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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE SERVIÇO SOCIAL FERNANDA LÍLIAN LIMA MOTA ADOLESCENTES (DES) PROTEGIDOS: UM ESTUDO DE CASO REALIZADO NA 5ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DE FORTALEZA”. FORTALEZA 2013

FERNANDA LÍLIAN LIMA MOTA - faculdadescearenses.edu.br · Meu muito obrigado a Professora e Mestre Rúbia Cristina que aceitou ser minha orientadora nesse trabalho, pela paciência

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

FERNANDA LÍLIAN LIMA MOTA

“ADOLESCENTES (DES) PROTEGIDOS: UM ESTUDO DE CASO REALIZADO

NA 5ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DE FORTALEZA”.

FORTALEZA

2013

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FERNANDA LÍLIAN LIMA MOTA

“ADOLESCENTES (DES) PROTEGIDOS: UM ESTUDO DE CASO REALIZADO

NA 5ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DE FORTALEZA”.

Monografia submetida à aprovação Coordenação do curso de Serviço Social do Centro de Ensino Superior do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de graduação.

FORTALEZA

2013

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FERNANDA LÍLIAN LIMA MOTA

“ADOLESCENTES (DES) PROTEGIDOS: UM ESTUDO DE CASO REALIZADO

NA 5ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DE FORTALEZA”.

Monografia como pré-requisito para obtenção do título de Bacharelado em Serviço Social, outorgado pela Faculdade Cearense – FAC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores. Data da aprovação:__ /__ /___

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________

Profª. Ms. Rúbia Cristina Martins Gonçalves (Orientadora) Faculdade Cearense

__________________________________________________

Prof. Ms. Homero Bezerra Ribeiro Faculdade Cearense

__________________________________________________

Ms. Veranísia Damasceno Rocha Assistente Social do Juizado da Infância e da Juventude

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A Deus,

pelo dom da vida, pela coragem e por me

fortalecer sempre diante as dificuldades.

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Ao meu falecido pai, Dedé Cardoso, pelas lições de caráter e dignidade. As palavras são falhas para expressar a falta que me faz, mas tenho a certeza de que nunca estarei só, pois um anjo me guia lá do céu.

A minha mãe, Fátima, mulher guerreira e de fibra, a melhor

amiga que eu poderia ter. Pelos conselhos e suporte que me proporciona nessa caminhada de vida.

Ao meu marido, Igor, pelo amor e companheirismo, por saber

que foi o maior incentivador para que eu concluísse o meu sonho, por saber que sempre poderei contar contigo. Se fosse pra escolher um marido, te escolheria quantas vezes fosse preciso.

Ao meu filho, Renato, por me dar muitas alegrias e motivação

para viver, por me fazer sentir o prazer de ser mãe e conhecer a grandeza desse amor, aprendendo essa arte a cada dia e, por me fazer acreditar na possibilidade de construirmos um mundo melhor.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, pois sem ele nada é possível.

Aos meus pais, pelo amor, por ser o meu alicerce

desde o nascimento e por estar sempre ao meu lado dando força, apoiando minhas decisões.

Ao meu marido Igor pela paciência, pelo carinho e por me

proporcionar muita felicidade.

Ao meu filho Renato, uma pessoa muito especial na minha vida, que eu amo muito.

As minhas queridas e verdadeiras amigas que conquistei nestes quatro anos,

Soraia e Andréa que me ajudaram de alguma forma na confecção desse trabalho, como também as agradeço por todos os momentos de luta,

choro e vitórias que tivemos juntas.

À equipe técnica da Liberdade Assistida Judiciária, da 5a Vara do Juizado da Infância e da Juventude, em especial

minha técnica de estágio Veranísia Damasceno Rocha e a Fátima Martins, pela paciência e pelo meu crescimento profissional.

Aos adolescentes da 5a Vara do Juizado da Infância e da Juventude,

da medida sócio-educativa de Liberdade Assistida, que fizeram parte da entrevista deste estudo.

Meu muito obrigado a Professora e Mestre Rúbia Cristina

que aceitou ser minha orientadora nesse trabalho, pela paciência e disposição.

Aos amados professores que estiveram ao nosso lado desde o primeiro semestre

contribuindo para minha formação acadêmica, dando exemplo de profissionais que nos conduzirão em nossa prática.

À banca examinadora composta por Veranísia e Homero,

agradeço pela disponibilidade e pela oportunidade de conhecer grandes professores.

A todos que torcem por mim e acreditam no meu potencial.

Fernanda Lílian Lima Mota

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RESUMO

O presente trabalho tem como o objeto de estudo as motivações que

levam os adolescentes a cometerem ato infracional em Fortaleza. O interesse pelo

tema criança e adolescente envolvido com ato infracional surgiu da experiência

vivida no campo de estágio na 5ª Vara da Infância e da Juventude no setor da

Liberdade Assistida. Constituem-se os objetivos do trabalho identificar o grau de

diálogo na manutenção de vínculos entre os adolescentes e familiares, analisar o

papel da educação na vida desses adolescentes, conhecer a relação do ato

infracional e as drogas. As categorias a serem analisadas serão adolescência,

violência e ato infracional. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, documental e

exploratória utilizando como técnica a coleta de dados e a entrevista estruturada

com 06 adolescentes admitidos na 5ª Vara da Infância e da Juventude. Chegou-se a

conclusão de que os adolescentes precisam da proteção da família, sociedade e do

Estado, pois os mesmos possuem pouca escolaridade, problemas familiares e

principalmente o envolvimento com as drogas.

Palavras-chave: Criança e Adolescente. Estatuto da Criança e do Adolescente. Ato

Infracional.

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ABSTRACT The present work has as the study object the motivations that take the

adolescents to commit infracional act in Fortaleza. The interest for the subject child

and involved adolescent with infraction act appeared of the experience lived in the

field of period of training in 5ª Pole of Infancy and Youth in the sector of the Attended

Freedom. The objectives of the work consist to identify the degree of dialogue in the

maintenance of bonds between the familiar adolescents and, to analyze the paper of

the education in the life of these adolescents, to know the relation of the infraction act

and the drugs. The categories to be analyzed will be adolescence, violence and

infraction act. One is about a bibliographical, documentary and exploratory research

using as technique the collection of data and the interview structuralized with 06

adolescents admitted in 5ª Pole of Infancy and Youth. It was arrived conclusion that

the adolescents need the protection of the family, society and of the State, therefore

the same ones possess little familiar escolaridade, problems and mainly the

involvement with the drugs.

Keywords: Child and Adolescent. Statute of the Child and the Adolescent. Act

Infraction.

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1: Faixa Etária dos Adolescentes Admitidos.......................................... 52

GRÁFICO 2: Gênero dos Adolescentes Admitidos................................................. 53

GRÁFICO 3: Situação Escolar dos Adolescentes Admitidos.................................. 55

GRÁFICO 4: Tipo de Ato Infracional mais cometido............................................... 59

GRÁFICO 5: Tipo de Drogas Ilícitas Usadas pelos Adolescentes.......................... 62

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LISTA DE SIGLAS

CEDECA: Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará

CF/88: Constituição Federal de 1988 CNACL: Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei CREAS: Centro de Referencia Especializado da Assistência Social

DCA: Delegacia da Criança e do Adolescente DCECA: Delegacia de Combate a Exploração de Crianças e adolescentes ECA: Estatuto da criança e do Adolescente FEBEM: Fundação Estadual de Bem-Estar do Menor FUNABEM: Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor MSE: Medida Socioeducativa PNBM: Política Nacional de Bem-Estar do Menor SAM: Serviço Nacional de Assistência aos Menores SDH: Secretaria de Direitos Humanos SEDH: Secretaria Especial de Direitos Humanos SINASE: Sistema Nacional de atendimento Socioeducativo URLBM: Unidade de Recepção Luiz Barros Montenegro

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................... 11

1. HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E DOS

ADOLESCENTES................................................................................................ 20

1.1. História Mundial sobre crianças e adolescentes........................................... 20

1.2. Código de Menores de 1927......................................................................... 24

1.3. A Constituição Federal de 1988.................................................................... 27

1.4. O Estatuto da Criança e do Adolescente...................................................... 30

2. ADOLESCENTE E ATO INFRACIONAL......................................................... 34

2.1. E a adolescência?......................................................................................... 34

2.2. Violência e ato infracional............................................................................. 37

2.3. Elementos que influenciam o ato infracional................................................. 40

3. A 5ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE: ETNOGRAFIA DA

INSTITUIÇÃO...................................................................................................... 45

3.1. Histórico da instituição do objeto de estudo.................................................. 45

3.2. O perfil e análise das entrevistas obtidas na pesquisa de campo dos adolescentes atendidos pela 5ª Vara da Infância e da Juventude.....................

50

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................. 67

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 69

APÊNDICES......................................................................................................... 72

Apêndices A: Termo de consentimento para entrevista....................................... 72

Apêndices B: Roteiro de Entrevista...................................................................... 74

ANEXOS.............................................................................................................. 75

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INTRODUÇÃO

Um dos problemas sociais que mais chamam a atenção das autoridades

e da própria sociedade é a exploração da criança e do adolescente, bem como a sua

relação conflituosa com a lei.

O interesse pelo tema criança e adolescente envolvido com ato infracional

surgiu da experiência vivida no campo de estágio na 5ª Vara da Infância e da

Juventude no setor da Liberdade Assistida. O grande aumento de adolescentes

cada vez mais cedo inseridos no mundo do crime instiga a sociedade sendo

ampliado pela mídia.

No Brasil as desigualdades sociais são resultantes da implantação do

modelo de sociedade capitalista. Acrescenta-se a isto o não cumprimento dos

direitos fundamentais (que para a maior parcela da sociedade ainda é

desconhecido) e a falta de iniciativas sociais. Esses fatores tem impedido a

consolidação de um Estado Democrático de Direito. Então pesquisar um tema tão

relevante, polêmico e atual em uma monografia irá contribuir para uma discussão

que está apenas começando frente aos crescentes conflitos sociais.

Crianças e adolescentes possuem direitos que estão previstos na

Constituição Federal em vigência no Brasil desde o ano de 1988, ao qual lhes

concedem absoluta prioridade no atendimento ao direitos a vida, saúde, educação,

convivência familiar, lazer, liberdade, profissionalização, etc., mudando uma

concepção de infância e adolescência entendendo-os como cidadãos, sujeitos de

direitos que precisam ser vistos como pessoas em desenvolvimento e com

prioridade absoluta.

O nascimento do Estatuto da Criança do Adolescente (ECA) se deu no

contexto do esgotamento histórico-jurídico e social do antigo Código de Menores de

1979, e não foi uma dádiva do Estado, mas uma vitória da sociedade civil diante das

suas lutas sociais (Silva, 2005). Esse código trazia a intenção de reprimir e isolar a

infância mais pobre, institucionalizando o termo “menor”, dando a ideia apenas da

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faixa etária (menores de 18 anos), caracterizando também o menor como

delinquente ou abandonado.

A Constituição Federal de 1988 coloca como um dos objetivos

fundamentais da nossa República, a promoção do “bem estar para todos, sem

preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e outras formas de discriminação”

(art. 3º, IV) e afirma que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza” (art. 5º). Então, pode-se concluir que a nossa sociedade e o Estado

deverão reconhecer e garantir os direitos das crianças e dos adolescentes sem

discriminação, exploração e nenhuma violência. Rizzini em sua citação aponta que,

São exemplos vivos de contradições de nossos tempos, entre o discurso emergente de direitos e a real situação de agravamento das desigualdades socioeconômicas. Defende-se o direito que as crianças e adolescentes têm à convivência familiar e comunitária, porém, não se lhes asseguram sequer condições mínimas para que possam sobreviver dignamente e permanecer em seus lares. Pelo contrário, como vemos em relatos de suas vidas, eles parecem nascer sem lugar no mundo. Suas vidas são marcadas, desde o início, por adversidades contínuas, forçando-os a circunstâncias desumanas, que vão compondo o pano de fundo de suas trajetórias. Embora ocupem as ruas com sede de viver, suas histórias são pautadas por episódios de fome, brigas, desastre, mortes, perdas, falta de opção, de apoio, de tudo (Rizzini et all, 2003, p.12).

Os protagonistas dessa história têm sido as crianças e os adolescentes

de idade de 0 a 18 anos incompletos por se encontrarem na situação de extrema

pobreza. As suas famílias vivem com renda mensal de até meio salário mínimo por

pessoa, evidenciando a gravidade das precárias condições de vida e a

vulnerabilidade da infância e da juventude (Minayo, 2006).

Tejadas (2007) ressalta que a sociedade é marcada por desigualdades no

campo econômico, social e cultural, levando a ser uma sociedade heterogênea,

produzindo assim diversas formas de vivência da juventude. Com a naturalização da

violência, os jovens “pobres” passaram a ser chamados de “perigosos”. Quando há

uma reunião deles pelas ruas, seja em busca de lazer ou talvez a procura de

emprego, são vistos como um risco presente, pois o jovem considerado “pobre” está

sendo afastado não apenas do mercado de trabalho, mas dos espaços de lazer,

esporte e cultura, e principalmente do direito de estar, de circular e de se apropriar

dos lugares que a sua cidade possui (Cassab, 2005).

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A criança e o adolescente que são envolvidos com a prática de delitos

são aqueles que vivem em maior situação de vulnerabilidade, camadas pobres da

sociedade. A maior parte dessas crianças e adolescentes, segundo o autor Trassi

(2006), são de classes populares, com famílias, na maioria das vezes chefiadas por

mulheres que vivem em condições de estresse, trabalham fora e suas crianças

costumam ficar sozinhas ou aos cuidados de outras pessoas da comunidade ou até

mesmo de irmãos maiores.

A violência praticada por crianças e adolescentes é um assunto muito

presente e assustador na vida cotidiana e nos meios de comunicação em vários

países do mundo. No Brasil e no Ceará a crise social, cultural e econômica leva ao

aumento do temor que a população vivencia pela crescente ampliação da violência

nos centros urbanos e rurais que nos mostram o número crescente de infrações da

população juvenil (Tejadas, 2007).

No Brasil, os adolescentes são frequentemente considerados os

responsáveis pelo aumento da violência, em foco os jovens considerados pobres,

produzindo uma realidade exposta pela mídia que sugere a redução da

imputabilidade penal, o aumento do tempo das medidas e talvez a pena de morte

como soluções de combate a violência (Cedeca, 2008).

A ideia de impunidade está associada à interpretação do senso comum

de que a lei destinada ao adolescente não cumpre a sua função suficiente de

punição, pois a sociedade brasileira vive tempos de intranquilidade, devido ao fato

de que os jovens da periferia têm reproduzido crescentemente a violência e a

criminalidade (Vainsencher, 1989).

Atualmente, no Brasil, conforme dados fornecidos pelo IBGE, existem

34.157.631 crianças e adolescentes na faixa etária de 10 a 19 anos de idade. O

período de 2009 até 2010 conforme a resolução nº 77 do Conselho Nacional de

Justiça (CNJ), o sistema registrou ocorrências de 91.321 adolescentes, ao qual

desses 29.506 estão em cumprimento de medidas socioeducativas. Então

percebemos que 32% dos adolescentes estão sendo atendidos pelo Poder judiciário.

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O restante dos adolescentes são encaminhados as delegacias do interior e somente

registrado o ato infracional, pois não possuem atendimentos para

acompanhamentos e por isso os mesmos são liberados.

De acordo com a entrevista publicada no jornal O Povo, o juiz Manuel

Clístenes de Façanha e Gonçalves, titular da 5ª Vara da Infância e Juventude de

Fortaleza, responsável pela execução das medidas socioeducativas em Fortaleza e

181 municípios cearenses, afirma que é comum entre adolescentes em conflito com

a lei a prática de ignorar as medidas socioeducativas em meio aberto. Pelo menos

80% das Liberdades Assistidas (LAs) não vigoram plenamente, quanto à Prestação

de Serviço à Comunidade (PSC) este índice chega a 50% dos casos. Em 2011, 401

cumpriram PSC e 1.323 passaram por LA. O ano de 2012, eram 132 em PSC e

2.163 em LA, de acordo com a anteriormente denominada Secretaria de Direitos

Humanos (SDH)1.

Importante ressaltar que os números citados acima revelam somente os

adolescentes que estão ingressando nas medidas, ao quais são de novas

admissões e não se incluem os reincidentes2 nos atos infracionais. Não há na 5ª

Vara da Infância e Juventude dado sobre o número de adolescentes reincidentes, no

entanto, esta realidade é percebida na vivencia naquele Fórum, onde mais de 50%

dos adolescentes entrevistados já reincidiram.

O eixo de defesa das crianças e adolescentes na garantia de acesso a

justiça, com proteção legal dos direitos humanos possui órgãos em Fortaleza que os

contemplam: Varas da Infância e da Juventude, Promotorias de Justiça, Defensoria

Pública, Ministério Público, Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA),

Conselhos Estaduais dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca), Conselho

Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e Conselhos

Tutelares. Ainda é feito o acompanhamento de adolescentes em cinco núcleos que

estão presentes nas Regionais I, II, III, V e VI. Os núcleos são compostos por uma

1 Em 2013 a Secretaria de Direitos Humanos de Fortaleza passou a se chamar Secretaria Municipal

de Cidadania e Direitos Humanos. 2 A 5ª Vara da Infância e da Juventude passou a contabilizar o número de reincidentes no ano de

2013, ao qual será divulgado através de dados no final do referido ano.

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equipe multiprofissional3 voltada exclusivamente para o acompanhamento direto da

Liberdade Assistida e PSC.

O adolescente envolvido com atos infracionais é um sujeito desprovido de

oportunidades e de acesso aos direitos sociais, sua história é marcada pela

exclusão. O adolescente encontra um obstáculo imenso de ingressar na sociedade,

na escola e no mercado de trabalho, onde segundo Adorno é uma “socialização

incompleta”, ou seja, os jovens pobres associam o trabalho somente como

provimento e contribuição para renda familiar (Adorno, 1991).

Todo o trabalho realizado pelos orgãos de atendimento das crianças e

adolescentes tem como objetivo sua reinsersão na sociedade, porém é necessário

uma ação conjunta do Estado juntamente com a sociedade e a família. O verdadeiro

desafio está em como a sociedade que possui tantas contradições, contrastes e

exclusões pode criar referenciais positivos para construção da identidade dos

adolescentes, incluindo na mesma o planejamento do futuro com uma mudança de

atitude social no sentido de acolhimento, crescimento e desenvolvimento de suas

personalidades (Tejadas, 2007).

Apesar do conjunto de garantias o Estado, maior responsável em

assegurar os direitos se configura como um dos maiores violadores desses direitos

da maioria da população, não priorizando como se define o ECA, a implementação e

o fortalecimento de estruturas de promoção e defesa dos direitos infanto-juvenis.

Deste modo podemos ao longo do trabalho questionar alguns elementos:

quais as motivações que levam os adolescentes a cometerem atos infracionais em

Fortaleza?; de alguma forma os pais influem para que o adolescente cometa ato

infracional?; a falta da educação pode ser considerada como um fator para que os

adolescentes cometam ato infracional?; existe relação entre a prática do ato

infracional e o consumo de drogas?

3 A equipe multiprofissional que atende os adolescentes nos cinco núcleos das Regionais é composta

por Assistentes Sociais, Advogados, Pedagogos e Psicólogos.

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Diante desses elementos, o objetivo geral desta proposta investigativa é

conhecer as motivações que levaram os adolescentes atendidos pela 5ª Vara da

Infância e da Juventude a cometerem ato infracional em Fortaleza.

Nos objetivos específicos busca-se: identificar o grau da manutenção de

vínculos entre os adolescentes e familiares; analisar o papel da educação na vida

desses adolescentes; conhecer a relação do ato infracional e as drogas.

A pesquisa da monografia será realizada com a aproximação do método

dialético, entendendo que esse método favorece uma verdadeira aproximação com

a realidade sabendo que sua transformação é permanente, pois tudo se relaciona e

dialoga numa perspectiva de totalidade. Segundo Minayo (1996, p.24) a dialética

propõe “abarcar o sistema de relações que constrói o modo de conhecimento

exterior ao sujeito, mas também as representações sociais que traduzem o mundo

dos significados”.

Realizou-se uma pesquisa bibliográfica a qual os materiais que serviram

de base para a pesquisa foram os livros, revistas, publicações periódicas na área de

serviço social que ampliaram meus conhecimentos tendo como base informações,

artigos e dados publicados. Segundo o autor Gil (2002, p.45), “A principal vantagem

da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de

uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar

diretamente”.

Utilizou-se, também, a pesquisa documental, sobretudo com documentos

conservados em instituições públicas, inclusive documentos como fotografias,

ofícios, boletins e relatórios. O autor Gil (2002, p.46) afirma que “a pesquisa

documental apresenta uma série de vantagens, [...] como os documentos subsistem

ao longo do tempo, tornam-se a mais importante fonte de dados em qualquer

pesquisa de natureza histórica”.

Além das formas de pesquisas citadas, também realizei estudo de campo,

utilizando a observação participante e entrevista estruturada. O autor Gil ressalta

que:

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“O estudo de campo apresenta algumas vantagens em relação principalmente aos levantamentos. Como é desenvolvido no próprio local em que ocorrem os fenômenos, seus resultados costumam ser mais fidedignos” (Gil, 2002, p.53).

O campo de estudo da pesquisa foi a 5ª Vara da Infância e da Juventude

no setor da Liberdade Assistida, situada no bairro Presidente Kennedy e os sujeitos

envolvidos serão os adolescentes que cometem atos infracionais em Fortaleza que

são inseridos em medidas socioeducativas.

Os dados foram coletados no período de abril e maio de 2013, sendo

utilizada a entrevista estruturada com 06 adolescentes. Ressalto que o critério não

pode ser numérico, pois há uma maior preocupação e compreensão das ações e

relações humanas, de um lado não captável em estatísticas, ou seja, não

quantificável. Segundo Minayo:

“A entrevista tomada no sentido amplo de comunicação verbal, e no sentido restrito de coleta de informações sobre determinado tema científico, é a estratégia mais usada no processo de trabalho de campo. Entrevista é acima de tudo uma conversa a dois, ou entre vários interlocutores, realizada por iniciativa do entrevistador” (Minayo, 2012, p. 64).

Após a realização da coleta de dados dos 06 adolescentes, passou-se

para etapa de análise e tabulação das informações colhidas, transcrevendo de forma

integral o conteúdo das entrevistas dos envolvidos na pesquisa, identificando os

pontos mais relevantes e significativos da temática de interesse.

As análises do objeto de estudo serão embasadas na compreensão e

aproximação com as categorias Criança e Adolescente, Violência e Ato Infracional

para o subsidio do aprofundamento da pesquisa. O foco da investigação foi na 5ª

Vara da Infância e da Juventude.

Deste modo, na abordagem da categoria criança e adolescente o

referencial teórico da pesquisa monográfica foi O curso de direito da criança e do

adolescente de Andréa Rodrigues Amin (2010); O que é adolescência de Daniel

Becker (1994); Escola que protege de Vicente de Paula Faleiros (2007); Puberdade

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e adolescência de Içami Tiba (1986); O Estatuto da Criança e do Adolescente e o

Código de Menores: descontinuidades e continuidades de Maria Liduína de Oliveira

Silva (2005); entre outros.

Na categoria violência buscou-se a contribuição dos autores e das

seguintes obras: O adolescente e o conflito de gerações na sociedade

contemporânea de Erane Paladino (2005); Adolescência/violência: desperdício de

vidas de Maria de Lourdes Trassi (2006); Jovens e oportunidades: a

desnaturalização da cidade desigual de Maria Aparecida Tardin Cassab (2005);

Adolescência e violência: teorias e práticas no campo clínico, educacional e jurídico

de Deise Matos do Amparo (2010); entre outros.

E por fim na categoria ato infracional utilizou-se dos conceitos e

contribuições das obras e autores: a socialização incompleta: os jovens delinquentes

expulsos da escola de Sérgio Adorno (1991); Vidas nas ruas: crianças e

adolescentes nas ruas de Irene Rizzini (2003); Juventude e Ato Infracional: as

múltiplas determinações da reincidência de Silvia da Silva Tejadas (2007); O

adolescente e o ato infracional de Mário Volpi (2011); entre outros.

O primeiro capítulo do trabalho aborda um resgate histórico da legislação

brasileira, retratando sua construção ao longo da história, os diversos mecanismos

instituídos para garanti-lo. Este capítulo foi importante para aproximação com o

tema, ao reconhecer à ausência de legislação direcionada as crianças e os

adolescentes até a efetivação do ECA, que vêm sucedendo de geração para

geração, se fazendo presente na cultura da sociedade.

No segundo capitulo analisaremos a adolescência, a violência e os

elementos que motivam os adolescentes a cometerem o ato infracional,

características estas vivenciadas no meio social e familiar.

No terceiro e último capítulo, será apresentada a instituição que

representa um direcionamento sociojurídico em Fortaleza, o perfil dos adolescentes

atendidos e a entrevista com os mesmos, realizando uma análise das motivações

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apresentadas nas entrevistas sobre o ato infracional. Vale salientar que estas

análises teóricas estão entrelaçadas as análises da pesquisa empírica realizada.

A pesquisa ora apresentada foi uma contribuição na discussão da

legislação das crianças e adolescentes com a análise que foi muito gratificante e

contribuiu com o esclarecimento dos conteúdos referentes ao tema e para a

ampliação dos conhecimentos.

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1. HISTÓRICO E EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DO TEMA

Este capítulo permite mostrar a evolução histórica acerca da

compreensão das crianças e dos adolescentes e os entraves até a garantia na

legislação existente hoje. O conservadorismo e a situação da negligência contra a

infância e a juventude tem início no Brasil desde o seu descobrimento, na

escravidão dos índios até os dias atuais, demonstrando que nossa cultura nunca

possibilitou colocar em prioridade absoluta os problemas de atenção pública. Neste

sentido uma abordagem teórica do assunto é de enorme importância para,

posteriormente, entendermos o adolescente que comete ato infracional.

1.1 Historia Mundial sobre crianças e adolescentes

Nas civilizações antigas os laços de família eram estabelecidos através

da religião e não por laços afetivos ou de sangue. A figura do pai era considerada a

autoridade familiar e religiosa, dando-lhe o poder e o cumprimento dos deveres

religiosos, ao qual o mesmo exercia um poder absoluto sobre os seus filhos

independente de suas maioridades (Amin, 2010).

Na Grécia Antiga, as crianças filhas dos cidadãos eram educadas por

meio de mitos, fábulas e com músicas, totalmente ao contraste dos filhos dos

escravos ao qual eram considerados como uma mercadoria. A criação das crianças

escravas era mais cara que a do adulto, já que o adulto pagava a sua importação

com o trabalho (Faleiros, 2007).

Nessa época, na Grécia, havia um grande número de morte das crianças

escravas, levando as mães a serem alugadas como amas de leite e também era

uma forma de separar os filhos de suas mães.

Em Roma, meninos e meninas eram criados juntos, sendo protegidos por

deuses até os dozes anos. A partir dos14 anos aos meninos lhes era dado à vida

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pública e militar e as meninas o casamento, regras que se aplicavam apenas a

nobreza, pois a plebe e os escravos somente restavam a trabalho escravo.

Na França as primeiras instituições para as crianças e adolescentes que

cometiam infrações, passaram a existir a partir de 1850, utilizavam esta segregação

de infratores com uma finalidade educativa. Nesse período o colégio surgiu como

uma instituição educacional com a finalidade de resgate das crianças e adolescentes

para dentro do lar, utilizando de relações de afetividade, tendo o Estado e a Igreja

responsabilidade pelo sistema educacional (Rosa, 2001).

No século XX começa a linha de produção em série e com isso também

se inicia a imensa exploração do trabalho infantil e juvenil ocorrendo mudanças nas

famílias e grandes problemas sociais de saúde, vindo a surgir às políticas de

proteção para crianças e adolescentes. Com a verdadeira realidade posta no

capitalismo industrial, as quais as crianças e adolescentes trabalhavam 16 horas, o

avanço da proteção integral no final do século XX foi bem significativa (Rosa, 2001).

No filme “Daens – Um grito de justiça” pode-se observar que não havia

leis trabalhistas, organização dos trabalhadores e a atuação da Igreja Católica com a

sua doutrina social, que foram muito importantes para sociedade. O trabalho das

mulheres e das crianças tinha uma carga horária de até 16 horas, seus salários

eram reduzidos com a desculpa de não possuírem a força física suficiente. A morte

ocorria em grande escala, enquanto os burgueses e o governo organizavam o poder

militar para proteger as suas empresas.

No Brasil desde o seu “descobrimento” em 1500 até 1822, diante da sua

dependência econômica, política e administrativa a Portugal, as leis e as ordens

para crianças e adolescentes eram também cumpridas através da Igreja Católica e

dos representantes de D. Pedro I advindos de Portugal.

O Estado juntamente com a Igreja uniu-se para cuidar das crianças índias

com o objetivo de batizá-las e depois inseri-las no trabalho. Para essa inserção

aplicavam castigos violentos e a matança dos índios, fundando as Casas de

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Recolhimento para meninos e meninas, separando-os de sua comunidade,

ensinando os costumes e normas do cristianismo para introduzi-los na visão cristã

do mundo (Faleiros, 2007).

De acordo com Faleiros (2007), para atender à internação de filhos

ilegítimos, foi implantada a Roda dos Expostos4 em Salvador, a partir de 1726, que

tinha o objetivo de esconder a origem legítima da criança e salvar a honra das

famílias, que na maioria das vezes, eram filhos de senhores com escravas.

Essa instituição acolhia crianças enjeitadas de cor branca ou parda, filhos

de brancos ou de brancos com negros, que uma vez colocadas na Roda só

poderiam permanecer na instituição até um ano e meio, depois eram entregues a

amas de leite alugadas ou a famílias que recebiam dinheiro e utilizavam as crianças

para trabalho doméstico.

A partir do aumento do número de crianças abandonadas, a Lei do Ventre

Livre em 1871, passou a proteger essas crianças chamadas de ingênuos. A abolição

da escravatura no ano de 1888 e a formação do capitalismo industrial brasileiro,

enviou milhares de ex-escravos para as periferias das grandes cidades, surgindo às

primeiras favelas (Simões, 2010).

Nesse período o Brasil também é uma arena de intensas e rápidas

transformações decorrentes da urbanização em contraposição a rural-agrária, que

requeria uma reorganização das forças políticas. Ganha evidência nesse contexto os

higienistas, que apresentam experiências médicas sobre higiene, controle e

prevenção de doenças infectocontagiosas e epidemias (Passeti, 1995).

Os higienistas, em geral médicos, com seu método intervencionista

instauram marcas disciplinares com intensas implicações para a sociedade,

deliberando os referenciais de diagnóstico e prevenção, doença e cura (Passeti,

1995).

4 Roda dos expostos: um cilindro giratório na parede da Santa Casa que permitia que a criança fosse

colocada de fora sem que fosse vista de dentro, sendo recolhida pela Instituição que criou um local denominado “Casa dos Expostos”.

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E é em função da higiene que os olhares se voltam para a criança,

especialmente a criança sem recursos, na forma de técnicas cotidianas de controle

em nome da prevenção e da segurança, dispositivos normativos “recomendando o

que convém e punindo os atos que infringem essas regras de higienização, como

assepsia” (Passeti, 1995, p.42).

No governo imperial, com a preocupação de recolher as crianças que

perambulavam nas ruas, foram tomadas as primeiras medidas essenciais advindas

do poder público com relação à infância pobre. Nascem por todo o Império abrigos

mantidos pelos governos que afastavam os “menores” do convívio social, desejavam

ministrar-lhes o ensino fundamental e o profissionalizante. Então no ano de 1875, é

criado o Asilo de Meninos Desvalidos, cujo regulamento é descrito como sendo “um

internato destinado a recolher e educar meninos de 6 a 12 anos [...] que deveriam

receber instrução primária e o ensino de ofícios mecânicos” (Rizzini, 1995, p.244).

No ano de 1912, o Deputado João Chaves apresenta um projeto de lei

alterando o direito da criança e do adolescente, afastando-o da área penal e

direcionando para os movimentos internacionais da época. Contudo, diante dessas

discussões levou a construção de uma Doutrina do Direito do Menor, fundada na

perspectiva carência/delinquência, fase essa da criminalização da criança pobre,

pois o Estado teria o dever de proteger os menores mesmo que não preservasse as

garantias gerando uma doutrina irregular (Amin, 2010).

De acordo com essa situação de irregularidade com as crianças e

adolescentes, em 1902 o juiz de menores da então capital da República Mello

Matos, propõe para o país um Projeto de Proteção para o menor que posteriormente

é transformado em lei no ano de 1926, mas somente é promulgado em 1927, o

Código de Menores também conhecido como Mello Matos (Volpi, 2001).

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1.2 Código de Menores de 1927

O Código de Menores de 1927 mostrava a intenção de reprimir crianças e

adolescentes isolando a infância mais pobre, dando aos mesmos uma nomenclatura

de “menor”, referindo-se não somente a sua faixa etária, mas como uma

característica de delinqüente ou abandonado, de acordo com o seu art. 1º:

“O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinqüente que tiver menos de 18 anos de idade, será submetido pela autoridade competente ás medidas de assistência e proteção contidas nesse Código”.

Com essa nova lei, pois anteriormente não possuía nenhuma legislação

social para as crianças e adolescentes, o Juiz de Menores possuía o poder de

decidir o destino das crianças. A família independente da sua situação econômica

teria o dever de manter as necessidades básicas de acordo com o modelo

idealizado pelo Estado, as quais as soluções assistenciais vinham como forma para

minimizar que as crianças e adolescentes continuassem na rua (Amin, 2010).

No período do Estado Novo, no governo de Getúlio Vargas, foi criado no

ano de 1941 o SAM (Serviço Nacional de Assistência aos Menores), que era

vinculado ao Ministério da Justiça para extinguir a ameaça dos meninos que eram

considerados “perigosos e suspeitos”, garantindo uma ordem social, não se

preocupando em assistir as crianças e adolescentes que necessitavam de apoio

material e educacional e sim se caracterizando por um regime de internações,

acabando com os vínculos familiares e substituindo pelos vínculos institucionais

(Amin, 2010).

Na década de 60, o SAM passou a receber severas críticas tanto por

parte do Estado, da sociedade civil e também da Igreja Católica, pois não cumpria e

se distanciava do seu objetivo inicial, violentando, surrando e torturando as crianças

e adolescentes. Sendo também acusado pelo desvio de verbas, superlotação,

ensino precário, incapacidade de recuperação dos internos, não sendo mais

considerado um órgão de proteção e sim um órgão de repressão deixando as

crianças em péssimas condições (Faleiros, 2007).

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O SAM funcionou até o golpe militar de 1964, neste período foi visto que

não haveria mais condições das crianças e dos adolescentes serem tratados de

forma desumana, propostas advindas da Igreja Católica e da sociedade. Esforços

estes que com a mudança de poder no Brasil a oposição foi silenciada, o poder foi

centralizado criando assim uma nova instituição a FUNABEM (Fundação Nacional

do Bem-Estar do Menor), esta fundação era independente do Ministério da Justiça

(Faleiros, 2007).

A nova instituição FUNABEM era baseada na Política Nacional do Bem-

estar do Menor (PNBM)5, apresentando uma proposta pedagógica-assistencial

progressista, que na prática era um instrumento de controle do regime político

autoritário exercido por militares, em nome de uma segurança nacional. Essa

segurança buscava reduzir ameaças de qualquer origem, mesmo se tratando de

menores, pois naquele momento da história no auge do regime militar houve um

retrocesso reduzindo a responsabilidade penal para dezesseis anos de idade (Amin,

2010).

A FUNABEM não conseguiu reduzir o combate à marginalização durante

o período da ditadura, houve o grande aumento da exclusão social, os menores se

marginalizavam por conta da pobreza da família, por estar afastado da escola, pela

situação de rua, significando estar exposto a exploração do tráfico de drogas e ao

abuso sexual (Volpi, 2001).

Através da Lei nº 6.697 em 10 de outubro de 1979, surge o novo Código

de Menores consolidando a doutrina de “Situação Irregular”, ao qual o seu contexto

considerava o “menor6”, assim chamado de forma preconceituosa, com a situação

irregular aquele que estivesse fora dos padrões sociais, na perspectiva de que a

pobreza era considerada uma doença, como também os desvios de conduta e a

falta de seus pais ou representantes legais.

5 Introduzida através da Lei 4513 de 1° de dezembro de 1964.

6 No dicionário Aurélio o conceito de menor é definido como pessoa que ainda não chegou à

maioridade. (FERREIRA, 2001).

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Nesse momento aparecem algumas figuras jurídicas como "menores em

situação de risco” ou “em perigo moral e material", originando-se um novo

paradigma, haja vista que o Juiz de Menores, além das demandas jurídicas, seria

designado também de suprir as carências das políticas públicas no campo da

infância e juventude. A legislação dizia que:

“O menor de dezoito anos que praticasse infração penal deveria ser encaminhado à autoridade judiciária. O menor de dezoito e maior de catorze anos de idade que praticasse qualquer infração submetia-se a um procedimento para apuração de seu ato, sendo passível de uma das medidas previstas no Código de Menores, conforme o arbítrio do Juiz. O menor de catorze anos autor de infração não respondia a qualquer procedimento, mas também estava sujeito à aplicação de medidas por se encontrar em situação irregular (SOARES, 2003, item 7)”.

Na perspectiva desse Código de Menores considerando que ser pobre

era uma doença, o médico possuía o poder de um juiz que decidia as normas a

serem executadas no caso de situação irregular, decidindo os destinos e questões

relacionadas à sua internação, adoção e punição.

Enfim, nesse Código os direitos das crianças e adolescentes somente

existiam quando havia situação de risco ou de “doença social”, não possuindo um

caráter preventivo, mas repressivo. Depois de uma suspeita de ato infracional, os

quais eram submetidos á sua privação de liberdade sem que a materialidade do ato

fosse comprovada e sem direito de defesa, não existindo um processo legal devido,

regulamentando a criminalização da pobreza (Faleiros, 2007).

A constituição de 1988 será um marco importante, pois promoveu

mudanças apesar de ter sido promulgada em tempos de crise no desenvolvimento

econômico do país, em uma época de não reconhecimento dos direitos e ampliação

da desigualdade social.

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1.3 A Constituição Federal de 1988

A década de 1980 é considerada a “década perdida” para o Brasil no seu

desenvolvimento econômico, estabelecendo nesse período um redimensionamento

das relações de poder no mundo, uma intensa concorrência por novos mercados,

imensa competitividade capitalista, exigindo mudanças e uma flexibilidade dos

padrões de consumo (Iamamoto, 2011).

Nessa década tem-se uma dificuldade para elaboração de políticas

econômicas impactando na redistribuição de renda, não apenas no Brasil, mas em

toda a América Latina. Esse processo gerou ao país o empobrecimento

generalizado, crise dos serviços sociais públicos com um aumento da demanda em

contraposição a não expansão dos direitos, desemprego, agudização da

informalidade na economia e favorecimento da produção para exportação em

detrimento as necessidades internas, tudo isso foram os resultados da dívida

externa (Behring, 2011).

No país houve outro aspecto em destaque que foi a redefinição das

regras políticas e a retomada do Estado democrático de direito, tarefa direcionada

para o Congresso Constituinte como reivindicação dos trabalhadores e dos

movimentos sociais. Essa reivindicação interferiu na agenda política dos anos de

1980 pautando alguns eixos: reafirmação das liberdades democráticas, impugnação

da desigualdade e afirmação dos direitos sociais, direitos trabalhistas e reforma

agrária (Behring, 2011).

Os movimentos democráticos ao longo da década foram tencionados com

a presença da sociedade burguesa brasileira, também estando presentes as

mudanças em outra direção, a do neoliberalismo (Behring, 2011).

Com o aprofundamento das desigualdades sociais e a ampliação do

desemprego comprova-se que há uma proposta neoliberal vitoriosa, sabendo-se

serem estas suas metas, ao investir no mercado como regulador das relações

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econômicas, direcionando aos indivíduos a responsabilidade de “se virarem no

mercado” (Iamamoto, 2011).

O resultado é um Estado cada vez mais intencionado e direcionado aos

empenhos econômicos e políticos da sociedade burguesa dominante, não levando

em conta a vontade e a soberania da sociedade, em um contexto em que o que

prevalece é o capital financeiro (Iamamoto, 2011).

O discurso neoliberal tem uma espantosa proeza de direcionar o seu

argumento afirmando que a regulação do mercado pelo Estado é negativa, já que tal

regulação desestimula o capitalista de investir, impedindo o desenvolvimento e a

criação de empregos. A solução seria que o Estado Social deixasse de ser

paternalista, incentivador e viesse a negar aos indivíduos os serviços sociais dando-

lhes oportunidades de escolhas e autonomia nas suas decisões (Behring, 2011).

De acordo com Iamamoto (2011) esse período também foi marcado pelos

avanços políticos e institucionais direcionados a crianças e adolescentes

empobrecidos do país, resultados de intensas reivindicações populares e da luta

pela redemocratização do Brasil.

Nesse momento a transição democrática do país resultou num conjunto

de movimentos, o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, UNICEF,

Ordem dos Advogados do Brasil - OAB e Pastoral do Menor com a participação

democrática dos segmentos da sociedade civil, resultando com a Assembleia

Nacional Constituinte que elaborou uma Nova Carta Constitucional determinando

significativas mudanças e estabelecendo novos paradigmas (Rosa, 2001).

A partir dessa Carta Constitucional, os direitos das crianças e dos

adolescentes que devem ser garantidos com absoluta prioridade, teve como

resultado o art. 227º da Constituição Federal de 1988, que preconiza que:

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, á dignidade, ao respeito, à liberdade e á convivência familiar e comunitária,

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além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas públicas especificas e obedecendo aos seguintes preceitos: I - aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno- infantil; II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. ................................................................................................................... § 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos: I – idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII; II – garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; III - garantia do acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola; IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar especifica; V – obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito á condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade; VI – estímulo do poder público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado; VII – programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins (EC nº 65/2010).

Com a elaboração da Constituição democrática e cidadã o país pela

primeira vez na história passa a situar as crianças e adolescentes como pessoa em

condição peculiar de desenvolvimento, como sujeito de direitos e também como

agentes de deveres perante o Estado, família e sociedade.

Depois do início da implementação da Doutrina da Proteção Integral, a

noção de infância ganha outro olhar e um novo sentido social. As crianças e os

adolescentes são incluídos no universo da cidadania, não podendo mais ser vistos

como um grupo afastado dos seus direitos, pois com a efetivação da CF passaram a

ter interesses reconhecidos mudando do paradigma das necessidades para o

paradigma dos direitos.

Por fim, baseada na Constituição Federal foi promulgada num sentido

amplo, a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, o nascimento do Estatuto da Criança

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e do adolescente (ECA), que se traduz a determinação política dos princípios da

doutrina de proteção integral.

1.4 O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

No período de 1990, o Brasil do ponto de vista econômico era um país

destruído pela inflação, paralisado pelo baixo nível de investimento privado e público

sem uma solução sólida para o problema do endividamento e com uma questão

social gravíssima (Behring, 2011).

Nessa época houve a reforma7 no país para redução de custos, deixando

a política econômica a mercê dos especuladores do mercado financeiro, de forma

que a redução dos custos levou a um crescimento rápido das dívidas internas e

externas. Então se entende que o sentido desta reforma levou o país a uma

facilitação para as privatizações entregando uma parcela significativa do patrimônio

público ao capital estrangeiro (Behring, 2011).

Diante de uma conjuntura adversa na década de 1990, concretizou-se a

efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente ocorrendo grandes mudanças.

Com a Doutrina da “Proteção Integral” o Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA) abriu caminhos para transformações direcionadas a crianças e adolescentes

no Brasil. As antigas práticas repressoras, estigmatizantes que faziam parte das

antigas legislações passaram por uma nova construção, dando prioridade absoluta

em suas garantias. A autora Minayo ressalta em seus estudos que:

“A proteção integral designa um sistema em que as crianças e adolescentes, até 18 anos, são considerados titulares de interesses subordinados, à frente da família, à sociedade e ao Estado, cujos princípios, como já foi dito, estão sintetizados no caput do artigo 227 da Constituição Federal. [...] A teoria da proteção integral parte da compreensão de que as normas que cuidam de crianças e de adolescentes devem concebê-los

7 Essa “Reforma” foi o ajuste fiscal neoliberal que trazia em si uma forte contradição entre o discurso

da chamada reforma e a política econômica. Argumentava que o problema estava no Estado e por isso seria necessário reformá-lo para corrigir distorções e reduzir os custos.

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como cidadãos plenos, porém, sujeitos à proteção prioritária, tendo em vista que são pessoas em desenvolvimento físico, psicológico e moral” (Minayo, 2006, p.15).

Com a criação do ECA (1990) houve uma ruptura com a visão tradicional

e conservadora existente anteriormente nos antigos poderes normativos, garantindo

a criança e ao adolescente uma ampla defesa nos seus direitos fundamentais,

responsabilizando o Estado em criar condições para que na própria sociedade,

especialmente as famílias desses “menores”, possam desenvolver seus filhos,

profissionalizá-los e emancipá-los (Mendez, 2002).

O ECA promoveu uma verdadeira ruptura com o arbítrio e com a

discriminação que existia nas legislações de 1919 até 1990 com os adolescentes,

resultando nas “reformas” das leis direcionadas aos menores que constituíam

apenas em discursos que não eram executados e eram vistos como paradigmas

(Mendez, 1999).

Observamos que mesmo com a criação do ECA, ou seja, com os avanços

das legislações, as crianças e adolescentes do Brasil representam a parcela mais

exposta as violações de direitos pela família, pelo Estado e pela sociedade. Existe

um distanciamento entre a legalidade e a efetividade, mostrando que estão sendo

violados exatamente ao contrário do que preconiza nossa Constituição Federal e

suas leis que a complementam (Volpi, 2011).

O Estatuto da Criança e do adolescente é considerado como uma das

mais avançadas legislações do mundo, trazendo a inovação de estabelecer as

garantias e direitos contra a violência do Estado, mas também propor ações

concretas em direção ao ato infracional, que segundo o ECA no seu art. 112º:

“Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semiliberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no Art. 101, I a VI.

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§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado. § 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.”

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) registrou no período de 2009 até

2010, ocorrências de 91.321 adolescentes, ao qual desses 29.506 estão em

cumprimento de medidas socioeducativas. Conforme citado anteriormente 32% dos

adolescentes estão sendo atendidos pelo Poder judiciário. O restante dos

adolescentes são encaminhados as delegacias do interior e somente registrado o

ato infracional, pois não possuem atendimentos para acompanhamentos e por isso

os mesmos são liberados.

Diante dessas medidas é relevante ressaltar que muita coisa melhorou,

considerando um salto importante para benefício não só dos adolescentes infratores,

mas também para a sociedade que sofre com os reflexos da desigualdade social.

Que segundo Volpi (2011) a responsabilidade do adolescente passou a se iniciar

aos 12 anos, e que:

“Todo sistema de contenção do adolescente do antigo Código de menores e da “Política de Bem-Estar do Menor” estava organizado para tratar um “delinquente”, e não para atender um adolescente que transgrediu a norma” (Volpi, 2011, p.15).

Mas, de acordo com os princípios fundamentais da nossa República, a

sociedade brasileira direcionou a dignidade da pessoa humana como um de seus

princípios, reconhecendo assim cada indivíduo como autônomo de direitos e com

valores essenciais a sua realização como pessoa (Amin, 2010).

Apesar de está em vigência há 23 anos, o ECA continua sendo alvo de

ataques advindos dos que não entendem que a legislação obteve essa oportunidade

para a criação de um conjunto de regras de proteção capaz de colocar nossa

infância e juventude a salvo de toda e qualquer forma de negligência, violência e

exploração (Bezerra, 2006).

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Os obstáculos e problemas socioeconômicos do nosso país não podem

ser considerados como desculpas para fazer críticas à lei, que na maioria das vezes

não é cumprida. E também não deixar de enxergar que as crianças e adolescentes

não têm assegurados os direitos básicos de pessoa humana, vivendo à margem dos

benefícios sociais, realidade tantas vezes denunciada no País (Bezerra, 2006).

Dessa forma, o Estatuto instiga a sociedade a assumir uma tarefa de

mudança cultural. O ECA passa a representar um salto qualitativo, uma proposta

abrangente da atenção para que haja um reordenamento político institucional

proposto e, um envolvimento da sociedade civil na discussão, decisão e controle

das políticas de atenção à criança e ao adolescente (Bezerra, 2006).

Sabemos que essas medidas não serão capazes de eliminar a violência

praticada contra as crianças e os adolescentes, mas irá representar um início do

trajeto para que a lei seja cumprida em favor dessa população, preparando para o

exercício pleno da cidadania e para uma existência mais digna (Bezerra, 2006).

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2. ADOLESCENTES E ATO INFRACIONAL

Ser adolescente é passar por uma etapa da vida, um processo de

crescimento e desenvolvimento, ao qual acontecem as modificações físicas e

emocionais. O sujeito está à frente de muitos desafios, visto que está em uma fase

de turbulências, descobertas e que se vê obrigado a entrar no mundo adulto em

busca de uma identidade e de amadurecimento para sua vida.

Já o ato infracional e a sua prática não pode ser incorporada como

inerente a sua identidade, mas vista como uma etapa de vida que pode ser

modificada. Logo, toda criança ou adolescente não comete crime e sim praticam ato

infracional, ou seja, para as crianças e adolescentes o ato infracional é como se

fosse infração penal (ECA, 1990).

2.1 E a adolescência?

De acordo com o autor Tiba (1986), a palavra adolescência vem do latim

“adolescer” e seu significado é crescer, tornar-se maior, desenvolver-se e por fim

atingir a maioridade. Sendo que, a adolescência é um processo em que o ser

humano passa por um desenvolvimento, uma fase importantíssima na vida de

qualquer indivíduo, fase ativa da personalidade que ocorre às mudanças biológicas

e psicológicas para formação da identidade, estando também relacionadas aos

fatores socioeconômico, histórico e cultural.

Segundo o ECA no seu art. 2º, adolescente é aquela pessoa que tem

entre 12 anos completos e 18 anos incompletos de idade, mas em casos expressos

em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto as pessoas entre dezoito e vinte e

um anos de idade. Reconhecendo que o adolescente para o pleno e harmonioso

desenvolvimento de sua personalidade, em virtude da sua ausência de maturidade,

necessita de proteção e cuidados especiais, inclusive a devida proteção legal, tanto

antes quanto após o seu nascimento (ECA, 1990).

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O período da adolescência é a fase de vida do ser humano em que o

sistema biológico de transição sai da infância e entra na vida adulta, momento em

que o sujeito está frente de muitos desafios e conquistas. De acordo com a

psicanalista argentina Aberastury (1981, p.89), afirma que “[...] a criança, queira ou

não, vê-se obrigada a entrar no mundo adulto”, essa expressão resume

notoriamente este momento singular, pelo qual todo sujeito vivencia.

Para Becker (1994), adolescência é está numa fase conflituosa de

mudança de identidade e da personalidade sendo o adolescente encarado pelos

adultos como um ser em desenvolvimento e conflito. Fase ocorrida depois da

infância vista como uma pedra no caminho para a entrada na vida social, havendo

uma separação escolar devido à pressa em chegar a vida adulta como explica o

autor:

“Com ascensão da burguesia como classe dominante, houve mudanças na estrutura escolar, surgindo à formação primária e secundária. Assim, a idade, classe escolar e adolescência passou a ser melhor distinguida” (Becker, 1994, p.58).

Paladino (2005) percebe que esta fase de crescimento não se restringe

somente as mudanças corporais, oriundas do processo biológico, mas sim a um

crescimento interior, a um desenvolvimento psíquico, a uma construção da

personalidade e da identidade. Nas palavras do autor Paladino:

“A identidade é, então, algo formado ao longo do tempo por intermédio de processos inconscientes, e não algo inato, existentes na consciência no momento do nascimento. [...] Ela permanece sempre incompleta, sendo sempre formada. O processo de identificação seria este processo, eternamente em andamento” (p.35).

Sendo a adolescência caracterizada por sentimentos diversos, ao qual

não podemos descrever e nem mesmo explicar, as ações e os desejos dos jovens

são imprescindíveis, o que está sendo bom hoje, pode ser ruim amanhã e vice

versa. Em meio a essa diversidade de sentimentos, o jovem vai criando a sua

própria identidade e o seu próprio mundo, sobre o qual esclarece Aberastury (1992),

afirmando que a estabilização da personalidade não ocorre sem que o sujeito passe

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por certo grau de conduta patológica, que é extremamente normal nessa etapa da

vida.

De acordo com Amparo (2010) na adolescência existe uma fragilidade

interna e externa, o adolescente vive a sua puberdade como se fosse vítima dela,

possuindo uma sensação de perseguição e ao mesmo tempo de ódio, levando-o a

se defender contra esse sentimento, buscando um responsável fora de si mesmo,

como se ele fosse à única vítima.

A passagem para a fase adulta é bastante complicada, é por isso que o

Estatuto da Criança e do Adolescente preconiza que os direitos das crianças e

adolescentes devem ser garantidos com absoluta prioridade, de acordo com seus

artigos, que dizem:

Art. 4º “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”. Art. 5º “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.

Nesta perspectiva, Amparo (2010) explica que as comunidades marcadas

por altos índices de desemprego e pobreza estão vulneráveis as desestabilizações

psicológicas que atingem não somente os adultos e sim aos demais integrantes da

família como os adolescentes e as crianças.

Assim, os adolescentes dessas famílias demonstram, às vezes com atos

violentos, sua insatisfação e sua falta de credibilidade no pacto social, o que os leva

a comportamentos que seriam vistos como desamparo e sofrimento pela ausência

de perspectiva de inserção social (Amparo, 2010).

Se pensarmos na adolescência hoje, vemos uma aproximação do cenário

de lutas para garantia dos direitos do que alegria de termos conquistado uma

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legislação. O contexto atual situa a adolescência de uma forma banalizada, como

um mecanismo que modifica os jovens, torna-os expostos cotidianamente a

situações de violência e a exclusão social.

2.2 Violência e Ato Infracional

A discussão sobre violência é um fenômeno social que ocorre em todo

mundo nos dias atuais e é considerado um problema de saúde pública devido à

quantidade de vítimas que a comete, ocorrendo em diferentes classes sociais,

culturas, raça e etnias (Volpi, 2001).

Segundo Volpi, crianças e adolescentes do Brasil representam uma

parcela exposta às violações de direitos pela família, pela sociedade e pelo Estado,

exatamente ao contrário do que se define a nossa Constituição Federal e suas leis

(Volpi, 2011). A Constituição Federal de 1988 preconiza em seu Art. 227 que:

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Faleiros (2007) ressalta que a violência contra crianças e adolescentes

esteve presente desde o inicio da história da humanidade, com a probabilidade de

que houvessem sido crianças e adolescentes assassinados, aterrorizados e

abusados sexualmente.

A sociedade requer a segurança como uma forma de se proteger da

violência que é cometida por desajustados sociais que necessitam ser afastados do

convívio das pessoas, recuperados e depois reinseridos, sendo difícil para o senso

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comum perceber a ideia de segurança e cidadania, não reconhecendo no agressor

um cidadão vulnerável e sensível (Volpi, 2011).

A autora Amparo concorda com Volpi quando ressalta que no Brasil,

adolescentes são considerados grupos de risco visível para a sociedade, ao qual

somente ao longo do século XX passou do enfoque punitivo para o educativo,

mobilizando vários tipos de profissões para uma abordagem de emergência com

esses adolescentes (Amparo, 2010).

Ainda segundo Amparo (2010), a abordagem introduz a noção de

violência como inerente à puberdade, devido à rapidez e a profundidade das

transformações sofridas pelo adolescente, sendo este reverso difícil de admitir, em

face da menor visibilidade social. Conclui que, vulnerabilidade pode rimar com

violência, crime organizado ou não, já que a adolescência são tempos de busca, de

risco e principalmente de experimentação.

Para Amparo (2010) não faz sentido abordar a violência sem direcionar o

contexto de risco em que vive o adolescente, pois são inúmeras as dificuldades de

encontrar um trabalho, um trabalho decente que possa lhe afastar da situação de

pobreza. Considera-se o desemprego juvenil o maior problema de inclusão social,

avaliando-se a vulnerabilidade desse grupo como face da violência, da pobreza e

dos serviços sociais, sendo os mesmos totalmente desprovidos.

Esta perspectiva da relação entre pobreza e violência, Amparo (2010)

afirma, faz parte da imaginação da sociedade entender que as necessidades

econômicas vividas por adolescentes sem condições financeiras, considerados

pobres, os levam com maior frequência a prática de crime como forma de supri-las.

Sobretudo, as dificuldades de superação do preconceito são

incomparáveis, pois a punibilidade varia pelo tipo de crime e também das origens

sociais dos autores e das vítimas. Assim, a justiça e a legislação podem ser

direcionadas em favor das classes consideradas ricas e mais duras para as

infrações cometidas por pessoas de classes menos favorecidas (Amparo, 2010).

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Então, a autora acima citada relaciona adolescente e violência sejam na

posição de autores, de vítimas ou como consumidores da mídia, alvos de interesse,

considerando sua pobreza, marginalidade, desvios, desemprego e a sua relação

com o crime como situações críticas. Logo, a sociedade e os poderes públicos

elaboram diagnósticos e formulam políticas públicas a eles direcionadas,

especialmente na área social e da segurança pública.

Nessa linha de raciocínio o ato infracional praticado pela criança ou

adolescente tem caráter diferenciado, pois devido a sua condição mental em

desenvolvimento e também sua estrutura física e psicológica ainda não formada,

não permite que seja comparado ao de uma pessoa adulta, dotada de capacidade

mental e física plenamente desenvolvida.

Por isso, os menores entre 12 e 18 anos incompletos, quando praticam

atos infracionais8, estão sujeitos às normas da legislação especial, mesmo sendo

considerados penalmente inimputáveis são responsáveis pelos atos infracionais que

cometem (ECA, 1990).

Esses adolescentes são responsabilizados, através da aplicação de

medidas de proteção ou mediante um devido processo legal, que estabelecerá

sanções, sob a forma de medidas socioeducativas, que podem implicar em privação

de liberdade para posteriormente oferecer condições para a reinserção social

(Art.112º, ECA).

Para superarmos os preconceitos direcionados aos adolescentes

envolvidos com atos infracionais é necessário acabarmos com a impressão de que a

única solução possível seria a punição e a privação de liberdade. De acordo com

Volpi (2011), as medidas socioeducativas representam um avanço, mas incorporam

a discussão em nível mundial de que a privação de liberdade só deve ser adotada

em último caso, comprovando que a ineficácia do sistema penal tradicional para a

ressocialização do jovem na sociedade.

8 Ato infracional é a conduta descrita em lei como crime ou contravenção penal, (ECA, art.103). O

adolescente, embora enquadrado pela circunstância da idade, não tem sua conduta considerada como crime ou contravenção, mas, na linguagem do legislador, como simples ato infracional.

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Diante de todo o exposto, necessário se faz que os entes de

responsabilização da criança e do adolescente, sendo eles o Estado, a sociedade e

a família, conscientizem-se do seu papel de orientadores, permitindo que a infância

e juventude tenham seus direitos e garantias respeitados.

2.3 Elementos que influenciam o ato Infracional

Os atos infracionais praticados pelos adolescentes muitas vezes ocorrem

devido ao meio social em que vivem. Existem vários elementos que podem

influenciar para que o adolescente se envolva na prática ilícita, desde a falta de

convivência com a família, a falta da educação, o envolvimento com drogas, o

estimulo ao consumismo e a pobreza. Sobre essa questão, Mário Volpi escreve:

“A ruptura com essas redes remete o adolescente ao desenvolvimento de estratégias de sobrevivência produzidas fora dos padrões de socialização próprios da rede. Uma ruptura que implica, em muitos casos, o abandono gradativo de padrões morais, que no interior dessas relações já possuíam grande vulnerabilidade” (Volpi, 2001, p. 59).

É nesse sentido que a família9 desde os fins dos anos 1970 é considerada

um importante agente privado de proteção social, uma forte base para a construção

da personalidade, pois é o primeiro contato que o ser humano adquire. Ressaltamos

que nem toda família cumpre o seu papel primordial de proteção, demonstrando que

a qualidade do relacionamento familiar influencia firmemente na formação do caráter

do indivíduo, comprometendo na falta de responsabilidade, controle das amizades,

preocupação com o desenvolvimento escolar.

9 De acordo com Ferrari e Kaloustian “a família é o espaço imprescindível para a garantia da

sobrevivência, de desenvolvimento e da proteção integral dos filhos e dos demais membros, independente do arranjo familiar ou da forma como vem se estruturando”. FERRARI, Mario e KALOUSTIAN, Sílvio Manoug (Org.). Família Brasileira: A base de tudo. 10 ed. São Paulo: Cortez, Brasília: UNICEF, 2011.

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A autora Sales (2010) assevera que é na família que os indivíduos

tendem a buscar suporte para lidar com as circunstâncias adversas como a

desigualdade social, a discriminação nas ruas e nas escolas, os próprios conflitos

pejorativos da adolescência, o contato com as drogas e a falta de assistência.

A maioria das famílias que vivem nas grandes cidades brasileiras são de

classes populares, numerosas e também chefiadas por mulheres que vivem em

condição de estresse permanente, tornado-se deficientes na promoção de garantias

e de proteção (Sales, 2010).

A autora acima citada ressalta que essas mulheres são responsáveis

pelos filhos, idosos, doentes, sobrecarregando-a ainda mais, pois na atual

conjuntura do Estado persiste a tendência de repassar para a família

responsabilidades do vazio das políticas públicas assegurando assim a reprodução

social.

Deste modo, a maioria dos adolescentes advindos das famílias pobres

vive em condições desumanas, condições estas que as crianças chegam à sua

adolescência com grandes desvantagens, como: desnutrição e baixa escolaridade,

mas mesmo assim tem que trabalhar para sobreviver, é o que o autor Becker

ressalta:

“Enquanto estuda, trabalha, rouba, padece de fome e maus tratos, o adolescente se vê cercado por estímulos maciços ao consumo, mensagens dirigidas a quem tem dinheiro: o mundo trata melhor quem se veste bem, e daí para baixo. É de se imaginar como ele se sente [...]” (Becker, 1994, p. 90).

Nessa perspectiva de consumo a sociedade e os adolescentes

encontram-se seduzidos pelo mercado que promove um padrão estabelecido e leva

os indivíduos a serem colocados em campos opostos, justificando como sendo as

regras específicas nas relações sociais para estar dentro da sociedade, ampliando o

espaço para criminalidade (Costa, 2005).

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O consumismo repassado pela mídia leva os indivíduos a lógica de que

“quem não consegue é sujeira”, um problema que precisa ser modificado,

considerando-os como consumidores falhos e também dando a ideia de que são

indivíduos livres, onde o conceito definido está direcionado ao seu poder de escolha

como consumidor (Costa, 2005).

Muito embora a mídia desempenhe um papel importante na vida dos

adolescentes, também se torna responsável pela propagação de conteúdos

negativos como a violência, os problemas da saúde, educação. Dessa forma, produz

um discurso que os adolescentes são responsáveis pelo aumento progressivo da

criminalidade e da violência (Sales, 2010).

Os adolescentes pobres e infratores dos setores de baixa renda, vítimas

da violência criminal, estão incorporados em uma escala de consumo incompatível

com seus recursos, aumentando a sensação de privação e rompimento com o

sistema legal. Então esses adolescentes se envolvem no tráfico de drogas para a

obtenção de dinheiro ao qual o destino é adquirir produtos, tais como camisetas e

calças de grife, tênis de “marca”, que lhe atribuem um papel de destaque nos locais

onde moram, posição de status e poder (Sales, 2010).

Esse papel de destaque é visto como a “fome”, fome esta que leva ao

crime, a um “poder” para ser conhecido e respeitado, ou seja, filiar-se ao tráfico, usar

armas, matar e até mesmo ser preso e identificado como “perigoso” é uma forma de

obter recursos simbólicos para se tornar visível e afirmar sua identidade (Sales,

2010).

De acordo com a opinião pública, a ideia repassada é que tem aumentado

o número de infrações cometidas por adolescentes, que estes atos infracionais são

revestidos de grande violência, dando a ideia de impunidade que está associada à

interpretação do senso comum (Costa, 2005).

É certo que vivemos momentos de intranquilidade na sociedade brasileira

e com isso o fantasma da criminalidade é criado para sugerir um sistema penal

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como alternativa, uma solução para o que chamamos de questão social. Trata-se de

uma ilusão da sociedade que o “mal” pode ser combatido através de uma política

criminal ostensiva e intolerante, ao qual não identifica que a violência criminal é vista

como individual, de uma minoria (Costa, 2005).

Pensarmos hoje nas questões referentes à criminalidade dos

adolescentes significa refletir sobre as dificuldades nos direitos existentes nos

princípios da coletividade, liberdade e democracia, ressaltando o não cumprimento

do direito a educação, que segundo a Constituição Federal de 1988 no seu art. 208º,

é o dever do Estado garantir a:

I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; II – progressiva universalização do ensino médio gratuito; III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV – educação infantil, em creches e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; VII – atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. § 1º o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito publico subjetivo. § 2º o não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente. § 3º compete-se ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência á escola.

No que se refere à educação, além de se constituir direito do adolescente,

segundo a Constituição Federal (1988), a educação é a chave principal para

construir uma base sólida do processo socioeducativo. Porém os adolescentes que

estão envolvidos com a prática de atos infracionais possuem uma dificuldade de

reinserção escolar por conta das condições de sua família e a vulnerabilidade a

pobreza.

Na verdade, são inúmeras as causas da evasão escolar, não estando

somente ligadas a uma razão específica e sim a vários fatores que exige refletirmos

o problema no seu todo para que se possa não só fazer retornar o aluno à escola,

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mas mantê-lo nela. De acordo com o autor Sales (2010), para o desenvolvimento

pleno dos adolescentes é necessário uma educação que garanta o exercício da

cidadania e a qualificação para o exercício do trabalho.

Dessa forma, a educação formal e a capacitação dos adolescentes dos

setores populares não pode ser vista fora da sua especificidade, a fim de se garantir

os direitos mínimos necessários para que os jovens pobres tenham uma preparação

para enfrentar suas necessidades e para dar garantias a melhores condições de

vida (Sales, 2010).

Em suma, diante das mudanças econômicas e sociais no país com

repercussões na vida familiar, no trabalho, aumentou a desproteção social dos

indivíduos, expressando-se em diversas situações de desigualdade com implicações

diferentes para os homens, mulheres, adolescentes e crianças modificando a

trajetória de vida (Sales, 2010).

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3. A 5ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE- ETNOGRAFIA DA INSTITUIÇÃO

Este terceiro capítulo tem como objetivo traçar as motivações que levam

os adolescentes a cometerem ato infracional em Fortaleza, a partir do atendimento

institucional da 5ª Vara da Infância e da Juventude. Através da pesquisa foi possível

conhecermos a instituição, procedimentos técnicos, perfil e atendimentos dos

adolescentes e suas ações diretas e indiretas no combate a reincidência de infração.

3.1 Histórico da Instituição do objeto de estudo

Figura 1: Mapa do Estado do Ceará

http://www.guianet.com.br/ce/mapace.htm

A 5ª Vara da Infância e da Juventude fica localizada no Estado do

Ceará10, na região Nordeste do Brasil e sua área total são de 148.825,6 km2,

equivale a 1,74% da área do Brasil, desta forma o Estado é o 17° entre os estados

brasileiros em termos de superfície territorial, e a quarta extensão territorial da região

Nordeste.

10

Fonte: http://www.ceara.gov.br/index.php/ceara-em-numeros.

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Atualmente o Estado é composto por 184 municípios e sua população está em

torno de mais de 8 milhões de pessoas, sendo que 75% delas residem em áreas

urbanas. Mais de 99% da população que vive em áreas urbanas e mais de 96% da

população da zona rural têm acesso à energia elétrica. Nas áreas urbanas, 92% da

população têm acesso à água tratada.

A 5ª Vara da Infância e Juventude de Fortaleza está localizada na Rua

Tabelião Fabião, nº 114 no bairro Presidente Kennedy e o seu espaço físico

encontra-se dentro de um complexo juntamente com a Delegacia da Criança e do

Adolescente (DCA), a Unidade de Recepção Luiz Barros Montenegro (URLBM), a

Delegacia de Combate a Exploração de Crianças e adolescentes (DCECA) e o

Centro de Referência Especializado da Assistência Social (CREAS).

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, que concebe a

criança e o adolescente como sujeito de direitos e como pessoa em

desenvolvimento, a 5ª Vara do Juizado da Infância e da Juventude tem como função

as garantias penais e processuais do adolescente que comete atos infracionais,

dentro de uma perspectiva socioeducacional e de responsabilização.

A instituição acima citada tem a natureza de Proteção Jurídica Social e

anteriormente a política do Estado era uma única vara, com o Estatuto da Criança e

do Adolescente (ECA) dividiu-se em cinco varas, da primeira a quarta vara é de

instrução e a quinta de execução, pois anteriormente somente existia a política do

bem estar do menor.

O Juizado da Infância e da Juventude tem por missão garantir os direitos

dos adolescentes que cometem atos infracionais, em consonância com preceitos

contidos no Estatuto da Criança e do adolescente e os objetivos atuais do Juizado

são:

A responsabilização do adolescente diante da sua conduta e também

assegurar que no período de cumprimento da medida tenha condições que

facilitem e promovam seu desenvolvimento como pessoa e cidadão.

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Orientar o adolescente sobre a busca de novas formas de relacionarem-se

com a família, grupos de pertencimento, programa de atendimento e outros

espaços dos quais participa.

Supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente,

promovendo, inclusive sua matrícula e retorno à rede de ensino, entre outros.

Assessorar a 5ª Vara de Execução da Infância e Juventude, na aplicação das

medidas socioeducativas, como também acompanhar, auxiliar e orientar o

adolescente em conflito com a lei que esteja cumprindo medida

socioeducativa.

A 5ª Vara do Juizado da Infância e da Juventude conta com a seguinte

equipe profissional: juiz, promotor de justiça, defensoria pública, coordenador de

secretária, policiais, assistentes sociais, pedagogas, psicólogas, estagiários, técnico-

administrativos, auxiliares em serviços gerais e motoristas.

A política social que orienta esses projetos é a Política de Atendimento da

Criança e do Adolescente da lei estatutária, que visa garantir segundo art. 88, inciso

V que: “integração operacional de órgãos do judiciário, ministério público, defensoria,

segurança pública e assistência social, preferencialmente em um mesmo local, para

efeito do atendimento inicial ao adolescente que atribua autoria de ato infracional”

(ECA, 1990).

Aproximadamente por volta de 1977, surgiu o Serviço Social no Juizado

de Menores, em consequência de uma carência no campo de atendimento as

questões sociais que demandavam um trabalho específico do profissional do Serviço

Social. Contando com duas Assistentes Sociais, foi instalado o plantão de Serviço

Social da FEBEMCE, atuando junto com o Juizado de menores.

O plano de atuação do plantão visava o desenvolvimento de suas

atividades obedecendo às diretrizes da Fundação do Bem-Estar do Menor

(FUNABEM) do Ceará para um funcionamento satisfatório que proporcionasse ao

sujeito condições favorável ao seu desenvolvimento integral.

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Os objetivos gerais do Serviço Social era estudar casos visando à

adequação de atendimentos pela FUNABEM e orientá-los para uma solução

propícia a cada um deles, de acordo com as diretrizes desta unidade.

Quanto à área de atuação e metodologia, o Serviço Social de plantão

atendia a toda pessoa que procurava a FUNABEM do Ceará com problemática

referente ao adolescente. Devido ao trabalho de plantão social, a natureza da

metodologia utilizada era essencialmente de intervenção a nível individual. Contudo,

em alguns casos torna-se necessário a intervenção de técnicos nos processos de

grupo e de comunidade.

O Serviço Social da 5ª Vara do Juizado da Infância e da Juventude

trabalha juntamente as demandas voltadas para questões referentes ao adolescente

em conflito com a lei, bem como as questões dos seus familiares. Atende os

adolescentes orientando as medidas aplicadas pelo Juiz, bem como encaminha

esses adolescentes para que busque seu desenvolvimento como sujeito participativo

de uma sociedade.

A questão social se faz presente no cotidiano do trabalho do serviço

social, dentre elas a presença de adolescentes usuários de drogas, que possuem

dificuldades de relacionamento no âmbito familiar, que possuem baixo poder

aquisitivo, vulnerabilidade social, envolvimento com armas, e outras.

Os instrumentos que o Serviço Social usa na instituição são: a entrevista

de admissão, termo de audiência, entrevista de readmissão, ofício, relatórios

semestrais e circunstanciais, estudo de caso, visita domiciliar, consulta ao sistema

judiciário, entre outros.

Atualmente, a instituição possui três assistentes sociais e três estagiárias

de serviço social. Sendo uma assistente e uma estagiária no Programa Privação de

Liberdade e duas assistentes sociais e duas estagiárias no Programa Liberdade

Assistida.

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Os programas dos quais contam com o trabalho do Serviço Social dentro

da Instituição são: Projeto Justiça Já, Liberdade Assistida, Serviço de Prestação a

Comunidade e Privação de Liberdade. Tais programas não são específicos do

Serviço Social, pois contam também com pedagogos e psicólogos.

O Projeto Justiça Já tem por objetivo a implementação de um programa

que vise à efetivação de um bom sistema de justiça para a infância e adolescência

de Fortaleza. Busca satisfazer aos anseios da comunidade, principalmente, quando

diz respeito à política de atendimento dos direitos infanto-juvenis preconizados, para

que as medidas socioeducativas previstas no artigo 112, complementadas, quando

for o caso, pelas medidas protetivas do artigo 101, sejam eficientes para responder a

prática de infrações e assegurar a reinserção social para o resgate da cidadania dos

adolescentes em conflito com a lei.

O Programa Liberdade Assistida, tem como objetivo atender e

acompanhar o adolescente infrator que sentenciado, cumpre medida sócio-educativa

de liberdade assistida, promovendo-o socialmente e sua família, fornecendo-lhes

orientação e, se necessário, inserindo o jovem em programa oficial ou comunitário

de auxílio e assistência social. Supervisionar a frequência e o aproveitamento

escolar destes adolescentes, promovendo, inclusive, sua matricula escolar. Buscar

profissionalização do adolescente e sua inserção no mercado de trabalho.

Apresentar relatório de cada caso para o juiz da vara das execuções saber,

acompanhar e resolver sobre a liberação ou não do adolescente.

O Programa de Prestação de Serviços à Comunidade acompanha os

adolescentes que recebem por sentença a medida sócio-educativa de prestação de

serviços à comunidade. O trabalho consiste em orientar, ministrar aconselhamento e

atendimento psicológico para o jovem e sua família. Encaminhá-lo, quando preciso

para a escola, cursos profissionalizantes e obtenção de documentos civis. Dar apoio

ao juízo da 5ª Vara, manifestando verbalmente nas audiências e por escrito nos

processos seu parecer técnico sobre a evolução ou involução do comportamento do

adolescente.

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O Programa de Privação de Liberdade acompanha o processo de

cumprimento da medida de internação aplicada ao adolescente que cometeu

infração, a fim de subsidiar com parecer técnico e de apoio, o desenvolver da

medida socioeducativa utilizada, projetando-a a extinção, manutenção ou a

regressão, conforme o grau de ressocialização do adolescente.

A relação que a equipe tem com o adolescente acaba sendo muito

superficial e deixa muito a desejar devido ao ambiente, as reuniões que só ocorrem

mensalmente, inclusive no que se refere ao preenchimento da folha de entrevista,

que era para ser um papel exclusivo do Assistente Social.

Não posso deixar de relatar que o Serviço Social dentro da 5ª Vara da

Infância e da Juventude resulta com um compromisso ético das profissionais, em

desempenhar o seu trabalho objetivando conceder ao usuário o melhor que houver

em termos de proporcionar-lhe uma solução para o problema enfrentado no seu

cotidiano.

Também vale ressaltar que os profissionais do setor precisam divulgar o

trabalho realizado dentro da instituição, pois muitos desconhecem o real valor do

assistente social no campo sociojurídico, uma vez que trabalha no seu cotidiano com

pessoas de baixa renda em busca do resgate da autonomia, dos seus direitos

essenciais e da materialização da cidadania.

3.2 O perfil e análise das entrevistas obtidas na pesquisa de campo dos

adolescentes atendidos pela 5ª Vara da Infância e da Juventude

O estudo acerca do tema tem o objetivo de dar visibilidade ao contexto

social em que os adolescentes estão inseridos. A análise foi realizada de acordo

com as entrevistas e os dados fornecidos pela coordenação da 5ª Vara da Infância e

da Juventude.

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No ano de 2012, de janeiro a dezembro, foram realizadas 826 admissões

de adolescentes que pela primeira vez cometeram atos infracionais e foram

acompanhados pelo poder judiciário.

Foram realizadas entrevistas com 06 adolescentes11, por entender que

através da coleta de dados possibilita a percepção em relação as suas próprias

experiências, permitindo dar-lhes voz. Destacam-se os relatos dos mesmos sobre os

fatores que estão relacionados à sua trajetória infracional e ao contexto social.

As entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas, com a

permissão dos adolescentes, mediante consentimento (Apêndice A). Os nomes dos

entrevistados da pesquisa não são divulgados por questões éticas e de sigilo.

Mostraremos por meio dos gráficos os principais resultados obtidos nos

dados fornecidos pela 5ª Vara da Infância e da Juventude em relação aos 826

adolescentes admitidos no ano de 2012. Após cada gráfico virá comentários e

expressões ditas pelos jovens no momento da entrevista (Apêndice B).

Estatisticamente, a grande maioria dos adolescentes que cometem atos

infracionais na cidade de Fortaleza pertence à faixa etária entre 15 e 17 anos, eles

estão mais expostos a uma série de fatores relacionados à sua vida social,

percebendo-se que os mesmos estão ingressando cada vez mais cedo no mundo

das infrações, o que não está presente nas outras idades. É o que mostra o gráfico

abaixo.

11

Todos os entrevistados foram adolescentes inseridos no Programa de Liberdade Assistida.

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Gráfico 1: Faixa Etária dos Adolescentes Admitidos

Fonte: 5ª Vara da Infância e da Juventude de Fortaleza/CE

É bastante preocupante porque no gráfico podemos observar que a

grande porcentagem de adolescentes em conflito com a lei está aos 17 anos, ou

seja, chegando à maioridade penal, significando que o Estado, a família e a

sociedade precisam proporcionar imediatamente políticas públicas protetivas e

compensatórias, pois quando os mesmos chegarem à idade de 18 anos, que

praticarem qualquer ato de natureza criminal, não será mais cobertos pelo Estatuto

da Criança e do Adolescente.

Como pode ser verificado no gráfico, durante o ano de 2012, os

adolescentes que mais cometeram atos infracionais foram do sexo masculino. No

total foram 740 adolescentes do sexo masculino e 86 do sexo feminino.

1% 3%

10%

16%

27%

34%

9%

12 anos 13 anos 14 anos 15 anos

16 anos 17 anos 18 anos

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Gráfico 2: Gênero dos Adolescentes Admitidos

Fonte: 5ª Vara da Infância e da Juventude de Fortaleza/CE

O gráfico nos mostra que os adolescentes do sexo masculino possuem

um grande envolvimento com o ato infracional, talvez as adolescentes do sexo

feminino por conta de possuírem mais maturidade e por sua conduta de dominar

melhor o mundo social se mantém mais afastada da criminalidade.

Os dados apenas confirmam que os meninos se tornam mais vulneráveis

a este tipo de situação, por está na maioria envolvidos com drogas e também por

conta da relação e da falta de diálogo com os pais. A família tanto pode representar

um papel importante na produção das condições que levam a drogadição quanto na

proteção, foi referida por três jovens em uma situação da falta de diálogo.

“Converso mais com a minha tia e a minha irmã, pois não gosto da minha mãe, ela não trabalha, só bebe” (A.M.L, 16 anos). “Não tenho diálogo com a minha mãe, ela é ruim de conversa, não entende a minha cabeça, diz que eu estou sempre errado, mas mesmo assim respeito muito ela” (J.S.N, 15 anos). “Só as vezes que eu converso com a coroa, eu discuto mais do que converso, ela fica nervosa por qualquer coisinha” (L.F.R, 17 anos).

A família surgiu em outra fala, referente como um local de amparo, ao

qual o adolescente mostra o amor da família direcionado a ele.

masculino 90%

feminino 10%

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“Gosto muito de conversar com a minha mãe, pois ela é muito legal. Ela não briga comigo, gosta dos meus amigos. Sou muito querido pela minha família, quando eu estava no centro educacional a minha vó ficou até doente, porque tava com saudade de mim, viu” (B.G.S, 16 anos).

No que se direciona a família, cabe aos pais educar, assistir e criar os

filhos, responsabilidade direta de promover a instrução de sua descendência, já que

através da educação visa-se o pleno exercício da cidadania. Este dever da família

está previsto na CF que ressalta em seu Art. 229º: “Os pais têm o dever de assistir,

criar e educar os filhos menores”...

Nesta perspectiva, como autora Sales (2010) ressaltou anteriormente, a

maioria das famílias são de classes populares, chefiadas por mulheres que vivem

em condição precária e de alto estresse. Num sistema familiar com regras e papéis

inflexíveis, o desejo de cuidar, conversar e a disposição para proteger não existem

mais, por conta da falta de tempo, tornando-as deficientes na proteção dos filhos e

na promoção de garantias, necessitando trabalhar e persistindo a repassar para as

filhas responsabilidades do vazio das políticas públicas, responsabilizando as

mesmas pelas tarefas domésticas.

De acordo com Volpi (2011), a permanência mais demorada das meninas

no seu lar, devido na maioria das vezes à necessidade das mães de trabalhar,

dispõem que elas sejam submetidas aos afazeres domésticos e também ao cuidado

dos irmãos mais novos, e isso tem sido um dos fatores responsáveis por sua

permanência na unidade escolar, pela sua ausência nas ruas e pelo seu menor

envolvimento nos atos infracionais.

Porém, essa alteração entre infratores masculinos e femininos destina-se

a ser alterada, observando a convicção de que a adolescente do sexo feminino tem

entrado cada vez mais no mundo da infração, principalmente no constante tráfico de

drogas como consequência do seu envolvimento com o namorado traficante e como

proteção do seu parceiro.

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Veremos no gráfico a perspectiva dos adolescentes admitidos na 5ª Vara

da Infância e da Juventude em relação à escola, onde será ressaltada a situação

escolar dos adolescentes.

Gráfico 3: Situação Escolar dos Adolescentes Admitidos

Fonte: 5ª Vara da Infância e da Juventude de Fortaleza/CE

De acordo com o gráfico, a porcentagem dos adolescentes que não

estudam é de 49%, então podemos observar que a situação escolar dos

adolescentes admitidos na 5ª vara da Infância e da Juventude é extremamente

preocupante. Se considerarmos a relação com o futuro e as possibilidades do

mesmo de romper com a reincidência12 do ato infracional, podemos afirmar que há

dificuldade de o adolescente construir um novo projeto de vida, mais saudável e

promissor.

Conforme as entrevistas realizadas com os adolescentes, verifica-se que

a maioria não está estudando, acarretando em um número reduzido de adolescentes

12

A reincidência é definida como “uma caixa de ressonância das políticas públicas e do próprio Sistema de Atendimento do adolescente autor de ato infracional”, sendo destacada a não garantia de direitos e invisibilidade dos jovens neste contexto (Tejadas, 2005, p. 279).

6% 18%

49%

27% não alfabetizados

EJA

não estudam

4° ano e 3° EM

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que tenham completado o 1º grau do ensino fundamental, caracterizando-se a

desistência dos alunos e uma elevada porcentagem de semianalfabetos.

Na percepção dos adolescentes sobre a sua vida cotidiana uma das

dificuldades mais comuns é conseguir entender as mudanças que ocorrem nessa

etapa da vida. A ocupação adequada e prazerosa do tempo livre são as atividades

das práticas esportivas, como os jogos de futebol e o surf, que são vistas pela

sociedade como a reunião de jovens pobres para a prática de delitos (Cassab,

2005).

De modo que segundo o ECA, as crianças e adolescentes necessitam de

todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, em seu artigo 3º ressalta

que deverão ser assegurados os meios, oportunidades e facilidades necessários para

seu desenvolvimento, em condições de liberdade e de dignidade. No artigo

especificamente destinado ao trato do direito à liberdade, ao respeito e à dignidade,

estabelece o Estatuto:

Art. 15º A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. Art. 16º O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais; II - opinião e expressão; III - crença e culto religioso; IV - brincar, praticar esportes e divertir-se; V - participar da vida comunitária, sem discriminação; VI - participar da vida política, na forma da lei; VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.

O limite de vida que a maioria desses adolescentes possui pode ser

percebido a partir da impossibilidade de satisfação de suas necessidades básicas:

moradia, escolaridade, saúde e lazer. O contexto em que estão inseridos se

configura através das visões preconceituosas, de limitações, de negação da

cidadania e da exclusão social.

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Diante disso, o futuro dos adolescentes entrevistados representa um

mundo de incertezas, dúvidas e muitas dificuldades para se construir e executar um

projeto de vida totalmente diferenciado da realidade que vivem.

“Eu passo o dia todo dormindo, jogo futebol no campo do lado da minha casa, não tenho projeto para o meu futuro” (J.R.S.S, 15 anos). “Eu posso dizer que passo o dia na rua, pratico futebol, eu queria era ser advogada” (A.M.L, 16 anos). “Durante o dia eu faço a tarefa bem rápido e depois vou à praia, gosto de jogar bola e surfar, o meu projeto para o futuro é arranjar um emprego que eu ganhe muito dinheiro” (L.F.R, 17 anos).

Segundo a Constituição Federal (1988), a educação é a chave principal

para construir uma base sólida do processo socioeducativo. Porém os adolescentes

que estão envolvidos com a prática de atos infracionais possuem uma dificuldade de

reinserção escolar ao qual predomina a simples falta de interesse, seguida da

necessidade de trabalhar, além de problemas familiares.

Nesse sentido, a escola pode ser percebida como um local que apresenta

poucos atrativos para muitos adolescentes, pois não consegue estabelecer um

vínculo com o mesmo, que acaba optando pela companhia dos amigos, das drogas

e da rua. Nas falas que se seguem, a escola não se encontra presente no cotidiano

dos adolescentes e dos seus interesses, contribuindo para o abandono.

“Eu posso dizer que passo o dia na rua, não gosto de ir à escola, a professora é uma chata” (A.M.L, 16 anos). “Às vezes eu ia, mas a galera ia me buscar, então eu saia com eles pra bagaceira. De vez em quando até rolava um tiroteio na frente da escola” (J.R.S.S, 15 anos).

A política de educação deve estar voltada à inclusão e ao

desenvolvimento social, direcionado sempre a necessidade de aumentar o acesso a

todas as fases da educação básica e garantir qualidade de ensino que propicie às

crianças e adolescentes autores de ato infracional uma aprendizagem legítima, além

de assegurar o direito à escola e à permanência na mesma.

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A educação como direito fundamental deve estar conectada aos valores

humanos e ser capaz de formar cidadãos com um olhar crítico voltado para o meio

em que vivem. Na opinião da autora Charlot o problema da evasão escolar deve ser

vista diante de várias opiniões, tais como:

“sobre o aprendizado... sobre a eficácia dos docentes, sobre o serviço público, sobre a igualdade das chances, sobre os recursos que o país deve investir em seu sistema educativo, sobre a crise, sobre os modos de vida e o trabalho na sociedade de amanhã, sobre as formas de cidadania” (Charlot, 2000, p. 18).

O estudo de Tejadas (2005, p.244), mostra que a inserção dos

adolescentes na vida escolar é “marcada pela defasagem entre idade, escolaridade,

evasão e fracasso”. A escola deve ser considerada como fundamental na vida dos

adolescentes, desempenhando um papel importante na sua vida social e na

preparação para o trabalho.

É necessário ocupar esses adolescentes com o ensino regular e

atividades pedagógicas complementares, possibilitando oportunizar novos

referenciais, contando que mesmo diante dessa tomada de decisão, infelizmente a

maioria não retorna a escola.

Observamos que o adolescente necessita é de educação e não de pena

criminal, pois a pena o deixaria mais exposto à contaminação carcerária, onde

aumentaria sua criminalidade e sua qualidade cairia refletindo na pura

marginalização.

Diante disso, Volpi (2001) assevera que o adolescente em conflito com a

lei é uma mera “vitima de um sistema social”, ou “produto do meio”, e o delito é uma

estratégia de sobrevivência ou resposta a uma sociedade violenta, excludente e

infratora em relação aos seus direitos.

Os dados do gráfico abaixo permitem verificar quais os tipos de atos

infracionais mais praticados pelos adolescentes no ano de 2012, mostrando que o

direito à vida se encontra em risco e necessita de atenção especial.

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Gráfico 4: Tipo de Ato Infracional mais cometido

Fonte: 5ª Vara da Infância e da Juventude de Fortaleza/CE

Na análise do quadro quanto à prática dos atos infracionais, pode-se

visualizar que o que predominou dentre os atos infracionais cometidos pelos

adolescentes foi o roubo13 seguido do tráfico de drogas. Foi percebido que todos os

entrevistados que praticaram esses 2 tipos de atos infracionais afirmaram que

praticaram para suprir a necessidade do vício.

Em seguida, apresenta-se a prática do ato infracional para "arrumar

dinheiro", tanto para si como para a sua família, pela influência dos amigos e pela

própria impulsividade natural do adolescente e além de outras razões como:

conflitos familiares, facilidades encontradas, o convite feito por adultos já envolvidos

no crime ou a simples curiosidade.

13

O roubo (art. 157 do Código Penal Brasileiro) é caracterizado presença de violência ou grave ameaça à pessoa, enquanto o furto (art. 155 do Código Penal Brasileiro) não possui violência ou ameaça.

34%

31%

23%

8%

4%

roubo

tráfico de drogas

porte ilegal de arma de fogo

furto

outros

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“Me envolvi pela primeira vez para conhecer o centro educacional. Ninguém me chamou, eu fui por que eu quis, vi os meus amigos fazendo e fui, por que não gosto de pedir dinheiro a minha mãe. Quando a polícia me pegou disse que tinha achado a droga, mas fui eu que comprei para depois vender. A polícia faz o trabalho dela, pegar a gente quando está fazendo coisa errada" (L.F.R, 17 anos). “Ninguém me chamou para ir roubar, eu fui por que quis para ter dinheiro fácil. A minha apreensão foi justa, por que não pode pegar as coisas dos outros” (J.R.S.S, 15 anos).

Entretanto, o envolvimento dos adolescentes com drogas é uma das

principais razões para que o mesmo cometa o ato infracional, pois a dependência

química acarreta esta prática, mostrando que muitos adolescentes só chegam a

praticar o ato infracional sob o efeito de drogas.

“Tia, uso maconha há 4 anos e na hora que os home me pegou eu estava drogado” (L.F.R, 17 anos). “Na hora que os cana

14 me pegou eu só tinha usado uma pedra, não me

preocupo com as pessoas, porque é o meu pai que me dar à comida (J.R.S.S, 15 anos).

A situação do adolescente envolvido com a drogadição não pode estar

limitada somente à aplicação da lei. Cabe, portanto, ao Estado, à família e à

sociedade oferecer ao adolescente o cuidado daqueles que estão em situação de

vulnerabilidade social. Segundo o SINASE15:

“O adolescente deve ser alvo de um conjunto de ações socioeducativas que contribua na sua formação, de modo que venha a ser um cidadão autônomo e solidário, capaz de se relacionar melhor consigo mesmo, com os outros e com tudo que integra a sua circunstância e sem reincidir na prática de atos infracionais. Ele deve desenvolver a capacidade de tomar decisões fundamentadas, com critérios para avaliar situações relacionadas ao interesse próprio e ao bem-comum, aprendendo com a experiência acumulada individual e social, potencializando sua competência pessoal, relacional, cognitiva e produtiva” (SINASE, 2006, p. 46).

14

Os cana: maneira que os adolescentes tem para chamar os policiais militares. 15

Sinase é o conjunto ordenado de princípios, regras e critérios, de caráter jurídico, político, pedagógico, financeiro e administrativo, que envolve desde o processo de apuração do ato infracional até a execução de medida socioeducativa. Esse sistema nacional inclui os sistemas estaduais, distritais e municipais, bem como todas as políticas, planos, e programas específicos de atenção a esse público (Sinase, 2006, p. 22). Sinase constitui-se de uma política pública destinada à inclusão do adolescente em conflito com a lei que se correlaciona e demanda iniciativas dos diferentes campos das políticas públicas e sociais (Sinase, 2006, p. 23).

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O SINASE mostra que as instituições que acompanham esses

adolescentes devem proporcionar condições para que os mesmos se reconheçam

como sujeitos de direitos, preparando sua autonomia, esclarecendo sobre o que seja

o ECA, para que os mesmos venham a viver em sociedade de forma que afastem

do ato infracional.

“Não sei nada do que é esse estatuto, o ato infracional é conhecer os artigos. O meu artigo foi furto que é o 155. O que eu sei é isso tia” (A.M.L, 16 anos). “O estatuto é...não sei. È quando a pessoa faz coisa errada e tem que pagar” (M.S.S, 16 anos). “Ah, não sei o que é o estatuto e nem o ato infracional” (J.S.N, 15 anos). “O ECA é para proteger os menores e que o ato infracional é usado por que eu errei” (B.G.S, 16 anos). “Não sei nada sobre o Estatuto e o ato infracional é que se eu fizer de novo vou ser preso” (J.R.S.S, 15 anos). “Ei não sei explicar o que é o estatuto e o ato infracional são os artigos e o tempo que eu vou ficar no centro” (L.F.R, 17 anos).

Muitos dos adolescentes ou quase todos, desconhecem o que seja o ECA

e relatam que o ato infracional são os artigos do Código Penal conforme ouvem falar

na rua e no cotidiano de sua vida infracional.

Outro fator importante analisado por esta pesquisa é o uso de drogas, o

qual comprova que o uso pode designar as vivencias no cotidiano dos adolescentes.

Entre os adolescentes pesquisados, uma grande parcela tem inserido no seu dia a

dia o costume da drogadição. Este gráfico representa a pergunta da entrevista: No

momento da sua apreensão estava sob o efeito de drogas ou álcool?

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Gráfico 5: Tipo de Drogas Ilícitas Usadas pelos Adolescentes

Fonte: 5ª Vara da Infância e da Juventude de Fortaleza/CE

Sabe-se que 52% dos adolescentes autores de ato infracional possui

alguma ligação com as drogas ilícitas, até mesmo como um refúgio para situações

que sofrem dentro de casa, na rua ou na escola.

“Comecei a usar droga desde os 9 anos de idade, aos 10 anos já tava envolvida no crack, todo dia era sagrado eu furtar para usar pelo menos uma pedra ou conseguia dinheiro roubando as coisas lá de casa. Tia, não morri ainda porque fui apreendida e me levaram para o centro educacional” (A.M.L, 16 anos). “Tia, uso maconha há 4 anos e na hora que os home me pegou eu estava drogado” (L.F.R, 17 anos).

Outro dado relevante no gráfico acima apresentado consiste no número

reduzido de adolescentes que "assume" ser dependente químico e que pede ajuda

para ser encaminhado a programas de tratamento, haja vista que é um número

reduzido de adolescentes que pretende fazer um acompanhamento.

Freitas (2002) fala que o uso de drogas na adolescência pode surgir por

intermédio do grupo de amigos, por ser este o local que os jovens encontram e

experimentam sensações semelhantes juntos.

não usam 48%

maconha 45%

crack 7%

0%

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“Comecei a usar maconha porque o meu amigo me chamou, eu ia muito na pilha dos outros, mas já faz 4 meses que parei” (M.S.S, 16 anos). “Tava no campo, aí o meu brother chegou e me chamou pra usar maconha, eu fui, não tô mais usando faz muito tempo, um mês” (J.S.N, 15 anos).

Observamos através dos dados coletados que foi perceptível que os

adolescentes admitidos na 5ª Vara da Infância e da Juventude no ano de 2012 são

usuários de drogas ilícitas, cometeram os atos infracionais em decorrência de

problemas familiares e de renda, pelo simples fato de tentar suprir as necessidades

vitais.

De acordo com as entrevistas e os dados da 5ª vara da Infância e da

Juventude, observamos que esses adolescentes são sujeitos que não estão mais

estudando e muitos deles afirmaram que depois que passaram a ser viciados em

drogas, principalmente os que usam o crack, “não pensam mais em fazer nada”, não

tem nenhum projeto de futuro e nem expectativa de vida.

Nessa perspectiva, pode-se ressaltar a carência de todo o Estado de

programas específicos para direcionar esses adolescentes, pois são poucas as

alternativas existentes, dificultando a ação de profissionais que atuam na área da

Infância e Juventude de inserção dos mesmos na sociedade.

A partir das entrevistas com os 06 adolescentes elaborou-se um perfil ao

qual o foco frisou os motivos dos adolescentes a cometerem ato infracional, que por

sua vez, a desigualdade de renda e a falta da educação são fatores a serem

considerados. Os adolescentes pobres compreendem na maioria dos envolvidos na

prática dos atos infracionais, os mesmos não possuem condições financeiras e nem

mesmo a garantia dos seus direitos fundamentais.

A.M.L: 16 anos, o ato infracional cometido foi furto e contravenção penal, estudou

até o 3º ano do ensino fundamental, mora com a mãe, 5 irmãos, a tia e a avó no

bairro Pirambú. Diz que passa o dia na rua, pratica futebol, seu projeto para o futuro

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é ser advogada. Era usuária de crack há 7 anos até ser internada no centro

educacional. Ressalta que conversa com a tia e a irmã, pois não gosta da mãe, a

mãe não trabalha, só bebe. A renda familiar é da avó que é aposentada. Não se

preocupa com o que as pessoas pensam dela. Diz que não sabe nada sobre o que

significa o ECA, que o seu conhecimento sobre o ato infracional é conhecer os

artigos de acordo com o delito, não gosta de falar como se envolveu e nem porque

motivo com o ato infracional. Afirma que foi bom ter sido apreendida, por que se

afastou da droga, se tivesse na rua já estava morta (sic). Foi Deus que me colocou

no centro educacional.

M.S.S: 16 anos, o ato infracional cometido foi receptação, estudou até o 8º ano do

ensino fundamental, mora com a mãe, 2 irmãos, no bairro Planalto Pici. Passa o dia

na casa do colega costurando, pois está sem trabalhar atualmente, pratica futebol,

seu projeto para o futuro é trabalhar e não se envolver mais com o ato infracional. Já

fez uso de maconha, mas há 4 meses parou. Afirma que gosta de conversar com a

mãe e que ela conhece todos os seus amigos. A renda familiar é de dois salários

mínimos do emprego da mãe de costureira. Não se preocupa com o que as pessoas

pensam dele, pois cada um tem a sua vida. Afirma não saber o que é o ECA, o ato

infracional e quando a pessoa faz coisa errada e tem que pagar, diz que se envolveu

quando o namorado da irmã chegou e ofereceu a moto roubada e só soube quando

a polícia chegou na minha casa através de denúncia, foi justa a sua apreensão pois

a polícia está fazendo o trabalho dela.

J.S.N: 15 anos, o ato infracional cometido foi furto, estuda e cursa o 6º ano do

ensino fundamental, mora com a mãe, 6 irmãos, no bairro Mondubim. Passa o dia

na escola e trabalha na entrega de frango, pratica futebol, seu projeto para o futuro é

ser jogador de futebol. Já fez uso de maconha, mas parou há 1 mês. Afirma que não

tem diálogo com a mãe, ela é ruim de conversa, diz que estou sempre errado, mas a

respeita muito. A renda familiar é menos de um salário mínimo que é do emprego da

mãe de doméstica. Não se preocupa com o que as pessoas pensam dele. Responde

que não sabe o que é esse estatuto e nem o que é ato infracional. Afirma que foi

influenciado por um amigo e que não acha justa a sua apreensão por que o outro é

que ficou com o celular e a bicicleta.

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J.R.S.S: 15 anos, o ato infracional cometido foi furto, não estuda e cursou até o 4º

ano do ensino fundamental, mora com o pai e a mãe, não tem irmãos, mora no

bairro da Messejana. Passa o dia todo dormindo, joga futebol no campo do lado da

minha casa, não tenho projeto para o meu futuro. Diz que conversa com os pais e

obedece só às vezes. Usa droga mais não sabe há quanto tempo. A renda da

família é de dois salários mínimos, por que os meus pais trabalham com serviços

gerais. Não me preocupo com as pessoas, por que é o meu pai que me dar à

comida (sic). Afirma não entender nada sobre o ECA e sobre o ato infracional diz

que se ele fizer de novo vai apreendido. Ninguém me influenciou para ir roubar, eu

fui por que quis para ter dinheiro fácil. A minha apreensão foi justa, por que não

pode pegar as coisas dos outros.

B.G.S: 16 anos, o ato infracional cometido foi porte ilegal de arma e receptação,

estuda e cursa o 6º ano do ensino fundamental, mora com a mãe, 4 irmãos, no

bairro Dias Macedo. Passa o dia todo em casa e a noite vai para a aula, joga futebol

no campo enfrente da minha casa, o meu projeto para o futuro é trabalhar, fazer

filhos e criar. Nega ter usado alguma droga. Afirma que tem diálogo com a mãe, ela

é muito legal, que ela conhece todos os seus amigos e que é querido pela família. A

mãe não trabalha e a renda familiar é do dinheiro que o namorado dar que é de

outro país. Não me preocupo com as pessoas pensam de mim, só com a minha

mãe. Diz que o ECA é para proteger os menores e que o ato infracional é usado por

que eu errei. Me envolvi quando um amigo chamou e ele estava armado, depois foi

por que fui andar numa moto roubada, mas não fui eu que roubei. Fui influenciado

pelas amizades que não prestam e a minha apreensão foi justa porque eu estava

com ele na hora.

L.F.R: 17 anos, o ato infracional cometido foi tráfico de drogas, foi apreendido 5

vezes, estuda e cursa o 8º ano do ensino fundamental, mora com o pai e a mãe, 3

irmãos, no bairro Jacarecanga. Durante o dia faço a tarefa e depois vou à praia,

gosto de jogar bola e surfar, o meu projeto para o futuro é acabar os estudos e

arranjar um emprego. É usuário de maconha há 4 anos e que na hora que foi

apreendido estava drogado. Afirma que tem diálogo com a mãe e que às vezes

discute. A renda familiar é do salário do pai que é zelador e da mãe que é

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doméstica, por volta de dois salários mínimos. Não me preocupo com o que as

pessoas falam por que elas sempre aumentam. Não sabe explicar o que é o ECA, e

o ato infracional são os artigos e o tempo que vai passar se for apreendido. Meu

envolvimento pela primeira vez para conhecer o centro educacional. Ninguém me

chamou, eu fui por que eu quis, vi os meus amigos fazendo e fui por que não gosto

de pedir dinheiro a minha mãe. Quando a policia me pegou disse que tinha achado a

droga, mas fui eu que comprei para depois vender. A polícia faz o trabalho dela,

pegar a gente fazendo coisa errada.

Diante do exposto, através das entrevistas observamos que a faixa etária

mais comum desses menores infratores é entre 15 e 17 anos, que os mesmos são

usuários de drogas ilícitas.

Assim, muitos adolescentes são filhos de pais separados e, na maioria

das vezes, não conseguem enfrentar essa separação com maturidade,

manifestando, por conseguinte, angústias e conflitos. Esses sintomas se acentuam

ainda mais quando a mãe acaba tendo outros relacionamentos amorosos, o que, por

vezes, é inaceitável para o adolescente.

O limitado espaço de vida que a maioria desses adolescentes tem pode

ser percebido a partir da impossibilidade de satisfação de suas necessidades

básicas. O contexto em que estão inseridos se configura através das visões

preconceituosas, de limitações e de exclusão social.

Diante disso, o futuro dos adolescentes entrevistados representa um

mundo de incertezas, dúvidas e muitas dificuldades para se construir e executar um

projeto de vida totalmente diferenciado da realidade que vivem.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa trata-se de um estudo embasado nas motivações que os

adolescentes possuem para cometer ato infracional. Ocorre que o ato infracional é

uma realidade encontrada nas mais diferentes sociedades, variando somente em

grau, inclusive nos filhos de classe média ou rica, mas o que vemos na divulgação

da mídia atualmente é o aumento das infrações cometidas por adolescentes das

classes empobrecidas.

O estudo dessas motivações permitiu a visualização de parte de

problemas comuns, como: a falta de acolhimento e vínculos familiares, desamparo

perante a sociedade, desproteção do Estado. Esses elementos conduzem a sólidas

medidas que compõe a realidade desses adolescentes infratores.

O ato infracional está se tornando cada vez mais visível no país, e

atualmente direcionando a sociedade a considerar que o adolescente envolvido com

delitos é o maior responsável pela insegurança, parecendo ser algo que não possui

solução.

Observei que a criminalidade entre adolescentes está aumentando

gradativamente, mas o Estado prefere investir milhões em centros de internação

para menores, os quais demonstram como um armazenamento de pessoas, não

sendo efetivados nesses locais políticas públicas, ressocialização e direitos

humanos para que os mesmos se mantenham afastados do ato infracional.

Durante a pesquisa, diante da realidade apresentada, concluí que a

maioria desses adolescentes tiveram seus direitos violados durante a sua infância,

começando pela própria família, que na maioria das vezes, não possuem um poder

aquisitivo que retirem os mesmos da sua condição de negligência. Então, conhecer

a história de vida desses adolescentes revela sua importância para um tratamento

mais humanizado dentro da instituição. A troca de informações dentro da instituição,

com adolescentes e familiares destes, fortalecem as relações, permitindo uma

melhor compreensão da vivência singular de cada família.

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Outro aspecto que pude observar é que o envolvimento com as drogas,

além de ser um dos maiores agentes incentivadores para a prática dos atos

infracionais, direcionam os adolescentes a reincidirem nas medidas socioeducativas,

pois se observa o fácil acesso e estes veem na infração a única maneira de

sustentar o vício.

O Estado assim como a sociedade tem a responsabilidade de garantir a

esses adolescentes uma educação de qualidade, saúde, cultura, lazer e

profissionalização, ou seja, a forma preventiva para a diminuição dos casos de

adolescentes em conflito com a lei. Porém, em vez de possibilitar uma mudança,

percebe-se que a sociedade só julga esses adolescentes como “jovens do crime” e

“delinquentes”, ou seja, acredito que não conseguem pensar e refletir sobre a

história de vida e os direitos que lhes são privados.

Vale ressaltar que o ingresso na 5ª Vara da Infância e da Juventude foi

essencial para a realização da pesquisa. Não houve nenhum tipo de dificuldade no

acesso às informações e entrevistas, pois fui estagiária do setor da Liberdade

Assistida por um período de um ano e meio. Diante isso, tive a facilidade para

aproximação com os adolescentes entrevistados. E através desse período de

estágio tive mais envolvimento com a temática que já era de meu interesse.

Por fim, o tema pesquisado não pode deixar de ser inserido nos debates,

para que haja discussões construtivas e criação de estratégias para realização de

atendimentos conscientes e produtivos, que tenham como principal objetivo

solucionar os problemas apresentados da realidade dos adolescentes que estão em

situação de conflito com a lei.

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APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO DO ENTREVISTADO Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Caro/a Senhor/a,

Chamo-me ____________________________________, sou graduanda (8º

semestre) em Serviço Social pela Faculdade Cearense – FAC. Estou realizando

uma pesquisa para o meu trabalho de conclusão de curso. A pesquisa tem por

objetivo estudar as motivações que levam os adolescentes a cometerem ato

infracional em Fortaleza.

Por essa razão, o/a Senhor/a está sendo convidado/a a participar, de forma a

responder algumas perguntas, permitir ser observado e ter depoimentos gravados.

O/a Senhor/a terá garantido o sigilo de todas as informações que dispuser, bem

como o anonimato de todo e qualquer depoimento. Terá também o direito de se

desligar da pesquisa a qualquer momento, sem que isto lhe traga qualquer prejuízo

e/ou despesa.

A sua participação nesta pesquisa é de caráter voluntário. Caso o/a Senhor/a aceite

participar, não receberá nenhuma compensação material ou financeira, como

também não sofrerá qualquer prejuízo se não aceitar.

Se tiver alguma dúvida a respeito dos objetivos da pesquisa e/ou métodos utilizados

na mesma, estarei à disposição na FAC, endereço Av. João Pessoa, 3884 – Damas,

curso de Serviço Social, no horário da noite (18:30 – 22:00), nas terças e sextas-

feiras. Meu telefone de contato é ____________________ e meu e-mail é:

_________________________.

Caso o/a Senhor/a esteja de acordo em participar deverá preencher e assinar o

Termo de consentimento pós-esclarecido que se segue, recebendo uma cópia do

referido Termo.

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Termo de Consentimento Pós-Esclarecido

Pelo presente instrumento que atende às exigências legais, o/a Sr/a

_________________________________________________, portador/a da cédula

de identidade __________________________, declara que, após leitura minuciosa

do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), teve oportunidade de fazer

perguntas, esclarecer dúvidas que foram devidamente explicadas pelo/a

pesquisador/a, ciente dos serviços e procedimentos aos quais será submetido e, não

restando qualquer dúvida a respeito do lido e explicado, firma seu

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO em participar de forma voluntária

desta pesquisa.

E, por estar de acordo, assina o presente Termo.

Fortaleza – CE, ____de __________________de __________.

_______________________________ ou Representante Legal

Impressão dactiloscópica

________________________________________

Fernanda Lílian Lima Mota

Pesquisadora

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APÊNDICE B – Roteiro de Entrevistas

1. IDENTIFICAÇÃO

1.1 Qual o seu nome e qual a sua idade?

1.2 Você estuda? Estudou até que série?

1.3 Onde você mora?

1.4 O que você faz durante o dia?

1.5 Qual programa da TV que você gosta de assistir?

1.6 Pratica algum esporte?

1.7 Qual o seu projeto para o futuro?

1.8 Você faz/fez uso de alguma droga? Se sim qual?

1.9 Faz uso de drogas há quanto tempo?

1.10 No momento da sua apreensão estava sobe o efeito de drogas ou álcool? Se

sim quais?

2. SITUAÇÃO FAMILIAR E SOCIOECONÔMICA

2.1 Você mora com seus pais?

2.2 Existe diálogo entre você e seus pais?

2.3 Como você vê a sua relação com seus familiares?

2.4 Seus pais conhecem seus amigos?

2.5 Seus pais controlam seu horário de saída e chegada em casa?

2.6 Você se preocupa com que as pessoas pensam de você?

2.7 Qual a profissão dos seus pais? Qual a renda familiar?

2.8 Você tem irmãos? Quantos?

3. SOBRE O ATO INFRACIONAL

3.1 O que você sabe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente?

3.2 Qual o seu conhecimento sobre o ato infracional?

3.3 Qual ato infracional que você cometeu?

3.4 Como você se envolveu com ato Infracional?

3.5 Você foi influenciado por alguém?

3.6 Qual o motivo para que você cometesse esse ato?

3.7 Você acha que foi justa sua apreensão?

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ANEXO

SINOPSE DOS RESULTADOS DO IBGE DO CENSO DE 2010

www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/webservice/default.php?cod1=0&cod2=&cod3=0&frm=piramide