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Fronteiras da Tradição - Olavo de Carvalho_0002

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IRÍllITEIRASIIA

TRADICAÍ|

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FRONTEIRAS DATRADIÇÃO

OLAVO DE CARVALHO

coleção elxo

ffi novn sTELLÍt

Crpo: Carlos Roberto Zibel Costa

Revisão: Rogério Carlos castaldo de Oliveira

Conposição: Cilberto Francisco de LiúaArte Final: Dorâ Pratt e Bduardo coúes

Índice

Prefác io

l. Fronteirâs da Tradição

2. A tradição, as ciências tradicionais

3- seitas e teligiães

4- o valor do iotelecto

5. À decadêocúe o fiú, segundo âs doutritrashindus

ó- coÊsiderações

7. xoralidade ser Deus?

I{ota§

Il! Edição r986

1

9

t7

3l

43

CopyriAht by Olavo d€ Carvalho

Coleção BixoOrg- Tom Cenz

llova Stella Editorial Ltda.Av. Pêülista,2448são Paulo SP Ol3lOTeI:881-5771

49

55

71

85

PRAÊÁCrO

Com exceção do ârtigo rrMoralidsde sem Deus?rr,publicado no Jortral da Târde, em 27 de fevereiro de1982, os trebâlhos reunidos neste volume foram todosescritos em 1985, e tôm todos â mesma finêIidade queele: ajudar o leitor a disringuir entre os ensina-mentos tradicionais t isto é, provenientes dâs Sran-des religiões reveladas e ortodoxas) e as suas fa1-s i ficaçõe s contêmporâneas.

o título explica-se assim pelo nosso intuito dedemarcar, de estabelecer um muro divisório entre oque é a Tradição, e o q"e é, de outro lado, o caos eas "trevas exteriores".

De modo geral, essa distinção é simples. Todosos estudiosos de religiôes comparâdâs do mundo, comquase oenhuma exceção, utilizam o termo "Tradição"como sinôniÍno de sâEâthana Dhâma, de Lei Pereúis'de Sophia Perennis, de Al-Eiknât el-illahiys -- Paradesignar o número de princípios mecaÍÍsicos que é

comuú a todas as grándes religiões do mundo, bem

como a transmissão ininterrupta desses princÍpiospor meio dos ritos, normas, leis e hierarquias, ten-porais e espirituâis, dessas nesmas religiões. Doponto de vista prático, o crirério de reconhecimentoá igualmente simples: considera-se "tradicional",em principio e como regra gerâI, toda doutrinâ ouprática que seja ãceita como ortodoxe e revelada porquâ1quer dessas religiões -- e, inversanente, consi-dêra-se "não-tÍadiciona1", ou, em certos casos ex-tremos, "antitradicional", a qualquer ensinanento ouprãtica q"e não seja ortodoxa por nenhuma delas.

Como corolário dessa definiçào, Podemos conPre-endêr que. de um ládo, a mistura ou tusão de dourri-na" e-p.áti."" de várias reLigiões num amá[gama ae

pretensões 'runiversalistasi' não é ortodoxo paranenhuma delâs, ê portanto só pode ser dito "tradi-cionâl" no mpsno sentido em que umâ (aÍicarurá. párásêr câricatura, deve ter alguma longínqua sêmelhançacom a reãlidade. o respeito à forna exterior e àintegridade de cada ortodoxia é uma exigência sinequa non da verdâdeira universalidadê tradicionâ1.Por outro lado, a "prova dos noverr de quâlquerprincípio universal e autênticamente tradicional ájustanente a sua possibilidade de ser transposto nostermos, moldes, parâmetros e símbolos de todas e decada uma das grandes religiões, sen ferir a ortodo-xia de nenhuúa e ner Duito nenos as leis da lógica.E esta êxigência --- que constitui a pedra-de-toquepara distinguir o joio do trigo -- é tão difícil erara de atender, que se identifica mesmo àquilo quena tradição cristã se denomina o "dom das 1ínguas",ou a capacidade dê falâr a cada um segundo a lingua-gen que the é própria, o que evidentenente está nosaütÍpodas de uÍn sarapatel "universalista" e demagó-Sico ao gosto dos psêudo gurus en geraL

O terno, portanto, evidenteínentê não designa,nen pode designar, nenhuma organização, sociedádêsecretaJ escola iniciática ou seita em pãrticular,mas, justamente ao contrário, aquilo que é o maisi1iÍnitado e universaL que se possa conceber.

De quâlquer modo, se á distinçào em si mesma éráciI de estabelecer, muitas pessoas parpceú encon-trár dificuldade em aplicá-la aos muitos casos con-cretos e parciculares que vão surgindo, neste cadavez ÍÍãis colorido supermercado da pseudo-espiritua-lidade contenporânea, motivo pelo qual podem cair emerros trágicos, mesmo estando informadas do que sejae do que não seja, en princípio, Tradição.

São PauIo, fevereiro de 1986

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I

Quer rrêstá" tra Tradição

Para que não sê confunda a Tradigão com qualquertipo de I'organização", 'rescolarr, "corrente de opi-nião" ou coisa assim, nen, poÍ outro lado, se inagi-ne que ela sejâ apenas um vago "espíritou ou "esti-Io", é preciso fazer desde Iogo algumas observações:

A Lei exotérica é o "fimite exteriorl da Tradi-ção. Quem ten unâ retigião e reconhece os seus man-àamentos, cumprindo-os seja ao nível do "mínirno Ie-gaIÍ, seja acima, conforme suas eapacidades, já es-tá na Tradição. Quen não tem uma religião, quem nãoestá submetido voluntariamente a uma Lei revelada,não está em Tradição nenhuma, ainda que álegue Per-teocer a tal ou qual "organizaçãorr e ainda que talorganização se al irme até mesmo, com denÊnc iâl Pre-tensào, "o Dirptório Central do Cosmos".

PoÍ outro rado, é necessário distioguir entre oconceito amplo de rrTradição" e o conceito mais res-rrito de "viá espirituat". Assir como u, país nào seesgota na linha.dâs suas fronteiras exteriores, mâstem uÍn território interior, por sua vez dividido porfronteiras inteÍras êm regiões, províncias, cida-

I

Eronteirâs da tradição*

*Tóp ic os de uma conferância pronunciada eú 2 dede 1985 na Editora AstrocieÍtia, do Rio de

9

Olâvo de Carvalho

des, etc. , igualmênte a Tradição, dentro dâs suasfronteiras, tem muitos territórios distintos, corn

fÍonteiras ora mais, ora nenos clarámente delimita-das -- conforme a Tradição de que se trâte --, e quevão desde as regiôes áui" .*terior"s até as maisinteriores. A região nais exterior é o cumprinentopuro e sinplês àa n".*u social ditada pela Lei (oquê inclui a execução pelo menos dos gestos exterio-res que compõem os ritos obrigátórios); a náis inte-rior é a realização -- teórica e efetiva -- do sen-tido último e universal dessá Lei. a qual patenrPia,átravés do homem que aringe essá realização, suaidentidade com a constituição mesrna do real e com aNormâ que estatui e rege o Cosnos. (Claro que pes-soas que não atingiran a pleoa realização esPirituáIpodem -- e devem -- possuir algun vislumbre dessaidentidâde entie a Lei revelada e a estruturã doreal, e também é claro que a ausência de quâlquerPre§sentinento nessê sentido seriá una marca deprofunda irreligiosidade; nas, ântes de Percorreruma viâ espiriLual, ninguéÍn Eem essá conscienciaexceto em modo irteórico'' e "virtual".)

Para o honem primitivo, que desconhecia as limi-ráções que o processo dê individuaç;o veio a imPorsobre á inteligência hunana nás geráções subsequPn-tes, não havia necessidade de uma Lei revelada e

escrita, Porque eles tinham a compreensão iÍnediata e

intuitiva da Lei nstural, que é por si rnesma a pri-neira das revelações, e da quál as Leis r€veladasposteriores nào são, po. assi. aizer. senão versõessimplificadas. o "limite êxterior" da Tradição coin-cidia então con os limites dâ natuÍeza, ou dito deourro modo, com os limites intrínsecos da possibili-dade huíâna em geral.

À progressiva degradação da intetigância humana,criando hiatos e dissonâncias enrre a mente subjeti-va e a verdade objêtiva, criou a necessidãde de com-

Pensaçôes períodicas, constituídas pelas sucessivâsLeis reveladâs. Estes fixavam limites exteriores,mais restritos que os da simples lei oâtural, e poristo nesmo nais fáceis de apreender e cumprir. O

cumprimento destâs leis favorecia o homem de duâs.r.i;.r" , pr ime i ro. que e tas cons r i tu íâD um resumo

'e por isto símbolo, dss Leis nâturáis, e

assim sua obediéncie e estudo podia restaurarr ao

Longo do teÍnpo, a intuição originária dâs leis natu-rai; (que por suâ vez, sendo um simbolo das qualida-des divinas, levavam o homem ao conhêcimento -- ou

melhor: recordâçào -- de Deus) i câso nào houvesse!para este ou aquele indivíduo, a ocasiào de comple-tar essa restauração interior, o cumprimento da nor-ma legaL pelo menos o mantinha dentro dos limites de

comunidâde, podendo Portanto beneficiar-se, apos a

morte, das prerrogativas originárias readquiridasDelos membros mais cápazes, dâs quais eles Partici-pa,a.

".,tào a títuIo de herança coletiva. A Primeirá

à""rr. dua" persPect ivas é a que conduz à chamada

"libertaÇào", e constitui o esoterism. A segundáconauz aó que as reLigôes denominan a "salvação da

alma após â morte" e constitui o exoteri§úo-Deste modo, Percebe-se que as Leis reveladas

constitueÍÍ manifestação da }lisericórdia, destinadass conpensar a perda da intuição direta das l-eis

É ,rrna curiosâ aberrâção dá nossâ época quejustamente âs pessoâs meis insensíveis às Ieis natu-iais seja. âs que se ProcláÍnam mais "superiores" ã

toda Lei reveládá, quando na verdade sào ás que maisnecess itaÍn de1a.

***

Àssin, se quem está mrma reLigião já está na

Trâdição, quegt dentro dessa Trádiçào, encontre um

carninÁo espiritual -- um esolerismo -- está rrmâis

dentro", e quen chesue à s,pre.a realização-está "nocentro" dessa Tradição, o qual coincide então com o

centro da Tradição universal e primordial.chegar ao ésot..i"ro sem um exoterismo é tão

impossíiet quanto chegar ao centro de u' pais sem

o"."tr.. ,. suas Ironteiras e Percorrer seu terri ró-iio. s" afguét desligado de um exocerisno tem por

t0

acaso a felicidade de contâctar um mestre espirirualautênLico, a primeirâ coisa que psLe vai fazer émándá- Io sprender.e.práticár o exoterismo:

- E um prrncrpro geráI do sufismo que um firmeeftbasamento no exoterismo é inaispensávef "o.o

pi"_parâçao no.caminho esotérico; e, na rariqatr Oarqá_vr... r rodos os noviços eram obrigados a decorar oGuia dos Eleoentos Essenciáis do Conhecirento Reli_gioso (nr - famoso carecisno islâmico ". "".;."t,-;"Tbn.rAshir, como meio de assegurar qr" p""..í;; -;Ínrnrmo necessario de instruçào retigiosa',.( t)

que essa coincidência só existe nanais em pârte a lguma.

rmagrnaçao, ê

2

Os Perigos da Trivial idade

A única maneira de reencontrar Deus é recuperaro senso do sagrado, que é . ".""" do maravilhoso,q"e é o senso de eternidade e imutabilidade .acirnâ dêtoda moviÍnentação mental e cósmicâ.

os ritos e a arte sâcra roÍnpem a trivialidade,mas não para abrir para o âbismo do nada, e sim paraintroduzir, nos intervalos de fluxo cósnico, pontoscintilantes que recordâm a inutabilidade do suprâ-cósmico. Esses pontos são como os rubis de un reló-gio, que articulâm o lnovimento sem psrticipar dele.

3

Tradição e Tradiçães

Existe uma Tradição Prinordial, universal eeterna, que e o deposito da sabedoria revelada.Existe ê manifestação hunana e terrestre dessa Trâ-dição, e portanto uma organização tradicional que arepresenta. Bxiste um centro geográfico que é a 1o-calização dessa organização em algum ponto da Terra,egl cada ciclo temporal.

Tudo isso é inquestionáver.Xâs: as tradições em particular, historicarnente

existentes, não provêm desse ponto dâ Terra, e simdiretamente de Deus, que é a Origern delas e da Tra-dição Prinordial igualmente. À1iás as tradições nãosão outra coisa senão a mesma Tradição primordialressurgida em novas formas, porém em câdâ câsoigualmente -- e novâmente -- íntegra e originária.Considerada isoladamente das suas formas históricas,que são as tradições, a Tradição Primordial não senatrifesta historicanente, pela simples razão de queela não é una ( Láis uma) tradição, que apenâs esti-vesse acime das demais tradições, e sim é o Loldedas tradições, o padrão da sua tradicionâlidade, eelas, êo contrário, são as suas manifestações histó-ricas, forjadas segundo €sse molde.

. A. indiÍerença e a Lrivialidade __ que dào a rô_nrca do "sentimenro do mundo,' na socieiade moderna-- levarn a só poder conceber Deus coÍro o ,,totalmenteourror' (o sanz andere de Rudolf ott"l. p.i", iis"ài_vido Lodo senso do sagrádo, e ausente Loda marca desácrâtidade na vida coLidiana, Deus só podê ser imâ_grnado como o áusentej o esLranho, e,n úLrima ins_tancra o esquisiro e o absurdo. Esra á a origem doápelo sedutor que as seitas monsrruosâs exercem so_bre a a-lma cansada e gastâ dos "os"o" .ont".porã_neos. .Na medida em que se opõe à rriviat idade e àopressrvrdáde plana e rasâ da indi Ferença, introdu_-zindo nela um corte que abre pâra uma verricálidade':bissáI".o hpdiondo_pode pássar por uma iEágo Dei.§o - que orlvlamenre e uma iúagem consrituída de pri_vaçao e carência -- privaçào de senrido, ."rên";à a.reál rdáde e poder criador -- ê porLanro uÍna imageminvertlda, Iireralnenre,,satânicai'. nfa tira aa tiilvialidáde pará tevar áo nada, que é.,"i".;;r;;;_têl das I lusoes. O nádâ p o absoluto só rên umâ coi_sa eú conum: é que sào iguatmente i";,"gi";rã;".-llmaginaçáo e o rrlugár geométrico', aa cãincidênciaêntre o nada e o Absoluro, o que é o Ínesmo qup dizer

12 t3

platônicos pode dargularidadei'não se

coota desta questão. À "trian-manifesrâ senão aLrâvés de rriân-

O rêcurso às "idéias", ,,formas,, ou "arquét ipos" 4

Àntirradição e paródiâ

Quando se fala de "organizações anritradicio-nais", é preciso resguardar-se de imaginar que elasconbatam a Tradição. Elas não combatem: elas copiam.Não produzem uma refutaçào. produzem um ,imuLairo e

Quanto aos representantes da Trâdição, as orga-nizacões antitradicionais só os combatern na medidaen que e1ês âmeaçam denunciar o simulacro e frustara paróaia, mas não na medida em que se limitem aexpor dados de conhecimênto tradicionais, de queaIiás elas n€cessitam para com eles co.por'seu sim.-Iacro, motivo pelo qual seu combarÊ a tais represen-tantes é dúbio e entrecorrado de cortesias e adula-ções. Para isto, freqentênente essas organizaçõese seus comandados 5e prestám á seÍviços mênores emrávor da Tradiçào, e inctusive à divulgáção de par-celãs reêis de conhecimenros rradicionais, de cujoprestígio e fraseologia procuram assim se ap.op.iai.

Ao copiar, a anticradição não desfigura a Tra-dição enquanto ral -- que é imutávet e inatingívelsob todos os aspectos aparência peranteum grupo humano deterninado, o quat fica enrão im-possibilitâdo de chegar à rradição verdadeira en-quaoto não se livrar das malhas seduroras e gruden-tas de um sinulacro quê pode ser inrpirámenLe vero"-sirnil. mesmo para pessoas inÍormádas. (o que aIiássisnifica que ninguém se livra dos simuraáros porsuas próprias forças e sen a ajuda dâ traaição nàs-na, assim como se distingue o ouro fatso rão-sonentepela comparação com o verdãdeiro. )

_ A verossimilhança dos simulacros aumenta, po-remj nâ proporça que, aprox imando-se oLermino do presenLe ci( 1o. á Tradi\ào dá a púbticoparcelas cada vez Ínaiores do seu resouro de conheci-mentos. Estes tanto podem servir de flárcos indicati-vos para levar as pêssoâs à rradição, quánto de ,,mâ-téria prima" pará novas falsiri(aaõês e eneodos. Uma

gulos concretos e particulares; mas o conceito (ou oesqueÍa mental) de triângulo, que não é em si mesmonen rriângularidade nem triânguIo, represênta, námente, a triangularidade. Todos os triângulos que ohomêm faz são forjados no molde do conceito de rri-ângulo, sem que se possa dizer que ele os produza,ou que provenham dele. Por esta analogia, o homemLem no seu intelecLo o arquétipo dá Lriangularidáde.oa sua mente o conceiro de rriânguIo, ná sua mào ahabilidade de desenhar triângulos; e o intelectorepresenta aqui o Logos divino, a mente, a Tradiçãoprinordiã1 e a mão, as rradições em parricular.

Se a Tradição primordial se manifestasse exte-riormente, eIa só poderia Íazê-lo sob á forma de,'mais uma'r rradição, âssim como só é possíve1 dese_nhar "um" triângulo e não "o" triânsul; em si mesmo,embora "cadar' triánguto sejá novamenLe, e a seu mo-do, ',o" triângulo. EIa nunca poderia manitesLar-sesob a forma de uma r'supra-rradição', uoíversa1, por_que o universo em si nesmo não tem forma, exceto asformas, particuLares que o representamr porque todaÍorma e part icular por definiçào. A "rnani fesracão,lda rradiçào PrimordiaL, com umá forma própr ia e

- in-

dependente das demais, é urn contra-senso puro esimptes, que vai contra rodâs as condições de espa-ço, rêmpo e numero que definem o ,,nosso mundorr, eporEanLo essá rnaniÍestação nào ocorr"rá anres dotáruino deste mundo. o quat por suá vêz deverá serprecedido justamenre pela "Crânde paródiai'de Tradi-ção prinordial, q.e será o Reino do Anticristo.

portanto, a única ,,fornâ,, sob a qual é possívelenconrrár â rrsdição PrimordiaL é a forma das rradi-ções historicanente existentes. Quem quer que seapresente como porta-voz da Tradição prinordial semser por intermédio dessas tradiçàes, já está ence-nando a parodiá.

14 t5

sinples migalha de conhecimentos tradicionais, ari-rada ao solo, borbulhante de ferrilidade, da confu-são contemporânea, dá para produzir uma variedadeimensa de pseudo-ensinamêntos e pseudo-esco1as, querebaixam esses conhecimentos en qualidade (engros-sândo-os e Iiteralizando naterielisricamente o seusentido ao nesmo tempo em que procuran der ares decoisá sublime e esotérica a baflalidades e conrra-sensos) € os nultiplicám en quentidade de reprodu-ções, vêndendo, aos curiosos, "conhecimentos se-cretosrr que eles poderiam adquirir petá sinplesleiturâ dê livros de domínio púb1ico.

Por exemplo, dezenâs de organizações que hojese dizem provenientes de um nisterioso "centrorr ini-ciático dâ Ásia Central não são mais do que Íindus-trializaçõesri de dados extraídos de rrês livros tra-dicionais: Xission de lrInde (1910), de Sâinr-yvesdrAlveydre; Bêstas, Eorêns e Deuses (1924), de Fer-dinand Ossendowski, e sobretudo Le Roi du Honde(1927,, de René cuénon.

Isto não impede que em determinados casos sucê-da o coltrário, isto é, que tendo dererminadâs pes-soas pas9ado por organizações tradicionâis e retira-do delâs áIguns fragÍnentos "comercializáveis,,, taisorganizações decidam publicar a explicação integratque permita reincorporar essas parcelss num quadrocoerente, de modo a evitar novas confusões. Mas taisexplicações, por sua vez, pôem en circulação novosdados, que se prestarão a novas falsificações, eassim por diante, o que torna cada vez mais dificil,parâ quen não está escorado denrro de una religiãoortodo).a e tradicional, distinguir os caninhos fa1-sos e os verdadeiros.

II

A tradição, as ciências tradicionais e o islar*

l

Tradição e Àntitradição

A abordagem do conceito -- e dâ realidade -- dâTradição pode começar pela tomada de consciência domistério da intetigência humana. Nossa humanidadeatual está tão derrotada e deprimida, rão decaídr eeimbotaaa, que a naravi Ihâ desse mistério Bera mente

À inteligência é ao mesmo tempo mistério dasubjetividade e certeza de um conhecimento objetivo.Ela escâpá à contradição entre o I'eu. e o ihundori,ela não está propriamente "dentro" nem propriamente"fora" de nós; se seu lugar de aparição é a .entesubjetiva, por outro lado seu alcance, enquanto sedede un conhecimento objetivo, vai muito além doslimites do rimentalrr; por e)(emplo, podêÍnos conceberpela inteligência o infinito, que não podêÍnos "re-presentarii mertâImente de nâneira âIgumã. A inteli-gência rraparece" na âImâ, mas não "está" na aLma;ela "vê" o mundo e portanto não "está" no mundo. Eladá fornra, sentido e unidade às nossas percepções domundo objetivo e subjetivo, e assi, é transcendente

* Resumos de trêstora Àstrocientiâ,setembro de 1985.vô1wimêntos oreis

conferências pron'Jnc iadas na Edi-do Rio de Jâneiro, em 5, 6 e 1 de

À exposição abranseu muitos desen-que não são reproduzidos aqui.

t6 17

 inte l igênc ia não sedâs funçõe s íntelectivas --

ident i f i.ã .ôh nenh,,mármâglnaçao I

raciocínio, sensibilidâde, etc. -- que aexpressam; e1a é a vida ê o sentido dessasdes, mas não se confunde com elas.

Por causa do caráter transcendente dâ inteli-gência, o hômem sente-se só no "niverso, oão tendocom quêm compárar-se ou dialogar. O tcnàmeno recpnrpda chamadã 'rplanetarização da cutturâ" fez con quê aconsciência desse caráter transcendênte. único e so-litário dâ nos'a espécie tendessê a êmêrCir, lor(as-se a passâgem exigindo um reconhecimento claro. Nofundo, rodo o interesse aruêi pêlos rpnómpnos dapsiq"e é

"ma busca da inteligência; apenas â humani-

dade atuál não conseguiu ainda acertar o alvo, êainda confunde a intelisência com as funções lnte-lectivas. Poucas pessoas têm a condição parâ o plenoreconhecimento da inteligênciâ e para a plena reali-zação das consequôncias que esse reconhecirnentoinplica. i'ías estas poucas pessoas "representamr', porassim dizer a humaoidade, e se e1âs assumirem ainteligência isto bastãrá parâ que a humanidadereencontre, mais dia, menos diá, seu caminho.

Trânscendendo a todos os fenômenos do universo,a inteligência não ten "causa" nêm "orisem" em parrealguÍnã. EIâ parece surgir de forâ, de cimâ, desde ooceano infinito da Possibilidade, que envolvê o mun-do como o oceano envolve os continêntês. Como oespaço e o tempo são apenas formas assumidas pelainteligôncia, é inútir procurar paÍa a intêtigênciâuma origem no êspaço ou no tempo. Elâ tem origem nâPossibiLidade. no TnliniLo. q,,e é sempre presentê emtodâ parte, inaltÊráveI e inesgotáve1.

À orisem da inteligência é agora.O Íevigoranento perióaico do contato entre a

inteligência e o infinito, que é a s"a origen, deno-mina-se revelação, quando desse contãto surgen umrito e uma norna destinadâ a possibilitar esse con-tato para un grânde número de pessoas; denonina-seintuição íntelectuâl quando ocorre para un indivi-duo em parti(ular. A revelação fornêce os meios para

que os indivíauos atinjam, quando qualificados parâisso, a intuição intelectual Para os que nao temes.a quaIitj,a,.áo. êlâ fornô.ê o ên'iná-mento para que se aproxrmem o guanto possíveI desselimitêl me5no que "ssá aproximaçio " ia apera' 'Lm-bóli(â. e ind;rêra, arravÉs da parL;'ipa\ào daspês5oas na conunidade rcli8io'â. Plá servê pararlar à' suas vida' o carátêr de rrancl r, io'z árravesdo qual o sentido da existência se .orna suficiênte-menie pró"imo mesmo dos atos mais simPtes da vidacotidiana, como se observa em qualquêr civilizaçaotradicional.

Não há nem religião nem esoterismo de espéciealguma sêm uma revelação.

A revelação origina ao mesmo tenPo as Eecnlcasp discipl inas que ronduz.n à int riçào.t"is q,rà conduze, à viv, n.iaçào 'imbóti'á ê indiretddô "enlido. A eqrâc duds in.Lán ias dá se o nome dp

esoter ismo e exoterismo, respectivamente.A possibitidade pernânente de efêtivar uma des-

sas duas fornâs de vida espiritual denomina-se Tra-dição.

Toda tradição remonta a uma revelação.A revelação pode vir sob a forma de uma pessoa

ou Mensageiro, como Cristo ou Buda, ou sob a formade um texto, como Os Vedâs, a Torah ou o Corão-

Cada Íradição é ,-r. corpo intesral e integro de

ritos e normas, Àue resiaem nos "pontos de junção"entre a inteligência e o infinito. Esse corPo naopode ser desmenúrado- Cáda Tradição ó um todo con-pleto e auto-suficiente. Pode-se compaÍa-las, mas

não fundí-ras.Tambén não se Pode separar esoterismo e exote_

rismo, porque eles sào a vida e o (orpo. resPecriva-rêntê - de uma Tradicão.

éaaa rraoi,.ào É con't it,íaa de rrês elernentosinpre sc ind íve is :

a) Umâ Doutrina sobrê o infinito, sobre o que

Absoluto e o qrre é nelativo.

19l8

c) Um corpo de SíDbolos (por exempto, nâ árLesácra) quê ájudám á menre a chegâr à incelecção dasverdades veículadas pela Doutrina e corporiiicadaspelos ritos. Às chanadas ciências tradiciooais, comoa alquimia, a asrrologia, ben como as artes sacras,-- árquireturá, pinrurá, erc. -- farem pa.te ao.or:po de s;mbolos de uma rradiçào. A astrotogiâ, Latcomo a conhecemos hoje, tem origem na Tradição hetê_nica -- alexandrina --, mâs seu sinbolismo, por suauniversalidade, foi bêÍn assinilaao. pero àsàterismocristão e muçuLmano, de nodo que seu àstuao é u. Uo.rn.trumento auxiliar pára quem deseje penerrár noun Lve rso dessas tradrçoes.

b) Um corpo de Bitos que ajudam o homem a in-corPorâr a verdâde da doutrina na sua formâ de exis_tência, de modo â harmonizar o conhecioento e

2

As ciôncias tradicionaisê a astrologia espirituâl

Muitás das ciências tradicionais -- como a a"-trologia particularmente -- só chegaram até nós emuma fôrnâ fragmentária. Apesar da inconrestáve1 va-lidade destâ ciência, as lacunas no edificio que aconpõe abrern nargen a incongruências e contradíções,e, assim, flenhuma das tentativas atuais de formularuina teoria âstrolósica de Daniel Verney,Raymond Abellio. Arnold Keyserling ê tanros ourros--é isenta de defeitos que a ror.nam inaceitáve1desde uÍn ponto de vista lógico. No rnÍnimo, rodas dãouma impressão gerâ1 de incomplecude e deformidade,que é incompátive1 com una ciência toda constiruidade haÍmonia, e na quâl PIâtão ênxergava o retrátomesmo da inteligência divina estanpado oos cé"s.

A razão dêssá incompletude, no entanto, nàoreside na falta de informações, pois os elemenrosque nos chegaram da âstrologia he1ônica, babilônica,chinesa ê inclusive eeípcia, são mais do que sufici-entes Para Podernos reconstituir na sua quase tota-lidáde o corpo dessa ciência tal como era conhecidâe praticada na antiguidade. E, ademais, nem cabefslar de reconstituição, pois este termo só se apli-ca a ciâncias extintas, ou em desuso durante muitotêmpo, o quê não é o caso da astrologia, ao menos noOriente, pois êla continuâ a ser praticada ininter-ruptamente na Índia e nos pâÍses islâmicos, em rnor-dês rigorosãmente tradicionâis em ambos os casos, eao mÊnos no que diz respeito à astrologia hindu ostextos, trâduzidos em ingfês, são abundantes noOc idente.

O que nos falta na astrolosia não é informação,é uma compreensão verdadeirâ do intuito e do lugardessa ciência. sabemos muito sobrê â suá consistên-cia interna, mês ignoramos o seu contorno, o seulugar no sistema das ciências espirituais tradicio-

Àpenas é preciso advertir que existe também umapseudo-cradi(ào. ou,ária, pspudo-rrádiçàÊs. podêmosrêconnêcp-tas tacr tmenLe pelo tá(o dê que dispensámtodo exotêr-ismo e se pretenden superiores a todãs asreligiões, às quais, no enranto! etas imitan e dasquais roubam etemenros simbóticos e rituais. Face ãestas conrraÍa5ões, geraLmênte gro(esLas, caracreri-zádas pela áusen.iê LordI de belezá e de ;nLeliqibi_Iidade, é preciso saber que o próp,;o .en"o estãrjcode cada pp.,soa á un guia seguro pará "epárar o joiodo trigo. Más, se querem reatmente seguir uma viã deconhec i men Lo espiricuãt por inregrar-senuma religião ortodoxa. Aruatmenre pode-se seguir

a) cr i st ianismo ortodoxo;b) budismo (fujam de quem prometâ

um exoterisno bud is ta )c) judaísmod) Islan.

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nais, e ignoramo" isLo peta simples rázào dê que,nao possuindo mais umá Lrâdiçào viva p comptera,des.onhe. emos roLaimpn(e a ex;sránL ia -- quanto máisa ronsistênria -- desse sisremá.

Se as ciências aruais organizam-sê segundo asconveniências de uma técnica ãestinaaa ao -aomíniomâterial do mundo ( incluindo-se nisto as técnicaspsicológicas e de dornínio poritico), o sistema tra-dicional das ciências tem no sêu topo, e como crité-rio hierárquico único e exctusivo, o conceiro p ámeta da realização espiritual. tsto queÍ dizer que oque diferencia as ciências umas das outras é. "."t.sistema. a manêira diÍêrÊnre de ênÍocarem o probtemáda realização espiriruat, e que aquilo que âs dispõehierarquicanente á a sua naior ou menor proxirniaadedessa mêtâ. Em outros termos: una ciência é tidacomo superior na medida ern que é mais direto oconhecimento de Deus que ela oferece, e como infe-rior. na mêdida êm quê esse.onhecimenro É mais in-direto, "imbóti.o e alusivo. por êxêmplo, a ciênciados ritos é superior a uma ciência ",i".ár, po,qu" orito, ao menos ", útri,a insráncia, "isa a u" conr,.-cimento direto de Deus, âo passo que o conhecímentoda naturêza também leva a Deus, mas por inrermédiodo simbolismo, e de uma naneira inteiramente teóricae viÍtual. Por ourro ládo, uma ciência puramenteintelecEual e teórica dâ narureza. como a astrotô-gia. é superior a uma ciencia p,;i;.u " operárivacomo a arquiretura ou a arte dâ Suerra, porque aprimeira está mais próxima da atirude de com;.e;nsãopura e contenpLativaj que é mais aparentaaa ao co-nhecimento de Deus na mística.

Dentro desse sisrema, a única prática quê inte-re§sâ e ã pratica espiritual que conduza ao plenoconhecimênto da verdade e à reatização eferiva dodever inerente ao estado humânô.

. O que faLta para uma compreensão da astrologiaê portanto um conhecimento das suas rêlaçôes com amÍstica, isto é, com a técnica da rearizaião espiri-tuáL Pojs a .asLrotôgia. quâisquer que sejam suasâpr Lcaçoes prát rcas no campo da pura ur i I idade máte_

riát (e as apticações psicológicas e psicorerapóuri-cas devem ser incluidás nesra caLegoriâ ranto quánroas ápIicaçôes econômicas ou sociais), á uma ciênciade índole teórica, e como rat não teÍn justificaçãoem sí mesmâ, e sim somente nâs âplicações e exten-soes que possá ter no campo da reatização espiri-tua1. Notê-se que, eÍn todas as civilizações que pos-s"íra. uma astrolosia, ela serviu "".p'é " """.

'ti.em prineiro lugar, como se vê atiás pelo alto apreçoque os grandes místicos como Ibn ,Araby, ptatã;,Sohravardi e tantos outros t inham pêta âstrotogiâespiritual, parâ1e1amênte a um desprezo ou pelomenos a umâ _indiferênça para com as aplicações divi-nátoriás, nedicas, etc., a quê essa ciÂncia dava

Ora, somente para dar uma idéia tongínqua doque possa ser essa aplicação espiritual da astrolo-gia, podenos reco.rer à correspondência tradicionalentre planetas, funçôes cogoitivas e ptanos de rea-lidade.

Na astrologia rradicional, ral cono se vê porêxenplo em Ibn 'Araby, nas rambén em muitos autorestradicionais ocidentais, cada planêta reprêsênta um!função cognitiva -- em têrmos escotásticos, uma ,'fa-culdâdê da alma" -- e por outro tádo um ptdno ounrvel dô cosmôs.

. A cosmologia,rrêdicionát, da quáI a asrrotogiae um resuno slmbolrco, ênxerga o cosnos como umsistema de planos, ou de esferas concêntricas, cujacorreta percepção (no sentido puramenre intetêcruê1,interior, da palavra percepção) depênde do grau deconcentração, dê santidade e de penetração intetec-tual de cada qual. crosso nodo, os três principaisplanos são os do espírito, da alma ê aa corporàli-dade. O prineiro contén o segundo, que conrém o ter-ceiro. Há nuitas divisões internediárias. pârat€Ia-mente, a alma hunana tambérn é composta dê esferas(alma intelectiva, alma volirivã, etc. ), âbarcadasumas pe las outras.

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 cada uma dessas esfeÍas, simultanêâmênte domacrocosmo e do microcosmo, corresponde uma esfeÍaou órbita pLaneEária.

No esquema p.ânerário, o ásrro máic imporránre-- o So1 -- corresponde, no microcosÍro hunaoo, àfâculdade de inEuiçao, ou inteligôncia, e ôo nacro-cosmo ele representa o Logôs, ou Inteligônciâ Divi-na. Os demais astros reprêsentam, no homem, fâcul-dades subsidiárias que, como vimos oa conferência

Somente Para encerrar, e vottando âo assunto de

ontem, é prec;so advertir que os ritos exotéricossão parte integrante dessê processo de realizaçaoe'piritr-ral, ao Ponto de que em grandê Pártê dos cá_

""" "r." são a base mesma sobre a quál incidira o

ensino da doutrina e até mesno uma êventual iniciâ-ç;.. Eles são, portanto, absolutamente indispensá-ve is, na toraLidáde dos l.âsos

No que diz respeito ao efeito dos ritos exote-Íicos, um efeito que eles podem e devem ter é justa-mente o de abrir acesso a un conhec iÍnento esotérico'só que a maior pãrte dos fiéjs não se lembra dê

pedii exatamente isso a Deus -- limitando-se a pedirsolução ae males humanos corri-queiros e deixandopara pedir conhecimenros esoréricos ao primeiropseudo-Buru ou pseudo-shàikh que áPare\á. sem que'rt." oã"... utilizar-se do poder efetivo do meio."g,r.t " normá1. estabelecido por Dêus 'esmo.

que é

â DrÊce. E. no entanLo, a Promessá de DPus é clâra e

.orene: "satei. e vos abrirào a Portai pedi. ê vos

"..á daao." E Deus é o Firnê, o Manten€dor, o sufi-

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olslaoeoSufisúo

0 ingre sso noreligiões, por um

s inpLe s declarâçãoates ta sua crençaconst i tuem o lsLanl

Na sinbólica trâdicional, as viagens celesEes,como a de Dantê na Divina Corédia, simbolizam rea-lizaçôes espirituais, e a trãvessia de câdá esferãplanetária simboliza, de un Iâdo, a ascensão a um

"íve1 cósmico de mãior universâIidade, e. de outro.á abcorçao d" mâis umá ráculdádp cognitíva ná inrui-ção ou inteligência. Esta âbsorção faz con qu€ âfaculdâde em questão perca seu rãnço subjetivo econdicionado e, identificando-se a intelieôocia que

e tonte, passenaneira mais fiel e direta.

anter ior, dependem da inteligência e a ve icu lan ou

a veicular â verdade de

E evidente, pôrtanto, qu€r ô simbolisno dêcada esfera planetária só pode ser correEâmente con-preendido dêntro do processo de real izâção espiri-tual de cada quãt, e ná medida dessa realização. Em

outros terrnos: so compreendonos ou âbarcamôs ãquêlasesferas que já tcnhamos atravessado, ao menos vir-tualmente, o que depeLrde dâ nossa possibilidâde --ou vocação -- de reatização espirítuaI.

o esEudo da astrologiâ, que ên si mesmo é muitoútiI para essa finalidâdê, ficâ portanto truncâdo êinsat isfatório ênquanto eIa não for cumprida, aonenos em certa nedida mínima. Neste sentido, a as-trologia é propriânênte uma ciência dita esotárica,na medida em que implica uma realização espirituãI.

</J\O::-: ÀÉ í-lj\j)\<J\ )1â iláha íla Arláh, líohámedzer, "não há deus exceto Deus,ge iro de Deus".

Islam não se faz, como em outrâsrito de agregação, mas Por uÍna

oúUti.a, nu qual o novo nuçulmanonos dois princípios de base que

rassúl uttárr, quer ai-eMohammedéomensa-

2L 25

Es ta dupla fórnuIatodo o Tslarn e todo onovo muçulmano anuncia,gião, que é a conquistadenominado a Ident idadê

A prime ira parte dafundamental da UnidadeExis tênc ia. Tal doutrinaguinte maneira:

contém, de modo resumído,Sufisno. O primeiro ato doassim o coroanento da reli-do estado final do Sufi,

Suprema.fórnula expressa a Doutrinade Deus e da Unicidâde dapode ser resunidá da se-

"Ser" e "unidade" são sinônimos. Ser, é ser um.Todo ser, perdida a unidáde, nào existe mâis enquan-to tal. Portanto, a unidade é o princípio mesno dacoesão dos seres, o princÍpio que sustenta sua iden-tidade diferenciada e sua existência. Ora, pelo fatomesmo de que a idêntidade dos seres é diferenciada,isto é, de que a identidadê de cada qual só é aquiloque é na medida em que ela se diferencia dos outros,pode-se concluir que a unidáde dos enres nào é umaunidade absoluta, porém relativâ. Unâ unidade abso-luta excluiria quâlquer alteridade e qualquer dife-renciação. PoÍtanto, os seres só existen na nedidaem que têÍí unidade, mas, como esrá uniaade é precá-ria e relaiiva, também o é a sua própria existência.É forçoso admitir, para cina de todas as unidadesrelarivas, uma unidadê indivisá, áo mesmo tempo sim-ples e-abrângentê, da qual todas as únidadês relâti-vas sao apenas projeçoes ou imagens parciais; domesmo modo, acima de todás as existências particu-Iares está a Existência enquanto taI. À unlaaaeenquanto ral. rranscendente e imanente, oriaen,sustentáculo e meta de todâs as unidêdes parciais,denomina-se Deus, Al-Lâh. À manifestação desseDeus em todas as forrâs de unidades parciais e rela-t ivas denomina-se Existênc ia.

À primeira parte da fórnu1a é porranro umaafirmação ae ordem metafísica, que âtesta á Unidad€do PrincÍpio e a Unicidade da Existência.

E certo que, al,em desse sentido Ínais univer-sal, eIa pode Eer de fato uma série indefinida deoutros níveis de significado, mais particularizados,que constituem outras tantas aplicações desse prin-

r íoio a domínios menores da realidádê.A sesundá parte dá lórmula -- ltohâmed râs§úl

Ulláh -- torna-se mais clara quando, pela elimolo-gia, se sabe que o nome üohamed é um deÍivado doverbo trâmada, que significa "louvar", "prezar","e Log iar", "reconhecer um mérito".

Mohâmmed pode ser traduzido sumariânentê como

"digno de Iouvor", "meritório". Por outro 1ado, essenome é ta.uém um certô arranjo fêito com

leLrâs que compõem a palâvra Àdaú, "Adào". De modoque MohaÍnned é o proprio Homem. o HoÍnem consideradona sua universafidadê, como arquétipo e modelo .detodos os indivíduos q"e co.pôem a nossa especrePortãnto, o Homem, considerado na sua universalidade-- nào enquanro indivíduo separado, qu" é rraco,dÊricienre à erradjo --, é um .nte de eIêvado méri-to, ê este grande mérito da espécie hunana em facede todas as outras espócies animais, vegetais e

minerais, e em face de todo o Cosnos com toda a suaim€nsâ variedadê de modalidades e planos de existên-cia, é un "mensageiro" de Deus, um "sinal da Unici-dade dá existênciá encravado, como um pino ou um

eixo, no meio da Roda cósmicao Homem é o proróripo e padrão da unidáde do

próprio Cosmos, e, para as outras espécies de serês,e1e representa a figura mesma de Deus sobre a Terra.Por isto diz-se no ls1am que o Itomem é o "vice-re-sente[ (khalifat) de Deus oa Terra, encarregado dêzelar perâ ordem cósmica e pelo bem-estar de todos

o homem realiza isso pelo exercício das trêsfaculdades que êle tem en comum com o Próprio Deus:intel igênc ia, vontadê e linguageín.

Sua inteligência pode aIçar-se âcima da condi-ção biológica e subjêtiva, alcançando a objetivida-de e a universâ1idade. sua vontade pode oPtar livre-mente, vencendo os condicionanentos da própria con-dição terrestre ê individuâl, afirnando no seio de

toda existência humana individual a Presença doHomem Universâ1. Finalmente, sua Iingüagem podeelevar-se acima da mera auto-êxpressão individuat --

26 27

que, no fim das contas, é apenas biológica __ paratornar-se uma expressão da Universalidade e da i/er_dádej porrânto do próprio Deus.Dái que o homem, na concepção isIàmiLa. esreianá rêrrá pará mánirêsrar es,a. Lrés quátid;des: s;ainteligência deve buscar incessântêmenre o univer_sa1, suá vontade deve optar pelo universal e suap"1,"." 9",", pela prêce. exprêssâr simbojicampnLe ounrversá1. A êxisrenciá hunaná rem por tinajidadê:(a) atcançar o conhecimento do univêr;at, p"l; ;;;;_do da Doutrina; (b) Iibêrrar a vonrâde dos condicio_namentos biolósicos, arnbientais, animais, êtc. , ia-z9ndo dêIa un insrrumênLo dócir e um,"í.,1. i."""_rucrdo pára a apariçáo dá Vêrdade. íc) pronunciar aPalavra Sagrada, para os ourros seres hunanos beúcono pára rodos oc ourros entês cápazes de ouvir

lanim:is, pranLa<. gênios ou ajínn, ;i;.,; ;;,.;;;;-do todo o Cosnos na imensá Lj(urgia que, maniÍe"rán_do. á-Vêrdadej ins(aurá e reinsLaura .onr rnuamenre a!,xlslên( ra em todá parLe e pára Lodos os sêres. Aprece, quê e a unica torma liLúrgicá do tstrmJ remassim uÍna função instiruidora e reequilibraote não". ?:I9.. meio humano. mas pára rodos os sêres. AsensrDr lidâde e receprividadc quê dr; ôs ánimáismostram ao ouvirem os cânticos do co.ão é

"rn renôlneno conr inuamênLe áLêsrado por Lodos or observado_res desde o surpimênLo do Iqiám

e na medidâ do aprendizado de cada qual, anpliândoên círculos concêntricos a irradiação daquele núcleode influência espiritual contido nas cinco precesdiárias, até que toda a vida, em todos os seus as-Pectosj se torne una prece continua e irradiante. OIslam não reconhece a existência dê un domínio pro-fano indêpendêrte, e busca a sacratização de todosos gestos e de todos os dominios da existência, poissomentê isto é compatível com apos ição hurnana no Cosmos.

a1tâ disnidade da

certanente, parâ o individuoordenánte e equitibrante dá pre(êexper ien.ia que mijhões de pessoascont r rmam d iarianenEe_

humano. . o poder

rs lamrca e umáem todo o mundo

O Sufismo é a mistica isLâmica, ou o aprofunda-mento intelectual e espiritual do Is1am, para aque-1es que sejam capazes de reatizá-to.

A base da prática sufi é a mêsma da religião emgeral, isto é, a prece, a recitação. O Sufismo, por-taflto, não pode ser praticado por queÍn não estejaintegrado no ciclo licúrgico e regulâmentar do Is-Ian, pois este ciclo é, ele mesmo, a basê de todasas práticas sufis. As duas difeÍenças que poderíâmosassinalar entre a prática geral da religião e a prá-ticâ sufi é que esta última. prifleiro, rpquer umacompreensão doutrinal mais profunda do simbolismocosmológico e metafísico das leis e das preces, coÍn-pree[são que pode ser dispensada no caso da maioriados fiéis; e que, êÍn segundo lugar, o sufismo tendea reduzir ê sirnplificar as práticas, ao mesmo tempoque aumenta sua intensidade qualitâLiva e sua conti-nuidade no tenpo. A tendência geral do sufismo épara realçar a inportância da chamada prece quintes-sencial -- a jaculatória ou dhikr que é a invocaçãointermináve1 do Nome de Deus (tal como se dá nocristianisno ortodoxo com a "Prece Perpétuâ"), o quenão dispensa evidentemente o praticánte de curnprirtodas as regras islâmicas que tambéín são impostas aocomun dos crentes. A narca registrada do pseudo-su-fismo -- já denunciada ao longo dos sécu1os por mes-tres como Ibn iÀrâby, Runi, Ahmed e1 'ÀLaky e tantosoutros -- consiste justanente en procurâr desligar osufismo do Is1am, tentando dispensar os praticantesde cumprir as regras is1âmicas e alinentando o seuorgulho aré o delírio. Íazendo-os crer que sào pes-

... .A lirurgiã islàmicá é composta de cinco c ictosorárros de oraçáot nos quais se recirâm rrechos doexecutam cerros ge5ro5 r iLuá is que Lons_trtuem ao seu proprio nível uma escrira có,mica, qt,e

:.",i.r: . revêrbera no ptano do proprro Lorpo o eLooas" pálavras enroadás. O cumprímento dâs nor.nasrstamrcas em rodos os serorês da vidá __ pois há umáregra . istámica pará rudo, desde á rêtisiào áté odesde ás arLes aE; a vida conjugat, desdeo governo até a higiene corporal -- var, aos poucos.

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soas superiores e que estão acima das normas religi_osas, quando em vêrdade una legítimâ superiorídade.que Lranscendesse eteLivamentê as formâs exteriores,voltaria a submerer-se a esras, não por necessidadáindividuá1, mas por uma necessidade cásmica, isto é,para .a salvação das almas de todos os demais, q"ánâo tivessem âcesso ao conhecimento espiriruâ1.

0 ensinamento sufi provém diretamente do pro-Íeta, Moháruned, e as tinhagens ininrerrupEás demestre a discípuIo podem sêr aresradas pela "genea-logia" de cadê prericante, em documentos {ue se

ç1o de quem deseje conhecê-las. Os farsantei nãoLem genealo8ia, esrão forá da corrpnre (silsi tar), enao representêm â ninSuem nem a n€da torâ da suáproprra lnagrÍaçao deliranre e ambiciosa.

Todas as vias espirituais ou escolasplural de taríqat, "via,, -- exigem doque ele primeiro entre no Islan e pratiquee regras, com sinceridade, e durante un

III

sêitas e religiões*

Raramente as grandes questôes púb1icas, em nossopaís, chegam a ser discutidas com a aÍnplitude, a

profundidade e o rigor necessários. Agitam-se duas

;u três idéias da moda, ouve-se rapidanente a oPi-nião dos transeuntes, os inteLectuais dê plantaoimprovisarn algumas citações, ê pronto. A.consciênciapútfica está âpaziguada -- pelo menos ate que novos

u"o.,t".irn".tto", de gravidade redobrada, volteú â

sacudi-la da letargia com â revelação de que nenhuÍn

ato positivo resultou dâ po1êmica anterior, e de quê

tudo está muito Pior que antes.Temo que isso venha â acontecer. com o gravrssrno

problená das sêitês, recenrÊmente ágitádo pêLa Igre-ja Católica com a denúcia dp que muiLas dêssas orgá-nizações são financiádas Pela CIA.

Á p....pçào da gravidáde do Problema dêpende dá

orientáçào da consciôncia dP cada quaL: o naciona-listâ sente-se desafiado pela intervençao estranger_râ, o católico ofendido pà1o desrespeito à sua reli-gião, o progressista ãÍneaçado peto desafio imposto a

i"púúri"à ,,i""""t., o pai de farníria intimidado pelop.iieo q". se ergue ânte o fuLuro dos fiIhos 14ás

nào há quem nào se sinta, de perto ou de longe' to-câdo Dela quesrão A pergunta quÊ naLuralmeoEP surgêdianLà dis;o é: co,o é possível que um mâI tão srávee tão amplâmente conhecido -- que supera infinita-mente a invasão das drogas nos anos 60 e 70 -- possa

coütinuar crescendo, sem que a sociedade consiga.otiflr".-". para tomaÍ a máis mini'na providência a

Íespeito?

* Tnádito. o orisinâl é de 1985

Postulante

podê ser rnais ou nenos longo, conformeSuns mestres sufis aceitaram, em outras

trad içõesainda hoje, orienrar retigiosos de ourrás-- pádres crisràos oLr monges budisrás --áce,Larâ um discipulo sem religiào, earnda alguem que seja conrra a reliaiào.

E Deus Buia à Verdade quem Ele quer

30 3l

A resposta é, em primeiro 1usax, que a própriadiversidade de eÍfoques possÍveis numê sociedâderrabeÍtarr impede qualquer consenso -- e inviabilizaqualquer açào conjuntá -- fáce á uma questào quedemande uma tomada de posição eÍn torno de principiosreligiosos. Assim, todos resguârdam o principio da"1ibêrdade religiosa" e, âpegando-se às s"r" pró-prias opiniões, cada qual vê o ininigo por um ânguIodiferente: eIe acâbâ sêndo designado por una multi-plicidade dê nomes, que constitui no fim o methordisfarce sob o quaL pode continuar agindo e crescen-do iÍnpunemente. É âcIA, é o diabo, é o fin dost"*pos, _é a angústia da juventude, é prr.a se.-rergo-nhice, é doença mental, é a crise econônica, são oscomunistas, são os anticomunistas -- erlfiul, já ouvitodo gênero de palpites disparatados, que revelan nanossa opinião púrrica, mesmo Letrada, um despreparototal para 1idâr com o problema. Todos sentem aameêça e todos estão contra, mas quando se trata dedefinir o q"ô é ela o" quem á erâ, aí instala-se anova Babel, que é mais propíciâ ainda ao floresci-mento de novas seitas.

Essa imensa dificurdade de compreênder o que sepassa leva muitos a um sentimento de ápâlermâdaimpotência, que se disfarçâ às vezes e, indiferençâafetada e num ar de superioridáde olínpica ("tudoisso é coisa de gente fraca"), e às vezes se retirapara um derrotisno ostensivo, falsâmente profótico eapocalíptico ("não adianta, é pior que praga, vocêcorta una nascem dez, é o firn dos tempos"). A uns éconveniente lembrar que ninguéÍn, por mais intelisen-te que se jurgue, está livre da influência dos fa1-sos mestres (pois ainda ontem não se ajoelharamperante Guevara, i!íarcuse e Althusser? ltais ou sontles neiges draDtâo?); e, a outros, qr:e a ninguén,nen aos anjos e profetâs, e sin sornente a Deus Todo-Poderoso, incunbe fixar â data do térnino destemundo, e que apressâr-se ên ceder a tais rrprofeciasrl(postas no mais das vezes eú circulação pe1âs nêsmâsseitas que se trata de combater), resulta apenas emengrossâr as correntes que tevaÍn a destruições ta1-

vez desnecessárias (l), ou, no minimo, en arriscar-se a um vexame caso o pr.etenso Juízo Universal, comona famosa "".éal. a. vittorio De Sica, venha a seradiado por mais âlguns sáculos ou nilênios. Nisto,como em tudo o rnâis) o rnelhor é seguir o conselho doProfeta Islâmico: "orai como se fôsseis norrer ama-nhã, e esÍorçai-vos na tarefa cono se fôsseis viver

Em meio à côn{usão reinante, creio no entantoq"e é possível discernir em tudo isso alguns Pontosevidentes, capazes de serem reconhecidos por todos,e de estabelecer um cêrto consenso.

Antes de tudo o nais, não êxiste a nenor possi-bilidade de compreender o que seja una 'iseita" semter uma idéia clara do que seja "relieião", assimco.o não é possÍvel distinguir a moeda falsa sem

co.pará-1a com a verdadeira- Digo isto porqu€ adesignação oficial adotádã pela própria CNBB --"grupos e rÍovimentos retigiosos independentes" -- é

um eufemismo que dá a entender quê a tgreja reconhe-ce nessas entidades umá manifestação autêntica derelieiosidáde, o que sesuramenre nào é o caso te. sefor, a Igrejâ terá ae responder pelo gravissimo pe-cado de tentar sufocar um impulso religioso autênti-co, ou, no míni.o, terá de explicar como e por que aCIÀ veio a desenpenhar eín seu 1ugâr o pápel de "fer-mento e sp iritual" dãs ínassas).

A noção de religião está intrinsecanente ligadaà ae "revelação". rsto va1ê para todas as religiõesdo mundo, sem distinção, êmbora a forma e a circuns-tância da revelãção possam ser diferentes en cadacaso. Mas, qualquer que seja a religião de que setrate, revelação é o meio pelo quáI á verdade total,universal e definitiva se Eanifesta e se evidenciáaos honens. o "momento culninante" da revelação é o

instaÍtê em que se ,rasga o véu" e em que o segredoútti.o se torna evidente. Este momento é antecedidode grandes trabalhos e angúsrias, q,e às uezes en-volve. um povo inteiro ( corno no caso do exíIio dopovo judêu, precedendo a revelação no nontê sinai),às vezes um indivíauo privilesiado e arquetípico

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que representa e corporificâ a hunanidade (como nocaso das peregrinações do Buda antes da lluminação);ê e seguido dê uma serie de eventos miraculosos, dedeslumbrante bêIeza, quê confirmam a excepcionalida-de do evento. Em seguida, a verdade revelada reco-brê-sê novamente de formas (1inguísticas, artísti-cas, simbólicas), etc., que constituem então como um

cofre ou un estojo lavrado em ouro, onde aqueleinstante privilesiado será conseÍvado, por assindizer, "fora do tempo". o nome deste cofre é "reli-gião".

A aspiração de todo homêm religioso, mas parti-cularmeflte do místico, é reabrir esse estojo, nestavida ou post úorter, para reviver o instante supra-temporal da revelação, sendo ârrebatado para fora dotempo, da rnutação e do sofriÍnento por aquela verdade

Entre a revelação, que funda umâ relisião, e arealização mística do indivíduo ou a salvação daâ1ma individual, há assim en todas âs r€ligiões umâinversão do sentido dos acontêcimentos: na revela-ção, a verdade se mostra a "ós, na reatização mis-Lica e na salvaçào nós é que so,os nos( rádos à ver-dade, LdI como nas palavras tinais do Sâlve Regitracâtó1ico: "e, depois deste desterro, nostrai-nos a

Creio ser essâ a naneira nais sinples de expli-car o que a revelação, ta1 cono é €ntendi-da em todas as religiões autênticas. Cabe umá pã]a-vra sobre a diversidade dás formas da revelação.Esta pode tomár á lormá de um texto sagraoo, que éditado aos homens numâ língua apta a rêcebê-lo (aslínguas sacras, coÍno o h€braico, o sânscrito e oárabe , têm propriedades que as 1ínguas modernas,delâs derivadas, não têm, e que permiten expressõesde um rigor simbóIico que geráInente es.rp, à pu.-cepção dos linguistas leigos). Neste caso, os even-tos e personagens que cercam o instânte da revelâçãonão têm "ma importância mais que auxiliar, corno ins-trumentos providenciais para a revelação do texto.No câso de ouLras religiões, a revetaçào não é

con§tituída de um texto, nas da vinda -- e da vida-- de um homem, que é, ele nesmo, a verdade. Nestahipótese, pode também haver textos em jogo, querreproduzam as palavras deste homem, quer relaten suâvida taL como outros a presenciaran, quer comentem e

expliquem a verdade trazida nele, mas tãl como oshomens ê eventos do caso anterior, desempenham papelauxiriar- Estão no primeir hinduisno (cornos vedâs), o juaaísmo (com a rorah), e o Islamismo(com o corão); no segundo, o Budismo e o Cristianis-mo. (o caso do taoísmo e das religiões indígenas émais complexo e nào cabe discut i-lo aqui, mas nàomudâ êm nâda o que foi dito.)

Às pessoas que se aventuran a falar de rê1igiãofrequentemente esquecem essa distinção ófvia, o queas leva â fazer conparações indevidas -_ por exem-p1o, entre Cristo e Moisés, o-Evargelho e o Corão,Buda e IrÍaomé --, o que não ajuda eÍÍ nada o verda--deiro diá1ogo que está pressuposto na noção de

Cabê comparar somente os elenentos comparáveis,isto é, aqueles que estruturalmente desenpenhen, nossÍândiosos edifícios das religiões, uma função simi-iar. Por exemplo, no Cristianismo a reveLaçào nào éo EvanSelho, Ínas Cristo; no IsLam nào é uao,é, .as otexto do Corão. Os EvanAelhos são meios auxiliarespara chegar a Cristo, e a vida de Maomé ajuda â com-prêender o corão- Mas cada coisa no seu lugar. (2)

voltândo à idéia do estojo, este é lavrado poucoa pouco, com o auxí1io das primeirâs testemunhasdiretas da revelação, e depois corÍ o concurso dosseus sucessorês. Dai provém um corpo de princípios,de textos, de práticas, de obras de arte, tudo des-tinado a fixar a memória daquele instante priviregi-êdo, de modo que nào se percá párá as gerações se-guintes. O trenendo poder gerativo da revelaçãoexprêssa-se de maneira insofismáve1 nas dimensõesdesse edifício: umâ pretensa religião que surgissede repente, e que, no curso de um século mais ou,nenos, já não se tivessê alastrado num corpo impo-nente de cultura sacra, não seria religião de manei-

3t1 35

ra alguma.A revelação provén da Misericórdia divina, e a

Itisericórdia é por natureza expansiva. Esse corpo demanifestações sacrais quê se alastra, depois darevelação, pelas terras e pelos sécu1os, deve porénter unidade, e esta é assegurâda pelo caráter inin-terrupto da transmissão do ensino e da autoridade,de homem a homêÍn, de nação a nação, de geração

^ageração. rsta transrnissão ininterrupta -- que se vê,por exemPlor no caso cristão, na ordenação sacer-dotal proc"dente de sáo Pedro. ê deste á .lesus -- é

o que se denomina proprianente "tradição", do verbolatino trad€Íe, "trazer". Designa aqüi1o que "foi"trazido por Deus e que "continua sendorr trazido dehonen a homem no decorrer dos séculos.(3) Na ríneuahebra ica, nãô outro o sent ido da PáIávra Kabba-

necessidades materiais dá coletividade; e, finalnen-te, os hábitos de culto e de obediência por partedos fiéis. (4) Reunindo estes três componentes sob adenominaçào de "cuIro" -- e siBo nisto o êspírito"posirivista" que presidiu à redaçào do nosso cóai-go Civil --, podemos chegar, enfirn, a uma definiçãode "seita": seita é o culto sen religião. Em outrostermos, é á atiLude subjetiva de obedí;nciâ e devo-ção (viabilizada pôr uma estrutura de Poderio ouinfluência social), sern a contrapártida objetiva deuna revelação cristaLizâda num corpo de cultura sã-cra. É um corpo feito de gordurá e pele, sem vida

Cláro que, etimologicamente, a palavra "seita"tefl um sentido âlgo diverso, e claro tambén que e1ajá foi usada com um sentido diferente en outrosi"*po", p".. designar outros tipos de fenômeoos. Mas

não estou aqui fazendo um estudo de etimologia neÍn

de semântica histórica. Estou definindo a palavra, e

a coisa que ela designa, segundo ambas se apresentanhoje, perânte olhos. Podem aplicar o con-ceito, tal cono o defini, a qualquer dos casos pre-sentes. Verifiqueín se em todas as seitas que conhe-cem não existe culto e estrutuÍa de Poder' Existem.Verifiquem, por outro 1ado, se esse culto se ditigeâ un corpo de cultura sácra efetivamente existente-- a um corpo de dogmas, 1eis, conentários, obras de

arte sacra, panteão de vidas dê homens santo§, en-fim, tudo o que caracteriza una religião autênticajá aesae seus primeiros tempos. Verão que não sedirige a nada. Ou antes, verão que o culto, naotendo objeto real onde polãrizar-se, se fêcha em si."".o, ã".o""r-"e num labirinto autolátrico, e sedirige enfim à estrutura mesma de Poder que o sus-tenta, ou àqueles que nela ocuPam os mais altosposcos hierárquicos. Entào podenos precisar â nossaàeFini5ào, ê dizer que seita é um culto subjetivis-ta, autolátrico, que diviniza o poderio social que asustenta. Este poderio pode cristalizar-se simboli-camente na pessoa dê um "mestre'r ou projetar-seiÍnpessoâlmente na organização cono um todo. 0 ponto

lah, sobre a qual as seitas dê ontem e de hojefazem proliferâr tantos enignas e pretensos ,nisté-rios, aptos a chamar a atenção da curiosidâde gros-seirã ê vulgar. Na dupla coluna de emânações divinasda Kabbalâh, entende-se que a "Misericórdia" traz a

revelação e alastra aos homeos a possibilidade dasalvação pelo crescimento da religião, e orrRigor"assegura a unidade do edifício pela transmissãodireta da autoridâde e pela inflexibilidade da dou-Erina conservâda dê Beráçào em g"raçào.

Jâ por essas explicações iniciais e eLementa-res, o Íenóneno das seiLas surge-nos um pouco maiselucidado. Na medida em que nào dispõem nem dã reve-taçào -- nem. a fortiori, podem arrogar-se a origeme a posse de um corpo de cuLtura sacra _- elas Pode-riam ser definidas como a reLigião menos seus doise lenentos essenciais.

ora, as religiões não são fornadas âpênas Peloselementos essenciáis, mas tambén pelo concurso deelenentos "âcidentâis", que formam por assim dizer agordura e a pelê dessê corpo ondê a revelaçào e a

cultura sacra são â vida e o sangue. Tais elenentosacidentais são, de um lado, a comunidade ou coleti-vidade dos fiéis; de outro, a estrutura de poderiosocial gerada pela cultura sacra Pâra prover as

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essencial é o"e o oôiêro de culto nào transcendeiámais as esr;uturas aá própria organização.

Há um casor entrêtânLo. que pode conÍundir-no"un pouco, parecêndo escapar à deriniçào arima É o

câso das seitas que se aProPriam de elementos ouasDectos isolados de reLjgiões exisrenLes. Porexernplo rórmulas riruais. sínboios ou dogmás. NesLá

evêntualidade, o objero de culro Párecê eferivamenteprojetâr-se pu', ,ié* do§ Iimites da orgânização,abrindo-sê parâ as dimensõe" sup"riores que saosimbolizadâs por esses elementos roubados Por exêm-p1o, umâ seita pode utilizar-se de elênentos do

Àirá"í".", como a noção de karoa ou a recitação do.onossilabo sacro Om (Aum), e evidenteflente suasprát icas parece.ào ter toda a amPlitude " . "1.'""sinbóIicos que essÊs elenenros eletivamenrê tem na

religião origináriá- Para coflpletar o siÍrulacro, a

seita pode dos próprios t€xtos dã reli-gião em questão, que, circulando em edições-comer-ciais ao êlcánce de todos (isto quando nao. saoreproduzidos em edi\ões promovidas pelá propÍraseitâ), podem ser tivremeote usâdos Parâ qualquerfin, independemenre do seu u§o regular e da signifi-cação que possan te). efetivamente na religiao de

onde provêm. Quem pode impedir que alguem use o

Evangelho para Erânsflit ir o contrário da mensagem

""angéli"r, ou, com base em trechos seletos dosdiscursos do Budá, ensinar como budismo algo que

seiá exatamenLe a neeaçào do budismo: Pártindo doprincípio de que a vítima desses engodos desconhececoÍnpletâmente as religiães saqueadas, nada pode

impedi-lâ de comprar como coisa autênticâ e completaalgo que é apenas um fragmento roubado.

o teste decisivo para identificar esse tipo dê

operação é j"stamentà o papel fragmentário e incoe-rente que em tais seitas desemPenham esses pedaçosde hinduísmo, dê cristianismo, de budismo. As reli-giões autêntiáas não constituen amá1ga.as de práti-cas e sí,uor"s jun(ados a.s.o. poré, (orPo', orgã-nismos vivos cuias partes não podem ser seccionadase usadas fora do contexto sem acarretaÍ ou a norte

dessas mesmâs partes! ou do organismo inteiro Parâ

ser cristão não basta rePetir o Pai Nosso: e precr-so, de um Lãdo, comPreender quê os sete pedidos do

pai fro".o represêntam cadâ uín deles uma virtude e

,. "..r"."".à, e, de outro 1ado, é Preciso praticãr

"."." "..ru.."io", tais como são dâdos pela cadeia

ininterÍuptâ de sacerdócio que começa em Jesus e

São pedrà, e que se chama Igreja' ê Praticãr essas

virtudes tal e como elas são exPlicadas por essá

rnesma tradição ininterrupta, com um sentido claro e

ã"ii.ia. ."*, torÍente de Livros desde há dois nil,.".1 . ";. com um senrido improvisado e arbirráriodjtádo pela riránia do e8o individual Pára sêrmuculÍnáno, não basta declárar que ""ó oe"s é o"'" ';i;;;-; "",

p.o,",,", "

p.".;.o s"ometer-'e à toi."" "..n, dessê Deus ,j'ico e se Propâgá pYla cadeiaini.,"..rp,u da tesislá(ào e do ensinamenro esoirj-tt1â1 do lsIam, e é preciso imitar efetivamente 3

vida desse ProÍetá, regrando-se por seus atos e

exemplos, (al como estào relaLadoc. (omenrados .e

exDIicádos nos I ivros da teologia. da iurrcPruden( 1a

e âa .spirit"at idade do Tslám. e não segundo os

caprichos do dêsejo individuã1 Caso contrarro' os

sete oedidos do Paj Nosso ou a de' Iar açào de Íému(utránâ lornám-se um símbolo <êm sinbolizado un

'o, o.o " PêrturbadoÍ. ou enLào una contradição pura

ã- "i'pr"., como a de pedir ásua quando nào 'e tem

sêde, ou comprãr uma passagem para Porto ÀLegrêquando se q,.i;t, salvâdor' se nossos aros desmen-

i"r""ã."àr""ilà.s rormuradoq em PaIavrês á Iógicoquê Deus aienaerá à nossa verdadeira vontâde' ex-

;ressa mudamente nos âtos. e nào à Falsa, alegada" --'-p-";;;-;;..ê

sen senrido-nêm lncençào, própriaa nós met,os, nas nâo á Deus A Precê e

,,. ';."." da retisiáo, nào seu sub'rirucivo o mesmo

Dôde-sê dizer de rodos os símbolos e r iros em Par-ii"',r".. o,"* se aproPria de Pedaços do Evangelho

sem s.bmeter-se à regra cristã, viola duplamentê a

Iei cristã. Quem se aPropria de pedâços do corao sem

cumprir a 1ei muçulmana, Profana duPlamente o textosacro. (5)

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dê elemêntos cristãos. Esses elementosenfeites, pingentes e plumás coloridas

PortantoJ o üso d€ eiemenros muçulmanos nãotorna muçulmuna umã seita! nem a tornâ .risrã o uso

ilusáo de que se cuLrua a Deus, quandoofênde a Deus brutalmenre, enquanro ná prática se.ultua Lná "rganizalio " "êu chefe. Com i\Lo. votré.

defini,áo anrer iôr, e as .êiras conri-nuan sendo um culto de si mesmâs, um ser mórbido,autocêntrico, egoísta, fechado e destrurivo como um

O.que foi dito até aqui bâsta para que qualquerpessoa, mesmo nao sêndo retigiosa, possa distinsuircom total precisão e rigor entre religiões e seitas.

Essa distinção, absoluramenre indispensáve1 comopreliminar a qualquer discussão séria do probtema,nao parêce ter estado ênrre os objetivos da .ecentereuniãú dá CN88. onde. ao conLrár ío, houve umá Lpn-dência á conrundir JêtiberadánÊnre as duás .orsa5jrotulando as seitas cono "movimenros religiosos in-depêndentes", o que coofere ao fenômeno u. caráterr'religioso" qrí ele ábsolurampn,e nJo tcn.

De tdLor ro fêz"r i""o. a CNBB n;o dêixou ouLrocrit;rio de distin\ào.nLre ar r"li8iôês. spiLas,senâo o fato de que as primeiras são ,,oficiais,, e assegundas são tindependenres,' sem atiás esclarecercomo uma organizaçào financiada pela CIÁ pode ser"ind"p"ndente". j"ro êquivdtr a negar às ,"1 isiàe",à CaroliLa in.lusive qurlqu"r primdzia nas quesràesreligiosas, e em reduzir rodâ diferença a uma ques-tão acidenral de orden sociat e .;urÍaica. t..u.a:resulta em legitimar as seiras do ponro de vistarêlieioso, restando âpênas tegiriná-tas sociar ejuridicamenre. Isto é suicídio puro e simples.

Para conpletar estes êsclarecimentos, é precisointroduzir ainda uma distinção fundanenral enrre asimples, âpropria(ào imirar iva e tragmenrária dê ri-Los ê srmbolos rel;giosos, de um tado. p, de oLcro,a alteração ou inversão propositat desses símbolos e

No primêiro caso, estanos diante do mero fenô-meno de "pseudo-religíão", q"e é o caso da maioriâdâs seitâs atuâlmente existentes. A práticâ de tais"riros" náo têm outros etieiros, senào os quê podensêr obtido< pêlos pro.edímênros vulSar"s d. "ugestàoe auto-sugestão (com toaas as sequeLas norais e psi-coIógicas que tôm esses procedimentos, quândo trans-formados en práticas hâbituais e viciosas).

Já nô sesuodo .a.", poré., tráta-§e daquilôque se podê denominar "contra-religião" ou religiãoinvertida , e isto já é algo de infinitamente maisgrave, pois não é realmente outra coisâ senão aquiloquê recebe trãdicionalmente o nome de "satanismo'r. Apalavra "Sarã" -- êm h"btdico F drrb,, shaiLansisnifi.a pxáramenLê adversário, no ç,nrioo êtirotó!ico aa expressão 1at inâ ad-versus, isto é, aquiloque toma as coisas PeLo verso ou Pelas costas O

"satânico" a que nos relerimos áqui não tem êviden-temente as habituais conotaçõe. mitológicas e fan-tasmáticas em que a palavra mente poPular,ma" signit ica -- "tecni.amente', por assim dizPr --a inver'ào p,opo-iLãl dos simbolos, dâ' Palávrás,das coisas, das idéias, dos sentimentos e, evidente-mente, dos ritos.(6)

A exisrência d" sêira' saLanistás, que até ál-gum tempo atrás era matériâ de pura fãntâsiâ en fil-;." " '.,r"..', que dêspertavan no pr;blico Jná ,êa-çào de in. rédula curios:dade. é to;" "m fato noró-rio e contundente da nossa trágica atualidade.

A título de exemplo dessas inversões rituais,todos conhecem o caso das cruzês de cabeça parabaixo que são usadas nas rrMissas Negras". Menos

falado no ocidente, mas muito conhecido no orienteMédio, é o caso das seitas aberrantes de pseudo-sufis, onde periodicamente se recitár trechos doCorão de costas voltadas pâra a Meca, que é a dire-ção normal da prece; ou se coloca uma nulher Parâ

"t"rir. u prece, postada ná frente dos fiéis, o queé pela lei corânica "ma

função exclusivâmênte mas-culina; ou ainda se realizam as preces §em a abluçãopreliíninar que purifica o crente pãra comparecer

4l40

diânte de Deus, (isto equivale, no Cristianismo, a

tomar a comunhão voluntâriámentê em êstâdo de pecadomortai).(7)

Não é necessário dizer quê a prática dos ritosinversos tem também efeitos inversos, isto é, se osritos relisiosos devêm conduzir à iltminação ince-rior, os ritos profanatórios conduzem ao embruteci-mênto da âlma, à substituição da intelisência pelamalícia, e âo ctllto dã perversão e da bestialidade.Conro atestação dos efei.tos de tais práticas nresmo nodonínio corporal, pode-se verificar o grande númerode crianças nat imortas ou defeituosâs entre os Íi-thos de mulheres praticânEes de tais "ritos".

Que, a pretexco de liberdade religiosá e deigualdâdê de direitos tais coisas possam vir hoie em

dia â ser denominádas pelo mesno termo 'rrelieião"(re1ígio) quê designa os grandes edificios de 1eis,ritos e conhecimentos sacros como o Cristianismo, oBudismo oLr o IsIam, é âigo qu€ somente atesta aincon".iên.iê. raiêndo d esrupidpz. o" um" Época queparec. ansiar pelo dbr"no p LIánár pelá di"'ol r,,ãona vorâgem do nada.

A depreciação do intelecto, mesmo feita em nomedê supostos "ureios superiores" ae contrecimento, é

anti-islâmica e anti-espirituâl e. s"a essência. É

inspirada pelo apeso à imaginação e à sensoriarida-de, funções que, uma vez reprinido ou entorpecido o

intelecto, poderio seÍ freio sobre o ho-mem, revestindo-se inclusive da âutoridade que Per-tence exclusivamente ao intelecto e pretendendoditar "verdades" cuja confusão mesna já basta paracaracterizá-1as como ment iras ou desvarios.

A excusa da rrfórr não passa de um subterfúgio,q"e não é aceito nen pelo Corão, nem pelas autorida-des, sábios e espirituais do nundo islâmico.

o Corào proibe terDinântenente crer ."m razão:"Não sigas aquilo que desconheces" (xVIrr36). zakâ-ria E1 Berry, cornentando este versícu1o, afirnai "ocorão proíbe ao homeÍn sesuir aquilo que dêsconhece,quando não tem provas evidentes a respeito. Elê con-dena áquêl.s que sêguem a oJLros. mesmo a "eu. páis.sem conhec imento. . . , classificando abaixo dos ani-mais o homem que não usa de sua inteligência".(1)

Un hedith do Profetá (sobre ele á Pãz) estabe-lece: "Deus não criou nada mais nobre que o intelec-to, e Sua cólera tomba sobre aquêlês que o deni-grem".(2 )

Quanto à excusa dâ fé, é importante notar quefides, em latim, ten a acepção de "fide1ídâde", derrconstânciarl e de rrconfiabilidade", nada permitindointerpretá-1a no sêntido de umâ adesão irracional a

IV

* rnédito. originar de 1985

t+2 43

crenças insensãtas ou incertas. A virtude da fé siglni lica quê o homêm. umá vez têndo apreendiao peiarázao ê pêla êvidência und vprdád., perma.ec.,j ii.ra eIa, mesmo quando sua imaginaçào, ."u, senti,enrosou sua vontade -- para não falar de fatorês coêrci-tívos-meramente externos, como a opinião s.rp;i ;;-,pressao das circunstâncias -- o inctinarem em sênti-do oposto. Denrrô do campo cristão, u .o"..pção nã"p difêrenre, dêsde q!ê á Lêotosia ",."tá"r i.r, .;;sánLo Tomá5 de Aqurno à tr"nLe. dectara que a tá nào€ uma atitude dos sentimenros -- e muito menos dealsum impulco obscuro, inêxpti"áver e ,,subcon"cienlre" -- porên uma dcc i sào do incê iect o e dá Vonrade(3). No rnundo judaico, o vator do intetecro e dopensanento e afirmado como sinal de soberaniá inre_lectual e moral da pessoã humâna, e atesradô, entrêouEros raro", peto ámo, quê o povo judeu dêdi.á ao.rlvros e-a árrê do.debarp. qu" é tundámenrat pârr á

manu t ençáo dâ "'ioráh vivênLê,, (4).Certas expressões ârrebatádas dos mist icos

muçuJmanos e crisrào". que oro. tamám sua .É acima erndepcndênLem, nrê dê mor ivos ra.ionáis. aào pod"mser desoncstamentc empresadas pará justific;r o:f,q,:.:g inLete,r.. poi" cxpres:an ápenr.., er nodohrperbolr.o. ã Éidej:dad. do,.renr. d v-rdddê apre_êndida, mesmo âcimá € independ.nremenrê dos meios dedêscobertâ e prova que â elá conduziram ê que a sus_tpnLem no campo do pênsrmenro dis.ursivo; ái,". ou"o. finr sào sup-rior.. aos mêio" ";. -;g"ir;., j"_preciar os neios enquanco rais, ncnÍazer u.o detês sob quálquêr prpLêxro qre sêjd. Osêntido.dessas expre.sàe" ê que d verdáde, mesmormpertêrLane-rLe apreendioa, vdjê,nai- do qüê un er_tundado em razôe, "parenLem.nre lógr.a,:aajs vale verdáde que nào se sabe provardo.que deixár-sê ensánar por latsás p,ovâc. o pró_prro es(ilo hiperbolico de rái\ dêctaráçôe. êviàen-.ia que Êles veiculam hipóresps exr remadá§. quê Lo-radás ao pê da lerra ou.r modo ptá.o r"rutrarián noábsurdo puro e .ímptes. Quando sào proter;da" porrrsrrcos mu\utmános. e oreci.o têvar áindá em.onra

o gônio da 1íngua árabe para as expressões ârreba-tadas e hiperbó1icas, cuja tradução para uma IÍnguâôcidentál produz às vezes um efeito de incongruênciae desproporção, desde que a indole mais fria e ra-ciooâl das línguas ocidentâis não permite traduzirfielmente as emoções de um temperâúento nobrementearrebatãdo tal cono o dos árabes. Quando o sufi dizque prefcrê "ir para o inferno pêla vontade de Deusa ir para o céu contra a sua vontadeii, está claroque ele não está dizêndo quê Deus tênha o hábito deenviar os hômens santos pâra o inferÍo, mas apenasexpressândo, por ampliação ad absurdum, a radica-Lioade da "ua obeaiÉncia. (Que u'na expr"ssào.omoessa possa ser usadâ por fâlsos mestres para induzirinocentes discípuIos ocidentâis a prãticaÍ o ma1 "emnome de Deus" e a "provar sua obediência" indo êfe-tivamente para o inferno, é algo cuja monstruosidâdesaltâ aos olhos, mas que reâlmente a.ôotecê êrn nos-sos dias (5) ). lo mesmo nodo, quando Santo Agosti-ntro, após têr verificado que a inexistênciâ de Dêusé uma hipótese absurda, declara sua crença em Deusem termos dê credo quia absurduo ("creio, mesmo queseja absurdo"), está no mesmo ato afirmândo que acrença em Deus não pode ser absurda.

A propósito, o uso indevido do termo qatb ("co-ração") para designâr arsum tipo misterioso dã fã-culdade cognitivâ colocado acima e fora do intelectoe da razão é claramente condenado pelos nestres su-fi., cono por exênp)o Al-Chazzali:

"Há efetivâmente no coração (qalb) do homemr m olho (' áyn) qu" po"ui perferçáo. (hamám-no à"vezes dê inrêle.to ('aql), às,e,.' oe espirito(ruh).

Dêixe de lado todas essas denoninações que aspessoas pouco clarividentes podêm fazer crer que seLrárá de rêaliddde",úLLipta'. Quanto a nós. prerendêmos designaÍ expressões aquilo que dis-tingue o hoúen racional da criança, do aninãl e dolouco. Chamemo-Io portanto iÍrtelecto ('aql), se-guindo a l insuasem corrente"(6).

45

A eminente dignidade do intelecto ê da falã é

aindá reafirmada pela autoridade de Jala1 Ed-Din Rú-mi, quando d iz:

"O homem é um.animal que fala: o homem acres-centa as caracteristicas aninãis a linguâgem; essascaracterísticas são permanentes e estão ligadas aele, e o mesmo sucêde com a linguagem. Quando o ho-mefl não fala exteriormêntê, fâla interiormente. Estásemprê falando: é como

",,ra torrente misturadã com

fodo. À água clara da torreote é a tinguagem, o lodoé á ánimalidade. o looo é a( idêntá1. Nào vés quelodo e corpo pêrecem e ápodrecem, ao passo que aliflguagem, trãnsmitida pela história, pe1â ciência,pelá .ulturá, ber ou maI, pêrmane(e?"(7)'

Que diria Rúmi, enrào, êm láce das teoriás queofeÍecem uma "comunicação oão verbal", puranenteanimal e instintiva, fundada nâ memória ancestral,como forma de "conhecinento direto" superior à 1in-guágem?

Podemos concluir êstá parte com A1-Kortoby: "Osfilhos de Adão distinguem-se pelo seu inte1ecto... A

lei assemêlha-se ao solr e o intelecto ao olho. Se o

otho for são e estiver aberto, vê o so1 e percebe asformas das coisas".(8) E com E1-Berry: "o pensamentoi enrào um in<r into ndtural do honem, e pensar é a

runção e a missão da mente. os sábios definem o ho-nefl como ufl ânimal que pensâ e fala. Portanto o pen-sar é um dever islâuico".(9)

o lJonto que pode realmênte suscitar confusão --s que não deixa de ser aproveitado con astúciâ pelosinteressâdos na destruição das faculdades intelec-tuâis do homem -- é que o intelecto pode efetivamen-re corrompe.-sê e falhar.

Por um lado, ã verdade apreendida pelo pensa-mento não permanece, mas some quando o homem pára depensar no assuntot ê pode porlânro ser esquecida.ba1 a necessiaaae aa prár icá rêligjosá e nísticaqúe consolide no próprio modo de ser da pessoa aposse dá verdade percebida. Esre ; o "ênL ido. atiá.,ão rerno larino trábito. qu" vêm do vêrbo habere,,,possuir". Não basta apreender a vêrdãde pêlo pensa-

46 41

mento, É preciso transformá-la num hábito ou posseperflanêntê, e q"e só se obrêm pela renoção das dis-trações e pela concentração do intelêcto. A concên-traçao, como e obvio, inrensifica a atividade dointel€cto, suprime a pretêxto de desenvol-ver supostas "faculdades superiores". O rermo "visãointerior" uEilizado por todos os místicos, refere-sêdo êrrédo de evidén. iá permanênrê que p aL, an\adopelo intelecto, e que nunca poderia sêr aringidopelo seu mero exercício esporáaico e intermitente, esim somente pela prática volLrotária e resulâr.

Por outro lado, á possibilidade da corrupçãonão decorre de algunâ falha constitutivá do própriointelêcto, mas do simplês faro de que pensar é si-multâneamente um ato Lógico (portanto ontológico) eum ato psicolósico (portanto biológico), respondendosimultâneamente, de uma parte, às exigências consti-tutivas da verdade e, de outra pârte, às contingên-ciâs e demândas do corpo em süa insrabitidade eflutuação ciclica. Quando o pensameoro é riet à suamissão, quando ete se atém à universalidade tógicaque reflête a permanência e a universatidade do ser,ple á o "inrplecto sáo" qup corarz o homem : vêrdá-de. Quando, ao contrário, ele se deixa €nvolvêr pe-las funções inferiores e se torna escravô da inasi-nação e dos desejos, ete mersulha nâ obscuridadesubjetiva dos impulsos biôlóeicos, e é o "intelecrodoente" que homcm na prisão da mentirâ eda i lusão.

É nesse sentido, eafé e a obediância à

não en qualqLrer outro, queLei revelada podem ser, âo

taticamente e na prática, mais imporrantes doo próprio intelecto, já que o bonr funcionamenrodêpende, em últiná instância. da retidão moral

resu Iar idâde tradicionál do indivíduo.É claro, então, que umâ pretensa "via espi-

ritual" que por um lado restrinja ou desestimule ãação do intelecto e por outro excite a imaginaçãoímedianr. hí"róriâs. medianre "irua5óes incongru;n-tes, mediante uma sucessão de estínu10s desenconrra-dos), ao mêsno tenpo que aá tivre curso aos desejos

e abole qualquer rêgra moral explícitê, concorreunicâmente pârâ a sujeição do intelecto às paixões,e portanto para a eclosão da 'rrebelião" que fará dointelecto doente e nundanizado uú tirano a serviçodo ego subjetivo. Tudo isso concorre para rebaixar ohomem a um nível inferior ao do ênimal, ao nesmotempo que the dá a trágica ilusão de esrar "êvoluin-do espirituâlmente".

Y

Adecadêtrciaeofiú,seguDdo as doütriras hindus*

Os sinais próximos de uÍÍ I'fin dos tempos" atra-em hoje â atenção de muitas pessoas para e antiquís-sima doutrina hindu dos ciclos cósmicos, pe1ê sim-ples razão de que os acontecinentos a confirmam aope da letra.

Mas esta súbita populêridede de uma doutrinaque permaneceu desconhecida no Ocidente durantequêse toda a nossa civilização -- e que, mesmo dê-pdis de redescoberta pelos orie$talistas, aindaficou por mais de um século relegada ao dominio doexótico e do "oculto", no sentido pejorativo do ter-no --, essa popularidâde não significa que e1a sejahoje melhor compreendida do que ontêm, e nem mesnoque aqueles que a divulgaÍn âgora tenhan a mínimêinteüção de fazer compreendê-la.

De fato, a tendência geral é para fazer umgrânde alarde dos fatos e dos tempos assinaladospela doutrina dos ciclos, mas dândo-1hes uma valora-ção exatamente inversa daquela que thes atribuen ostextos sâcros hindus de onde e1a foi extraíaa. Emsuma, os fatos que a doutiinê hindu assinalâ comoperigosos índices de uma degradação extrêma e semprecedentes da espécie humana, são hoje apresentâdoscomo sinais auspiciosos de una era de renovação, deIuminosidade e mesmo de apogeu espirituêI.

Se é arriscado dizer qual a intenção com que se

* Novembro de 1985.Editora Àbri1 sobre

Escrito para uma publ icaçãoo coneta de llalley.

49

da

faz isso, é fácil, no entanto, constatar o efeitoque uma "ção de.se Lipo dêsen. adeid: á pronessa de

"*u r..ou"ç;o i ILSór iá raz Lom que ás pessoas se

átirem .or mdic 'acilidádê, e dL; com unr Lertá vo-I úp ia , na vordsên da de. ad;nc iá .

o árgdnento (orrenlê de quê rooa Ôxrinçdo conç-litui áulÔmatLcámênie uná rênova!ao e Jora de Propo-sito, porqu€ o quê está e..ioeo é a melhor qúaLidâdedo que sc promete vir depois, -e não o simPles fatoda múdançá. Quando um homem estâ para norrer, o^unr-co indício positivo de que e1e têra una exrstencram€lhor no outro mundo reside justamenEe na santidâdede sua vida terrestre e na Piedadê corajosa e hon-rada com que e1e enfrente a aproximaçao da morte, e

não no simples fâto de encontrar-se moribundo, que e

algo que tâúbém acontece aos tiranos e assassinos

'Fm quê isLo consLituá molivo de .onl:an!a na "aIvá-!do dac suas almas. Pior êinda. ninguêm dira que

uma mort€ desonrosa constitua uma garantia dessaordem, n.m que á no5sa civilizá\ào. do rêregár ac

religiões e a cultura trádicionais e ao atirãr-secom vorúpia aos piores desrcgrâmentos e âo culto das.ais gràs.eiras Pscudo-divindades já concebidas,estei: morrendo disnãmente, con digni-dade, sem abdicar um mil ímetro que fosse dos seusp.i..ipio", leis e costunes, os povos in<lieenas que

.r, .ã"*" extinsuiu cm na<la memorável bánho de san-

cue.A doutrina hindu dos ciclos cósmicos abrange

muito mais do que un cicLo de civilização, como o

nosso; ela se estende por toda a duração do nossorundo. e rss:naIa erâpas ê mudar'a" oer iód icas que

transforman nào ap"nas a5 ê\trururâs ço'râIs. Ps'-quicas e culrurais, ma. a propria isiononia oo pla-.,"tu. e" .t u*uau. t',.aa.ças de erâ" ascrorógicas (de

rouro a Áries, de Áries a Peixes, de Peixes a

equário), são apenas uma fração das mudanças cicli-cas rnaiores âssinaladas pelos hindus. As eras âstro-lógicas, de 2160 anos, sucedem-se por simples mudan-

çãs culturais e sociais, lentas e -- para a mâssa

ãa humanidade -- quase imperceptíveis a cLrrta dis-

Lan.;4. 'em á.onPánhdr-se d' alL ra\oês nàiores "n..caia física l.to nào á'ontê'e con as nudánça' do'

srandes ciclos assinalados nâ doutrinâ hindu, como

"s fins dos "ciclos polares" de 21 600 anos, que

marcan alteraçôes profundás na constituição nêsma da

h.,mãnioad". e que "ào aconpannado' dê calâ' Iismo" ê

",',.". t".;m"no- de ord"m ríti.a qun alrnran signi-ficativâmente o panorama da Terra Os melhores estu-diosos do assúnto, como Saint Yves d'ALvevdre, Rene

cuénon e caston Georsel, são unâni'es e' demarcar as

:media.óes oo rosro rêmpo dô 'nrêr ranrlroa" ,,, àe""". t'L i. ro. Polár'." Íeróm"n' Lrê srdroê"proporções, perto do qual a simples oudança de era

astrológica é co.o ,r. rabisco de üm sarÔto no muro

de um temPlô que rui.eorele" o.e inLerprêtám oc a!orrecimêntÔs ço-

ciá;s dá no.'a época à tuz da ruoança de era ásLro-lógica cometem assim um Pequeno erro de escalâ' que

ooãe arLerar sub.Lán'iálmenLê a v:"ào das 'ojsa"' de

modo quê '3to5 que êvid"n iám o ê'goramento roLá1

das possibilidadás humanâs mâis báixas, prenunciando.reti,amente also como uma extinção, pÔssam ser vis-tôs Lono Promi5soras novidâd's'

-á.e á icLo. é pr".:'o diz'r qu''m rosso.lerPouna nulr ipli.idáde d" ci' los ' 'smicos ' hr'Lor"o"está cheeando ao ser-r fin, prenunciando uma mudança

de muitã maiores proporções do que um simples arra-nhão na cros'ca das instiEuições do nosso modernÔ

o.ià.",. i.a,',, iaI . máreriàli'tr' De lêto LÔin' i-d€m por volta desta época o encerr'amento da Era de

piscàs, o encêrranento de um ciclo polar de 21 600

,;;; .' . encerramento dâ rdade do Ferro (era da

decadôncia iniciada aproximadamente em 4450 A C )'iara q"e se conpreenda bem o que isto quer di-

zer, é p.eciso saber que a doutrinâ hindu -- como'

â1iás, todas as doutrinas tradicionâis -- eflcâra o

deseníolvimento têmporal da espécie humana como um

procês50 de quêda proBrês'jva. que dê inrervalo. a

i"i..,"r. ê susrddo poi uma inte'v'n'ào Providêncialaos céus, com o surgimento de um Avatara ou Profêta';;;;;;,;".. até certo ponto as Possibilidades espi-

50 5l

rituais anterior nunca poder etevar ahumânidade ão nívet pieno de perfeiçào espirituá1 deantes. Dentro do ciclo final da Idadê do Fe.ro, osurgímento do Cristianismo representâ uma dessasreoova,,õ"". _cneBando porranro ao "eu tínal. ágora, oLêrcêiro e ritrimo p"ríodo da toade do rerro. já emsi nesma considerada o auge da decadência após asIdades do Ouro, da Prata e do Bronze, que tiveramdurações bem maiores que a detá.

No que diz respeito aos indicios que assinalamo fin da ldade do Ferro, rais como aparecem nâs dou-trinas hindus, eles não são muiro diferenres dasprofêcias contidas no Apocalipse dê São João refê-rentes ao encerramento do cicto Íenor constiruídopelo período de vigência do Cristianismo. para que oleitor possa por si mesmo estabêlecer as devidascomparações, damos em seguida um extrato do livrodos Baghavata Purana, Livro Xrr, St. 24 a 44, quetratam do pânorama humano e social desse período:

^ ."Durante esse período, os homêns têm a inreli-gencra curtá e poucos Etes são glurões,libidinosos, indigentes. As mulheres são Iiberrinas

"Os campos são devastados pelos assatraoteslivros sacros são profanados petos heréticos.

IAs mulheres são de talhe exíguo, mas "orazes,de una fecundidade excessiva, sem pudor, taaarelandosem parar, ladras, rurvas e de um grande descarâmen-

I'o comércio estará nas mãos de gente miseráve1,de ment irosos convicros. Mesmo nào sendo em caso denecessidáde. as ocupaçõ"s iIícitas serào considera-

"Os honens abandonarão pais, irmãos, amigos eparentes, serão dados à luxúria e às areições iiíci-

"os Shudras (homens grosseiros e materiâ1is-tas), disfarçados em ascetas, viverão deste disfar-ce, c apt ando oferendas.

"os homens terão a alma sempre perturbada; es-târão âtormêntados pela escassez e pelo fisco.

"A riqueza substituirá vântajosámêntê â nobrezade orisen, â virtude, o mérito.

"No câsamento, os homens só b"scarão o prazer,e, nos negócios, o lucro Iácii.

"o objetivo ae toaos será encher a barrisa. Ainsolenc ia passarâ por sinceridade.

"A lei dos herér i.os preváLecerá. Toda. ás .âs'tas serão parecidas com a dos Shudras.rl

Nesse panorama, os indícios da desagregação --a sexualidade decadente, os shüdras disfarçados demísticos, á hêresiâ proposta como religião, a inso-lência tomãda como "sinceridade" -- não são por aca-so os mesmos nos quais os teóricos da "Era do Aquá-rio" vêm os mais elevãdôs sinãis de uma "renovaçãoespirituâ1r'?

Eis o que diz ãquê1e que foi talvez o maistenaz estudioso dâ doutrina hindu dos ciclos nosécu1o xx:

.Para os cabãlistas, a "Era do Aquário" é a erado "Princípe deste Mundo".Alguns, entre os hippies,conparam-se aos primeiros cristãos... Mas os 'rfilhosdo Aquário" esquecem, ou isnoram que... o próxino"Fim dos Tempos" será imediaEamente precedido peloadvento do Anticristo, que os cabalistas identificancomo a "Era do Aquário"..., reino efêmero porquê,segundo o Apocalipse, durará somente quarenta e doisfleses. . . os pobres hippies nutrem muitas ilusôesquando imaginan representar a vanguarda da humanida-de futura, quândo en realidade são apênâs os produ-tos desenerados de um mundo corrompido e próximo da

52 53

ruína."(l)Evidentementê, os que na décsda de 70 se deno-

mi-navam hippiês são hoje os fiesmos que lotân- osashraEs dos pseudo-gurusj e se submere; á todo gêne-ro de experiênciâs degradântes, que passerÍr poÍ irprá-t rcas asceti.ás"

VI

Consideraçães*

l

Apreceealei

As precês dirigeÍn-se ao "ser psíquico" da comu-nidade !eligiosâ, e someote através dele à "influên-cia espiritual" cêIêste, que orienta esse ser oumsentido unificante e escendeÍrte; em outros têrmos,dirige-se ao "divino'r êtrevés do "humano universali-zâdo", eo "universal" através do "gera1". (1)

Pêre o crente, é e aceitação, a obediôncie dasregres da religião que o coloca em harmoniê com êttâlme de comuüidade", de modo que suas preces possemchegâr eo céu; assirn, as restrições que a obediênciâpossa impor são compensadas pela Gráça que respondeà sua prece. (2)

É aaí que provém â êstrite necessidade da 1eireligiose. Esta polariza os focos de consciênciá --corno fâchos de luz que se dirigern a um corpo dêvalores cuja uÍliversalidâde reilumina, Por sua vê2,âs consciêÍrcias individuais; reitengrando-es nafinalidêde de existência. A 1ei destacâ certos valo_res que constituem a "personalidade" esPecíficâ comque o tlomem Universal se aptesentâ nessa reli-gião. (3) 0s traços essin iluminados oferecem-secLsros eos olhos de todos os crentes e tornám-se,

* Notas distribuídâs ê alunos deposta a várias perguntes. Dezembro de 1985.

54 55

Por sua vezj guias pará fâc ilitâr ê inrpgraçào doscrentes na reArá.e, ássim, a pêrcep§ào do universal.5ej áo rnves de impor regras, a retigião dei_

xasse todos " à vonrade", oferecendo uma,,liberdâde,,constrruida simplesmpnre da ausência de teis expl[_citas, o foco de áLençào de cadá qual, em vêz de secrrrrgrr ao ee,r a1 (" por meio deste áo universat),irie na direçào dá suá diterença individuat (Dortan_to,

^do quanL irar ívo). Assim. o único ponro de con_

vergencra a unificar a comunidade só poderiá estarlocalizâdo no íponto cego', deixâdo no "u"tro po.todas as consciências (ou rnelhor, ínconsciênciàs)divergentes, e que consrituíria assim o,,niojo in_conlessavel" desde o qual á comunidadê poderia sermanobrada para finalidades que nada tôm àe universale que ela ignoraria comptetamente. A unidade já nãose^ Íária pelo "ponro mais atro,,. isro é, peIã cons_

de vatores univêrsais, nas pelo ponLomais baixo, isto é, pela inconsciência- ..r". ar"finalidades da orsânizáção, na conversência de rodasas inconsciências. lo invés de um;máxino aivisor

A redundância aparente esconde una inrenção queapela ao que existe de mais essencial e profundo navocação humana.

cornun", teríamos "mínino múrt iptô comum,, queabarcâriâ a rodos no foco da inconsciência gerat. Éa tecnica da contra-iniciação. (4)

fa que sua natureza impõe, e em nenhuÍn momenro nemcircunstâncias thes é oferecida a atternaEivã dedizer Ínão" e nem mesmo a possibilidade de rer dúvi-dás ou hêsiláçõe" por máis teves e passageiras quesejam.

Se um ente "fâlharr em sua rârefa, estâ falhanào represenra odtra.oisá senào a supressào pura esimples da sua existência individuâI, como se vê,por exemplo. pelo Íáto de quê os spres viventes, aosquais foi por suá naturêza ordenado viver, cessamde existir tão togo essa vida sê interrompê por uminstante, não podendo de maneirâ alguma estaremmortos por un lapso de tempo e volrar à vida enseguida. (6) Do mesmo nodo, uma substância química,cuja natureza é aeriniaa por um certo asregâdo dePartes, ou atomos se quiserem, cessa de existir en-quanto tal, tão Iogo essas partes são dispersadas eintegradas - a outros cor.pos circundantes, não poden-do r:ma mo1écula de carbono ser desfeita rê fe ita à

Acontece que todos os entes serven a Deusj eâ formá párLi(ular que assume esrp serviço pm

caso e deterninada pelá sua narurÊzá. A pedráporquê esta é s"a natureza, determinada pore os astros giram em torno do Sol porque Deusesta órbitâ cono um destino inexorável ads-

à natureza dos corpos do sisrema sotar.Àssim, todos os entes são subjugados pela rarê-

Deus,

trito

.. Podemos, porranto, concebêr qual o"religião" -- e, portanto, de ',prácesse"

t ipo de

poge

anuncia por rrás da,,permissividade'. ê do nu,"iri"rocontemporaneos.(5) Ea roligiào e o govêrno domanêjo inconscienre das massas peto Anricristo.

2

A obediôncia e a

Se Deus é Onipotente.dos estão sob Suas ordens,tet a exortação de,,servirexiste alternar iva? Nãofogo queime e a água molhe?

forEâ àuÍrana

e se todos os entesquâ1 o sent ido que

a Deus", uma vez quee isto como pedir

Toda "fa1hâ" implica, portanto, a dispersão daspârtes cujo agregado consritui o ente e que por ocâ-sião dã falha são integradas a outros entes. A dê-sintegração da forma de um ente no insrâÍre da ces-sação da sua tarefa não impede que as partes, isola-dâmente cons ideradâs, cont imlem desempenhando cadaqual a tarefa que lhe é própria, integradas porémnum our ro organismo ou sisrema.

56 51

Na decomposiqào de um enLê, ás parres sepára-das, ao serem inregrâda" srsLema continuámcumprindo essa rarefa isolâdan€nre, isto e, num ní-vel de inregração mais baixo. por eremplo: as cétu-1âs dispersas de um.ào morro DodeíÍ conrinuar vivpn-do nos vermes q,,e as aevo,.., nras já nào havêráên( rê p tás u ."o.o"nr,,ào, á i;rêsraçào numá unidádêsupe,;or e numá torma "6sss 6"norlnada "cão".

Em outros termos: â obediência prossegue, rÍlas aforma individuar desapárece. Tudo o que existe obe-dece a O-us. más nem (udo o que exisrê pêrsevêrgidênt ico na existência

9" *.* môdo ocorre com o homen. sabemos queêsLê e um (ompjexo q rê inregrá pártes -- ou láixas'- PerLen(entec ànalogicamenrê aos trêç rernos dánaturêza: minerai, vegetal e animalt as quais sãocoroadas e integradJs p"tá. tunrà"' proPriámentehurnanas, que dpr,nem á roima -- ricicá e êxicrenLiál-- da nos;a espécie. Essas 6ui*," disrõem-se hierar-quicamente, e no insraote em que cessa uma das fun-çóes supêriores, as infêrio;es cofltinuam impertur-bavelmente sua tarefa, mas fora desse todo integra-do. por ex€mpto, quando cessam "s

funções propria-mente humanas -- ting"agem Lósica € oPção voluntária-- as Íun5óes animai" J",eior " intlinros --conr inudm pxi,rindoj más opprênd; lorâ dos quádrosdeLprminadô" p.lá5 tun\ô.. humana.. E, quándo seextingue a vida ánimal e vcgetativa, os componentesninêrais do corpo humano cãnservao inalteravelmentesuas propr edades. ás quais .onrjnLam,. porránto.dê\empênhando suá tar{.ta. só quê r'gorá ja nêo sob ocooando de una vontadê humana nen dê um impulsoanimal vivenre, mas sim ao sâbor do jogo de causasque .srêja em ação no oedd\o de Lerrá onde o cor poestpjà sêpuIrado.- Assin, o ênte individual sêrvira â Deus -- istoe, obedecerá à sua nature,a -- em qualquer cir-cunstância, nâs dêntro dos linires e do níve1 defi-nido por natureza. Se L,Í ênte peÍde ápropriedâde humana, continuará servindo â DeusJ másja não como homen, e sim como animal, sujeito às

58 59

leis do nundo animal; e assim por diante, descendoaté a niflerâIidáde, cuja obediência é exemplar aoponto de â alma do hoÍnem perfeito ser sinbolizãdapor un cristâI.(7)

Dessê flodo, o que se exige do homen quando se oexorta a rrservir a Deus" é que não o fãça sêgundo ojoeo de tensões e repuxos câusais que definem aêsfera animâ1, vegetal ou mineral, mas como homem,segundo a Íorma propriam"nre humàna de obediência, á

qual implica os três fatores que sesundo o corãodefinem a condição hunana, e que são a iotetigênciaobjetiva (capaz de ápreender o absoluto e o relati-vo), a vontade livre (capaz de optâr pelo real êrejeitar o ilusório) ê a Iinguasem 1ógica (capaz deabstração, isto é, de superâr a particuláridade e

êlevar-se ao universal). Quãndo se exorta o honem âçervir a Dêus, a êIternál ivá á que esca exortaçào s"opõe não é a possibitidãdê de que o homem deixe deservir a Deu§ de uma forma ou dê outrã, mas que eledeixe de ser homem. Em outros termos, que ele Passeá sêrvir a Dêus por ouLr05 mor ivos e modos que ràoos propriamênte trumanos, já que o duro sono dos mi-neráis e o jogo .e8o do" insrinros animais são Lam-bén, a seu nível, dererminaçôes dâ Naturezã e, por-tantoJ sêrviço prestado a Det1s.

À intelisência humana é a intelisência hümanaporque pode conceber distintos graus de relatividadee distintas modalidades de reflexão, direta e indi-reta, do âbsoluto no relâtivo: a vontade livre é avontãde livre porque se "ê aiante de urn n;mero inde-finido de álternativãs e pode escolher aquela quenelhor reflita â absolutidade de Deus na naturezadas coisas, dentro de um contexco pârticular e deuma contingôncia vivida peta sua individualidade. Alinguagen lógica é a linguagem lógica porque tem a

possibilidãde da contradição interna e porque pode,pela coerência do discurso, refletir â Unidâde divi-na e, portanto, reportar-se ao Infinito pela perfei-ção da forma finita. Somente â obêdiência por essestrês canais é propriamente humaná, e somente essestrês canais conduzem à ideotificação do homem com a

Vontade do Céu, como se vô pelo preceito cristão deqúe ning"Ém vai á Dêus ex.eEo por Jesus, e pelo ha-dith: "Ninsuém encont.a.á Deus "e prinPiro não riverencontrâdo o Profeta.Í Em ambos os casos o que sedizê que a ascensào à divindaderealização da perfeição do estado humano, ou, em

outros têrmos, que os Grandes Misté!ios são precedi-dos pe los Pequenos Mistérios.

o célebre hadith -- "Meu escravo não cesse dese aproximar de Min por devoções voluntárias, atéquê Eu o ame..."etc,, contém de modo sintético todasessas distinções, ná mêdida en que o "aproximar-se"inplica a distioção dô Absoluto e do relativo (inte-ligência), ou "não cessar" designa a concentração(vontaae) e a "prática voluntária" deslgna prêclsa-mente a recitação ou dhikr (linguagem).

Do mêsrno modo, pode-se entender a obediênciaIivre, inteligente e voluntária, ao realizâr a Per-feição da "servidão" transfoima a servidão em "ami-zade", cono se vô pela sentença dê Jesr-rs (" Não voschâmarei mais senão amigos"), e, tâmbém,pela forma comum das pâIavras "santo" e "amigo" em

r íngua árabe (rraly).Segundo todas as doutrinas Erâdicionâis, o es-

tado humano é condicionar e pode ser Perdido. BudâáÍirma que um nascimenro em forma humâná á,m e,"nr"tão precioso e raro quanto o seria a coincidência de

uma tãrtaruga, num Iugár qualquer do Ocêâno, Iograrpâssar a cabeça por uÍna argola atirada em qualqueroutro Lugar do mesno oceano. E aliás, basta a mãisleve comparação com as outrâs espécies animais paraconstatar a insignificância n"mérica da espécie

As trâdições extremo-orientais estabeleceín vá-rias gradações de distinção entre niveis não-humanose infra-huflanos de existência, gradações que sãoexigidas pela doutrina dês transmigraçàes. Más, Paraas tradições ,onoteistas, todos os estados inferio-res ao e§tâdo humano constituem, sen distinção, o

"inferno", o que a1iás é fo.çoso pela etimologiamesma da palavra,

preced ida pê la

E, do mesno modo que nenhuma tradição desmentê

a Oniporência dê Deus, á qual rêgê mesmo o" êstados,.,".""i". âssim tâmbém nênhumá postJIá.4 conquistade estados superiores Íora da unica via que e a

idpnrifi.a(ào com o Homen Perfeiro ou ProFetá, c á

reálizaçáo da plenirude dos trés árt ibuLo' humános'Vê-.e por ai o quanro e moncrruosá â perspec-

riva oue. sob o rótuto de "suÍismo", afirma a supe-

'i"'i;â.á oa ooedjância coprciEiva -- idenriÍicán-do-a com a per r"içào --. e identili'a a "verdadeiral;berdádê" com a "ausáncia dê alternaLivá", o que

implicê â de"istáncia inicidt da pertêi\ão humana e

a t"sca ae uma forma lateral e forçosamenre inferiorde obediência, a qual, não podendo ser â dos bichosnem â das pedras (nos quais un homem não poderiatrânsformar-se conservando, ao.mesno temPo, a formaexterjor humáná) .ó poderia ser a dos denônios, ês-tes obviaflente também são "servidores" â seu modo e,obviamenre, nào tâm álEernáriva, senão obedecPr e

concinuar <omo demónio, âre o lim dos rêmpos, de vezque, abaixo d.Les, nào há mais nenhum níveI ontolo-

"i." ""t, o oual possam cair. oaí que o Nadá, paraãr.., '"i, a rinica e'pé.ie de alívio concebível, mas

o Nãda não é nada.(8)

3

A farsa do "inconsciente Pessoal"

Que o homem seja presa de têndências destruti-vas -i animatescas ou mesno diabólicas --, as quaisàs vezes atuam por meios inconscientes, e que sejanecessário expor essas forças obscuras à luz da

consciência, para reprimi-Ias ou canalizá-1as segun-do o caso, é algo en que a maior Parte das correntesda psicologia moderna concorda com ãs doutrinastrádicionai;. Melhor dizendo: é algo que sempre foidiEo pelas psicologiâs tradicionai". e que ás esco-las moàernas'copiarãn, atribuindo a si o mérito de

60 61

uná descoberta que não thes pertence. Mas, para pio-rar as coisas, a cópla não foi fiel: a psicologiamoderna introduziu na noção das forças subconscien-t"s una êntase peculiâr, e ranbém estabeieceu (erL05modoc dê lidâr .on êssas Éor!as! com a' quais aperspectiva tradicionâI não pode concordàr de manei-ra âIguma.

o ponto Iundánen(ál dê dis.ordání;a é que a.escolás nodernas, com Freud à trente,lor\ás incons.ienres infêriores como perLencen(es à

alma individuâl, ã sêrem reconhecidas como tais,Iassunidasi'e, em sêguida, "sublinadas". Alguns psi-cótogos chegam forças a "verdadeiranaturezarr do homen, apenas encoberta por uma finacamadâ de proibições e tâbus culturais, que serianec"ssário retirar para restabelecer a sáúdê ê á

naturalidadê; o p.óp.io Freud, evidentemente, nuncachegou â tâis êxagerôs.

Do ponto de vistã tradicional, ãs forças infe-riores não pertencem de nodo âlgun à psique indivi-duâ1 humâna, e se um homem as assume cono conponen-tes dê suê inorvidualidade, ou dá suá pessoa, estásimplesmente se deixando dominar por elas ê se re-baixando voluntariamente ao níveI do animalesco oudo diabó1ico. Se tais forçâs, umê vez ássunidas comose faz na psicanálise e cm outros tratamentos domesmo gênero, poden en seguidá ser sublimadas ousociâIizadas, de mánêira que o animá1esco continuepresente r mas sob forna disfarçada e socialmenteaceitávet, isto só é possivel na medida mêsmâ em quea própria sociedade à qual se procura adaptar oindivíduo tem also de ânimalesco e de diabólico. Háunã diferençâ radical e inconciliáve1 entre a subli-mação-socialização! ta1 como a entenden a escolafrêudiana e seus similares, e a efetiva vitória dohomern sobre as forças inferiores, tal como se reali-za nas escolas espirituais das tradições, por .éto-dos que nada têm em comum com os de quaLquer psico-terapia modêrna. Essa diÍerença é " .es.a que exist€entre um animal feroz adornecido e un animal donés-tico. o primeiro nostrará as garras tão logo dêsper-

Segundo as doutrinas tradicionais, â posse deuma almá individual -- isto é, dotada de uma foÍmaprópria e ditprente em Lada caso -- é uma caracte-ristica exclusiva da espécie humana. As demais espé-cies, aninais e vegetais, têm apenas uma "alrna cole-tiva", denominada seralmente o "gênio da espécie".De modo que, nessa perspectiva, somente aquilo que éproprianente humâno -- isto é, caracterizado pelostrês atributos que defineo o homem: inteligênciaobjetiva, vonEade livre e linsuasem -- pode ser re-conhecido como pertenc€nte à atmâ individual, tudo omais provindo cie um residuo dá animalidade no homên,resía"o este q"e é por sua própria natureza coletivoe impêssoáI. A presença de quaisquer elenêntos áni-malêscos ou diabólicos no homen deve ser vista sen-pre como uma intrusão, e o invasor deve ser expulsopara que a alma individual recupere sua integridade.Qualquer tendência inferior, lonse de pertencer aoâmbito dâ própria alma, já;. poÍ si me.mâ, um

siná] de decomposição dã alna, dê sua desagrêgaçãosob o impacto de forças psíquicas estranhas e inu-manas que ultrapassaram a sua capacidade de reaçãoconsciente. Portanto, assumir essás tendências comose fossêm próprias da individuaLidade (sem contar aaberração dê considerá-las a verdâdeira natureza dapessoa), assumi-1as ao invés de combatê-las, é unaverdadeira inversão do processo de cura da a1na.Equivâ1e a colocar a consciência a serviço da des-personalização. do homem; aquele que se entregâ atais experiências torna-se vitina inerme e parado-xalmente satisfeita das influências desagregadoras edesumanizantes que atravessam a sociedade atual comorâ i adas de ventos furiosos.

Na perspectiva cradicional, o que o homem temde conscientizar não são supostas forças inferiorespróprias da alma, mas, justamente ao contrário, fra-quezas de uÍna alma que, sem deixar de ser hunana,pode no entanto ser invadida e dominada por forçasestranhas. oaÍ que o conhecimento da própria almaseia, na perspectiva trâdicional, una consciência

62 bl

agudâ e permanentê da própria fraquezá -- e, porran-to, umã busca constanre de apoio nas verdades uni-vêrsais --, ao contrário do que ocorre em ranraspsicologías modernâs, onde o suposto ,,autoconheci-mento'r de forças ânimalescâs e diabóticas produz umaautosatisfação estúpidâ e pretensiosa, que já é, e.si mesma, also dê animatesco e diabórico.(9)

4

ttudiração

Existe, hoje em dia, muita conÍusão a respeitodo que seja oeditação- Em geral confundem-na conáI8um êsLêdo de quietude e repouso inLerior, queantes constitui um simples ,,retâxamênto,' (Íelar).

Á confusão é propositadamenre alimenrada pororganizações contra-iniciáticas, que procuran ganharâdeptos _mêdiante o apelo à busca de um arÍvio fácirpaÍa angust ias vulgares.

Meditação é uma operação p€Ia quat a menrê,partindo de dados firmes da doutrina, escapa aoserros e volteios anárquicos do pensanento vutgâr,"ditando-se" uma I ição sobrê un ponLo de douLrinâ. AmedrráÇáo e meio presa. neio tivre, de nodo a ,,re-conduzirÍ suavemente ao fio central o movimento damenre. Seu exercÍcio pressupôe duas condições: (a) oconhecimento dá dourriná, e tamUém ao" .írboto", q..perínitem pela analoBia "rêcuperarí para o rema cen-tral êventuais movimentos laterais espontâneos darnente; (b) uma técnica de prece e conceniraçào, queestabelece o fio continuado do rema.

A meditação é circ"tã., ou antes esférica, nosentido de que todos os planos da alma são convoca-dos a intêgrar-se no tema central, constituindo unatotalidade harmônica q,re é em sua conpletude unairago mrndi, portanto uma iúago Dei-

l A meditação é uma operação do pensamento(e, portanto, da ringuagem), não sendo possivel con-irndí-Ia, de un Lado, Loa esLado5 propriamente .ontemplativos, sileociosos, aos quais justamente elaconduz e para os qLrais Em árabe, a mesmapalavra que designa "pensar" sisnifica ""mediEar":fikr, que é ,.Lma operação complementár âo dhikr (rê*citação, concentração). o fikr recordã ápara que o dhikÍ recorde Deus.

2. A meditação ó essencialmente ativa, nosentido em quê a vontade deliberadamente conduz ospensâmêntos nã d ireção certá.

3. obstáculos .e"taii que podem inteÍromper aneditação (cu1pas, imaginações compulsivas) seriamobstácu1os muito mais graves a um estâdo contempLa-tivo puro; a mente, que não está treinada pela medi-tação, não â1cança ta1 estâdo.

4- As culpas € temores devem ser removidosantes dá neditação para não cortarêo âbruptánente oseu fio, donde se conclui que sem os ritos prêlini-nares de purificação a mêditação é impossíveL.

5. Muito nenos deve-se confundir a meditaçãô,seja com a oração, sejâ com a recitação continua(prece jaculatória), e certamente e1â náda tem a vercom estados de "ben-estar" mêrânente auto-hipnóticose com um desfile dê bêlas inâgê;s pela mente. ( lO)

5

Passividade

Em certos mêios, Iouvâ-se nuito, hoje em diarrpa.sividade", que 'e supàe represenLaruma espécde suna das qualidades propriámente femininas,opos j çào à "aL iv idadê" mascu I iná .

ie

64 65

Iais oposições, como se apresenraÍn no Linsuajardos eios "ocuttistas", são senpre suspeitas, não cmsr mesma§, e cLaro, porque representam polaridad.rsa'r- ollviân,,'Lc r;.n r.guná rêatidad- en * r própr ,,.í,e.. "a' ." ,.. q,; deias ... rá2. o quar É uo r r

nimo simplista e grôssêiro, e na pior das hipótr:scsvo rado d. ropraoan.nLe à conrusào medid.r o jog-do dup Io sent ido.

Se há (,m ponto pacífico na Tra<tição unânimc, r1

o que d€fine a postura de "homoo verdadeiro,, conro ade alguóm que é passivo en relação ao principio eativo em face da maniÍesração. O profeta -- ou oiniciâdo que, na escatá da reatização mistica, oreprêsenra,-- tem âssim uma dupla face, uma voltâdapara o C€u, outra para a Terra. A primeira face épassiva, e coÍresponde à atitude de obediência doservo em relação ao Senhor; a segunda, átivaj cor-responde ao papel de profêta-1egis1ador, portanro degovernante e chef€ militar, juiz e mêsrre. O aspectopassivo, cuja pêrteisào ã, de um tado. a anura,,ào davonráde propria em ,ace do (omándo de Deus, e dêoutro lado a Ibrancurarrou purczá da inteligênciaaptá a refLetir sem átterãção a verdade, correspondeefecivamente a um aspacro, por assim dizer, femininoda perfeição, e por isto ele pode ser r.epresentadopor uFa mulhpr(ll). O Modeto, npsLe caso, é a SanraVirgên -- sobre e1a a paz --, que na Crisrandaderepresenta o cume dâ perfeição humâna e no Tslam temmesmo o estatuto de prôfeta.

Embora essencialmenre feminina, a virrude daobediência é ocasionatmenre simbolizádâ por tiposmasculinos, corno Abrahão -- sobre e1e â paz.

Do mesmo modoJ a segunda Íunção é essencialnen-Le masculina, não taltândo porám rasos em 9ue aci-dcntalm€nte a virtude do comando proíétieo sejaconcedida a uma flulher, como no caso de Sta. Joana

Dentro do Ternário dos nundos -- Céu,Homem -- e denrro dos ternários derivêdosprolongam pará denEro do mundo humano (corpo,espirito; álná sensitivâ, aimá volirivâ, alna

66

a1ma,inte-

lectiva, etc.), a atividade e â passividade podemcombinar-se de muitas maneiras, sendo que, quantonênos univêrsa1 e mais particular o nível de apli-cação, mais é arriscado atribuir uniformemente apãssividadê ao fêminino e a atividade ao masculino,atribuição esta q"e só tem validade plena ao níveldo Homefl llniversá1, tendendo a ser substituida, nosgraus inferioresJ pela multiplicidade de combinaçõesque constelân a gamá todâ dâs possibilidades indi-v idua is.

6

Pedantisoo

.Hoje em dia, cada qual julga-se no direito derotulâr como "pedante" o emprego dê qualquer palavraque e1ê particularmente não conheça, ou com â quaLnão esteja pessoalmente habituado.

Como são por definição os mais ignorântes quemignora o maior número de palavras, o vocabuláriosociâlmence admicido restringe_se dia a dia, aomesmo tempo que proliferan os termos de 8íria, ossons inarticulados e as corruptelas de paLavrasestrangeirâs; e como todos estes termo§ dePendem demoda ê são portanto de cuÍta duração (sem contarainda as gírias puramente Iocais, que testringemainda espacialmênte o vocabulário), venros que acomunicação de quaisquer idéias se torna a cadâ diâmais difíciI. o crivo de cIáusulas restritivas, cadavez mais apertado, acaba por fazer com que mesmo aexpressão des idéias mais simples e pátente§ setorne un desafio dp gigânte, a não ser pará quêmres tr inje voluntarianente seu público.

A inveja, o cornplêxo de inferioridede, o narcl-sisno ê e tirânica auto-afiÍmação dos mâis ignoran-tes e grosseiÍos toma o lugsr da ciência e da cul-tura, para não fslar da sabedorie.

De mero recurso de crÍtice ê correção estilís_

67

ticâ que era, o rótulo dê pedantisno tÍansformou-senum in;trumento de opressão que faria inveja à pro-paganda nazista, e prênuncia, hoje, o reinado doSupreÍno Imbecil, que é o Anti-Cristo.

o capricho fúti] de multidões de tirânetes --cada qual julgando-se padrão e Ío na Para toda a

humanidâde -- tornou-sê o supreno critério de valore veracidade. A leviandade das avaliações contrástacon o peso aterrador das penalidades qúe dêcÍeta.

Diriâ que hoje o temor ao julgamento dos inbe-cis pesa como uma espada de Dâmocles sobre todos osq". à"...u",, se não estivesse seguro de que ninguémmais conhece a expressão "espada de Dâmoc1es" e nãotemesse incorrer no crime de "pedantlsrno".

1

Lixo oeatal

o "1ixo informático" de hoje em dia produz ne-cessarianentê na psique de câd3 qual um "lixo rnen-tal" constituído de palavrâs soltas, sons inarticu-lados, associações de idéias sem nenhum sentido,trocadilhos âutômáticos, para oão falar de residuosdê pornogrâfia e pornofonia en toda a sua presençacontínua e obsêdante nos ouvidos e na me.ória.

Essa "cortina de sujeira" é um dos principaisobstácu1os à "oncentração,

q"e é "na condição indis-pensávet da prece e de outras práticas espirituais.

o "ruído psÍquico" êxcita, irrita, atrai, dis-persâ, nove e derruba o mais bem intencionado prin-cipiante.

Ele existe " é tortatecido diâriâmente pelosmeios de comunicação, pelos cartazes luminosos, pelofalatório oco dos bares e restaurantes, pelâ exibi-ção maciça e inconseqente de objetos de consumo e

de desêjo acina dâs pôssibilidades de aquisição, e

por ínais miI e urn estímulos, que Íazen do mundo

á(uál uma imaeem do intêrno. EnLre esses est rmulos,

não se deve esquecer as práticas psicológlcas per-;;;.,; q,. proctrram arrair -e rixar a aren5ào oo

indivíd;o nes'as insigniriràncias, 'omo se Iaz ná

"terapiâ" Fischer-Hof fmann.üuito" p.o"u.uÍn fugir disso -- bêm cÔno dã tri-

viá1idáde opr"ssiva dá vidá cociat -- fugindo pará o

.r,o . Uuscanao "a natureza"' Yas. por ur lado' a

natureza se encontra aviltada pela presença obsedãn-rr aas máo'rina' e LárrêzPs do mundo moderno' e Porô,,rro Iado ecsá fusá é pla mesma aIimeflLáda pelasôciedade inaurrriãt, a título dÊ deriva( ivo, por

sua vez industrializado sob váÍias modalidâdes de; i..i...,,, vernizes ídeológicos natuÍa-Iistas. A fuga rem€te de volta obsessivamence ao

Donto de Dart idá.' ô,'tlrô,, ven da sociêdddê indu.rrial, mác, uma

vez assirnilado, ele não está aqui nem a1i, geografi-

""*""i", *". ná *.n.., nâ a1mã do indivíduo E se

quem foi sujado foi a alma, é ã alma que tem de ser1impa.

Pâra limPá-Iá, á preci'o. Primeiro' nào retor-c.r o Ijxo o'as. piadas gross"iras'araceios bobos e crocadilhos quê excitan os êuromd-

ti"ro" *ai" baixos dâ nente inferior' Tambem nâo se

deve aLinentá-1o com un linguajar inãrticulado' fa1-samente "espontâneo": é preciso esfoÍçar-se para

i.ir. .1".., "om Frases comple(ás. porque a.perfei-rào da Forma atrai a inspirarao correlat Já que o

i"i'i,.; irresistivÊlmente atrâído pela beleza e

oeia intperidaoe. e já qre a lósicâ e a srámaLrca

"ào o o.incípio da integridad" do pensámênto' como a

rerórica é o princípio dá-beIpzã do di5''ursoEm terceiro lugar, é preciso tirar proveito

dessa bâse constituíãa Pela linguagen, Para dar for-na aos atos, e daí aos sentimentos, para o que a

p..." *."rá, bem como â 1ei, constitui o mais pre-cioso instrumento

68 69

VII

tloratidada 3eú Deus?*

Àté uns sécu1os êtrás, o atêísmo ere considera_do ull|e simples inorslidade. "Libertini6mo" erâ um

dos seus sinônirnos. Hoie Ials-se de ume "noralidadeleigêrr ou mesmo de ume rrmoral aBoósticarr, como coisaevidente por si nesmê ê que não necessita especialjust ificação.

Nesge contexto, s'.rpõe_se que todas ês questõesrnorais estão Íre depeüdêÍrcia exclusiva de certost'princípios" nais ou mênoa convencionais aceitospela coletividede, e que portanto Podêm ser Íesolvi-dos segundo critários unicsmente humanos, sem nenhum

uma instânc ia "divina'r.os mesmos "princípios", ecredita-se, Podem sêr

ac€itos tanto Pêlos ateus qirento Pelos crentes' Crer.ou não crer em Deu6 pâssa a ser uma questão subjeti-ve! e ser decididâ no foro íntimo de cade um, Iongedas discussões objêtivas sobrê a morali.dadê sociâ1,sobre âs quêis eIs não deve êxercer nênhuúa interfê-rência relevaate.

En suma, a moralidâde pássou da eLçadá Íeligio_se para â êsfers Puraúente juríaica, êducácional oupolÍtica, e todo êpeIo à idéia dê Deus, tornâ-se noà."o, ur" intromissão indesejáve1 de consideraçães"netafísicas" -- no sentido corrente e Pejoral ivo dapalavrs, isto é, dê elgo absoluEamenre inveriticavele hipotético -- no contexto de uma discussào que bempoderia ser resolvida inteirâmente por neios "racio-neisr', i8!o é, mediante o aPeIo, Por exenPlo, so

* Publicêdo [ro Joroal1982. Reproduzido seú

dr TÚde de 27 de fevereiro deâ1terações,

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intêres se co Iet ivo, aosqueiros, ou a qualquer

Se o crênrej apesár disso,Deus na moral idade, admite-sefaçã, e adÍnite-se isso em nome"toIerância", que, por suâ vezno, nas humâno, o que rêsulramente que o honem é melhor

sent imêntos humanos corri-out ro cricério purâmente

ins is te em imiscuircortesmente que o

de um pr inc ípio de, também não é o divi-em a f irnar implicita-para Deus do que Deus

Essa explicação é mais o,r menos correta, mascom duas ressalvas. Primeira que o processo nào 'eini(ia na Renascensa, mas remonta ao século xTTI,quândo fatos de nâturezã puranente poLítica e inter-na da Igreja desencadearam a destruição dâ imâgemcristã-nedieval do cosmos, muito antes dos descobri-mentos científicos aos quais se atribui êrroneamenteessa destruição. Tais fatos são demasiado conplexospara explicar aqui, mas já me referi mais extêÍsâ-mente a eles num livreto publicado algum tempo âtrás(l), sendo desnecessário repeti-1os aqui. Basta di-zÊr quê êles l"vám à conclusào de que está inreira-mente erradâ a concepção popular segundo a qual foio .progresso cientifico" que destruiu a primazia dâconcepção cristã na cultura ocidental.

Em segundo lugar, se a disseninação do ateÍsmofoi a causa genérica da asceosão da moral idadeagnóstica, destaca-sê, entr.e as manifestações doateismo, urna espêcificamente, que por sua força deconvicção pode ser considerada a deterÍninante daãtitude moral contemporâoea, ou pelo menos sua mâisre lêvante j ust i ficação.

Trata-se da divulgação pelos antropólogos eetnótogos, da diversidade de códisos morais nas vá-riâs culturâs. Os antropóIogos associam essa diver-sidade à variação nas instituições po1íticas e eco-nômicas, nas formas de adâptação do homem ao meionatural, nas estruturas faÍniliares, etc. Isso tendeevidentemênte a mostrar o caráter adaptativo e se-cundário da rnoralidade e, portânto, â abolir todaidéia de uDâ noralidade absoluta d€ origen divina.

Os livros clássicos, nesse sentido, são os deBronisla!, MaIino\rski e Ruth Benedict, entre outros,que se tornâram nodelares como padrões da atitudêcientífica ante as demais culturas.

A atitude de "isenção imparciaL" do antropólogoexige que e1e se limite a descrever as diferenças depâdrões morais entre as várias culturás, seú pÍonun-ciar-se sobre a superioridade de uns sobre os outrosnem sobre a verdêde ou erro de cada um êÍn particu-Iar. Restaria perguntar se essa "isenção" cria con-

Embora irremediavelmênre viciosa, êssa posruraestá tão disseminada hoje êm dia, que mesno os sa-cerdotê5 doc vários "utros tpara nào dizêr á ma"sado" Íipi" comun.) aceiram discJrir nêssê" rermos,cono se vê em congressos fiLósoficos e educacionaisonde o ponto de vista "caró1ico" ou ,,judaico,'éapresêntado e. pé ae igualdade con ourros tãntosPontos de vistá puramêntê hLmanos ê ,onrinSênrês,

catolicismo ou o judáismo fossem simpteses.olrs filo'ófica. máis ou mênos recente< e inpro-vicádás .omo o marxisno. o bêhàviourismo. â p.ica-nalise. er' . Como .e rudes"e l,âv.r ,rra mêdidá .omunentrê as religiôes rêveladas e ás opiniões indivi-

Quando consideramos que os códisos morâis dacivilização ocidentat derivam codos de â1guna fontereligiosá ou espirituat - seja p€to cristianismo,seja pela inftuência judáica, he1ênicã ou nuçu1mana,seja pelo Dirêiro Romano. que por sêu tado tambémnáo era dÊ origem "puranenr, huná1a,'ma. esrává Ii-gado a todo um complexo mirico e rírual -- podemosnos perguntãr como foi possível, em menos de trêsseculos, uma âIreração tão profunda.

Associa-se seralmente esse fenômeno à aisseni-naçào, a párt ir da Rênascençê e sobrêrudo depois doseculo xVTTT. de vários ripo< de arcísmos "cientíri-

o evolucionismo, o pragmatismo, o positi-vismo, em que se denomina o r,âdvenro dã

13

dições para uma objetividâde, como pêrece à primeiravista, ou se ela já não constitui um parri pris quevic ia todâs as cooclusões.

Na realidade, para situar-se imparcislnenteântê todos os cóaigos morais, o cientista deveria ôupossuir um outro código, inrelectualmenre superior atodos eles -- que os abrângesse e superasse dialeti-camente, constituindo-se como um eixo pernanent€ doquál derivássem como variações ocâ"ionâis -- ou,cáso Lontrárror colocár-se num ponLo de vjçra sim-plesmenre arnorâ1 ou indiferenre. À primeira hipóreseestá excluída porque ra1 alegação àe s"perioiiaaaenão seriarrcienríÍica", e de fato os antropó1ogos.járai" a adotam. Quanro à segunda hipórese, que deláto e a da maioria dos cicnrisLas, não se compreen-de cono uma atitude indiferenre poderia levar aoutra coisa senão à inairerenciação, ou seja, aencarar todos os cóaigos morais como igualmenteirrpLevantês. Em ou(rás patavrás, náo se vê como âindiferença poderia ajudar a caprar, precisamênre,diferenças.

Rests áinda uma Eerceirâ alternativa, que é adê o cientista colocar-se numa posição ativamentêantimoral ou irnoral, de modo que a descrição dasvárlas noralidâdes resulrasse em relati;izá-tastodas dê taI modo que, vistás junras, assumissern oaspecto de uma absurda galeriâ de erros, esquisiti-ces regionais e preferências arbitrárias. parece-mequê é justanênte isso o que acontece em grande núme-ro de obras antropológicas, mesmo quando o autor remuna atitude de sinpariâ para com a culturâ êm apre-ço, pois vai trarar-se ênrào de uma simparia mera-mente sentimental, que ên nada contribui para aaprêensào intelectual da validade universal dospadrões morais dessa cuLtura. f se não é para desco-brir em cádâ culcura seus valores universâis e per-mânêntes, Para que estudá-Ias?_ Se a proclamaçào do reIârivisno culrural dos

codigos morais resultou em abotir todá auroridademoral objetiva, reve ainda o domiodiferentismo moral -- ou imoral

gos fle únicâ etitude morál ecertavel,"c ient í ficá".

Porque a unrca

Com isso, não êstou oegsndo o fato da variaçãodos códi.gos morais, mas êpenas o modo ae encará-1ose âs conclusões que se tirâm de1e. Porque, se oscódigos rnorais divergêm, não ó menos verdâde quecada un dêles se :rpresênta como vêrdadeiro, e queesta reivindicação de umâ vêrdede faz parte da natu-

dos códigos morais. De modo que, de duasuma: ou estão todos errados -- o que irnplica unracondenação globa1 da inteligência humana, condenaçãoda qual não êstâria isento o antropó1ogo que a pro-ferisse --, ou então a variação mesma deveria ser'encarada como uma pluralidade de aspectos da mesmaverdâde, Câds cóaigo moral seria entào visco comouna adaptação temporal e contingente de uma Íne§maLei supratemporâ1 e, em sua essência, invariáveI. ousejar de uma Lei divina. Isto significa que o estudoda diversidade dos códigos morais teria de ser feitocomo uma aplicação psrticular de um conhecimento da"moralidad€ universaL" emanâda ds philosophia peren-nis, ou unidade transcendente das religiões.(2)Como, porém a hipótese de uma Lei transcendente cinutável está fora da esferâ ao antropó1ogo, asvariações acabam não sendo referidas a nenhum eixo

o que se acabã caindo num contra-senso1ógico que, nâ terminologiâ escolástica, seria o dadiferença de espécies sem comunidâde de gênero. Per-dendo-se de vista Loda essênc iá permánenLe do lenó_meno "moralidade", o fato mesmo da variação é abso-lutizado, sendo quê o têrmo rrvariação" á já por sireIâLivo a un sujêiro lógico que varia.

Liquidada a hipótêsê dê uina rnoral objetiva,fundâda no absoluto, a per§pectiva que restava era ade un puro acordo entre sentinentosr desejos ou in-terêsses huúanos, individuais ou grupais, e é a istoque se rêduz o conceito atual de noralidade. Essêconceito, por sua própria natureza, irnplicará umanivelação das "preferências'r morais, e as divergên-ciâs eventuais terão de ser decididas, ênfin, por um

critério simplesmente numérico ou "democrático".de trans fornar o

dos antropó1o-

74 75

la as

para

Neste sentido, bastâ que "m

número considerávet depp<soás sê dê( ida a defender uma aberra5ão quálquer,parã que ela se torne uma preferência moral tegíti-ma, con todo o rrdireito" de ser exercida. Claro que,crescendo o número de reivindicações divergentes, asmais estapafúrdias esquisitices indíviduais e gru-pais serão admitidas como formas variantes de "nora-1idade", e o acordo final terá ae se estabê1ecer eÍtorno de "preceitos mínimos" qr," po""ám sêr a"eiEospor Lodos inditerentemente, isto á. "m torno do.senLimenL05 mais vulgares e corriqu"iros.

A discussão da moralidâde, assimi tende a

transformar-se numa simples disputa eleitoral ou demercado. Nesse panorama, a moralidade "absolutã" docrente passa a ser apenas uma preferência entreoutrâs, sem nênhum direito especial, e a defesa deDeus terá de concorrer, no nêrcado livre, com adefesa dâ honossêxualidáde e do sadismo, do abortoou do racismo. Nenhuma dâs igrejas terá nada â re-clarnar, quando seus adversários as acusarem de êstâr.disputando sua freguesia ou cabalando eleitores.

É evidente que, ao aceitarem a discussão nes-ses ternos -- mesmo que seia pelas mêlhores inten-

--r os crentes do lodás ãs religiões rêve1âdascolocâm numa posição de inferioridade, de modo

como "e diz no rplrào populár, .on râis amigos,que á religião precisará de inimisos?En todà a discussãô moral .ontenporánea, paracehá um ponto que é sempre passado em branco. Semorálidadp se prêrêndê verdadeira, entào ur

caráter absoluto, ou, se quiserem, âbsolutis-ta, faz pârte da essência mesma da moral, e, nestecaso, poderíamos pêrguntar se uma "morâIidade reIâ-tiva", como se pretende hoje em dia, constitui mora-lidade de qualquer espécie que seja, ou se "ão é

apenãs uina ausência de moralidade.É irnportante notar que o que se afirma hoje

não é apenas a rêlatividâdê deste ou dâquele códigomorâl ên paÍticular, mas a relatividâdê da nôr41.Corno ela se apresenta sempre sob formas vâriadas,conclui-se dai, num sofisma bastante suti1, que essa

variabilidade está na essência da moráI, e não ape-nas nas condições contingentes -- históricas, so-ciais, êtc. -- en que e1a se manifesta. A "isençãoimparciaL" ao antropó1ogo é uma forma de nominalismo

Quanto aos padrões noráis particulares, estêssenpre foran relativos, como sê vê pelo sentido nes-mo da palavra mores, "costumêsr', isto é, algo quepor si não afirma validade universâl, Ínas apenas umâconjunção temporária de fatores.

ocorre que todâs as leis moráis do passado, re-tativãs em si mesmas, postulavam-se no entanto conoorigioadas no absoluto, ou seja, como expr"ssões ourefLexos têmporaisj e Portânto necessariamente rela-tivos. de una verdade supratemporaL e absoluta.

Nesse sentido, a Ínoralidade, como a inteligên-cia mesma -- se rnê permitem utilizar

"ma expressão

pâradoxaL de Fri thjol schuon -- goza de umâ cond içào"relativamente âbsolutar', no sentido de uma projeçãoou reflexo do absoluto no temPo. E esta clãro que asvariacões de um retlexo não indicam a inconstânciaaa ronte ae Iuz, nas da superfície refletánre, comosoÍnbras projetadas pelo sol numa folhagem batid4

As leis morais, relativas porque feitas Parahomens. são absolutas porque não foram feitas porhoÍnens, nas apenas recebidas por estes, e sujeitasaos limites e variações do receptor. se o conheci-mento é, precisamente, â redução da multiplicidadefenomênica à unidade de um princípio, a constataçãodas variaçôes morais só teriâ sentido intelêctual seconduzisse à constatação de uma unidade PrinciPiâ1(31 e supra-hisróricâ. Más isto é exaramente o con-trário do que faz a antropologia (4), a quaL, dis-solvendo a unidade da moral numa variação absoluti-zada, só pode Ievar à multiplicidade e à confusào

Quando se fala de "projeção do absoluto no têÍn-po", isto não se refere apenas aos códigos morais,nas sim a toda a Lei revele:da (da qua1, aliás, o

aspecto moral não é senão uma parcela entre nuitas).Ém todas as tradiçôes espiriruais, a revelaçào sem-

77

pre foi entendida como uma Ídescida" de um plano a

outro -- o absoluto consentindo fâlar á lingua8em do

conLingente _-, o que imPlica uÍn cerLo cáráter Parâ-doxâ1 da verdede reveLede. Do Ponto de vista lin-guístico, Schuon, observa que, em todos os textossacros, a revelaÇão "estoura" os quadros Srematicaise semânticos de um idioma simplesmente humâno, rema-nejando_os e, de certo modo inaugurândo uma "nova"1íngua, como o Peútateuco inaugura o hebraico e o

flcorão o árabe.

dade;po.

pe 1aprime

coÍno o foran todâs as que a ântecederam, e1a é rele_tivista, o que é totelnente diferente. Ela não aPe-Ía§ tem urn atributo de relatividade, como todas,nras funde-se na relâtividade enquanto ta1. As Ínora_lidades enteÍiores limitaram-se a acelter a releti-vidade de facto, como fatalidáde inevitável da con_dição humanâ. À morâlidede atusl deseja essa relati-vidadê e a proclama cono uma superioridade de jure'fazendo seu princípio e sua bandeita.

Nesse sentido, mesmo a pelavrânão é suficiente, pois uÍn re1êtivistaoegação ativa do âbsoluto, e portantomoderna é essencialnente negativa ou

Para

A questão toda, então, resume-seque medida uma negaçÀo Pode servir

um raciocínià filosófico, que procederá entào Poruma seqência de precisôes e distinções, isto é, pornesácõe9 sucessivas e progressivanênte Particulari-,uã"á. u"" está clâro ';ue, na análise lógica como na

anáLise química, â dlvisão em Psrtícu1as ceda vezm€nores pode pÍosseguir indefinidemente, ebrindo-se

--"-'

A mora1, por isso, sempre apresentou duas fa-umâ absoluta, voltada Para sua raiz na eterni-outra rêlativa, reflexo da eternidade Ío tem-

o simplismo dos tempos modernos sPmPre sentiuparadoxo como insupoitáveI, Eêntendo liquidá-Iosupressão de um dos termos, sisteneticâmente o

iro de1es.Ore, a morslidade atual não é apenas relativa,

"re Iat iv is terrde jure é urna

e noral. idadenegat ivista.na Pergunta:de fundámento

o que quer que seja?clsro, pode-se partir de uma negação Psra fâzer

.nfim apenas para os sucessivos abismos do infinite-sinaI. o correlato moral dâ partição infinitesimalda nar.lr ia ,j a dúvida: podê-se prossegui r questio-nando c duvidãfldo indefinidamente, mas ninguém diriaqut: isto serve de base parâ "* cóalgo moral, que nãocxisEe pârâ criar dúvidas, mas para apoiar a decisãoe a ação. 0 preço noral de urna opção pefa aná1iseintermi náve I ó a perplexidade paraLisãnte da dúvida

Por olrtro lado, a moral negativa, não podêndo,por definiÇào, firmar um conteúdo moral positivo,deverá proceder por negações, isto é, por restriçõese proibições, que, por sua vez, poderão particuLâri-zar-se progressivãmente até abaÍcaÍ detâlhes insig-nificantes, o que é precisamente a tendência doEstado burocrático moderno, o qual se pernite Íegu-lãnentar assuntos que as sociedades tradicionaispreferiram deixar a critério de cade qua1.

A moralidade Ieiga, portanto, constituirá ape-na" u, "óaigo

jurídico de penâ1idâdes, e não um có-digo de vâlores positivos que sirva de base para a

decisão e, portánto, para o fortâlecimento da perso-nal idade hunana.

Daí a associação, comum entre jovens de hoje,entre "moral" e "repÍessão", pois, jamais tendoconhecido um cóaigo moral que remeta para o alto,para o absoluto e para o sentido da existência, sópodem -imaginar a ooral como um impedimento e unaâgre ssao.

Claro que a moralidade negativa, procedendo poÍÍêgaÇões sucessivânente particularizadas, terá dêtonar como parâmetro o mais beixo e o mais vil,pois, de un ponto de vista "científico", o crime éuma realidáde posiriva e a ascençâo do homem a umadinênsào rranscendente é apenas una hipótese entreoutras, matéria de conjetura e oão de decisão práti-ca. A úoralidade negâtiva só pode surgir, assim,numa sociedade que êncara o pior cono noÍmâ, o ruime o feio coúo "rea1idade", e o ben, a verdâde e abeleza como vagos ideais inatiÍgíveis, o que implicauma condenação a todo o cosmos.

79

Contraditória de um ponto de vista Iógico, a

moral agnóstica é ta.ré,n "na imPossibilidâde psico-lógica, por um motivo muiro "imPles. Na trádicionalaivisào ternjr ia do ser humâno -- corpo, alna, êsPi-rito -- a morâ1 diz resPeito especificamentê à aLma,ou seja, ao campo das emoções, volições, desejos,êtc., das quãis nossos âtos emanârn como simplesprojeções corporais.

tlinguén rerá dúvidas em compr"Pndêr que nossas

"moçôes dependpm de nossás represenLâções simboli-.r", i"to é, que nosso código .inbóli. o Pessoâl e

grupaL firma aigu,nas coisas como desejávêis, outrascono destestáveis, temíveis, êtc., e quê essa "mon-tâgem" simbólicâ, por sua vez, "canaliza" a energiadas ernoções, produzindo comportamentos.

Toda moral depende, portanto, de uma hiêrarquiade símbo1os. os objetos de afeto que colocarmos noropo da hiprá,quia decidirào, em itrima anátise, os

compoÍtamentos e reações morais secundários. Pormais iLógica que seja a escolha dessê valor supremo,bem como dos sirnbolos que o corporificam, a êstr:utu-ra internâ dã hierarquia simbólicâ tem una certacoerência lógica, pois se colocanos, por exenplo, o

prazer da vida corporal no topo, e o simbolizamospela image. de status, de riqueza, de luxúria, está.r..o qu" no degrau segúinte da hierârquia não pode-rá estar u, símbolo d. oureza vjrginal ou de abne-gaçào no sacrifício. loda a arre tradi"ional, atias.Ü.i.i"-r" na redlidádê ",oerá.cia dos símbolos, dê

môdô oue a "tiberdadp" artíst icá atuaL no spntido dê

uLjlizar qualquer símboIo com qualquer sêntido podê

ter conseqências psicológicas imprevisíveis.Toda a queqrào da morâl re"une-se, assim' na

perguÍta: quâI o nosso objeto de maior afeto, e como

o simbolizanos? A que dirigimos o maior volume donosso fluxo dê energias psíquicas?

Nem todos os objetos de afeto podem ser rePre-sentados com â mesna facilidade, e pelos mesmos

meios. Se o que mais a.amos é apenas umâ pessoa,podemos representá-14 mediânte umâ sinPlês recor-dação, sen nênhum grande êsÍorço. Mas se adotamos un

ideâ1 ãbstrato, por mais vulgar que seja, a ,,pazsocial" por exenplo, a rêpresentação disso exigiráum esforço náior. e iá nào pod"rá ser uma rêprpsen-tação merarnente subjetiva, pois neste caso o quêpâra nos e a paz para um outro pode ser o símboto dadesordem e dâ vioLenciâ, ê ássin nossa esrrururáafetivâ êstaria permanentemenre ameaçáda de conres-tação desde fora. ou seja, quánto mais universal oobjeto de aFero. naior esfor\o de obiêrividdd. esLa-ra inplicado ná sua rep,esênra,,ào, e maior o aletoque devereínos ter para nos rorivar a isso.

Isso sienifica que a quanridade e qualidáde doesforço que fazemos para representar -- parâ conhe-cer -- nosso objero de areto já é un sinal da suauniversalidade, ê portanto da suâ qualidade objeti-.

ora, se o objêto de arnor mais alto é entãoâquele que dêmanda naior esforço concenrrâdo parâ oconhecimento dâ sua universalidade, está cIãro quea única noção que cumpre essa exigência é a noção-deAbsoIuto, justãmente porquê o absoluro esrá âcina detodas as rêpresentações. Elê consritui o objeto deafeto por excelência, pois seu conhecimento dêmandao melhor de nós mesmos, num esforço concentrado queÍâz com que êsse amor tenhâ o dom de nos tornãr me-Ihores, e que portanto sejâ o único amor que, decerto modo, traz em si sua própria recompensa. Todasas demais rormás de amor não sào .enào reflexos ousínbolos desse único "ser" ao qual jamais poderemosamar ranto quanto lhe cabe por sua consrituiçãoontológícâ mesma, ou antes, por sua consriruiaãosupra-ontoIógica. Como está ascensão progressiva noaÍno., pela concentração, pela devoção e pelo esfor-ço, constitul o que propriamente sê chama ascese epurificação, todas âs fornas de arnor são necessáriâ-mente um tanto ascéticas, sob pena de não serem amorde manêira alguma.

Mâis ainda, como toda hierarquia afetiva --portanto morâl -- emana desse mesno páradigina,compreensão de todos os códigos rnorais rêÍnporâisparticulares dependê dá nossa própria proxinidade

8t

relação ao ÀbsoIuto, ou seja: toda objetividade in-tele;tuâ] perante a diversidade dos códigos moraissó se pode estabelecer "desde cima", desde um emormodeLar e tão alto que possá abranger sinteticamentetodas ês outras Possibil idádes de expressão, e nunca

"desde baixo", desde umâ simples postura artificialde indiferênça acadêmica, q"e não é mais do que

insêns ibi l idade senil.Eín suna: todos os códigos morais só Podem ser

compreendidos a pârtir da moralidade absoluta Nestesentido, os grãndes santos e nestres das várias tra-dições, uma vez tendo alcançado o estado supremo,podeo inclusive transcender as formas contingentesda sua própria tradição (seja nos aspectos rituaisou morais), pois o absoluto é o ponto central da

coincidentia àppositorun, onde as divergências dog-máticas se reábsorvem numa unidade superior. Cono

dizem os ,luculmános. "as djvereências enLre os dou-rorês dá ,;liBiào rambém são uma dáaiva dá miseri-córdia divina".

Entre(ánto, essá superá(ào das lornas só é pos-síve] após a absorção intêgral da tradição a quepertencenos, pois ninguem s€ tôrnâra um santo sem

i", u.,t". sido un fiel. Esta advertência é de restoól,ia, mas calvez seia Preciso rePe( i-la numa épocaen que ateus e materialistâs confessos se permitenpregar a I'superação dos formalismos religiosos",-co-mo se esta superaçào pudessê ser ourra coisa senao o

resultâdo ÉináI da obediencia Psrrita aos mesmos

formalisnos, e como se o rígido 1êgalismo judaiconão tivesse tido de vir ânte§ dã Pura esPiritualida-de interior, que não foi trazida PeIo cristo paraabolir â Lei, mas para curnPri-Ia.

Mohyyddin Tbn-Aráb i di "se que seu coração era"tanto a Kaâbâ do peregrino quanlo â ceLa do monge

cristão ou as tábuas da Torah ii. Mas disse-o depol§de reconhecido como un ínuçulmano exenplar, como um

santo e como a Ínaior figura do Is1ã dePois do profe-tâ MohamÍned. Não deixa de ser un exemPlo Para aque-1es "cristãos" que, em nomê dê un universalismopuramentê inventado e abstrato, falam hoje ern "supe-

rar o Cristianismo em nome do Cristo".As diferenças entre os códigos morais das vá-

riás tradições resolveo_se desde cima, na perêpêc-tiva universal dâquele quê se tornou um "anigo deDeusrr ê que pode restituir â cada variante sua par-ceLa na verdade total, e dissolven-se desde baixo'no indiferêntismo relativista da "imparcialidâdecientífica" ou no universalismo abstrato do pseudo-espirituâIismo que despreza a autenticidâde dê cadareligião ê cada código efl particular. Por isto sediz que nada é tão pareciao quanto a verdade quantoum erro, e que satã é o iÍnitador, o macaco de Deus.

Resta ainda a hipótese de, eínbalados por alSuÍrdos sentimêntalismos contemporâneos, elevarmôs aLgumideal parcial -- a paz social, a liberdade, a fÊli-cidade, o âmor humano, ou seja tá o que for -- à

condição de absoluto, e o cultuarmos em seguida Mâs

isto é a definição nesma da idolatria, e não podetêr sido para isto que Moisés queimou o bezerro deouro, que Mohânsed invãdiu a Kaaba para qüebrar osíaolos, ou que o Cristo, num de seus mais subtimespâradoxos, respondeu ao suplicante: "tor que me

.hânâs boD? só neus é bom".

82 83

IloT s

Il) üartin lings,

^ Sufi Sriüt of rhe XXth CêÊtury,

LondoÍr, Àllen & Unwin, 1971, p. 17ó.

III

l) Não se deve confundir a disseminação de tais"profecias" com á difusão honestá das doutrinastrêdicioüeiÉ -- por exenplo, vedântinâs -- sobre osciclos. cósrÍicos. No primeiÍo cnso, o que se vise écriar uo smbieíte de confusão pela prolifef,açãodesorde[ada de eÍrseios e teoores, que predigponhamâs rnagsas ignorantes a aceitar de braços abertosquelquêr farsante que thes ofereça como salvaçãoelgo que nâo passa de um simulacro de atívio, enga-,noso ê fugaz. Nó segurdo caso, a mesmâ profundidedee complexidade de doutrina impede âs simplificaçõesgrosseiras ao gosto do púb1ico vulgar, e demandaú do1êitor ums atitude interior bem diferente dessa.Conforme, de uú 1edo, René cuénon, I,ê ràgne de laq{reDtité et les Signês des Terps, Pêris, CaLlimard,1945 (chsp. )0«VtI, I'Le duperie des prophécies',), e,de outro, Gaston Georgel, Les Quatre Ãges del'Euredté- Brposé de la lroctrinê TraditioÊêliê desCyclê6 co6riquê,, Milano, Archà, 1976,

2) A criteriologia das compareçães entre religiõesfoi estabêlecida de nodo definitivo por Frithjofschuon em Dê t'Unité lrenscendente des RéligiongPeris, Ie Seui1, 1979. llá tradução brasileira,muito rara, de Fernendo celvão: D[ Iloidedê Trán6ceí-dêntê dss religiões, São Paulo, lÍarrins, 1950.

85

3) Sobre a definição de Tradição, v Sevved HosseinNâsr, KnoÍ.ledge and the Sacred, New York, Crossro-ads, l98l (Chap. II, "What is Tradltion?I).

4) os ritos, portânto, exigem o concurso de uma

dupla ordem aá inrr"ência: dã um 1ado, as influên-cias espirituais, divinas, que asseguran- a direçao"r"."."i.".r" e ncentralizante" da sua prática; es-tas influências são asseguradas pela revelação e

pela ortodoxia que a transmite; de outro lado, in-fluências psíquicas, fornecidas pela concentraçaodâ nassa dos crentês e que garantem a reverberaçaoÍhorizontal" das influências esPirituais sobre todââ comunidade hunana en questão. os pseudo-ritos,poi ranLo! .onten ap"nas a parce p"íquica .o quê lhes

à,',"," .- si'n,racio de eticácia cr. René cu"nón.Ãp.'ç.. "". I'lnitiation, Paris, Éditions rraditio-ne L Ies, 1983.

5) Em úItima instância, a obediência integraL aosp,"."ito" formais da relieião é urn critério infalí-ve1 par" a distinção entre I'mestres espirituais"veraiaei.os e fâLsos. Como escreveu o srandê sufiBayazid al-Bistami: "uesmo que você veja un homem

dotado de poderes niraculosos ao ponto de erguêr-seno ar, não se deixe enganar por ele, mas investisuese ele observa os divinos preceitos e proibições, se

êle pernánece den o dos liínites dâ religiào e se

ele cumpre os deveres que ela the impõe." (Clt enlrrtritall il. Perry, A Treasury of Trâditional IfisdoÚ!Patês líânor, Bedfont, Perennial Books, 1981, P.943)'Que também, por outro iado, ninguém se deixe enganarperas citações de câsos de mestres espirituaisaurenti.os que, en cêrtos caso'. permiriram ou

ordenaÍám á "êus dis.ípuIos ações que conr rariavam'aparentemente ao menos, o texto da lei religiosa'Essês casos são hoje abundantemente citádos em

defesa de aberrações que os pseudo-gurus conetem ou

ordenam diante ãe seus est,rpiaificâdos disciPulos 'Ma' os oiscípulos nào sabem. e os pseudo-gurus nào

thes contam, que se "há câsos em que um glrru ordênâ,

provisoriamente e tendo en vista determinada opera_ção de alquimia espiritual (do discípu1o), atosque, sen prejudicar a ninguéo, são contrários àLei..., ou antes às "prescrições", tais como existêmno Hinduísmo, e, no ocidente, sobrecudo no Judaismo,en oenhur caso poderia tratar-se de irfrações gra-ves à orden púbrica-" (FriEhjof schuon, Regards surles úondes anciens, Paris, Editions Traditionelles,1976, pp. 66-67 e ne l). Não é necessário esclare-cer que, no contexto is1âmico, a ingestão d€ bebidâsalcoór icas, o aborto o" a prát ica irregular dosritos são infrações graves à oraem pública.

6) sobre as seitas aberrantes de pseudo-sufis, cf.l. M. Leüis, Ecstatic Religion, An AotropologicâlStudy of Spirit Possession and shânanisú, Harmonds-worth, IÍiddlesex, Penguin Books, 1975. Especiálmentepp. 104-148. o autor descreve inclusive o caso deseitas onde o papel do inan (líder da prece) é de-senpenhádo por mulhêres masculinizadas e estóreis, ê

cujas práticas sâtânicas têÍn como um de seus efeitosmai. óuvios a 'cparaçào dos ca.ais.

7) cf. nená cuénon, LtErreur spirite, Paris, Édi-t ions Trad it ione 11e s, 1952ques t ion du satanisme").

I ) zakariatrad. SamirBras i 1, s/d

(Parte II, cap. x, "La

tv

El-Berry, os Direitos Euuanos no IsIão,E1-Hayek, São Pau1o, Centro ts1âmico do

, p. 30.

2) Cit. por FriEhjof S.huon em coúprendre l'IslaD,Paris, Le seui1, 1976, p.42.

3) o Concilio vâticano I condenou e proibiu formal-nente âs teorias que fazem da fé um "sentimento" va-so e irracional, sureido das profundezas do "incons-ciente". A definição dâdá pelo Concí1io foi: "Se

86 a7

aLsuém disser que Deusj um e verdadeiro, criador esenhor nosso, po, mêio dás !oi<ás . r iádas não pooesêÍ conhecido pêlá luz naturâl da razão, que sejaanátena (De RêweI-, can. l). O Pâpâ Pio X, em suaEncícrica Pâscendi Dorinici cregis ( 1907), classifi-cou oc propágàdo.es dá reor iá s. nt inênral da fi como

"homens de pêrvêrso dizêrrr ( Át., 20:30), "vaní10-quos e sedutôres" ( Tit., l:10), "q"e caiaos e,r' erroarrastam os dêmais ao erro" (rI Tiú. 3:3).

4) Cf. Alexandre Safran, La cábâ1a, trad. CarlosAyala, Barcelona, Martinez Roca, 1976, pp. 5l-125.

2) A relativã eficácia dos ritos e práticas pseudo-religiosas ê peüdo- espirituais provêm aliás unica-mente da energia psíquica coleriva ,,esroc.ada,,

emobjp(os, lugáres, símboto., e pê<soas. ;á a .onrra-ini.iá(ào propriamente oirá emprpSd nào "omenr" e",afonte de enereia, mas também os ,,resíduos,, de rradi-ções _ extintas, colhidos em remptos antigos de ondeo L"Dírito sê,rerirou. dêixando somênrePsrquLca. rl)ár o rntere5cê das or8anizá\ões .onrrâiniciiricas petas escavalõa. ..q,"ãr;si.,"

" p"ià;vrsrtds a muilo treqenrês. po, eyeaplo.entre os gurdjieffianos e ênrre os sesuidores .lêIdrres Sháh). Em ambos os , âsos, o efeiro. por naisê.peLaculár qLe seja, é superÍiciál " pr.rog.;,o, n"âusenciá. do laLor de r ixação repr(senrado petasrnlruencras oroprIanenLe pspirituais, rerirando_sê-- pâra espanto e desitusão aas créauias vítimas --tão Iogo se esgotá a quanridade de,energia psiquicaque Íoi investida na operação. É o q,e acontece.por exemplo, mi rácuLosás,' oue de um LeÍnpopara ca se tornarafl moda nos círculos de estudanrese pequênos letrados corn interrese em ,,ocutrisno',.Ct.. â ,espeiro, n"né cuénon, Le Ràgne dp Ia Quánr-i-te, Chap. XXVII, e rsmbem o que foi dito arr;s nopresenrê volume. Cap. tlL

3) Sobre a unidade e diversidade do Homem Universâ1-- ponto êssencial parâ a conpreensão do que estamosdizendo aqui, v. Seyyed Hossein Nasr, Ideals andRealitiês of Islaú, London, Unwin, 1979, p.61 , esobretudo Titus Burckhardt, ,,Introductions', à rrad.francesa de La SagÊsse des propheres, de Mohieddinlbn 'Arab\', Páris, AIbin Michet, tc74, pp. tO ss.

4) Uma "experiênLia', desse tipo É eferjvamentp rea-lizada pela organização Idries Shah, conforme pude-mos observaÍ pessoalnente e conforme declara nesmo o"manua1" da seira, O Sufisro no Ocidenre, Rio, Der-vish, 1984, pp. I04 ss.

6) Al-chazzatí, Le Tabernêcle des Luniàres, trad.Roger Deladriàre, Paris, Le SeuiL, l98l, p. 40.

7) Djalal-ed-Din Rumi, Fihi-nâ-fihi (En esto 10 queestá en eso), trâd. M. Bonaudo, Buenos Àires, Edici-ones del Peresrino, p. 103.

5) Cf. F. Schuon, "Ellipse et hyperbolisme dâns Iárhetorique arabe" em Le soufisDe: voile et quintes-sence, Paris, Dêvy-Livres, 1980, pp. I I ss.

8) Cit. por El-Bcrry, p. 29.

9) El-Berry, op. cit. , p. 30

I ) cas ton ceorsel,Mi lano, Àrchà, 1976

Les Quatre Âges de, pp.56-57.

Irflunanité,

VI

I ) René cuénon, "Influence spirituellê et ésréso-r€s'r, em Initiation et realisatioÍr spirituelle,Paris, Éditions TradiEioneIIes, i975, pp. 64 ss.

88 89

5) Sobre o nêrcisismo, v. o excelente artiSo deIíichel Lacroix, 'rUma época sob o signo de Narcisor',publicado no o Bstado de são Paulo, êm 13 de maiode I984.

6) Nâda de tergiversações a pretexto dos casos depessoâs I'cLinicamente mortas" que voltaÍam à vida,pois está claro que a ftorte em questào é reconhecidaparc ial e reletiva.

7) Rêsguerdadas certas difereflças sernânticas, nota_damente quanto à palavra "falha", comparar o quedissemos com o que diz Mário Ferreira dos Santos em

sua be1â Ética ltunds@Irtel, Logos, 1964, pp. 109-117.

8) Consultar, sobre o problema do IÍâ1, o têxto deFrithjof schuon, "Diurensions of omnipotence", em

Studíes iÊ Co.parativ€ neli8ioÊ, vo1. xVI, n. l_2,t{inter - spring, 1984, pp. 9-1ó (rêproduzido em Tras1ãs Euelles dê le RêIiEioo Pere rc, tred. esPânho1e,Bercelonâ, sophia Perennis, 1982).

9) rfá um evidente perigo em sondar as tendênciesinferiores. Ne úitologia gregâ, esse perigo é enÍa_tizado quando Júpiter recomendâ a Perseu que nãoolhe a Medusa (sÍmbo1o das forças inferiores) dire-temeÍrte nos olho§, mas sim através do escudo que elerecêbe do senhor do Olimpo. O escudo rePresentâ sem-pre es doutrioas e as Preces, em seu asPecto Protê_tivo.

t0) Para uma expLicação meis coülPleta da meditação,v. Titus Burckhardt, Ân IÊtroductioD to Sufi lloutri-tre, trad. inglesa, London, Thorsons, 1976, Chap. l7'e Frithjof Schuon, "De Ie Méditâtion" em LrOêiI duCo€ur, Paris, Dervy-Livres, I974,

l1) Cf. Frithjof Schuon, Corprendre IrIsIáo, Pâris,Le seuiI, 1976, pp. 103-123.

VII

l) À ioagen do hoÉ! ná astrologia, São Paulo,Júpiter, 1981.

2) Frithjof Schuon, De I'unité traoscendetrte degréIigions, Paris, Le SeuiI, reed. 1978 (há umatradução brasileira, Da uDidâdê tretrscendêote dasreligiões, São Pau1o, Iíartins, s/d).

3) rrPrincipiel": termo cunhado por René cuénoÊ (Lácrise du Dade Dde!tre, Paris, Callimard, l93O), pâ-ra designer o que se refere âo mundo dos princípioseternos e imutáveis, por oposição âo mundo da mani-festação.

4) As tentatives rêcentes de alguns antropó1ogos,ros Encontros de Royaumont, sob a chefia de Edgarlrorin e }íassimo Piâte11i-PatmeriÍli, pera reconsti-tuir uÍna cêrte r'unidâde do honem" por baixo devariedade dâs culturas, a1ém de constituir epenêsum tardio reconhecimento do óbvio p'or pârte de quêmsempre o negou, é ainda urn reconhecimento tÍmido eparcial, e bêseedo em razões puramente contingeÍrtesrcomo as de ordem biológica, por exempLo.

90 9t

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