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VÍTOR FERNANDO BARROS ESTUDO FONÉTICO DO CONCELHO DE FREIXO DE ESPADA À CINTA . Morfologia . Sintaxe . 1

Estudo Fonético do Concelho de Freixo de Espada à Cinta

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Page 1: Estudo Fonético do Concelho de Freixo de Espada à Cinta

VÍTOR FERNANDO BARROS

ESTUDO FONÉTICO DO CONCELHO DE

FREIXO DE ESPADA À CINTA.

Morfologia . Sintaxe .

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A todos os amigos do concelho de Freixo de Espada à Cinta, especialmente ao António Caló, Adelino Escudeiro, Alberto Moreno, José Manuel Fragata, Carlos Cordeiro e Zeca.

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«Nenhum cientista vai ao encontro da realidade que quer explicar sem “informação”, sem formação: é (…) uma ideia falsa a de acreditar que a observação é a fonte da descoberta. Não se descobre senão aquilo que se estava pronto intelectualmente para descobrir.»

Michele Miaille, Introdução Crítica ao Direito, Editorial Estampa, 2005, p. 30.

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CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO

O nordeste transmontano não tem muitas razões de queixa sobre o estudo das suas especificidades linguísticas. Muitos especialistas, entre eles Leite de Vasconcelos, lhe dedicaram eméritos trabalhos de análise. Todavia, raramente se encontram referências significativas ao sul desta região, nomeadamente ao concelho de Freixo de Espada à Cinta. O presente trabalho, um mínimo contributo para o estudo do falar deste concelho, pretende minimizar essas carências de investigação e suscitar nas pessoas mais sapientes do que nós motivos acrescidos de reflexão e vontade de complementar e contraditar as nossas conclusões. O facto de termos vivido muitos anos neste concelho, e dele termos recebido múltiplos valores que continuam a nortear a nossa vida, trouxe-nos, contraditoriamente, facilidades e dificuldades na investigação: por um lado, um maior conhecimento do objecto de estudo; por outro lado, um menor grau de distanciamento da realidade envolvente. Este último aspecto pode ter condicionado a nossa investigação, isto é, ter diminuído a nossa capacidade de percepcionar os fenómenos estudados. Evidentemente, procurámos tornear o problema, através de uma metodologia baseada em gravações, mas não temos a certeza de ter solucionado integralmente o óbice. Como não somos filólogos, mas apenas detentores de conhecimentos razoáveis de filologia e de fonética, é possível que as nossas captações fonéticas não estejam completamente de acordo com as dos peritos. Quanto às percepcionadas pelos completamente leigos na matéria em apreço, temos a informar que não lhes atribuímos grande importância. Como escreveu Leite de Vasconcelos, Opúsculos (vol. VI), p. 29, com esta observação « se responde às críticas que alguns insensatos fazem aos filólogos, de que certas distinções fonéticas, que eles às vezes acham (…), são inexactas. Convenho em que um ouvido habituado ao estudo da fonética distinga facilmente sons que outras pessoas sem preparação prévia têm dificuldade de distinguir (…). Quantas moléstias não há, por exemplo, na classe das dermatoses, que à observação do vulgo se confundem completamente entre si, e todavia são distintíssimas umas das outras aos olhos do clínico?» Chamamos ainda a atenção dos consulentes para o facto de algumas das características fonéticas aqui descritas não serem fenómenos generalizados. A crescente escolarização da população e o acesso massificado desta aos meios de comunicação social esbateram em muitos falantes as diferenças entre a língua norma e os falares locais.

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CAPÍTULO II – CARACTERÍSTICAS FONÉTICO-FONOLÓGICAS

1. CONSOANTES

1.1. Substituição da oclusiva velar sonora [g] pela oclusiva velar surda [k]

costoso1 (= gostoso)

1.2. Guturalização do -l antes de consoante 2

naquel campo (= naquele campo)aquel burro (= aquele burro)não val nada (= não vale nada)é del tudo (= é dele tudo)gênlro (= genro)tênlro (= tenro)hônlra (= honra)

1.3. Oclusivas sonoras -b, -d, -g

Estas consoantes, entre vogais, são constritivas fricativas, isto é, na sua pronúncia, a corrente expiratória, numa estreita fenda da via bucal, encontra um obstáculo parcial (e não total) que a comprime, mas não a interrompe em momento algum, produzindo um ruído similar ao de uma fricção 3. Assim, distinguimos o -b de bato, o -d de data e o -g de galo do -b de abixeiro, do -d de lado e do -g de Lagoaça.

1.4. Aspiração da oclusiva sonora –b e da oclusiva surda -p 4

Alípiolábioprincípiosábio

1.5. Troca da vibrante [r] pela lateral [l] (dissimilação) 5

almário (= armário)elguer (= erguer, levantar, içar, subir) 6

patamal (= patamar)

1 Também ouvimos pronunciar quêstoso.2 A guturalização do -l antes de consoante ocorre em muitas localidades do distrito de Bragança. Ver José Leite de Vasconcelos, Opúsculos, vol. VI, parte II, pp. 14 e 27.3 Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, p. 42. 4 O mesmo fenómeno ocorre em Parada de Infanções, concelho de Bragança, segundo José Leite de Vasconcelos, ob. cit., p. 27.5 É vulgar em múltiplas localidades transmontanas. Ver Maria Augusta Martins Teixeira, Terras de Bragança: linguagem e costumes, p. 78.6 O vocábulo elguer apenas o ouvimos em Fornos.

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1.6. Toca da fricativa sonora –v pela oclusiva sonora -b

abó (= avó e avô)bendo (= vendo)pôlbo (= polvo)

Nas aldeias de Fornos, de Lagoaça e de Ligares, ao contrário do Porto e do Barroso 7, a troca destas consoantes nem sempre se verifica. Exemplos: Aveiro, vaca, valente, vento. É em Mazouco e em Fornos, particularmente na primeira, que a troca de consoantes ganha foros de instituição. Em Freixo de Espada à Cinta e em Poiares, freguesias do sul do concelho, não ocorre esta troca de consoantes.

1.7. Troca da oclusiva sonora –b pela fricativa sonora –v 8

Este fenómeno fonético, no concelho de Freixo de Espada à Cinta, é exclusivo de Fornos 9. Sublinhamos, no entanto, ser minoritário o número de falantes que o exerce: apenas o registámos de outiva a meia dúzia de pessoas, mas recordamo-nos de o termos igualmente ouvido, no passado, ao nosso falecido tio – também nós, por vezes, em linguagem descuidada, nos apercebemos desta “herança” que a aldeia nos outorgou.

és um vurro! (pronuncia-se vurrrro) varba (= barba)

1.8. Realização da consoante africada dorsopalatal surda 10

Este fonema, que começa por ser oclusivo e termina fricativo, corresponde ao grafema -ch (lê-se tch) [t] – não faz parte do sistema do português norma -, distinguindo-se claramente da consoante palatal surda -x :

achar (pronuncia-se atchar)cachorro (catchorro)chave (tchave)chede (tchede)chove (tchove)fechado (fetchado)rachado (ratchado)sacho (satcho)

A pronúncia das consoantes -ch e -x é tão diferente que se torna quase impossível trocá-las na linguagem escrita, incluindo uma criança do 1.º ciclo.

7 Cf. Rui Dias Guimarães, O Falar de Barroso, p. 559 e Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 76.8 Deste fenómeno fonético não se apercebeu Amadeu Ferreira, Quem vê o seu povo…, p. 285 : «Note-se porém que à troca do “v” pelo “b” não correspondia a inversa. Isto é, “vaca” era “baca” mas “boi” continuava “boi” (…) »9 Não é, todavia, no contexto transmontano, exclusivo de Fornos. Na freguesia de Guiães, concelho de Vila Real, por exemplo, também se realiza (ou, pelo menos, realizava-se em 1885), de acordo com o testemunho avalizado de José Leite de Vasconcelos, ob. cit. p. 205 : «Na maioria dos casos v passa a b. Por vezes dá-se a transformação contrária de b em v.»10 Este fenómeno, comum ao nordeste transmontano, ocorre predominantemente nos falantes mais idosos.

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1.9. Realização da consoante africada dorsopalatal sonora 11

Este fonema, que não faz parte do português norma, corresponde ao grafema –j (lê-se dj) :

já (pronuncia-se djá)

1.10. Consoante palatal surda – grafema -x

abixeiro (= lugar frio e sombrio, onde não bate o sol)enxadaXavier

A esta consoante corresponde o fonema -ch, tal como no Barroso 12.

1.11. Arrastamento da vibrante sonora [R]

agarrado (soa agarrrrado)até t’arrebento (= dou cabo de ti)carramelo (= amontoado de coisas)terrincar (= ranger os dentes)

Este fenómeno fonético - arrastamento do [R] à maneira basca – não faz parte do sistema do português norma. No concelho de Freixo de Espada à Cinta é exclusivo de Fornos 13.

1.12. Acrescentamento de um fonema (paragoge) ao -l em sílaba final 14

Abril(e)

afinal(e)Brasil(e)cordel(e)farnel(e)male(e)Manel(e) (=Manuel)sal(e)sul(e)

O -l em sílaba final nem sempre sofre o fenómeno fonético de paragoge: matagal, Raul, etc.

1.13. Distinção entre a apical -s e a pré-dorsal –ç 15

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11 Este fenómeno fonético não é generalizado. A sua realização está confinada a uma minoria de falantes forneiros.12 Rui Dias Guimarães, ob. cit. p. 102. 13 Corroboro aqui a opinião de Amadeu Ferreira, …O Mundo Todo, p. 125.14 É um fenómeno fonético vulgar no concelho.15 No sul do concelho não ocorre este fenómeno.

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1.14. Consoantes fricativas -s e -z

Estas consoantes, normalmente em posição intervocálica, realizam-se como pré-dorsoalveolares sonoras 16 :

asaazul

1.15. Frequente posposição da vogal fechada média [∂] (paragoge) nas sílabas finais das palavras terminadas em -r, e -z 17

mandare (= mandar)mulhare (= molhar)rezare (= rezar)faze (= faz)

1.16. Mudança de sílaba (metátese) da consoante vibrante [r] 18

drento (= dentro)vrido (= vidro)virdado (= vidrado)Grabiel (= Gabriel)

1.17. A consoante lábiodental fricativa surda – grafema -f - passa a consoante bilabial oclusiva sonora 19 em

probessor (= professor)

1.18. Conservação de -n intervocálico 20

aldeana (= aldeã) avelaneiracampeona (= campeã)leitona (= leitoa)

16 Tal como no Barroso. Ver Rui Dias Guimarães, ob. cit. p. 105. Embora pronúncia minoritária, na freguesia de Mazouco ouvi pronunciar distintamente os fonemas -s e -z.. O efeito acústico do grafema -s é igual ao descrito para o concelho de Bragança pela autora Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 62.17 É um fenómeno fonético vulgar no concelho e no distrito de Bragança.18 A ocorrência deste fenómeno fonético não é, actualmente, frequente nem generalizada; ele tem maior expressão nos grupos sócio-culturais não escolarizados.19 Fenómeno fonético vulgar em múltiplas localidades transmontanas. Ver Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, Contribuição para uma monografia etnográfica, linguística e folclórica do concelho de Alfândega da Fé., p. 88. 20 A manutenção do -n intervocálico não é tão abrangente como nos concelhos de Bragança, Vimioso e Vinhais. Ver, por exemplo, Adelina Angélica Aragão Pinto, Deilão: estudo linguístico e etnográfico, p. 48.

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1.19. A consoante velar oclusiva sonora – grafema -g – passa a consoante surda – grafema -c – em 21

bacatela (= bagatela)

1.20. A fricativa sonora – grafema -v – passa a consoante oclusiva sonora – grafema –d

Adé-Maria (= Ave-Maria)

1.21. A consoante oclusiva sonora - grafema d – passa a consoante oclusiva surda – grafema -t

bigote (= bigode)

1.22. O grupo -sc reduz-se a –c 22

conciência (= consciência)crecer (= crescer)decida (= descida)naceu (= nasceu)

2. VOGAIS, SEMIVOGAIS, DITONGOS. OUTROS CASOS

2.1. O -o de sílaba terminada por -l é fechado 23

bôlcar (= derrubar, atirar alguém ao chão)côlmarpôlbosôldadosôlteirotôldar

2.2. O -o no interior de sílaba terminado por consoante apicodental vibrante [r] é, frequentemente, aberto 24

córnocórvodórmas (= durmas)mórnomórto

21 Fenómeno vulgar e generalizado, comum a outras localidades transmontanas.22 Fenómeno fonético que ultrapassa as fronteiras do concelho de Freixo e se estende a quase toda a região transmontana. Ver Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 77 e Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, ob. cit., p. 90.23 É um fenómeno fonético frequente no concelho, extensivo à maioria das localidades dos dois distritos transmontanos.24 É também um fenómeno fonético frequente no concelho.

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pórcotórçotórto

Não é aberto em muitos outros vocábulos : abôrto, côrte, pôrtão, Pôrto, sôrtear, tôrneio.

2.3. O -o, quando em sílaba final tónica -bó ou -vó, ou quando forma sílaba sozinho, no início de palavra, é aberto 25

abó, avó (= avô e avó)óbo (= ovo)ólho (= olho)ósso (= osso)regibó (= barulho, confusão)

Esta abertura do -o não é tão acentuada como em Lisboa – assemelha-se mais ao castelhano 26.

2.4. O -o é frequentemente aberto antes de sílaba velo-palatal vibrante [R] e pré-dorsal surda [s] 27

córra (= corra)desóssada (= desossada)grósso (= grosso)mórra (= morra)

Em casos idênticos, há vocábulos nos quais o -o é fechado : tôrre, zôrro, zôrra.

2.5. O -o antes de sílaba vibrante apicodental [r] é, regra geral, fechado 28

agôra (= agora)môra (= amora) 29

namôra (= namorada)penhôra (= penhora)senhôra (= senhora)

Algumas excepções a esta regra: embora, adora, etc.

2.6. A vogal -o passa a vogal média semifechada 30

saluço (= soluço)

25 É fenómeno fonético vulgar e generalizado.26 Deste fenómeno nos dá conta, em finais do século XIX, José Leite de Vasconcelos, ob. cit., p. 24. Acrescenta, porém, não o ter observado na localidade; recebeu esta informação de um forneiro.27 É um fenómeno fonético corrente.28 É também um fenómeno fonético corrente.29 No concelho, apenas ouvimos este vocábulo em Fornos; mas ele ocorre noutros locais de Trás-os-Montes. Ver Adelina Angélica Aragão Pinto, ob. cit., p. 41.30 Não ouvimos, durante o período da nossa investigação, para além do vocábulo em apreço, outra palavra em que este fenómeno fonético se realizasse.

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2.7. Nasalação de vogais, antes de consoantes nasais 31

fũmos (= fomos)fũgem (= fogem)

2.8. Tendência, no início de palavra, para a nasalação do -e átono 32

inducação (= educação)inleição (= eleição)

2.9. Tendência para se mudar a vogal nasal [ẽ] na vogal nasal [ĩ] 33

imbora (= embora)impatar (= empatar)inginheiro (= engenheiro)inquanto (= enquanto)intendem (= entendem)intrar (= entrar)Intrudo (= Entrudo)inxame (= enxame)mintiroso (= mentiroso)

2.10. Anteposição de vogal nasal anterior [ĩ] (nasalação) em vocábulos iniciados por consoante 34

intremoço (= tremoço)

2.11. Intercalação de um -i para anulação do hiato 35

a-i-água (= a água)a-i-ama (= a ama)a-i-Ana (= a Ana)à-i-aula (= à aula)à-i-eira (= à eira)p’la-i-alma (= pela alma)

2.12. Passagem de vogal média fechada [∂] a vogal anterior fechada [i] 36

Alixandre (= Alexandre)chigar (= chegar)

31 É fenómeno fonético vulgar.32 Não é, no presente, fenómeno fonético frequente e generalizado.33 É um fenómeno fonético vulgar, comum a muitas localidades transmontanas.34 É fenómeno raro, restrito a alguns falantes de um grupo sócio-cultural não escolarizado. Apenas o registámos em Fornos.35 É fenómeno corrente e generalizado, ouvindo-se em todas as localidades transmontanas nossas conhecidas, tanto no distrito de Vila Real como no distrito de Bragança.36 Este fenómeno fonético ocorre com mais frequência nas freguesias de Fornos (apenas nesta aldeia ouvimos pronunciar Alixandre) e de Mazouco, particularmente nos grupos sociais não escolarizados.

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ninhum (= nenhum)piqueno (= pequeno)piru (= peru)sigurar (= segurar)

2.13. Passagem de vogal média semifechada [α] a vogal média fechada [∂] 37

jenela (= janela)selada (= salada)relar (= ralar)rezão (= razão)

2.14. A vogal média semifechada [α], depois da palatal -j, em final de palavra, passa a vogal média fechada – grafema -e 38

loje (= loja)botije (= botija)

2.14. Passagem da vogal nasal [õ], em posição átona, a vogal nasal fechada [ữ] 39

acuntecer (= acontecer) cumbersa (= conversa)

cumprar (= comprar)cuntigo (= contigo)rumper (= romper)tumbar (= tombar)

2.15. Passagem da vogal nasal [õ], em posição tónica, a vogal oral [u] 40

custipar (= constipar)

2.16. Passagem da vogal nasal [ẽ], em posição átona, a [ã] 41

antão (= então)estander (= estender)lantidão (= lentidão)lantilha (= lentilha)santeio (= centeio)randimento (= rendimento)

37 É, pelo menos no vocábulo selada (salada), fenómeno vulgar e generalizado. Cf. Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 68.38 Fenómeno fonético vulgar e generalizado, comum a outras localidades transmontanas. Ver Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 68.39 É fenómeno vulgar e generalizado, comum a outras localidades transmontanas. Ver Adelina Angélica Aragão Pinto, ob. cit., p. 44.40 É fenómeno frequente, ocorrendo sobretudo nas camadas sociais menos escolarizadas, mas não é generalizado.41 É fenómeno frequente e generalizado, pelo menos nalguns destes vocábulos, ocorrendo noutras localidades transmontanas. Ver Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit. p. 70 e Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, ob. cit., p.84.

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santimento (= sentimento)santinela (= sentinela)santido (= sentido)

2.17. Realização da vogal nasal [ã] em posição inicial como [ĩ] ou [ẽ] 42

intigo (= antigo)endorinha (= andorinha)

Há casos idênticos em que isso não acontece: Antero, António, antena, etc.

2.18. Passagem de vogal fechada média a vogal fechada posterior 43

lubar (= levar)buber (= beber)

2.19. Passagem de vogal fechada posterior a vogal fechada média 44

feturo (= futuro)estepor (= estupor)gueloso (= guloso)

2.20. Realização da vogal -a como -e, antes de nasal palatal 45

castenheiro (= castanheiro)castenholas (= castanholas)

Há casos similares em que este fenómeno não ocorre: apanha, castanha, estanho, etc.

2.21. Passagem de vogal fechada anterior a vogal fechada média 46

dezer (=dizer)dezia (= dizia)sacrefício (= sacrifício)

2.22. Fechamento da vogal -o em sílaba final -or 47

melhôr (= melhor)piôr (= pior)bolôr (= bolor)

42 É, na actualidade, fenómeno pouco frequente, ocorrendo, particularmente em Fornos, nos grupos sociais menos escolarizados.43 É fenómeno fonético vulgar, ocorrendo particularmente nas freguesias do Norte do concelho.44 É fenómeno fonético frequente e generalizado.45 Fenómeno fonético vulgar.46 É fenómeno generalizado, comum a outras localidades transmontanas. Ver Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, ob. cit., p. 85.47 Fenómeno fonético vulgar e generalizado - que se afasta do sistema do português norma - no concelho de Freixo de Espada à Cinta e no distrito de Bragança.Ver Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, ob. cit., p. 84.

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redôr (= redor)

2.23. Dissimilação entre semivogal e vogal palatal 48

piadade (= piedade)sociadade (= sociedade)

2.24. Queda do -e (aférese) na sílaba inicial -es 49

stá (= está)speramos (= esperamos)

2.25. Queda da sílaba átona -a (aférese) no início de palavra 50

inda (= ainda)môra (= amora)

2.26. Queda do -e ou do -i (síncope) na sílaba interior da palavra 51

aparcer (= aparecer)advinha (= adivinha)cal’se (= cale-se)establecimento (= estabelecimento)pacência (= paciência)

2.27. Queda da vogal átona -o (apócope) no final da palavra 52

ti Silvestre (= tio Silvestre), ti Mário, ti António

2.28. Acrescentamento da sílaba átona -a (prótese) à sílaba inicial do vocábulo 53

alembrar (= lembrar)alevanta (= levanta)arreceber (= receber)assuceder (= suceder)

2.29. Acrescentamento da vogal -a (paragoge) nalgumas palavras oxítonas terminadas em -r 54

qualquera um (= qualquer um)

48 É fenómeno muito frequente.49 É, tal como em quase todo o país, fenómeno vulgar e generalizado. 50 É fenómeno vulgar e generalizado, mais no primeiro do que no segundo vocábulo – que tem forte incidência em Fornos.51 É fenómeno vulgar e generalizado.52 É fenómeno vulgar e generalizado. Esta forma de tratamento, embora carinhoso, tem claramente uma marca de classe: só as pessoas mais humildes o recebem; as pessoas com um estatuto social mais elevado, mas sem estudos superiores, recebem o tratamento de “Sr.”53 Fenómeno frequente, mas não generalizado.54 Fenómeno fonético vulgar.

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sequera um (= sequer, pelo menos, ao menos um)

2.30. Atracção (forma particular de metátese) da semivogal -i ou -u, em ditongo crescente final, para junto da vogal tónica 55

Antoino (= António)auga (= água) augado (= aguado)relóijo (= relógio)

2.31. Transposição de vogal e consoante vibrante na mesma sílaba (metátese) 56

drumo (= durmo)redadeiro (= derradeiro)sastifeito (= satisfeito)trocer (= torcer)treceiro (= terceiro)prégunta (= pergunta)

2.32. Monotongação do ditongo oral -ou em [o] 57

já bô (= já vou)ôtra (= outra)pôco (= pouco)sô de Lagoaça (= sou de Lagoaça)

Não se monotonga, regra geral, em: Mogadouro, Douro, courão, etc. (ouvi, no entanto, a algumas pessoas, pronunciar Mogadoiro e coirão).

2.33. Monotongação do ditongo oral decrescente -ou em -u 58

lureiro (= loureiro)

2.34. Passagem do tritongo -eio a -ê (redução) 59

mê-dia (= meio-dia)

2.35. Passagem de vogal a ditongo [ou], tal como se pronuncia no Porto 60

à toua (= à toa)

55 Fenómeno vulgar também noutros concelhos de Trás-os-Montes.Ver Adelina Angélica Aragão Pinto, ob. cit., p. 55 e Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, ob. cit. , p. 94. Ocorre também o fenómeno de metátese em redadeiro (derradeiro), sastifeito (satisfeito).56 Fenómeno muito frequente, mas restringido aos falantes mais idosos. 57 Este fenómeno fonético, na freguesia de Mazouco, é raro. Aqui ouvi dizer: bou, outra, pouco, sou.58 Apenas o ouvimos em Fornos.59 Fenómeno fonético muito frequente.60 Fenómeno fonético vulgar e generalizado.

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boua (= boa)Lisboua (= Lisboa)magoua (= magoa)

2.36. Passagem a ditongo -ou de vogal média semifechada seguida de vogal fechada posterior – grafema -u -, com a qual não forma ditongo 61

soudade (= saudade)soudoso (= saudoso)

2.37. Passagem do ditongo -ou ao ditongo -ei em 62:

deitor (= doutor)

2.38. Uso preferencial do ditongo -oi 63

oitrooirohoivepoisalavadoiro

2.39. O -o tónico fechado e o –a tónico aberto, por vezes, ditongam -oi antes de palatal –j 64

hoije (= hoje)haija (= haja)

2.40. O -o tónico nasal seguido de consoante palatal desenvolve um [i], formando ditongo com o [õ] 65

lõije (= longe)

2.41. O -a tónico fechado e o -a átono aberto ditongam -ai em 66

vigairista (= vigarista)araige (= aragem)gaijo (= gajo)pelaige (= pelagem)viaige (= viagem)

2.42. Passagem dos ditongos -ao e -oi a vogal (redução) 67

61 Fenómeno de uso generalizado.62 Fenómeno que se restringe aos falantes menos escolarizados.63 Fenómeno fonético não generalizado, que ocorre, em particular, na freguesia de Fornos.64 Fenómeno vulgar e generalizado, comum a outras localidades transmontanas.65 Ocorre, por vezes, nos falantes mais idosos de Lagoaça. Ver Maria José de Moura Santos, Os falares fronteiriços de Trás-os-Montes. p. 167.66 Fenómeno vulgar, mas não generalizado.67 É de uso generalizado, tal como noutras localidades de Trás-os-Montes e do país.

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“não deu de comer à égua nem ò cavalo” (= ...ao cavalo)nôte (= noite)

2.43. Passagem do ditongo –ão a vogal nasal 68

num o vi (= não o vi)num falei nisso (= não falei nisso)

2.44. Em frases enfáticas o ditongo -ão é nasalizado, soando -êum 69

quêum (= cão)ladrêum (= ladrão)

2.45. O ditongo -ei passa ao ditongo -âi em 70:

dâixou (= deixou)

2.46. O ditongo -ei monotonga frequentemente em -ê 71

azête (= azeite)encontrê (= encontrei)mandê (= mandei)

2.47. Monotongação do ditongo -au (dissimilação) em 72

Águsto (= Augusto)

2.48. Monotongação do ditongo -ei em -i

miotes (= meiotes)

2.49. Monotongação do ditongo -eu em –u 73

Ugénio (= Eugénio)Ulália (= Eulália)rumatismo (= reumatismo)pnumonia (= pneumonia)

2.50. O ditongo -ei pronuncia-se com -e aberto 74

déito (= deito)

68 Fenómeno frequente e não generalizado, comum a outras localidades transmontanas. Ver Maria Augusta Martins, ob. cit. p. 75.69 Este fenómeno fonético é exclusivo de Lagoaça. 70 Actualmente, é fenómeno não generalizado, mas ainda com grande expressão.71 Fenómeno que, no concelho, ocorre na vila de Freixo de Espada à Cinta e em Ligares.72 Fenómeno fonético vulgar e generalizado, comum a outras localidades transmontanas.73 Fenómeno vulgar e generalizado.74 Fenómeno que, por sistema, só ocorre nas freguesias situadas a norte da sede do concelho: Fornos, Lagoaça e Mazouco. Em Freixo, onde este fenómeno só ocorre episodicamente, ouvimos pronunciar ôvéilhas (=ovelhas), vocábulo este que, nas restantes freguesias se pronuncia ubêlhas ou uvêlhas.

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péito (= peito)séi (= sei)

2.51. O ditongo decrescente oral -au passa a vogal oral semiaberta – grafema -o 75

ótorização (= autorização)ótomotora (= automotora)ómentar (= aumentar)

2.52. O -e tónico fechado ditonga -ei antes de palatal -j 76

veija (= veja)seija (= seja)deseija (= deseja)

2.53. O -i átono, em início de palavra, antes de consoante oclusiva sonora – grafema -d –, frequentemente ditonga -ei 77

eidade (= idade)eideal (= ideal)Eidalécio (= Idalécio)

2.54. Fusão de duas vogais de sílabas diferentes num ditongo decrescente (sinérese) 78

riu (= rio)friu (= frio)tiu (= tio)

2.55. As palavras terminadas em -enha e -enho soam -anha e -anho 79

lanha (= lenha)sanha (= senha, sinal)tanho (= tenho)vanho (= venho)

2.56. Passagem da vogal média fechada [∂] ao ditongo -ei (ditongação) antes de consoante lateral sonora [λ] – grafema -lh 80

teilha (= telha)

75 Fenómeno muito frequente.76 Fenómeno fonético vulgar e generalizado.77 Fenómeno fonético com particular incidência na aldeia de Fornos.78 Fenómeno pouco frequente, incidindo particularmente nos falantes mais idosos de Fornos. Ocorre noutras localidades transmontanas. Ver Adelina Angélica Aragão Pinto, ob. cit. p. 46.79 Fenómeno vulgar e generalizado, no concelho (excepto a vila, onde ouvi pronunciar lénha e ténho) e no nordeste transmontano.80 Fenómeno vulgar e generalizado em Lagoaça.; frequente nas restantes freguesias, com excepção de Fornos. Nesta localidade a sua ocorrência é muito rara, preferindo-se a pronúncia têlha, abêlha, etc. A palavra vermeilho ouvi-a em Freixo. No norte do concelho só ouvi burmêlho.

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abeilha (= abelha)azeilha (= azelha)vermeilho (= vermelho)

2.57. O -e tónico oral aberto tritonga-se em 81:

fieito (= feto)

2.58. O -e átono oral fechado, em sílaba interior, passa a -o ou a -a em 82:

desortar (= desertar, desaparecer, pôr-se a milhas)númaro (= número)

2.59. O -i átono nasal, em sílaba inicial, passa a -e nasal em 83:

vendima (= vindima)

2.60. Supressão da vogal final de um vocábulo quando se lhe segue outra palavra que começa por vogal (sinalefa) 84

Olhá fina! (= Olha a fina, a esperta!) Olhó milagre! (= Olha o milagre!)C’admiração! (= Que admiração!)

2.61. Aférese do -i átono oral antes de consoante fricativa 85

Zaías (= Isaías)Zabel (=Isabel)

Em casos idênticos, este fenómeno não ocorre: Isaura, Isaltino, etc.

2.62. Fusão de duas vogais de sílabas diferentes – uma vogal oral e outra vogal nasal – numa só vogal nasal em 86:

ruĩm (= ruim)

2.63. Desnasalização do -em (apócope do -m) em final de palavra 87

home (= homem)onte (= ontem)trás d’onte (= anteontem)

81 Na freguesia de Lagoaça diz-se figueito.82 Fenómeno muito frequente. Ver também Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, ob. cit., p. 83.83 Fenómeno fonético vulgar e generalizado.84 Fenómeno fonético vulgar e generalizado.85 Fenómeno muito frequente.86 Fenómeno muito frequente.87 Fenómeno muito frequente, mas não generalizado.

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2.64. Desnasalização da vogal átona nasal – grafema -an – antes da consoante palatal -j (síncope do -n)88

majarico (= manjerico)majedoura (= manjedoura)

2.65. Desnasalização da vogal nasal -om (apócope do -m) em -ô89

bô (= bom)

2.66. Haplologia da sílaba -ce em 90:

nessidade (= necessidade)nessitado (= necessitado)nessário (= necessário)

2.67. Haplologia da sílaba -sus em 91:

rescitou (= ressuscitou)

2.68. Na palavra manhã e compostos regista-se muitas vezes -ẽ 92

manhẽ (= manhã)amanhẽ (= amanhã)

2.69. A vogal tónica -a é mais aberta do que na pronúncia da língua norma

sáca (= saca)ráto (= rato)páta (= pata)

2.70. Depois de -a tónico nasal seguido de consoante palatal, desenvolve-se um [i], não muito acentuado, formando ditongo com o [ã] 93

cãija (= canja)larãija (= laranja).

2.71. Por vezes, dá-se a redução do ditongo -ui 94

muto (= muito)88 Fenómeno vulgar e generalizado, comum a outras localidades transmontanas. Ver Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa Ferreira-Pinto, ob. cit. p. 82.89 Idem, ibidem.90 Fenómeno fonético vulgar, mas não generalizado.91 A ocorrência deste fenómeno é rara, estando confinada a um grupo de falantes não escolarizados.92 Ocorre com muita frequência em Lagoaça, particularmente nos falantes mais idosos. Ver Maria José de Moura Santos, ob. cit. p. 146. Segundo esta autora (ver p. 144, da mesma obra), tem ainda alguma vitalidade, em Fornos e em Freixo de Espada à Cinta, a realização [ãu – manhãu (= manhã)]. Nós não a conseguimos registar, o que não quer dizer que não exista. Ouvimos, isso sim, em Ligares, pronunciar manhé (= manhã).93 Idem, ibidem.94 Observado em Fornos e em Lagoaça; no entanto, é mais frequente munto.

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2.72. O -e tónico nasal seguido de consoante oclusiva surda – grafemas -t e -p – é mais aberto do que na pronúncia da língua norma

quénte (= quente)ménte (= mente)témpo (= tempo)

2.73. Por vezes, o -e tónico antes de consoante oclusiva sonora – grafema -d – é aberto 95

médo (= medo)dédo (= dedo)

O mesmo não acontece, por exemplo, em: arvoredo, etc.

2.74. Por vezes, o –e tónico antes das consoantes –b e –ç é aberto 96

bébo (= bebo)percébo (= percebo)aquéço (= aqueço)conhéço (= conheço)

2.75. Em muitos vocábulos do grupo –qu, há contracção do –u com a vogal seguinte, gerando –ò ou –ô, ou a sua queda 97

cólidade (= qualidade)côresma (= Quaresma)cal (= qual)calquer (= qualquer)

2.76. Há também elisão do –u nalguns vocábulos do grupo –gu 98

mingar (= minguar)gardião (= guardião)

2.77. Anaptixe (caso especial de epêntese) em 99 :

belusa (= blusa)felor (= flor)pelaina (= plaina)pelástico (= plástico)

Este fenómeno não ocorre, por exemplo, em: blocar, placar, planificar.

95 Comum a outras localidades transmontanas. Antes da oclusiva sonora -g ouvi pronunciar, em Mazouco, borrégo (= borrego); nas outras freguesias do concelho segue-se a pronúncia da língua norma.96 Fenómeno generalizado.97 Fenómeno generalizado.98 No caso do vocábulo mingar é fenómeno fonético generalizado. Apenas as pessoas situadas no grupo social não escolarizado/pouco escolarizado pronunciam gardião.99 Fenómeno generalizado.

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2.78. Epêntese do –s em 100:

astrever-se (= atrever-se)desbulhar (= debulhar)despois (= depois)

2.79. As palavras terminadas em -al são pronunciadas com -a aberto, o que não acontece na língua norma ou língua padrão 101

pinhál (= pinhal)pardál (= pardal)

CAPÍTULO III – PARTICULARIDADES MORFOLÓGICAS

1. ADVÉRBIOS E LOCUÇÕES ADVERBIAIS

100 Fenómeno que ocorre no grupo social não escolarizado/pouco escolarizado.101 Este fenómeno fonético é, no concelho de Freixo de Espada à Cinta, exclusivo de Lagoaça. Os naturais da aldeia vizinha, Fornos, costumam dizer que os lagoaceiros “enchem a boca” quando pronunciam palavras terminadas em –al.

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1.1. De negação

a) O advérbio não, estando acompanhado de outro vocábulo, regra geral de classe gramatical diferente, passa a num (perde o -m – apócope – quando seguido de palavra iniciada pela vogal -e):

“num falei em ti” 102 (= não falei em ti)“num tem nada a ver connosco” 103 (= não…)nu’entras (= não entras)

b) Monotongação do ditongo nasal -ão do advérbio de negação, normalmente antes de consoante surda – grafema -s 104:

nã senhor (= não senhor)

c) Emprego de agora 105 com o sentido de não:

- Já fizeste negócio com o ti Manel?- Agora! Queria-me os olhos da cara.

1.2. De afirmação

a) A locução adverbial mas sim transforma-se em advérbio, através de um processo de aglutinação 106:

- Não estás cansado? - Não massim (= não mas sim, isto é, sim estou).

b) O advérbio sim, normalmente antes da consoante surda – grafema -s -, perde a consoante final (apócope do -m) 107:

Si senhor (= sim senhor)

1.3. De inclusão

O advérbio também, através de um processo de assimilação, perde a consoante -b (síncope), passando o ditongo -am a vogal média semifechada [α] 108:

tâmém (= também)

1.4. De ordem

102 Amadeu Ferreira, ob. cit., p. 144.103 Odete Ferreira, Rente aos pássaros, p. 19.104 Fenómeno frequente.105 Em Ligares ouvi pronunciar o vocábulo com a aberto: ágóra.106 Fenómeno frequente.107 Fenómeno frequente108 Fenómeno vulgar e generalizado.

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Há epêntese no advérbio depois, tal como noutras regiões do país:

despôis109 (= depois)

1.5. De tempo

a) Apócope do -m do advérbio ontem 110: Onte fui a Freixo.

b) O advérbio anteontem passa a 111:

trás-d’onte

c) A vogal nasal [ẽ], do advérbio então, realiza-se como vogal nasal [ã] ou como vogal semifechada 112:

antão (= então) atão (= então)

d) Aférese do -a de ainda:

“Inda são duas horas a cavalo!” 113

e) Outros casos:

há bem há (= há muito tempo) 114

ementes (= entretanto, enquanto) 115

1.6. De quantidade

a) O ditongo oral -ui do advérbio muito passa a vogal nasal [ữ] 116:

É munto dinheiro.

b) O advérbio muito(s) – e as respectivas flexões em género e em número – é, por vezes, substituído pelas seguintes locuções adverbiais:

mais de cachaquinze 117 (= muitos)mais de quanto(s), mais de quanta(s)mais qu’enfimmais qu’eu sei lá

109 Também se ouve a variante óspôis, sobretudo em Fornos.110 Fenómeno vulgar, mas não generalizado.111 Fenómeno vulgar que ocorre predominantemente nos grupos sociais não escolarizados.112 Fenómeno vulgar e generalizado.113 Fenómeno vulgar e generalizado. Ver Odete Ferreira, ob. cit., p. 23.114 Fenómeno frequente.115 Fenómeno vulgar que ocorre predominantemente nos grupos sociais não escolarizados.116 Fenómeno frequente, mas não generalizado.117 Fenómeno que ocorre com mais frequência no norte do concelho, com especial incidência em Fornos.

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um purradão

1.7. De dúvida

A dúvida exprime-se frequentemente pelos seguintes vocábulos ou expressões:

óquasque (= quase) 118

há p’rá’í (= mais ou menos, talvez, por volta de) 119

pori (= talvez, provavelmente, se calhar) 120

1.8. De lugar

p’ró pé de (= junto de) 121

2. ADJECTIVOS

a) No plural dos adjectivos formados por intermédio do sufixo -oso e -osa, a penúltima sílaba é, contrariamente à pronúncia da língua norma, sempre fechada 122:

gulôsos gulôsas medrôsos medrôsas

b) Também não seguem a pronúncia da língua norma, entre outros, os seguintes adjectivos 123:

nóbo (= novo)nóbinho (= novinho)córvo (= corvo)grósso (= grosso)pequéna (= pequena)préto 124 (= preto)quénte (= quente)

c) Os adjectivos masculinos terminados em ão formam o feminino em ôa ou ona 125

anôa (= anã)ladrona (= ladra)capitona (= capitã)

118 Fenómeno raro.119 Fenómeno frequente, mas não generalizado.120 Fenómeno frequente, mas não generalizado. Apenas o ouvimos em Fornos.121 Fenómeno vulgar e generalizado.122 Fenómeno vulgar e generalizado, comum a todo o nordeste transmontano.123 Fenómeno frequente.124 Este vocábulo, com esta pronúncia, apenas o ouvimos em Fornos.125 Este fenómeno é frequente nos grupos sociais não escolarizados.

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d) Quando se compara a qualidade de dois seres, nos comparativos anómalos, emprega-se sempre o advérbio mais

mais bom (= melhor)mais grande (= maior)mais melhormais pior

3. ARTIGOS

3.1. Definidos

a) O artigo definido o, em contracção com a preposição a pronuncia-se como -o tónico aberto 126:

Vou ò monte (= vou ao monte)

b) Os artigos o e a tomam a forma -ò e -à quando estão repetidos em frases coordenadas aditivas 127:

Fui ver o primo e à prima.Fui ver a Joana e ò primo dela.

4. CONJUNÇÕES

Na conjunção alternativa ou ocorre o fenómeno de monotongação

É uma coisa ô oitra (=…ou outra)É carne ô peixe? (= …ou…)

5. PRONOMES E LOCUÇÕES PRONOMINAIS

5.1. Pessoais

a) O pronome ele surge frequentemente guturalizado 128:

El é maluco. (= ele é maluco)

b) O pronome pessoal da 3.ª pessoa do plural é eis 129:

Pensas qu’eis são tolos?

c) Nos pronomes pessoais ela, elas, ao contrário da pronúncia da língua norma, dá-se o fechamento da vogal –e 130:

126 Fenómeno vulgar e generalizado.127 Ocorre em diversas localidades transmontanas. Ver Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 64 e Adelina Angélica Aragão Pinto, ob. cit., p. 56.128 Fenómeno frequente.129 Fenómeno raro, que ocorre somente nos grupos sociais menos escolarizados.

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êlaêlas

d) Os pronomes pessoais forma complemento o(s), a(s) tomam a forma no(s), na(s), depois de nasal 131:

Tem-na(s) na cabeça. Dão-no(a) a quem entendem.

e) Conservam a mesma forma depois das palavras terminadas em -r, -s ou -z, acrescentando-lhes um –i 132:

fazeri-os (= fazê-los) damosi-os (= damo-los) pomosi-os (= pomo-los) fêzi-os (= fê-los)

f) Os pronomes pessoais forma complemento lhe(s), lho(s) e lha(s) tomam a forma le(s), lo(s) e la(s), antes e depois do verbo 133:

Nunca le(s) fizeram mal (= nunca lhe(s) fizeram mal).Não lo(s) deram. (= não lho(s) deram).Queriam-le munto (= queriam-lhe muito).Já la(s) deram (= já lha(s) deram).

g) Emprego impessoal do pronome pessoal ele, usado como reforço do advérbio não 134:

- Amanhã vai chover.- Ele não.

h) O pronome pessoal eu é pronunciado com -e aberto, ao contrário da pronúncia da língua norma 135:

éu (= eu)

5.2. Demonstrativos

a) Guturalização do pronome aquele 136

aquel banco (= aquele banco)

130 Fenómeno vulgar, não generalizado, que ocorre em todas as localidades transmontanas nossas conhecidas.131 Cf. Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 86.132 Fenómeno frequente.133 Fenómeno frequente.134 Fenómeno frequente e generalizado.135 Fenómeno frequente, mas não generalizado.136 Fenómeno vulgar e generalizado.

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b) O plural de aquele é aqueis 137

Os meus borregos são aqueis (= (…) aqueles).

c) Os pronomes demonstrativos femininos mantêm a vogal -e fechada 138

êsta(s) [= esta(s)] êssa(s) [= essa(s)] aquêla(s) [= aquela(s)]

5.3. Possessivos

a) O ditongo -eu é aberto, tanto no singular como no plural 139

méu(s) [= meu(s)] téu(s) [= teu(s)] séu(s) [= seu(s)]

b) Outras vezes, o ditongo -eu do pronome de 1.ª pessoa, masculino, passa a vogal média fechada 140

Onde está mê pai?

5.4. Indefinidos

a) O ditongo -ou transforma-se em -ôi 141

ôitro(s) [= outro(s)]ôitra(s) [= outra(s)]

b) A locução pronominal indefinida qualquer um(a) realiza-se através do acrescentamento do fonema -a (paragoge) 142

qualquera um (= qualquer um)

6. PREPOSIÇÕES

Ectlipse do -m final da preposição com (e até da vogal que o precede) quando a palavra seguinte principia por vogal

“O meu anda co’ela ferrada” 143

Co’aquelas safas-te!Trabalhou c’um interesse (= …com um interesse).

137 Fenómeno frequente, mas restrito às pessoas mais idosas e não escolarizadas.138 Fenómeno vulgar, comum à esmagadora maioria das localidades do nordeste transmontano.139 Fenómeno frequente, mas não generalizado.140 Fenómeno raro (ouvi-o em Fornos). Em Ligares ouvi mei pai.141 Fenómeno frequente, mas não generalizado. Nem todas as pessoas idosas lhe dão preferência.142 Fenómeno frequente e generalizado.143 Odete Ferreira, ob. cit., p. 58.

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7. SUBSTANTIVOS

a) A penúltima sílaba é, regra geral, fechada, tanto no singular como no plural 144

côrpo - côrposfôgo – fôgosfôrno - fôrnosjôgo – jôgosmiôlo – miôlospôça - pôçaspôvo - pôvostôrdo - tôrdos

Algumas excepções: córno – córnos; óvo – óvos; bólso - bólsos.

b) O plural dos nomes terminados em -ão passa, de uma maneira geral, à terminação –ões 145

chões (= chãos)capitões (= capitães)

Por vezes, o plural é ães: grães (= grãos).

c) Os vocábulos que no plural padrão terminam em -ós passam a -es 146

filhóses (= filhós)póses (= pós)

d) Uso do plural para os nomes fígado e nariz 147

Até te arranco os fígados!Tenho os narizes entupidos.

e) O plural dos nomes terminados em -el e -il não se faz de acordo com a língua norma 148

anéles (= anéis)funiles (= funis)pincéles (= pincéis)

f) Alguns substantivos mudam de género 149

Não tem nenhuma dó dele (= não tem nenhum dó dele).a paga (= o pagamento)a risa (= o riso)

144 Fenómeno vulgar e generalizado.145 Há casos em que -ão passa a -ães. Por exemplo: o plural de grão, ao contrário da língua norma, é grães.146 Fenómeno vulgar, mas não generalizado.147 Fenómeno que ocorre predominantemente nos grupos menos escolarizados.148 Fenómeno raro que ocorre nos grupos sociais não escolarizados.149 Fenómeno vulgar e generalizado.

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o nacente (= a nascente)uma orvalheira (= um orvalho)

g) O substantivo colectivo cerejal designa um substantivo comum 150

cerejal (= cerejeira)

h) Há outros substantivos que não se pronunciam de acordo com a norma

rêmo (= remo)moêda (= moeda)témpo (= tempo)bólso (= bolso)médo (= medo)sóno (= sono)bérço (= berço)sélo (= selo)pórco (= porco)óvo (= ovo)caróço (= caroço)

8. NUMERAIS

a) Queda do -a (síncope) na sílaba interior do vocábulo

curenta (= quarenta)

b) Queda de -se (aférese) na sílaba inicial do vocábulo

senta (= sessenta)

9. VERBOS

9.1. Verbos auxiliares 151

9.1.1. Verbo Haver

a) A 3.ª pessoa do singular do presente do indicativo (empregado impessoalmente) é hai (= há);

b) A 2.ª pessoa do singular e a 3.ª pessoa do plural do presente do indicativo, usadas com a preposição de, são, respectivamente, hádes (= hás-de) e hádem (= hão-de).

9.1.2. Verbo Ter

150 Fenómeno vulgar e generalizado.151 O elenco dos verbos auxiliares varia de gramática para gramática. Não há uniformidade de critério para determinação dos limites da auxiliaridade. Sobre o assunto ver Eunice Pontes, Verbos auxiliares em português. Petrópolis, 1973.

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Nos falantes mais idosos e não escolarizados, este verbo conserva o -n intervocálico na 3.ª pessoa do plural do presente do indicativo:

tênem (= vêm)

9.1.3. Verbo Ser

a) A 1.ª e 2.º pessoas do plural presente do indicativo são, respectivamente, sâmos (= somos) e sondes ou séis 152(= sois);

b) O pretérito perfeito do indicativo conjuga-se assim: fui, fuste (= foste), foi, fữmos (= fomos), fustes (= fostes), foram.

c) O imperativo é sende (= sede);

9.1.4. Estar

a) A 1.ª e 2.ª pessoas do plural do presente do indicativo são, respectivamente, estêmos (= estamos) e estaides (= estais);

b) A sílaba tónica da 1.ª pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo é fechada: estivêmos (= estivemos);

c) A 1.ª e 2.ª pessoas do plural do presente do conjuntivo são proparoxítonas, tal como os verbos das conjugações em -er, -ir e -or: estêjamos (= estejamos), éstêjeis (= estejais) 153.

9.2. Verbos da 1.ª conjugação

9.2.1. Verbo Andar

a) A 2.ª pessoa do plural do presente do indicativo é andaides 154(= andais);

b) O pretérito perfeito do indicativo é andive (= andei), andivéste (= andaste), andêve (= andou), andivémos (= andámos), andivésteis (= andastes), andiveram (= andaram);

c) O imperfeito do conjuntivo é andivésse (= andasse), andivésses (= andasses), andivésse (= andasse), andivéssemos (= andássemos), andivésseis (= andásseis), andivéssem (= andassem).

d) O imperativo é andaide 155 (= andai).

9.2.2. Verbo Anunciar

152 Em Fornos ouvi pronunciar as duas formas: sondes e séis (esta a mais usada).153 Por vezes ouve-se estejaides (= estejais).154 A segunda pessoa do plural do presente do indicativo, em todas as conjugações, tem a terminação -ides: cavaides, correides, abrides, fugides, etc.155 O imperativo tem, em todas as conjugações, a terminação ide: esperaide, comeide, partide, etc.

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a) A 3.ª pessoas do singular e do plural do presente do indicativo são, respectivamente, anunceia (= anuncia) e anunceiam (= anunciam);

b) O presente do conjuntivo conjuga-se assim: anunceie (= anuncie), anunceies (= anuncies), anunceie (= anuncie), anunceiemos (= anunciemos), anunceiem (= anunciem).

9.2.3. Verbo Assoprar

O –o, em todos os tempos e modos, é fechado: assôpro, assôpram, assôprarei, etc.

9.2.4. Verbo Chegar

a) A vogal -e do infinitivo do verbo passa a -i: chigar.

b) O mesmo acontece na 1.ª e 2.ª pessoas do plural do presente do indicativo e do presente do conjuntivo: chigamos (= chegamos), chigais (= chegais), chiguemos (= cheguemos), chigueis (= chegueis); nos pretéritos do indicativo e do conjuntivo; no futuro imperfeito do modo indicativo e do modo conjuntivo; assim como no infinitivo pessoal, no condicional, no gerúndio, no particípio passado e nalgumas pessoas do imperativo presente: chiguemos (= cheguemos), chigai (= chegai).

9.2.5. Verbo Dar

O presente do conjuntivo conjuga-se assim: deia (= dê), deias (= dês), deia (= dê), dêiemos (= dêmos), deiens (= deis), deiam (= dêem).

9.2.6. Verbo Esperar

Antes do advérbio de lugar aí, ocorre o fenómeno fonético de aférese da sílaba -es no imperativo: pera aí! (= espera aí!).

9.2.7. Verbo Necessitar

Haplologia da sílaba -ce em todos os tempos e modos: nessitar (= necessitar).

9.2.8. Verbo Olhar

O imperativo presente é ulha (= olha).

9.2.9. Verbo Perguntar

Há metátese em todos os tempos e modos verbais: preguntar (= perguntar); preguntes (= perguntes).

9.2.10. Verbo Procurar

Usa-se frequentemente com o sentido de perguntar: já lhe procuraste quantos anos tem? (= …perguntaste …)

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Page 33: Estudo Fonético do Concelho de Freixo de Espada à Cinta

9.3. Verbos da 2.ª conjugação

9.3.1. Verbo Beber

Labialização do -e em todos os tempos e modos: buber (= beber).

9.3.2. Verbo Cobrir

O presente do indicativo, conjuga-se assim: cubro, cubres (= cobres), cubre (= cobre), cubrimos (= cobrimos), cubrides (= cobris), cubrem (= cobrem).

9.3.3. Verbo Comer

A 1.ª pessoa do presente do indicativo é pronunciada com -o tónico aberto: cómo (= como).

9.3.4. Verbo Correr

a) Tal como no verbo precedente, a 1.ª pessoa do presente do indicativo é pronunciada com -o aberto: córro (= corro).

b) A 2.ª pessoa do singular e a 1.ª e 2.ª pessoas do plural do pretérito perfeito do indicativo dá-se a substituição do -e da sílaba tónica por -i: corriste (= correste), corrimos (= corremos), corristes (= correstes) 156.

9.3.5. Verbo Crescer

O grupo -sc do verbo reduz-se a -c: crecer (= crescer) 157.

9.3.6. Verbo Dizer

a) O presente do indicativo conjuga-se assim: digo, dizes, diz, dezemos (= dizemos), dezeis (= dizeis), dizem.

b) Tanto no pretérito imperfeito do indicativo, como no infinitivo, no imperativo e no gerúndio, o verbo conjuga-se com -e antes da fricativa -z .

c) O particípio passado é dezido (= dito).

9.3.7. Verbo Entender

Em todos os tempos e modos, dá-se a substituição da vogal nasal [ẽ] pela vogal nasal [i˜] 158.

9.3.8. Verbo Fazer

156 O mesmo ocorre nos verbos aprender, comer, etc. 157 O mesmo acontece com nascer, descer, etc.158 O mesmo acontece com verbos de outras conjugações: imprestar (= emprestar), mintir (= mentir), etc.

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a) O presente do indicativo conjuga-se desta forma: fazo (= faço), fais (= fazes), fai (= faz), fazemos, fazeides (= fazeis), faiem (= fazem).

b) O presente do conjuntivo é sempre conjugado com a fricativa –z, por analogia com o infinitivo: faza (= faça), fazas (= faças), faza (= faça), fázamos (= façamos), fázeis (= façais), fazam (= façam).

c) A 1.ª pessoa do pretérito perfeito do indicativo é fez (= fiz).

9.3.9. Verbo Morrer

a) Usa-se muitas vezes como verbo reflexo: Morreu-se. Quem se morreu?

b) O ditongo -eu da 3.ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo é aberto: morréu (= morreu).

9.3.10. Verbo Querer

a) A 2.º pessoa do presente do indicativo é qués (= queres).

b) A 1.ª e 3.ª pessoas do singular do pretérito perfeito é quês (= quis).

9.3.11. Verbo Saber

O ditongo -ou, de todos os tempos e modos em que está presente, monotonga -u: sube (= soube), subera (= soubera), subesse (= soubesse), suber (= souber).

9.3.12. Verbo Trazer

A 2.ª e a 3.ª pessoas do singular e a 3.ª pessoa do plural do presente do indicativo conjugam-se assim: tráis (= trazes), trái (= traz), tráiem (= trazem).

9.3.13. Verbo Torcer

Transposição de vogal e consoante vibrante na mesma sílaba (metátese), em todos os tempos e modos: trocer (= torcer).

9.3.14. Verbo Valer

Dá-se a despalatalização em todos os modos: valo (= valho), vala (= valha), etc.

9.4. Verbos da 3.ª conjugação

9.4.1. Verbo Abrir

a) A 1.ª pessoa do singular e a 2.ª pessoa do plural do presente do indicativo conjugam-se assim: aibro (= abro); abrides (= abris);

b) O imperativo é abride (= abri).

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9.4.2. Verbo Cuspir

A 2.ª e a 3.ª pessoas do singular do presente do indicativo, numa relação analógica com o infinitivo, tal como o imperativo, são conjugadas com u: cuspes (= cospes), cuspe (= cospe).

9.4.3. Verbo Dormir

a) Há metátese no infinitivo e, por vezes, noutros modos e tempos: dromir (= dormir), drumo (= durmo), drumisse (= dormisse).

b) A 2.ª pessoa do singular do presente do conjuntivo é dórmas (= durmas).

9.4.4. Verbo Fugir

Por analogia com o infinitivo, a 2.ª e a 3.ª pessoas do singular e a 3.ª pessoa do plural do presente do indicativo, assim como o imperativo presente, conjugam-se com u antes de fricativa sonora – grafema -g: fuges (= foges), fuge (= foge), fugem (= fogem).

9.4.5. Verbo Ir

a) A 2.ª pessoa do singular e a 3.ª e 4.ª pessoas do plural do pretérito perfeito do indicativo são, respectivamente, fuste (= foste), fumos (= fomos) e fustes (= fostes).

b) O imperativo é inde (= ide).

9.4.6. Verbo Medir

A 1.ª pessoa do presente do indicativo é mido (= meço).

9.4.6. Verbo Ouvir

O ditongo ou concorre com o ditongo oi: oivir (= ouvir), oivi (= ouvi), etc.

9.4.7. Verbo Pedir

a) A 1.ª pessoa do presente do indicativo é pido (= peço).

b) A 1.ª, 2.ª e 3.ª pessoas do singular e a 3.ª pessoa do plural do presente do conjuntivo conjugam-se, respectivamente, assim: pida (= peça), pidas (= peças), pida (= peça), pidam (= peçam).

9.4.8. Verbo Vir

a) Tal como noutras regiões do país, a 2.ª pessoa do plural do presente do indicativo é viêmos (= vimos).

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b) A 3.ª pessoa do singular do presente do indicativo é bêu ou vêu (= veio) 159.

10. Interjeições e locuções interjectivas

À certa! (= Isso é que era bom! Não querias mais nada!?) Ala! (= Desaparece! Põe-te a andar!) Põe-te na alheta! (= Desaparece! Põe-te a andar!) Andor! (= Fora daqui! Desaparece!) Arreda! (= Afasta-te!) Arre-diabo! (= Caramba! Não me digas!) Arriba! (= Acima! Força!) Aixe! (= Não me digas! Caramba!) Axe! (= Não me digas! Caramba!) Bem m’eu finto! (= Não acredito!) Bô! (= Não me digas! Pode lá ser! Não acredito!) Bonda! (= Chega! Basta!) Bota p’ra lá! (= Força! Avança! Continua!) Caraças! (= Caramba! Porra!) Caracho! (= Caramba! Porra!) Carago! (= Caramba! Porra!) Cautela co’a obra! (= Impressionante! Extraordinário!) Che! (= Pode lá ser! Não me digas! Impressionante!) Coche-coche! (= Voz com que se chamam os porcos) Concho! (= Caramba! Porra! Não me digas!) Conho! (= Caramba! Porra! Não me digas!) Ó c’um catano! (= Que chatice! Não me digas!) Olha se queres ver! (= Impressionante! Não me digas!) Piu-piu! (= Voz com que se chamam as galinhas) Rais ta parta! (= Raios te partam! O diabo que te leve!) Susquedono! (= Rua! Fora!) Uche! (= Pode lá ser!) Xó! (= Grito para fazer parar as bestas)

CAPÍTULO IV – SINTAXE

1. Emprego do verbo ficar como reflexo, no sentido de adormecer e de morrer 160

O menino ficou-se no carro (= o menino adormeceu no carro).Ficou-se como um passarinho (= morreu …).

2. Emprego do verbo morrer como reflexo

O passarinho morreu-se (= o passarinho morreu). Quem se morreu? (= quem morreu?)

3. Emprego do verbo cair como reflexo 161

159 Fenómeno raro. Ocorre em grupos minoritários pouco escolarizados e/ou não escolarizados.160 Ver Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p. 103.161 Ver Adelina Angélica Aragão Pinto, ob. cit., p.73.

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Caiu-se-le a albarda (= caiu-lhe a albarda).

4. Emprego do verbo jogar no sentido de fazer

Joguêmos ali uma brincadeira (= fizemos ali uma brincadeira).

5. Emprego do verbo saltar no sentido de começar

Saltou a dizer… (= começou a dizer…)

6. As orações impessoais podem construir-se 162:

a) Usando o pronome pessoal ele como reforço do advérbio não: - Já te pagou a jeira? - Ele não.

b) Usando o pronome ele como sujeito de qualquer verbo impessoal:

Olha o que ele chove!

c) Usando o verbo ir em vez do verbo haver:

Vai em três dias que semeei o pão.

7. Uso frequente da conjugação perifrástica, que, com o verbo ir, exige sempre a intercalação da preposição a 163

Vou-me a ir embora.Vou a comer qualquer coisa.

8. Uso enfático do advérbio cá 164

Eu cá sei.Eu cá não fui.

9. Concordância do substantivo com o numeral 165

Vinte e um ano.

10. Uso do futuro e do condicional sem recurso à tmese

Farei-os amanhã (= fá-los-ei amanhã).Nem que custassem 10 contos ele comprari-as (=…comprá-las-ia).

11. Emprego do gerúndio pela oração com conjunção temporal

162 Ver Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit., p.102.163 Idem, ibidem, p. 103.164 Idem, ibidem, p. 104.165 Ver Maria Augusta Martins Teixeira, ob. cit. p. 104.

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Em casando… (= quando casar…)Em falando… (= quando falar…)

12. Substituição do pronome pessoal forma complemento lhe(s) pelas formas le, lo, la, las, les

«Ai se o pai soubesse, dava-le (= dava-lhe) uma tunda que o derreava.» 166

13. Outras construções sintácticas

Ambos os dois (= ambos).Olha a ver!Enquanto e não (= entretanto).Foi ò p´rálem (= naquela direcção).Foi ò p’ra diante.Foi ò p’ra baixo.Começou a andar d’ó p´ra trás.Foi d’a pé.De quando em onde (= de vez em quando).Tenho lá que farte (= tenho em abundância).

CAPÍTULO V – PROVÉRBIOS E EXPRESSÕES DO SABER POPULAR

Abril, águas mil.A capa e a merenda nunca pesaram.A castanha é de quem a apanha.A cavalo dado não se olha dente.Acompanha com o bom e serás como ele; acompanha com o mau e serás pior do que ele.A fonte de água mais pura tem sempre lodo no fundo.Água corrente não mata gente.Água mole em pedra dura tanto dá até que fura.A homem calado e mulher barbeada, em tua casa não dês nada.A horta quer ver o dono todos os dias.A laranja de manhã é oiro, ao meio-dia é prata e à noite mata.A mentira dá volta ao mundo, enquanto a verdade calça os sapatos.Amigo verdadeiro vale mais que dinheiro.A minha comadre vem cá, se trouxer levará.

166 Odete Ferreira, ob. cit., p. 63.

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A mulher e a sardinha, da mais pequenina.Ande o frio por onde andar, no Natal vem cá parar.Ano de nevão, ano de pão.Antes que cases vê o que fazes.A puta e o cão só olham para a mão.Ao ano andarás, aos dois falarás 167.A ocasião faz o ladrão.Ao rico não devas, ao pobre não prometas.Aos mortos e aos ausentes não insultes nem atormentes.A quem amassa e peneira não falta quem a queira.A quem se muda, Deus o ajuda. A raposa tem sete manhas e a mulher tem as manhas de sete mil raposas.Até ao lavar dos cestos é vindima.Até aos quarenta bem passo; depois dos quarenta, ai a perna, ai o braço.Atrás de mim virá quem pior fará.Atrás dum forrador vem um bom gastador.A verdade é como o azeite: vem sempre ao de cima.Azeite, vinho e amigo, o mais antigo.Barriga vazia não conhece alegria.Beatos, brasileiros e mirandeses, raros são os que são boas reses.Bem branco é o papel e limpa-se o cu a ele.Bem sabe a fogaça alheia na casa cheia.Besta que geme a carga não teme.Burro com fome, cardos come.Burro morto, cevada ao rabo.Burro velho não toma andadura.Caldeireiro na terra, água na serra 168.Candeia que vai à frente alumia duas vezes.Cão que ladra não morde.Capoeira onde há galo não canta galinha.Casamento e mortalha, no céu se talha. Casa onde caibas, terra quanta vejas.Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.Casar e apartar.Cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém.Cavar e estercar 169 em Agosto, ao lavrador alegra o rosto.Chega-te aos bons e serás como eles, chega-te aos maus e serás pior do que eles.Círculo na Lua, água na rua.Coisa ruim não tem perigo.Com água parada não mói o moinho.Conforme o santo, assim a oferta.Conselho de raposa, morte de galinha.Conselho de vinho é falso amigo.Cordeiro manso mama a sua mãe e alheia.Cria fama e bota-te a dormir.Da mão à boca se perde a sopa.

167 Ditado relacionado com o crescimento dos bebés.168 Está relacionado com o período invernoso em que o caldeireiro vinha à aldeia (Fornos) vender as suas sertãs (= frigideiras), caldeiras, etc. 169 Estrumar

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Dar, dá o relógio horas e ainda não é sempre.De mal agradecidos está o inferno cheio.De médico e de louco todos temos um pouco.De pequenino é que se torce o pepino.Depois de filha casada, não lhe faltam maridos.Depressa e bem não há quem.De um bom ninho sai um ruim passarinho.Deus ao velho faz uma esmola: tira-lhe os dentes mas abre-lhe a gola 170.Deus que o marcou algum defeito lhe encontrou.Dia de S. Martinho, vai à adega e prova o vinho.Dinheiro emprestado, inimigo ganhado.Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és.Do cerejo ao castanho bem me amanho; do castanho ao cerejo mal me vejo.Do prato à boca se perde a sopa.Dos Santos ao Natal, Inverno crual.Do trabalho mal feito não aparece dono.Eleva o teu filho acima de ti, que ele se envergonhará de ti.Em casa de ferreiro, espeto de pau.Em Fevereiro, crescem os dias um salto de carneiro.Em Março, tanto durmo como tanto faço.Em Março, iguala o dia à noite e o pão 171 ao chaugarço 172.Em Agosto, frio no rosto.Em vinte de Janeiro dá o Sol no abixeiro.Enquanto o gordo emagrece, o magro fenece.Entre marido e mulher não metas a colher.Erva ruim não a queima a geada.Esmola Mateus, primeiro aos teus.Está a cabra esfolada 173 para Castela, lavrador põe-te à janela.Fala pouco e bem, ter-te-ão por alguém.Faz o bem e não olhes a quem.Fevereiro engana a mãe no ribeiro.Fevereiro quente traz o diabo no ventre.Filho da mesma porca tem o mesmo roncar.Filho és, pai serás, como fizeres assim acharás.Filhos criados, trabalhos dobrados.Foge do mau vizinho e do excesso de vinho.Fui (pedir) ao vizinho, envergonhei-me; voltei para casa, remediei-me. Gaba-te cesto que hás-de ir à vindima.Galinha pedrês não a comas, não a vendas nem a dês.Grão a grão enche a galinha o papo.Guarda da risa 174para a chora.Guarda que comer, não guardes que fazer.Homem pequenino, ou velhaco ou dançarino.Homem prevenido vale por dois.Homem velho e mulher nova, filhos até à cova.Longe da vista, longe do coração.170 Goela.171 Seara172 O pão está aqui por seara. O chaugarço é uma espécie de urze.173 Céu que, à noite, apresenta uma cor avermelhada, anunciando calor para o dia seguinte.174 Riso.

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Lua Nova trovejada, trinta dias é molhada.Mais depressa se apanha um mentiroso que um coxo.Mais vale ruim acordo que boa sentença.Mais vale um pássaro na mão que dois a voar.Mãos que não dais, por que esperais?Março, Marçagão, manhã de Inverno, tarde de Verão.Março molhado enche o celeiro e farta o gado.Meias de três nem o diabo as quês.Merenda comida, companhia desfeita. Morra gato, morra farto.Morte desejada é vida prolongada.Mulher amovida 175 ao ano parida.Mulher beata, mulher velhaca. Mulher doente, mulher para sempre.Não cuspas para o ar, que te pode cair em cima.Não guardes para amanhã o que podes fazer hoje.Não há amor como o primeiro, nem luar como o de Janeiro.Não peças a quem pediu, nem sirvas a quem serviu.Não te fies em sapatos de defunto.Não te rias do mal do vizinho, que o teu já vem a caminho.Natal na praça e Páscoa à lareira.Nem por muito madrugar amanhece mais cedo.Ninguém vê o argueiro no seu olho.No dia de S. Lourenço, vai à vinha e enche o lenço.No dia de S. Martinho, salpicão e vinho.No dia de S. Martinho, vai à adega e prova o vinho.No dia de S. Sebastião, junta-se a perdiz com o perdigão.No Entrudo, alho porretudo 176.No primeiro dia as visitas são gratas, mas no terceiro fartam.No S. Lourenço, nem no bolso nem no lenço.Num lado se põe o ramo, noutro se vende o vinho.O comer e o ralhar, o ponto é principiar.O figo não é de quem o apalpa, é de quem o papa.O filho casa-o quando quiseres, a filha quando puderes.O lume ao pé da estopa 177, o Diabo assopra 178.O homem arca, a mulher abarca.O mal entra às carradas e sai às polegadas.O pão dos tolos todo se vai em bolos.O pão quente traz o diabo no ventre.O pouco agrada e o muito enfada.O que não se sabe não se sente.O que nasce torto, tarde ou nunca se endireita.Os homens são como os pardais, os mais pequenos são como os demais.Pão com olhos, queijo sem olhos e vinho que salte aos olhos.Pão e vinho já andam caminho.Pão quente, muito na mão e pouco no ventre.

175 Que aborta.176 Deriva de porreta (= talo verde da cebola ou do alho).177 Parte grossa do linho que sobra, depois de assedado; impurezas do linho178 Pronuncia-se assôpra.

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Para baixo todos os santos ajudam.Para o ano ser bom de pão, sete neves e um nevão.Pela aragem, logo se vê quem vai na carruagem.Pela boca morre o peixe.Pelo Natal, crescem os dias um salto de pardal.Pelo S. Martinho prova o teu vinho.Pensai no mau, aparelhai o pau.Por cima folhos e rendas, por baixo nem fraldas.Por fora cordas de viola, por dentro pão bolorento.Potro de ano já pode com o amo.Poupa e terás, trabalha e verás.Presunção e água benta, cada um toma a que quer.Quando Deus quer, com todos os ventos chove.Quando nasce uma panela nasce logo um testo 179 para ela.Quem aos vinte não é e aos trinta não tem, aos quarenta não é ninguém.Quem as coisas muito apura, a vida se lhe torna dura.Quem com garotos se deita mijado se levanta.Quem com putas faz cabedal ou vai parar à cadeia ou ao hospital.Quem com putas joga o vinte180 ou fica pobre ou pedinte.Quem conta um conto, acrescenta-lhe um ponto.Quem dá o pão dá a educação.Quem de novo não morre, de velho não escapa.Quem desdenha quer comprar.Quem diz o que quer ouve o que não quer.Quem fora vai casar, ou se engana ou quer enganar.Quem gasta o que tem, a pedir vem.Quem maltrata um animal não é de bom natural.Quem muito andou, já pouco tem para andar.Quem muito corre, pouco anda.Quem não deve não teme.Quem não poupa na água e na lenha, não poupa no mais que tenha.Quem não se aventurou, não perdeu nem ganhou.Quem não trabuca não manduca.Quem o alheio veste na praça o despe.Quem quer bolota trepa.Quem quer ser respeitado, dá-se ao respeito.Quem se deita sem ceia, toda a noite rabeia 181.Quem se estende mais do que a roupa, ficam-lhe os pés de fora.Quem semeia ventos, colhe tempestades.Quem tarde vier comerá do que trouxer.Quem te avisa amigo é.Quem troca caminhos por atalhos mete-se em trabalhos.Quem tudo quer tudo perde.Quem vê o seu povo vê o mundo todo.Quem veste de ruim pano veste duas vezes por ano.Ralham as comadres, descobrem-se as verdades.Santos da terra não fazem milagres.

179 Tampa.180 Certo jogo de azar.181 Padece, sofre.

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Se aqui me ladram, além me mordem.Semeia em pó para colher de mó.Semeia-me no pó e de mim não tenhas dó.Se não queres casar mal, casa com um igual.Se queres bom conselho, pede-o ao velho.Se queres ter bom alhal, semeia-o pelo Natal.Se queres ver a terra arder, é mandar os obreiros e não os ir ver.Se queres ver o homem morto, dá-lhe couves em Agosto.Serviços à noite, de manhã se vêem.Setembro molhado, figo estragado.Setembro ou seca as fontes ou leva as pontes.Só te lembras de Santa Bárbara quando ouves trovejar.Tantas vezes vai o cântaro à fonte que um dia lá lhe fica a asa.Tanto tens, quanto vales.Tão ladrão é o que vai à horta como o que fica à porta.Tem-o chicoso! (= exprime uma convicção negativa: não o tem)Toda a galinha enquanto não põe é franga.Trabalho feito não mete fastio.Tristezas não pagam dívidas.Tudo o que procuramos na terra, na terra o temos de deixar.Uma vima 182 na segada 183 vale por uma estercada 184.Vale mais uma ruim componenda 185que uma boa contenda.Velhos e porcos, aproveitam-se depois de mortos.Vinho e amigo, o mais antigo.Vinte galinhas e um galo comem tanto como um cavalo.Viúva rica, casada fica.

CAPÍTULO VI – CONCLUSÃO

Dentro das nossas limitações científicas, estudámos, em 2005, o falar do concelho de Freixo de Espada à Cinta. Procurámos assim preservar uma cultura linguística, histórica etnográfica e sociológica que nos singulariza no país e nos integra e distingue da região envolvente. Quando falamos de preservação, não entendemos a língua, o falar – aqui percebido como uma variedade da língua norma, sem o grau de coerência do dialecto - como algo de imutável. Conservar uma língua, um falar implica reconhecer como imprescindível a sua mudança natural. Estas sempre foram um instrumento privilegiado de comunicação. O seu funcionamento não é conflitual com a mudança, antes pelo contrário implica-a. As línguas e os falares não são produtos mortos, mas sim realidades dinâmicas. Por esta razão, não sentimos qualquer nostalgia pelo perecimento de alguns vocábulos e algumas maneiras de dizer. E também não sentimos repulsa ou estranheza pelo surgimento de novas palavras e novas maneiras de dizer. O falar deste concelho integra-se no falar geral transmontano. Não é um subfalar do falar transmontano, mas contém alguns elementos distintivos que lhe conferem identidade própria.

182 Lavra.183 Ceifa.184 Estrumação.185 Discussão.

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Não podemos deixar de assinalar que o concelho de Freixo tem, no seu próprio seio, algumas diferentes marcas linguísticas e fonéticas. O sul distingue-se do norte do concelho. As freguesias distinguem-se umas das outras; todavia, há mais elementos comuns do que marcas de individualização. Fazia todo o sentido que este trabalho fosse complementado com um léxico concelhio. Optámos por não o fazer, porque este já consta do nosso Dicionário do Falar de Trás-os-Montes e Alto Douro (ver bibliografia).

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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- (2006), Dicionário do Falar de Trás-os-Montes e Alto Douro, Lisboa, Âncora Editora/Edições Colibri.

- «Algumas características fonético-fonológicas de Lagoaça», em Lagoaça – Terra Nossa (Revista da Comissão de Festas de N.ª Sra. das Graças), n.º 3, 2004, pp. 25-35.

- (2004), Uma aldeia transmontana: morfologia social de Fornos, Freixo de Espada à Cinta, Câmara Municipal de Freixo de Espada à Cinta (pode aceder a este trabalho no site www.bragancanet.pt/bemposta/html/fornos.htm).

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CINTRA, Luís Filipe Lindley; CUNHA, Celso (1984), Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Edições João Sá da Costa.

FERREIRA, Amadeu (1999), Quem vê o seu povo…, Freixo de Espada à Cinta, Câmara Municipal de Freixo de Espada à Cinta.

- (2002), ... O Mundo Todo, Freixo de Espada à Cinta, Câmara Municipal de Freixo de Espada à Cinta.

FERREIRA-PINTO, Amélia da Conceição Inocêncio de Sousa (diss. policop. – 1955), Contribuição para uma monografia etnográfica, linguística e folclórica do concelho de Alfândega da Fé, Alfândega da Fé, Câmara Municipal de Alfândega da Fé (1.ª ed. 2002)

FERREIRA, Odete (2000), Rente Aos Pássaros, Freixo de Espada à Cinta, Câmara Municipal de Freixo de Espada à Cinta.

GUIMARÃES, Rui Dias (2002), O Falar de Barroso – O Homem e a Linguagem, Mirandela, João Azevedo Editor. PINTO, Adelina Angélica Aragão, «Deilão – Estudo linguístico e etnográfico», em Brigantia, vol. IX, números 3/4, Julho/Dezembro de 1989, pp. 3-47; vol. X, n.º 1 e 2, Janeiro/Junho de 1990, pp. 3-30.

REBELO, Joaquim Manuel (1995), A Terra Transmontana e Altoduriense – notas etnográficas, Torre de Moncorvo, Câmara Municipal de Torre de Moncorvo/Associação Cultural de Torre de Moncorvo.

SANTOS, Maria José de Moura (1967), Os falares fronteiriços de Trás-os-Montes (vol.

XII, tomo II; XIII e XIV), Coimbra, Separata da ‘Revista Portuguesa de Filologia’.

TEIXEIRA, António José, «Adágios populares, pragas e curiosidades linguísticas de Freixo de Espada à Cinta», em Brigantia, vol. IV, n.º 3, 1984, pp. 357-370.

TEIXEIRA, Maria Augusta Martins (diss. dact. – 1947), Terras de Bragança (linguagem e costumes de França, Baçal, Babe, Vila Meã, Sarzeda e Rebordãos), Lisboa.

VASCONCELOS, José Leite de (1982), Etnografia Portuguesa (vols. II [1980], V e VI), Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda.

- (1986), Opúsculos, (vol. VI), Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda.

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Índice

Dedicatória pág. 2Citações 3Capítulo I – Introdução 4Capítulo II – Características fonético-fonológicas 51. Consoantes 52. Vogais, semivogais, ditongos. Outros casos. 9Capítulo III – Particularidades morfológicas 221. Advérbios e locuções adverbiais 221.1. De negação1.2. De afirmação1.3. De inclusão1.4. De ordem1.5. De tempo1.6. De quantidade1.7. De dúvida1.8. De lugar

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2. Adjectivos 3. Artigos 3.1. Definidos4. Conjunções5. Pronomes e locuções pronominais5.1. Pessoais5.2. Demonstrativos5.3. Possessivos5.4. Indefinidos6. Preposições7. Substantivos8. Numerais9. Verbos9.1. Verbos auxiliares9.1.1. Verbo haver9.1.2. Verbo ter9.1.3. Verbo ser9.1.4. Verbo estar9.2. Verbos da 1.ª conjugação9.2.1. Verbo andar9.2.2. Verbo anunciar9.2.3. Verbo assoprar9.2.4. Verbo chegar9.2.5. Verbo dar9.2.6. Verbo esperar9.2.7. Verbo necessitar9.2.8. Verbo olhar9.2.9. Verbo perguntar9.2.10. Verbo procurar9.3. Verbos da 2.ª conjugação9.3.1. Verbo beber9.3.2. Verbo cobrir9.3.3. Verbo comer9.3.4. Verbo correr9.3.5. Verbo crescer9.3.6. Verbo dizer9.3.7. Verbo entender9.3.8. Verbo fazer9.3.9. Verbo morrer9.3.10. Verbo querer 9.3.11. Verbo saber9.3.12.Verbo trazer9.3.14. Verbo valer9.4. Verbos da 3.ª conjugação9.4.1. Verbo abrir9.4.2. Verbo cuspir9.4.3. Verbo dormir9.4.4. Verbo fugir9.4.5. Verbo ir9.4.6. Verbo ouvir

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9.4.7. Verbo pedir9.4.8. Verbo vir10. Interjeições e locuções interjectivasCapítulo IV – SintaxeCapítulo V – Provérbios e expressões do saber popularCapítulo VI – ConclusãoBibliografia consultada

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