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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A IMPORTÂNCIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA
PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR
Por: Laura Magalhães de Souza Izvekov
Orientador
Prof. Willian Rocha
Rio de Janeiro
2014
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A IMPORTÂNCIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA
PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito do Consumidor.
Por: . Laura Magalhães de Souza Izvekov
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos amigos de classe, pela
jornada que passamos juntos e que
compartilhamos dos mesmos
percalços. Aos familiares sem os quais
não estaria onde estou e aos amigos
da vida pela ausência nas noites
preciosas e nos dias atribulados. Ao
Fernando Bittencourt que suportou
meus momentos de agonia na escrita
dessa preciosa monografia.
4
DEDICATÓRIA
Dedico à Ledir Magalhães, Jorge Izvekov,
Leiva Magalhães, Fernando Bittencourt,
porém acima de tudo a Leila Magalhães
por todo o esforço dedicado a mim e todo
o apoio que sempre foi indispensável.
5
RESUMO
O presente trabalho aborda a questão das Agências Reguladoras e sua
atuação indireta na proteção do direito do consumidor. As agências que foram
criadas com a finalidade de fiscalizar a prestação de determinado serviço
prestado por uma permissionária ou concessionária de serviço público, acabam
que indiretamente desempenhando um papel de proteção do direito do
consumidor, uma vez que esta acaba por coibir abusos praticados pelas
concessionárias e permissionárias.
As Agências que são braços estatais fiscalizadores atuam de modo à
regular a prestação dos serviços públicos.
6
METODOLOGIA
A metodologia de pesquisa utilizada foi a leitura de livros, apostilas, bem
como a consulta a material utilizado no presente curso e a pesquisa na internet.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - A origem das Agências reguladoras 09
CAPÍTULO II - Funções das Agências reguladoras 17
no contexto social CAPÍTULO III – A atuação das Agências 29 Reguladoras na proteção do Direito do consumidor CONCLUSÃO 35
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 36
ÍNDICE 38
8
INTRODUÇÃO
David Harvey (1998) ensina que a “alteridade”, aspecto mais atraente e
libertador do pensamento dito “pós-moderno”, é essencial para o pluralismo
que caracteriza nossa época, podendo ser representada pela “idéia de que
todos os grupos tem o direito de falar por si mesmo, com sua própria voz, e de
ter aceita essa voz como autêntica e legitima”.
A sociedade evolui e junto com ela o Estado deve evoluir. O Estado
primeiramente concentrava todas as atividades. Tudo era provido pelo ente
estatal, porém com o início das privatizações passou a surgir a necessidade de
órgãos que fiscalizassem e regulassem a prestação de determinados serviços
prestados.
As agências reguladoras se incluem nessa evolução.
Neste entendimento, seriam os consumidores os maiores beneficiados
da criação de tais agências?
Como entes fiscalizadores de serviços elas passaram a atuar
indiretamente na proteção do direito do consumidor, pois o outro lado envolvido
na prestação do serviço é sempre o consumidor final.
9
CAPÍTULO I
A origem das Agências Reguladoras
Alguns fatores ocorreram no mundo, na primeira metade do século XX,
como, por exemplo, a 1ª e a 2ª Guerras Mundiais, a quebra da Bolsa de
Valores de Nova York em 1929, dentre outros, que trouxeram sérios prejuízos
para a economia mundial, sinalizando a necessidade de uma maior intervenção
do Estado na economia.
Após isso surgiram os chamados Estados Intervencionistas, com
legitimação a atuar na atividade econômica privada, inclusive como
concorrente da iniciativa privada, visando promover determinados fins sociais,
ou sob a égide da segurança nacional, ou seja, o Estado do bem-estar social.
No Brasil, principalmente entre 1930-1945 e posteriormente entre
1950-1954, o Estado brasileiro se tornou paternalista criando uma máquina
estatal voltada à proteção e ao atendimento das atividades, que eram
consideradas como necessidades básicas para o cidadão. Foi nesse período
que se deu a criação das grandes empresas estatais, em quase todos os
setores produtivos e, na definição das áreas que estariam sob a égide do
monopólio estatal, com o fito de proteção às influências externas, sob o manto
da justiça social.
A douta Constituição de 1934, determinou expressamente que a
economia se organizasse de acordo com os princípios da justiça social que
possibilitasse a vida digna, garantindo a liberdade econômica.
Foi neste momento que o Estado brasileiro evoluiu como o grande
provedor do bem estar e da justiça social ampliando a máquina estatal para
abarcar atividades promovessem a integração nacional visando a segurança
nacional.
10
Foi então que o Estado criou dois tipos de empresas: as que se
destinavam à intervenção na atividade econômica e as prestadoras de serviços
públicos.
Nos governos do regime militar (1964-1984), os militares aparelharam
o Estado, com Ministérios e Secretarias com a finalidade de melhor oferecer as
atividades típicas de um Estado protetivo.
Na ilustríssima visão de Verônica Cruz, Historicamente, a propriedade
pública das empresas provedoras de bens e serviços públicos essenciais tem
sido o principal modo de regulação econômica, especialmente quando se trata
de setores como gás, eletricidade, água, estradas de ferro, correios, telefonia,
além de outros cujas origens estão no processo de industrialização no século
XIX e apresentam características de monopólios naturais. A propriedade do
Estado nesses casos era tida como importante não apenas porque eliminava a
ineficiência dos monopólios privados, mas também assim se estimulava o
desenvolvimento econômico em favor de regiões ou grupos particulares
desfazendo assimetrias, protegendo consumidores e garantindo a segurança
nacional. No entanto, entre as várias justificativas apresentadas, destaca-se
mesmo a afirmação central na qual a propriedade pública poderia aumentar a
habilidade do governo para regular a economia e proteger o interesse público.
(CRUZ, 2009, p. 54)
Com o retorno ao Estado Democrático de Direito, o Brasil buscou de
todas as formas continuar com o oferecimento dos serviços públicos, de forma
intervencionista.
Verificou-se, ao longo de nossa história, um significativo crescimento
da máquina estatal em vários ramos da atividade econômica.
O crescimento desenfreado do Estado trouxe graves conseqüências,
dentre eles principalmente, o déficit estatal fiscal. Como forma de arrecadação
para suprir este déficit, o Estado só conta com duas alternativas possíveis: a
tributação ou venda de ativos.
11
De modo a contrapor esta grande mentalidade estatizante brasileira
que, de certa forma, coibiu o crescimento econômico da iniciativa privada,
aparece a necessidade de uma redefinição do real papel, ou seja, a
identificação de quais atividades ele realmente deveria estar presente.
Foi neste cenário de redefinição do papel do Estado na atividade
econômica, que surgiu o Programa Nacional de Desestatização, instituída pela
Lei nº 8.031/90 (alterada pela Lei nº 9.491/97).
Na lição de Alexandre Santos Aragão, no Brasil as agências
reguladoras geralmente são consideradas um instituto novo no Direito Público,
surgido apenas a partir das desestatizações da década de noventa. A
afirmação, contudo, se não é equivocada, pelo menos não é improcedente. Se,
por um lado, a divisão da Administração Pública em mais de um único centro
de poder é um fenômeno muito mais amplo do que o surgimento das recentes
agências reguladoras, não há de se menosprezar a importância dessas,
principalmente diante do contexto de desestatização e liberalização em que
surgiram. (ARAGÃO, 2012, p. 209)
Na visão de Verônica Cruz, A mobilização de alguns setores sociais
juntamente com o governo brasileiro nesse sentido foi notável nos anos 1990.
Com afiada construção retórica fundamentada no ideal de sociedade capitalista
moderna e dotada de aparato regulatório moderno, o Brasil viu-se em meio a
reformas afinadas com as propostas de desregulamentação. (CRUZ, 2009, p.
56)
No programa de desestatização, a privatização é uma das modalidades
de desestatização, e tem como objetivo devolver à iniciativa privada o seu
espaço, com o retorno do Estado as suas funções essenciais ou típicas.
A privatização surge com a finalidade enxugar o Estado, tendo como
objetivo tentar executar suas finalidades típicas.
O referido programa acredita de que a atividade econômica produtiva
deve ser desempenhada pela iniciativa privada, cabendo ao Estado zelar pela
12
busca do bem estar social. É a busca da nova concepção de Estado entre o
interventor e o liberal, ou seja, o Estado Regular.
Em síntese, pode-se perceber como objetivos da privatização a
redefinição da forma de intervenção do Estado no domínio econômico; a
redução do perfil da dívida pública; a ampliação dos investimentos da iniciativa
privada com a atração do capital estrangeiro; o fortalecimento do mercado de
capitais com a venda de ações de estatais em bolsa e, principalmente, a
liberação de recursos do Estado para ser investidos em setores que sua
presença seja essencial na busca do bem estar social.
Neste novo cenário a Administração Pública passa a ter um diferente
papel na economia, migrando de um Estado fortemente intervencionista para
um Estado regulador.
No entendimento de Verônica Cruz, embora nos últimos anos se tenha
falado muito na profusão do “Estado Regulador” na América Latina, a atividade
regulatória sempre esteve entre as atribuições do Estado. Em geral, a atividade
regulatória ocorre de dois modos: diretamente, por meio do provimento de bens
e serviços públicos pelo próprio Estado, via empresas estatais que atuam em
setores de monopólios naturais ou não; ou a partir de sua própria estrutura
tradicional, como ministérios ou órgãos a eles subordinados. Até o início dos
anos 1990 predominou na Europa e na América Latina a primeira opção.
(CRUZ, 2009, p. 54)
Surgem, então, as chamadas Agências Reguladoras, com finalidade de
regulamentar, controlar e fiscalizar a abertura de um mercado econômico, que
antes era monopolizado pelo Estado empreendedor.
No Brasil o surgimento das “Agências Reguladoras” ou dos entes
reguladores autônomos teve como parte inicial o processo de privatização, ou
de desestatização. Assim demonstra-se a evolução do papel do Estado
Brasileiro no que se refere a intervenção na economia, ou seja, o cenário que
levou a mudança do Estado Interventor empresário ao atual Estado Regulador.
13
Vale ressaltar que no Brasil, desde o início do século XX, já havia
entidades com funções regulatórias e fiscalizatórias de setores econômicos,
mas que não eram chamadas de agências. Di Pietro (2007, p. 434) menciona
algumas:
[...] no período de 1930-1945, o Comissariado de
Alimentação Pública (1918), o Instituto de Defesa
Permanente do Café (1923), o Instituo do Açúcar e do
Álcool (1933), o Instituto Nacional do Mate (1938), o
Instituto Nacional do Pinho (1941), o Instituto Nacional do
Sal (1940), todos esses institutos instituídos como
autarquias econômicas, com a finalidade de regular a
produção e o comércio. Além desses, podem ser
mencionados outros exemplos, como o Banco Central, o
conselho Monetário Nacional, a Comissão de Valores
Mobiliários e tantos outros órgãos com funções
normativas e de fiscalização.
É importante salientar que apesar da diminuição da intervenção estatal
na economia, o mesmo não pode ser considerado como um Estado mínimo,
visto que exerce influência econômica, ao regular as atividades que
anteriormente eram de sua responsabilidade.
Pelo contrário, ao estabelecer regras e forma de intervenção
econômica, verifica-se que este deslocou a atuação estatal do campo
empresarial, através das empresas públicas, para o campo da disciplina
jurídica, ao ampliar o seu papel na regulação e fiscalização dos serviços
públicos e atividades econômicas.
Com isto, o Estado não deixa de ter um papel decisivo. Verifica-se este
fato, pela enorme quantidade de textos normativos editados nos últimos anos.
Realmente, na década de 90 houve a flexibilização dos monopólios e a
conseqüente abertura destes setores ao capital estrangeiro. Foi também, nesse
período, que se introduziu no país uma política específica de proteção ao meio
14
ambiente, limitativa à ação dos agentes econômicos, e se estruturou um
sistema de defesa e manutenção das condições de livre concorrência que,
embora longe do ideal, constitui um considerável avanço em relação ao modelo
anterior.
Nesse ambiente é que despontaram as agências reguladoras como
instrumento da atuação estatal.
Portanto, nessa diretriz, a onda de privatizações decorrente do Plano
Nacional de Desestatização (PND), criado pela lei nº 8.031 de 1990 e alterada
pela lei nº 9.491 de 1997, característica principal do neoliberalismo, em que o
Brasil, deixando de explorar diretamente atividades econômicas, delegou à
iniciativa privada, impulsionou o surgimento desses órgãos reguladores,
denominados, por opção do legislador, de agências reguladoras. Esse período
conhecido também como a “Reforma do Estado” implicou em elaboração de
diversas emendas constitucionais que permitiram ao Estado delegarem ao
setor privado a prestação de serviços públicos que eram até o momento
explorado exclusivamente por aquele. As emendas constitucionais nº 08 e 09
de 1995 permitiram ao Estado a delegação das respectivas atividades bem
como criaram os órgãos reguladores pertinentes, conforme texto abaixo in
verbis, da Constituição Federal de 1988:
Art. 21. Compete à União:
[...]
XI - explorar, diretamente ou mediante autorização,
concessão ou permissão, os serviços de
telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a
organização dos serviços, a criação de um órgão
regulador e outros aspectos institucionais; (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 8, de 15/08/95)
Art. 177. Constituem monopólio da União:
15
[...]
§ 2º A lei a que se refere o § 1º disporá sobre:
[...]
III - a estrutura e atribuições do órgão regulador do
monopólio da União; (Inciso incluído pela Emenda
Constitucional nº 9, de 1995)
(grifos do autor)
As primeiras agências criadas com assento constitucional foram, nessa
ordem, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), pela lei nº 9.472 de
16 de julho de 1997, e a Agência Nacional do Petróleo (ANP), pela lei nº 9.478
de 6 de agosto de 1997, ressaltando-se que a primeira agência surgida no
Brasil foi a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em 1996, sendo que
esta não tem previsão direta constitucional.
Em seguida, foi o legislador infraconstitucional quem criou as demais
agências de acordo com a necessidade de regular setores em que a iniciativa
privada estivesse explorando atividade econômica de interesse público ou
prestando serviço público.
Deste modo, conforme Fernando Quadros da Silva:
A criação das agências reguladoras no Brasil decorre,
como já foi salientado, da adoção de um novo modelo de
provisão dos serviços públicos, no qual o poder público
continua a ser responsável pela sua prestação mas a
execução direta é feita pelo particular. As agências
também desempenharão atividades de regulação da
atividade econômica, reconhecida constitucionalmente
16
como tarefa relevante do Estado, prevista no artigo 174
da Constituição Federal (SILVA, 2007, p. 95).
Assim, a regulação por agência busca despolitizar a atividade
regulatória, atribuindo aos órgãos independentes a decisão final sobre temas
específicos, sem possibilidade de recurso à Chefia da Administração ou aos
Ministérios supervisores, ressalvado o controle pelo Judiciário. (SILVA, 2007, p.
96)
17
CAPÍTULO II
Funções das Agências Reguladoras no contexto social
A função básica das Agências Reguladoras é a intervenção do Estado
no domínio econômico, ou ainda, a promoção do desenvolvimento econômico,
tudo sob o prisma do fortalecimento da competição no setor privado da
economia e da criação de procedimentos de controle absolutamente racionais.
Em traços gerais o perfil das agências reguladoras acumulam as
funções de:
a. relativa independência técnica e gerencial;
b. regular e fiscalizar;
c. exerce função contenciosa ao dirimir divergências entre os
prestadores do serviço, os produtores e seus respectivos consumidores;
d. buscar a preservação da competitividade no mercado, valendo-se da
crença de que a concorrência proporcionará maior qualidade a um menor custo
para o cidadão, alçado a condição de consumidor de serviços públicos.
O Brasil incorporou ao seu Direito Administrativo um instrumento
moderno, muito eficiente e de intervenção na economia: a Agência Reguladora.
A ela a administração delega:
a. o poder de produzir a nova regulamentação dos setores relevantes
da economia nacional, voltada à preservação do interesse público;
b. poder de fiscalização e controle de atividades desenvolvidas pelos
atores privados da economia, de modo a impedir a o abuso do poder
econômico que coloque em risco a saúde púbica, o meio ambiente e o acesso
universal dos cidadãos aos serviços públicos;
18
c. poder quase jurisdicionais, a procura de solução de litígios que
envolvem prestadores e usuários de serviços públicos.
Por outro lado, às Agências Reguladoras se impõe a obrigação de
preservação da competição no mercado, como alavanca do desenvolvimento
econômico. Impondo-se também, a elas, a adoção do “devido processo legal”
como modo de atuação, ou, mais precisamente, como princípio vetor do
processo de tomada de decisão da Administração Pública, instrumento que
tende a tornar cada vez mais racionais e transparentes as decisões
administrativas.
As agências reguladoras são, em essência, autarquias especiais que
recebem do legislador a autonomia administrativa e são dirigidas por
colegiados cujos membros não são demissíveis livremente pelo Presidente da
República, o que garantiria a independência de atuação. (SILVA, 2007, p. 97)
Nesse novo paradigma de modelo regulatório, o Estado possui tanto
característica de exploração direta de atividade econômica quanto
característica daquele que entrega a iniciativa privada a exploração da
atividade econômica prestando serviços públicos, conforme Justen Filho:
Todos os serviços públicos que puderem ser organizados
segundo padrões de estrita racionalidade econômica
deverão ser remetidos à iniciativa privada. Somente
incumbe ao Estado desempenhar atividades diretas nos
setores em que a organização econômica, modelada
pelos parâmetros de acumulação privada de riqueza,
colocar em risco valores coletivos ou for insuficiente para
propiciar sua plena realização.(JUSTEN FILHO, 2002, p.
24)
Segundo a Constituição Federal de 1988, especificamente nos artigos
21, XI e 177, §2º, III, as agências reguladoras estão previstas como “órgãos
reguladores”, com competência específica a certas atividades.
19
Deve ser destacado que o signo “órgão”, utilizado pelo legislador
constituinte, distancia-se da boa técnica do Direito Administrativo, uma vez que
confunde conceitos de descentralização, que é atinente a entes (como as
agências reguladoras) e não à desconcentração, esta sim ligada a órgão.
Tendo em vista que as autarquias, no modelo tradicional, permaneciam
muito vinculadas ao controle de resultados, passou-se a entender que era mais
benéfico à atuação do Estado dar nova dinâmica a estes entes, mediante um
controle dos meios de atuação.
Assim, foram criadas as autarquias de regime especial, ou melhor, as
agências reguladoras. De forma sucinta, surgiram autarquias com maiores
privilégios.
Conforme o artigo 21. XI e 177, § 2º, III, da Constituição Federal, há
previsão de órgãos reguladores para certas atividades, apesar do legislador
constituinte nominar desta forma as atuais agências reguladoras, não há
duvida que, hoje, o termo “órgão” não condiz com a realidade, uma vez que a
criação das agências reguladoras é matéria atinente à descentralização e não
à desconcentração, feita por intermédio da criação de órgãos.
Segundo Di Pietro[4], as agências reguladoras “[...] estão sendo
criadas como autarquias em regime especial. Sendo autarquias, sujeitam-se às
normas constitucionais que disciplinam esse tipo de atividade.”
Conforme o artigo 5º, inciso I, do Decreto-lei 200/67, autarquia é:
[...] o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade
jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar
atividades típicas da Administração Pública, que
requeiram para seu melhor funcionamento, gestão
administrativa e financeira descentralização.
Na lição de Hely Lopes Meirelles,
20
“A autarquia não age por delegação, age por direito
próprio e com autoridade pública, na medida do jus imperii
que lhe foi outorgado pela lei que a criou. Como pessoa
jurídica de direito público interno, autarquia traz ínsita,
para a consecução de seus fins, uma parcela do poder
estatal que ele deu vida. Sendo um ente autônomo, não
há subordinação hierárquica da autarquia para com a
entidade estatal a que pertence, porque, se isto
ocorresse, anularia seu caráter autárquico. Há mera
vinculação à entidade matriz de que, por isso, passa a
exercer, um controle legal, expresso no poder de
correção finalístico do serviço autárquico”.
2.1 – Atuação das Agências Reguladoras e a sociedade
Com a implementação da política que transfere para o setor particular a
execução dos serviços públicos e reserva para a Administração Pública a
regulamentação, o controle e a fiscalização da prestação desses serviços aos
usuários e a ela própria, o Governo Federal, dito por ele mesmo, teve a
necessidade de criar entidades para promover, com eficiência, essa
regulamentação, controle e fiscalização, pois não dispunha de condições para
enfrentar a atuação dessas parcerias.
Tais entidades são criadas com essa finalidade e poder, são as
agências reguladoras. São criadas por lei como autarquia de regime especial
recebendo os privilégios que a lei lhes outorga, indispensáveis para atingir de
seus fins. São entidades, portanto, que integram a Administração Pública
Indireta.
Pedro Ivo Sebba de Carvalho entende que as agências reguladoras
brasileiras configuram-se como autarquias públicas federais de caráter
especial. Isso implica que tais entes, apesar de se enquadrarem como
entidades da Administração Pública indireta, disponham de maior
independência em relação ao núcleo do governo. Isso porque têm natureza
21
peculiar, por se tratar de autarquias “especiais”, dotadas de aspectos novos no
ordenamento jurídico brasileiro. (RAMALHO, 2009, p. 139)
Tal entendimento é criticado por Fernando Quadros da Silva:
Forçoso concluir, portanto, que, no ordenamento
constitucional brasileiro, as agências reguladoras
integram a Administração Indireta. Primeiro, porque, à
exceção do órgão regulador dos serviços de
telecomunicações (art 21, XI, CF), não há previsão
constitucional de órgãos reguladores independentes.
Segundo, porque, no modelo de separação dos poderes
adotado pela Constituição brasileira, a atividade
administrativa federal está subordinada ao Presidente da
República (art. 84, II, CF), a quem compete exercer a
direção superior da Administração Pública Federal.
(SILVA, 2007, p. 99)
Vale ressaltar também a opinião de Caio Tácito que entende que a
liberdade decisória das Agências reguladoras não as dispensa do respeito ao
princípio da legalidade e aos demais fixados para a Administração Pública, no
art. 37, da Constituição Federal de 1988 (TÁCITO, 2004, p. 5)
Tem-se que a função essencial das agências reguladoras das
concessionárias é a fiscalização dos serviços prestados. Essa fiscalização
depende também de autorização legislativa, para não se confrontar com o
princípio da legalidade.
Na lição de Verônica Cruz, A moderna reforma regulatória traz em seu
bojo arcabouço teórico que sustenta que agências reguladoras autônomas
representam importante inovação institucional no que tange à democratização
da tomada de decisão. Isso ocorre porque essa modalidade de reforma tem
como substrato ideológico uma doutrina ou um conjunto de interpretações
administrativas, o New Public Management, que incorpora a introdução de
novos conceitos como o de “cidadão consumidor” e “boa governança”, por
22
exemplo. Além disso, essa ideologia incorpora presunção da necessidade do
predomínio da razão sobre a política, fundamentada na superioridade da
especialização técnica e em detrimento da representação de interesses.
(CRUZ, 2009, p. 73)
Esta autorização legislativa, até porque se faz difícil descrever todos os
fatos de lide possíveis, deve dar à agência reguladora uma margem de
atuação, um caminho a ser seguido por ela, ou seja, seus principais objetivos.
Decaindo desta forma, as idéias de que se as agências reguladoras
fiscalizassem automaticamente, estariam violando o princípio constitucional da
legalidade.
O fundamental é a tutela dos hipossuficientes em relação aos agentes
econômicos cada vez mais fortes. As agências reguladoras devem atuar
através de advertências, quando as concessionárias estiverem em
desconformidade com seus objetivos, resolvendo os problemas de imediato e
em casos mais graves devem estipular multas diárias para as concessionárias
que estiverem violando direitos.
A importância das agências reguladoras, no atual sistema político
adotado em nosso país, objetivam sobremaneira a regulação das
concessionárias, a fiscalização, a estipulação de multas, bem como a cassação
da concessão, caso não sejam atingidas suas metas.
Por se tratar de serviços de natureza pública, as agências têm o dever
de zelar pelo bom funcionamento das concessionárias, resguardando dessa
forma um serviço que pertence a sociedade.
Verônica Cruz, ressalta que Consumer Sovereignty, ao contrário,
considera os cidadãos os melhores juízes de suas próprias necessidades e
isso pode ser observado na medida em que lhes é permitido fazer suas
escolhas em ambiente competitivo. Desse modo, o significado da competição é
enfatizado, permitindo ao indivíduo utilizar-se da vantagem das escolhas
voluntárias sobre o consumo de qualquer bem particular. O autointeresse do
provedor de bens regulados também é considerado, na medida em que cabe a
23
ele ofertar o maior número de informações sobre o seu produto, pois disso
depende sua reputação. Ser accountable e transparente em sua atividade
aumenta suas chances de sobrevivência. (CRUZ, 2009, p. 79)
As Agências Reguladoras são instrumentos de proteção e segurança,
para tanto. É fundamental que sua performance apresente-se na mais pura
transparência. Desta forma, outra característica comum entre as Agências
Reguladoras é o contato aberto com população.
A sociedade deve estar ciente de suas ações que, para serem
socialmente legítima, necessitam ser amplamente divulgadas pela imprensa
escrita, falada e televisionada.
As Agências Reguladoras, além da publicidade de seus atos, também
devem criar e manter ouvidorias ou centros de atendimentos aos cidadãos, no
sentido de receber as reclamações, investigá-las e, se for o caso, aplicar as
sanções cabíveis em face das empresas que estejam infringindo alguma
norma, confirmando, deste modo, seu caráter de ente estatal regulador e
fiscalizador da economia.
Dentro dessa expectativa de proximidade com a sociedade, a
necessidade de que as Agências Reguladoras possuam meios de
comunicação eficientes com as empresas privadas, no sentido de ouvir seus
anseios e reivindicações, formando, dessa maneira, novas normas regimentais
dos respectivos mercados que atuam.
O exercício da regulamentação pode ser realizado com bases em
audiências públicas, e reunião com empresários.
A importância dessa entidade pública como responsável pela
regulamentação da economia do país. Além das grandes inovações que
trouxeram ao nosso ordenamento, também um relevante progresso na
aproximação significativa dos anseios da sociedade para com a autuação do
Estado, esse fato traz o desenvolvimento para todos, caso for efetivamente
verificado na prática da atuação das Agências Reguladoras.
24
As agências reguladoras são entidades de Direito público dotadas de
personalidade jurídica própria. O objetivo deste instituto é regular determinados
setores da economia e o fornecimento de recursos à população em geral,
levando à prática o princípio da supremacia do interesse público e a
manutenção do bem comum. Para realizar estas funções, as agências
reguladoras são dotadas dos poderes executivo, legislativo e judiciário, sempre
no âmbito técnico e restrito a um setor intrínseco ao próprio motivo de
existência da agência, que tanto no Brasil quanto nos EUA é definido por lei. É
importante ressaltar também, que estes institutos são vinculados ao ministério
afim e são sujeitos ao controle de legalidade e de constitucionalidade como
qualquer outro instituto estatal.
O próprio modo federativo de governo, que assim como as agências
reguladoras é um conceito advindo da experiência norte-americana teve
grandes dificuldades de se compatibilizar com o modelo praticado no Brasil.
Desde sua adoção com a Constituição de 1891, até hoje, vemos uma
dificuldade de consolidação do federalismo da forma como ele foi concebido
nos Estados unidos.
Sobre o federalismo no Brasil, aduz Streck:
O Brasil adotou este modelo com a Proclamação da
República, mas sua implementação somente se dá com a
Constituição de 1891. Com a Constituição de 37, volta ao
modelo unitário, somente ressurgindo a federação com a
Constituição de 1946. Após 1964, o princípio federativo
ficou mais enfraquecido e com a carta constitucional de
05/10/1988 permaneceu o modelo centralizador, sendo
que a partilha de competências tornou mais evanescente
o modelo federalista. ( STRECK e BOLSAN, p.172)
25
Assim como o conceito inicial de federalismo é incompatível com o que
é praticado no Brasil, o conceito de agências reguladoras da forma como é
praticado nos EUA também o é, pelo fato de ser um instituto descentralizado,
dotado de poderes que se distanciam do centro da Administração.
Evidenciando a cultura interventiva do Estado Brasileiro, o governo de
Vargas centralizou mais ainda a Administração, conduzindo a recuperação da
economia por meio da substituição das importações, o marco da
industrialização brasileira.
Este perfil intervencionista se repetiu nos anos que se seguiram. Teve
momentos de dificuldades provocadas pela constante busca por financiamento
externo, o que acabava por aumentar a dívida externa. Houve um momento de
aparente estabilidade durante a ditadura militar, mas os anos que se seguiram
foram perniciosos, sobretudo por causa da crise do petróleo.
Na redemocratização o principal problema além da dívida externa era a
inflação. As tentativas de controle da inflação pelo tabelamento de preços não
atingiam eficácia. Sobretudo porque os preços não tinham compatibilidade com
a realidade da cadeia produtiva e com os salários. O resultado era que os
produtores escondiam determinados produtos que tinham elevado grau de
procura.
A situação econômica dos anos oitenta, no Brasil, apontava para a
inevitável mudança do perfil da Administração Pública. O modelo
intervencionista não tinha mais condições de resolver os problemas de uma
economia estagnada e inflacionada. Os serviços que o Estado monopolizava
não produziam eficácia e acabavam por aumentar a dívida externa. Nesse
sentido, aduz o professor Aluisio de Souza Martins em dissertação de
mestrado:
Esse tipo de atuação estatal na atividade econômica, que
teve seu apogeu nas décadas de 1930 e 1970, culminou
no crescimento descomunal do aparelho administrativo,
mormente das empresas públicas e sociedades de
economias mistas e suas subsidiárias, ocasionando o
26
esgotamento da capacidade de investimento do setor
público e, como tal, a falência dos serviços públicos em
geral. Assim, O Estado chegou ao fim do século XX
grande, troncho, ineficiente, com bolsões endêmicos de
pobreza e de corrupção.” Por isso, “ A questão que se
vive hoje da desconstrução do Estado brasileiro, por ruim
que possa ser, não é uma opção ideológica, é uma
inevitabilidade histórica.” Daí que já não se atendia mais
os anseios da sociedade, que exigia maior eficiência e
participação nos serviços públicos. (MARTINS, Aluisio de
Sousa, p.31)
Assim, diante da necessidade de diminuição do “tamanho do Estado”,
surgiu no estuário Administrativo Brasileiro dos anos 90 o Programa Nacional
de Desestatização. É aí que surge a necessidade de regulação estatal. Os
setores privatizados teriam que ser regulados, porque como vimos no início do
deste estudo o liberalismo clássico já havia sido superado. No mundo todo já
havia a concepção de que os mercados livres teriam de ter algum meio de
regulação, já que o arbítrio do mercado poderia levar a consequências
desastrosas, como de fato ocorreram.
Pedro Ivo Sebba Ramalho, ressalta que na década de 1990 e nos
primeiros anos do início deste século, a principal mudança no arranjo das
funções e organização do Estado no Brasil foi o surgimento de estruturas
autônomas de administração para os assuntos de regulação da economia, as
agências reguladoras. Inaugurou-se, dessa forma, novo paradigma de
intervenção estatal no domínio econômico, notadamente em setores de
infraestrutura. Essas novidades institucionais alteraram significativamente o
modus operandi regulatório, impondo novo padrão de relação do Estado com
os agentes econômicos da sociedade capitalista brasileira. O surgimento das
agências reguladoras, denominado de “agencificação”, iniciou-se no governo
FHC como produto da reforma regulatória implementada no país a partir das
privatizações ocorridas ao longo da última década do século passado.
(RAMALHO, 2009, p. 125)
27
Não é novidade, portanto, o fato de se reconhecer a necessidade de
intervenção do Estado no domínio econômico (em sentido amplo). O interesse
que as atuais agências despertaram, quando começaram a ser aqui
implantadas (a partir de 1996), decorre principalmente do fato de que a retirada
do Estado brasileiro das atividades de produção direta de bens e prestação de
serviços - redução do papel de “Estado-empresário” - ampliou sobremaneira a
relevância da intervenção estatal regulatória nos setores que passaram a ser
explorados pela iniciativa privada. (ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO,
Vicente. p.162)
Assim, as agências reguladoras no Brasil surgiam com uma motivação
totalmente distinta da motivação deste instituto nos Estados Unidos dos anos
30. Por lá, as “agencies” surgiram para regular setores que antes não se
submetiam a nenhum tipo de regulação. Por aqui, as agências surgiram para
regular setores que antes eram umbilicalmente ligados ao aparelho estatal.
De início, é importante ter em mente que as agências reguladoras
caracterizam-se por possuírem função híbrida, é dizer, ao mesmo tempo
exercem a função executiva, normativa e judicial (julgamento dos processos
administrativos, regidos pela Lei nº 9.784, de 1999).
Com efeito, pode-se afirmar que as agências reguladoras quebraram o
paradigma da concepção tradicional da separação dos poderes, que trazia uma
percepção estanque e rígida de funções atribuídas a cada poder. À medida que
foram sendo criadas as agências reguladoras para cuidarem dos mais diversos
campos dos serviços públicos no país – telefonia, energia elétrica, transportes
terrestres, petróleo, etc. – o poder executivo, no caso, a administração direta,
teve reduzido o seu campo de poder administrativo-executivo.
Historicamente, os Estados Unidos foram o primeiro país a criar
instituições equivalentes às agências reguladoras, no início do século XIX. Mais
especificamente, em 1887, o Interstate Commerce Act representou um marco
para o começo de uma nova gestão pública naquele país. Isso porque, por
meio dele, passou-se a fixar regras de práticas tarifárias das companhias
ferroviárias, proibindo discriminações e abusos e especialmente, foi criada uma
autoridade independente especial chamada Interstate Commerce
28
Comission. Esta nova instituição criada por meio do ato citado, além do poder
de criar regramentos, estava encarregada de executar as medidas por ela
mesma criada e de regular o setor ferroviário, o que rompia, significativamente,
com o paradigma clássico da separação dos poderes (ROSANVALLÓN, p:
119-122).
À época, o contexto histórico e social vivido nos Estados Unidos nos
idos dos anos de 1880, de um Estado Federal fragilizado e em crise de
legitimidade, levou à necessidade da criação de instituições fortes e autônomas
ao poder executivo, para que passassem a administrar os serviços públicos
essenciais à população, a exemplo do ferroviário. Ademais, havia a
necessidade de que essa instituição criada fosse muito competente, a ponto de
resolver as questões tarifárias do serviço, aprovar regras, e fixar normas, o que
demandava um conhecimento técnico específico, o qual não detinha a
administração pública (ROSANVALLÓN, p: 120). Nesse contexto, também se
percebeu a necessidade de criação de regras mais maleáveis, com processo
de edição e aprovação mais simples e célere, a ponto de atender mais
imediatamente à demanda da sociedade, o que se contrapunha à realidade
burocrática até então vigente na administração pública.
29
CAPÍTULO III
A ATUAÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA
PROTEÇÃO DO DIREITO DO CONSUMIDOR
No momento da concepção do Código de Defesa do Consumidor
(1990), o movimento em torno da reforma regulatória ainda era incipiente, visto
que apenas a partir de 1995 tal reforma passou a tomar corpo através das
privatizações. Não havia, naquele contexto histórico, a necessidade social para
que se previsse no Código de Defesa do Consumidor regras mais abrangentes
quanto à prestação de serviços públicos regulados. Ainda assim, e dada à
própria natureza do Código de Defesa do Consumidor, é possível identificar a
maneira como suas matrizes principiológicas atingem as atividades reguladas.
Os princípios do direito administrativo atingem diretamente as
atividades regulatórias. Do princípio da supremacia do interesse público
infere-se que há uma posição privilegiada do órgão encarregado de zelar pelo
interesse público, e de exprimi-lo nas relações com particulares. Nesse sentido,
o objetivo de garantir o interesse público com fim primeiro da atividade da
administração deve pautar todos os atos e decisões regulatórias, havendo
assim uma íntima relação com o interesse pela proteção dos direitos do
consumidor. Além disso, há que se ressaltar que a Constituição Federal (art.
5º, XXXII) prevê que cabe ao Estado promover a proteção do consumidor. Não
existe previsão em igual sentido quanto à proteção de fornecedores.
Neste contexto, ocorre uma transformação do papel do Estado e do
direito público. Como a literatura jurídica sugere, os direitos fundamentais
típicos de uma sociedade de riscos são os direitos à proteção estatal. O direito
administrativo começa a se mover para além de uma cômoda idéia de defesa
dos indivíduos frente a uma poderosa e arbitrária Administração Pública. Sua
principal função atual tem sido defender os cidadãos das eventuais e reais
agressões de grupos privados - que não raramente são corporações
globalizadas e mais poderosas que o próprio Estado. Cada vez mais se exige
que os poderes públicos atuem na defesa dos hipossuficientes, ao invés de
30
simplesmente se absterem de intervir nas relações entre particulares, o que
demanda mecanismos efetivos para que os cidadãos afetados possam
requerer e obter a proteção estatal. Liberdade, dignidade e segurança humana
tornam-se o fundamento constitucional da tutela do "cidadão-consumidor" e a
Administração Pública passa a ter um "dever discricionário" de perseguir o
interesse coletivo. O direito brasileiro não se afasta desse paradigma. A
Constituição Federal de 1988 estabelece como um dever fundamental do
Estado promover, na forma da lei, a defesa do consumidor. Os entes
federativos têm o dever de legislar sobre a responsabilidade por dano ao meio
ambiente e ao consumidor.
Inserido nesse quadro normativo, o Código de Defesa do Consumidor
(CDC) estabeleceu a Política Nacional das Relações de Consumo,
reconhecendo a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo e a
necessidade de ações governamentais no sentido de protegê-lo efetivamente.
A tarefa estatal de proteger o consumidor tem sido atribuída em grande
medida às Agências Reguladoras, principalmente após a reforma
administrativa promovida no final da década de 1990. Dentre outros órgãos de
regulação instituídos nesse período, a Lei 9.961/2000 criou a Agência Nacional
de Saúde Suplementar (ANS), a Lei 9.427/1996 criou a Agência Nacional de
Energia Elétrica (ANEEL), e a Lei 9.472/1997 instituiu a Agência Nacional de
Telecomunicações (ANATEL).
Em todos esses casos, as leis instituidoras estabeleceram como
finalidade dos órgãos reguladores promoverem a defesa do interesse público e
dos consumidores, estimulando a competitividade entre os concessionários e
garantindo qualidade, eficiência, continuidade, confiabilidade e isonomia na
prestação dos serviços, bem como sua constante atualização e progressiva
universalização.
Assim, essas típicas agências reguladoras de serviços públicos teriam
como tarefas precípuas o “controle da qualidade do serviço e da sua
regularidade, exercido por meio da fiscalização, assim como assegurar aos
usuários o atendimento a seus direitos ao serviço adequado e a uma tarifa
módica (ou no mínimo razoáveis). (WALD e MORAES, 1999, p. 157)
31
Lucia Helena Salgado ressalta que o incentivo aos investimentos para
o desenvolvimento econômico, a promoção do bem-estar dos consumidores e
usuários e o estímulo à eficiência econômica seriam as funções da regulação
exercida pelas agências. (SALGADO, 2003, p.3)
Nessa tarefa, as Agências Reguladoras são responsáveis por
harmonizar os conflitos de interesses entre os diversos atores envolvidos com
o serviço público regulado, sendo indispensável à utilização de procedimentos
de participação na elaboração dos atos normativos.
Ronaldo Seroa da Motta, assevera que a governança regulatória será
tão mais efetiva quanto menor for a assimetria de informação entre o regulador
e o regulado. Isto é, quanto mais informação o regulador tiver do tipo e do
desempenho do regulado e quanto mais isenção o regulador tiver para aplicar
os princípios e normas regulatórias. A necessidade de isenção requer
autonomia de decisão para evitar a “captura” dos órgãos reguladores pelos
interesses daqueles agentes que deveriam regular ou mesmo pelo próprio
governo com ações oportunistas e imediatistas. A autonomia está centrada,
sobretudo, nos mandatos dos diretores das agências e nas decisões
colegiadas. Estudos técnicos que contemplem os impactos regulatórios das
decisões e ampla discussão em consultas públicas incentivam o caráter técnico
das decisões, estimulam a transparência e a prestação de contas sistemática à
sociedade por parte dos dirigentes dos órgãos. (MOTTA, 2009, p. 97-98)
No entendimento de Joaquim Falcão:
Criadas no bojo do processo de privatização com a
finalidade de disciplinar e fiscalizar diversos setores da
economia, as agências reguladoras têm falhado,
sobretudo, no que se refere à garantia dos direitos dos
consumidores. Seja nos campos de saúde suplementar,
telefonia, energia elétrica ou aviação civil, a prática
recorrente das agências tem sido deixar na mão dos
consumidores o ônus de ir atrás de seus direitos. Uma
omissão que tem levado ao crescimento considerável de
ações judiciais envolvendo relações de consumo.
32
As agências no Brasil têm três erros estruturais. O primeiro deles
decorre de elas serem, no fundo, uma delegação de poder do Legislativo para
o Executivo. Essa delegação tem sido entendida em sentido extremamente
mais amplo do que o razoável em uma democracia. Uma vez criada a agência,
o Legislativo não se preocupa mais com o que ocorre com o poder de legislar
que foi concedido a ela. E esse poder é, às vezes, excessivo. No entanto,
nossa Constituição estabelece a possibilidade de o Congresso Nacional limitar
o poder normativo das agências.
Outro ponto é que as agências, sobretudo as de serviços públicos,
obedecem a uma lógica segundo a qual o mercado atua melhor do que o
Estado, desde que o mercado seja regulado. Todo sistema concorrencial do
setor privado necessita de certo equilíbrio setorial, mas a finalidade das
agências não é somente a busca desse equilíbrio da concorrência entre as
diversas entidades privadas que atuam naquele mercado. Tanto a concorrência
leal quanto o equilíbrio setorial são meios, não a finalidade das agências. A
finalidade delas é garantir a prestação de um serviço ao cidadão, ao
consumidor. Existem interesses públicos e do consumidor que vão além de um
mero equilíbrio setorial ou de uma concorrência legal.
O terceiro ponto é a incapacidade que as agências mostram para
resolver conflitos. Elas foram estruturadas como um míni poder do Estado
voltado para um determinado setor econômico. Em seu campo de atuação, as
agências têm poder para legislar, normatizar, fiscalizar e executar políticas
necessárias ao desenvolvimento desse setor. E elas cresceram no Brasil
desenvolvendo bem o seu poder de legislar, normatizar melhor e executar, mas
não desenvolveram o poder de resolver os conflitos entre os meios e os fins,
entre o consumidor e todas as entidades que ela regula. É como se faltasse – e
ela deveria existir – uma função de resolução de conflitos, uma função de “pré-
judiciário” ou talvez de uma justiça pré-administrativa, que trabalhasse com a
conciliação e a mediação de conflitos, porque isso faz parte da sua função.
Elas criam os problemas e quem tem de resolver isso é o Poder Judiciário. As
agências reguladoras estão terceirizando os custos do conflito que elas
próprias geraram.
33
Para que o processo deliberativo nas Agências Reguladoras se
legitime, é fundamental que haja representação efetiva dos consumidores. A
participação dos cidadãos nas decisões públicas que os afetam não somente
garante uma maior quantidade de informações disponíveis para as Agências
Reguladoras, aumentando a probabilidade de acerto de seus atos, como
também contribui para conferir-lhes legitimação democrática e demonstrar o
respeito pela dignidade dos consumidores. Isto pode ocorrer por meio de
mecanismos de participação direta e consulta popular como por meio da
participação de órgãos de defesa do consumidor. A intervenção dos órgãos de
defesa do consumidor nos processos deliberativos regulatórios é de especial
relevância, pois evita que as Agências sejam monopolizadas pelos interesses
das empresas concessionárias, criando um ambiente mais democrático e
harmônico.
A representatividade dos órgãos de defesa do consumidor é
reconhecida pelo CDC, que confere a essas instituições o poder de perseguir
judicialmente os interesses coletivos dos consumidores (art. 82). Contudo, mais
do que permitir a contestação judicial de atos regulatórios, a legislação deve
assegurar mecanismos que garantam a participação dos órgãos de defesa do
consumidor na própria formação das normas editadas pelas Agências.
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) poderá votar
projeto que otimiza o funcionamento das agências reguladoras para a proteção
e defesa dos direitos dos consumidores. A proposta (PLS 284/2010), de
iniciativa da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e
Fiscalização e Controle (CMA).
Um dos pontos levantados nos debates foi que as agências
reguladoras não possuem todos os instrumentos necessários proteger os
interesses dos consumidores.
A proposta altera a Lei 9.986/2000, que trata da gestão de recursos
humanos das agências reguladoras. O projeto acrescenta dispositivos para
que se tornem públicas as sessões deliberativas das agências, assim como
todas as fases das representações, dos inquéritos, procedimentos e processos
administrativos em andamento nesses órgãos.
34
Tal projeto ainda obriga as agências reguladoras a explicitarem os
motivos para rejeição das contribuições oferecidas por agentes públicos ou
privados nos procedimentos de consulta pública realizada para confecção de
norma regulatória. As agências devem também considerar, na avaliação de
desempenho das empresas reguladas, o volume de reclamações dos usuários
perante os órgãos de defesa do consumidor.
Pela proposta, os órgãos de defesa do consumidor terão direito a
petição e a representação perante a agência reguladora, que deverá dar
prioridade à análise dessas demandas. Os órgãos de defesa do consumidor
também poderão solicitar que a agência custeie estudos técnicos necessários à
defesa de seus interesses.
Para o relator, as alterações propostas à Lei 9.986/2000 dão mais
transparência e publicidade às ações das agências reguladoras.
Inácio Arruda ressalta que a finalidade da agência reguladora é
assegurar uma prestação eficiente de serviços aos consumidores e usuários.
Destaca:
Nada mais oportuno, portanto, do que assegurar aos
órgãos de proteção e defesa do consumidor o direito de
petição e representação perante a agência, bem como a
prioridade na análise de suas demandas, com o que se
reforça a defesa do consumidor, um dos princípios
constitucionais da ordem econômica.
Diante de todo o exposto, somente resta concluir que as Agências
Reguladoras desempenham função importante na proteção do direito do
consumidor juntamente com os outros órgãos atuantes nesta área.
35
CONCLUSÃO
Diante disso, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabeleceu a
Política Nacional das Relações de Consumo, que reconheceu a vulnerabilidade
do consumidor no mercado de consumo e a necessidade de ações
governamentais no sentido de protegê-lo efetivamente.
A tarefa do Estado em proteger o consumidor tem sido atribuída em
grande parte às Agências Reguladoras, principalmente após a reforma
administrativa promovida no final da década de 1990. Dentre outros órgãos de
regulação instituídos nesse período, a Lei 9.961/2000 criou a Agência Nacional
de Saúde Suplementar (ANS), a Lei 9.427/1996 criou a Agência Nacional de
Energia Elétrica (ANEEL), e a Lei 9.472/1997 instituiu a Agência Nacional de
Telecomunicações (ANATEL).
Nos casos acima citados as leis que instituíram as agências
estabeleceram como finalidade dos órgãos reguladores a proteção da defesa
do interesse público e dos consumidores, visando estimular a competitividade
entre os concessionários e garantindo qualidade, eficiência, continuidade,
confiabilidade e isonomia na prestação dos serviços, bem como sua constante
atualização e crescente universalização.
Com este trabalho, visamos identificar e explicar as mais importantes
teorias e disponíveis.Com tudo isso, tentamos propiciar uma visão geral e
abrangente dos aspectos positivos, negativos, conjunturais e diferenciais
destas teorias, bem como a importância da motivação para o trabalho.
36
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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Janeiro, Forense, 2012.
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01/09/2014
38
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A ORIGEM DAS AGÊNCIAS REGULADORAS 9
CAPÍTULO II
FUNÇÕES DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NO 17
CONTEXTO SOCIAL
2.1 – A atuação das Agências reguladoras e a sociedade 20
CAPÍTULO III
A ATUAÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA 29
PROTEÇÃO DO DIREITO DO CONSUMIDOR
CONCLUSÃO 35
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 36
ÍNDICE 38