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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA DE LETRAS NEOLATINAS
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDOS LINGÜÍSTICOS
OPÇÃO: LÍNGUA ESPANHOLA
ESTRATÉGIAS DE RAPPORT EM CONVERSAS COTIDIANAS ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NO ESPANHOL DE BUENOS AIRES: uma
perspectiva interacional
Eliane Mattos de Souza
Rio de Janeiro 2008
2
ESTRATÉGIAS DE RAPPORT EM CONVERSAS COTIDIANAS ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NO ESPANHOL DE BUENOS
AIRES: uma perspectiva interacional
Eliane Mattos de Souza
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Título de Doutor em Letras Neolatinas (Estudos Lingüísticos Neolatinos).
Orientador: Prof. Dr. Pierre François Georges Guisan Co-orientadora: Profª Drª Sonia Bittencourt Silveira
Rio de Janeiro Abril de 2008
3
ESTRATÉGIAS DE RAPPORT EM CONVERSAS COTIDIANAS ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NO ESPANHOL DE BUENOS AIRES: uma perspectiva interacional
Eliane Mattos de Souza Orientador: Prof. Dr. Pierre François Georges Guisan
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Letras Neolatinas (Estudos Lingüísticos Neolatinos).
Aprovada por: ________________________________________________ Presidente: Prof. Dr. Pierre François Georges Guisan, UFRJ ________________________________________________ Profª Drª Sonia Bittencourt Silveira (co-orientadora), UFJF ________________________________________________ Profª Drª Maria do Carmo Leite de Oliveira, PUC-RJ ________________________________________________ Profª Drª Claudia Nivia Roncarati de Souza, UFF ________________________________________________ Prof. Dr. José Carlos Gonçalves, UFF ________________________________________________ Profª Drª Maria Aurora Consuelo Alfaro Lagorio, UFRJ ________________________________________________ Profª Drª Annita Gullo, UFRJ (Suplente) ________________________________________________ Profª Drª Amitza Torres Vieira, UFJF (Suplente)
Rio de Janeiro Abril de 2008
4
À Cláudia Roncarati, que demonstrou ser
amiga no sentido pleno da palavra, me apoiando e
me incentivando nas horas em que pensei em
desistir, e sem a qual este humilde trabalho não
teria chegado a termo, por ser uma pessoa tão
especial.
À Camila, razão de viver, uma incentivadora
também, que cedeu tempo de convivência comigo
para a realização deste trabalho, demonstrando
desapego e amor.
5
AGRADECIMENTOS
Aos meus orientadores, pelo conhecimento que me foi passado e pela paciência
e perseverança que demonstraram para comigo.
Aos membros da banca do Exame de Qualificação, pelas valiosas sugestões.
Aos membros da banca da defesa, que muito gentilmente cederam seu tempo
para a leitura deste trabalho, meus sinceros agradecimentos (e, em especial, àqueles que
abriram mão de compromissos para estar hoje aqui).
A CAPES, cujo apoio financeiro foi fundamental para a realização deste
trabalho.
6
RESUMO
O presente trabalho tem por objeto de análise o fenômeno denominado rapport,
focalizando as relações existentes entre esse conceito e os conceitos de polidez positiva
e envolvimento. Seu objetivo central é identificar e analisar o uso de estratégias de
rapport no gênero “conversa“ entre amigos e familiares, em um corpus oral da língua
espanhola, adotando para tal uma perspectiva interacional das trocas conversacionais
seqüencialmente situadas. A pesquisa possui uma abordagem de estudo de caso, de
natureza interpretativista e qualitativa, na qual foram utilizadas amostras de língua oral
da cidade de Buenos Aires, levantadas com base em gravações coletadas em uma
pesquisa coordenada pela Profª Drª Ana Maria Barrenechea, da Universidade de Buenos
Aires. O estudo do fenômeno do rapport em relações simétricas é complexo e abrange
outros conceitos a eles associados, como face, polidez positiva, envolvimento,
confiança, small talk e language play. Os resultados demonstram que certos atos, tais
como: não compartilhar as opiniões de seu interlocutor, manifestar falta de modéstia ou
parecer demasiadamente crítico são riscos decorrentes de manifestar a opinião própria
sobre alguém ou alguma coisa, e podem ser vistos como ameaçadores das relações
sociais. Entretanto, quando o nível de confiança existente entre os participantes é alto,
essas ameaças encontram-se neutralizadas. Conclui-se, também, que como
conseqüência dessas ameaças os participantes de nosso corpus orientam-se no sentido
da manutenção do rapport (harmonia) da relação, buscando o acordo interpessoal, a
participação cooperativa e o clima socio-emocional afiliativo quando expressam
opiniões.
7
ABSTRACT
The present work is concerned with the phenomenon analysis called rapport, focusing
the relationship between this concept and the one of positive politeness and
involvement. The main focus is to identify and to analyze the use of strategies of
rapport in the activity type“conversation between friends and family”, in an oral corpus
of Spanish language, using an interactional approach focuses on speech-in-interaction
sequentially built by the participants. The research includes a case study, of qualitative
and interpretative nature, in which were used samples of the oral language of the city of
Buenos Aires. These samples were taken from conversations recorded in a research
program coordinated by the Profª Drª Ana Maria Barrenechea, from the University of
Buenos Aires. The study of the phenomenon of rapport in symmetric relationships is
complex and encompasses other concepts related to them as face, positive politeness,
involvement, trust, small talk and language play. The research results show that
disagreements or excessive criticism are risks arising from the act of presenting the own
opinion about someone or something and can be seen as threatening the social relations.
However, when the level of trust between the participants is high, such threats are
neutralized. Hence, it can be concluded that, as consequence of these potential threats,
the participants of the interactions analysed tend toward the maintenance of the rapport
(harmony) of the relation, seeking the interpersonal consent, the cooperative
participation , trying to preserve an affiliative emotional stance when they express their
opinions.
8
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
2. NOÇÕES TEÓRICAS PERTINENTES: FACE, POLIDEZ, RAPPORT E
ENVOLVIMENTO – ENTRELAÇAMENTOS E ESPECIFICIDADES
2.1 A noção de face
2.1.1 Face e trabalho de face: Goffman
2.1.2 Face e trabalho de face: Brown e Levinson
2.2 A noção de polidez
2.2.1 Teoria da Polidez: Brown & Levinson
2.2.2 Modelo de Comunicação: Lim e Bowers
2.2.3 Sistemas de Polidez: Scollon e Scollon
2.2.4 Tipos de Polidez: Kerbrat-Orecchioni
2.3 A noção de rapport, de envolvimento e conceitos associados
2.3.1 Gerenciamento de rapport: Spencer-Oatey
2.3.2 Conceitos de rapport, de small talk e de language play
2.3.3 Conceitos de envolvimento, de script cultural e de confiança
2.4 Propostas de análise aplicadas a corpora em língua espanhola
2.4.1 Bravo (Universidade de Estocolmo)
2.4.2 Briz (Universidade de Valência)
2.4.3 Hernández-Flores (Escola Superior de Comércio de Copenhage)
2.4.4 Albelda (Universidade de Valência)
2.4.5 Boretti (Universidade Nacional de Rosário)
2.5 Síntese e discussão
2.5.1 Críticas à teoria da polidez de Brown e Levinson
2.5.2 Rapport como estratégia de envolvimento: um modelo teórico para análise
9
3. METODOLOGIA
3.1 Critérios de constituição do corpus
3.2 Características da pesquisa: um estudo de caso
3.3 Proposta de modelo de análise do corpus
4. CONVERSA COTIDIANA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NA CIDADE
DE BUENOS AIRES: suas especificidades
4.1 Situando conversa entre amigos e familiares
4.2 Situando polidez positiva e rapport no contexto de nosso corpus
4.3 Situando o comportamento e o modo lingüístico do argentino
5. CONVERSA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES: estratégias de envolvimento e
de rapport
5.1 Análise macro
5.1.1 Manutenção de rapport
5.1.2 Maximização de rapport
5.2 Uso das micro-estratégias de rapport
5.2.1 Micro estratégias destinadas à manutenção de rapport: gerenciamento / mitigação
de conflito
5.2.2 Micro estratégias destinadas à maximização de rapport: maximização / aumento
de acordo / compartilhamento
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
7. CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
ANEXOS
10
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho, que se filia à linha de pesquisa “Processos Interculturais
Lingüísticos e Identitários”, tem como objeto de estudo o fenômeno denominado
rapport, focalizando as relações existentes entre esse conceito e os conceitos de polidez
positiva e envolvimento.
Nosso objetivo central é identificar e analisar o uso de estratégias de rapport no
gênero “conversa“ entre amigos e familiares, em um corpus oral da língua espanhola de
Buenos Aires, adotando para tal uma perspectiva interacional das trocas conversacionais
seqüencialmente situadas.
O conceito de rapport inclui uma ampla gama de estratégias (algumas das quais
têm sido apresentadas como de polidez positiva), que têm como objetivos a
aproximação e o envolvimento entre os participantes de um encontro social. Um dos
elementos constitutivos do envolvimento é, segundo Scollon e Scollon (1995),
demonstrar que o falante deseja sustentar uma visão de mundo partilhada com o
ouvinte. Já para Aston (1988, apud PLACENCIA, 2004), o rapport é uma forma de
estabelecimento e manutenção de relações amigáveis, sendo, por isso, um termo amplo
que abrange várias atividades: comunicação fática, cumprimentos, language play,
perguntas do tipo “como vai você?”, despedidas amigáveis, entre outras listadas como
estratégias de polidez positiva.
Na avaliação de Sacks (1992), a organização seqüencial da conversa envolve,
entre outras coisas, a sucessão de falantes, que se dá de forma sistemática e ordenada
através de um sistema de tomada de turnos. O sistema de tomada de turnos, nas
conversas, é organizado com base em relações simétricas entre os participantes, que,
teoricamente, têm os mesmos direitos de assumir os turnos de fala e de selecionar ou
recusar os tópicos. Assim, olhar para o modo pelo qual cada conversa se organiza
ilumina a forma pela qual as interações sociais são concebidas em uma dada
comunidade de fala. As regras que organizam os comportamentos, verbais e não-
verbais, emergem da orientação que os próprios participantes demonstram estar
assumindo (cf. DURANTI, 1996). Segundo Goffman (2002), um dos princípios
organizadores das trocas conversacionais é a preocupação com os desejos de face do
11
self1 e do outro, condição necessária para a manutenção das interações sociais. As
“regras do grupo” e a “definição da situação“ são decisivas para a forma como a face e
as imagens do self são construídas e negociadas no curso da interação.
O estudo do fenômeno do rapport em relações simétricas é complexo e abrange
outros conceitos a eles associados, como face, polidez positiva, envolvimento,
confiança, small talk e language play2. A presente pesquisa vem suprir uma carência, no
sentido de as estratégias de rapport em relações simétricas terem sido ainda pouco
estudadas.
Apoiamos a discussão do conceito de rapport na concepção de face em Goffman
(1972), na Teoria da Polidez de Brown e Levinson (1978), na noção de atos lisonjeiros
para face (face flattering acts) de Kerbrat-Orecchioni (2000) e nas definições de
envolvimento em Tannen (1989) e Scollon e Scollon (1995).
Examinamos, ainda, na vertente espanhola, as categorias de autonomia e
afiliação propostas por Bravo (1999), as premissas ligadas a essas categorias, e os
resultados encontrados por Boretti (2003) em seus trabalhos com o espanhol de Rosário,
assim como com as estratégias de intensificação propostas por Albelda (2003), que
estende a proposta de Kerbrat-Orecchioni (op. cit.).
Considerando-se o entrelaçamento dos conceitos acima referidos – rapport,
polidez positiva e envolvimento – em nossa pesquisa, temos como objetivos discutir
e/ou responder às seguintes questões de natureza teórica e empírica:
(i) quais as relações de semelhança e diferença entre esses conceitos?
(ii) qual o papel do uso de estratégias de rapport na construção / negociação de relações
de amizade no corpus em análise?
1 A noção de self diz respeito à identidade pessoal do “eu” (self): é um conjunto de qualidades sem as quais o indivíduo não pode imaginar-se a si mesmo (noção psicológica); em termos de identidade social, o self é um conjunto relativamente estável de percepções sobre quem somos em relação a nós mesmos, aos outros e aos sistemas sociais. O self está organizado em torno de um conceito de si mesmo, isto é, das idéias e sentimentos que temos com relação a nós mesmos (porém sempre com respeito à relação que temos ou tivemos com os demais). 2 As noções de small talk (cf. KNAPP, 1978), comunicação fática, e de language play (cf. SHERZER, 1992), manipulação dos elementos de linguagem, serão detalhadas na seção 2.3.1.
12
(iii) quais os principais recursos lingüísticos e discursivos usados no espanhol de
Buenos Aires para sinalizar rapport?
Algumas justificativas de ordem teórica e prática para o presente estudo
poderiam ser assim relacionadas:
• teóricas: contribuir para um melhor entendimento sobre as teorias de polidez e
rapport e, conseqüentemente, para o estudo da linguagem enquanto lugar de construção
/ negociação das relações interpessoais;
• práticas: o uso da linguagem em situações concretas e um melhor entendimento
dos recursos lingüísticos e discursivos que garantem uma comunicação não só eficaz do
ponto de vista da informação, mas bem sucedida em termos da manutenção e construção
das relações interpessoais, através de escolhas adequadas ao contexto de uso da
linguagem.
O presente trabalho segue a organização descrita a seguir.
No capítulo 1, especificamos o objeto de estudo e os objetivos pretendidos.
No capítulo 2, apresentamos os pressupostos teóricos pertinentes ao estudo do
rapport – noções de face, polidez, envolvimento, small talk e language play –,
discutimos os modelos aplicados a corpora em língua espanhola, examinamos os
modelos que criticam e/ou expandem a teoria de Brown e Levinson e, por último,
especificamos o modelo teórico adotado em nossa análise.
No capítulo 3, detalhamos os parâmetros metodológicos adequados a uma
perspectiva interacional de abordagem qualitativa de estudo de caso e definimos os
critérios de constituição do corpus “El habla culta de la cuidad de Buenos Aires –
materiales para su estúdio” (BARRENECHEA, 1987).
No capítulo 4, cotejamos as noções de polidez positiva e de rapport, com base
no corpus adotado, a partir das especificidades da conversa entre amigos e familiares no
contexto do comportamento e do modo lingüístico do argentino.
No capítulo 5, apresentamos a análise propriamente dita das estratégias de
rapport na conversa cotidiana entre amigos e familiares do espanhol de Buenos Aires.
O capítulo 6 é dedicado à discussão dos resultados e à síntese das conclusões
relevantes.
13
2. NOÇÕES TEÓRICAS PERTINENTES: FACE, POLIDEZ, RAPPORT E ENVOLVIMENTO – ENTRELAÇAMENTOS E ESPECIFICIDADES
Neste capítulo, apresentamos, os pressupostos teóricos que nortearam nossa
análise à luz da perspectiva interacional. Nosso objetivo é buscar, nos entrelaçamentos
entre as noções de face, polidez positiva, rapport e envolvimento, direcionamentos
teórico-metodológicos que nos permitam examinar como os participantes constroem e
negociam seus alinhamentos no enquadre de uma conversa entre amigos e familiares
cujas relações interpessoais são potencialmente de natureza simétrica.
Inicialmente, cumpre esclarecer que, segundo Scollon e Scollon (1995),
conversas entre amigos e familiares regulam-se por um Sistema de Solidariedade, em
que há um alto grau de envolvimento, não havendo sentimentos de diferença de poder e
nem de distância entre os participantes da interação. As características deste sistema
podem ser assim configuradas: relação simétrica (-poder): os participantes se vêem
como estando na mesma posição social; relação estreita (-distância): os participantes
fazem uso de estratégias de envolvimento. Para eles, toda comunicação implica
envolvimento, expresso tanto através da assunção do ponto de vista do outro, quanto
através de um outro meio qualquer que demonstre que o falante deseja sustentar uma
visão de mundo partilhada.
2.1 A noção de face 2.1.1 Face e trabalho de face: Goffman
O ponto de partida para a maioria dos estudos atuais, no ocidente, sobre face e
trabalhos de face tem sido o trabalho pioneiro de Goffman, sociólogo de origem
canadense, acerca da natureza e forma de organização da interação social, em que face é
descrita como algo que pode ser perdido, mantido ou aumentado. Segundo Goffman
(1980 [1967]: 76-77), face é “o valor social positivo que uma pessoa realmente
reivindica para si, a partir da linha que os outros pressupõem que ela tenha adotado,
durante um contato particular”. Linha, por sua vez, corresponde ao padrão de atos
verbais e não-verbais que uma pessoa adota durante uma interação, expressando, assim,
a avaliação que faz da situação em que se encontra engajada, dos demais participantes e,
especialmente, de si mesma.
14
Segundo Goffman (op.cit.), o conceito de face pode ser entendido como imagem
social. Para ele, face é “[...] o valor social positivo que uma pessoa efetivamente
reclama para si [...] em termos de atributos aprovados socialmente”. Este autor propõe o
conceito de face como imagem social porque, segundo ele, as pessoas estão
emocionalmente comprometidas com uma imagem de si mesmas que é aprovada pela
sociedade e que dá lugar a uma série de regras para o trato interpessoal e cujo
desconhecimento pode provocar conflitos na conversa. Ele também incorpora a noção
de território, ou melhor, “os territórios do eu”: territórios corporal, material, espacial,
temporal, cognitivo, etc.
Um outro pressuposto envolvido nas discussões sobre face é o de que, no curso
das interações sociais, as pessoas defendem suas faces e/ou os valores associados às
mesmas, como também as faces dos outros, através de trabalhos de face que são:
“as ações realizadas por uma pessoa para tornar o que quer que esteja
fazendo consistente com a face que está sendo reivindicada, num dado momento.
(Goffman, 1972, p.5).
Face é também definida como “uma imagem do self, delineada em termos de
atributos sociais aprovados (1980, p.76)”. Assim sendo, o termo face, para Goffman,
envolve tanto o significado denotado − semblante, aparência, aspecto externo – como o
sentido conotado de dignidade, auto-respeito, prestígio (i.e. valores afetivos e
sociocognitivos). Podemos verificar que o autor explora esse duplo sentido em sua
terminologia: ‘salvar a face’ (e.g. salvar as aparências); ‘perder a face’ (e.g. perder o
prestígio, desacreditar-se).
O conceito de face focaliza os seguintes aspectos:
(1) “valor social positivo que uma pessoa efetivamente reclama para si mesma através
daquilo que os outros presumem ser a linha por ela tomada durante um contato
específico” (op.cit., p.76-77)”;
(2) “uma imagem do self delineada em termos de atributos sociais aprovados” (op.cit.,
p.77);
(3) “algo que se localiza no fluxo de eventos que se desenrolam no encontro, e se torna
manifesto apenas quando estes eventos são lidos e interpretados em função das
avaliações que nele se expressam” (op.cit., p.78)
15
Goffman (op.cit.) introduziu várias expressões relacionadas ao termo face, entre
as quais citamos as seguintes:
face social: “embora a face social de uma pessoa possa ser o que ela possui de mais pessoal, o centro de sua segurança e prazer, trata-se apenas de um empréstimo que lhe foi feito pela sociedade: poderá ser-lhe retirada caso não se comporte de modo a merecê-la” (p.80-81). manter a face: manter a face hoje implica ter adotado uma determinada linha coerente com a anterior (ex.: se a pessoa aceitou ser humilhada, os outros não terão consideração com seus sentimentos, no presente). estar na face errada: “uma pessoa está na face errada quando surge uma informação acerca de seu valor social que não pode ser integrada, mesmo com esforço, à face que está sendo sustentada” (p.79). estar na face errada / fora da face: produz sentimentos (justificados ou não) de vergonha, inferioridade, embaraço. A pessoa teme perder sua reputação e isso constitui uma ameaça à face e aos sentimentos ligados à mesma. A expressão “perder a face” significa estar fora da face, estar na face errada, estar envergonhado (perder o prestígio; desacreditar-se). estar em face / estar na face certa: produz confiança e segurança ou quando não está, mas os outros não deixam isto transparecer. salvar a face: refere-se ao processo pelo qual a pessoa sustenta para os outros a impressão de não ter perdido a face (salvar as aparências) trabalhos de face / elaboração da face: pretende designar “as ações através das quais uma pessoa é capaz de tornar qualquer coisa que esteja fazendo consistente com a face” (p.82)
Os tipos básicos de elaboração de face (trabalhos de face), segundo Goffman (op.cit.), são:
Processo de evitação: O modo mais seguro de se evitar ameaças à própria face é
evitar contatos nos quais exista a probabilidade de ocorrência de tais ameaças. Uma vez
que se tenha arriscado um encontro, como medida defensiva a pessoa pode manter-se
afastada de tópicos e atividades que poderiam levar à expressão de informações
inconsistentes com a linha seguida. Por outro lado, como manobra protetora, a pessoa
pode mostrar-se respeitosa e polida; empregar discrição; deixar de expor fatos que
poderiam, implícita ou explicitamente, contradizer e embaraçar as reivindicações
positivas feitas por outros; fazer ligeiras modificações nas exigências feitas aos outros e
na apreciação dos outros, etc.
16
Processo corretivo: Os participantes tendem a dar à ameaça ocorrida o status de
incidente, para ratificá-la como uma ameaça que merece atenção oficial direta, e tentar
corrigir seus efeitos. A extensão e a intensidade do esforço corretivo são habilmente
adaptadas à persistência e intensidade da ameaça.
Um encontro pode tornar-se não uma cena de consideração mútua das faces, mas
uma arena na qual se desenrola um concurso ou uma competição. Objetivo: marcar o
maior número possível de pontos contra o adversário e fazer o maior número de pontos
para si mesmo (e.g. introduzir fatos lisonjeiros sobre si mesmo e fatos desfavoráveis
sobre os outros, dar alfinetadas, fazer afrontas, etc.) Em suma, estamos diante de
intercâmbios agressivos: o vencedor demonstra que, como interagente, consegue lidar
consigo mesmo melhor que seus adversários. É o que Goffman chamou de “fazer
pontos”, isto é, é o uso agressivo da elaboração facial.
Para Goffman, é fundamental a escolha da elaboração de face apropriada.
Quando ocorre um incidente, a pessoa cuja face é ameaçada pode tentar restabelecer a
ordem ritual através de um tipo de estratégia, enquanto os outros participantes podem
estar desejando ou esperando o emprego de uma prática de tipo diferente. Portanto,
quando alguém comete uma gafe, todos podem ficar embaraçados, não por uma
inabilidade em lidar com tais dificuldades, mas porque, por um momento, ninguém sabe
se o ofensor vai deixar passar o incidente, dar-lhe um reconhecimento jocoso ou
empregar alguma outra prática salvadora da face.
Sempre que há uma ameaça à face, uma elaboração deve ser feita. Como cada
participante em uma situação de interação está preocupado em salvar a própria face e a
face dos outros, embora por razões diferentes, produzir-se-á naturalmente uma
cooperação tácita, de tal forma que os participantes, em conjunto, possam atingir seus
objetivos comuns, apesar de diferentemente motivados.
Quando uma pessoa é responsável pela introdução de uma ameaça à face de
outrem, ela aparentemente tem o direito, dentro de certos limites, de esquivar-se da
dificuldade através da auto-degradação. Portanto, em termos do código ritual, a pessoa
parece ter uma permissão especial para aceitar maus-tratos de si própria, porém não
17
pode aceitá-los caso venham de outrem. Além disso, dentro de certos limites, a pessoa
tem o direito de perdoar afrontas de outros participantes à sua imagem sagrada. Pode,
indulgentemente, deixar passar ofensas sem importância à sua face, e, quando se trata de
danos maiores, é ela a pessoa que está em posição de aceitar desculpas em nome de seu
self sagrado. É o que Goffman denominou de “os papéis rituais do self”. Em suma, os
direitos e deveres de um interagente são planejados para impedi-lo de abusar de seu
papel como objeto de valor sagrado.
Em qualquer sociedade, sempre que surge a possibilidade física de uma interação
falada, um sistema de práticas, convenções e regras de procedimento, que funciona
como um meio de guiar e organizar o fluxo de mensagens, parece entrar em jogo. Uma
compreensão acerca de quando e onde será permissível iniciar a conversa, entre quem, e
através de que tópicos, prevalecerá. Estas regras de fala pertencem, não à
interação falada enquanto processo contínuo, mas a uma ocasião de fala ou episódio de
interação como uma unidade naturalmente de marcada.
As convenções relacionadas à estrutura das ocasiões de fala representam uma
solução efetiva para o problema da organização de um fluxo de mensagens faladas. Ao
se tentar descobrir como tais convenções são mantidas com tal vigor como guias para a
ação, encontram-se indícios que sugerem uma relação funcional entre a estrutura do self
e a estrutura da interação falada.
Essa interação entre o self e a interação falada se revela mais claramente quando
se examina o intercâmbio ritual. Num encontro em que há conversa, a interação tende a
desenvolver-se em jorros, um intercâmbio de cada vez, e o fluxo de informação e
negócios é parcelado em termos dessas unidades rituais relativamente fechadas.
Quando uma pessoa começa um encontro mediado ou imediato, já existe algum
tipo de relação social entre ela e os outros interessados, assim como uma expectativa de
sua parte quanto à relação que manterá com estes após o término do encontro. Esta é
uma das formas pelas quais contatos sociais se inserem na sociedade mais ampla.
O fato de que cada um dos membros garanta seu apoio a uma dada face para os
outros membros em uma dada situação parece ser uma obrigação característica de
18
muitas relações sociais. Portanto, para impedir o rompimento de tais relações, é
necessário que cada membro evite destruir a face dos outros. Uma relação social, então,
pode ser vista como um modo pelo qual a pessoa é forçada a confiar sua auto-imagem e
sua face ao tato e à boa conduta de outros.
Deve-se observar o fato de que qualquer sociedade, enquanto sociedade, deve
mobilizar seus membros como participantes auto-reguladores em encontros sociais. O
ritual é uma forma através da qual se pode mobilizar o indivíduo para este propósito.
2.1.2 Face e trabalho de face: Brown e Levinson
Com relação ao conceito de face, esta também é definida pelos autores (1978)
como a imagem social ou pública do self que todos querem reivindicar para si mesmos,
e que é constituída de dois aspectos relacionados.
Esses aspectos consistiriam de dois desejos básicos, que seriam:
(1) o desejo de não sofrer imposições, de ter liberdade de ação (não ser cerceado ou
impedido em suas ações), de reivindicar territorialidade, de preservação pessoal ou
privacidade, denominado de face negativa;
(2) o desejo de que a imagem do self seja aprovada e apreciada pelos interlocutores,
que os demais compartilhem e aprovem pelo menos algumas manifestações de sua
personalidade (forma de pensar, de agir, etc.), denominado de face positiva.
Os autores partem do pressuposto de que os atos de fala são ameaças potenciais
aos desejos de face e definem estratégias de polidez como aquelas utilizadas para
mitigar o grau de ameaça potencial existente nos atos de fala. Portanto, segundo esses
autores, todo ato de fala seria potencialmente ameaçador à face (face threatening acts,
FTAs) ou imagem social do falante e/ou do ouvinte.
A partir desse pressuposto, Brown e Levinson propõem um modelo de
estratégias de polidez (politeness strategies), que têm como objetivo atenuar o efeito
social negativo de atos que supõem a possibilidade de uma ameaça às faces de falantes e
ouvintes. Essas estratégias de polidez constituem trabalhos de face (face work), que são
19
comportamentos realizados com o propósito atenuar ou evitar os efeitos dos atos de
ameaça à face.
Exemplos de ameaça à face negativa do interlocutor seriam pedidos ou ordens,
pois eles limitariam o direito da pessoa de decidir sobre suas próprias ações. O
adequado, para evitar-se o conflito, seria escolher um modo indireto ou atenuado de
formular o pedido (ou a ordem), que levasse em consideração a vontade do interpelado.
Ex.: (1) Me passe esse livro. (2) Me passe esse livro, por favor?
(3) Você poderia me passar esse livro, por favor?
(4) Será que você poderia me passar esse livro, por favor? Nos exemplos acima, o (1) ameaça a face negativa do interlocutor; já os
exemplos (2 - 4) possuem diferentes graus de atenuação para minimizar esse efeito de
ameaça.
Outros aspectos que devem ser levados em conta são os prosódicos, como a
entonação. Um mesmo enunciado, como (1), pode, conforme a entonação dada pelo
falante, ameaçar ou não a face do interlocutor.
Também as variáveis sociológicas (por exemplo, a distância social existente
entre os falantes) são fundamentais. O enunciado (1) pode não soar ameaçador à face, se
os falantes possuírem um alto grau de envolvimento e/ou intimidade.
No caso de ataques à face positiva, seria apropriado minimizar uma expressão de
desacordo ou de desaprovação para não frustrar os desejos de aprovação do interlocutor.
Ex.: (5) Na minha opinião, isso não procede. (6) Se não me engano, não foi isso que ele falou. (7) Eu acho que não é bem assim. (8) Dizem que foi isso o que aconteceu. (9) Parece que eles brigaram. Vamos analisar os exemplos acima segundo a terminologia adotada por Rosa
(1992). Os exemplos (5-6) lançam mão de marcadores de rejeição (disclaimers),
pequenos prefácios que costumam preceder possíveis atos ameaçadores da face, como
críticas, proibições, ordens (se não me engano, não me leve a mal, a meu ver, na minha
opinião, etc.). Esses marcadores preservam a face do enunciador, restringindo a gama
de respostas que possam gerar algum tipo de conflito entre os participantes de uma
interação. Também preservam a face do interlocutor, afastando, de antemão,
interpretações danosas à interação.
20
O exemplo (7) faz uso de um marcador de evasão (hedge), que introduz um
grau de incerteza ou imprecisão. Há evasivos de dois tipos: (1) indicadores de atividade
cognitiva = atenuação da impositividade (assim, quer dizer, sei lá, não sei, etc) e (2)
indicadores de incerteza = diminuição do comprometimento para com o que foi
enunciado (acho que, não sei, etc).
Os exemplos (8 – 9) lançam mão de marcadores de distanciamento, que
sinalizam lingüisticamente o afastamento do enunciador da situação de comunicação,
deslocando a responsabilidade, através de marcas lingüísticas de impessoalidade (
parece que, parece, é possível que, etc) e indeterminação do sujeito do enunciado (diz
que, dizem que, diz-se, segundo fulano, etc.).
Os procedimentos de atenuação contribuem para preservar a face na interação e
podem ser de natureza não-verbal (um sorriso), de natureza prosódica (entonação,
altura) ou de natureza verbal (palavras ou expressões atenuadoras).
Uma advertência, contudo, deve ser feita. Dizer que os elementos atenuadores
são procedimentos de preservação da face pode levar a uma confusão entre as noções de
polidez e de atenuação, que não são fenômenos equivalentes. Fraser (1980) considera
que o abrandamento ou atenuação implica polidez, mas não o inverso. O fenômeno da
polidez é mais amplo do que a atenuação e pode prescindir de procedimentos
atenuadores (por exemplo, um cumprimento é um ato de polidez, porém não é um
procedimento atenuador), além de ser possível a realização da polidez mediante
procedimentos de intensificação, como veremos mais adiante.
21
2. 2 A noção de polidez 2.2.1 Teoria da Polidez de Brown e Levinson A Teoria da Polidez de Brown e Levinson (1978) é uma extensão do conceito
de face e de elaboração da face de Goffman. Essa teoria propõe a existência de dois
princípios que governariam o uso da linguagem, a cooperação e a polidez. A
cooperação é definida como eficiência comunicativa e a polidez, como a expressão das
relações sociais.
A Teoria da Polidez adota como ponto de partida um “modelo de pessoa” (um
falante adulto de uma língua natural, fluente) dotado de duas propriedades:
racionalidade (modo de raciocínio) e face. O princípio da racionalidade consiste na
habilidade desse indivíduo modelar de escolher estratégias lingüísticas para atingir
determinados fins comunicativos. As escolhas feitas por um modelo de pessoa
(doravante, MP), para lidar com o desejo de ser eficiente comunicativamente e com os
desejos de face do self e do outro fornecem um modelo de descrição do estilo de
interação verbal.
Os pressupostos que fundamentam essa teoria podem ser assim resumidos: 1) Todos os MPs (falantes e ouvintes) têm face positiva e face negativa e todos os
MPs são agentes racionais, isto é, escolhem meios que irão satisfazer seus fins. 2) Dado que face consiste em um conjunto de desejos satisfeitos apenas por ações
(incluindo expressões de desejos) dos outros, é geralmente de interesse mútuo dos dois MPs manter a face um do outro, a não ser que o falante faça com que, via coerção, ameaça, etc., o ouvinte mantenha a sua face sem ter que recompensá-lo.
3) Alguns atos são intrinsecamente ameaçadores à face (AAFs: atos de ameaça a face).
4) A não ser que o falante queira fazer um AAF com máxima eficiência, (‘na bucha’, diretamente, bold on record), é desejável que o falante preserve a face do ouvinte (ou a sua própria) em algum grau, assim o falante desejará minimizar a ameaça à face do ato de fala.
5) Quanto mais um ato for ameaçador à face do falante e/ou do ouvinte, mais o falante deverá escolher uma estratégia destinada a minimizar o risco de ameaça às faces envolvidas.
Brown e Levinson (op. cit.) propõem a seguinte classificação para os atos de
ameaça à face, levando em consideração o tipo de face (positiva ou negativa) e o alvo
da ameaça (falante e/ou ouvinte):
22
A) Atos que ameaçam a face negativa (FN) do ouvinte: 1) atos que predizem alguma ação futura do ouvinte, gerando algum tipo de pressão
sobre o mesmo (ordem, pedido, sugestão, ameaça, advertência); 2) atos que prevêem alguma ação futura do falante, criando algum tipo de pressão
sobre o ouvinte (oferecimento, promessas); 3) atos que indicam o desejo do falante em relação ao ouvinte (cumprimentos,
elogios). B) Atos que ameaçam a face positiva (FP) do ouvinte (o falante não se importa com os desejos do ouvinte): 1) mostram que o falante tem uma avaliação negativa de alguns aspectos da FP do
ouvinte: expressar desacordo, críticas, ridicularização, insulto, questionamentos, etc.;
2) mostram que o falante não valoriza, nem teme o que o ouvinte teme: ser irreverente; falar de tabus ou coisas impróprias ao contexto; contar coisas desagradáveis sobre o ouvinte e agradáveis de si mesmo; demonstrar não-cooperação; interromper a fala do outro; não prestar atenção e marcar diferença de status através de termos de endereçamento.
C) Atos que ameaçam a face do falante e do ouvinte: 1) atos que ameaçam a face negativa do falante e do ouvinte: expressar
agradecimentos; aceitar agradecimentos / pedidos de desculpas, obrigando a minimizar transgressão do ouvinte; desculpar após um ato criticado pelo ouvinte; aceitar oferecimentos (o falante fica em débito); responder a um faux
pas (gafe) do ouvinte; promessas e oferecimentos (o falante promete, mas não quer / pode cumprir).
2) atos que ameaçam a face positiva do falante: pedir desculpas; aceitar elogios;
auto-humilhar-se; confundir-se; acovardar-se; agir como um idiota; confessar-se e admitir culpa.
As estratégias de polidez positiva, que estão direcionadas aos desejos de face
positiva do ouvinte, têm como função “azeitar” as relações sociais. Brown e Levinson
dividem as estratégias de polidez positiva em três grandes mecanismos, que se
desmembram dando origem a um conjunto de quinze estratégias:
1º) Reivindicar base comum: Estratégia 1: tomar conhecimento, atender ao ouvinte (seus desejos, interesses, necessidades, bens); Estratégia 2: exagerar (interesse, aprovação, solidariedade com o ouvinte); Estratégia 3: intensificar interesse pelo ouvinte; Estratégia 4: utilizar marcadores de identidade do grupo, por exemplo, apelidos, formas de tratamento;
23
Estratégia 5: procurar acordo; Estratégia 6: evitar desacordo; Estratégia 7: pressupor, levantar, garantir base comum, por exemplo, falar “abobrinhas”, boatos ou assuntos que interessam ao falante e ao ouvinte antes de chegar ao “ponto”; Estratégia 8: fazer piadas para reparar um FTA. 2º) Informar que falante e ouvinte são cooperativos: Estratégia 9: garantir ou pressupor o conhecimento e interesses do falante pelos desejos do ouvinte e não potencialmente pressionar o ouvinte a cooperar com o falante ; Estratégia 10: oferecer, prometer (o que quer que o ouvinte deseje, o falante deseja por ele e o ajudará a obtê-lo); Estratégia 11: ser otimista, isto é, o falante assume que o ouvinte deseja os desejos do falante (interesse partilhado); Estratégia 12: incluir tanto o falante quanto o ouvinte na atividade, por exemplo, o uso de “nós” inclusivo; Estratégia 13: dar ou pedir razões, explicações, incluindo o uso de sugestões indiretas; Estratégia 14: supor ou garantir reciprocidade (direitos ou obrigações recíprocas). 3º) Atender aos desejos do outro: Estratégia 15: dar presentes para o ouvinte (bens, solidariedade, compreensão, cooperação, etc.), com a função de demonstrar que o ouvinte é: amado, admirado, compreendido, escutado, etc.
Brown e Levinson também propõem um total de dez estratégias de polidez
negativa, cuja função seria amenizar a imposição particular de um Ato de Ameaça à
Face (AAF). São elas: ser convencionalmente indireto; perguntar em vez de afirmar, ser
evasivo; ser pessimista; minimizar a imposição; fazer deferência; desculpar-se;
impessoalizar falante e ouvinte; apresentar um AAF como regra geral; usar estratégias
de nominalização; incorrer em débito com o ouvinte ou fazê-lo, não criando um débito
para o ouvinte.
Nas seções a seguir, apresentamos alguns outros modelos que têm como ponto
de partida a Teoria da Polidez de Brown e Levinson, porém a ela fazem críticas ou
propõem reformulações.
2.2.2 Modelo de Comunicação de Lim e Bowers Lim e Bowers criticam o fato de Brown e Levinson (op.cit) darem atenção
excessiva aos atos que ameaçam a face negativa (para eles face da autonomia),
negligenciando os trabalhos de face direcionados aos desejos de face positiva.
24
Diferentemente de Brown & Levinson (op.cit), esses autores defendem que as
estratégias de polidez positiva são dirigidas a dois desejos humanos distintos: o de ser
incluído e aceito pelos outros (polidez positiva para de Brown & Levinson) e o desejo
de ter suas habilidades respeitadas. O desejo de inclusão corresponderia, segundo eles,
à face da camaradagem, segundo a qual os participantes querem ser considerados
membros de um grupo, envolvendo os desejos de aceitação e pertencimento. Ao
reivindicarem a face da camaradagem, os participantes reivindicam valores associados à
amizade e cooperação. O segundo, o desejo de aprovação, corresponderia, à face da
competência e à necessidade de todo ser humano de ter suas habilidades reconhecidas e
suas ações respeitadas.
Propõem com isso um novo modelo de trabalhos de face, com três tipos de
desejos de face: o de inclusão, o de aprovação e o de estar livre de imposições ou
controle por parte de terceiros. A cada um desses desejos de face, corresponde um tipo
diferente de trabalho de face: estratégias de solidariedade, ligadas à face da
camaradagem; estratégias de aprovação, ligadas à face da competência e estratégias de
tato, associadas à face da autonomia.
Os autores apresentam, ainda, três fatores sociais como determinantes na escolha
dos trabalhos de face: a intimidade relacional, a diferença de poder e o direito de
realizar determinado ato.
A intimidade relacional entre os participantes da interação é o fator que mais
influencia a escolha dos trabalhos de face adotados. Quanto mais próxima for a relação
entre os interlocutores, mais eles sentir-se-ão obrigados a cooperar mutuamente, e
tornar-se-ão mais dispostos à tolerância de imposições e críticas. Sendo assim, o esforço
para minimizar uma ameaça à face do outro diminui à medida que a intimidade
aumenta. Porém, quando ocorrerem casos de ameaças à face que superem os limites
tolerados, essa dinâmica mudará e os interlocutores reagirão tão ou mais negativamente,
caso a relação entre eles não seja de proximidade.
O segundo fator social apontado pelos autores é a diferença de poder. Ele
influencia as escolhas dos trabalhos de face em uma medida menor do que a intimidade
relacional (devido à ideologia do igualitarismo que rege a maioria das sociedades), mas
também é uma influência forte nessas escolhas. À medida que o poder de um
25
interlocutor sobre o outro aumenta, ocorre, na mesma proporção, uma diminuição nos
índices de solidariedade, aprovação e tato, mas somente entre pessoas com baixo grau
de intimidade.
O terceiro e último fator social é o direito de realizar um ato. A legitimidade da
ação influencia os trabalhos de face, uma vez que os interlocutores, à medida que seu
direito de imposição e/ou desaprovação diminuem, tendem a utilizar níveis mais
elevados de tato e/ou aprovação.
2.2.3 Sistemas de polidez de Scollon e Scollon Scollon e Scollon (1995) definem e classificam três Sistemas de Polidez ou de
Face: Sistema de Deferência, Sistema de Solidariedade e Sistema Hierárquico. Tais
sistemas fazem uso de Estratégias de Polidez, que podem ser de dois tipos: de
envolvimento e de independência.
Na interação, além dos aspectos implicados na participação dos interlocutores
(em termos de quem são eles e de que papéis assumem), há um importante aspecto de
identidade tido como um elemento essencial à “participação”, ou seja, a identidade
interpessoal dos indivíduos envolvidos na interação. Este componente, segundo Scollon
e Scollon (op. cit.), tem sido referido como “face”. Face, portanto, segundo eles, é um
conceito paradoxal por implicar dois lados que estão em oposição: (a) a necessidade
humana de manter / expressar algum grau de independência em relação ao outro
participante e (b) a necessidade humana de estar envolvido com os outros participantes
e mostrar-lhes este envolvimento.
Segundo Scollon e Scollon, as estratégias utilizadas para mostrar independência
enfatizam a individualidade dos participantes, seu direito a não serem completamente
dominados seja por valores sociais, seja por valores do grupo, sendo expresso o desejo
de que a pessoa quer agir com algum grau de autonomia / liberdade de movimentos ou
de escolha. Para esses autores toda comunicação implica envolvimento e eles afirmam
que envolvimento pode ser manifestado ao assumir-se o ponto de vista do outro, ou
através de qualquer meio de demonstrar que o falante deseja sustentar uma visão de
mundo partilhada.
26
Por outro lado, os participantes devem partilhar alguns aspectos dos sistemas
simbólicos para que possam se intercomunicar. A necessidade de enfatizar
independência, porém, põe em risco o envolvimento e vice-versa, o que gera um
conflito. Destacam-se dez estratégias de envolvimento, que são aquelas utilizadas pelos
participantes de nosso corpus. São elas:
1) notar o ouvinte, atendê-lo:
“Gostei de sua jaqueta”; “Você está se sentindo melhor agora?” 2) exagerar interesse, aprovação ou simpatia pelo outro:
“Por favor, seja cuidadoso com os degraus, eles são muito escorregadios” 3) reivindicar pertencer ao mesmo grupo do ouvinte: “Todos nós aqui da PUC”. 4) reivindicar ponto de vista comum, opiniões, atitudes, conhecimento, empatia: “Eu sei como você se sente. Tive um resfriado destes a semana passada”
5) ser otimista: “Acho que vamos acabar este trabalho bem rápido.”
6) indicar que o falante conhece e leva em consideração os desejos do outro: “Tenho certeza que todos vocês querem saber quando esta reunião vai acabar.”
7) assumir ou afirmar reciprocidade: “Eu sei que você quer se dar bem nas vendas, tanto quanto eu quero que isto
ocorra.”
8) usar o primeiro nome ou apelido: “Bill, você pode fazer aquela reportagem para mim, amanhã?”
9) ser volúvel: (por exemplo, falar abobrinhas) 10) usar a linguagem ou o dialeto do ouvinte:
“Tudo bem, guria?”
Esses autores, tal como Brown e Levinson, afirmam que há três fatores que
determinam a escolha das estratégias e que colocam esse sistema em jogo: poder,
distância e grau de imposição (teor de risco).
O poder refere-se à diferença vertical entre os participantes numa estrutura
hierárquica. Por exemplo, a relação entre patrão e empregado é categorizada como
[+Poder]. A relação [-Poder] ocorre quando há pouca ou nenhuma diferença hierárquica
entre os participantes, trata-se de um sistema igualitário, como é o caso de nosso corpus.
Na distância, a relação pode ser entre desconhecidos [+Distância] ou entre
conhecidos, amigos [-Distância], este último sendo o caso de nossos dados. Assim, uma
conversa entre pessoas que possuem cargos equivalentes, mas são desconhecidas entre
27
si, seria categorizada como [+ Distância] e [-Poder] e uma conversa entre amigos como
de [-Distância] e [-Poder].
O terceiro fator a influenciar a escolha de estratégias de face é, segundo eles, o
grau de imposição. Mesmo se dois participantes têm relações fixas, as estratégias de
face usadas irão variar, dependendo da importância por eles atribuída ao tópico em
discussão (grau de ameaça inerente ao conteúdo proposicional do ato de fala). Esse fator
é muito relevante, e pode ser comprovado em nosso corpus, nos excertos (1) e (2) da
parte 1A (manutenção de rapport) de nossa análise.
Scollon e Scollon concluem que diferença hierárquica está associada a poder e
que grau de conhecimento está associado à distância (contato). Fatores como poder e
distância podem decorrer das mais diversas razões. Variam de sociedade para sociedade
e também no curso da história. Os autores ressaltam ainda que esses fatores estão
diretamente associados ao tipo de sistema de polidez que está operando na interação em
um dado momento: a deferência, a solidariedade ou a hierarquia.
Para que possa ser aplicado o Sistema de Deferência [-P; +D], as duas pessoas
que têm o mesmo status (-P), mas são desconhecidas (+D), devem usar um sistema de
deferência mútua, isto é, serão distantes e independentes. Pode-se encontrar este sistema
onde quer que a relação seja igualitária, mas em que os participantes queiram manter
distância (com deferência) entre eles. Esse sistema possui as seguintes características:
(1) ser simétrico (-P): os participantes usam estratégias de independência ao falar com o
outro; (2) ser distante (+D): cada participante usa estratégias de independência ao falar
com o outro.
No Sistema Hierárquico, os participantes reconhecem e respeitam as diferenças
sociais que coloca um deles numa posição superordenada (superior) e o outro, numa
posição subordinada. A principal característica deste sistema é o reconhecimento da
diferença de status ou [+P]: (1) relações assimétricas: os participantes se vêem como
estando em posições sociais desiguais; (2) relações assimétricas: os participantes usam
de estratégias de face diferentes: o superior usa estratégias de envolvimento e o
subordinado estratégias de independência.
28
Finalmente, no Sistema de Solidariedade (-P, -D), que é o sistema utilizado pelos
participantes de nosso corpus, há um alto grau de envolvimento, não havendo
sentimentos de diferença de poder entre os participantes da interação, nem de distância.
Esse sistema possui as seguintes características: (1). relação simétrica (-P): os
participantes se vêem como estando na mesma posição social; (2). relação estreita (-D):
ambos os participantes usam estratégias de envolvimento.
Podemos encontrar o Sistema de Solidariedade em todas as situações em que as
relações forem igualitárias e os participantes sintam ou expressem proximidade uns com
os outros. Amizades entre colegas de trabalho, parentes ou amigos que são muito
próximos, íntimos, geralmente são sistemas de solidariedade.
2.2.4 Tipos de polidez de Kerbrat-Orecchioni
Segundo Kerbrat-Orecchioni (1996), a teoria de Brown e Levinson é relevante
em seu fundamento básico: polidez é real e fundamentalmente uma questão de faces, de
desejo de face e de trabalho de face. Isso não significa necessariamente que todas as
coisas em uma interação correspondam a questões de face.
O maior impedimento para o correto funcionamento do modelo de Brown e
Levinson é, de acordo com essa autora, a extrema falta de clareza que permeia as
noções de negativo e positivo. Para ela, esses predicados se aplicam a dois objetos
diferentes: face e polidez.
No que concerne à noção de face, a face negativa corresponde aproximadamente
à noção de “território” de Goffman; e face positiva corresponde, grosso modo, ao que a
linguagem comumente chama ‘face’, que alguém pode perder ou salvar, estando
associada a orgulho, sentido de honra, narcisismo.
Por que, então renomear respectivamente ‘território’ e ‘face’ em ‘face negativa’
e ‘face positiva’, expressões que implicam que poderia existir uma relação de oposição
entre essas duas entidades, quando existe, de fato, dois constituintes complementares de
qualquer indivíduo social? De acordo com Kerbrat-Orecchioni, para correlacioná-los
29
com duas formas de polidez, a positiva e a negativa, e é neste ponto, segundo ela, que
surgem os problemas.
No que concerne à polidez, a negativa é primeiramente orientada para a
satisfação dos desejos de face negativa, porém Brown e Levinson acrescentam que essa
forma de polidez é principalmente baseada na evitação. O mesmo argumento pode ser
aplicado no que concerne à face positiva, a qual é o cenário dos desejos de preservação
e gratificação. Brown e Levinson incorporam, nesse momento, face positiva e polidez
positiva, quando a autora acredita que deveria ser:
(1) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face negativa (por exemplo, abrandar uma ordem); (2) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face negativa (por exemplo, um presente); (3) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face positiva (por exemplo, abrandar uma crítica ou um desacordo); (4) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face positiva (por exemplo, um elogio, uma expressão de acordo, etc.).
As principais proposições de ajustes ao modelo de Brown e Levinson feitas por
essa autora consistem, exatamente, em dissociar face negativa e face positiva de polidez
negativa e polidez positiva.
Kerbrat-Orecchioni também critica o fato de Brown e Levinson não haverem
ponderado que alguns atos poderiam ser lisonjeiros para as faces, como votos,
agradecimentos e elogios. É por isso que ela propõe introduzir um termo extra dentro
desse modelo teórico para referir-se a esses atos que são, de certo modo, uma cópia
positiva dos FTAs, aos quais ela chamou de FFAs (Face Flattering Acts), isto é, Atos
Lisonjeiros de Face.
30
2.3 A noção de rapport, de envolvimento e conceitos associados
2.3.1 Gerenciamento de rapport: Spencer-Oatey
Segundo Spencer-Oatey (2000), existem três características importantes que
incidem sobre o gerenciamento das relações sociais:
1) o uso que as pessoas fazem da linguagem pode influenciar as relações interpessoais; 2) as pessoas tentam controlar suas relações com as outras pessoas; 3) culturas diferentes podem ter convenções diferentes para o que é um comportamento apropriado e em qual contexto.
Segundo essa autora (op.cit.), as pessoas frequentemente pensam em
comunicação como ‘transmissão de informação’. Comunicação, porém, também
envolve ‘gerenciamento de relações sociais’. A autora define esse gerenciamento das
relações interpessoais como o uso da linguagem para promover, manter ou ameaçar
relações sociais harmoniosas e sugere o termo “rapport management” (gerenciamento
de rapport) para se referir a esta área.
Brown e Yule (1983) identificam duas funções principais da linguagem: a
função transacional (ou transferência de informação) e a função interacional (ou
manutenção de relações sociais). Previsões do tempo e conferências acadêmicas são
exemplos típicos de linguagem transacional, enquanto agradecimentos e small talk são
exemplos de linguagem interacional.
Spencer-Oatey (op.cit.) acredita que face é um fenômeno universal – todas as
pessoas possuem as mesmas preocupações fundamentais com a face – e que polidez é,
na verdade, um julgamento contextual: ‘nenhuma sentença é inerentemente polida ou
impolida’. O escopo da teoria da polidez tradicional é a manutenção e/ou promoção de
relações interpessoais harmoniosas.
Ela, por outro lado, emprega o termo ‘gerenciamento de rapport’ ao invés de
‘gerenciamento de face’ porque, segundo ela, o termo ‘face’ parece focar preocupações
com o self, enquanto gerenciamento de rapport sugere mais um equilíbrio entre o self e
o outro. A preocupação com o gerenciamento de rapport também é mais extensa: ele
examina o modo pelo qual a linguagem é usada para construir, manter e/ou ameaçar as
31
relações sociais e inclui o gerenciamento dos direitos sociais assim como de face. Pode-
se deduzir, portanto, que rapport pode envolver tanto relações de harmonia quanto de
conflito.
Spencer-Oatey (op.cit) propõe que gerenciamento de rapport (o gerenciamento
da harmonia – desarmonia entre as pessoas) envolve dois componentes principais: o
gerenciamento de face e o gerenciamento dos direitos sociais. O primeiro, como o
próprio nome indica, envolve o gerenciamento das necessidades da face segundo a
definição de Goffman (1972, p.5) já citada anteriormente.
O gerenciamento dos direitos sociais, por outro lado, envolve o gerenciamento
de expectativas sociais, que Spencer-Oatey define como “denominações fundamentais /
básicas / essenciais, pessoais e sociais, que os indivíduos efetivamente reivindicam para
si próprios em suas interações com os outros” (2000, p.14).
Essa autora (op.cit.) sugere que face possui dois aspectos inter-relacionados:
atributos / habilidades e papéis / identidades sociais.
(i) Face da competência: nós possuímos o desejo básico de que as pessoas nos avaliem positivamente em termos de nossas qualidades pessoais, isto é, nossas habilidades, competência, aparência, etc. Face da competência se relaciona com os valores que nós efetivamente reivindicamos para nós mesmos, em termos de qualidades pessoais, e, por isso, está intimamente relacionada com nosso senso de auto-estima pessoal. (cf. face da competência de Lim & Bowers) (ii) Face da identidade: nós possuímos o desejo básico de que as pessoas conheçam e apoiem nossas identidades ou papéis sociais, isto é, como líderes de grupo, amigos íntimos, etc. Face da identidade se relaciona com os valores que nós efetivamente reivindicamos para nós mesmos em termos de papéis sociais ou de grupo, e está intimamente relacionada com nosso senso de valor na esfera pública.
Similarmente, Spencer-Oatey (op.cit.) também sugere que direitos sociais
possuem dois aspectos inter-relacionados:
(iii) Direitos à justiça / imparcialidade: nós possuímos a crença básica em que temos o direito de reivindicar considerações pessoais dos outros, de maneira que sejamos tratados de maneira justa e honesta: que não sejamos indevidamente iludidos / ludibriados; que não sejamos instruídos de maneira injusta ou desonesta; e que não sejamos explorados ou que tirem proveito de nós. Parece haver dois componentes para essas reivindicações por justiça: a noção de custo-benefício (o grau em que somos explorados ou sofremos desvantagens, e a crença de que custos e benefícios deveriam ser mantidos rigidamente equilibrados através do princípio da reciprocidade), e a
32
questão relativa à autonomia-imposição (o grau em que as pessoas nos controlam ou nos impõem e/ou ordenam algo). (iv) Direitos à associação: nós possuímos a crença básica de que temos o direito de reivindicar uma associação com os outros que é restringida / sustentada pelo tipo de relação que temos com elas. Esses direitos de associação concernem em parte à associação-dissociação interacional (o tipo e o grau de nosso envolvimento com os outros). Eles também concernem à associação-dissociação afetiva (o grau pelo qual compartilhamos ansiedades, sentimentos e interesses).
Gerenciamento de face
(valores pessoais / sociais) Gerenciamento de direitos sociais (reivindicações pessoais / sociais)
Perspectiva pessoal / Independente
Face da competência / (cf. face positiva de Brown e Levinson)
Direitos de justiça / imparcialidade (cf. face negativa de Brown e Levinson)
Perspectiva social / interdependente
Face da identidade
Direitos de associação
Quadro 1: Componentes do gerenciamento de rapport: (fonte: SPENCER-OATEY, 2000, p.15). Segundo essa autora (op.cit.), existem dois conjuntos de fatores que influenciam
o uso de estratégias, que são: (i) orientações de rapport; e (ii) variáveis contextuais.
O primeiro deles diz respeito à orientação de rapport (sistematizada abaixo) e o
segundo conjunto de fatores que tem uma influência crucial na escolha do
gerenciamento das estratégias são as variáveis contextuais. Nesse segundo conjunto de
fatores, essa autora lista quatro variáveis: as relações dos participantes; o conteúdo das
mensagens; direitos e obrigações; e atividade comunicativa.
Ela sugere quatro tipos de orientações de rapport:
(1) orientação no sentido de AUMENTO / MAXIMIZAÇÃO de rapport: desejo de aumentar ou fortalecer relações harmoniosas entre os interlocutores. Motivos: iniciar uma relação romântica; ganhar um lucrativo contrato de negócios; etc. (2) orientação no sentido de MANUTENÇÃO de rapport: desejo de manter ou proteger a qualidade das relações em curso e o nível de rapport entre os interlocutores. Nesta orientação, existem dois tipos de diretrizes, dependendo da situação, para lograr o efeito desejado:
33
(i) escolher apropriadamente termos de tratamento, de saudação, honoríficos3, etc.; (ii) lidar apropriadamente com atos de ameaça à face. Alguns excertos desse tipo de ato: ordens, críticas, reclamações, desacordos e ameaças. (3) orientação no sentido de NEGLIGÊNCIA de rapport: falta interesse na qualidade das relações. Motivos: situações em que o foco maior está na informação / conteúdo ou nas tarefas e menos na qualidade das relações; estar mais preocupado em manter sua própria face do que na manutenção do rapport da relação; não se importar com a relação por algum motivo qualquer; etc. (4) orientação no sentido de QUESTIONAMENTO de rapport: desejo de questionar ou impedir relações harmoniosas entre os interlocutores; desejo por mudança negativa, prejudicando o rapport entre os interlocutores. Motivos: marcar independência, devolver ofensa, etc. Causar deliberadamente a perda de face das pessoas é uma maneira de consegui-lo.
Segundo a autora, essas orientações não podem ser diretamente observadas,
devendo, portanto, ser inferidas. Apesar da dificuldade, devem ser incluídas em
qualquer pesquisa sobre rapport (p.31) uma vez que, através delas, podemos investigar
qual é o ethos4 que subjaz a uma dada atividade de fala, isto é, em função da orientação
de rapport preponderante.
O segundo conjunto de fatores citado pela autora é composto por quatro
variáveis: as relações entre os participantes; o conteúdo das mensagens; direitos e
obrigações; e atividade comunicativa.
A primeira variável (participantes e suas relações) está subdividida em: poder,
distância, inter-relação entre poder e distância e número de participantes. Não nos
deteremos na análise que essa autora faz dos três primeiros itens, por não considerarmos
relevante para nossa pesquisa. Uma vez que nosso corpus é composto por participantes
que possuem relações de amizade, definidas por Scollon e Scollon como de [-Distância]
e [-Poder], utilizaremos os parâmetros do Sistema de Solidariedade desses autores, já
exposto anteriormente (item 2.2.3).
3 Cf. RONCARATI, C. Dêixis social – a designação socialmente referenciada: “Você sabe com quem está falando?” In: Votre, S. ; Roncarati, C. Anthony Julius Naro e a lingüística no Brasil – uma homenagem acadêmica. Rio de Janeiro: 7Letras/FAPERJ, 2008, p. 115-147. 4 Ethos: noção da retórica de Aristóteles = imagem que um orador transmitia implicitamente de si mesmo, através de sua maneira de falar, entonação, gestos, porte geral. Segundo Maingueneau, todo discurso oral supõe um ethos, uma representação do corpo de seu responsável, que se responsabiliza por ele. É um conjunto de traços psicológicos (jovial, sincero, simpático, ...) e uma corporalidade (um conjunto de traços físicos e indumentários). Cf. MAINGUENEAU, Dominique. Termos-chave da análise do discurso. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2000, p. 59-60.
34
Com relação ao item “número de participantes”, Spencer-Oatey afirma que o que
as pessoas dizem e como elas dizem é freqüentemente influenciado pelo número de
pessoas presentes, e se todas elas estão escutando o que está sendo dito.
Essa autora afirma que a variável conteúdo das mensagens possui uma
influência fundamental na escolha das estratégias de manejo de rapport, uma vez que as
mensagens podem variar em seus prováveis graus de ameaça à face, e podem possuir
“custos” associados a elas. Esses custos não são necessariamente financeiros; eles
podem ser custos de tempo, de esforço, de imposição, de inconveniência, de risco, etc.
A terceira variável é composta pelos papéis sociais / interacionais que podem
influenciar o uso das estratégias de manejo de rapport, no sentido em que eles afetam a
avaliação das pessoas sobre direitos e obrigações. As pessoas cumprem diferentes
papéis sociais e interacionais, tais como: professor / aluno; patrão / empregado; amigo /
amigo; vendedor / cliente; etc., e em cada um desses papéis é necessário cumprir com
uma gama de direitos e obrigações.
A quarta e última variável que, de acordo com Spencer-Oatey, pode influenciar o
uso das estratégias de manejo de rapport é o tipo de atividade comunicativa que está
acontecendo: por exemplo, uma conferência, uma entrevista de emprego, um
julgamento, etc. Atividades comunicativas geralmente são organizadas com base em
gêneros comunicativos, que podem exibir padrões característicos em cada um dos cinco
domínios de manejo de rapport e suas regras e ideais especificados culturalmente
influenciam como os participantes compõem e interpretam a fala.
2.3.2 Conceitos de rapport, de small talk (comunicação fática) e de language play (jogos de palavras) Desde que Malinowski (1972, p. 151 [1923],) cunhou o termo ‘comunicação
fática’ para se referir a “[...] um tipo de discurso no qual laços de união (isto é, relações
interpessoais) são criados meramente pela troca de palavras”, comunicação fática ou
small talk tem sido reconhecida pelos lingüistas como preenchedora de importantes
funções sociais.
35
Firth (1964 [1937], APUD Placencia, 2004) enfatiza a importância da
comunicação fática, apontando a quantidade de tempo que as pessoas dispensam a este
tipo de comunicação em suas vidas diariamente. Knapp (1978, p.112) também enfatiza
a função da comunicação fática quando considera que “[...] small talk é um modo de
manutenção do senso de comunidade e de companheirismo com outros seres humanos,
nos ajudando a fortalecer nossos laços de humanidade”.
Aston (1988) refere-se à comunicação fática como uma conversa interacional
empregada na negociação do rapport positivo (orientado para relações harmoniosas), o
qual ele define como o estabelecimento e a manutenção de relações amigáveis. Assim,
ele emprega essa noção para referir-se não somente a formas convencionalizadas, mas
principalmente a usos individualizados e criativos da linguagem. Esse autor está entre
os primeiros que identificaram uma série de recursos lingüísticos que as pessoas
empregam na negociação das relações amigáveis, além do uso das formas
convencionais.
A noção de Aston (rapport-building) que dá título ao trabalho de Placencia
(2004) é como um termo ‘guarda-chuva’ para uma gama de atividades, incluindo trocas
de language play, atividades criativas não associadas com comunicação fática como ela
tem sido tradicionalmente concebida (perguntas sobre saúde, conversas sobre o tempo,
etc.), cumprimentos, perguntas do tipo “como vai você?”, despedidas amigáveis, entre
outras utilizadas nas estratégias de polidez positiva.
Atividades de language play são descritas por Aston como aquelas que refletem
a orientação dos participantes na manuteção de rapport ou de relações amigáveis.
Alguns exemplos de language play seriam jogos de palavras e jogos lingüísticos com
nomes (nomes próprios, apelidos, etc.). Já para Sherzer (1992, APUD Placencia, 2004),
language play corresponderia à manipulação dos elementos da linguagem, que envolve
modelagem de formas lingüísticas, criação de realidades alternativas e o uso social de
ambos.
Atividades de language play tais como: comportamentos inoportunos, piadas,
jogos lingüísticos com nomes e outros tipos de jogos de palavras são, para Placencia
(2004), atividades que, do mesmo modo que small talk ou comunicação fática, parecem
36
estar orientadas para metas que envolvem relacionamento, embora elas também possam
servir a outras metas (cf. COOK, 2000). Confira-se (excerto Anexo 3, trecho 5):
01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...
02 Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?
03 Carlos -Sí, sí, sí.
04 Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura, ¿no es así?
05 Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...
06 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?
07 08
Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?
09 10 11
Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.
12 Carlos -Claro, claro.
No exemplo acima, por existir confiança, a brincadeira feita por Carlos com a
palavra criatura (ele jogou com os termos “te encontras con la creación” e “la creación
y su criatura” ditos por Mercedes nas linhas 2 e 4) foi interpretada por Mercedes dentro
de um enquadre de brincadeira e não gerou nenhum tipo de situação conflituosa.
Placencia (op. cit.), em seu estudo sobre rapport no contexto de compra e venda
em pequenas lojas/armazéns de bairro em Quito, inclui dentre as atividades de
construção de rapport as seguintes: troca de cumprimentos; perguntas do tipo ‘como vai
você’; tópicos conversacionais tais como saúde, problemas domésticos, feriados, escola
e trabalho; language play; despedidas do tipo ‘desejos de bem-estar ou felicidade’ ou
expressões que ela denomina leave-taking (por exemplo, hasta luego).
Já para Holmes (2000), a comunicação fática, embora sirva para estabelecer um
contato inicial entre duas pessoas, também serve a outras funções, tanto afetivas quanto
referenciais, o que reforça sua afirmação de que “[...] a fala é inerentemente
multifuncional” (op. cit. p. 33). Para ela, o uso da comunicação fática engloba uma série
de funções, dentre as quais as que valem a pena destacar seriam: (1) a de atender aos
desejos de face positiva; e (2) a orientação dos papéis dos participantes na relação.
Segundo essa autora (op.cit.), prestar atenção aos desejos de face dos outros é
um componente crucial no estabelecimento de uma relação de amizade. O
37
significado afetivo de um enunciado envolve a atitude do falante em relação ao ouvinte
no contexto da enunciação. Modificar a força ilocucionária pode servir para expressar
uma variedade de atitudes para com o ouvinte, variando de atitudes muito positivas a
atitudes muito negativas. Uma forma de analisar esta questão é examinar a extensão em
que ela aumenta ou diminui a solidariedade ou a distância social entre os interlocutores.
2.3.3 Conceitos de envolvimento conversacional, de script cultural e de confiança
Na visão de Tannen (1989), a conversação casual é construída através de
estratégias que são persuasivas, espontâneas e funcionais. Ela refere-se a essas
estratégias como estratégias de envolvimento, uma vez que refletem e criam
envolvimento interpessoal. Segundo ela, envolvimento, além de ser marcado pela
prosódia, também ocorre simultaneamente com seqüências e estratégias de
envolvimento, dentre elas: sincronia rítmica; repetição; indiretividade, além de outras
diretamente envolvidas na construção do sentido, tais como: figuras de linguagem;
discurso construído (reportado ou relatado); e narrativa.
A respeito da narrativa, Tannen (op.cit.) afirma que contar uma estória na
conversa pode, por si só, ser uma estratégia de envolvimento. Ela afirma também que
quando há um alto grau de envolvimento, as pessoas tendem a contar suas próprias
experiências pessoais e os sentimentos relativos a esses eventos.
Para Gumperz (1982), envolvimento conversacional é a habilidade de inferir,
de uma maneira global, sobre o que trata a interação e sobre o que um participante
espera ser, localmente, o significado de cada enunciado. Em resumo, envolvimento
conversacional constitui o resultado bem sucedido de uma inferência conversacional.
Esse autor (op.cit.) destaca que falantes e ouvintes, uma vez envolvidos na conversação,
mostram, pela sinalização do envolvimento (tanto por palavras quanto por gestos e
sinais não-verbais), que inferiram aquilo a que a fala em interação se refere. Tannen
(op.cit.) afirma ser esta a base de todo entendimento lingüístico, uma vez que
entendimento pressupõe envolvimento conversacional.
Selting (1994), por sua vez, destaca que o envolvimento é uma noção
interpretativa que faz referência ao campo das emoções e atitudes. O estilo marcado
38
pelas estratégias de envolvimento é denominado por ela de estilo enfático. Essa autora
também afirma que “[...] sinais de ênfase ou surpresa são manifestações emotivas
importantes e comuns nas quais o envolvimento ‘mais-que normal’ é expresso
lingüisticamente por pistas [pistas essas que equivalem às estratégias apontadas por
Tannen e mencionadas anteriormente] que sugerem o apropriado enquadre
interpretativo” (op. cit., p. 376).
Relembre-se que, de acordo com Scollon e Scollon (1995), mostra-se
envolvimento assumindo o ponto de vista do outro, ou através de qualquer meio de
demonstrar que o falante deseja sustentar uma visão de mundo partilhada. Para eles,
toda comunicação implica envolvimento.
Apesar dessas diferenças existentes em termos de focalização, os conceitos de
envolvimento têm em comum: (i) a definição de um mesmo foco de atenção, isto é,
interação centrada cognitiva e visualmente, nos termos de GOFFMAN (1992); e (ii)
partilhamento de pontos de vista, conhecimento, emoções, sentimentos.
Outro conceito relevante para este trabalho é o conceito de script cultural, que é
definido como um padrão de interação social característico de um grupo cultural
particular (TRIANDIS ET ALLI, 1983). Para esses autores, simpatia é o script cultural
dos hispânicos e latino-americanos. Segundo eles, “ser simpático” possui as seguintes
características:
• mostrar certos níveis de conformidade (adaptação); • ter a capacidade de partilhar os sentimentos dos outros; • comportar-se com dignidade e respeito para com os outros; • buscar harmonia nas relações inter-pessoais.
Estas características implicam uma evitação de conflitos interpessoais e uma
tendência por comportamentos positivos que devem ser enfatizados em situações
positivas e comportamentos negativos que devem ser desencorajados em situações
negativas. Esse conceito pode ser pensado à luz dos “valores sociais positivos” que um
dado grupo associa à imagem positiva do self ou as faces reivindicadas pelo grupo, nos
termos de Goffman (1992).
39
A noção de rapport pode ser pensada ainda à luz das noções de confiança e de
intimidade relacional. Placencia (2004) se refere à noção de confiança que Thurén
(1988, p. 222) define como “proximidade ou senso profundo de familiaridade” e como
um “estilo de comunicação” que, estudiosos como Hernández Flores (2001), enfatizam
em estudos de polidez na Espanha.
Segundo Thurén (op.cit.), a confiança pode surgir como o resultado de contato
regular sem necessariamente existir uma relação de amizade entre os participantes (caso
do corpus trabalhado por Placencia em seu estudo citado aqui). Este, porém, não é o
caso de nossos dados, onde se comprova, através de pistas contextuais e de
conhecimento de mundo compartilhado, a existência de amizade entre os participantes.
Ainda segundo Thurén, é a presença da confiança que torna certos tipos de language
play e outros comportamentos lingüísticos e extralingüísticos parecerem aceitáveis e
mesmo desejáveis.
Já para Bravo (2003), a confiança interpessoal não requer que se compartilhem
os desejos do interlocutor, nem que se aprovem suas características de personalidade,
senão que se o aceite assim tal qual ele é, embora se o critique “abertamente” e se
discorde daquilo que ele pensa (também “abertamente”): é mais importante conhecer
uma pessoa do que aprová-la. Essa definição de Bravo é uma critica a definição de face
positiva de Brown e Levinson.
A definição apresentada por Lim e Bowers (1991) de intimidade relacional é
correlata à definição de confiança (cf. p.18). Sendo assim, segundo esses autores, o
esforço para minimizar uma ameaça à face do outro diminui à medida que a intimidade
aumenta.
Hernández-Flores (2003), por sua vez, focaliza as relações afiliativas da imagem
social. Ela toma como premissa que uma possível característica de afiliação na
comunidade cultural espanhola é o valor da confiança descrito por Bravo (2003), o qual
aparece nas seguintes expressões:
1) falar com confiança: alude a um estilo comunicativo que supõe falar
abertamente, sem reservas, com franqueza; 2) ter confiança em alguém: tipo de relação afetiva que alude à proximidade;
40
3) fazer algo porque se tem confiança: atuar livremente de acordo com sua própria personalidade, sem medo de ofender ao outro, e sabendo que esta conduta será recebida com naturalidade;
4) ser alguém de confiança: ser muito próximo de alguém, conhecer-lhe bem,
como alguém da família. Embora se depreenda dos resultados da pesquisa dessa autora que, se existe
confiança na relação, se é mais flexível com a expressão de polidez formal (como pedir
“por favor”, dizer “obrigado”), o uso da polidez continua tendo importância neste tipo
de relação: não ser polido seria um caso de abuso de confiança.
É interessante observar que o conceito de confiança descrito por Hernández-
Flores (2003) e o conceito de intimidade relacional de Lim e Bowers (1991) podem
ser entendidos como similares ou mesmo idênticos.
Para Hernández-Flores, confiança alude a um tipo de contrato social entre
pessoas que supostamente se conhecem bem, o que permite falar ou atuar abertamente e
sem medo de ofender. Lim e Bowers definem intimidade relacional nos seguintes
termos: quanto mais próxima for a relação entre os interlocutores, mais eles sentir-se-ão
obrigados a cooperar mutuamente, e tornar-se-ão mais dispostos à tolerância de
imposições e críticas. Sendo assim, o esforço para minimizar uma ameaça à face do
outro diminui à medida que a intimidade aumenta.
Para Hernández-Flores, confiança implica limites e adequacão: ter confiança é
algo positivo, porém sempre que ocorra no meio adequado ou com a pessoa adequada
(meio ou pessoa próximos a si) e na medida certa, pois o contrário é valorado
negativamente, daí a expressão “tomarse demasiadas confianzas”.
Do mesmo modo, a definição de Lim e Bowers para intimidade relacional
também implica limites. Segundo eles, quando ocorrerem casos de ameaça à face que
superem os limites tolerados, essa dinâmica mudará e os interlocutores reagirão tão ou
mais negativamente caso a relação entre eles não fosse de proximidade.
41
2.4 Propostas de análise aplicadas a corpora em língua espanhola 2.4.1 Bravo (Universidade de Estocolmo) Bravo (2003) critica o modelo de Brown e Levinson, pelo menos a partir do
enfoque sociocultural por ela utilizado. Segundo ela, o problema reside em que os
aspectos negativos e positivos da imagem social estão demarcados e/ou delimitados
socioculturalmente e somente são adequados para serem aplicados a algumas
comunidades de fala inglesa.
Segundo Bravo (op.cit.), em um número muito interessante de trabalhos que não
se encaixam totalmente nas expectativas criadas pelas categorias universais, as
diferenças se justificam em conteúdos socioculturalmente específicos da imagem social.
Por esse motivo, ela explica que considera imagem social central para uma teoria da
polidez, uma vez que essa noção, ao ser definida como psicosociológica tem, segundo
ela, a virtude de conectar os conceitos de identidade pessoal e social.
De acordo com o pressuposto de que a imagem social de uma comunidade é
específica dessa comunidade, Bravo (op.cit.) adotou as categorias de autonomia e
afiliação. Segundo essa teoria, a imagem da pessoa compreende duas perspectivas:
1) como alguém diferente do grupo: a autonomia;
2) como alguém integrado ao grupo: a afiliação.
Essa autora postula um conjunto de premissas ligadas à autonomia e à afiliação,
subjacentes à imagem do grupo e assumidas pelo indivíduo, envolvendo aspectos de
uma imagem social que acusa tendências mais ou menos estendidas na Espanha (cf.
BRAVO, 2002):
I) Premissas ligadas à autonomia: ver-se / ser visto
� Um indivíduo que se autoestima reconhece o próprio valor e modo de agir e se mostra capaz de exibir ou ratificar suas boas qualidades e originalidade. Esta autoestima se relaciona com a necessidade de autoafirmação do indivíduo e faz parte do ser social; está ligada ao sentimento de orgulho que pode ser manifestado expressiva e claramente; em geral, origina modos de ação diretos e frontais, o que permite que o indivíduo se confirme socialmente. A autoestima é merecedora do interesse, admiração e apreço, dentro do grupo.
42
� Um membro competente da sociedade não se queixa em demasia, não é muito crítico, não é indiferente, nem improvisa. � Um indivíduo não aceita facilmente que se questione seu valor. II) Premissas ligadas à afiliação: ver-se / ser visto � Um indivíduo é capaz de demonstrar afeto, tolerância, sinceridade e desinteresse, através de comportamentos próprios da intimidade familiar e da amizade. � Um indivíduo outorga e busca, com vistas à reciprocidade, a confiança do outro, com base no conhecimento mútuo ou nos acordos implícitos; não obstante, a confiança se ganha. � Um indivíduo para o qual importa o apreço interpessoal, o qual, por sua vez, conduz ao consenso e à manutenção da coesão do grupo.
Na conversa, a imagem social se manifesta na atuação do self frente ao alter5 e,
nesta medida, está unida a como se concebe uma relação interpessoal em uma
determinada circunstância. Os traços mais permanentes da imagem social fazem parte
da identidade social, porém não são a mesma coisa. O conceito de imagem social abarca
um sentimento de pertencimento, porém reduz seu alcance à atuação social dos
interlocutores. Por isso, a autora diz que há um compromisso de imagem no sentido em
que o falante está apresentando uma imagem de si mesmo a seu interlocutor ou
auditório, num determinado cenário de fala. Esta apresentação é única, temporal,
interacional e está circunstancialmente demarcada e/ou delimitada.
2.4.2 Briz (Universidade de Valência) Briz (1988 e 2003) faz um estudo da polidez de acordo com as unidades da
conversa e a partir de uma distinção básica entre polidez codificada e polidez
interpretada. A primeira está, segundo ele, regulada antes da interação, submetida,
portanto, à convenção, e a segunda, avaliada no transcurso da interação, contexto a
contexto, de acordo com os inícios e, sobretudo, com as reações dos participantes na
mesma.
Esse autor já assinalava (op.cit.) que as intervenções polidas estão parcialmente
convencionalizadas em cada língua, isto é, uma cultura subjetiva de maneira freqüente o
uso de certos mecanismos lingüísticos para mitigar, diminuir a força ilocucionária, que
ficam desse modo codificados para a expressão da polidez em uma dada língua.
5 A noção de alter [do latim alter, ‘outro’] refere-se ao conceito de cada indivíduo segundo o qual os outros seres são distintos dele próprio; opõe-se a ego (Novo Dicionário Aurélio, 1986).
43
A avaliação da polidez verbal somente é possível no processo mesmo da
interação; entendida como efeito, somente pode ser avaliada contextualmente. Briz,
então, propõe uma tentativa de explicar o dinamismo da atividade polida através de
“filtros de avaliação hierarquizados”. Cada um desses filtros pode ser especificado
segundo vários fatores: (1) +/- solidariedade entre os interlocutores; (2) +/- fim
interpessoal da interação; (3) +/- pertinência de ideomas6; (4) +/- problematicidade
temática; (5) +/- aceitação lingüística e social.
As interações de maior solidariedade são aquelas nas quais existem relações de
proximidade e de simetria entre os interlocutores. São excertos de relações de
proximidade: presença de vivências comuns, maior saber compartilhado, maior contato
e maior grau de compromisso afetivo entre os interlocutores. Com relação a interações
simétricas, são aquelas nas quais existe maior igualdade funcional e maior nivelação de
papéis (sobretudo os derivados das características socioculturais, como idade, gênero,
profissão, etc).
As interações com fim predominantemente interpessoal são aquelas que
primordialmente buscam e favorecem a manutenção das relações sociais, a relação entre
as pessoas, o contato entre elas. Do ponto de vista funcional são, portanto, simétricas, o
que indica sua estreita relação com as interações de maior solidariedade. Conversas
cotidianas entre amigos ou vizinhos, como é o caso de nossos dados, podem ser
excertos de conversas mais interpessoais, como também de interações de maior
solidariedade.
Já interações com fim predominantemente transacional são aquelas nas quais
existe um objeto de negociação concreto, uma finalidade precisa. Nestas tudo aparece
mais regulado, inclusive os turnos, ao mesmo tempo em que se realiza a distância social
e, do ponto de vista funcional, são assimétricas.
6 Segundo Briz, os ideomas, característicos de cada cultura ou grupo social, inclusive de cada indivíduo, são conteúdos culturais, além de fatores de codificação da atividade da polidez, que permitiriam explicar as diferentes interpretações do polido e dos mecanismos lingüísticos empregados em cada caso na construção de dita atividade. Cf. BRIZ, A. Cortesía verbal codificada y cortesía verbal interpretada en la conversación. In: Bravo, D. e Briz, A. Pragmática sociocultural: estudios sobre el discurso de cortesía en español. Barcelona: Editorial Ariel, 2004.
44
O terceiro fator diz respeito ao contexto cultural e a maior ou menor pertinência
de ideomas corteses segundo culturas. Segundo Briz, talvez seja possível estabelecer um
“mapa” do ideário da polidez, da imagem polida, em cada cultura e grupo social. Esta
classificação, portanto, finita poderia marcar as diferenças interculturais e intraculturais
da chamada polidez codificada ou convencional, assim como explicar as avaliações
prévias do polido e do impolido em uma língua ou entre várias línguas, ou de acordo
com as exigências de um grupo social determinado.
Os conteúdos culturais de privacidade e confiança da cultura anglo-saxã e
espanhola, respectivamente, além de fatores de codificação da atividade de polidez,
seriam filtros que permitiriam explicar as diferentes interpretações do polido e dos
mecanismos lingüísticos empregados em cada caso na construção de dita atividade.
Estes ideomas polidos, característicos de cada cultura ou grupo social, inclusive
de cada indivíduo, tornam prioritária a proteção de certas imagens próprias ou alheias e,
por isso, predeterminam ou favorecem a conveniência de atenuar (ou de valorizar) em
maior ou menor medida certas ações ou a presença de atenuantes para certos temas que
se consideram mais conflitivos e que possam provocar um choque ou conflito social.
O quarto fator diz respeito aos temas da interação e seu grau de
problematicidade. Em geral, uma conversação polêmica favorece a presença de
atenuantes polidos, principalmente se as imagens ficam comprometidas.
O quinto (e último) fator diz respeito a maior ou menor aceitação ou acordo, isto
é, à aceitação lingüística e social. Segundo Briz, o fim último de toda interação é, em
geral, lograr o acordo, a aceitação do outro. Assim, quando as metas do eu se enfrentam
ou não coincidem com as metas dos interlocutores, quando se deseja obter um benefício
e se sabem ou intuem dificuldades para consegui-lo, o falante recorre a mecanismos
atenuadores de polidez como meio para tentar lograr dito acordo / aceitação.
Segundo Briz (1988), os falantes de uma comunidade de fala assumem, em
virtude dos traços anteriores, uma série de princípios de conduta social e lingüística em
relação com a polidez, que velam pela imagem própria e alheia e que servem, além
45
disso, como filtros de avaliação prévia do comportamento polido, de sua maior ou
menor conveniência; determinam, portanto, um pensamento de conduta social.
É evidente que as sociedades, comunidades de fala e culturas diferem. Assim,
nas denominadas “culturas de distanciamento”, os princípios ativos sofrem, com menos
freqüência, estados de hibernação, frente ao que sucede nas “culturas de aproximação”
(termos introduzidos por Haverkate, em seu trabalho de 1994).
Na conversa coloquial espanhola, uma das chamadas culturas de aproximação
(assim como a argentina, caso de nosso corpus) uma situação prévia de imediatez
comunicativa (+ solidariedade), de + interpessoalidade e de + cotidianidade temática
favorece a desativação (ou posta em repouso) das convenções sociais e também
lingüísticas (existe um menor controle do produzido e das formas utilizadas)
relacionadas com a polidez.
Como se tem assinalado, a hierarquia dos filtros dados, com relação ao seu grau
de influência na atividade polida, não está estabelecida previamente, determina-se
contexto a contexto e pode mudar no transcurso da fala em interação.
Em resumo, pode-se dizer da polidez que se trata de um processo dinâmico que
se define e se redefine na interação segundo os indícios e, sobretudo, as reações do
outro ou outros. Somente deste modo se pode dar conta disso que Briz vem chamando a
polidez interpretada, um conceito que ajuda a entender, por sua vez, tal dinamismo.
2.4.3 Hernández-Flores (Escola Superior de Comércio de Copenhague)
Hernández-Flores (2003) critica o modelo de Brown e Levinson, pois, segundo
ela, as características outorgadas para as imagens negativa e positiva não são válidas
para descrever a imagem social que aparece em todas as comunidades, isto é, essas
características não são universais. E alinha-se a Bravo ao acreditar que a imagem social
de uma comunidade é específica dessa comunidade (cf.Bravo, 2003), e ao adotar as
categorias de autonomia (foco nas diferenças inter-grupos) e afiliação (foco nas
semelhanças) desenvolvidas por esta.
46
Dentre as características da imagem de autonomia espanhola, inclui-se o desejo
de mostrar-se original e consciente das boas qualidades próprias; dentro da imagem
afiliativa, existe o ideal de confiança, isto é, saber a que se ater com respeito ao outro e
o que se pode falar sem temor a ofensas ou sem temer ofender o outro.
Hernández-Flores compartilha a suposição de Bravo de que a confiança é uma
característica da imagem afiliativa espanhola, característica que não se pode incluir na
categoria de imagem positiva de Brown e Levinson, pois aquela supõe o desejo de
buscar ou reafirmar a proximidade social entre as pessoas, e não o desejo de ser
aprovado socialmente. Por outro lado, ter confiança em uma relação se chocaria de
forma flagrante com o outro desejo de imagem suposto por Brown e Levinson, o da face
negativa, pois, como já visto, ter confiança permite falar e atuar abertamente de cara ao
outro e sem temor de ofender, atuação que, segundo a perspectiva do desejo de face
negativa, invadiria o espaço privado do outro.
Os resultados dos testes de hábitos sociais aplicados por essa autora serviram
para que ela levantasse várias questões. A palavra polidez associa comportamentos
formais apreendidos a comportamentos de deferência. No meio familiar, porém, o
comportamento deferente é pouco mencionado (o que, em nossa opinião, não é
nenhuma surpresa, uma vez que deferência pressupõe diferença hierárquica) sendo
excertos de polidez, neste caso, os atos que permitem mostrar o afeto (ajudar, dar
atenção, mostrar carinho e escutar problemas ou opiniões) e os que ajudam a cumprir
requisitos para ter uma boa convivência (pedir por favor, considerar e respeitar gostos e
vontades).
Assim sendo, o exemplo mais mencionado de polidez em família é ajudar o
outro, um comportamento que alude a um valor apreciado na comunidade espanhola e
que está dirigido para a imagem afiliativa de seus membros, comportamento que não é
esperável que tenha a mesma consideração em outras comunidades como a anglosaxã,
por causa do alto valor que estas outorgam ao desejo de não intromissão (a chamada
face negativa).
47
2.4.4 Albelda (Universidade de Valência)
Albelda (2003) trabalha com polidez valorizante, seguindo as definições
propostas por Kerbrat-Orecchioni. Ela assim define os conceitos de intensificação,
polidez e imagem:
� Intensificação: nível argumentativo da linguagem (mensagem); nível social da linguagem (relação falante-ouvinte).
�Atividades de polidez: polidez positiva = valorizante; polidez negativa = mitigadora. � Atividades de imagem: face positiva e face negativa. Ambos os tipos de polidez podem referir-se aos dois tipos de imagem. A autora
segue Kerbrat-Orecchioni, para quem as relações entre faces e tipos de polidez
constituem quatro tipos básicos de polidez (cf. seção 2.2.4). A polidez mitigadora (de
caráter negativo) é preventiva e reparadora, enquanto que a polidez valorizante é de
caráter producionista: produz atos polidos, efetua FFAs (face flattering acts).
Existem, segundo essa autora, dois modos de reforçar a face (= atos de polidez
valorizante) dos interlocutores: diretamente, realizando FFAs para a face positiva do
interlocutor, satisfazendo seus desejos de aprovação; e indiretamente, manifestando
acordo com o feito ou dito pelo outro. Dentre as estratégias que apóiam e/ou reforçam
indiretamente a imagem do outro, ela destaca as seguintes:
• argumentos que reforçam a cooperação com o dito e/ou mostram o acordo, tais como: intervenção colaborativa em que se apóia o que o outro está contando; palavras que expressam acordo (claro, eso es, etc.), as quais são seguidas (ou não) por um argumento que as apóia; dar razão ao interlocutor; exclamações (que podem vir acompanhadas de palavras que expressam acordo) que, além disso, podem introduzir um argumento que reforça o dito; repetição do mesmo argumento anterior. • comentários valorativo-emotivos que mostram o desejo de equiparar seus sentimentos com os do falante; • a simples retroalimentação da conversa através de marcadores do discurso e outras partículas; • outras formas de manifestar o acordo e a cooperação são as intervenções nas quais o interlocutor tenta antecipar o que o outro vai dizer, ajudá-lo a produzir a fala (fala colaborativa) ou explicar algo que disse o interlocutor, manifestando implicitamente o
48
acordo com o dito por ele; acabar um enunciado do interlocutor, ajudar a formulá-lo ou repeti-lo. Essas são estratégias que manifestam a implicação do falante no tema e seu interesse por ele.
Vale a pena observar que as quatro estratégias propostas por Albelda, que têm
como objetivo apoiar e/ou reforçar indiretamente a imagem do outro são, na verdade,
similares às estratégias de polidez de envolvimento de Scollon e Scollon (1995) que,
por sua vez, são equivalentes às estratégias de polidez positiva de Brown e Levinson
(1978).
Analisando a função que desempenham tais atos de polidez valorizante, a
autora chega à seguinte conclusão: fim social, isto é, fortalecer a face do outro supõe,
por sua parte, fortalecer as relações sociais, estreitar esses laços. Ela salienta, porém,
que temos de observar que nos encontramos diante de situações sociais de
familiaridade, parâmetro social básico dos usos lingüísticos do espanhol coloquial.
2.4.5 Boretti (Universidade Nacional de Rosário) Com relação às conclusões de Boretti sobre o comportamento do argentino e o
modo lingüístico por ele utilizado na relação interpessoal, não pretendemos refutá-las,
uma vez que trabalhamos com outro método de análise, o qualitativo, enquanto ela
utilizou o método de análise quantitativo. Retomaremos esse tópico no capítulo 6,
destinado as conclusões e considerações finais.
Boretti (2003) levanta hipóteses com relação ao comportamento e ao modo
lingüístico (usado na relação interpessoal) dos argentinos, que refletem a competência
cultural do grupo e explicitam configurações identitárias, confrontadas com os “modos
de falar” de um grupo de falantes argentinos, representativo de uma “subcultura”, dentro
da cultura nacional: homens e mulheres de classe média urbana, em relação de amizade
e proximidade, a maioria deles profissionais.
Essa autora adota como método de trabalho para o estudo da polidez, as
propostas de Bravo (1999). Ela assinala que uma das razões da adoção dessa perspectiva
pragmática centrada nos contextos socioculturais foi o fato de ela permitir associar
interesses puramente lingüísticos, neste caso referidos à manifestação do discurso
polido na língua falada, com aspectos da imagem do argentino.
49
Segundo Boretti (2003), Leech (1983) afirma que a polidez surge na interação
onde são observados fenômenos lingüísticos de indiretividade. Porém, distintas
pesquisas mostraram que as formas diretas, em algumas culturas, não são impolidas,
isto é, polidez e indiretividade não se exigem mutuamente. Boretti também não
concorda com a hipótese de que existem atos inerentemente polidos (como os
oferecimentos) ou impolidos (as ordens), tal como afirma Leech (op.cit.) e também
Brown e Levinson (1978).
O objetivo da análise lingüística de Boretti era verificar se atividades
consideradas ameaçadoras de face por Brown e Levinson também o eram no contexto
de seu corpus. Entretanto, ela comprovou que formas tradicionalmente codificadas
como descorteses no contexto de seu corpus não o eram, porque esses usos, ligados à
diretividade e à frontalidade do comportamento lingüístico, se devem à combinatória
de conteúdos específicos da categoria de autonomia, tais como a autoafirmação e a
autoestima, com outros da categoria de afiliação, como a disponibilidade, a confiança e
a sinceridade. Assim, autonomia e afiliação não resultam equiparáveis com a face
negativa e, às vezes, tampouco com a positiva, descritas por Brown e Levinson.
É importante esclarecer que o teste de hábitos sociais, conduzido por Boretti em
1999 (que tomou como base o questionário de Hernández-Flores), consistia em um
questionário aplicado a 90 informantes e constava de três partes que visavam a recolher
opiniões com relação ao tema da polidez e exemplos de comportamentos lingüísticos
diante de situações concretas. As outras perguntas do teste eram:
1) Que é para você a polidez? 2) Você pode dar exemplos reais aonde você vê a polidez? 3) Por que você usa a polidez? Para que ela serve, na sua opinião?
Boretti acrescentou uma quarta parte, que lhe permitiu investigar,
especificamente, aspectos relativos à imagem do argentino. Essa autora pretendia
investigar o que entendiam os informantes por tratamento polido, e recolher dados mais
particularizados sobre a imagem do argentino (visto por ele mesmo) e seu modo de
comunicar-se. As perguntas foram propositadamente formuladas para evitar
50
generalizações nas respostas. Essa sessão do teste visava a investigar questões relativas
a:
-O comportamento do argentino, em geral, como poderia ser caracterizado?
a) individualista, e por quê?
b) orientado para a comunidade, e por quê?
-Em sua opinião, os argentinos, em geral, são frontais e diretos ou indiretos e
ambíguos em seu modo de comunicar-se com os demais?
Dentre as respostas e generalizações advindas dos resultados do teste de hábitos
sociais dos argentinos, podemos destacar as seguintes:
• O comportamento do argentino foi caracterizado como individualista, quer no sentido de desinteresse pelos demais – “salve-se quem puder” – (com exceção no trato com familiares e amigos), quer no sentido de atribuir “importância a si mesmo”. • O modo lingüístico usado na relação interpessoal foi categorizado como frontal e direto, às vezes em demasia.
Por outro lado, a autora assinala que, uma vez que a polidez pode ser entendida
como modo de comportamento (ao pedir um favor, por exemplo), a relação com
amigos, familiares e com companheiros de trabalho foi fortemente marcada por um alto
grau de confiança, o que neutralizaria a ameaça considerada intrínseca a certas
atividades comunicativas. Tal resultado também influenciou o nível de diretividade e
frontalidade.
51
2.5 Síntese e discussão 2.5.1 Críticas à Teoria da Polidez de Brown e Levinson
Nesta seção, apresentamos uma síntese daquilo que tanto os modelos vistos em
2.2 quanto às propostas aplicadas à língua espanhola, em 2.4, criticam e/ou reformulam
na Teoria da Polidez de Brown e Levinson (1978).
1) Conceito de face Segundo Goffman (1980), o conceito de face pode ser entendido como imagem
social. Para ele, face é “[...] o valor social positivo que uma pessoa efetivamente
reclama para si [...] em termos de atributos aprovados socialmente”. Brown e Levinson,
igualmente, definem face como a imagem social ou pública do self que todos querem
reivindicar para si mesmos.
Para Scollon e Scollon (1995), na interação há um importante aspecto de
identidade tido como um elemento essencial à “participação”, ou seja, a identidade
interpessoal dos indivíduos envolvidos na interação. Este componente tem sido referido
como “face”. Face, portanto, segundo eles, é um conceito paradoxal por implicar dois
lados que estão em oposição: (a) a necessidade humana de manter / expressar algum
grau de independência em relação ao outro participante e (b) a necessidade humana de
estar envolvido com os outros participantes e mostrar-lhes este envolvimento.
Para Kerbrat-Orecchioni (1996), no que concerne à noção de face, face
negativa corresponde aproximadamente à noção de “território” de Goffman; e face
positiva corresponde, grosso modo, ao que a linguagem comumente chama ‘face’, que
alguém pode perder ou salvar, estando associada a orgulho, sentido de honra,
narcisismo e todos esses tipos de coisa. Para essa autora, portanto, face positiva
equivale à noção de Brown e Levinson que, por sua vez, é equivalente ao conceito de
face em Goffman.
Bravo (2003) explica que considera a noção de imagem social central para uma
teoria da polidez uma vez que, segundo ela, a imagem social é uma noção
52
psicosociológica, e essa descrição tem a virtude de conectar os conceitos de identidade
pessoal e social.
2) Noções de face / imagem negativa e positiva e relação entre face e polidez Lim e Bowers (1991) consideram que Brown e Levinson levam em conta
principalmente os atos que ameaçam a face negativa do outro (por exemplo: perguntas e
ordens). Eles, porém, mantiveram o conceito de face negativa, chamando-a de face da
autonomia. Esses autores também argumentam que Brown e Levinson negligenciam os
trabalhos de face direcionados à face positiva do outro, e combinam, em um mesmo
conceito, dois desejos humanos distintos: o desejo de inclusão e o desejo de aprovação.
O desejo de inclusão corresponderia, segundo eles, à face da camaradagem, na
qual os participantes querem ser considerados membros de um grupo. É o desejo de ser
aceito, de pertencimento. Os participantes adotam os valores de amizade e cooperação
na face da camaradagem. O segundo, o desejo de aprovação, corresponderia à face da
competência. É a necessidade de todo ser humano de ter suas habilidades reconhecidas
e suas ações respeitadas. A cada um desses desejos de face, Lim e Bowers fizeram
corresponder um tipo diferente de trabalho de face: solidariedade, ligada à face da
camaradagem; aprovação, ligada à face da competência e tato, ligado à face da
autonomia.
Scollon e Scollon (1995) definem e classificam três Sistemas de Polidez ou de
Face: Sistema de Deferência, Sistema de Solidariedade e Sistema Hierárquico. Tais
sistemas fazem uso de estratégias de polidez, que podem ser de dois tipos: de
envolvimento e de independência. Esses autores consideram, como Brown e Levinson,
que há três fatores que determinam a escolha dessas estratégias, que são: poder,
distância e grau de imposição (teor de risco).
Em língua espanhola, os estudos têm forte apoio em Bravo. As pesquisadoras
Boretti e Hernández-Flores abraçam como método de trabalho para o estudo da polidez
as propostas de Bravo, adotando as categorias de autonomia e afiliação. Boretti
considera que os estudos de Bravo proporcionaram um panorama estimulante para que
ela iniciasse o estudo do discurso da polidez em seu país, a Argentina, e refletisse sobre
53
possíveis motivações de ordem sociocultural que, ao afetar a relação interpessoal,
afetariam também o modo de falar dos argentinos.
Tanto para Bravo, quanto para Boretti e Hernández-Flores, as noções por elas
adotadas de autonomia e afiliação não resultam equiparáveis com a face negativa e, às
vezes, tampouco com a positiva, descritas por Brown e Levinson. Essas categorias de
autonomia e afiliação devem ser preenchidas dentro do âmbito de cada cultura em
particular.
Na visão de Kerbrat-Orecchioni (2001), o maior impedimento para o correto
funcionamento do modelo de Brown e Levinson é a extrema falta de clareza que
permeia as noções de negativo e positivo. Para ela, esses predicados se aplicam a dois
objetos diferentes: face e polidez e, por isso, ela propõe dissociar face negativa e face
positiva de polidez negativa e polidez positiva.
(1) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face negativa (por exemplo, abrandar uma ordem); (2) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face negativa (por exemplo, um presente); (3) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face positiva (por exemplo, abrandar uma crítica ou um desacordo); (4) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face positiva (por exemplo, um elogio, uma expressão de acordo, etc.). Kerbrat-Orecchioni (op.cit.) afirma que os atos que os participantes são
induzidos a produzir no curso da conversação podem possuir efeitos negativos (FTAs)
ou positivos (FFAs) sobre suas faces (um mesmo ato pode, naturalmente, aparecer sob
diversas categorias). As distinções entre FTA e FFA habilitam, além disso, a esclarecer
as noções de polidez negativa versus polidez positiva, confusas na teoria de Brown e
Levinson:
a) polidez negativa é abstencionista e compensatória por natureza: ela consiste em evitar a ocorrência de FTAs, ou de alguma maneira abrandá-los, quando os mesmos são postos em prática (princípio: “Poupar um ao outro”); b) polidez positiva tem, ao contrário, um caráter de traço producionista: ela consiste em realizar algum ato de elogio orientado ao outro ou à face do outro (princípio: “Elogiar um ao outro”).
Finalmente, ainda segundo essa autora, vale a pena ressaltar que a redefinição
dos termos negativo e positivo poderia aplicar-se também à impolidez (não definida por
Brown e Levinson): ‘impolidez negativa’ consiste em não produzir um FFA esperado
54
(cumprimentos, desculpas, agradecimentos, etc.) e ‘impolidez positiva’ consiste em
produzir um FTA não abrandado que poderia mesmo ser endurecido por algum tipo de
“maximizador”.
Albelda (2003) trabalha com polidez valorizante, seguindo as definições
propostas por Kerbrat-Orecchioni. Os conceitos de polidez e imagem abrangem
atividades de polidez (polidez positiva = valorizante; polidez negativa = mitigadora) e
atividades de imagem (face positiva e face negativa). A polidez mitigadora (de caráter
negativo) é preventiva e reparadora, enquanto que a polidez valorizante é de caráter
producionista, produz atos polidos, efetua FFAs (face flattering acts).
Essa autora concorda com Kerbrat-Orecchioni, para quem ambos os tipos de
polidez podem referir-se aos dois tipos de imagem. Como resultado, as relações entre
faces e tipos de polidez passam a constituir quatro tipos básicos de polidez (já descritos
acima).
Spencer-Oatey (2000) acredita que face é um fenômeno universal – todas as
pessoas possuem as mesmas preocupações fundamentais com a face – e que polidez é,
na verdade, um julgamento contextual: ‘nenhuma sentença é inerentemente polida ou
impolida’. O escopo da teoria da polidez tradicional é a manutenção e/ou promoção de
relações interpessoais harmoniosas.
3) Questão da universalidade X diferenças culturais Para Kerbrat-Orecchioni (1996) a polidez é universal porque, em todas as
sociedades humanas, se constata a existência de comportamentos que permitem manter
um mínimo de harmonia entre aqueles que interagem, apesar dos riscos de conflitos
inerentes a toda interação. Porém, ao mesmo tempo, a polidez não é universal na
medida em que suas formas e condições de aplicação variam sensivelmente de uma
sociedade para outra. Essa autora propõe introduzir um certo número de arranjos no
modelo proposto por Brown e Levinson, a fim de melhorar sua capacidade descritiva,
essencialmente a introdução da noção de Ato Lisonjeiro de Face (em inglês, Face
Flattering Act) em oposição à de Ato Ameaçador de Face (em inglês, Face Threatening
Act).
55
Bravo (2003) critica o modelo de Brown e Levinson, pelo menos a partir do
enfoque sociocultural. Segundo ela, o problema reside em que os aspectos negativo e
positivo da imagem social estão demarcados e/ou delimitados socioculturalmente e são
adequados para serem aplicados somente a algumas comunidades de fala inglesa.
As noções de face negativa e positiva, para essa autora, não podem ser
consideradas universais. Segundo ela, nem todas as culturas, como a japonesa, estão
preocupadas em ter liberdade de ação e em preservar seu território pessoal; tampouco,
todas as culturas, como a espanhola, possuem o desejo de obter aprovação e de que os
outros compartilhem seus desejos, opiniões e características pessoais. Em muitos
trabalhos, que não se encaixam totalmente nas expectativas criadas pelas categorias
universais propostas por Brown e Levison, as diferenças se justificam em conteúdos
socioculturalmente específicos da imagem social.
Pelos mesmos motivos, Hernández-Flores (2003) critica o modelo de Brown e
Levinson uma vez que, segundo ela, as características outorgadas por eles para as
imagens negativa e positiva não são válidas para descrever a imagem social que aparece
em todas as comunidades, isto é, essas características não são universais. De acordo
com o pressuposto de que a imagem social de uma comunidade é específica dessa
comunidade, essa autora prefere seguir a linha de Bravo, adotando as categorias de
autonomia e afiliação que devem ser preenchidas dentro do âmbito de cada cultura em
particular.
Boretti (2003), assim como Hernández-Flores, abraça como método de trabalho
para o estudo da polidez as propostas de Bravo (1999), adotando as categorias de
autonomia e afiliação que devem ser preenchidas dentro do âmbito de cada cultura em
particular.
2.5.2 Rapport como estratégia de envolvimento: um modelo teórico para análise
Na seção anterior, apontamos algumas inadequações da Teoria de Polidez de
Brown e Levinson. Nesta seção, vamos apresentar o quadro teórico em que sustentamos
a nossa matriz analítica, destacando os pontos de convergência com os autores
resenhados.
56
Mas, antes, é necessário enfatizarmos que, em nosso entender, a Teoria da
Polidez de Brown e Levinson é a teoria-mãe ou seminal da polidez. Se assim não o
fosse, todos os outros modelos não teriam nela se inspirado, com algumas críticas e/ou
reformulações, é verdade, mas sempre dela partindo. De acordo com Kerbrat-
Orecchioni (1996), atualmente e dentro do campo da pragmática interacional e do
domínio mais particular dos fenômenos da polidez, não parece existir competidor sério
com a teoria de Brown e Levinson.
Entretanto, por não dar conta de todas as questões relacionadas à polidez
positiva de forma cabal (que, para Brown e Levison, é sempre um ato de reparação),
escolhemos trabalhar também com o modelo de Kerbrat-Orecchioni, que optou por
introduzir um termo extra dentro desse modelo teórico para referir-se a atos que são, de
certo modo, uma cópia positiva dos FTAs (atos de ameça à face, face threating acts),
atos ao qual chamou de FFAs (atos lisonjeiros de face, face flattering acts).
Spencer-Oatey propõe o termo “gerenciamento de rapport” (rapport
management) em lugar de “gerenciamento de face” (face management) porque, segundo
ela, o termo face parece enfocar somente o self, enquanto que gerenciamento de rapport
sugere, por outro lado, um equilíbrio entre o self e o outro.
O enfoque do gerenciamento de rapport também é mais amplo: ele examina o
modo como a linguagem é usada para construir, manter e/ou ameaçar relações sociais e
inclui tanto o gerenciamento dos direitos sociais como os de face.
Rapport é um conceito que inclui uma gama de estratégias que têm como
objetivos a aproximação e o envolvimento. Algumas dessas estratégias fazem parte da
polidez positiva, porém rapport é um conceito mais amplo, pois ele pode envolver tanto
relações de harmonia quanto de conflito.
Como vimos, para Brown e Levinson, todos os atos supostamente ameaçam a
face (positiva ou negativa) do ouvinte. Por esse motivo, ao trabalharmos com as
estratégias de polidez positiva, que estão incluídas no escopo das estratégias de rapport,
temos que discordar de algumas abordagens que eles propõem, como o fizeram os
autores incluídos em 2.5.
57
Com relação aos atos que ameaçam a face negativa do ouvinte, Brown e Levison
elencam, entre outros, os cumprimentos e os elogios, pois indicam o desejo do falante
em relação ao ouvinte. Há, em nosso entender, uma outra leitura possível dessa
abordagem, pois os cumprimentos e os elogios são atos de polidez positiva que visam a
dar face ao outro e não a ameaçá-la.
Relembremos que, para Brown e Levison, os atos que ameaçam a face positiva
do ouvinte demonstram que o falante não se importa com os desejos do ouvinte. Dentre
estes, teríamos:
1) atos que mostram que o falante tem uma avaliação negativa de alguns aspectos da face positiva do ouvinte: expressar desacordo, críticas, ridicularização, insulto, questionamentos;
2) atos que mostram que o falante não valoriza, nem teme o que o ouvinte
teme: ser irreverente, falar de tabus ou coisas impróprias ao contexto, contar coisas desagradáveis sobre o ouvinte e agradáveis de si mesmo, demonstrar não-cooperação, interromper a fala do outro, não prestar atenção, marcar diferença de status através de termos de identificação.
Na nossa avaliação existem, nessa abordagem, atos que realmente podem
ameaçar a face positiva do ouvinte. Porém, para nós, alguns deles, a depender do
contexto em tela, podem não exercer tal função. Senão vejamos:
• expressar desacordo, críticas e/ou questionamentos: não necessariamente
expressam que o falante possui uma avaliação negativa da face positiva do ouvinte, pois, de acordo com Bravo (2003), a confiança interpessoal não requer que se compartilhem os desejos do interlocutor, nem que se aprovem suas características de personalidade, senão que se o aceite assim tal qual ele é, embora se o critique “abertamente” e se discorde daquilo que ele pensa (também “abertamente”): é mais importante conhecer uma pessoa do que aprová-la.
• interromper a fala do outro: há interrupções de natureza colaborativa na fala,
que não ameaçam e, sim, dão ou preservam a face do interlocutor; • ser irreverente: há situações que, em função do grau de intimidade entre os
participantes, podem ser aceitáveis ou sinalizar que o falante está agindo em tom de brincadeira;
• falar de assuntos tabu7: há casos em que, também em função do grau de
intimidade, existe a possibilidade de se abordar temas tidos como tabu naquela mesma cultura. 7 Para mais informações sobre este assunto, remetemos à dissertação Mecanismos de atenuação e
silenciamento no português xinguano. SOUZA, E. UFF, 2000.
58
Também concordamos com a posição de Kerbrat-Orecchioni que considera que
a polidez positiva tem um estatuto tão importante quanto àquele que a polidez negativa
exibe (ser polido numa interação significa produzir FFAs tanto quanto suavizar as
expressões dos FTAs): a polidez negativa é basicamente impolidez restritiva, porém
a polidez positiva é a verdadeira polidez (um elogio é ainda mais polido do que uma
crítica abrandada, a expressão de concordância é ainda mais polida do que um
desacordo mitigado, etc.).
Inspiramos nosso modelo também no de Albelda (2003), que inclui a noção de
polidez valorizante, prevendo dois modos de se reforçar a face dos interlocutores (= atos
de polidez valorizante): a direta, que realiza FFAs para a face positiva do interlocutor,
satisfazendo seus desejos de aprovação, e a indireta, que se manifesta através do acordo
com o feito ou dito pelo outro.
Partimos, também, da definição de Sistema de Solidariedade de Scollon e
Scollon (1995), para quem, em um sistema desse tipo, como uma conversa entre amigos
(caso do nosso corpus), há um alto grau de envolvimento, não havendo sentimentos de
diferença de poder entre os participantes da interação, nem de distância, já que os
participantes ocupam a mesma posição social. Por tratar-se de uma relação estreita (-D),
além de uma relação simétrica (-P), os participantes usam estratégias de envolvimento.
Conforme já apontamos, há várias definições para envolvimento. Em nosso
trabalho, vamos utilizar a definição mais lata de Scollon e Scollon (1995), que associa
envolvimento à assunção do ponto de vista do outro, ou a outros modos de sustentação
de uma visão de mundo partilhada.
Sob uma perspectiva mais restrita, adotamos tanto a definição de envolvimento
de Selting (1994), que o vê como uma noção interpretativa que se refere ao campo das
emoções e atitudes, codificadas através de pistas apropriadas aos enquadres
interpretativos em jogo na interação verbal, quanto aquela de significado afetivo de
Holmes (1984), que envolve a atitude do falante em relação ao ouvinte no contexto da
enunciação. Nesse sentido, entendemos que prestar atenção aos desejos de face dos
outros é um componente crucial no estabelecimento de uma relação de amizade.
59
Nossa escolha em adotar definições de envolvimento que dizem respeito ao
campo das emoções e do afeto se justifica ao levarmos em conta a natureza de nosso
corpus, composto por participantes que possuem, em um maior ou menor grau, relações
de amizade.
Concordamos com Briz (2004), que assevera que a proximidade e a
familiaridade fazem com que predominem certas manifestações da polidez, tais como
elogios, lisonjas e respostas colaborativas que reforçam o acordo daquilo que o outro
está dizendo, em resumo, a polidez valorizante. Pressupomos que, nesse tipo de
interações solidárias e interpessoais, os mitigadores são menos recorrentes, uma vez
que, na expressão dos atos dentro da interação, nada nem ninguém, em princípio, se
sente ameaçado pelo outro.
As estratégias de rapport que buscamos encontrar em nosso corpus são aquelas
enumeradas por Aston (1988): comunicação fática, cumprimentos, language play,
perguntas do tipo “como vai você?”, despedidas amigáveis, além daquelas utilizadas nas
estratégias de polidez positiva, e, nestas últimas, nos baseamos nas estratégias de
polidez de envolvimento de Scollon e Scollon (que são, com pequenas diferenças, as
mesmas descritas por Brown e Levinson).
60
3. METODOLOGIA 3.1 Critérios de constituição do corpus Nossa análise dos dados será de natureza essencialmente qualitativa e
interpretativa. Os resultados obtidos serão quantificados, se isto for possível e se fizer
necessário, para que padrões recorrentes possam ser estabelecidos.
O referencial metodológico adotado neste trabalho compreende uma análise,
através de uma perspectiva interacional e de uma abordagem qualitativa de estudo de
caso, de amostras de língua oral da cidade de Buenos Aires, levantadas com base em
gravações em fita cassete, a partir da quais vamos examinar a ocorrência de estratégias
de rapport.
Os dados foram coletados em uma pesquisa coordenada, na cidade de Buenos
Aires, pela Profª Drª Ana Maria Barrenechea, da Universidade de Buenos Aires,
publicada pelo Instituto de Filologia e Literaturas Hispânicas da Faculdade de Filosofia
e Letras dessa mesma universidade no ano de 1987, com o título “El habla culta de la
ciudad de Buenos Aires – materiales para su estúdio”. Trata-se de uma publicação em
dois volumes que oferece uma seleção de diálogos livres e entrevistas, gravados dentro
de “El proyeto de estudio coordinado de la norma lingüística culta de las principales
ciudades de Iberoamérica y de la Península Ibérica”.
Este projeto nasceu por iniciativa do Dr. Juan M. Lope Blanch. O sentido da
expressão “norma lingüística culta” que aparece no título deve-se ao fato de o critério
do projeto centrar-se na fala das pessoas com educação superior (ou de um nível
semelhante). O motivo dessa escolha deu-se em razão da urgência de aplicação de seus
resultados nesse nível de ensino. O projeto descreve o espanhol falado nas grandes
cidades (especialmente nas capitais), com o intuito de determinar as características que
costumam gozar de maior prestígio em cada país, em um idioma tão extendido
geográfica e politicamente.
Deve entender-se, portanto, que a palavra norma que aparece no título do projeto
não foi utilizada, nesse projeto, com sentido prescritivo ou impositivo, e, sim, com
sentido de língua standard, generalizado na terminologia lingüística.
61
Desse projeto, constam diálogos livres e entrevistas. Dentre eles, selecionamos
apenas diálogos livres, escolhendo três nos quais os participantes possuem laços de
amizade ou de familiaridade.
3.2 Características da pesquisa: um estudo de caso Como já citado no início em 3.1, a presente pesquisa adota um enfoque
interacional de base interpretativista, e, nela, se utiliza o método de análise qualitativo,
dentro da abordagem de estudo de caso.
A expressão “pesquisa qualitativa” compreende um conjunto de diferentes
técnicas interpretativas que visam a descrever e a decodificar os componentes de um
sistema complexo de significados.
Há, pelo menos, três diferentes possibilidades oferecidas pela abordagem
qualitativa: a pesquisa documental, o estudo de caso e a etnografia. Segundo Godoy
(1995, p. 25), o objeto do estudo de caso é a análise profunda de uma unidade de estudo,
que visa ao exame detalhado de um ambiente, de um sujeito ou de uma situação em
particular. Optamos por trabalhar com a abordagem estudo de caso, pois nosso objetivo
é uma análise aprofundada de cada situação que emerge em cada um dos três diálogos
analisados.
Para Garcez (1996, p. 45-46), [...] a Sociolingüística Interacional está interessada na interpretação dos
significados sociais e lingüísticos na conduta da interação humana. Focaliza a análise da produção e da interpretação de enunciados que ocorrem naturalmente em contexto social situado. Com diferentes origens na Antropologia, Lingüística e Sociologia, este ramo da sociolingüística investiga linguagem, cultura e sociedade, derivando seus insights básicos do trabalho de Goffman sobre o papel da linguagem na ordem interacional e do trabalho de Gumperz sobre o papel da cultura na contextualização da linguagem. Partilha também muitas de suas metas e pressupostos com a Análise da Conversação etnometodológica, com tradição na Sociologia.
Na análise do discurso, a abordagem interacionista enfatiza a necessidade de se
privilegiar o discurso dialogado oral, tal como ele se realiza nas diversas situações da
62
vida cotidiana. É, de fato, onde ocorre o mais forte grau de interatividade. Portanto, a
comunicação “face a face” é, sob esse ponto de vista, a mais representativa dos
mecanismos próprios da interação.
Essa abordagem colocou em evidência a importância do papel que exercem na
elaboração do discurso certos fenômenos completamente negligenciados até então pela
descrição gramatical, tais como: marcadores conversacionais, repetições, reformulações,
truncamentos, retificações, hesitações e outros procedimentos de “reparação”. Os
discursos são, nessa perspectiva, concebidos como construções coletivas, sendo que
todos os seus componentes podem prestar-se à negociação.
Concordamos com a perspectiva de Goffman (2002), segundo a qual a posição do
interlocutor é a de quem procura entender o significado do discurso a partir do contexto
interacional, indagando sempre onde se situa o contexto de fala, “onde está a realidade
de uma dada interação?”, “o que está acontecendo?”, “por que isso agora?”
Nesse viés analítico, segundo Garcez (2002, p. 8),
[...] tanto o falante quanto o ouvinte têm papéis ativos na elaboração da mensagem e na definição de ‘o que está se passando aqui e agora’. Não há, portanto, significado que não seja situado. A noção de contexto ganha relevância, passando a ser entendida como criação conjunta de todos os participantes presentes ao encontro e emergente a cada novo instante interacional.
Garcez (op. cit, p. 8:) afirma, ainda, que os participantes levam em consideração
não somente os dados contextuais relativamente mais estáveis – quem fala para quem,
referência (sobre o quê), espaço (em que lugar) e tempo (em que momento) _ levam em
conta, sobretudo, o modo pelo qual cada um dos presentes sustenta e sinaliza o contexto
interacional em andamento.
A Análise da Conversa demonstrou, repetidamente, que as conversas são
realizações cooperativas, em que se podem observar os membros trabalhando firme para
coordenar suas ações com as de seus interlocutores. Ao isolar pequenas seqüências de
fala, ela revela novas maneiras de se estudar o que as palavras fazem na interação.
Adotamos, em nossa análise, a perspectiva de Duranti (1997), que considera que,
em muitos casos, não podemos dizer a priori quais aspectos do contexto serão
63
relevantes. Os analistas da conversa têm argumentado que a única maneira
empiricamente adequada de se evocar o contexto é atentar para o que é posto em
relevância pelos próprios participantes, através de suas ações lingüísticas, sendo que a
idéia é que a busca pelo contexto começa, de fato, com a fala ou com outra conduta que
esteja sendo analisada.
Por fim, cumpre enfatizar que nossa escolha pela perspectiva interacional deveu-
se, principalmente, ao fato de trabalharmos com o discurso dialogado oral, ou seja, com
a comunicação face a face, tipo de discurso mais representativo dos mecanismos
próprios da interação. Essa abordagem também põe em evidência a importância de
certos fenômenos que examinaremos (repetições, reformulações, hesitações, etc.). Nela,
a noção de contexto é de extrema importância, uma vez que não há significado que não
esteja situado. O contexto, nessa perspectiva, pode ser entendido como uma criação
conjunta de todos os participantes, que sinalizam e sustentam o contexto interacional em
curso.
3.3 Proposta de modelo de análise do corpus A seguir, descreveremos a proposta de modelo de análise para os dados que
norteou nosso trabalho. A análise foi dividida em duas partes. Na primeira parte fizemos
uma análise macro que mostra, em um primeiro momento e de forma geral, como se dá,
seqüencialmente, o gerenciamento de conflitos e como as partes se orientam e se
mostram interessadas na manutenção do rapport. Em um segundo momento,
procedemos a uma análise que mostra como os participantes se alinham com o intuito
de aumentar / maximizar rapport. Na segunda parte da análise ilustramos o uso de
micro estratégias destinadas à manutenção de rapport e aquelas destinadas à
maximização de rapport.
Nossa pesquisa norteou-se na proposta de análise de rapport que tem como base
a orientação dos participantes. Verificamos, na primeira parte da análise, como ocorrem
em nossos dados as negociações e o gerenciamento de conflitos. As partes orientam-se
e mostram-se interessadas na manutenção do rapport (harmonia) da relação, através de
estratégias que visam à atenuação / minimização de atos tidos como ameaçadores de
64
face, como também alinham-se no sentido de construção de aumento / maximização de
rapport.
Finalmente, no capítulo “conclusão”, que é destinado à discussão dos resultados,
realizamos uma associação entre as orientações dos participantes (análise macro) e a
escolha e o uso de micro estratégias lingüístico-discursivas.
Partimos dos parâmetros teóricos de Spencer-Oatey (2000, p.29-30) que, como
já citado anteriormente, define quatro tipos de orientações de rapport:
1) estratégias destinadas à manutenção de rapport; 2) estratégias destinadas ao aumento / maximização de rapport; 3) estratégias destinadas ao negligenciamento de rapport; 4) estratégias destinadas ao questionamento de rapport. Porém, diferentemente dessa autora, segmentamos nossa análise em duas
orientações principais (estratégias 1 e 2) e duas secundárias (estratégias 3 e 4), que
aparecem subjacentes às outras.
1) Estratégias destinadas à MANUTENÇÃO de rapport: desejo de manter ou
proteger a qualidade das relações em curso e o nível de rapport entre os interlocutores.
Nesta orientação, existem dois tipos de diretrizes, dependendo da situação, para lograr o
efeito desejado:
(i) escolher apropriadamente termos de tratamento, de saudação, honoríficos,
etc.; (ii) lidar apropriadamente com atos de ameaça à face. Alguns exemplos desse
tipo de ato: ordens, críticas, reclamações, desacordos e ameaças.
O foco se dá através da negociação / evitação de conflito / desacordo. Nos dados
isso ocorre nos tópicos problemáticos e/ou delicados (conflito gerado por enquadres
distintos) e mal-entendidos. Analisaremos como o conflito é introduzido, gerenciado
seqüencialmente no curso da interação (atenuado / minimizado ou não, ignorado pelo
outro, etc.), resolvido ou não, abandonado / evitado.
2) Estratégias destinadas ao AUMENTO / MAXIMIZAÇÃO de rapport:
desejo de aumentar ou fortalecer relações harmoniosas entre os interlocutores. O foco
ocorre através de estratégias de maximização de solidariedade / consenso / cooperação.
65
A principal função das estratégias é sinalizar que os participantes compartilham
conhecimento de mundo, lembranças, pontos de vista, avaliações, etc.
3) Estratégias destinadas ao NEGLIGENCIAMENTO de rapport: falta
interesse na qualidade das relações, e pode ocorrer em situações em que o foco maior
está na informação / conteúdo ou nas tarefas e menos na qualidade das relações. As
razões para se negligenciar rapport podem ser: estar mais preocupado em manter a
própria face do que na manutenção do rapport da relação; não se importar com a
relação por algum motivo qualquer; etc.
4) Estratégias destinadas ao QUESTIONAMENTO de rapport: desejo de
questionar ou impedir relações harmoniosas entre os interlocutores; desejo por mudança
negativa, prejudicando o rapport entre os interlocutores. Podem ter diversos motivos,
tais como: marcar independência, devolver uma ofensa recebida (causar
deliberadamente a perda de face das pessoas é uma maneira de consegui-lo), etc.
Na primeira parte da análise, focalizamos os aspectos interacionais de ordem
macro, que definem o que está acontecendo ao longo da interação (ex.: é o
gerenciamento de um conflito?; é a tentativa de manter de relações amistosas?). Na
segunda parte, nos detivemos no exame das micro-estratégias, com o objetivo de olhar
para os detalhes da interação. Segmentamos as micro-estratégias encontradas em dois
tipos, as destinadas à manutenção de rapport e as orientadas à maximização de rapport.
2A) Micro estratégias destinadas à MANUTENÇÃO de rapport: gerenciamento / mitigação de conflito
As principais estratégias destinadas à manutenção de rapport encontradas foram:
reivindicação de acordo e/ou evitação de conflito; concordância com ressalva / pseudo-
acordo; formas de reparo e de auto-correção; perguntas ou pedidos de esclarecimento
(pedir explicações); oferecimento de razões ou explicações (tipo escusa / justificativa);
negociação e/ou recusa de pressuposições / inferências.
66
2B) Micro estratégias destinadas à MAXIMIZAÇÃO de rapport: maximização / aumento de acordo / compartilhamento
As principais estratégias destinadas à maximização de rapport encontradas
foram: co-construção de tópico, de elocução, de avaliações (construção colaborativa);
concordância de idéias ou consenso de opiniões; hetero-repetição colaborativa; uso de
language play; endereçamento afetivo (formas de tratamento, uso de apelidos); uso de
diminutivos (linguagem afetiva); adjetivação avaliativa; uso de marcadores discursivos
de acordo / consenso; uso de elogios; estratégia de modéstia.
67
4. CONVERSA COTIDIANA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NA CIDADE DE BUENOS AIRES: suas especificidades
4.1 Situando conversa entre amigos e familiares
Nesta seção, definimos, em termos gerais, as características prototípicas da
conversa, com base em Albelda (2004) e, na seqüência, apontamos as especificidades
do espanhol coloquial tal como Briz (1996) as define.
Uma conversa, segundo Briz (1998), se define como um conjunto sucessivo e
alternante de turnos de fala ocupados por diferentes falantes. A não predeterminação de
tal alternância é sua característica distintiva frente a outros discursos dialogais (por
exemplo, um debate, uma diálogo livre, manifestações nas quais dita alternância de
turno está predeterminada), o que não significa que a tomada ou cessão de turno não
fiquem submetidas, em último extremo, a certos princípios ou convenções
socioculturais. Portanto, desde esse ponto de vista social, a conversa se ordena e
progride através de unidades chamadas de turnos e da alternância de turnos.
Segundo Albelda (2004, p. 110-113), o espanhol coloquial que reflete um tipo de
registro de fala é usado, prototipicamente, em conversas mantidas em situações
comunicativas informais. Um registro é uma modalidade de uso determinada pelo
contexto comunicativo. Existem registros formais e informais e, entre eles, não há uma
linha divisória e, sim, um continuum de traços que permite identificar registros
intermediários.
Com relação ao registro informal ou coloquial, ainda segundo Albelda, os traços
que o definem se encaixam perfeitamente na modalidade discursiva da conversa, de
maneira que, habitualmente, a conversa adota o registro coloquial sendo, por esse
motivo, o modo discursivo prototípico do coloquial.
A conversa é uma modalidade discursiva que se caracteriza,
preponderantemente, por interlocuções em presença (face a face), imediatas, com
tomadas de turno não predeterminadas, dinâmicas e cooperativas. A essas
características, Albelda acrescenta aquelas próprias do registro coloquial. Para ela, a
caracterização global da conversa coloquial, em linhas gerais, pode ser assim definida:
68
1) Características ou traços situacionais:
• relação de igualdade (social e funcional) entre os interlocutores; • relação vivencial de proximidade entre os interlocutores; • marco de interação familiar, cotidiano; • temática não especializada.
2) Características ou traços discursivos:
• finalidade interpessoal; • tom informal; • ausência de planejamento prévio; • tomada de turno não predeterminada; • dinamismo, presença de tensão dialógica.
Segundo Briz (1996, p. 29-30), o espanhol coloquial possui as seguintes
características:
(i) É um registro, nível de fala, um uso determinado pela situação, pelas circunstâncias da comunicação.
(ii) Não é domínio de uma classe social, mas, sim, tal e qual como é entendido aqui, caracteriza as realizações de todos os falantes de uma língua. É certo que é o único registro que dominam os falantes de nível sociocultural baixo, meio-baixo, porém em absoluto é exclusivo deles.
(iii) Não é uniforme, nem homogêneo, já que varia segundo as características dialetais e sócio-dialetais dos usuários.
(iv) Reflete um sistema de expressão que, mais que simplificação do registro formal ou do uso escrito, parece ser a continuação e desenvolvimento do modo pragmático da comunicação humana.
(v) Além de ser oral, pode refletir-se ou manifestar-se no texto escrito. (vi) Aparece em vários tipos de discurso, se bem que é na conversa, como uso mais
autêntico da linguagem, onde também mais autenticamente se manifesta esta modalidade lingüística tornando-se, portanto, o lugar mais adequado para iniciar seu estudo.
4.2 Situando polidez positiva e rapport no contexto de nosso corpus
Neste item, apresentamos uma breve revisão das noções relevantes de polidez
positiva e de rapport em que sustentamos nossa matriz analítica e elencamos os
recursos lingüístico-discursivos que, em princípio, poderiam ocorrer em nosso corpus.
Como já dito anteriormente, a polidez positiva pode ser definida como
estratégias utilizadas na fala em interação, que visam azeitar as relações sociais através
69
do reforço da imagem do outro. Ela é producionista, isto é, produz atos polidos, efetua
FFAs (atos lijonseiros da face, face flattering acts).
Nossas expectativas quanto às respostas fornecidas pela análise podem ser assim
detalhadas:
● Em situações sociais de familiaridade, parâmetro social básico dos usos lingüísticos do espanhol coloquial, os atos de polidez positiva objetivam o fim social, no sentido de que visam a fortalecer a imagem do outro, que supõe, por sua parte, o fortalecimento das relações sociais.
● O tipo de situação em jogo determina a natureza da polidez, que pode ser entendida de dois modos: como norma social de comportamento e como estratégia conversacional.
� Em contextos informais de situações de familiaridade, tal como se configura no nosso corpus, a polidez atua como estratégia conversacional e, para isso, contribuem os atos de reforço da imagem social positiva do self e do outro.
� Há dois de modos de se reforçar a face (= atos de polidez valorizante) dos interlocutores: diretamente, através de FFAs que reforçam a imagem positiva do interlocutor, satisfazendo seus desejos de aprovação e, indiretamente, através de acordo com o feito ou dito pelo outro.
� As contribuições comunicativas de cada participante se redefinem no intercâmbio com seu interlocutor ao longo da conversa, uma vez que a polidez é, em última instância, uma função da avaliação do ouvinte.
� A noção de construção de rapport (rapport-building) é um termo guarda-chuva, que abriga uma gama de estratégias, que possibilitam aproximação e envolvimento, e podem incluir trocas de language play, isto é, atividades criativas não associadas com a comunicação fática como esta tem sido tradicionalmente concebida, mas que envolvem modelagem de formas lingüísticas, criação de realidades alternativas e uso social para gerar intimidade ou conflito. Atividades de language play (comportamentos provocadores ou brincalhões, piadas, jogos lingüísticos com nomes e outros tipos de jogos de palavras) são atividades que, do mesmo modo que small
talk ou comunicação fática, parecem estar orientadas para metas que envolvem relacionamento, embora também possam servir a outras metas.
� A comunicação fática é um tipo de conversa interacional utilizada na negociação do rapport positivo, que faculta o estabelecimento e a manutenção de relações amigáveis, através de formas convencionalizadas ou de usos individualizados e criativos da linguagem.
Dentre os principais recursos lingüístico-discursivos usados no espanhol de
Buenos Aires para construir rapport, esperamos encontrar em nossos dados:
• uso exagerado da adjetivação (que expressa maior afetividade); • uso de formas de tratamento, em especial de vocativos (diminutivos, apelidos, etc., demonstrando carinho e relações afetivas); • construções conjuntas e colaborativas da fala; • reivindicação de acordo através da busca de consenso; • estratégias de language play;
70
• elogios; • estratégia de modéstia; • perguntas ou solicitação de esclarecimento (demonstrando interesse); • explicações (ou razões) dadas ao interlocutor; • repetição do enunciado (em parte ou na totalidade) do interlocutor; • diminutivos, expresssando afetividade; • interrupção colaborativa; • emprego dos verbos performativos, como creer e parecer relativizando a opinião do falante, além de fórmulas estereotipadas e expressões modalizadoras, como para mí, a
lo mejor, no sé, yo que sé, oye, hombre, mujer, ¿no?, ¿entiendes?, ¿¡qué quieres que te diga? empregadas com função minimizadora.
4.3 Situando o comportamento e o modo lingüístico do argentino Nesta seção, ilustramos alguns aspectos de polidez relativos ao comportamento e
à codificação lingüística do argentino, em confronto com outros padrões culturais
diferentes.
Partimos do princípio de que a polidez não é exercida em todos os lugares da
mesma maneira, nem nas mesmas circunstâncias. Logo, trata-se de se determinar se ela
se reduz ou não em todos os lugares a um conjunto de estratégias de deferência /
valorização da imagem e de respeito ao território do outro. Como fenômeno variável, a
hipótese de uma teoria universal do uso polido da linguagem é posta em xeque ao se
tentar aplicá-la em diferentes tipos de sociedade e de cultura.
Nessa perspectiva, a proposta de Haverkate (1994) de diferenciar culturas de
aproximação e culturas de distanciamento é um ponto de partida importante para se
entender o uso distinto de estratégias polidas. Assim, por exemplo, o fato de não se
utilizar gentilezas ou de sempre se agradecer é algo explicável e natural em uma cultura
de distanciamento, assim como o é o fato de as gentilezas serem freqüentes e de se
considerar inadequado estar sempre agradecendo em uma cultura que tenda à
aproximação.
A polidez não se modaliza nem se entende igual nas distintas línguas e culturas,
de maneira que, tampouco, é estranho que, para um espanhol, o agradecimento ao estilo
holandês seja excessivo, exagerado, ou vice-versa, que um holandês não entenda uma
forma tão freqüente da polidez espanhola, como as gentilezas.
Briz (2004) entende que tal distinção proposta por Haverkate (op.cit.) entre
culturas de aproximação e culturas de distanciamento, assim como a proposta de Bravo
71
(cf. 1999, p. 169; 2002, p. 144-115), segundo a qual um dos conteúdos fundamentais da
imagem de autonomia espanhola é a expressão de auto-afirmação, são fundamentais
para se para entender o uso distinto de estratégias polidas em diferentes culturas.
Ainda na visão de Briz, os conteúdos culturais de privacidade da cultura anglo-
saxã e de confiança da cultura espanhola, além de codificarem a polidez, constituem
filtros que permitem explicar diferentes interpretações do polido e dos mecanismos
lingüísticos empregados. Esses “ideomas” polidos, característicos de cada cultura ou
grupo social, inclusive de cada indivíduo, tornam prioritária a proteção de certas
imagens próprias ou alheias e, por isso, predeterminam ou favorecem a conveniência de
se atenuar (ou de se valorizar), em maior ou menor medida, certos temas ou tópicos
considerados mais socialmente conflitivos. Uma conversação polêmica geralmente
favorece a presença de atenuantes polidos, principalmente se as imagens ficam
comprometidas.
Já segundo Markus e Kitayama (1991), pessoas de diferentes culturas têm
construções marcadamente diferentes do self e do outro, variando também a forma
como se dão as relações de interdependência entre eles. Para eles, as culturas se
diferenciam em coletivistas e individualistas, categorização esta que equivale às
chamadas culturas de aproximação e de distanciamento propostas por Haverkate (op.
cit.).
Para esses autores, as ditas culturas coletivistas insistem na relação fundamental
entre os indivíduos, sendo enfatizada a forma como as pessoas se adequam e mantêm
uma relação harmoniosa entre si. Já as culturas individualistas valorizam a forma como
o indivíduo descobre / expressa seus atributos internos singulares e se identificam com a
perspectiva ocidental do self. As culturas da América do Norte e da Europa Ocidental
são exemplos dessa cultura individualista.
Uma outra forma de se denominar essas diferentes concepções de self seria a de
tratá-las como construções interdependentes (culturas coletivistas) e independentes
(culturas individualistas) de self.
As diferenças entre construção independente e interdependente de self são
ilustradas no quadro a seguir, através de um quadro contrastivo:
72
CARACTERÍSTICA COMPARADA
CONSTRUÇÃO INDEPENDENTE DO SELF
CONSTRUÇÃO INTERDEPENDENTE DO
SELF
Definição de self separada do contexto social conectada ao contexto social Estrutura limitada, unitária, estável flexível, variável Características importantes internas, privadas (e.g.
habilidades, pensamentos e sentimentos)
externas, públicas (e.g. status, papéis e relações)
Tarefas • ser único; • expressar o self; • perceber os atributos internos; • estimular / promover as
próprias metas; • ser direto: “dizer o que está na
mente”
• pertencer, adequar-se; • ocupar seu próprio espaço; • engajar-se em ações
apropriadas; • estimular / promover as metas
dos outros; • ser indireto: “ler a mente do
outro” Papel dos outros • avaliação do self: os outros
são importantes para a comparação social, para a avaliação espelhada
• definição do self: as relações com os outros em contextos específicos definem o self.
Base para a auto-estima • habilidade em expressar o self, validar atributos internos
• habilidade de ajustar, restringir o self, de manter harmonia com o contexto social
Quadro 2: Construção independente e interdependent de self (fonte: MARKUS; KITAYAMA, 1991, p. 229)
Tal quadro constitui um sumário, breve e simplificado, de algumas das
diferenças hipotéticas entre construções independentes e interdependentes de self,
constituindo parte de um repertório do esquema de self usado para avaliar, organizar e
regular a experiência humana nas diferentes culturas. Markus e Katayama (1991)
ressaltam, contudo, que o conceito de self deriva-se não só de um esquema ‘cultural’ de
self, que é o foco de seu estudo, mas de uma completa configuração de esquemas de self
que sofrem a interferência de outras variáveis, tais como gênero, raça, religião, classe
social, além de fatores decorrentes da história de desenvolvimento pessoal e social de
cada indivíduo. Paralelamente às diferentes construções de self e, conseqüentemente,
aos diferentes valores sócio-cognitivos, afetivos e culturais a ele associados, podemos
identificar diferentes estratégias de trabalhos de face dirigidas ao self e/ou dirigidas ao
outro. Essas diferenças, como já apontamos, estão retratadas nas orientações das teorias
e modelos sobre face e trabalhos de face aqui resenhados.
73
De uma sociedade para outra, os comportamentos de polidez variam
consideravelmente, tanto quantitativa como qualitativamente, como apontam Markus e
Katayama (op. cit.):
� Em termos quantitativos, os procedimentos de polidez podem ser mais ou menos numerosos e freqüentes conforme as sociedades. O uso do agradecimento é menos freqüente em espanhol do que em francês. � Em termos qualitativos, o agradecimento, em árabe, pode tomar a aparência de uma fórmula de bendição, e, em japonês, a de uma fórmula de desculpa; na França, suaviza-se um pedido principalmente pela formulação indireta através do modalizador poder ou querer; porém, em outros lugares, o pedido pode ser suavizado por outro tipo de marcador. Uma mesma fórmula ou um mesmo procedimento de polidez pode receber valores diferentes, inclusive opostos, de uma sociedade para outra. Essas diferenças de ordem cultural, quantitativas e qualitativas, porém, não põem
em xeque os fundamentos do modelo de Brown e Levinson, que se estima sujeito a
restrições, tanto acerca do que deve ser considerado como um FTA ou um FFA em uma
situação dada, nas culturas e nas diferentes situações de fala inter- e intraculturais,
quanto acerca do que deve ser considerado polido em uma dada situação e não polido
em outras (em numerosas sociedades, é muito mal visto agradecer a um familiar).
É preciso, por isso, considerar como impolido a ausência de agradecimento? Não
o é mais do que para nós, que projetamos sobre usos estrangeiros (e, portanto,
estranhos) nossas próprias normas.
Concebido para pôr em evidência certos princípios universais do uso da
linguagem, a saber, os que permitem uma gestão harmoniosa da relação interpessoal, o
modelo de Brown e Levinson permite, mediante um certo número de
acondicionamentos, vislumbrar certas diferenças no funcionamento da polidez de uma
cultura a outra.
Kerbrat-Orecchioni (1996) assinala, a este propósito, que, se no texto de Brown e
Levinson existe etnocentrismo, este se localiza essencialmente na importância, sem
dúvida excessiva, conferida aos procedimentos de não imposição (polidez negativa)
que, com efeito, desempenham um papel crucial no funcionamento da polidez ao modo
ocidental: enquanto que, na China, certos pedidos podem ser percebidos como FFAs (na
medida em que honram seu destinatário, brindando-o com a ocasião de desempenhar o
74
papel de benfeitor), por outro lado, na França, parece que todo pedido conserva algo de
seu caráter “impositivo” e que não pode, por isso, ser considerado como polido, senão
com a condição de ser suavizado.
Em princípio, segundo essa autora (op.cit.), não parece irracional admiti-lo, se
forem comparados o número e a freqüência das formas e das fórmulas de polidez
vigentes nas sociedades consideradas. Contudo, a polidez não se deixa quantificar tão
facilmente, seja pelo aspecto das diferenças culturais aqui ilustradas, seja porque uma
sociedade não é nunca homogênea: os comportamentos de seus membros variam
segundo o subgrupo ao qual pertencem (problema de variação “interna”) e, também
segundo, as situações comunicativas. Por exemplo, na Rússia os comportamentos
mudam sensivelmente conforme o intercâmbio se efetue na esfera pública ou em um
espaço privado. Na China, a extrema aspereza dos encontros comerciais ou de serviço
contrasta com a afabilidade da qual dão prova em outros tipos de situações. Em outras
sociedades, todavia, é a oposição relação dentro do grupo (relation in-group) versus
relação fora do grupo (relation out-group) a que acarreta diferenças radicais de
comportamento, por exemplo, no Japão e na Coréia.
Essas diferenças nas lógicas culturais subjacentes aos comportamentos de
polidez podem, segundo Kerbrat-Orecchioni (op.cit.), acarretar más interpretações nos
intercâmbios interculturais e convidam a uma maior prudência no que concerne à
questão de saber se certas sociedades são mais polidas do que outras. A respeito disso,
quando se trabalha a partir de uma perspectiva comparativa, a primeira questão que
convém destacar, anterior a de como se exerce a polidez, é esta outra: para quem e em
que situação se exerce o dever da polidez?
Por isso mesmo, ela conclui (op.cit.), o estudioso da polidez deve ser prudente, já
que uma reflexão sistemática sobre variações culturais pode contribuir para a luta contra
reflexos xenófobos que, muitas vezes, residem no desconhecimento da amplitude de
variações que afetam as normas comunicativas e, mais especificamente, as regras da
polidez lingüística.
Cada cultura (ou inclusive cada indivíduo) concede mais importância a
determinadas ações e temas, ou dá maior relevância a certas imagens. A maior ou menor
75
problematicidade temática se revela, de acordo com cada cultura, em um continuum
que vai desde temas corriqueiros ou banais, passando por temas polêmicos, até,
inclusive, os temas tidos como tabu. De acordo com Aston (1988, p. 304), o processo de
rapport pode envolver desde compartilhamento de atitudes até controvérsias sobre
temas potencialmente conflituosos.
O grau de aceitação que o falante supõe que vai obter previamente, assim como o
grau de solidariedade entre os interlocutores (sua distância ou aproximação social ou
funcional, sua distância ou proximidade vivencial), o fim predominante da interação
(interpessoal ou transacional) e o contexto cultural são fatos que favorecem certos usos
que, em nenhum caso, podem ser avaliados de modo polarizado, nem sequer como
graus de maior ou menor polidez.
A solidariedade se refere às relações de proximidade e simetria entre os
interlocutores. As interações de maior relação de proximidade são aquelas nas quais
existem ou se percebem entre os interlocutores maior presença de vivências comuns,
saber compartilhado, maior contato, maior grau de compromisso afetivo. São interações
simétricas aquelas nas quais existem ou se percebem entre os participantes da interação
maior igualdade funcional, maior identidade grupal, maior nivelação de papéis
(sobretudo os derivados das características socioculturais, como idade, gênero,
profissão, etc.).
Para concluir esta seção, remetemos às pesquisas já citadas de Boretti e
Hernández-Flores (cf. seções 2.3.3 e 2.3.5) que, diferentemente da nossa pesquisa,
utilizaram o método de análise quantitativo. Nossa pesquisa, como já enfatizamos, é de
enfoque interacional e de base interpretativista, na qual se utiliza o método de análise
qualitativo.
Segundo os resultados de Boretti (2003), a categoria de autonomia argentina
pressupõe as seguintes características: auto-estima, auto-afirmação; enquanto que a
categoria de afiliação argentina inclui as características a seguir: disponibilidade,
confiança, sinceridade, reciprocidade, generosidade, hospitalidade.
Já os resultados de Hernández-Flores (2003) apontaram uma característica de
afiliação na comunidade cultural espanhola: o valor da confiança descrito por Bravo
76
(2003) segundo o qual, dentre as características da imagem de autonomia espanhola,
estão o desejo de mostrar-se original e consciente das boas qualidades próprias, e,
dentro da imagem afiliativa, existe o ideal de “confiança”, isto é, saber a que se ater
com respeito ao outro e o que se pode falar sem temor a ofensas ou sem temer ofender o
outro.
Hernández-Flores colheu, em sua pesquisa, evidências de que falar com
confiança refere-se a um estilo comunicativo que supõe falar abertamente, sem reservas,
com franqueza; ter confiança em alguém, a um tipo de relação afetiva que alude à
proximidade; fazer algo porque se tem confiança, a um tipo de atuação em
conformidade com a própria personalidade, sem medo de ofender ao outro, sabendo que
esta conduta será recebida com naturalidade; ser alguém de confiança. Refere-se, por
fim, a ser muito próximo de alguém, conhecer-lhe bem, como alguém da família.
Freqüentemente pode ver-se escrito que as conversas coloquiais espanholas são
menos polidas que as formais, até mesmo que a conversa espanhola peninsular em geral
é menos polida que a de outras culturas.
De acordo com Briz (2003), nenhuma das considerações anteriores é correta. Por
um lado, o que realmente é constatável é que, nas coloquiais, prototipicamente
solidárias e interpessoais, os atenuadores, como procedimentos lingüísticos de
expressão da polidez mitigadora, são menos freqüentes, pois sua presença excessiva
contradiria o fim das mesmas, essa familiaridade e solidariedade prévia ou buscada
pelos interlocutores.
Segundo Bravo (2003), entre espanhóis, em situações de negociação, não se
manifesta o território pessoal, enquanto que no nível “gregário” se procura tratar o outro
de forma familiar e conseguir níveis de confiança no interpessoal. A confiança
interpessoal não requer que se compartilhem os desejos do interlocutor, nem que se
aprovem suas características de personalidade, senão que se aceite o interlocutor tal qual
ele é, embora se o critique abertamente e se discorde daquilo que ele pensa (também
abertamente): é mais importante conhecer uma pessoa do que aprová-la.
77
5. CONVERSA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES: ESTRATÉGIAS DE ENVOLVIMENTO E DE RAPPORT O corpus com o qual trabalhamos é composto por três diálogos livres. Note-se
que, abaixo do número de cada amostra (diálogo), seguem uma descrição dos
participantes e, logo após, comentários sobre eles. As descrições foram extraídas do
corpus e foram redigidas pelos autores do projeto; já os comentários foram por mim
elaborados para dar conta dos objetivos deste trabalho.
Seguem, portanto, as descrições dos participantes e os comentários sobre as
relações existentes entre eles, relações essas que podem ser inferidas através de pistas
do discurso.
Diálogo livre número 1: participantes Marta e Tereza
Amostra XXIX
Corresponde à amostra nº 240, fita CXX-A. Diálogo livre. Duração: 47 minutos. Tema: campainhas e portas, ensino de alemão, amigas, idiomas. O participante A (nº 278 de nosso arquivo) é uma mulher de 67 anos, solteira, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Já viajou à Europa, ao Oriente e ao Uruguai. Profissão: professora de Filosofia. Fala alemão e francês. Seu pai, advogado e fazendeiro, e sua mãe, dona de casa, também são de Buenos Aires. O participante B (nº 279 de nosso arquivo) é uma mulher de 70 anos, solteira, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Já viajou à Europa, ao Oriente e à América. Profissão: professora de Filosofia. Fala inglês e francês. Seu pai, fazendeiro, e sua mãe, dona de casa, também são de Buenos Aires.
Comentários
A partir da análise deste diálogo, através de pistas contextuais, pode-se inferir
que as participantes Marta e Tereza são amigas de longa data. Algumas dessas pistas
seriam os assuntos tratados, o conhecimento de mundo compartilhado e as amigas em
comum. Pode-se concluir, também, que se trata de uma relação de amizade que passa
pelo afeto, como comprovam, entre outras estratégias, as formas carinhosas de
tratamento utilizadas (Bebita e hija). Confira-se:
01 02
Tereza -Ahora--- vas a tropezar con una dificultad que es mi pésima memoria. Yo no puedo memorizar.
03 04
Marta -¿Querés que te diga una cosa, Bebita? Yo creo que lo de la pésima memoria tuya es un. . . un leitmotiv que tenés.
05 Tereza -¿Un qué?
06 Marta -Leit-motiv: lo repetís pero no es verdad.
78
07 08
Tereza -Pero yo me pongo a estudiar un verbo, y lo estudio y me lo olvido a los pocos días.
09 10 11 12
Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.
13 Tereza -Pero los verbos los confundo.
14 Marta -¿El significado?
15 Tereza -No, confundo... confundo cuando la...
16 Marta -¿ La formación ?
17 Tereza -Las formaciones, sí.
18 Marta -¡Ah, no! que con la declinación...
19 Tereza -Los tiempos compuestos, el subjuntivo, todo eso.
20 21
Marta -Pero eso, hija, eso es muy humano porque son - - - endiablados los verbos.
22 Tereza -Ah, bueno. Entonces me consolás.
23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...
Diálogo livre número 2: participantes Carmen e Maura
Amostra XXVII
Corresponde à amostra nº 305, fita CLIX-A. Diálogo livre. Duração: 48 minutos. Tema: vários. O participante B (nº 117 de nosso arquivo) é uma mulher, solteira, de 37 anos, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Ocupação: professora de letras. Fala inglês e francês. Já viajou para Europa, Estados Unidos, Peru, México e Brasil. Seu pai, médico, é de Rosário, e sua mãe, dona de casa, é de Buenos Aires. O participante A, mulher, não se considera (*), embora reúna as condições exigidas, pois a porcentagem de mulheres da terceira idade já está coberta.
(*) não se considera: refere-se ao fato de o projeto do qual extraí meu corpus de trabalho não haver analisado a participante A (Carmen), pois, apesar de reunir as condições buscadas por eles, a porcentagem de mulheres da terceira idade já estava coberta.
Comentários
A partir da leitura deste diálogo, por sua vez, constata-se que as participantes
Carmen e Maura são mãe e filha, respectivamente. Por conseguinte, há uma relação que
vai além da amizade, pois é uma relação de familiaridade, que passa pelo afeto e pelas
emoções. Isso pode ser comprovado através das formas de tratamento por elas utilizadas
(mamita e nena), além de longos segmento de falas de narrativa pois, como afirma
Tannen (1984), quando existe um alto grau de envolvimento, as pessoas tendem a
79
contar suas próprias experiências pessoais e os sentimentos relativos a esses eventos.
Confira-se:
01 02
Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?
03 Maura -Bueno.
04 Carmen -¿ Eh?
05 Maura -Contáme, mamita, contáme.
06 07 08 09 10 11 12
Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...
Diálogo livre número 3: participantes Mercedes e Carlos
Amostra XXVI
Corresponde à amostra nº 303, fita CLVI-A. Diálogo livre. Duração: 49 minutos. Tema: o gravador, França, religião, viagens, anedotas sobre Sarmiento, Chile. O participante B (nº 115 de nosso arquivo) é uma mulher de 52 anos, casada, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Já viajou à Europa, à Austrália e à Ásia. Ocupação: obras sociais e o lar. Fala francês. Seu pai, fazendeiro, e sua mãe, dona de casa, são da província de Buenos Aires. Seu marido, fazendeiro, é da província de Buenos Aires. O participante A, homem, não se considera (*), pois não reúne as condições necessárias.
(*) não se considera: refere-se ao fato de o projeto do qual extraí meu corpus de trabalho não haver analisado o participante A (Carlos), pois não reunia as condições buscadas por eles.
Comentários
O segmento de fala inicial da conversa entre os interlocutores Carlos e Mercedes
é muito importante, pois nele encontramos evidências sobre a relação de amizade
existente entre os participantes, como se observa pelas falas de Mercedes nas linhas 21,
23 e 24. Confira-se:
21 22
Mercedes -Claro. Bueno, yo por lo que te conozco a través de tantos años...
23 Carlos -Te...
24 25
Mercedes -...sé que has tenido una veneración muy especial por el hombre del cuadro, como dijo Cristina, ¿no?
26 27
Carlos -Mirá--- yo más que por el hombre del cuadro--- la veneración mía--- es mi abuelo.
28 Mercedes -¿Cuál, Carlos L.?
29 Carlos -Carlos L., a quien no conocí.
30 Mercedes -Y, claro, es el decano; claro.
80
Essas falas são relevantes pois, além de afirmar que eles se conhecem há muitos
anos, Mercedes também mostra, com a frase “[...]sé que has tenido una veneración muy
especial por el hombre del cuadro, como dijo Cristina, ¿no?”, conhecimento de mundo
compartilhado. Ela afima saber alguma coisa importante da vida de seu interlocutor, e,
ainda, menciona uma pessoa, Cristina, de quem se pode inferir que seja uma amiga
comum.
Este capítulo está dividido em duas partes. Na primeira parte fizemos uma
análise macro que mostra, em um primeiro momento e de forma geral, como se dá,
seqüencialmente, o gerenciamento de conflitos e como as partes se orientam e se
mostram interessadas na manutenção do rapport. Em um segundo momento,
procedemos a uma análise que mostra como os participantes se alinham com o intuito
de aumentar / maximizar rapport. Na segunda parte deste capítulo ilustramos o uso de
micro estratégias destinadas à manutenção de rapport e aquelas destinadas à
maximização de rapport.
Finalmente, no capítulo “conclusão”, que é destinado à discussão dos resultados,
realizamos uma associação entre as orientações dos participantes (análise macro) e a
escolha e o uso de micro estratégias lingüístico-discursivas.
Relembramos que Spencer-Oatey define o gerenciamento das relações
interpessoais como o uso da linguagem para promover, manter ou ameaçar relações
sociais harmoniosas e sugere o termo “rapport management” (gerenciamento de
rapport) para se referir a esta área.
Lembramos que iremos efetuar nossa análise de acordo com os parâmetros
teóricos dessa autora, que sugere quatro tipos de orientações de rapport. Porém,
diferentemente dela, segmentamos nossa análise em duas orientações principais
(orientações 1 e 2) e duas secundárias (orientações 3 e 4), estas últimas aparecendo
subjacentes às outras, como movimentos que ocorrem de maneira esporádica e que não
impedem a manutenção do rapport da relação.
(1) orientação no sentido de MANUTENÇÃO de rapport
(2) orientação no sentido de AUMENTO / MAXIMIZAÇÃO de rapport
(3) orientação no sentido de NEGLIGÊNCIA de rapport
(4) orientação no sentido de QUESTIONAMENTO de rapport
81
5.1 Análise macro 1) Como os participantes se orientam com o intuito de manutenção do rapport da relação; 2) como os participantes se alinham no sentido de construção de um aumento / maximização de rapport. 5.1.1 Manutenção de rapport Veremos, a seguir, como ocorre, em nossos dados, as negociações e o
gerenciamento de conflitos. Utilizando-se do discurso argumentativo, as partes
orientam-se e mostram-se interessadas na manutenção do rapport (harmonia) da
relação, através de estratégias que visam à atenuação / minimização de atos tidos como
ameaçadores de face.
Entendemos o discurso argumentativo como aquele no qual, através de
argumentos, desenvolve-se uma negociação entre os participantes, negociação essa
destinada a resolver os conflitos advindos de opiniões divergentes.
Excerto 1 (diálogo 1):
Neste segmento do diálogo 1 ocorre (linhas 1-64), uma situação conflituosa
onde o rapport é gerenciado através da evitação de conflito ou de desacordo, das
perguntas e dos pedidos de esclarecimento e do oferecimento de razões ou explicações.
O segmento em questão segue com o tema do anterior, ensino de alemão por
parte de Marta. Nele ocorre (linhas 1-64), uma situação conflituosa que foi gerada por
um ressentimento de Teresa para com sua amiga Marta. Esse ressentimento deve-se ao
fato de Tereza descobrir que Marta está dando aulas de alemão para outra pessoa,
porém havia deixado de dar aulas para ela. Veremos como se dá o gerenciamento
dessa situação de conflito, isto é, como ele é posteriormente minimizado / atenuado
pelos interlocutores, como conseqüência do interesse das partes na manutenção do
rapport da relação.
01 02
Tereza -Yo creía--- que vos habías dejado la enseñanza del alemán.
82
03 04 05 06 07 08 09 10 11 12
Marta -Pero--- es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me da vergüenza. Tanto, que esta chica me dice: "i Pero Marta, qué lecciones largas, pero qué barbaridad! Pero no me cobra más que... eh... lo que me ha cobrado el año pasado por una hora." "No, hija", le digo yo. Son lecciones muy poco académicas, en las que yo recurro al diccionario, y en las que yo consulto la gramática en presencia de ella. Pero yo creo que ella prefiere--- que haga así un trabajo de sinceridad--- y no que me presentara como una gran profesora no siéndolo.
13 14
Tereza -¿Y por qué te has olvidado de una de tus alumnas--- que has dejado completamente a un lado?
15 16
Marta -Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá--- se lo pasa paseando...
17 18 19
Tereza -Como definición me parece muy bonito, porque está escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.
20 Marta -Yo creo que sí. Tengo… tengo otra amiga ...
21 22
Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...
23 Marta -No, es que...
24 25
Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.
26 27
Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."
28 Tereza -No, ella va por necesidad también.
29 30 31
Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...
32 33
Tereza –Yo creí que no te interesaba o que no tenías tiempo, que no querías hacerlo.
34 35 36 37 38 39
Marta -Este año he tenido un año terrible de luchas internas--- ya sabés a quién me refiero--- Y tengo pendiente--- otra clase de alemán, pero quién sabe si se llega a realizar, porque Georgina tenía idea de ir a Alemania, y entonces quería--- uno o dos meses antes de ir a Alemania --conversar conmigo un poco en alemán.
40 Tereza -¿Pero sabe un poco Georgina?
41 42 43
Marta -Sí, ella se recibió de maestra hace aiíos --en el Consejo de Mujeres, pero no lo ha cultivado y nunca lo ha sache... lo ha sabido como yo.
44 Tereza -Ah, bueno! Es más fácil.
45 46
Marta -Pero--- conmigo, conversando, lo hubiera refrescado eso que sabía.
47 Tereza -¿Y tenés tiempo para dar alguna clase de alemán?
48 49 50 51 52 53 54
Marta -Mirá, si viene la obligación--- yo hago el tiempo y en realidad me viene bien; pero vos sabés el problema que yo tengo en casa. Vos sabés que a mí--- la muchacha me tiene enloquecida con sus imprevistos, con sus --agachadas--- con miles de cosas que no sé cómo definir --- y que no es como tener una empleada cualquiera por lo que tiene la chiquita.
55 Tereza -Bueno.
56 Marta -Y que está en juego la felicidad de esa criatura.
57 58
Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me
83
59
levanta- - - y además porque...
60 Marta -Te levanta de la cama.
61 Tereza -No puedo decirte...
62 Marta -Te levanta de la cama, ¿no?
63 64
Tereza -No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que
65 66
Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.
67 68 69
Tereza -Sí, tengo obligaciones; pero, como vos decís, el tiempo puede hacerse de alguna forma. Siempre un hueco hay.
70 71
Marta -Mhm. Bueno, yo también puedo hacer un hueco. Sobre todo a la mañana.
72 73
Tereza -¡Espléndido! Ahora, mi alemán es muy deficiente, eso es lo malo.
74 75 76
Marta -Yo no le veo. Yo encuentro --- que el ja... que... que entre vos y la otra chiquilina --- hay una diferencia abismal.
77 Tereza -¿En qué sentido?
78 79 80 81 82 83 84 85 86
Marta -Lo que vos sabés --- lo has estudiado--- académicamente, conscientemente --- y la pregunta tuya es precisa--- esta chica--- es inteligente, es rápida, pero es un poco haragana--- y no ha estudiado--- como vos. Cuando vos--- decís que un sustantivo, en ese caso corresponde en dativo o en acusativo, yo pienso: "Tiene razón porque lo debe de haber estudiado." ¿Entendés?
87 88
Tereza -Bueno, yo te propondría--- que hiciéramos las lecciones que pudiéramos.
89 90
Marta -Claro, como ha sido siempre- - - el día que te conviene.
91 92 93
Tereza -Como ha sido siempre; porque--- es un pequeño bagaje, es un bagaje muy corto, muy diminuto, muy insignificante.
94 Marta -Sí.
95 96
Tereza -Pero--- por lo menos permite- - - moverse—elementalmente.
97 Marta -Claro.
98 99 100
Tereza -Y como siempre pienso hacer un viaje en Alemania--- y me hace un bien moral también, podríamos tomar esos libros de historia.
101 Marta -Mirá, me parecería muy divertido.
102 Tereza -Son divertidísimos.
No segmento acima ocorre um mal-entendido entre as interlocutoras, que pode
ser classificado como um conflito de pressuposições ou inferências equivocadas
realizadas por cada uma das interlocutoras. Este segmento pode ser sub-dividido em
duas partes. Na primeira (linhas 1-64) há a pressuposição equivocada por parte de
Tereza, que pensa que a amiga não quer ou não pode mais dar aulas de alemão para ela.
84
Note-se que, logo após o início do segmento de fala conflituoso, ocorrem duas
orientações distintas, uma por parte de Tereza, que se orienta no sentido de
questionamento de rapport, e outra por parte de Marta, que está orientada para a
manutenção do rapport da relação. Todas as ações de Tereza na parte inicial do
segmento acima (até a linha 39) estão ameaçando as relações sociais harmoniosas entre
ela e sua interlocutora Marta.
Esse segmento inicia-se com Tereza fazendo uma ameaça à face positiva de sua
amiga Marta, ao dizer que “Yo creía – que habías dejado la enseñanza del alemán.”
(linhas 1-2), o que Marta passará a responder com estratégias de proteção de face,
através de justificativas ou pseudo-estratégias de modéstia como, por exemplo, “Pero
– es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me dá vergüenza.” (linhas 3-4) , que
minimizam, atenuam seu ato.
Tereza, porém, continua a ameaçar a face positiva de sua amiga, dizendo: “Y
por qué te has olvidado de una de tus alumnas – que has dejado completamente a un
lado?” (linhas 13-14), ao que Marta, recorrendo novamente a justificativas, afirma:
“Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá – se lo pasa
paseando…” (linhas 15-16).
Tereza lança mão da estratégia da indiretividade, através de duas artimanhas:
ocultamento do nome da pessoa que seria beneficiária das aulas de alemão (“una de tus
alumnas”, no caso, ela mesma) e utilização do formato de pergunta. O que na verdade
Tereza faz é uma cobrança atenuada (pela indiretividade), pois a amiga está dando aula
para outra pessoa e não está mais dando aula para ela.
É fundamental observar-se que o gerenciamento das relações interpessoais é feito
de formas distintas por Tereza e Marta. Com relação à Tereza, no sentido de
questionamento de rapport e por sua amiga Marta, cujas asserções são sempre
orientadas pela escolha de estratégias de atenuação / minimização, no sentido de
manutenção de rapport.
A continuação (linhas 17-19), Tereza responde sem utilizar-se de qualquer tipo
de atenuação e chega a valer-se de ironia (ou mesmo de deboche) para contestar o que
disse Marta em sua defesa: “Como definición me parece muy bonito, porque está
85
escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.”. Com
isso ela diz não acreditar no que sua amiga falou (“...o que você diz não é verdade”),
em mais uma ameaça à face de sua interlocutora. Marta recusa e diz, em sua defesa, que
está dizendo a verdade: “Yo creo que sí.” (linha 20).
Spencer-Oatey afirma que causar deliberadamente a perda de face das pessoas é
uma maneira de orientar-se no sentido de questionamento de rapport, e é a estratégia
que Tereza vem seguindo até o momento. Os motivos que levam uma pessoa a
questionar rapport são vários. No exemplo em questão (após a descoberta das aulas que
Marta ministra para outra pessoa e não mais para ela), o motivo que leva Tereza a
seguir a orientação de questionamento de rapport pode ser o questionamento da própria
amizade existente entre ela e Marta.
Segue-se um segmento (linhas 21-31) no qual Tereza continua ameaçando a face
positiva de sua interlocutora. Esta se orienta, uma vez mais, pela manutenção do
rapport (harmonia) da relação, como pode verificar através das estratégias de atenuação
utilizadas por esta última (estratégia de dar justificativas e/ou explicações):
21 22
Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...
23 Marta -No, es que...
24 25
Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.
26 27
Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."
28 Tereza -No, ella va por necesidad también.
29 30 31
Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...
Tereza (linhas 21-22) reafirma sua opinião (dada anteriormente na linha 1), e o
faz de uma forma não atenuada pois, apesar da utilização do verbo parentético8 creer,
que deveria funcionar como instrumento atenuador, esse recurso é perdido pelo efeito
do advérbio francamente, usado em seguida. Marta (linha 23) faz uma tentativa
interrompida de explicação e Tereza (linhas 24-25) passa a expor a sua amiga o motivo
pelo qual ela necessita tanto das aulas de alemão e, por isso, estar tão aborrecida (o que
8 Segundo Fraser (1980), verbos e advérbios parentéticos (do tipo acho, creio, provavelmente, etc.), reduzem o comprometimento resultante da enunciação, funcionando, assim, como instrumentos atenuadores da força ilocucionária dos enunciados.
86
se deduz do fato de ela não estar atenuando suas asserções) com o fato: as aulas são um
benefício moral para ela.
A descrição de Bravo (2003) para confiança – confiança interpessoal não requer
que se compartilhem os desejos do interlocutor, nem que se aprovem suas
características de personalidade, senão que se o aceite assim tal qual ele é, embora se o
critique “abertamente” e se discorde daquilo que ele pensa (também “abertamente”) – é
o que, em nosso entender, faz com que Marta aceite as várias críticas e questionamentos
a sua pessoa feitos por sua amiga Tereza e, ao longo de todo esse segmento de fala,
prossiga em sua orientação de manutenção de rapport.
Tereza afirma que Marta sabia de suas necessidades pessoais, isto é, do
benefício moral que as aulas de alemão dão a ela (linhas 24-25). Porém Marta recusa e
diz, para salvaguardar a sua face, que todas as alunas a procuram com esse argumento,
isto é: ”-Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me
decía: "Me hace falta..." (linhas 26-27), ao que Tereza responde, não aceitando a
explicação de Marta: “-No, ella va por necesidad también.” (linha 28), em referência
ao emprego de vendedora que a aluna de Marta ocupa, e no qual ela necessita falar
alemão. Tereza opta novamente pela ação despreferida de discordância do interlocutor,
e novamente o faz sem atenuação.
Marta (linhas 29-31) pondera que a aluna “ahora tiene este trabajo nuevo”,
porém no ano anterior ela também pedia as aulas de alemão alegando o beneficio moral
que fariam a ela (ela utiliza a conjunção pero, que indica contraposição entre a idéia
inicial e a que a sucede). Marta, em mais uma tentativa de salvar a sua face, utiliza-se
da estratégia de oferecer razões ou explicações a sua interlocutora.
Note-se que o assunto, polêmico, foi gerado por um mal-entendido ocorrido
anteriormente entre as partes. Isso pode ser deduzido especialmente nas falas transcritas
abaixo (linhas 21-22 e 65-66):
21 22
Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...
65 66
Marta Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.
87
Pode-se observar que Tereza pensava que à Marta não interessava mais dar
aulas de alemão e Marta pensava que sua amiga estava muito ocupada, cheia de
obrigações sociais e não tinha mais tempo para estudar alemão.
Marta, dando continuidade a sua estratégia de evitação de conflito, dá
explicações à Tereza (linhas 34-39), informando sobre seus problemas e sobre a
existência de outra amiga sua que também deseja ter aulas de alemão, porém ela ainda
não atendeu a esse pedido:
34 35 36 37 38 39
Marta -Este año he tenido un año terrible de luchas internas--- ya sabés a quién me refiero--- Y tengo pendiente--- otra clase de alemán, pero quién sabe si se llega a realizar, porque Georgina tenía idea de ir a Alemania, y entonces quería--- uno o dos meses antes de ir a Alemania --conversar conmigo un poco en alemán.
A continuação, Tereza muda sua orientação e parece aceitar as explicações de
Marta, atenuando suas asserções e fazendo perguntas sobre Georgina (amiga de Marta),
o que mostra seu interesse na narrativa de Marta e na manutenção do rapport (linhas 40,
44 e 47). Em seguida, Marta dá novamente explicações à Tereza (linhas 48-54 e 56):
40 Tereza -¿Pero sabe un poco Georgina?
41 42 43
Marta -Sí, ella se recibió de maestra hace aiíos --en el Consejo de Mujeres, pero no lo ha cultivado y nunca lo ha sache... lo ha sabido como yo.
44 Tereza -Ah, bueno! Es más fácil.
45 46
Marta -Pero--- conmigo, conversando, lo hubiera refrescado eso que sabía.
47 Tereza -¿Y tenés tiempo para dar alguna clase de alemán?
48 49 50 51 52 53 54
Marta -Mirá, si viene la obligación--- yo hago el tiempo y en realidad me viene bien; pero vos sabés el problema que yo tengo en casa. Vos sabés que a mí--- la muchacha me tiene enloquecida con sus imprevistos, con sus --agachadas--- con miles de cosas que no sé cómo definir --- y que no es como tener una empleada cualquiera por lo que tiene la chiquita.
55 Tereza -Bueno.
56 Marta -Y que está en juego la felicidad de esa criatura.
Segue-se um segmento de construção colaborativa da fala (linhas 57-62), no
qual Tereza começa por dizer que entende os motivos de sua interlocutora, mas expõe
que as aulas fariam bem a sua pessoa, sendo interrompida duas vezes por Marta, que
88
tenta antecipar o que ela vai dizer, numa forma de manifestação de acordo e
cooperação.
57 58 59
Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me levanta- - - y además porque...
60 Marta -Te levanta de la cama.
61 Tereza -No puedo decirte...
62 Marta -Te levanta de la cama, ¿no?
63 64
Tereza -No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que es más importante.
Por dois turnos seguidos (linhas 60 e 62) Marta oferece o complemento “Te
levanta de la cama”, sendo, na segunda vez, corrigida por Tereza, que responde
fazendo a correção: “-No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que es más
importante. . “ (linhas 63-64).
Esse segmento de construção colaborativa (linhas 57-64) não é bem sucedido,
uma vez que a pressuposição feita por Marta sobre o motivo de as aulas de alemão
fazerem bem a sua amiga Tereza não correspondiam à realidade. Ao dizer “pero me
hubiera hecho bien porque me levanta…” (linha 58), Tereza não queria dizer, como
pressupôs Marta, que as aulas a levantariam da cama, mas sim que “... me levanta el
ánimo, que es más importante.” (linha 63-64). Pode-se dizer que o ocorrido foi uma
pressuposição de conhecimento compartilhado que estava equivocada.
Tereza, porém, ao recusar o complemento dado por sua amiga (que ela
decodifica em seu sentido literal, isto é, levantar-se da cama para ir à aula) pode
também ter-se equivocado, uma vez que sua interlocutora poderia estar falando em
sentido metafórico.
Na segunda parte desse segmento (linhas 65-71) é a falante Marta quem se
equivoca (linhas 65-66), ao pensar que Tereza estava muito ocupada e não queria mais
ter aulas com ela.
65 66
Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.
67 68 69
Tereza -Sí, tengo obligaciones; pero, como vos decís, el tiempo puede hacerse de alguna forma. Siempre un hueco hay.
70 71
Marta -Mhm. Bueno, yo también puedo hacer un hueco. Sobre todo a la mañana.
89
Tereza, então, tenta desfazer o equívoco, fazendo o devido reparo, porém de
forma atenuada. Primeiramente ela afirma: “Sí, tengo obligaciones;” (linha 67), para,
em seguida, iniciar uma ressalva com a conjunção pero. Em seguida ela faz uma
afirmação (“el tiempo puede hacerse de alguna forma”), porém imputa essa afirmação a
sua interlocutora (“como vos decís”), como uma maneira de dizer que, embora tenha
muitos compromissos, ela concorda com sua amiga, isto é, que há uma maneira de
conciliar as duas coisas.
Tem início a superação do conflito: a partir da linha 65 tem início a resolução
do conflito, com Marta (linhas 70-71) orientando-se no sentido de chegar a um acordo
com sua interlocutora. Tereza ratifica o acordo proposto (linhas 72-73), inclusive
fazendo uso da estratégia de adjetivação (“Espléndido!”), porém avisa à Marta que elas
terão um problema, devido ao fato de o seu alemão ser deficiente (estratégia de
modéstia ou de auto-depreciação).
65 66
Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.
67 68 69
Tereza -Sí, tengo obligaciones; pero, como vos decís, el tiempo puede hacerse de alguna forma. Siempre un hueco hay.
70 71
Marta -Mhm. Bueno, yo también puedo hacer un hueco. Sobre todo a la mañana.
72 73
Tereza -¡Espléndido! Ahora, mi alemán es muy deficiente, eso es lo malo. (estratégia de modéstia ou de auto-depreciação)
Desse segmento em diante passam a predominar, por parte de Marta, as
estratégias destinadas à maximização de rapport, sobretudo os elogios seguidos de
argumentos (linhas 74-76 e 78-86). Nota-se também uma mudança na orientação de
rapport por parte de Tereza, que passa a orientar-se no sentido de manutenção de
rapport.
Marta recusa a afirmação de Tereza, dizendo que entre ela e sua outra aluna
existe uma diferença abismal, diferença essa que se deve ao fato de ela já haver
estudado alemão academicamente, de forma consciente. Essa estratégia utilizada por
Marta é uma estratégia de polidez positiva (ou modo de reforçar a imagem do outro)
direta, que satisfaz os desejos de aprovação do outro através do uso de elogios.
74 75 76
Marta -Yo no le veo. Yo encuentro --- que el ja... que... que entre vos y la otra chiquilina --- hay una diferencia abismal. (elogio)
90
77 Tereza ¿En qué sentido?
78 79 80 81 82 83 84 85 86
Marta -Lo que vos sabés --- lo has estudiado--- académicamente, conscientemente --- y la pregunta tuya es precisa--- esta chica--- es inteligente, es rápida, pero es un poco haragana--- y no ha estudiado--- como vos. Cuando vos--- decís que un sustantivo, en ese caso corresponde en dativo o en acusativo, yo pienso: “Tiene razón porque lo debe de haber estudiado." ¿Entendés? (elogio seguido de argumentos)
Nos turnos seguintes (linhas 87-94) é logrado o acordo, como se constata, por
exemplo, pela repetição de parte do enunciado do interlocutor (linha 91):
87 88
Tereza -Bueno, yo te propondría--- que hiciéramos las lecciones que pudiéramos.
89 90
Marta -Claro, como ha sido siempre- - - el día que te conviene.
91 92 93
Tereza -Como ha sido siempre; porque--- es un pequeño bagaje, es un bagaje muy corto, muy diminuto, muy insignificante.
94 Marta -Sí.
Esse acordo também se manifesta nos turnos seguintes (linhas 91-102), nos
quais Marta concorda com Tereza, numa estratégia que reforça a cooperação. Ao
reforçar o dito por sua interlocutora, Marta reforça também a imagem desta.
91 92 93
Tereza -Como ha sido siempre; porque--- es un pequeño bagaje, es un bagaje muy corto, muy diminuto, muy insignificante.
94 Marta -Sí.
95 96
Tereza -Pero--- por lo menos permite- - - moverse--elementalmente.
97 Marta -Claro.
98 99 100
Tereza -Y como siempre pienso hacer un viaje en Alemania--- y me hace un bien moral también, podríamos tomar esos libros de historia.
101 Marta -Mirá, me parecería muy divertido.
102 Tereza -Son divertidísimos.
Excerto 2 (diálogo 3):
Neste segmento do diálogo 3 ocorre uma situação conflituosa (linhas 1-44) que
foi gerada, sobretudo, em virtude do tópico da conversa: religiosidade. Mostraremos
como se dá, seqüencialmente, o gerenciamento do conflito.
91
Há interesse na manutenção do rapport (harmonia da relação) como no exemplo
anterior, no qual a falante Marta se orienta nesse sentido. Neste, porém, a orientação dos
participantes mudará no curso da interação (como veremos mais adiante). Aqui, porém,
não é logrado o acordo, e um conflito maior é evitado através do abandono do tópico
religiosidade (cf. linhas 41-43).
01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...
02 03
Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?
04 Carlos -Sí, sí, sí.
05 06
Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura, ¿no es así?
07 08
Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...
09 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?
10 11
Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?
12 13 14 15
Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.
16 Carlos -Claro, claro.
17 18
Mercedes -No sé, ¿no te pasa a vos--- conmoverte frente a la obra del--- Creador?
19 20
Carlos -Sí. Bueno, mirá--- sí --- sí, pero en cuanto a las creencias mías--- son--- muy distintas a las tuyas.
21 Mercedes -¿Por qué?
22 Carlos -No, porque vos sos una ... sos... sos una...
23 24
Mercedes -No no, yo tengo una educación del colegio religioso, ¿viste?, que te... te... te...
25 Carlos -Claro. En cambio yo no. De manera que...
26 Mercedes -Pero no sos ateo.
27 Carlos -No, ateo no soy, no.
28 Mercedes -Pero podés creer que sos.
29 30 31
Carlos -Eh... no soy no; no soy ateo y la prueba es que... esté... recibí la bendición del Santo Padre por segunda vez.
32 33 34 35
Mercedes -Claro. Bueno, el otro día el padre L. explicaba, ¿no? que la religiosidad--- es una creación del hombre, lo que te viene de Dios es la fe--- que es diferente, ¿no es cierto?
36 37
Carlos -Claro. ¿Y vendrá de Dios? Porque si viniera de Dios todos tendrían fe.
38 Mercedes -Sí, claro; pero a veces hay quien es más sordo.
39 40
Carlos -Ah, entonces yo debo ser... debo... Claro, sí sí; sí, yo soy sordo.
41 Mercedes -Me parece que nos estamos metiendo en un tema teológico
92
42 43
que conviene salir, ¿eh?, para uno más frívolo, ¿qué te parece? [risas] ¿No has estado en el cine últimamente?
44 Carlos -No.
Esse segmento versa sobre o polêmico tema religiosidade e, a princípio (linhas
1-16), os interlocutores parecem desfrutar uma perfeita concordância de idéias.
01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...
02 03
Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?
04 Carlos -Sí, sí, sí.
05 06
Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura, ¿no es así?
07 08
Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...
09 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?
10 11
Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?
12 13 14 15
Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.
16 Carlos -Claro, claro.
As observações de Carlos destacadas abaixo podem ser descritas como
estratégias de language play, pois ele faz (linhas 7-8 e 10-11) trocadilhos com os termos
“te encontrás con la creación” e “la creación y su criatura”, ditos
por Mercedes nas linhas 2 e 5:
07 08
Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...
10 11
Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?
Atividades de language play são descritas por Aston como aquelas que refletem
a orientação dos participantes na manuteção de rapport ou de relações amigáveis e,
neste segmento, parecem sinalizar que, ou Carlos não leva o tópico religiosidade tão a
sério quanto Mercedes, ou pensa ser ele pesado e tenta suavizá-lo. É a presença da
confiança, entretanto, que torna certos tipos de language play e outros comportamentos
lingüísticos e extralingüísticos parecerem aceitáveis (e mesmo desejáveis). No exemplo
em questão, se não existisse confiança, a brincadeira feita por Carlos com a palavra
criatura poderia ser erroneamente interpretada por Mercedes e gerar uma situação
conflituosa.
93
O fragmento seguinte (linhas 17-31), porém, tem um caráter extremamente
polêmico e nele ocorrem vários desacordos e mal-entendidos. Mercedes interpreta de
maneira equivocada as pistas de contextualização dadas por Carlos (no caso uma
escolha lexical e sintática). Quando ele diz: “...sí, pero en cuanto a las creencias mías---
son--- muy distintas a las tuyas.” (linhas 19-20), Carlos queria dizer que ele não é tão religioso
quanto Mercedes. Esta, porém, interpreta exatamente o contrário, isto é, que ele pensa que ela
não é uma pessoa religiosa. As falhas de comunicação desse tipo levam a julgamentos
errôneos sobre a intenção do falante.
17 18
Mercedes -No sé, ¿no te pasa a vos--- conmoverte frente a la obra del--- Creador?
19 20
Carlos -Sí. Bueno, mirá--- sí --- sí, pero en cuanto a las creencias mías--- son--- muy distintas a las tuyas.
21 Mercedes -¿Por qué?
22 Carlos -No, porque vos sos una ... sos... sos una...
23 24
Mercedes -No no, yo tengo una educación del colegio religioso, ¿viste?, que te... te... te...
25 Carlos -Claro. En cambio yo no. De manera que...
26 Mercedes -Pero no sos ateo.
27 Carlos -No, ateo no soy, no.
28 Mercedes -Pero podés creer que sos.
29 30 31
Carlos -Eh... no soy no; no soy ateo y la prueba es que... esté... recibí la bendición del Santo Padre por segunda vez.
Carlos afirma (linhas 19-20) que suas crenças são muito diferentes das de sua
amiga Mercedes. Esta pergunta o porquê e Carlos (linha 22) tenta explicar-se, não
conseguindo, porém, finalizar seu argumento. Após várias hesitações de Carlos,
Mercedes responde (linhas 23-24) com uma asserção direta (“No no, yo tengo una
educación del colegio religioso, ¿viste?”), negando aquilo que ela acreditou que Carlos
diria, ou seja, ela pensava que Carlos duvidava de sua religiosidade, e isso, para ela, era
uma ofensa, uma ameaça a sua face, um FTA (face threating act).
Note-se que essa era uma pressuposição equivocada por parte de Mercedes, pois
Carlos responde (linha 25): “Claro. En cambio yo no.”. Em seguida, Mercedes indaga
de Carlos se ele é ateu e ele responde categórico (linha 27): “No, ateo no soy, no.”. Ela,
porém, opta por divergir de seu interlocutor, afirmando (linha 28): “Pero podés creer
que sos.”, desferindo uma ameaça (FTA) à face positiva de Carlos, o que faz com que
94
este responda de forma direta, categória e enfática, lançando mão, inclusive, além da
negação enfática, do artifício de acrescentar argumentos que reforcem sua posição
(linhas 29-31): “Eh... no soy no; no soy ateo y la prueba es que... esté... recibí la
bendición del Santo Padre por segunda vez.” Há uma pista de contextualização
realizada por Carlos para dar autenticidade a seus argumentos, quando ele afirma: “...y
la prueba es que...”.
Observe-se, por todo o segmento acima (linhas 1-31), a orientação de Carlos no
sentido de manutenção do rapport da relação. Mercedes, por sua vez, faz uma afirmação
(linha 28) que está mais orientada no sentido de questionamento de rapport, uma vez
que ela afirma sobre seu interlocutor algo que ele mesmo havia acabado de negar.
26 Mercedes -Pero no sos ateo.
27 Carlos -No, ateo no soy, no.
28 Mercedes -Pero podés creer que sos.
No fragmento final deste segmento (linhas 32-44) surge uma nova polêmica.
Após Mercedes tentar explicar a diferença entre religiosidade e fé (linhas 32-35), Carlos
faz indagações que questionam a validade dos argumentos de Mercedes (linhas 36-37),
introduzindo a dúvida. Mercedes contra-argumenta (linha 38) e Carlos, então, sustenta a
polêmica ao afirmar (linhas 39-40): “Ah, entonces yo debo ser... debo... Claro, si, si; si,
yo soy sordo.”, para justificar sua suposta falta de fé.
32 33 34 35
Mercedes -Claro. Bueno, el otro día el padre L. explicaba, ¿no? que la religiosidad--- es una creación del hombre, lo que te viene de Dios es la fe--- que es diferente, ¿no es cierto?
36 37
Carlos -Claro. ¿Y vendrá de Dios? Porque si viniera de Dios todos tendrían fe.
38 Mercedes -Sí, claro; pero a veces hay quien es más sordo.
39 40
Carlos -Ah, entonces yo debo ser... debo... Claro, sí sí; sí, yo soy sordo.
41 42 43
Mercedes -Me parece que nos estamos metiendo en un tema teológico que conviene salir, ¿eh?, para uno más frívolo, ¿qué te parece? [risas] ¿No has estado en el cine últimamente?
44 Carlos -No.
Mercedes, então, propõe a troca do tema da conversa (linhas 41-43), ao perceber
que o assunto, extremamente polêmico, está gerando um conflito, conflito esse que eles
não estão conseguindo gerenciar de forma satisfatória (não ocorre atenuação /
95
minimização das asserções). Em conseqüência, e com o intuito de manutenção do
rapport da relação, Carlos aceita a proposta de Mercedes, e eles abandonam o tópico e
trocam o tema da conversa.
41 42 43
Mercedes -Me parece que nos estamos metiendo en un tema teológico que conviene salir, ¿eh?, para uno más frívolo, ¿qué te parece? [risas] ¿No has estado en el cine últimamente?
44 Carlos -No.
5.1.2 Maximização de rapport Excerto 3 (diálogo 2): A maximização de rapport, neste segmento de fala, ocorre através do uso de
apelidos carinhosos como forma de tratamento, das repetições de parte do enunciado
do outro que geram um diálogo construído, do uso de diminutivos e de um segmento de
fala de narrativa.
A “base comum” (common ground) existente entre as interlocutoras faz com que
se produza envolvimento entre elas, resultado da visão de confiança tal qual a define
Thurén (1988, p.222), isto é, proximidade ou senso profundo de familiaridade.
01 02
Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?
03 Maura -Bueno.
04 Carmen -¿ Eh?
05 Maura -Contáme, mamita, contáme.
06 07 08 09 10 11 12
Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...
13 Maura -Vos lo conociste a Ulises.
14 15 16 17 18 19 20 21 22 23
Carmen -¿A Ulises lo conocías, sí? Bueno--- desde chico, siempre que se quería disfrazar, siempre agarraba una valijita chica que nosotros ... sacaba una cartera así, de esas valijitas redondas que usaban los médicos antiguamente, habrás visto algún dibujo vos, y él se ponía una galera de papá y decía: "Soy el doctor." Desde chico me acuerdo haberío visto siempre que quería ser médico él. Bueno, él tenía una paciencia bárbara. A la mañana temprano, cuando estábamos de vacaciones, en fin, que estaban ellos, porque yo en esa casa tenía cuatro
96
24 años, tres, así que no [ ...... 1
25 Maura -¿En Moreno era?
26 27 28 29
Carmen -En Moreno, sí. Frente a Bolívar, ahí donde está el Nacional ahora. Resulta que íbamos a la terraza- - la azotea, nos íbamos todos. Él llevaba una pava y tomábamos mate.
30 Maura -Ah.
31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47
Carmen -Nos servía el mate. Mirá, yo a los tres años tomando mate. Esté... y en la casa que en esa época todas las casas eran un piso alto nomás, por ahí, y más o menos vos podías pasar de una terraza a la de al lado--- porque, no tenían más que unas paredes bajitas que las separaban. Una altura de cincuenta centímetros había, así que se pasaba p@ encima, por ahí, y había... esté... en la misma cuadra, pero a la vuelta de '¡a casa nuestra, había un almacén por mayor--- muy grande, de los de R., que ahora no ... no sé si existen ellos porque creo que se han muerto todos, pero entonces era una firma muy importante. Y tenían en el local, yo me acuerdo haber pasado por ahí y haber visto, tenían- - - los locales grandes todo... todo el... las mercaderías, las latas, todas las cosas colocadas, y en los techos hacían como una especie de... como una pirámide de ladrillos para arriba, como un hueco, yo no sé para qué sería eso. Era como un hueco.
48 Maura -¿ Qué hab ... qué había adentro?
49 50 51 52 53 54
Carmen -No sé, eran en la........................................los techos eran así, formando esa especie de hueco que [1 una pirámide, formaba como una pirámide para arriba. Esas pirámides sob... sobresalían en la terraza, ¿sabés?, y eran todo de esos ladrillos colorados--- de esos mosaicos colorados.
55 56
Maura - [ 1 sería [ 1 el humo de la cocina. Una especie de [
57 58 59
Carmen -No no, si era en el salón grande, donde estaban todas las mercaderías, donde vendían, que era almacén por mayor.
60 Maura -Entonces no sé qué sería.
61 62 63
Carmen -No sé para qué sería. Y sería... era un galpón grande. Lo habrían hecho de esa forma. No sé si tendría a lo mejor alguna rejilla, tender... posiblemente...
64 Maura -Para ventilación puede ser. Para ventilación.
65 66 67 68 69 70 71 72 73
Carmen -Para ventilación pud... eh... podría ser, ¿no?, que tuviera alguna rejilla. Yo no me acuerdo de eso, de la rejilla. Lo que me acuerdo que la... la terraza--- era toda medio ondulada--- porque era una terraza vieja, gastada. Y cuando llovía se formaban charcos ahí abajo de esas pirámides--- se formaban charcos de agua. ¿,Vos sabés 1 ... 1 la gracia nuestra? Resbalar de ahí arriba de la punta ................. 1 de las chicas se largaban, y Ema...
74 Maura -Como si fuera un tobogán.
75 76 77
Carmen -Sí--- como si fuera un tobogán. Ema se ponía la bombacha a la miseria, toda mojada. Todas un día al aire [ 1 Ulises nos llevaba allá arriba--- a la terraza
97
78 79
y nos contaba cuentos, nos leía cuentos. Sí, nos leía siempre cuentos. Yo me acuerdo de haber ido allá...
80 Maura -Siempre tuvo espíritu de solterón.
81 82 83 84
Carmen -Sí, era muy, muy bueno, pobre. Tenía mucha paciencia. Y... y me acuerdo una vez que... esté... se pusieron ... se puso, ¿quién fue?, Ulises se puso las botas de un ... de un...
85 Maura -Ah, sí. Bah, yo no me acuerdo, pero vos contaste.
86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 100 101 102
Carmen -Yo te conté, sí. Ulises, yo no sé cuántos años tendría. La misma casa cuatro, i cinco, diez... diez, once aflos tendría él, doce, no sé cuántos años. Se puso las botas de un cocinero que--- trabajaba en el almacén de la casa [ ] Había abajo un almacén. Entonces trabajaba este hombre allí, se puso esas botas del cocinero, después... se había puesto con los zapatos de él puestos. Claro, entrar... las calzó, cuando se las quería sacar no se podía. Y estábamos allá en la terraza, todos tirábamos de la cintura, unos de otros, para quererle sacar las botas. Y todos llorando porque no le podíamos sacar las botas. No se le podían sacar las botas. Al final qué sé yo quién vino a ayudar y le sacó la bota con el zapato y todo, y salieron. Pero ya creíamos que iba a estar con las botas para toda la vida.
Esse segmento começa com uma indagação (linhas 1-2) de Carmen a Maura
sobre se esta última deseja que aquela lhe conte um episódio ocorrido em sua infância
(de Carmen). É através do uso dos pronomes de tratamento em forma de apelidos
carinhosos (mamita, nena e mamá) que se percebe que as interlocutoras são mãe
(Carmen) e filha (Maura). O uso desses pronomes (linhas 5, 6 e 7), que denotam
intimidade e afetividade, além do uso dos diminutivos cuentito e chiquita (linhas 7 e 8),
geram um aumento / maximização de rapport. Confira-se:
01 02
Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?
03 Maura -Bueno.
04 Carmen -¿ Eh?
05 Maura -Contáme, mamita, contáme.
06 07 08 09 10 11 12
Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...
98
Tannen (1989) afirma que o envolvimento, além de ser marcado pela prosódia,
também ocorre simultaneamente com seqüências e estratégias de envolvimento, e cita,
entre outras, a repetição, o diálogo construído e a narrativa. A respeito da narrativa, essa
autora afirma que contar uma estória na conversa pode, por si só, ser uma estratégia de
envolvimento. Ela afirma também que, quando há um alto grau de envolvimento, as
pessoas tendem a contar suas próprias experiências pessoais e os sentimentos relativos a
esses eventos, que é justamente o que ocorre aqui.
A narrativa realizada por Carmen do episódio ocorrido em sua infância (linhas 6-
102), está permeada por perguntas feitas por Maura, que denotam interesse pelo
assunto. Confira-se:
25 Maura -¿En Moreno era?
26 27 28 29
Carmen -En Moreno, sí. Frente a Bolívar, ahí donde está el Nacional ahora. Resulta que íbamos a la terraza- - la azotea, nos íbamos todos. Él llevaba una pava y tomábamos mate.
48 Maura -¿ Qué hab ... qué había adentro?
49 50 51 52 53 54
Carmen -No sé, eran en la ....................................... los techos eran así, formando esa especie de hueco que [1 una pirámide, formaba como una pirámide para arriba. Esas pirámides sob... sobresalían en la terraza, ¿sabés?, y eran todo de esos ladrillos colorados--- de esos mosaicos colorados.
Ao longo da narrativa ocorre, também, um grande número de repetições, que
geram um diálogo co-construído. Essas repetições dão suporte e concordância às
afirmações do outro, aumentando o rapport existente e evidenciando que as
interlocutoras alinham-se como amigas, além de compartilharem lembranças e
conhecimento de mundo.
57 58 59
Carmen -No no, si era en el salón grande, donde estaban todas las mercaderías, donde vendían, que era almacén por mayor.
60 Maura -Entonces no sé qué sería.
61 62 63
Carmen -No sé para qué sería. Y sería... era un galpón grande. Lo habrían hecho de esa forma. No sé si tendría a lo mejor alguna rejilla, tender... posiblemente...
64 Maura -Para ventilación puede ser. Para ventilación.
65 66 67 68
Carmen -Para ventilación pud... eh... podría ser, ¿no?, que tuviera alguna rejilla. Yo no me acuerdo de eso, de la rejilla. Lo que me acuerdo que la... la terraza--- era toda medio ondulada--- porque era una terraza vieja,
99
69 70 71 72 73
gastada. Y cuando llovía se formaban charcos ahí abajo de esas pirámides--- se formaban charcos de agua. ¿,Vos sabés 1 ... 1 la gracia nuestra? Resbalar de ahí arriba de la punta ................. 1 de las chicas se largaban, y Ema...
74 Maura -Como si fuera un tobogán.
75 76 77 78 79
Carmen -Sí--- como si fuera un tobogán. Ema se ponía la bombacha a la miseria, toda mojada. Todas un día al aire [ 1 Ulises nos llevaba allá arriba--- a la terraza y nos contaba cuentos, nos leía cuentos. Sí, nos leía siempre cuentos. Yo me acuerdo de haber ido allá...
Vale salientar que, apesar de, no segmento de fala acima, a narradora do
episódio ser Carmen, é sempre Maura quem introduz os enunciados que serão aceitos e
repetidos por Carmen, o que evidencia o alto grau de envolvimento existente entre elas
e a colaboração e o interesse de Maura na narrativa. Maura, ao sugerir proposições para
as quais sua interlocutora não conseguia achar as palavras adequadas (linha 64) ou
resumir o dito por ela (linha 74), está colaborando para a elaboração de um diálogo
construído.
Repetições, diálogo construído e narrativa, três maneiras de gerar envolvimento
segundo Tannen (e, consequentemente, de maximizar rapport), ocorrem
simultaneamente neste segmento do diálogo 2, evidenciando o alto grau de
envolvimento existente entre as interlocutoras.
Excerto 4 (diálogo 2):
No segmento de fala a seguir o aumento / maximização de rapport ocorre
através, principalmente, do consenso de opiniões e das repetições que geram diálogo
construído. Mais uma vez, a “base comum” (common ground) existente entre as
interlocutoras resultou em envolvimento, fruto da visão de confiança tal qual a define
Thurén (1988, p.222)..
01 02 03 04
Carmen -Y Be... y Bety, ¿sabés lo que me pone en la carta? Dice que a Inés para una fiesta del colegio, que tenía que bailar un vals con trajes ... ¿qué di'o--- trajes antiguos?
05 06 07
Maura no sé, porque le pusieron el traje de torero para m bailar--- un vals. Ahora, lo habrá bailado con todo el vals, seguramente.
08 09 10
Carmen Eran chicas [ 1 con cualquier traje sería. Bueno, la cuestión que le pu ¿no le [ 1 trajes como antiguos o trajes raros? [ 1 algo así.
100
11 Maura -Sí, con trajes antiguos, trajes raros, sí.
12 13 14
Carmen -Sí. Entonces le puso... le hizo... eh... le puso el traje que ella usó cuando era chica--- que iba a baile espaiíol.
15 Maura -Pero lo habrá modificado un poco, a lo mejor.
16 17 18 19 20
Carmen -No sé, no creo, estaba muy bien. Dice que le quedaba espléndido. Y Cecilia tenía que bailar el cuándo, y entonces le puso un vestido que le había hecho ella a Inés hace dos años para otra fiesta del colegio--- y después un peinetón que era mío, dice [...............]
21 Maura -Sí, acá el peinetón grande [ ] de abuelita.
22 Carmen -Yo tenía dos peinet... no, mío, de disfraz.
23 24
Maura -[ ] uno de disfraz. Vos tenés una foto disfrazada con el peinetón, sí.
25 26 27
Carmen -Sí, que yo vivía disfrazada de chica. Me gustaba muchísimo vestirme así--- cantar en... canciones españolas y bailar la jota. Me gustaba muchísimo.
28 Maura -Es una artista.
29 30
Carmen -No, no soy una artista. Tengo vocación de artista, pero no soy artista.
31 Maura -Mhm.
32 33
Carmen -No, en serio que me gustaba muchísimo. Me gustaba mucho cantar y bailar.
34 35 36
Maura -Yo sí, yo también bailaba ciiando... cuando era chica me... pre... pretendieron enseñarme a bailar baile... baile español y clásico.
37 Carmen -Bailes clásicos eran.
38 39
Maura -Pero iba [ ] a danzas clásicas. Claro--- yo era gorda y Bety era muy flaca y parecían ... ¿cómo decían los
40 41 42
Carmen -No sé. No [....................] ¿ Pero y después cuando venía acá el profesor a hacerle hacer gimnasia rítmica a casa?
43 Maura -Aquél perfumado, sí.
44 45
Carmen -¡Qué risa! Mirá que nos hemos divertido, ¿eh? La hemos pasado muy bien tanta ge... tanta gente.
A conversa começa com Carmen relatando (linhas 1-4) o recebimento de uma
carta enviada por uma pessoa chamada Bety, e esse fato evidencia o conhecimento de
mundo compartilhado pelas falantes, pois não se torna necessário explicar para Maura
quem é Bety.
A continuação (linhas 19-27), ao comentar sobre as roupas antigas usadas por
Carmen quando era criança, as falantes repetem parte do enunciado uma da outra (como
“de disfraz”) e Carmen, após Maura dizer “Vos tenés una foto disfrazada con el
peinetón, sí.”, assevera que é verdade que ela adorava se fantasiar – “Sí, que yo vivia
disfrazada de chica.” – numa seqüência de falas colaborativas que denotam o
conhecimento de mundo compartilhado por elas.
101
16 17 18 19 20
Carmen -No sé, no creo, estaba muy bien. Dice que le quedaba espléndido. Y Cecilia tenía que bailar el cuándo, y entonces le puso un vestido que le había hecho ella a Inés hace dos años para otra fiesta del colegio--- y después un peinetón que era mío, dice [...............]
21 Maura -Sí, acá el peinetón grande [ ] de abuelita.
22 Carmen -Yo tenía dos peinet... no, mío, de disfraz.
23 24
Maura -[ ] uno de disfraz. Vos tenés una foto disfrazada con el peinetón, sí.
25 26 27
Carmen -Sí, que yo vivía disfrazada de chica. Me gustaba muchísimo vestirme así--- cantar en... canciones españolas y bailar la jota. Me gustaba muchísimo.
28 Maura -Es una artista. (elogio)
29 30
Carmen -No, no soy una artista. Tengo vocación de artista, pero no soy artista. (estratégia de modéstia)
31 Maura -Mhm.
Note-se, em seguida, o par adjacente composto por elogio / recusa de elogio
(linhas 28-30). Maura faz um elogio à Carmen (“es una artista)”, que o recusa,
lançando mão da estratégia de modéstia.
Mais adiante (linhas 40-45), ocorre uma simbiose de idéias, o que denota a
perfeita sintonia existente entre as falantes, que compartilham avaliações e pontos de
vista comuns:
40 41 42
Carmen -No sé. No [....................] ¿ Pero y después cuando venía acá el profesor a hacerle hacer gimnasia rítmica a casa?
43 Maura -Aquél perfumado, sí.
44 45
Carmen -¡Qué risa! Mirá que nos hemos divertido, ¿eh? La hemos pasado muy bien tanta ge... tanta gente.
Excerto 5 (diálogo 3):
O aumento / maximização de rapport no excerto a seguir foi realizado,
preponderantemente, através da utilização de elogios.
01 Mercedes -Ah, ¿Pero vos vivías cuando él murió?
02 Carlos -Sí, mi abuelo murió en el año cinco.
03
Mercedes -¿Y vos de cuántos años es...?, si no es indiscreto.
04 Carlos -Yo soy del cuatro. [risas]
05 06
Mercedes -Estas cosas no se preguntan aunque sean hombres, ¿no es cierto ?
07 Carlos -De... de los... esté...
102
08 Outra voz
-Es joven.
09 Carlos -¿Eh?
10 Mercedes -Joven.
11 12
Carlos -Bueno, yo creo que--- la juventud se lleva en el espíritu, ¿no?
13 Mercedes -Claro, sí.
14 15
Carlos -Es una frase ya hecha, pero es la verdad. Yo... yo tengo compañeros míos de curso...
16 17 18
Mercedes -Bueno, yo hasta que me di cuenta que tenía el corazón enfermo de tanto amar, no sabía que era una persona grande.
19 20
Carlos -Pero vos sos una... vos sos una chica--- una chica agrandada en cuanto a... a algo...
21 22 23 24
Mercedes -Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad. Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía hasta que t... t... tuvieron que hacerme--- los análisis que me hacés.
25 Carlos -Pero... bueno, pero--- ni la representás.
26 Mercedes -Sí, la represento. Siendo una abuela...
27 Carlos -No la representas. Bueno, lo de abuela...
28 Mercedes -¿Eh?
29 30
Carlos -Eso no tiene importancia. Lo de abuela no tiene importancia para los años.
31 Mercedes -¿Te parece? ¡Ay, sí! ¿Sabés qué?, las arrugas.
32 Carlos -¡Oh, las arrugas!
33 Mercedes -Las arrugas porque--- después el cuerpo no.
34
Carlos -¿,Qué arrugas? ¿las arrugas de qué? ¿de la piel? No.
Neste segmento ocorre um pseudo-conflito (linhas 16-34), isto é, o que parece
ser uma discordância na realidade não o é, pois Mercedes, na verdade, compartilha a
opinião de Carlos. O tema em questão é se Mercedes aparenta a idade que tem, e se ela
se sente como uma pessoa idosa.
Como se comprova através das falas de Mercedes no trecho abaixo, ela não se
sente uma pessoa idosa (cf. linhas 16-18 e 21-24): “[...] no sabía que era una persona
grande”; “Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía...“.
Também se verifica que Mercedes concorda com a opinião de Carlos sobre ela não
aparentar a idade que tem uma vez que, após o elogio feito por este (linhas 19-20), ela
responde (linha 21): “Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad.”
103
16 17 18
Mercedes -Bueno, yo hasta que me di cuenta que tenía el corazón enfermo de tanto amar, no sabía que era una persona grande.
19 20
Carlos -Pero vos sos una... vos sos una chica--- una chica agrandada en cuanto a... a algo...
21 22 23 24
Mercedes -Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad. Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía hasta que t... t... tuvieron que hacerme--- los análisis que me hacés.
25 Carlos -Pero... bueno, pero--- ni la representás.
O tópico “idade: juventude / velhice” é gerenciado através do uso de elogios,
por parte de Carlos, direcionados a sua amiga Mercedes (linhas 19-20, 25, 27, 29-30,
34). Esta, por sua vez, começa por aceitar os elogios (linha 21) para, em seguida,
recusá-los (linhas 26, 31, 33), lançando mão, inclusive, da estratégia de modéstia (linha
26): “Sí, la represento. Siendo una abuela...”. Isto se dá através de uma série de pares
adjacentes que proporcionam enquadres de interpretação compostos, na primeira parte,
por elogios e, na segunda, por aceitação ou recusa.
16 17 18
Mercedes -Bueno, yo hasta que me di cuenta que tenía el corazón enfermo de tanto amar, no sabía que era una persona grande.
19 20
Carlos -Pero vos sos una... vos sos una chica--- una chica agrandada en cuanto a... a algo... (elogio)
21 22 23 24
Mercedes -Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad. (aceitação do elogio) Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía hasta que t... t... tuvieron que hacerme--- los análisis que me hacés.
25 Carlos -Pero... bueno, pero--- ni la representás. (elogio)
26 Mercedes -Sí, la represento. Siendo una abuela... (recusa elogio)
27 Carlos -No la representas. Bueno, lo de abuela... (elogio)
28 Mercedes -¿Eh?
29 30
Carlos -Eso no tiene importancia. Lo de abuela no tiene importancia para los años. (elogio)
31
Mercedes -¿Te parece? ¡Ay, sí! ¿Sabés qué?, las arrugas. (pedido de confirmação do elogio)
32 Carlos -¡Oh, las arrugas!
33 Mercedes -Las arrugas porque--- después el cuerpo no.
34 Carlos -¿,Qué arrugas? ¿las arrugas de qué? ¿de la piel? No. (elogio)
A Análise da Conversa mostrou que há linhas de ação preferidas, isto é, aquilo
que é considerado normal ou esperado em qualquer dada situação. Porém, quando a
organização de preferência precisa dar conta, por exemplo, dos elogios, surge a questão:
elogios: aceitação ou recusa?
104
Segundo Duranti (1996), os elogios são uma categoria à parte, pois, ao mesmo
tempo em que expressam aprovação, eles criam um problema para o ouvinte para o qual
o elogio é endereçado. O problema seria um conflito entre os dois princípios gerais da
interação, que são: a preferência pela concordância e a despreferência pelo auto-elogio.
O segmento acima (linhas 16-34) começa com Carlos elogiando sua amiga
Mercedes (linhas 19-20), que aceita o elogio (linha 21). Mercedes, ao aceitá-lo, escolhe
a ação preferida de concordância com o interlocutor, ao mesmo tempo em que pratica a
atividade despreferida do auto-elogio.
Carlos prossegue com os elogios a Mercedes (linha 25), ao dizer que ela não
aparenta a idade que tem. Mercedes, por sua vez, recusa o elogio (linha 26). Então
Carlos reafirma sua opinião: “No la representas.” (linhas 27). Mercedes, agora,
pratica ação inversa àquela por ela praticada anteriormente, isto é, ela rejeita os elogios
de Carlos e, assim, escolhe a ação despreferida de discordância com o interlocutor, ao
mesmo tempo em que se alinha com a estratégia de recusa aos elogios.
Carlos (linhas 29-30) prossegue com os argumentos que sustentam sua opinião
anteriormente exposta, isto é, de que Mercedes não é uma representante das pessoas de
sua idade. Mercedes (linha 31), então, rejeita essa afirmação com o contra-argumento:
“Sabés que? las arrugas.”, ao que Carlos responde com a divertida sentença (linha 32):
“Oh, las arrugas!” (“Oh, as rugas!”). Mercedes (linha 33) prossegue sua contra-
argumentação, que é novamente rebatida por Carlos (linha 34).
Excerto 6 (diálogo 3): Esse segmento evidencia a paixão que os interlocutores compartilham por
viagens, sendo um exemplo típico de diálogo co-construído, através de repetições de
parte da fala do interlocutor e de pressuposições que se confirmam, evidenciando o alto
grau de envolvimento existente.
Essas estratégias citadas, destinadas à maximização de rapport, evidenciam que
os participantes possuem pontos de vista e avaliações comuns e que compartilham
lembranças e conhecimento de mundo.
105
01 02
Carlos -Bueno, hoy es... hoy en la mesa estábamos hablando de algo muy agradable.
03 Mercedes -¿Del viaje?
04 Carlos -De los viajes--- sí.
05 Mercedes -¡Ah, qué interesante! Yo dejo cualquier cosa por viajar.
06 Carlos -Porque los viajes son--- apasionantes, ¿no?
07 08
Mercedes -Ah, sí. Yo prefiero un... ése es un--- lujo que no sé si es lujo.
09 Carlos -No, yo tampoco.
10 11 12 13
Mercedes -Pero a cualquier cosa, a las pieles--- a... incluso a tener más comodidades en la casa. Más de las que tengo no lo... no... no... no... no las preciso. En fin--- uno siempre por el gusto estético, ¿no es cierto?
14 Carlos -Sí, aspira a más, ¿mm?
15 Mercedes -Sí, siempre uno aspira a tener una cosa
16 Carlos -Bueno, dentro ... dentro de las comodidades que...
17 Mercedes -Ah, sí, es auténtico.
18 Carlos -Pero el viajar a mí también... a mí--- me encanta.
19 20
Mercedes -Yo creo que es acercarse a la historia de los pueblos, ¿no es cierto?, y de los hombres, ¿no?
21 Carlos -Ah, sí; ah, sí. Sí, retroceder así...
22 Mercedes -Ahora, me canso mucho yo, porque yo--- us... tilizo...
23 Carlos -Cansás tu imaginación.
24 Mercedes -Sí. No sé si cansando la imaginación--- pero...
25 26
Carlos -Agotás la imaginación, ¿eh?, porque vos sí que retrocedés--- y querés... querés--- en el...
27 28
Mercedes -En el tiempo. Bueno, yo trato de--- reconstruir la época--- en que fueron...
29 Carlos -Te ubicás... te ubicás en aquel tiempo.
30 31 32
Mercedes -Exacto Me parece que es lo más interesante porque--- hoy sería ridículo, por ejemplo, concebir un---Versailles, ¿no?
33 34
Carlos -Ajá. Y sobre todo como está Versailles desmantelado, ¿no?
35 Mercedes -Sí, no. Bueno, Versa... claro.
36 37
Carlos -A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir por qué.
38 Mercedes -Porque no viste muebles, ¿verdad? Nada.
39 40
Carlos -Nada, nada. Salones. El salón de los espejos, salón grande y después y después...
41 Mercedes -Claro.[.......] magnífico, ¿no?
42 Carlos -Ah, sí. Magnífico.
43 Mercedes -Grandioso.
44 45
Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.
46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?
106
47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...
48 Mercedes -El mobiliario.
49 Carlos -Sí, el mobiliario.
50 Mercedes -¿Conocés Malmaison?
51 Carlos -No, no no, no.
52 53 54 55 56
Mercedes -Y ya esté... está bastante ma... acom... Bueno, vos sabés que en Versailles como fue donde ejecutaron, la [sic] sacaron presos a los reyes... eh... fue el último momento de ellos, tiraron todo por las ventanas, quemaron. Fue el incendio del populacho, ¿no? Es por eso.
57 58 59
Carlos -Ajá. Y qué raro que... eh... los demás, Fontainebleau... yo al que no he ido es al Petit Trianon y al gran... al gran...
60 Mercedes -No, no tiene gran cosa. No no.
61 Carlos -¿,No hay nada?
62 63 64 65
Mercedes -Sí, bueno, en--- el Grand Trianon creo que reside el gobierno de Francia, ¿no? Yo no lo pude--- Visitar porque había ese día que fui--- una [sic] gran almuerzo de De Gaulle.
66 Carlos -¿Y está cerquita de las... de...
67 Mercedes -De París.
68 Carlos -...de Versailles? Creo, ¿no? Sí sí, creo que...
69 70
Mercedes -Sí, de... sí, camino de Versailles, ¿no? La Malmaison sí--- que era la casa de ella, ¿no?
71 Carlos -Sí, si. Yo ésa tampoco la vi, pero ...
72 Mercedes -Esté... es bonita. Es una casa chica. Bonita es.
73 Carlos -¿Y está también--- bien amueblada así?
74 75 76
Mercedes -Sí, sí, sí. Sí, está sí. Está... está bien amueblada. Está... está más vivida. Se salvó del incendio, ¿no es cierto?
77 Carlos -Ajá.
No segmento abaixo, Mercedes (linha 38) arrisca uma pressuposição de qual
seria o motivo da afirmação de Carlos (linhas 36-37):“A mí me... a mí Versailles me
decepcionó. Te voy a decir por qué.”, pressuposição essa que se confirma (linhas 39-
40). Logo em seguida, Mercedes novamente (linhas 46-48) arrisca outra pressuposição,
tentando encontrar uma resposta para a asserção de Carlos (linhas 44-45): “En cambio
Fontainebleau me gustó.”, que, mais uma vez, se confirma (linhas 47-49).
30 31 32
Mercedes -Exacto Me parece que es lo más interesante porque--- hoy sería ridículo, por ejemplo, concebir un---Versailles, ¿no?
33 34
Carlos -Ajá. Y sobre todo como está Versailles desmantelado, ¿no?
107
35 Mercedes -Sí, no. Bueno, Versa... claro.
36 37
Carlos -A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir por qué.
38 Mercedes -Porque no viste muebles, ¿verdad? Nada.
39 40
Carlos -Nada, nada. Salones. El salón de los espejos, salón grande y después y después...
41 Mercedes -Claro.[.......] magnífico, ¿no?
42 Carlos -Ah, sí. Magnífico.
43 Mercedes -Grandioso.
44 45
Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.
46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?
47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...
48 Mercedes -El mobiliario.
49 Carlos -Sí, el mobiliario.
Esse é mais um exemplo de diálogo co-construído, no qual ocorrem vários
turnos de consenso entre os interlocutores, com pressuposições que se confirmam
(linhas 39-40, 47-49), repetição de parte do enunciado do interlocutor (linhas 41-42, 48-
49 e 73-74) e uso de adjetivação avaliativa (linhas 41-43).
Nos segmentos transcritos abaixo ocorrem repetições de parte do enunciado do
interlocutor (linhas 48-49 e 73-74), evidenciando que os falantes possuem avaliações e
pontos de vista comuns, compartilhados. Essas repetições têm função de concordância,
de acordo.
44 45
Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.
46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?
47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...
48 Mercedes -El mobiliario.
49 Carlos -Sí, el mobiliario.
72 Mercedes -Esté... es bonita. Es una casa chica. Bonita es.
73 Carlos -¿Y está también--- bien amueblada así?
74 75 76
Mercedes -Sí, sí, sí. Sí, está sí. Está... está bien amueblada. Está... está más vivida. Se salvó del incendio, ¿no es cierto?
77 Carlos -Ajá.
108
5.2 Uso das micro-estratégias de rapport
Nesta segunda parte procedemos à amostragem das micro-estratégias
encontradas em nossos dados que estão dirigidas à manutenção de rapport, além
daquelas destinadas à maximização de rapport.
5.2.1 Micro estratégias destinadas à MANUTENÇÃO de rapport: gerenciamento / mitigação de conflito Excerto 1 (diálogo 2):
O tópico do exemplo a seguir versa sobre comentários sobre vizinhos (a
coloquialmente denominada fofoca9). Nele, as interlocutoras possuem opiniões
discordantes, que não chegam a gerar conflito entre elas pois ocorre um gerenciamento
adequado do rapport, com a produção de opiniões atenuadas.
As micro estratégias utilizadas, que serão analisadas segundo o uso e a
contribuição na orientação do gerenciamento de rapport, foram:
(a) marcadores conversacionais de rejeição (ou disclaimers) e de distanciamento;
(b) formas de auto-correção.
01 Carmen -¿Eh?
02 Maura -¿ Qué le pasó?
03 04
Carmen -Y nada. Le ... le dan muchísimo trabajo los chicos para estudiar. El otro día te encontraste con ella abajo, ¿no?
05 06 07 08 09
Maura -No ... eh ... eh ... la otra noche la encontré. Había ido a comprar el diario el chico, ella estaba esperando en la puerta porque dice que el chico no se duerme si no lee el diario antes, y ella no se lo deja leer si no estudia. ¿En qué colegio está el ... ?
10 Carmen -Está acá en el Carlos Pellegrini. Aquí en Charcas en ...
11 12
Maura -Ah, Carlos Pellegrini el chico. Pero es un monstruo ese chico.
13 Carmen - [...........
14 Maura -Tiene cara... no tiene cara de r... una cara rara.
15 16
Carmen - No, a mí no me parece feo. No es feo ese chico. El más chico es más feo.
17 Maura -¿ El más chico? Tiene una cabeza de melón así grande.
9 Fofoca (popular): mexerico, intriga, bisbilhotice (Novo Dicionário Aurélio, 1986).
109
18 19
Carmen -Ah, bueno, puede ser que la cabeza sea grande, pero la cara no es feo.
20 Maura -Ah...
21 Carmen -En cambio el mayor tiene una nariz de .... 1 - - 1
22 23
Maura -¿El mayor... el mayor se lla... el mayor... el mayor se llama Adrián?
24 Carmen -No, Adrián deben ser los chicos del primer piso.
Neste trecho (linhas 1-24) as interlocutoras conversam sobre crianças que vivem
na vizinhança, começando pelo tópico colégio e estudos. Há um segmento em que elas
criticam a aparência de uma criança (linhas 11-21), no qual Maura começa por dizer que
a criança “...es un monstruo” (linhas 11-12), para, em sua fala seguinte (linha 14),
fazer uma auto-correção, atenuando e dizendo que a criança possui um rosto pouco
comum, diferente, singular: “...una cara rara”.
10 Carmen -Está acá en el Carlos Pellegrini. Aquí en Charcas en ...
11 12
Maura -Ah, Carlos Pellegrini el chico. Pero es un monstruo ese chico.
13 Carmen - [...........
14 Maura -Tiene cara... no tiene cara de r... una cara rara.
15 16
Carmen - No, a mí no me parece feo. No es feo ese chico. El más chico es más feo.
17 Maura -¿ El más chico? Tiene una cabeza de melón así grande.
18 19
Carmen -Ah, bueno, puede ser que la cabeza sea grande, pero la cara no es feo.
20 Maura -Ah...
21 Carmen -En cambio el mayor tiene una nariz de .... 1 - - 1
O trecho acima gera uma discordância entre elas, com Carmen dizendo (linha
15) que, na opinião dela, a criança não é feia. A outra criança menor (eles devem ser
irmãos) sim que, na opinião dela, é feia. Carmen utiliza a estrutura “a mí no me parece
feo”10.
A resposta de Maura é “¿El más chico?”(o menor?), e prossegue com uma
afirmação (linha 17) que gera um segmento de fala dúbio na conversação. Ela diz:
“Tiene una cabeza de melón así grande.”, e não se sabe se ela está se referindo à criança
menor ou à maior. Carmen não concorda com a opinião de Maura (linhas 18-19): “Ah,
bueno, puede ser que la cabeza sea grande, pero la cara no es feo.”, e por essa
10 Segundo Consuelo Alfaro Lagorio, essa é uma seqüência formulaica, fazendo o verbo parecer parte do grupo de dativos ‘canônicos’ que em espanhol são recorrentes e produtivos. Esse verbo possui uma regência obrigatória me com a variação a mi (opinião manifesta durante defesa desta tese).
110
afirmação deduz-se que Maura se referia à criança maior, pois Carmen concorda em
parte com Maura, mas diz novamente que a criança não é feia. Na opinião dela, a
menor é mais feia que a maior.
As falas discordantes que ocorrem nesse segmento de fala não chegam a gerar
um conflito entre as interlocutoras, uma vez que há um gerenciamento adequado do
rapport, com as falantes produzindo opiniões atenuadas, migitadas. A discordância com
relação à aparência das crianças, portanto, não chega a comprometer o bom andamento
da conversa, que prossegue normalmente, voltando ao tópico colégio e estudos.
Excerto 2 (diálogo 1): As micro estratégias utilizadas no trecho abaixo foram:
(a) fazer perguntas ou pedidos de esclarecimento (pedir explicações) (em negrito)
(b) oferecer razões / dar explicações (tipo escusa / justificativa) (em negrito e itálico)
(c) estratégia de modéstia e/ou auto-depreciação (em negrito e itálico)
01 02
Tereza -Yo creía--- que vos habías dejado la enseñanza del alemán.
03 04 05 06 07 08 09 10 11 12
Marta -Pero--- es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me da vergüenza. Tanto, que esta chica me dice: "i Pero Marta, qué lecciones largas, pero qué barbaridad! Pero no me cobra más que... eh... lo que me ha cobrado el año pasado por una hora." "No, hija", le digo yo. Son lecciones muy poco académicas, en las que yo recurro al diccionario, y en las que yo consulto la gramática en presencia de ella. Pero yo creo que ella prefiere--- que haga así un trabajo de sinceridad--- y no que me presentara como una gran profesora no siéndolo.
13 14
Tereza -¿Y por qué te has olvidado de una de tus alumnas--- que has dejado completamente a un lado?
15 16
Marta -Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá--- se lo pasa paseando...
17 18 19
Tereza -Como definición me parece muy bonito, porque está escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.
20 Marta -Yo creo que sí. Tengo… tengo otra amiga ...
21 22
Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...
23 Marta -No, es que...
24 25
Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.
26 27
Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."
28 Tereza -No, ella va por necesidad también.
111
29 30 31
Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...
Tereza (linhas 1-2) faz, através de indiretividade, um questionamento a sua amiga
Marta, que responde (linhas 3-12) com estratégias de dar explicações e/ou razões (tipo
escusa / justificativa), que têm como finalidade a manuteção do rapport da relação.
Note-se que ela o faz ao longo de 10 linhas, o que demonstra sua grande preocupação
com a opinião / avaliação de sua amiga Tereza.
Marta também recorre (linhas 3-4 e 11-12), ao longo de suas justificativas, à
estratégia de modéstia (ou de auto-depreciação), ao dizer que ela não pode ser
considerada professora de alemão. Ela também (linhas 4-5) lança mão de argumentos
(através da fala de sua aluna) que corroborem o que ela deseja comprovar, isto é, que ela
não é realmente professora de alemão.
Confira-se (em negrito e negrito com itálico):
03 04 05 06 07 08 09 10 11 12
Marta -Pero--- es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me da vergüenza. Tanto, que esta chica me dice: "i Pero Marta, qué lecciones largas, pero qué barbaridad! Pero no me cobra más que... eh... lo que me ha cobrado el año pasado por una hora." "No, hija", le digo yo. Son lecciones muy poco académicas, en las que yo recurro al diccionario, y en las que yo consulto la gramática en presencia de ella. Pero yo creo que ella prefiere--- que haga así un trabajo de sinceridad--- y no que me presentara como una gran profesora no siéndolo.
Novamente Tereza (linhas 13-14) pede explicações à Marta, questionando as que
esta havia dado anteriormente (isto é, porque Marta pode dar aulas para outra pessoa e
não para ela). Marta, mais uma vez (linhas 15-16), recorre às micro estratégias de
oferecer razões / explicações que, mais uma vez, não são aceitas por Tereza. Esta
(linhas 17-19) recorre à ironia para mostrar que não acredita nas razões dadas por
Marta. Confira-se:
13 14
Tereza -¿Y por qué te has olvidado de una de tus alumnas--- que has dejado completamente a un lado?
15 16
Marta -Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá--- se lo pasa paseando...
17 18 19
Tereza -Como definición me parece muy bonito, porque está escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.
20 Marta -Yo creo que sí. Tengo… tengo otra amiga ...
112
21 22
Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...
23 Marta -No, es que...
Marta (linhas 20 e 23) faz novas tentativas de explicação, interrompidas e rebatidas
por Tereza, que (linhas 21-22) reafirma sua posição dada anteriormente (linhas 1-2), isto
é, de que Marta não mais desejava dar aulas de alemão. A seguir, Tereza (linhas 24-25)
agrega argumentos que justificam o fato de ela estar tão aborrecida: as aulas de alemão
são, para ela, um benefício moral. Marta, porém, argumenta (linhas 26-27) que todas
dizem a mesma coisa, ao que Tereza (linha 28) rebate, dizendo que para a aluna de
Marta as aulas são uma necessidade de trabalho. Marta (linhas 29-31) se utiliza
novamente da micro estratégia de dar justificativas, dizendo: “... ahora tiene este
trabajo nuevo, pero el año pasado me decía...”.
24 25
Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.
26 27
Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."
28 Tereza -No, ella va por necesidad también.
29 30 31
Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...
A continuação, as interlocutoras chegam a um acordo com relação a Marta
voltar a dar aulas para Tereza, comprovando que todo o esforço de Marta no sentido de
valer-se de estratégias para manter o rapport da relação foi recompensado.
Excerto 3 (diálogo 1): No segmento abaixo Marta recorre à micro estratégia de pseudo-acordo
(concordar para em seguida discordar). Esta estratégia tem a finalidade de evitar a
discordância direta ao interlocutor, favorecendo, assim, a manutenção do rapport da
relação.
01 02 03 04 05 06 07 08 09
Marta -Mirá, vos le fuistes--- a enseñar el mecanismo de la puerta--- En materia de puertas lo más original, para mi modo de ver, es la que ha puesto--- Erwin Rubens en su casa. Vos tocás la campanilla--- y empieza un sonido musical- - - de varillas metálicas que se chocan entre sí; y así vos apretés el botón con fastidio, con apuro, con rabia, eso no sale de su ritmo--- y tenés--- que aguantarte que vengan a abrirte cuando les da la gana. No es lo mismo--- que cuando vos apretás el botón y con rabia le das y le das y le das.
113
10 Tereza -Sí.
11 12
Marta -Y yo le digo: "Mire, acá tiene uno que dejar todo malhumor. . . porque no hay caso; te contesta una musiquita.
13 Tereza -Porque es un sonido continuo, melódico, como una música.
14 15 16 17
Marta -Sí sí; no es --- continuo porque es s ... ensegmento de falacan unas cuatro o e... los cuatro o cinco caireles--y después--- se acaba; y vos volvés a tocar--- y vuelve otra vez a producirse lo mismo.
18 Tereza -Entonces hay que probar la paciencia--- del visitante.
A construção colaborativa feita por Tereza (linha 13) gera um pseudo-acordo
(linha 14) por parte de Marta, que recusa a afirmação de Tereza “…es un sonido
continuo,…”, dizendo: “Sí, sí; no es …continuo porque es …”. Marta discorda de
Tereza, porém, antes de fazer o reparo necessário (no es… continuo porque es…),
utiliza as partículas Sí, sí;. Deste modo ela primeiro concorda para depois discordar.
Com isso, ela evita a discordância direta a sua interlocutora.
Os motivos que levaram Marta a utilizar-se da estratégia de pseudo-acordo
foram: (i) o fato de sua interlocutora haver produzido uma fala colaborativa a sua
narrativa; e (ii) estar orientada no sentido de manutenção do rapport da relação.
Excerto 4 (diálogo 1): No segmento abaixo Marta lança mão da micro estratégia de concordância com
ressalva, para não quebrar a seqüência de falas colaborativas de Tereza e evitar que a
discordância direta gerasse algum tipo de desentendimento.
16 Tereza -Es una manera muy interesante de objetivar la gramática.
17 Marta -Claro.
18 Tereza -De hacerla objetiva...
19 20
Marta -Y de que los chicos aprendan; porque por regla general--- los chiquitos...
21 Tereza -. . y de participar en ella.
22 Marta -Claro, parece...
23 Tereza -Porque de otra manera es el libro y el niiío.
24 Marta -Sí.
25 26 27
Tereza -Y nada más que las pequeñas letras que él tiene que ir descifrando el significado; de la otra manera se crea un poco.
28 29 30
Marta -María Victoria también ha inventado juegos--- en que el chico tiene que hablar y el otro tiene que contestar, y así se acostumbran al... al diálogo.
31 Tereza -Al fin se ha llegado a mejorar la ense... la ped... la
114
32 metodología de la gramática.
33 34
Marta -Pero--- en este renglón y ese grupo de personas, porque yo creo que eso no está muy generalizado.
35 Tereza -No, creo que no.
Marta (linhas 33-34) utiliza-se da partícula pero e do marcador de atenuação
“yo creo que” para marcar que a opinião de Tereza (linhas 31-32) procede, porém não
de maneira generalizada: “Pero… en este renglón y ese grupo de personas, porque yo
creo que eso no está muy generalizado.”
Essas estratégias atenuadoras devem-se ao fato de Marta estar discordando de
sua interlocutora (atividade despreferida). Logo em seguida (linha 35) Tereza concorda
com o reparo feito: “No, creo que no.” A estratégia utilizada por Marta foi a da
concordância com ressalva, pois discordar abertamente e de forma direta do interlocutor
pode gerar conflito entre as partes, e costuma ser evitado quando o falante está
orientado para a manutenção do rapport da relação.
Excerto 5 (diálogo 3):
As micro estratégias utilizadas no segmento a seguir são:
(a) pressuposições (que se confirmam);
(b) adjetivação avaliativa.
30 31 32
Mercedes -Exacto Me parece que es lo más interesante porque--- hoy sería ridículo, por ejemplo, concebir un---Versailles, ¿no?
33 34
Carlos -Ajá. Y sobre todo como está Versailles desmantelado, ¿no?
35 Mercedes -Sí, no. Bueno, Versa... claro.
36 37
Carlos -A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir por qué.
38 Mercedes -Porque no viste muebles, ¿verdad? Nada.
39 40
Carlos -Nada, nada. Salones. El salón de los espejos, salón grande y después y después...
41 Mercedes -Claro.[.......] magnífico, ¿no?
42 Carlos -Ah, sí. Magnífico.
43 Mercedes -Grandioso.
44 45
Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.
46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?
47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...
115
48 Mercedes -El mobiliario.
49 Carlos -Sí, el mobiliario.
Mercedes (linha 38) faz uma pressuposição com relação à afirmação de Carlos
(linhas 36-37): “A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir
por qué.”, que se confirma (linha 39). Em seguida, há o uso de adjetivação avaliativa
(linhas 41-43). A continuação, Mercedes (linha 46) arrisca novamente uma
pressuposição com relação à afirmação de Carlos (linhas 44-45): “En cambio
Fontainebleau me gustó.”, pressuposição essa que se confirma (linhas 47-49).
Excerto 6 (diálogo 1):
As micro estratégias utilizadas no segmento a seguir são:
(a) pressuposições equivocadas (não se confirmam);
(b) demonstração de solidariedade.
57 58 59
Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me levanta- - - y además porque...
60 Marta -Te levanta de la cama.
61 Tereza -No puedo decirte...
62 Marta -Te levanta de la cama, ¿no?
63 64
Tereza -No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que es más importante.
65 66
Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que—estabas--- llena de obligaciones sociales.
No início do trecho acima, Tereza (linhas 57-58) demonstra solidariedade para
com sua amiga Marta, ao afirmar: “Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te
las he pedido,...”.
Em seguida, por dois turnos seguidos (linhas 60 e 62) Marta oferece o
complemento “Te levanta de la cama”, sendo, na segunda vez, corrigida por Tereza,
que responde fazendo a correção: “-No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que
es más importante.” (linhas 63-64).
Esse segmento de construção colaborativa (linhas 57-64) não é bem sucedido,
uma vez que a pressuposição feita por Marta sobre o motivo de as aulas de alemão
116
fazerem bem a sua amiga Tereza não correspondiam à realidade. Ao dizer “pero me
hubiera hecho bien porque me levanta…” (linha 58), Tereza não queria dizer, como
pressupôs Marta, que as aulas a levantariam da cama, mas sim que “... me levanta el
ánimo, que es más importante.” (linha 63-64). Pode-se dizer que o ocorrido foi uma
pressuposição de conhecimento compartilhado que estava equivocada.
Tereza, porém, ao recusar o complemento dado por sua amiga (que ela
decodifica em seu sentido literal, isto é, levantar-se da cama para ir à aula) pode
também ter-se equivocado, uma vez que sua interlocutora poderia estar falando em
sentido metafórico. Vale salientar que a correção de Tereza à pressuposição feita por
Marta não prejudica o rapport da relação, como se evidencia no turno seguinte (linhas
65-66), no qual Marta compreende os motivos de sua amiga e tenta chegar a um acordo
com ela.
5.2.2 Micro estratégias destinadas à MAXIMIZAÇÃO de rapport: maximização / aumento de acordo / compartilhamento
Segundo Brown e Levinson, os elogios são uma ameaça à face negativa, uma
vez que expressam desejo pelo objeto elogiado. Porém, segundo Kerbrat-Orecchioni,
sem negar que esse ato algumas vezes possui esse traço, um elogio é, em primeiro
lugar, um comportamento lisonjeiro para com a outra pessoa, antes de tudo uma anti-
ameaça, um FFA. Os elogios são estratégias de polidez positiva (ou modo de reforçar a
imagem do outro) diretas, que satisfazem os desejos de aprovação do outro, fazendo
parte, portanto, das estratégias de rapport.
Excerto 7 (diálogo 1):
As micro estratégias encontradas no segmento a seguir foram:
(a) elogios;
(b) estratégia de modéstia,
(c) formas de tratamento que demonstram carinho e relações afetivas;
(d) repetição colaborativa do enunciado do interlocutor;
(e) demonstração de solidariedade;
(f) procura de acordo.
117
01 02
Tereza -Ahora--- vas a tropezar con una dificultad que es mi pésima memoria. Yo no puedo memorizar.
03 04
Marta -¿Querés que te diga una cosa, Bebita? Yo creo que lo de la pésima memoria tuya es un. . . un leitmotiv que tenés.
05 Tereza -¿Un qué?
06 Marta -Leit-motiv: lo repetís pero no es verdad.
07 08
Tereza -Pero yo me pongo a estudiar un verbo, y lo estudio y me lo olvido a los pocos días.
09 10 11 12
Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.
13 Tereza -Pero los verbos los confundo.
14 Marta -¿El significado?
15 Tereza -No, confundo... confundo cuando la...
16 Marta -¿ La formación ?
17 Tereza -Las formaciones, sí.
18 Marta -¡Ah, no! que con la declinación...
19 Tereza -Los tiempos compuestos, el subjuntivo, todo eso.
20 21
Marta -Pero eso, hija, eso es muy humano porque son - - - endiablados los verbos.
22 Tereza -Ah, bueno. Entonces me consolás.
23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...
24 Tereza -Entonces empezamos el jueves.
25 26 27 28 29 30 31 32 33 34
Marta -Mirá, cuando yo me puse a estudiar italíano--- que me pareció que me iba a ser muy fácil, porque yo oigo hablar italiano a un conferencista o en el teatro y lo entiendo, cuando se trató de estudiarlo me encontré con que el--- punto verbos era poco menos que inaccesible para mí. No hay verbos regulares casi; casi ... cada verbo tiene una conjugación propia; y después hay un montón de palabritas chiquitas como en griego--- que en la traducción se pierden--- y que sin embargo, en italiano, le tienen que dar un matiz especial al ... al ... a la frase.
35 36
Tereza -Bueno, vamos a hacer así. Vamos entonces a empezar el lunes.
37 Marta -No, el jueves.
38 Tereza -El jueves.
39 Marta -El jueves.
40 Tereza -El jueves.
41 42
Marta -Bueno, muy bien. A mí me divierte también y también me obliga, me disciplina; me disciplina en muchos sentidos.
43 44
Tereza -Yo tengo mucho libro de lectura porque he comprado mucho texto, porque he leído bastante.
45 46
Marta -Tenés una enormidad: si cuando yo vi--todos los libros que tenías y que te los habías leído.
47 Tereza -Y que la mayor parte son leídos.
48 49
Marta -Por eso te digo, y comprendidos, que eso es muy importante.
118
50 Tereza -Sí. 51 52 53 54 55
Marta -Entonces yo no sé qué es mucho ... qué mucho es lo que te puedo enseñar; únicamente que aquí sin... eh... ¿te acordás que una vez--- fuimos a la Sociedad Hebraica--- a ver una exposición de códices--- y que vos fuistes hablando conmigo alemán durante varias cuadras?
56 Tereza -Sí, sí. 57 58
Marta -Y yo estaba pas... sorprendida. Nunca hubiera esperado que supieras tanto.
59 60 61
Tereza -Bueno, me alentás mucho. Vamos a hacer así. Vamos a hacer un rato de conversación, vos me corregirás las partes gramaticales.
62 Marta -Las que sepa.
63 64
Tereza -Y las que yo no sepa buscaremos en el libro, juntas, para disipar dudas.
65 66
Marta -Y leeremos y traduciremos el librito. Yo empezaré--- por repasarte... por repasarte una lección que yo sepa.
67 Tereza -Claro.
Esse segmento de fala segue com o assunto do anterior, que são as aulas de
alemão que Marta dará para Tereza. Tereza inicia fazendo uma auto-crítica (linhas 1-2)
a sua memória (estratégia de modéstia ou de auto-depreciação), crítica essa que é
rebatida por Marta nos turnos seguintes (linhas 3-4; 6; e 9-12), através do uso de
elogios.
Note-se o uso do dativo de interesse - Pero vos me has estudiado poesías de
memoria -, fenômeno amplamente estudado por Lavandera, que é um elemento de
reforço para os argumentos que estão sendo utilizados. Esse me, de natureza
pragmática, marca o grau máximo de envolvimento.
09 10 11 12
Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.
Marta também se utiliza (linha 3) de uma forma de endereçamento carinhosa
– um apelido no diminutivo, Bebita – como uma estratégia de reforço ao elogio feito, o
que demonstra relação de intimidade. Esse uso está inserido nas chamadas atividades
de language play (dentre as quais se incluem o uso de variações do primeiro nome,
como apelidos ou diminutivos).
01 02
Tereza -Ahora--- vas a tropezar con una dificultad que es mi pésima memoria. Yo no puedo memorizar.
03 04
Marta -¿Querés que te diga una cosa, Bebita? Yo creo que lo de la pésima memoria tuya es un. . . un leitmotiv que tenés.
119
05 Tereza -¿Un qué?
06 Marta -Leit-motiv: lo repetís pero no es verdad.
07 08
Tereza -Pero yo me pongo a estudiar un verbo, y lo estudio y me lo olvido a los pocos días.
Tereza, por sua vez, não aceita os elogios e recusa-os reiteradamente (linhas 7-
8 e 13). Marta, então, sustenta sua opinião e segue elogiando a boa memória da amiga
(como se constata nos turnos seguintes, linhas 9-12 e 20-21), porém agora ela
acrescenta argumentos que os defendem e justificam.
Note-se, também, (linhas 20 e 23) o vocativo carinhoso hija11, uso que denota
extrema cumplicidade, novamente uma estratégia inserida nas atividades de language
play. Finalmente (linha 22), Tereza se rende: “Ah, bueno. Entonces me consolás.”
Note-se uma mudança de enquadre interpretativo nesta fala de Tereza. Esta, após vários
elogios feitos por Marta, realinha o seu discurso, passando a aceitar os elogios feitos
pela amiga:
09 10 11 12
Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.
13 Tereza -Pero los verbos los confundo.
14 Marta -¿El significado?
15 Tereza -No, confundo... confundo cuando la...
16 Marta -¿ La formación ?
17 Tereza -Las formaciones, sí.
18 Marta -¡Ah, no! que con la declinación...
19 Tereza -Los tiempos compuestos, el subjuntivo, todo eso.
20 21
Marta -Pero eso, hija, eso es muy humano porque son - - - endiablados los verbos.
22 Tereza -Ah, bueno. Entonces me consolás.
23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...
Nos turnos seguintes (linhas 23 e 25-34), Marta tentará mostrar solidariedade
e compreensão para com Tereza, ao compartilhar com ela suas próprias dificuldades
quando de sua aprendizagem da língua italiana.
11 Segundo Consuelo Alfaro Lagorio, o que é relevante nessa forma é que se trata de uma marca não só de intimidade, mas de gênero, pois requer o traço [+feminino] tanto do enunciador como do co-enunciador (opinião manifesta durante defesa desta tese).
120
23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...
24 Tereza -Entonces empezamos el jueves.
25 26 27 28 29 30 31 32 33 34
Marta -Mirá, cuando yo me puse a estudiar italíano--- que me pareció que me iba a ser muy fácil, porque yo oigo hablar italiano a un conferencista o en el teatro y lo entiendo, cuando se trató de estudiarlo me encontré con que el--- punto verbos era poco menos que inaccesible para mí. No hay verbos regulares casi; casi ... cada verbo tiene una conjugación propia; y después hay un montón de palabritas chiquitas como en griego--- que en la traducción se pierden--- y que sin embargo, en italiano, le tienen que dar un matiz especial al ... al ... a la frase.
Finalmente (linhas 35-42), as amigas chegam a um acordo quanto ao dia da
semana em que ocorrerão as aulas (estratégia de procurar acordo). Primeiro, porém
(linhas 35-36), ocorre um equívoco por parte de Tereza, que é corrigido por Marta
(linha 37):
35 36
Tereza -Bueno, vamos a hacer así. Vamos entonces a empezar el lunes.
37 Marta -No, el jueves.
Em seguida, a repetição da expressão “El jueves” (linhas 38-40) torna-se
necessária como uma estratégia cuja finalidade é de reforço, com o intuito de desfazer-
se totalmente o equívoco ocorrido anteriormente.
35 36
Tereza -Bueno, vamos a hacer así. Vamos entonces a empezar el lunes.
37 Marta -No, el jueves.
38 Tereza -El jueves.
39 Marta -El jueves.
40 Tereza -El jueves.
41 42
Marta -Bueno, muy bien. A mí me divierte también y también me obliga, me disciplina; me disciplina en muchos sentidos.
Mais uma vez Marta faz (linhas 57-58) um FFA em forma de elogio à Tereza,
com relação a seu conhecimento de alemão, e Tereza (linha 59) o aceita:
57 58
Marta -Y yo estaba pas... sorprendida. Nunca hubiera esperado que supieras tanto.
59 60 61
Tereza -Bueno, me alentás mucho. Vamos a hacer así. Vamos a hacer un rato de conversación, vos me corregirás las partes gramaticales.
121
Excerto 8 (diálogo 2): Os principais recursos usados para construir / maximizar rapport são:
(a) construções conjuntas e colaborativas;
(b) repetições do enunciado do interlocutor (geram envolvimento);
(c) concordância com ressalva;
(d) auto-correção.
O tópico do segmento a seguir versa sobre comentários relacionados a parentes ou
amigos em comum. A visão de confiança (na visão de Thurén) é resultado da “base
comum” (common ground) existente entre as interlocutoras.
01 02 03 04 05 06 07 08
Carmen -Y es un trabajo cuando los chicos dan... mejor dicho, es una desesperación cuando los chicos dan trabajo para estudiar. Mirá--- Bety me escribe... era una risa la carta de Bety. Dice que... que Inés es de lo más burra para matemáticas--- no le gustan las matemáticas, no le gusta, y la vez pasada le estuvieron preguntando una cosa y no sabía. Y el padre le preguntó cuál era el... ¿cómo es?, el...
09 Maura -El múltiplo del...
10 Carmen -El múltiplo del gramo... de gramo, y dijo gramore.
11 Maura -Claro, porque le pareció que era algo más grande.
12 13 14 15 16
Carmen -¿Te das cuenta? Entonces le han tenido que tomar una maestra que va todas las tardes una hora. Y dice que va, y sí que está aprendiendo mucho. Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el colegio, conversa muchísimo.
17 Maura -Es ... es muy charlatana.
18 19 20
Carmen -Es muy charlatana y--- no presta atención. De manera que si no presta atención, las cosas que no le gustan [ 1 se aburre.
21 22 23 24
Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...
25 Carmen -Que tenían que prometerle.
26 27 28 29 30 31 32
Maura - [ 1 le tenían que prometer que se iban a portar bien, que iban a ser buenos. Y dijo: "¿Me prometen?" Y entonces [ 1 se para y dice: "Seiíorita, yo no prometo nada." "¿Por qué?" "Y, porque si yo le prometo ahora que me voy a portar bien, sería una mentira porque se lo digo ahora, pero yo me voy a portar mal enseguida", le contestó. Así que... además quiere ser hippy cuando sea grande.
33 34
Carmen -Pero le gusta escribir muchísimo. Dice que hace unas composiciones espléndidas. ¿Te acordás que I?
35 Maura -Sí, con muchas faltas de ortografía, pero escribe bien.
36 37
Carmen -Sí, escri... redacta muy, muy bien. Así que por ahí va a salir escritora.
122
38 39 40
Maura -Y, puede ser. Pero leer no ... leer sí, también le gusta porque en Monte Hermoso estaba leyendo Coi,azón. Leía todas las noches un capítulo o dos.
41 42 43 44
Carmen -¿ Qué... qué... qué podíamos decir? ¿ Qué le contamos a Susana? Hay que contarle algunas cosas de esas que... esas cosas que han pasada,, que hace tanto que no la veo a Susana y que no le puedo contar yo.
45 Maura -No sé '
Nesse segmento, ao dar continuidade ao tópico crianças e estudos, Carmen
menciona uma carta que ela recebeu de Bety (amiga em comum ou parente), que
menciona uma criança com dificuldades no colégio. Esse segmento de fala evidencia
que as falantes possuem conhecimento de mundo compartilhado.
Ocorre um segmento de fala de construção conjunta e colaborativa, na qual
Maura (linha 6) ajuda Carmen a encontrar o termo adequado (sugere palavra), após a
hesitação desta (linha 5):
01 02 03 04 05 06 07 08
Carmen -Y es un trabajo cuando los chicos dan... mejor dicho, es una desesperación cuando los chicos dan trabajo para estudiar. Mirá--- Bety me escribe... era una risa la carta de Bety. Dice que... que Inés es de lo más burra para matemáticas--- no le gustan las matemáticas, no le gusta, y la vez pasada le estuvieron preguntando una cosa y no sabía. Y el padre le preguntó cuál era el... ¿cómo es?, el...
09 Maura -El múltiplo del...
10 Carmen -El múltiplo del gramo... de gramo, y dijo gramore.
11 Maura -Claro, porque le pareció que era algo más grande.
12 13 14 15 16
Carmen -¿Te das cuenta? Entonces le han tenido que tomar una maestra que va todas las tardes una hora. Y dice que va, y sí que está aprendiendo mucho. Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el colegio, conversa muchísimo.
Ato contínuo (linhas 7 a 11), ocorre uma perfeita sintonia entre as falas de
Carmen e Maura, uma complementando a outra. À asserção de Carmen (linha 7),
Maura responde com um “Claro,” para, em seguida, justificar a fala de sua
interlocutora. Ocorre, portanto, uma concordância seguida de justificação. Carmen
(linha 9), ao perceber que sua interlocutora concordou com sua colocação (além de
justificá-la), diz “Te das cuenta?” (algo como, em portugués, “Você percebe?”).
No segmento de fala a seguir (linhas 9 a 23) ocorre novamente uma perfeita
simbiose de idéias entre as falantes:
123
12 13 14 15 16
Carmen -¿Te das cuenta? Entonces le han tenido que tomar una maestra que va todas las tardes una hora. Y dice que va, y sí que está aprendiendo mucho. Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el colegio, conversa muchísimo.
17 Maura -Es ... es muy charlatana.
18 19 20
Carmen -Es muy charlatana y--- no presta atención. De manera que si no presta atención, las cosas que no le gustan [ 1 se aburre.
21 22 23 24
Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...
25 Carmen -Que tenían que prometerle.
26 27 28 29 30 31 32
Maura - [ 1 le tenían que prometer que se iban a portar bien, que iban a ser buenos. Y dijo: "¿Me prometen?" Y entonces [ 1 se para y dice: "Seiíorita, yo no prometo nada." "¿Por qué?" "Y, porque si yo le prometo ahora que me voy a portar bien, sería una mentira porque se lo digo ahora, pero yo me voy a portar mal enseguida", le contestó. Así que... además quiere ser hippy cuando sea grande.
Essa simbiose de idéias começa com a concordância, por parte de Maura, ao dito
por Carmen (linhas 10-11):“Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el
colegio, conversa muchísimo”, e essa concordância ocorre através de um resumo: “Es...
es muy charlatana.”, ao que Carmen responde com a repetição colaborativa da fala de
Maura e um complemento (“Es muy charlatana y… no presta atención”), complemento
esse que gera uma consequência (segmento marcado em negrito):
18 19 20
Carmen -Es muy charlatana y--- no presta atención. De manera que si no presta atención, las cosas que no le gustan [ 1 se aburre.
Esse enunciado gera uma resposta de Maura (linha 15) que, além de ser uma
concordância ao dito por Carmen, é uma complementação (segmento marcado em
negrito):
21 22 23 24
Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...
Maura também tenta lembrar-se de um segmento de fala da carta (linhas 15-17),
e produz algumas hesitações e uma pergunta, gerando uma co-construção por parte de
Carmen que a auxilia com a frase que lhe faltava (linha 18). Em seguida Maura (linha
19) repete o que lhe foi sugerido por Carmen, complementando seu raciocínio.
124
21 22 23 24
Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...
25 Carmen -Que tenían que prometerle.
26 27 28 29 30 31 32
Maura - [ 1 le tenían que prometer que se iban a portar bien, que iban a ser buenos. Y dijo: "¿Me prometen?" Y entonces [ 1 se para y dice: "Seiíorita, yo no prometo nada." "¿Por qué?" "Y, porque si yo le prometo ahora que me voy a portar bien, sería una mentira porque se lo digo ahora, pero yo me voy a portar mal enseguida", le contestó. Así que... además quiere ser hippy cuando sea grande.
No segmento abaixo (linhas 33-45) também ocorrem vários episódios de
concordância e de fala colaborativa.
33 34
Carmen -Pero le gusta escribir muchísimo. Dice que hace unas composiciones espléndidas. ¿Te acordás que I?
35 Maura -Sí, con muchas faltas de ortografía, pero escribe bien.
36 37
Carmen -Sí, escri... redacta muy, muy bien. Así que por ahí va a salir escritora.
38 39 40
Maura -Y, puede ser. Pero leer no ... leer sí, también le gusta porque en Monte Hermoso estaba leyendo Coi,azón. Leía todas las noches un capítulo o dos.
41 42 43 44
Carmen -¿ Qué... qué... qué podíamos decir? ¿ Qué le contamos a Susana? Hay que contarle algunas cosas de esas que... esas cosas que han pasada,, que hace tanto que no la veo a Susana y que no le puedo contar yo.
45 Maura -No sé '
Maura responde (linha 35) a uma pergunta feita por Carmen (linhas 33-34) com
uma concordância com ressalva (concorda para em seguida discordar). A sentença de
Maura poderia ser reordenada dessa forma:
• concordância: “Sí, escribe bien, ...”
• ressalva: “... pero con muchas faltas de ortografía.”
33 34
Carmen -Pero le gusta escribir muchísimo. Dice que hace unas composiciones espléndidas. ¿Te acordás que I?
35 Maura -Sí, con muchas faltas de ortografía, pero escribe bien.
Carmen concorda (linhas 36-37) com Maura. Após uma hesitação, porém,
reformula sua frase, através da troca da palabra “escribe” pela palavra “redacta”. Em
seguida, Maura concorda com a afirmação de sua interlocutora (linhas 36-37) – “Así que
por ahí va a salir escritora.” – afirmando: “Y, puede ser.”
125
Ato contínuo, Maura faz uma auto-correção (linha 38), quando começa por
dizer que a menina não gosta de ler (“Pero leer no…”), e corrige para: “leer sí, también
le gusta...”.
36 37
Carmen -Sí, escri... redacta muy, muy bien. Así que por ahí va a salir escritora.
38 39 40
Maura -Y, puede ser. Pero leer no ... leer sí, también le gusta porque en Monte Hermoso estaba leyendo Coi,azón. Leía todas las noches un capítulo o dos.
Excerto 9 (diálogo 2): O uso dos pronomes de tratamento em forma de apelidos carinhosos mamita,
nena e mamá (linhas 5, 6 e 7), que denotam intimidade e afetividade, além do uso dos
diminutivos cuentito e chiquita (linhas 7 e 8), geram um aumento / maximização de
rapport.
01 02
Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?
03 Maura -Bueno.
04 Carmen -¿ Eh?
05 Maura -Contáme, mamita, contáme.
06 07 08 09 10 11 12
Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...
Excerto 10 (diálogo 3):
Esse segmento versa sobre o polêmico tema da religiosidade. As observações de
Carlos destacadas abaixo podem ser descritas como estratégias de language play, pois
ele faz um trocadilho com os termos “te encontrás con la creación” e “la creación y su
criatura” ditos por Mercedes nas linhas 2 e 5.
01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...
02 03
Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?
04 Carlos -Sí, sí, sí.
05 Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura,
126
06 ¿no es así?
07 08
Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...
09 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?
10 11
Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?
12 13 14 15
Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.
16 Carlos -Claro, claro.
127
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando-se o entrelaçamento dos conceitos rapport, polidez positiva e
envolvimento em nossa pesquisa, propusemos, na introdução, as seguintes questões de
natureza teórica e empírica, que tentamos responder a seguir:
(i) quais as relações de semelhança e diferença entre esses conceitos?
(ii) qual o papel do uso de estratégias de rapport na construção / negociação de relações
de amizade no corpus em análise?
(iii) quais os principais recursos lingüísticos e discursivos usados no espanhol de
Buenos Aires para sinalizar rapport?
Com relação à primeira pergunta, referendamos a visão de Tannen (1989), na
qual a conversa casual é construída através de estratégias que são persuasivas,
espontâneas e funcionais. Essa autora refere-se a essas estratégias como estratégias de
envolvimento, uma vez que refletem e criam envolvimento interpessoal.
Conforme já apontamos, há várias definições para envolvimento.
• Scollon e Scollon (1995) associam envolvimento à assunção do ponto de vista
do outro, ou a outros modos de sustentação de uma visão de mundo partilhada.
• Segundo Selting (1994), envolvimento é uma noção interpretativa que se
refere ao campo das emoções e atitudes, codificadas através de pistas apropriadas aos
enquadres interpretativos em jogo na interação verbal.
• Segundo Holmes (1984), significado afetivo envolve a atitude do falante em
relação ao ouvinte no contexto da enunciação. Nesse sentido, entendemos que prestar
atenção aos desejos de face dos outros é um componente crucial no estabelecimento de
uma relação de amizade.
Todos esses conceitos se aplicam a nossos dados, uma vez que os participantes
de nosso corpus, em uma medida maior ou menor, possuem uma visão de mundo
partilhada, assumem o ponto de vista do outro, prestam atenção aos desejos de face do
outro, compartilham emoções, sentimentos, lembranças e atitudes.
128
Para Spencer-Oatey polidez é, na verdade, um julgamento contextual: ‘nenhuma
sentença é inerentemente polida ou impolida’. O escopo da teoria da polidez tradicional
é a manutenção e/ou promoção de relações interpessoais harmoniosas. Já polidez
positiva, segundo Brown e Levinson, possui estratégias que estão direcionadas aos
desejos de face positiva do ouvinte (que nos remete à definição de significado afetivo
segundo Holmes), e têm como função “azeitar” as relações sociais.
Rapport é um conceito que inclui uma gama de estratégias que têm como
objetivos aproximação e envolvimento. Algumas dessas estratégias fazem parte da
polidez positiva, porém rapport é um conceito mais amplo, uma vez que ele pode
envolver tanto relações de harmonia quanto de conflito. Porém, não pode haver rapport
sem envolvimento; envolvimento é condição essencial para a existência de rapport.
Spencer-Oatey propõe o termo “gerenciamento de rapport” (rapport
management) em lugar de “gerenciamento de face” (face management) porque, segundo
ela, o termo face parece enfocar somente o self, enquanto que gerenciamento de rapport
sugere, por outro lado, um equilíbrio entre o self e o outro. O enfoque do
gerenciamento de rapport também é mais amplo: ele examina o modo pelo qual a
linguagem é usada para construir, manter e/ou ameaçar as relações sociais e inclui tanto
o gerenciamento dos direitos sociais como os de face.
Podemos incluir entre as atividades de construção de rapport as seguintes
estratégias: troca de cumprimentos; perguntas do tipo ‘como vai você’; tópicos
conversacionais tais como: saúde, problemas domésticos, feriados, escola e trabalho;
language play; despedidas do tipo ‘desejos de bem-estar ou felicidade’; atividades
criativas distintas das tradicionalmente reconhecidas como comunicação fática
(perguntas sobre saúde, conversas sobre o tempo, etc.); despedidas amigáveis, entre
outras utilizadas nas estratégias de polidez positiva. Podemos concluir que o escopo das
atividades / estratégias de rapport é maior do que o da polidez positiva.
Dentre as estratégias de polidez positiva, podemos destacar: tomar
conhecimento, atender ao ouvinte (seus desejos, interesses, necessidades, bens);
exagerar (interesse, aprovação, solidariedade com o ouvinte); intensificar interesse pelo
ouvinte; utilizar marcadores de identidade do grupo, por exemplo, apelidos, formas de
129
tratamento; procurar acordo; evitar desacordo; pressupor, levantar, garantir base
comum, por exemplo, falar “abobrinhas”, boatos ou assuntos que interessam ao falante
e ao ouvinte antes de chegar ao “ponto”; fazer piadas para reparar um FTA; garantir ou
pressupor o conhecimento e interesses do falante pelos desejos do ouvinte e não
potencialmente pressionar o ouvinte a cooperar com o falante; oferecer, prometer (o que
quer que o ouvinte deseje, o falante deseja por ele e o ajudará a obtê-lo); ser otimista,
isto é, o falante assume que o ouvinte deseja os desejos do falante (interesse partilhado);
incluir tanto o falante quanto o ouvinte na atividade, por exemplo, o uso de “nós”
inclusivo; dar ou pedir razões, explicações, incluindo o uso de sugestões indiretas; supor
ou garantir reciprocidade (direitos ou obrigações recíprocas); etc.
Com relação à segunda pergunta – qual o papel do uso de estratégias de
rapport na construção / negociação de relações de amizade no corpus em análise –
verificamos que:
• A escolha das estratégias de polidez, em nossos dados, reflete e constitui,
predominantemente, as relações de amizade que as pessoas possuem e desejam manter.
Verificamos que isso ocorre tanto com a polidez positiva (cujas estratégias aumentam o
desejo de aprovação do outro, aumentando o rapport da relação) quanto com a negativa,
que tenta atenuar / minimizar atos entendidos como de ameaça à face do outro (cujas
estratégias buscam a superação de um possível conflito e / ou a manutenção do rapport /
harmonia da relação).
• Concluimos que o desejo de face e o alinhamento dos participantes como
amigos são fatores preponderantes na definição da intensidade do uso de rapport. Os
participantes utilizam rapport com meio de reafirmar o alinhamento escolhido e
satisfazer os desejos de face do self e do outro, orientando-se para os papéis sociais dos
mesmos na relação. Em nossos dados isso significa relações de afeto, amizade,
camaradagem e familiaridade.
• Rapport emerge da construção real de uma situação, emerge de um
conhecimento construído e não artificial. A conversa entre amigos é um exemplo típico
de interação interpessoal, que tem como objetivo buscar e favorecer a manutenção das
130
relações sociais. E isso ocorre através do gerenciamento do rapport (entendido aqui
como harmonia) da relação.
• A noção de rapport pode ser pensada ainda à luz das noções de confiança e de
intimidade relacional. Thurén (1988) define a confiança como proximidade ou senso
profundo de familiaridade. É a presença da confiança que torna certos tipos de language
play e outros comportamentos lingüísticos e extralingüísticos tornarem-se aceitáveis e
mesmo desejáveis uma vez que, se não houvesse a confiança, esses comportamentos
poderiam ser tomados como ofensa, gerando um conflito e uma possível diminuição do
rapport (harmonia) da relação.
• Em nossos dados, os exemplos mais recorrentes no sentido de aumento /
maximização de rapport, que visam ao fim social (isto é, fortalecer a face do outro,
fortalecer as relações sociais, estreitar esses laços), foram (totalizando 61 exemplos):
• co-construção / construção colaborativa: 27 exemplos;
• hetero-repetição: 12 exemplos;
• concordância de idéias / consenso de opiniões: 11 exemplos;
• uso de elogios: 11 exemplos.
• Em contrapartida, os exemplos mais recorrentes direcionados à manutenção do
rapport da relação foram (totalizando 26 exemplos):
• reivindicação de acordo / evitação de conflito: 11 exemplos;
• dar razões ou explicações: 8 exemplos;
• fazer perguntas ou pedidos de esclarecimento: 7 exemplos.
Esse fato nos remete à seguinte conclusão: quando nos encontramos diante de
situações sociais de familiaridade, parâmetro social básico dos usos lingüísticos do
espanhol coloquial, o gerenciamento do rapport (harmonia) da relação visa,
fundamentalmente, dar face ao outro, aumentar o desejo de aprovação do outro. Por
outro lado, as estratégias destinadas à manutenção do rapport (harmonia) da relação
também marcaram presença, uma vez que alinhar-se como amigo pressupõe evitar o
conflito, reivindicar o acordo, pedir explicações ou esclarecimentos, dar razões ou
explicações quando solicitado.
131
De acordo com o conceito de script cultural (Triands et alli, 1983), descrito em
2.3.3., simpatia é o script cultural dos hispânicos e latino-americanos. Segundo eles,
“ser simpático” possui as seguintes características:
• mostrar certos níveis de conformidade (adaptação);
• ter a capacidade de partilhar os sentimentos dos outros;
• comportar-se com dignidade e respeito para com os outros;
• buscar harmonia nas relações inter-pessoais.
Dentre as características acima, todas, com exceção da primeira, marcaram
presença em nossos dados. A terceira e a quarta puderam ser encontradas ao longo de
quase todo o corpus (com raras exceções) e tivemos alguns exemplos da segunda, que
transcrevemos a seguir:
Excerto 1: (diálogo 1, segmento 4, anexos p.4)
38 Marta -Y que está en juego la felicidad de esa criatura.
39 40 41
Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me levanta- - - y además porque...
Tereza demonstra, no exemplo acima, a capacidade de partilhar os sentimentos
de Marta (segmento de fala em negrito).
Excerto 2: (diálogo 1, segmento de fala 8, anexos p.8)
06 07
Marta -Porque la Nena va a grabar también y Mecha L.- - - también, ¿la que vos le decías la mujer fuerte?
08 Tereza -Justamente.
09 10
Marta -Ahí está--- Te diré que--- es una mentalidad extraordinaria la de esa mujer, ¿eh?
11 Tereza -Yo la envidio. (“Eu a invejo.”)
12 13
Marta -Ochenta y dos años--- y se va pasito a Daso, sola, de noche, de su casa a lo de la Nena...
Quanto à primeira característica, esta não apareceu de forma significativa em
nossos dados, uma vez que os falantes, por diversas vezes, discordaram abertamente das
opiniões de seus interlocutores, fato que chegou a gerar situações conflituosas que
foram posteriormente minimizadas (entrando em cena, então, a quarta característica
acima).
132
Com relação à terceira pergunta – quais os principais recursos lingüísticos e
discursivos usados no espanhol de Buenos Aires para sinalizar rapport – listamos, no
início de nossa pesquisa, aqueles que acreditávamos seriam os mais usados no espanhol
de Buenos Aires para construir rapport. Após a análise, comprovamos que quase todos
eles se encontram presentes no corpus, porém as estratégias mais recorrentes estão
descritas no quadro abaixo.
ESTRATÉGIAS Diálogo 1
12 páginas Diálogo 2 (4 páginas)
Diálogo 3 (8 páginas)
TOTAL
Uso de elogios, acompanhado (ou não) da estratégia de modéstia
5 exemplos 1 exemplo 5 exemplos 11
hetero-repetição 5 exemplos 5 exemplos 2 exemplos 12
language play 4 exemplos 2 exemplos - 6
Co-construção / construção colaborativa (em conjunto ou não com a concordância de idéias e/ou opiniões)
15 exemplos
6 exemplos 6 exemplos 27
Reivindicação de acordo e/ou evitação de conflito
9 exemplos 2 exemplos - 11
Concordância de idéias e/ou consenso de opiniões
8 exemplos - 3 exemplos 11
Formas de reparo e auto-correção 4 exemplos - - 4
Fornecer razões e/ou explicações 8 exemplos - - 8
Fazer perguntas ou pedidos de esclarecimento
7 exemplos - - 7
Total 65 16 16 97
Quadro 3: Quadro quantificativo das estratégias de rapport O fato de, no diálogo 1, as estratégias encontradas serem quantitativamente
muito mais significativas em relação aos outros dois diálogos deveu-se, em nossa
opinião, a:
(i) este diálogo possuir o triplo de páginas do diálogo 2, e um terço a mais de páginas do
que o diálogo 3;
(ii) neste diálogo haver um extenso trecho que versa sobre um tema conflituoso e, por
esse motivo, as interlocutores (especialmente Marta) necessitarem lançar mão de
estratégias de manutenção de rapport com uma freqüência muito maior;
(iii) o fato de, após as interlocutoras haverem chegado a um acordo, ocorrer uma
mudança na orientação (especialmente de Tereza), e então as estratégias de aumento /
maximização de rapport passaram a marcar forte presença, acreditamos que numa
tentativa de “compensar” o tempo dispendido com a negociação do conflito.
133
Com relação à associação entre as orientações dos participantes (análise macro)
e a escolha e o uso feitos por eles de micro estratégias lingüístico-discursivas, chegamos
à seguinte conclusão:
• quando a orientação dos participantes era no sentido de manutenção de
rapport, as estratégias mais empregadas foram: evitação de conflito ou de desacordo,
perguntas e pedidos de esclarecimento, oferecimento de razões ou explicações, uso de
marcadores conversacionais de rejeição (ou disclaimers) e de distanciamento, pseudo-
acordo, concordância com ressalva;
• quando a orientação dos participantes era no sentido de aumento /
maximização de rapport, as estratégias mais utilizadas foram: uso de co-construções e
construções colaborativas; uso de formas de tratamento (por exemplo, apelidos) que
demonstram carinho e relações afetivas, hetero-repetições (que geram diálogo
construído), uso de diminutivos (linguagem afetiva), narrativa, consenso de opiniões,
uso de elogios, pressuposições que se confirmam, estratégia de modéstia.
Concluímos que o alinhamento de amizade dos participantes foi o que definiu a
intensidade do uso do rapport, assim como quais estratégias foram mais utilizadas. As
estratégias de co-construção ou construção colaborativa da fala e de hetero-repetição
foram as mais recorrentes (27 e 12 exemplos, respectivamente), uma vez que elas
sinalizam acordo, rapport (harmonia) e reafirmam o alinhamento escolhido (de
amizade). Quando uma pessoa procura alinhar-se como amigo, ela repete a fala do outro
(como forma de sinalização de sintonia), lança mão de construções colaborativas da fala
(diálogos co-construídos) e de concordância de idéias ou consenso de opiniões, além de
fazer uso de estratégias de rapport que visem dar face ao outro, como, por exemplo,
elogios (11 exemplos encontrados).
As estratégias destinadas à manutenção do rapport (harmonia) da relação
também ocorreram de forma relevante, uma vez que alinhar-se como amigo pressupõe,
como já dito anteriormente, que se evite o conflito, que se reivindique o acordo, que se
peça explicações ou esclarecimentos, que se dê razões ou explicações quando solicitado.
134
Outras estratégias encontradas foram formas de reparo, auto-correção e
estratégias de language play, estas últimas ocorrendo preponderantemente quando
existe a noção de confiança descrita anteriormente. Quando a noção de confiança está
presente, brincadeiras do tipo language play são aceitas e mesmo esperadas, e reparos
podem ser feitos sem que sejam codificados como descorteses.
Reiteramos que a intimidade relacional entre os participantes da interação é o
fator que mais influencia a escolha dos trabalhos de face adotados: quanto mais próxima
for a relação entre os interlocutores, mais eles sentir-se-ão obrigados a cooperar
mutuamente, e tornar-se-ão mais dispostos à tolerância de imposições e críticas.
Boretti (2003) comprovou que formas tradicionalmente codificadas como
descorteses no contexto de seu corpus não o eram, porque esses usos, ligados à
direcionalidade e frontalidade do comportamento lingüístico, se devem, segundo ela, à
combinatória de conteúdos específicos da categoria de autonomia, tais como a
autoafirmação e a autoestima, com outros da categoria de afiliação, como a
disponibilidade, a confiança e a sinceridade.
As características que se inserem na categoria afiliativa, tais como:
disponibilidade, confiança, sinceridade, reciprocidade e generosidade, aparecem
subjacentes às estratégias mais recorrentes encontradas em nosso corpus, que foram: o
uso de elogios (expressa afeto, estima) e a estratégia de modéstia; as co-construções ou
construções colaborativas (falar pelo outro mostra afiliação, envolvimento,
conhecimento compartilhado); fazer perguntas ou pedir esclarecimentos (mostra
interesse pelo assunto); estratégia da hetero-repetição (demonstra envolvimento);
estratégias de “language play” (que caracterizam afetividade, envolvimento,
familiaridade), etc.
Com relação à categoria de autonomia argentina, tal como descrita por Boretti
(2003), esta não marcou presença relevante em nossos dados:
“Um indivíduo que se autoestima reconhece o próprio valor e modo de agir e se mostra
capaz de exibir ou ratificar suas boas qualidades e originalidade. Esta autoestima se relaciona
com a necessidade de autoafirmação do indivíduo e faz parte do ser social; está ligada ao sentimento de orgulho que pode ser manifestado expressiva e claramente; em geral, origina
modos de ação diretos e frontais, o que permite que o indivíduo se confirme socialmente. A
autoestima é merecedora do interesse, admiração e apreço, dentro do grupo.”.
135
A estratégia de modéstia vai de encontro ao que Boretti enfatizou como sendo
características da categoria de autonomia argentina – “Um indivíduo que se autoestima
reconhece o próprio valor e modo de agir e se mostra capaz de exibir ou ratificar suas
boas qualidades e originalidade.” – pois o interlocutor, para adequar-se a essas
características, deveria aceitar os elogios recebidos, o que não ocorre na grande maioria
das vezes.
Os resultados de nossa análise são compatíveis com a posição de Kerbrat-
Orecchioni quando ela considera que polidez positiva legitimamente toma uma posição
tão, ou mais, importante quanto àquela que a polidez negativa toma (ser polido numa
interação significa produzir FFAs tanto quanto suavizar as expressões dos FTAs), isto é,
polidez negativa é basicamente impolidez restritiva, porém polidez positiva é a
verdadeira polidez.
136
7. CONCLUSÃO
A atenuação é o recurso estratégico dentro da atividade argumentativa e
conversacional que busca a aceitação do ouvinte, quer seja do dito e do dizer ou do
próprio falante. Entendemos o discurso argumentativo como aquele no qual, através de
argumentos, desenvolve-se uma negociação entre os participantes, negociação essa
destinada a resolver os conflitos advindos de opiniões divergentes.
Concluímos que a maior ou menor presença de atenuantes em uma conversação
é proporcional não somente ao grau de desacordo que exista na mesma, mas também ao
grau de intimidade relacional existente entre os participantes e à presença ou não da
noção de confiança.
Em resumo, vários fatos afetam o fenômeno da polidez, como o fato de que uma
interação apresente mais ou menos solidariedade entre os interlocutores ou que tenha
um fim predominantemente interpessoal ou transacional. A proximidade, a
familiaridade, etc., fazem com que predominem certas manifestações da polidez como
os elogios, as lisonjas, as respostas colaborativas, que reforçam o acordo daquilo que o
outro está dizendo, isto é, a polidez valorizante.
Neste tipo de interações solidárias e interpessoais, como é o caso de nossos
dados, em conseqüência, os mitigadores são menos freqüentes, uma vez que na
expressão dos atos dentro da interação nada nem ninguém se sente ameaçado pelo outro
e sua presença excessiva contradiria o fim das mesmas, essa familiaridade e
solidariedade prévia ou buscada pelos interlocutores.
Contudo, a menor presença de atenuantes não tem como correlato um menor
grau de polidez, pois há as contribuições polidas (como as gentilezas, os afagos, os
carinhos), a já citada polidez valorizante, que nada têm que ver com a atenuação
lingüística, mas, sim com a intensificação.
Como se observa, quando o nível de confiança existente entre os participantes de
um encontro social é alto, eles podem ameaçar a face do outro, discordar do que o outro
pensa, criticar o outro “abertamente”, abordar temas controversos ou tidos como tabu,
137
uma vez que as ameaças consideradas intrínsecas a essas e outras atividades
comunicativas se encontram neutralizadas. Em uma linguagem coloquial, pode-se dizer
que não há necessidade de tantas “papas na língua” para falar certas coisas com pessoas
muito íntimas a nós, como seriam necessárias para falar a mesma coisa com pessoas
com as quais não possuímos intimidade ou que nos sejam estranhas. Reiteramos, porém,
que quando ocorrem casos de ameaça à face que superem os limites tolerados, essa
dinâmica muda e os interlocutores reagem tão ou mais negativamente caso a relação
entre eles não fosse de proximidade.
Pode-se dizer da polidez, então, que se trata de um processo dinâmico que se
define e se redefine na interação, segundo os alinhamentos e, sobretudo, as reações do
outro. Somente deste modo se pode dar conta do que Briz vem chamando de polidez
interpretada, conceito que ajuda a entender, por sua vez, tal dinamismo.
Os resultados nos mostram que ameaças como as de não compartilhar as
opiniões de seu interlocutor, manifestar falta de modéstia (ao aceitar-se elogios ou auto-
elogiar-se, por exemplo) ou parecer demasiadamente crítico são riscos decorrentes de
manifestar a opinião própria sobre alguém ou alguma coisa. Entretanto, quando o nível
de confiança existente entre os participantes é alto, essas ameaças encontram-se
neutralizadas (como mencionado anteriormente), como ocorre em nossos dados.
Como entendemos que o teor de ameaça de um ato é cultural, assim como a
polidez é contextual, só podemos entender / visualizar a construção do rapport a partir
de uma situação contextualmente e culturalmente situada.
Como conseqüência, os participantes de nosso corpus orientam-se no sentido da
manutenção do rapport (harmonia) da relação, buscando o acordo interpessoal, a
participação cooperativa e o clima socio-emocional afiliativo quando expressam
opiniões.
Esperamos que o presente trabalho tenha contribuído para elucidar os
mecanismos de utilização do rapport e do envolvimento em relações que envolvam
amizade e afeto e que suscite novas pesquisas na área.
138
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