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6 Fisiologia do Sangue.

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do Sangue.

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FISIOLOGIA DO SANGUE - Vol I - 117

O sangue é o meio líquido queflui pelo sistema circulatórioentre os diversos órgãos,transportando nutrien-tes,hormônios, eletrólitos, água,resíduos do metabolismo celulare diversas outras substâncias. Afisiologia do sangue estuda assuas múltiplas funções eminteração com a nutrição dosdemais tecidos do organismo.

O deslocamento do sangue nosis-tema circulatório depende daação da bomba cardíaca e dacondução pelas artérias, veias ecapilares. O sangue circula noorganismo humano, trans-portando oxigênio, dos pulmõespara os tecidos, onde é liberadonos capilares. Ao retornar dostecidos, o sangue conduz odióxido de carbono e os demaisresíduos do metabolismo celu-lar,para eliminação através da res-piração, do suor, da urina ou dasfezes.

O sistema de defesa doorganismo contra doenças e ainvasão de germes patogênicosestá concentrado no sangue. Oequilíbrio e a distribuição deágua, a regulação do pH atravésos sistemas tampões, o controleda coagulação e a regulação datemperatura correspondem aoutras importantes funçõesdesem-penhadas pelo sangue.

As células do corpo humano,para funcionar adequadamente,precisam consumir oxigênio. As

moléculas de hemoglobinacontidas nos glóbulos vermelhosdo sangue, transportam ooxigênio aos tecidos, e, quando asua oferta é reduzida, ofuncionamento celular sedeteriora, podendo mesmocessar, determinando a morte.

O volume de sangue contido nosistema circulatório (coração,artérias, veias e capilares)constitui o volume sanguíneototal, também chamado volemia.Um adulto, dependendo do seuporte físico, pode ter de 4 a 8 litrosde sangue no organismo. Emgeral, a volemia tem relação coma idade e o peso dos indivíduos(Tabela 6.1). O adulto temaproximadamente 60ml desangue para cada quilograma depeso corporal. Os elementoscelulares corres-pondem aaproximadamente 45% dovolume de sangue, enquanto oplasma corresponde a 55%.

Fig.6.1. Diagrama que mostra a composição do sangue.Lista os elementos celulares e o plasma sanguíneo.

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Tabela 6.1. Volemia estimada.

Peso ( Kg ) Volemia ( ml/Kg )

Recém-nato - 10 Kg 8511 - 20 8021 - 30 7531 - 40 65> 40 60

O sangue é um tecido quecontém uma fase sólida, quecompreende os elementoscelulares, e uma fase líquida, quecorres-ponde ao plasma (Fig. 6.1).

Os elementos celulares dosangue são as hemácias, osleucócitos e as plaquetas.

As hemácias são as célulasencarre-gadas do transporte deoxigênio e gás carbônico dometabolismo celular; os

leucócitos constituem umexército de defesa do organismocontra a invasão por agentesestranhos e as plaquetas sãofragmentos celulares,fundamentais aos processos dehemostasia e coagulação dosangue.

O plasma sanguíneo éconstituido por elementos sólidose água. Os elementos sólidos doplasma são, principalmente asproteinas, gorduras, hidratos decarbono, eletrólitos, saisorgânicos e minerais, ehormônios. O plasma é umlíquido viscoso que contém 90%de água e 10% de sólidos, comoproteinas, lipídeos, glicose, ácidose sais, vitaminas, minerais,

hormônios e enzimas. Em cada litro de sangue existem 60 a 80 gramas

de proteina. A maior parte éconstituida pela albumina; emmenor proporção estão asglobulinas, rela-cionadas àformação de anticorpos para adefesa do organismo e ofibrinogênio, uma proteinafundamental no processo decoagulação do sangue.

O organismo humano contémuma grande quantidade de água,capaz de migrar entre os diversoscompar-timentos, pelo fenômenoda osmose. A osmose é umprocesso físico que ocorre entreduas soluções separadas por

uma membrana permeável, emque a água atravessa amembrana para o lado quecontém o maior número desolutos, para igualar a suaquantidade nos dois lados damembrana.ORIGEM DASCÉLULAS DOSANGUE

No início da gravidez, oembrião retira os alimentos deque precisa das paredes do úteromaterno. À partir da terceirasemana, passa a alimentar-se

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através o sangue materno. Nofinal do primeiro mês, o feto játem um coração rudimentar, quebombeia o sangue para o corpoem formação. Nas primeirassemanas de gestação, o embriãohumano é acompanhado de umaespécie de bolsa, chamada sacovitelino.

À partir de três semanas degestação na parede externa dosaco vitelino surgem pequenasmassas celulares, que vão setransformando em agrupamentossanguíneos, chamados ilhotas deWolff. As paredes dos primeirosvasos sanguí-neos são formadaspelas células que contornam asilhotas e, aos poucos, o interiordas ilhotas vai ficando vazio. Ascélulas mais internas das ilhotastrans-formam-se em glóbulosvermelhos primitivos.

No início do segundo mês, osangue já tem glóbulosvermelhos, glóbulos brancos eplaquetas. Os vasos sanguí-neose glóbulos vermelhos se originamfora do organismo do embrião, ouseja, são de origem extra-embrionária.

Após o terceiro mês de vidafetal, a formação do sangue seprocessa no fígado e no baço.Esta fase é conhecida como fasehepática da fabricação do sanguefetal. Na metade do período davida fetal, a medula óssea começaa produzir o sangue, processo quese continua durante toda a vida

extra-uterina.Após o nascimento, a grande

maioria das células do sangue éproduzida pela medula óssea, omiolo gelatinoso que preenche ointerior dos ossos longos e doesterno. Os tecidos linfoides,locali-zados no baço, timo,amigdalas, gânglios linfáticos eplacas de Peyer no intestino,também colaboram nesta tarefa.A própria medula óssea contémtecido linfoide e, em situaçõesespeciais, encarrega-se sòzinhada produção de todas as célulasdo sangue. A medula óssea depràticamente todos os ossosproduz eritrócitos até os cincoanos de idade. À partir daí, amedula dos ossos longos torna-se mais gordurosa, exceto oúmero e a tíbia, e deixam deproduzir células após os vinteanos de idade. Acima dos vinteanos, a medula dos ossosmembranosos, como asvértebras, as costelas, o esternoe a pelve são os grandesprodutores dos eritrócitos.

A matriz celular, existente namedula óssea e nos tecidoslinfoides é a célula reticularprimitiva, que aparece nasprimeiras fases de formação doembrião e funciona como umafonte permanente de célulassanguíneas. A célula reticularprimitiva origina dois tiposdistintos de células: as célulasreticuloendoteliais, que

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desempenham funçõesprotetoras, englobando partículasestranhas e os hemocitoblastos,que são as células produ-toras desangue e que dão origem àshemácias, alguns tipos deleucócitos e plaquetas.

O hemocitoblasto é uma célulavolumosa que tem um núcleoovoide. No interior da medulaóssea os hemo-citoblastosdividem-se e originam célulasmenores, os proeritroblastos.Estas outras células também sedividem e originam oseritroblastos que sofrem diversastransformações até que, final-

mente, perdem o núcleo e seconstituem nos eritrócitos. Oprocesso de formação dashemácias é denominadoeritropoiese.

Nas malhas do retículo damedula dos ossos também sedesenvolvem os granulócitos que,como as hemácias, descendem dacélula reticular primitiva.Origina-se inicialmente, um tipocelular chamado mieloblasto que,por sua vez se diferencia empromielócito, cujo citoplasma temgrânulos. Conforme a coloraçãodos grânulos seja violeta, azul ouvermelha, é que os promielócitos

se diferenciam nas células brancas neu-trófilos, eosinófilos e basófilos.Estes três tipos de leucócitos temnúcleos com dois ou mais lobose, por essa razão, são chamadosde polimorfonucleares. Eles temgranulações no interior do seucitoplasma e por isso são tambémchamados de granulócitos.

O tecido linfoide, que forma aestrutura básica do baço, dotimo, dos gânglios linfáticos e deoutros órgãos é o encarregado daprodução dos outros dois tipos deleucócitos, os monócitos e oslinfócitos. Estas células temnúcleo simples e não temgranulações no seu citoplasma.

Os leucócitos são as unidadesmóveis do sistema protetor doorganismo. Após a sua formação,

os leucócitos são transportadospelo sangue, para as diferentespartes do organismo, ondepoderão atuar, promovendo adefesa rápida contra qualqueragente invasor.

Os hemocitoblastos tambémfor-mam os megacariócitos, que,como o nome indica, são célulasque apresentam núcleoscaracterísticamente grandes. Ocitoplasma do megacariocitofragmenta-se em diversasporções, que ficam totalmenteenvolvidas por uma mem-brana.Quando o megacariócito serompe, libera diversas plaquetasque são lançadas na circulação.As plaquetas, portanto, não são

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células e sim, elemen-toscelulares, porque são fragmentosde uma célula principal derivadada célula primitivahemocitoblasto.

As células sanguíneas e asplaquetas tem origem comum nascélulas reticu-lares primitivas. Asua produção é contínua,durante toda a vida do indi-víduo,e regulada por diversos fatoresque, em condições normais,mantém a concentraçãoadequada de cada tipo celular, nosentido de otimizar as funções dosangue. Cada elemento celular dosangue, hemácias, leucócitos eplaquetas desempenha funçõesespecí-ficas, relacionadas aotransporte de gases, aosmecanismos de defesa doorganismo e ao sistema dehemostasia.HEMÁCIAS

A principal função dashemácias é transportar oxigêniodos pulmões para os tecidos e odióxido de carbono, dos tecidospara os pulmões. O transporte dooxigênio é feito pela hemoglobina,através de ligações químicas. Ashemá-cias contém a enzimaanidrase carbônica, que acelera areação da água com o dióxido decarbono, tornando possível aremoção de grandes quantidadesde dióxido de carbono, paraeliminação pelos pulmões. Ahemoglobina fun-ciona aindacomo um sistema tampão

adicional, na manutenção doequilíbrio ácido-básico doorganismo.

As hemácias, glóbulosvermelhos ou eritrócitos, são ascélulas mais numerosas nosangue. Tem a forma de um discobicôncavo, com um excesso demem-brana, em relação aoconteudo celular. A membranaem excesso permite à hemáciaalterar a sua forma na passagempelos capilares, sem sofrerdistensão ou rotura. A formabicôncava da hemácia favorece aexistência de uma grandesuperfície de difusão, em relaçãoao seu tamanho e volume. Ahemácia circu-lante não temnúcleo, seu diâmetro médio é deaproximadamente 8 microns e aespessura é de 2 microns naperiferia e cerca de 1 micron nasua porção central.

A quantidade de hemácias nosangue varia com o sexo. Nohomem adulto normal, suaconcentração é de apro-ximadamente 5.200.000 pormililitro de sangue, enquanto namulher normal é de 4.800.000.

A altitude em que a pessoa viveafeta o número de hemácias emcirculação. As populações quevivem em grandes altitudes, ondea pressão parcial de oxigênio noar é mais baixa, tem necessidadede uma maior quantidade dehemácias na circulação, paramanter a oxigenação dos tecidos

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adequada.No recém-nascido, a contagem

de hemácias revela quantidadessuperiores às do adulto. Nodecorrer das duas primeirassemanas de vida, a quantidadede hemácias se reduz e estabiliza,até atingir os níveis do adultonormal.

Aproximadamente 60% dacélula da hemácia é constituidapela água e o restante peloselementos sólidos. Da partesólida, 90% é ocupada pelahemo-globina e o restantecorresponde às proteinas,substâncias gordurosas, fosfatos,cloro e íons de sódio.

A quantidade de hemácias nosistema circulatório é controladapelo orga-nismo, de tal forma queum certo número de eritrócitosestá sempre disponível para otransporte de oxigênio aostecidos. Qualquer condição quediminua a quantidade de oxigênionos tecidos, tende a aumentar aprodução de eritrócitos.

Quando a medula ósseaproduz hemácias muitoràpidamente, várias células sãoliberadas no sangue antes de setornarem eritrócitos maduros.Estas células mal desenvolvidaspodem transportar o oxigêniocom eficiência porém, são muitofrágeis e o seu tempo de vida émenor.

A vida média das hemácias noorga-nismo é de 100 a 120 dias.

Fig. 6.2. Esquema da molécula da hemoglobina A quemostra os quatro grupos heme ligados às cadeias depolipeptídeos (alfa e beta) e a ligação do radical hemecom as quatro moléculas de oxigênio.

Ao final desse período suasmembranas tornam-se frágeis eelas são, na maioria, removidasda circulação pelo baço,enquanto a medula óssea formanovas hemácias, para seremlançadas na circulação. Esteprocesso de formação dehemácias é contínuo.

A hipóxia renal estimula aliberação de um fatoreritropoiético que modifica umaproteina do plasma, transfor-mando-a em eritropoietina ouhemo-poietina que, por sua vez,estimula a produção de glóbulosvermelhos.

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A medula óssea para elaborarnovos glóbulos vermelhosaproveita restos de hemáciasenvelhecidas e destruidas. O ferrocontido na hemoglobina é reapro-veitado, para formar novasmoléculas do pigmento. Célulasfagocitárias do baço, fígado,gânglios linfáticos e da própriamedula encarregam-se dedestruir os glóbulos vermelhosenvelhecidos. À seguir, lançam nacirculação o ferro que sobra, paraque possa ser reaproveitado. Aprodução de hemácias exige apresen-ça de cianocobalamina(vitamina B12) e um fator damucosa do estômago, chamadode fator intrínseco, que secombina com a vitamina B12. Oácido fólico também participa doprocesso de formação ematuração das hemácias.

HEMOGLOBINAA hemoglobina é o principal

compo-nente da hemácia. Ela éformada no interior doseritroblastos na medula óssea.

A hemoglobina é o pigmentorespon-sável pelo transporte dooxigênio para os tecidos e confereà hemácia a sua coloraçãoavermelhada. Quando aquantidade de hemoglobinacombinada com o oxigênio égrande, o sangue toma acoloração vermelho viva, dosangue arterial. Quando a

combinação com o oxigênio existeem pequenas quanti-dades, acoloração do sangue é vermelhoescura, do sangue venoso.

A hemoglobina é formada pelaunião de radicais heme com umaproteina, chamada globina. Cadamolécula de hemoglobina contémquatro moléculas do radical hemee dois pares de cadeias depolipeptídeos, estruturalmenteformadas por diversos amino-ácidos. A hemoglobina A, doadulto, é formada por um par decadeias de polipeptídeoschamados cadeias alfa e um parde polipeptídeos chamadoscadeias beta. O pigmento ouradical heme contém moléculasde ferro no estado ferroso e é oresponsável pela cor vermelha dahemoglobina.(Fig. 6.2).

A cadeia alfa-globina éconstituida por um grupo de 141resíduos de amino-ácidos e temo peso molecular de 15.750Daltons. A cadeias beta é formadapela união de 146 resíduos deamino-ácidos e tem o pesomolecular de 16.500 Daltons. Ahemoglobina A resultante, temum peso molecular aproximadode 64.725 Daltons.

A estrutura química damolécula da hemoglobina foidemonstrada por Perutz eKendrew que, em 1962 rece-beram o prêmio Nobel dequímica, pelos seus trabalhoscom aquele pig-mento. A

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configuração química dahemoglobina permite um aprovei-tamento excepcional; cadamolécula pode transportar quatromoléculas de oxigênio. Acombinação química do radicalheme com a molécula de oxi-gênio é fàcilmente reversível, oque facilita a sua captação noscapilares pulmonares e a sualiberação nos capilares dostecidos. A ligação do oxigênio àhemoglobina é do tipocooperativo. Isto significa que aligação de uma molécula deoxigênio ao grupo heme facilita aligação da segunda molécula, quetorna mais fácil a ligação com aterceira molécula e, mais fácilainda, a ligação com a quarta eúltima molécula, numa espéciede reação cuja velocidadeaumenta à medida em que vaisendo processada. Aoxihemoglobina é a molécula dahemoglobina saturada com

quatro moléculas de oxigênio.Durante as primeiras fases do

desen-volvimento embrionário doser huma-no, o sangue contémuma hemoglobina embrionária,chamada hemoglobina E,composta por duas cadeias depolipeptí-deos do tipo alfa e duascadeias de tipo epsilon. Duranteo estágio de vida fe-tal ahemoglobina embrionária é subs-tituida pela hemoglobina fetal,deno-minada hemoglobina F. Estetipo de hemoglobina, tem enormeafinidade pelo oxigênio, econstitui uma adaptaçãofisiológica, com a finalidade deextrair mais oxigênio dacirculação materna da placenta,que tem uma pO2 relati-vamentebaixo. A hemoglobina fetal éformada pelos quatro radicaisheme ligados à duas cadeias depolipeptídeos alfa e duas cadeiasdo tipo gama. A hemoglobina Fse mantém nas hemáciascirculantes em grandequantidade, nos recém-natos evai desaparecendo gra-dualmente nos primeiros mesesde vida, para dar lugar àhemoglobina A, predo-minanteno sangue do indivíduo adulto.

A capacidade de oxigenaçãodos tecidos pelo sangue estárelacionada ao número deglóbulos vermelhos circu-lantese à quantidade de hemoglobinaque contém. No adulto normal,cada 100 ml. de sangue contém

Fig. 6.3. Curva de dissociação da hemoglobina. Mostraa correlação da saturação de oxigênio com a pO2 dosangue. Alterações da curva refletem modificações dosangue produzidas por diversos fatores, conformeexplanação do texto.

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aproxi-madamente 15 gramas dehemoglobina.

A forma bicôncava dos glóbulosvermelhos é ideal para a absorçãoe liberação rápida de gases. Aausência de núcleo tambémfavorece o transporte de oxigênio,porque a célula pode conter maiorquantidade de hemoglobina,contribuindo para sua maioreficiência por unidade de volume.

A estrutura moleculartetramérica, com quatromoléculas do radical heme e acaracterística ligação cooperativacom o oxigênio, permitem àhemoglobina modificar a suaafinidade pelo oxigênio,dependendo de diversos fatores,como o número de moléculas deoxigênio já combinadas à suaprópria molécula, a presença equantidade de dióxido decarbono, o pH do sangue, atemperatura e a quantidade defosfatos orgânicos presentes.Esses fatores constituem umimportante mecanismo decontrole, que permite àhemoglobina captar oxigênio emum instante e liberá-lo eficien-temente no instante seguinte.

A afinidade pelo oxigênio e acapaci-dade de liberação daquelegás, são descritas por equaçõese curvas que representam adissociação da hemoglo-bina. Acurva de dissociação da hemo-globina representa a relação entrea pressão parcial de oxigênio no

sangue e o percentual desaturação da hemo-globina. Osangue que deixa os pulmões temuma pO2 de 100mmHg e, nessascondições, a hemoglobina estáplena-mente saturada. A curva dedissociação demonstra opercentual de saturação dahemoglobina correspondente acada valor da pO2 do sangue,conforme demonstra o gráfico dafigura 6.3.

A análise da curva dedissociação da hemoglobina e ainfluência de diversos fatores nasua configuração, facilitam acompreensão dos mecanismos deliberação do oxigênio nos tecidos.Quando a afinidade dahemoglobina pelo oxigênio estáaumentada, menos oxigênio éliberado nos tecidos. O consumocelular de oxigênio diminui a suaconcentração no ambiente emque a célula se encontra. Com aredução da concentração dooxigênio, o gradiente do oxigênioatravés a membrana celular se

Fig. 6.4. Esquema dos tubos de hematócrito. Demonstrao resultado da centrifugação do sangue no tubo. Ashemácias se depositam no fundo do tubo, pela suamaior densidade. Ilustra o aspecto do sangue normal,das anemias e das policitemias.

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reduz e menos oxigênio sedifunde na célula, reduzindo opO2 intracelular ecomprometendo o metabolismocelular.

A afinidade da hemoglobinapelo oxigênio é um fenômenodinâmico que pode ser afetadopor diversos meca-nismos. Asmanipulações da fisiologiainduzidas durante a circulaçãoextra-corpórea, como ahipotermia, as alte-rações doequilíbrio ácido-base, ahemodiluição e outras, podemmodi-ficar a afinidade dahemoglobina pelo oxigênio,levando à alterações da saturaçãoe da liberação do oxigênio nostecidos.

A curva de dissociação dahemo-globina pode sermodificada por altera-ções do pH.Se o sangue se tornar ácido, como pH de 7,2 por exemplo, a curvade dissociação se desloca cercade 15% para a direita. Se osangue, ao contrário, estiveralcalino, com o pH de 7,6, a curvase desloca para a esquerda. Oaumento da concentração dodióxido de carbono e o aumentoda temperatura corporal,também deslocam a curva paraa direita.

Quando a afinidade dahemoglobina pelo oxigênio estáaumentada em relação aonormal, a curva de dissociação sedesvia para a direita e, menos

oxigênio é liberado. Se a afinidadeda hemo-globina está diminuidaa curva de dissociação se desviapara a esquerda e o oxigênio éliberado com mais facili-dade. Apresença de grandes quantidadesde hemoglobina fetal desvia acurva de dissociação dahemoglobina para a esquerda, nofeto e no recém-nato, facilitandoa liberação de oxigênio aostecidos.

HEMATÓCRITOA massa de glóbulos vermelhos

existente no sangue pode seravaliada pelo hematócrito. Ohematócrito é o percentual dovolume de sangue ocu-pado pelashemácias e, portanto, repre-sentaum índice da concentração dosglóbulos vermelhos.

Quando se diz que uma pessoatem o hematócrito de 40 significaque 40% do volume sanguíneosão células verme-lhas e orestante corresponde ao plasma.O hematócrito do homem normalvaria de 40 a 45% (média de42%), e o da mulher normal oscilaentre 38 e 42% (média de 40%).O hematócrito, na ausência deanemia, tem correlação com aquantidade de hemoglobinaexistente no sangue. O valor de15g% de hemo-globina nosangue, corresponde aproxi-madamente ao hematócrito de45%. A razão aproximada é de 1:3

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em relação ao hematócrito, o queequivale a dizer que, o valor dahemoglobina multi-plicado portrês, corresponde ao valoraproximado do hematócrito.

O hematócrito é determinadopela centrifugação de umaamostra de sangue em um tubocapilar. Após 3 minutos decentrifugação, as hemácias, porsua maior densidade, sedepositarão no fundo do tubo.Sobre estas se depositará umacamada bem fina de glóbulosbrancos e de plaquetas, e no topodo tubo ficará o plasma. Acamada que contém os leucócitose plaquetas é tão fina que não éconsiderada na leitura. Nosangue normal, após a centri-fugação, se para toda a colunaocupada, atribuirmos o valor 100,teremos 45% ocupados pelashemácias e 55% pelo plasma.Uma escala graduada permite aleitura direta da percentagem dehemá-cias existentes no sangue.Se, em uma amostra de sanguecentrifugado, dividir-mos ocomprimento da coluna deglóbulos vermelhos pelocomprimento total da amostra(glóbulos + plasma), teremos ovalor do hematócrito (Fig.6.4).

Quando a quantidade deglóbulos vermelhos no sangue éinferior ao valor normal, existeanemia. Nestes casos adeterminação do hematócritomostra valores abaixo de 42% no

homem e de 40% na mulher. Aocontrário, quando a quantidadede hemácias é superior aonormal, existe poliglobulia. Ohema-tócrito estará acima de45%.

A hemodiluição usada naperfusão reduz a concentraçãodos elementos celulares dosangue; o hematócrito baixa avalores entre 20 e 25%,dependendo do gráu dehemodiluição. A redução dohematócrito a níveis abaixo de15%, representa um valor dehemoglobina de 5 g%, que podeprejudicar o transporte e a ofertade oxigênio pela hemoglobinapara os tecidos, causando hipóxiacelular e acidose metabólica,mesmo que a saturação deoxigênio do sangue arterial sejanormal.

Quanto maior o hematócrito,maior é o atrito entre as camadasou lâminas do sangue que sedesloca nos vasos sanguíneos. Oatrito entre aquelas camadas éum fator importante nadeterminação da viscosidade dosangue. A viscosidade elevadadificulta o fluxo de sangue atravésdos pequenos vasos e doscapilares.

Em função de mecanismosfisioló-gicos de adaptação, ou emconsequência de alteraçõespatológicas, podem ocorreralterações da quantidade dehemácias no sangue circulante

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(anemia ou polici-temia) bemcomo alterações da estrutura efunção da hemoglobina (hemo-globinopatias).

ANEMIAA anemia corresponde à

redução do número de hemáciascirculantes; pode ser causada porhemorragia ou por deficienteprodução de hemácias.

Se a perda de sangue é rápida,o indivíduo apresentahipovolemia, que suscita aabsorção de líquidos dointerstício para o sangue,diluindo os glóbulos vermelhos,produzindo a anemia. A perdacrônica ou lenta de sanguetambém resulta em anemia,porque a formação de novashemácias não é suficientementerápida para repor a perdacontinuada.

Existem anemias causadas porinca-pacidade da medula ósseaproduzir as células vermelhas,como a anemia aplástica, porexemplo, bem como anemiascausadas por falta de compo-nentes essenciais ao metabolismoformador da hemoglobina, comoo ferro, a vitamina B12, o fatorgástrico intrínseco e o ácidofólico. Outras anemias sãocausadas por excessivadestruição das hemáciascirculantes, como as anemiashemolíticas.

Anemias Hemolíticas - Em

conse-quência de diversasalterações, frequen-tementehereditárias, um organismo podeproduzir hemácias comanomalias diversas, inclusive damembrana celular, que astornam particularmente frágeis epermitem que se rompam comfaci-lidade, ao passar peloscapilares. Nessas condições,mesmo quando o número deeritrócitos é normal, pode ocorreranemia, porque o período de vidaútil das hemácias é muito curto.Um exemplo dessas anemiashemolíticas é a esferocitosehereditária, em que as hemáciastem a forma esférica, ao invés dediscoides. Essas células não tema estrutura da membrana normaldos discos bicôncavos e nãopodem ser comprimidas,rompendo-se com muitafacilidade. Outros exemplosseriam a talassemia ou anemiade Cooley e a anemia falciforme,esta última de grandeimportância em nosso meio.

POLICITEMIAA policitemia representa um

aumen-to, fisiológico oupatológico, da quanti-dade dehemácias no sangue circulante.A contagem das hemácias ésuperior a 5.200.000 por mililitrode sangue e o hematócrito, emconsequência, está acima de45%. O exemplo mais comum de

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policitemia fisiológica é o dasgrandes altitudes, em que aspopulações tem maiorquantidade de hemácias nacirculação para compensar amenor concentração de oxigêniono ar atmos-férico. Os efeitos daaltitude sobre o ser humanocomeçam à partir dos 2.400metros.

A policitemia mais importanteé a de origem patológica e podeser primária ou secundária.

Policitemia Primária - A

medula óssea produzquantidades excessivas dehemácias, sem que issorepresente qualquer mecanismode adaptação. O tipo clássico é aPolicitemia vera, uma condiçãoneoplásica ou tumoral dos órgãosprodutores de célulassanguíneas. Ela gera umaexcessiva produção de eritrócitos,leucócitos e plaquetas. Ohematócrito nestas pessoas podechegar aos 70 ou 80%. O sistemavascular se torna intumescido,

muitos capilares são obstruidos devido à viscosidade do sangue, que

nesta doença, pode aumen-taraté cinco vezes em relação aonormal.

Policitemia Secundária - Ostecidos do organismo sãohipóxicos, como ocorre nascardiopatias congênitascianóticas que se acompanhamde shunt intra-cardíaco da direitapara a esquerda. A hipóxiacrônica, estimula o organismo aproduzir glóbulos vermelhos emexcesso, lançando-os nacirculação para aumentar a ofertade oxigênio aos tecidos. Ohematócrito destas crianças podealcançar os 80% e a viscosidadedo sangue aumentaproporcionalmente. Nestascircunstâncias, a hemodiluiçãopré-operatória é importante para

favore-cer a perfusão e aoxigenação tissulares, durante acirculação extracorpórea.

Com frequência, as alteraçõesdas hemácias são devidas àalterações da hemoglobina, comoocorre na anemia falciforme, queé, provàvelmente, ahemoglobinopatia maiscomumente encontrada. Já foramidentificadas e catalogadas maisde 300 tipos diferentes dehemoglobinas, das quais cerca de10% podem se acompanhar dealtera-ções funcionais e clínicas.Estas altera-ções da hemoglobinasão raras e são encontradasapenas em alguns indiví-duos deuma mesma família. Suaimportância reside no fato de queum paciente portador dessas

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anormalidades podeeventualmente, ser submetido àcirculação extracorpórea e ahemo-globinopatia potenciar odesenvol-vimento de crisehemolítica severa, capaz decomprometer a função renal.

Anemia Falciforme - Érelativamente comum napopulação negra especial-menteda África Central, onde parece terse originado, por mutaçãogenética. Na atualidade a suadistribuição é bastante extensa,graças à migração do povoafricano para a maioria doscontinentes. A doença ou seustraços são facilmenteencontrados na população negraou em seus descendentes, inclu-sive em nosso país.

A alteração primária da anemiafalciforme ocorre nahemoglobina. Existe alteração deum dos resíduos de amino-ácidonas cadeias da globulina beta,originando um tipo de hemoglo-bina chamada hemoglobina S. Acompo-sição anormal da porçãoglobina da hemoglobina, favorecea fácil cristali-zação do pigmentono interior das hemácias, além detornar as células mais frágeis. Oscristais da hemoglobina S sãolongos e tendem a alongar ashemácias, alterando a sua formanormal no sangue. Quando ahemoglobina S cristaliza e sealonga, a hemácia deformadaassume um formato curvo, como

uma “foice”, fato que originou adesignação de falciforme. Estespacientes podem ter baixa tensãode oxigênio tecidual, por diversasrazões, inclusive a formação degrumos celulares que obstruemos capilares e reduzem o fluxosanguíneo para diversos tecidos.

As hemoglobinopatias, comoas demais alterações de origemgenética, podem ser do tipohomozigótico onde os doisprogenitores transmitem o genedeficiente ou pode ser do tipohetero-zigótico onde o genedeficiente provém de apenas umdos progenitores. Na anemiafalciforme, a hemoglobinapatológica pode ser do tipo Hb-SS (homozigótico) ou do tipo Hb-AS (heterozigótico), em quecoexiste o caráter A dahemoglobina normal. A doençaapenas se manifesta nos porta-dores do tipo Hb-SS, sendo osdemais indivíduos, portadores dotipo Hb-AS, conhecidos comoportadores do traço falciforme. Napopulação negra ameri-cana 8%dos indivíduos tem o traçofalciforme, enquanto 0,2% tem aanemia na sua forma plena.

A anemia falciforme étransmitida através docromossoma 11, onde se localizao gene mutante causador daalteração da cadeia beta daglobina. A miscigenação dasraças produziu a expansão dadoença que, em nosso país, pode

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cursar com formas de extremagravidade.

As manifestações clínicas daanemia falciforme incluemanemia hemolítica crônica,complicações sistêmicas produ-zidas por infartos de diversosórgãos, complicações renais damesma origem e oclusõesvasculares periféricas. A vidamédia das hemácias falciformesé encurtada e, nos casos maisseveros, pode ser de apenas 10dias.

A circulação extracorpórea empa-cientes com anemia falciformepode desencadear criseshemolíticas extrema-menteseveras além de oclusões vascu-lares e outras complicaçõessistêmicas.

HEMÓLISEA lise ou rotura das

membranas das célulassanguíneas vermelhas é conhe-cida como hemólise. A lesão damem-brana das hemáciaspermite a liberação dahemoglobina para o plasma,consti-tuindo a hemoglobinalivre. O fenô-meno gerado peloaumento de hemo-globina livreno plasma em consequên-cia dahemólise é a hemoglobinemia.

A quantidade de hemoglobinalivre no plasma depende dacapacidade e da velocidade deremoção do pigmento pelo

organismo de cada indivíduo.Normalmente, o sistema retículo-endotelial é capaz de removercerca de 0,1mg de hemoglobina/Kg/minuto. Quando ahemoglobina livre no plasmasupera o valor de 100mg%, ahemo-globina é filtrada pelosrins. A urina que contémhemoglobina adquire a colora-çãoavermelhada, característica dahemoglobinúria. Dependendo daquanti-dade de hemoglobina, acoloração da urina pode variar delevemente averme-lhada afrancamente vinhosa ou cor de“coca-cola”. A lesão renalproduzida pela hemoglobina podeocorrer quando os valores dahemoglobina livre no plasma sãosuperiores a 3.000mg%.

O plasma normal contém umapequena quantidade dehemoglobina livre, quecorresponde à hemoglobinaliberada pela destruição dashemácias “velhas”, para a suarenovação. A quantidade dehemoglobina livre no plasmanormal é de aproximadamente6mg%. A circulaçãoextracorpórea adequadamenteconduzida, com os equipamentosatualmente disponíveis, eleva ahemoglobina livre para 20 a40mg%, em função da hemóliseprodu-zida pelo trauma. Quandoo trauma celular na perfusão é

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excessivo, a hemoglobinemia é acentuada e supera os 100mg%,

produzindo a hemo-globinúria.A hemólise pode ser produzida

por reações a certosmedicamentos, como umprocesso auto-imune, devido àpresença de hemoglobinasanormais ou, no caso maisfrequente da circulaçãoextracorpórea, por trauma físico.

O tratamento mais utilizadopara prevenir as consequênciasda hemólise excessiva consisteem administrar bicarbonato desódio, para alcalinizar o plasmae a urina, inibindo a cristalizaçãoda hemoglobina livre.Administra-se ainda o manitol,na tentativa de promo-ver alavagem dos túbulos renais, poruma diurese osmóticaabundante.LEUCÓCITOS

O organismo possui umeficiente sistema de combate aosdiferentes agentes agressores,tóxicos ou infec-ciosos comobactérias, fungos, vírus eparasitas. Este sistema inclui ascélulas brancas ou leucócitos, osmacrófagos dos tecidos e osistema linfóide.

Os leucócitos são consideradosas unidades móveis do sistemaprotetor do organismo, porquepodem deixar a correntesanguínea e migrar para locaisonde sua ação seja necessária.Após a sua formação, as células

brancas são lançadas no sangueonde circulam, até que sejamnecessárias em algum ponto doorga-nismo. Quando isso ocorre,os leu-cócitos migram para o localnecessário, especìficamente asáreas de inflamação, fazendouma defesa rápida contra osagentes infecciosos. Naeventualidade de invasão doorganismo por bactérias, osleucócitos são lançados nacirculação em grandesquantidades.

Existem normalmente nosangue periférico de 6.000 a8.000 leucócitos por mililitro desangue, divididos em cinco tipos:neutrófilos, eosinófilos, basófilos,monócitos e linfócitos. Suadistribuição percentual nosangue periférico corresponde àda tabela 6.2.

Tabela 6.2. Tipos de leucócitos no sangue periférico.

Tipos de Leucócitos Percentual

Neutrófilos 60 a 70%Jovens (Bastões) 3 a 5%Maduros (Segmentados) 51 a 67%

Eosinófilos 2 a 4%Basófilos 0 a 1%Monócitos 4 a 8%Linfócitos 21 a 35%

Os neutrófilos no sangueperiférico se distribuem emformas jovens, com o núcleo embastão e formas adultas, com onúcleo segmentado.

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Os três primeiros tipos deleucócitos, os neutrófilos oseosinófilos e os basófilos sãochamados de leucócitospolimorfonucleares porque temnúcleos com dois ou mais lobos.Além desta característica dosnúcleos, os leucócitospolimorfonucleares apresentamgranu-lações no interior do seucitoplasma, sendo, por essarazão, também chama-dos degranulócitos.

Os monócitos e os linfócitostem núcleo simples, e não temgranulações no citoplasma,sendo conhecidos comoleucócitos agranulócitos.

Os leucócitos formados namedula óssea, especialmente osgranulócitos, ficam armazenadosna medula. Vários fatores podempromover a sua liberação nosistema circulatório, quandoneces-sários.

O tempo de vida dos leucócitosem circulação no sangue é curto.

A maior parte deles ficaarmazenada e só vai para acirculação quando requisitada.Após serem liberados da medulaóssea, passam de seis a oito horascirculando no sangue e duram dedois a três dias nos tecidos.Quando há infecção locali-zadanos tecidos, o tempo dosleucócitos em circulação é aindamenor, porque vão direto à áreainfectada, onde inge-rem osorganismos invasores e a seguirsão destruidos.

Os monócitos passam poucotempo na circulação, porque vãodireto aos tecidos, ondeaumentam de tamanho e podemsobreviver até alguns mesesantes de serem destruidos.

Os linfócitos entram nosistema circulatório de formacontínua e perma-necem nosangue apenas por algumashoras.

Os neutrófilos e os monócitosatacam e destroem as bactérias,vírus invasores e qualquer outroagente lesivo. Ao penetrar nostecidos, os neutrófilosintumescem, aumentam detamanho e, ao mesmo tempo,desenvolvem no citoplasma, umnúmero elevado de lisossomas ede mitocôndrias, que possuemgrânulos. Estas células aumen-tadas denominam-se macrófagos,que tem grande atividade nocombate aos agentes patogênicos.

Os neutrófilos e os monócitos

Fig. 6.5. Diagrama da plaqueta vista ao microscópioeletrônico. Indica a composição da membrana e denumerosas estruturas e organelas intra-plaquetárias,conforme a descrição do texto.

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se movimentam ràpidamenteatravés das paredes dos capilaressanguíneos; podem deslocar-seaté três vezes o seu própriocomprimento a cada minuto.

A função mais importante dosneu-trófilos e macrófagos é afagocitose. Os neutrófilos ingereme digerem as partículasestranhas, até que algumasubstância tóxica ou enzimaliberadas no seu interior osdestruam. Normal-mente, istoocorre depois que o neutró-filotenha fagocitado cerca de 5 a 25bactérias. Em seguida, osmacrófagos fagocitam osneutrófilos mortos.

EOSINÓFILOSE BASÓFILOS

Ao surgir uma proteinaestranha no organismo, oseosinófilos entram na circulaçãoem grandes quantidades. Oseosinófilos são tambémimportantes na destruição decoágulos velhos ou organizados.Ficam armazenados nos tecidos,onde ocorrem as reaçõesantígeno-anticorpo. Tem apropriedade de fagocitar e digeriro complexo antígeno-anticorpo,após o processo imune terdesempenhado suas funções.Durante as reações alérgicas, aprodução de eosinófilos pelamedula óssea é aumentada. Os

eosinófilos só atingem as áreasinflamadas nas fases finais doprocesso inflamatório. A maiorimpor-tância dos eosinófilos é nadetoxificação de proteinasestranhas e nos mecanis-mos dealergia.

A função dos basófilos pareceestar relacionada à liberação deheparina no local de umaagressão, para impedir acoagulação no sangue. Osbasófilos no sangue circulante selocalizam perto da parede doscapilares. O sangue trans-portaos basófilos para os tecidos, ondese transformam em mastócitos elibe-ram heparina, histamina equantidades menores debradicinina e serotonina. Eles sãomuito importantes em algunstipos de reações alérgicas, porqueo tipo de imunoglobulina ligadoà estas reações é a IgE, que tempropensão a se fixar aos

Fig. 6.6. Alterações da quantidade de plaquetascirculantes durante perfusão com oxigenadores debolhas e de membranas. Nos oxigenadores demembranas, a recuperação do número de plaquetas émais rápida.

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mastócitos e basófilos. Nestaocasião, o antígeno específicoreage com o anticorpo e estareação faz com que o mastócitose rompa, liberando hista-mina,bradicinina e serotonina queprovocam as reações dos vasossanguí-neos dos tecidos, queconstituem as manifestações daalergia.

Quando a medula ósseainterrompe a produção deleucócitos, o organismo ficadesprotegido contra agentes inva-sores bacterianos ou de outranatureza. A inabilidade paraproduzir leucócitos na medulaóssea é conhecida comoagranulocitose. Diversosmedicamentos e algunshipnóticos barbitúricos podemproduzir agranulocitose, porinibição da medula óssea.

OS LEUCÓCITOSDURANTEA PERFUSÃO

A circulação extracorpóreaativa os neutrófilos por diversosmecanismos, dentre os quais aliberação de frações docomplemento e de calicreina,além de outros fatores. Osneutrófilos, quando ativados,liberam substâncias quecontribuem para a gênese dareação inflamatória generalizada

que a circu-lação extracorpóreadetermina. Alguns radicaistóxicos e peroxidases são tambémprodutos liberados pelosleucócitos ativados. Durante aperfusão, os neutrófilos tendema se acumular nos pulmões, ondeseus produtos tóxicos produzemaumento da permeabilidadevascular e edema intersticial.

Os leucócitos ativados liberamradicais livres de oxigênio que emdeterminadas circunstânciaspodem produzir oclusãomicrovascular. Os efeitos dessesradicais são melhor conhecidosdurante a fase de reperfusãocoronariana, após odesclampeamento da aorta.PLAQUETAS

As plaquetas são corpúsculosou fragmentos de célulasgigantes, os megacariócitos,formadas na medula óssea. Elastem a forma de discos diminutosarredondados, e na reali-dade,não representam células esim corpúsculos celulares. Osmagaca-riocitos se fragmentamem plaquetas, que são liberadasna circulação san-guínea.

As plaquetas não tem núcleo;seu diâmetro médio é de 1,5(micron) e a espessura varia de0,5 a 1.

As plaquetas são defundamental importância nosprocessos de hemos-tasia ecoagulação do sangue. Quando

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oocorre lesão do endotélio de umvaso sanguíneo, as plaquetas sãoativadas, aderem ao local da lesãoe aglutinam-se umas às outras.Ao mesmo tempo liberamsubstâncias que ativam outrasplaquetas promovendo aformação de grumosplaquetários, que obstruem olocal da lesão do vaso e, emúltima análise, promovem ainterrupção da perda sanguínea.Essa é a principal função dasplaquetas no fenômeno dehemostasia. Além disso, asplaquetas participam ativamenteda cascata da coagulação dosangue, liberando váriasproteinas e lipoproteinas queativam determinados fatores da

coagulação.As propriedades mais

importantes das plaquetas,relacionadas à sua partici-paçãonos mecanismos da hemostasiae da coagulação do sangue estãorelacio-nadas na tabela 6.3.Tabela 6.3. Principais propriedades das plaquetas.

Propriedades hemostáticas das plaquetas

1. Adesividade2. Agregação3. Difusão4. Liberação de serotonina5. Produção do fator III plaquetário6. Liberação do fator IV plaquetário7. Retração do coágulo

A adesividade permite que aplaqueta possa aderir aoendotélio vascular lesado ou à

qualquer outra superfície diferente do endotélio normal. A agregaçãopermite que as plaquetas possamaderir umas às outras,constituindo grumosplaquetários que são a origem dofuturo coágulo. A serotoninaliberada pelas plaquetas estimulaa adesividade e a aglutinação,além de produzir vaso-dilataçãolocal. Os fatores plaquetários IIIe IV participam das reações dacascata da coagulação. Asplaquetas participam ainda, emconjunto com a fibrina daelaboração de um coágulo final,cuja retração produz uma massafirme, com expulsão do soro do

seu interior.A estrutura interna das

plaquetas é bastante complexa,quando analisada ao microscópioeletrônico (Fig. 6.5). Uma camadaexterna, chamada glicocálice, ricaem glicoproteinas, envolve asplaquetas e contém receptorespara diversos agentes capazes deativar as plaquetas. Algumasglicoproteinas da camada derevestimento da membranaplaquetária são importantes paraas funções de adesividade eagregação. Abaixo dessa camadaglicoproteica existe a membrana

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plaquetária, que tem trêslâminas. Em contato com alâmina mais interna damembrana da plaqueta existe umconjunto de filamentosespecializados, próximos de umsistema canalicular, com diversoscanalículos, que penetram nointerior das plaquetas, chamadosistema canalicular aberto. Essesistema cana-licular aumentabastante a área da superfície daplaqueta e permite a expulsão deprodutos secretados para oplasma. O citoplasma dasplaquetas é viscoso e contémnumerosas organelas e grânulos.No citoplasma existem micro-filamentos e túbulos densos, quecontém actina e miosina econtribuem para manter a formadiscoide, bem como para formaralongamentos ou pseu-dópodos,além de contrair as plaquetas,quando estimuladas peloaumento do cálcio no interior docitoplasma. A contração dessesmicrofilamentos comprime asorganelas e grânulos docitoplasma, e expremem o seuconteúdo para o plasma atravésdo sistema canali-cular aberto,constituindo um sofisti-cadomecanismo de liberação das

diversas substâncias produzidaspelas plaquetas.

As organelas e os grânulos dointerior do citoplasma são devários tipos, como asmitocôndrias, os grânulos densose os grânulos alfa,principalmente. Os grânu-los alfacontém o fator IV plaquetário, queparticipa da coagulação dosangue, e contém aindabetatromboglobulina efibrinogênio. Os grânulos densoscontém reservas de difosfato deadeno-sina (ADP), trifosfato deadenosina (ATP), cálcio eserotonina. Outros grânulos docitoplasma contém aindacatalase, fosfatase ácida e outrasenzimas. O sistema tubular densocontém ciclo-oxigenase queconverte o ácido aracdô-nico damembrana em prostaglandinas eem tromboxano A2, que é asubstância vasoconstritora maispotente do orga-nismo, cujometabolito é o tromboxano B2.

A adesão e a agregação dasplaquetas podem ser estimuladaspor uma série de substâncias,chamados agentes agregantes,como ADP, adrenalina, trombina,colágeno, vasopressina,serotonina, ácido aracdônico e

trom-boxano A2. Estes agentes agregantes estimulam receptores dasuperfície das plaquetas, queliberam cálcio no cito-plasma e

desencadeiam a sua contração ea compressão das organelas e

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grânulos.O A.T.P. (trifosfato de

adenosina), liberado pelasplaquetas, fornece energia paraa formação de um coágulo firmee estável.

A concentração normal dasplaquetas no sangue é de150.000 a 400.000 por mililitrode sangue. Cerca de 30.000plaquetas são formadas por dia,para cada mililitro de sangue; asplaquetas circulantes sãototalmente substituidas a cada10 dias. A quantidade mínima deplaquetas capaz de assegurar ahemos-tasia adequada oscila emtorno de 50.000 por mililitro desangue. É necessário, contudo,que as plaquetas tenham funçãonormal, para que a hemostasiase processe adequadamente. Asplaque-tas danificadas semantém na circulação porém,sua atividade fica prejudicada,não sendo eficazes para amanutenção da hemostasia.

AS PLAQUETASNA CIRCULAÇÃOEXTRACORPÓREA

As plaquetas sofrem alteraçõesbastante significativas durante acircu-lação extracorpórea, queresultam em dificuldades com ahemostasia e a coagulação dosangue.

O início da perfusão se

acompanha de adsorção edeposição de proteinas do plasmanas superfícies internas dostubos, oxigenadores e filtros,especial-mente fibrinogênio,gamaglobulinas e em menorproporção, a albumina. Forma-seuma verdadeira camada derevestimento proteico, que emcinco segundos tem a espessurade aproxima-damente 5 Angstrone, em 1 minuto de perfusão,alcança a espessura de 125Angstron. Outras proteinas,inclusive fatores de coagulação elipoproteinas, são tambémadsorvidas, porém em menoresquantidades que o fibrino-gênio.Sobre esse revestimento proteico,rico em fibrinogênio, depositam-se plaquetas que são, dessaforma, seques-tradas dacirculação.

Antes do início da perfusão,certos produtos liberados pelaincisão dos tecidos, como atromboplastina tissular,estimulam as plaquetas de formaa reduzir a resposta ao estímuloagregante da adenosina em cercade 40%. Esta redução dacapacidade funcional dasplaquetas coincide com aelevação do nível de tromboxanoB2 no plasma, de duas a quatrovêzes o valor inicial.

Nos primeiros minutos daperfusão, ocorre um rápidodesaparecimento das plaquetasdo sangue circulante. Essa

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FISIOLOGIA DO SANGUE - Vol I - 139

redução do número de plaquetasinde-pende da hemodiluição eocorre tanto com os oxigenadoresde bolhas como com osoxigenadores de membranas,sendo, contudo, mais acentuadanos primeiros, devido à interfacecom o gás (Fig. 6.6).

A consequência maisimportante do contato dasplaquetas com os circuitos dacirculação extracorpórea é aredução da capacidade deagregação, causa dasdificuldades com a hemostasia,logo após o final da perfusão.

As plaquetas reagem sempredo mesmo modo aos diversosestímulos a que são submetidas.O contato das plaquetas com assuperfícies não endo-teliais doscircuitos e aparelhos dacirculação extracorpórea provocaa ativação plaquetária, que ocorreem quatro fases sucessivas:

1. Alterações da forma daplaqueta;

2. Agregação primária;3. Agregação secundária;4. Depleção do conteudo

granular.Imediatamente após o contato

com as superfícies estranhas docircuito, os elementos contráteisdo citoplasma das plaquetasproduzem modificações da suaforma, tornando-as globosas,mais arredondadas. Em seguida,as plaquetas formam pequenosaglomerados que podem ser

desfeitos com facilidade,denominados agregadosprimários. Quan-do o estímuloque ativa as plaquetas é degrande intensidade, os agregadosprimários transformam-se emagrega-dos secundários, que jánão se dissol-vem, formandoagregados irreversíveis. O estágiofinal da ativação das plaquetas éa fase de liberação ou depleção.Diversas substâncias sãoliberadas das organelas egrânulos das plaquetas, para oplasma, das quais as principaissão o fator IV plaquetário,b e t a t r o m b o - g l o b u l i n a ,fibrinogênio e outras subs-tâncias dos grânulos alfa. Asgranulações densas liberam ADP,ATP, cálcio e serotonina.

As fases iniciais, de alteraçõesda forma das plaquetas e aformação dos agregadosprimários, são reversíveis. Asfases irreversíveis dependem daintensi-dade do estímulo eapenas ocorrem na circulaçãoextracorpórea, quando otraumatismo é muito intenso.

O número de plaquetas 3minutos após o início da perfusãoé de aproxima-damente 78% donormal, caindo para 70% após 5minutos.

O número de plaquetasinativadas, de forma discoide aos8 minutos de perfusão é deaproximadamente 57% donormal. Após os primeiros 15

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140 - VOL I - FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

inclusive a secreção e eliminaçãode seus produtos.

Pela microscopia eletrônica, onú-mero de plaquetasfuncionalmente normais caiu de96% para 54%, oito minutos apóso início da perfusão, o quesignifica que, praticamente,metade das plaquetas foi ativadapor oito minutos de circulaçãoextracorpórea. Próximo ao finalda perfusão há um aumentoconsiderável do teor desubstâncias liberadas pelasplaquetas no plasma, devido àdestruição de plaquetas e àformação de agregadossecundários. Outros estudosrealizados com auxílio daagregometria, com e semestimulação pelo ADP,mostraram resultados seme-lhantes aos da microscopia

minutos da perfusão parecehaver uma pequena recuperaçãodas plaquetas que mudaram deforma; a seguir as alterações seestabilizam e persistem em ummesmo nível até o final daperfusão. Nesta fase, o troboxanoB2 está elevado; seus valores,contudo, dependem de varia-çõesindividuais.

O ponto máximo de redução dafunção plaquetária ocorre logoapós a administração daprotamina. Após a perfusão, e atéo final das primeiras 24 horas, onúmero de plaquetas circu-lantespermanece baixo, ligeiramenteacima de 120 a 130.000/ml. Osindica-dores da funçãoplaquetária vão se recuperandoprogressivamente.

Existe correlação entre aestrutura microscópica dasplaquetas e a sua função,

eletrônica.A hemodiluição causa trombo-

citopenia, pelo efeito dilucionalsobre as plaquetas. Numerosasplaquetas são tambémsequestradas pelo baço e pelofígado, retornando à circulação,após a saida de perfusão. Aquantidade normal de plaquetasde 150.000 a 300.000/mm3 cái,durante a circulaçãoextracorpórea, para cerca de100.000/mm3 e, ocasio-nalmente, para valores mais

baixos.A reversão das alterações das

plaque-tas na perfusão não éimediata e parece durar 6 a 8horas, durante as quais podempersistir alterações de diversosgráus na hemostasia.

Quando a hemostasia é difícilusa-se infundir concentrado deplaquetas na quantidadeaproximada de 1 unidade deconcentrado para cada 10 Kg depeso do paciente, até um máximo

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FISIOLOGIA DO SANGUE - Vol I - 141

de 5 a 6 unidades. As plaquetaspreservadas em refrigerador,contudo, também tem a funçãodeprimida e a recuperaçãocompleta da sua função após atrans-fusão, também não éimediata.PLASMA

A fase líquida, não celular, dosangue, é constituida pelo plasmasanguíneo. O plasma é umasolução amarelo pálida ou âmbar,viscosa, cuja composição tem91% de água e 9% de substânciasdissolvidas. As principaissubstâncias em solução noplasma são as proteinas, hidratosde carbono, lipídeos, eletró-litos,pigmentos, vitaminas e hor-mônios.

O plasma permite o livre inter-câmbio de diversos dos seuscompo-nentes com o líquidointersticial, através os porosexistentes na membrana capilar.As proteinas plasmáticas, devidoàs dimensões da sua molécula,em condições habituais, nãoatravessam a membrana capilar,permanecendo no plasma.Outras substâncias dissolvidasno plasma e as moléculas deágua, contudo, se difundemlivremente. A saída da água doplasma através os capilares écontrolada pela pressão coloido-osmótica e pelo estado dapermeabilidade das membranas;o que equivale dizer que asproteinas extraem água dostecidos para os capilares, mas,dificultam a sua saída doscapilares para os tecidos. Aalbumina é o principalresponsável pela manutenção dapressão coloido-osmótica doplasma.

O volume médio de sangue deum adulto normal, de 60ml/Kgde peso, correspondeaproximadamente a 35ml deplasma e 25ml de hemácias porcada quilograma, quando ohematócrito está normal.

A concentração de proteinas noplasma é três vezes maior que nolíquido intersticial.

PROTEINAS

Fig.6.7. Diagrama que representa o sentido em que astransfusões de sangue são possíveis entre os diferentesindivíduos. Os indivíduos do grupo O, apenas podemreceber o sangue do seu próprio grupo sanguíneo,porém podem doar para os demais, A, B e AB. Osindivíduos do grupo A, podem doar para o mesmogrupo e para o grupo AB, bem como podem receberdo grupo O. Os do grupo B, podem doar para o mesmogrupo e para o grupo AB; podem, contudo, receber dogrupo O. Finalmente, os indivíduos do grupo ABpodem doar apenas para indivíduos do mesmo grupoe podem receber dos demais grupos.

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142 - VOL I - FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

PLASMÁTICASAs proteinas são o principal

compo-nente do plasma; as suasmoléculas são de grandesdimensões e de elevado pesomolecular; são responsáveis pordiversas características biofísicasdo plasma, tais como adensidade, a viscosidade e apressão osmótica. As proteinasplasmá-ticas participam dosprocessos de nutrição,coagulação, regulação doequilíbrio ácido-base e daimunidade do organismo.

As proteinas do plasma são detrês tipos principais, a albumina,as globu-linas e o fibrinogênio.

A albumina tem o pesomolecular de 69.000 Dalton ecorresponde a 55% do total deproteinas plasmáticas, ou seja 4a 6 gr.%. A sua principal funçãoestá relacionada à manutençãoda pressão coloido-osmótica.

As globulinas, tem o pesomolecular entre 80.000 e 200.000Dalton; corres-pondem a trêstipos principais: alfaglo-bulinas,betaglobulinas e gamaglo-bulinas. Juntas, as globulinascorres-pondem a 38% do total deproteinas. As globulinas alfa ebeta transportam diversassubstâncias ligadas às suasmoléculas, para todo oorganismo. As gamaglobulinas ealgumas betaglo-bulinasparticipam do sistema de defesae nos mecanismos de imunidade

e alergia.O fibrinogênio tem peso

molecular entre 350.000 e400.000 Dalton; corres-ponde a7% do total de proteinas doplasma. O fibrinogênio éfundamental nos fenômenos dacoagulação sanguí-nea. Existeentre 100 e 700mg defibrinogênio em cada 100ml deplasma. O fibrinogênio é formadono fígado e, devido ao seu grandepeso molecular, não costumapassar para o líquido intersticial.Contudo, quando a permea-bilidade dos capilares estáaumentada, o fibrinogênio podesurgir no interstí-cio, emquantidades suficientes parapermitir coagulação.

As proteinas plasmáticas sãomuito sensíveis aos diversos tiposde trauma-tismos, inclusive otérmico. Se subme-tidas àtemperaturas elevadas, da ordemde 45oC, podem ser desnaturadasou destruidas, perdendo as suasfunções.

Os demais constituintes doplasma são importantes noequilíbrio eletro-lítico, nanutrição dos tecidos, no equilíbrioácido-básico e no controle eregulação hormonal doorganismo.GRUPOSSANGUÍNEOS

O sangue dos diferentesindivíduos possui propriedadesantigênicas e imunes distintas.

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FISIOLOGIA DO SANGUE - Vol I - 143

Anticorpos existentes no plasmade um indivíduo, podem reagircom os antígenos existentes nashemácias de outro indivíduo.Rara-mente, os antígenos e osanticorpos de dois indivíduos, sãoiguais.

Quando ocorrem hemorragiasou anemia, frequentemente sãonecessárias transfusões desangue para repor a volemia erecompor a dinâmica circu-latória. A transfusão de sangueentre dois indivíduos deverespeitar a presença dosantígenos especiais dos góbulosvermelhos e dos anticorpos doplasma sanguíneo. Testessimples de labo-ratório, permitemdeterminar o grupo sanguíneodos indivíduos ou a presença dos

antígenos e anticorpos existentesno sangue do doador e doreceptor da transfusão. Atransfusão de sangue entreindivíduos de grupos sanguíneosnão compatíveis, determinareações de aglutinação doseritrócitos, hemólise e outrasreações mais severas que podemproduzir a morte.

Foram identificadosaproximada-mente trezentosantígenos nas células sanguíneashumanas, dos quais apenastrinta tem ocorrênciarelativamente frequente. Osdemais surgem apenas emalgumas pessoas dedeterminadas famílias, e sãomuito raros.

Os antígenos existentes nas

hemácias são constituidos de glicolipídeos ou mucopolissacarídeos.

Dentre os antíge-nos conhecidos,dois grupos ou siste-mas,ocorrem em todos os indivíduose podem causar reações deincompa-tibilidade nastransfusões. São o sistema deantígenos ABO e o sistema deantígenos Rh. O sangue éclassificado em grupos, conformea presença dos antígenos dosistema ABO nas hemácias e emtipos, conforme a presença dosantígenos Rh no plasma.

SISTEMA ABONa superfície das hemácias

podem existir dois antígenosespecíficos desse sistema,denominados antígeno A eantígeno B. Devido ao modo detrans-missão hereditária dessesantígenos, os diferentesindivíduos podem ter apenas umdos antígenos, ambos ou nenhumdos antígenos, em suashemácias.

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A presença dos antígenos A eB é determinada por genes queexistem em cromossomasadjacentes, um gene em cadacromossoma. A presença dosgenes determina se a hemácia iráconter o antígeno. Por essa razão,existem seis possibilidades decombinações gené-ticas, uma vezque cada indivíduo recebe doisgenes, um de cada progenitor. Aspossibilidades genéticas são OO,OA, OB, AA, BB e AB. Essascombinações de genes sãoconhecidas como genó-tipos;cada indivíduo possui um dosseis diferentes genótipos. Ogenótipo OO determina apresença do grupo sanguí-neo O;os genótipos OA e AA deter-minam o grupo sanguíneo A; osgenó-tipos OB e BB determinamo grupo sanguíneo B, enquantoo genótipo AB determina o gruposanguíneo AB.

O sangue do grupo A contémhemá-cias com o antígeno A e osangue do grupo B contémhemácias com o antígeno B. Osangue do grupo AB contémhemácias com os antígenos A e Be o sangue do grupo O contémhemácias sem nenhum antígeno.Esses antígenos das hemáciastambém são conhecidos comoaglutinógenos, pela suacapacidade de produziraglutinação das células dosangue.

ANTICORPOSDO PLASMA

Existem no plasma sanguíneoanti-corpos produzidos pordeterminação genética de cadaum dos genótipos. Os indivíduoscom sangue do grupo A, que temo antígeno A nas hemácias, pos-suem os anticorpos anti-B. Osindi-víduos com sangue do grupoB, tem anticorpos anti-A; osindivíduos do grupo AB não temanticorpos e os indivíduos dogrupo O possuem ambos osanticorpos, anti-A e anti-B. Osanticorpos do plasma sanguíneotam-bém são chamados deaglutininas, pela sua capacidadede reagir com os antí-genos dashemácias produzindo agluti-nação celular (Tabela 6.4).

Tabela 6.4. Características dos Diferentes Grupos Sanguíneos.

Genótipos Grupo Sanguíneo Aglutinógeno Aglutinina

OO O - Anti-A e anti-BOA ou AA A A anti-BOB ou BB B B anti-AAB AB A e B -

As aglutininas (anticorpos) sãogamaglobulinas, e a sua maiorparte corresponde a moléculas deimuno-globulinas das frações IgMe IgG.

As aglutininas só começam aser for-madas após o nascimento,estando com-pletas, após osprimeiros meses de idade.

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FISIOLOGIA DO SANGUE - Vol I - 145

SISTEMAOU FATOR RH

Além dos grupos sanguíneosO,A,B e AB outros sistemas deantígenos determinamcaracterísticas do sangue, dos

quais o mais importante é osistema ou fator Rh.

Existem seis tipos comuns deantí-genos Rh, designados porC,D,E,c,d,e. Um indivíduo quetem o antígeno C, não terá oantígeno c; ao contrário, o

indivíduo que não tem o antígeno C, sempre terá o antígeno c. Amesma relação ocorre com osantígenos D-d e E-e. A forma detransmissão dos carac-teresrelacionados ao fator Rh, faz comque cada pessoa tenha umantígeno de cada um dos trêspares. Os antígenos C, D e E,podem estimular o desenvol-vimento de anticorpos anti-Rh,que causam reações àstransfusões. Os indivíduos quepossuem um dos três antígenos,C,D ou E são chamados de Rh(+),ou Rh positivo. Os demaisindivíduos, que possuem osantígenos c, d e, são chamadosde Rh(-), ou Rh negativo. Cercade 85% dos indivíduos dapopulação branca são Rhpositivo, enquanto os restantes15%, são Rh negativo. Istosignifica, com relação ao sistemaRh que, 85% da população tem ofator Rh presente no sangue,enquanto 15% não tem o fatorRh. Na população negraamericana, cerca de 95% dosindivíduos são do tipo Rhpositivo.

Outros fatores existentes,como os antígenos M, N, S, P,Kell, Lewis, Duffy, Kidd, Diego eLutheran, podem ser importantesem circunstâncias especiais, nãosendo, contudo, testados naprática clínica diária.

A distribuição dos diferentesgrupos sanguíneos na populaçãode acordo com o sistema ABO é ada tabela 6.5. Quando levamosem consideração a presença dosdois sistemas A-B-O e Rh, adistri-buição dos diferentes tipossanguíneos na população, passaa ser a da tabela 6.6.

Tabela 6.5. Grupos sanguíneos na população geral.

Tipo Sanguíneo: %

O 46%A 42%B 9%AB 3%

Para determinar o gruposanguíneo dos indivíduos, duasgotas de sangue são colocadas emlâminas de vidro e mistu-radas aamostras de soros que contém osanticorpos anti-A e anti-B;

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observa-se o comportamento damistura. Se houver aglutinaçãocom o soro anti-A, o sangue serádo grupo A; se houver aglutinaçãocom o soro anti-B, o sangue serádo grupo B; se houveraglutinação com os dois soros, osangue será do grupo AB e, senão houver aglutinação, o sangueserá do grupo O.

Tabela 6.6. Incidência dos diferentes tipos sanguíneos napopulação.

Tipo sanguíneo Incidência na população

O Rh + 38%O Rh- 7%A Rh+ 35%A Rh- 6%B Rh+ 8%B Rh- 1%AB Rh+ 3%AB Rh- 2%

A determinação da presença dofator Rh é feita de modosemelhante. O soro para o testecontém anticorpos anti-Rh. Sehouver aglutinação, o sangueserá do tipo Rh positivo. Quandonão há aglutinação, o sangue édo tipo Rh negativo.TRANSFUSÃO DESANGUE

A transfusão de sangue entrediferen-tes indivíduos é possível,respeitando-se a presença dosantígenos e anticorpos, o quesignifica, na prática, a determi-nação da compatibilidade entreo sangue doador e o sangue doindivíduo recep-tor.

Em geral, a transfusão desangue deve respeitar os grupos

Fig.6.8. Representa a via extrínseca da coagulação dosangue à partir da estimulação pela tromboplastinatissular.

sanguíneos, cada qual podendoservir como doador paraindivíduos do mesmo grupo, apóso resultados das provas cruzadas.Em condições excepcionais,contudo, pode-se admitir atransfusão entre indivíduos degrupos diferentes, desde queexista compatibilidade.

O sangue do grupo O não temantígenos e, portanto, pode serdoado a qualquer indivíduo domesmo grupo, ou dos grupos A,B ou AB. Entretanto, o sangue dogrupo O tem ambos os anticorposanti-A e o anti-B e, dessa forma,o indivíduo do grupo O, somen-te poderá receber sangue domesmo grupo. O doador desangue do grupo A, poderá doar

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ao receptor A; o grupo B, poderádoar ao receptor B. As pessoasque tem sangue do grupo AB,podem receber doação dequalquer tipo de sangue, porqueo tipo de sangue AB, não possuianticorpos. Essas pessoas, sãochamadas de receptoresuniversais. Todos os que tem osangue tipo O, tem anticorposanti-A e anti-B, e por isso podemdoar seu sangue a qualquerpessoa, mas só podem recebersangue do grupo O, sãochamadas doadores universais.As pessoas com Rh positivo, sópodem doar e receber sangue deoutro Rh positivo. Quem tem Rhnegativo, pode doar para um Rhposi-tivo, mas só pode receber Rhnegativo. O verdadeiro doadoruniversal é o tipo O Rh negativo,que pode ser adminis-trado aqualquer grupo sanguíneo, comqualquer tipo de fator Rh. Odiagrama da figura 6.7 mmostrao sentido em que as transfusõespodem ser feitas, segundo os

diferentes grupos sanguíneos dosistema ABO.

REAÇÕESÀS TRANSFUSÕES

Antes de se fazer umatransfusão de sangue, énecessário determinar o gruposanguíneo do receptor e dodoador e fazer a “prova cruzada”,ou seja testar o resultado damistura do soro do receptor como sangue do doador. A ocorrênciade aglutinação das hemáciasindica incompatibilidade.

As reações às transfusões porincom-patibilidade de grupossanguíneos, incluem a hemólisedos eritrócitos, que pode serintensa, reações alérgicas dediversos gráus e, ao choqueanafilático.

Outro tipo de reação àstransfusões é a insuficiência

Fig.6.9. Representa a via intrínseca da coagulação dosangue, à partir da ativação pelo fator XII (Hageman).

Fig. 6.10. Representa a via comum da coagulação dosangue, à partir da ativação do fator X (Stuart-Prower).O estímulo ativador inicial pode ter percorrido a viaextrínseca, a via intrínseca ou ambas as vias. Acoagulação sempre ocorre através aquelas vias,independente da natureza do estímulo inicial.

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renal aguda, que, nessascircunstâncias, se acompanha demorta-lidade superior a 50%. Ainsuficiência renal aguda écausada pela reação antígeno-anticorpo, com liberaçãoacentuada de substâncias tóxicasque produzem intensavasoconstrição renal. A hemólise

dos eritrócitos circulantes, aqueda da pressão arterial, o fluxorenal reduzido e o débito urináriobaixo, acompanham o quadroclínico. A vasoconstrição renal eo choque circulatório agem emconjunto, na origem dainsuficiência renal.

As reações anafiláticas são o

resultado da ação das proteinas plasmáticas do doador, mas, algumas

vezes, podem ser devidas aosanticorpos do receptor quereagem com os leucócitos dosangue transfundido, liberandoinclusive a histamina dosbasófilos.

TRANSMISSÃODE DOENÇASPELASTRANSFUSÕES

A transfusão de sanguecoletado de portadores dediversas doenças podecontaminar o indivíduo receptorda transfusão. Um número dedoenças pode ser transmitidapelas transfusões, das quais asmais importantes são: hepatitese outras viroses, malária, doençade Chagas, sífilis e AIDS ou SIDA(Síndrome da ImunodeficiênciaAdquirida).

Alguns indivíduos são

portadores dos agentescausadores das doenças, masnão apresentam os seus sintomasou sinais. São chamados deportadores sãos. Quando osangue destes portadores édoado, transmite a doença aoreceptor, quase sempre em umaforma aguda.

É imprescindível verificar apresença daquelas doenças,antes de liberar o sangue para adoação. Os portadores de vírusou outros agentes infecciosos nãopodem ser doadores, emnenhuma circunstância.

Os doadores de sangue, emnosso meio, são habitualmentetestados para a presença demalária, doença de Chagas,hepatites B e C, sífilis, e apresença do vírus HIV, causadorda AIDS.

Na atualidade, a grandepreocupação com a transmissãode doenças por transfusões, se

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FISIOLOGIA DO SANGUE - Vol I - 149

refere ao vírus daimunodeficiência adquirida (HIV).A contaminação via transfusões,nos anos oitenta, vitimou umagrande quantidade de hemofílicose outros receptores, em todo omundo. O vírus, aparentemente,pode permanecer no organismopor vários anos, sem que hajammani-festações da doença. Emdeterminadas circunstâncias,contudo, a doença pode semanifestar muito rapidamente,após a transfusão do sangueinfectado pelo vírus.

Os elevados riscos da

transmissão de doenças pelastransfusões, tem estimu-lado asequipes ao desenvolvimento deprotocolos especiais, visando àredução do uso de sangue,durante a cirurgia e a circulaçãoextracorpórea.

CUIDADOSNA CIRCULAÇÃOEXTRACORPÓREA

Os cuidados com o manuseiodo sangue, visam proteger nãoapenas os pacientes, mas

também os profissionais que participam dos procedimentos.

facial, pelos perfusionistas, éeficaz na prevenção contra ainoculação acidental de agentesdo sangue dos pacientes. As luvasdevem ser usadas não apenasdurante o preparo do material eda perfusão, mas durante todo otempo de contato com osequipamentos, até o seu descartefinal.

Em um estudo publicado em1988, Williams e cols. relatam aincidência de 25% de infeccão decirurgiões pelo vírus da hepatiteB. Fry, em 1993 discutiu a

Todos os indivíduos quemanuseiam sangue, devem seprecaver contra a possibilidadede transmissão de doenças. Ashepatites B, C e D, por exemplo,tem contaminado incontáveisprofissionais, entre cirurgiões,perfusionistas e enfer-meiros decentro cirúrgico. Nos dias atuais,é altamente recomendável avacinação preventiva de todo opessoal do ambiente hospitalar,contra a hepatite B. O uso deluvas de látex além da máscara

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estimativa de 250 óbitos dentreo pessoal hospitalar, no ano de1992, em conse-quência deinfecção por hepatite B. Kurusz,em recente pesquisa nos EstadosUnidos, encontrou que 4,6% dototal de perfusionistas ematividade contrairam doençastransmitidas pelo sangue,possivelmente pelo manuseiodurante a perfusão.

Diversos estudos temdemonstrado a eficiência dasmedidas preventivas simples,para proteção do pessoal contracontaminação acidental.

A expansão do vírus HIV exigiua introdução de novas rotinas decuidados no ambiente hospitalar,que privilegia a proteção dopessoal que tem contato com ospacientes.

Além dos cuidados geraiscontra o cruzamento de infecções,em casos de cirurgia de pacientesportadores do vírus HIV,recomenda-se, ao final doprocedi-mento e antes dodescarte dos equipa-mentos,circular no oxigenador, cardio-tomia e circuitos usados, umasolução de formaldeido a 10%,com o objetivo de esterilizar omaterial que vai ser desprezado.Esta medida é um impor-tantecomplemento na proteção contrainfecção acidental do pessoal res-ponsável pelo manuseio do lixohos-pitalar.HEMOSTASIA E

COAGULAÇÃO DOSANGUE

Normalmente o sangue flui noorganismo em contato com oendotélio vascular. A fluidez dosangue depende, além daintegridade do endotélio, davelocidade do fluxo sanguíneo, donúmero de células sanguíneascircu-lantes e, possivelmente, dapresença de heparina comoanticoagulante natural,produzido pelos mastócitos.

Quando o sangue sai dointerior dos vasos, perde a fluidez,torna-se viscoso e em poucotempo forma um coágulo que,posteriormente se retrái, organizaou dissolve. Este é o fenômenonormal da hemostasia, queconsiste de um conjunto defenômenos que visaminterromper a perda continuadade sangue.

Existem três mecanismosprincipais, que se destinam ainterromper a perda de sangueatravés de um vaso lesado, e queconstituem os alicerces dahemos-tasia. Esses mecanismossão: resposta vascular, atividadeplaquetária e coagu-lação dosangue.

1. Resposta VascularQuando um vaso sanguíneo é

lesado, ocorre imediata contraçãoda sua parede, que reduz o fluxode sangue no seu interior, natentativa de interromper a perdade sangue. A redução de calibre