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IX Encontro dE EconomIa BaIana – SEt. 2013
EFEITOS DA SECA SOBRE A PRODUTIVIDADE AGRÍCOLA DOS MUNICÍPIOS DA REGIÃO NORDESTE
Paulo Henrique Cirino Araújo*Dênis Antônio Cunha**
Joao Eustáquio de Lima***José Gustavo Féres****
Resumo
O objetivo deste estudo foi analisar a produtividade das culturas do milho, cana-de-açúcar e mandioca sob longos períodos de estiagem. Em específico, para cada uma dessas culturas, buscou-se avaliar o impacto histórico dos níveis de precipitação e de outras variáveis climáticas e agronômicas sobre os níveis de produção por área plantada. Para esse fim, foram utilizadas regressões em painel com efeitos fixos, considerando 1297 municípios ao longo de 30 anos. Os resultados encontrados apontam que, nos anos de registro de secas, as culturas sofrem relativas perdas de produtividade e, dentre todas, a do milho é a mais prejudicada. Ainda que tenham sofrido perdas, as culturas da mandioca e da cana-de-açúcar são mais tolerantes a baixos e irregulares regimes de chuva. O Estado mais afetado foi a Bahia, onde a redução média de produtividade alcançou 40% na cultura do milho. Essas perdas agrícolas refletem na renda familiar de pequenos produtores, na segurança alimentar e na subsistência de muitos nordestinos.
Palavras-chave: Secas. Agricultura. Produtividade. Nordeste. Brasil.
AbstrAct
The objective of this paper was to analyze the productivity of corn, sugar cane and cassava crops during long periods of drought. Specifically, we sought to evaluate the historical impact of rainfall and other climatic and agronomic variables on levels of production by acreage of each of these crops. As such, panel regressions with fixed effects were used, in relation to 1,297 municipalities over 30 years. The results found showed that, in drought years, productivity levels of the three crops fell, with that of maize (corn) being the most damaged. Despite suffering losses, the crops of cassava and sugar cane are more tolerant of lows and irregular rainfall periods. The most affected stated was Bahia, where an average reduction in productivity reached 40% for the corn crop. These agricultural losses were reflected in the household income of small farmers, food security and livelihoods of many northeastern Brazilians.
Keywords: Droughts. Agriculture. Productivity. Northeast. Brazil.
* Doutorando e mestre em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). [email protected]
** Doutor e mestre em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Professor do Programa de Pós-graduação em Economia Aplicada da UFV. [email protected]
*** Pós-doutor em Economia pela Universidade da Flórida (UF) e doutor em Economia Rural pela Universidade do Estado de Michigan (MSU). Professor titular da Universidade Federal de Viçosa (UFV). [email protected]
**** Doutor em Economia e mestre em Economia Matemática e Econometria pela Universidade de Toulouse I Sciences Sociales. Técnico de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). [email protected]
EconomIa BaIana • 151
EFEITOS DA SECA SOBRE A PRODUTIVIDADE AGRÍCOLA DOS MUNICÍPIOS DA REGIÃO NORDESTE
Paulo Henrique Cirino Araújo, Dênis Antônio Cunha, Joao Eustáquio de Lima, José Gustavo Féres
IX ENCONTRO DE ECONOMIA BAIANA – SET. 2013 ECONOMIA BAIANA • 152
1. INTRODUÇÃO
O desempenho favorável do setor agrícola depende sobremaneira de condições
ambientais adequadas. De acordo com Göepfert et al. (1993), o clima é um dos principais
fatores limitantes e determinantes da produção agrícola, pois a seca na fase inicial das culturas
(semeadura e germinação) e o excesso de chuva na colheita, respondem por parcela
expressiva da redução das safras. Isso se verifica no Brasil, em que, de acordo com Pinto et al.
(2003), a grande dimensão territorial ocasiona considerável heterogeneidade climática e
condições que podem ser favoráveis ou desfavoráveis, dependendo da cultura agrícola.
Na região Nordeste, essa questão se torna particularmente importante, já que
apresenta grande heterogeneidade climática. Localizado na zona intertropical da Terra, no
Nordeste podem ser identificados três tipos de clima (tropical, semiárido e equatorial úmido).
Nessa região as chuvas não são bem distribuídas ao longo do ano, sendo essa característica
mais acentuada na região semiárida. Segundo Duarte (2010), a porção semiárida, que ocupa
57% do território nordestino, singulariza-se por ser castigada periodicamente por secas.
A questão da seca gera considerável atenção, pois parcela substancial da atividade
econômica do Nordeste é baseada na agropecuária. Quando ocorrem prolongados períodos de
estiagem, a produção agrícola fica comprometida, a pecuária é debilitada e as reservas de
água superficiais se esgotam (Duarte, 2010). Nessas condições, a vulnerabilidade das camadas
mais pobres da produção eleva-se consideravelmente. A geração de renda e emprego fica
comprometida, há aumento de pobreza e miséria, além dos efeitos indiretos sobre outras
regiões e centros urbanos, resultante de processos migratórios.
Na literatura especializada, em geral se aceita que os efeitos da seca são sentidos
principalmente por pequenos produtores e agricultores familiares. Esse fato é preocupante, já
que no Brasil cerca de 48% dos estabelecimentos agrícolas têm, no máximo, 10 hectares; se
for considerada a agricultura de subsistência, esse valor pode chegar a 84%. Somente no
Nordeste estão localizados 50% dos estabelecimentos de agricultura familiar. Além disso, a
agricultura de subsistência representa 75% da força de trabalho agrícola e é responsável por
aproximadamente 10% do PIB nacional (Guilhoto et al., 2007).
Nesse contexto, o presente estudo buscou analisar o desempenho da agricultura
nordestina em longos períodos de estiagem. Especificamente, buscou-se responder como as
culturas do milho, da cana-de-açúcar e da mandioca são afetadas pelos baixos níveis de
precipitação nos municípios da região Nordeste. O principal objetivo foi entender a
heterogeneidade dos impactos das secas sobre a agricultura regional e identificar quais os
estados e municípios que sofreram as maiores perdas de produção por hectare plantado. As
culturas foram escolhidas pela importância que elas exercem para os produtores familiares
como fonte de renda e alimentação, bem como por sua participação nas economias dos
Estados Nordestinos. Conforme nota do Banco Central do Brasil (2013) sobre Levantamento
Sistemático da Produção Agrícola (LSPA, IBGE, 2010), as culturas do milho, da cana-de-
açúcar e da mandioca, quando somados seus valores brutos de produção - VBP, representam
cerca de um terço de todo o VBP da agricultura do Nordeste.
A principal contribuição deste trabalho encontra-se na desagregação dos
resultados. Eles informam as perdas agrícolas médias para toda a região, para os Estados e
ainda revelam as variações médias de produtividade para os municípios produtores de milho,
cana-de-açúcar e mandioca de toda a referida região. A partir desses resultados, e do
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detalhamento deles, o desenho e a implementação de políticas de convivência com a seca
poderão ser mais precisos e bem planejados. O fato da estimação dos modelos ter levado em
consideração painéis de dados abrangentes, tanto no número de municípios quanto no extenso
período de 30 anos, possibilita maior entendimento da problemática.
Alem desta introdução, o trabalho está organizado em outras quatro seções. A
segunda apresenta uma breve revisão da literatura sobre o impacto das secas na atividade
agrícola nordestina. Na terceira é descrita a metodologia de análise que, basicamente, resume
todas as técnicas e variáveis utilizadas no estudo. Na quarta são discutidos os resultados
obtidos. Finalmente, a quinta seção resume as conclusões.
2. REVISÃO DE LITERATURA
A literatura científica, sob a qual foram desenvolvidas as análises deste trabalho,
está relacionada a duas abordagens distintas. Embora essas duas abordagens estejam voltadas
para problemas diferentes, quando reunidas, elas acabam por permitir uma compreensão mais
completa sobre o impacto do clima e também das mudanças climáticas na agricultura. A
primeira delas compreende estudos que recaem sobre os impactos de longo-prazo do clima
sobre os níveis de produção, lucratividade e produtividade agrícola, o que, certamente, recai
sobre o processo de aquecimento global (Dêschenes e Greenstone (2007); Evenson e Alves
(1998); Féres et al. (2009)). Numa outra perspectiva, existem estudos que também se
destinam a entender os efeitos do clima sobre a atividade agrícola, porém no curto-prazo.
Esses estudos, classe na qual também se enquadra este trabalho, procuram analisar a
influência de eventos ou choques climáticos de curto prazo, a saber, eventos extremos
climáticos (Legler et al. (1997); Adams et al. (1997); Roberts e Schlenker (2010)).
O trabalho de Roberts e Schlenker (2010) analisou se a produção agrícola
americana é sensível a eventos de calor extremo e verificaram que as lavouras têm sido pouco
suscetíveis a flutuações nos níveis de precipitação e, que, ao longo do tempo, a tolerância
delas ao calor diminuiu. Outro trabalho que também tratou de eventos climáticos extremos,
foi o realizado por Deng et al. (2010), o qual buscou identificar a relação entre a produção de
arroz e os eventos El Niño na província chinesa de Jianexi, na China. Esses autores
identificaram que os efeitos dos eventos El Niño ocorreram exatamente nos meses em que não
há produção de arroz. Baseado nos resultados expostos por esses trabalhos, nota-se uma
recente preocupação da literatura especializada com os efeitos econômicos de eventos
extremos, seja nos EUA, na China e, atualmente, em economias subdesenvolvidas como o
Brasil.
Especificamente sobre as secas nordestinas, Sampaio e Sampaio (2010) propõem
um modelo de impactos econômicos decorrentes da seca. A avaliação desses impactos é
proposta sobre o mercado de produto, sobre a distribuição de renda e sobre as transferências
governamentais. Algumas sugestões para políticas de combate as secas são propostas pelos
autores, ainda que a operacionalização do modelo não tenha sido quantificada. Segundo eles,
a ação mais importante seria a reposição de renda, pois, em períodos de seca, os preços dos
alimentos tornam-se mais elevados. Os principais apontamentos do trabalho são para a
geração de um mercado de água e também extensão da área irrigada.
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Outros trabalhos técnicos ou relatórios governamentais também expõem
evidências dos prejuízos trazidos para economia regional do Nordeste e também para todo o
Brasil. Segundo o relatório Economia da Mudança Climática (2010), estima-se que em anos
de seca as perdas somem entre 719 bilhões e 3,6 trilhões de reais, até 2050. Ainda, de acordo
com esse estudo e também confirmado por Pinto e Assad (2008), a região Nordeste terá seus
episódios de seca cada vez mais intensificados, decorrentes do processo de aquecimento
global. Além deles, o Painel Intergovernamental de Mudança Climática (IPCC, 2007) já
apontava a região nordeste do Brasil como uma das áreas globais que sofreriam maior
tendência, ao longo dos próximos anos, de aridez e estiagem.
3. METODOLOGIA
Para mensurar os efeitos de longos períodos de estiagem sobre o rendimento físico
de culturas agrícolas, a metodologia utilizada seguiu duas etapas (Féres et al.,2009; Cirino, et
al., 2011). A primeira refere-se a uma análise de regressão em painel com efeitos fixos que,
dentre outros aspectos, permitiu identificar os impactos das variações no regime de chuva
sazonal sobre os níveis de produtividade das três culturas analisadas. Na segunda etapa,
buscaram-se computar quais foram as perdas ou ganhos médios, em termos de produtividade,
apresentados pelos municípios e estados da região Nordeste do país, nos anos de ocorrência
de secas severas, considerando o período de 1970 a 2002.
3.1. Efeitos sobre a produtividade agrícola das variações climáticas
Em conformidade com Féres et al. (2010), esta etapa do estudo busca relacionar
os níveis de produtividade agrícola de cada município estudado com os níveis de precipitação,
de temperatura e suas respectivas características agronômicas, no período de 1970 a 2002.
Esses modelos exploram, assim como Féres et al. (2010) e Cirino et al. (2011), os efeitos
anuais das mudanças no regime de chuva e nas temperaturas dos produtos agrícolas
considerados. A equação 2 retrata essa relação:
, (1)
em que denota o rendimento em toneladas por hectare de uma certa cultura
agrícola , no município e num determinado ano ; é um conjunto de variáveis
referentes a temperatura e precipitação observadas em cada estação do ano nos municípios ao
longo dos anos1. As regressões representadas pela equação 2 foram acrescidas uma variável
de tendência ( ) e um termo de efeitos fixos ( )2. Ressalta-se que foram construídos seis
1 As variáveis de temperatura e precipitação também foram incluídas na forma quadrática, , para captar
possíveis relações não-lineares entre a produtividade e as variações climáticas (Dêschenes e Greenstone, 2007). 2 Nas regressões, optou-se por incluir um termo de efeitos fixos para controlar o viés de omissão de variável
relevante, uma vez que a produtividade agrícola é um fenômeno explicado por inúmeras variáveis além das
climáticas. Nesse caso, os efeitos fixos refletem aquelas características de cada município que são invariantes no
tempo. Adicionalmente, vale destacar que a tendência também foi incluída para captar efeitos que são invariantes
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painéis de dados, pelos quais cada regressão foi amostrada por municípios da região Nordeste
e cada cultura agrícola considerada, bem como seccionadas de acordo com os anos de
ocorrência de secas severas e anos de neutralidade (sem registro de secas).
Finalmente referem-se a um conjunto de coeficientes estimados, tal
que , e trata de um componente de erro aleatório. Todos esses parâmetros, e
também o componente de erro, variam para as regressões relacionadas a cada cultura , de
forma que . O índice foi criado a partir de técnicas de
estatística multivariada, sendo, portanto, um escore fatorial3. A principal justificativa para a
inclusão desse índice foi que a produtividade agrícola é, em termos de sua intensidade, um
fenômeno bastante amplo e explicado também por diversas variáveis agronômicas (ex.: tipo
de solo, altitude do solo, presença de água da terra plantada, uso de herbicidas e pesticidas,
entre outras.)
Quanto à qualidade de ajustamento das estimativas das regressões em painel
realizadas, foram adotadas algumas medidas de correção e também ajustamentos estatísticos.
No caso, os erros padrão foram reamostrados por bootstrap, com a finalidade de corrigir
possíveis problemas de autocorrelação e, ou, heterocedasticidade (Johnston e Dinardo, 1997).
3.2. Variação média da produtividade das culturas estudadas
Para mensurar a variação média da produtividade decorrente dos longos períodos
de estiagem foram utilizados os coeficientes das variáveis climáticas, especialmente aqueles
relacionados aos níveis de precipitação das estações do ano, e gerados os níveis de
produtividade estimados pelas regressões. Assim, em termos de efeito marginal, torna-se
possível computar a variação líquida sobre os níveis de produtividade agrícola em cada
município. Para tanto, fez-se uso da seguinte equação:
, (2)
em que denota a variação média das produtividades apresentadas ao
longo dos anos, por um município numa certa cultura agrícola s;
representa as condições climáticas em anos
de registros de secas severas e nos anos de neutralidade; e são os parâmetros estimados das
variáveis climáticas nas regressões representadas pela equação 1. Em especifico, o efeito das
secas, é captado pelos parâmetros estimados relacionados a e seus respectivos efeitos
marginais, para cada cultura . Os resultados encontrados nesta etapa final refletiram as
perdas ou os possíveis ganhos médios de produtividade que os municípios apresentaram em
todos os anos de registro de secas.
nos municípios, mas que mudaram com o passar do tempo, um exemplo seria a tecnologia. A variável de
tendência tem periodicidade anual e também específica nas estações do ano. 3 Para mais detalhes da metodologia de construção desse índice, vide a sub-seção da metodologia 3.3, que trata
da descrição das variáveis.
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3.4. Variáveis e Fontes de dados
Os dados utilizados neste trabalho foram provenientes da reunião de diferentes
levantamentos estatísticos em nível municipal. As informações de área plantada e produção
agrícola foram obtidas no IPEA-DATA que, por sua vez, realizou a coleta desses dados por
meio do anuário Produção Agrícola Municipal (PAM) do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). As informações climáticas sobre os níveis de temperatura e precipitação
de cada município brasileiro considerado foram extraídas da base de dados CL 2.0 10’ do
Climate Research Unit (CRU) da University of East Anglia, cedidos com exclusividade pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Por fim, os dados agronômicos também
foram extraídos do IPEA-DATA, que coletou os respectivos dados da Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). A descrição das variáveis utilizadas é feita a seguir:
Produtividade média agrícola
As variáveis referentes às produtividades médias dos municípios nordestinos que
produzem milho, mandioca e cana-de-açúcar são provenientes da razão entre a quantidade
colhida (t) e a área plantada (ha), portanto foram expressas em t/ha. Durante a estimação,
foram considerados aqueles municípios que apresentaram dados de área plantada para as
culturas consideradas em cada Estado da região Nordeste. Durante as estimações, foram
considerados aqueles municípios que apresentaram dados de área plantada para as culturas
consideradas, no período de 1970 a 2002.
Variáveis climáticas
As variáveis climáticas utilizadas nos modelos estimados neste trabalho referem-
se aos níveis de temperatura ( ) e precipitação (mm) de cada município nordestino. Essas
variáveis climáticas são segmentadas em estações do ano para, finalmente, serem incluídas
nas estimações dos modelos econométricos.
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Índice Agronômico
Existem inúmeras variáveis que correspondem às características agronômicas dos
municípios nordestinos que, em conjunto, são responsáveis pela produtividade apresentada
por eles em cada cultura agrícola cultivada. Dentre elas destacam-se aquelas que recaíam
sobre o tipo de solo, altitude, disponibilidade de água e demais características
edafoclimáticas.
Ao invés de incluir todas essas variáveis nas estimações da equação 1, buscou-se
sintetizar essas informações em um índice agronômico (IA) que, em linhas gerais, teve por
objetivo resumir essas variáveis de acordo com suas características de correlação. Com essa
finalidade, o mais adequado foi recorrer a técnicas de estatística multivariada, em especial, a
análise fatorial por componentes principais. A partir dessa técnica foi possível obter um índice
ponderado que correspondesse a todas as 17 variáveis agronômicas. Salienta-se que foram
feitos testes a fim de verificar a adequabilidade da técnica de análise fatorial para os dados, o
teste de esfericidade de Bartlet e a estatística KMO - Kaiser-Meyer-Olkin (Mingoti, 2005)4.
Sobre o período da análise, todas as estimativas foram geradas para os dados
registrados entre os anos de 1970 a 2002. A análise é restrita até 2002 devido à
disponibilidade de dados climáticos para os anos seguintes. Além disso, a partir de relatórios
da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) e do Departamento
Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) definiram-se os anos de registros de secas
prolongadas. Segundo eles os anos de estiagem prolongada foram: 1973/74, 1982/83,
1983/84, 1992/93, 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001. Os demais anos desses 32 anos de
análise são considerados anos de normalidade, ou, anos que não houveram registros de
períodos prolongados de seca.
4 Para os resultados da Análise Fatorial e da elaboração do Índice Agronômico (IA) vide apêndice.
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4. RESULTADOS
Para examinar a ligação entre fatores climáticos e a produtividade agrícola,
utilizaram-se painéis de dados compostos por 1297 municípios da região Nordeste e em 32
anos compreendidos no período de 1970-2002. Em anos de registro de seca, esses painéis
apresentam dimensões de 1297 municípios em 10 anos, enquanto, nos anos de neutralidade, a
dimensão é dada por 1297 municípios em 22 anos. Os municípios cujos dados foram levados
em consideração por esta análise pertencem a 9 estados da federação.
Inicialmente, através de uma análise descritiva dos dados, observa-se que na
região Nordeste, em anos de registros de secas, a temperatura média se eleva e a precipitação
média se reduz. Destaca-se também que, até mesmo em anos de neutralidade, os níveis de
precipitação da região nordeste são comparativamente menores que a média nacional.
Enquanto em todo o país a média de precipitação municipal encontra-se em torno de 130 mm
anuais, na região Nordeste esse regime médio anual é cerca de 20% menor.
Figura 1 – Gráfico dos níveis médios de temperatura e precipitação, em períodos de seca e
neutralidade.
Fonte: dados da pesquisa.
Detalhadamente, um estudo da amostra revelou que os municípios de Anagé,
Aiquara, Alagoinhas, Alcobaça e Água Fria, todos eles do Estado da Bahia, apresentaram, em
anos de secas, os menores níveis de precipitação anual. Nos meses de junho, julho e agosto,
esses municípios apresentaram menos de 8% do regime anual de chuva do país.
Os modelos estimados neste trabalho foram dedicados a entender a relação entre a
produtividade agrícola municipal da Região Nordeste e os níveis históricos de temperatura e
precipitação observados. Na tabela 1, estão dispostas regressões estimadas referentes às
culturas do milho, da mandioca e da cana-de-açúcar, tanto em anos de seca quanto em anos de
neutralidade.
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Tabela 1 – Regressões estimadas para os níveis de produtividade das culturas de milho,
mandioca e cana-de-açúcar para a região Nordeste.
Nordeste Secas Neutralidade
Milho Mandioca Cana Milho Mandioca Cana
Precipitação_verão 0,004
(0,0005)
0,0095
(0,001268)
0,032***
(0,016)
0,0008***
(0,0001)
0,0002
(0,0008)
0,015*
(0,0086)
Precipitação_verão^2 -0,0000 (0,004)
0,0000 (0,000001)
-0,00014*** (0,000056)
-0,00006** (0,000007)
0,0000 (0,000007)
-0,00003 (0,00002)
Precipitação_outono 0,004***
(0,0003)
-0,008***
(0,00017
-0,013
(0,012)
0,0011***
(0,00008)
0,0016***
(0,0004)
-0,0034
(0,0067)
Precipitação_outono^2 -0,001*** (0,0001)
0,00009** (0,0000187)
0,00001 (0,00003)
-0,0002*** (0,000001)
-0,0004*** (0,0001)
0,0000 (0,000012)
Precipitação_inverno -0,00001
(0,002)
0,00156***
(0,000276)
0,0154
(0,01904)
0,0009***
(0,00001)
0,0014
(0,0009)
0,0119**
(0,00098)
Precipitação_inverno^2 -0,0001*** (0,00001)
-0,0082* (0,0085)
-0,00006 (0,0005)
-0,0002*** (0,000003)
-0,0004* (0,0002)
-0,00003 (0,000023)
Precipitação_primavera 0,0015***
(0,0004)
0,0010
(0,0023)
-0,0201***
(0,00242)
0,06***
(0,00028)
0,00005
(0,0015)
0,0162
(0,01683)
Precipitação_primavera^2 -0,0002*** (0,000003)
0,000001 (0,00001)
0,00012 (0,0001)
-0,0007*** (0,00008)
-0,00001* (0,000008)
-0,00015 (0,000096)
Temperatura_verão 0.4209**
(0.2023)
0,8226
(1,100)
-15,86***
(8,865)
-0,334***
(0,0674)
-0,2454
(0,4824)
-2,831**
(1,8144)
Temperatura_verão^2 -0,0094** (0,0037)
-0,0155 (0,0211)
0,312** (0,0223)
0,0064*** (0,0013)
0,0041** (0,0009
0,0708 (0,0929)
Temperatura_outono -0,777***
(0,1734)
-0,0903***
(0,0006)
10,187*
(8,42)
0,07981
(0,1332)
-0,349
(0,5543)
-8,4801***
(2,9211)
Temperatura_outono^2 0,0154*** (0,0034)
0,0003 (0,0130)
-0,211 (0,184)
-0,0006 (0,0026)
0,0069** (0,000186)
0,1508 (0,1760)
Temperatura_inverno 0,8765***
(0,1050)
-0,5613**
(0,0654)
-3,051
(7,2106)
0,4779***
(0,0759)
0,7343***
(0,0511)
1,9413*
(2,631)
Temperatura_inverno^2 -0,019*** (0,0021)
0,0123* (0,01032)
0,0567 (0,1456)
-0,01325*** (0,00154)
-0,0133 (0,010)
-0,0382 (0,1154)
Temperatura_primavera -0,2647**
0,1334
0,027***
(0,0003)
-3,861
(6,389)
-0,9227***
(0,098)
-0,4388
(0,5866)
1,8311***
0,0119
Temperatura_primavera^2 0,0057**
(0,0026)
0,0004
(0,123)
0,0691
(0,1252)
0,0189***
(0,001919)
0,0069
(0,0113)
-0,037
(0,1269)
Índice Agronômico 0,002769**
(0,057)
0,000198**
(0,012)
0,000145**
(0.0061) 0,0031 (0.023)
-0,000214***
(0.1080)
0.00169**
(0.0876)
Constante -1,888
(3,273)
-1,893
(18,05)
193,1
(178,27)
10,234***
(1,934)
6,077
6,211
117,36*
(80,34)
Dummy_1970 1,086***
(0,049)
-1,2201***
(1,193)
0,058*
(0,509)
0,054*
(0,0286)
-0,012***
(0,0286)
0,0174***
(0,0549)
Dummy_1980 0,673***
(0,039)
-10,202***
(1,975)
0,0459
(0,189)
0,259***
(0,3195)
-0,037***
(0,0032)
0,0014**
(0,0109)
Dummy_1990 0,210***
(0,052)
-0,460***
(1,541)
0,026***
(0,238) 0,4691***
(0,372)
-0,1945***
(0,00344)
0,0141***
(0,341)
Dummy_2000 0,359***
(0,047)
-0,0945***
(0,02886)
0,0629**
(0,0255) 1,342***
(0,062)
-0,2021***
(0,0161)
0,051***
(0,321)
Fonte: dados da pesquisa.
Nota: ***,** e * indicam significância estatística aos níveis de 1, 5 e 10%, respectivamente. Em parêntesis,
encontram-se os erros-padrão relacionados aos coeficientes estimados.
De modo geral, em conformidade com os resultados expostos na tabela 1, os
níveis de precipitação e temperatura foram estatisticamente significativos para explicar a
produtividade das três culturas estudadas. Também se verificou que, em sua maioria, as
variáveis quadráticas foram estatisticamente significativas, revelando uma possível não-
linearidade entre as variáveis. Esse resultado converge com aqueles encontrados por Féres et
al., 2010. As dummies temporais incorporadas nos modelas tinham como função traduzir a
evolução de características que não foram observadas no tempo, como o processo de
modernização agrícola, mas que, definitivamente, explicam a produtividade agrícola. Nesta
tentativa, constatou-se que todas elas foram significativas e que, em suma, acabaram captando
os efeitos do progresso tecnológico agrícola nos últimos anos.
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IX ENCONTRO DE ECONOMIA BAIANA – SET. 2013 ECONOMIA BAIANA • 160
É possível também discutir os sinais dos coeficientes estimados, uma vez que
todos eles demonstram os efeitos que os condicionantes climáticos exercem sobre a
produtividade agrícola, configurando, portanto, os períodos de safra e entressafra destas
culturas. No caso dos cultivos da mandioca e do milho, verificou-se que, nos períodos de
primavera e verão, as elevações nos níveis de temperatura e precipitação implicaram em
aumentos nos níveis de produtividade. Sobre a magnitude dos coeficientes, todos eles revelam
os ganhos incrementais de produtividade agrícola devido ao aumento de 1 mm de precipitação
ou 1º C nas temperaturas sazonais. Nesse contexto, observa-se que, em anos que houve
registros de secas, os níveis de precipitação tendem a influenciar com menos intensidade os
níveis de produtividade de culturas como o milho. Ainda, de acordo com os coeficientes
estimados, nota-se que, em anos de seca, a mandioca e a cana-de-açúcar tem seus níveis de
produtividade menos influenciados pelas variáveis climáticas.
Numa segunda etapa, o estudo buscou estimar os efeitos marginais que as
variações nos níveis de precipitação, em anos de seca, causam sobre o desempenho das
culturas agrícolas estudadas. Para este cômputo, foram extraídas as diferenças entre os
coeficientes das regressões relativos aos anos de seca e de neutralidade e, finalmente,
multiplicados pelas temperaturas e precipitações amostradas em cada município nordestino.
Esses valores foram agregados em médias para os 30 anos analisados e revelam as perdas de
produção por hectare colhido na região, nos Estados e também nos municípios. Na tabela 2,
encontram-se os resultados encontrados.
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Tabela 2 – Variação média da produtividade das culturas de cana-de-açúcar, mandioca e
milho para os estados da região Nordeste.
Cana-de-açúcar
Região/Estados Municípios Secas Neutralidade Var. Produtividade
Média (%)
Nordeste 1297 20,87 21,32 -2,2
Maranhão 113 17,45 21,05 -17,1
Piauí 80 19,60 21,07 -6,9
Ceara 138 20,50 21,47 -4,5
Rio Grande Norte 147 20,73 21,29 -2,6
Paraíba 168 21,20 21,28 -0,4
Pernambuco 163 22,23 21,31 4,3
Alagoas 87 22,03 21,52 2.4
Sergipe 74 21,94 21,47 2,0
Bahia 327 22,16 21,49 3,1
Mandioca
Nordeste 1297 1,89 1,911 -1,1
Maranhão 113 1,39 2,01 -30,8
Piauí 80 2,62 2,17 20,7
Ceara 138 2,02 1,97 2,5
Rio Grande Norte 147 2,05 1,86 10,2
Paraíba 168 1,92 1,82 5,5
Pernambuco 163 2,47 1,84 25,5
Alagoas 87 1,17 1,84 -36,4
Sergipe 74 1,83 1,85 -1,1
Bahia 327 1,58 1,843 -14,3
Milho
Nordeste 1297 0,41 0,49 -17,26
Maranhão 113 0,35 0,32 9,3
Piauí 80 0,31 0,44 -0,29
Ceara 138 0,29 0,36 -0,19
Rio Grande Norte 147 0,39 0,42 -7,14
Paraíba 168 0,32 0,54 -40,7
Pernambuco 163 0,38 0,53 -28,3
Alagoas 87 0,41 0,58 -29,3
Sergipe 74 0,48 0,60 -20,0
Bahia 327 0,41 0,67 -38,8
Fonte: dados da pesquisa.
De acordo com os resultados da Tabela 2 para os anos de secas, verificou-se que
grande parte dos estados produtores de milho, cana-de-açúcar e mandioca sofreram perdas
médias de produtividade. Toda a agricultura da região nordeste parece ser bastante afetada
nos anos de seca, mas as culturas da mandioca e da cana-de-açúcar são bastante tolerantes a
esses períodos. Na média dos anos em que houve registros de secas, as culturas de cana e
mandioca tiveram sua produtividade reduzidas numa média de 2% e1%, respectivamente. Por
outro lado, seja pelos coeficientes estimados na tabela 1 ou nas perdas somadas na tabela 2, o
milho foi a cultura mais susceptível a baixos índices de precipitação.
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No caso do cultivo do milho, os municípios dos Estados da Paraíba e da Bahia
foram os mais prejudicados, isto é, cerca de 40% é a redução da produtividade. Dentre eles, as
perdas registradas na Bahia são preocupantes, uma vez que a mandioca e o milho são bastante
produzidos por agricultores familiares. Outros resultados, como aqueles encontrados por
Cirino et al. (2012), revelam que essas perdas são potencializadas nos anos de El Niño, ou
seja, anos que as secas são mais intensas. Resultados como esse sugerem que as perdas do
Milho, da ordem de 40% na Bahia, possam chegar por ocorrência do El Niño a 60%.
Os mapas da figura 1 ilustram, em vermelho, as perdas de produtividade de todos
os municípios produtores de cana, milho e mandioca da região Nordeste. Esses resultados
referem-se às perdas obtidas por esses municípios ao longo de 30 anos, e, referente a
intensidade destas perdas, ao lado de cada mapa estão dispostas as respectivas legendas.
Fonte: dados da pesquisa.
Figura 1 – Mapas da variação de produtividade (t/ha) das culturas de cana-de-acucar,
mandioca e milho nos municípios da região Nordeste do Brasil, segundo os efeitos das secas.
A região Nordeste é onde historicamente registraram-se as maiores perdas
agrícolas e pecuárias relacionadas às secas severas, conforme dados do Departamento
Nacional de Obras contra as Secas (DNOCS, 2012). Referente a esses efeitos e junto da
redução da disponibilidade hídrica, a maioria dos municípios nordestinos tem a segurança
alimentar comprometida. Neste estudo, verificou-se que, em anos de ocorrência de secas, as
produtividades médias dos municípios produtores tendem a serem reduzidas. Como ilustrado
nos mapas da Figura 1, prejuízos agrícolas são constatados em municípios de quase todos os
estados. A Bahia, o maior produtor de milho e mandioca da região Nordeste, apresentou um
elevado número de municípios que tiveram suas atividades agrícolas prejudicadas e que,
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IX ENCONTRO DE ECONOMIA BAIANA – SET. 2013 ECONOMIA BAIANA • 163
muito além de perdas nos níveis de produtividade, tiveram suas lavouras totalmente
comprometidas. De acordo com o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola – LSPA
(IBGE, 2012), em 2011, a produção de milho baiana sofreu perdas de 12,7%, em sua maioria
conduzida pelas secas.
Todo o cerrado nordestino apresenta uma drástica redução nos níveis médios de
produtividade, o que, em certo grau, inviabiliza o cultivo do milho. As perdas não se
concentram apenas no cerrado, elas passam pelo semi-árido e, no caso da cana-de-açúcar, são
mais intensivas nas regiões litorâneas da porção Norte dessa região.
Outro efeito importante das estiagens refere-se à redução na produtividade dos
gêneros como milho e mandioca, que são essenciais na produção de subsistência de pequenos
produtores rurais. Neste estudo, foi verificado que os municípios mais produtivos nessas
lavouras eram aqueles situados no Oeste e Norte da Bahia (cerrado nordestino), e, em
conformidade com a Figura 3, foram eles os mais prejudicados. As perdas relacionadas a
esses municípios podem chegar a 15% e 16% da produtividade média nas culturas da
mandioca e da cana-de-açúcar, e no caso do milho, todo o cultivo pode ser comprometido.
O contrário é notado nos anos de neutralidade, pois, conforme Cirino et al. (2012),
alguns desses anos são coincidentes com a formação de La Nina no Oceano Pacífico. Anos
que foram registrados a ocorrência desse fenômeno marcam a chegada das frentes frias a
região Nordeste, o que, normalmente garantem níveis de precipitação acima da média. Essa
maior possibilidade de chuvas, quando efetiva nas fases em que as culturas mais necessitam
de água, permite um desempeno agrícola favorável. Baseado num estudo específico da
amostra, neste estudo foi verificado que, em anos de La Niña e sem registro de secas,
praticamente todos os municípios nordestinos apresentaram aumentos nos níveis de
precipitação, ainda que comparado a média nacional fossem índices pluviométricos baixos.
Esse relativo aumento das precipitações, quando marcados nas estações corretas, foi suficiente
para elevar os níveis de produtividade de todas as culturas estudas nesta pesquisa. Em termos
regionais, a Bahia apresentou ganhos significativos de produtividade na média desses anos,
apresentando aumentos de 14%, 23% e 37% para as culturas da cana, da mandioca e do
milho, respectivamente.
Quando analisados os mapas da Figura 1, alguns municípios tiveram suas áreas
preenchidas com a cor azul, indicando variações positivas nos níveis de produtividade. No
entanto, esse desempenho de produtividade municipal não pode ser entendido como ganho,
afinal os resultados revelaram que estas culturas teriam sido pouco afetadas em anos de seca.
Além disso, mesmo em que em anos de seca esses municípios tenham variações positivas de
produtividade, sem registro desse fenômeno, certamente, eles poderiam apresentar níveis
ainda mais elevados.
Aspectos geográficos também foram observados nesta pesquisa. O cultivo da cana
concentrou perdas nas regiões de caatinga, que, de acordo como IBGE (2012), são áreas de
desenvolvimento da agricultura de sequeiro, na qual 27 milhões de pessoas estão ligadas ao
cultivo dessa cultura. O cultivo da mandioca é bastante difundido por toda a região, e por isso
apresentou perdas significativas, mas de forma bastante heterogêneas espacialmente. Isto, de
fato, sinaliza reduções na renda do produtor agrícola familiar ou na sua subsistência, afinal a
mandioca é matéria prima de diversos produtos alimentares.
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5. CONCLUSÃO
O desempenho favorável da atividade agrícola, junto das atividades pecuárias,
confere a economia brasileira quase um terço de toda a produção interna, garante a promoção
de divisas externas na comercialização de commodities e ainda garante a disponibilidade e a
oferta de alimentos. No entanto, toda a produtividade da agricultura é vulnerável aos
condicionantes climáticos, principalmente, os fenômenos ligados as baixas precipitações.
Nesse sentido, o presente estudo buscou averiguar os efeitos causados pelas secas na
produtividade agrícola da região Nordeste do Brasil.
Em anos de ocorrência de secas, notou-se que a produção de mandioca, cana e
milho é bastante reduzida. Ainda que bastante afetadas, o cultivo da mandioca e também da
cana mostraram-se bastante tolerantes aos períodos de secas, isto é, em alguns municípios a
variação média da produtividade ainda foi positiva. Em contrapartida, as lavouras de milho
sofrem perdas heterogêneas em toda a região Nordeste, concentrando-se principalmente no
cerrado baiano e em quase toda a caatinga. De um modo geral, as perdas de desempenho
agrícola foram constatadas e são preocupantes. A grande maioria dos resultados encontrados
neste estudo está ligada ao comprometimento da segurança alimentar de produtores familiares
e também a redução de renda.
Os formuladores de política pública precisam desenvolver medidas de longo prazo
e não apenas ações emergenciais. Garantir o abastecimento de água para o produtor rural e a
estocagem de alimentos são duas ações fundamentais. Nessa perspectiva, um plano adequado
de gerenciamento dos recursos hídricos deve ser traçado, tendo como metas principais a
definição de um mercado de água e, ou, ampliação da área irrigada. Além disso, deve-se
investir, em perenização de rios e poços artesianos, transposição de rios, construção de
barragens de médio porte e assistência técnica aos produtores. Além dessas ações, não são
dispensados esforços emergenciais e de convivência com a seca.
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