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ano 01 _dezembro de 2013 revista política social e desenvolvimento #02 Educação, Desenvolvimento e Geração alt+tab nelson pretto sergio haddad

Educação, Desenvolvimento e Geração alt+tab sergio haddad … · na sua dimensão humana, social e ambiental, resgatando-o das amarrar restritas do crescimento econômico, como

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ano 01 _dezembro de 2013

revista política social e desenvolvimento #02

Educação, Desenvolvimento e Geração alt+tab

nelson prettosergio haddad

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FOTO EDUARDO FAGNANI

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Apresentação 06....................................................................................Eduardo Fagnani

12............Nelson Pretto

O que quer nas ruas a geração alt+tab?

08..................................Uma discussão necessária Sergio HaddadEducação e desenvolvimento:

Índice

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Eduardo Fagnani

A maior parte dos países desenvolvidos eliminou o analfabetismo no início do século passado. O Brasil ainda acumula desigualdades e ausências. A escolaridade media da população é baixa em relação aos parâmetros internacionais. O analfabetismo de jovens e adultos permanece elevado. Apesar dos avanços recentes, a universalização da oferta ainda apresenta lacunas no ensino infantil, médio e superior. Estar na escola não garante o aprendizado e a questão da qualidade permanece viva. Como enfrentar o desafio da universalização e da qualidade no ensino?

Para debater esse tema reunimos artigos elaborados por reconhecidos especialistas brasileiros. Sergio Haddad (Educação e desenvolvimento – uma discussão necessária) critica a visão reducionista da educação nos debates sobre o desenvolvimento brasileiro conduzido pelos economistas. A tendência natural das análises é a de tratar a educação como suporte do crescimento econômico, um insumo para a formação de mão de obra, destaca Haddad. Ao contrário, o autor defende a necessidade de afirmar tanto o sentido amplo do desenvolvimento, entendido na sua dimensão humana, social e ambiental, resgatando-o das amarrar restritas do crescimento econômico, como o sentido amplo da educação na sua face de insumo para o exercício da cidadania e valorização do potencial sociocultural da população.

ApresentaçãoProfessor do

Instituto de Economia da UNICAMP,

pesquisador do CESIT e coordenador da rede

Plataforma Política Social - Agenda para o

Desenvolvimento

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O ponto de partida do artigo elaborado por Nelson Pretto (O que quer nas ruas a geração alt+tab?) são as manifestações populares de junho de 2013. “Essa geração, de qualquer idade, com uma dezena de telas abertas ao mesmo tempo, usando simultaneamente as teclas alt+tab para navegar entre todas as janelas abertas, está, agora e literalmente, navegando pelas ruas das cidades com a mesma intimidade com que navegam pelas telas”, afirma o autor.

Sustenta que a educação demandada pelos jovens “muda radicalmente a perspectiva de escola”. Requer outra arquitetura escolar que supere a visão indutiva e exclusiva da sala de aula, do professor posicionado na frente com a função de ministrar a lição, o tempo todo. Portanto, “é urgente que superemos definitivamente as atuais concepções de educação que formam para a linearidade e não para a complexidade”, sublinha Pretto.

Boa leitura!

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No contexto atual, o tema do desenvolvimento tem sido tratado como prioridade por economistas, a mídia em geral e pelos gestores públicos. Quando acoplado à temática da educação, a tendência natural das análises é a de tratá-la como suporte do crescimento econômico, um insumo para a formação de mão de obra. No entanto, parte da sociedade entende que é necessário afirmar tanto o sentido amplo do desenvolvimento, entendido na sua dimensão humana, social e ambiental, resgatando-o das amarrar restritas do crescimento econômico, como o sentido amplo da educação na sua face de insumo para o exercício da cidadania e valorização do potencial sociocultural da população.

A educação é sim um fator de formação de mão de obra e uma resposta possível ao direito por trabalho digno de todas as pessoas, mas é também, ao mesmo tempo, um direito humano que propicia, por sua formação geral, condições melhores para a vida e para a participação política e social. Por outro lado, o crescimento econômico é apenas uma das dimensões a ser considerada pelo desenvolvimento. Uma visão restrita da relação entre desenvolvimento e educação pode orientar os processos educacionais apenas à sua dimensão de formação de mão de obra para atender às necessidades o mercado de trabalho e consumo, sem questionar o tipo de desenvolvimento que temos e as

EducaçÃo e desenvolvimento

Uma discussão necessária

Por Sergio Haddad

Diretor Presidente do Fundo Brasil de Direitos Humanos,

assessor da ONG Ação Educativa e membro do Conselho de

Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da

República.

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suas consequências sociais, culturais e ambientais, restringindo a participação cidadã.

Todos nós sabemos que um dos legados da forma como o Brasil veio se desenvolvendo é a sua profunda desigualdade. Apesar das melhorias ocorridas neste século, ainda carregamos o triste resultado de sermos uma das sociedades mais desiguais, o que fez e faz com que os frutos do desenvolvimento sejam apropriados de maneira permanente por aqueles que têm mais bens e privilégios.

A educação não pode ser um fator que reafirme e reproduza esta desigualdade ofertando àqueles que têm menos acesso aos bens e serviços produzidos pela sociedade uma educação de pior qualidade. Ao contrário, há que se ofertar mais e melhor aos que têm menos. Essa é a receita para fazer da educação um efetivo fator de promoção humana e de justiça social. É necessário também continuar a promover políticas afirmativas para corrigir desigualdades, apoiando aos que têm menos condições para acessar direitos por causa da sua condição de classe, gênero, raça, idade, local de moraria, ou qualquer outro fator.

Mas só isso não basta. Um sistema educacional adequado é aquele entendido como sistêmico, sem privilégios de políticas para qualquer um dos seus níveis de ensino e modalidades. Temos que deixar de fazer pesquisas para tentar

mostrar como a educação infantil, ou a educação básica ou o ensino superior, ou ensino profissional impacta mais ou menos o desenvolvimento e procurar investigar a dimensão sistêmica em que todos os níveis de ensino são importantes e complementares.

Como produzir uma melhor escola fundamental se não tivermos uma boa universidade para formar o seu professorado? Como melhorar o desempenho do ensino médio sem melhorar o desempenho do ensino fundamental? E sem melhorar o desempenho da Educação Infantil? Como melhorar a condição de acompanhamento dos pais aos seus filhos sem uma boa oferta de uma educação de adultos em uma sociedade na qual menos de cinquenta por cento da população tem o ensino fundamental de nove anos que é obrigatória? Como separar o ensino profissionalizante da formação geral? Como separar a educação escolar da dimensão não escolar da aprendizagem? A universalidade e indivisibilidade das diversas dimensões formativas é o fundamento da educação como um direito humano.

E essa dimensão sistêmica também está presente nos diversos insumos que compõe a arquitetura educacional de um país, demonstrando que atender apenas um deles, seja salário, formação, infraestrutura, material didático, ou outro qualquer, será insuficiente para dar conta do grande desafio que temos pela frente em ofertar um ensino de qualidade.

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Muito se diz que o problema agora é o da qualidade, já que todas as crianças estariam na escola. Isso é uma falsa verdade, pois, apesar do enorme esforço que foi feito para incluir parcelas da população no sistema público de ensino, muito ainda há por ser feito.

É importante ressaltar que é o ensino público que vem incluindo a população brasileira, já que 90% dos que estão na educação básica estudam na escola pública.

Mas se é verdade que hoje praticamente são atendidas todas as crianças e os jovens de 6 a 14 anos que procuram pelo ensino fundamental, isso não é verdade para a educação infantil, em particular para as creches, e muito menos para o ensino médio.

Além do mais, é enorme o número de pessoas acima de 15 anos que não completaram o ensino fundamental, possíveis demandantes da educação de jovens e adultos, a EJA.

Ao mesmo tempo, vimos constatando um decréscimo no número de matriculas no ensino fundamental nos últimos seis anos, depois de décadas de crescimento. Foi de 7,5%, representando quase 2,4 milhões de estudantes, 656 mil só no ano de 2012. O mesmo pode ser observado na educação de jovens e adultos que vem apresentando queda permanente de matrículas desde 2006. Apesar do crescimento do número de alunos na educação infantil ainda está longe a universalização do atendimento, assim como no ensino médio.

Portanto, o fator quantidade ainda é preocupante e o resultado dos últimos anos quando ao atendimento, deve permanecer como um fator de preocupação para as autoridades educacionais. Quantidade e qualidade não podem ser tratadas de maneira isolada; hoje, no Brasil, ambas devem ter a nossa atenção e sua complementariedade é evidente.

Por fim, e certamente não por último, vale a pena considerar o intenso debate que vem sendo realizado nos últimos anos, em particular na última Conferência Nacional de Educação, sobre a necessidade de se construir um sistema nacional de educação articulado.

“O campo da educação se apresenta como uma arena na qual muitos opinam: empre-sários, jornalistas, economis-tas, sociólogos, matemáticos. Mas a grande verdade é que os atores da base do sistema educacional muito pouco têm falado e muito pouco têm sido ouvidos.”

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Trata-se de ressaltar a importância em superar diferenças na oferta escolar entre os três níveis de governo, que faz com que convivemos com padrões de escolas diferentes por ser municipal, estadual ou federal.

Ao mesmo tempo, há que se implantar um plano de carreira e um piso salarial para o magistério, que sejam respeitados nacionalmente, garantindo segurança profissional e valorizando o trabalho do professorado.

Estamos nos acostumando a conviver com a voz opinativa dos de fora do sistema educacional. Nos últimos anos, os economistas passaram a ter um papel protagônico no campo da educação por meio das suas pesquisas econométricas. Muito pouco das pesquisas de educadores e de profissionais afim tem servido como orientador das políticas públicas, sendo consideradas muitas vezes como irrelevantes ou retóricas, pouco afeitas ao ensinar e aprender.

O campo da educação se apresenta como uma arena na qual muitos opinam: empresários, jornalistas, economistas, sociólogos, matemáticos. Mas a grande verdade é que os atores da base do sistema educacional muito pouco têm falado e muito pouco têm sido ouvidos. Raramente a opinião do professorado pesa nas notícias, nas pesquisas, na voz pública e nas reformas educacionais; ou a voz dos trabalhadores da educação, ou dos pais, muito menos dos estudantes e da comunidade escolar.

Talvez tenhamos que começar por aí, dando voz aos que fazem e sofrem a educação no seu dia a dia, reconhecendo suas dificuldades, seus acertos, suas frustrações e sonhos para construir um sistema educacional que efetivamente ajude a construir um Brasil mais justo e democrático e cujo desenvolvimento seja o resultado das expectativas e necessidades de toda a população.

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Mais de dois milhões de brasileiros manifestaram-se ruidosamente nas ruas durante o último mês de junho. O que querem mesmo esses jovens nas ruas? Esta tem sido a pergunta de muitos, especialmente políticos e mídia, na tentativa de, por um lado, entender e, por outro, desqualificar as recentes manifestações. Fala-se de não objetividade nas reivindicações, no excesso de bandeiras e na falta de lideranças.

Nem sempre é necessário ter clareza ou unificar bandeiras de luta. A falta de “objetividade” (as aspas aqui são fundamentais!) foi sempre motivo de

estranhamento de muitos acadêmicos, da mídia e, por consequência ou não, da população em geral: o que querem essas meninas e meninos?

Lembro que foi assim também quando do início do Fórum Social Mundial (FSM) em 2001, que reuniu cidadãos do mundo inteiro para, já naquele momento, protestar contra tudo e todos. Havia uma sensação generalizada – que, aliás, é a mesma de hoje – de que tudo estava para ser resolvido e uma forma de desqualificar aquelas iniciativas era dizer que faltava foco e objetividade nas discussões e propostas. Estava num dos primeiros

O que quer nas ruas a geração

alt+tab?Por Nelson Pretto

Professor da Faculdade de Educação da UFBA. Secretário Regional da

SBPC/Bahia. Doutor em Comunicação (USP/1994).

www.pretto.info e [email protected]

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Fóruns em um auditório superlotado atento ao belo depoimento do escritor Eduardo Galeano (“As Veias Abertas da América Latina”), que iniciava a sua fala com uma frase por ele encontrada em uma pichação de um muro na Bolívia: “quando achamos todas as respostas, mudaram a pergunta”.

É o que de novo ocorre no país e no mundo. Os métodos, as práticas, a política, a economia, tudo está a merecer outro olhar. Mesmo que já tenhamos todas as respostas, elas não estão dando conta dos desafios, pois a pergunta mudou!

Impressionantes imagens publicadas – e traduzidas - pelo New York Times (bit.ly/protestosnyt) mostram-nos aquilo que vimos nas ruas: a diversidade de reivindicações (“gosto de mulher, e daí?”, “abaixo a FIFA”, “não é pelos 0,20”, “passe livre, “mais saúde”, “mais educação”, entre tantas outras).

Diferentes bandeiras, diferentes visões de mundo e tudo isso é muito bom que esteja nas redes e nas ruas!

Cobrar objetividade é matar o movimento. Objetividade é algo que foi construído ao longo da história da humanidade e não um conceito absoluto e concreto desde sempre. Nestes momentos gosto muito de rever o belo texto de Robin Horton, Diferenças entre culturas tradicionais e culturas de orientação científica, que mostra-nos o quanto a objetividade é um ideal construído pela sociedade (HORTON, 1979, p. 200).

Além do que, e talvez mais importante do que tudo isso, a diversidade de bandeiras, literalmente e não só metaforicamente, corresponde à rica diversidade da população e da política brasileira. Um governo que se preze tem que considerar que estas diferenças são mais do que importantes. Elas são a base fundamental de existência da sociedade e é para isso que se tem que buscar formas de governar.Essa geração, de qualquer idade, com

uma dezena de telas abertas ao mesmo tempo, usando simultaneamente as teclas alt+tab para navegar entre todas as janelas abertas, está, agora e literalmente,

"Essa geração, de qualquer idade, com uma dezena de telas abertas ao mesmo tempo, usando simultaneamente as teclas alt+tab para navegar entre todas as janelas abertas, está, agora e literalmente, navegando pelas ruas das cidades com a mesma intimidade com que navegam pelas telas."

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navegando pelas ruas das cidades com a mesma intimidade com que navegam pelas telas.

“Saímos do Facebook”, dizia um cartaz. Estamos na rua, complemento. E estamos na rua sem deixar de estar nos twitters, identi.cas, instagrams, vinetubs, facebooks, orkuts e tudo mais. Por isso a importância de lutarmos por uma infraestrutura e políticas públicas que garantam uma rede com neutralidade, de qualidade e acessível a todos.

Estas, entre outras, são bandeiras associadas à governança da internet que não podem ser deixadas de lado, sob

pena de termos uma internet totalmente controlada, afastando-se anos-luz da ideia de rede nascida nos laboratórios americanos e europeus no segundo quartel do século XX, que tinha como princípio e possibilitava a criação plena.

Não sejamos simplistas. O momento atual é complexo, como também o é a vida.

E complexo não é sinônimo de complicado. A complexidade exige um olhar, ou melhor, múltiplos olhares, com rigorosa atenção.

Educação, claro, está entre as bandeiras. Mas que educação?!

Foto: Reprodução Internet

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Mais recursos são necessários, mas não apenas para fazer mais do mesmo. Estamos assolados com politicas públicas para a educação que burocratizam demais os processos de ensino e aprendizagem, em todos os níveis, que vivem do ranquear índices de alunos, professores e escolas, como bem apontaram Daine Ravitch (Vida e Morte do grande sistema escolar americano, 2011) e Valdemar Sguissardi e João dos Reis Silva Júnior (Trabalho Intensificado nas Federais: pós graduação e produtivismo acadêmico, 2009).

Políticas que não valorizam as construções coletivas e interativas dos saberes, que, em última instância, ignoram as pluralidades. Enfim, políticas públicas que impedem de muitos modos as criatividades que brotam das/nas ruas.Insistimos neste aspecto porque observamos que estas transformações têm trazido um enorme desconforto para diversas áreas e, especialmente, para a educação, pelo simples fato de que, ao longo dos últimos anos, muito se tem feito em termos da universalização do acesso e com um alto investimento em utilização de tecnologias digitais de informação e comunicação. No entanto, a situação da educação em todo o mundo deixa a desejar.

De um lado, os dados apontam para um verdadeiro fracasso quase que generalizado do sistema escolar mundial. Observe-se aqui que a utilização destes dados precisa ser relativizada uma vez que os mesmos estão impregnados da

concepção de educação e de sociedade na qual os parâmetros de avaliação foram construídos e, portanto, estão coerentes com estas concepções e, neste sentido, jamais poderão identificar as mudanças que estão acontecendo no cotidiano de muitas escolas. E isso tem a ver com o tema da objetividade da ciência já mencionado anteriormente. Mesmo assim, ou seja, mesmo considerando que essa avaliação que está sendo feita com as bases teóricas do próprio sistema que está em crise, os resultados deixam a desejar.

Como já referimos, Diane Ravitch, antiga secretária-assistente de educação nos governos de George H. W. Bush (1991 a 1993) e posteriormente de Bill Clinton, é categórica ao identificar que os Estados Unidos haviam saído da rota de melhorar a educação por conta destas políticas burocráticas e produtivistas. Para ela, “o que fora um movimento pela referência agora estava sendo substituído pelo movimento de responsabilização. O que fora um esforço para melhorar a qualidade da educação se transformou em uma estratégia de contabilidade: mensure, depois puna ou recompense.” (p. 32).

Ao fechar suas reflexões sobre o grande sistema escolar americano, ela é enfática: “as nossas escolas não irão melhorar se nós continuamente reorganizarmos a sua estrutura e administração sem uma consideração pelo seu propósito essencial. Nossos problemas educacionais são função de nossa falta de visão educativa,

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não um problema administrativo que requer o alistamento de um exército de consultores empresariais” (p.251, grifo meu). E complemento: nada disso será possível sem um professor fortalecido.

No caso brasileiro, o que nossa experiência tem mostrado é que a escola está mudando e os professores não necessariamente são resistentes às mudanças. Pelo contrário, em uma boa parte deles encontramos profissionais animados e comprometidos com as radicais transformações do sistema e, mais do que tudo, isto precisa ser fortalecido.Necessário se faz compreender o momento contemporâneo com um olhar multifacetado, demandando políticas públicas de educação que se articulem fortemente com as políticas públicas de diversas outras áreas do conhecimento.

O que temos hoje são politicas esquizofrênicas que não compreendem a necessidade de pensar a educação para além da própria educação, articulando-a com outras áreas do conhecimento para, com isso, tentar superar o que denomino de escola broadcasting1, implantando um ecossistema pedagógico de aprendizagem e produção de culturas e conhecimentos.

O que se busca com isso é pensar as tecnologias, todas elas, o lápis, a caneta, o livro impresso, o mimeógrafo, o computador, o tablet, a câmera digital, a internet, as redes sociais, tudo isso conectado entre si e em rede, fazendo com que a escola se preocupe menos com o consumir informação e conteúdo

e passe a se preocupar mais intensamente com a produção de conteúdo, de culturas e de conhecimentos, implantando-se um circulo virtuoso de produção cultural e científica.

Aqui importante destacar que a construção deste ambiente de produção não descarta o conhecimento estabelecido, não descarta a língua culta, a ciência moderna, a ciência com C maiúsculo e no singular, porque o ambiente escolar passa a se constituir no espaço das convivências e do diálogo entre as culturas, suportes, conhecimentos e saberes da sociedade. Anísio Teixeira em um memorável texto dos anos 60 intitulado Mestre de amanhã, discutiu o papel dos professores que são “compelidos a mudar pelas condições dos tempos presentes” (TEIXEIRA, 1963). E se pregunta “E por quê?”, respondendo: “Porque estamos entrando em uma fase nova da civilização chamada industrial, com a explosão contemporânea dos conhecimentos, com o desenvolvimento da tecnologia e com a extrema complexidade consequente da sociedade moderna”. (p. 143)

E Anísio não havia visto nada!

Mesmo assim, com uma visão premonitória de um futuro que estaria se avizinhando, passa a ver a escola de amanhã como aquela que “lembrará muito mais um laboratório, uma oficina, uma estação de televisão do que a escola de ontem e ainda hoje.” (p. 147).

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Atualizar Anísio é premente.

Pensar a escola de hoje, que será a preparadora dos jovens de hoje e do amanhã, implica em rearrumá-la arquitetonicamente2, aproximando-se mais de experiências como a dos laboratórios hackers, fablabs ou Pontos de Cultura, com a implantação de espaços multimidiáticos de produção de vídeo, televisão e rádio, de espaços para a produção textual nas diversas linguagens e com os diversos suportes, levando os professores à interagirem com os seus alunos e com os conhecimentos estabelecidos, coordenando esses processos produtivos e não processos consumidores de informações.

Isso muda radicalmente a perspectiva de escola e demanda também, como já mencionamos, outra arquitetura escolar que supere a visão indutiva e exclusiva da sala de aula, do professor posicionado na frente com a função de ministrar a lição, o tempo todo.

Desta forma, o conjunto de aparatos tecnológicos disponíveis contemporaneamente, possibilita ao professor uma liberação da sua responsabilidade enquanto fornecedor de informações – antes escassas, hoje abundantes – e lhes reserva o direito e a tarefa de ser um negociador permanente dos diálogos entre os conhecimentos estabelecidos, entre os saberes e as diferentes culturas trazidas para

dentro do espaço escolar pelos seus alunos. Transforma-se esse professor em um negociador permanente das diferenças.

Portanto, é urgente que superemos definitivamente as atuais concepções de educação que formam para a linearidade e não para a complexidade.

E isso não é pouco.

"O que temos hoje são políticas esquizofrênicas que não compreendem a necessidade de pensar a educação para além da própria educação"

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Notas deRodapé

1. Uso propositalmente uma expressão que vem do meio de comunicação de massa para denominar a escola distribuidora de informação

2. Penso ser fundamental avançar em linhas de pesquisa que aprofundem criticamente esta relação entre a arquitetura e educação. Constroem-se cada vez mais prédios escolares sem uma maior reflexão sobre o que deve ser a escola conectada em rede, o que é a educação de hoje e de amanhã. Chegamos a pensar na implan-tação de um projeto nesta linha que, no entanto, gerou apenas duas produções, uma tese de doutorado (FREIRE, 2006) e uma dissertação de mestrado (MAGRIS, 2004). As primeiras notas do projeto estão em http://twiki.ufba.br/twiki/bin/view/GEC/ArquiEduca, acesso em 10 de julho de 2013.

Bibliografia

FREIRE, Márcia Rebouças. Arquitetura na Interface com a Educação: outras referências. 2006. Tese (Douto-rado em Arquitetura e Urbanismo).

HORTON, Robin. Diferenças entre culturas tradicionais e culturas de orientação científica, que mostra-nos, de forma, direta, o quanto a objetividade é um ideal (HOR-TON, 1979, p. 200).

MAGRIS, Patrícia. Escola-Cidade, Cidade-Escola: espaços de aprendizagem do tempo agora. 2004. 162 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal da Bahia.

SGUISSARDI, Valdemar e SILVA Júnior, João dos Reis. Trabalho Intensificado nas Federais: Pós Graduação e Produtivismo Acadêmico, Xama, 2009.

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