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Clássicos & Comentadores ARISTÓTELES E A POLÍTICA FRANCIS WOLFF tradução de Thereza Christina Ferreira Stummer e Lygia Araujo Watanabe Cet ollvrage. publié dons le cudre du programme de participa/ia,n à Ia I'IIh1icofioll, bénéficie du sontien du Minisrere [rançais de,... Affairf!.~ Etronger,l''''' de l'Ambussade dr France 011 Brésil, de Ia Moison [mnçníse de RIO de lnnriro 1:'1dll Consutot Genéral de Frunce li Siio Pauto. Este livro, publicado no âmbito do prngruma de participação à publicação, contou com o apoio do Ministério Irunçês das Relações Exteriores, du Embaixada da França no Brasil, da Maison Irunçaisc do Rio de Janeiro C do Cousuludo Geral da França em São Paulo. CONSULADO GERAL DA FRANÇA! SP MINISTÉRIO DA CULTURA discurso editorial

Francis Wolf - Da Política Até a Política de Aristóteles

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Francis Wolf - Da Política Até a Política de Aristóteles

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  • Clssicos & Comentadores

    ARISTTELES E A POLTICA

    FRANCIS WOLFF

    traduo deThereza Christina Ferreira Stummer

    e LygiaAraujo Watanabe

    Cet ollvrage. publi dons le cudre du programme de participa/ia,n IaI'IIh1icofioll, bnficie du sontien du Minisrere [ranais de,...Affairf!.~ Etronger,l'''''de l'Ambussade dr France 011 Brsil, de Ia Moison [mnnse de RIO de lnnriro

    1:'1dll Consutot Genral de Frunce li Siio Pauto.

    Este livro, publicado no mbito do prngruma de participao publicao,contou com o apoio do Ministrio Iruns das Relaes Exteriores, duEmbaixada da Frana no Brasil, da Maison Irunaisc do Rio de Janeiro

    C do Cousuludo Geral da Frana em So Paulo.

    CONSULADO GERALDA FRANA! SP

    MINISTRIODA CULTURA discurso editorial

  • Este pequeno livro no tem outra pretenso alm de prepararou acompanhar a leitura da Poltica de Aristreles. O Captulo 1 uma apresentao geral desta obra, a partir da histria - ou antes, dapr-hisrria - do pensamento poltico grego, seguida de um resumoanaltico destinado a facilitar seu acesso. O Captulo 2 prope umcomentrio dos dois primeiros captulos da Poltica, ressaltando seusobjetivos prprios e ressituando-os no quadro mais geral da filosofiade Aristreles: segue-se um breve apndice sobre a teoria da escravi-do, exposta nos captulos 4 a 7 do mesmo livro. O Captulo 3 con-sagrado anlise do Livro lI!: o livro fundamental, do ponto devista poltico, porque ali Arisrteles classifica e compara os diferentesregimes. Veremos que da se depreende, em particular, uma defesa sin-gular do regime "democrtico".

    A escolha das passagens em que nos concentramos evidente-mente no esgota o interesse da Poltica: o socilogo ou o historiador,at mesmo o "politlogo", teriam sem dvida privilegiado outros li-vros. Escolhemos abordar a Poltica de Aristreles por onde ela maismarcou a histria da filosofia poltica e por onde ela pode continuar aaliment-Ia.

    Depreende-se uma certa lio geral: a de que s h polticadeterminada por aqueles aos quais ela destinada.

    As referncias Poltica so dadas, conforme o uso, da seguintemaneira. O nmero em algarismos romanos indica o livro; seguidode um nmero em algarismos arbicos, indicando o captulo, e de-pois do nmero da pgina da edio Bekker (a edio moderna dotexto de Arisrreles a cuja paginao se referem todas as edies etradues disponveis), em seguida, da letra (a ou b), indicando acoluna, e, finalmente, da linha, dessa mesma edio. A traduo queutilizamos a de P. Pellegrin, Aristote, Les Poliriques, Coleo GF,Flammarion, Paris, 1990. As referncias aos outros textos de Arisr-reles so dadas segundo essa mesma conveno, utilizando-se as se-guintes abreviaes: Fs. para Fsica (edio francesa: Physique, trad.ele H. Carreron, ed, Les Belles Lettres): Met., para a Metafisica; t.Nir., para a tica a Nicmaco (Mtaphysique e Etbique Nicomaque,nmbns na edio francesa traduzi das por J. Tricot, Vrin).

    Da poltica ata Poltica de Aristteles

    J se conseguiu dizer que a filosofia fala grego. possvel. Em todo caso, certo que a poltica, sim, falagrego. No se pode, com efeito, falar acerca de polticasem a lngua grega: "tirania", "monarquia", "oligarquia","aristocracia", "plutocracia", "democracia" ... todo o nos-so vocabulrio poltico saiu dela. E, em primeiro lugar, aprpria palavra poltica. A palavra tanto quanto a coisa.A poltica, de fato, a prpria idia de poltica, o produ-to de um momento singular em que se cruzaram, em nossahistria, dois frutos da histria grega: um novo modo depensar surgido por volta do sculo VI antes de Cristo,fundado no livre exame e na interrogao sobre o funda-mento de todas as coisas, encontrou um modo livre e novode viver juntos, surgido no sculo VIII antes de Cristo,chamado polis. Produto desse cruzamento, a poltica aprtica da polis que se tornou consciente de si prpria,ou, inversamente, a investigao sistemtica aplicada polis. , numa palavra, o livre pensamento de uma vidalivre. "Poltica" , com efeito, uma dessas palavras curio-sas (como a palavra "histria") que designam ao mesmotempo uma "cincia" e o seu objeto: entende-se efetiva-mente por ela um conjunto de prticas s quais os ho-mens se dedicam para coexistir, e tambm o estudo obje-tivo dessas mesmas prticas. (Da mesma forma, a histria

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    ao mesmo tempo o devi r das sociedades e o seu estudo.)Ora, de certa maneira, um no anda sem o outro: enquan-to o poltico no se deu ao olhar dos homens como um.objeto que se possa estudar e interrogar por ele prprio,os homens "no fizeram" poltica. Sem dvida, antes doaparecimento da poltica, j existiam sociedades, e os ho-mens se acomodavam a elas, bem ou mal, para viveremjuntos. Mas, enquanto no pensaram aquilo que viviamcomo algo que pertencia a um domnio que chamamosde poltico, isto , como algo que dependia deles, eles nopoderiam, especificamente falando, fazer poltica (e a re-cproca, a[ortiori, verdadeira): submetiam-se a um po-der como a um destino, contra o qual nada se pode fazer,uma vez que no existe enquanto tal, to prximo estdaquilo que se ;um poder, frgil ou todo-poderoso, massempre vindo do alto, no qual mal se distinguem a auto-ridade do chefe, a irrecusabilidade da tradio e o temoraos deuses. E assim como um povo sem memria histri-ca no tem verdadeiramente histria, uma vez que nopode agir sobre ela, da mesma forma um povo sem a cons-cincia de um domnio prprio das coisas da cidade nopode agir politicamente, uma vez que no sabe que a po-ltica aquilo que lhe pertence. Aquilo que a prpria exis-tncia da polis permitiu, na vertente das prticas (a polti-ca que se faz), a existncia do pensamento racional opermitiu, na vertente da conscincia reflexiva (a polticaque se estuda). E esta foi desde logo descritiva e normativa:pois poder pensar a maneira pela qual se vive politicamen-t , poder distanciar-se dela para tom-Ia como objeto, j

    implesmente pensar que se poderia no viver assim (mas

    Da poltica at a Polticade Aristteles 9

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    Macednia, e as cidades tero perdido sua autonomia, osgregos, num certo sentido, j no "faro" mais poltica.Em todo caso, as grandes obras do pensamento polticogrego (entre as quais, a de Aristteles) so ainda contem-porneas da polis, a despeito de certos descompassos cro-nolgicos aos quais voltaremos adiante.

    Mas a poltica no apenas uma reflexo sobre umaforma historicamente datada ou uma singularidade etno-grfica, a cidade: ela tem um escopo universal ou, ao me-nos, geral. E os "negcios da cidade", para alm das parti-cularidades da polis, tm uma extenso bem maior do quepara ns, modernos. Com efeito, dizer "poltica', para ns, associar algumas imagens (campanhas eleitorais, lutaspartidrias, ambies pessoais) e alguns aspectos bem de-finidos da vida social: h "homens polticos" (profissio-nais) e outros que no o so, assim como h clrigos eleigos; momentos polticos e outros que o so menos; even-tos polticos e outros que absolutamente no o so, etc.Para os gregos, toda a esfera da vida pblica , num certosentido, poltica, e a esfera privada muito mais estreitado que para ns: nem a "moral", nem a religio, nem aeducao das crianas, por exemplo, esto fora do campoda poltica. No que "tudo seja poltico", isto equivaleriadizer que "nada poltico", isto , seria negada sua espe-ificidade: o "econmico", por exemplo, que para ns

    nltarnente poltico, pertence para eles esfera privada en me gesto do patrimnio (a palavra vem de oikos,

    qu si nifica "casa', propriedade). O terreno poltico per-I '11 para os gregos, ao koinon, o comum, e "abarca to-lns as atividades e prticas que devem ser partilhadas, isto

    Da poltica at a Poltica de Aristteles 11

  • A grande ciso entre homens livres e escravos distingueaqueles que tm quase todos os poderes sobre outros ho-mens. As crianas devem naturalmente obedincia aosadultos, e as mulheres aos homens, ainda que estas tenhampoder sobre a casa familiar (espao privado). Estes, os ci-dados, constituem o conjunto da comunidade chamadacidade (espao pblico). A poltica , portanto, ocupaoexclusiva daqueles que a priori j esto cheios de poderes:mais do que uma ocupao, trata-se de um privilgio, e,por isso, de uma obrigao. Mas tambm ocupao paratodos, coletivamente, e, bem ou mal, de todos, distribu-tivamente, ou ao menos daqueles que se mostrem, aosolhos de todos, os melhores entre os iguais.

    Afinal, se a prtica poltica reveste-se de um valorto elevado, porque a excelncia poltica toraliza de al-gum modo todas as outras excelncias. Em primeiro lu-gar, porque o terreno poltico recobre todas as competn-cias particulares e exige uma competncia universal: naassemblia deliberativa de uma democracia direta, comefeito, todos os cidados devem se pronunciar a respeitode todos os assuntos, pelo menos todos os assuntos deinteresse geral (ver Plato, Protgoras, 219 b-d). Alm domais, o homem poltico deve demonstrar o mais elevadograu de todas as qualidades morais: justia, piedade, sen-so de honra e de sacrifcio. Por fim, e simplesmente, ohomem completo s pode ser o cidado, porque seu graude cornpletude se manifesta pelo poder que ele tem sobreseus pares. Como Mnon indica, no dilogo Mnon, de

    I I.cmbrcmos que esto excludos da cidadania os estrangeiros, os uma maneira geral, a virtude do homem " a capacidade.s rnvos, as crianas e as mulheres. de comandar homens" (73 b); e, no Grgias, Grgias re------------- l ~ ~

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    totalmente voltado para o exterior, como o espao do te-atro se reproduz no espao da cidade. Pois o deus de pe-dra ou o ator se acham no centro de uma ordem organi-zada por eles, no ponto de convergncia de todos os pontosde vista possveis. Este o lugar ideal do heri arcaico (oguerreiro hornrico), ou, na idade clssica, do homempoltico, um e outro, no centro do crculo comum. Oorador da assemblia do povo, que "aconselha a sua cida-de", atrai todos os olhares e brilha por sua doxa, no duplosentido do ponto de vista que ele tem sobre as coisas (opi-nio) e do ponto de vista que se tem sobre ele (reputa-o). O sucesso poltico, dito de outra forma, pblico porseu domnio e publicamente sancionado, portanto onico possvel.

    A poltica , por outro lado, o nico lugar em quese decide o poder: o que define a polis que, contraria-mente tribo ou s grandes monarquias, contrariamente comunidade familiar, ali ningum possui a priori o po-der. No se trata do objeto de um "ter" reservado, mas olugar de uma luta pelo reconhecimento pblico, princi-palmente - mas no exclusivamente -, quando a polis democrtica (caso de Atenas). Reconhecimento-rivalida-de que concerne aos cidados, definidos pelos poderes quej possuem por outra parte, l onde o poder j no umobjeto de disputa, mas um atributo que se possui por na-tureza, pelo que se um homem livre, adulto e macho '.

    Da politica-at a Poltica de Aristtefes 13

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    pete, fazendo eco: o domnio poltico recobre "as mais im-portantes e as melhores coisas humanas" (451 d), e noh bem maior para o homem do que convencer os outrosem qualquer reunio de cidados (452 d). Numa civiliza-o do prestgio, toda qualidade (individual) traduzi daem superioridade (sobre os outros), e numa sociedade semmonarca (apolis), toda superioridade reconhecida deve sertraduzi da em poder. preciso inverter a idia modernasegundo a qual o pblico o privado posto em comum,ou a poltica do singular quando colocado no plural. Acidade no uma soma de indivduos, antes o indiv-duo privado que apriori pensado como "redobramentosobre si mesmo" do pblico. A poltica no passa da reali-zao de si, uma vez que o "si" relao com o outro.

    A poltica, cruzamento do "pensamento racional"e dapolis, tem finalmente um terreno to amplo, que seuslimites confundem-se com os limites do humano, e umvalor to eminente, que de certo modo engloba todos osoutros valores. Poderamos esperar ento que, do encon-tro da forma mais livre do pensamento, a filosofia (queno tem de dar satisfaes a nenhum mestre, a no ser a simesma), com a forma mais livre da vida comum, a polis(que por sua vez tambm no d. satisfaes a nenhummestre, a no ser a si mesma), nasceu a filosofia poltica,que teria sido afinal a realizao idlica de uma e da outraem sua unio.

    No foi bem assim. De fato, entre filosofia e pol-tica, tudo se passou, ao contrrio, como se tivesse havido,d sde o incio, um imenso mal-entendido. O descompassodas datas de seus apogeus respectivos o atesta: a idade do

    Da poltica at a Poltica de Aristteles 15

    ouro da polis o sculo V; a da filosofia, o sculo IV Apoltica, no sentido de vida sob o teto da polis, portanto,no coincide exatamente com a poltica, no sentido dereflexo sobre a polis: a filosofia poltica a conscinciade uma forma que se acha no crepsculo, como Hegel jindicava. Em Atenas, no sculo V, desconfia-se das espe-culaes tericas dos "filsofos" sobre a Natureza e sobreo Ser, e o primeiro filsofo da cidade, Scrates, foi con-den~do por ela morte. Tudo se passa como se, na idadeclssica da cidade, as exigncias da poltica se opusessems da filosofia. A preservao da cidade no requer outraespeculao alm dos velhos princpios de uma moralpragmtica, e, por conseguinte, probe a do "livre-pensa-dor", o filsofo: pensar demais, os deuses da cidade o pro-bem; pensar bem demais, uma ameaa para o equil-brio entre cidados (veja-se a instituio do "ostracismo");pensar diferente demais, uma ameaa para a harmoniada cidade (vejam-se os numerosos processos "antiintelec-tuais" do sculo V). Os poucos pensadores polticos dosculo, como Protgoras, so "estrangeiros" em Atenas,onde so perseguidos e indiciados por "impiedade"; comotambm o so alguns filsofos da natureza, que, a exem-plo de Anaxgoras, tentam fazer carreira em Atenas. ComScrates, num certo sentido, tudo muda, e, num outrosentido, a contradio filosofia-poltica torna-se extrema.Tudo muda, porque ele , ao mesmo tempo, cidado ate-niense e filsofo, e mesmo filsofo por excelncia, e, porexcelncia, o filsofo da cidade. Mas o divrcio filsofo-cidade atinge seu ponto mximo: no somente pela con-denao de Scrates morte, mas por sua vida, cuja no-

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    tvel originalidade, aos olhos de seus contemporneos, re-sidia justamente no fato de a poltica ter pouco espaonela. O que no o impedia, segundo Plato (Grgias), dese proclamar "o nico homem poltico verdadeiro de seutempo" (isto , o nico preocupado com a justia absolu-ta), e de se orgulhar, segundo Xenofonte (Memordueis),por formar homens de Estado. Mas a distncia entre ohomem e a cidade ainda grande demais. O que ela quer o oposto daquilo que ele lhe oferece: ela exige no umadeduo universalmente vlida, mas uma adaptao s cir-cunstncias, no uma interrogao sobre a essncia, mas osenso das oportunidades, no o enunciado de uma verdadesem concesses, mas a soma de pontos de vista mltiplos ediscordantes. A esse ttulo, os sofistas so os verdadeirospensadores polticos do sculo V, e Protgoras o verda-deiro representante da polis. Quanto ao filsofo, sua con-denao morte pela cidade acaba por consumar o di-vrcio e consigna a impossibilidade de uma "filosofiapoltica" no grande sculo da cidade.

    Inversamente, o sculo seguinte ser o da filosofia.Pois Plato far deste divrcio a sua razo de ser, e a ma-tria-prima de sua reflexo. Reabilitar Scrates e a filoso-fia, eliminar o espectro da cicuta, , em primeiro lugar,para Plato, tornar a filosofia totalmente poltica: sua obramaior, a Repblica (Politeia), abarca assim a totalidade dopensvel ("moral", "metafsica", "conhecimento", "arte")- e no apenas "os negcios da cidade" - a fim de lanaras bases de uma cidade ideal na qual os filsofos seriamrei . Mas, para Plato, tentar reconciliar a polis e a filoso-fia tambm, simetricamente, tornar a cidade to filos-

    Da poltica at a Poltica de Aristteles 17

    fica quanto possvel; a vida de Plato pontuada por suastentativas de fundar em Siracusa uma cidade conformeao ideal filosfico. Numa palavra, para Plato, a cidadedigna desse nome era filosfica, e a filosofia era inteira eprofundamente poltica; mas tambm a razo pela qualno hd filosofia poltica propriamente dita em Plato. En-tenda-se: reflexo sobre a cidade enquanto tal, engajadanas vicissitudes imprevisveis da histria.

    pois a Poltica de Aristteles que inaugura a filo-sofia poltica, justamente no momento em que apolis cls-sica est se acabando. Em que sentido?

    Primeiramente, no sentido de que, com Aristre-les, a expresso "filosofia poltica" deixa de ser tautolgicaou contraditria. Aquilo que sempre fora, em certo senti-do, at ele. Para Plato, por exemplo, no h filosofia pol-tica porque a poltica praticada no dia-a-dia da cidade no da conta do filsofo; que a filosofia se torne poltica nestesentido, que ela se ponha na medida das contingncias dacidade, 'seria algo contraditrio. Mas ao mesmo tempoporque esta poltica no verdadeiramente poltica: averdadeira cidade no seria nada mais do que a verdadei-ra filosofia; a prtica poltica real, no a caricatura que eleestima ter diante de si, dominada pelos retores e demago-gos, uma questo de perfeito conhecimento, exaustivo eeterno. Se preciso pr o filsofo frente da sociedade(Repblica, 473 c), porque ele o nico a poder atingiro ser imutvel (484 b), isto , a ser capaz de se elevar aci-ma das vicissitudes do devir (485 b). A deciso polticasbia (euboulia) , com efeito, um saber, reservado aos ra-ros indivduos suscetveis de estabelecerem para si como

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    objeto "a cidade em seu todo, tanto em sua orga~iza~interna, quanto em suas relaes com as outras Cidades(428 b-d), pois a cincia da justia necessria prticapoltica (Grgias, 459 d); "a cincia do poltico" exige comefeito que ele mantenha seus olhos fixos na idia de Beme por essa razo que ele possui a cincia suprema. Estestraos marcantes do pensamento poltico de Plato spodem ser esquematicamente levantados aqui. Mas bas-tam para mostrar que com Piaro realiza-se uma tend~n-cia da filosofia que desde sua origem dominante: atin-gir a respeito da totalidade das coisas um ponto = vistaque as abarque num saber total, imutvel e perfeito, quepossa pr fim a todas as contradies e, portanto, guia~,de uma vez por todas, as prticas humanas. Pcpoiis, e maisgeralmente as "coisas humanas", no pode constituir ummundo distinto ou autnomo em relao ao mundo docu e, mais geralmente, da natureza imutvel: uma ordemnica regula o mundo e harmoniza o conjunto das coi-sas, e o homem que est em condies de dominar peloseu saber essa unidade total a quem cabe conduzir a ci-dade, essa coisa entre as coisas. Longe de ser, neste pontode vista, um pensador "dualista", a que freqentementereduzido, enquanto pensador da unidade e da unicidadedo mundo - da natureza at o homem, do cu at a terra,da cidade at o indivduo - que Plato pe o problemada cidade. E ele resoluto ao recusar idia de autono-mia do poltico qualquer pertinncia - seja com relao matemtica, astronomia ou dialtica. Esta autonomiaconsignaria a derrota do pensamento, assim como signi-fi ou a morte do filsofo (Scrates).

    Da poltica at a Poltica de Aristteles 19

    Mas a filosofia de Aristteles permitir justamente pen-sar essa autonomia. Pois ela no subordina a prtica poltica posse de um saber imutvel, mas de qualidades particular-mente rebeldes ao conceito, a "prudncia" e a "experincia".Esta apangio daqueles que sabem no por terem aprendi-do, mas por terem vivido, pois ela no nasce da transmissodo universal, mas da repetio do particular. Ao contrrio dacincia que concerne ao que necessrio e ao que no de-pende de ns, a "prudncia" (isto , a sabedoria na ordem daao) concerne ao que contingente, e se adapta variabili-dade de indivduos e de circunstncias; desse modo, est namedida da cidade, na qual se delibera sobre aquilo que podeser diferente do que , j que isto depende de ns (ao contr-rio do movimento dos astros, que s podemos admirar, sempoder fazer nada), e na qual nos defrontamos com a histria,isto , com a sucesso de eventos particulares. Analisando osentido e o lugar desse conceito de "prudncia" na filosofiade Aristteles, P.Aubenque demonstrou o quanto ele soli-drio de toda a cosmologia do filsofo, que distingue a or-dem imutvel e necessria do "mundo celeste" ("supralunar")e a ordem contingente do mundo "terrestre" ("sublunar"). Oacaso, a temporalidade, a circunstncia no tm nela um lu-gar marginal, mas sim essencial, e, de certo modo, o maiselevado, pois so a condio de existncia da liberdade destemundo: este mundo que, na falta de ser divino, humano;demasiado humano, sem dvida, tendo em vista o ideal con-ternplarivo, mas bem humano mesmo, para que se possa agire escolher. neste mundo que a polis, a cidade real, no umsonho de cidade celeste, existe, e ela que o filsofo poderenfim estudar.

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    H, portanto, para Aristreles, uma especificidadedas "coisas humanas". E, nesta esfera, h uma autonomiada poltica, especialmente em relao tica. A "filosofiadas coisas humanas", segundo a expresso de Aristteles(t. Nic., X, 10, 1181 b 15), tem seguramente um objetouno, o humano enquanto tal, mas que pode ser focaliza-do de dois pontos de vista distintos, que so respectiva-mente adotados pelas duas obras que conhecemos com onome de tica a Nicmaco e de Poltica. A conduta dosindivduos constitui a matria-prima da tica, e a histriadas cidades com seus regimes constitui a da poltica. Deuma para outra, h mltiplos laos, com sentido duplo: apoltica continua sendo, para Aristteles - ao menos oque ele afirma no incio de sua tica -, a suprema cin-cia, da qual dependem o estudo e a efetivao do "sobera-no bem"; o homem s pode realizar sua natureza de ho-mem na e pela cidade. Inversamente, a cidade, quandodigna desse nome, tem uma finalidade altamente moral,como Arisrteles no pra de repetir na Poltica. Alm domais, a conduta individual somente poderia ser boa emgeral com o auxlio das leis da cidade, que mostram per-manentemente qual a regra e dispem de um poder co-ercitivo quando falta virtude; reciprocamente, so neces-srios muitos legisladores virtuosos para dar boas leis cidad. A tica, portanto, no independente da polti-ca. E a poltica depende da tica em seu direcionamentotanto quanto em seus meios. No entanto, uma parte es-

    4 t. Nic., X, 10, 1180 a 21. Esse Caprulo X, 10 da t. Nic. tratadas relaes to controvertidas, em Aristreles, entre a tica e a

    Da poltica at a Poltica de Aristteles 21

    sencial da tica, at mesmo a mais elevada, apoltica. Avida mais elevada, para o Sbio, , com efeito, a vida con-templativa daquele que conhece (t. Nic., X, 7-8), quedispensa qualquer participao na ao poltica; o Sbiovive s, margem da cidade, e dela espera apenas siln-cio. Inversamente, uma parte importante da poltica amoral. A "cincia poltica", com efeito, tem como obje-to, entre outros, estudar friamente as causas da grandezae da decadncia dos diferentes regimes, e pode-se utilizartal conhecimento para elaborar polticas de manutenoda ordem, ou para auxiliar qualquer poder, mesmo tir-nico, a se salvaguardar-'. Em suma, com Aristteles, a po-ltica no independente da tica, mas adquiriu sua au-tonomia: dizer "a poltica" doravante tem sentido. Com aPoltica de Aristteles, a filosofia ps-se finalmente al-tura da cidade, de seu lugar propriamente humano nomundo, e de seu lugar prprio no mundo das "coisas hu-manas". Primeiro livro de "filosofia poltica''", em que secruzam ento, pela primeira e ltima vez, estas duas rotasgregas que at ento permaneciam paralelas: a filosofia ea cidade.

    poltica. A esse respeito, podero ser lidos os artigos de P.Aubenque,"Poltica e tica em Aristteles", in Ktema, Universidade de Estras-burgo, n 5, 1980; e a resposta de P. Pellegrin, na Introduo desua edio de Les Politiques, p. 24-30. Poder ser consultada tam-bm a obra de R. Bods (cf Referncias bibliogrficas).O que objeto do final do Livro V (caps. 8 a 11). Sobre o conse-lho dado aos tiranos para se resguardarem de perturbaes e sedi-es, ver V, 11, 1313 a 34 e ss.

    6 A prpria expresso "filosofia poltica' surge em I1I, 12, 1282 b 23.

  • 22 FRANCIS \VOLFF Da poltica at a Polticade Aristteles

    Mas o que isso quer dizer? O que h para se dizersobre a cidade? Tudo depende da pergunta que se fizer, eda maneira pela qual se interroga. Eis por que, se que hmesmo uma filosofia poltica de Arisrteles, esta no redutvel a um nico projeto.

    A filosofia poltica desde logo descritiva e pres-critiva, como dissemos. Pois no se pode procurar sabercomo vivem os homens, sem previamente se ter tomadodistncia da prpria maneira de viver, para poder dessemodo objetiv-la, ou sem conceber que se poderia viverde outro modo, e buscar como viver melhor. Da polticaque se faz at aquela que se deveria fazer h uma pass~-gem necessria. Inversamente, no se pode buscar qual sepo melhor regime poltico sem ter previamente recensea-do, organizado e classificado todos os regimes possveis.No h prescrio sem descrio. Acrescentemos que, naordem das "coisas humanas", no se pode ter diante deseu objeto o distanciamento que tem um astrnomo: ,atica no puramente especulativa, visa o agir bem (Et.Nic., II, 2, 1103 b 26), como a poltica visa o bem viverjuntos. Ambas as preocupaes, descritiva e prescritiva.so portanto solidrias, e muitas vezes so difceis de sedistinguir uma da outra. So mesmo inseparveis, numafilosofia que, como a de Aristteles. identifica aquilo que um ser em sua essncia, e o bem na direo do qual ele

    tende.No obstante, inegvel que haja, em termos abso- .

    lutos, duas grandes questes de "filosofia poltica': "Comoso as coisas da cidade?" e "Como elas deveriam ser?"

    Ademais, h tambm dois grandes tipos de proce-dimentos possveis: "especulativo" e "positivo". Por umlado, pode-se buscar, como um terico, a partir das ques-tes gerais que se ponham a respeito da cidade, discerniros fundamentos da vida poltica, recuar at seu princpioideal ou absoluto, preocupando-se essencialmente com origor racional, a riqueza conceitual e a sistematicidade. Esta, alis, a imagem clssica do trabalho filosfico. Pode-setambm, e mais "positivamente", partir de realidades em-piricamente constatveis (esta ou aquela cidade, este ouaquele regime, este ou aquele acontecimento histrico), etentar pensar suas relaes, evitando qualquer julgamen-to ou hiptese que ultrapasse os dados da prtica real. Ora,a filosofia poltica de Aristteles ora "especulativa", ora"positiva', do mesmo modo que ela est animada por umadupla preocupao, descritiva e prescritiva. E, uma vezque podemos combinar as duas intenes e os dois pro-cedimentos, so quatro osprojetos de filosofia poltica quepodem ser discernidos na Poltica de Aristteles: pois pode-mos nos interrogar sobre os fundamentos da poltica comfinalidades descritiyas (perguntar-nos, por exemplo, o que a cidade em sua essncia); ou prescritivas (perguntar-nos, por exemplo, o que , em termos absolutos, a cidadeideal); podemos tambm nos ater positivamente aos da-dos da experincia poltica com finalidades descritivas(perguntar-nos, por exemplo, quais so os tipos de regi-mes polticos), ou prescritivas (perguntar-nos, por exem-plo, o que preciso ser feito para preservar contra a runacada regime existente).

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  • 24 FRANCIS WOLFF Da poltica at a Poltica de Aristteles 25

    Por conseguinte, proporemos o quadro abaixo, noqual esto classificadas as tendncias dominantes dos oitolivros da Poltica de Aristteles:

    O quadro sudeste corresponde aos estudos mais "maquia-vlicos" de Aristteles: aconselhar o prncipe, qualquerque seja ele; estabelecer e preservar os regimes, quais-quer que sejam eles.

    O quadro nordeste corresponde aos estudos mais "idea-listas" da Poltica: reflexo focalizada na busca da cida-de perfeita, ou do melhor regime, construo terica fre-qentemente feita a priori. Com freqncia surge umainvestigao, uma preocupao, como que um tom queevocam os do Plato da Repblica.

    INTENO INTENODESCRITIVA PRESCRITIVA

    PROCEDIMENTOESPECULATIVO LIVROS I e !lI LIVROS n. VII e VIII

    PROCEDIMENTOPOSITIVO LIVRO IV LIVROS Ve VI

    Desse modo, os oito livros aparecem em quatro quadrossituados em duas linhas: O conjunto dos livros reagrupados na linha superiorconstitui uma teoria dos fundamentos da poltica.

    A linha inferior reagrupa os livros que constituem o quese denomina geralmente como "bloco realista".

    O quadro noroeste corresponde aos livros de "filosofiapoltica" no sentido estrito do termo. Constituem a me-lhor introduo poltica aristotlica e, at mais gene-ricamente, aos problemas da filosofia poltica. Um de-les (o Livro I) trata dos diferentes tipos de vida social, ooutro (Livro III) trata dos diferentes tipos de regimespolticos. principalmente ao contedo desses livrosque consagraremos o restante destas pginas.

    No quadro sudoeste, no cruzamento de um direciona-mente descritivo e de um mtodo positivo, acha-se oLivro IV, que reagrupa estudos que chamaramos, emtermos modernos, de sociolgicos.

    V-se ento que a Poltica um conjunto de estu-dos variados nos quais os gneros se misturam, em quemuitas disciplinas (filosofia ou "cincias polticas", socio-logia ou histria, economia ou antropologia social) po-dem encontrar suas origens, e nas quais podero muitobem ter-se inspirado Montesquieu ou Rousseau, Marx ouMaquiavel, M. Weber ou H. Arendt. Os historiadores dopensamento grego procuraram com freqncia dar contadessa diversidade pelo estilo das obras de Aristteles quechegaram at ns (sabe-se que no so tratados destina-dos publicao, mas notas de aulas, mais ou menosredigidas e sem dvida retomadas em momentos diferen-tes do ensinamento de Aristteles no Liceu) e por umaevoluo do prprio pensamento de Aristteles: uma dastendncias dominantes da crtica do sculo XX, aps osinfluentes trabalhos de W Jaeger. A reunio desses livros,na ordem que conhecemos hoje, data provavelmente daedio tardia do Corpus aristorlico trs sculos aps suamorte, e com isso era tentador para os eruditos propor

  • 26 FRANClS \VOLFF Da poltica at a Poltica de Aristteles 27

    reorganizaes dessa ordem tradicional, de acordo com oque cada um deles estimasse ser a ordem cronolgica. Esseprocedimento esteve por muito tempo na moda, mas seusresultados foram logo contestados; hoje, a incerteza delesacabou por empanar a f no outro. Contentamo-nos emconstatar a diversidade e o estilhaamento "da" Poltica deAristteles. A "classificao" que ns mesmos acabamosde propor no tem qualquer outro objetivo, para alm dademasiado simples oposio entre "realismo" e "idealis-mo", do que localizar as tendncias, isto , as tenses, destelivro, e at mesmo de qualquer-escrito filosfico sobre apoltica.

    preciso, no entanto, completar esta tentativa derecorte da Poltica em quatro grandes orientaes poss-veis, por meio de um resumo analtico de seu contedo,que dar uma idia melhor de sua variedade.

    lares importantes pontuam a seqncia do livro, notada-mente a desorientante defesa da escravido (caps. 4 a 7),ou as famosas anlises de "economia poltica" dos caps. 8a 11, que sero retomadas por Marx no Livro I de O capi--tal, reconhecendo sua dvida para com "o grande pensa-dor que foi o primeiro a analisar a forma valor, bem comotantas outras formas, seja de pensamento, seja de so-ciedade, seja da natureza". Eis o plano geral do livro:

    A) A cidade, a melhor das comunidades humanas(caps, 1-2)

    B) A famlia (caps. 3-13)1. As relaes de poder que constituem a fam-

    lia (Cap. 3)2. A escravido (caps, 4-7)3. A gesto familiar ("economia") (caps. 8-11)4. As outras relaes familiares (caps, 12-13)

    ~. ~\y /~L 11 E J ,. J l'T, . . ~ v"'''' ,IVturo : stuao crittco aas me nores constttutoes ,p C)..q1

    - Y ?,/Este livro somente se liga ao precedente por algu- y

    mas linhas finais do Livro I (1260 b 20-4), que talvez te-' \nham sido acrescentadas pelos editores antigos, preocu-pados em dar a impresso de continuidade entre dois livrosto opostos em esprito como em contedo. Desta vez,Aristteles concentra suas anlises na melhor maneira deviver politicamente, isto , sobre a melhor politeia, a me-lhor "constituio". Neste livro, contenta-se com umaanlise crtica de constituies existentes, aquelas que exis-tem em teoria nos projetos dos grandes reformadores po-

    Livro 1:A cidade e a famlia?

    Qualquer que seja a data de sua composio, este\ ~ livro, situado em primeiro lugar em nossas edies, est.J~'~.4,0 "" devido l~gar, p~i.s discerne o fundame~to ~ a es-

    d C' fV)Jl sencia de toda Vida poltica, recolocando-a no mterior de}i outras formas, mais elementares, de vida social. Os doisyl~ primeiros captulos, que so essenciais, sero analisados

    em nosso prximo captulo. Entretanto, estudos particu-

    7 Propomos estes ttulos de captulos e de livros para facilitar sualeitura. Evidentemente, no so de Aristteles.

  • 28 FRANCIS WOLFF

    Iticos, na primeira fila dos quais est Plato8, e aquelasque esto efetivamente em vigor nas cidades reputadas co-mo as mais bem governadas. Mas existem, aqui e ali, es-tudos particulares, bem como outras tantas inseres quemerecem nossa ateno. Por exemplo, a passagem do Capo8 (1268 b 25-1269 a 28), to estimulante, e em certosaspectos to moderna, em que Aristteles pergunta-se se "melhor mudar as leis, quando se v - ou quando seacredita ver - um meio de melhor-Ias", ou se "prefer-vel deix-Ias como so, ainda que pelo fato de que soI ."9eIs .Eis o plano geral do livro:

    A) As constituies ideais em teoria (caps. 1-8)1. A da Repblica de Plato (caps. 1-5)2. A das Leis de Plato (Cap. 6)3. A de Falias (Cap. 7)4. A de Hipdamo (Cap. 8)

    8 Que seja lembrado o fato de que a obra principal de Plato, quetraduzimos por Repblica, em grego se denomina Politeia, e quesua ltima obra, As leis, retoma sobre novas bases seu projeto deconstituio ideal.

    9 Esta passagem foi analisada por J. de Romilly, La loi dans Ia pensegrecque, Les Belles Lemes, Paris, 1971; p. 220-5, e principalmen-te por J. Brunschwig, respondendo ao texto precedente, em "Domovimento e da imobilidade da lei", artigo publicado na RevueInternationale de Philosophie (La mthodologie d'Aristoce, n 133-4, 1980) e do qual tomamos emprestada a formulao do problema.

    Da poltica at a Poltica de Aristteles 29

    B) As constituies reais reputadas como as melhores(caps.9-12)1. Esparta (Cap. 9)2. Creta (Cap. 10)3. Cartago (Cap. 11)4. Alguns grandes legisladores (Cap. 12)

    Livro lIJA cidade, o cidadoe os diftrentes regimespolticos possveis I

    Dedicaremos nosso Captulo 3 anlise detalhada ,deste Livro lU. Eis o seu plano de conjunto:

    A) Questes prvias ao exame dos regimes (caps. 1-5) y' _'(,;{, , ,,;"-\J v

    1. O que um cidado? (caps. 1 e 2) (,.. ,2. O ~ue a cid~~e? (Cap. 3) bY'~

  • Com o Livro IV, entramos naquilo que tradicio-nalmente chamado de "bloco realista" (livros IV- V-VI)da Poltica de Aristreles, em que predomina a obstinada

    ~ -- advertncia quanto diversidade dos fatos. Aqui o bilo-r

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    o prncipe e para os Discursos sobre a pri:nei-:a dcada deTito Lvio. "Com freqncia aparentando mdlferena paracom a natureza do regime cuja salvaguarda se trata de as-segurar, Aristteles multiplica os conselhos.d:stinados aosdirigentes, para se protegerem contra. sedies e revolu-es, na segunda parte deste livro. Srdido cI~lsmo de con-selheiro mercenrio? Conservantismo pascallano de quem,por duvidar que se possa fortalecer a justia, a t~rna for-osa, a fim de que haja paz, "que o soberano bem (Pascal,Penses,Art. V, Laf. 81, Br. 299)? Nem um nem o outro.O tom diferente: o tom do naturalista que calmamen-te considera com olhos tambm fascinados todas as cons-tituies que pde coletar. Tendo longame~te observadoo modo pelo qual os regimes e os seres VIVOS nasc~m emorrem, pode tirar dessa experincia uma sabedona deveterinrio que no se preocupa mais em saber se trata decuidar de um sapo, de uma gazela, de uma serpente, ou

    de um cavalo.

    A) Causas gerais das sedies (caps. 1-4)

    B) Causas das sedies de acordo com o regime e a ma-neira de se resguardar contra elas (caps. 5-12)1. Como morrem as democracias (Cap. 5)2. as oligarquias (Cap. 6)3. 11 11 as aristocracias (Cap. 7)4. Como preservar os diferentes regimes (caps. ~-9)5. Como morrem as monarquias (realeza e tira-

    nia) e como preserv-Ias (caps. 10-11)6. Exame crtico da concepo platnica das re-

    volues (Cap. 12)

    Da poltica at a Poltica de Aristteles 33o);

    'rY'1 . c~'' ,Livro VI- Como estabelecer os diferentes regimes \

    Este livro, que parece complementar mais as anli-ses do Livro IV do que as do Livro V, supe, no entanto,que o estudo do livro precedente, sobre as causas da mor-te dos regimes, tenha sido feito, uma vez que agora se pre-ocupa em como fund-Ias da melhor maneira. Aqui, odestinatrio dessas pginas ser menos o dirigente ou ohomem de Estado do que o "legislador", isto , o funda-dor da cidade, encarregado de lhe conferir as instituiesiniciais mais seguras.

    Introduo: Generalidades sobre a variedade de consti-tuies e as constituies mistas (Cap. 1)

    A) As democracias: o que so elas (caps. 2-4) e como esta-belec-Ias (Cap. 5)

    B) As oligarquias e como estabelec-Ias (caps. 6-7)

    C) As magistraturas (Cap. 8)

    Livro VII: A cidade "ideal"

    Os livros VII e VIII, que formam um todo, geral-mente considerado como a parte mais antiga da Poltica,supem uma funo do discurso poltico que oposta dos trs livros precedentes, mas que comum a numerososautores da Antiguidade: a descrio da cidade "ideal". Vere-mos durante a leitura desse livro que no se trata de uma"utopia', se entendermos por isso um pas imaginrio emque tudo existe para o melhor, mas, antes, do modelo deuma cidade possvel para um "legislador" empreendedor.

  • 34 FRA eIS WOLFF

    A) A vida melhor (caps. 1-3)

    B) Descrio da melhor cidade (caps. 4-7)1. Densidade demo grfica (Cap. 4)2. Extenso territorial (Cap. 5)3. Acesso ao mar (Cap. 6)4. Povoamento e nacionalidade (Cap. 7)

    C) Organizao da melhor cidade (caps. 8 a 17)1. As classes sociais e suas funes (caps, 8-10)2. Urbanismo (caps, 11-12)3. Educao (caps. 13 a 15)4. Controle dos casamentos, nascimentos e da pri-

    meira idade (caps. 16-17)

    A felicidade de se viver juntoAnlise dos dois primeiros captulos da Poltica

    o PRIMEIRO CAPTULO

    Tese geral

    Abramos agora a Poltica.Primeiro livro, primeira frase ...

    Os captulos 1 e 2 da Poltica de Aristteles estabe-lecem os fundamentos de toda sua filosofia poltica. Cons-tituem um todo, e este todo j est de algum modo contidona primeira frase: esta esboa um raciocnio cujos suportese conseqncias sero desenvolvidos no conjunto dos doiscaptulos, e, alm disso, anuncia a sua concluso, que atese dominante da Poltica. Ei-la: "A cidade tem por fina-lidade o soberano bem".

    Esta concluso fundamenta-se em trs premissas:

    1. "A cidade uma (um certo tipo de) comunida-de" (1252 a l).

    2. "Toda comunidade constituda em vista de umcerto bem" (1252 a 2).

    3. "De todas as comunidades, a cidade a mais so-berana e aquela que inclui todas as outras" (1252a3-5).

    Disso se depreende facilmente que o bem prpriovisado por essa comunidade soberana o bem soberano.

    Livro VIII: A educao na cidade ideal

    ,/I Este livro a seqncia do. tratado sobre a educa-7\. o iniciado no Captulo 13 do livro pr~cedente. Como. ,/;9- observa J. Aubonner, "compe-se essencialmente de ""r" postas dadas s trs questes colocadas no final do L~vro

    VII ... , a saber: 1) A educao das crianas deve ser objetode uma regulamentao?, 2) Essa educao deve ser p-

    de ?"blica ou privada?, 3) Sob que forma eve ser rei ta.

    A) A educao em geral (caps. 1 a 3)

    B) A ginstica (Cap. 4)

    C) A msica (caps. 5 a 7)