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CONSTRUINDO UM MODELO DE ARTICULAÇÃO ENTRE ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL, UNIVERSIDADE E ESTADO: Inovações, Desafios e Perspectivas do Novo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil no Brasil.
Elizabeth Matos Ribeiro – PROAP/PDGS-UFBA ([email protected])Neomar Pereira – Curso de Gestão Pública-UFBA ([email protected])
Walter de Oliveira Pinto Júnior-PROAP-UFBA([email protected])
RESUMO
Este artigo tem por objetivo apresentar a concepção e resultados preliminares da experiência de
articulação interinstitucional entre a universidade, o Estado e as organizações da sociedade civil,
com a finalidade de conceber e implementar metodologias de formação profissional para gestores
públicos e gestores sociais tendo como base os desafios impostos pela implementação do novo
Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil no Brasil (MROSC). Esta legislação veio
promover alterações substanciais nas relações entre o poder público e a sociedade civil no Brasil,
revelando, pois, uma grande expectativa de contribuir tanto para institucionalizar e aperfeiçoar o
ambiente jurídico de uma relação complexa entre Estado e Sociedade civil organizada.
PALAVRAS CHAVE: Gestão Pública; Gestão Social; Parceria Estado-Sociedade-
Universidade; MROSC-Brasil
NOTA BIOGRÁFICA DOS AUTORES:
Elizabeth Matos Ribeiro - Doutora em Ciências Políticas e da Administração pela Universidade de
Santiago de Compostela-Espanha (2000). Professora Associada I da UFBA. Coordenadora Grupo
de Pesquisa Núcleo de Estudos Conjunturais em Administração-NEC. Integra o Grupo de Espaços
Deliberativos e Governança Pública, apoiado pela CLACSO; Neomar Pereira - Estudante de
graduação do curso de Gestão Pública da UFBA, bolsista do projeto de extensão Rede de Inovação
Ponto de Gestão MROSC: Construindo Modelo de Articulação entre Organizações da Sociedade
Civil, Universidade e Estado; e Walter de Oliveira Pinto Junior - Mestre em Desenvolvimento e
Gestão Social pelo PDGS-UFBA (2017). Especialista em Gestão de Políticas Públicas de Gênero e
Raça.
1. Introdução
Este artigo tem por objetivo apresentar a concepção e resultados preliminares da experiência
de articulação entre organizações da sociedade civil, universidade e estado com a finalidade de
conceber e implementar metodologias de formação profissional para gestores públicos gestores
sociais sobre o novo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil no Brasil (MROSC).
Esta legislação teve como base a Lei nº 13.019/2014 que foi concebida e promulgada com vistas a
promover alterações substanciais nas relações entre o poder público e a sociedade civil no Brasil,
revelando, pois, uma grande expectativa de contribuir para institucionalizar e aperfeiçoar o
ambiente jurídico de uma relação complexa entre Estado e Sociedade civil organizada. A UFBA
decidiu entrar nessa articulação com o governo federal e as representações da sociedade civil
visando, pois, contribuir para o enfrentamento desse grande desafio especialmente no referente ao
esforço que deverá ser empreendido para possibilitar espaços efetivos de articulação e cooperação
entre a Administração Pública (em âmbito federal, estadual e municipal) e as OSCs.
É importante ressaltar que esse esforço responde, em grande medida, ao movimento de
resistência de lideranças dos movimentos sociais brasileiros com o objetivo de se contrapor aos
escândalos que emergiram a partir de 2000 em torno do papel de algumas ONGs envolvidas em
fraudes e no mau uso dos recursos públicos. Nesse sentido, visando fortalecer a atuação estratégica
das organizações sociais, particularmente, as que sempre prezaram pelos valores e princípios que
regem a gestão da coisa pública, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) decidiu submeter um
projeto em Edital público vinculado do Ministério da Educação (MEC) lançado em 2016, para
apoiar ações extensionistas de professores articulados com outros atores da sociedade civil e do
poder público interessados em contribuir para a formação dos gestores públicos e gestores sociais
para a aplicação do novo marco jurídico orientador das novas relações entre os interesses públicos e
os interesses sociais (MROSC). Trata-se, portanto, de um projeto que assumiu como concepção
teórica e metodológica uma perspectiva sistêmica e pluridisciplinar, envolvendo, pois, diversos
campos do conhecimento liderados pela área da administração (publica e social). Conforme já
ressaltado os objetivos desse projeto era instrumentalizar através de uma formação crítica que
deveria integrar aspectos políticos, socioeconômicos, culturais, jurídicos, administrativos e
contábeis (contabilidade pública) em torno dos desafios impostos para a implantação de qualquer
marco legal.
Nessa direção, a expectativa em torno do papel da Universidade era garantir a institucionalidade
das ações educativas e mobilizadoras em torno do MROSC de modo a ampliar o nível de
conhecimento sobre os aspectos que fundamentam os novos processos de contratualização entre o
Estado e as Organizações Sociais, fortalecendo, assim, a participação e o controle social. Com esse
macro objetivo, o projeto que fundamentou esse texto, intitulado de Rede de Inovação Ponto de
Gestão MROSC: Construindo Modelo de Articulação entre Organizações da Sociedade Civil,
Universidade e Estado se propõe a abrir espaço para proporcionar o diálogo com essa nova
conjuntura institucional entre poder público e OSCs. Essa ação extenionista baseada no desenho e
implantação de práticas de formação cidadã tem possibilitado que a Universidade tenha a
oportunidade de assumir o papel de polo canalizador do processo de fortalecimento institucional das
organizações sociais baianas. Considera-se que incrementar a formação dessa rede estadual e
regional de formação em gestão pública possibilitará expandir esse movimento através da atuação e
divulgação de informações e experiências desenvolvidas nessa inter-relação complexa entre Estado
e sociedade. Assim como poderá servir também como referência e suporte para consolidar uma
cultura de relações colaborativas e de participação social que venha a contribuir, de forma
significativa e efetiva, para melhorar a prática da gestão pública democrática brasileira e baiana, em
particular.
2. Uma Breve Contextualização do Tema
Segundo dados recentes divulgadas em diversas pesquisas, existem no Brasil milhares de
organizações da sociedade civil (OSCs) entre as que são consideradas como ‘boas’ e as que são mal
vistas por terem participado de ações antiéticas no passado recente. A maior parte dessas
instituições surgiu após a promulgação da Constituição Federal de 1988 que reconheceu a
organização e participação social como direitos e valores a serem garantidos e fomentados.
Observa-se que essas organizações sociais atuam em diversas áreas de políticas sociais como saúde,
educação, cultura, promoção de direitos, ciência e tecnologia e assistência social, entre outras. A
parceria de algumas dessas instituições com o Estado nas últimas décadas permite qualificar as
políticas públicas, aproximando-as das demandas mais urgentes da sociedade, especialmente da
população marginalizada, possibilitando, assim, o atendimento de necessidades emergenciais
utilizando recursos inovadores e mais acessíveis de gestão pública e gestão social se comparado
com os padrões tradicionais e insatisfatórios que vem sendo realizado pelo poder público,
especialmente os municípios que revelam baixa capacidade de conceber e executar políticas
públicas.
Esse trabalho alinha-se, portanto, às grandes demandas atualmente colocadas para a
sociedade e para o Estado brasileiro (seja no Governo Federal, Estaduais e principalmente
Municipais), no que se refere a implantação de um Marco Regulatório que foi elaborado justamente
para qualificar as Organizações da Sociedade Civil para parceirizar com o poder público para,
assim, ampliar e democratizar a gestão dos interesses públicos, até então concentrados nas mãos de
um Estado autoritário, excludente e incapaz de enxergar e/ou promover ações transformadoras da
dura realidade que ainda orienta as relações sociais de produção, distribuição e consumo no Brasil.
Nessa direção o MROSC traz inovações importantes na dimensão institucional no que se refere a
construção de uma agenda comprometida em promover alterações substanciais nas relações entre
governos e sociedade civil, com o objetivo de aperfeiçoar o ambiente jurídico e institucional
relacionado as relações das OSCs com o Estado. Nessa direção, aponta para ações que visam
favorecer as articulações e cooperações imprescindíveis para legitimar e potencializar, de maneira
mais assertiva, a transparência e a participação da sociedade na condução das políticas sociais que
tem impactos expressivos na qualidade de vida social.
Ao reconhecer formalmente a relevante e legítima participação da sociedade civil na
concepção e execução de ações públicas o governo brasileiro admite aceitar a participação social
como ingrediente essencial de sua forma de governar, seja no diálogo permanente com a sociedade,
seja através da criação de espaços concretos de participação das organizações sociais qualificadas.
Esta participação tem se dado a partir de 2003 através da criação de espaços formais de participação
social como conselhos, conferências, audiências públicas, plataformas digitais e redes sociais, entre
outros recursos, mas o MROSC traz novidades importantes nesse processo de inclusão social na
medida em que admite espaços mais efetivos de cooperação entre Estado e Sociedade civil através
do estabelecimentos de contratos de gestão de políticas públicas.
Cabe destacar, ainda, que um dos principais avanços para a agenda do MROSC foi a
aprovação da Lei 13.019, sancionada em 2014, ao criar um regime
jurídico próprio para as parcerias entre Estado e organizações da sociedade civil, a referida lei
constitui um avanço para a democracia, pois valoriza a atuação de uma sociedade civil autônoma e
participativa e reconhece as potencialidades das organizações sociais na condução de ações
públicas. Como já destacado, a nova norma trata dos aspectos que possibilitam a contratualização
dessas organizações com a administração pública e estabelece princípios, preceitos e normas para a
Gestão de Parcerias Público Sociais, as chamadas PPPs.
Merece informar que a nova lei tem abrangência nacional o que implica inovações também
nas relações de parceria de todos os entes federados (estados e municípios) com as OSCs, tendo a
União (governo federal) como o ente responsável pela coordenação dos demais entes federados, na
capacitação de gestores, representantes de organizações da sociedade
civil e conselheiros dos conselhos de políticas públicas. Nesse sentido, as instituições acadêmicas e
outras organizações públicas e sem fins lucrativos, comprometidas com a promoção de projetos de
capacitação, formação e desenvolvimento profissional de servidores públicos, têm papel
fundamental neste processo.
Além do desafio de formar e capacitar servidores públicos federais, municipais, estaduais e
distritais para que desenvolvam competências técnicas e políticas capazes de aplicarem a nova lei
em seus processos de trabalho, instituições universitárias como a UFBA, entre outras Universidades
brasileiras, tem a obrigação moral de ajudar esse movimento mediante o desenvolvimento de
dinâmicas de capacitação que contemplem outras perspectivas complementares que o MROSC vai
demandar, a exemplo das competências administrativas (de gestão e de práticas gerenciais)
fundamentais para o sucesso desse esforço coletivo. Outro desafio importante que compete às
universidades é criar novas pedagogias que possibilitem a formação técnica e políticas de grande
parte dos atores sociais no Brasil que carecem de conhecimentos mais substanciais sobre os
conteúdos específicos da administração do poder público. Nessa direção, é preciso reconhecer que o
desenvolvimento de atividades relacionadas à formação no Marco Regulatório tem o objetivo de
contribuir para a ampliação de processos educativos que ofereçam espaços de convivência, troca de
experiências e construção conjunta de conhecimentos entre diferentes atores sociais, para que se
possa fortalecer uma cultura de relações colaborativas e contribuir com uma prática de gestão
pública democrática, capaz de construir consensos mínimos acerca da relação entre Estado e
organizações da sociedade civil no país.
2.1. Breve Histórico do Esforço Coletivo e Institucional que garantiu o MROSC
Como resultado de um processo político histórico liderado por diversos representantes de
organizações da sociedade civil brasileira, em 2010, um grupo de organizações, movimentos e redes
se articulou em uma Plataforma para um novo Marco Regulatório para as Organizações da
Sociedade Civil e apontou a necessidade de aprimoramentos nas leis referentes às parcerias com o
governo. Em 2011, foi criado um Grupo de Trabalho Interministerial para, em conjunto com a
sociedade civil, elaborar propostas e análises sobre o tema. O grupo, coordenado pela Secretaria
Geral da Presidência da República, contou com a participação da Casa Civil, Controladoria-Geral
da União, Advocacia-Geral da União, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Ministério
da Justiça, Ministério da Fazenda, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e de 14
organizações da sociedade civil de representatividade nacional.
Em 2011, este grupo realizou um seminário internacional para construir um plano de ação e
definiu três eixos orientadores: contratualização, sustentabilidade econômica e certificação.
Priorizou-se, inicialmente, o eixo referente ao processo de contratualização de parcerias, mediante a
elaboração de uma minuta de Projeto de Lei para auxiliar os debates do Poder Legislativo em
relação ao tema. Todos esses momentos auxiliaram a construção de um diagnóstico e de uma
agenda positiva para as organizações. O diagnóstico elaborado pelo Grupo de Trabalho elencou
uma série de propostas e, dentre elas, ganhou relevância uma minuta de projeto de lei relacionada
especificamente à contratualização entre OSCs e o poder público, que subsidiou o poder Legislativo
sobre o tema.
Em 2013, as discussões sobre o Marco Regulatório no Congresso Nacional foram
intensificadas por meio de um diálogo constante com os senadores e deputados para que as
propostas de alteração legislativa incorporassem os resultados do grupo de trabalho.
Esse movimento teve uma contribuição forte do Estado da Bahia, devido ao ativismo das
organizações da sociedade civil, a exemplo da ABONG, Cáritas Brasileira e CESE, esta última
representando o CLAI-Conselho Latino Americano de Igrejas/Regional Brasil. Juntas compuseram
o GT liderado pela SG/PR, desde 2011, e reforçaram o trabalho em âmbito
estadual, junto às demais OSCs e movimentos sociais baianos. Essa atuação foi mais acentuada a
partir de 2013, com a realização da sessão especial promovida pela Assembleia Legislativa da
Bahia, a partir da discussão do seguinte tema: Contribuição das Ongs para o desenvolvimento da
Bahia. Outro movimento importante ocorreu na sequência por iniciativa da ABONG/BA e da
Plataforma do MROSC, materializada através da realização de amplo debate interno para motivação
das OSCs, assim como para criar espaço para esclarecimentos a respeito do que vinha sendo
construído pelo GT. Essa ação contou com a a presença de representantes da SG/PR, da ABONG
Nacional, do Comitê Facilitador da Plataforma em âmbito nacional e da Secretaria de Relações
Institucionais do governo da Bahia.
O grupo MROSC-Bahia, como ficou reconhecido, realizou a partir desse momento, diversas
reuniões preparatórias de mobilização com ONGs e movimentos populares que culminou com a
parceria do Ministério Público estadual para a realização de uma Audiência Pública para ampliar a
discussão sobre o MROSC, realizada em novembro de 2013. Esse evento que teve como tema
orientador As OSC e a Democracia: por novas relações com o Estado - Projetos de Lei em
tramitação no Congresso, contou com a relevante palestra do representante do MP Estadual e
contou também na mesa de debate com a participação de representantes do Comitê Facilitador da
Plataforma das OSC na mesa de debate. A relevância desse evento foi a grande representatividade
de movimentos sociais, OSCs e parlamentares baianos (entre senadores, deputados federais e
estaduais) presentes e integrados na discussão do novo marco. Como resultado dessa Audiência
Pública foram encaminhados uma ‘carta-compromisso’, aprovada pelas organizações e
parlamentares presentes, e a sugestão de criação de um blog contendo os principais pontos tratados
para ampliar, desse modo, o conhecimento de outros atores interessados no tema.
Com base nesse breve contextualização, observa-se que o processo de construção dessa
agenda passou por um avanço significativo até alcançar seu ápice com a aprovação da Lei 13.019,
em 2014. Esse marco ganha relevância justamente porque passou a estabelecer um novo regime
jurídico das parcerias voluntárias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil,
por meio dos termos de fomento e de colaboração, reconhecendo, assim, as especificidades das
entidades privadas sem fins lucrativos e evitando analogias indevidas com as parcerias realizadas
entre entes públicos. Pode-se inferir que a elaboração desse novo instrumento jurídico incorporou
contribuições de diversos atores e reflete a convergência de diversas forças sociais e políticas para
sua aprovação, demonstrando, desse modo, que o regime de parcerias entre organizações da
sociedade civil e a administração pública deveria ser tratada como uma matéria suprapartidária e de
interesse nacional.
O MROSC cria instrumentos jurídicos próprios (Termo de Fomento e Termo de
Colaboração) e estabelece regras para a seleção das entidades e para as etapas de avaliação das
parcerias tais como a exigência de: chamamento público obrigatório – de modo a criar barreiras
para evitar o favorecimento de grupos específicos. Nessa direção, vai exigir três anos de existência
e experiência das entidades, o que evita a escolha de entidades sem preparo técnico ou estrutura
para o cumprimento dos objetivos e metas dos projetos. Além disso impõe que a entidade e seus
dirigentes tenham “ficha limpa”, com o objetivo de coibir corrupção e trazer segurança jurídica e
ética a atuação das organizações que, de fato, comprovem estar comprometidas com o interesse
público. Ademais, exige que os órgãos públicos planejem previamente a realização e o
acompanhamento das parcerias e prevê um sistema de prestação de contas diferenciado por volume
de recursos, o que deverá garantir o aperfeiçoamento de políticas de monitoramento e avaliação dos
projetos contratados ou parceirizados. Com essas exigências os gestores sociais são obrigados a
investir em, uma formação técnica que o capacite a atuar com os padrões legais próprios do poder
público. É fundamental, pois, que esses gestores compreendam que ao parceirizar com um ente
público deve estar preparado para não apenas respeitar as questões jurídicas, mas deve demonstrar
ter competências para planejar, controle processos de trabalho e garantir a entrega as sociedade dos
bens ou serviços assumidos, controlando, assim, os resultados alcançados.
Por meio desta lei, as particularidades das OSCs passam a ser visibilizadas: são pessoas
jurídicas de direito privado que, ao atuar em parceria com o Estado, promovem ações de relevância
pública. Essa hibridez que congrega lógicas distintas na mesma natureza jurídica - submissão ao
regime de direito público e privado ao mesmo tempo - ocasiona certa confusão na ótica da
administração pública. Uma das inovações trazidas pela citada lei é a obrigação da oferta de
capacitação para gerir e executar parcerias em consonância com a nova legislação. Em seu artigo 7º,
a Lei 13.019 informa que:
A União, em coordenação com os Estados, Distrito Federal,
Municípios e organizações da sociedade civil, instituirá programas de
capacitação para gestores, representantes de organizações da
sociedade civil e conselheiros dos conselhos de políticas públicas, não
constituindo a participação nos referidos programas condição para o
exercício da função.
2.2. Contribuições, Desafios e Possibilidades da Articulação entre Estado, Universidade e
Organizações da Sociedade Civil
Conforme já destacado acima, esta nova obrigação legal tem enorme potencialidade de
reverter a realidade do desconhecimento e insegurança que ainda permeia o processo de parcerias
com base no MRSOC. O que implica o longo caminho que essa conquista tem para tornar-se
efetivamente um caminho para melhorar e qualificar as parcerias entre Estado e Sociedade civil no
Brasil. Investir tanto na produção de conhecimentos teóricos e práticas administrativas (que
envolvem práticas sociais e organizacionais fundamentais). Para isso, o governo (federal, estaduais
e mancipais) precisam contar com o suporte acadêmico e pedagógico das universidades e de outras
instituições de capacitação que atuam na administração pública (a exemplo da Escola Nacional de
Administração Pública-Enap, da Escola Superior de Administração Fazendária-Esaf; da Escola da
Advocacia-Geral da União; do Programa Capacita da Controladoria-Geral da União, entre outros
órgãos que funcionam como “Universidades Corporativas” no setor público) para dar conta desse
enorme desafio que se apresenta para modernizar incluindo nesse conceito a participação ativa e
efetiva da sociedade civil, através do desenvolvimento de atividades formativas, continuada, que
promovam a reflexão e qualifiquem o debate público sobre a contratualização entre as organizações
sociais e o Estado brasileiro.
Foi com esse objetivo que a Secretaria Geral de Presidência da República, responsável pela
articulação do MROSC no Governo Federal, colocou-se à disposição para atuar em rede com as IES
selecionadas e as convidou, por meio de documento institucional, a submeterem projetos de
extensão para atender ao Edital PROEXT 2016. O esforço desta Secretaria era, portanto, ir além do
atendimento da obrigação legal prevista na Lei 13.019, de 2014, integrando como ação estratégica
fundamental ações de capacitação dos diferentes atores sociais em consonância com o Decreto
8.243, de 2014, que institui a Política Nacional de Participação Social - PNPS e o Sistema Nacional
de Participação Social - SNPS. Este decreto assume relevância nesse contexto por definir como um
dos objetivos centrais da PNPS "incentivar e promover ações e programas de apoio institucional,
formação e qualificação em participação social para agentes públicos e sociedade civil".
Visando atender a esse desafio foi formado um grupo triparte, formado por professores da
UFBA, representantes da Sociedade Civil Baiana e atores vinculados ao Governo do Estado da
Bahia com o objetivo de coproduzir um projeto de extensão para submeter ao Edital PROEXT-
MEC 2016. Em resposta a esse compromisso, o objetivo central dessa ampla articulação foi,
portanto, contribuir com a disseminação de informações e desenvolver atividades de
capacitação junto a servidores públicos, conselheiros de políticas públicas e membros de
OSCs baianas, para expandir e consolidar relações de parcerias mais transparentes,
democráticas, focadas em resultados efetivos para a população, ampliando a inserção social
da universidade pública. E como objetivos específicos foram definidas as seguintes metas:
a) Fortalecer a atuação estratégica das OSCs, por meio de formação e assessoria
técnica, de forma sistêmica e pluridisciplinar, aos seus representantes e gestores
públicos;
b) Instrumentalizar os atores envolvidos na relação entre Estado e organizações da
sociedade civil na Bahia para se adequarem às inovações trazidas pela Lei nº
13.019/2014, ampliando o nível de conhecimento sobre os novos aspectos da
contratualização e fortalecendo a participação e o controle social;
c) Servir de referência e suporte para consolidar uma cultura de relações colaborativas e
de participação social, que contribua para a prática da gestão pública democrática; e
d) Incrementar a formação de rede nacional e estadual para atuação e divulgação
ampliada de informações e experiências desenvolvidas, por meio da rede "Ponto
MROSC Bahia-UFBA".
3. Bases Metodológicas e Pedagógicas do Projeto
Na definição dos conteúdos e metodologias orientadoras das ações de capacitação, admitiu-
se como pressupostos centrais:
a) Os subsídios para Capacitação sobre a Lei 13.019/2014, expostos no documento Gestão
de Parcerias com Organizações da Sociedade Civil (MROSC - SG/PR);
b) Os princípios e metas relacionados dos projetos educativos e núcleos de pesquisa do
PROAP - Programa de Estudos Aplicados em Administração Política e do PDGS -
Programa de Mestrado em Desenvolvimento Territorial Gestão Social da EAUFBA e;
c) A construção participativa, com promoção de debates e
possibilidade de reelaboração curricular a partir da interação entre os sujeitos que
compõem o processo de ensino-aprendizagem.
A execução deste projeto dirigido para a concepção e desenvolvimento de atividades de
extensão e consequente interação sociedade-universidade, deve ser considerado, portanto, como um
projeto piloto para a implantação de um Ponto de Gestão de OSCs, a partir das agendas do MROSC
na Bahia-UFBA. Se for exitoso poderá ser replicado, de maneira sistemática, em âmbito estadual e
se possível, nacional, com base em uma atuação em rede e contanto com o apoio fundamental do
poder público, de outras instituições de ensino e de muitas outras organizações sociais. Por tratar-se
de um projeto financiado com recurso público (Edital PROEXT-MEC/2016) e também por sua
finalidade social, as atividades propostas tem sido realizadas de forma gratuita, contando com a
colaboração de docentes e pesquisadores da UFBA, de gestores de OSCs e de outros participantes
voluntários convidados. Propõe-se que, ao longo da execução do projeto e para sua continuidade,
sejam buscados financiamentos adicionais necessários para sua multiplicação.
Esta proposta tem como perspectiva o funcionamento em rede de cooperação e intercâmbio,
com a divulgação ampliada e possibilidade de replicação do projeto, com a implantação de núcleos
similares de Pontos de Gestão do MROSC em outras universidades, consolidando, assim, uma rede
interativa de informações e experiências. Nesse sentido, os Pontos de Gestão MROSC são
concebidos como "pontos de encontro" de apoio à gestão de Organizações da Sociedade Civil, nas
áreas de direito, administração, contabilidade, planejamento e comunicação, com foco na
sustentabilidade de suas ações e nas parcerias com o Estado.
Em termos de articulação, o Ponto MROSC-Bahia-UFBA pretende reunir, pois, acadêmicos,
professores, pesquisadores, membros das OSCs, movimentos sociais, servidores públicos,
conselheiros de políticas públicas, operadores do direito, representantes de entidades de classe,
entidades municipalistas, órgãos de controle, empresas paraestatais e estatais e demais interessados.
E deverá ter uma "atuação estratégica com as OSCs, de modo a reforçar a sua autonomia e
sustentabilidade, visando a consolidação de uma sociedade civil forte e atuante", conforme exposto
no Edital PROEXT 2016 (item "a" do subtema 4.19.5 – Fomento e Colaboração com Organizações
da Sociedade Civil e Projetos Sociais). Para tanto, deve ter como atividades principais:
a) Capacitar, Instrumentalizar e Assessorar profissionais e gestores
públicos e de OSCs nos temas relativos à agenda do MROSC;
b) Promover Seminários, Cursos Livres,
c) Painéis de Debate Itinerantes e outras atividades formativas que incorporem a
participação das organizações alvo e contribuam para o fortalecimento da cidadania;
d) Construir uma rede de troca de informações e atuação conjunta de Gestores de OSCs
e governos voltados aos temas e eixos do MROSC.
As atividades acadêmicas/formativas do projeto, como os Cursos Livres de Capacitação,
Seminários e Painéis de Debate Itinerante, tem sido construídas com base na Matriz Curricular
proposta pelo governo federal e das experiências de pesquisa e ensino multidisciplinar
desenvolvidos pelo PRAP-NEC e pelo PDGS, com um olhar apurado sobre as relações
interorganizacionais, as características e necessidades dos públicos alvo, prioritariamente das OSCs
baianas.
A Matriz Curricular sugerida trata-se de uma proposta organizada de forma modular e
abrangente sobre parcerias entre o Estado e as OSCs, elaborada para apoiar a realização de
atividades de formação para gestores públicos, conselheiros de políticas públicas e gestores das
organizações sociais.
Os Percursos de Aprendizagem principais, mas não exclusivos, que tem integrado essa
proposta piloto de formação são os seguintes:
Percurso de Aprendizagem 1 - Organizações da Sociedade Civil, Políticas Públicas
e Participação Social;
Percurso de Aprendizagem 2 - Princípios, Fundamentos, Direito e legislação
aplicada às Organizações da Sociedade Civil e suas relações com o Estado;
Percurso de Aprendizagem 3 - Parcerias entre o Estado e Organizações da
Sociedade Civil - do planejamento à prestação de contas;
Percurso de Aprendizagem 4 - Operando o Sistema Gerencial para
Termos de Colaboração e Fomento; e
Percurso de Aprendizagem 5 - Controle social, monitoramento e avaliação.
Os conteúdos e a composição desta estrutura curricular modular e flexível buscou a
integração das dimensões política e técnico-científica em uma proposta
interdisciplinar contextualizada.
Partiu-se do princípio que as relações de parceria entre Estado e OSCs, objeto desta proposta
de formação, deveriam ser abordadas pela compreensão de todos os seus atores, da lógica e do
sentido que lhes orienta, de suas origens, variáveis históricas, sociológicas, formas de
funcionamento, enfim, das posições que ocupam no sistema democrático e como se combinam e
interpenetram. Esta opção epistemológica orientou a definição de todos os módulos e escolha
preliminar dos temas, sendo mais expressiva no percurso 1 (Organizações da Sociedade Civil,
Políticas Públicas e Participação Social) e no percurso 2 (Princípios, Fundamentos, Direito e
legislação aplicada às Organizações da Sociedade Civil e suas relações com o Estado), que dão
início à proposta de formação.
A partir da compreensão dos princípios, apreensão de conceitos e contextualização política,
a dimensão prática ganhou relevo na concepção da proposta, possibilitando que os instrumentos
concretos utilizados para as relações de parceria sejam conhecidos, entendidos e, sobretudo,
aplicados.
O percurso 3 (Parcerias entre o Estado e Organizações da Sociedade Civil - Do planejamento
à prestação de contas), o percurso 4 (Operando o Sistema Gerencial para Termos de Colaboração e
Fomento) e o percurso 5 (Controle social, monitoramento e avaliação) apresentam mais
acentuadamente esta dimensão técnico-prática, sem negar o entendimento de que questões desta
ordem são o reflexo de formulações teóricas e representam visões e opções políticas determinadas.
Neste sentido, pode-se dizer que a relação teoria-prática colocou-se como imperativa no tratamento
dos conteúdos selecionados ao longo de todos os módulos.
A partir desta matriz preliminar serão propostas as atividades formativas do projeto, sejam
elas os Cursos Livres, Seminários e/ou Painéis de Debate Itinerantes, trazendo a possibilidade de
combinar módulos diferentes, com duração e aprofundamento temático compatível às necessidades
do público participante, a ser definido pela equipe do projeto, com apoio da rede Ponto MROSC
Bahia/UFBA.
As demais atividades, de articulação em rede e assessoramento, serão centradas no cotidiano
do Ponto de Gestão MROSC Bahia, por meio de relação periódica das organizações sociais com a
equipe (docentes, discentes, bolsistas e representantes gestores da rede), com sua ação condicionada
às demandas trazidas pelas OSCs e demais organizações participantes, de modo a criar um espírito
participativo, colaborativo e propositivo ao projeto.
4. Algumas Considerações Preliminares
A título de considerações preliminares merece tecer algumas reflexões sobre os desafios da
execução um projeto com esse grau de complexidade especialmente no que se refere aos entraves
relacionados ao próprio processo de articulação entre Estado, Universidade e Organizações Sociais.
O que impõe à equipe de gestão triparte, conformada por professores e estudantes da UFBA,
gestores do governo do Estado da Bahia e representantes de organizações sociais baianas, um
permanente esforço para ajustar tanto as diferentes formas de trabalhar dos profissionais
envolvidos, como principalmente equacionar as enormes diferenças existentes entre as culturas do
poder público, da qual a UFBA faz parte, e das Organizações Sociais. Esses são dilemas
característicos das práticas de gestão e de gerência próprias das estruturas da Administração Pública
que são mais burocráticas, menos flexíveis, mais fechadas à inovações, ainda que assumam, na
atualidade, discursos comprometidos com métodos para alcançar eficiência e resultados, mas que
estão distantes de alcançar esse objetivo.
Por outro lado, as organizações sociais trazem também seus próprios problemas vinculados
tanto em relação a dispersão que marca a cultura de cada entidade, seja pelos valores que defendem,
seja pela cultura consolidada, seja por diversos outros motivos e interesses difusos e muitas vezes
de difícil apreensão.
Essas duas constatações, por si só revelam os desafios que as ações de capacitação
vinculadas a esse projeto tem a enfrentar, pois os reptos maiores impostos para a implantação plena
do MROSC está justamente em criar as competências necessárias nos gestores públicos e nos
gestores sociais para que as parcerias e contratação entre Estado e Organizações sociais seja
exitoso. Enfim, esse impasse mais ligado a gestão e governança do projeto coloca à equipe em uma
posição bastante desafiadora pois revela uma pequena porem relevante fração dos inúmeros e mais
complexas situações que exigirão do poder público e dos atores sociais empenho, paciência e
investimento na construção de uma nova cultura que a participação social carrega. Em outras
palavras, esse relato preliminar sobre os processos de aprendizagens que a execução desse projeto
tem imposto para encontrar os meios mais apropriados para investir em ações de educação cidadã,
envolvendo tanto atores públicos como atores sociais em um mesmo espaço e comprometidos em
dar conta dos mesmos desafios que é construir bases sólidas que ajudem a sociedade e o Estado
brasileiro a transformar as relações sociais perversas que ainda marcam nossa vida coletiva.
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