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Autor (s)
Maria Teresa Lisboa Nobre Pereira
Título da Pesquisa
Formação policial e práticas institucionais das delegacias da mulher de Sergipe: entre a capacitação e a educação continuada
CONCURSO NACIONAL DE PESQUISAS APLICADAS EM
VALORIZAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Titulo da Pesquisa:
“FORMAÇÃO POLICIAL E PRÁTICAS INSTITUCIONAIS DAS
DELEGACIAS DA MULHER DE SERGIPE:
ENTRE A CAPACITAÇÃO E A EDUCAÇÃO CONTINUADA”
RELATÓRIO FINAL
Proponente: Maria Teresa Lisboa Nobre Pereira
Responsável Técnica: Maria Teresa Lisboa Nobre Pereira
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EQUIPE EXECUTORA:
MARIA TERESA LISBOA NOBRE PEREIRA 1
(Coordenação da pesquisa)
LIANNA DE MELO TORRES 2
(Coordenação de campo)
ANA CRISTINA COSTA DE ARAÚJO 3
JACQUELINE MONTE DE HOLLANDA FONSECA 4
MICHELE DE FREITAS FARIA DE VASCONCELOS 5
ASSINATURA DO RELATÓRIO:
MARIA TERESA LISBOA NOBRE PEREIRA
LIANNA DE MELO TORRES
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AGRADECIMENTOS
À secretária de Segurança Publica do Estado de Sergipe, às delegadas da Delegacia da Mulher de Aracaju e Salvador e a ex-delegada da DEPM de Itabaiana, pela disponibilidade, colaboração e abertura com que nos concederam entrevistas.
À delegada responsável pela Coordenação do Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis de Aracaju, pelo apoio dado à realização da pesquisa e às secretarias e recepcionistas deste órgão que inúmeras vezes viabilizaram o nosso acesso às delegadas e demais funcionários.
Aos e às agentes policiais pelas entrevistas concedidas e pela confiança em nós depositada, ao nos revelarem suas opiniões, impressões e sentimentos acerca do tema da nossa pesquisa. A todos os e as agentes policiais das DEPMs de Aracaju e Itabaiana que se dispuseram a responder aos nossos questionários e a assistente social de Itabaiana que viabilizou sua aplicação naquela unidade policial.
À presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, membro da Casa Abrigo e da UBM (União Brasileira de Mulheres), pela sua colaboração através da entrevista concedida.
Aos membros da Comissão de Direitos Humanos da Universidade Federal de Sergipe e do MUSA/Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, pela disponibilidade, interesse, acolhimento e abertura com que participaram das entrevistas. Esperamos que as reflexões produzidas neste relatório se somem a outras avaliações que esses grupos têm feito, acerca das relações entre a universidade – polícia - sociedade, em função de possíveis trabalhos futuros, em especial aqueles voltados à formação de policiais e de outros profissionais, no enfrentamento da violência em todas as suas formas.
Ao GEPEC (Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Exclusão, Direitos Humanos e Cidadania da Universidade Federal de Sergipe) pela infra-estrutura que nos disponibilizou e pelo apoio a nós concedido durante a execução da pesquisa, sem os quais este trabalho não teria sido possível.
A cada um dos membros da equipe executora da pesquisa – Lianna, Ana Cristina, Jacqueline e Michele - , pela parceria, seriedade, compromisso, dedicação e competência com que realizaram o trabalho, em todas as suas fases: desde a construção dos instrumentos de coleta de dados, sua aplicação e tratamento, às analises e discussões que produziram o relatório final, o que faz deste um trabalho coletivo. À Profa. Lianna, em particular, com quem tenho dividido nos últimos 5 anos, trabalhos e inquietações em torno do tema desta pesquisa, pela sua clareza política e sensibilidade, pelas trocas e aprendizagens profissionais e acadêmicas, e principalmente, pela sua amizade.
A Fabiana Lobão pela colaboração no tratamento dos dados dos questionários.
À equipe da SENASP pela atenção e apoio ao longo da pesquisa.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................
2. OBJETO DA PESQUISA E ENQUADRE TEÓRICO ..........................................
Formação policial e educação para a cidadania .................................................... Formação policial como política de combate à violência de gênero ..................... Formação policial nas DEPMs de Sergipe ............................................................
3. METODOLOGIA ...................................................................................................
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................
4.1 – Inserção no campo e estratégias de implantação e articulação das experiências 4.1.1 – A experiência da CDH/UFS: Grupos de Discussão ........................................
a) Histórico .......................................................................................................... b) Planejamento da experiência e entrada no campo ........................................... c) Condições institucionais de execução da proposta ..........................................
4.1.2 – A experiência do MUSA/UFBA: Capacitação ................................................ a) Histórico .......................................................................................................... b) Planejamento da experiência e entrada no campo. .......................................... c) Condições institucionais de execução da proposta ..........................................
4.2 – Pressupostos teóricos e metodológicos das experiências ................................... 4.2.1 – A experiência da CDH/UFS: Grupos de Discussão ........................................
a) Concepções sobre o trabalho, idéias norteadoras da intervenção e objetivos da ação .............................................................................................................
b) Estratégias metodológicas ............................................................................... 4.2.2 – A experiência do MUSA/UFBA: Capacitação ................................................
a) Concepções sobre o trabalho, idéias norteadoras da intervenção e objetivos da ação. ............................................................................................................
b) Estratégias metodológicas ...............................................................................
4.3 – Formatação das ações ......................................................................................... 4.3.1 – Contextualização das discussões produzidas pelas duas experiências ............
4.4 – Impactos das experiências sobre as práticas institucionais ................................ 4.4.1 – A visão dos policiais ........................................................................................ 4.4.2 – A visão das agências formadoras .................................................................... 4.4.3 – A visão dos movimentos sociais .....................................................................
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4.5 – Avaliação das experiências .................................................................................4.5.1 - Pela corporação policial ................................................................................... 4.5.2 – Pelas agências formadoras ............................................................................... 4.5.3 – Pelos movimentos sociais ................................................................................
5. CONCLUSÃO .........................................................................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ........................................................................
ANEXOS .....................................................................................................................
Anexo 1 – Roteiro de entrevista com as delegadas ..................................................... Anexo 2 – Roteiro de entrevista com agentes policiais................................................ Anexo 3 – Questionário aplicado aos agentes policiais .............................................. Anexo 4 – Roteiro de entrevista com membros da CDH/UFS..................................... Anexo 5 – Roteiro de entrevista com membros do MUSA/ISC/UFBA ......................
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1. INTRODUÇÃO
Este relatório de pesquisa descreve e analisa duas experiências realizadas em
Sergipe, desenvolvidas junto a policiais civis (delegadas, agentes de polícia, investigadores) e
técnicas lotados nas Delegacias da Mulher. Tais experiências se constituíram como duas
iniciativas dirigidas à formação policial específica no trato da violência de gênero no Estado: a
primeira, pela Comissão de Direitos Humanos da Universidade Federal de Sergipe, formatada
como Grupos de Discussão e Reflexão de Práticas Institucionais, realizada entre 2001 e 2002,
e a segunda, pelo Ministério da Justiça/ MUSA/Instituto de Saúde Coletiva da Universidade
Federal da Bahia, formatada como Capacitação para Policiais que atuam com Mulheres em
Situação de Violência, realizada em 2002.
Ambas tiveram como objetivo geral: contribuir para a formação dos quadros
policiais, visando melhor qualidade no atendimento à população e maior resolutividade do
serviço. Entretanto, algumas especificidades se verificam nas duas experiências, a partir de
uma concepção diferenciada sobre educação, modos de intervenção institucional e relação
polícia-sociedade. Este estudo identifica essas singularidades e as contribuições/impasses de
cada experiência à formação de policiais que lidam com violência de gênero e aponta algumas
questões, problematizando os processos de formação policial em geral, e de formação policial
como política de combate à violência contra a mulher, em particular.
A pesquisa teve como objetivos específicos: a) Conhecer as propostas educativas
das duas agências formadoras responsáveis pelas experiências, enfocando os princípios,
fundamentos, pressupostos e objetivos que embasaram os dois projetos; b) Mapear os
conteúdos programáticos, metodologia utilizada, recursos pedagógicos empregados e temas
emergentes nos encontros com os/as alunos/as policiais; c) Levantar dificuldades, limites,
impasses e avanços na execução dos projetos; d) Investigar o impacto que as duas experiências
tiveram sobre a formação policial e, de modo particular, se houveram conseqüências, a partir
desses trabalhos, em termos de mudança das práticas institucionais das DEPMs6 e e) Conhecer
a avaliação que as duas agências formadoras, a corporação policial e representantes de
movimentos de mulheres fazem das experiências.
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Entretanto, durante o período de mais de 1 (um) ano transcorrido entre a realização
do Concurso Nacional de Pesquisas Aplicadas em Segurança Pública e Justiça Criminal e o
início da pesquisa, a Delegacia da Mulher de Aracaju sofreu significativas mudanças em sua
estrutura organizacional e em seu modo de funcionamento institucional, o que nos fez ampliar
esses objetivos.
Vinculada à Secretaria de Segurança Pública do Estado de Sergipe, a DEPM de
Aracaju criada em de outubro de 1986, funcionou, até 2004, como uma delegacia autônoma
em relação às demais delegacias do município. Porém, em meados do segundo semestre de
2004, passou a integrar um Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis, composto por três
delegacias especializadas, que têm como público: a) mulheres vítimas de violência doméstica e
de violência sexual atendidas pela Delegacia Especial de Atendimento à Mulher; b) menores
de 18 anos, vítimas de violência, atendidos, privativamente, pela Delegacia Especial de
Atendimento à Criança e ao Adolescente; c) idosos, homossexuais e profissionais do sexo,
portadores de necessidades especiais e qualquer pessoa vítima de discriminações em razão de
raça, cor, etnia, religião e procedência nacional, atendidos pela Delegacia de Atendimento a
Grupos Vulneráveis (SERGIPE, s.d.).
As atribuições de cada uma das unidades policiais que compõem o Centro de
Atendimento a Grupos Vulneráveis foram definidas pela Portaria nº 037/2004 da
Superintendência de Polícia Civil da Secretaria de Estado da Segurança Pública, como
“registro e apuração de crimes e delitos”, infringidos aos três segmentos sociais acima citados.
(SERGIPE, 2004). A agregação das três delegacias especializadas num único complexo
policial é justificada, neste documento, pela finalidade de “garantir maior integração das ações
na área da segurança pública, voltadas às demandas de uma população específica, excluída de
direitos básicos e discriminada socialmente” (SERGIPE, s.d.).
O novo complexo policial inclui um Núcleo de Mediação de Conflitos, visando um
melhor atendimento da DEPM, sobretudo no enfrentamento da violência doméstica. De acordo
com Marques e Teles (2004), a mediação pretende transcender o modelo punitivo para um
modelo de justiça penal diferenciado, pautado no restabelecimento do diálogo, na negociação
de interesses e na mediação de contendas, buscando a construção de relações solidárias entre as
partes em conflito. Para que o instrumento da mediação seja eficaz, “é necessário qualificar os
serviços prestados à população, ampliando os serviços de atendimento, tornando-os
satisfatórios e hábeis na capacidade de resolver tais questões” (MARQUES, TELES 2004: 50).
Essa nova atribuição da DEPM implica, prioritariamente, no nosso modo de entender,
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viabilizar um programa específico de formação policial dos agentes lotados nesse complexo,
aplicado à missão para a qual foi criado.
Essas mudanças de ordem organizacional e funcional verificadas na DEPM
exigiram de nós um novo modo de inserção no campo da pesquisa e acercamento do nosso
objeto de estudo. Deste modo, conhecer como tem sido pensada a formação dos quadros
policiais lotados no Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis, em Aracaju, e em especial
na DEPM, foi um objetivo que se agregou ao nosso Projeto de Pesquisa inicial.
Assim, em virtude do novo contexto esse relatório discute as experiências de
formação policial desenvolvidas pela CDH/UFS e pelo MUSA/UFBA, situando-as dentro das
mudanças que se encontram em curso no âmbito da segurança pública em Sergipe, a partir da
criação do Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis. Entretanto, esclarecemos que a nova
configuração que a Delegacia da Mulher de Aracaju assumiu com sua criação, no que diz
respeito à infra-estrutura e condições de trabalho, não se constitui objeto desta pesquisa. Os
dados aqui analisados referem-se a um contexto histórico anterior (2001-2002), no qual se
desenvolveram as duas experiências de formação policial.
A pesquisa foi desenvolvida por uma equipe de trabalho integrada por membros do
GEPEC (Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Exclusão, Direitos Humanos e Cidadania) da
Universidade Federal de Sergipe, que participou de trabalhos sistemáticos voltados à formação
policial nos últimos 5 (cinco) anos: 3 (três) docentes e 2 (duas) técnicas. Na medida em que
ouviu diversos atores sociais (professores universitários, policiais, representantes de
movimento sociais e ongs), a pesquisa teve caráter de continuidade de um trabalho
anteriormente realizado pelo GEPEC, oportunizando a retomada e aprofundamento de um
debate público em torno da função social das Delegacias da Mulher e do atendimento prestado
pela segurança pública aos chamados grupos vulneráveis. Esperamos que essa discussão,
retomada através da pesquisa e articulada por interlocutores que se encontram fora da
organização policial, possa contribuir para uma reflexão crítica acerca da necessidade de uma
formação específica destes policiais e para a definição de novas parcerias entre a polícia e a
sociedade, na construção de estratégias de ação para implementação das mudanças almejadas.
Ressaltamos, por fim, que proceder a uma discussão e avaliação de experiências
das quais participamos como atores7 exigiu uma constante análise da nossa implicação com o
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campo e objeto da nossa investigação. Esse dado remete a uma questão central nas ciências
sociais: a complexidade da relação sujeito-objeto, frente à possibilidade concreta de tratarmos
de uma realidade da qual nós próprios somos agentes. (MINAYO 1994). Considerar-se parte
integrante da pesquisa, “tornar-se um observador capaz de observar-se a si próprio”, saber
“impregnar-se do objeto”, para depois fazer o movimento inverso de distanciamento
(LAPLANTINE 1995), na busca de categorias analíticas próprias do discurso
científico/acadêmico e não mais do discurso “nativo” ou militante, foi uma tarefa que requereu
de nós disciplina, rigor e sensibilidade. Tendo sido executada coletivamente, porém, essa
aproximação-distanciamento tornou-se possível, na medida em que a própria equipe executora
da pesquisa funcionou como espaço de discussão dos dados e análise dos resultados.
2. OBJETO DA PESQUISA E ENQUADRE TEÓRICO
Apesar do avanço que representou a criação das Delegacias da Mulher na
construção da cidadania das mulheres no Brasil, questiona-se hoje a sua eficácia como lócus
privilegiado de implantação da política de segurança pública no combate à violência de
gênero. Inúmeros estudos e pesquisas têm apontado exaustivamente a deficiência do
atendimento prestado por este órgão e sua baixa resolutividade, que aliadas aos modos de
funcionamento institucional dos Juizados Especiais Criminais, pautados em uma cultura
jurídica tradicional, configuram um quadro onde permanece a impunidade, sobretudo nos
casos de violência doméstica. (SAFFIOTTI s.d.; SANTOS 1999; SILVA 2001; DEBRET
2002; CARRARA ET ALLI 2002; MACHADO 2002).
Desde a sua criação, constatou-se que a maioria das denúncias registradas nas
DEAMs remete à violência praticada contra a mulher por pessoas da família (em geral pelo
companheiro). Por isso, na grande maioria dos casos, a vítima usa a delegacia como uma
instância mediadora do conflito privado, na expectativa de que a intervenção da autoridade
policial possa propiciar uma conciliação com o agressor. Disso resulta, em parte, as inúmeras
retiradas pelas mulheres das queixas prestadas e na frustração profissional das agentes policias,
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por não levarem a cabo os processos que conduziriam à criminalização e punição do agressor
(NOBRE, TORRES, FARIAS 2004).
As análises desta problemática revelam a complexidade que envolve a violência
contra a mulher e o despreparo dos/as agentes policiais na identificação e compreensão do
problema com os quais lidam cotidianamente, e apontam a necessidade imperiosa da formação
dos quadros policiais que atuam nas Delegacias da Mulher. De fato, segundo revela pesquisa
realizada pela SENASP, em 2004, 38% dos funcionários destas delegacias nunca passou por
nenhuma capacitação (BRASIL 2004).
Identificamos duas perspectivas que orientam experiências de formação policial
para as DEAMs: uma centrada numa formação de gênero, a qual, por si só, garantiria uma
mudança nas práticas institucionais destas delegacias de polícia (SAFFIOTTI s.d.; AMARAL
2002), e outra que acena a insuficiência desta perspectiva para uma mudança nos modos de
funcionamento destes órgãos, indicando a necessidade de uma análise mais profunda da
organização policial e da cultura institucional que embasa as práticas dos(as) agentes policiais
que aí trabalham. (SANTOS 1999; NOBRE, TORRES, FARIAS 2004; RIFIOTIS 2004).
Formação policial e educação para a cidadania
No mundo moderno, a educação tem sido vista não só como um meio de
disseminação de conhecimentos formais, mas também como um meio de integração da
população à cidadania. Esta foi uma das preocupações que levou inúmeros reformadores a
instituírem a escola pública obrigatória, a partir da segunda metade do século XIX, nos países
europeus e nos EUA. No Brasil, face às proporções da exclusão social existente, a “dimensão
socializadora” da educação sempre foi uma das vertentes mais exploradas pelos educadores no
país, como demonstram as obras de autores como Anísio Teixeira, Paulo Freire, Darcy
Ribeiro, entre outros. Certamente, por isso, o debate em torno da chamada “educação para a
cidadania” está tão em evidência nas últimas décadas, como parte das ações de
redemocratização do país, após a ditadura militar. Entre estas iniciativas situam-se os Cursos
de Direitos Humanos para policiais, os Fóruns Permanentes de debate sobre essas temáticas
disseminadas ao longo de todo o País, e ultimamente, os Cursos de Especialização em Gestão
e Segurança Pública, oferecidos por inúmeras universidades brasileiras.
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Por outro lado, os programas formais, ligados aos currículos dos cursos de
formação policial, estão se desenvolvendo atualmente em torno de uma matriz curricular
definida pela SENASP, que se “propõe a ser um referencial nacional para as atividades de
formação em Segurança Pública e tem como princípios os direitos humanos e a cidadania, a
formação e a capacitação continuada, humana e profissional dos diferentes atores sociais”,
buscando, enfim, a construção democrática de saberes e práticas renovados (BRASIL 2005)
Além de terem a função de construir e/ou contribuir com uma nova formação
policial, essas várias ações educativas na área da segurança pública, fornecem elementos para
entender as corporações policiais, os códigos, crenças e valores dessa cultura institucional, e as
formas como estes são incorporados/reproduzidos pelos seus quadros, nas relações com
segmentos da sociedade, em particular com os grupos vulneráveis e em situação de conflito.
Entretanto, tanto em relação às experiências ligadas à educação formal quanto às
demais que se encontram desvinculadas dos currículos acadêmicos da corporação policial e se
caracterizam como intervenções que buscam a constituição de um novo modo de operar das
organizações públicas, cabe indagar, como sugere Neves (2001): “É possível educar alguém
para ser cidadão? São a cidadania e os direitos humanos conteúdos “formais” que possam ser
aprendidos como outras disciplinas em cursos de formação ou treinamentos? Pode-se dar
consciência a alguém?” Diz ele:
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A indagação do autor sugere a necessidade de superar a noção de educação como
transmissão de conhecimentos e informações, e de acrescer a ela a concepção de educação
como “exercício sistemático de reflexão de crenças e valores” (MENDONÇA FILHO 2000)
que orientam práticas sociais. Para que isso seja possível, faz-se necessária uma reinvenção da
relação professor-aluno:
Adotando as premissas dessa construção teórica entendemos que a mudança das
práticas policiais, almejadas pela sociedade e por grande parte dos membros dessas
corporações, tem sido efetivada no Brasil à medida que se estabelece lentamente um
“controle” das ações policiais pela comunidade às quais elas se dirigem, e não apenas pela
aquisição de conhecimentos teóricos e técnicos ministrados em cursos voltados à formação
policial. Neste sentido, canais de debate e discussão entre a polícia e a sociedade civil
organizada começam a se abrir, o que têm permitido identificar parceiros e estabelecer alianças
que possam contribuir para a implantação de novas políticas de segurança pública.
Formação policial como política de combate à violência de gênero
Tomando de empréstimo da Pedagogia a produção teórica sobre o processo de
formação, recorremos a Nóvoa (1992), que afirma que este processo na se dá por acumulação
(cursos + conhecimentos + técnica), mas através de um trabalho de reflexão crítica sobre a
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prática, e de construção permanente de identidade pessoal e social. Reconhecendo esta
premissa pensamos que uma política de formação profissional adequada deve ser dividida em
dois momentos: a formação inicial e continuada. O processo de formação inicial é importante
para que os agentes de polícia possam apropriar-se de toda discussão teórica – científica que
envolve o seu objeto de trabalho. A partir daí, porém, é necessário dar continuidade ao
processo de reflexão crítica de sua formação, o que na literatura educacional se convencionou
chamar de formação continuada. A formação deve ter como eixo de referência o
desenvolvimento profissional na dupla perspectiva da subjetividade, considerando sujeito
individual e coletivo (NÓVOA 1992).
Pensar nesta modalidade de formação dos agentes policiais que trabalham na
DEAM significa investir não só em programas de formação continuada, mas também na
melhoria das condições de trabalho, na relação salário-formação e numa organização curricular
que inclua questões relativas à natureza do poder, à ideologia e à cultura (GIROUX, MAC
LAREN 1994).
Assim, um processo de formação policial que se proponha a pensar com seriedade
na melhoria dos serviços prestados pelas DEAMs às mulheres vítimas de violência, passa por
questionar o Estado nas estratégias de controle e desvalorização da categoria profissional. Pela
falta de valorização profissional instala-se um processo de acomodação e frustração capaz de
promover o descompromisso e a falta de envolvimento com o seu trabalho, ou um processo de
resistência que funciona como um tipo de negação ou afirmação colocada diante de discursos e
práticas dominantes.
Ainda tomando de empréstimo a literatura pedagógica sobre o processo de
formação profissional, Zeichener (1993), propõe a formação de um profissional reflexivo, ou
seja, um sujeito capaz de problematizar a realidade e a si próprio, como agente ativo do seu
desenvolvimento profissional e agente da definição de funcionamentos institucionais. Além do
compromisso com a reflexão enquanto prática social, o processo de formação deve ter como
característica uma tendência democrática e emancipatória.
Considerando a atividade dos agentes policiais que trabalham nas DEAMs como
uma atividade complexa e multifacetada, questionamos: até que ponto cursos de
aperfeiçoamento, treinamentos e outros que tenham o objetivo de informar ou socializar
modelos ou experiências exitosas, são suficientes como propostas eficazes de formação
contínua?
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Um programa de formação específica para policiais lotados nas DEAMs deveria
contemplar o atendimento diferenciado e especializado às mulheres vitimizadas, a
resolutividade dos casos e a rede de apoio jurídico, médico, social e psicológico à mulher. No
entanto, nem no processo de escolarização regular nem nos cursos de formação promovidos
pela organização policial há lugar para o foco central da questão com as quais lidam os agentes
de polícia, ou seja, a diferença e a especificidade. Desse modo, qual o espaço capaz de garantir
a reflexão das práticas policiais institucionalizadas, que têm se distanciado da missão para a
qual as DEAMs foram criadas, negando às mulheres vítimas de violência um atendimento
diferenciado e especializado? Parece-nos que a resposta deve ser construída a partir da análise
aprofundada de experiências que estão em desenvolvimento.
Formação policial nas DEPMs de Sergipe
A maioria dos profissionais lotados nas DEPMs de Sergipe concluiu o ensino
médio e muitos têm nível superior, entre os quais se destacam cursos de Direito e Serviço
Social. O contingente é formado predominantemente por mulheres, havendo também a
presença de policiais do sexo masculino, sobretudo no trabalho externo e no setor de
investigação. As delegadas e agentes policiais são concursados, embora ainda existam
profissionais contratados, transferidos e/ou cedidos de outros órgãos.
Seguem a mesma trajetória de formação profissional dos demais policiais civis:
quando do seu ingresso na organização policial, se submetem a um treinamento dado pela
ACADEPOL (Academia de Polícia Civil), que contempla, entre outros conteúdos, matérias de
Direito Constitucional, Criminal e Penal, incluindo disciplinas obrigatórias sobre Direitos
Humanos, Relações Humanas e Balística.
Até recentemente não havia programa de formação voltado às especificidades da
função, sendo a atividade profissional aprendida por estratégias rotineiras junto aos/às policiais
mais antigos/as e experientes. Com a criação do Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis
a oferta de outros cursos tornou-se mais freqüente e outras temáticas passaram a fazer parte do
processo: legislação específica de proteção à mulher, legislação de proteção a grupos
vulneráveis, atendimento ao público, disciplinas com conteúdos da área de sociologia,
psicologia, ética, informática e português. Na opinião dos agentes policiais a mudança
possibilitou não só a ampliação e melhoria do atendimento à população e maior eficácia na
resolução dos casos atendidos, mas também melhoria no processo de formação específica.
15
Apesar da freqüência aos cursos/capacitações/treinamentos ter um caráter compulsório, os
agentes policiais alegam interesse profissional/pessoal como motivação à participação dos
mesmos.
Os requisitos básicos necessários para o desempenho das funções policiais na
DEPMs, na opinião dos agentes são: “conhecimento da legislação”, “capacidade de entender a
vítima”, “relacionar-se bem com o público” e “ser solidário”. Esta maneira de conceber o
processo de formação centrado em habilidades e atitudes pessoais revela uma concepção que
não valoriza suficientemente a perspectiva teórica, técnica e crítica que deveria fundamentar o
exercício da função policial. Isso indica a necessidade de se pensar uma formação específica à
missão para a qual as Delegacias da Mulher e o Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis
foram criados.
3. METODOLOGIA
A pesquisa é essencialmente qualitativa, em função da própria natureza do objeto
que nos propusemos investigar, constituído por um universo de significados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes, “que não podem ser reduzidos à operacionalização das
variáveis” (MYNAIO 1994: 21-22) e atravessado por aspectos bastante complexos e
multifacetados.
As metodologias qualitativas procuram “introduzir um rigor, que não o da precisão
numérica, aos fenômenos que não são passíveis de serem estudados quantitativamente”
(MARTINS E BICUDO 1994: 27) e que necessitam ser considerados sob a perspectiva de uma
abordagem mais abrangente e multidimensional. Assim, optamos por utilizar um conjunto de
instrumentos que privilegiam a própria voz dos atores sociais, para a partir delas efetuar a
análise dos dados, sem a pretensão de generalização dos resultados. Ao lado das fontes orais,
consultamos registros escritos sobre as experiências de formação policial nas DEPMs de
Sergipe, realizadas pela CDH/UFS e pelo MUSA/UFBA, de modo a permitir um
entrecruzamento dos dados e possíveis significações diferenciadas dos mesmos fatos.
O processo de construção dos dados utilizou as seguintes fontes:
a) Entrevistas com delegadas e agentes policiais que participaram das duas
experiências, com uma representante de movimentos de mulheres que
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participou da Capacitação, e com representantes das duas agências formadoras
(CDH e MUSA) responsáveis pelas experiências. Os entrevistados totalizaram
18 sujeitos.
b) Questionários aplicados aos/às agentes policiais lotados nas DEPMs de Aracaju
e Itabaiana. Foram distribuídos 49 questionários, dos quais 18 foram devolvidos
devidamente preenchidos.
c) Consulta ao Banco de Dados das duas entidades responsáveis pelas
experiências: relatórios, memórias de reuniões, diários de campo, artigos
publicados.
O maior desafio do trabalho consistiu, principalmente, na inserção da equipe no
campo, onde algumas agentes policiais se apresentaram inicialmente reticentes a retomar uma
discussão “antiga”, ou seja, relatar e avaliar experiências transcorridas há mais de 3 (três) anos,
num momento em que mudanças substanciais estavam sendo implantadas, referentes à
estrutura organizacional, modos de funcionamento institucional e formação policial, com a
criação do Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis.
Iniciamos o trabalho de campo entrevistando as delegadas (Anexo 1), o que nos
permitiu visualizar o contexto das mudanças estruturais e operacionais que envolvem as
práticas da Delegacia da Mulher atualmente, e sua relação com as experiências de formação
policial atuais e anteriores. Foram entrevistadas 3 (três) delegadas que participaram integral ou
parcialmente da experiência do MUSA/UFBA: a ex-delegada de Itabaiana (atualmente
delegada titular da DEPM de Aracaju), a atual secretária de Segurança Pública (ex-delegada da
DEPM de Aracaju) e a delegada titular de Aracaju à época da realização das duas experiências.
Esta última participou integralmente da experiência dos Grupos de Discussão e da
Capacitação. Todas as delegadas entrevistadas mostraram abertura à pesquisa. Estas
entrevistas nos forneceram elementos que nos permitiram elaborar um roteiro para a
abordagem das agentes policiais (Anexo 2).
Uma dificuldade encontrada na coleta dos dados se refere à ausência de alguns
policiais que participaram das experiências, em virtude de aposentadoria ou transferências e,
principalmente, pela rotatividade na lotação de policiais entre as delegacias. Contudo, na
DEPM de Aracaju, como se mantém basicamente a mesma equipe de trabalho ao longo dos
últimos anos, foi possível entrevistar 8 (oito) das 12 (doze) participantes dos Grupos de
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Discussão formados pela CDH/UFS. Todas estas policiais também participaram da
Capacitação oferecida pelo MUSA/UFBA.
As entrevistas com as agentes policiais foram realizadas na sede da Delegacia da
Mulher de Aracaju, durante o horário de trabalho, sendo as funcionárias liberadas pela
delegada, pelo tempo necessário à tomada dos depoimentos, que variou de 30 minutos a 1
hora. Após a explicitação dos objetivos da entrevista e o estabelecimento de um “contrato” de
sigilo acerca da não identificação pessoal dos sujeitos, as questões foram respondidas num
clima de cooperação. Todas as entrevistas foram gravadas.
Em relação à experiência do MUSA/UFBA, que teve a participação de todos/as
os/as policiais das DEPMs do Estado de Sergipe, encontramos maior dificuldade, pois muitos
policiais da DEPM de Itabaiana sofreram rotatividade com as mudanças de delegadas naquela
unidade policial, ocorridas nos 3 (três) últimos anos. Além disso, alguns foram aposentados e
outros se afastaram da Polícia. Foi possível entrevistar um deles, que mesmo tendo prestado
concurso para a Saúde Pública, deixando a carreira policial, contribuiu com seu depoimento.
Em função desse quadro, optamos por aplicar o questionário (Anexo 3) a todos/as os/as
funcionários/as das Delegacias da Mulher de Sergipe8 que se dispuseram a colaborar com a
atividade, independentemente de terem ou não participado das experiências.
As entrevistas com os membros das duas agências formadoras – CDH/UFS e
MUSA/UFBA – foram realizadas, respectivamente, no campus universitário em São
Cristóvão/Sergipe e na Secretaria de Saúde de Lauro de Freitas, na Bahia.
Essas entrevistas foram semi-abertas, com um roteiro norteador (Anexos 4 e 5),
havendo, no entanto, maior liberdade para acrescentar e desdobrar questões, uma vez que os
sujeitos participaram com maior espontaneidade, interesse e abertura, ressaltando a
importância de se avaliar o trabalho realizado por eles. A seleção dos sujeitos foi intencional e
considerou o grau de participação dos mesmos na elaboração e execução dos programas de
formação policial, totalizando 5 (cinco) entrevistados entre as 2 (duas) agências.
18
Em Salvador foi realizada uma entrevista com a delegada titular da Delegacia da
Mulher, que participou da experiência do MUSA, em Sergipe, como instrutora. A entrevista
foi realizada na sede da Delegacia da Mulher, onde fizemos 2 visitas. Além de coletar dados
sobre esta experiência específica, a entrevista teve o objetivo de conhecer aspectos referentes à
formação dos policiais e outros profissionais que lidam com violência de gênero na Bahia.
Por fim, foi realizada uma entrevista com uma representante dos movimentos de
mulheres em Aracaju que participou da capacitação do MUSA/UFBA. A entrevistada é
membro da UBM (União Brasileira de Mulheres), da Casa Abrigo e atual presidente do
Conselho Municipal dos Direitos da Mulher.
A terceira fonte de dados é documental: relatórios da CDH/UFS sobre a experiência
dos Grupos de Discussão, memórias das reuniões feitas com as agentes policiais na DEPM de
Aracaju, material didático utilizado na Capacitação do MUSA (Programa de Estudos em
Gênero e Saúde do ISC–Instituto de Saúde Coletiva/UFBA), diários de campo
disponibilizados pelos membros da CDH, que contém registros sobre as 2 (duas) experiências,
e artigos publicados sobre a experiência da CDH junto às Polícias Militar e Civil do Estado de
Sergipe, descrita nas obras organizadas por Neves, Rique e Freitas (2002) e por Mendonça
Filho (2004).
Todos as entrevistas foram transcritas na íntegra e submetidas a sucessivas escutas
e leituras, através das quais se identificou temas emergentes, escolhidos como unidades de
registro (BARDIN 1970). O mesmo mapeamento foi adotado em relação aos questionários, aos
dados obtidos através das fontes documentais e outros registros: relatórios, artigos publicados,
memórias de reuniões, diários de campo, etc.
A partir desses mapeamentos, os dados passaram a ser agrupados de acordo com
sua similaridade ou diferenciação, em referência às temáticas emergentes. A seguir foram
classificados em categorias, estabelecidas segundo alguns princípios básicos, que implicam
homogeneidade dos critérios de categorização, exaustividade e exclusividade entre elas
(GOMES 1994). Ao mesmo tempo, atentamos para a necessidade de considerar esses
elementos em conjunto, na sua totalidade e em inter-relação. Essa categorização permitiu uma
maior visibilidade entre os dados, revelando em que aspectos as informações, opiniões e
imagens aproximam-se, distanciam-se ou contrapõem-se. Identificar os pólos de tensão,
oposição e semelhança entre os sujeitos, tanto num plano horizontal (policiais, professores,
representantes de movimentos sociais e ongs entre si), quanto verticalmente (nos
19
atravessamentos entre essas categorias) revelou não apenas os consensos, mas também as
contradições que permeiam as relações, idéias, imagens e percepções entre esses segmentos.
Foram definidas as seguintes categorias de análise, com base na Análise Temática
realizada, que tiveram como eixo articulador a formação profissional dos policiais que
trabalham com mulheres em situação de violência:
a) Inserção no campo e estratégias de articulação e implantação das
experiências;
b) Pressupostos teóricos e metodológicos que embasam as experiências;
c) Formatação das ações: público atingido, carga horária, conteúdos
programáticos, recursos metodológicos e temáticas emergentes;
d) Impactos das experiências sobre as práticas institucionais;
e) Avaliação da experiência: pela corporação policial, pelas agências
formadoras, por representantes de movimentos sociais.
O procedimento de análise das entrevistas englobou sínteses dos relatos acerca de
cada tema, destacando-se as semelhanças e as diferenças entre os vários discursos. As sínteses,
que em alguns momentos aparecem como “falas reconstruídas” (ZANNELI 1994), foram
intercaladas com textos dos próprios sujeitos, na tentativa de preservar, ao máximo, a palavra
do outro e o sentido atribuído aos temas abordados. Suas versões, independentemente da
veracidade ou não das informações que fornecem, não são tomadas como o olhar de um
indivíduo sobre uma experiência vivenciada, mas como conteúdos produzidos e marcados pelo
coletivo: crenças, valores, atitudes e projetos que norteiam as práticas sociais dos grupos
sociais que protagonizaram as duas experiências de formação policial realizadas nas DEPMs
de Sergipe, num determinado contexto social e momento histórico.
Neste sentido, os dados não revelam apenas os aspectos explícitos das experiências
e dos acontecimentos objetivos, mas aspectos implícitos nas práticas sociais retratadas pelo
discurso dos informantes, das instituições e grupos dos quais fazem partem. Revelam também
o jogo das relações mais amplas que constituem o campo social sobre o qual se desenvolveram
as experiências de formação policial aqui analisadas.
20
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 - INSERÇÃO NO CAMPO E ESTRATÉGIAS DE IMPLANTAÇÃO E ARTICULAÇÃO
DAS EXPERIÊNCIAS
4.1.1 – A experiência da CDH/UFS: Grupos de Discussão
a) Histórico:
Entre 1999 e 2002, a Comissão de Direitos Humanos da Universidade Federal de
Sergipe realizou um trabalho de extensão universitária, caracterizado como pesquisa-
intervenção, através do Curso “A Polícia como Protetora dos Direitos Humanos”, do qual
participaram policiais civis e militares. O Curso foi realizado em convênio com a Secretaria de
Segurança Pública do Estado de Sergipe, o GAJOP (Gabinete de Assessoria Jurídica às
Organizações Populares) e FAPESE (Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de Sergipe),
com financiamento da Fundação FORD, atingindo cerca de 400 policiais militares e civis, com
carga horária de 40 horas (COMISSÃO 2002).
Após a realização de 17 turmas do curso, a avaliação feita pela CDH/UFS apontou
para a conquista de um espaço de problematização da relação polícia e sociedade no âmbito
das corporações. Embora tenha tido um conteúdo programático formal, discutido com os
alunos durante as aulas, segundo relatório e depoimentos de membros da CDH, o maior
impacto do curso foi ter produzido a tematização do exercício da função policial, com ênfase
nos problemas estruturais e de funcionamento interno das organizações policiais.
Deste modo, o formato Curso de Extensão havia chegado a um impasse: se por um
lado permitia o trânsito de informações e conhecimentos sobre a temática “a polícia como
protetora dos direitos humanos”, por outro desencadeava a reflexão em torno dos problemas
institucionais da própria polícia, o que impunha a necessidade de aprofundamento das questões
levantadas, que, com o término do curso não tinham continuidade. Surgiu então a proposta de
modificar o formato do projeto anterior e a intervenção passou a ser caracterizada, não mais
como Cursos de Direitos Humanos para policiais, mas como Grupos de Discussão e Reflexão
de Práticas Institucionais. A proposta era que os grupos se reunissem sistematicamente nas
duas corporações policiais, durante 6 meses, em reuniões quinzenais, de modo a permitir uma
discussão mais sistemática dos problemas institucionais evidenciados na primeira fase da
experiência.
21
Nesta segunda fase foram constituídos 4 (quatro) grupos: 3 (três) grupos na Polícia
Militar (Coronéis, Oficiais e Patrulhamento Urbano); e 1 (um) grupo na Polícia Civil
(Delegada e Agentes de Polícia Judiciária da Delegacia da Mulher de Aracaju). Na DEPM, a
expectativa institucional, que se constituía como uma demanda da delegada, era que a
intervenção ajudasse a “melhorar o atendimento à população”. Dessa forma, vislumbrou-se a
possibilidade de construção de um espaço de debate sobre as práticas institucionais
desenvolvidas na DEPM, onde seus servidores se dispusessem a repensá-las (FARIAS 2002).
b) Planejamento da experiência e entrada no campo:
Foram realizadas 3 (três) reuniões de negociação/construção da proposta, na sede
da DEPM de Aracaju. As reuniões ocorreram durante o horário de trabalho, nos turnos da
manhã e tarde, das quais participaram a delegada e todos/todas os/as agentes policiais, técnicas
e investigadores lotados na unidade. Foi discutida a proposta de constituição dos grupos, a
demanda da delegada e as expectativas dos/das policiais frente ao trabalho. A CDH construiu,
a partir daí, um primeiro mapeamento da natureza da intervenção, com levantamento das
demandas iniciais, ficando a proposta a ser construída com o grupo, à medida que a
experiência fosse se desenvolvendo, em termos de temáticas a serem discutidas e dinâmicas de
funcionamento das reuniões, que totalizaram 9 (nove), durante 6 (seis) meses. Foi colocado o
critério de participação não compulsória dos agentes. Deste modo, dos 26 (vinte e seis)
policiais presentes nas reuniões iniciais, apenas 12 (doze) se dispuseram a participar da
experiência dos Grupos de Discussão.
c) Condições institucionais de execução da proposta:
Segundo depoimentos dos membros da CDH, a proposta dos grupos era “nova e
ousada”, pois significava que “pessoas estranhas à organização queriam discutir e
problematizar, com a polícia, os problemas da própria polícia”. Diferentemente da experiência
dos Cursos de Direitos Humanos, oferecidos anteriormente, a experiência dos grupos, tanto na
Polícia Militar como na DEPM, representava uma “construção coletiva”:
22
Ao mesmo tempo em que os policiais que queriam uma polícia diferente e cidadã
viam nos Grupos de Discussão uma possibilidade de fazer alianças com representantes da
sociedade, desencadeavam-se resistências institucionais. Tais resistências eram expressas em
dificuldades para articular e manter o funcionamento das reuniões: ausência de participantes,
dificuldade de local, disponibilidade de horário dos policiais, encontros com duração variável a
depender da rotina institucional, etc (COMISSÃO 2002). Segundo dizem membros da CDH,
“os policiais demandavam aquele tipo de intervenção, mas as condições de suporte
institucional eram muito limitadas”.
De acordo com depoimento de uma das delegadas da DEPM, muitas questões
discutidas eram delicadas, “às vezes ficava muito evidente as lacunas e limitações das
policiais, tanto pessoais quanto profissionais, para o exercício da função”. Entretanto, uma das
agentes policiais afirma:
4.1.2 – A experiência do MUSA/UFBA: Capacitação
a) Histórico:
Com o objetivo de conhecer e analisar criticamente as condições de funcionamento
das DEAMs ao longo de todo o território nacional, o Conselho Nacional dos Direitos da
Mulher/SEDIM, em parceria com o Ministério da Justiça/SENASP realizou, em 2000, uma
ampla pesquisa que atingiu 78% das 370 DEAMs então existentes no País. A pesquisa
intitulada “Condições de Funcionamento das Delegacias Especializadas no Atendimento às
Mulheres”, investigou, entre outros aspectos, a infra-estrutura, condições de trabalho policial e
formação do contingente lotado nesses órgãos. A pesquisa apontou a precariedade de
funcionamento das DEAMs, enfatizando a urgência de capacitação específica de seus agentes
23
policiais e técnicas, cuja carência representava o maior entrave ao funcionamento deste órgão
em todo o País, que se expressava, sobretudo, na baixa qualidade do atendimento prestado às
mulheres vítimas de violência e no atendimento insatisfatório de suas demandas específicas
(SILVA 2001).
Decidiu-se, então, pela execução de um programa de formação policial, estruturado
como capacitação, que atingisse todas as delegacias da mulher ao longo do território nacional.
Buscou-se parcerias com ONGs e universidades para pensar a elaboração de um projeto. O
treinamento de agentes multiplicadores para execução do curso nos estados e municípios foi
realizado pela CEPIA, no Rio de Janeiro.
De acordo com depoimento de um membro do MUSA, como não houve
representantes do Estado de Sergipe no treinamento dado pela CEPIA, a UFBA, através do
MUSA (Grupo de Estudos e Pesquisas em Gênero do Instituto de Saúde Coletiva da
Universidade Federal da Bahia) foi convidada para executar o projeto em Sergipe. O programa
da Capacitação inseriu-se, portanto, num projeto mais amplo, a partir de uma iniciativa do
Ministério da Justiça, em parceria com outras instituições. A Capacitação foi realizada durante
uma semana, com participação compulsória de todos os policiais lotados na Delegacia da
Mulher do Estado.
b) Planejamento da experiência e entrada no campo
Um mês anterior à Capacitação, foi convocada uma reunião com várias entidades
que trabalham com gênero em Sergipe, pela Secretaria de Estado da Segurança Pública para
discutir a sua realização. Estavam presentes representantes das seguintes instituições: Caritas,
Bem-me-quer (Ong), OAB / Centro de Defesa da Cidadania da Mulher, Conselho Municipal
de Direitos da Mulher, Fórum de Direitos Humanos, Comissão de Direitos Humanos da UFS,
Fórum de Mulheres e UBM - União Brasileira de Mulheres.
O programa da Capacitação já estava elaborado, não sendo possível alteração no
seu conteúdo. Propunha-se, entretanto, a participação de professores das universidades locais
para ministrar as aulas; quadros da Polícia Civil e representantes dos movimentos de mulheres
foram também convidados, para participar de atividades de mesas-redondas e na abertura do
evento, ao lado de outras autoridades.
24
c) Condições institucionais de execução da proposta:
De acordo com o MUSA, houve a possibilidade de articular vários parceiros locais
para a realização da Capacitação, de modo que as condições institucionais necessárias ao
sucesso da experiência foram garantidas, sobretudo em relação à liberação dos/das
funcionários/as. Algumas delegadas, porém, apontam problemas no modo como a experiência
foi executada:
4.2 – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DAS EXPERIÊNCIAS:
4.2.1 – A experiência da CDH/UFS: Grupos de Discussão
a) Concepções sobre o trabalho, idéias norteadoras da intervenção e objetivos da
ação:
O trabalho junto às polícias, incluindo a experiência na DEPM, é definido pela
CDH como “uma modalidade de pesquisa-intervenção”, por meio da qual se buscava conhecer
o campo e provocar uma análise coletiva do funcionamento institucional. A perspectiva que
embasou a intervenção fundamentou-se nos princípios básicos da Análise Institucional
(LOURAU 1993), através da participação ativa das policiais nas discussões e temáticas
propostas pelo próprio grupo (COMISSÃO 2002).
A discussão estava centrada no exercício da função policial e nas práticas
institucionais da Delegacia da Mulher como órgão da Polícia Civil, inserida numa cultura
organizacional, onde se reproduzem valores e crenças consolidados, observados, inclusive, em
25
outras delegacias. Foi considerado, entretanto, as especificidades do público atendido e suas
demandas singulares: mulheres vítimas de violência e seus agressores.
As diretrizes que nortearam o trabalho centraram-se em dois eixos:
1) estimular a construção de uma prática de discussão, através da reflexão dos
modos de funcionamento naturalizados nesse órgão e das práticas policiais,
sobretudo com relação às formas de atendimento às mulheres que registram queixas
na DEPM;
2) estabelecer a possibilidade de um diálogo entre a polícia e a sociedade onde se
discuta e se repense o exercício da função policial no atendimento das demandas
específicas das mulheres que sofrem violência e sua relação com a construção da
cidadania.
A CDH “se propôs como dispositivo de enunciação que objetivava analisar as
questões sociais no plano institucional, entendido como plano abstrato das crenças e valores
que se materializam nas organizações sociais” (COMISSÃO 2002: 4). A discussão acerca dos
direitos humanos em geral e dos direitos das mulheres em particular, foi centrada no âmbito
das ações do Estado, isto é, no modo de execução das funções públicas, onde não se enfatizava
as práticas individuais dos agentes, mas o modo como uma determinada cultura policial era
reproduzida e naturalizada no espaço específico da DEPM.
26
b) Estratégias metodológicas:
A estratégia metodológica deu ênfase à discussão crítica sobre o cotidiano da
atividade policial, numa proposta aberta, onde não havia temas definidos a priori, sendo estes
sugeridos pelas próprias agentes policiais, a cada encontro, para a reunião seguinte. Nesta
proposta o enfoque de gênero estava contemplado, embora contido numa perspectiva mais
ampla de formação em direitos humanos e cidadania, permitindo uma maior aproximação com
a complexidade da segurança pública. Procurava-se, também, valorizar o trabalho das policiais
e a função social da DEPM como mediadora de conflitos, dentro de uma perspectiva mais
democrática de segurança pública, que extrapola a tarefa investigativa e repressora da polícia.
Os recursos utilizados (músicas, dramatizações, estudos de caso, relatos de
pesquisa, etc), foram mobilizados como recursos auxiliares na condução do trabalho e não
como procedimentos técnicos para a obtenção imediata de resultados definidos. Buscava-se
quebrar os lugares postos da relação de poder professor x aluno para poder problematizar as
questões e permitir outras falas diferenciadas (COMISSÃO 2002).
Além dos recursos técnicos, foi utilizada a observação livre do funcionamento da
delegacia com registro etnográfico em diário de campo, cujos dados abasteciam a intervenção,
se constituindo como material de discussão das reuniões (FARIAS 2002). As policiais fazem
referência a essa postura metodológica:
4.2.2 – A experiência do MUSA/UFBA: Capacitação
a) Concepções sobre o trabalho, idéias norteadoras da intervenção e objetivos da
ação:
Os critérios utilizados pelo MUSA/UFBA para pensar os projetos de capacitação de
policiais das DEAMs são construídos em torno de uma metodologia específica de gênero,
montada em parceria com núcleos de saúde pública de duas universidades brasileiras: a
27
UFRGS (Universidade Federal do Rio do Sul) e a UERJ (Universidade Estadual do Rio de
Janeiro), de acordo com depoimento da coordenadora da Capacitação em Sergipe.
O eixo norteador da proposta está assentado na necessidade de capacitação
específica dos/as policiais e técnicos/as que lidam com violência de gênero e na ampliação dos
serviços das DEAMs, desdobrando-se na formação de redes de atendimento integral às
mulheres em situação de violência, como parte de uma política pública de combate à violência
contra a mulher.
As idéias norteadoras da intervenção estão ancoradas em dois pressupostos:
1) capacitar os agentes públicos no trato da violência contra a mulher, para uma
melhor operacionalização das ações das DEAMs;
2) estimular a criação de uma rede de atendimento integral que se desdobre em
ações de outras instituições (serviços assistenciais e jurídicos).
A Capacitação pretendeu identificar os avanços conquistados pelas DEAMs e os
impasses que impedem um melhor desempenho no atendimento e acolhimento das mulheres.
O foco da ação estava voltado para a necessidade de intervir sobre as práticas dos policiais no
atendimento às mulheres que procuram as DEAMs, a partir do levantamento das dificuldades
enunciadas pelos agentes policiais referentes ao trabalho que executam. Identifica ainda a
necessidade de repensar os preconceitos e discriminações dos próprios policiais no
atendimento às mulheres.
b) Estratégias metodológicas:
A Capacitação privilegiou a transmissão de um conteúdo programático, com
enfoque de gênero, abordando as principais temáticas voltadas ao trabalho policial no
atendimento às mulheres em situação de violência. O programa é sempre o mesmo em todos
os Estados brasileiros, mas segundo depoimento da coordenadora, quanto maior o
28
envolvimento de instrutores e profissionais locais, maior a possibilidade de viabilizar a
formação da rede. Nessa perspectiva não só os policiais deveriam ser contemplados na
formação, mas membros de outras instituições, como o pessoal das Casas Abrigo e da rede de
saúde pública.
A experiência do MUSA tem revelado que há ações isoladas ou incipientes de
várias instituições no atendimento das mulheres vítimas de violência, que se configuram como
uma rede informal. A perspectiva da Capacitação é de contribuir para a articulação dessas
várias entidades de modo que a rede possa ser tecida e formalizada para oferecer um
atendimento integral e integrado às mulheres.
As capacitações coordenadas pelo MUSA utilizam como recursos metodológicos
workshops, com aulas e mesas redondas. Na ocasião, são distribuídos materiais de apoio, em
forma de caderno, contendo os textos referentes ao conteúdo programático com temas
trabalhados para que possam ser consultados posteriormente pelos participantes, caso desejem
se aprofundar.
Freqüentemente, há participação de instrutores convidados de outros Estados para
abordar algumas temáticas: em Sergipe houve a participação da delegada da DEAM de
Salvador e de um magistrado de um dos Juizados Especiais Criminais de Pernambuco. De
acordo com depoimentos dos policiais, ambos contribuíram com o relato de experiências bem
sucedidas no campo do atendimento policial às mulheres vítimas de violência e na aplicação
da Lei 9099/95, respectivamente. Contudo, alguns policiais se referiram ao grande volume de
informações, à quantidade de participantes e à necessidade de um maior conhecimento da
realidade local por parte dos instrutores. Alguns consideraram o conteúdo muito teórico, pouco
aplicável.
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4.3.1 – Contextualização das discussões produzidas pelas duas experiências
Segundo depoimento de uma das delegadas, a DEPM de Aracaju foi uma das
primeiras Delegacias da Mulher do Brasil, criada em 1986 por um desejo da 1ª dama do
Estado. Depois, como aconteceu nos demais estados brasileiros, decorrente do baixo número de
inquéritos policiais instaurados e do inexpressivo número de casos encaminhados à Justiça,
passou a ser discriminada dentro da própria corporação como uma delegacia que “não fazia
trabalho de polícia” e que “atendia problemas fúteis”, em virtude das demandas específicas das
mulheres, voltadas prioritariamente à área psicológica e social. Permaneceu na estrutura da
Secretaria Estadual de Segurança Pública sem receber importância das autoridades, sendo os
policiais lotados na DEPM discriminados por outros colegas.
Apesar das dificuldades e impasses, durante os debates nas duas experiências, foi
enfatizado o avanço que representa a criação das DEAMs para a construção da cidadania das
mulheres e a contribuição do órgão para a redução do problema da violência de gênero, mesmo
que as soluções encontradas não tenham resultado na punição dos agressores. Neste sentido, foi
discutido o papel da polícia como instância mediadora do conflito privado e a importância da
DEPM como espaço educativo e de reflexão, junto às vítimas e agressores, dos valores que
produzem e reproduzem a violência contra a mulher.
Em decorrência da ausência de uma rede estruturada e formal de atendimento que
possa oferecer à mulher, seus filhos e agressores, soluções mais definitivas para o problema da
violência, os/as policiais revelaram o sentimento de “fazer um trabalho paliativo” ou “botar
panos quentes na situação”. Algumas policiais que lidam diretamente com os casos de
violência doméstica, sobretudo, afirmaram, inclusive, “não querer se envolver muito, porque
não podem dar jeito”.
Três problemas podem ser evidenciados a partir dessa afirmação: a falta de
acolhimento às mulheres, a precariedade das condições estruturais de atendimento e a falta de
formação policial para lidar com vítimas de violência. Durante as discussões, porém, foi
mapeada a existência de uma rede informal, identificados parceiros já existentes ou potenciais e
feitas algumas sugestões de encaminhamentos para que a rede possa ser tecida.
Em relação ao atendimento dos agressores, na Capacitação foi apresentada e
discutida a Lei 9099/95 e sua aplicação. Foi ressaltado o caráter não socializante das medidas
de contenção adotadas antes da lei e sua pouca eficácia em termos de mudança de padrões de
conduta, evidenciando-se a necessidade de medidas pedagógicas e preventivas, sobretudo no
trato da violência doméstica. Muitos aspectos foram polemizados, do efeito pedagógico da
sentença à aplicação das penas alternativas que têm contribuído para a banalização da violência
de gênero e a perda de credibilidade na Justiça pela sociedade. A experiência realizada em
Pernambuco foi apresentada como um modelo diferenciado e exitoso de aplicação da lei.
Uma dificuldade apontada nos Grupos de Discussão foi a relação da polícia com os
movimentos sociais e de mulheres no Estado, que não trabalham articulados entre si nem em
conjunto com a polícia. Foi citada, também, a ausência de espaços públicos que possam
promover o debate entre esses segmentos sociais, desdobrando-se em ações integradas e mais
eficazes. Em alguns momentos foi evidenciado um campo de tensão entre a polícia e os
movimentos de mulheres:
O depoimento acima e outras falas semelhantes revelam a precariedade da
formação policial no Estado e em particular dos quadros das DEPMs. Neste sentido, a polícia
aparece como uma instituição sem formação básica, com predomínio dos processos informais
de aculturamento, muito mais eficazes do que a aprendizagem formal dos conteúdos que são
ministrados nos treinamentos oferecidos pela própria corporação.
Em termos de condições de trabalho, observa-se em Sergipe a mesma situação das
demais DEAMs do Brasil: precariedade em termos de infra-estrutura física, falta de
equipamentos para serviço interno e externo, falta de uma política de pessoal satisfatória na
corporação, sobrecarga de trabalho, baixos salários, rotina estressante, rotatividade de
delegadas e funcionários, falta de pessoal técnico capacitado (psicólogas e assistentes sociais),
informalidade nos procedimentos9.
Contudo, um fato novo foi ressaltado durante os debates, nas duas experiências: o
surgimento da categoria “delegado concursado”10, que tem imprimido novos modos de
funcionamento institucional nas delegacias do Estado. Segundo os policiais, isso representou
um grande avanço e a esperança de mudanças positivas. Por outro lado, juntamente com este
concurso, houve outro para agentes de polícia judiciária, cujos aprovados ainda não haviam
sido nomeados naquela época. Esse fato criava expectativas e apreensões, pois, previa-se uma
possível disputa entre “a competência dos novos” e a “experiência dos antigos”.
4.4. – IMPACTOS DAS EXPERIÊNCIAS SOBRE AS PRÁTICAS INSTITUCIONAIS
4.4.1 – A visão dos policiais:
O impacto das 2 (duas) experiências sobre o funcionamento das DEPMs aparece
como indiferenciado para os quadros policiais, tanto entre as delegadas, quantos entre os/as
agentes que participaram do Grupo de Discussão e da Capacitação. Segundo os depoimentos
das delegadas e agentes policiais, o impacto se reflete principalmente nos modos de
atendimento à população. Essa mudança segue duas direções: uma no sentido de modificar a
visão que eles/elas próprios/as tinham do trabalho policial na DEPM como um lugar
desprestigiado dentro da Polícia Civil; e outra, no sentido de um novo entendimento dos/as
próprios/as policiais sobre a função das DEPMs, levando-as a pensar no espaço policial não
apenas como lugar de punição ao agressor, mas como um espaço educativo junto à mulher que
sofre violência. Essa reflexão contribuiu para superar a visão estereotipada da mulher que
denuncia, mas não pretende a criminalização do agressor e apontou a necessidade de
encaminhá-la para outros espaços de assistência, dentro da própria delegacia ou para outras
instituições.
Por outro lado, houve uma sensibilização em relação à necessidade de buscar
parcerias com outros órgãos para que o atendimento à mulher vítima de violência não se
encerre na DEPM, mas se desdobre em outras ações que possam oferecer soluções mais
conseqüentes e de longo alcance, sem o caráter paliativo que muitas vezes representa a ação
policial diante da complexidade do problema, sobretudo nos casos de violência doméstica.
A percepção da DEPM como espaço de mediação, de orientação e de cuidado,
segundo depoimentos das delegadas, e a necessidade de criação de uma rede de apoio que
preste um atendimento integrado e integral às mulheres em situação de violência (policial,
jurídico, médico, psicológico, social), foram as contribuições mais significativas das duas
experiências. Isso, segundo depoimentos de algumas, teria influenciado a busca por novos
modelos de funcionamento, que se materializou no projeto do Centro de Atendimento a Grupos
Vulneráveis.
Segundo as policiais, a mudança do formato da DEPM e sua vinculação a um
complexo policial, localizado no mesmo espaço físico, com uma coordenação unificada e com
setores comuns, garantiu melhores condições de trabalho e tem produzido um aumento no nível
de satisfação e valorização profissional, embora se registre um acúmulo e sobrecarga das
atividades sobre o contingente policial. O novo modelo de atendimento tem aumentado o
número de queixas e proporcionado maior visibilidade na mídia, facilitando o acesso da
população ao Centro. Há ainda, segundo esses depoimentos, uma maior preocupação com a
qualidade do atendimento e com um maior acolhimento às mulheres. Esses avanços são
entendidos como “não fazer a vítima esperar” e “na pouca reincidência de casos, após as
audiências de mediação”.
Um policial que participou apenas da Capacitação e é da DEPM de Itabaiana, no
interior do Estado de Sergipe, apresenta um ponto de vista diferente:
4.4.2 – A visão das agências formadoras:
Os membros da Comissão de Direitos Humanos da UFS, ao contrário dos policiais,
apontam as limitações dos cursos ou da experiência dos grupos de discussão, em termos de
impactos sobre as práticas, capazes de produzir mudanças substanciais nos modos de operar
das organizações policiais. Para eles, essas mudanças são decorrentes de muitos fatores
interligados, tais como: conjuntura da segurança pública em nível nacional e local, ascensão de
alguns quadros policiais aos cargos de maior hierarquia dentro das corporações, organização da
própria categoria na busca de solução para os problemas institucionais das organizações
policiais, etc. Dentro desse contexto, a CDH se vê como estimuladora da criação de um espaço
público de tematização dessas questões e uma interlocutora na relação polícia-sociedade:
Esses depoimentos vão ao encontro do que defendem Giroux e MacLaren (1994)
sobre a possibilidade da produção de mudanças das práticas usuais. Para eles, só a produção de
uma “contra-hegemonia” teria este papel, uma vez que implica num entendimento mais
político, mais teórico e mais crítico, não só da natureza da dominação, mas também do tipo de
oposição ativa que deveria engendrar (GIROUX, MACLAREN 1994). Em outras palavras, a
contra - hegemonia, para além da crítica, possibilita a criação de esferas públicas alternativas.
O MUSA também pontua limitações acerca da experiência, em termos de impactos
sobre as práticas policiais. O formato de capacitação adotado não possibilita o
acompanhamento de ações posteriores e seus desdobramentos.
4.3.3 – A visão dos movimentos sociais:
A representante dos movimentos de mulheres, que participou apenas da experiência
do MUSA, considera que a Capacitação produziu impacto sobre as práticas de atendimento, em
termos de melhoria no acolhimento às mulheres. Mas, assinala que mudanças mais
significativas se devem a fatores mais amplos e complexos, vinculados à cultura policial já
consolidada.
4. 5. – AVALIAÇÃO DAS EXPERIÊNCIAS
4.5.1 – Pela corporação policial:
A maioria dos policiais considera as duas experiências indiferenciadas, em
decorrência do fato dos membros da CDH/UFS que coordenaram os Grupos de Discussão na
DEPM, terem participado da Capacitação promovida pelo MUSA/UFBA, na qualidade de
palestrantes, participantes de mesas redondas e ministrantes de aula. Contribui também para tal
indiferenciação o distanciamento do tempo transcorrido entre a realização das experiências e
esta pesquisa.
As especificidades são evidenciadas apenas em relação à metodologia: o Grupo de
Discussão é percebido pelas agentes policiais como inserido no cotidiano institucional, sem
conteúdos definidos a priori pela equipe da CDH, mas “negociados” com os participantes, o
que é valorizado mais positivamente em relação à Capacitação dada pelo MUSA, que
apresentou um programa já elaborado, com uma pauta definida de temas a serem discutidos,
“sem uma pesquisa dirigida às necessidades locais”.
Outra diferença evidenciada diz respeito à continuidade das experiências: a
primeira é percebida como uma presença constante durante 6 (seis) meses, e a segunda,
concentrada em 1 (uma) semana, embora ambas tenham contemplado a mesma carga horária.
Evidenciam-se também especificidades na abordagem das policiais: a experiência do MUSA
trabalhou com aulas-debate, em uma situação formal e “distante da realidade cotidiana”; a
experiência da CDH utilizou como recurso, algumas vezes, a própria prática institucional. Por
outro lado, na Capacitação houve melhores condições de infra-estrutura e não se verificou,
explicitamente, o que os membros da CDH chamam de “resistências institucionais” ao
desenvolvimento da proposta.
A visibilidade que a experiência do MUSA teve junto à corporação policial, à mídia
e aos movimentos sociais foi significativamente maior do que a experiência da CDH, que ficou
circunscrita a um pequeno grupo de policias da DEPM de Aracaju. Outro aspecto positivo
ressaltado em relação à Capacitação foi a possibilidade de conhecer experiências de outros
Estados, através da participação de instrutores convidados de Pernambuco e da Bahia.
Outros pontos positivos das duas experiências são evidenciados, sobretudo no que
se refere à relação da polícia com a sociedade: ambas promoveram uma abertura ao diálogo
entre esses dois segmentos, contribuindo para pensar criticamente a função das DEPMs. O
“diálogo com outras instituições, com pessoas que vem de fora e abrem um espaço de
expressão e reflexão” é valorizado por quase todas as policiais entrevistadas, incluindo as
delegadas. Deste modo, ambas as experiências foram, no geral, positivas: em um nível mais
imediato, sensibilizaram o contingente policial para a especificidade do trabalho nas DEPMs e
para a necessidade de um maior acolhimento às mulheres vítimas de violência; em um nível
mais amplo, as experiências contribuíram com a idéia de criação do Centro de Atendimento a
Grupos Vulneráveis. A falta de continuidade das experiências é apontada como aspecto
negativo, principalmente em relação à Capacitação.
4.5.2 – Pelas agências formadoras:
Na avaliação da CDH, a experiência desenvolvida junto às polícias do Estado, tanto
na primeira quanto na segunda fase, representou uma expansão do debate público sobre o
exercício da função policial. Neste sentido, o trabalho desenvolvido na DEPM remete sempre a
um trabalho mais amplo, não circunscrito a essa unidade policial, mas ao conjunto da Polícia
Civil e Militar.
Sobre a experiência na DEPM, é enfatizada a importância da reflexão feita sobre a
especificidade do trabalho policial nessa delegacia e sobre o descompasso entre as
representações e demandas das policiais e das vítimas em torno da função da DEPM,
apontando a necessidade de se repensar o papel da polícia para além de sua função repressora e
punitiva. É valorizada, também, a expressão do desejo das policiais de realizar um bom
trabalho, de melhorar a imagem do policial e sua credibilidade social, e de buscar soluções
mais eficazes para o atendimento às mulheres vítimas de violência. Avalia-se também
positivamente a presença da delegada em quase todas as reuniões do grupo, contribuindo para o
aprofundamento das discussões e para a busca de soluções.
Entretanto, em termos de impacto, como já assinalado anteriormente, a avaliação da
CDH aponta as limitações do trabalho realizado no que diz respeito a mudanças das práticas
institucionais. Neste sentido, o grupo considera que sua contribuição foi problematizar as
relações polícia-sociedade e estimular o debate, pelos próprios policiais, das questões
institucionais.
Um dos frutos da experiência do Grupo de Discussão foi a construção coletiva, de
um projeto de formação policial para as DEPMs, elaborado pela equipe da CDH e pelas
policiais. Entretanto, não houve recursos financeiros nem para a execução deste projeto nem
para a continuidade do trabalho que vinha sendo desenvolvido. A interrupção do processo é
apontada como o aspecto mais negativo da experiência.
Na avaliação do MUSA, o grande ganho da Capacitação foi a possibilidade do
intercâmbio entre os Estados de Sergipe e Bahia e “pela primeira vez realizar um trabalho
voltado à melhoria do atendimento, através da criação de um espaço de discussão”. Isso
permitiu aprofundar o debate em torno da função de uma delegacia especializada no
atendimento à mulher vítima de violência, buscando alternativas para suas demandas. “Os
policiais puderam colocar as dificuldades do trabalho, sem serem criticados”. Foi sugerido
pelos agentes que o curso fosse estendido aos policiais militares e de outras delegacias, e que a
carga horária fosse ampliada.
Como aspecto negativo foi apontada a falta de infra-estrutura dada pela Secretaria
de Segurança, em termos de local adequado e qualidade do coffee break oferecido.
Outro ponto considerado negativo foi que a Capacitação não atingiu um dos seus
objetivos: a formação da rede de atendimento. Foi ressaltada também, como limitação da
proposta, a impossibilidade de atender às demandas dos policiais:
4.5.3 – Pelos movimentos sociais:
Como não participaram dos Grupos de Discussão a avaliação se refere apenas à
Capacitação. Neste sentido foi ressaltada a importância do diálogo entre policiais, movimentos
sociais, universidade e “todos que tinham interesse em discutir o assunto”.
Foi apontada como limite da Capacitação a falta de continuidade da experiência,
uma vez que os movimentos de mulheres entendem que esse modelo de formação não é uma
estratégia eficaz para a mudança da cultura policial.
5. CONCLUSÃO
Embora embrionárias, considerando o curto período de tempo em que ocorreram e
a baixa carga horária das duas experiências, é necessário considerar que os programas de
formação policial aqui analisados estão inseridos dentro de propostas de trabalho mais amplas
que as duas agências formadoras possuem, com experiências significativas em educação para a
cidadania: junto à polícia (no caso da CDH/UFS) e junto aos movimentos sociais,
especialmente de mulheres (no caso do MUSA/ISC/UFBA).
A contribuição das experiências para a formação policial e o impacto que tiveram
sobre as práticas policiais mostram-se vinculados à abertura de um espaço de diálogo, crítica e
reflexão entre a polícia e a sociedade, e não apenas aos conteúdos instrucionais trabalhados.
Observam-se, neste sentido, ênfases diferenciadas: enquanto a ênfase da Capacitação do
MUSA recaiu sobre a transmissão de conteúdos e informação, a dos Grupos de Discussão da
CDH incidiu sobre a reflexão das práticas policiais cotidianas. Entretanto, os dois enfoques
foram contemplados nas 2 (duas) experiências: ambas promoveram o acesso a informações
novas e relevantes para o exercício da função policial e discutiram criticamente práticas
institucionais.
O grande impacto das experiências parece estar relacionado à contribuição que
ambas deram na elaboração da proposta de criação do Centro de Atendimento a Grupos
Vulneráveis, que se assenta em dois pilares centrais: a mediação de conflitos, e o atendimento
integrado e em rede às mulheres e demais grupos vulneráveis e em situação de risco, elaborado
por um grupo de delegadas e delegados de carreira, quase todos recém-concursados. Neste
sentido, podemos dizer que as contribuições dadas se refletiram prioritariamente num nível
hierárquico superior, embora os agentes policiais possam ter sido sensibilizados para
mudanças, direta ou indiretamente.
A criação do Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis, contudo, dependeu de
inúmeros fatores vinculados à conjuntura local da Polícia Civil, tais como: a contratação de
delegados/as novos/as por meio de concurso público, quase todos/as sem inserção anterior na
polícia e com uma visão mais democrática de segurança pública (entre os quais foram
escolhidas as atuais delegadas titulares das DEPMs do Estado); a organização desse grupo para
fazer frente à práticas consideradas violadoras de direitos humanos e ilegais dentro da
corporação; e a articulação com quadros policiais antigos e em ascensão, que dentro da Polícia
Civil já tinham idéias e práticas diferenciadas. Além disso, houve mudança na conjuntura em
nível nacional, no âmbito das políticas de segurança pública.
Deste modo, consideramos que as experiências realizadas com os Grupos de
Discussão e a Capacitação, desenvolvidos respectivamente pela CDH/UFS e pelo
MUSA/UFBA, somam-se a esse contexto de mudanças, no qual as agências formadoras são
vistas pelos policiais como parceiros na construção de novas propostas de funcionamento para
a DEPM.
O projeto que cria o Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis aponta a
necessidade de “formação de agentes públicos aptos tecnicamente para lidar com as diferenças
existentes no espaço social” (SERGIPE, s.d.). O texto reconhece que essas unidades policiais,
embora tenham por missão o atendimento à população específica, “não possuem, em seu
quadro de pessoal, profissionais preparados para o trato de tais demandas”.
Deste modo, se reafirma a necessidade de formação específica para os quadros
policiais, pois como revela a experiência de 2 (duas) décadas das DEAMs, não basta a criação
de novos espaços policias para que se assegure bom atendimento, conquista de cidadania,
proteção às mulheres e garantia de direitos.
Concluindo esse relatório recorremos a um depoimento de Paulo Freire, que relata
uma experiência feita por ele, na formação de educadores, que poderia ser utilizada como
desafio, em projetos de formação policial e que deixamos como sugestão a ser pensada:
Adotando essa concepção de “formação permanente” na qual o próprio educando
deve ser implicado, acreditamos que cursos específicos, para atender necessidades
emergenciais, não garantem um processo de formação que torne possível aos agentes policiais
o enfrentamento do problema social e cultural da violência contra as mulheres, capaz de lhes
garantir um atendimento especializado e diferenciado dentro da Polícia Civil. Projetos
verticalizados, com conteúdos programáticos e metodologia unificada em nível nacional, como
a Capacitação aqui analisada, também não parecem atingir o cerne da questão. Por outro lado, a
experiência dos Grupos de Discussão é uma proposta inovadora, mas como não teve
continuidade, não há elementos suficientes para analisar seu alcance e eficácia.
Uma proposta de “formação permanente” deveria estar articulada em torno de uma
concepção clara sobre as questões centrais dos problemas vividos pelo cotidiano das DEAMs,
para fomentar uma atitude problematizadora dos profissionais em relação às práticas
institucionais vigentes. É sobre o exercício do fazer cotidiano e a reflexão dessas práticas
institucionais que a teoria deve ser discutida, como sugere Freire. Essa, porém, é uma
perspectiva antes política do que técnica e implica, necessariamente, repensar a função social
das Delegacias da Mulher.
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A N E X O S
Anexo 1
Roteiro de Entrevistas – Delegadas DEPMs
1) Qual o critério para lotação de funcionários nas DEPMs?
2) Que tipo de formação é dada aos policiais ao ingressarem nas
DEPMs?
3) Existe algum tipo de acompanhamento/capacitação posterior?
4) Quais as maiores dificuldades no exercício da função policial no
atendimento ao público específico da DEPMs?
5) Como vê as experiências de formação policial executadas por
outras organizações não policiais das quais participou? (CDH /
MUSA)
6) Como/se essas experiências contribuíram com a formação policial
e para a execução das ações específicas das DEPMs?
7) Que mudanças concretas podem ser verificadas no funcionamento da DEPM depois da criação do Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis?
Anexo 2
Roteiro de Entrevistas – Funcionárias da DEPM/Aracaju
1. Como foi a sua formação para agente de polícia?
2. Como você chegou a DEPM?
3. Que tipo de cursos específicos você fez para trabalhar na DEPM?
4. Como você vê o seu trabalho? (descrever a rotina, dificuldades, avanços. Explorar mudanças das práticas institucionais depois da criação do Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis)
5. Como vê o trabalho da CDH/UFS na DEPM (Grupos de Discussão)? (explorar contribuições para mudanças das práticas, para a formação policial, relação com a população atendida, temáticas trabalhadas, reflexões produzidas, etc).
6. Como vê o trabalho do MUSA? (Capacitação) (explorar contribuições para mudanças das práticas, para a formação policial, relação com a população atendida, temáticas trabalhadas, reflexões produzidas,etc).
Anexo 3 QUESTIONÁRIO - POLICIAIS E TÉCNICAS/OS DAS DEPMS
1. DADOS DE IDENTIFICAÇÃO Sexo ( ) feminino ( ) masculino IdadeEstado Civil ( ) solteiro/a
( ) casado/a ( ) divorciado/a
( ) separado/a ( ) viúvo/a ( ) outros
Escolaridade ( ) 1° grau completo ( ) 1º grau incompleto ( ) 2º grau completo ( ) 2º grau incompleto ( ) nível superior completo / curso: ______________________ ( ) nível superior incompleto / curso: _____________________ ( ) pós-graduação / curso: _____________________________
ReligiãoBairro de residência Cargo/ Função Tempo de serviço na polícia Tempo de serviço na DEPM Outros setores da polícia em que trabalhou Renda por faixa de salário mínimo
( ) 1 a 3 SM ( ) acima de 3 a 5 SM ( ) acima de 5 a 10 SM
( ) acima de 10 a 15 SM ( ) acima de 15 a 20 SM ( ) acima de 20 SM
Via de acesso à polícia ( ) por concurso ( ) por contratação ( ) transferência/ cessão de outro órgão / qual? ________________ ( ) outro / especifique _____________________________________
2. FORMAÇÃO POLICIAL / PROFISSIONAL 2.1 – Enumere a 1ª coluna de acordo com a 2ª Cursos de capacitação/ treinamento realizados Instituições promotoras ( ) direito constitucional (1) Secretaria de Segurança Pública ( ) direito penal (2) Secretaria da Justiça ( ) direito criminal (3) ACADEPOL/ outras instituições policias ( ) direitos humanos (4) MUSA / UFBA ( ) relações humanas (5) UFS - Universidade Federal de Sergipe ( ) gênero e violência (6) UNIT - Universidade Tiradentes ( ) ética (8) SESC/SENAC/SESI ( ) investigação criminal (9) outros ( ) legislação específica de proteção à mulher ( ) legislação de proteção a grupos vulneráveis ( ) balística ( ) defesa pessoal ( ) técnicas de atendimento ao público ( ) português ( ) arquivismo ( ) informática
2.2 – Em que esses cursos/capacitação/ treinamentos contribuíram para a sua prática policial/ profissional?
OBS – Se você participou da “Capacitação para Policiais que atendem Mulheres em Situação de Violência”, promovida pelo MUSA/UFBA, em 2002, especifique essa contribuição:
2. 3 - Você participa dos cursos: ( ) por interesse profissional ( ) titulação/ ascensão profissional ( ) por interesse pessoal ( ) gratificação salarial ( ) por obrigação ( ) por outros motivos. Especifique: 2.4 – Enumere as temáticas que você considera relevantes para um curso de formação policial/profissional, por ordem de importância (de 1 a 13) ( ) aspectos jurídicos: direito constitucional, criminal,
penal( ) missão das DEPMs ( ) mediação de conflitos
( ) direitos humanos ( ) legislação de proteção a grupos vulneráveis
( ) valorização profissional e condições de trabalho
( ) relações humanas ( ) plano nacional de segurança pública ( ) gênero e legislação específica de proteção à
mulher( ) relação polícia e sociedade
( ) plano nacional de direitos humanos ( ) políticas públicas de proteção à mulher
( ) violência doméstica / violência sexual
3. CENTRO DE ATENDIMENTO A GRUPOS VULNERÁVEIS (só para DEPM de Aracaju)
3.1 A que você atribui a mudança de formato da DEPM para Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis? (pode haver múltiplas alternativas) ( ) política nacional de atendimento a grupos vulneráveis ( ) tentativa de se fazer um trabalho diferenciado no Estado ( ) influência dos cursos realizados ( ) ampliação e melhoria do atendimento à população ( ) promover maior eficácia na resolução dos casos atendidos ( ) outras. Especificar ____________________________________________________ 3.2 – Você considera a mudança: ( ) ótima ( ) muito boa ( ) boa
( ) razoável ( ) péssima ( ) indiferente
3.3 – Na sua opinião, que impactos essa mudança trouxe para: a população
as/os policiais lotados na DEPM
3.4 - Que requisitos você acha necessário ao policial no desempenho da sua função na DEPM?
Anexo 4
Roteiro de Entrevistas
Membros da Comissão de Direitos Humanos da UFS
1. Como você avalia a experiência de formação policial, através dos Grupos de Discussão e Reflexão das Práticas Institucionais, desenvolvida pela CDH/UFS com as policias do Estado de Sergipe?
2. Como você avalia a experiência desenvolvida na Delegacia da Mulher?
3. Como você avalia as repercussões dessa experiência na relação da polícia com a sociedade?
4. Qual a contribuição dessas experiências para a formação policial?
5. Qual o impacto dessas experiências sobre as práticas cotidianas dos policiais e sobre a corporação?
Anexo 5
Roteiro de Entrevistas – MUSA/ISC/UFBA
1) O que é o MUSA? (histórico, objetivos, programas, etc)
2) Qual é a experiência do MUSA em formação de gênero? (público,
metodologia, conteúdos trabalhados, etc)
3) Qual e como é/ foi a experiência do MUSA na capacitação de
policiais da Delegadas da Mulher? (Estados atingidos, número de
policiais, programas dos cursos, etc)
4) Como foi a experiência em Sergipe?
5) Como o MUSA avalia a experiência (aspectos qualitativos e
quantitativos)?
6) Como os policiais avaliaram o trabalho?
(ver possibilidade de consultar relatórios e banco dados,
questionários, etc)
7) Houve algum contato posterior com os grupos trabalhados? Que
repercussões a capacitação teve para melhoria do atendimento à
população?