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Educação e cultura midiática – v. II

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Educação e Cultura Midiática

Volume II

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Universidade do Estado da Bahia - UNEB

Lourisvaldo Valentim da SilvaReitor

Maria Nadja Nunes BittencourtDiretora da Editora

Conselho Editorial

Delcele Mascarenhas QueirozJosé Cláudio Rocha

Josemar Rodrigues de SouzaMárcia Rios da SilvaMaria Edesina Aguiar

Mônica Moreira de Oliveira TorresWilson Roberto de Mattos

Yara Dulce Bandeira Ataíde

Suplentes

Kiyoko Abe SandesLiana Gonçalves Pontes Sodré

Lynn Rosalina Gama AlvesRonalda Barreto Silva

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Lucila Pesce

Maria Olívia de Matos Oliveira

(Organizadoras)

Educação e Cultura Midiática

Volume II

EDUNEBSalvador

2012

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© 2010 EDUNEBProibida a reprodução total ou parcial por qualquer meio de impressão, em forma idêntica,

resumida ou modificada, em Língua Portuguesa ou qualquer outro idioma.Depósito Legal na Biblioteca Nacional

Impresso no Brasil em 2012.

Ficha Técnica

Coordenação EditorialRicardo Baroud

Coordenação de Design e CapaSidney Silva

Projeto Gráfico, Editoração, Normalização e RevisãoGrajaú Gráfica e Encadernadora

Ficha Catalográfica - Sistema de Bibliotecas da UNEB

Editora da Universidade do Estado da Bahia - EDUNEBRua Silveira Martins, 2555 - Cabula

41150-000 - Salvador - BahiaFone: + 55 71 3117-5342

[email protected]

Educação e cultura midiática / Organizado por Lucila Pesce; Maria Olivia de Matos Oliveira. – Salvador: EDUNEB, 2012. 202 p. v. 2.

ISBN: 978-85-7887-121-5.

Inclui referências. 1. Educação - Inovações tecnológicas. 2. Inovações educacionais. 3. Tecnologia educacional. I. Pesce, Lucila. II. Oliveira, Olívia de Matos.

CDD: 371.334

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Educação e Cultura Midiática

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Sumário

Apresentação 9

PARTE I: CULTURA MIDIÁTICA

Educação, Música e Mídia 15

Jusamara Souza e Antonio Dias

Interfaces entre Comunicação e Educação, através da Produção de Mídias Alternativas: possibilidades emancipatórias 37

Sandra Maria Loureiro de Souza Farias e Maria Olivia de Matos Oliveira

Espaços Vividos e Jogos Digitais: ambientes propícios para produção de novas formas de letramentos e de conteúdos interativos pela geração C 65

Lynn Alves e Tânia Maria Hetkowski

PARTE II: FORMAÇÃO ONLINE

Projeto Amadeus: criando novas experiências de aprendizagem em uma educação sem distância 91

Ricardo Amorim, Dinani Amorim e Alex Sandro Gomes

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A Edificação dos Saberes para o Exercício da Tutoria a Distância: o caso dos professores-tutores do curso de pedagogia a distância da UERJ 121

Edméa Santos

Nova Didática Mediada pelas Tecnologias Digitais 143

Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo

Aulas Multimídias: um caminho possível para a autonomia intelectual dos educandos na rede municipal de ensino de Salvador? 169

Iza da Conceição Lopes e Célia Maria Silva de Souza

Sobre os Autores 197

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Apresentação

Caro leitor, o segundo volume da coletânea que ora apresentamos reúne pesquisadores de distintas universidades brasileiras e trata de dois temas instigantes da sociedade contemporânea: cultura midiática e processos de formação desenvolvidos nos ambientes digitais.

Os artigos que compõem a primeira parte deste livro – Cultura Midiática – revelam, na polissemia das vozes dos autores, uma unicidade nas reflexões sobre como a mídia se torna presente em todos os aspectos da vida cotidiana e como o discurso midiático participa do processo histórico de construção da identidade dos sujeitos, nas interações sociais, afirmando ou negando a nossa condição de cidadãos.

Essas experiências corroboram com o entendimento de que se faz necessário explorar, da melhor forma possível, os ambientes virtuais e “o potencial educacional das mídias, considerando-se os seus aspectos positivos em cada modalidade de ensino e o uso de metodologias e tecnologias necessárias para tal”, no dizer de Ricardo Amorim, Dinani Amorim e Alex Sandro Gomes.

Jusamara Souza e Antonio Dias Nascimento colocam que o desafio para a educação é permitir a convivência com o mundo digital; porém é papel da escola ajudar crianças e jovens na aquisição de um censo crítico que lhes permita fazer as escolhas certas, no que tange aos meios e conteúdos midiáticos.

Uma nova geração surge, os nativos digitais que navegam na web, nos jogos eletrônicos, smart fones, GPS, PDA, celulares, buscam criar em diferentes telas, com a ajuda de técnicas computacionais e telemáticas, situações que se aproximem do real, das situações vividas nos lares ou

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nos espaços cotidianos, como apontam Lynn Alves e Tânia Hetwovisk, no relato de uma pesquisa junto a um grupo de professores que utiliza o jogo Búzios: ecos da liberdade. Sandra Loureiro de Souza e Maria Olivia de Matos Oliveira apresentam uma introdução à temática das mídias alternativas e suas relações com a educação, a partir da possibilidade de emancipação e de ação do sujeito, através da compreensão das relações entre cultura e os processos de comunicação na sociedade contemporânea.

O conjunto das reflexões inerentes aos capítulos que compõem a primeira parte do livro busca, portanto, discutir a importância de se conhecer o poder da mídia no cotidiano das pessoas, para a partilha conjunta de significados e compreensão crítica da contemporaneidade.

Na segunda parte do livro – Formação online – os textos voltam-se para os distintos aspectos inerentes à formação veiculada nos dispositivos e interfaces digitais. As reflexões sobre as novas linguagens audiovisuais demandam dos docentes uma nova visão paradigmática capaz de ressignificar as atuais práticas educacionais, em sintonia com as emergências dos sujeitos que participam das atuais organizações societárias.

Para apresentar a segunda parte do livro julgamos pertinente iniciar com as reflexões dos autores Ricardo Amorim (UNEB); Dinani Amorim (UNEB) e Alex Sandro Gomes (UFPE) que apresentam novas possibilidades de potencializar aprendizagens em ambientes virtuais e buscam, através do desenvolvimento do texto, saídas alternativas para a superação do impasse de uma educação a distância para uma educação sem distância.

Também são abordadas questões relacionadas à docência, no contexto da cultura midiática. Edméa Santos apresenta dados de uma pesquisa sobre como são edificados os saberes para o exercício da tutoria a distância. A análise aborda as especificidades da docência online e os desafios da cibercultura, relacionando-os com os saberes de professores-tutores que atuam nos cursos de formação de professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

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Célia Maria Silva Souza e Iza da Conceição Lopes, tendo como corpus de análise o Programa de Aulas Multimídias da Rede Pública Municipal de Salvador, consideram o desenvolvimento da autonomia intelectual, a partir de intervenções pedagógicas que possibilitem espaços de expressão, participação e criatividade.

Questões relativas à educação veiculada nos dispositivos e interfaces digitais, como a fragilidade das interações entre a equipe conceptora e os tutores, o pouco investimento institucional no processo de formação continuada de professores para o exercício da mediação a distância são discutidos ao longo das nossas páginas, sobretudo nas linhas assinadas por Edméa Santos. Para compreender as concepções de aula e sala de aula na contemporaneidade é preciso, antes de tudo, entender aspectos relacionados à sala de aula presencial, bem como entender algumas atitudes docentes e da escola, que revelam resistência em reconhecer a inevitável inserção dos estudantes na cultura digital.

Nessa perspectiva trazemos à baila as ideias de Iolanda Cortelazzo. Ao apresentar reflexões sobre uma nova cultura em que professores e alunos realizam interações colaborativas mediadas pelas tecnologias digitais, a autora, com propriedade, afirma: “Os hábitos de professores e alunos não mudaram substancialmente nesses dezoito anos, embora os suportes tecnológicos sejam significativamente diferentes”.

Nessa miríade de reflexões finalizamos a apresentação do segundo volume da coletânea por nós organizada. Ao fazê-lo, apontamos mais dúvidas que certezas, mais interrogativas que afirmativas, porque as questões pendentes poderão ser esclarecidas ou aprofundadas, na interlocução de você, leitor, junto a cada um dos autores da presente obra.

Lucila PesceMaria Olívia Matos Oliveira

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Parte I

CULTURA MIDIÁTICA

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Educação, Música e Mídia

Jusamara Souza(UFRGS)

Antonio Dias Nascimento(UNEB)

Introdução

O uso abusivo dos meios eletrônicos de comunicação por regimes políticos discricionários que antecederam a Segunda Guerra Mundial e que a ela sobreviveu fez com que pensadores humanistas os vissem sempre com desconfiança quanto à sua função formadora. Adorno (1975) chegou a cunhar a expressão Indústria Cultural para expressar a grande distância que separava a cultura veiculada pela mídia, da cultura elaborada pelo povo. Do mesmo modo, Morin (1969) chegou a afirmar que o capitalismo, com o desenvolvimento da indústria cultural havia ultrapassado a última barreira a ser transposta – a alma humana.

Com a redemocratização dos países centrais e com a emergência de novas democracias, no entanto, tornou-se possível o surgimento de muitas outras expressões midiáticas de tal modo a permitir aos indivíduos oportunidades de escolhas. Apesar de persistirem os usos mercantilistas e até mesmo a manipulação político-ideológica dos meios de comunicação, esses usos são obrigados a conviver também com usos voltados para a formação humana e até mesmo para a aproximação de povos. Assim, os meios de comunicação são vistos hoje como campos de disputa que

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permitem, ao menos, a “reflexividade social” como denominou Giddens (1994) querendo expressar a possibilidade de ampliação do grau de informação dos sujeitos, resultante da atuação e do uso massivo dos meios eletrônicos de comunicação.

Estudando o aprendizado da música pelos jovens através da sua relação com as mídias eletrônicas Kübler (2003 apud SCHIMELING, 2005, p. 21) assim se expressa:

Hoje, crianças e jovens crescem convivendo com as mídias e estas representam um dos componentes importantes em suas vidas, na busca por identidade e por socialização. O conceito [de mídia] pretende abranger tanto as estruturas e mercados das mídias, como também o confronto subjetivo das crianças e jovens e sua assimilação. Com isso, o conceito implica componentes tanto objetivos como subjetivos. Conforme o autor, há uma profusão das mídia e dos seus produtos e diferenciam-se as maneiras de lidar com eles entre crianças e jovens, denotando assim uma multiplicidade, complexidade, falta de delimitação clara de previsibilidade nas interações destes grupos com as mídias.

Diante disso, o que se coloca como grande desafio para a educação, tanto na família, como na escola, é o de como dotar tanto crianças, como jovens, de censo crítico na escolha dos meios e dos conteúdos com os quais se põem em interação. A ideia, portanto, é a de usufruto e convivência com o mundo virtual e não a de negá-lo ou a de evitá-lo. Se concordarmos com a visão de um mundo alcançado, observado, vigiado e controlado através do panóptico, como nos indicou Foucault (1987), com o acesso ao mundo virtual, tornamo-nos também observadores ativos e vigias do nosso tempo e do que ocorre ao redor do mundo numa velocidade espantosa e com

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uma capacidade operativa nunca dantes experimentada, como pode ser observado, por exemplo, na educação musical.

Nos últimos anos vimos discutindo no Brasil sobre os princípios epistemológicos que fundamentam as teorias e práticas de educação musical que vêm se configurando de forma ampla, não se restringindo mais aos processos de ensino-aprendizagem realizados na escola. Crianças e jovens hoje talvez “aprendam” música mais em seus ambientes extraescolares do que na escola propriamente dita. E mesmo a profissionalização ou a formação de professores de música ou profissionais que lidam com o ensino de música tem se realizado em espaços antes nunca pensados.

Cada vez mais, pesquisadores buscam compreender os processos de aprendizagem (transmissão-apropriação) que se estabelecem em formas e práticas diárias de indivíduos envolvidos em realizações musicais fora da escola, em contextos extraescolares e suas possíveis articulações com a escola (ver, entre outros, PRASS, 1998, 2004; ARROYO, 1999; CORRÊA, 2000; RAMOS, 2002; FIALHO, 2003; ARALDI, 2004; SUBTIL, 2007).

Em decorrência do processo de globalização da cultura e da informação, modificam-se cada vez mais as linguagens e meios técnicos de distribuição musical. Essas mudanças levam-nos a refletir sobre os desafios trazidos para o ensino da música na atualidade e da educação de modo geral. A música na vida cotidiana faz-se cada vez mais presente e sua massiva utilização por crianças e jovens indica o seu significado para a educação musical (SOUZA, 2000).

Por isso nos interessam muito particularmente temas como novas práticas musicais e tecnologias de comunicação, o consumo, a recepção de música e a formação de identidades através dos meios de comunicação, músicas da mídia no cotidiano de crianças e jovens; culturas musicais das ruas (como hip hop), bem como a atuação e formação de professores

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de música diante das novas questões trazidas pelas transformações da sensibilidade musical na contemporaneidade (CARVALHO, 1999).

Esses temas são apresentados, num primeiro plano, de uma forma descritiva pelos dados empíricos disponíveis e, num segundo plano, de marco interpretativo, são desvendados contextos e estruturas condicionais para o ensino e aprendizagem de música. Num terceiro plano, mais abstrato, serão formuladas teorias sobre funções e significados das mídias para crianças e jovens como, por exemplo, a crescente autosocialização através das mídias (KÜBLER, 2003, p. 6).

Vale ressaltar, como Toschi (2002, p. 267) alerta, que “[...] mídia não se confunde com recurso, com equipamento, por mais sofisticado e atual que seja, mas refere-se a meio tecnológico portador de conteúdos e, portanto, de sistemas simbólicos”. Como a autora explica: “Por se caracterizar como tecnologia e conteúdos, as mídias adquirem valor formativo, educativo. As mídias são criaturas culturais e criam cultura. Mídias são tecnologias, mas são também meio de divulgação de conteúdos, são, enfim, tecnologias midiáticas” (TOSCHI, 2002, p. 267-268).

Integrando as atividades cotidianas dos indivíduos, os meios de comunicação não apenas promovem interações interpessoais, mas viabilizam novos conhecimentos, disponibilizando na sociedade um conjunto de materiais simbólicos. A linguagem midiática fornece símbolos, mitos e recursos que contribuem na formação de uma cultura representativa de um grande número de indivíduos. Para Kellner (2001, p. 10) trata-se de uma “pedagogia cultural”, isto é, uma fonte de informação e entretenimento que muitas vezes nem é percebida como tal, contribuindo para “[...] nos ensinar como nos comportar e o que pensar e sentir, em que acreditar, o que temer e desejar – e o que não”.

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Na análise de Thompson (1998, p. 45-46) durante a recepção e apropriação dos conteúdos da mídia, os indivíduos encontram-se “[...] envolvidos num processo de formação pessoal e de autocompreensão – embora em formas nem sempre explícitas e reconhecidas como tais”. Ao incorporar as mensagens da mídia à própria vida, “[...] o indivíduo está implicitamente construindo uma compreensão de si mesmo, uma consciência daquilo que ele é e de onde ele está situado no tempo e no espaço” (THOMPSON, 1998, p. 45-46).

Este capítulo pretende discutir algumas questões vinculadas às práticas pedagógico-musicais presentes na cultura jovem. Interessa-nos discutir práticas musicais de jovens realizadas pelos meios de comunicação tais como tocar um instrumento, apreciar ou ouvir música. Muito particularmente focamos em compreender a aprendizagem musical que aí se efetiva.

Tomando o conceito de aprendizagem a partir das teorias do cotidiano nos interessamos pelos sujeitos imersos e envolvidos numa teia de relações presentes na realidade histórica que é prenhe de significações culturais. Logo, a aprendizagem não se dá num vácuo, mas num contexto complexo. Ela é constituída de experiências que nós realizamos no mundo. Dessa maneira, a aprendizagem pode ser vista como um processo no qual – consciente ou inconscientemente – criamos sentidos e fazemos o mundo possível.

Mídias e aprendizagem musical

As mídias estão cada vez mais presentes na vida das crianças e adolescentes que desde cedo dispõem de i-pods, CD-player, TV, DVDs e também computadores. Na literatura o termo “mundo das mídias”

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(Medienwelten), já é consagrado. É um conceito necessário para dizer que hoje crianças e jovens crescem convivendo naturalmente com as mídias, que estas representam componentes importantes de suas vidas, de sua procura de identidade e de sua socialização.

A inserção da música na vida de jovens, foge à relação abstrata que normalmente as escolas propiciam. Por isso mais do que “se limitar a um estudo da prática ou do consumo musical unicamente por seu conteúdo ou gênero de música apreciada ou escutada” a educação musical tem que se ocupar com o tipo de relação que os jovens mantêm com a música (GREEN, 1987, p. 95).

Os jovens vivem experiências musicais diversificadas: tocam em bandas de rock, fazem parte de grupos de pagode, funk, hip hop (DAYRELL, 2002) participam de escolas de samba, cantam em corais de igrejas, tocam em bandas ou fanfarras. As preferências musicais dos adolescentes estão ligadas a gêneros musicais que para eles possuem um significado relacionado à liberdade de expressão e de mudança. Ou seja, a relação que mantêm com a música representa uma manifestação de uma identidade cultural caracterizada por dupla pertença: classe de idade e do meio social (GREEN, 1987, p. 100).

Referindo-se aos gêneros musicais que são difundidos pela mídia, Green (1987, p. 100) acredita que estes “[...] fazem parte de um processo de socialização, através dos quais os adolescentes criam suas relações sociais”. Segundo a autora, esses gêneros musicais “revestem-se aos olhos dos adolescentes de uma importância superior àquelas que se ligam às relações ‘obrigatórias de família’. É por isso que o adolescente, que é quase sempre um aluno, sente uma impressão muito forte de liberdade com esses gêneros musicais” (GREEN, 1987, p. 100).

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Pais (1993, p. 104) define a música como um signo juvenil geracional, pelo fato de os jovens atualmente se envolverem “[...] muito mais com a música do que as gerações mais velhas”. Em relação às preferências musicais dos jovens, o autor revela que estas “são acompanhadas de atitudes específicas que reforçam, – mas também ultrapassam – os gostos musicais”, apontando a questão das “escolhas emblemáticas”, tais como vestuário, cortes de cabelo, discotecas que tocam determinados tipos de música e que representam “[...] elementos de identificação dos grupos, dando suporte a uma certa ‘moral de convivência’ por conivência de gostos” (PAIS, 1993, p. 104).

Apoiados nesses autores, pretendemos discutir como as novas mídias e a sua naturalização no dia a dia têm provocado outras maneiras de aprender música, ilustrando-a através de recortes dos dados empíricos recolhidos por pesquisas recentes1. O conceito de aprender nestas investigações incluiu não somente aprendizagem de conteúdos, geralmente atribuída à escola, mas também suas competências emocionais e sociais, uma vez que a experiência com os meios de comunicação considera os processos de impregnação cotidiana e a imitação, realizados no plano individual e no coletivo, normalmente no encontro com outras crianças em casa ou na escola. Privilegiando as abordagens qualitativas os estudos buscam compreender como as pessoas, sobretudo jovens e crianças, dão sentido às músicas que ouvem e vêem no dia a dia e que de, certa forma, lhes oferecem um sentido para si próprias.

É incontestável que a onipresença da música através das mídias influencia a vida musical dos jovens. No entanto, como essa influência se manifesta, é uma discussão controvertida. A visão geral sobre diversas mídias em sua gênese histórica, suas características mais importantes e sobre

1 Aqui fazemos referências a trechos de entrevistas realizadas por Ramos (2002) e Schmeling (2005).

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as formas de assimilação pelos jovens abre um espaço de possibilidades que quase não admite enunciados generalizados sobre as mídia. Ou seja, cada mídia teria sua especificidade e desenvolvimento ao longo da história.

As mídias integram de maneira “natural” o contexto das crianças e dos jovens, observando que em seus quartos, “[...] não é possível perceber a realidade do mundo a não ser através de mídia [...] enriquecem o mundo dos sentidos. Tais como olhos e ouvidos, prestam seu serviço sem serem percebidos” (SCHLÄBITZ, 1996, p. 283).

A investigação realizada por Baacke et al. (1998), reflete sobre a popularidade e a multifuncionalidade da audição musical na vida dos jovens de hoje. Das 14 funções listadas pelos autores destacam-se:

Sinais de reconhecimento para determinadas culturas juvenis que se destacam de outros através de determinadas preferências musicais; fonte de informações sobre novos estilos de vida, modas, formas de conduta, etc; delimitação diante de adultos que não aceitam a música Pop; estímulos para sonhos e anseios próprios; criação de identidades através da descoberta de movimento e corporeidade na dança; solicitação desafio para a ação, o ser-ativo, o protesto; possibilidade de isolamento do cotidiano, o que se torna possível pela colocação de fones de ouvido; possibilidade de identificação com figuras-padrão como astros de rock; expressão de protesto e oposição contra a cultura do cotidiano; recurso para alegrar-se, melhoria do ânimo, e controle da disposição (VOLLBRECHT et al., 1997, p. 37).

A maioria dos jovens necessita da música não apenas como fundo musical, e sim, pode-se dizer, como elemento do cotidiano vivido, do qual ele não pode ser separado.

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Ana: Quando eu estou de castigo, eu fico dentro de casa vendo televisão e escutando o rádio. Ainda mais quando o meu pai está trabalhando como agora, minha mãe também, as minhas irmãs ficam na rua, só fica eu e minha irmã. Tem vez que eu desligo a televisão e vou direto pro rádio... a gente arruma a casa, pega as vassouras e fica dançando. (RAMOS, 2002, p. 121).

Temas escolares e também as diversões tornam-se difíceis, quase impossíveis, sem fundo musical. O argumento pedagógico da “distração” nas tarefas escolares pela música parece ter-se transformado no oposto: somente através do som acompanhante é favorecida a disposição e capacidade de concentração.

Hoje eu até fui na coordenação e daí falei pra coordenadora: ´com todo respeito, eu vou te desrespeitar agora, e vou te informar que, apesar de ser proibido o uso no colégio de walkman, eu vou continuar ouvindo´. Falei pra ela: ´vou informar que eu vou continuar ouvindo.´Porque desde que eu sou pequeno eles dizem que é proibido, senão, a gurizada já ouve no meio da explicação, vira algazarra, quer pedir emprestado, que não sei o quê, me empresta fita, me empresta CD, não sei quê, meu fone tá estragado, claro que acontece isso, mas quando chega a hora de fazer um exercício [...] Bah, aquela barulheira em volta, [tu] bota teu fone, te fecha no teu mundo e faz teu trabalho. (SCHMELING, 2005, p. 68).

Nesta situação, observa-se transformações na estrutura da percepção, já investigadas por alguns autores como a capacidade dos jovens de se concentrarem em “vários canais” ao mesmo tempo. Principalmente adolescentes utilizam o CD como um pano de fundo de determinadas

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necessidades e interesses. Não o ouvem inteira, pelo contrário, predomina uma percepção motivada por experiências próprias, quer dizer: certas cenas e passagens são ouvidas de novo, enquanto outras nem são percebidas porque não lhes são de importância. A partir do que ouvem do conteúdo dos CDs pode-se tirar conclusões de seu estado de ânimo.

Também as crianças frequentemente escutam rádio ao lado de outras atividades. As crianças aproveitam o rádio como meio de retração, ou em companhia de outras, quando assume a função de acompanhamento de outras atividades. Ver televisão e ouvir rádio simultaneamente lhes parece uma tarefa muito simples. Coloca a criança em situações de selecionar, escutar, cantar e dançar.

Entrevistadora: Tu disseste que quando estás limpando a casa, tu ligas a televisão e o rádio, pra ficar escutando e ficar vendo, né? Elisa: É.Entrevistadora: E por que tu ligas os dois juntos?Elisa: Porque quando tá dando música boa no rádio, eu abaixo a televisão, e escuto o rádio e danço. E quando tá dando coisa boa, música boa assim na televisão, eu abaixo o rádio e levanto a televisão [...] (RAMOS, 2002, p. 122).

As mídias auditivas estão firmemente ancoradas no dia-a-dia das crianças (RAMOS 2002; SCHMITT 2004). Em seu uso reflete-se principalmente a variedade de funções da música, à qual as crianças recorrem. Ela corresponde à necessidade de relaxamento, autodeterminação, movimento corporal e animação.

Entrevistadora: Olha aqui, vocês ligam a televisão [...]Joel: Ligamos.

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Entrevistadora: E ficam trocando de canal pra ver onde está dando música, se está dando música vocês param. Me conta como é que é essa história?Joel: A gente não sabe onde tem música. Aí a gente bota no canal que tem música, daí a gente sabe a música já canta, se abala, se levanta do sofá, da cama, de qualquer coisa, começa a cantar, dançar, daí a gente se abala demais. Vai trocando até achar a música. (RAMOS, 2002, p. 108).

Os aparelhos de som, em especial, possibilitam uma disponibilidade a qualquer hora e uma utilização diferenciada, de acordo com o estado de ânimo. Os aparelhos estão embutidos no dia a dia e ritualizados a ponto de estar equiparado a outras possibilidades de lazer, não-midiais.

Ana: Até na rua de vez em quando as minhas amigas ficam dançando. Ontem mesmo era o dia das mães, e elas estavam dançando aqui, fazendo umas apresentações. Na minha rua todo mundo dança e canta. Até essa casa da esquina, na maioria das vezes, eles estão com o rádio ligado. Hoje é um milagre eles não estarem com o rádio ligado. E ali na casa da minha vizinha, também é um milagre não estarem com o rádio ligado de manhã. Ela liga bem de manhã cedo quando acorda, só que ela espera a gente acordar, e depois ela liga pra não incomodar. Ela liga às 8 horas. (RAMOS, 2002, p. 74).

Para além das mídias

Os padrões de preferência dependem das próprias crianças e dos jovens, de acordo com as concretas situações e perspectivas de vida e de experiências individuais.

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Entrevistadora: Gostas dessa música do Milton Nascimento?Duca: Não. Eu acho que é de criança essa música.Entrevistadora: E o que é uma música de criança?Duca: Música de criança é que [...] não sei como te dizer [...] eu gosto de música que tem realidade mesmo.Entrevistadora: O que é música que tem realidade?Duca: Realidade pra mim é negócio de drogas, de popozuda. (RAMOS, 2002, p. 84).

A recepção dos produtos da mídia não se dá de forma passiva, mas sim através de um processo “ativo e criativo”, como propõe Thompson (1998). Ao receber novos conhecimentos e informações, os indivíduos estão interagindo e reinterpretando estes elementos conforme sua experiência, sua bagagem cultural e afetiva. Para este autor, “[...] o sentido que os indivíduos dão aos produtos da mídia varia de acordo com a formação e as condições sociais de cada um, de tal maneira que a mesma mensagem pode ser entendida de várias maneiras em diferentes contextos” (THOMPSON, 1998, p. 42).

Ainda segundo o autor, a interpretação de uma mensagem, seu “significado” ou “sentido” deve ser avaliado como

“[...] um fenômeno complexo e mutável, continuamente renovado e, até certo ponto, transformado, pelo próprio processo de recepção, interpretação e reinterpretação. O significado que uma mensagem tem para um indivíduo dependerá em certa medida da estrutura que ele ou ela traz para o sustentar” (THOMPSON, 1998, p. 44-45).

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No campo da interação social TV, rádio e outras mídias podem levar crianças e adolescentes a participar da configuração afetiva do relacionamento e tornar-se relevante para a participação ou delimitação do círculo de amizades ou da família. Além disso, a TV e os transmissores de som oferecidos especialmente a crianças encerram um “capital” pedagógico que não deve ser subestimado.

Entrevistadora: Parece que tu gostas de cantar junto com o Joel e o Jonas.Duca: Sim.Entrevistadora: E por quê?Duca: É que eu gosto de cantar porque eles sabem as músicas que eu sei cantar. Algumas não sei, só o Joel e o Jonas cantam essas músicas. Aí eles me ensinam. É que daí, sozinho, não consigo. Eu não fico com vontade de cantar. Só com alguém. Sozinho, não consigo. (RAMOS, 2002, p. 149).

De acordo com a análise de Ramos (2002, p. 150),

[...] para as crianças não existe um local específico para aprender. A relação da criança com a música estabelecida entre o mundo televisivo e o Escolar está no próprio ato de querer aprender e como aprender. O local não define a relação, o que define é a música que está presente nesses dois mundos. Existe o mundo televisivo, que se constitui das interações entre a criança, a música e a televisão. No mundo Escolar, as interações se estabelecem entre a criança, a música e outras crianças.Entrevistadora: A turma e a Escola são importantes pra tu aprenderes essas canções?Ana: São. Sem elas, professora, se a gente não tiver uma companhia, a gente nunca aprende, sempre tem alguém pra ajudar a gente.Entrevistadora: Tu gostas então?Ana: Gosto.

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Entrevistadora: Aprendes lá em casa [...]Ana: Em qualquer lugar. Não tem lugar pra mim aprender [...] qualquer lugar. . (RAMOS, 2002, p. 150).

O ouvir em conjunto, numa roda de amigos, oferece motivação de diálogo, de conversas, de trocas de experiências e da certeza e afirmação da mesma preferência/gosto musical. O uso individual espanta o tédio, por exemplo, durante os temas escolares, como já mencionado. Ela traz uma disposição emocional, por exemplo, durante a leitura ou serve para superar maus sentimentos, respectivamente para compensá-los.

Entrevistadora: Tu cantas com teus amigos na Escola?Joel: Canto, porque todo mundo abala. Lembra quando tinha aquele palco ali onde a gente dançava?Entrevistadora: Sim.Joel: A diretora botava música, e daí todo mundo começa a cantar, dançar e chega uma, chega duas, e daí chega três, chega quatro, até bastante gente, e todo mundo dança.Entrevistadora: Isso é importante pra ti?Joel: É, porque já vê uma pessoa cantando, já se lembra, já dança, já abala. Todo mundo dança.Entrevistadora: E aí tu aproveitas e cantas com teus amigos?Joel: Canto. Entrevistadora: E a turma e os amigos que tu tens aqui na Escola são importantes pra tu aprenderes essas músicas?Joel: São. Eles cantam a música que eu não sei, depois no outro dia elas cantam de novo e aí eu já sei. (RAMOS, 2002, p. 148).

De forma semelhante uma outra criança entrevistada revela:

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Entrevistadora: Que tipo de música tu cantas na Escola? Diane: Às vezes no recreio. Na sala não dá pra cantar porque a professora não deixa, mas eu consigo.Entrevistadora: E no recreio, o que tu cantas?Diane: Eu canto um monte de músicas.Entrevistadora: Sozinha?Diane: Às vezes sozinha ou com minhas colegas. Nós sentamos num banco e cantamos. Eu gosto das minhas colegas porque são elas que me ensinam.Entrevistadora: E como é que te ensinam?Diane: Elas cantam e aí a gente senta num banco e elas vão me ensinando, aí eu aprendo. (RAMOS, 2002, p. 147).

Essa identificação das crianças com seus pares parece ser uma referência que a escola insiste em relevar, como se o sentido unívoco do “estar na escola” estivesse fixada no conhecimento ou na aprendizagem de conteúdos. Tomar a vida escolar com suas contradições, interrupções que correspondem à vida cotidiana, à situação real em sociedade torna-se imperioso para que as experiências escolares permaneçam como experiências significativas (SOUZA, 2000, p. 177-178).

Entrevistadora: Caso tu tenhas que conversar com a diretora sobre as músicas dos alto-falantes, o que tu falarias sobre elas?Ana: É que ela botou uma música que eu nem sabia como cantar. Era uma do Zeca Pagodinho [...] eu não sabia nem dançar. Eu ia pedir pra ela colocar uma música do É o Tcham, porque sei dançar quase todas. (RAMOS, 2002, p. 134).

Entrevistadora: O que tu gostarias de perguntar para a diretora sobre as músicas dos alto-falantes? Joel: Eu perguntaria pra ela: ‘- Diretora, a senhora não gosta de música de funk?’. Daí ela: ‘- Sim eu

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gosto’, ‘- Então porque a senhora não bota lá, todo mundo já sabe e aí a gente começa a abalá também, né? (RAMOS, 2002, p. 134).

As crianças interpretam, atribuem significados e filtram o que circula pela mídia e, assim, inovam a partir de suas experiências e vivências reais e virtuais. No caso da televisão parte-se do pressuposto de que as crianças não recebam passivamente aquilo que esse aparato veicula. Ramos (2002) avalia que as crianças assistem à televisão, e dominam com maestria o controle do aparelho, e consomem com interesse programas não apenas destinados a elas, mas também aqueles dirigidos aos adultos.

Ver televisão, não é um ato individual, mas social, porque os meios se encontram na dimensão do cotidiano infantil e o que circula por esse aparato suscita e alimenta as interações infantis com a família e com a escola. As crianças aprendem música a partir da sistematização frente aos programas de televisão. Elas selecionam os programas diários ou semanais de que cantores e grupos musicais participam. Os que aprendem se manifestam de uma maneira espontânea durante o recreio ou na sala de aula, ou seja, o que a criança aprende sozinha em casa é levado para a escola numa espécie de “assimilação coletiva” (LURÇAT, 1998).

Ao falar com os colegas da escola sobre os programas que assistem à televisão, ou sobre algo que escutaram pelo rádio, interagem com os demais, adaptam-se, questionam, argumentam e percebem que há outros matizes sociais e culturais. Essa é uma das maneiras pelas quais elas conhecem o mundo a partir de vivências e experiências musicais comuns que se expandem e se transformam com e no seu grupo. Nessas interações, elas tentam decodificar o apreendido, quando misturam ou acrescentam a suas brincadeiras ou conversas as representações e o conhecimento sobre o mundo que observam em casa, na escola ou na televisão (RAMOS, 2002).

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Considerações finais

Os meios de comunicação são fundamentais nas sociedades contemporâneas, integrando as atividades cotidianas dos indivíduos. Os meios não apenas promovem interações interpessoais, mas viabilizam novos conhecimentos, disponibilizando na sociedade um conjunto de materiais simbólicos. Neste sentido, os media são significativos no processo de circulação de saberes, de trocas de informações, de transmissão e apropriação de conhecimentos, de formas de viver e de se expressar, interferindo na formação dos indivíduos, reconstruindo diariamente, opiniões, percepções e desejos.

Os usos da música transmitida pelos meios, é hoje, parte inquestionável do cotidiano dos jovens. Vemos também que novas ofertas midiáticas como i-pods são aceitas com extrema facilidade. No entanto a escola parece ainda ignorar as experiências musicais que são feitas pela mídia, fora do tempo-espaço da escola:

Joel: Eu gosto de ouvir música no final de semana porque não tem aula e daí eu posso ouvir bastante. No colégio as professoras colocam às vezes uns radinhos com músicas só de romance, também não abala ninguém.Entrevistadora: A música tem que abalar, Joel?Joel: Tem que abalar, como é que a pessoa vai cantar morrendo? (RAMOS, 2002, p. 147).

Com o desenvolvimento dos meios tecnológicos e sua consequente inovação das práticas musicais, parece importante ouvirmos as crianças e jovens para que possamos nos aproximar desse novo contexto, conhecendo assim suas necessidades, expectativas, ideias e conceitos. A nossa busca tem

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sido descrever os fenômenos pedagógicos musicais com metodologias cada vez mais aperfeiçoadas e próprias da área. O desafio tem sido propor uma pedagogia musical coerente com a realidade, numa permanente atualização.

No uso pedagógico de CDs e outras mídias no cotidiano, deve-se considerar que uma sensibilização do sentido auditivo (como parte de uma educação estética) geralmente é pensada a partir de uma perspectiva dos educadores. Porém é necessário não se distanciar do significado que a música tem para crianças e adolescentes e ignorar as necessidades e as condições do cotidiano deles. Considerar os aspectos que levam as crianças e jovens a usar determinados CDs; e que são muito seguros de si quando compram o que gostam, aquilo que os satisfaz.

Em relação à mídia e aprendizagem, Schläbitz (1996) afirma que hoje é mais importante saber compreender e manejar do que acumular conhecimento. Isso equivale a educar a sensibilidade para a diferenciação, ou seja, para a percepção individual. Não pode ser propósito substituir a pedagogia musical por entretenimento, de impor o gosto do educador à criança, mas sim entreter com fantasia e humor, a ponto de satisfazer a necessidade a qual elas têm direito; satisfazer na criança a necessidade de empolgação e relaxamento. Pois afinal de contas a criança quer se divertir com a música e não “aprender”.

Músicas de filmes, histórias de aventuras, de piratas, de fantasmas, de contos de fadas, não são apenas ouvidas – são vivenciadas. A criança teme pelo herói que está em perigo, mas ao mesmo tempo sabe do happy end. Tensão sempre está ligada à tensão/relaxamento e isso para crianças são experiências muito agradáveis. Porém essas situações não são provocadas apenas através de conteúdos, mas também através de ruídos e do uso da música.

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As transformações que as novas tecnologias trazem, e como os seus paradigmas afetam a educação musical e a educação em geral, têm sido objeto de estudo tanto de educadores musicais, como dos educadores de modo geral. Com os atuais meios de comunicação as crianças estão em contato com a música nas mais diversas situações. Como tem alertado Souza (2000, p. 176), “[...] embora normalmente essa vivência não seja acompanhada de reflexão, é extraordinário o potencial de uma aprendizagem musical efetiva que aí reside”. Por isso, acreditamos, como escreve Morduchowicz (2001, p. 94-95), que a escola deveria propor:

Uma educação em meios não busca transformar o capital ou os consumos culturais dos alunos, mas explorar a relação que os meninos estabelecem com o mundo (Escolar e não Escolar) e ensinar a desnaturalizar as representações que o constroem, cuja compreensão afetará certamente a percepção que tem do universo, sua observação sobre a realidade e sua atitude ante o conhecimento.

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Interfaces entre Comunicação e Educação, através da Produção de Mídias alternativas: possibilidades emancipatórias

Sandra Maria Farias Loureiro de Souza(FTC/UNEB)

Maria Olivia de Matos Oliveira(UNEB)

Introdução

A pesquisa ‘Interfaces entre ‘Educação e Comunicação através da Produção de Mídias Alternativas: Possibilidades Emancipatórias’ foi realizada como dissertação de mestrado, no Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade - PPGEduC, da Universidade do Estado da Bahia, defendida no ano de 2010.

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O presente artigo pretende apresentar o percurso metodológico, os dados coletados e as conclusões resultantes das investigações e reflexões desenvolvidas durante a pesquisa que abordou a Oi Kabum! Escola de Arte e Tecnologia, programa não-formal do Oi Futuro, desenvolvido em Salvador – Bahia, pela organização não-governamental CIPÓ - Comunicação Interativa.1

Os processos investigados na referida pesquisa estão fundamentados na perspectiva das relações entre comunicação e educação, visando as possibilidades e limites para a participação e inclusão social de jovens de comunidades periféricas através da produção de mídias alternativas.

O contexto teórico-conceitual da pesquisa

A expansão tecnológica favoreceu a aproximação e a interação com as TIC dos mais diversos públicos, mesmo aqueles com poucos recursos. Tornou-se cada vez mais barato adquirir aparatos tecnológicos como câmeras digitais de fotografia e vídeo, celulares com os mais diferentes recursos e mesmo computadores, scanners e impressoras, além do acesso à rede infomatizada – a internet. Através desses aparatos e do acesso à internet, esses públicos estão produzindo e disseminando mídias – textos e imagens – com diversidade de discursos para milhões de pessoas em todo o mundo.

A centralidade das TIC e a produção de mensagens e sentidos por meio das técnicas e dos processos midiáticos vigentes no mundo

1 A CIPÓ - Comunicação Interativa é uma organização não-governamental, criada em 1999, em Salvador, BA, reunindo um grupo de profissionais de diferentes áreas: comunicação, educação e arte que tem como focos a democratização e qualificação dos meios de acesso, produção e veiculação de mídia e da comunicação; a utilização educativa das TIC; envolvimento de crianças, adolescentes e jovens na produção de mídia, como jornais, sites, animações, programas de rádio e TV, vídeos, coletâneas fotográficas, entre outros.

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contemporâneo são procedimentos que funcionam como mobilizadores de interações sociais, padrões de comportamento, de consumo e de vida. Neste movimento ativam também um impulso dialético que estimula o potencial humano para as transformações, pois tanto podem veicular em larga escala mensagens e conteúdos que se destinam a manter o status quo, como também se configuram em terreno fértil para a veiculação de diferentes discursos, imagens e sons, já que os meios técnicos estão presentes de forma intensa no cotidiano de todos. Essa condição dialética é analisada por autores como Santos (2007) e Martin-Barbero (2006), que reconhecem a violência da informação no mundo globalizado, e que, como afirma Santos (2007, p. 39), “[...] o que é transmitido à maioria da humanidade é, de fato, uma informação manipulada que, em lugar de esclarecer, confunde”. O referido autor avança ainda mais nesta reflexão ao afirmar que esta informação manipulada “se apresenta como ideologia”.

Dessa forma, ao considerarmos os sistemas contemporâneos de produção-recepção-disseminação, observamos que há um movimento que faz a informação circular, produz novas ideias, reflexões e discussões, além de possibilitar uma maior socialização do conhecimento.

No campo da educação, cada vez mais são promovidas reflexões e discussões acerca do alcance das TIC, tanto em termos de influência que exercem sobre os sujeitos, instituições, relações e representações sociais, como em relação às estratégias para se lidar com as transformações que afetam os modos de acessar e elaborar informações, ideias e conhecimentos.

Evidentemente, as relações educacionais e escolares e as mediações pedagógicas estão intensamente impregnadas por esse novo mundo tecnologizado, pois os processos educativos, sejam eles formais ou não-formais – não estão isolados dos acontecimentos mundanos e, dessa forma, reconhece-se que é extremamente difícil estabelecer os rumos que serão

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traçados nas próximas décadas para a educação frente aos desafios que ainda precisam se vencidos.

Nesse âmbito, os fenômenos midiáticos da vida cotidiana, abordados em um contexto educativo, relacionados à realidade dos educandos, assumem outra dimensão. Considera-se que o caráter multilateral, proporcionado pelo acesso às TIC, pode se constituir em fomentador de crítica, de reflexão e de ação em torno de outras visões de mundo e de outros projetos de vida.

As mídias alternativas configuram-se em processos de produção midiática que se identificam com processos de resistência, e podem configurar-se como possibilidades de transformação social, e mesmo de subversão das relações de produção e recepção. Downing (2002) trata da temática das mídias alternativas por meio de uma ampla reflexão acerca do potencial intrínseco que essa produção pode oferecer, no sentido de romper com as relações hegemônicas estabelecidas no mundo contemporâneo pela forte incidência das mídias. Traça um panorama através do qual procura demonstrar que as mídias alternativas sempre tiveram lugar na história da humanidade, atestando o caráter não-conformista e a vocação para a resistência por parte dos sujeitos.

O referido autor alerta para as possibilidades que se apresentam ao se reconhecer e fomentar essas produções consideradas alternativas, autônomas, experimentais e mesmo marginais, que são potencializadas pelo extensivo alcance das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) que vivenciamos em escala global.

Essa discussão é perpassada por uma problemática crucial: o papel emancipador da educação. O entendimento acerca do trabalho educativo como prática política, assim como defendido por Giroux (1983), que se alinha a Freire (2007), o qual relaciona cultura política, educação

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e transformação, em uma perspectiva por meio da qual a educação é concebida como um projeto de vida pessoal e coletivo e parte das demandas sociais e culturais dos sujeitos, sobretudo aquelas relacionadas à educação das camadas populares. O sujeito, ao vivenciar processos educativos mais implicados com uma visão política e com uma leitura crítica do mundo seria, consequentemente, levado a uma concepção mais crítica e estaria mais apto a fazer escolhas voltadas para seus reais interesses, baseados em projetos dimensionados pessoal e coletivamente.

A educação, nesta perspectiva, cumpriria o papel de articular a reflexão com a ação, ao realizar a mediação entre informação, conhecimentos, ideias e valores veiculados pelas mídias. Este papel consistiria em atuar como agente de elaboração, transformando informações em conhecimento, ao desenvolver uma visão crítica das produções e mediações midiáticas, que estão presentes em todos os setores da vida. Um processo de ressignificação de ideias, conceitos, valores e propósitos através da reflexão crítica e da criação de um discurso próprio, como educandos e como sujeitos históricos.

Silva (2006, p. 68), ao refletir sobre os desafios contemporâneos da educação frente à comunicação afirma:

A escola não se encontra em sintonia com a emergência da interatividade. Encontra-se alheia ao espírito do tempo e mantém-se fechada em si mesma, em seus rituais de transmissão, quando seu entorno modifica-se fundamentalmente em nova dimensão comunicacional. Para Martín-Barbero, um dos pesquisadores mais atentos à inter-relação comunicação e educação, pode-se falar em ‘esquizofrenia entre modelo de comunicação que configura uma sociedade progressivamente organizada sobre informação e o modelo hegemônico que subjaz o sistema educativo’.

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É certo que os alunos trazem um conhecimento, construído social e culturalmente, em grande parte, permeado pela mídia. A percepção dessa dinâmica pode vir a trazer um novo sentido às relações educativas. Faz-se necessário reconhecer o que é trazido pelo aluno para os espaços de conhecimento e conferir significado a uma produção socialmente construída, e que, via de regra, é considerada como fora do espaço escolar. Uma produção marginal. Ressignificar esse conteúdo para o aluno, ao estabelecer as relações desse conteúdo com a vida, talvez seja um ponto de partida para uma mediação pedagógica que leve em consideração a vida cotidiana e as necessidades e demandas sociais dos sujeitos implicados. Nesse contexto, a construção do conhecimento deixa de ser apenas uma ação cognitiva, e passa a ser reconhecida também como uma produção social (a qual já é, de fato), mediada por sistemas simbólicos dos quais os sujeitos dispõem e podem mobilizar a seu favor, como forma de interagir com mais significado com as diversas vertentes do saber e do conhecimento humanos. Nessa perspectiva, a mídia atuaria não apenas como produtora-reprodutora de cultura, mas também como espaço de luta simbólica. Um espaço onde os sujeitos, através de uma visão crítica do conhecimento e da educação para a vida, teriam a oportunidade de rever seu papel no mundo, como possíveis participantes, construtores e sujeitos desse mesmo conhecimento.

O problema da pesquisa

O problema principal desse estudo procurou reconhecer os processos comunicacionais e tecnológicos presentes na experiência em produção midiática realizada pela Oi Kabum! Escola de Arte e Tecnologia, através das TIC, buscando identificar possibilidades e limites para a inclusão social de jovens de comunidades populares.

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Assim, foram propostos os seguintes pontos para questionamento, reflexão e discussão, a partir do problema: 1. Quais as demandas socioculturais requeridas pelos sujeitos da pesquisa em termos de informação, educação e comunicação? 2. Quais as conexões entre a formação dos jovens no programa em estudo e a apropriação, uso das mídias e das TIC e as possibilidades e limites para a inserção social?

Como objetivo geral, este estudo buscou analisar os processos educacionais, comunicacionais e tecnológicos, visando identificar possibilidades e limites para a inclusão social de jovens de comunidades populares, através das análises dos conteúdos presentes nas comunicações e depoimentos colhidos dos jovens egressos do referido programa educacional.

Para isso, foram propostos os seguintes objetivos específicos: identificar junto aos sujeitos da pesquisa as demandas socioculturais por informação, educação e comunicação; identificar conexões entre a formação de jovens de comunidades populares em um programa educativo, a apropriação e uso desse conteúdo por esse público-alvo e as repercussões na vida desses sujeitos; caracterizar as formas de participação, apropriação e disseminação da produção e do uso da tecnologia por parte desses sujeitos.

As reflexões, análises e discussões tiveram como fonte as relações presentes na interface educação/comunicação/produção midiática/tecnologias, que levou em consideração as contradições presentes nesta relação tão complexa. Os processos investigados têm como fundamentos a leitura crítica das mensagens midiáticas que circulam na sociedade, por meio da leitura crítica do mundo e da mídia, a produção midiática (no processo educativo e fora dele) e a participação em processos educativos e interativos por meio das TIC, que são as bases da metodologia educativa pesquisada.

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Os sujeitos da pesquisa

O público-alvo para o qual se volta o programa educativo investigado é formado por adolescentes e jovens em fase de escolarização e preparando-se para o mundo do trabalho. Cada turma é formada por jovens que podem estar no final do Ensino Fundamental (a partir do 7º ano), cursando um dos três anos do Ensino Médio ou são recém-egressos do 3º ano. São estudantes de escola pública e moradores das regiões periféricas do Nordeste de Amaralina e do Subúrbio Ferroviário. Recentemente, passaram a integrar o programa, adolescentes e jovens do Centro Histórico de Salvador.

Comunidades como o Subúrbio Ferroviário, formado por cerca de 30 bairros e com uma população em torno de 600 mil pessoas e o Nordeste de Amaralina, com uma população de cerca de 100 mil habitantes e composto por quatro bairros, surgidos através da ocupação desordenada, apresentam condições ainda precárias de urbanização e de qualidade de vida. Os adolescentes compõem grande parte da população desses bairros. São jovens que buscam alternativas para as situações de exclusão em que vivem, e buscam participar de atividades culturais e artísticas, porém o que lhes é oferecido não dá conta de mantê-los distantes das situações de criminalidade e violência que são características desses bairros.

A trilha metodológica

A abordagem para apreensão e análise tem por base a concepção dialética, levando em consideração que um campo de grandes conflitos, em diferentes níveis, se apresenta e demanda a possibilidade de confrontarmos elementos contraditórios, em busca de uma síntese. Essa síntese precisa levar em conta aspectos sociais, econômicos, culturais, históricos, mas que

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não se anulem as subjetividades presentes e que seja possível privilegiar a complexidade humana e suas possibilidades/potencialidades de emancipação.

A opção pelo estudo de caso (GOLDENBERG, 1998) visou conhecer o mais profundamente possível o funcionamento da proposta educativa e suas relações com os contextos relacionados, nos aspectos sociocultural, tecnológico, comunicacional e educacional, para assim ser possível identificar uma contribuição mais efetiva das possibilidades oferecidas e dos seus limites.

Nas análises desenvolvidas acerca dos objetivos e das ações do programa, procurou-se descrever e fazer a reflexão sobre quais seriam as lógicas identitárias implicadas nos processos e relações entre os diversos elementos presentes, qual o conteúdo crítico que emerge no trabalho e nas atividades pedagógicas e como esse conteúdo está relacionado e pode contribuir para uma aprendizagem significativa dos envolvidos, por meio das mediações realizadas durante as atividades. Além disso, quais seriam as relações que se estabelecem frente ao uso da tecnologia para esse processo educativo. Que reflexões e posicionamentos críticos foram provocados nos participantes e qual a relevância para o contexto de vida dos jovens e para suas demandas por conhecimento, comunicação e educação, ou seja, para sua inserção social.

O processo de observação das atividades foi fundamentado a partir de algumas questões centrais. Esta observação foi realizada pela pesquisadora durante a sua própria atuação enquanto coordenadora pedagógica do programa, não sendo possível determinar o número de horas dispendido no processo.

As atividades observadas possuíam como um dos focos principais a leitura crítica da mídia. Um ponto importante a ser observado, referiu-

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se às práticas educativas descritas e como estas estimulariam formas do educando estabelecer relações com suas vivências e com uma visão de mundo mais ampla.

Por outro lado, tentou-se estabelecer uma ligação entre o potencial de aprendizado e a análise crítica da produção midiática, tanto aquela oriunda da mídia oficial, como a produzida durante o processo educativo.

A produção midiática desenvolvida pelos jovens foi descrita destacando as mediações presentes nas atividades para a criação dos produtos, e também nos planejamentos e nas estratégias de pesquisa desenvolvidas pelo programa educativo, que são base para a elaboração pelos jovens dos produtos midiáticos, tanto em relação aos conteúdos, quanto a formatos, contemplando a elaboração de textos e registro de imagens.

Foram também descritos os processos relacionados à apropriação das tecnologias, presentes nos processos de desenvolvimento das atividades e utilizadas no desenvolvimento dos produtos midiáticos. É importante ressaltar que, neste contexto específico, entende-se o produto como a concretização da aprendizagem, resultado do processo e totalmente implicado com ele. Não se pretende estabelecer aqui uma relação de produto enquanto lógica de mercado. O produto, neste caso, seria o reflexo das mediações presentes no processo, a partir da análise do perfil dos sujeitos, dos conteúdos críticos relacionados com esses sujeitos e as representações identitárias contidas nesta produção.

A partir das entrevistas realizadas, tentou-se traçar uma conexão entre os processos de aprendizagem e os resultados para os jovens acerca da inserção social através do mundo do trabalho. Afinal, a formação tem como um dos objetivos principais a formação técnica e uma possível inserção no mundo do trabalho.

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Um ponto de ancoramento, fio condutor das análises, foi a discussão que se estabeleceu entre a formação e a participação social dos jovens, principalmente em seus entornos - comunidade. Nessa perspectiva, uma questão observada foi a articulação ou não entre as práticas educativas com os processos potenciais de emancipação presentes na proposta educacional pesquisada. Que potencialidades e limites se apresentaram, de forma explícita ou implícita no Programa Oi Kabum! e com quais oportunidades e aprendizados os adolescentes foram confrontados? Como a proposta em questão se articula com as reflexões da presente investigação? Quais os resultados da formação dos jovens frente aos desafios que enfrentam?

Foram usados diferentes métodos e instrumentos de coleta de dados: entrevista semiestruturada; análise de documentos e materiais produzidos sobre o processo formativo desenvolvido, como fichas de inscrição, relatórios, planejamentos e avaliações; observação e participação em atividades e procedimento pedagógicos, que ocorreram durante a própria atuação da pesquisadora como coordenadora pedagógica do programa educacional. Consideramos de grande importância, para a análise, essa participação.

A pesquisa foi estruturada da seguinte forma: foram entrevistados 30 jovens da Turma I (2004 – 2006), sete jovens da Turma II (2006 – 2008), somando 37 jovens no total; foram coletados os dados atualizados referentes à idade, à escolaridade e inserção no Mundo do Trabalho dos 30 jovens da turma I e dos sete jovens da Turma II.

Procurou-se, nas entrevistas, identificar as expectativas e as repercussões da formação para as escolhas e trajetórias desses jovens.

Em relação aos dados quantitativos, relacionados à faixa etária, à escolaridade e à situação de trabalho, foram elaborados gráficos para que ficasse visível parte da trajetória desse grupo. Nestes gráficos constam os

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números referentes à conclusão do Ensino Médio, acesso à universidade e situação atual de trabalho dos 37 jovens. Os nomes dos jovens foram preservados para garantir o anonimato.

O método de análise dos dados buscou inferir as mensagens contidas nas falas e expressões dos sujeitos das pesquisas, por meio da análise das comunicações e diálogos estabelecidos no processo de coleta.

Para a análise qualitativa dos dados, foram consideradas relevantes as categorias presentes nas comunicações dos sujeitos, previamente definidas a partir dos objetivos e das propostas dos programas investigados.

Assim, dentre as diversas técnicas de Análise de Conteúdo de Bardin (2009, p. 199), foi escolhida a análise por categorias que:

Funciona por operações de desmembramento do texto em unidades, em categorias segundo reagrupamentos analógicos. Entre as diferentes possibilidades de categorização, investigação dos temas, ou análise temática, que é rápida e eficaz de se aplicar a discursos diretos (significações manifestas) e simples.

Em consonância com a técnica escolhida, as respostas às entrevistas, tratadas como texto, foram separadas em unidades de registro. As unidades de registro podem ser divididas em palavras ou em temas. Esses temas são “unidades de significação que se libertam do texto analisado segundo

certos critérios relativos à teoria que serve de guia de leitura” (BARDIN, 2009, p. 131). São também “núcleos de sentido”, que correspondem ao teor das comunicações. São analisados em termos de “frequência de aparição” e “podem significar alguma coisa para o objetivo analítico”. A técnica que

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enfatiza a análise temática é apropriada para as análises que buscam deduzir a partir de hipóteses, em direção a novas hipóteses.

Para a aplicação desta técnica foram definidas algumas categorias para as análises, baseadas nos próprios objetivos do programa pesquisado:

• Contribuir para a melhoria da imagem dos bairros, de forma a ampliar a autoestima dos seus moradores e diminuir o estigma a que estão associados;

• Formar adolescentes de bairros populares para participarem ativamente da melhoria de suas comunidades, utilizando a comunicação e a arte como ferramentas da transformação social;

• Promover a inserção qualificada de jovens no mundo do trabalho;

• Produzir materiais de arte e comunicação com qualidade técnica, conceitual e estética com e para adolescente sobre temas relevantes para os jovens e para as comunidades onde residem.

Como diretrizes gerais para a análise dos dados:

1. Objetivos do programa educativo ao realizar suas ações e atividades.

2. A fundamentação teórica que medeia a discussão e a análise dos dados.

3. As comunicações feitas pelos sujeitos da pesquisa.

4. Os dados levantados pela pesquisa.

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Análise dos dados: possibilidades emancipatórias

Para realizar as análises considera-se relevante partir das seguintes questões: qual a contribuição social do referido programa educacional para as comunidades dos jovens participantes e qual o olhar desses jovens acerca do referido programa? Para além dos objetivos declarados em seus documentos institucionais, qual é a avaliação feita pelos jovens em relação à contribuição do programa para uma maior participação social e intervenção comunitária?

Ao serem perguntados se acreditavam “que o aprendizado desenvolvido durante o programa educativo contribuiu para modificar a atuação em relação à comunidade e de que forma aconteceu essa modificação”, a maioria das respostas aponta para uma visão individualizante do programa:

Comunidade..., não mudou significativamente, pois um projeto como este não é abrangente a todos os jovens da comunidade, e enquanto papel de multiplicador nas comunidades por conta da vida corrida que todos levamos, ingresso no mercado de trabalho e formação acadêmica, não houve iniciativa da minha parte juntamente com a falta de projetos voltados para este fim na comunidade, no qual eu pudesse fazer em paralelo os dois papéis, multiplicador e tirar o sustento. (Jovem da Turma I - 2004 – 2006).

Ou ainda:

O olhar mudou de apenas reclamão para crítico, mas nunca quis me envolver numa atuação mais direta em prol da comunidade. (Jovem da Turma I - 2004 – 2006).

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Estou vivendo aquele ditado, ‘casa de ferreiro, espeto de pau’; ainda não tive a oportunidade de passar para a galera da minha comunidade o que aprendi durante esses 3 anos. (Jovem da Turma II - 2006 – 2008).

Esses são alguns exemplos das respostas dadas a essa proposição. Dos 37 depoimentos colhidos, dentre os jovens das duas turmas formadas, apenas 4 jovens demonstraram ter realizado ações continuadas nas comunidades. Ou seja, praticamente 90% dos jovens entrevistados não atuam nas comunidades como multiplicadores de conhecimento ou mobilizadores sociais. No entanto, grande parte dos jovens declara que o programa fomentou uma visão crítica sobre a comunidade, sobretudo ao reconhecer as qualidades positivas, a cultura local e o valor de seus moradores:

Vejo a comunidade de forma mais construtiva e acolhedora, mas me sinto de mãos atadas para uma intervenção mais direta em prol da comunidade. Tudo isso devido à dinâmica da vida atual: trabalho, estudo etc. (Jovem da Turma I – 2004 – 2006)

[....] a comunidade tem cultura. [...] a gente tem tipo... é uma coisa nossa ali, sabe? É uma cultural local, então é legal a gente tá mostrando isso, porque tem coisas que a gente faz lá que ninguém conhece, isso é meio mirabolante assim, mas é uma cultura nossa, então. Acho que é legal e a Kabum me ensinou isso, a ver essa cultura, por mais que todo lugar tenha problema, eu acho que tem aquela parte bonita, então porque não aproveitar aquela parte bonita e mostrar? (Jovem da Turma II - 2006 – 2008).

Pode-se inferir desses depoimentos que, de forma geral, através dos jovens, moradores das comunidades, o programa cumpre seu objetivo

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explicitado de “contribuir para a melhoria da imagem dos bairros, de forma a ampliar a autoestima dos seus moradores e diminuir o estigma a que estão associados”. Os depoimentos são apoiados pela própria produção autoral dos jovens, por meio de vídeos, fotografias e materiais gráficos. Esta produção, elaborada durante a formação e com desdobramentos em projetos multimídia desenvolvidos no Núcleo de Produção e também em participação em editais de fomento à produção audiovisual e em festivais, demonstram a capacidade dos jovens de criar e veicular imagens e sons baseados nesta valorização da cultura local. Não há um temor nem vergonha de mostrar as comunidades e seus moradores e valorizar a produção cultural local.

Um depoimento de um jovem morador do Subúrbio Ferroviário, formado na Turma II (2006 – 2008) atesta o valor e a relevância desse conteúdo da formação:

Eu produzi o vídeo ‘Candomblé Visão Jovem’, que falava um pouco sobre a vida do jovem, como ele se insere dentro do Candomblé, então isso foi uma história do jovem dentro de um terreiro que ele participava. [...] quando a gente tava na Kabum a gente produziu o vídeo ‘A Cidade de Plástico’ que foi uma experiência nossa. Então a gente tava convivendo no dia-a-dia com aquelas pessoas, as pessoas tavam fazendo suas casas de plástico dentro da comunidade, então nos interessou isso. Não teve nenhum custo, nem nada, apenas a Kabum nos ajudando. Esse vídeo ganhou (o festival).2

2 O vídeo-documentário ‘Candomblé Visão Jovem’ foi realizado através de edital interno promovido pelo Núcleo de Produção Kabum! Novos Produtores e foi selecionado para o Festival Olhar Circular de Cultura Livre 2009, em Alagoas. ‘A Cidade de Plástico’ foi um vídeo- documentário realizado por jovens da Turma II (2006 -2008) da Oi Kabum!, que mostra a ocupação pelo MSTS (Movimento dos Sem Teto de Salvador) de uma área baldia, próxima à Lagoa da Paixão, que denominaram A Cidade de Plástico, localizada no Surbúbio Ferroviário no bairro de Periperi, Salvador, Bahia. O vídeo recebeu o prêmio da IV Mostra Baiana de Videoclipes 2008, foi selecionado para o Goiânia Mostra Curtas 2008, para o Festival Olhar Circular de Cultura Livre 2009 – Alagoas, e para o Festival Imagens da Cultura Popular, promovido pela ONG ‘Favela é Isso Aí’, de Belo Horizonte. Pode ser acessado no site de vídeos <www.youtube.com>.

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Segundo Martín-Barbero (2006, p. 15):

[...] a comunicação e a cultura constituem hoje um campo primordial da batalha política: estratégico cenário que exige que a política recupere sua dimensão simbólica – sua capacidade de representar o vínculo entre cidadãos, o sentimento de pertencer a uma comunidade – para enfrentar a erosão da ordem coletiva.

Contudo, a partir das falas dos jovens, percebe-se que os mesmos não se dão conta plenamente desse potencial mobilizador da comunicação, através da produção de mídias. Reconhecem a identificação com os fatos que acontecem nas comunidades, mas apenas intuem as relações que se estabelecem entre estes fatos e a participação social e política. Essa dicotomia é expressa por declarações em que os jovens, mesmo estando em condições de produzir e inserir seus produtos midiáticos, não se vêem como agente de mudanças fundamentais. Como constatado, a quase totalidade dos jovens entrevistados declara não estar contribuindo com a comunidade e que, em suas palavras, neste sentido: “estão de ‘mão atadas’”, “na fase do ‘eu sozinho’”, de “não contribuir diretamente com a comunidade em que vive”.

Assim, em relação a um dos principais objetivos da Kabum “Formar adolescentes de bairros populares para participarem ativamente da melhoria de suas comunidades, utilizando a comunicação e a arte como ferramentas da transformação social”, não foi possível detectar articulações diretas significativas, levando-se em consideração as falas dos jovens entrevistados.

Ao se retornar à descrição das atividades educativas do Capítulo 2, constata-se que há um movimento em direção a uma reflexão sobre o mundo contemporâneo. Segundo afirmação dos educadores, nos relatórios de ações, os jovens, a partir das atividades de leitura crítica da

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mídia, demonstravam perceber a forma estereotipada como determinados programas veiculam a imagem das comunidades populares, porém, não sabiam analisar criticamente as razões para isso:

A partir de atividades que trataram do tema das representações sociais construídas pela mídia, os jovens puderem perceber que a periferia é vista e retratada, na maioria das vezes, de forma exótica ou fatalista, mas desconhecem as razões para isso. A atividade buscou ampliar a compreensão sobre os interesses envolvidos na manutenção do discurso amedrontado sobre a periferia, refletindo como as representações correspondem e alimentam as relações de poder da sociedade. (Educadora de Vídeo. Relatório Parcial de Atividades da Turma II da Kabum, 2007).

Dentre as atividades realizadas, os jovens analisavam notícias e reportagens e discutiam critérios de noticiabilidade, estrutura do texto jornalístico e relação imagem-texto. Também discutiam como se compõe a prática jornalística, o que caracteriza a linguagem jornalística, quais são os gêneros jornalísticos e qual o alcance de um jornal comunitário. A reflexão sobre os interesses da sociedade e os interesses do jornal enquanto empresa comercial também era discutida nas atividades. As estratégias que os jornais usam para chamar atenção das pessoas foi outra questão explorada durante as discussões acerca da mídia. Observando-se o desenvolvimento das atividades, percebe-se que o programa educativo não tem apenas o foco na produção, esvaziada de sentido. A produção midiática proposta pelos educandos é confrontada com a produção da mídia tradicional, com a qual convivem intensa e cotidianamente, como base para reflexão e discussões de temáticas fundamentais.

Ao se pronunciar sobre como o programa influenciou sua vida e sua visão de mundo, um dos jovens do programa declarou:

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Eu assistia à televisão, via as matérias no jornal sem pensar se o que estavam dizendo era verdade ou não. Para mim era tudo verdade. Eu não imaginava que podiam estar passando as informações por causa de interesses econômicos ou políticos. Na Kabum eu passei a entender melhor a mídia, suas intenções (Jovem educando de vídeo – Turma II – 2006/ 2008).

Ao se analisarem os procedimentos e estratégias para o desenvolvimento dos produtos realizados no contexto pedagógico descrito, verifica-se que os mesmos são tratados como materiais educativos. Possuem como intenção a mobilização dos educandos em torno de temas do seu interesse, porém relacionados a um plano mais amplo de conhecimento e aprendizagem. O objetivo é que sejam provocadores e promovam a reflexão, por meio dessa aprendizagem, no sentido de uma possibilidade de mudança. Seriam assim, potencialmente, agentes de emancipação, no sentido de levar o jovem a uma compreensão mais crítica do seu entorno social. Estes produtos midiáticos se configurariam como estimuladores de novas indagações e de práticas educativas que geram produtos midiáticos e produtos midiáticos como meios para a aprendizagem. Contudo, ao se analisarem as falas dos jovens, ao descreverem seu posicionamento frente às comunidades e às possibilidades de participação social, percebe-se que os mesmos, em sua maioria, não se sentem provocados para a atuação comunitária, um dos importantes objetivos do programa.

Neste sentido, retornamos a Freire (2007) e Giroux (1983), ao destacar o caráter político e emancipador da educação, ao entender o trabalho educativo enquanto prática política, que não pode ser abstraída do seu entorno e implicações sociais. A educação, nessa perspectiva, passa a ser entendida como a construção e implementação de um projeto de vida pessoal e coletivo. Na concepção do presente trabalho, o programa educacional pesquisado de fato promove a inserção social desses jovens,

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oriundos de comunidades populares, que se qualificam e se apropriam das oportunidades de trabalho e continuidade dos estudos, como demonstram os dados. Porém, se não há uma dimensão coletiva, social, no que diz respeito à amplitude de suas ações, o efeito é pontual, que gera um impacto reduzido à esfera individual.

Ao se colocar em evidência o potencial mobilizador da produção de mídias, por meio da apropriação das tecnologias e do acesso ao conhecimento, inevitavelmente articula-se com a relevância em implicar essa produção a um movimento não só de mudança de visão. Se há uma mudança de vida eminentemente individual para esses jovens, é possível que se esteja reproduzindo um sistema individualista, em que se está “cada um por si”. Quais as mudanças estruturais, no sentido social e da qualidade das relações humanas, que podem advir dessas modificações individualizadas? É certo que o individual é parte do coletivo. A mudança que ocorre em um indivíduo pode resultar, em um âmbito maior, pelo somatório das individualidades, em uma mudança sistêmica. Contudo, se não há uma mudança da visão social e política, implicada com transformações, qual a garantia de mudança social mais ampla, que alcance impactos sociais relevantes? Em termos de representatividade social, o alcance que imaginamos como emancipatório não se efetiva, ficando as mudanças restritas a casos individuais.

Por outro lado, é preciso observar que há um potencial mobilizador que permeia as experiências vividas pelos jovens, ao considerarmos a representatividade que se concretiza nas oportunidades individuais de continuidade dos estudos e de trabalho, nas áreas de formação específicas oferecidas. O resultado quantitativo e qualitativo demonstra mudanças nas vidas dos jovens. Essas modificações podem vir a se configurar como um indicador, no sentido de representarem as possibilidades de mudança para esses contingentes populacionais. Em outras palavras, estas conquistas

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individuais podem representar para o coletivo a realização de sonhos e desejos que são considerados difíceis, ou mesmo impossíveis, de alcançar, agindo no nível simbólico.

Outro elemento, potencialmente mobilizador, é a produção midiática, ao tratar de temas socialmente relevantes para os jovens e suas comunidades e ao ser proposta, produzida e disseminada pelos próprios jovens, através de diferentes meios. Esta produção reafirma o potencial desses jovens de refletir sobre temáticas socialmente relevantes, criar, produzir e comunicar-se, demonstrando capacidades e habilidades em se apropriar e elaborar conhecimentos socialmente significativos.

Tomam-se como base os dados dos 37 jovens da Turma I (2004 – 2006) e da Turma II (2006 – 2008), para efeito de dados quantitativos, quanto à conclusão do Ensino Médio, ao acesso à escolarização superior e à inserção social por meio do trabalho. Essa escolha explica-se, pois os jovens das turmas mais antigas (formados na Kabum há quatro e há dois anos) estão na faixa etária entre 20 e 27 anos, fase já crítica em relação à escolaridade e trabalho, no que diz respeito à transição do sistema escolar para o mundo do trabalho.

Segundo Pochman (2000, p. 57), no Brasil, devido às condições das famílias de baixa renda, a necessidade de ingresso no mundo do trabalho acontece precocemente:

A necessidade de antecipar renda futura ou de ajudar no orçamento familiar tem pressionado os filhos, sobretudo os de famílias de menor renda, a terem uma breve passagem pela escola. Por conta disso, o ingresso de filhos de famílias humildes no mercado de trabalho tende a ocorrer na faixa de 10 a 15 anos de idade.

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O ingresso precoce no mundo do trabalho é uma outra problemática que necessitaria de um aprofundamento, pois relaciona-se com questões como acesso e permanência nos diversos níveis de escolaridade. O fomento ao ingresso no mundo do trabalho, nos primeiros anos da juventude, poderia significar uma dificuldade para a continuidade dos estudos, principalmente no Ensino Superior? Afinal, a necessidade de receber um salário para sobreviver e auxiliar nas despesas familiares pode se tornar uma prioridade. De qualquer modo, é preciso relacionar as possibilidades de ingresso no mundo do trabalho à formação e à escolaridade, o que nos apresenta muitas discussões. Uma das questões a discutir seria a relação entre a inserção dos jovens no mundo do trabalho e as políticas públicas que qualificassem a inserção, ao garantirem, concomitantemente, a escolarização, ou seja, acesso e permanência.

Dos 37 jovens, 24 jovens estão trabalhando. Dentre esses, 13 jovens atuam nas áreas de formação da Kabum como fotógrafos, editores de imagem, designers, operadores de videoteipe e de câmera de vídeo, em empregos em emissoras de TV, produtoras, gráficas e lojas de fotografia digital. Dezesseis trabalham em colocações diversas e oito não trabalham.

Levando-se em consideração a amostragem, é possível notar que há um índice significativo em termos de trabalho e de acesso às universidades. Vale ressaltar, que a amostragem em questão foi aleatória e foi coletada indiscriminadamente, de acordo com os jovens que foram encontrados e se disponibilizaram a realizar as entrevistas. Contudo, percentualmente, os dados apresentados são significativos.

Todos os 37 jovens concluíram o Ensino Médio. 18 jovens estão cursando o Ensino Superior ou já finalizaram o curso. Um jovem está fazendo um curso técnico e um jovem está iniciando um novo curso superior, após graduado.

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Além dos números apresentados, é interessante assinalar algumas falas dos jovens, em que tentam estabelecer uma relação entre os objetivos alcançados e a formação vivenciada na Kabum, ao serem perguntados como viam a própria vida antes e depois do programa:

Uma vida de novas descobertas. Algo que jamais imaginava que teria acesso um dia. Minha vida agora é um grande incentivo ao talento. (Jovem Turma I – 2004 – 2006).

Mudou a minha forma de ver o mundo e ‘meu mundo particular’. Adquiri coragem para me arriscar a sonhar e buscar, além de ter um foco no planejamento da carreira profissional. (Jovem Turma I – 2004 – 2006).

Vejo a vida de forma muito mais clara quanto aos objetivos e planejamento. A formação intensificou o que eu tinha de potencial e ajudou a rever o que tinha a melhorar e o que eu não reconhecia como defeito. (Jovem Turma I – 2004 – 2006).

Com certeza minha vida mudou. Na Kabum eu pude abrir meus olhos para a realidade, tanto para as coisas ruins, como a manipulação da mídia e das pessoas com poder aquisitivo, quanto pras coisas belas. (Jovem Turma II – 2006 – 2008).

É evidente que, em relação ao objetivo do programa “Promover a inserção qualificada de jovens no mundo do trabalho”, há uma concretude. É possível verificar a inserção dos jovens no mundo do trabalho. Observa-se que, além da inserção no emprego, há a continuidade dos estudos, representada por cerca de 100% de conclusão do Ensino Médio e de 70% do total desses cursando o Ensino Superior, grande parte em fase de conclusão.

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O último grande objetivo declarado pelo programa educativo pesquisado é: “Produzir materiais de arte e comunicação com qualidade técnica, conceitual e estética com e para adolescentes sobre temas relevantes para os jovens e as comunidades onde residem”. Não é difícil constatar a qualidade dos produtos.

O programa disponibiliza seus vídeos e publicações gratuitamente para as comunidades, professores, escolas, universidades organizações comunitárias, e organizações sociais e emissoras de TV, promovem mostras e exibições públicas. Também participam de festivais e mostras, competitivos ou não, promovidos por diversas instituições e, por onde passam, a produção e seus produtores colecionam elogios à qualidade do conteúdo, à técnica e à expressão artística. Porém, essa qualidade é possível graças, não só à efetividade da formação oferecida, que pode ser verificada pelos índices de empregabilidade dos jovens no mercado gráfico e audiovisual de Salvador, que é bastante competitivo, mas também, essa qualidade é possível devido ao acesso a uma tecnologia de ponta, a equipamentos, estrutura e materiais dispendiosos. Essa circunstância pode nos colocar duas situações: por um lado, seria o caso de considerarmos que há, para esses jovens a falta de oportunidades. De fato, não há muitos espaços que ofereçam as condições de formação em comunicação e mídias encontradas na Kabum e, o que os dados demonstram é que se o jovem tem oportunidades, ele pode se desenvolver. É importante salientar que o processo seletivo do jovem não busca jovens com habilidades específicas restritas às linguagens midiáticas oferecidas e o perfil de ingresso é bastante diversificado. Por outro lado, é necessário reconhecer que há uma questão que gera muitas discussões, que se refere ao atendimento limitado a um número pequeno de jovens (80 a cada seleção, atualmente atingindo três comunidades populares da cidade), em contraposição a um recurso considerável destinado ao funcionamento do programa, muito distante da realidade das comunidades de onde são

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os jovens atendidos e de outros processos educativos, mesmo aqueles oferecidos por outras ONGs.

Assim, é possível que seja difícil, até para as próprias comunidades atendidas compreenderem qual seria a contribuição de um programa tão dispendioso, diante de tantas carências básicas existentes. Para um país com tantas problemáticas na educação a solucionar, é complexo perceber uma contribuição que se coloca de forma tão recortada e setorizada em um universo particular e que, embora destinado às comunidades populares, não é acessível à maioria. Seria mais uma forma de exclusão?

À Guisa de Conclusão

Ao final, diante da análise dos dados levantados e das comunicações dos sujeitos envolvidos, constata-se que o programa investigado declara como um dos principais objetivos trabalhar na perspectiva da construção do sujeito crítico e se preocupa com a formação política dos jovens. Porém as ações de educação não propiciam uma formação que consiga concretizar a formação política dos sujeitos individuais e coletivos no sentido da sua participação social, comunitária e na esfera pública. Com o grupo de egressos entrevistados, constata-se que, finalizado o curso, poucos se dedicam a algum tipo de atividade realizada na comunidade, sejam elas de ordem política, cultural, esportiva, educativa ou recreativa. Embora declarem reconhecer a importância que era dada a essas temáticas durante a formação e perceberem a importância da participação, não se posicionam como sujeitos históricos ativos, agentes de mudança, nem mesmo local. Porém, há uma dimensão de efetividade social e política, relacionada a uma maior sociabilidade, à noção de responsabilidade, ao estímulo positivo para planejar o futuro e à autoestima.

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Ao mesmo tempo, observa-se também que há uma relação entre a formação e as oportunidades de emprego, trabalho e renda para grande parte dos jovens participantes, além de dados que atestam o acesso à escolarização, configurando-se em evidências acerca de uma efetivação da inclusão social dos jovens.

Outro elemento importante que deve ser notado na formação em questão é a prática pedagógica que, além de não se limitar aos aspectos técnicos, procura estabelecer nas rotinas a reflexão e a discussão, sobre temas de interesse dos jovens.

De fato, é relevante discutir, neste contexto, o alcance sociopolítico dessas iniciativas, a relação trabalho, acesso e permanência a outros níveis de escolarização e o papel do estado, quanto à sua responsabilidade nessas questões. Outra problematização recairia sobre o papel das ONGs nesta relação. Como entidades que buscam promover a inclusão, por meio de relações colaborativas de parcerias não estariam promovendo também o conformismo, amortecendo os conflitos necessários às mudanças significativas?

Contudo, apesar de passível de muitos questionamentos, uma proposta educativa como esta seria, no mínimo, um campo fértil para diferentes reflexões, inclusive motivando investigações acerca do que de fato é relevante para essas comunidades em termos de educação para a emancipação e para a possibilidade de escolhas conscientes no mundo contemporâneo.

Referências

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Ed. 70, 2009.

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DOWNING, John. Mídia radical: rebeldia nas comunicações e movimentos sociais. São Paulo: Senac, 2002.

FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 12. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007.

GIROUX, Henri. Pedagogia radical: subsídios. São Paulo: Cortez; Autores Associados, 1983. (Coleção educação contemporânea).

GOLDENBERG, Mirian. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em ciências sociais. 2 ed. Rio de Janeiro, 1998.

MARTIN-BARBERO, Jesus. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. 4. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2006.

POCHMAN, Marcio. A batalha pelo primeiro emprego: as perspectivas e a situação do jovem no mercado de trabalho brasileiro. São Paulo: Publisher Brasil, 2000.

SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 14. ed. São Paulo: Record, 2007.

SILVA, Marco. Sala de aula interativa. 4. ed. Rio de Janeiro: Quartet, 2006.

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Espaços Vividos e Jogos Digitais: ambientes propícios para produção de novas formas de letramentos e de conteúdos interativos pela geração C

Lynn Alves(Senai-Cimatec e UNEB)

Tânia Maria Hetkowski(UNEB)

Introdução

Segundo Castels (1999), as tecnologias digitais e telemáticas são capazes, tanto de moldar quanto de reestruturar a vida dos sujeitos. Porém, não é pretensão afirmar que as mesmas são os únicos meios capazes de modificar e influenciar o contexto sócio, econômico e educacional, mas a

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intenção é alavancar discussões acerca das características da Geração C1. Geração que desencadeia e demonstra, nas suas situações e ações vividas, uma familiaridade com essas tecnologias, potencializando seus usos e suas influências na ressignificação dos espaços vivificados cotidianamente. Geração C é o grupo de sujeitos que interagem com as tecnologias digitais e telemáticas e produzem colaborativamente e conectivamente conteúdos.

Mas como se dá esse processo? Letrados em interfaces comunicacionais síncronas (ferramentas de comunicação em tempo real) e assíncronas (ferramentas que apresentam um distanciamento de tempo entre a mensagem e a resposta), que utilizando a web, celulares, smart fones, PDAs (Personal digital assistants (PDAs ou Handhelds), ou Assistente Pessoal Digital ), jogos, notebooks, diferentes telas, digitam freneticamente muitas vezes através de uma linguagem híbrida (combinação de textos, imagens e sons), pequenos textos que objetivam informar e comunicar a um grupo de pessoas, eventos, notícias e principalmente aspectos do cotidiano destes sujeitos, por exemplo, “jogando Guitar Hero e Rock Band”, “corrigindo monografias” ou ainda “Participando do Videojogos 2009 – PT”. Este tipo de comportamento alimenta a pulsão escópica, isto é, o desejo de ver, de atuar como voyeur, dos seres humanos que têm a necessidade de saber, curiosamente, o que o outro sujeito está fazendo diariamente.

Na perspectiva de Zagalo (2009):

Por outro lado e tão importante é que devemos parar e reflectir seriamente sobre o que queremos que os outros vejam em nós e não recorrer à partilha por impulso, tão banalizada por ferramentas como o Twitter ou os comentários rápidos no Facebook “What’s in Your Mind” no qual expressamos o que nos passa pela cabeça num determinado minuto ou

1 Expressão utilizada pelos autores Douglas Coupland e Peter Marsh, dentre outros, mas não existem referências sólidas sobre quem criou o termo.

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momento, porque estamos chateados ou alterados, porque alguém nos incomodou, ou porque não gostamos de uma determinada atitude. No mundo real uma frase destas é transmitida pela ar e desaparece nos ouvidos dos poucos que estão por perto que dificilmente poderão provar o acontecido. Aqui ficam registros de tudo, é uma extensão de nós que nos vai registrando e catalogando.

Podemos ver isso claramente em sites de relacionamento como o Facebook onde se pode encontrar uma janela com a seguinte pergunta: “No que você está pensando agora?” ou principalmente no Twitter onde com 140 caracteres o usuário mantém informado os seus seguidores sobre os seus passos.

Esse dilúvio de informações como diria Lèvy (1999), produzido cotidianamente na web nos leva a uma atenção parcial contínua para garantir o controle do que está sendo produzido, veiculado e consequentemente consumido, isto é, mobilizados pelo desejo de “[...] ser um nó vivo em uma rede, de conectar-se e ser conectado, de não perder nada, sempre em alto estado de alerta. Isso é fruto da tendência de se mover na vida escaneando os ambientes, buscando sinais e deslocando a atenção de um problema para outro” (SANTAELLA, 2007, p. 239).

Contudo, muito do conteúdo produzido não tem o objetivo de ser mais que informação volátil que em um segundo será esquecido e/ou deletado não contribuindo efetivamente para a produção de conhecimento. Dentro desse contexto, questionamos como garantir que o conteúdo produzido favoreça a produção de conhecimento colaborativo e conectado em tempo real? Como estes conteúdos, se potencializados pelos sujeitos, podem ser redimensionados através dos jogos de linguagem e das representações acerca dos espaços cotidianos?

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Adentrar hoje no universo acadêmico seja em uma sala de aula, principalmente da pós-graduação stricto sensu, ou ainda em congressos, seminários, eventos etc., de distintas áreas, implica se defrontar com uma audiência que tem seus notebooks ligados e muitas vezes conectados, onde são produzidas nas telas, textos que na maioria das vezes não têm nenhuma relação com o que o professor ou orador está falando. Sim, abrem janelas cognitivas simultaneamente, pois paralelo a interação com os computadores e acesso a internet, ouvem o palestrante e muitas vezes atendem os celulares. Este comportamento caracteriza-se como multitarefas (multitasking), pois motivados pelo desejo de serem mais produtivos, fazem um certo número de coisas simultaneamente durante um certo tempo (SANTAELLA, 2007), impacientam-se em ter que ouvir o outro sem estar a produzir.

Neste contexto, o desafio dos espaços de aprendizagem formais é captar e potencializar estas habilidades para os processos de ensinar e aprender, viabilizando a produção de conteúdos que vão além da informação pontual.

Jenkins (2008) traz exemplos interessantes quando nos apresenta a narrativa transmidiática que dentre outros aspectos favorece a emergência de consumidores críticos que vão além da recepção dos conteúdos midiáticos, mas tornam-se produtores de novos conteúdos. Essa passagem provoca conflitos entre a comunidade dos fanfictions (grupo que através das interfaces comunicacionais, criam ficções usando personagens e universos dos conteúdos midiáticos. Por exemplo, fóruns, blog para discutirem, construírem e reconstruírem as narrativas sobre determinada obra, como por exemplo, Harry Porter) e as empresas que produzem e distribuem os discursos midiáticos, já que os fans ampliam os discursos relativos aos produtos e as empresas têm medo de perder o controle e os direitos autorais das suas obras (nos referimos aos jogos eletrônicos, livros, filmes, animações etc.).

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Mas o que fazem esses fans? Produzem conteúdos que envolvem a elaboração de textos, de imagens, entre outras linguagens que exigem leituras prévias e interação com os produtos que os fascinam. Além disto, exercitam competências gerenciais na medida em que: a) organizam as comunidades que são formadas por outras pessoas que estão muitas vezes do outro lado do mapa; b) produzem as informações e c) sistematizam dados. Estes sujeitos estão imersos em um processo sociocultural no qual os pares atuam como interventores na zona de desenvolvimento proximal dos seus parceiros. Tudo isso acontece fora da escola. Uma escola que não compreende e nem aceita esse tipo de conhecimento, já que não consegue estabelecer relações entre esse cotidiano e os conteúdos escolares.

Diante deste contexto, configuram-se as dificuldades no que se refere à produção colaborativa de conteúdos pelos sujeitos, uma vez que a escola não considera a representação que o sujeito tem em relação aos redimensionamento das tecnologias digitais e telemáticas na sua cotidianidade, desconsiderando o perfil dos sujeitos que representam a Geração C e seus processos colaborativos em busca de saberes científicos ou narrativos.

Queremos que nossos alunos sejam produtores e leitores de textos, mas não conseguimos perceber que eles estão se formando no espaço midiático mobilizados pelo desejo e prazer de conectar-se e sentirem-se sujeitos autorizados a criar novos e diferenciados processos formativos vivos. O espaço, neste sentido, é vivo, possui e reconstrói histórias que se fundamentam, principalmente, nas ações do  homem com o meio, através de instrumentos e de relações subjetivas. Desta forma, os sujeitos produzem

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novos jogos de linguagens2, colaborativamente, com diferentes conteúdos interativos através da exploração de espaços vividos e buscam criar situações que se aproximam do real, dos espaços cotidianos e de situações vividas.

Tecnologias Digitais e Telemáticas: Jogos de Linguagem e Espaços Cotidianos

O caráter potencialidador das tecnologias digitais e telemáticas está no movimento que elas podem desencadear nas práticas sociais, culturais, políticas, pedagógicas entre outras. Segundo Marques (1999, p. 121), ao mesmo tempo em que a dinâmica do mercado empreende na racionalização do sujeito, abrem-se

[...] novos espaços: dos saberes emergentes em circulação, da associação e das metamorfoses das comunidades pensantes, produzindo, cada qual seu mundo virtual [...], suas realidades potenciais, das quais participam mundos heterogêneos, eles mesmos heterogêneos e múltiplos, sempre em devir, pensantes.

Destarte, o espaço virtual ou mundo virtual, somente existe se o pensarmos como potencializador das interfaces comunicacionais, de conteúdos e de discursos midiáticos entre sujeitos, pois possibilita um deslocamento de situação pela capacidade de expressar um “[...] contexto

2 Observando as jogadas no jogo de xadrez, Wittgenstein percebeu a analogia do jogo à linguagem como um todo e não somente relacionada aos sistemas axiomáticos, nascendo assim a terminologia jogos de linguagem. Porém nesta pesquisa a ideia não é aprofundar as obras desse autor, mas ampliar as discussões sobre as potencialidades dos jogos de linguagem na contemporaneidade. Obras como Investigações Filosóficas de Wittgeinstein são essenciais para futuros estudos.

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dinâmico acessível a todos e memória comunitária coletiva alimentada em tempo real” (LÉVY, 1999, p. 146).

Porém, estas perspectivas que perpassam os espaços criativos da comunidade dos fanfictions se contrapõem aos limites clássicos impostos pela escola, uma vez que “[...] o saber pós-moderno não é somente o instrumento dos poderes, mas aguça nossa sensibilidade para as diferenças e reforça nossa capacidade de suportar o incomensurável” (LYOTARD, 1998, p. xvii). Um saber que não encontra sua razão de ser na homologia, mas na paralogia dos inventores, isto é, um bom saber é aquele que percebe “anomalias” e constrói novos conceitos.

Assim, os sujeitos da Geração C conseguem mobilizar estatutos de saberes diferentes daqueles que versam sobre enunciados aceitos como saberes. A constituição de saberes, potencializados pelas tecnologias digitais, conquistada pela nova geração perpassa a constituição de jogos de linguagem, os quais exigem que os sujeitos compreendam que as regras não possuem legitimação, mas exigem contato com os jogadores; sem regras não há jogo e todo enunciado é um lance no jogo. Diante desta interpretação, compreendemos como os sujeitos da Geração C criam janelas cognitivas simultaneamente e desenvolvem comportamentos multitarefas, pois o jogo de linguagem supõe o desejo e o prazer à busca de entrelaçamentos entre o saber narrativo e o saber científico.

Os princípios dos jogos de linguagem estão atrelados ao movimento dos jogos convencionais como o jogo de xadrez, exemplificado por Wittgeinstein em suas obras, os quais, segundo este autor, têm características familiares, ou seja, possuem regras formais e regras estratégicas, que são criadas no decorrer das jogadas e, de acordo com essas regras o mais importante da linguagem não é a significação, mas o uso que o sujeito

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faz dela. Assim, fica evidenciado que a geração C mobiliza os jogos de linguagem na contemporaneidade, uma vez que

[...] esses jogos são parte integrante de uma forma de vida, que é na verdade uma prática humana, logo se percebe que ele está sujeito a mudanças, assim como toda prática que nos envolve como seres humanos. [...], por ser constituído por regras que norteiam o modo como os jogamos, os jogos de linguagem podem, ao longo dos anos, terem suas regras modificadas, ou até mesmo esquecidas (RUY, 2010, p. 9).

A prática humana, através dos processos tecnológicos, desencadeia jogos de linguagem com a perspectiva de uma interação comunicacional, possibilitando ao sujeito potencializar e legitimar saberes narrativos, os quais definem regras de convivência próprios da sociedade, bem como agregam e valorizavam as pluralidades humanas, uma vez que a tecnologia criou novos dispositivos que ampliam a capacidade de percepção sensorial humana, provocando dinâmicas e socialidades singulares, como é o caso dos sujeitos imersos na tecnologia digital.

Diante disso, compreendemos porque os jovens dominam a lógica das tecnologias digitais e telemáticas e da produção de sentidos, pois, para eles, o saber não é entendido apenas como um conjunto de enunciados, mas como uma pluralidade de jogos de linguagem. Assim, os jogos de linguagem denotam, nestes sujeitos, a capacidade de entender os espaços do saber e relacioná-las a partir de simulações nos espaços digitais, ou seja, os jogos de linguagem podem ser representados através de simulacros, onde a realidade virtual possibilita o redimensionamento da criatividade e a representação dos saberes.

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Tomaz Andrei (2009) denomina, estas possibilidades, de intersecções entre espaços dos jogos eletrônicos e espaços cotidianos e enfatiza que

[...] a imensa maioria dos jogos eletrônicos utiliza referências do espaço ‘concreto’ na elaboração de seus espaços e cenários, assim como de suas mecânicas. Sejam bases militares, espaços urbanos ou cenários de diferentes momentos históricos, não é difícil identificar quais as referências utilizadas pelos autores de um jogo na construção do mesmo.

No jogo de linguagem a natureza do vínculo social é definidora na constituição de processos formativos, sejam eles, mediados pelas tecnologias digitais, sejam eles potencializados por estas tecnologias. Diante disso, podemos destacar que os jogos de linguagem, através dos jogos eletrônicos, podem potencializar a criatividade dos sujeitos a partir de situações referenciais com os espaços vividos.

Na perspectiva de abolir a oposição entre os pressupostos instrumentais das tecnologias e os discursos de emancipação do sujeito criativo, percebemos, a cada dia mais, crianças, adolescentes e jovens descobrirem e construírem novos jogos de linguagem mediados pelos jogos eletrônicos nos espaços cotidianos. Jogos que exploram noções de espacialidade e lateralidade, simulações que se aproximam de situações vividas nos lares, nos espaços formais, públicos, urbanos ou mesmo históricos, como é o caso do jogo Búzios: ecos da liberdade, objeto desta discussão, dentre outros mundialmente conhecidos como The Sims, Civilization, os jogos móveis, os ARGs3, entre outros, os quais auxiliam a Geração C a compreender que o saber não se reduz a ciências, nem mesmo

3 Alternate Reality Games ou jogos de realidade alternativa – neste tipo de jogo é possível combinar situações que ocorrem em espaços públicos e nos ambientes da WEB, mediados por celulares, GPS, sites de relacionamento etc.

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ao conhecimento científico, mas aos processos desejantes e instituintes, ou seja, aos jogos de linguagem.

Diante do exposto, percebemos que o sujeito contemporâneo, representado nesta discussão como Geração C, busca agregar os elementos materiais e imateriais, advindos das tecnologias, para redimensionar suas formas de aprender e ensinar, uma vez que o sujeito aprende colaborativamente, ele também ensina, pois a troca de experiências entre colegas amplia as capacidades cognitivas, motoras, afetivas e sociais. No que se refere aos elementos imateriais, podemos destacar todo o processo, acima descrito, sobre os jogos de linguagem que permeiam a construção de sentidos e significados, pelos sujeitos, em relação aos seus saberes científicos e narrativos. De outro lado, nos referimos aos processos materiais e instrumentais das tecnologias, as quais denotam a exploração de técnicas informáticas, telemáticas, eletrônicas entre outras, as quais possibilitam o sujeito ampliar as possibilidades de deslocamento, comunicação, informação, armazenamento, entretenimento, planejamento e simulação.

Ao nos reportarmos às simulações, nos remetemos aos jogos digitais e às representações dos sujeitos acerca da constituição dos espaços virtuais cotidianos. Mas o que é espaço? Santos et al. (1988) consideram o espaço como uma instância da sociedade que contém e é contida por outras instâncias sociais, econômicas, políticas e tecnológicas. Ademais: “O espaço é uma estrutura social dotada de um dinamismo próprio e revestida de uma certa autonomia, na medida em que sua evolução se faz segundo leis que lhe são próprias” (SANTOS et al., 1988, p. 15), Ou seja, o espaço não se reduz às debilitações e escalas geográficas, mas a dinâmica dos sujeitos, uma vez que o espaço é vivo, possui e reconstrói histórias que se fundamentam, principalmente, nas ações do  homem com o meio. Para Santos (1996, p. 27) “[...] a sociedade seria o ser, e o espaço seria a existência”. E como funciona a representação dos espaços cotidianos, pelo sujeito criativo e

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desejante, quando da sua relação com as tecnologias digitais, especialmente na exploração de jogos digitais?

Portanto, o espaço é social, é histórico e humano e o sujeitos traz, na sua história de vida, através da constituição de jogos de linguagem, uma representação do espaço como instância da sociedade, onde, nela convive um sistema composto por elementos objetivos e subjetivos, os quais permeiam o campo técnico, humano e social; a complexidade organizacional; a relevância dos processos de construção da sociedade e; a constituição das relações (que podem ser efêmeras, colaborativas, familiares, indiferentes ...). Essa representação sobre a complexidade dos espaços cotidianos, pode ser atualizada nos espaços virtuais, compreendendo que o virtual significa força e potência e o mesmo não se opõe ao real, mas potencializa-o. Para Lèvy (1997, p. 18), “[...] a virtualização é um dos princípios vetores da criação da realidade”. Dessa forma, os espaços cotidianos são potencializados e potencializam as simulações, uma vez que elas são representações dos espaços vividos, elevados à potência.

Para Lèvy (1997, p. 23),

[...] multiplicação contemporânea dos espaços faz de nós nômades de um estilo: em vez de seguirmos linhas de errância e de migração dentro de uma extensão dada, saltamos de uma rede a outra, de um sistema de proximidade ao seguinte. Os espaços se metamorfoseiam e se bifurcam nossos pés, forçando-nos à heterogênese.

É nesse sentido que a Geração C diferencia-se das outras gerações, uma vez que conseguem potencializar e metarmorfosear os espaços cotidianos através das simulações dos jogos digitais e, é neste ínterim, que nos defrontamos com as dificuldades da escola formal ao explorar

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diferentes instrumentos e criar metodologias atrativas e criativas para seus alunos. Corroboramos com Lèvy (1997, p. 14), quando afirma que “se a virtualização for bloqueada, a alienação se instala, os fins não podem mais se reinstituídos, nem a heterogênese cumprida: maquinações vivas, abertas, em devir, transformam-se de súbito em mecanismos mortos”. Da mesma forma, se podadas as atualizações, as ideias criativas desta nova geração, tornar-se-ão lineares e suas ações pouco ou nada colaborativas, ou seja, a inibição da potencialização conduz ao sufocamento dos jogos de linguagem, a heteronomia de saberes, as limitações das representações do espaço vivo e a extinção dos desejos e da criatividade.

Delineando uma Prática Pedagógica para a Geração C

Ao compreendermos que as tecnologias contêm elementos materiais e imateriais, que os jogos de linguagem potencializam o saber e a representação dos espaços cotidianos e, diante destas constatações, destacamos que as práticas podem representar tanto a objetivação do homem e domínio da natureza quanto à subjetivação humana, sua realização e liberdade. Ademais, as práticas não representam exclusivamente atividades técnicas de aplicação e produções externas, mas abrem espaços ao sujeito no que se refere aos saberes, à descoberta, invenção, reflexão e diferença.

Assim, a “práxis” representa a esfera do ser humano e se revela no segredo do homem enquanto ser autocriativo. Significa e imprime aos sujeitos, a partir da superação das dicotomias, possibilidades de (re)criar e (re)construir a realidade humano-social, bem como a capacidade de gerar novos significados à existência humana, uma vez que a contextura da sociedade é marcada pela história da ação humana, advinda da arte, das linguagens, das formas de organização social e política, dos inventos tecnológicos entre outros, os quais não reproduzem determinada época,

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mas são expressões da essência, das representações, das ações humanas e dos processos vivos.

A ação é uma unidade de enlace para compreender o processo e o movimento de diferentes práticas, ela evidencia alguma potencialidade ou faculdade da qual o homem dispõe e por meio dela se expressa (SACRISTÁN, 1999). A ação também é uma condição essencial e definidora da condição humana, bem como possibilita o desenvolvimento social, cultural, histórico, educacional entre outros.

Neste sentido a prática pedagógica implica compreender que o contexto pedagógico é formado por diversas práticas cotidianas. Essas práticas cotidianas orientam e constituem as ações dos professores, imprimindo significados à sua profissionalização. Elas também representam as divergências ou convergências que este grupo, professores, encontra para desenvolver mecanismos de defesa ou de justificativas quanto à sua ação em sociedade. Tais mecanismos são intensamente penetrados por interesses, ideologias, dilemas, conhecimentos, crenças, persuasões e representações cotidianas e pelos quais produzem saberes que legitimam suas práticas no contexto educacional. Assim, a intervenção pedagógica é influenciada pelo modo como os professores pensam e como agem diante das diversas possibilidades da sua vida na escola e fora dela (SACRISTÁN, 1995).

A prática pedagógica demanda que o professor seja um mediador de diferenças, que consiga perceber que as singularidades acontecem na sociedade, através dos sujeitos, e no espaço, enquanto existência, superando práticas instituídas, associadas a discursos homogêneos ‘de que é impossível mudar a educação’. Hoje “não é mais possível ter uma única forma de ensinar tudo a todos, pois as coisas não funcionam homogeneamente e, então, há de se levar em consideração as diferenças” (MARTINS, 1998, p. 66). Essa perspectiva nos remete pensar nas possibilidades dos jogos de

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linguagem, utilizados comumente pelas novas gerações, das representações sobre os espaços cotidianos e, das narrativas transmidiáticas, pelas quais eclodem a virtualização como um dos vetores de criação às comunidades colaborativas e as explorações de jogos digitais.

Sintonizados com a discussão acima, criamos o curso Produção de Conteúdos Digitais para professores e licenciandos em Pedagogia, com a carga horária de quarenta horas, nas quais os docentes\discentes produzem cotidianamente conteúdos mediados por distintas linguagens para a web. O objetivo é possibilitar que estes sujeitos interajam com os diferentes discursos midiáticos que contaram a Revolta dos Alfaiates, que trata da maior revolta social do Brasil, ocorrida no século XVIII na Bahia, que em consonância com o ideário da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) e com a participação de duas etnias (brancos e negros) lutaram pela liberdade.

A Revolta dos Alfaiates como é conhecida, diferenciou-se por ter sido a única de caráter popular, democrático, liberal e contrário a permanência de uma sociedade escravista, fato que possibilitou o acesso tanto de membros da classe desprivilegiada (negros, pardos, brancos pobres, escravos, livres, libertos), como de membros da classe dominante (branco, livres, católicos).

Este fato histórico tem grande relevância para o Estado da Bahia, que se caracteriza por ser o maior estado com população afro-descendente e também porque com a aprovação da Lei 10.639/03 (complementada pela lei 11.645 de 2008) tornou-se obrigatório nas instituições de ensino fundamental e médio, “[...] o estudo de História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil”.

Assim, torna-se necessário criar diferentes possibilidades de produções em torno de tal fato que já foi explorado através de outras linguagens, como uma revista em quadrinhos produzida em 2007 pelo Olodum, o livro “Animai-vos, povo Bahiense! A conspiração dos Alfaiates”, organizado por Carlos Domingues, Cícero Lemos e Edyala Yglesias, que

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reúne textos, ilustrações, peça teatral, música, cordel e roteiro de cinema numa coletânea repleta de informações sobre essa revolta popular, uma mesa redonda no Programa “De lá pra cá”, na TV Brasil (Exibido na TV Brasil no dia 16 nov. 2009). E finalmente através do jogo digital do tipo adventure Búzios: ecos da liberdade financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia - FAPESB e Pró-Forte UNEB, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Cadastrado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq Comunidades Virtuais4.

O jogo foi desenvolvido com o objetivo de se constituir em um espaço de aprendizagem que simula o contexto da sociedade baiana no século XVIII, resgatando essa importante revolta popular, criando um locus para que os alunos e professores possam construir conceitos e significados acerca desse conteúdo histórico mediado por um jogo eletrônico5.

Desta forma, embasados na perspectiva da narrativa transmidiática defendida por Jenkins (2008) que se estrutura como uma nova estética para atender as novas exigências dos consumidores que passam a ser mais críticos e produtores de conteúdo, na medida em que participam ativamente de comunidades de conhecimento, criando um novo universo mediado por múltiplos suportes midiáticos, inicialmente, convidamos um grupo de oito professores a interagirem com o jogo Búzios a fim de subsidiar o processo de desenvolvimento do jogo, dando feedback para garantir que este elemento tecnológico poderá ser utilizado pelos professores ( Ver na próxima Seção os dados relativos a essa fase da pesquisa).

No segundo momento da pesquisa (em andamento) estes docentes e mais dezoito que livremente escolheram fazer parte da comunidade interagem com as diferentes linguagens (histórias em quadrinho, livros paradidáticos, cordel, vídeos etc.) que tratam do fato histórico mencionado acima, para produzir conteúdos interativos para a web, estabelecendo uma lógica de convergência entre estas mídias.

4 Disponível em: <www.comunidadesvirtuais.pro.br>.

5 O Búzios está disponível para download em: <www.comunidadesvirtuais.pro.br/buzios>.

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A comunidade é mediada por quatro pesquisadoras (as autoras deste artigo, uma mestranda e uma bolsista de iniciação científica da área de pedagogia) e iniciou as atividades da comunidade a partir de uma discussão sobre a produção de conteúdos midiáticos, possibilitando que os docentes imergissem no universo dos games, das redes sociais, dos vídeos, dos fóruns, blogs etc., construindo sentidos que vêm permitindo a produção de uma narrativa transmidiática que estará disponibilizada na WEB, no site <www.comunidadesvirtuais.pro.br>.

No terceiro momento da pesquisa, iremos analisar percurso dos docentes para produzir os discursos midiáticos, articulando com os elementos que foram observados durante a interação com as mídias, isto é, dificuldades enfrentadas, alternativas encontradas para superá-las, etc. Esta etapa da pesquisa está prevista para julho de 2010.

Ressaltamos que toda a produção construída pela comunidade evidenciada está disponível no ambiente Moodle (<www.ava.uneb.br>).

Para efetivar a análise das produções estaremos atentos às contribuições de Gee (2004). Para o autor, o letramento vai além de uma realização mental, mas se configura também como práticas sociais e culturais com implicações econômicas, históricas e políticas. Assim, atentaremos para o universo no qual estão imersos os professores e como constroem significado para as novas mídias, especialmente os games e teremos como indicadores da análise as premissas abaixo pontuadas por Salem (2007) adequando-as a outras mídias, além dos games. Desta forma, investigaremos como os docentes:

• Improvisam, criam e subvertem os discursos apresentados;

• Seguem as regras, questionam e testam os limites do sistema apresentado;

• Entendem como os sistemas operam e como eles podem ser transformados;

• Modelam e constroem mundos;

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• Aprendem a navegar em um complexo sistema de recursos fora do jogo, como os tutoriais, FAQs, inventários, orientações e fóruns.

A partir destes dados realizaremos a análise para compreender como os professores constroem conteúdos interativos a partir da interação com as novas mídias, especialmente, os games.

O Perfil dos Sujeitos da Pesquisa

Como citado anteriormente, realizamos a primeira fase da pesquisa no período de outubro a novembro de 2009, proporcionando que os oito professores interagissem com o jogo Búzios. Esse processo de interação permitiu que delineássemos o perfil dos sujeitos. Foram entrevistados quatro professoras e quatro professores da rede pública, que não tinham expertise com os jogos eletrônicos, destacando-se apenas um que já tinha experiência. O processo de formação acadêmica do grupo está concentrado em instituições públicas (62%) e instituições privadas (38%). A faixa etária predominante dos sujeitos entrevistados poderia caracterizá-los como a geração Atari (empresa criada por Nolan Bushnell que se constituiu em sinônimo de videogames, presente na memória da geração da década de 1970 e, de forma mais intensa, dos anos oitenta), isto é, aqueles que interagiram com os primeiros consoles de videogames. Contudo, apenas um dos entrevistados deste grupo tinha vivido a experiência de brincar com os videogames na infância e adolescência. Este professor está em fase de conclusão de uma dissertação de mestrado que investiga os percursos dos coordenadores dos projetos financiados pelo Edital 02/2006 da FINEP para desenvolvimento de jogos eletrônicos voltados para educação. O grupo de sujeitos envolvidos na pesquisa apresentava a seguinte configuração: 13%

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na faixa etária de 39 a 49 anos; 25% na faixa etária de 50 a 59 anos; e por fim, 62% na faixa etária de 28-38 anos.

Ao indagar os sujeitos sobre as atividades realizadas no computador, foi possível perceber uma pequena diferença nas respostas, isto é, os homens utilizam mais o computador para trabalhar, enquanto as mulheres mantêm um equilíbrio entre navegar na internet, ouvir música, assistir vídeos no Youtube e digitar texto. Os dois grupos apresentam percentuais iguais no que se refere a pesquisar na internet, conforme detalhamento na Figura 1.

Figura 1

Após o delineamento do perfil dos sujeitos, foram investigadas questões relacionadas com o jogo Búzios e foi interessante perceber que 62% dos entrevistados tinham ouvido falar da Revolta dos Alfaiates, tema do jogo, mas não lembravam onde, denotando um desconhecimento da história do seu povo, do seu estado. Tal fato sinaliza um descompasso com

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as raízes histórico-culturais deste grupo que deveriam ser conhecidas e socializadas com os alunos, principalmente o fato histórico indicado acima que tem um significado importante na Bahia.

Neste sentido, emergem dificuldades do professor no que se refere a compreensão, representação e ação pedagógica sobre o espaço vivido por sujeitos em determinada época histórica, bem como, neste ínterim, são desencadeadas as limitações em explorar o lugar, Bahia, como essência à reconstituição e reinterpretação da história, considerando seus aspectos políticos, sociais, culturais, econômicos entre outros. Segundo Hetkowski (2010), quando o espaço é passível de ser sentido, pensado, apropriado e vivido pelos educadores, nele há convergência sobre fatores humanos que superam as práticas pedagógicas viciadas e retrógradas. Nesse espaço vivido, associam-se práticas sociais, políticas, culturais entre outras, as quais redimensionam as potencialidades das tecnologias digitais e telemáticas, neste caso através do jogo Búzios.

Ao interagir com o jogo os sujeitos professores sinalizaram performances distintas, principalmente as mulheres que tiveram um baixo nível de tolerância com as dificuldades apresentadas no ambiente do game, conforme Figura 2. Este aspecto está relacionado com as dificuldades, desses sujeitos, em compreender os jogos de linguagens que permeiam a sociedade contemporânea e, consequente, se aproximar das dinâmicas produzidas pela Geração C.

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Figura 2

Ou seja, o grupo pesquisado encontra-se permeado pelos discursos da ciência moderna, apoiada no saber e no poder de legitimação da verdade e da racionalidade, desencadeando enunciados científicos baseados na filosofia positivista da eficiência e da performatividade, através de uma relação input/output. No entanto, a nova geração, sob a égide da contemporaneidade e das influências das informações e dos instrumentos tecnológicos, considera tanto os saberes das ciências positivistas quanto as perspectivas dos jogos de linguagem. Assim, consideramos que os pesquisados compreendem as regras do jogo, mas não a dinâmica das jogadas, bem como não foram interpelados a compreender as potencialidades das regras estratégicas que superam a analogia com o modelo matemático.

Isso demonstra e justifica as dificuldades dos professores no que se refere ao ato de “jogar”, uma vez que o mais importante não é jogar somente para ganhar, mas pelo gosto e pelo prazer das jogadas e pela ampliação das

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práticas e relações humanas, as quais criam novos sentidos ao jogo. Porém, sabemos que a escola, através dos professores, tem muito a descobrir sobre as potencialidades dos jogos digitais e das dinâmicas que os mesmos podem desencadear nos processos formativos.

Diante disso, constatamos que apenas um jogador concluiu todas as fases apresentadas pelo jogo digital Búzios. A versão maio de 2010 do jogo agregou as contribuições destes sujeitos, permitindo que a nova versão estivesse mais próxima do universo dos docentes, garantindo assim, a presença destas mídias no cenário pedagógico.

As dificuldades dos professores podem estar aliadas ao desejo de “fazer aquilo”, ou mesmo à sua formação, uma vez que sua geração teve como base o conhecimento científico que segundo Lyotard (1998, p. 35), “[...] seria o conjunto de enunciados que denotam ou descrevem os objetos, excluindo-se todos os outros enunciados, e susceptíveis de serem declarados verdadeiros ou falsos”. Diferentemente dos jogos de linguagem que permeiam a produção de saberes da Geração C, a qual associa conhecimentos científicos com saberes narrativos e constituem formas colaborativas a partir das potencialidades das tecnologias digitais e telemáticas.

Dentre as dificuldades apontadas pelos jogadores podemos destacar: movimentação do personagem (62%), abrir menu de interação (74%), utilizar botões do menu de interação (38%), falar com os personagens espalhados no cenário (75%), receber itens e acessar o inventário (38%) e identificar os objetivos do jogo (62%).

É importante, destacar que, nesta primeira fase de análise, avaliamos apenas o nível de interação e jogabilidade dos sujeitos com o jogo, deixando as perspectivas sobre produção de conteúdo para a segunda fase da pesquisa que teve início em abril e término previsto para agosto de 2011.

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Considerações Finais

Para Santos (1996, p. 51) a “[...] reconstituição dos espaços tem uma substância científico-tecnológica informacional. Não é nem meio natural, nem técnico. A ciência, a tecnologia e a informação estão na base mesma de todas as formas de utilização e funcionamento do espaço [...]”. Desta forma, podemos perceber que é neste contexto que a Geração C se consolidou e, é a partir, desta realidade que são desencadeadas novas formas de conceber os saberes e novas formas de criação e de relação com as tecnologias, principalmente digitais e telemáticas.

Assim, compreendemos as dificuldades que os educadores enfrentam, na contemporaneidade, em relação ao domínio das tecnologias digitais e aos processos de representação dos espaços explorados, simulados e redimensionados, neste caso, pelos jogos digitais. Corroborando com Lyotard (1998, p. 30), “[...] o que é preciso para compreender desta maneira as relações sociais, em qualquer escala [...], não é somente uma teoria da comunicação, mas uma teoria dos jogos, que inclua a agonística em seus pressupostos”.

Assim, os dados apontados pela pesquisa ratificam a dificuldade dos professores, principalmente aqueles que não têm nenhuma experiência com os jogos, em interagir com o seu universo, construir novos sentidos e compreender a dinâmica dos jogos de linguagem.

Tal situação termina por desmotivar os docentes para estabelecer práticas pedagógicas mediadas pelas novas mídias, distanciando-os cada vez mais do universo da Geração C que busca atividades colaborativas, conectadas, produzindo novos jogos de linguagem. Para Lèvy (1998), os saberes aliam-se à velocidade da evolução, às possibilidades da massa e produz novos saberes mediados por novos instrumentos técnicos, ou seja, as tecnologias, através de suas potencialidades técnicas e simbólicas desencadeiam uma nova lógica instituinte, na qual os sujeitos burlam o

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modelo tradicional com o objetivo de estabelecer processos formativos baseados nos três aspectos do jogo de linguagem (regras não possuem legitimação, mas exigem um contrato dos jogadores; sem regra não há jogo e todo enunciado é um lance no jogo).

A nossa intenção é possibilitar a criação de espaços de saberes para que os professores possam construir significados para as tecnologias digitais e telemáticas, produzindo novas formas de letramentos e conteúdos interativos. Esse é o nosso desafio para as próximas fases da pesquisa, quando aprofundaremos a investigação em torno das estratégias utilizadas pelos docentes para possibilitar que o conteúdo produzido favoreça a produção de saberes colaborativos, de jogos de linguagens, de representações do espaço vivido, conectados em tempo real.

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PARTE IIFORMAçãO Online

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Projeto Amadeus: criando novas experiências de aprendizagem em uma educação sem distância

Ricardo Amorim(UNEB)

Dinani Amorim(UNEB)

Alex Sandro Gomes(UFPE)

SOCIEDADE, EDUCAÇÃO E TECNOLOGIAS

As Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) vêm ocupando um papel de extrema importância na Educação contribuindo com o desenvolvimento de estratégias, técnicas e facilidades para melhorar o ensino e aprendizagem. Atualmente, para satisfazer as necessidades educacionais da sociedade – marcada por grandes avanços em ciência e tecnologia – as TIC representam um elemento capaz de melhorar a interação e a comunicação na construção do saber, de forma a potencializar,

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reforçar e transformar a educação no sentido de torná-la mais democrática, personalizada e flexível. Assim, percebe-se que há, cada vez mais, demandas educacionais onde são exigidas novas formas de se ensinar e a incorporação de recursos tecnológicos na Educação.

Neste cenário, a Educação a Distância (EaD) emergiu de forma adequada a estas novas exigências, pois, conforme ressalta Litto e Formiga (2006, p. 1), esta modalidade de ensino contribui “[...] para aumentar o acesso mais democrático ao conhecimento, e racionalização de despesas de livros-texto e outros materiais para a aprendizagem em todos os níveis”. Na última década, muitos esforços de pesquisa foram dedicados ao desenvolvimento de formas de uso da internet em EaD. Com isso, surgiram vários conceitos como o de Objetos de Aprendizagem, baseados na padronização de material disponível online com fins de reuso e interoperabilidade entre plataformas para EaD (WILEY, 2002) e o conceito de Design Instrucional (FILATRO, 2008) cujo propósito é o de ajudar no planejamento didático de atividades educacionais relacionadas com o uso deste tipo de material. Assim, os Sistemas de Gestão de Aprendizagem ou, em inglês, Learning Management System (LMS), geralmente baseados em tecnologia Web, foram criados no âmbito da EaD para o planejamento, implementação e avaliação de um processo de aprendizagem específico (WHA, 2004 apud PASSOS, 2006).

Com estes sistemas, o uso de Objetos de Aprendizagem adquiriu uma dimensão considerável contribuindo para tornar a atividade de planejamento didático em EaD uma atividade mais complexa. Desta forma a reutilização/interoperabilidade de material de aprendizagem e a modelagem do processo educacional tornaram-se aspectos chave em plataformas do tipo LMS. Neste sentido, a especificação IMS Learning Design (IMS LD) considera-se como um padrão de fato que permite descrever o processo de aprendizagem em Unidades de Aprendizagem contendo o material educacional associado (IMS, 2003). A IMS LD propõe-se a ser

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um metamodelo pedagógico que suporta o uso de um grande número de modelos pedagógicos na aprendizagem online, podendo também ser aplicada nas modalidades presencial e semipresencial. Com esta especificação são definidos elementos constituintes do processo educacional tais como objetivos, pré-requisitos, atividades, materiais e ferramentas de apoio que são representados como Objetos de Aprendizagem e Serviços necessários. Estes elementos se distribuem em etapas do processo educacional na forma de um fluxo de aprendizagem.

A aprendizagem via LMS tem trazido vantagens significativas como a rápida distribuição de conteúdos e redução dos seus custos de produção, a disponibilidade destes a qualquer hora e local, a possibilidade do aprendiz determinar o seu próprio ritmo e percurso de aprendizagem e uma melhor sistematização das intervenções no processo de ensino e aprendizagem por intermédio de ferramentas de comunicação como e-mail, chat, fórum e vídeo conferência (AN5, 2005 apud PASSOS, 2006).

As vantagens que este tipo de tecnologia traz para o ensino e aprendizagem, tem sido motivo de comparações entre a modalidade de EaD e a educação presencial tradicional. No entanto, o que muitos especialistas em educação têm observado hoje em dia é que uma modalidade, sozinha, não é suficiente para cobrir todas as demandas de educação, e com a qualidade que a nossa sociedade exige. Muito mais que a modalidade, o importante é que os objetivos de aprendizagem sejam atingidos de acordo com parâmetros de qualidade desejados. Portanto, para uma educação de qualidade, faz-se necessário levar em conta os aspectos positivos nas diversas modalidades, tanto em EaD quanto na educação presencial tradicional, e fazer uso de metodologias e tecnologias necessárias (TORI, 2001, 2009; ROBLYER, 2006).

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Neste contexto, como uma das tendências em educação apoiada por TIC, surgiu o conceito de Blended Learning que se caracteriza pela combinação de técnicas de ensino e aprendizagem variadas com o uso de diversas tecnologias educacionais baseadas na web. Nesta modalidade, podem combinar-se auto-aprendizado e/ou aprendizagem colaborativa em momentos presenciais ou a distância com o uso de tecnologias como videoconferência síncrona, streaming de vídeo, áudio e texto (DRISCOLL, 2000).

BASES LEGAIS E DE QUALIDADE NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E SEMIPRESENCIAL NO BRASIL

A modalidade EaD foi legalmente instituída no Brasil em 1996, com a lei 9.394 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional e, no seu artigo 80, respalda a possibilidade de uso desta modalidade em todos os níveis educacionais. Este artigo foi posteriormente regulamentado com o Decreto de No 5.622 de 2005, onde foram definidas as características da EaD, as disposições gerais para o seu funcionamento e estabelecida uma política de garantia de qualidade para esta modalidade, alinhada a critérios de qualidade estipulados pelo Ministério da Educação (MEC). Em complemento a estas determinações legais, o MEC, por intermédio da sua Secretaria Especial de Educação a Distância (SEED), vem editando desde 2003 um documento – Referenciais de Qualidade para a Educação Superior a Distância, com a sua última versão no ano de 2007 (BRASIL, 2007). Este documento não tem força de lei, foi elaborado para subsidiar atos legais do poder público e para ser utilizado como referenciais na organização de sistemas EaD, com o intuito de induzir a uma harmonização da qualidade destes sistemas aos padrões requeridos pelo MEC.

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Em relação ao uso de LMS na oferta de cursos de nível superior na modalidade a distância convém ressaltar algumas sugestões contidas nos referenciais de qualidade para EaD. De forma resumida, conforme este documento, uma instituição de ensino a distância baseada nos referenciais de qualidade do MEC para EaD, deveria estruturar-se tendo em conta:

1. A concepção de Educação e Currículo. Em função da opção teórico-metodológica do projeto pedagógico, configura-se a partir da forma de organizar um curso: em disciplinas, módulos, áreas, os instrumentos a serem utilizados e a compreensão de avaliação;

2. Equipe multidisciplinar com funções de planejamento, implementação e gestão dos cursos a distância, onde destacam-se três categorias: docentes, tutores e pessoal técnico administrativo;

3. O uso de meios de comunicação que promovam a interação entre professores, tutores e estudantes;

4. O material didático. Recomenda-se a integração deste com diferentes mídias tais como materiais impressos, radiofônicos, televisivos, de informática, de videoconferências e teleconferências, dentre outros;

5. As avaliações devem ser compostas de avaliações a distância e presenciais, zelando pela confiabilidade e credibilidade dos resultados e havendo uma preponderância destas últimas;

6. Gestão Acadêmico-Administrativa. Adoção de sistema para o controle de inscrições, avaliações, banco de dados contendo informações de professores, tutores estudantes, conteúdos (que

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permita ao professor a sua inserção de forma amigável, rápida e flexível). O estudante, geograficamente distante, deve dispor da mesma forma que no ensino tradicional, de serviços como matrícula, inscrições, requisições, secretaria, tesouraria, etc.

Na legislação Brasileira vigente sobre EaD, há uma regulamentação que prevê a oferta de carga horária a distância em disciplinas na modalidade presencial. Assim, parte das disciplinas ou carga horária em um curso de nível superior reconhecido, pode ser oferecida na modalidade a distância. Esta modalidade, conforme a portaria de No 4.059 denomina-se semipresencial e caracteriza-se como:

[...] quaisquer atividades didáticas, módulos ou unidades de ensino-aprendizagem centrados na auto-aprendizagem e com a mediação de recursos didáticos organizados em diferentes suportes de informação que utilizem tecnologias de comunicação remota (BRASIL, 2004, Art. 1º, § 1º).

Ainda de acordo com esta portaria, em um curso, a carga horária da modalidade semipresencial limita-se a 20% da carga horária total do mesmo. Neste sentido, uma disciplina poderia ser ofertada em parte ou integralmente na modalidade EaD desde que o total no curso não ultrapasse dito percentual. No entanto, as avaliações devem ser realizadas primordialmente na modalidade presencial.

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APRESENTANDO O AMADEUS LMS

O sistema Amadeus1 enquadra-se neste contexto de educação mesclada como um LMS para a educação presencial, a distância ou mista, baseado no conceito de Blended Learning no qual se estendeu os estilos de interação possíveis entre os usuários (PREECE et al., 2002). Este sistema consiste em um conjunto de soluções orientadas à integração de mídias digitais diversas com as quais se busca explorar da melhor forma possível o seu potencial educacional. O Amadeus, acrônimo de Agentes Micromundos e Análise do DEsenvolvimento no USo de instrumentos, é o projeto principal do grupo Ciências Cognitivas e Tecnologia Educacional (CCTE) do Centro de Informática (CIn) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) 2.

Os estudos realizados na fase inicial do projeto Amadeus levaram à identificação de uma série de limitações no uso de plataformas de gestão da aprendizagem. No geral, a interação entre os participantes neste tipo de sistema baseia-se na distribuição de artefatos (envio, visualização e entrega de material em mídias variadas) e na troca de mensagens de forma síncrona ou assíncrona por intermédio de ferramentas apropriadas (fóruns, chat e e-mail). Na maioria das plataformas avaliadas, há limitações no suporte ao trabalho do professor durante o planejamento didático (Design Instrucional) e na avaliação diagnóstica e continuada (GOMES, 2004), a percepção entre usuários e sistema é limitada a eventos relacionados com atividades síncronas (CHRIST, 2005) e há um fraco suporte na manipulação de objetos de aprendizagem e no uso de padrões de metadados com fins de

1 Disponível em: <http://amadeus.cin.ufpe.br>.

2 Disponível em: <http://www.cin.ufpe.br/~ccte>.

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reutilização e interoperabilidade de material educacional (ALVES, 2005; IMS, 2003).

A plataforma Amadeus foi concebida a partir dos resultados destes estudos iniciais e de vários anos de pesquisas nas áreas de Interações Humano Computador (IHC) e Tecnologia Educacional (TE) dentro do contexto da EaD. Buscou-se o desenvolvimento de uma plataforma centrada no processo formativo e nas interações entre usuários a partir da integração com diversas mídias (jogos, simulações, vídeos, texto, áudio e imagens), com ênfase na utilização de meios que permitem facilitar estas interações a partir de diversas dimensões percebidas nas atividades sociais desenvolvidas. Pretendeu-se, a partir disso, ampliar as possibilidades de acesso dos usuários e obter uma maior participação dos aprendizes estimulando e facilitando a interação destes. Para tal, utilizam-se meios distintos como: aplicações próprias para computadores do tipo desktop, celulares, PDA, TV Digital, jogos, interfaces tangíveis (para analfabetos). A integração destes meios torna possível aos usuários ter uma percepção de presença e acesso a interface do Amadeus de forma ubíqua.

Nos últimos anos, com a popularização das tecnologias de EaD, novas características que ampliam os estilos de interação dos usuários em relação aos LMS tradicionais passaram a ser requeridas:

• sistemas muito mais orientados ao uso de técnicas pedagógicas que no uso de recursos tecnológicos;

• aplicabilidade a diversas situações pedagógicas do tipo Blended Learning;

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• percurso da aprendizagem muito mais centrado no aluno que definido a partir de uma sequência lógica determinada pelo professor;

• possibilidade de adaptação e personalização do ambiente ao perfil do aprendiz;

• avaliações orientadas à pratica reflexiva e processual.

Estes novos requisitos definem uma tendência da atualidade no design de LMS e representam, para alguns autores, a segunda geração de plataformas para EaD. Desta forma, os LMS que ampliam os estilos de interação com soluções para alinhar-se com estas novas características são chamamos de LMS de segunda geração (ADAMS; MORGAN, 2007). No Amadeus, as diversas mídias são integradas e se organizam em módulos na constituição de cursos ou componentes curriculares aplicáveis nas modalidades de EaD ou presencial mesclada com EaD, conforme os princípios do Blended Learning. Com a integração destas mídias, o Amadeus propõe-se a ser um LMS de segunda geração. Nesta plataforma, estendeu-se o conceito de LMS pela incorporação de novos estilos de interação do usuário com o sistema, com os conteúdos e entre os demais usuários. Com isso, busca-se explorar da melhor forma os canais da percepção humana e atender as diversas formas de aprendizagem, através das características de cada um destes recursos e aplicá-las no contexto da aprendizagem (GOMES; TEDESCO, 2002).

Após os primeiros anos do projeto e a partir dos bons resultados obtidos com a publicação de artigos e formação de pessoal, decidiu-se distribuir o Amadeus como software livre. Assim, desde março de 2009, esta plataforma é distribuída sob licença de Software Livre e integra o Portal

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do Software Público Brasileiro (PSPB)3, a partir de onde é possível o acesso completo ao seu código e a todas as suas funcionalidades. O Amadeus na sua versão atual, estável e para livre distribuição, está disponível no portal do software público4. Trata-se de uma aplicação do tipo opensource, com as seguintes características:

• interface simplificada e intuitiva, baseada em princípios de usabilidade e desenvolvida a partir do uso metodológico de tecnologias para tornar as páginas Web mais interativas com o usuário - Web 2.0 e AJAX (GEHTLAND et al., 2006);

• uso de uma ampla gama de mídias, desde os tradicionais chats até vídeos com discussão simultânea entre vários usuários;

• compartilhamento de vídeos em situações de colaboração síncrona;

• servidor de jogos multiusuários promovendo formas alternativas de interação com mídias de jogos;

• sistema de controle de experimentos e medida em tempo real pela internet;

• percepção da atividade social na interface Web e nos diversos ambientes interligados;

• mobile learning: estilos de interação por meio de dispositivos móveis, tais como celulares e PDAs;

• integração com o Sistema Brasileiro de TV Digital.

Ultimamente, muito dos esforços de pesquisa neste LMS tem sido dedicados ao desenvolvimento de novos estilos de interação. Estes novos

3 Disponível em: <www.softwarepublico.gov.br>.

4 Disponível em: <http://www.softwarepublico.gov.br, na comunidade Amadeus>.

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estilos são categorizados em dois grandes grupos: no primeiro encontram-se os estilos de interação construtivistas, baseados na ação, na manipulação de metáforas do conhecimento onde os alunos podem modificar a representação de conceitos com ações diretas (em aplicações como servidor de jogos, servidor de vídeo, EriMont); e, no segundo, os estilos que permitem criar novas formas de colaboração, ou estilos sociointeracionistas, baseadas na percepção. Com esse instrumento, a percepção da presença de alguém pode induzir outros a realizarem novas ações complementando atividades previamente iniciadas. Por exemplo, em determinadas atividades de aprendizagem, com o uso de aplicações ou jogos, as diferentes formas de percepção tornam possível a negociação e discussão durante seções síncronas (LOBATO et al., 2008).

EXPERIÊNCIA DA APRENDIZAGEM COM O AMADEUS LMS

Nesta seção, descrevem-se alguns cenários de uso do Amadeus LMS que, embora não represente uma lista exaustiva, permitem dar uma idéia ampla de como a experiência da aprendizagem ocorre neste ambiente de aprendizagem. Para tal, inicialmente as principais funcionalidades do Amadeus LMS são demonstradas e, em seguida, foram considerados o uso deste LMS no ensino superior nas modalidades de EaD, semipresencial e presencial em conformidade com a legislação no Brasil.

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Um passeio pela interface do Amadeus na Web

O objetivo da interface Web do Amadeus é facilitar o trabalho dos professores por intermédio de ferramentas apropriadas que ajudam nas suas práticas de ensino e facilitar o uso por parte dos alunos, tornando mais interessante esse processo, estimulando a interação e o aprendizado pela ação. As interfaces do ambiente foram criadas para promover as interações entre os participantes de forma a ampliar as possibilidades de trabalho dos professores e criar novas formas de relacionamento e interação síncronas e assíncronas, promovendo a comunicação e colaboração com um foco na aprendizagem dos alunos. A Figura 1 apresenta os primeiros passos para o acesso à interface web.

Figura 1 – Primeiro acesso ao sistema. Em (a), tela inicial com o Cadastro de Usuário; em (b), os dados do novo usuário sendo incluídos e, em (c), a página inicial de cursos

Fonte: Gomes, 2010.

Conforme assinalado na Figura 1a, inicialmente os usuários devem cadastrar-se no sistema para o acesso aos cursos e, também, para criação de cursos novos, se o usuário for docente. Caso necessário, o perfil do usuário pode ser alterado e, para tal, o usuário acessa o próprio nome no canto superior esquerdo da tela inicial e informa novos dados solicitados pelo

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sistema com a possibilidade de incluir-se uma foto para o perfil. No caso de alunos, após concluir esta etapa, estes deverão localizar o curso desejado e efetuar uma matrícula para o ingresso no mesmo. A Figura 2 mostra os passos necessários.

Figura 2 – Em (a), duas formas de localizar um curso: por nome e por palavra chave; em (b), o resultado de uma busca e, em (c), tela inicial do curso desejado, a partir da qual um aluno pode se inscrever

Fonte: Gomes, 2010.

Após matricular-se, o aluno tem acesso a uma tela onde o mesmo pode ver uma lista de participantes no curso a partir da qual, um primeiro nível de interação tem início. Os cursos podem ter vários módulos, que representam etapas no processo educacional, e em cada módulo tem-se uma descrição do mesmo, onde podem ser declarados os objetivos de aprendizagem, materiais associados e ferramentas para o desenvolvimento de atividades de forma online. Para o acesso a estes módulos, utiliza-se a opção Visualizar Módulos (FIGURA 3).

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Figura 3 – Tela inicial e módulos em um curso

Fonte: Gomes, 2010.

Em cada módulo, diversos tipos de atividades de aprendizagem podem ser configurados, como por exemplo: Enquete - aplicável em casos onde o professor necessita ter um feedback do andamento das aulas; Fórum - bastante útil em situações em que se necessita promover discussões sobre assuntos diversos; Entrega de Materiais - que pode ser aplicada no caso de trabalhos (resumo, revisão bibliográfica, paper, monografia, etc) realizados por alunos em grupo, ou individualmente (FIGURA 4).

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Figura 4 – À esquerda, realização de enquete. No centro e à direita, utilização de fórum

Fonte: Gomes, 2010.

Situações didáticas baseadas no uso de interfaces síncronas podem ser aplicadas em cada módulo. Estas interfaces ampliam a experiência do usuário e permitem facilitar a aprendizagem. Na Figura 5, vê-se a realização de uma atividade colaborativa baseada no uso de um diagrama compartilhado e no uso de chat que, combinados, permitem ampliar a interação entre os participantes, facilitando a compreensão do assunto tratado.

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Figura 5 – Atividade colaborativa baseada no uso de gráfico compartilhado e chatFonte: Gomes, 2010.

De acordo com a Figura 5, o professor pode explicar um diagrama, os alunos podem fazer perguntas e indicar como está a sua compreensão do assunto utilizando-se uma ferramenta específica onde estes selecionam um símbolo correspondente (Smiley). Atividades em grupo com o uso de vídeos podem ser realizadas a distância. Neste caso, os participantes utilizam um chat associado para explicações, discussões e dúvidas (FIGURA 6). Caso necessário, os participantes têm um controle que permite voltar e avançar no vídeo, conforme o andamento da explicação ou discussão.

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Figura 6 – Atividade a distância com vídeo, baseada em discussão por meio de chat

Fonte: Gomes, 2010.

Tanto na situação da Figura 5 como na da Figura 6, conforme o smiley apresentado, o professor pode explicar novamente ou seguir com outras explicações, em função da compreensão demonstrada pelos alunos.

As atividades envolvendo jogos educacionais podem ser realizadas a partir de uma interface que permite a integração de jogos armazenados em um servidor específico. Neste caso, os jogos podem ser multiusuários e os participantes jogam a distância com a possibilidade de interagir de forma textual, por meio de chat, o que possibilita perceber a presença e ações dos participantes (FIGURA 7).

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Figura 7 – Atividade com o uso de jogos multiusuários

Fonte: Gomes, 2010.

Outras formas de interação podem ser utilizadas com o uso de dispositivos móveis ou aparelho celular. Com o uso destes dispositivos, busca-se um reforço na percepção, consciência e auto-estudo. Neste sentido, os alunos podem obter informações sobre atividades e artefatos disponíveis e, neste caso, a presença é percebida de forma ubíqua (FIGURA 8).

Figura 8 – Uso de dispositivos móveis com o Amadeus LMS

Fonte: Gomes, 2010.

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Com a maioria dos celulares atuais é possível visualizar conteúdos. Desta forma, estes dispositivos melhoram a consciência dos alunos sobre as atividades a serem realizadas, permitem promover o autoestudo e o sentido de responsabilidade sobre tarefas a serem cumpridas.

Com o uso de Lousa Digital, o Amadeus pode ser utilizado como ferramenta de apoio a aulas presenciais ou em aulas semipresenciais. As anotações produzidas com a Lousa, durante explicações nas aulas, podem ser acessadas posteriormente (FIGURA 9).

Figura 9 – Aula presencial com Quadro Digital e conteúdo integrado ao Amadeus LMS

Fonte: Amorim et al., 2010.

A entrada da TV Digital (TVD) no Brasil cria novas oportunidades de difusão de conhecimento com a possibilidade de interação entre

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difusora, conteúdos e usuários desse novo tipo de serviço televisivo. Nesta linha, foram concebidas soluções para a integração deste sistema de TV ao Amadeus LMS, criando novas oportunidades de aprendizagem para a estudantes na modalidade EaD. O objetivo é explorar da melhor forma o potencial educacional proporcionado pelas novas formas de interação possíveis com a TVD (FIGURA 10).

Figura 10 – Realização de atividade com a TV Digital integrada ao Amadeus LMS

Fonte: Gomes, 2010.

No Amadeus, há um conjunto de ferramentas voltadas às avaliações: nos módulos podem ser configuradas Enquetes e Avaliações de diversas formas; o registro de acessos e interações dos usuários com o

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ambiente permite que seja feita uma verificação da participação dos alunos em atividades disponibilizadas, de forma simplificada (FIGURA 11).

Figura 11 – Realização de um tipo de avaliaçãoFonte: Amorim et al., 2010.

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Assim, a plataforma Amadeus LMS pode ser utilizada em diversos níveis educacionais. A ampliação das formas de interação dos usuários com os conteúdos, e dos usuários entre eles, permite a implementação de novas estratégias de ensino e aprendizagem orientadas por teorias construtivistas ou sócio-interacionistas do desenvolvimento humano.

Uso do Amadeus na modalidade EaD no nível superior

A integração de mídias variadas e as múltiplas formas de interação possíveis entre professor, tutor e alunos no Amadeus permitem a sua utilização em diversas situações de ensino e aprendizagem.

No âmbito do ensino superior a distância, o uso desta plataforma deve ter em conta a regulamentação referente à modalidade EaD no Brasil, mencionados no item ‘Bases Legais e de Qualidade...’. Desta forma, de acordo com os subitens I, II e III (concepção, equipe e uso de meio de comunicação, respectivamente), no Amadeus, os cursos podem ser organizados em módulos nos quais conta-se com uma série de ferramentas de apoio à realização de atividades de ensino e aprendizagem, tais como chat, fórum, vídeos em grupo, enquete, jogos, mídia para celular, simulações e avaliações. Os usuários se classificam em tipos e participam nos cursos conforme a função de professor, tutor e estudantes. Com estes recursos, diversas situações de ensino e aprendizagem podem ser configuradas a partir de vários enfoques teórico-metodológicos. A interação entre professor, tutor e estudantes pode ocorrer a partir de uma diversidade de mídias, com o uso de chats tradicionais ou com vídeos com discussão simultânea entre vários usuários, com o uso de jogos ou de dispositivos como PDA e celular.

Algumas destas mídias tais como jogos e simulações multiusuário, permitem agregar recursos de realidade virtual. A possibilidade de uso de diversos tipos de mídia como material didático, e de forma integrada, torna o Amadeus um LMS que se ajusta ao sugerido no subitem IV (material didático, descrito no item ‘Bases Legais e de Qualidade...’). Diversos tipos de materiais no formato digital podem ser incluídos facilmente nos módulos

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pelo professor para uso durante a realização de atividades de ensino e aprendizagem. Pode-se utilizar desde vídeos, links de Internet e outros materiais em diversos formatos. São aceitos os formatos de arquivos mais conhecidos (por exemplo: .doc, .pdf, .ppt, .avi, .wmf etc.).

Avaliar é uma atividade complexa que depende de concepções teórico-metodológicas e até mesmo pessoais. Em uma plataforma do tipo LMS, as tecnologias envolvidas permitem oferecer formas alternativas ou que complementam as formas tradicionais de avaliação. Em relação ao subitem V (avaliações, descrito no item ‘Bases Legais e de Qualidade...’), diversas formas de avaliação online podem ser configuradas no Amadeus. Por exemplo: avaliação do tipo teste (com questões de múltipla escolha, verdadeiro e falso, discursivas), verificação da participação em fóruns, a partir do envio de materiais ou com uso de dispositivos de comunicação síncrona. Estas avaliações podem ser realizadas presencialmente em uma sala de aula do tipo “laboratório de informática”, em data e horário definido pelo professor. Orientado à gestão acadêmica, tendo em vista tratar-se de um LMS, as funções administrativas descritas no subitem VI (gestão acadêmico-administrativa, descrito no item ‘Bases Legais e de Qualidade...’) e previstas no Amadeus, referem-se ao cadastro de usuários no sistema, onde o professor tem um controle sobre quem pode matricular-se em um dado curso, e à manutenção de informações e conteúdos em banco de dados.

No ensino superior na modalidade semipresencial

Para a modalidade semipresencial, pode-se utilizar até 20% da carga horária considerada e deve-se justificar, conforme o que determina a legislação, a forma de computar o número de horas utilizadas na realização de atividades e os parâmetros utilizados nas avaliações.

O Amadeus permite o planejamento de diversos tipos de atividades nas quais a forma de computar as horas necessárias à sua realização depende

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muito mais da experiência do professor na docência que da tecnologia em si mesma. Em uma atividade relacionada com leitura de textos e discussão entre pares, o professor pode configurar um fórum e determinar o tempo que os alunos necessitam para a leitura e compreensão de textos e, o tempo necessário para colocar as mensagens (posts) em função da carga horária semipresencial determinada. A participação dos alunos neste fórum pode ser avaliada conforme o conteúdo e o número de posts colocados. Atividades com vídeo e chat permitem o cômputo de horas e avaliação da participação de forma fácil, tendo em vista que este tipo de atividade utiliza um meio de interação síncrono.

Nesta modalidade, de acordo com os princípios do Blended Learning, o uso de uma plataforma do tipo AVA permite ao professor combinar momentos presenciais com momentos a distância na realização de atividades orientadas ao auto-estudo ou à colaboração, a partir da utilização de recursos como fórum, chat, vídeo, áudio ou jogos. No Amadeus, estes e outros tipos de recursos disponíveis permitem a realização de variadas atividades de ensino e aprendizagem na modalidade semipresencial considerando-se os cenários de uso expostos a partir da interface Amadeus para a Web (ver item Experiência da aprendizagem com o Amadeus LMS).

No ensino superior na modalidade presencial

Na modalidade de ensino presencial, um LMS pode ser utilizado como instrumento de apoio às aulas presenciais. Neste caso, o uso do Amadeus LMS serviria como meio de facilitar a aprendizagem em atividades que se realizam fora do âmbito da sala de aula. Por exemplo, uma atividade de leitura e discussão de um assunto, definida para realizar-se em um determinado número de aulas, poderia seguir por vários dias em momentos fora da sala de aula sem comprometer o planejamento das outras

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atividades. Esta é uma das formas possíveis de se estender as horas/aula planejadas para determinadas atividades.

Com este LMS, a interação entre participantes pode ser melhorada nos momentos fora da sala de aula com o uso de quadros de aviso, enquetes, mensagens e na entrega de trabalhos. O uso de material impresso poderia reduzir-se consideravelmente com a disponibilização de material de aprendizagem online e com a realização de avaliações de forma presencial em salas do tipo “laboratório de informática”.

O uso de Unidades de Aprendizagem padrão IMS LD no Amadeus

Em uma perspectiva computacional, a especificação IMS LD permite a descrição de diversas situações de ensino e aprendizagem a partir de um grande número de estratégias/técnicas pedagógicas. A adoção desta especificação por softwares do tipo LMS traz uma série de vantagens: a possibilidade de reutilização de material educacional preparado previamente cuja qualidade tenha sido comprovada; o (re)uso de material produzido a partir de plataformas diversas; os materiais educacionais produzidos com esta especificação podem ser adaptados ao perfil do aluno permitindo melhorar o rendimento da aprendizagem; e, redução de custos de produção considerando-se a possibilidade de reuso de material.

Com o objetivo de adaptar o Amadeus ao uso da IMS LD, optou-se pela integração do banco de dados desta plataforma a um banco de dados definido a partir de uma ontologia educacional de IMS LD (AMORIM et al., 2006, 2010), tendo em vista que esta ontologia representa de forma precisa as definições contidas nos documentos de IMS LD e permite facilitar a programação de aplicações compatíveis com esta especificação. Com o banco de dados definido, procedeu-se um estudo para a adequação das interfaces do Amadeus para a criação, edição, importação e exportação

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de Unidades de Aprendizagem (UA) no padrão IMS LD. Na Figura 12, vê-se parte do processo de edição de uma UA no Amadeus.

Figura 12 – Processo de criação de uma UA IMS LD no AmadeusFonte: Amorim et al., 2010.

Conforme a Figura 12, durante a edição de atividades em um curso de Plano de Negócios, em (A) a interface do módulo Gestão de Conteúdos; em (B), a edição de uma atividade de aprendizagem com os seus atributos conforme IMS LD: Descrição, Objetivos da Aprendizagem/ Pré-requisitos,

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os Recursos associados, a forma como a atividade deve ser completada e a descrição do feedback ao completar-se a atividade; e, em (C) uma visão geral da arquitetura software e as partes relacionadas com este processo de edição que, neste caso, realiza-se com o Módulo Gestão de Conteúdo (com círculo em vermelho) utilizando a ontologia IMS LD (diagrama no retângulo cinza). A aplicação Amadeus LMS é composta por vários componentes que interagem para o correto funcionamento do sistema, representados em (C) na Figura 12. Durante a criação de uma UA, a ontologia é fundamental para garantir que os dados incluídos estão de acordo com as definições na documentação de IMS LD. Desta forma, garante-se a representação de um curso dado na forma de uma Unidade de Aprendizagem correta, conforme esta especificação.

CONCLUSÕES

Neste capítulo apresentamos a plataforma Amadeus de um sistema de gestão de aprendizagem. O mesmo é composto por um conjunto diverso e crescente de módulos. A utilização de cada um desses módulos pode ser planejada com facilidade e a operação de uma metodologia para EAD é bastante simples. O Amadeus foi todo projetado com técnicas de Design Centrado no Usuário, o que lhe confere um alto padrão de usabilidade, portanto, de facilidade de uso. Os diversos cenários de uso no contexto da educação superior indicam que a adoção do Amadeus facilita os processos de tutoria e mediação por meio desta plataforma.

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Referências

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Agradecimentos

Este trabalho foi apoiado pelo Instituto Nacional de Ciência e

Tecnologia para Engenharia de Software (INES), financiado pelo CNPq e

FACEPE, processos 573964/2008-4 e APQ-1037-1.03/08.

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A Edificação dos Saberes para o Exercício da Tutoria a Distância: o caso dos professores-tutores do curso de pedagogia a distância da UERJ1

Edméa Santos(UERJ)

INTRODUÇÃO

A pesquisa contemporânea sobre formação de professores vem atentando para a relação complexa e interativa entre histórias de vida, formação inicial e continuada e as aprendizagens construídas ao longo da carreira e do exercício da profissão, em que o docente interage e aprendem com seus estudantes, seus pares, gestores, comunidade escolar e com a sociedade mais ampla. Nem sempre foi assim. Até a primeira metade do século XX, o foco sobre a formação de professores centrava-se na formação

1 Este texto é produto da pesquisa “Docência na Cibercultura”, que contou com o apoio do Edital Universal CNPq 2007, com Programa Prociência UERJ-FAPERJ e com o Programa de Iniciação Científica da UERJ.

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inicial direcionada à aprendizagem de saberes disciplinares. Formar o professor significava, sobretudo, formar profissionais conhecedores dos conteúdos que deveriam ministrar em seu exercício docente. O que ensinar? Era e ainda é, em alguns contextos, principalmente na formação inicial de grande parte dos cursos de Licenciatura e de aperfeiçoamento no Brasil, a grande questão. Contudo, compartilhamos com D’Ávila (2008) o entendimento de que, na contemporaneidade, convivemos com diversos modelos de formação docente, entre os quais se destacam: o modelo artesanal, o modelo instrumental-tecnicista, o modelo sociopolítico e os “novos paradigmas de formação”, como a “epistemologia da prática” e a “fenomenologia existencial”.

Neste trabalho daremos ênfase ao “paradigma da epistemologia da prática”, onde a partir do conceito de saberes e do processo de edificação dos saberes docentes segundo Tardif dialogamos com alguns professores-tutores que atuam nos cursos de Pedagogia e Licenciatura da UERJ no Consórcio CEDERJ. Desse diálogo mapeamos como estes profissionais formam e se formam. A expressão “edificação dos saberes” é tratada por Tardif como metáfora para ilustrar que o processo de formação de professores é um processo sempre em construção.

SOBRE SABERES E A EDIFICAÇÃO DE SABERES DOCENTES. DESAFIOS PARA A DOCÊNCIA ONLINE

A formação de professores é composta por uma diversidade de processos e saberes oriundos dos campos da formação pessoal e profissional, dos saberes disciplinares e curriculares, da experiência. Por nos apresentar de forma mais sistematizada uma teoria sobre os tipos e origens dos saberes da docência e dos docentes, vale a pena destacarmos no Quadro 1 uma síntese das origens e tipos de saberes docentes segundo Tardif (2002).

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Origens dos saberes docentes Tipos de saberes docentes

Saberes pessoais – são provenientes das vivências familiares, dos processos sociais primários, da nossa história de vida em processos educacionais mais amplos e não formais.

Saberes da formação escolar – são provenientes da nossa trajetória escolar formal, dos modelos de professores que tivemos e pela socialização pré-profissional.

Saberes disciplinares – são apresentados pelas instituições formadoras, universidades ou cursos de formação de professores, a partir do currículo formal organizado por campos do conhecimento no formato de disciplinas.Saberes curriculares – são apresentados para além do conteúdo disciplinar. Correspondem aos modos e meios a partir dos quais as instituições organizam seus processos de ensino e aprendizagem.

Saberes da formação profissional – são provenientes da preparação para a vida profissional nos cursos de formação inicial e continuada intencionalmente promovidos para a formação para o mundo do trabalho.

Saberes da experiência – são provenientes do exercício concreto da profissão em interação com os estudantes, as instituições empregadoras.

Os saberes da experiência costumam articular os saberes disciplinares e curriculares, apreendidos em situações formais com os saberes que emergem da prática docente via experiência de sala de aula ou nos demais espaços sociais da instituição de ensino. Nesse contexto os professores vivenciam conflitos e tensões ao articularem, ou não, saberes pessoais, da formação escolar e da formação profissional com as vivências do cotidiano e da experiência docente. Portanto, os saberes da experiência são advindos de todo o processo e formação humana vivenciados pelos docentes ao longo da sua itinerância do mundo da vida e da profissão.

Quadro 1 – Edificação dos saberes docentes segundo Tardif

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No quesito “saberes da experiência”, Tardif apresenta-nos o desafio de atentarmos para uma epistemologia da prática docente como fonte de conhecimentos para uma melhor compreensão da docência e do ato de ensinar para além da racionalidade técnica. O ambiente de trabalho é, para este autor, o locus privilegiado para a instituição dos saberes da experiência. Para tanto, é preciso “[...] mobilizar uma ampla variedade de saberes reutilizando-os no trabalho para adaptá-los e transformá-los pelo e para o trabalho” (TARDIF, 2002, p. 21). Saberes estes que se articulam como um “amálgama” dos saberes advindos da formação da formação inicial (disciplinares), da formação continuada, que pode se constituir por processos formais e não formais de educação, a exemplo dos saberes edificados a partir da emergência de situações concretas no e do ambiente de trabalho, em sintonia, ou não, como os processos institucionais e da sociedade mais ampla.

Nesse sentido, o processo formativo precisa ser narrado pelo sujeito que aprende com seus pares. Aqui, não só a reflexão de si e sobre si é importante, como também a partilha desses sentidos pessoais com os sentidos de outros aprendentes envolvidos no contexto mais amplo do processo formativo. Nas práticas pedagógicas mediadas por tecnologias digitais em rede, precisamos atentar para este processo de edificação dos saberes docentes, questionando inclusive os sentidos dessas práticas docentes, tratadas, quase sempre como práticas de tutoria.

A educação online é uma modalidade de educação que pode ser vivenciada ou exercitada tanto para potencializar situações de aprendizagem mediadas por encontros presenciais, quanto a distância, caso os sujeitos do processo não possam ou não queiram se encontrar face a face; ou ainda situações híbridos, nas quais os encontros presenciais podem ser combinados com encontros mediados por tecnologias telemáticas (SANTOS, 2005).

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No Brasil, a educação online é um fenômeno novo. As primeiras práticas e projetos começam a aparecer com a internet e suas interfaces na segunda metade da década de 1990. Nos últimos 15 anos contamos com algumas experiências formativas, principalmente por conta da legislação brasileira, que vem sendo favorável às práticas de EAD e de educação online, bem como à emergência, ao crescimento e à diversidade de projetos e pesquisas na área. A evolução das interfaces digitais da internet, mais especificamente os ambientes online de aprendizagem, vem contribuindo para que práticas pessoais e institucionais se desenvolvam.

A formação pessoal e a história de vida são fontes fundamentais na edificação os saberes da docência. Memórias de professores que tivemos, sejam dos bons ou dos maus profissionais, acabam corroborando para a instituição das nossas experiências profissionais e formadoras. Contudo, no que se refere à formação de professores para a docência online, poucos são os docentes que podem contar com essas memórias e narrativas.

Nesse sentido, precisamos contar com os saberes da formação profissional fundados na experiência profissional e curricular. Muitos docentes online formam-se no contexto das suas primeiras experiências profissionais, aprendendo com seus pares e em sua relação com seus estudantes. Muitas instituições costumam formar suas equipes com projetos de cursos de aperfeiçoamento que se centram, quase sempre, nas diretrizes e dinâmicas do seu currículo ou desenho didático-específicos. Os processos de formação curricular, conforme descreve Tardif, são aqueles provenientes dos processos de organização das práticas específicas de cada instituição formadora. No caso específico da docência online precisamos conhecer como os saberes para a docência online estão edificando-se nas práticas cotidianas, escutando e dialogando com os praticantes e suas narrativas. Para tanto apresentaremos a seguir dados de como os professores-tutores a

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distância da UERJ-CERDERJ edificaram e edificam seus saberes no e para o exercício da docência online.

SABERES DA DOCÊNCIA ONLINE: O CASO DOS PROFESSORES-TUTORES DA UERJ-CEDERJ

Conforme destacamos no resumo desse texto, trabalhamos com a abordagem qualitativa e a metodologia da pesquisa-formação. A pesquisa-formação não separa a experiência acadêmica da prática profissional do pesquisador e dos sujeitos envolvidos. (SANTOS, 2006) Lançamos mão de diversos dispositivos (conversas informais, diálogos durante grupo de estudo e pesquisa, análise dos debates em fóruns de discussão online, observação das práticas pedagógicas via ambiente virtual de aprendizagem, cineclube e grupo focal), ou seja, meios materiais e intelectuais para mapearmos os saberes e como estes são edificados no contexto das práticas pedagógicas e de formação de professores-tutores da UERJ-CEDERJ. Da análise dos dados chegamos a categorias compreendidas por nós como noções subsunçoras. As noções subsunçoras são as categorias analíticas frutos da análise e interpretação dialógica entre empiria e teoria num processo de aprendizagem significativa (SANTOS, 2005). Entendemos a pesquisa como prática de formação, portanto como processo legítimo de formação e de aprendizagem significativa não só referente ao pesquisador coordenador da pesquisa, como também dos praticantes envolvidos. A seguir traremos das noções subsunçoras advindas desse diálogo entre teoria e prática.

Conforme ilustramos no item ‘Sobre Saberes e a Edificação...’, os saberes da docência podem ser edificados no contexto da formação inicial, continuada, da experiência profissional e da história de vida dos docentes. Nesses contextos destacamos os saberes curriculares (referentes ao saberes institucionalizados), disciplinares (referentes aos conteúdos

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e métodos da disciplina ou área de atuação) e da experiência (referentes aos saberes que emergem da relação professor-alunos-pares-comunidade escolar). Em nossa pesquisa com os professores-tutores, verificamos que grande parte dos saberes mobilizados e edificados surgiu da experiência da prática pedagógica construída ao logo do exercício profissional na universidade. Dos saberes da experiência, destacamos a seguir algumas noções subsunçoras mapeadas por nós.

Relação com os professores-coordenadores

A interação do professor-tutor com seu coordenador de disciplina inicia-se no momento do processo seletivo. Na parceria entre universidade e Fundação CEDERJ Cecierj, cabem à universidade a seleção (elaboração e aplicação dos instrumentos de seleção: prova teórica, entrevista e prova de títulos) da equipe e a formação continuada e permanente desses profissionais. Ao consórcio cabe a garantia das condições de formação continuada (infraestrutura e remuneração da equipe [no modelo de bolsas]). Após a seleção dos profissionais, o Consórcio CEDERJ é responsável pela capacitação inicial da equipe. Essa atividade tem como objetivo apresentar institucionalmente o consórcio, explicando as funções e papéis de cada ator-instituição envolvidos no sistema. Além disso, são debatidos coletivamente temas referentes à metodologia de EAD adotada pelo consórcio (concebida como semipresencial, por contar com a possibilidade de atividades presenciais serem promovidas nos pólos presenciais), as diretrizes para o exercício da tutoria a distância e uma breve apresentação da plataforma de EAD. Após esse momento de capacitação, todos os tutores passam a interagir diretamente com o seu coordenador de disciplina.

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Em tese, cabe ao coordenador de disciplina cuidar e garantir da formação continuada e permanente de sua equipe. Entretanto, nem sempre essa formação continuada e permanente é garantida. Muitos professores-tutores sinalizaram esse dilema. Grande parte dos coordenadores não discute suas estratégias com a equipe. A grande maioria se dedica exclusivamente aos conteúdos e às avaliações presenciais e a distância. Os encontros formativos, muitas vezes, se limitam às discussões dos temas da disciplina e muito pouco se discute em relação a metodologia para a prática online na plataforma.

A plataforma de EAD é um software proprietário, criado e gerido pelo consórcio para o exercício das atividades online. Em última análise a plataforma equivale à sala de aula online, na qual os professores-tutores interagem com seus alunos, que estão geograficamente dispersos. No contexto do exercício profissional mediado pela plataforma é que os saberes da tutoria online são edificados. Contudo, a qualidade desse exercício profissional depende diretamente da relação construída entre o professor-tutor com seu coordenador de disciplina. Essa noção subsunçora emergiu fortemente em todos os dispositivos da pesquisa. Se a relação é dialógica, coparceira, as práticas fluem com mais qualidade se aproximando mais da docência online. As práticas vão além da tutoria a distância reativa, ou seja, uma tutoria a distância reativa se efetua apenas pelo exercício de “tirar dúvidas” (na plataforma ou no serviço telefônico do 0800) dos alunos referentes aos conteúdos e atividades disponibilizados no material institucional e da administração burocrática de cronogramas com datas de exames, avaliações ou atividades de autoestudo. Vejamos depoimentos dos praticantes:

A qualidade fica muito a cargo da coordenação de disciplina. Eu tive uma troca de coordenação de disciplina e minha prática saiu de um polo

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para outro. Dizia a nova coordenadora: “vamos criar fóruns de discussão, disponibilizar vídeos, vamos fazer uma avaliação diferenciada, se não tem como inserir vídeos na plataforma vamos gravar em casa e mandar para o polo”. Daí vi que o movimento fica outra coisa com o coordenador de disciplina. Quando eu me deparei com a questão, vi que eu tinha cinco coordenadores, dois tinham este pensamento e três não. Ai eu percebi nitidamente que a atuação do tutor depende diretamente do coordenador. Este ano teve novamente troca de coordenação e eu fiquei cerceada com todas as letras. Eu já tinha feito fórum de discussão online com mais de 200 alunos, onde tivemos setecentas e tantas entradas. Daí perguntei para a nova coordenadora “vamos continuar fazendo fórum?” E a nova coordenação disse: “de jeito nenhum, impossível fazer fórum com tantos alunos, isso é inviável”. Aí perguntei a ela: “qual a minha atuação na sua disciplina?” Ela respondeu: “responder a plataforma e o telefone 0800” (Prata, 2009).

Eu tenho uma coordenadora que eu me sinto docente porque ela me solicita, troca muito comigo e outra que eu sou uma tutora reativa por completo em outra. Eu percebo isso claramente e é uma confusão dentro de mim. Ora você é docente, não é nem o poder...é a autoria estabelecida você pode oferecer...e na outra você não pode (Prata, 2009).

Tem coordenador que não te dá a liberdade, mesmo que você queria não pode abrir fórum em uma determinada disciplina, porque o coordenador não permite. Este diferença eu também tive. Passei por quatro coordenações diferentes. Três coordenações foram completamente reativas [...] A partir do momento que tem troca, parceria e uma estrutura e um direcionamento você muda sua prática completamente. [...] por trás de uma boa tutora tem sempre um bom coordenador (Esmeralda, 2009).

As vozes dos professores-tutores revelam que, se a coordenação da disciplina não tem clareza do potencial da educação online, as práticas da tutoria a distância estão comprometidas. Há uma hierarquia no sistema.

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A prática acadêmica é responsabilidade da coordenação da disciplina. O coordenador é o professor universitário. A grande maioria dos coordenadores são professores concursados da universidade, que estudam e pesquisam na área de atuação da disciplina que coordenam. Os professores-tutores são bolsistas remunerados pelo CEDERJ e não possuem vínculos empregatícios, direitos trabalhistas e autonomia acadêmica. Contudo, alguns coordenadores trabalham em regime de coautoria com sua equipe de tutoria. Esta equipe passa a não ser apenas executora de processos e produtos, mas também coautora desses processos e produções. Os dados específicos dessa noção subsunçora revelam que é preciso investimento não só na formação dos professores-tutores para um bom exercício da educação online, como também na formação continuada dos professores coordenadores. Grande parte dos coordenadores são especialistas nos conteúdos disciplinares e pouco discutem as especificidades da docência online.

Investimento pessoal e pouco investimento institucional: formação em espaços plurais de aprendizagem

Após a capacitação que se segue ao processo seletivo, fica a cargo da grande maioria dos professores-tutores a responsabilidade pela formação continuada. Os professores-tutores que estão deste o inicio do projeto na UERJ revelaram que foram poucas as iniciativas institucionais de formação continuada para o exercício da docência online. A maior parte dos coordenadores de disciplina encontram-se com suas equipes apenas para planejar e avaliar as atividades do período (elaboração do cronograma e guia da disciplina, avaliação dos resultados da aprendizagem dos alunos, planejamento de atividades e avaliações presenciais e a distância). Apenas uma pequena parte dos coordenadores criam e fazem gestão de grupos

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de estudos com suas equipes. Os docentes revelaram que, por iniciativa própria, o grupo de tutores a distância do curso de Pedagogia criou um grupo de estudos, no qual textos, pesquisas e práticas pedagógicas eram compartilhadas num clima de prazer e colegialidade. Esse grupo de estudos foi dissolvido em 2008, por conta de mudanças na infraestrutura e gestão geral do projeto na universidade. Revelaram alguns professores-tutores:

De um dia pra noite chegamos aqui e não tínhamos onde ficar. Literalmente perdemos nossa sala de trabalho. Ficamos sem sala, sem rede, sem computadores, sem espaço para correção de provas (Esmeralda, 2009).

Em 2007 o projeto-piloto trouxe esperança de valorização. Em 2008 circulava a informação que nada vai mudar, que tudo vai piorar, isso nos deixou bastante desmotivados. [...] O reconhecimento do trabalho do professor-tutor demorou a chegar.

O projeto-piloto citado pela tutora corresponde a uma iniciativa de formação continuada, via pesquisa-ação, na qual trabalhamos com a equipe de tutoria a distância com um curso online (projeto-piloto da pesquisa em questão que durou três meses) e em que os 40 professores-tutores puderam exercitar a discência online noutro ambiente virtual de aprendizagem. Além de questões específicas da educação e docência online, pudemos vivenciar com mais intensidade a comunicação síncrona e assíncrona. Uma professora-tutora chegou a constatar que mesmo atuando com os colegas num mesmo espaço físico, que é a sala de tutoria a distância, a interação entre os pares foi mais potencializada durante a interação online no projeto-piloto. Vejamos:

Estamos trabalhando lado a lado por três anos, e a nossa interação não é tão grande quanto aqui. Viu como o online agrega as pessoas?!?! Está sendo muito enriquecedor conhecer um pouco mais de cada um! Tenho certeza que nossos encontros – presenciais ou online – irão bombar daqui por diante (Safira, 2007).

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Nesse projeto–piloto detectamos que grande parte da equipe não tinha vivenciado ainda a mediação online nas interfaces síncronas e assíncronas. Constatamos que grande parte da equipe não mediava sequer fóruns de discussões online. Grande parte da equipe atuava, e ainda atua apenas na “sala de tutoria”, que é uma interface específica para tirar dúvidas dos alunos referentes ao conteúdo do material instrucional.

Além da ação colegiada do grupo de estudos, da participação no curso online piloto por nós organizado, alguns professores citaram no início do projeto a participação em grupos de pesquisa. Essa experiência em grupos de pesquisa foi destacada por alguns professores-tutores que, antes ou depois de aturem no sistema, puderam, como alunos de graduação, pós-graduação ou bolsistas em programas variados da universidade, vivenciar discussões mais formais sobre EAD, Educação e Tecnologias, Informática na Educação, entre outros. Vejamos algumas falas retiradas do fórum online sobre memórias da docência online:

Como me tornei um docente online? Tudo começou na UERJ, quando estava fazendo o curso de Pedagogia, tive o prazer de ter como minha professora e futura orientadora Raquel Villardi, com quem trabalhei e pesquisei sobre EAD e o uso das novas Tecnologias no grupo de pesquisa. Essa foi minha 1ª experiência como docente online. Quando terminei a graduação comecei a trabalhar no município como Professor II e prestei o concurso para tutoria daqui, continuando depois meus estudos na Pós sobre Tecnologia Educacional (Rubi, 2007).

Oiê!! Quase toda a minha família é formada por professores, sempre acompanhei as conversas, eventos, planejamentos, estudos... Vira e mexe estava “implorando” para ajudá-los (ou atrapalhá-los) de alguma forma. Me formei no Ensino Médio, antigo Normal, e desde então não parei mais!! Minha experiência com a EAD começou como aluna, fiz o adicional em Educação Infantil na Fundação Brasileira de Educação - Projeto Crescer, era semipresencial com

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materiais impressos, aulas e  avaliações  mensais (presenciais). Continuei a minha trajetória como educadora, fiz a graduação em Pedagogia na UERJ o extinto CPM e/ou PEDSI, ingressei em 2004/2 como tutora a distância das Licenciaturas e atualmente integro o Laboratório de Tecnologias Cognitivas na UFRJ como aluna. (...) Tchurma, o LTC tem como objetivo: Investigar a integração das tecnologias da informação e comunicação em contextos educativos presenciais e a distância de formação discente, docente e de profissionais nas áreas das ciências e saúde, por meio de pesquisa, desenvolvimento e implementação de sistemas hipermídia e de ambientes virtuais de aprendizagem. Há duas linhas de pesquisas, a da qual participo é a Tecnologia Educacional nas Ciências e na Saúde. Ultimamente estou até o “topo” envolvida num projeto que iniciaremos (amanhã) em parceria com a SME/RJ, um curso-piloto chamado: Internet na Educação - recursos e aplicações para os professores que trabalham nos Núcleos de Tecnologias, os multiplicadores na Info Educativa. Depois do encontro conto mais [...] (Vênus, 2007).

Ao sair do normal, entrei para Educação Artística/História da Arte na UERJ. E lá me apaixonei imensamente pela área. Já gostava, fazia curso de pintura, desenho. Tive bolsa de iniciação à docência, com a professora Raquel Villardi, e lá ela me “juntou” mais ainda à área de Design, que tanto gostava. No final da faculdade estudei também Programação Visual no SENAI, e logo depois entrei para o Mestrado em Design na PUC-RIO. Isso poderia ter me afastado da área de educação, mas já trabalhava no Estado, no Município e minha pesquisa era relacionada ao ensino de Design [...] (Marte, 2007).

As falas revelam a importância da participação em grupos de pesquisa. A pesquisa é base para a produção do conhecimento, principalmente quando tem relação direta com a reflexão na e sobre a ação docente. Infelizmente essas iniciativas não passam, ou passam muito pouco, por ações institucionalizadas. A partir de 2008, iniciamos de forma intencional, discussões e debates mais direcionados ao exercício da educação e da docência online, bem como a discussão mais ampla sobre Cibercultura e Educação. Nesse contexto contamos com a presença de alguns professores-

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tutores no GPDOC – Grupo de Pesquisa Docência na Cibercultura – onde realizamos estudos diversos, como a pesquisa “Docência na cibercultura: laboratórios de informática, dispositivos móveis e educação online”. Durante o período de setembro de 2007 até a presente data buscamos desenvolver algumas experiências formativas com os professores-tutores no contexto das atividades do grupo de pesquisa. Contudo, percebemos a necessidade de atuarmos mais formalmente, responsabilizando a UERJ e o CEDERJ pela formação continuada e permanente de sua equipe de tutoria. Ao mesmo tempo reconhecemos a importância de envolvermos os tutores em projetos de pesquisa acadêmica. Vejamos a fala de uma professora-tutora que é membro do grupo de pesquisa GPDOC de forma livre e espontânea:

Participar do grupo de pesquisa tem contribuído para minha mudança de postura na forma de trabalhar com a EaD. Pois a partir dos textos lidos, discutidos, e da reflexão na escrita de diferentes autores, foi possível ver a diferença da prática do tutor “reativo” para o docente online. Este proporciona discussões, valoriza o diálogo, trabalha na construção de um ambiente real de aprendizagem. Ele assume seu papel na construção da interatividade nesse ambiente. O docente online permite, a partir da sua prática, que o aluno veja que autonomia no estudo não quer dizer “aprender sozinho”. Isso é impossível! Sem sentido! Isso é uma “chatonomia”! Pois o diferencial está em cooperar, pensar junto! Discordar, apresentar argumentos, reconstruir questionamentos etc. E o docente online está nesse processo, assumindo esse espaço, e sua responsabilidade!! Tudo que estou falando aqui é conhecimento construído com minhas colegas (e amigas) do grupo de pesquisa!! É fruto da formação docente no GPDOC (Pérola, 2009).

A criação do GPDOC aconteceu no momento da minha atuação como coordenadora de tutoria do curso de Pedagogia da UERJ-CEDERJ. Atuei na coordenação de tutoria no período de abril de 2008 a junho de

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2009. A experiência foi bastante gratificante, pois me permitiu conhecer de perto as dinâmicas e limites da função, junto à complexidade do sistema. Fazer pesquisa acadêmica e atuar na gestão de processos educacionais foi uma experiência desafiadora.

A mediação online e a potencialização da aprendizagem do aluno online

Criar conteúdos hipertextuais, sistematizar narrativas, criar ambiências para que novas narrativas sejam construídas e socializadas, provocar novas situações de aprendizagem colaborativas e cooperativas, não são práticas fáceis. Tornam-se dilemas docentes concretos quando acreditamos que essas práticas só são interativas se os discentes forem de fato coautores. Conforme sabemos, os discentes online também são constituídos por práticas docentes ainda sustentadas por pedagogias transmissoras e lineares. Muitos não entendem e não se dispõem à cocriação interativa, ainda preferem o consumo de conteúdos pré-fabricados e a replicagem destes nos exames para certificação. Contudo, quando a mediação online é de qualidade, o aluno também se transforma passando a vivenciar a valorizar mais as práticas interativas.

Quando atuamos para além da tutoria reativa os alunos percebem nitidamente a mudança. Eu tive a resposta agora na prova presencial. Os alunos deixaram relatos que adorariam se toda tutoria a distância fosse assim mais interativa (Esmeralda, 2009).

Quando conseguimos que os estudantes online soltem suas vozes, suas narrativas, suas imagens, suas oralidades, podemos dizer que a docência online realmente foi vivenciada. A máxima de Freire (1996, p. 22)

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“não existe docência sem discência” é proposição também para a docência online.

Um docente online deve logo de início aprender que o discente online não tem que responder às suas perguntas do docente, como se ele estivesse sendo arguído. Nas interfaces assíncronas temos ambiências comunicacionais para exercitarmos nossa autoria. Como deve se comportar o docente online nestas mediações? Devemos literalmente explicar para o discente que a participação pode acontecer quando um colega comenta uma mensagem de outro, questionando, trazendo uma dúvida para compartilhar com um colega, e com os docentes, socializando outras leituras, outros links. Então a participação online se dá como estratégia de coautoria. É sempre importante agregar novos debates. Um novo enunciado, uma nova provocação, são sempre novos “pré-textos” para mais e melhores debates

Especificidades da docência online: do uso técnico das interfaces digitais às autorias na cibercultura

A sala de aula do docente online é o ambiente virtual de aprendizagem (AVA). Ambientes virtuais de aprendizagem ou “plataformas de EAD” são soluções informáticas que reúnem, numa mesma plataforma, várias interfaces de conteúdos e de comunicação síncronas e assíncronas, onde podemos educar e nos educarmos com os praticantes geograficamente dispersos, produzindo e interagindo com narrativas digitalizadas que circulam em rede (SANTOS, 2010). Para muitos professores-tutores, os primeiros contatos com os AVA são o começo de uma carreira na cibercultura, bem como uma construção cultural que se expande para além do AVA utilizado em seu exercício profissional.

Em nossa pesquisa, constatamos que alguns professores-tutores, antes do ingresso na carreira, já atuavam com outras soluções informáticas em rede. A experiência com as interfaces digitais e as redes online no social

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mais amplo pode potencializar a docência online, uma vez que esta ganha potência quando os sujeitos interagem em rede, trocando e compartilhando informações, saberes e conhecimentos, de forma colaborativa. Esses saberes são fundamentais para a autoria na cibercultura. Vejamos o que dizem alguns professores-tutores que já atuavam nas interfaces digitais antes de aturem com a plataforma do CEDERJ:

Apesar de ter nascido numa época em que ainda não existia internet, e-mail (afinal, sou uma senhora balzaca)... o online acabou se fazendo presente na minha vida. No finalzinho da minha adolescência, a internet começou a se popularizar. Lembro-me que eu e minha tia dividíamos a prestação de um “Lentium” e a mensalidade da Domain, um provedor da década de 90. Comecei minhas investidas virtuais pelo Mirc, UOL e depois ICQ. Foi nessa época que aprendi a mexer na internet, fuxicando em tudo. Tudo demorava muito. Lembro-me que só podíamos entrar na internet depois de meia-noite ou aos domingos, pois a conta de telefone pesaaaaaava! [rs] Aliás, foi num domingo chuvoso que, conectada à internet discada, conheci meu marido pelo ICQ [...] Foi amor à primeira teclada (Safira, 2008).

Comecei a procurar um cursinho de informática. Podia ser que lá alguém conhecesse algumas noções básicas de Didática e me possibilitasse uma real aprendizagem. Encontrei um na Tijuca, num colégio que ficava na subida do morro da Formiga. Comecei o curso numa turma grande e, no final, éramos só eu e o professor. Só não foi tão ruim, porque o que perdi em interação com os colegas acabei ganhando em aprendizado técnico. Aí, já mais segura, decidi fazer uma pós-graduação em Informática Educativa na Unicarioca. Daí para o Mestrado em Educação na linha de pesquisa em Tecnologias de Informação e Comunicação nos processos educacionais na Estácio de Sá foi um passo. Quando terminei o mestrado, soube do concurso para tutores AD da UERJ e me candidatei à única vaga para Didática. Minha coordenadora gostou de mim e dos meus 25 anos passados em sala de aula e estou aqui. Hoje, continuo dando aulas no Ensino Médio do Estado do Rio de Janeiro, onde sou professora de Língua Portuguesa e trabalho como tutora também no FGV Online (Diamante, 2007).

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Quando essas competências técnicas são mobilizadas, os saberes pedagógicos e comunicacionais são mais facilmente transpostos, sobretudo quando temos clareza de que essa transposição não consiste em copiar do presencial para o online estratégias que não contemplem o espaço da dialógica e da interatividade.

A partir do momento que começamos a interagir no ciberespaço, com as potencialidades do hipertexto eletrônico, ao acessar informações digitalizadas (nos repositórios científicos, nos portais jornalísticos e artísticos, nas páginas pessoais, nas redes sociais) e interagir com e nas interfaces comunicacionais (fóruns, chats, blogs, softwares sociais, listas de discussões, web conferências) começamos a ver a docência presencial também com outros olhos. Muitos docentes estão tornando-se mais autores. Além da autoria e planejamento da aula em si, esses docentes tornam-se autores de imagens, textos, hipertextos, comunicações mais dialógicas e interativas. Vejamos o que diz a Esmeralda:

Quando eu aprendi a usar a plataforma com suas potencialidades [...] percebi que, com aquele ambiente que já estava ali, nós poderíamos realmente fazer uma tutoria online que realmente mediasse. Vi como poderia realmente buscar o aluno. Porque, no começo (isso durou uns dois anos), vale a pena frisar, o aluno só participava do fórum para ter nota. Então se tivesse três participações, ele ganhava uma nota e somava com as avaliações dele. Daí o que eu descobri depois que eu me especializei [...] quando procurei saber o que de fato era uma docência online? Qual o potencial das interfaces? Como interagir melhor com o aluno a partir das interfaces? Daí percebi que os alunos poderiam procurar o tutor sem precisar de nota. Foi aí que eu comecei a fazer uma tutoria que lançava mão das interfaces. Não era nada diferente. Com a mesma plataforma, mas fazendo diferente. Fazendo com que o aluno sentisse a necessidade e o prazer de estar ali interagindo não só com o tutor, mas também com seus colegas de turma (Esmeralda, 2009).

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Esta fala revela como a aprendizagem técnica da plataforma foi falha e é insuficiente no início do exercício da tutoria a distância. Não há na instituição uma política de formação para uso da plataforma no contexto da educação online. Os tutores recebem inicialmente seus logins e senhas e, com base da experiência de exploração, vão descobrindo aos poucos ou com ajuda de pares mais experientes as funcionalidades das interfaces. Como a maior parte dos coordenadores de disciplinas só utilizam a interface “sala de tutoria”, para tira-dúvidas, a maioria das interfaces não são utilizadas ou são subutilizadas pelos professores-tutores. Estes, quando buscam formação, vão aos poucos se apropriando da técnica e inovando suas práticas nas dinâmicas da cibercultura. Quando os professores já ingressam no sistema com uma vivência anterior nas interfaces digitais, tudo fica mais fácil e o desenvolvimento da ação docente fica mais próximo das práticas de educação online.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES PARA CONCLUIR: SABERES EM CONSTRUÇÃO...

Em síntese o processo de edificação dos saberes dos professores-tutores, até o ano de 2009, do curso de Pedagogia UERJ-CEDERJ acontece nas seguintes mediações:

• Relação professor-tutor com seu coordenador de disciplina – quanto mais horizontal é a relação entre os sujeitos mais saberes são mobilizados;

• Investimento pessoal do professor-tutor em sua formação continuada – quanto mais os professores-tutores interagem em grupos de estudos e pesquisa, se envolvem que situações de aprendizagem variadas mais interessante torna-se sua prática profissional;

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• Relação professor e aluno online – quanto mais os alunos participam das atividades online propostas pelos docentes mais instigante torna-se a prática docente. Quando os alunos estão interagindo mais no ambiente online e melhores situações de aprendizagem são mobilizadas, acontece um processo de retroalimentação nas práticas a online;

• Aprender com a na cibercultura potencializa a prática da tutoria online – quanto mais os professore-tutore utiliza em sua vida cotidiana as mídias e interfaces digitais mais saberes são mobilizados e transpostos para o exercício da sala de aula online. Quanto mais aprendem a usar sua interface de trabalho (Plataforma CEDERJ) mais inspirações pedagógicas são promovidas.

Os dados revelaram que o processo de edificação de saberes acontece principalmente no contexto da experiência dos professores-tutores em seu exercício profissional, no diálogo com seus pares, alunos e coordenadores de disciplinas. Há pouco investimento institucional no processo de formação continuada de professores para o exercício da tutoria a distância. Urge investimento em políticas de formação continuada, bem como, melhorias nas condições de trabalho e investimento em processos de profissionalização da docência online. A formação desses profissionais não pode ser reduzida a cursos aligeirados de capacitação e nem a práticas tecnicistas de treinamento. Além de instituir políticas de formação inicial e continuada temos que questionar os processos de profissionalização perversos que não contemplam conquistas trabalhistas básicas, conquistadas pela categoria docente ao longo da história da profissão “professor”.

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Referências

D’ÁVILA, Cristina. Formação docente na contemporaneidade: limites e

desafios. In: Revista da FAEBA, Salvador, v. 17, n. 30, p. 33-43, jul./dez. 2008.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

SANTOS, Edméa O. Educação online: cibercultura e pesquisa-formação na

prática docente. 2005. 354 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação,

Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2005.

______. Portfólio digital: dispositivo e interface para a prática da avaliação formativa em educação online. In: SILVA, Marco (Org.). Painel: avaliação da aprendizagem em educação online. Recife: UFPE; ENDIPE, 2006.

______. Educação online para além da EAD: um fenômeno da cibercultura. In: SILVA, M.; PESCE, L.; ZUIN, A. (Org.). Educação online: cenários, formação e questões didático-metodológicas. Rio de Janeiro: WAK Ed., 2010. p. 29-48.

TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.

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Nova Didática Mediada pelas Tecnologias Digitais

Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo(UTFP)

O objetivo deste capítulo é apresentar reflexões sobre uma nova cultura em que professores e alunos realizam interações colaborativas mediadas pelas tecnologias digitais. Essas reflexões são resultados de dezoito anos de pesquisa junto a professores da Educação Básica e da Educação Superior como pesquisadora, formadora de formadores, e docente em sala de aula do Ensino Superior. A análise e interpretação dos dados apoiam-se em eixos que emergiram de uma análise das falas de docentes em fóruns de discussão presenciais e online, de perguntas feitas em palestras e comunicações orais nos congressos da ABED. Coletaram-se dados, também, em oficinas realizadas com professores, em diferentes encontros do Seminário Pedagogia em Debate e das quatro edições do Seminário Nacional Promoção de Inclusão Mediada pelas Tecnologias Assistivas. Ao longo desses anos, constatamos que ainda não se criou de fato uma nova didática porque os meios mudam, mas as concepções dos professores e dos alunos permanecem arraigadas a uma cultura mediática unidirecional e responsiva ou degenera para uma cultura mediática de apatia. Os hábitos de professores e alunos não mudaram substancialmente nesses dezoito anos, embora os suportes tecnológicos sejam significativamente diferentes. Há muita informação e pouco conhecimento. Em paralelo, constatamos, tanto em instituições de ensino públicas como privadas, inúmeros

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oásis de interação social intencional e de colaboração que aproveitam as potencialidades das tecnologias digitais para a criação de redes colaborativas de aprendizagem. Nesses contextos, constatam-se, a seleção da informação e o aprofundamento do conhecimento, o desenvolvimento de comunidades de prática, de pesquisa, de aprendizagem, e produção de conhecimento. Ensaios, artigos, trabalhos para eventos produzidos em conjunto, aproveitando os talentos e as capacidades individuais para a melhoria do indivíduo e do grupo. De que modo? É sobre isso que este estudo se desenvolve.

Introdução

As transformações sociais ocorridas durante e depois da Segunda Guerra Mundial provocaram mudanças imediatas no mercado de trabalho, nos costumes, nos meios de comunicação. As telecomunicações e as redes de computadores no decorrer da segunda metade do século XX ampliaram as possibilidades de se informar sobre o que acontece no dia a dia local e regional. Neste final de primeira década do século XXI, as pessoas em todo o mundo podem assistir em tempo real a erupção de um vulcão no norte da Europa; da mesma forma um médico pode coordenar uma cirurgia do coração com uma nanotecnologia como se ele pudesse estar navegando por uma artéria e sem estar na mesma sala de cirurgia, até mesmo, estar no outro lado do mundo.

Se nos perguntarmos como chegamos a essa tecnologia de ponta, teremos com certeza como resposta: muito estudo, muita pesquisa, muita indagação, muito comprometimento. Pesquisa, estudo, trabalho, comprometimento, obstáculos vencidos, conhecimento, habilidades, estas palavras são a chave para conhecer e aplicar ciência e tecnologia nos dias atuais.

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Voltemos, então, os nossos olhos (meus e seus, caro leitor) para a escola atual brasileira. Digo brasileira, porque sabemos que a escola em outros países também provoca a mesma preocupação, mas em diferentes regiões as características são particulares, pois essa instituição social para ser efetiva precisa ser adequada ao contexto em que se situa. A escola brasileira, pública e privada, com alguns oásis de qualidade em ambos os setores, abandonou a sua função específica de trabalhar a preservação do grupo social, que é manter seus valores e ao mesmo tempo promover a transformação desse mesmo grupo, corrigindo suas incorreções, preparando as diferentes gerações para solucionar problemas não resolvidos e buscar a melhoria de vida. Assumiu funções de alimentação e “guarda” das crianças e jovens enquanto pais e mães renunciam a essa função primordial de formação dos filhos, para amealharem bens materiais para “garantir um melhor futuro” para esses mesmos filhos. Nesse contexto, também como reflexo das transformações dos meados do século XX, a escola passa a ser uma escola para todos, mas, ao mesmo tempo, essa escola se empobrece e seus professores passam a serem trabalhadores sem qualificação adequada para manter a qualidade que se garantia para uma elite. Os cursos de Pedagogia se multiplicam e se espalham por todo o país. A EAD, como modalidade “salvadora da educação brasileira”, permite que um curso tenha, em um dado momento, em 2008, 17.000 alunos espalhados pelo país, com a possibilidade de assistir uma teleaula, e ouvir, desde que o desejassem, uma tutoria do professor pela Rádio Web. E esse curso, a que me refiro, era na época um oásis de qualidade, pelo menos em relação aos professores, às aulas, à tutoria central e ao material didático. Porém aí vem outra questão, e os professores tutores dos polos? São todos qualificados? Constatei que alguns são muito bem preparados, qualificados, atuantes e formadores de qualidade, mas a maioria... Será?

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Estas inquietações são trazidas na introdução deste capítulo, pois são elas que me instigaram a escrevê-lo e reportar minhas descobertas em um conjunto de pesquisas que desenvolvo desde minha atividade como coordenadora do grupo Ensino de Humanidades e Telemática no Núcleo de Pesquisas Aplicadas em Novas Tecnologias Aplicadas à Educação, Escola do Futuro, da USP. Instigaram-me enquanto mestranda e doutoranda da Faculdade e Educação da USP, professora do mestrado Tecnologia e Comunicação na UNIBAN, da Graduação no Centro Universitário São Camilo e na Faculdade Sumaré em São Paulo. Voltaram a provocar as pesquisas desenvolvidas nos nove anos como pesquisadora na Universidade Tuiuti do Paraná, dos quais oito anos foram vivenciados como professora do Programa de Pós-graduação em Educação, Stricto Sensu, além de três anos como Coordenadora Pedagógica de Educação a Distância na FACINTER. Os resultados que trago neste capítulo mostram que se passaram quinze anos dos primeiros resultados de pesquisa sobre formação de professores e as “novas tecnologias” na educação, mas as constatações não são muito diferentes. Não se consolidou uma nova didática necessária aos tempos de redes, hoje mais do que redes de computadores ou de comunicações, tempos de redes sociais.

As pesquisas que embasam estas reflexões têm a característica de serem qualitativas e de serem realizadas com base em literatura científica e ensaios sobre as tecnologias da informação e da comunicação, mídias, linguagens, formação de professores educação a distância, educação inclusiva, necessidades especiais, alunos com deficiência, tecnologias assistivas. Os dados foram coletados em questionários, entrevistas semi estruturadas, em diálogos espontâneos, em fóruns de discussão, em listas de discussão, em portfólios de cursos de formação de professores, seguindo diferentes roteiros e sistematizações, dependendo do objeto de cada pesquisa. A classificação e seleção de dados partiram de leituras e releituras

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com o olhar atento para a interrogação de cada pesquisa. Do discurso do sujeito, passou-se à redução a unidades de significado que permitiram a emergência de invariantes que foram agrupadas em convergências, ou categorias abertas. A análise fenomenológica hermenêutica busca nos testemunhos do sujeito, a sua percepção da realidade, a partir da estruturação dessa percepção por meio do gesto e da linguagem verbal. Do grupo de manifestações colhidas, analisam-se todas a partir da pergunta de pesquisa, buscando as unidades de significação e formulando um quadro com o “discurso na linguagem do sujeito”, a redução à unidades de significação, invariantes e as convergências. Trabalha-se assim uma rede de significados, não permanecendo na pura descrição, mas avançando para a interpretação em um movimento de reflexão sobre os sentidos dos dados analisados para os envolvidos na pesquisa (BICUDO, 2000,).

Da atuação de professores em projetos telemáticos

As primeiras pesquisas, de 1992 a 1996, resultaram em questionamentos que nos levaram a refletir sobre as práticas comunicacionais mediadas por suportes tecnológicos como as redes de computadores e os serviços de email, e listas de discussão, mas também os tradicionais meios de comunicação social, telefone, rádio, TV, fitas de áudio e fitas de vídeo, e ainda os mais antigos, como o texto escrito (carta, folheto, livro, mural). “Qual a relação entre aprender, pesquisar, e ensinar para uma melhor atuação do professor no uso das tecnologias de comunicação em sua prática pedagógica?”. Chegamos à conclusão de que as práticas comunicacionais no âmbito escolar foram influenciadas pelo contexto sociocultural, no qual professores e alunos estavam inseridos, mas essas práticas não incluíam, no geral, as mídias utilizadas por professores e alunos na interação social intencional. Constatamos que, em geral, “o por quê, para quê e o que ensinar

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e aprender na escola“ e “o como, quando, onde, quem com quem ensinar e aprender na escola”, foram determinados em um currículo documento que desconsiderava o conhecimento do professor, os interesses, necessidades e expectativas do aluno, e mesmo a necessidade que a sociedade, incluindo o mercado de trabalho precisariam num futuro próximo em que esses alunos se tornariam cidadãos participantes. Assim, os professores recebiam seus planos de ensino e elaboravam seus planos de aula de forma reativa. Ao definirem os materiais didáticos e os meios de comunicação, os suportes tecnológicos que usariam, limitavam-se a repetir o que já era costume, o que conheciam, ou o que exigisse menor esforço. Quando nos referimos à falta de qualificação do professor, referimo-nos à qualificação para o magistério em sua área de formação não para a utilização de tecnologias de informação e de comunicação como apoio à sua prática pedagógica. Constatamos, então, na pesquisa com professores envolvidos em projetos pedagógicos telemáticos, isto é que, pretendiam se comunicar via rede de computadores, com outras escolas, que um dos problemas era o da formação de professores para uma prática pedagógica que efetivasse a aprendizagem do aluno:

Como pedir a um coordenador pedagógico, por exemplo, que acompanhe e oriente seus professores num projeto pedagógico telemático em que se discute cidadania, se esse educador não tem claro para si os problemas de cidadania da comunidade em que sua escola se encontra, e ignora o significado da palavra telemática, ou ainda mais grave, não sabe o que é um projeto pedagógico? Como o professor de Matemática poderá orientar seus alunos para organizar planilhas eletrônicas com este ou aquele software, se não está bem claro para ele o significado da palavra planilha e que ela não existe a partir do computador, mas muito antes deste. Como envolver o professor de Inglês num projeto pedagógico telemático com professores de Inglês de outros países, se o que ele sabe fazer nas aulas de

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Inglês se refere apenas a “ensinar gramática” e não tem proficiência na língua viva, dinâmica, usada na comunicação internacional? (CORTELAZZO, 1996, p. 196).

Outra constatação resultante da pesquisa foi que muitos professores não refletiam ou não tinham claro para si os significados dos conceitos ensino e aprendizagem fossem os que ensinavam há muito tempo, ou os que eram iniciantes; Também não tinham explicito quais eram os seus objetivos de ensino, o que entendiam por técnicas, mídias de ensino e de aprendizagem. A maioria desses professores não compreendia o que era trabalho em rede, e redes de comunicações. Ao ouvirem o termo tecnologias pensavam em computadores e não associavam a palavra mídias com livro didático, quadro de giz, caderno. Não diferenciava a interdisciplinaridade da multidisciplinaridade.

Contudo, desde os primeiros anos da década de 1990, parcerias realizadas entre centros de pesquisa de universidades públicas em Salvador, São Paulo, Campinas, Florianópolis, Porto Alegre, Pernambuco, entre outras, e secretarias de educação ou mesmo com escolas públicas e privadas desenvolveram projetos de capacitação e formação continuada de professores para a utilização das tecnologias de informação e de comunicação.

Muitos dos projetos centraram-se apenas no desenvolvimento de habilidades em relação à tecnologia. Outros projetos eram desenvolvidos por doutorandos que orientavam os alunos, mas não dialogavam nem trabalhavam em conjunto com os professores, não possibilitando, assim, o desenvolvimento de autonomia do professor na coordenação de novos projetos pedagógicos. Mas outros projetos incorporaram, em sua preparação, a participação e a interlocução com os professores. Essa

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colaboração dos professores na elaboração do projeto tinha como finalidade o desenvolvimento de autonomia dos professores para dar continuidade à elaboração de novos projetos. Quando os pesquisadores das universidades ou das secretarias de educação terminavam a sua participação nos projetos por eles sugeridos e coordenados, os professores teriam se apropriado da dinâmica dos projetos, aprofundado seus conhecimentos na temática e desenvolvido novas habilidades. Refiro-me a dois exemplos de projetos na década de 1990 em Pernambuco: o projeto A Apropriação da Informática pela Escola Pública, no qual a equipe coordenadora do projeto envolveu toda a comunidade escolar. Disciplinas como Português, Matemática e História eram trabalhadas pelos alunos das três turmas de oitava série do Ensino Fundamental da Escola Arraial Novo do Bom Jesus, da rede municipal de Recife. Ainda em Pernambuco, o projeto pedagógico telemático De Olinda a Olanda, usando a BBS Cidadão do Futuro no Brasil, coordenado pela Ars Consult em conjunto com a Sociedade Nordestina de Ecologia, teve a participação de ,professores e alunos das escolas públicas e particulares do Estado de Pernambuco. Os professores foram orientados a estimular os alunos realizarem pesquisas e produzirem uma exposição, e encenação no monte dos Guararapes, Pernambuco, no dia 27 de outubro de 1995, sobre o período holandês no Brasil. Mais do que se comunicarem via rede de computadores os alunos aprenderam procedimentos de pesquisar, princípios de comunicação, utilizaram mídias tradicionais e integraram noções de robótica ao trabalharem com Lego Logo. O mais importante é que os professores, além de conhecerem sobre tecnologias de informação e de comunicação e suas possíveis aplicações na educação, aprofundaram seu conhecimento nas áreas de História, Arte, Geografia e Português, e desenvolveram suas habilidades operacionais em relação à tecnologia audiovisual e digital.

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Os dados desses e de outros projetos analisados revelaram que o comprometimento dos professores com os projetos variava de professor para professor, porém todos que participavam, acabavam por se envolver, pois eram orientados pela coordenação pedagógica da escola, e pelo coordenador do projeto, em um trabalho curricular. Para trabalhar o projeto telemático como elemento curricular, o professor precisava articulá-lo com seus objetivos de ensino, compreender as características do projeto e perceber qual era a sua contribuição para a efetividade da aprendizagem dos alunos. Assim, nesses projetos, o projeto telemático, via rede de computadores, não era mais uma novidade, mas mais um meio para atingir os objetivos educacionais. Em alguns projetos, o uso do computador demonstrou aos professores e alunos que um meio não substituía o outro. Por exemplo, percebeu-se que era fundamental, o desenvolvimento de um jornal impresso, para se poder pensar a produção de um jornal eletrônico como estratégia de comunicação em alguns projetos. Em vários testemunhos constatou-se a mesma prática bem sucedida: a coordenação do projeto trabalhava com os professores, para que constatassem as diferenças de linguagem quando as mídias são diferentes. Dessa forma, a capacitação dos professores como preparação do projeto a ser realizado com os alunos permitia aos professores desenvolverem autonomamente, no futuro, outros projetos.

Assim, pode-se afirmar que um dos pontos nevrálgicos da informatização educativa ou da implantação de novas tecnologias didáticas tem sido a prática de execução desses planos sem a articulação dos mesmos com uma política educacional ampla que tenha como ponto de partida programas de capacitação e atualização de todo o corpo pedagógico-administrativo escolar. Educadores, profissionais ligados às tecnologias de informação e comunicação, legisladores e representantes do executivo continuam produzindo dissertações, teses, artigos durante a década de

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1990 sobre a necessidade de uma preparação mais consistente do corpo pedagógico escolar para a execução dos projetos de redes nas escolas. Pelos dados coletados, constatou-se que novas iniciativas de formação continuada foram instaladas como resultado de muitas dessas pesquisas. Em alguns projetos, houve um real envolvimento de professores com a produção de material didático (avaliação e produção de software educacional); muitos professores perceberam e se apropriaram do novo papel do professor comunicador “compromissado com a revalorização do ser humano” que, segundo Garzón (1994, p. 55 apud CORTELAZZO, 1996, p. 197), se conceitualiza como “um ser que conhece, e que se comunica”.

Da necessidade de projetos colaborativos na educação básica e nos cursos de Licenciatura

Os projetos de pesquisa desenvolvidos na primeira metade da década de 2000 mostraram que se observava, e ainda se observa na prática tradicional de ensino nos cursos de Licenciatura, em especial nos cursos de Pedagogia, uma ênfase, na maior parte do curso, na abordagem teórica em disciplinas de fundamentos desconectadas das questões práticas que o futuro professor enfrentará na sala de aula – presencial ou virtual. Mais ainda, os fundamentos são oferecidos aos alunos a partir de textos escritos em uma linguagem hermética no nível dos pesquisadores especialistas no tema. Descolados da realidade ou marcados por uma ideologia doutrinadora, os dados revelam que os textos, xerocopiados, não atraem os alunos, também porque são descontextualizados do corpo total das obras de onde foram extraídos.

Da mesma forma, nessa abordagem tradicional, muitas vezes rotulada como teoria crítica, ou outra denominação parecida, docentes universitários utilizam como tecnologia de informação e comunicação, a fala,

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os textos escritos, transparências digitalizadas ou transcritas em programas de apresentação pelo computador, esquecendo-se das possibilidades que outras mídias oferecem para a pesquisa e para a produção e divulgação de conhecimento: a fotografia, o jornal, o cinema, a TV, o vídeo, o computador, as redes de computadores, a Web.

As pesquisas também desvelaram um contexto na Graduação, e mesmo nos cursos de Licenciatura, no qual, professores começavam a se articular colaborativamente para fazerem seus alunos, futuros professores, inverterem a orientação de sua pesquisa e de sua prática. Professores pesquisadores e empreendedores estimulam seus alunos, futuros professores, a buscarem na prática questões que precisam ser solucionadas ou que implicam melhoria de vida e buscar saber o que já existe na teoria que pode fazer entender essa prática, e se instrumentar de conhecimento e metodologia para responder as suas indagações. Os futuros professores são estimulados a incluir a pesquisa como prática profissional:

As aulas, estudos e leituras dos livros e textos teóricos constituem-se referências para as análises dos registros e levantamentos realizados nas investigações. Deste modo, o movimento é de relação entre prática e teoria, e tória e prática. Quanto mais realizamos levantamentos empíricos de fatos, acontecimentos e experiências que ocorrem no cotidiano escolar, maior é o nosso conhecimento da realidade da escola, quanto mais examinamos textos e referências, isto o corpo teórico, mais condições temos de explicar o que ocorre na escola (CORTELAZZO; ROMANOWSKI, 2006, p. 5).

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Uma vez sistematizado o problema, analisados e interpretados os dados, voltam à teoria para confirmá-la, refutá-la ou ampliá-la. Muitos desses professores passaram a utilizar as novas tecnologias como uma forma de fazer os professores discutirem e refletirem sobre sua prática. Nos cursos de pós-graduação lato sensu, de atualização e, mesmo em oficinas pedagógicas, os professores que articulavam comunicação, educação e tecnologia, ainda hoje, levam os profissionais que participam desses eventos a se aprofundarem em questões fundamentais de suas áreas de interesse, em didática e em metodologia, tendo como motivação a discussão, a sensibilização ou a familiarização com as novas tecnologias. As avaliações colhidas nesses eventos demonstram três tipos de profissionais que são encontrados no cotidiano da escola: os entusiastas que voltam às suas instituições querendo executar em sua prática pedagógica o que foi recém aprendido; os realistas que retornam às suas instituições planejando conhecer mais e reorganizar sua prática considerando as condições existentes em suas instituições; e os resistentes que retornam indicando uma lista de razões para aquelas novas tecnologias, metodologias ou abordagens apresentadas no evento não sejam sequer pensadas na sua instituição.

A prática colaborativa se intensifica com os avanços da tecnologia digital que encurta o tempo e a distância. As listas de discussão, os fóruns, o email aproximam os profissionais depois dos eventos. A comunicação se estreita e se aprofunda. Dados coletados em listas e fóruns de discussão demonstram como os professores passam a compartilhar testemunhos sobre suas dificuldades bem como soluções encontradas, abreviando os tempos de busca de solução. A maioria dos professores que iniciam esse movimento já o realizava por meio de carta, fax ou telefone, mas os tempos de intervalo entre as comunicações eram muito grandes. Com as tecnologias digitais e as redes de computadores, esses tempos se tornaram cada vez mais curtos. Assim as trocas se tornaram mais constantes e frequentes.

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A prática colaborativa, no entanto, exige o cumprimento de uma série de regras que nem todas as pessoas conseguem cumprir; e, em se tratando de professores universitários com uma prática cristalizada no individualismo e na competição, ela fica ainda mais difícil de ser instalada. As pesquisas desvelaram, então, que muitas práticas continuavam sendo tradicionais, sob um véu comunicacional inovador, sob um discurso de aparência colaborativa. A interação social comunicacional ao ser analisada demonstrava a unidirecionalidade do professor para o aluno, marcante. As tecnologias digitais estavam sendo utilizadas; os professores afirmavam ter integrado as tecnologias de informação e comunicação (no seu entender o uso do computador e da Internet) em sua prática, mas os suportes tecnológicos eram utilizados com a mesma didática com que era usado o livro, o retroprojetor ou o vídeo.

A ação colaborativa é uma ação que extrapola os ambientes escolares ou empresariais. Toda a atividade social, na família, na escola, na igreja, na sociedade, comporta níveis de colaboração. Os projetos educacionais colaborativos podem se desenvolver tanto em ambientes formais como em não formais; portanto, as pessoas precisam expandir suas habilidades em resolver problemas, criar situações de uma vivência harmoniosa e mais humana, umas com as outras em direção a um objetivo comum que as reúne. Os dados dessas pesquisas revelaram que os projetos desenvolvidos em ambiente escolar articulados com a realidade em que os seus participantes vivem, produziram maior comprometimento e melhor aprendizagem. Constituem-se como uma via de mão dupla que traz, da realidade externa à escola, elementos necessários para a aprendizagem significativa e, da mesma forma, levam resultados ou descobertas encontrados nesses projetos para aquela realidade, transformando-a e melhorando-a. As tecnologias digitais possibilitam que, cada vez mais, essa mão dupla vença as barreiras de tempo e distância entre professores e entre alunos.

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Já nos meados da década de 1990, projetos colaborativos se multiplicavam entre escolas da educação básica de diferentes regiões do Brasil e, mesmo do mundo.

Da iniciativa isolada de professores nos cursos de Licenciatura: ausência de uma didática pró-ativa e colaborativa nos currículos de Licenciatura

No início da década de 2000, as iniciativas de professores em escolas de educação básica, de cursos de Licenciatura, de cursos de especialização articuladas, pouco a pouco, às ações de centros de pesquisa de universidades públicas e privadas começam a se refletir nos currículos dos cursos de Graduação. Surgem as disciplinas “Tecnologias de Informação e de Comunicação na Educação”; “Tecnologias Aplicadas ao Ensino de Matemática”, Laboratório de Multimídia, “Educação a Distância”, entre outras, na grade curricular. Mas essas disciplinas foram e são atribuídas aos professores que “mexem com tecnologia”, raramente com formação em Pedagogia. Esses professores, empreendedores, pró-ativos e entusiastas acabavam por enfatizar o uso da tecnologia, pois não tiveram nem tempo, nem possibilidades de se qualificar de forma sistemática, e desenvolver uma nova didática que aproveitasse as características inerentes a essa utilização tecnológica; nem tempo para fazer a leitura crítica do uso dessas tecnologias antecipando seu impacto. Esses professores desenhavam projetos de curta duração para poderem desenvolver uma nova prática pedagógica. Passaram a integrar a questão da educação inclusiva e o uso das tecnologias assistivas que eram dois temas que provocavam e ainda provocam muita resistência dos gestores e professores em geral:

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As participações das alunas, dos professores e dos pesquisadores no Projeto iniciaram um movimento, ainda muito incipiente, de reflexão e ação em relação à inclusão de alunos com deficiência no processo de ensino aprendizagem da própria Universidade. Houve, também, um fórum de discussão no Mestrado em Educação sobre a formação de professores para a Educação Especial e para o ensino de Pessoas com Necessidades Especiais. Esse movimento reflete inclusive sobre o papel que as tecnologias podem ter como apoio aos professores, aos alunos na sua aprendizagem e, na sociedade, como tecnologias assistivas facilitando a sua atuação como cidadão (CORTELAZZO; ROCHA, 2006).

Como reflexões conclusivas dessas pesquisas, refiro-me à necessidade de levar os professores atentarem para a questão de identidade epistemológica a que se refere Pimenta (2002, p. 166): para exercer a docência, é preciso entendê-la para além da identidade profissional, é necessário concebê-la como um campo de conhecimentos que abrange conteúdos específicos, conteúdos filosóficos, conteúdos de teoria da prática educacional, conteúdos didático-pedagógicos e conteúdos didático-tecnológicos. Ao mesmo tempo em que o professor aprofunda a sua consciência de sujeito que percorre sua trajetória com outros sujeitos, circunstancialmente seus alunos, esse profissional precisa realizar, com eles, o aprofundamento de sua consciência como sujeito que precisa desenvolver uma identidade epistemológica, além da profissional ao se pensarem docentes. Não é suficiente cumprir currículos e aplicar técnicas; faz-se necessário articulá-los aos outros saberes que servem de terreno firme onde se pode caminhar com segurança.

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Da cultura escolar marcada pelas tecnologias digitais

Nos projetos de pesquisa sobre preparação dos professores para a educação a distância e para uma educação inclusiva, o Núcleo de Pesquisa em Processos Educacionais Interativos - NUPPEI, integrou pesquisadores das diversas faculdades da UTP, do Núcleo de Desenvolvimento de Tecnologias Assistivas NEDETA da Universidade Estadual do Pará, da FACED, da Universidade Federal da Bahia, entre outras instituições superiores. O NUPPEI desenvolve pesquisas sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação nos processos educacionais presenciais e/ou a distância a partir de questões como Quais são as tecnologias de comunicação interativas que aperfeiçoam o acesso à informação e a construção e compartilhamento de conhecimentos? De que forma elas podem contribuir para uma formação profissional inicial de qualidade? Como podem aperfeiçoar o acesso de um grande número de egressos do sistema educacional formal e propiciar uma formação continuada? Como as tecnologias de informação e comunicação apoiam a aprendizagem? Que formas de Avaliação devem ser desenvolvidas para acompanhar esses processos?

Os pesquisadores tiveram como fundamentação teórica, estudos de Schensul e Schensul (1992), Singh (2000) e de Ibiapina (2008) em relação à pesquisa colaborativa; estudos de Behrens (2002 2006) sobre as práticas pedagógicas e o paradigma da complexidade. Buscaram, nos estudos de Campos (2003), Varella (2002) Pallof e Pratt (2003), embasamento sobre colaboração e aprendizagem colaborativa; nos estudos de Blikstein e Cavallo (2002); fundamentação sobre as tecnologias e suas limitações e perigos; nos trabalhos de Cortelazzo (2004, 2005, 2006, 2009), Rocha (2009), Valentini (2003); reflexões sobre tecnologias em educação, ambientes de aprendizagem e prática pedagógica em EAD, nos livros organizados por

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Silva (2000, 2003), Campos (2003) e Santos e Silva (2006), teoria e relatos de experiências sobre ambientes virtuais, e-learning e interatividade.

Os pesquisadores deste projeto estiveram, também, realizando estudos sobre pesquisa colaborativa, de Mion (2001); estudos sobre tecnologias assistivas com base nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL 2001), na Declaração de Salamanca (1996); nos textos sobre tecnologias na educação, de Brito (2006), de Fraga e Pedroso (2006) e de Valente (1998 e 2001); sobre Tecnologias Assistivas, de Santarosa (1997), de Galvão e Damasceno (2003), de Hogetop e Santarosa (s.d.); sobre acessibilidade; de Henry (2005); sobre inclusão em EAD, de Cortinhas (2005). Buscaram também dados em entrevistas e textos de autores como Oliveira (2007, 2008), Kleina e Alcântara (2008), Cortelazzo, Palma e Rocha (2008), sobre utilizações de tecnologias assistivas por diferentes profissionais no processo educativo. Os egressos do curso de Pedagogia e do Mestrado em Educação realizaram um levantamento de teses e dissertações nos cinco anos anteriores

É importante ressaltar que esses pesquisadores são professores que atuam nas salas de aula da educação básica, da graduação e da pós-graduação (Lato Sensu e Stricto Sensu) e praticam aquele movimento de buscar na prática as instigações para na teoria conseguir subsídios para propor soluções ou melhorias na prática e para um desenvolvimento humano sustentável. Esses pesquisadores são leitores críticos das novas abordagens teóricas, metodologias de ensino e aprendizagem, bem como das tecnologias existentes e emergentes do ponto de vista da aplicabilidade no contexto em que são inseridas. Mais ainda, são “experimentadores” críticos de novas propostas, aplicando-as num processo colaborativo com seus alunos, futuros professores, para que aprendam a avaliar as novas alternativas testando-as.

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Chamamos a atenção para este fato, pois, constatamos nas falas dos professores e profissionais de design instrucional e de tecnologias de informação e de comunicação, a tendência para a importação de modelos prontos bem sucedidos em outras culturas para a cultura local, provocando ainda mais a resistência de coordenadores e professores.

Os resultados das pesquisas demonstram que as tecnologias de informação e de comunicação provocam um período de transição nas instituições escolares afetando a cultura escolar. As mudanças culturais na sociedade em geral, principalmente no que se refere, à comunicação social ocorrem muito mais rapidamente, mas acabam por abalar as estruturas, em geral, rígidas das instituições de ensino em geral e as de ensino superior em particular. Altera-se, no âmbito pedagógico, o sistema de transmissão cultural em aulas expositivas e leituras de textos impressos (na cultura brasileira, mais textos fotocopiados, do que textos impressos originais) para o sistema de flexibilização, incorporando a esses elementos outros suportes tecnológicos digitais e telemáticos. Muitas instituições, segundo os dados analisados, investem em sua infraestrutura tecnológica, multiplicando laboratórios de informática, criando seus sites, blogs e twitters, mas ignorando investimentos necessários para a formação didático-pedagógica de seus docentes. De modo que a didática nas modalidades de ensino presencial, semipresencial ou á distância continua com as mesmas características da didática tradicional ainda presente na prática docente com a unidirecionalidade do professor ou dos textos teóricos para os alunos nos diferentes níveis de ensino (da educação fundamental à educação superior). Como escreve Rivoltella, “trata-se de uma transição, própria da imagem de uma Brick University (Universidade-tijolo, só muros e edifício) que cede lugar à Brick-and-click University, onde o click, evidentemente evoca o teclado e o computador” (RIVOLTELLA, 2003, p. 52 apud RIVOLTELLA, 2004, p. 40). Não se agregam ao sistema formativo, as novas possibilidades

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que os ambientes online em particular e as tecnologias digitais, no geral oferecem para a educação. Verificou-se que as ferramentas mais utilizadas são as de postagem (quadros de aviso, apresentação de ementas e de bibliografias, indicação de tarefas), seguem-se o uso de fóruns de discussão, o monitoramento da “clicagem do aluno” e a postagem de instrumentos de avaliação.

No uso de fóruns de discussão, constataram-se duas práticas: ou o professor tenta responder a todas as participações dos alunos, e isso se torna uma tarefa hercúlea: ou o professor deixa que os alunos se comuniquem livremente; neste caso, as discussões perdem o foco provocam o distanciamento de muitos alunos. A razão é que uma nova relação professor/aluno precisa ser desenvolvida, no sentido de permitir a autonomia com responsabilidade dos alunos. Para isso, impõe-se uma nova didática, na qual a monitoria, isto é, o acompanhamento e a tutoria (ou seja, a orientação) são novas funções dos professores. Não há que se responder a todas as manifestações, mas há que se verificar como ocorrem, quais as relações estabelecidas entre elas e o tema da discussão e provocar sínteses, intenções de pesquisa, e novas temáticas de discussão.

Rivoltella (2004) ao tratar dessa questão indica que a monitoria e a avaliação poderiam ter como coordenadas, três dimensões: a avaliação do sistema formativo para verificação do que precisa ser melhorado; a avaliação da aprendizagem para poder aperfeiçoar os instrumentos online que facilitam o trabalho do professor e dos alunos; e o “controle de qualidade”, isto é, verificar se os objetivos de ensino e aprendizagem foram alcançados e a satisfação do professor e dos alunos efetivada. Acrescentamos a essas três dimensões, uma quarta, a dimensão da avaliação da produção de conhecimento realizada tanto como resultado da docência como da aprendizagem na educação superior.

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Rivoltella (2004) chama a atenção para o fato de que as tecnologias digitais possibilitam às instituições de ensino ofertar um sistema customer oriented, isto é, voltada para a clientilização. Os resultados das pesquisas também revelam que, principalmente nas instituições de ensino privadas isso vem acontecendo. A proliferação de portais universitários, nos quais os alunos encontram toda a informação de seu interesse em relação às questões administrativas e técnico-pedagógicas, mas, novamente, os dados mostram que há pouco espaço para a divulgação e orientação nas questões referentes ao conhecimento científico, às práticas pedagógicas e à pesquisa.

A dimensão didática é uma dimensão interna que carece de visibilidade porque ela é reveladora das práticas estabelecidas entre professores e alunos, o desenvolvimento de aprendizagem e a produção de conhecimento. Embora as tecnologias digitais ofereçam instrumentos para a valorização dessa dimensão, são inovações que não foram incorporadas de forma sistemática nem pelos docentes nem pelos alunos. Exigem-se dos professores novas habilidades técnicas e operacionais não exigidas anteriormente, como por exemplo, as competências relativas à organização e disponibilidade dos conteúdos. Rivoltella (2004) chama a atenção para a necessidade dos professores saberem construir um planejamento completo de suas aulas e um roteiro do curso quase um instrumento de “cenografia” que indica os tempos e os planos que os alunos seguirão para poder “navegar” pelo curso. Esse planejamento e roteiro estarão guardados em uma pasta na sala da coordenação, mas exposto à leitura e crítica dos alunos que não usufruirão das possibilidades da Web e agregarão valores à sua aprendizagem se esses instrumentos estiverem desenhados e calcados apenas sobre uma tecnologia de escrita (no tradicional formato de livros e artigos impressos).

As atividades didáticas em um ambiente altamente tecnológico permitem que os docentes desenvolvam em seus alunos atitudes para as

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atividades colaborativas. Rivoltella (2004) indica que há uma ampliação das possibilidades de se chegar e esse estado. Parte-se das atividades de tratamento informático dos testes, que permitem produzir hipertextos com imagens, atividades de organização e disponibilização de conteúdos utilizando-se os diferentes recursos disponibilizados na Web, a gestão da comunicação entre alunos nos bate-papos, fóruns, blogs e twitters, e finalmente nas atividades colaborativas que permitirão o uso dos talentos individuais integrados uns aos outros.

Os dados das pesquisas reforçam essa indicação de Rivoltella, e essa preocupação começa a se desenhar nos últimos anos, visto que as tecnologias digitais que permitem a exposição desses portais apresentam os pontos fortes, mas também ressaltam as fraquezas. Assim, alguns coordenadores de cursos na educação superior começam a se preocupar com uma nova didática pela imposição do mercado.

Considerações finais: É possível uma nova didática?

Este texto procurou trazer algumas de muitas questões encontradas nos resultados das pesquisas realizadas no período de 1992 a 2009.

Um período de muitas transformações culturais, introdução no mercado e na comunicação social de suportes tecnológicos e mídias que revolucionaram a comunicação e que começam a estarem presentes de uma forma expressiva nos ambientes educacionais, mesmo à revelia de muitos professores e gestores.

A área da educação foi invadida por profissionais de informática, da comunicação do design que, de certa forma, lhe deram novos ares. Os profissionais da educação, em particulares os pedagogos, são pressionados a dialogar e a refletir mais exaustivamente sobre interdisciplinaridade, para

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além de uma multidisciplinaridade em que se justapõem as disciplinas e os discursos dos seus representantes. São também obrigados a executar novos papéis e buscar formação e capacitação em outras áreas como a metodológica e a tecnológica.

Ao ver dos pesquisadores do NUPPEI, esta é uma situação desejável, pois se obrigam todos, envolvidos na educação, a repensar a organização da instituição de ensino em que as tecnologias não sejam nem determinantes da infraestrutura e do serviço, nem ignoradas, mas que seja um componente no qual gestores, professores e alunos possam se apoiar para conseguir seus objetivos.

Dessa forma, novas atitudes dos gestores das instituições de ensino em todos os níveis, mas, começando pela formação de formadores, fazem-se necessárias. Uma atitude de valorização do capital intelectual e empreendedor que essas instituições têm em seu corpo de funcionários de todos os níveis, administrativo, técnico e tecnológico, pedagógico e científico. Atitude de rede colaborativa, na qual cada recurso humano trabalha colaborativamente com o outro para que o objetivo maior que é a aprendizagem do aluno seja alcançada. Atitude de gestão do conhecimento para uma organização que aprende. Todos esses fatores propiciarão a fecundação de uma nova didática.

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Aulas Multimídias:um caminho possível para a autonomia intelectual dos educandos na rede municipal de ensino de Salvador?1

Célia Maria Silva de Souza(SECULT – Salvador)

Iza da Conceição Lopes(SECULT – Salvador)

DIÁLOGO INICIAL

A contemporaneidade e suas implicações, a exemplo da deterioração das relações institucionais, políticas e ambientais, trazem inúmeros desafios

1 Trabalho apresentado à disciplina Projetos e Experiências, do curso de especialização em Formação de Professores para Educação Infantil com Mídias Interativas, para obtenção do título de Especialista em Formação de Professores para a Educação Infantil com Mídias Interativas.

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para a população planetária. A velocidade e a quantidade de informações disponíveis, imbricadas no avanço científico e tecnológico, evidenciam a necessidade de sujeitos autônomos, que sejam capazes de lidar com a transitoriedade e as incertezas que signifiquem suas escolhas, a partir de uma perspectiva fundamentada em novos conceitos éticos, políticos e estéticos.

Como significar aprendizagens que atendam a essa autonomia? Como situar, nesse contexto, o uso educacional das TIC, mais especificamente das aulas multimídias? Em que medida a interação dos educandos com essas aulas multimídias, mediada em ambientes virtuais de aprendizagem, favorece a construção da autonomia intelectual?

Essas inquietações, aliadas a algumas mudanças2 ocorridas no cenário das Escolas da Rede Pública Municipal de Salvador, concernentes ao uso das tecnologias a partir da introdução do ‘Programa das Aulas Multimídias’, bem como a experiência profissional das autoras deste trabalho, vivenciada como professoras regentes e/ou como multiplicadoras da cultura tecnológica, em escolas da referida Rede de Ensino, instigaram a produção deste artigo.

O objetivo do presente estudo é investigar até que ponto a utilização das Aulas Multimídias, no contexto assinalado, favorece a autonomia dos alunos. Para tanto, desenvolveu-se um estudo de caso junto aos professores de uma determinada escola, situada no bairro de Itapuã, através da aplicação de questionário e de observação participante. Com o pensamento de autores que situam a complexidade e as demandas da sociedade do conhecimento, trataram-se as aprendizagens necessárias aos sujeitos para agirem de forma autônoma, além da integração das TIC na escola.

2 Desde que foi implantado, em 1998, o PETI - Programa de Educação e Tecnologias Inteligentes passou por várias mudanças. Na última, no início de 2007, através de uma parceria com uma empresa privada, foi implantado o Programa das Aulas Multimídias.

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COMPLEXIDADE E DEMANDAS DA SOCIEDADE DO CONHECIMENTO: EM BUSCA DA AUTONOMIA

Avalanches de informações são distribuídas diariamente nas redes de computadores, na televisão e em outros meios de comunicação, sejam eles mais antigos ou mais recentes. É possível ter acesso, no mesmo instante, a abordagens divergentes de um mesmo assunto. Os conhecimentos adquiridos na escola, na família e/ou através de qualquer suporte de informação, rapidamente podem se tornar obsoletos. Apesar da velocidade e da quantidade de informações disponíveis, “nunca foi tão difícil conhecer” (MORAN, 2007, p.40). O que se tem de mais concreto na sociedade do conhecimento são transitoriedades e incertezas.

O enfrentamento dessa realidade coloca vários desafios à educação. Morin (2001) menciona lacunas existentes no sistema educacional, salientando saberes imprescindíveis à educação das novas gerações. Nesta perspectiva, sugere a reorganização da educação através de correções dos defeitos do sistema. Para tanto, acredita que é fundamental ensinar que o conhecimento nunca é um reflexo ou um espelho da realidade, mas, sim, a tradução desta, o que “significa estar sempre buscando modos de conhecer o próprio ato de conhecer” (MORIN, 2001). Aprender a conhecer, um dos pilares da educação tratado no Relatório de Delors (1998, p. 90-91), é assim definido:

Este tipo de aprendizagem que visa não tanto à aquisição de um repertório de saberes codificados, mas antes ao domínio dos próprios instrumentos do conhecimento, pode ser considerado, simultaneamente, como um meio e como uma finalidade da vida.

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Assim, os métodos devem permitir apreender as relações mútuas e as influências entre o todo e as partes, buscando sempre a contextualização do objeto – conhecimento pertinente. Neste sentido, Moran (2007, p. 41) acrescenta:

Conhecer é relacionar, interagir, contextualizar, incorporar o que vem de fora. Conhecer é saber, desvendar, ir além da superfície, do previsível, da exterioridade. Conhecer é aprofundar os níveis de descoberta, é penetrar mais fundo nas coisas, na realidade, no nosso interior. Conhecer é tentar chegar ao nível da sabedoria da integração total, da percepção da grande síntese que se consegue ao comunicar-se com uma nova visão de mundo, das pessoas e com o mergulho profundo no nosso eu. [...].

Para chegar a esse nível de construção de conhecimentos, os sujeitos precisarão aprender a agir com certa autonomia intelectual, diante do objeto em estudo, o que condiciona o sistema educacional a fornecer aos estudantes meios para gerenciar a quantidade de informação a que tiverem acesso através da seleção e hierarquização do que lhes for mais útil. Além disso, as instituições educacionais precisarão dar conta de uma abordagem que considere tanto o indivíduo, quanto a sociedade e a espécie, parte de um todo indivisível. Isso sugere compreender a condição humana no seu aspecto múltiplo, como parte de uma unidade que constitui a identidade da

comunidade planetária, ressaltando também a importância da antropo-

ética – ética do bem pensar, em que é ponderado o resultado das ações em nível pessoal, local e global.

Dessa forma, um ensino instrucional, fragmentado em disciplinas, que privilegie a repetição e a memorização, não dará conta de atender à formação do pensamento complexo, tão necessário para o enfrentamento

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dos atuais desafios e mesmo para o entendimento da própria existência. O ato de aprender requer equilíbrio e alternância entre o pensamento divergente e o pensamento convergente, o sujeito precisa, ao mesmo tempo, agenciar confiança com imprevisibilidade e incertezas, sabendo tomar decisões coerentes. Esse domínio se dará em situações problematizadoras e contextualizadas que favoreçam o despertar da curiosidade intelectual, do sentido crítico e da compreensão da realidade, mediante “a aquisição de autonomia na capacidade de discernir” (DELORS, 1998, p. 91). Segundo Freire (2003, p. 107),

Ninguém é autônomo primeiro para depois decidir. A autonomia vai se construindo na experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas. [...] A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade.

Nesses termos, o desenvolvimento da autonomia intelectual pressupõe o efetivo exercício da liberdade de criação, da autoria, da criatividade, do correr e do assumir riscos, que, por sua vez, demandam situações de aprendizagem concretas, desafiadoras, abertas e flexíveis. Tais situações visam a desenvolver os potenciais do educando com ênfase na imaginação e criatividade, além de buscar incentivar, no discente, o empreendedorismo, a pró-atividade e seu papel enquanto agente de mudanças. Ter autonomia, no sentido aqui descrito, remete a “assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar [...]”. (FREIRE, 2003, p. 41).

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Foi abarcando essa visão de autonomia e a convicção de que “aprender é uma aventura criadora” (FREIRE, 2003 p. 69), que se investigou o atual modelo de integração das novas tecnologias, na Rede Municipal de Ensino de Salvador, ou seja, o Programa de Aulas Multimídias.

EMERGÊNCIA DO CIBERESPAÇO: UMA VERSÃO CONTEMPORÂNEA PARA O TERMO MULTIMÍDIA

Por volta dos anos oitenta, o uso da informática, que se limitava ao setor industrial, foi agregado às telecomunicações, à editoração, ao cinema e à televisão. Essa tendência à digitalização suscitou novas formas de mensagens “interativas”. É o que Pierre Lévy (1999, p. 32) chama de o “prenúncio contemporâneo da multimídia”. Para ele,

O termo “multimídia” significa, em princípio, aquilo que emprega diversos suportes ou diversos veículos de comunicação. Infelizmente, é raro que seja usado neste sentido. Hoje, a palavra refere-se geralmente a duas tendências principais dos sistemas de comunicação contemporâneos: a multimodalidade e a integração digital. (LÉVY, 1999, p. 63).

A concepção de Lévy sobre multimídia, ainda que expressa em um tom de crítica3, remete às diferentes significações que ocorreram ao termo,

3 Lévy defende o uso do termo multimídia para designar vários suportes e formatos em estratégias que são usados separadamente. Em sua opinião, se “desejamos designar de maneira clara a confluência de mídias separadas em direção a uma mesma rede digital integrada, deveríamos usar, de preferência, a palavra ‘unimídia’” (LÉVY, 1999, p. 62). Embora Carvalho (2002) ache lógica essa colocação de Lévi, do ponto de vista da própria composição dessa nova tecnologia (vários médias num mesmo suporte), ele não vê contribuição para o esclarecimento do conceito que vem sendo usado em sua terceira fase de evolução, como um documento digital interativo que integra diferentes formatos.

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desde que foi cunhado em 1959 por Levis e Harcleroad, no livro Instrucional Media and Methods de Broun, conforme foi relatado por Clark e Craing (apud CARVALHO, 2002). Nessa fase inicial, não se associava o uso desse termo à utilização dos computadores. Ele era empregado para descrever uma sessão ou apresentação em que se utilizasse mais de um formato, como texto, imagem, vídeo, som, dentre outros, em diferentes suportes que não fossem os informáticos.

Em um segundo momento, surge a expressão “pacotes multimídia” para designar um conjunto de documentos em diferentes formatos e suportes – vídeo, cassete, papel – destinados à formação, principalmente na educação à distância, sendo a estes agregados, posteriormente, os computadores e softwares educativos (CARVALHO, 2002).

Com a informática ”amigável” e a emergência do ciberespaço, vários formatos foram combinados em um mesmo documento, dando origem aos hiperdocumentos. Nessa terceira fase, surgia a expressão “documentos multimídia interativos”, os quais logo passaram a ser chamados apenas de documentos multimídias, pois se acreditava já estar implícita em sua semântica a questão da interatividade. Neste artigo, o termo multimídia é empregado como o descrito na terceira fase, ou seja, “a conversão operacional de tecnologias informáticas em interfaces e conectividade de suas funções integradas” (KAPELIAN apud SILVA, 2002, p. 35).

MULTIMÍDIA COMO OBJETO DE APRENDIZAGEM: UMA BREVE PERSPECTIVA DO USO DAS TIC EM EDUCAÇÃO

A versatilidade do computador, principal suporte para interação com a multimídia informática, oferece diversas possibilidades de usos, capazes de se adequarem a quase todas as concepções de ensino-aprendizagem. Neste

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sentido, Sancho (2006); Valente (1993); Coscarelli (2006) se reportam às principais e descrevem o tipo de software educativo utilizado. As correntes condutivista e neocondutivista concebem esse artefato como máquina de ensinar ou tutor inteligente. Essa modalidade de uso do computador é baseada na instrução programada e em métodos de ensino tradicionais. Como descreve Valente (1993, p. 2):

Quando o computador ensina o aluno, o computador assume o papel de máquina de ensinar e a abordagem educacional é a instrução auxiliada por computador. Essa abordagem tem suas raízes nos métodos de instrução programada tradicionais, porém, ao invés do papel ou do livro, é usado o computador. Os softwares que implementam essa abordagem podem ser divididos em duas categorias: tutoriais e exercício-e-prática (“drill-and-practice”).

Esses softwares, apesar de conterem elementos multimídia e, em alguns casos, apresentarem certo tipo de organização “hipertextual”, têm características fechadas. Organizam-se geralmente em estrutura linear seqüencial ou em estrutura de árvore. Nesses dois casos, o conteúdo é disposto de forma estruturada e ao sujeito resta pouca possibilidade de criação e intervenção sobre o documento. Limita-se apenas a avançar e recuar, seguindo o mesmo percurso ou, então, indo com um pouco mais de possibilidades em que cada nó remete a mais de um descendente (COSCARELLI, 2006; CARVALHO, 2002; VALENTE, 1993).

A utilização desses aplicativos, na escola, comumente está ligada a uma disciplina específica, para ajudar o professor a “dar a aula” e fixar o conteúdo estudado. Nessa perspectiva, as TIC são usadas para “reforçar as crenças existentes sobre os ambientes de ensino em que ensinar é

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explicar, aprender é escutar e o conhecimento é o que contém no livro-texto” (CUBAN, 1993 apud SANCHO, 2006, p. 22). Moran (2007) situa essa modalidade de uso das TIC no que chama de primeira etapa de apropriação pedagógica4 desses recursos nas escolas. Esta forma se reduz à utilização das “tecnologias para fazer melhor o mesmo” (MORAN, 2007, p. 91), o que não sugere quebra de paradigmas e mudanças para a Educação.

Outra modalidade de aplicativo, bastante utilizada na escola, são os jogos educacionais, que, comumente, têm função de atrair e manter o interesse dos educandos, além de desenvolver habilidades de aplicação de conhecimentos. Segundo Valente (1993, p. 10), “a pedagogia por trás dessa abordagem é a de exploração autodirigida ao invés da instrução explícita e direta”. Para esta concepção, a aprendizagem é mais efetiva quando o sujeito por si só estabelece relações. Sem dúvida, os jogos educacionais, de simulação ou não, em função de suas características lúdicas, contribuem para algum tipo de desenvolvimento cognitivo. Entretanto, na maioria dos casos, quando os educadores têm objetivos claros para o emprego desses recursos, são pontuais e se limitam à apropriação ou à fixação de conteúdos. Essa restrição constitui uma subtilização do recurso.

Já os programas de simulação digital possibilitam a interação dos estudantes com modelos simplificados do mundo real. Geralmente, são desenvolvidos para explicar fenômenos e situações em que seria difícil o contato direto. Para Valente (1993), a possibilidade de o aluno desenvolver hipóteses, testá-las, analisar resultados e refinar os conceitos coloca esses programas à frente dos tutoriais. Nesta modalidade, o computador deixa

4 A recorrência às etapas de integração das TIC nas escolas, sugeridas por Moran (2007), não tem função de transmitir linearidade. Essas etapas foram usadas neste artigo, para efeito didático e/ou para indicar maior evidência de uma sobre a outra, no processo de apropriação pedagógica desses recursos pelas escolas. As formas de uso das tecnologias, evidenciadas pelo autor para cada etapa, coexistem em maior ou menor grau nas instituições de ensino.

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de ser máquina de ensinar para ser usado como ferramenta de ensino. Vale salientar que, para o funcionamento efetivo dos programas de simulação, são necessários sistemas computacionais avançados, o que, na maioria dos casos, não é a realidade nas instituições escolares.

Com a perspectiva pedagógica da informática, amplia-se o uso do computador como ferramenta de apoio ao processo de ensino-aprendizagem, ou seja, “não é mais o instrumento que ensina o aprendiz, mas a ferramenta com a qual o aluno desenvolve algo, e, portanto, o aprendizado ocorre pelo fato de estar executando uma tarefa por intermédio do computador”. (VALENTE, 1993, p. 13). Assim, através dos editores de textos, das planilhas eletrônicas, dos editores de gráficos, gerenciadores de bancos de dados, da comunicação através da internet, dentre outros, os estudantes realizam atividades através das quais são oportunizadas aprendizagens e construção de conhecimentos. Para Valente (1993, p. 13),

Talvez estas ferramentas constituam uma das maiores fontes de mudança do ensino e do processo de manipular informação. As modalidades de software educativos descritos acima podem ser caracterizados como uma tentativa de computadorizar o ensino tradicional. Mais ou menos o que aconteceu nos primórdios do cinema quando cinema = teatro + câmera. Hoje o cinema tem sua técnica própria. Este mesmo fenômeno está acontecendo com o uso dos computadores na educação. Com a criação destes programas de manipulação da informação, estamos vendo nascer uma nova indústria de software educativo que pode causar um grande impacto na maneira como ensinamos e como nos relacionamos com os fatos e com o conhecimento.

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O pensamento de Valente indica que a tecnologia por si só não favorecerá ou desfavorecerá o processo educativo, os benefícios virão a partir de uma utilização intencional dos atores envolvidos. Nesse sentido, Moran (2007) situa essa perspectiva de utilização das TIC, defendida por Valente (1993), em uma segunda etapa de integração desses recursos na escola, sugerindo que proporcionam mudanças parciais por permitirem, através das possibilidades de criação de plataformas e espaços virtuais de comunicação, o desenvolvimento de atividades novas, dentro da escola e à distância. Entretanto, salienta que essas intervenções pontuais convivem com o ensino tradicional, centrado no professor, evidenciando que o mais

[...] importante, o que vale de verdade, continua sendo o currículo, as aulas presenciais, as notas. Típica desta segunda fase é a divisão entre grade curricular obrigatória (disciplinas) e atividades virtuais (projetos, webquets) que costumam ser voluntárias ou consideradas complementares. A escola continua a mesma, no essencial, mas há algumas mudanças pontuais, periféricas, que começam a pressionar por mudanças mais estruturais. (MORAN, 2007, p. 92).

Referências sobre o computador e a Internet, como máquinas de ensinar e ferramentas de apoio às práticas pedagógicas, descritas até aqui, são objeto de discordância de alguns teóricos, dentre eles, Lévy (1999) e Coscareli (2006). Esses autores acreditam que as tecnologias inteligentes surgem como possibilidade de mudanças da educação e de uma nova relação com o saber, mais condizentes com as habilidades exigidas para superação de desafios do mundo contemporâneo, em constante mutação. Neste sentido Lévy (1999, p. 172) coloca:

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Ao prolongar determinadas capacidades cognitivas humanas (memória, imaginação, percepção), as tecnologias intelectuais como suporte digital redefine seu alcance, seu significado e, em algumas vezes, sua natureza. As novas possibilidades de criação coletiva distribuída, aprendizagem cooperativa e colaboração em redes oferecidas pelo ciberespaço colocam em questão o funcionamento das instituições e os modos habituais de divisão do trabalho, tanto nas empresas como nas escolas.

A partir desses pressupostos, vários especialistas sugerem novas condições ao trabalho escolar, tais como: flexibilização do currículo; novos espaços e tempos de aprendizagem; reorganização dos ambientes presenciais; ênfase na metodologia de pesquisa e na resolução de problemas; adequação do conhecimento ao contexto pessoal, regional e global, uso da tecnologia como canal de comunicação, produção, divulgação e visibilidade de vozes não veiculadas na mídia comercial e formação de redes de solidariedade (LÉVY, 1996; SILVA, 2002; OROFINO, 2005; COSCORELLI, 2006; MORAN, 2007, dentre outros).

As mudanças sugeridas acima encontram vários entraves quando ocorrem, realmente, no sistema educacional: são lentas nas universidades e muito inexpressivas nas escolas de ensino fundamental e médio, ocasionadas, principalmente, pela pressão exercida a essas instituições pelas Secretárias de Educação, em relação ao currículo, pelas expectativas da família, pelo que é exigido no vestibular, pela cultura escolar tradicional e pela cultura social conservadora (MORAN, 2007). Dessa forma, a quebra de paradigmas esperada na educação, através das novas tecnologias, não ocorreu até aqui e não ocorrerá apenas pela simples introdução desses recursos no espaço escolar, mas por uma ampla reforma na própria concepção de Sistema Escolar que perpassa, dentre outros fatores, pela criação de novos espaços

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de aprendizagens, pela flexibilização do currículo e, prioritariamente, pela revolução conceitual do pensamento dos próprios agentes desse Sistema.

MULTIMÍDIA, AUTONOMIA E NOVAS POSSIBILIDADES HIPERTEXTUAIS

A hipertextualidade, possibilitada pela rede mundial de computadores, favorece uma forma de pensamento não linear, que permite ao internauta decidir o seu próprio percurso, selecionar possibilidades, inferir e interferir sobre o conteúdo e construir coletivamente, tornando-se co-autor e autor ao mesmo tempo. Neste sentido, Silva (2002, p. 15) coloca:

O hipertexto se apresenta então como novo paradigma tecnológico que liberta o usuário da lógica unívoca, [...] ele democratiza a relação do indivíduo com a informação, permitindo que ultrapasse a condição de consumidor passivo para a condição de sujeito operativo, participativo e criativo. [...] ‘o hipertexto é essencialmente um sistema interativo’.

Segundo Silva (2002), o conceito de interatividade é fundamentado na epistemologia da complexidade, podendo então favorecer a construção de conhecimentos dessa natureza. É importante salientar que interatividade é a disponibilização de um mais comunicacional de modo expressivamente complexo, que se fundamenta na participação-intervenção, bidirecionalidade-hibridização e permutabilidade-potencialidade. A construção de conhecimentos, a partir desses princípios, é mais aberta e não se limita apenas ao uso das hipermídias, pode e deve se tornar fundamento da sala de aula. Para Moran (1998 apud MORAN et al., 2000),

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A construção do conhecimento, a partir, do processamento multimídico, é mais “livre,” menos rígida, com conexões mais abertas, que passam pelo sensorial, pelo emocional e pela organização do racional; uma organização provisória, que se modifica com facilidade, que cria convergências e divergências instantâneas, que precisa de processamento múltiplo instantâneo e de respostas imediatas. (MORAN et al., 2000, p. 19).

Retomando o sentido de autonomia, discutido anteriormente como exercício da liberdade de criação, da autoria, da criatividade, do correr e do assumir riscos e enfrentar desafios, pode-se dizer que é perceptível uma oportuna compatibilidade entre a autonomia e a linguagem da multimídia hipertextual. Entretanto, é importante perceber:

O fato de incorporar imagens, textos, sons, animação, e mesmo de interligar informações em seqüências não-lineares, como atualmente utilizadas em multimídia, e hipermídia, não é garantia de boa qualidade pedagógica e de uma nova abordagem educacional. Programas visualmente agradáveis, bonitos e até criativos podem continuar representando o paradigma instrucionista ao colocar no recurso tecnológico uma série de informações a ser repassada ao aluno. Desta forma, continuamos preservando e expandindo a velha forma como fomos educados, sem refletir sobre o significado de uma nova prática pedagógica que utilize esses novos instrumentos. (MORAES, 1997, p. 16).

Pelo exposto, incorporar as tecnologias na escola não é simplesmente enchê-las de computadores e softwares, procurando uma maneira mais fácil e massificante de utilizá-los, pois continuar perpetuando a visão

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tradicionalista e a fragmentação do conhecimento é simplesmente atingir a “otimização do péssimo” (MORAES, 1997, p.16).

O PROGRAMA DE AULAS MULTIMÍDIAS DA REDE MUNICIPAL DE SALVADOR

O Programa de Aulas Multimídias da Rede Municipal de Salvador, disponibilizado a 150 escolas da referida rede, a partir do início de 2007, é fruto de uma parceria entre a SMEC – Secretaria Municipal de Educação e Cultura e a Empresa Educandus. Essas instituições são responsáveis por desenvolver um conjunto de conteúdos multimídias em CD-ROM e web, envolvendo as disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, Geografia e História. Para o desenvolvimento dessas aulas, foi criado um Centro de Produção de Aulas (Fábrica do Saber), que conta com profissionais especializados em cada disciplina pedagógica, além dos profissionais ligados à área de informática e design. Esse software educacional foi implantado com o objetivo de melhorar a qualidade do ensino com o uso da tecnologia, através “da eficiência ao planejamento e à elaboração de aulas”. Propõe aprendizado nas diferentes áreas do conhecimento, através da utilização imediata da tecnologia educacional no processo de ensino-aprendizagem. Inicialmente, foram elaboradas 32 aulas, para as classes da 1ª à 4ª série e depois 40 para as classes da 5ª à 8ª, pela própria empresa parceira, sem nenhuma intervenção dos professores da Rede Municipal de Ensino.

Para a introdução do programa nas escolas, os professores de tecnologias,5 que já desenvolviam um trabalho flexível6 com o uso das TIC,

5 Professor de tecnologias é uma denominação dada, na Rede Pública Municipal de Salvador, para professores que, em tese, devem disseminar a cultura tecnológica nas escolas.

6 O trabalho era desenvolvido através da produção de home page, blogs, webquest, produção de vídeos, produção de gráficos, desenhos, textos, dentre outros, frutos de uma parceria entre o professor de tecnologia e o professor regente.

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receberam uma capacitação, desenvolvida pelos técnicos da Educandus, visando inicialmente à apropriação da nova proposta e, num segundo momento, à disseminação da mesma para os outros professores da rede.

A implantação do Programa de Aulas Multimídias nas escolas, foi um momento de expressivas insatisfações de muitos professores. Essas insatisfações são justificadas pela falta de preparo da maioria dos professores regentes para operacionalizar os computadores e o novo software educacional, tendo em vista que se tornariam responsáveis pela aplicação das aulas. Além disso, questões relacionadas à infraestrutura, como a desproporção entre a quantidade de alunos e o número de micros, a lentidão do provedor para abertura das aulas, dificuldades na configuração das máquinas e acesso à Internet foram apontadas como principais entraves para o desenvolvimento da proposta.

No que concerne à avaliação do Programa de Aulas Multimídias, os professores regentes e os de tecnologias dividem opiniões. Alguns acham que as aulas desenvolvidas são mais um suporte de enriquecimento e fixação dos conteúdos estudados na sala de aula, enquanto outros classificam o software como fechado, pautado no estímulo-resposta, com pouca possibilidade de criação e produção dos educandos, muito parecido com o livro didático.

• Portal PETI: Aulas Multimídias como Software Educacional

De acordo com o Manual de descrição, disponibilizado no próprio ambiente, o Portal é um ambiente virtual de aprendizagem ou Learning Management System (LMS), que possui recursos de comunicação,

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armazenamento de informações e gerenciamento de dados, gráficos e planilhas.

Em tese, esse Ambiente Virtual de Aprendizagem – AVA dispõe de:

Central de Relacionamento: canal de atendimento para os usuários do portal e para a rede municipal de educação de Salvador; Professor Web: professores à disposição para atender os alunos em suas dúvidas e resolução de exercícios; Gestão de Conteúdos: permite o gerenciamento de notícias, destaques, galeria de imagens, quadro de avisos e central de comunicação entre os usuários do portal; Conteúdo Didático: conteúdos organizados por disciplina, para cada segmento de ensino, estruturados em aulas web, com animações, imagens, mapas, vídeos, formulários, simulações, jogos virtuais e outros recursos que contribuem para aprendizagens em diversos campos do conhecimento; Fórum: permite a realização de discussões sobre temas que contribuem para a formação dos professores, através da criação de redes virtuais que possibilitem diálogos e trocas significativas; Chat: ferramenta de comunicação em tempo real entre alunos, professores e gestores (bate-papo); Painel de Gestão: relatórios e gráficos para controle de freqüência, desempenho individual, atividades realizadas e tempo utilizado em cada atividade (PORTAL PETI, 2007).

• Descrição e Análise da Estrutura das Aulas Multimídias

As aulas multimídias, disponibilizadas em CD-ROM e Web, seguem a mesma estrutura. São organizadas por disciplina, distribuídas na tela através de ícones. No caso das aulas em CD-ROM, além da organização

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por disciplina, também se agrupam por série. O ícone de cada disciplina dá acesso a uma listagem de conteúdos; o ícone de cada conteúdo dá acesso a uma nova aula. A navegação nessas aulas se dá através de botões que permitem avançar e retroceder. A linguagem utilizada é composta por texto, imagem, som e, em alguns casos, por elementos do jogo. Através do áudio, são dadas orientações para que os alunos possam realizar as atividades propostas. Há um ícone, em cada aula, chamado professor web, que permite ao aluno tirar dúvidas, informar erros ou dar sugestões sobre a aula. A partir das características descritas, o Programa de Aulas Multimídias pode ser classificado como um software tutorial.

RESULTADO DA PESQUISA

A pesquisa foi realizada com 13 professoras de uma escola da Rede Pública Municipal de Salvador, situada no bairro de Itapuã. Foi aplicado um questionário que evidenciou a visão dessas educadoras em relação à contribuição do Programa de Aulas Multimídias, adotado pela referida Rede de Ensino, para o desenvolvimento da autonomia dos educandos. Utilizou-se também a observação participante, visto que, uma das autoras deste artigo integra o grupo de educadores do Programa.

Como evidenciado na Figura 1, 85% das professoras pesquisadas responderam que as aulas multimídias favorecem muito o desenvolvimento da autonomia intelectual dos estudantes, enquanto 15% acham que favorece pouco.

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Figura 1 – Em que medida as aulas multimídia favorecem o desenvolvimento da autonomia intelectual dos educandos

Entretanto, ao justificarem sua opção, 36% dos casos relacionaram-na com a apropriação do uso do computador, enfatizando a atual necessidade de os sujeitos saberem manusear esse recurso, e 18%, além de evidenciar esse manuseio, mencionaram o prazer que os participantes demonstram ao interagir com esse suporte, como pode ser percebido nos seguintes comentários:

“É importante porque desenvolve o conhecimento tecnológico, já que vivemos na era tecnológica.”

“É interessante porque, nas aulas multimídias, os alunos gostam de manusear o computador, tudo lá é mais prazeroso para eles.”

Os 46% restantes apontaram, como principal motivo para a justificativa, o desenvolvimento do autodidatismo e da aprendizagem

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colaborativa, bem como a possibilidade de complementar o conteúdo estudado em sala de aula. Observa-se que, nessas avaliações, não há referências ao pensamento reflexivo, à metacognição e à criatividade dos sujeitos diante do objeto da aprendizagem. O entendimento de autonomia intelectual, enquanto liberdade de criação, possibilidade de fazer relações, enfrentar desafios, dentre outros apresentados neste artigo, não apareceram nas respostas das professoras.

Com relação à interação dos educandos com as aulas multimídias (FIGURA 2), em 54% dos casos, as professoras disseram identificar tentativa e erro como aspecto sobressalente nessa interação; 15% destacaram o fato de eles buscarem entender o que é questionado na atividade; já 8% consideram a necessidade de os alunos tirarem dúvidas como aspecto preponderante; outros 8% evidenciam a predominância na relação feita pelos alunos entre conteúdos estudados na sala de aula e os estudados através das aulas de multimídias.

Figura 2 – Aspecto identificado com maior frequência na interação aluno/aula

multimídia

Quando questionadas em relação ao benefício das aulas multimídias para a aprendizagem dos alunos (FIGURA 3), as professoras, em 23% de suas respostas, apontaram que é uma forma prazerosa de aprender; 15% acreditam que favorece a interatividade; outros 15% sinalizaram que

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propiciam a criatividade e a produção do aluno; enquanto 8%, não vêem muito beneficio nas aulas multimídias, pela pouca possibilidade de criação que o referido recurso oferece; outra professora (8%) vê benefícios para fixação dos conteúdos. Ninguém marcou as opções “desenvolve a autonomia intelectual” e “não traz nenhum beneficio”; 23% anularam a questão.

Figura 3 – Benefício que as aulas multimídias trazem para a aprendizagem

Durante a observação feita na mesma escola, em momentos distintos da interação com as aulas multimídias, nas turmas do 1º, 4º e 5º anos de escolarização, o item “tentativa e erro” também se apresentou como o aspecto principal, dessas interações. Os alunos respondiam e clicavam insistentemente nos ícones para checar a validade de suas respostas. O áudio repetidamente dizia “tente novamente”, se eles não indicassem a resposta certa na atividade, ou “parabéns, você acertou”, para os casos de acertos. Isto foi muito evidente em todas as turmas observadas, principalmente, entre os alunos com estágio de leitura e escrita menos avançado – que se centram muito mais em manusear o computador, experimentando o movimento das imagens e o som do áudio do que na própria atividade.

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Outro aspecto relevante identificado na observação foi a forma como as crianças se preocupavam em ajudar outros colegas que sentiam dificuldade em operacionalizar a aula multimídia. Essa cooperação diz respeito muito mais ao manuseio do software do que ao conteúdo propriamente dito.

A tabela abaixo mostra, em ordem crescente, enumerados de um a cinco, os fatores eleitos pelas professoras como os que mais dificultam o uso efetivo das aulas multimídias, na escola. De acordo com as opções feitas, a inadequação da infraestrutura dos laboratórios, que se repete na primeira e terceira posição, respectivamente com 38% e 23% dos votos, é a principal dificuldade para o avanço da proposta. Mas, há também a falta de formação do professor que ficou, na segunda posição, com 23% dos votos e a pouca possibilidade na abordagem do conteúdo que aparece em duas posições entre as cinco mais votadas – terceira e quarta – com 23% e 15% dos votos.

Representando 15% das escolhas, ao mesmo tempo aparecem, em quarto e quinto lugares, a pouca possibilidade de produção, criatividade e expressão do pensamento oferecida no recurso e a descontextualização das aulas.

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As impressões das professoras que responderam à pesquisa, na sua maioria, bem como os dados coletados na observação remetem à utilização do objeto de aprendizagem em estudo através do estímulo-resposta, isto é, com pouca reflexão por parte dos estudantes, acerca do que está sendo realizado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ponto de partida deste artigo foi investigar em que medida o Programa de Aulas Multimídias da Rede Pública Municipal de Salvador desenvolve a autonomia intelectual dos educandos. Com esse objetivo, buscou-se significar aprendizagens que favorecem a autonomia necessária aos sujeitos para conviverem com a velocidade e o acúmulo de informações disponíveis na contemporaneidade, bem como com os seus desafios.

Com suporte teórico em Morin (2001), apresentou-se a necessidade de reorganizar a educação, dando ênfase a novos modos de conhecer que privilegiem a contextualização e interconectividade do objeto do conhecimento em suas multiplicidades, o que não se prende especificamente a saberes codificados, mas, sobretudo, a aprender a conhecer o próprio ato de conhecer.

Além disso, discutiu-se que o desenvolvimento da autonomia intelectual implica numa abordagem que considere a condição humana como parte do todo que a constitui, concluindo-se que toda ação, dentro deste ecossistema, deve se orientar por novos princípios éticos que se situem em nível pessoal, local e global. Dessa forma, verificou-se que o ensino instrucional focado em disciplina não dará conta de atender a tais demandas, muito menos para possibilitar o desenvolvimento da autonomia, tão necessária aos sujeitos da contemporaneidade.

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Abordou-se a emergência do ciberespaço como propulsor de uma nova versão da multimídia, ou seja, a combinação, em um mesmo suporte digital de texto, imagem e som, trazendo o panorama do seu uso na educação. A versatilidade do computador como campo fértil, capaz de atender a quase todas as concepções de ensino. Nesse sentido, esse recurso pode ser utilizado como máquina de ensinar, ferramenta de ensino ou como suporte potencializador de novas possibilidades para a educação.

Entretanto, como evidenciado na pesquisa e na revisão de literatura realizada, a integração das Novas Tecnologias ainda não resultou nas mudanças anunciadas e esperadas para a educação. Na maioria dos casos, os recursos tecnológicos tem sido empregados como apêndice das práticas pedagógicas e como cristalizadores do ensino instrucional. Isso pode ser comprovado na Rede Pública Municipal de Salvador, através da implantação do Programa de Aulas Multimídias, que muito se aproxima de uma versão digital do livro didático, com mais interação e animação.

Os dados da pesquisa revelaram que, apesar desta concepção instrucional de utilização do computador e da Internet, os estudantes apresentam certa autonomia em relação ao manuseio desse recurso. Entretanto, para obter a autonomia defendida por Freire (2003), como exercício da liberdade de criação e da autoria, que privilegie a metodologia de resolução de problemas e a pesquisa, o ponto de vista sobre o uso das TIC deve caminhar em uma direção que proporcione um maior grau de criatividade, autoria e consumo critico dessas mídias.

Outro dado relevante da pesquisa diz respeito ao uso efetivo do Programa de Aulas Multimídias que é comprometido pela inadequação da infraestrutura dos laboratórios de informática, tanto em relação ao número de microcomputadores para a quantidade de estudantes, como pela baixa velocidade do provedor para a abertura das aulas. Também é

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apontada a falta de formação do professor, que se sente despreparado para operacionalizar as aulas e o computador.

Verificou-se também que o Portal do PETI - Programa de Aulas Multimídias disponibiliza algumas ferramentas de comunicação que podem ser usadas para abrir o diálogo entre os estudantes, técnicos e professores. É uma oportunidade de promover o consumo crítico dessa mídia. No entanto, na maioria dos casos, esses recursos não são explorados, mesmo porque, ainda que constituam o que o Programa tem de melhor, não é a predominância da sua concepção.

Diante do exposto, visualizam-se a premência de se criarem novos espaços de aprendizagem que facilitem a vivência de processos criativos, que desenvolvam a autoconfiança e possibilitem às novas gerações enfrentar desafios, inovar, refletir sobre a realidade, encontrando soluções alternativas e criativas para melhorar a qualidade de vida no planeta. A autonomia desejada, como vimos em Freire (2003, p. 107), “é processo, é vir a ser”, carece, portanto, de oportunidades para o seu desenvolvimento.

Referências

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COSCORELLI, Carla Viana. A tecnologia da informação na escola. In: ______ (Org.). Novas tecnologias, novos textos, novas formas de pensar. 3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

DELORS, Jacques (Coord.). Educação: um tesouro a descobrir. Brasília: Unesco; MEC, 1998.

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FREIRE, Paulo. A pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2003.

LÉVY. Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.

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MORAN, J. M. A educação que desejamos: novos desafios para e como chegar lá. Campinas: Papirus, 2007.

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MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 3. ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2001.

OROFINO, Maria Isabel. Mídias e mediação escolar: pedagogia dos meios, participação e visibilidade. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire, 2005.

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Sobre os Autores

Antonio Dias Nascimento (UNEB)Pós-doutor em Educação Musical (Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS), Doutor em Sociologia com ênfase em Educação Popular (The University of Liverpool, Inglaterra) e Mestre em Ciências Sociais (Universidade Federal da Bahia – UFBA). Graduado em Filosofia (Universidade Federal de Pernambuco UFPE) e em Comunicação (UFBA). Professor Titular e Professor Permanente do Programa de Pós-graduação em Educação e Contemporaneidade da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). E-mail: [email protected]

Alex Sandro Gomes (UFPE)Doutor em Ciências da Educação (Université de Paris V - René Descartes, França). Engenheiro Eletrônico e Mestre em Psicologia Cognitiva (UFPE). Professor Adjunto II no Centro de Informática da Universidade Federal de Pernambuco. Membro da Academia Pernambucana de Ciências. E-mail: [email protected]

Célia Maria Silva de Souza (SECULT - Salvador)Especialista em Formação de Professor para a Educação Infantil com Mídias Interativas e Bacharel em Pedagogia (Universidade do Estado da Bahia - UNEB). Professora da Rede de Ensino da Prefeitura Municipal de Salvador e atua na Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (LIMPURB) na área de Educação Ambiental Comunitária. E-mail: [email protected]

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Dinani Amorim (UNEB)Doutora em Electrónica y Computación (Universidad de Santiago de Compostela, Espanha, reconhecido como Ciências da Computação e Matemática Computacional pela Universidade de São Paulo - USP). Especialista em Informática (Universidade Federal de Pernambuco - UFPE). Graduada em Ciência da Computação (Universidade Católica de Pernambuco). Professora da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e Professora Titular da Faculdade de Ciencias Aplicadas e Sociais de Petrolina (FACAPE). Atua na área de Inteligência Artificial com ênfase em Redes Neurais Artificiais e Representação de Conhecimento. E-mail: [email protected]

Edmea Santos (UERJ)Doutora e Mestre em Educação (Universidade Federal da Bahia - UFBA). Pedagoga (Universidade Católica de Salvador – UCSal). Professora Adjunta do Departamento de Estudos de Educação a Distância na área de Informática da Faculdade de Educação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Atua no Programa de Pós-Graduação em Educação (UERJ), na linha de pesquisa Cotidiano e Cultura Escolar. Ex-professora visitante no PPGE da UFJF e ex-professora auxiliar no curso de Pedagogia da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). E-mail: [email protected]

Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo (UTP)Doutora e Mestre em Educação (Universidade de São Paulo - USP). Graduada em História (USP). Coordenadora de Tecnologia na Educação da COTED-CT e Professora do DEPED UTFPR, Campus Curitiba. Coordenadora de Pesquisa, Iniciação Científica e Editoração Científica - PROPPE/UTP. Membro da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) e do CRIE Curitiba (PR/UNU). Ex-coordenadora do Núcleo de

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Pesquisa em Processos Educacionais Interativos NUPPEI. Ex-pesquisadora e Professor Adjunto do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. E-mail: [email protected]

Iza Lopes (SECULT - Salvador)Especialista em Formação de Professores para Educação Infantil com Mídias Interativas (Universidade do Estado da Bahia - UNEB) e em Tecnologias em Educação (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro). Graduada em Pedagogia (Universidade do Estado da Bahia - UNEB). Professor/formador da Secretaria Municipal da Educação, Cultura, Esporte e Lazer - SME da Prefeitura Municipal de Salvador. E-mail: [email protected]

Jusamara Souza (UFRGS)Doutora em Educação Musical e Mestre (Universidade de Bremen, Alemanha). Graduada em Instrumento - Piano (Universidade Federal de Uberlândia). Licenciada em Música e Artes (Universidade de Bremen, Alemanha). Bolsista de Produtividade em Pesquisa 1D. Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Diretora da Editora da UFRGS. Ex-presidente da Associação Brasileira de Educação Musical. Atua na área de Artes, com ênfase em Educação musical, principalmente nos temas Educação Musical, Aprendizagem e Ensino de Música no Cotidiano, Sociologia da Educação Musical. E-mail: [email protected]

Lynn Alves (UNEB)Pós-doutora na área de Jogos eletrônicos e Aprendizagem (Università degli Studi di Torino, Itália). Doutora e Mestre em Educação (Universidade

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Federal da Bahia - UFBA). Graduada em Pedagogia (Faculdade de Educação da Bahia). Professora Adjunta e Pesquisadora do SENAI-CIMATEC, Departamento Regional da Bahia (Núcleo de Modelagem Computacional) e da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). E-mail:[email protected]

Maria Olívia de Matos Oliveira (UNEB)Pós-Doutora em Educação (UERJ); Doutora em Calidad y Procesos de Innovación Educativa (Universidad Autonoma de Barcelona), Mestre em Calidad Educativa (Universidade Autónoma de Barcelona) e Mestre em Educação (Universidade Federal da Bahia - UFBA). Graduada em Pedagogia (UFBA). Especialista em EAD (Católica Virtual de Brasília). Professor Titular da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Professor titular da Universidade do Estado da Bahia. Trabalha com os processos formativos a Distância e as tecnologias aplicadas a Educação, atuando principalmente nas áreas de Formação de Professores para a Educação Infantil e EJA, Mídia e Mediação Pedagógica. E-mail:[email protected]

Ricardo Amorim (UNEB)Doutor em Electrónica y Computación (Universidad de Santiago de Compostela, Espanha, reconhecido como Ciências da Computação e Matemática Computacional pela Universidade de São Paulo - USP) e Mestre em Engenharia de Produção com ênfase em Mídia e Conhecimento (Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC). Graduado em Ciência da Computação (Universidade Católica de Pernambuco). Professor Adjunto da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e Professor Titular da Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina. E-mail: [email protected]

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Sandra Maria Farias Loureiro de Souza (FTC)Pós-graduada em Gestão Educacional (Faculdades Olga Mettig). Mestre pelo Programa em Educação e Contemporaneidade (Universidade do Estado da Bahia - UNEB). Licenciada em Desenho e Plástica (Universidade Federal da Bahia - UFBA). Coordenadora Pedagógica da Oi Kabum - Escola de Arte e Tecnologia, programa desenvolvido pela Cipó - Comunicação Interativa em parceria com o Instituto Oi Futuro, Secretaria do Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza do Estado da Bahia e Unesco. E-mail: [email protected]

Tânia Hetkowski (UNEB)Doutora em Educação (Universidade Federal da Bahia - UFBA) e Mestre em Educação nas Ciências (Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul). Graduada em Pedagogia (Universidade do Oeste de Santa Catarina). Professor Adjunto da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). E-mail: [email protected]

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