanitário.p. 57-58. In: ARANHA, M. I. (org.). DireitoSanitário e Saúde Pública. Vol. I,Brasília: Ministério da Saúde, 2003, p.39-64).[51]

Vide AUTIN, J. L. Refléxions sur l’usagede la régulation en droit publique. In:MIAILLE, M. La régulation entre droitet politique. Paris: L’Harmattan, 1995.

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[52]Afirmando que “a linguagem e a prática

da regulação têm ingressado, nas últimastrês décadas [1980, 1990 e 2000], na lin-guagem da política pública, do direito e daeconomia” (BALDWIN, Robert; CAVE,Martin; LODGE, Martin. (org.). Regulation:The Field and the Developing Area, p. 3-16.In: The Oxford Handbook of Regula-tion. Oxford: Oxford University Press, 2010,p. 4).[53]

OGUS, Anthony I. Regulatory Law:Some Lessons from the Past. In: LegalStudies (London) 12(1): 1-19, 1983, p. 1.[54]

Vide ELTON, Geoffrey Rudolph. TheTudor Revolution in Government: Ad-ministrative Changes in the Reign ofHenry VIII. Cambridge: CambridgeUniversity Press, 1953.[55]

Vide BEVIR, Mark; TRENTMANN,Frank (org.). Markets in Historical

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Contexts: Ideas and Politics in theModern World. Cambridge: CambridgeUniversity Press, 2004.[56]

A afirmação transcrita a seguir é um ex-emplo desse uso indevido do termo ‘planeja-mento’ como sinômino de um formato es-tatal superado pelo Estado Regulador: “Priv-atization and deregulation have created theconditions for the rise of the regulatorystate to replace the dirigiste state of thepast. Reliance on regulation – rather thanpublic ownership, planning or centralizedadministration – characterises the methodsof the regulatory state.” (MAJONE, Giando-menico. The Rise of the Regulatory State inEurope. In: West European Politics17(3): 77-101, Julho de 1994, p. 77.)[57]

Vide PINTO, Álvaro Vieira. O conceitode tecnologia. Vol. I, Rio de Janeiro: Con-traponto Editora, 2005.

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[58]Moran elenca os principais autores e

obras inaugurais do Estado Regulador queutilizam o linguajar da ciência política. Emseu estudo, a regulação, em sua dimensão dehistória institucional, é definida como uma“tecnologia administrativa de controle denegócios por intermédio de agências espe-cializadas e apoiadas em leis específicas emoposição ao controle via técnica de pro-priedade estatal” (MORAN, Michael. ReviewArticle: Understanding the RegulatoryState. In: British Journal of PoliticalScience 32: 391-413, 2002, p. 392).[59]

As agências são um “bem de produção deordem superior”, na terminologia de VieiraPinto (PINTO, A. V., op. cit., p. 112). Elasproduzem bens de produção de ordem ele-mentar de controle e incentivo de setores daeconomia. Ao se identificar a agência regu-ladora como um bem vital a setores daeconomia, opta-se, na lógica regulatória, por

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uma das manifestações da libertação hu-mana à medida que o processo histórico deconstituição das agências reguladoras lhesimprime com o esforço material e mental ne-cessário à sua institucionalização. As agên-cias são mediações entre o ser humano e suacontradição natural para alteração da realid-ade via esse engenho humano. Assim, asagências são essenciais para a regulaçãomoderna pois se constituem na configuraçãohistórico-institucional de como, no EstadoRegulador, a sociedade optou por mediar suarelação com setores da economia.[60]

Vide CROLEY, Steven P. Regulationand Public Interests: The Possibilityof Good Regulatory Government. Prin-ceton: Princeton University Press, 2008.[61]

De acordo com a teoria da public choice,grupos de interesse competiriam por bensregulatórios, ou mais friamente, pela comprade legislação de políticos e burocratas, bem

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como outras medidas regulatórias para o be-nefício de seus interesses privados.[62]

Sobre os clássicos da teoria da publicchoice, vide: BLACK, Duncan. The Theoryof Committees and Elections. Cam-bridge: Cambridge University Press, 1958;DOWNS, Anthony. Uma Teoria Econôm-ica da Democracia. Trad. Sandra GuardiniTeixeira Vasconcelos, São Paulo: Editora daUniversidade de São Paulo, 1999 (Originalde 1957); OLSON, Mancur. The Logic ofCollective Action: Public Goods andthe Theory of Groups. Harvard, 2002(Original de 1965); ARROW, Kenneth J. So-cial Choice and Individual Values. 2ªed., New Haven: Yale University Press, 1963;BUCHANAN, James M.; TULLOCK, Gordon.The Calculus of Consent: LogicalFoundations of Constitutional Demo-cracy. Ann Arbor: University of MichiganPress, 1965.

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[63]Vide ROSE-ACKERMAN, Susan;

LINDSETH, Peter L. (org.). ComparativeAdministrative Law. Cheltenham, UK:Edward Elgar, 2010.[64]

Vide STEWART, Richard B. Regulationand the Crisis of Legalisation in the UnitedStates. In: DAINTITH, Terence (org.). Lawas an Instrument of Economic Policy:Comparative and Critical Ap-proaches. Berlin: Gruyter, 1988, p. 97-133;STEWART, Richard B. Regulation in a Lib-eral State: The Role of Non-Commodity Val-ues. In: Yale Law Journal 92 (1983),1537-1590.[65]

SUNSTEIN, Cass R. After the RightsRevolution: Reconceiving the Regu-latory State. Cambridge, MA: HarvardUniversity Press, 1990, p. 13.

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[66]Vide BRAITHWAITE, John. Crime,

Shame and Reintegration. Cambridge:Cambridge University Press, 1989.[67]

Vide AYRES, Ian; BRAITHWAITE,John. Responsive Regulation: Tran-scending the Deregulation Debate. Ox-ford: Oxford University Press, 1992.[68]

GUNNINGHAM, Neil; GRABOSKY,Peter. Smart Regulation: DesigningEnvironmental Policy. Oxford: Claren-don Press, 1998.[69]

Vide TEUBNER, Gunther. O direitocomo sistema autopoiético. Trad. JoséEngrácia Antunes. Lisboa: Fundação Cal-ouste Gulbenkian, 1989.[70]

Sobre o significado de modernização reflexiva, vide:BECK, Ulrich; GIDDENS, Anthony; LASH, Scott. Modern-ização reflexiva. Trad. Magda Lopes. São Paulo: EditoraUnesp, 1995.

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[71]Vide GONÇALVES, Pedro. Entidades

privadas com poderes públicos. Coim-bra: Almedina, 2005.[72]

Vide COIMBRA, Artur. O papel do ór-gão regulador na resolução de disputasentre operadoras de telecomunicações: aarbitragem e a mediação à luz das exper-iências japonesa, inglesa e americana. In:Revista de Direito, Estado e Telecomu-nicações 1(1): 111-159, 2009.[73]

Vide LEMES, Selma Maria Ferreira. Ar-bitragem na Concessão de Serviços Públicos– Arbitrabilidade Objetiva. Confidencialid-ade ou Publicidade Processual? RDM 134:148-163, abr./jun., 2004.[74]

BRASIL. STJ. Resp 904.813/PR. Relat-ora Min. Nancy Andrighi. 3ª Turma. Julgadoem 20/10/2011. DJe 28/02/2012.

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[75]Não se fala em direção no sentido abso-

luto de crença moderna no devir em detri-mento do ser, mas exatamente na con-statação de que o estudo da normatização decondutas é um processo próprio ao ser sociale não simplesmente de predefinição de con-dutas individuais capazes de, por si só, es-gotarem a realidade. A propósito da per-sistência do ser, no século inaugurador mod-erno (séc. XVII), como categoria maior dopensamento a conviver com a proposta ra-cionalista do devir, vide: BAUMER, FranklinLe Van. O pensamento europeu mod-erno: séculos XVII e XVIII. Vol. I, Lis-boa: Edições 70, 1990, p. 47. Não se pode fu-gir, aqui, entretanto, à crítica de subserviên-cia ao pensamento moderno de substituiçãoda meta contemplativa dos Antigos (de es-tabilidade) por um fim utilitário e ativista(de movimento) dos Modernos, embora tem-perado, nesta exposição, pela compreensãode que a previsibilidade não é o único

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fundamento para o esforço de se influenciara realidade.[76]

Vide BECK, Ulrich. O que é globaliza-ção? Equívocos do globalismo, respostas daglobalização. Trad. André Carone, São Paulo:Paz e Terra, 1999.[77]

Sundfeld define o ‘direito global’ como oque se opõe ao direito doméstico. “O direitoglobal extrapola largamente as fronteiras doEstado Nacional para buscar suas fontestambém fora dele [mas] a simples existênciade órgãos e de fontes normativas inter-nacionais nem constitui novidade nem bastapara caracterizar uma “nova era”. Esta é de-rivada, portanto, não do surgimento, mas daintensificação do fenômeno” (SUNDFELD,Carlos Ari. A Administração Pública na erado direito global. p. 157-158. In:SUNDFELD, Carlos Ari e VIEIRA, Oscar Vil-hena. Direito global. São Paulo: Max Li-monad, 1999, p. 157-168).

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[78]A globalização não é um acontecimento

estanque, é uma “onda que traduz uma novacultura (...) é o produto inevitável do cha-mado ‘efeito demonstração’ derivado dos ex-traordinários avanços da tecnologia”(CHACEL, Julian (org.). A globalização emdebate. p. 5. In: Carta Mensal, Rio deJaneiro, v. 46, n. 546, p. 3-14, set. de 2000).Pode-se identificar a globalização como “umprocesso e não como um fato consumado”(CALDAS, Ricardo W. O Brasil e o mitoda globalização. São Paulo: Celso BastosEditor, 1999, p. 18).[79]

O comentário de Eros Roberto Grau érevelador: “Modernas são a economia ja-ponesa e os regimes de protecionismo econ-ômico interno norte-americano e europeu,que não fazem nenhum exemplo de mercadolivre. De modo que ser moderno, hoje, é nomínimo já ter consciência de que o mercadoé impossível sem uma legislação que o

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proteja e uma vigorosamente racional inter-venção, destinada a assegurar sua existênciae preservação” (GRAU, Eros Roberto. Odireito posto e o direito pressuposto.

3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 92).Ser verdadeiramente moderno é intervir comvigor, força, conhecimento, prospecção, en-fim, é desenhar e implementar políticapública.[80]

“O termo de origem francesa ‘mundializ-ação’ (mondialisation) encontrou di-ficuldades para se impor, não apenas em or-ganizações internacionais, mesmo quesupostamente bilíngues, como a OCDE, mastambém no discurso econômico e políticofrancês. Isso se deve (...) ao fato de que otermo ‘mundialização’ tem o defeito de di-minuir, pelo menos um pouco, a falta denitidez conceitual dos termos ‘global’ e ‘glob-alização’.” (CHESNAIS, François. A mundi-alização do capital. São Paulo: Xamã Ed-itora, 1996, p. 24 – Original: La

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mondialisation du capital. Paris: Syros,1994).[81]

A mundialização significa “que as de-cisões já não são nacionais ou locais, perten-cendo a alguma congregação supranacionalde caráter mundial. Mas para a Comissão In-ternacional de Juristas, o sentido talvez maisimportante [da globalização] é que ela evocaas novas redes que os cidadãos estão form-ando e as relações cada vez mais estreitas,que matêm o movimento de direitos hu-manos” (CLAPHAM, Andrew. La mundial-ización y el imperio del Derecho. p. 17. In:La Revista de la Comisión Inter-nacional de Juristas – mundializa-ción, derechos humanos e imperio delderecho. n. 61, 1999, p. 17-37).[82]

O termo ‘realinhamento constitucional’ éutilizado por Oscar Vieira para designar a in-fluência dos fatores de pressão internacion-ais sobre os sistemas constitucionais

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nacionais. Conferir: VIEIRA, Oscar Vilhena.Realinhamento constitucional. In:SUNDFELD, Carlos Ari e VIEIRA, Oscar Vil-hena (coord.). Direito global. São Paulo:Max Limonad, 1999, p. 15-48.[83]

Ao analisar a globalização sob o trípliceenfoque de regionalização, direitos hu-manos e economia, Oscar Vieira identificaum realinhamento bidirecional nos movi-mentos de regionalização (VIERIA, Oscar.op.cit., p. 28) e direitos humanos (VIERIA,Oscar. op.cit., p. 29). Haveria, nestes, umainfluência recíproca entre os movimentoscitados e as posições políticas dos países dacomunidade internacional. Já no que diz re-speito à globalização econômica como “liber-dade total ao capital internacional” (VIERIA,Oscar. op.cit., p. 17), o autor não consegueidentificar o movimento de influência dospaíses neste fenômeno uniformizador:“Diferentemente dos demais fenômenos daglobalização, não temos neste caso [da

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globalização econômica] a já mencionada viade duas mãos. Há apenas uma assimilaçãodos padrões internacionais, sob a perspectivade que são essenciais para se participar doprocesso de globalização” (VIERIA, Oscar.op.cit., p. 46-47).[84]

Vide GALBRAITH, John Kenneth. Onovo Estado Industrial. São Paulo: Edit-ora Nova Cultural, 1997. Para Galbraith, asubstituição do sistema de mercado pelo sis-tema de planejamento teria modificado a es-trutura de poder nas empresas e na so-ciedade em razão do aumento da escala deprodução, do avanço da tecnologia e do con-hecimento interdisciplinar, que exigem el-evado tempo de maturação dos empreendi-mentos cada vez mais complexos. A decisãoteria migrado da propriedade do capitalpara sua gestão. O controle, agora, estarianas mãos do administrador qualificado peloconjunto de informações necessárias àgestão do negócio mediante a criação de

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novas necessidades moldadas pelo aparatopropagandístico, derrubando por terra asoberania do consumidor. Tal inteligênciaorganizada da empresa constituiria suatecnoestrutura, cujas decisões técnicas eimpessoais – tecnocracia – acabariam porsuplantar a liberdade individual de direcion-ar o desenvolvimento.[85]

Bresser Pereira, ao definir o mercadocomo o mecanismo de alocação eficiente derecursos por excelência, afirma a precedên-cia do Estado moderno ao mercado capit-alista na medida em que é o Estado quegarante os direitos de propriedade e a ex-ecução dos contratos. Vide PEREIRA, LuizCarlos Bresser. A reforma do Estado dosanos 90: lógica e mecanismos de con-trole. Brasília: Ministério da AdministraçãoFederal e Reforma do Estado, 1997, p. 9-10.[86]

“Não basta editar uma lei abstrata,genérica e distante, dizendo que nenhuma

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exploração da atividade industrial pode ul-trapassar certo limite de poluição, causandodano à saúde do vizinho. É preciso que oEstado vá trabalhando com a realidade todoo tempo, para definir, nas situações que sepõem, o que é ou não uma emissão de polu-entes aceitável; assim obter-se-á a paulatinadiminuição da emissão de poluentes. É pre-ciso impor graus crescentes de restrições àemissão de poluentes, e para isso a lei é insu-ficiente. Ninguém imagina que o legisladorvá cuidar de regular o nível de emissão depoluentes do bairro do Maracanã no ano de1998; e, em janeiro de 99, editar outra leipara estabelecer que já é hora de diminuirainda mais o nível de emissão de poluentes;e, no meio do ano, considerando que aquelenível eleito foi otimista demais, editar novalei para voltar atrás. Alguém imagina que olegislador possa fazer isso, dedicando-se, elepróprio, a um verdadeiro gerenciamentonormativo da realidade?” (SUNDFELD,

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Carlos Ari. Agências reguladoras e os novosvalores e conflitos. p. 1293-1294. In: Anaisda XVII Conferência Nacional dos Ad-vogados. Justiça: realidade e utopia.Vol. II, Rio de Janeiro: Ordem dos Ad-vogados do Brasil, 1999, p. 1291-1297).[87]

Eficiência esta que foi elevada à categor-ia constitucional com a Emenda Constitu-cional nº 19/98, que alterou o art.37, caputda Constituição Federal brasileira de 1988.[88]

O direito administrativo sempre sofreuos influxos da evolução tecnológica, comobem demonstram as regulamentações muni-cipais do direito de construir, que acompan-ham a evolução das técnicas de construção edo crescimento correspondente dos riscos. Anovidade de hoje está na ampliação sensíveldeste fenômeno de regulamentação conjun-tural para setores da economia, no Brasil,submetidos a escassa regulamentação estataldireta devido à suficiência da

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autorregulamentação das então empresasestatais.[89]

O termo publicatio é utilizado para de-notar a transferência da titularidade deatividades das mãos privadas para o Estado.[90]

Vide GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti.Teoria dos serviços públicos e sua trans-formação, p. 64. In: SUNDFELD, Carlos Ari(coord.). Direito administrativo econ-ômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p.39-71.[91]

Sobre as características e distinçõesentre o Direito Administrativo anglo-amer-icano e o Direito Administrativo de matrizfrancesa, vide: PESSOA, Robertônio. Cursode direito administrativo. Brasília: Edit-ora Consulex, 2000, p. 51-58.[92]

O art.149 da Constituição Federal de1934 estabelecia o dever do Estado e dafamília de prestar educação. O anteprojeto

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da Carta Constitucional de 1934 era maisclaro, pois previa, no título XI (Da Cultura edo Ensino), no art.112: “O ensino serápúblico ou particular, cabendo àquele, con-correntemente à União, aos Estados e aosMunicípios. O regime do ensino, porém, obe-decerá a um plano geral traçado pela União,que estabelecerá os princípios normativos daorganização escolar e fiscalizará, por fun-cionários técnicos privativos, a sua ex-ecução”. A Constituição Federal de 1937 foimais clara: “Art.129. À infância e à juven-tude, a que faltarem os recursos necessáriosà educação em instituições particulares, é de-ver da Nação, dos Estados e dos Municípiosassegurar, pela fundação de instituiçõespúblicas de ensino em todos os seus graus, apossibilidade de receber uma educação ad-equada às suas faculdades, aptidões etendências vocacionais”. A Constituição de1946, por sua vez, assim disciplinou:“Art.167. O ensino dos diferentes ramos será

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ministrado pelos podêres públicos e é livre àiniciativa particular, respeitadas as leis que oregulem”. A Constituição Federal de 1967 eEmenda nº1 de 1969 seguiram a mesma

linha: “Art.168. (...) §2o Respeitadas as dis-posições legais, o ensino é livre à iniciativaparticular, a qual merecerá o amparo técnicoe financeiro dos Podêres Públicos, inclusivebôlsas de estudo”. Finalmente, a Constitu-ição Federal de 1988 disciplina: “Art.205. Aeducação, direito de todos e dever do Estado(...); Art.209. O ensino é livre à iniciativaprivada (...)”. Históricos normativos semel-hantes podem ser desenhados para ossetores de saúde, abastecimento alimentar esistema financeiro.[93]

“A frustação com estas categoriasubíquas [de público e privado] surge parcial-mente porque elas são posicionadas paradescreverem oposições em nossopensamento. No cerne de muitas de suas ap-licações aparecem as duas idéias de que o

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público está para o privado tal como abertoestá para fechado e como o todo está para aparte.” – tradução livre do original (STARR,Paul. The meaning of privatization. p. 16.In: KAMERMAN, Sheila B. & KAHN, AlfredJ. Privatization and the Welfare State.Princeton: Princeton University Press, 1989).[94]

O conceito de serviço público como o“serviço disponível ao público” serviu à justi-ficação da provisão privada de serviçospúblicos sob a óptica econômica de estratégi-as de fomento do mercado, mas não se ad-equa nem satisfaz as exigências jurídicas deorientação da prestação de serviços públicose privados. Conferir: ROTH, Gabriel. Theprivate provision of public services indeveloping countries. Washington: Eco-nomic Development Institute, 1987, p. 1.[95]

Argumentando pela caracterização domodelo regulatório, segundo a ideologia con-stitucionalmente adotada pela Constituição

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Federal de 1988 no Brasil, como afeto umambiente concorrencial, mas avesso ao jogodos mercados, assim entendido aquele carac-terizado pela livre iniciativa e a livre concor-rência, vide: CARVALHO, Carlos EduardoVieira de. Regulação de Serviços Públi-cos na Perspectiva da ConstituiçãoEconômica Brasileira. Belo Horizonte:Del Rey, 2007.[96]

Daí a afirmação de Eros Roberto Graude que “a privatização dos serviços públicosinstala um autêntico caos em suas teoriza-ções [do direito administrativo], abalando aprópria noção de serviço público, que lhetem servido de sustentáculo” (GRAU, ErosRoberto. O direito posto e o direito

pressuposto. 3aed., São Paulo: Malheiros,2000, p. 125).[97]

Diz-se da relação em que o Estado detémuma posição privilegiada, gerando efeitos desubordinação. Conferir: SUNDFELD, Carlos

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Ari. Fundamentos de direito público.São Paulo: Malheiros Editores, 1992, p. 68.

[98]Vide GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti.

Teoria dos serviços públicos e sua trans-formação, p. 63-64. In: SUNDFELD, CarlosAri (coord.). Direito administrativo eco-nômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p.39-71.[99]

Autorização seria, neste caso, o “ato doPoder Público que libera o desempenho deatividade econômica, a qual continua sujeitaao seu regime próprio, de direito privado”(NETO, Benedicto Porto. Concessão deserviço público no regime da Lei n.8.987/95: conceitos e princípios. SãoPaulo: Malheiros, 1998, p. 140). Os arts.126 e131 da Lei Geral de Telecomunicações são ex-emplos característicos desta concepção:“Art.126. A exploração de serviço de tele-comunicações no regime privado será

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baseada nos princípios constitucionais daatividade econômica”. “Art.131. A exploraçãode serviço no regime privado dependerá deprévia autorização da Agência, que acar-retará direito de uso das radiofrequênciasnecessárias”.[100]

Vide DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.Parcerias na Administração Pública: con-cessão, permissão, franquia, terceirização e

outras formas. 3a ed., São Paulo: Atlas, 1999,p. 122-129.[101]

Em sede da Medida Cautelar na AçãoDireta de Inconstitucionalidade nº 1668, jul-gada em 20 de agosto de 1998, e referente adiversos dispositivos da Lei Geral de Tele-comunicações (Lei 9.472/97), o SupremoTribunal Federal pronunciou-se pela con-stitucionalidade do disposto no art. 65, III e§2º, que trata expressamente da con-comitância de prestação dos serviços de tele-comunicações em regime público e privado.

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No âmbito dos transportes, o Recurso Ex-traordinário nº 220.999-7 resultou no posi-cionamento da Corte no sentido de não seconsiderar como serviço público a atividadede transporte aquaviário exclusivamente demercadorias de empresas privadas.[102]

Vide ORTIZ, Gaspar Ariño;MARTINEZ, J. M. De La Cuétera; LÓPEZ-MUNIZ, J.L. El nuevo servicio público.Madri: Marcial Pons, 1997.[103]

Vide GROTTI, Dinorá Adelaide Mu-setti. Teoria dos serviços públicos e suatransformação, p. 62. In: SUNDFELD, Car-los Ari (coord.). Direito administrativoeconômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p.39-71.[104]

Exemplo esclarecedor da desintegraçãovertical consta em Grotti: “É o que já ocorre,no Brasil, com os serviços de navegaçãoaérea ou de transporte rodoviário: os

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aeroportos e rodovias são objeto demonopólio natural, atividade não-competit-iva de infraestrutura; essa infraestrutura éutilizada, com liberdade e igualdade deacesso, pelos inúmeros prestadores de ser-viço individuais” (GROTTI, Dinorá AdelaideMusetti. Teoria dos serviços públicos e suatransformação, p. 63. In: SUNDFELD, Car-los Ari (coord.). Direito administrativoeconômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p.39-71).[105]

Fala-se, aqui, em riscos do serviçoprivado em si: se o serviço deixar de serprestado, o Estado não intervem para prestá-lo ele próprio. Não se está comentando orisco dirigido ao prestador do serviço, pois,neste caso, mesmo o prestador de serviçospúblicos está sujeito ao risco natural donegócio. A propósito, as definições de con-cessão e permissão na Lei Geral de Con-cessões determinam que o concessionário epermissionário de serviços públicos os

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prestarão por “sua conta e risco” (art. 2o, II,III e IV da Lei 8.987/95).[106]

Vide BURNHAM, William. Introduc-tion to the Law and Legal System ofthe United States. 4ª ed., St. Paul: Thom-son/West, 2006.[107]

Em revisão da literatura sobre políticaregulatória, estudo da Revista Brasileira deInformação Bibliográfica em Ciências Sociaissalienta a insuficiência da tradicional divisãobinomial entre dois tipos de regulaçãopública: regulação por agência regulatória; eregulação pela estatização. Conferir: MELO,Marcus André. Política regulatória: uma re-visão da literatura. p. 8-9. In: RevistaBrasileira de Informação Bibliográfica

em Ciências Sociais, nº 50, 2o semestrede 2000, p. 7-43. A distinção tradicionalentre regulação via propriedade pública evia agência ou comissão independente é im-precisa sob o enfoque jurídico, pois

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pressupõe que a existência de bens públicosafasta a técnica de regulação via agência, oque, de fato, pode ser verdade nos modelosde tradição anglo-americana, mas não nomodelo brasileiro, que comporta um rol maiselaborado de espécies de regulação.[108]

Vide STRAUBHAAR, Joseph. Tendên-cias mundiais, p. 47. In: SIQUEIRA,Ethevaldo (et al.). Telecomunicações:privatização ou caos. São Paulo:TelePress Editora, 1993, p. 42-47. Relatandoas esperadas diferenças entre modelos regu-latórios no mundo, cita, em 1993, a experiên-cia da Jamaica, que optara por contratos de-talhados ao invés da criação de órgãosreguladores.[109]

Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vie-ira de. Regulação de Serviços Públicosna Perspectiva da Constituição Econ-ômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey,2007.

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[110]Vide ROSANVALLON, Pierre. A crise

do Estado-providência. Trad. Joel Pi-mentel de Ulhôa, Goiânia: Editora Univer-sidade Federal de Goiás e Editora da Univer-sidade de Brasília, 1997.[111]

Costuma-se apontar a alteração de pos-tura de intervenção direta para a de inter-venção indireta como resultado da crise fisc-al do Estado dos anos 80 e 90. Conferir:PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reformado Estado dos anos 90: lógica emecanismos de controle. Brasília: Min-istério da Administração Federal e Reformado Estado, 1997, p. 11-13.[112]

Vide SALOMÃO FILHO, Calixto. Regu-lação da Atividade Econômica: Princípios eFundamentos Jurídicos. São Paulo: Malheir-os, 2001.[113]

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A re-forma do Estado dos anos 90: lógica e

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mecanismos de controle. Brasília: Min-istério da Administração Federal e Reformado Estado, 1997, p. 17.[114]

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A re-forma do Estado dos anos 90: lógica emecanismos de controle. Brasília: Min-istério da Administração Federal e Reformado Estado, 1997, p. 32 e seguintes.[115]

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A re-forma do Estado dos anos 90: lógica emecanismos de controle. Brasília: Min-istério da Administração Federal e Reformado Estado, 1997, p. 33. “Para a agenda liberaltornava-se, agora, necessário, ao mesmotempo desregular e regular: desregular parareduzir a intervenção do Estado; regular,para viabilizar a privatização”.[116]

Há proposta de terminologia específicapara os serviços submetidos ao tratamentodito competitivo, em que coexistem regimes

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jurídicos distintos na prestação da mesmaatividade, como ocorre com as telecomu-nicações, energia elétrica, vigilância sanitáriadentre outros. A proposta de Sundfeld segueorientação européia, que passou a chamá-losserviços de interesse econômico geral. Con-ferir, a respeito: SUNDFELD, Carlos Ari. AAdministração Pública na era do direitoglobal. p. 161: nota 6. In: SUNDFELD, Car-los Ari & VIEIRA, Oscar Vilhena. Direitoglobal. São Paulo: Max Limonad, 1999, p.157-168. Persiste, todavia, a questão de sesaber se a adoção desta terminologia esclare-cerá ou confundirá ainda mais o esforço dedivisão do regime aplicado a cada tipo deserviço relativo a setores econômicos.[117]

Vide AGUILLAR, Fernando Herren.Controle social de serviços públicos.São Paulo: Max Limonad, 1999, p.164.[118]

Preferiu-se a utilização do conceito decentralização e descentralização por revelar,

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na sua ancianidade, a ligação de subordin-ação à Administração Pública, que é o sen-tido visado na diferenciação entre controlepela centralização e controle pela descentral-ização. Para uma análise da centralizaçãocomo subordinação, vide: URUGUAI,Paulino José Soares de Souza, Visconde de.Ensaio sobre o direito administrativo.Fac-símile da edição de 1960, Brasília: Im-prensa Nacional, 1997, p. 346. Para uma an-álise da centralização como unidade, vide:DEBBASCH, Charles. Droit administrat-if. Paris: Éditions Cujas, 1972, p. 87-88.Themistocles Cavalcanti, por sua vez, derivaa descentralização da necessidade de espe-cialização em face da complexidade funcion-al do Estado: CAVALCANTI, ThemistoclesBrandão. Tratado de direito adminis-trativo. Vol. II, 5ªed., Rio de Janeiro: Liv-raria Freitas Bastos, 1964, p. 83-84. Final-mente, esmiuçando a evolução dos significa-dos dos termos centralização e

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descentralização (descentralização políticaversus administrativa; descentralização dadecisão versus da gestão; territorial versuspor serviços ou institucional – p. 17 eseguintes) e criticando a concepção unívocade descentralização como transferência decompetências a pessoas jurídicas (p. 59), res-saltando a independência como essencial aoconceito de descentralização (p. 69), vide:ORTIZ, Gaspar Ariño. Descentralizacióny planificación. Madri: Instituto de Estu-dios de Administracion Local, 1972.(Colección Estudios de AdministraciónLocal).[119]

AGUILLAR, Fernando Herren. Con-trole social de serviços públicos. SãoPaulo: Max Limonad, 1999, p. 165 eseguintes; 181 e seguintes. “Observamos quea preferência pela expressão “regulaçãodesconcentrada” em detrimento da ex-pressão consagrada “desregulamentação” seprende a que entendemos que a ausência de

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regulamentação é uma forma de regulaçãoimposta pelo Estado” (p. 165). Aguillar de-fende a adoção da primeira nomenclatura,pois entende que a liberdade desfrutada pelainiciativa privada nas atividades econômicasdesregulamentadas é “consequência de umapolítica regulatória estatal, uma política deregulação pela desconcentração” (p. 211). Oautor não utiliza o termo desconcentraçãono sentido técnico-jurídico de oposição àdescentralização – diferença já sedimentadana doutrina de direito administrativo. Con-ferir: DEBBASCH, Charles. Droit adminis-tratif. Paris: Éditions Cujas, 1972, p. 88-89;DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direitoadministrativo. São Paulo: Atlas;GASPARINI, Diogenes. Direito adminis-trativo. São Paulo: Saraiva; MEIRELLES,Hely Lopes. Direito administrativobrasileiro. São Paulo: Revista dosTribunais; MELLO, Celso Antônio Bandeirade. Curso de direito administrativo. São

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Paulo: Malheiros; MUKAI, Toshio. Direitoadministrativo. São Paulo: Saraiva.[120]

AGUILLAR, Fernando Herren. Con-trole social de serviços públicos. SãoPaulo: Max Limonad, 1999, p. 191 eseguintes.[121]

Vide AGUILLAR, Fernando Herren.Controle social de serviços públicos.São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 212. Aregulação operacional “é manifestada pelapreferência outorgada à iniciativa privada ouàs empresas e órgãos estatais para o desem-penho de certas atividades de interessepúblico” (p. 164).[122]

A regulação normativa “diz respeito aopoder de regulamentar efetivamente o setorque interessa ao Estado” (AGUILLAR,Fernando Herren. op.cit., p. 164).[123]

Fala-se em tendência, pois a opção reg-ulatória estatal não está entre dois pólos,

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mas em um continuum de centralização edescentralização, como ressalta um pequenoestudo dirigido à Administração PúblicaFederal: MARCELINO, Gileno Fernandes.Descentralização: um modelo con-ceitual. Brasília: Fundação Centro deFormação do Servidor Público – FUNCEP,1988, p. 28.[124]

A terminologia intervencionismo diretoe intervencionismo indireto também é utiliz-ada, mas não permite todas as combinaçõespossíveis como ocorre com os termos regu-lação operacional e normativa, centralizadae descentralizada. Adotando os conceitos deintervencionismo direto e indireto, vide:MARQUES NETO, Floriano Azevedo. A novaregulação estatal e as agências independ-entes. p. 74. In: SUNDFELD, Carlos Ari (co-ord.). Direito administrativo econ-ômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p.72-98.

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[125]Para Floriano Marques, o intervencion-

ismo indireto é caracterizado pela concretaatuação do Estado “no fomento, na regula-mentação, no monitoramento, na mediação,na fiscalização, no planejamento, na orde-nação da economia” (MARQUES NETO,Floriano Azevedo. A nova regulação estatale as agências independentes. p. 74. In:SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direitoadministrativo econômico. São Paulo:Malheiros, 2000, p. 72-98).[126]

“O Estado tem que se organizar parafazer mais do que editar uma lei geral paravigorar por tempo indeterminado e depoiscuidar dos conflitos individuais. E, para issoele tem de intervir mais. Aqui está a questão.O modelo que conhecemos – a separação depoderes tradicional e as funções que com-petiam aos Poderes Judiciário e Legislativo –era perfeitamente coerente com o baixo in-tervencionismo estatal. Se o Estado não está

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muito preocupado em gerenciar a realidadeambiental de modo a ir apertando paulatina-mente as exigências para melhorar o meioambiente; se quer deixar os membros da so-ciedade acertarem suas diferenças independ-entemente da ordem jurídica, aí pode real-mente editar uma norma geral que vigorepor sessenta ou mais anos, como o CódigoCivil, e depois solucionar os conflitos peloPoder Judiciário. Mas, se o Estado querperseguir concretamente o valor ambiental,vair ter que intervir mais, editando normasseguidamente, dando-lhes conteúdos cadavez menos gerais, tratando de temas cadavez mais particulares. Assim, poderá realizaro gerenciamento normativo dos confli-tos (...) Como o Estado é obrigado a intervir[normativamente, em princípio], ele criou asagências reguladoras” – grifos nossos(SUNDFELD, Carlos Ari. Agências regu-ladoras e os novos valores e conflitos, p.1294 e 1296. In: Anais da XVII

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Conferência Nacional dos Advogados.Justiça: realidade e utopia. Vol. II, Riode Janeiro: Ordem dos Advogados do Brasil,1999, p. 1291-1297). Tal gerenciamentonormativo dos conflitos somente pode seralcançado por mecanismos institucionais deorganização dinâmica e de contato diretosetorial, como as agências reguladoras.Planejar e replanejar constantemente: estessão os conceitos basilares da política regu-latória normativa centralizada.[127]

Themistocles Cavalcanti posiciona-senitidamente a favor da segunda corrente:“No primeiro grupo encontram-se as empre-sas, alguns contabilistas incapazes de ad-aptarem os seus conhecimentos ao problemamais geral, e finalmente alguns economistase financistas clássicos, temerosos de uma in-tervenção do Estado, no pressuposto de suaincapacidade para administrar (....). Do se-gundo grupo, são os que se colocam naposição de equilíbrio entre os interesses das

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empresas e dos consumidores, mas consid-eram, em primeiro plano, os interessesdesses últimos para quem os serviços foramcriados e a cujos interesses, portanto, devematender precipuamente” (CAVALCANTI,Themistocles Brandão. Tratado de direitoadministrativo. Vol. II, 5ªed., Rio deJaneiro: Livraria Freitas Bastos, 1964, p.500-501).[128]

Analisando a posição institucional dospoderes políticos adotada pela ConstituiçãoFederal de 1988 do Brasil, vide: FERRAZ,Anna Cândida da Cunha. Conflito entrepoderes: o poder congressual desustar atos normativos do Poder Exec-utivo. São Paulo: Editora Revista dosTribunais, 1994.[129]

MONTESQUIEU, Charles Louis de Se-condat, baron de la Brède et de. O espírito

das leis. 2aed., Brasília: Editora Universid-ade de Brasília, 1995, p. 118-119.

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[130]Aristóteles divide em três partes as que

devem compor as formas de constituição en-carregadas de: deliberação sobre assuntospúblicos; funções públicas (executivas); e dopoder judiciário. Conferir: ARISTÓTELES.

Política. Trad. Mário da Gama Kury, 3aed.,Brasília: Editora Universidade de Brasília,1997, p. 151-160.[131]

Apontado como o inaugurador dadoutrina teorético-constitucional doequilíbrio dos poderes, Bolingbroke a enun-ciou em escritos exparsos. Conferir:SCHMITT, Carl. Teoría de la constitu-ción. Trad. Francisco Ayala, Madri: AlianzaEditorial, 1992, p. 187.

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[132]Locke ultima a divisão de funções em

divisão de poderes legislativo de um lado eexecutivo e federativo de outro. Conferir:LOCKE, John. Segundo tratado sobre ogoverno. Trad. E. Jacy Monteiro, SãoPaulo: Instituto Brasileiro de Difusão Cultur-al, 1963, p. 91-93 (Coleção Clássicos daDemocracia 11).[133]

Vide MONTESQUIEU, Charles Louis deSecondat, baron de la Brède et de. O es-

pírito das leis. 2a ed., Brasília: EditoraUniversidade de Brasília, 1995, p. 121.[134]

Quando o direito passou a funcionarcomo instrumento de implementação depolíticas públicas (regulação não exclusiva-mente de situações estruturais mas conjun-turais), “o direito torna-se contingente e var-iável. A ‘lei’, texto normativo produzido peloLegislativo, não pode mais ser tomada comocategoria absoluta: é necessário, mais do que

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nunca, distinguir entre lei em sentido formale lei em sentido material. Interpenetram-seos campos de atuação do Executivo e do Le-gislativo: aquele a exercitar, amplamente,função normativa; este, a produzir leis-me-dida. A leitura tradicionalmente desen-volvida da ‘separação dos poderes’ perde to-do o seu sentido” (GRAU, Eros Roberto. Odireito posto e o direito pressuposto.

3a ed., São Paulo: Malheiros, p. 136). E con-tinua em outro capítulo: “a instabilidade dedeterminadas situações e estados econômi-cos, sujeitos a permanentes flutuações – flu-tuações que definem o seu caráter conjuntur-al –, impõe sejam extremamente flexíveis edinâmicos os instrumentos normativos deque deve lançar mão o Estado para dar cor-reção a desvios ocorridos no desenrolar doprocesso econômico e no curso das políticaspúblicas que esteja a implementar. Aí, pre-cisamente, o emergir da capacidade norm-ativa de conjuntura, via da qual se pretende

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conferir respota à exigência de produçãoimediata de textos normativos, que as flutu-ações da conjuntura econômica estão a todoo tempo, a impor (...) [Dita capacidadenormativa] somente estará ungida de legal-idade quando e se ativada nos quadrantes dalei (...) O exercício da capacidade normativade conjuntura estaria, desde a visualizaçãosuperficial dos arautos da “separação” depoderes, atribuído ao Poder Legislativo, nãoao Poder Executivo. A doutrina brasileiratradicional do direito administrativo,isolando-se da realidade, olimpicamente ig-nora que um conjunto de elementos de ín-dole técnica, aliado a motivações de premên-cia e celeridade na conformação do regime aque se subordina a atividade de intermedi-ação financeira, tornam o procedimento le-gislativo, com seus prazos e debates pro-longados, inadequado à ordenação dematérias essencialmente conjunturais. Porisso não estão habilitados, os seus adeptos, a

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compreender o particular regime de direito aque se submete [um] segmento da atividadeeconômica” (GRAU, Eros Roberto. op.cit., p.172-173). Não se pode olvidar, no entanto,que essa argumentação implica o reposicio-namento do Legislativo à semelhança da des-regulamentação exigida na proposta neolib-eral: “substituição de regras rígidas, dotadasde sanção jurídica, por regras flexíveis,meramente indutoras de comportamentos”,gerando “ampliação do conteúdo dos regula-mentos (atos do Poder Executivo em geral),instalando uma nova contradição” (GRAU,Eros Roberto. op.cit., p. 98).[135]

“A classificação das funções estatais emlegislativa, executiva e jurisdicional é co-rolário da consideração do poder estataldesde o seu aspecto subjetivo: desde tal con-sideração, identificamos, nele, centros ativosque são titulares, precipuamente, de determ-inadas funções. Estas são assim classificadasem razão das finalidades a que se voltam

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seus agentes – isto é, finalidades legis-lativas, executivas e jurisdicionais. Tal clas-sificação, como vimos, tem caráter orgânicoou institucional.” (GRAU, Eros Roberto. Odireito posto e o direito pressuposto.

3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 176).[136]

Vide CLÈVE, Clèmerson Merlin. Afiscalização abstrata da constitucion-

alidade no direito brasileiro. 2a ed., SãoPaulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000,p. 211.[137]

Críticas são levantadas contra a ausên-cia de um controle efetivo de constitucional-idade dos atos normativos do Executivo,propondo-se, até mesmo, a criação de umaação direta de ilegalidade. Conferir: A fisc-alização abstrata da constitucionalid-

ade no direito brasileiro. 2a ed., SãoPaulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000,p. 215. No entanto, a discussão deveria,primeiramente, internalizar a compreensão

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da submissão estrutural do Executivo à lei aolado da inovação normativa funcional quelhe é própria.[138]

Tratando da Medida Provisória comoato normativo com força de lei e extraindodesta característica a impossibilidade de suaretirada do Congresso Nacional, pelo Exec-utivo, conferir: Ação Direta de Inconstitu-cionalidade 221/DF, relatoria do MinistroMoreira Alves, j.29.03.1990, DJ 22.10.1993,p. 22.251 e RTJ 151/331-355.[139]

Vide texto correspondente à nota 148,p. 24 deste estudo.[140]

Vide MASHAW, Jerry L. Gli atti sub-le-gislativi di indirizzo della pubblica amminis-trazione nell’esperienza degli USA. p.117-123. In: CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugode. Potere regolamentare e strumentidi direzione dell’amministrazione:

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profili comparatistici. Bolonha: IlMulino, 1991, p. 111-140.[141]

“Entende-se como função normativa ade emanar estatuições primárias, seja em de-corrência do exercício do poder origináriopara tanto, seja em decorrência de poder de-rivado, contendo preceitos abstratos egenéricos” (GRAU, Eros Roberto. O direito

posto e o direito pressuposto. 3aed., SãoPaulo: Malheiros, 2000, p. 180).[142]

Partindo de definição de Alessi de queos regulamentos são estatuições primáriasimpostas por força própria, mas emanadasde poder derivado, “em uma tentativa deconciliação de critérios, teremos que a fun-ção normativa (material) compreende a fun-ção legislativa e a função regulamentar (in-stitucionais) – mais a função regimental, seconsiderarmos a normatividade emanada doPoder Judiciário” (GRAU, Eros Roberto. Odireito posto e o direito pressuposto.

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3aed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 181).Assim, “quando o Executivo expede regula-mentos – ou, o Judiciário, regimentos –, nãoo faz no exercício de delegação legislativa(...) Logo, quando o Executivo e o Judiciárioemanam atos normativos de caráter não le-gislativo – regulamentos e regimentos, re-spectivamente –, não o fazem no exercício defunção legislativa, mas sim no desenvolvi-mento de função normativa.” (GRAU, ErosRoberto. op.cit., p. 184).[143]

Vide MONTESQUIEU, Charles Louisde Secondat, baron de la Brède et de. O es-

pírito das leis. 2a ed., Brasília: EditoraUniversidade de Brasília, 1995, p. 121.[144]

Para a exposição completa deste argu-mento com fundamentação exaustiva, con-ferir: GRAU, Eros Roberto. O direito posto

e o direito pressuposto. 3aed., São Paulo:Malheiros, 2000, p. 182-189.

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[145]Ação Direta de Inconstitucionalidade

221/DF, Relator Min. Moreira Alves,j.29.03.1990, DJ 22.10.1993, p.22.251 e RTJ151/331-355.[146]

O trecho a seguir, que parece proposit-almente inconclusivo, representa bem ainutilidade do argumento gramatical em faceda questão maior de proibição de delegaçãode funções constitucionais: “Poder-se-ia ar-

gumentar, em contrário, que o art. 5o, II, daConstituição não exige tanto [tamanha re-strição à atividade normativa da Adminis-tração]. Não dispõe ele que ninguém seráobrigado a fazer ou deixar de fazer algosenão por comando legal; quer apenas queninguém seja constrangido senão em virtudede lei. Bastaria assim a lei conferir generica-mente o poder ao administrador, para que asnormas que este viesse a editar encon-trassem conforto constitucional. Mas o prob-lema se reconduz aqui ao da impossibilidade

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de delegação de funções entre Legislativo eExecutivo. Em outras palavras, a inter-

pretação do art. 5o, II, requer necessaria-mente a consideração do limite a partir doqual se incidiria em inconstitucionalidadepor delegação indevida do poder de legislar.”(SUNDFELD, Carlos Ari. Direito adminis-

trativo ordenador. 1aed., 2atir., São Paulo:Malheiros, 1997, p. 35).[147]

Sobre os regulamentos de atribuição,vide: DELPÉRÉE, Francis. Le fonti normat-ive secondarie nel diritto belga. p. 51-52. In:CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potereregolamentare e strumenti didirezione dell’amministrazione: pro-fili comparatistici. Bolonha: Il Mulino,1991, p. 47-67.[148]

Norma secundária é considerada a“norma cujo titular não possa nunca agir deiniciativa própria ou autonomamente”.Subordinadas são as normas que “encontram

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seu fundamento na própria Constituição” –tradução livre do original: DELPÉRÉE,Francis. Le fonti normative secondarie neldiritto belga. p. 49-50. In: CARETTI, Paolo& SIERVO, Ugo de. Potere regolament-are e strumenti di direzione dell’am-ministrazione: profili comparatistici.Bolonha: Il Mulino, 1991, p. 47-67. A com-petência subordinada existiria se se acei-tasse, no Brasil, a presença de poderes implí-citos (inherent powers) no Executivo paraproduzir normas regulamentares em espaçosnão atingidos por dispositivos legais: suacompetência seria subordinada, pois re-stringível por lei, mas não secundária, poisnão necessitaria de prévia abertura legal. Acaracterística subordinada da competênciado Executivo brasileiro depende, no Brasil,segundo a teoria hoje predominante, deprévia abertura legal: deve ser, portanto,secundária. A jurisprudência norte-americ-ana se afina com a doutrina brasileira neste

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ponto: “a atribuição de poder à burocracia,tal como ao Presidente, deve ter fundamentonormativo em uma lei” (MASHAW, Jerry L.Gli atti sub-legislativi di indirizzo della pub-blica amministrazione nell’esperienza degliUSA. p. 138. In: CARETTI, Paolo & SIERVO,Ugo de. Potere regolamentare e stru-menti di direzione dell’amminis-trazione: profili comparatistici. Bo-lonha: Il Mulino, 1991, p. 111-140: traduçãolivre do italiano).[149]

Ao analisar o conceito de adminis-tração ordenadora como sucedâneo dotermo poder de polícia, Sundfeld salientaseu caráter derivado (secundário) capaz deinterferir nos contornos da vida privada:“Cada vez mais a lei se ocupa em disciplinardiretamente as variadas facetas da vidaprivada. A lei pode prever ou não a interfer-ência do Executivo em sua aplicação. Emcaso positivo, estaremos diante de normas dedireito administrativo (ex.: leis municipais

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sobre construções urbanas, regras detrânsito, disciplina dos preços na economia).(...) A administração ordenadora surge apen-as na primeira hipótese. Assim, inexiste setorque lhe pertença, por natureza. Só existiráadministração ordenadora se, quando, comoe na medida em que o legislador, ao regula-mentar a vida dos indivíduos, houver com-inado à Administração um papel ativo emseu cumprimento.” (SUNDFELD, Carlos Ari.

Direito administrativo ordenador. 1a

ed., 2a tir., São Paulo: Malheiros, 1997, p.21).[150]

“Evidentemente não estou a propor aliberação do Executivo para “legislar”. Pelocontrário, reconhecer o desenho correto doprincípio, tal como contemplado pelo direitobrasileiro, significa possibilitarmos o con-trole do exercício da função regulamentarpelo Executivo, ao que se recusam nossospublicistas, sob o argumento de que os

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regulamentos são inconstitucionais...”(GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o

direito pressuposto. 3a ed., São Paulo:Malheiros, 2000, p. 189).[151]

A característica hierárquica atribuída àdistinção entre lei e regulamento é “de tipoorgânico” como ocorre no relato de Delpéréesobre o poder regulamentar na Bélgica, emque os poderes legislativo e executivo estãoinseridos em uma relação “entre podersoberano e poder subordinado”(DELPÉRÉE, Francis. Le fonti normativesecondarie nel diritto belga. p. 47-48. In:CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potereregolamentare e strumenti didirezione dell’amministrazione: pro-fili comparatistici. Bolonha: Il Mulino,1991, p. 47-67).[152]

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.Reforma do Estado: o papel das agênciasreguladoras e fiscalizadoras. p. 256. In:

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Fórum Administrativo, ano 1, nº 3, maiode 2001, p. 253-257. Continua, na mesmapágina: “igualmente se pode dizer que a prát-ica é antiga, difundida e tolerada. Todos têmpresente as circulares e portarias de que cer-tos órgãos da Administração Pública usam eabusam, fazendo “leis” que não raro mais in-terferem na vida do cidadão que as leis pro-priamente ditas.”[153]

Floriano Marques divide o problema deacordo com o tipo de órgão regulador: a) ór-gãos reguladores de natureza constitucional(ANATEL e ANP); b)órgãos reguladores cria-dos exclusivamente por lei (ANEEL, ANVS,Câmara de Saúde Suplementar); c)órgãosreguladores de natureza constitucional im-própria, que encontram referência no textoconstitucional só que sem designação ex-pressa da sua constituição como órgão regu-lador em sentido próprio (Banco Central –art.192, IV e Superintendência de SegurosPrivados – art.192, II da CF/88). Conferir, a

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respeito: MARQUES NETO, FlorianoAzevedo. A nova regulação estatal e asagências independentes. p. 93-94: nota 49.In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direitoadministrativo econômico. São Paulo:Malheiros, 2000, p. 72-98.[154]

Salaverría esclarece a distinção entrediscricionariedade interna e externa: “háque se furtar ao perigo de se confundiremduas maneiras distintas em que compareceesta mistura de ‘técnica’ e‘discricionariedade’ (pois somente a umadelas cabe conceber como genuína ‘discri-cionariedade técnica’). Com efeito, uma coisaé entregar-se ao exercício da discricionar-iedade sobre a base de – entre outros – da-dos técnicos (econômicos, demográficos etc),e outra coisa distinta é que o espaço discri-cional irrompa na entranha dos juízos técni-cos mesmos” (SALAVERRÍA, Juan Igartua.Discrecionalidad técnica, motivación

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y control jurisdicional. Madri: EditorialCivitas, 1998, p. 26).[155]

A própria objetividade dos dados técni-cos é questionável. A “realidade ensina que atécnica não é sempre e necessariamentefonte de regras objetivamente válidas”(SALAVERRÍA, Juan Igartua. Discrecion-alidad técnica, motivación y controljurisdicional. Madri: Editorial Civitas,1998, p. 27).[156]

Esta postura é criticável em face da jácomentada ausência de objetividade noscritérios técnicos, no entanto, é adotada porjuristas de peso. “Se a decisão é técnica,evidentemente há standards, e muito pre-cisos, a serem estrita e rigorosamente aten-didos por quem toma a decisão!” (GRAU,Eros Roberto. O direito posto e o direito

pressuposto. 3a ed., São Paulo: Malheiros,2000, p. 159).

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[157]Vide SALAVERRÍA, Juan Igartua. Dis-

crecionalidad técnica, motivación ycontrol jurisdicional. Madri: EditorialCivitas, 1998, p. 13. O pensamento do autorpode ser resumido assim: a determinação dadiscricionariedade somente é evidenciadadefinitivamente in concreto (p. 38) e frente auma decisão razoável do administrador, queassim afastaria a crítica do arbítrio, cujagarantia para controle está na motivação es-sencial à ponderação da discricionariedade(p. 44 e seguintes).[158]

Vide MASHAW, Jerry L. Gli atti sub-le-gislativi di indirizzo della pubblica amminis-trazione nell’esperienza degli USA. p. 119. In:CARETTI, Paolo & SIERVO, Ugo de. Potereregolamentare e strumenti didirezione dell’amministrazione: pro-fili comparatistici. Bolonha: Il Mulino,1991, p. 111-140.

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[159]Vide DALLARI, Sueli Gandolfi. Direito

Sanitário. p. 55 e seguintes. In: ARANHA,Márcio Iorio (org.). Direito sanitário esaúde pública: coletânea de textos. Vol.I, Brasília: Ministério da Saúde, 2003. (SérieE. Legislação de Saúde)[160]

JUSTEN FILHO, Marçal. O Direito dasagências reguladoras independentes. SãoPaulo: Dialética, 2002, p. 31.[161]

Vide PROSSER, Tony. Law and theRegulators. Oxford: Claredon Press, 1997.[162]

“Regulation means government-im-posed controls on particular aspects of busi-ness activity. Note: This does not mean thateach and every business decision requiresprior government approval. Instead, controlwill usually be exercised through a mix ofprior approvals (for example, a request for atariff increase) or after-the-fact reviews ofperformance (for example, connection of a

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specified number of new customers). Regula-tion is only one form of government control.Governments can also control enterprisesthrough ownership and fiscal incentives).”(BROWN, Ashley C.; STERN, Jon;TENENBAUM, Bernard. World BankHandbook for Evaluating Infrastruc-ture Regulatory Systems. Washington:World Bank, 2006, p. 16).[163]

Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vie-ira de. Regulação de Serviços Públicosna Perspectiva da Constituição Econ-ômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey,2007.[164]

Definindo regulação como forma decontrole estatal, vide: GARNER, Bryan A.(org.). Black’s Law dictionary. 8ª ed., St.Paul: West Publishing Co., 2004, p. 1311.[165]

“Embora a etimologia sugira a asso-ciação da função reguladora com o

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desempenho de competências normativas,seu conteúdo [da regulação] é mais amplo evariado (...) a regulação contempla umagama mais ampla de atribuições, relacion-adas ao desempenho de atividades econôm-icas e à prestação de serviços públicos, in-cluindo sua disciplina, fiscalização, com-posição de conflitos e aplicação eventual desanções” (MOREIRA NETO, Diogo deFigueiredo. Direito regulatório: a al-ternativa participativa flexível para aadministração pública de relações set-oriais complexas no Estado Demo-crático. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p.45).[166]

Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vie-ira de. Regulação de Serviços Públicosna Perspectiva da Constituição Econ-ômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey,2007.

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[167]Entrevista dada por George Soros na

CNN, Fareed Zakaria GPS, em 12 de outubrode 2008.[168]

“In no system that could be rationallydefended would the state just do nothing”(HAYEK, Friedrich. The Road to Serf-dom. Chicago: University of Chicago Press,1944, p. 38-39).[169]

As funções de fiscalização, incentivo eplanejamento constam das raras passagensconstitucionais (art. 174, caput da Constitu-ição Federal de 1988) expressamente atin-entes à atividade reguladora do Estado.[170]

Vide MARQUES NETO, FlorianoAzevedo. A nova regulação estatal e asagências independentes. p. 74. In:SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direitoadministrativo econômico. São Paulo:Malheiros, 2000, p. 72-98).

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[171]Para uma concepção de regulação como

gerenciamento normativo de conflitos, vide:SUNDFELD, Carlos Ari. Agências regu-ladoras e os novos valores e conflitos, p.1294. In: Anais da XVII Conferência Na-cional dos Advogados. Justiça: realid-ade e utopia. Vol. II, Rio de Janeiro: Or-dem dos Advogados do Brasil, 1999, p.1291-1297. “O que é regular? É fazer este‘gerenciamento’ que referi. Não limitar-se àdistante edição de normas abstratas capazesde cuidar da sociedade durante oitenta anossem transformação mais profunda (...)”(SUNDFELD, Carlos Ari. op. cit., p. 1295).[172]

Observe-se que, aqui, regulamentaçãoestá sendo tratada como meio de regulaçãoestatal. Outra concepção dos termos regu-lação e regulamentação, guardando sintoniacom a terminologia – deregulation x regula-tion – e a preocupação atual norte-americ-ana de oposição entre regulação estatal (exo-

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regulação) e regulação social (auto-regulação), encontra-se em: GRAU, ErosRoberto. O direito posto e o direito

pressuposto. 3a ed., São Paulo: Malheiros,2000, p. 93.[173]

Eros Grau define a regulação como aatividade de “dar ordenação à atividade eco-nômica” e a regulamentação como uma suaespécie voltada a dar ordenação à atividadeeconômica “através de preceitos de autorid-ade, ou seja, jurídicos” (GRAU, ErosRoberto. O direito posto e o direito

pressuposto. 3a ed., São Paulo: Malheiros,2000, p. 96).[174]

A relação da regulação com monopóliosda União vem inscrita no art. 177, §2º, III, daConstituição Federal de 1988, referente aopetróleo, gás natural e outros hidrocarbone-tos fluidos.

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[175]Cass Sunstein utiliza, indiferentemente,

os termos regulation, law and government,government regulation e legal regulation,no sentido de intervenção em atividades deinteresse público. Conferir: SUNSTEIN, CassR. Republic.com 2.0. Princeton and Ox-ford: Princeton University Press, 2007.[176]

Sobre o conceito de sociedade-rede,vide: CASTELLS, Manuel. The Network So-ciety: From Knowledge to Policy. InCASTELLS, Manuel; CARDOSO, Gustavo.The Network Society: From Know-ledge to Policy. Washington: Johns Hop-kins Center for Transatlantic Relations,2006, p. 3-21.[177]

“We are used to hearing tales of the un-intended bad consequences of governmentaction. The Internet is an unintended goodconsequence of government action, by theDepartment of Defense no less.”

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(SUNSTEIN, Cass R. Republic.com 2.0.Princeton and Oxford: Princeton UniversityPress, 2007, p. 157).[178]

Vide AGUILLAR, Fernando Herren.Controle social de serviços públicos.São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 163-209.[179]

AGUILLAR, Fernando Herren. Con-trole social de serviços públicos. SãoPaulo: Max Limonad, 1999, p.165.[180]

Vide WEBER, Max. Economia e so-ciedade. Brasília: Editora Universidade deBrasília, 1991, p. 140.[181]

Vide AGUILLAR, Fernando Herren.Controle social de serviços públicos.São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 165-181.[182]

Verificou-se a tendência de passagemdo “poder de gerir a coisa pública das mãosprivadas do Imperador para inúmeros novoscentros de poder” (AGUILLAR, Fernando

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Herren. Controle social de serviçospúblicos. São Paulo: Max Limonad, 1999,p.181).[183]

Este fenômeno não foi uniforme, comonada na história o é. Daí Aguillar ressaltaruma manifestação de regulação normativaconcentrada nas concessões de construção eexploração de ferrovias a partir da primeirametade do século XIX e na regulamentaçãoda infraestrutura portuária. Conferir:AGUILLAR, Fernando Herren. Controlesocial de serviços públicos. São Paulo:Max Limonad, 1999, p. 184.[184]

Art.137.A lei federal regulará a fiscaliza-ção e a revisão das tarifas dos serviços ex-plorados por concessão, ou delegação, paraque, no interesse collectivo, os lucros dosconcessionarios, ou delegados, não excedama justa retribuição do capital, que lhes per-mitta attender normalmente ás necessidadespublicas de expansão e melhoramento desses

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serviços. (CAMPANHOLE, Adriano;CAMPANHOLE, Hilton Lobo. Constitu-ições do Brasil. 13ªed., São Paulo: Atlas,1999. p. 722) – mantida a redação originalda época.[185]

O art. 142 da CF/34 proibiu a garantiade juros aos concessionários. ConstituiçãoFederal brasileira de 1934: “Art. 142. A Un-ião, os Estados e os Municípios não poderãodar garantia de juros a empresas concession-arias de serviços publicos”.[186]

Esse período presenciou a criação doConselho Nacional de Telecomunicaçõescom o Decreto 50.666/61 e a instituição doCódigo Brasileiro de Telecomunicações (Lei4.117/62) revogado em sua maior parte pelaLei 9.472/97.[187]

Um dos objetivos fundamentais da Re-forma Estrutural do Setor de Telecomu-nicações proposta e já implementada pelo

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Governo brasileiro desde 1995 foi “fortalecero papel regulador do Estado e eliminar seupapel de empresário” mediante a privatiza-ção e a criação do órgão regulador. Conferir:BRASIL, Ministério das Comunicações.Diretrizes Gerais para a Abertura doMercado de Telecomunicações. Título II(Os fundamentos da proposta), Capítulo 2(Os objetivos da reforma), Figura 6. Esclare-cedora a posição exarada pelo Banco Mundi-al na Americas Telecom 2000, realizadaentre 10 e 15 de abril de 2000, no Rio deJaneiro, quando seu representante, CarlosBraga, foi questionado pelo Governo dePorto Rico sobre a ausência de linhas decrédito para empresas estatais prestadorasde serviços de telecomunicações. A respostarevelou a decisão do Banco Mundial emsomente fomentar o desenvolvimento deempresas privadas de telecomunicações emmercados livres, pois partiu do pressupostode que a concentração do serviço de

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telecomunicações nas mãos do Estado nãosatisfaria as exigências de tecnologia e din-amização em um mundo globalizado.[188]

As transformações implementadasocorreram porque o controle da regulaçãopelo próprio gestor do serviço (DNAEE,DNER, TELEBRÁS, ELETROBRÁS) faziaprevalecer o interesse da burocracia (in-teresse secundário) sobre o interesse do con-sumidor (interesse primário). Conferir:MARQUES NETO, Floriano Azevedo. A novaregulação estatal e as agências independ-entes. p. 77. In: SUNDFELD, Carlos Ari (co-ord.). Direito administrativo econ-ômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p.72-98.[189]

Esmiuçando o conceito de Estado Sub-sidiário, vide: DI PIETRO, Maria Sylvia Zan-ella. Parceriais na AdministraçãoPública: concessão, permissão,

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franquia, terceirização e outras

formas. 3a ed., São Paulo: Atlas, 1999, p.24-31.[190]

Vide TÁCITO, Caio. Novas agênciasadministrativas. In: Carta Mensal, Rio deJaneiro 45(529): 33-44, abril 1999, p. 34.[191]

O Decreto 83.740/79 estebeleceu umMinistro Extraordinário do Programa Na-cional de Desburocratização. Dentre os ob-jetivos do Programa, estava o de “impedir ocrescimento desnecessário da máquina ad-ministrativa federal, mediante o estímulo àexecução indireta, utilizando-se, sempre quepraticável, o contrato com empresas privadascapacitadas e o convênio com órgãos es-

taduais e municipais” (art.3o, g, do Decreto83.740/79). Visava, também, o incentivo deuma “política de contenção da criação indis-criminada de empresas públicas, pro-movendo o equacionamento dos casos emque for possível e recomendável a

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transferência do controle para o setor

privado” (art.3o, h, do Decreto 83.740/79).[192]

Art.1o, I do Decreto 95.886, de 29 demarço de 1988.[193]

Para a análise do histórico dos disposit-ivos normativos da desestatização no Brasil,vide: MEDAUAR, Odete. Direito adminis-

trativo moderno. 5a ed., São Paulo: RT,2001, p. 106 e seguintes.[194]

Vide CARVALHO, Carlos Eduardo Vie-ira de. Regulação de Serviços Públicosna Perspectiva da Constituição Econ-ômica Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey,2007.[195]

CONSTITUIÇÃO FEDERALBRASILEIRA DE 1988, art.151, I.[196]

Da mesma forma, as chamadas sançõespremiais são intervenção por indução, masnão se caracterizam como regulação regional

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e sim geral ou setorial dependendo do caso.Incentivos fiscais à indústria, em geral, parainvestimento em meio ambiente não se con-figuram regulação regional, mas geral sobreo subsistema ordenamental ambiental. Setais incentivos fiscais fossem dirigidos à de-terminado setor, eles se apresentariam tam-bém gravados do caráter de regulaçãosetorial.[197]

CONSTITUIÇÃO FEDERALBRASILEIRA DE 1988, art.159, I, c.[198]

AGUILLAR, Fernando Herren. Con-trole social de serviços públicos. SãoPaulo: Max Limonad, 1999, p. 214.[199]

Como exemplo, vide, mais adiante, nota269.[200]

No Brasil, o Conselho Administrativode Defesa Econômica (CADE). No Reino Un-ido, a Monopolies and Merger Commission

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(MMC). Nos EUA, a Federal Trade Commis-sion (FTC).[201]

Proposta de Carlos Ari Sundfeld naXVII Conferência Nacional da Ordem dosAdvogados do Brasil. “Talvez já seja a horade pensar, também, na criação de agênciasreguladoras do meio ambiente independ-entes em relação ao Poder Executivo, parasubstituir os atuais órgãos incumbidos do as-sunto” (SUNDFELD, Carlos Ari. Op. cit., p.1291).[202]

É o caso do Conselho Monetário Na-cional e do Banco Central do Brasil.[203]

À época de criação destas autarquias,costumava-se distinguir, por inspiração dodireito italiano, entre autarquias econôm-icas, voltadas a regular a produção e ocomércio, autarquias industriais, autarquiasde crédito, autarquias de previdência, autar-quias corporativas, autarquias educacionais.

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FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Re-forma do Estado: o papel das agências reg-uladoras e fiscalizadoras. p. 254. In:Fórum Administrativo, ano 1, nº 3, maiode 2001, p. 253-257.[204]

O Instituto Brasileiro do Café (IBC)apresentava-se como entidade autárquicacriada pela Lei 1.779, de 22 de dezembro de

1952. O art.1o, I, e da Lei 8.029, de 12 de ab-ril de 1990, autorizou o Poder Executivo aextinguir o IBC, o que se concretizou com oDecreto 99.240, de 7 de maio de 1990. Atual-mente, o Departamento do Café (DECAF) éresponsável pelo planejamento, coordenaçãoe supervisão das políticas públicas con-cernentes ao setor cafeeiro e integra a Secret-aria de Produção e Comercialização na estru-tura do Ministério da Agricultura e doAbastecimento.[205]

O Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA)

foi criado pelo Decreto 22.789, de 1o de

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junho de 1933. O art.1o, I, d da Lei 8.029, de12 de abril de 1990 autorizou o Poder Exec-utivo a extinguir o IAA, o que se concretizou

com o art.1o, I, d do Decreto 99.240, de 7 demaio de 1990. O Decreto 99.288, de 6 dejunho de 1990, transferiu as atribuições doextinto IAA para a Secretaria de Desenvolvi-mento Regional da Presidência da República(SDR/PR), que foi transformada em Secret-aria do Ministério da Integração Regional(MIR) pela Lei 8.490, de 19 de novembro de1992. Com a Medida Provisória 987, de 28de abril de 1995, o Ministério da Indústria,do Comércio e do Turismo (MICT) assumiuos encargos do MIR. Em 22 de dezembro de

1995, o art.2o, III, b do Anexo I do Decreto1.757 criou o Departamento de Açúcar e doÁlcool integrante da estrutura do entãoMICT. Finalmente, a Medida Provisória1.911-8, de 29 de julho de 1999 transferiupara o Ministério da Agricultura e do Abaste-cimento a competência sobre a matéria de

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política sucroalcooleira, onde funciona o De-partamento do Açúcar e do Álcool integranteda Secretaria de Produção e Comercializaçãona estrutura do Ministério da Agricultura edo Abastecimento. Atualmente, a políticapública sucroalcooleira concentra-se no Pro-grama de Equalização de Custos de Produçãonos Estados do Nordeste em detrimento deprogramas de incentivo específico de planta-dores de cana. Tal programa foi instituídopela Resolução nº 5, de 10/12/1998, do Con-selho Interministerial do Açúcar e do Álcool(CIMA), criado pelo Decreto sem número de21/08/1997 revogado pelo Decreto atual deregência do CIMA: Decreto 3.546, de 17/07/2000.[206]

O DNAEE originou-se da Divisão deÁguas (criada pelo Decreto 6.402, de 28/10/1940) do Departamento Nacional deProdução Mineral – DNPM – (criado na Re-forma Juarez Távora, em agosto de 1934) en-tão pertencente ao Ministério da Agricultura,

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Indústria e Comércio. Com a criação do Min-istério das Minas e Energia, em 1961, oDNPM foi vinculado a este ministério. SuaDivisão de Águas foi transformada no De-partamento Nacional de Águas e Energia –DNAE (Lei 4.904, de 17/12/1965) e teve suadenominação alterada para DepartamentoNacional de Águas e Energia Elétrica –DNAEE pelo Decreto 63.951, de 31/12/1968.[207]

O Conselho Nacional do Petróleo(CNP) foi criado pelo Decreto nº395/38 eteve suas atribuições definidas pela Lei2.004, de 03 de outubro de 1953.[208]

Deste rol de agências reguladoras estáexcluída a Agência Brasileira de Inteligência(ABIN), que assimilou a terminologia ap-licada às autarquias autônomas de regulaçãosetorial, mas não detém suas característicasdistintivas. A ABIN não tem personalidadejurídica própria. É um órgão integrante doSubsistema de Inteligência de Segurança

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Pública (art. 2o do Decreto 3.448/2000), cri-ado no âmbito do Sistema Brasileiro de In-teligência (SISBIN) da Presidência da

República (arts. 1o e 3o da Lei 9.883/99), sobsupervisão interna da Câmara de RelaçõesExteriores e Defesa Nacional do Conselho de

Governo (art. 5o da Lei 9.883/99) e sob con-

trole externo do Congresso Nacional (art. 6o

da Lei 9.883/99). Está sob a direção mono-

crática de um Diretor-Geral (art. 8o da Lei9.883/99), ao contrário do modelo das agên-cias reguladoras pautado em colegiados.Assemelha-se, contudo, às agências regu-ladoras no procedimento de nomeação deseu Diretor-Geral, mediante indicação enomeação pelo Presidente da República apóssabatina no Senado Federal (art. 11, pará-grafo único da Lei 9.883/99). O ConselhoEspecial do Subsistema de Inteligência deSegurança Pública, sob administração daABIN, é vinculado ao Gabinete de SegurançaInstitucional da Presidência da República

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(art. 3o do Decreto 3.448/2000) e tem o seuRegimento Interno aprovado pelo Chefe doGabinete de Segurança Institucional daPresidência da República, que é a via de in-teração da Agência com os interessados noexercício de seu direito a autodeterminaçãodas informações pessoais.[209]

Agência Espacial Brasileira (AEB) foiinstituída pela Lei 8.854, de 10 de fevereirode 1994, com competência, dentre outras, deestabelecer normas e expedir licenças eautorizações relativas às atividades espaciais(art.3º,XIII) bem como aplicar as normas dequalidade e produtividade em tais atividades(art.3º,XIV).[210]

Agência Nacional de Telecomunicações(ANATEL) foi instituída pela Lei 9.472, de 16de julho de 1997, regulamentada peloDecreto 2.338, de 7 de outubro de 1997, comfunção de disciplinamento e fiscalização daexecução, comercialização e uso dos serviços

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de telecomunicações e da implantação e fun-cionamento de redes de telecomunicações,bem como da utilização dos recursos de ór-bita e espectro de radiofrequências. Temfundo próprio submetido a sua exclusiva ad-ministração (Fundo de Fiscalização das Tele-comunicações – FISTEL), criado pela Lei5.070, de 7 de julho de 1966.[211]

Agência Nacional de Energia Elétrica(ANEEL) foi instituída pela Lei 9.427, de 26de dezembro de 1996 com a finalidade deregular e fiscalizar a produção, transmissão,distribuição e comercialização de energiaelétrica, em conformidade com diretrizes doGoverno Federal e com poderes regula-mentados pelo Decreto 2.335, de 6 de out-ubro de 1997. Sucedeu ao Departamento Na-cional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE).Tem atribuição de celebrar e gerir contratosde concessão e de permissão no setor e de di-rimir, no âmbito administrativo, divergên-cias entre concessionárias e consumidores.

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[212]Agência Nacional do Petróleo (ANP),

instituída pela Lei 9.478, de 6 de agosto de1997, teve suas atividades regulamentadaspelo Decreto 2.455, de 14 de janeiro de 1998.Como autarquia reguladora da indústria dopetróleo, tem funções de normatização, con-tratação e fiscalização das atividades econ-ômicas integrantes da indústria do petróleo.[213]

Agência Nacional de Vigilância San-itária (ANVISA) foi instituída pela Lei 9.782,de 26 de janeiro de 1999 e teve suas ativid-ades regulamentadas pelo Decreto 3.029, de16 de abril de 1999. Sua sigla foi mudada deANVS para ANVISA pela Medida Provisória2.134-25, de 28/12/2000, produto de modi-ficação das prorrogações da Medida Pro-visória originária de número 1.814, de 26/02/1999. Autarquia especial vinculada aoMinistério da Saúde, tem por objetivos,dentre outros, promover a proteção da saúdeda população, por intermédio do controle

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sanitário da produção e da comercializaçãode produtos e serviços submetidos à vigilân-cia sanitária, inclusive dos ambientes, dosprocessos, dos insumos e das tecnologias aeles relacionados, bem como o controle deportos, aeroportos e de fronteiras.[214]

Agência Nacional de Saúde Suplement-ar (ANS) foi criada pela Lei 9.961, de 28 dejaneiro de 2000, também vinculada ao Min-istério da Saúde e com a finalidade de pro-mover a defesa do interesse público na as-sistência suplementar à saúde, normatizandoa atuação das operadoras setoriais, inclusivequanto às suas relações com prestadores econsumidores, contribuindo para o desen-volvimento de ações em âmbito nacional.[215]

Agência Nacional das Águas (ANA) foiinstituída pela Lei 9.984, de 17 de julho de2000, vinculada ao Ministério do Meio Am-biente, integrante do Sistema Nacional deGerenciamento de Recurso Hídricos.

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[216]Agência Nacional de Transportes Ter-

restres (ANTT), instituída pela Lei 10.233, de5 de junho de 2001, autarquia especial su-pervisionada pelo Ministério dos Transpor-tes com independência administrativa, auto-nomia financeira e funcional e mandato fixode seus dirigentes (art.21,§2º) e competênciapara regulação do transporte ferroviário depassageiros e cargas ao longo do Sistema Na-cional de Viação (art.22,I), de exploração dainfraestrutura ferroviária e arrendamentodos ativos operacionais correspondentes(art.22,II), do transporte rodoviário in-terestadual e internacional de passageiros(art.22,III), do transporte rodoviário de car-gas (art.22,IV), da exploração da infraestru-tura rodoviária federal (art.22,V), do trans-porte multimodal (art.22,VI) e do transporteda cargas especiais e perigosas em rodovias eferrovias (art.22,VII).

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[217]Agência Nacional de Transportes

Aquaviários (ANTAQ), instituída pela Lei10.233, de 5 de junho de 2001, autarquia es-pecial supervisionada pelo Ministério dosTransportes com independência adminis-trativa, autonomia financeira e funcional emandato fixo de seus dirigentes (art.21,§2º)e competência para regular a navegação flu-vial, lacustre, de travessia, de apoio marí-timo, de apoio portuário, de cabotagem, delongo curso (art.23,I), os portos organizados(art.23,II), os terminais portuários privativos(art.23,III), o transporte aquaviário de car-gas especiais e perigosas (art.23,IV) e a ex-ploração da infraestrutura aquaviária federal(art.23,V).[218]

Agência Nacional do Cinema(ANCINE), instituída pela Medida Provisória2.228, de 6 de setembro de 2001, autarquiaespecial supervisionada pelo Ministério doDesenvolvimento, Indústria e Comércio

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Exterior com autonomia administrativa efinanceira (art.5º,caput) e mandato fixo deseus dirigentes (art.8º,caput) e competênciapara regular as atividades cinematográficas evideofonográficas (art.7º), com detal-hamento do audiovisual advindo da Lei12.485, de 12 de setembro de 2011.[219]

Office of Water Services (OFWAT), cujoDiretor (Director General of Water Services)vem definido como o regulador econômicoda indústria de água e esgoto da Inglaterra edo País de Gales na Parte I, Artigo 1º, Pará-grafo 1º, do Water Industry Act 1991(WIA91), fixando preços pelos serviços defornecimento de água e de esgoto, fiscaliz-ando a qualidade dos serviços, fiscalizando asaúde das empresas do setor, incentivando aeficiência e a competição.[220]

Precedida pela OFTEL (Office of Tele-communications), que fora criada pelo Tele-communications Act de 1984, a Office of

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Communications (OFCOM), com formatodefinido pelo Communications Act de 2003,assimilou, dentre outras, as competências daOFTEL e hoje se apresenta como reguladorada indústria de comunicações do Reino Un-ido, envolvendo serviços de televisão, rádio,telecomunicação e comunicação sem fio.[221]

The Office of Gas and Electricity Mar-kets (OFGEM) surgiu da reunião do OFFER(Office of Electricity Regulation) com oOFGAS (Office of Gas Suply), cujas basesnormativas remontam ao Gas Act de 1986.Trata-se do regulador da indústria britânicade gás e eletricidade.[222]

Interstate Commerce Commission(ICC), festejada como a primeira agênciareguladora federal norte-americana, foi in-stituída pelo Interstate Commerce Act de1887 destinada a regular transportes em ger-al, à exceção do transporte aéreo, tendo sidoextinta em 1995.

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[223]Federal Communications Commission

(FCC), instituída pelo Communications Actde 1934 e qualificada como agência inde-pendente, responde pela regulação da comu-nicação interestadual e internacional por rá-dio, televisão, par de cobre, satélite ou cabo.[224]

Federal Energy Regulatory Commis-sion (FERC), foi a sucessora da antiga Feder-al Power Commission (FPC), que, emboraexistente desde 1920, adquiriu as caracter-ísticas de uma agência governamental inde-pendente a partir de 1930. Criada em 1977, aFERC é citada oficialmente como agênciagovernamental independente que regula atransmissão interestadual de gás natural,petróleo e eletricidade dos Estados Unidosda América.[225]

Regulierungsbehörde für Telekom-munikation und Post (RegTP), trata-se daAutoridade Reguladora para

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Telecomunicações e Correios da Alemanha,entidade reguladora dos setores de tele-comunicações e correios instituída a partirde 1996 com a correspondente Lei Geral deTelecomunicações (Regelungen desTelekommunikationsgesetzes – TKG). Em 13de julho de 2005, foi renomeada para Bun-desnetzagentur. Conferir: FARIA, Patrick. AAgência Federal de Redes na RepúblicaFederal da Alemanha. In: Anais do ISeminário de Regulação de ServiçosPúblicos - Direito Comparado da Ener-gia Elétrica e das Telecomunicações.Brasília, 2007.[226]

União Internacional de Telecomu-nicações (International TelecommunicationUnion – ITU).[227]

World Health Organization (WHO) –Organização Mundial da Saúde (OMS).

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[228]Food and Agriculture Organization of

the United Nations (FAO).[229]

United Nations Educational, Scientificand Cultural Organization (UNESCO).[230]

Universal Postal Union International(UPU).[231]

International Atomic Energy Agency(IAEA) – Organismo Internacional de Ener-gia Atômica (OIEA).[232]

No setor de telecomunicações, o espec-tro de radiofrequência e os recursos de ór-bita são exemplos de bens finitos ouescassos.[233]

Já na primeira metade do século XIX,os conselhos administrativos eram tidoscomo auxiliares dos agentes políticos “paraque a deliberação e a ação que [deles] resultaseja ilustrada e acertada; para que esta

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melhor possa ser fiscalizada; para que a re-sponsabilidade seja mais patente e justa”(URUGUAI, Paulino José Soares de Souza,Visconde de. Ensaio sobre o direitoadministrativo. Fac-símile da edição de1960, Brasília: Imprensa Nacional, 1997, p.126).[234]

CONSTITUIÇÃO FEDERALBRASILEIRA DE 1934: “Art. 103. Cada Min-isterio será assistido por um ou mais Consel-hos Technicos, coordenados, segundo anatureza dos seus trabalhos, em ConselhosGeraes, como órgãos consultivos da Camara

dos Deputados e do Senado Federal. §1o A leiordinaria regulará a composição, o funccio-namento e a competencia dos Conselhos

Technicos e dos Conselhos Geraes. §2o Met-ade, pelo menos, de cada Conselho será com-posta de pessoas especializadas, estranhasaos quadros do funccionalismo do respectivo

Ministerio. §3o Os membros dos Conselhos

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Technicos não perceberão vencimentos pelodesempenho do cargo, podendo, porém, ven-cer uma diaria pelas sessões, a que compare-

cerem. §4o É vedado a qualquer Ministro to-mar deliberação, em materia da sua compet-encia exclusiva, contra o parecer unanime dorespectivo Conselho.” (CAMPANHOLE,Hilton Lobo; CAMPANHOLE, Adriano.

Constituições do Brasil. 13aed., SãoPaulo: Atlas, 1999, p. 712).[235]

Max Weber utiliza o conceito de colegi-alidade como meio específico de mitigaçãoda dominação. A colegialidade de funçõesdiferencia-se, no pensamento de Weber, dacolegialidade de cassação. Nesta última,persiste a decisão monocrática em meio aoutras instâncias monocráticas de adiamentoou cassação da decisão. Na colegialidade defunções, a autoridade monocrática é sub-stituída pela autoridade institucional, emque a vontade de um é substituída pela

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cooperação de alguns. Conferir, a respeito:WEBER, Max. Economia e sociedade.Vol.I, Brasília: Editora Universidade deBrasília, 1991, p. 178-188.[236]

Sobre o princípio da colegialidade,García-Trevijano Fos esclarece que “constitui(....) o último dos que integram as bases fun-damentais de toda organização adminis-trativa. Dividíamos os órgãos em ativos, de-liberantes, consultivos e de controle. Teor-icamente, todos eles podem ser unipessoaisou colegiados com uma única exceção: a dosórgãos consultivos, que têm sempre naturezacolegial (....). Os órgãos ativos costumam ser– na administração geral do Estado – uni-pessoais. Os de controle costumam ser, aocontrário, colegiados.” – tradução livre dooriginal: FOS, Jose Antonio Garcia-Trevi-jano. Tratado de derecho administrat-ivo. Tomo II, Vol. I, 2ªed., Madri: EditorialRevista de Derecho Privado, 1971, p. 480.

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[237]Ao analisar os progressos do princípio

burocrático monocrático, Weber aponta de-feitos e virtudes da forma colegial de decisão:“O trabalho organizado em forma colegial(...) condiciona atritos e retardações, com-promissos entre opiniões e interessescontraditórios, realizando-se, portanto, commenos precisão e menos dependência deautoridades superiores e, por isso, demaneira menos uniforme e mais lenta”(WEBER, Max. Economia e sociedade.Vol. II, Brasília: Editora Universidade deBrasília, 1999, p. 212).[238]

Vide WEBER, Max. Economia e so-ciedade. Vol. I, Brasília: Editora Universid-ade de Brasília, 1991, p. 183.[239]

“Superior ao conhecimento especial daburocracia é apenas o conhecimento especialdos interessados da economia privada, naárea ‘econômica’. Isto porque, para eles, o

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conhecimento exato dos fatos de sua área édiretamente uma questão de sua existênciaeconômica: erros numa estatística oficial nãotrazem consequências diretamente econôm-icas para o funcionário responsável, mas er-ros nos cálculos de uma empresa capitalistacausam-lhe perdas, ameaçando, talvez, suaexistência. E também o ‘segredo’, como meiode poder, está mais seguramente guardadono livro comercial de um empresário do quena documentação das autoridades. Já porisso, a influência oficial sobre a vida econôm-ica, na era capitalista, tem limites muito es-treitos, e as medidas do Estado nesta áreadesembocam tão frequentemente em camin-hos imprevistos e despropositados outornam-se ilusórias devido ao conhecimentoespecial superior dos interessados” (WEBER,Max. Economia e sociedade. Vol. II,Brasília. Editora Universidade de Brasília,1999, p. 227).

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[240]Vide WEBER, Max. Economia e so-

ciedade. Vol. II, Brasília. Editora Universid-ade de Brasília, 1999, p. 228-229.[241]

O trecho a seguir é esclarecedor daabertura conceitual sofrida pelo conceito deconselho: “Enquanto o conhecimento espe-cial em assuntos administrativos era exclu-sivamente produto de longa prática empíricae as normas administrativas não eram regu-lamentos, mas componentes da tradição, oconselho dos anciãos, muitas vezes com par-ticipação dos sacerdotes, dos “velhos estadis-tas” e dos honoratiores, era tipicamente aforma adequada de tais instâncias, que ini-cialmente apenas aconselhavam o senhor,porém, mais tarde, por serem complexosperenes diante dos soberanos alternantes,frequentemente usurpavam o poder efetivo.Assim, o senado romano e o conselho venezi-ano, bem como o areópago ateniense até suaderrubada em favor do domínio dos

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‘demagogos’.” (WEBER, Max. Economia esociedade. Vol. II, Brasília. Editora Univer-sidade de Brasília, 1999, p. 228).[242]

São exemplos conhecidos de“conselhos” com função decisória, no Brasil,o Conselho Administrativo de Defesa Econ-ômica (CADE) e os Conselhos de Con-tribuintes. O Conselho Nacional de Desestat-ização – CND, criado pela Lei 8.031/90 e in-tegrado por cinco ministros de estado temamplos poderes sobre todo o processo deprivatização, desde a escolha das atividadesou empresas a serem privatizadas até aforma de privatização e o destino dos re-cursos. Eventualmente deliberam nas ses-sões, o presidente do Banco Central e outrosministros de Estado. O presidente do Con-selho é o Ministro do Planejamento e Orça-mento. Mesmo o Conselho Nacional de Polít-ica Energética (CNPE), com atribuição depropor medidas relativas aos recursos ener-

géticos ao Presidente da República (art.2o da

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Lei 9.478/97), transpareceu vinculação dassuas emanações por força do Decreto 2.455/98, que, ao estabelecer as finalidades daAgência Nacional do Petróleo, vinculou-a àsdiretrizes emanadas do Conselho Nacional

de Política Energética (art.2o do Decreto2.455/98), que foge à característica mera-mente consultiva em razão de seu funciona-mento periódico e função específica de pro-postas políticas energéticas. Não se querdizer com isso que suas decisões vinculamsem a necessária aprovação do Presidente daRepública.[243]

A presença, na Constituição Federalbrasileira de 1988, do Conselho da Repúblicae do Conselho de Defesa Nacional como ór-gãos meramente opinativos é significativa.[244]

Nem todos os exemplos são tão lúcidosassim. O Conselho Monetário Nacional(CMN) tem sua composição restrita a 3membros do Executivo exclusivamente,

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quais sejam: Ministro de Estado da Fazenda;Ministro de Estado do Planejamento e Orça-mento; Presidente do Banco Central. Fun-cionam junto ao Conselho Monetário Na-cional comissões consultivas estritamentetécnicas (Normas e Organização do SistemaFinanceiro, Mercado de Valores Mobiliáriose de Futuros, Crédito Rural, Crédito Indus-trial, dentre outros).[245]

Como exemplo, a Agência Nacional deTelecomunicações (ANATEL) comporta umConselho Consultivo definido como órgão de“participação institucionalizada da sociedadena Agência” (art.33 da Lei 9.472/97).[246]

AGUILLAR, Fernando Herren. Con-trole social de serviços públicos. SãoPaulo: Max Limonad, 1999, p. 226.[247]

Sobre os conselhos, “continuava a oper-ar, de direito ou de fato, o controle político,pela via de supervisão ministerial e a

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competência do Congresso, definindo metase a atribuição de recursos” (TÁCITO, Caio.Novas agências administrativas. In: CartaMensal, Rio de Janeiro 45(529): 33-44, ab-ril 1999, p. 36).[248]

Considerando o CONTEL como comis-são interministerial, vide: BRASIL.SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Mandadode Segurança n. 19.227/DF, relator Min.Themístocles Cavalcanti, Tribunal Pleno, un-ânime, j. 09/04/1969.[249]

Murilo César Ramos analisa a semel-hança entre o CONTEL brasileiro e a FCCnorte-americana e atesta o processo de cent-ralização ministerial como o fator de ex-tinção do órgão regulador das telecomu-nicações no Brasil ao falar do “órgão colegi-ado criado pelo Código Brasileiro de Tele-comunicações, emulado, ainda que frouxa-mente, na Federal Communications Com-mission (FCC) norte-americana. CONTEL

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que iria ser esvaziado progressivamente atésua extinção total nos anos 70, substituídode fato e de direito por um Ministério alta-mente centralizador e concentrador depoder.” (RAMOS, Murilo César. Saúde,novas tecnologias e políticas públicas decomunicações. In: PITTA, Áurea Maria daRocha (org). Saúde & Comunicação: vis-ibilidades e silêncios. São Paulo: Hu-citec, 1995. p. 69-70).[250]

Expressão originária do italiano autar-chia. O termo “foi usado pela primeira vezpelo publicista italiano Santi Romano, em1897, para identificar a situação de entes ter-ritoriais e institucionais do Estado unitárioitaliano” (MEDAUAR, Odete. Direito ad-

ministrativo moderno. 5a ed., São Paulo:RT, 2001, p. 77). O conceito basilar de autar-quia está na personalidade jurídica dotadade auto-administração e autosuficiência,conforme enuncia a doutrina italiana em facede sua etimologia: “A palavra italiana

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‘autarquia’ traduz duas expressões gregasdistintas e tem dois significados em virtudedesta origem distinta: em um primeiro signi-ficado, indica a condição de um sujeito que écapaz de bastar a si próprio, de prover suaspróprias necessidades (autosuficiência); nosegundo, serve para indicar a posição de umente a quem é reconhecida a capacidade dese governar, de administrar os própriosinteresses (auto-administração)”(ZANOBINI, Guido. Corso di diritto am-ministrativo. Vol. I, 8ª ed., Milão: Dott. A.Giuffrè Editore, 1958, p. 124). Tradução livredo original: “La parola italiana ‘autarchia’traduce due diverse parole greche e ha duesignificati, secondo che deriva dall’una odall’altra di esse: in um primo significato,indica la condizione di un soggetto che è ca-pace di bastare a se stesso, di provvedere dasè ai propri bisogni (autosufficienza); nelsecondo, vale a indicare la posizione di unente cui è riconosciuta la capacità di

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governarsi da sè, di amministrare da sè ipropri interessi (autoamministrazione)”.[251]

TÁCITO, Caio. Novas agências admin-istrativas. In: Carta Mensal, Rio deJaneiro 45(529): 33-44, abril 1999, p. 37.[252]

Lei 9.649, de 27 de maio de 1998,produto da Medida Provisória 1.549-28, reg-ulada pelos Decretos 2.487 e 2.488, ambosde 2 de fevereiro de 1998.[253]

Fala-se em autarquias e fundaçõespúblicas federais, pois a lei criadora dasagências executivas é federal. Isso não im-pede a criação de agências executivas semel-hantes às federais no âmbito estadual e mu-nicipal, desde que existam leis destes entespara embasarem o ato da Administração.[254]

TÁCITO, Caio. Novas agências admin-istrativas. In: Carta Mensal, Rio deJaneiro 45(529): 33-44, abril 1999, p. 36.

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[255]Em razão de sua natureza jurídica de

direito público interno, a ela se aplica o rolde características publicistas, tais como: re-sponsabilidade objetiva do poder; controledos atos estatais; fundamentação dos atos dopoder; discricionariedade; publicidade;transparência; supremacia do interessepúblico; legalidade estrita; processo deprodução de atos do poder; dever de prestarcontas; licitação etc. A respeito da caracteriz-ação do regime de direito público, conferir aobra precisa, embora sintética e in-trodutória: SUNDFELD, Carlos Ari. Funda-mentos de direito público. São Paulo:Malheiros, 1992.[256]

Quanto aos efeitos do decreto, qualific-ando autarquias ou fundações como agênciasexecutivas, Di Pietro defende que “dificil-mente se poderá ampliar a autonomia dessasentidades, por meio de decreto ou de con-trato de gestão [embora deixando em aberto

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à lei prevista no art.37, §8o da CF/88 a pos-sibilidade de ampliação de dita autonomia],porque esbarrarão os mesmos em normas le-gais e constitucionais” (DI PIETRO, MariaSylvia Zanella. Direito administrativo.

11a ed., São Paulo: Atlas, 1999, p. 388).[257]

Nas agências executivas, predomina “osentido de prévio compromisso e a aferiçãode resultados como requisito de sobrevivên-cia” (TÁCITO, Caio. Novas agências admin-istrativas. In: Carta Mensal, Rio deJaneiro 45(529): 33-44, abril 1999, p. 39).[258]

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.Reforma do Estado: o papel das agênciasreguladoras e fiscalizadoras. In: FórumAdministrativo, ano 1, nº 3, maio de 2001,p. 253-257.[259]

No Brasil, as agências reguladorasmanifestam-se por diversos atos (súmula,aresto, ato, portaria, consulta, resolução).

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Destes, somente a resolução tem propria-mente caráter normativo qualificado comoum poder não-delegado e “temperado”(CUÉLLAR, Leila. As agências regulador-as e seu poder normativo. São Paulo: Di-alética, 2001, 142) ou mesmo como uma es-pécie de alargamento do poder normativo doExecutivo por intermédio de lei-quadro (loi-cadre) correspondente (BRUNA, SérgioVarella. Agências reguladoras: podernormativo, consulta pública e revisãojudicial. São Paulo: Editora Revista dosTribunais, 2003, p. 73). Nos EUA, têm-secomo exemplos da diversidade de atosproduzidos no âmbito das agencies norte-americanas dotadas de poder normativo:rules, adjudicatory orders, licenses, policystatements, manuals, circulars, memor-anda, advisory opinions, waivers, recom-mendations, regulations (MASHAW, JerryL. Gli atti sub-legislativi di indirizzo dellapubblica amministrazione nell’esperienza

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degli USA. p. 117. In: CARETTI, Paolo &SIERVO, Ugo de. Potere regolamentaree strumenti di direzione dell’amminis-trazione: profili comparatistici. Bo-lonha: Il Mulino, 1991, p. 111-140).[260]

TÁCITO, Caio. Novas agências admin-istrativas. In: Carta Mensal, Rio deJaneiro 45(529): 33-44, abril 1999, p. 34.[261]

MORAES, Luiza Rangel de. A reestru-turação dos setores de infra-estrutura e adefinição dos marcos regulatórios. In:PAULA, Tomás Bruginski de; REZENDE,Fernando (coordenadores). Infra-estru-tura: perspectivas de reorganização(Caderno de Regulação). Brasília: Insti-tuto de Pesquisa Econômica Aplicada(IPEA), 1997, p. 12.[262]

Fala-se, então, da dificuldade de assim-ilação do novo modelo de “instituições

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independentes e com grande autonomia deação” (Ibid., p. 5).[263]

Parker assimila o conceito de commis-sion ao de independent agency. Também re-gistra a qualificação de quarto poder at-ribuída às independent agencies norte-amer-icanas pelos órgãos de cúpula dos poderesLegislativo e Executivo. Conferir: PARKER,Reginald. Administrative Law. Indianá-polis: The Bobbs-Merrill Company, 1952, p.94: nota 62.[264]

Deve-se atentar para a consideração deCaio Tácito sobre a impropriedade da aprox-imação exagerada entre os conceitos deagências reguladoras do Brasil e as commis-sions dos EUA, pois ela seria “antes termin-ológica do que real” (TÁCITO, Caio. Novasagências administrativas. In: Carta Mens-al, Rio de Janeiro 45(529): 33-44, abril1999, p. 37). Há, entretanto, aproximaçõesúteis à compreensão das agências

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reguladoras: a) o interesse no estudo do con-ceito de public utility commission regulationestá na discussão e fixação do grau de inter-ferência do Poder Judiciário nas suas de-cisões. A análise dos limites dos clássicoscases envolvendo as commissions norte-americanas pode ser conferida em:CAVALCANTI, Themistocles Brandão.Tratado de direito administrativo. Vol.II, 5ª ed., Rio de Janeiro: Livraria FreitasBastos, 1964, p. 496-499. Desta discussãosurge a extensão do poder revisório judicialfrente à discricionariedade do ato adminis-trativo regulatório estatal; b) a origem da co-gitação das commissions aproxima-se muitodo objetivo das agências reguladorasbrasileiras, pois aquelas foram introduzidascom intuito de otimizar o controle das ativid-ades estatais delegadas, outorgando-sepoderes de regular e de controlar de formacontínua as concessões públicas por órgãoscom conhecimento técnico necessário ao

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direcionamento de determinados setores deatividade econômica; c) as commissionstambém partilharam o momento histórico deretirada do Estado da interferência opera-cional na economia, remetendo à função le-gislativa a definição de standards, cuja regu-lamentação ficaria a cargo de órgão técnicoespecializado.[265]

Estas primeiras comissões estaduaisnorte-americanas ainda não detinhamcaráter imperativo, mas simplesmente deestudos e consultas. Tais comissões podiamser vistas nos estados de Rhode Island(1836), New Hampshire (1844), Connecticut(1853), Vermont (1855) e Maine (1858).Comissões de caráter mandatório foram in-auguradas em 1855, no estado de Minnesotae Massachussets. Somente em 1871, o estadode Illinois instituiu a primeira comissão compoderes de fixação de preços de serviços.Conferir, a respeito: MELO, José Luis de An-haia. Problemas de urbanismo: o

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problema econômico dos serviços deutilidade pública. São Paulo: s/e, 1940, p.101.[266]

Caio Tácito enumera as característicascomuns às agências reguladoras: “constituí-das como autarquias especiais, destacam-seda estrutura hierárquica dos Ministérios e dadireta influência da conduta política do gov-erno; gozam de autonomia financeira, ad-ministrativa e especialmente de poderesnormativos complementares à legislação;dotados de poderes amplos de fiscalização,operam como instância administrativa finalem litígios sobre matéria de sua competên-cia; e respondem, fundamentalmente, pelocumprimento de metas fixadas e pelo desem-penho das atividades dos prestadores de ser-viço, segundo as diretrizes do Governo e emdefesa do interesse da comunidade”(TÁCITO, Caio. Op. cit., p. 42).

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[267]Sobre o fenômeno de especialização

das agências reguladoras, conferir:MORAES, Luiza Rangel de; WALD, Arnoldo.Agências reguladoras. In: Revista de In-formação Legislativa, Brasília 36(141): p.143-171, janeiro/março 1999, p. 151.[268]

O subsistema jurídico apresenta-secomo um “conjunto de regras, normas,princípios, finalidades e pressupostos adstri-tos a um dado setor da vida humana”(MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Anova regulação estatal e as agências inde-pendentes. p. 84. In: SUNDFELD, Carlos Ari(coord.). Direito administrativo econ-ômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p.72-98).[269]

Agência Municipal de Desenvolvi-mento, criada pela Lei Municipal nº 1.565,de 30/12/1996, de Niterói, com o intuito de

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formulação de políticas de desenvolvimentoeconômico-social do Município.[270]

Agência Municipal de Serviços deSaneamento de Cuiabá (AMSS), criada pelaLei Complementar nº41, de 23/12/1997. Em-bora tivesse caráter operacional, por terreassumido os serviços de água e esgoto deCuiabá antes exercidos pela Companhia deSaneamento do Estado, o fim que motivousua criação como agência, substituindo a an-terior Secretaria de Saneamento, foi o deregular e controlar as delegações paraprestação dos serviços públicos de sanea-mento no município de Cuiabá.[271]

Comissão de Serviços Públicos de Ener-gia, criada pela Lei Complementar nº 833,de 17 de outubro de 1997, do Estado de SãoPaulo, e inaugurada em 14 de abril de 1998para exercer funções de regulação dos ser-viços concedidos pelo poder concedente es-tadual com funções delegadas da Agência

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Nacional do Petróleo ou da Agência Nacionalde Energia Elétrica, mediante convênios.[272]

Para uma exposição sobre as vantagensdo modelo multissetorial das agências es-taduais, vide: CONFORTO, Gloria. Des-centralização e regulação de gestãodos serviços públicos. Revista de Admin-istração Pública. Rio de Janeiro, FGV,32(1):27-40, jan/fev 1998.[273]

Agência Reguladora de Serviços Públi-cos Concedidos do Estado do Rio de Janeiro(ASEP-RJ), criada pela Lei Estadual nº2.686, de 12/02/1997, cabendo-lhe o exercí-cio do Poder Regulador sobre as concessõese permissões de serviços públicos nas quais oEstado do Rio de Janeiro figure, por dis-posição legal ou pactual, como Poder Con-cedente ou Permitente.[274]

Agência Estadual de Regulação dos Ser-viços Públicos Delegados do Rio Grande do

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Sul (Agergs), criada pela Lei Estadual nº10.931, de 09/01/1997, alterada pela Lei11.292, de 23/12/1998, onde consta expressacomunicação à Assembléia Legislativa doteor de audiência pública sobre avaliação dosindicadores de qualidade dos serviços e de

pesquisa de opinião (art.14, §1o).[275]

Agência Reguladora de Serviços Públi-cos Delegados do Estado do Ceará (ARCE),criada pela Lei nº 12.786, de 30/12/1997,destina-se à direção, regulação e fiscalizaçãodos serviços públicos delegados no Estado

(art. 3o da Lei estadual nº12.786).[276]

Agência Estadual de Regulação e Con-trole de Serviços Públicos (ARCON), criadapela Lei estadual nº 6.099, de 30/12/1997,cuja função é de regular e controlar aprestação dos serviços públicos cuja explor-

ação tenha sido delegada a terceiros (art. 1o

da Lei 6.099/97).

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[277]Agência Reguladora de Serviços Públi-

cos do Rio Grande do Norte (ARSEP), criadapela Lei estadual nº 7.758, de 09/12/1999,mediante transformação da Agência Regu-ladora de Serviços Públicos do Estado do RioGrande do Norte (ASEP-RN), criada pela Leinº 7.463, de 02/03/1999, com finalidade deregular, controlar e fiscalizar os serviços

públicos delegados (art. 2o da Lei 7.758/99).[278]

Agência Estadual de Regulação de Ser-viços Públicos de Energia, Transporte eComunicações da Bahia (AGERBA), criadapela Lei estadual nº 7.314, de 19/05/1998.[279]

Os convênios são acordos entre entespúblicos ou entre estes e privados para con-secução de objetivos comuns dentro de com-petências institucionais comuns para o al-cance de resultado comum em um ambientede mútua colaboração entre os partícipes.Conferir: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.

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Parcerias na Administração Pública.Concessão, permissão, franquia, ter-

ceirização e outras formas. 3a ed., SãoPaulo: Atlas, 1999, p. 177-179. Assim, osconvênios diferenciam-se dos contratospelos aspectos: a)estrutural, que se refere aoconteúdo da vontade expressa pelas partes.Nos contratos, as partes visam a objetivo di-verso, no acordo, ambas pretende alcançar omesmo fim; b) funcional, pois ligado ao in-teresse que se pretende satisfazer. No con-trato, as partes compõem seus interesses; noacordo, elas os unificam por serem comuns;c) teleológico, que diz respeito à satisfaçãoespecífica do interesse público. O contrato éfinalístico. A Administração Pública é umadas partes, que obtém a satisfação do in-teresse público mediante a prestação daoutra parte. O acordo é instrumental, pois oatingimento do interesse público se dá pelavia da cooperação entre entidades públicas;d) patrimonial, referente à transferência

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econômica, que está presente nos contratos eé estranha ao acordo de natureza pública.Nestes últimos, os recursos continuam afeta-dos ao interesse público que os motivou.[280]

Lei 9.427, de 26/12/1996, art. 20, cap-ut. O mesmo ocorre com o setor do petróleo,em que a Lei 9.478, de 06/08/1997 prevê, no

seu art. 8o, VII e XV a possibilidade de fiscal-ização das atividades integrantes e a ap-licação de sanções por Estados ou pelo Dis-trito Federal mediante convênio. De fato, aComissão de Serviços Públicos de Energia –CSPE, criada pela Lei Complementar 833/97, no Estado de São Paulo, tem competên-cias no setor de eletricidade, por delegaçãoda ANEEL, no setor de petróleo e gás, pordelegação da ANP, e no setor de gás canaliz-ado, como longa manus estadual, que é o

poder concedente deste serviço (art. 25, §2o

da CF/88). A lei brasileira de telecomu-nicações não abre tal possibilidade.

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[281]MORAES, Luiza Rangel de; WALD,

Arnoldo. Agências reguladoras. In: Revistade Informação Legislativa, Brasília36(141): p. 143-171, janeiro/março 1999, p.145.[282]

PARKER, Reginald. AdministrativeLaw. Indianápolis: The Bobbs-Merrill Com-pany, 1952, p. 95.[283]

“Independência é uma expressão certa-mente exagerada. No mundo jurídico,preferimos falar em autonomia. Masgarantir a independência é fazer uma afirm-ação retórica com o objetivo de acumular odesejo de que a agência seja ente autônomoem relação à Administração Pública, queatue de maneira imparcial e não flutue suaorientação de acordo com as oscilações pró-prias do Poder Executivo, por força até dosistema democrático.” (SUNDFELD, CarlosAri. Agências reguladoras e os novos

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valores e conflitos, p. 1296. In: Anais daXVII Conferência Nacional dos Ad-vogados. Justiça: realidade e utopia.Vol. II, Rio de Janeiro: Ordem dos Ad-vogados do Brasil, 1999, p. 1291-1297).[284]

MORAES, Luiza Rangel de; WALD,Arnoldo. Agências reguladoras. In: Revistade Informação Legislativa, Brasília36(141): p. 143-171, janeiro/março 1999, p.146.[285]

Prezando pela modicidade das tarifascomo a necessária ponderação entre todos osinteresses em jogo, inclusive o dos consum-idores potenciais na ampliação da área deprestação do serviço e contra o que chama depopulismo regulatório, vide: MARQUESNETO, Floriano Azevedo. A nova regulaçãoestatal e as agências independentes. p. 86:nota 38. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.).Direito administrativo econômico. SãoPaulo: Malheiros, 2000, p. 72-98.

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[286]A radicalização da transparência e da

publicidade da atividade regulatória é aforma existente de fazer frente à tendênciade captura da agência pelos regulados. Vide:Ibid., p. 89.[287]

Entendendo a estrutura organizacionaldas agências como fortes indicadores daautonomia do órgão regulador, vide: PECI,Alketa; CAVALCANTI, Bianor Scelza. Re-flexões sobre a autonomia do órgão regu-lador: análise das agências reguladoras es-taduais. p. 106. In: Revista de Adminis-tração Pública, vol. 34, nº 5, set/out de2000, p. 99-118.[288]

“Quando reconheço ser constitucional-mente viável que elas [as agências regulador-as] desfrutem de um tal poder [poder norm-ativo], de modo algum estou sugerindo queelas produzam “regulamentos autônomos”ou coisa parecida, pois todas as suas

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competências devem ter base legal – mesmoporque só a lei pode criá-las, conferindo-lhes(ou não) poder normativo [§] A constitucion-alidade da lei atributiva depende de o legis-lador haver estabelecido standards sufi-cientes, pois do contrário haveria delegaçãopura e simples de função legislativa”(SUNDFELD, Carlos Ari. Introdução àsagências reguladoras, p. 27. In:SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Direitoadministrativo econômico. São Paulo:Malheiros, 2000, p. 17-38).[289]

A independência proposta “deve servirpara que o órgão regulador seja um instru-mento de política governamental, e não uminstrumento de política de um governo”(MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Op.cit., p. 87).[290]

MORAES, Luiza Rangel de; WALD,Arnoldo. Agências reguladoras. In: Revistade Informação Legislativa, Brasília

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36(141): p. 143-171, janeiro/março 1999, p.146.[291]

A previsão expressa da referida pro-teção estava contida no art. 26, caput, da LeiGeral de Telecomunicações (Lei 9.472/97),mas foi revogado pela Lei 9.986, de 18 de ju-lho de 2000. Para o caso da ANEEL, a Lei9.427/96 prevê a nomeação compartilhadados diretores para mandatos não coincid-entes, não os protejendo expressamente dademissão ad nutum. Sobre a fragilidade, noBrasil, da proteção do mandato com base emdecisões do Supremo Tribunal Federal, vide:SILVA, Fernando Quadros da. Agênciasreguladoras: a sua independência e oprincípio do Estado Democrático deDireito. Curitiba: Juruá, 2003, p. 130-134.[292]

A Lei Geral de Telecomunicaçõesproíbe, no seu art.29, que o conselheirotenha interesse significativo, direto ou in-direto, em empresa relacionada com

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telecomunicações. Além disso, o conselheiroda ANATEL não pode representar qualquerpessoa ou interesse perante a Agência noprazo de um ano após ter ocupado o cargo(art.30).[293]

Os diretores das agências não devemocupar outras funções públicas ou privadas.O caso da Asep (Agência Reguladora dos Ser-viços Públicos Concedidos) do Rio de Janeiroexemplifica o comprometimento que o mod-elo de autonomia das agências procuraevitar. Cf. PECI, Alketa; CAVALCANTI, Bi-anor Scelza. Reflexões sobre a autonomia doórgão regulador: análise das agências reg-uladoras estaduais. p. 112. In: Revista deAdministração Pública, vol.34, nº.5, set/out de 2000, p. 99-118.[294]

Defendendo a tese de pagamento aosex-dirigentes das agências por período mín-imo de 12 meses após o fim do mandato paraindenizá-los da restrição do direito

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individual de trabalhar, vide: MARQUESNETO, Floriano Azevedo. Op. cit., p. 85-86:nota 37.[295]

ADIn1949-0/RS, relator MinistroSepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, pormaioria suspendeu liminarmente a eficácia

do art.8o, da Lei 10.931, de 09/01/1997: “Art.

8o O Conselheiro só poderá ser destituído, nocurso do seu mandato, por decisão daAssembléia Legislativa”.[296]

A independência de objetivos daANEEL é ampliada mediante um contrato degestão negociado e celebrado entre a Diretor-ia e o Poder Executivo, como instrumento de

controle e avaliação de desempenho. (art. 7o,da Lei 9.427/96). Tal previsão não existepara o setor de telecomunicações brasileiro.[297]

O Conselho de Auto-RegulamentaçãoPublicitária é um exemplo vivo de auto-regulação. Apresenta-se como organização

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não-governamental – sociedade civil semfins lucrativos –, fundada em 5 de maio de1980, constituída por entidades represent-ativas das agências de publicidade, dosveículos de comunicação, de anunciantes ede todas as demais entidades que aderiremao Código Brasileiro de Auto-Regula-mentação Publicitária e se comprometerema seguir as decisões do Conselho de Ética e

do Conselho Superior do Conar (art.9o doEstatuto Social do Conar), tendo por objet-ivos sociais, dentre outros, zelar pela comu-nicação comercial, promover a liberdade deexpressão publicitária e a defesa das prer-rogativas constitucionais da propagandacomercial (art. 5º, I e VI do Estatuto Socialdo Conar). O desrespeito de suas re-comendações dá ensejo a advertências, cen-suras públicas, suspensão ou eliminação doquadro social (art.15 do Estatuto Social doConar).

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[298]GRAU, Eros Roberto. O direito posto

e o direito pressuposto. 3aed., São Paulo:Malheiros, 2000, p. 95.[299]

A escassa jurisprudência do SupremoTribunal Federal brasileiro sobre o temaaponta a exigência de natureza jurídica dedireito público para o exercício de poder depolícia. A Representação nº 1.169/DF – re-lator Min. Soares Muñoz, j.08/08/1984 (RTJ111/87) – apresenta os conselhos federais defiscalização de profissionais liberais comoautarquias corporativas. O Mandado de Se-gurança nº 22.643-9/SC – relator Min. Mor-eira Alves, DJ 04.12.1998, Ementárionº1934-01 – determina a submissão dosConselhos Regionais de Medicina, como aut-arquias, à prestação de contas ao TCU.[300]

Floriano Marques utiliza o termo regu-lação de caráter público para diferenciar da

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autorregulação. Conferir: MARQUESNETO, Floriano Azevedo. Op. cit., p. 83.

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